a khóra no timeu de platão

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A KHÓRA NO TIMEU DE PLATÃO - É uma “ficção” (como o contrato social de Rousseau) - É ≠ Hyle Aristotélica: 1) Etimologicamente,o termo “matéria” é de origem latina ≠ húle. Materia = tronco da árvore 2) Platão não se utiliza do termo húle = “madeira de construção” = silva latino 3) Em Aristóteles, impõe-se definitivamente o uso do termo húle = “matéria”. Considerando khora como “matéria primeira ausente de forma” 4) Em Platão, khóra (1 dos termos utilizados para o 3ºgênero 1 ) = “território”, “lugar”, ou, de modo mais geral, “espaço”. Uma noção ambígua que permite dar conta da participação do sensível no inteligível sendo é, de uma só vez, “o que em que” aparecem as coisas sensíveis e o que de que” são elas feitas. khóra se encontra na origem dessa noção de matéria destinada a desempenhar um papel essencial na história da cosmologia. 1. ONTOLOGIA E COSMOLOGIA EM PLATÃO - Uma cosmologia para Platão deve responder essas 3 questões fundamentais devido a convicção do mundo grego antigo de que a constante transformação não pode vir a ser a realidade verdadeira: 1) a cognoscibilidade do mundo sensível 2) como descrevê-lo/falar a respeito 3) a ação eficaz sobre ele - Para que possa ser objeto de discurso, na transformação mesma , deve apresentar alguma permanência - A solução platônica é a hipótese das Formas cognoscíveis pelo noûs, das quais as cópias sensíveis participam. - Participação operada pelo viés das matemáticas, assegurando permanência e regularidade, na medida do possível, assegurando a cognoscibilidade, a possibilidade de falar a respeito, e a ação eficiente - 2 problemas da hipótese das Formas formuladas no Parmênides: a) A participação das Formas entre elas mesmas (solução proposta no Sofista) b) A participação do sensível nas Formas (Timeu) b1) Platão, no Timeu, faz intervir duas ficções seguintes: demiurgo e a khóra problema de (b): semelhança e dissemelhança das coisas sensíveis para com as formas inteligíveis. 1 O terceiro gênero é apresentado como uma nutriz (trophós: 88d6; tithéne: 49a6, 52d5, 88d6), uma mãe (méter: 50d3), um receptáculo (hupodokhé: 49a6, 51a5), uma localização , um espaço (khóra: 52a8, 52b4, 52d3, 53a6), um lugar (tópos: 52a6, 52b4, 57c3), um local (édra: 52b1. 53a2).

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A Khóra No Timeu de Platão

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A KHRA NO TIMEU DE PLATO- uma fico (como o contrato social de Rousseau)- Hyle Aristotlica:1) Etimologicamente,o termo matria de origem latina hle. Materia = tronco da rvore2) Plato no se utiliza do termo hle = madeira de construo = silva latino3) Em Aristteles, impe-se definitivamente o uso do termo hle = matria. Considerando khora como matria primeira ausente de forma4) Em Plato, khra (1 dos termos utilizados para o 3gnero[footnoteRef:1]) = territrio, lugar, ou, de modo mais geral, espao. Uma noo ambgua que permite dar conta da participao do sensvel no inteligvel sendo , de uma s vez, o que em que aparecem as coisas sensveis e o que de que so elas feitas. [1: O terceiro gnero apresentado como uma nutriz (trophs: 88d6; tithne: 49a6, 52d5, 88d6), umame (mter: 50d3), um receptculo (hupodokh: 49a6, 51a5), uma localizao, um espao (khra: 52a8, 52b4, 52d3, 53a6), um lugar (tpos: 52a6, 52b4, 57c3), um local (dra: 52b1. 53a2).]

khra se encontra na origem dessa noo de matria destinada a desempenhar um papel essencial na histria da cosmologia.

1. ONTOLOGIA E COSMOLOGIA EM PLATO

- Uma cosmologia para Plato deve responder essas 3 questes fundamentais devido a convico do mundo grego antigo de que a constante transformao no pode vir a ser a realidade verdadeira:

1) a cognoscibilidade do mundo sensvel2) como descrev-lo/falar a respeito3) a ao eficaz sobre ele

- Para que possa ser objeto de discurso, na transformao mesma, deve apresentar alguma permanncia - A soluo platnica a hiptese das Formas cognoscveis pelo nos, das quais as cpias sensveis participam.- Participao operada pelo vis das matemticas, assegurando permanncia e regularidade, na medida do possvel, assegurando a cognoscibilidade, a possibilidade de falar a respeito, e a ao eficiente

- 2 problemas da hiptese das Formas formuladas no Parmnides: a) A participao das Formas entre elas mesmas (soluo proposta no Sofista) b) A participao do sensvel nas Formas (Timeu)b1) Plato, no Timeu, faz intervir duas fices seguintes: demiurgo e a khra

problema de (b): semelhana e dissemelhana das coisas sensveis para com as formas inteligveis. - O demiurgo garante a semelhana com relao ao inteligvel, enquanto que - khra explica porque uma deve ser diferente da outraKhra jamais descrita enquanto elamesma, em estado puro, no Timeu. Quando o demiurgo a trabalha para introduzirmedida e proporo, ela j apresenta traos dos quatro elementos (Timeu 52d-53c)angke, (movimento mecnico desprovido de ordem e de medida)impem limites severos a toda inteno racional

que a alma do mundo deve calcular, Plato reconhece que a ordem suposta para seu modelo cosmolgico apenas pode permanecer parcial e provisria

1.1. O que podemos dizer do mundo sensvel?

Ler passagem [49d-50d]

- Como falar do sensvel? Eis a questo e tentativa de resposta dessa passagem.

(1) No possvel atribuir s coisas sensveis qualquer denominao distinta, pois no se pode a distinguir qualquer fase do fluxo fenomenal qual elas se reduzem, dizendo dessa fase que isto fogo, isto gua

(3) cada vez que tentamos distinguir uma fase do fluxo fenomenal utilizando o detico isto, no se aponta uma fase do fluxo fenomenal, mas seu receptculo permanente e que no muda, enquanto que nele aparecerem, e dele desaparecem, manifestaes que no apresentam qualquer caracterstica permanente

(4) Ento, assim que seja possvel designar a frmula isto que tal e tal, a qual , de fato, uma abreviao para uma frmula mais elaborada do gnero o que em todo caso tal ou tal, ou mais exatamente ainda do gnero o que tal que se encontra sempre semelhante em absolutamente todos os casos e em nenhum deles em particular?a) Nomear tais propriedades de qualidades erro pois faz das imitaes do fogo, do ar, gua e terra indiscernveis de outras coisas eqto substncias/qualidade, isto que tal e tal (toioton) faz td igual.b) Tambm no se trata de fenmenos transitrios: do que no cessa de transformar-se, no se pode dizer que seja isto nem este tal e tal; c) Essas propriedades distintas e que guardam sua identidade, assim que adentram no receptculo do devir e saem, so qualificadas um pouco adiante de imitaes (mimmata) de realidades eternas (Timeu 50c), de representaes (aphomoimata) de seres eternos (Timeu 51a, cf. 52a) que trazem o mesmo nome destes, pois eles se assemelham (Timeu 52a-c).

1.2. Que podemos saber?

para explicar a diferena entre essa imagem que de uma coisa sensvel e seu modelo inteligvel, preciso criar a hiptese de um terceiro termo diferente dos dois outros. Em sendo assim, preciso aceitar:

[52a ff.] p.23

As coisas sensveis so visveis (Timeu 49a1) e perceptveis pelos sentidos (Timeu 52a5); elas fazem nascer uma opinio (Timeu 51d4) que resulta da sensao (Timeu 52a7); podem criar objeto de persuaso (Timeu 51d5-e6). As formas inteligveis so invisveis (Timeu 52a3-4) e inacessveis aos sentidos (Timeu 52a3-4); so apreendidas pelo intelecto (51d5-e6) ao final de um ato de inteleco (Timeu 42a4); podem criar o objeto de um ensinamento (Timeu 51d5-e6). Khra no pode ser percebida com o auxlio da sensao (Timeu 52b2), um vis pelo qual participa do inteligvel (Timeu 51a7-b1); e no menos h a necessidade de lev-la em conta (Timeu 52b3-4 et 49a3) se queremos dar conta das coisas sensveis. Esse arrazoamente bastardo (Timeu 52b2), pois no concerne nem ao sensvel nem ao inteligvel; ele to somente acreditado como em sonho (Timeu 52b2), e no pode ser objeto nem de persuaso nem de ensinamento; no entanto, verdadeiro e impe sua concluso como necessria.

1.3. Em que ela consiste?dado a estranheza dessa entidade, da qual tivemos que reconhecer a necessidade, essa aproximao no pode ser direta: e isto simplesmente porque khra no pode ser percebida pelossentidos nem ser alcanada por meio do intelecto. Eis por que preciso fazer um retorno para a comparao e para a metfora.

1.3.1. Aquilo em que se encontram as coisas sensveis

[50d ff.] p.25

terceiro gnero apresentado primeiramente como receptculo do devir, sua me, de algum modo. (me, pai e rebento).

Mas a comparao do terceiro gnero com a me introduz um elemento novo, pois faz intervir as duas idias seguintes: a do receptculo, ou seguramente o lugar, como prova a presena de termos significativos, e tambm a do elemento constituto,

1.3.2 De que so constitudas as coisas sensveis

Esta nova idia de princpio constitutivo explicitamente formulada por intermdiode trs compraraes que se associa ao receptculo como ao excipiente deum perfume, depois a um pedao de certa e, enfim, a uma massa de ouro, em quese imprime um certo nmero de formas.

[50e ff] p.26

uso metafrico que faz Plato de substantivos e verbos que se apresentam esse princpio, de uma s vez, como aquilo de que so feitas as coisas sensveis e aquilo em que se encontram. (Ver exs. pg. 27)

khra, que, como vimos, deve ser distinguida das formas inteligveis, deve tambm e antes de tudo ser radicalmente diferente de todas as coisas sensveis que a aparecem e que a desaparecem. Compreende-se, ento, que Plato considera necessria a hiptese de sua existncia por meio de um arrazoamento que qualifica como bastardo e que no a descreva seno com o auxlio de imagens e metforas.

2. A necessidade (ananke)

Se, com efeito, khra compe o universo e totalmente indeterminada, deve ser absolutamente dcil, pelo que, ento, a ao do demiurgo se encontra limitada e no pode realizar-se seno na medida do possvel?

Desde o ponto de partida, a se manifesta a necessidade

50dff..

khra se encontra agitada pelo movimento desprovido de ordem e medida

necessidade, longe de opor-se ao acaso, tem tendncia nesse contexto de identificar-se com ele enquanto causa errante (Timeu 48a).

essa desordem, o demiurgo procura absorver, persuadindo a necessidade (Timeu 48a, c et 51e), na medida do possvel. Em passagem enigmtica (Timeu 56c), Timeu deixa entender que a necessidade no se ope sistematicamente ao do demiurgo Mas, a maior parte do tempo, odemiurgo e seus auxiliares devem dobrar-se s ameaas que a necessidade impe, notadamente quando da constituio do corpo humano (Timeu 79b). Isto implica que a necessidade continua a manifestar-se no universo, em que a alma do mundo perpetua a ordem que a demiurgia instaurou.

Compreende-se logo que no so as formas inteligveis, mas as coisas sensveisque entram em khra e que saem (Timeu 50c4-6). No h seno coisas sensveis, todas que so a partir dos quatro elementos (fogo, ar, agua e terra) e dos quatro elementos somente, associados aos quatro poliedros regulares, as coisas sensveis que, nesse fluxo incessante, apresentam certa permanncia bastante longa em durao para serem identificadas e nomeadas.

Concluindo, o terceiro gnero aquilo em que se encontram as coisas sensveis e aquilo e que elas so feitas. diferente das formas inteligveis e totalmente distinta das coisas sensveis Assim sendo, no se pode apreender nem por pensamento como seria uma forma inteligvel, nem pelos sentidos como seria uma coisa sensvel. um pensamento bastardo