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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ WILLIAM RAPHAEL FERRARI DE OLIVEIRA A ISENÇÃO DO IPI NA COMPRA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES POR PESSOAS FÍSICAS: PERSPECTIVAS CONSTITUCIONAIS E ECONÔMICAS CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

WILLIAM RAPHAEL FERRARI DE OLIVEIRA

A ISENÇÃO DO IPI NA COMPRA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES POR

PESSOAS FÍSICAS: PERSPECTIVAS CONSTITUCIONAIS E ECONÔMICAS

CURITIBA

2014

A ISENÇÃO DO IPI NA COMPRA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES POR

PESSOAS FÍSICAS: PERSPECTIVAS CONSTITUCIONAIS E ECONÔMICAS

CURITIBA

2014

WILLIAM RAPHAEL FERRARI DE OLIVEIRA

O A ISENÇÃO DO IPI NA COMPRA DE VEÍCULOS AUTOMOTORES POR

PESSOAS FÍSICAS: PERSPECTIVAS CONSTITUCIONAIS E ECONÔMICAS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná - UTP, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Professor André Peixoto de Souza

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

WILLIAM RAPHAEL FERRARI DE OLIVEIRA

DISPENSA DAS LICITAÇÕES NA HIPÓTESE DE SITUAÇÃO

EMERGENCIAL E SEUS EFEITOS

Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do título de Bacharel no Curso de Bacharelado em Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ______de _________________________ de 2014.

________________________________

Curso de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná

__________________________________________ Orientador: Professor André Peixoto de Souza

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof.__________________________________________

Prof.__________________________________________

RESUMO

O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) está previsto na Constituição

Federal Brasileira no artigo 153, IV e tem como objeto todos os produtos

industrializados. Por industrialização entende-se qualquer operação que modifique a

natureza, o funcionamento, o acabamento ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe

para o consumo. O fato gerador desse imposto se dá, principalmente, no

desembaraço aduaneiro do produto. Entretanto, quando o particular realiza a

compra para fins pessoais de um veículo, ocorre uma dupla taxação, a qual é

vedada em nosso ordenamento jurídico. Boa parte da nossa doutrina e algumas

decisões de Tribunais Superiores, já se posicionaram contrários a essa incidência. A

luz dos principais constitucionais, tributários e econômicos, apresentando-se

definições de temas amplos do direito econômico e tributário, se discutirá a natureza

jurídica desse imposto, sua incidência e seu papel extrafiscal. Sem prejuízo de

reflexões sobre políticas econômicas e suas esferas (monetária, cambial e fiscal).

Palavras-chave: Direito Tributário. Imposto. Imposto sobre Produtos

Industrializados. Extrafiscalidade. Política Econômica. Política Fiscal.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 7

2 DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL ................................................................ 9

2.1 O CARÁTER SUI GENERIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO ............ 10

2.2 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO TRIBUTÁRIO .............................. 11

2.3 OS TRIBUTOS: IMPOSTOS, TAXAS E CONTRIBUIÇÕES ............................... 12

2.4 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, FATO GERADOR E LANÇAMENTO ..................... 14

3 DO IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS ................................. 16

3.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS E O IPI ................................ 17

3.2 O ARTIGO 46 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL ...................................... 19

3.3 CONTROVÉRSIAS SOBRE A COBRANÇA DO IPI ........................................... 20

4 DIREITO TRIBUTÁRIO OU DIREITO FISCAL? .................................................... 22

4.1 POLÍTICA MONETÁRIA,CAMBIAL E FISCAL .................................................... 23

4.2 POLÍTICAS EXPANSIONISTAS E CONTRACIONISTAS ................................... 24

4.3 EXTRAFISCALIDADE ......................................................................................... 25

4.4 POLÍTICAS FISCAIS ........................................................................................... 26

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 28

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 29

7

1 INTRODUÇÃO

Essa monografia tem como cerne a incidência do Imposto de Importação de

Produto Industrializado em veículos automotivos comprados por pessoa física.

Partindo desse questionamento, sobre a possibilidade ou não da incidência, buscou-

se refletir sobre o papel do Direito Tributário, a sua recente constitucionalização, os

princípios que o regem, além de apresentar reflexões e conceitos sobre fiscalidade,

extrafiscalidade e políticas econômicas.

O primeiro capítulo aborda o Sistema Tributário Nacional. Nós, enquanto

indivíduos, nos organizamos politicamente na forma de um Estado. E essa ficção

jurídica chamada Estado precisa de verba para garantir aos seus cidadãos a

satisfação de suas necessidades. Apresentar-se-á, nesse capítulo o porquê do

sistema tributário brasileiro possuir um caráter sui generis, como se deu a

constitucionalização do direito tributário e seus atuais desafios. Também definir-se-

ão os principais tributos e o que origina uma obrigação tributária.

O segundo capítulo focará especificamente no Imposto Sobre Produtos

Industrializados. Os princípios constitucionais que se relacionam a esse imposto, as

principais controvérsias sobre a sua cobrança, além de realizar a análise do artigo

46 do Código Tributário Nacional. Nesse capítulo far-se-á a análise de alguns

julgados proferidos pelo Supremo Tribunal Federal referentes ao tema, bem como

do Tribunal Federal da 4ª Região. Mister lembrar, que até o momento da entrega

desse trabalho, ainda não houve pronunciamento do pleno das duas casas do STF.

O terceiro capítulo é um capítulo mais livre, no qual se buscou a realização de

reflexões econômicas e jurídicas. Apresentar-se-ão definições acerca da política

monetária, creditícia, cambial e fiscal, além de diferenciar as políticas econômicas

expansionistas das contracionistas, buscando-se sempre um paralelo com o IPI.

Também se buscará entender o conceito de extrafiscalidade.

Como um todo integrado, essa monografia trata, em sua essência de um

imposto específico, porém abre espaço para outras discussões mais profundas, que

podem servir como uma introdução teórica a quem se interessar pelo tema. Temas

como economia, extrafiscalidade, teorias econômicas são indissociáveis da reflexão

acerca o direito tributário.

8

Pretendeu-se compilar o que uma parte significativa da doutrina entende e

propaga. Talvez, num futuro próximo, pretende-se aprofundar os conteúdos dessa

pesquisa, buscando-se um maior refinamento teórico, em uma pós graduação.

9

2 DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

O ordenamento jurídico brasileiro é formado por um complexo de

normas, cada qual com suas funções e suas particularidades. Nossa Carta

Magna estabeleceu a competência tributária, ou seja, a possibilidade de

instituir, arrecadar e fiscalizar os tributos, aos seus entes políticos, quais sejam:

a União, aos Estados-Membros e aos Municípios. Apenas os entes políticos

possuem esses poderes, visto que são os únicos titulares de competência

tributária.

Embora o estudo do direito tributário seja feito de maneira autônoma, ele

integra a ordem jurídica nacional e deve ser interpretado, sempre, conforme a

Constituição Federal, como toda a legislação nacional. Mister ressaltar que a

competência constitucional tributária baliza a definição positiva e negativa dos

tipos tributários, condicionando o legislador.

Organizamo-nos politicamente na forma de um Estado, sendo o Governo

seu “elemento diretor”, usando a expressão de J. Franklin Alves Felipe (ALVES

FELIPE, 2001, p.3). A fim de que sejam satisfeitas as necessidades públicas e

coletivas dos cidadãos, há a necessidade de produção de receita. Conforme

“A mais perfeita demonstração do poder estatal está na sua faculdade

de tributar. Se do Estado se exige a realização da justiça e, cada vez

mais, uma intensa intervenção na vida econômica e social, em seus

mais variados setores, visando à promoção do bem comum, sempre

oneroso a seus cofres, é necessário que lhe seja assegurado o direito

de buscar recursos para cumprir esses fins, através de uma

obrigação ex lege, cujo cumprimento independa da vontade dos

destinatários da norma” (ALVES FELIPE, 2001 p.33)

Existem diversas fontes de receita de um Estado (por exemplo:

permissão e concessão de um bem público, alienação de bens, participação

acionária, entre outras), entretanto a maior fonte de arrecadação de verba é

feita através dos tributos.

Visto a importância da arrecadação tributária para a manutenção dos

Estados modernos, seu caráter compulsório e sua vinculação direta à

Constituição Federal, pretende-se, nesse capítulo, discutir questões

10

relacionadas ao sistema tributário nacional frente à Constituição, além de

apresentar algumas definições importantes para se prosseguir, com a devida

consistência teórica, a discussão acerca da possibilidade da cobrança do

Imposto de Produtos Industrializados no caso específico que é o objeto desse

estudo.

2.1 O CARÁTER SUI GENERIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO

O caráter sui generis do nosso direito tributário, foi apontado,

inicialmente, por Geraldo Ataliba, visto que nosso sistema é “original e

desconhece similares e réplicas, contrastando radicalmente com todos os

demais, é mais perfeito juridicamente e requer trato singular e específico”

(ATALIBA, 2004, p.26-27).

Mas o que torna o direito tributário brasileiro diferente? Por que ele

possui esse caráter suis generis? Pode-se utilizar a explicação simples e

didática do professor Alexandre Macedo Tavares, para se compreender esse

ponto. Conforme:

“É o Brasil, pois, o único país do mundo a contar com um verdadeiro

subsistema constitucional tributário, o que implica importantes

desdobramentos, vez que as normas infraconstitucionais tributárias,

complementares ou ordinárias, acabam se submetendo a rigorosas

limitações de índole material e formal, subordinando-se, sempre que

editadas, ao amplo e inafastável teste de constitucionalidade”

(TAVARES, 2008, p. 9)

Com isso, é possível auferir que, sendo o sistema tributário pátrio sujeito

às amarras de uma Constituição rígida, está, ele mesmo dotado dessa mesma

rigidez. Assim, verifica-se a necessidade de um procedimento mais complexo

para alterar as diretrizes substanciais que regem o Sistema Tributário, da

mesma maneira como se procede com as alterações constitucionais.

Importante também ressaltar a existência de cláusulas pétreas

tributárias, dispostas no artigo 150 da Constituição Federal. Ali, constata-se a

positivação dos principais princípios que regem a legislação tributária.

Verificam-se, essencialmente, nesse artigo, as limitações do poder de tributar.

11

Limitações essas salvas de qualquer possibilidade de alteração, por serem

direitos e garantias individuais dos contribuintes nacionais. Conforme o artigo

60, § 4º, IV, são garantias intangíveis, irrevogáveis e não compromissíveis.

Em suma podemos concluir que o nosso Sistema Tributário é um

sistema previsível, sendo que a limitação ao poder de tributar se encontra

protegida na nossa Carta Magna por princípios indisponíveis. Muitas vezes, o

legislador e o próprio Judiciário não observam a hierarquia piramidal (aqui, se

fazendo uma referência à conhecida obra de Hans Kelsen) dos princípios

tributários da nossa Carta Maior, como no caso objeto desse estudo. Por isso

se faz importante embutir, em quase todas as discussões jurídicas, preceitos

constitucionais, com o intuito maior de se aperfeiçoar uma cultura

constitucional, e lembrar o Poder Público de zelar e proteger os preceitos

constitucionais, mesmo sendo esse o maior ofensor.

2.2 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO TRIBUTÁRIO

Após a devastação trazida por duas guerras mundiais, o direito, no

sentido amplo, buscou se reaproximar da ética e da moral, em detrimento de

análises meramente positivistas, visto que a obediência à lei foi usada para

justificar inúmeras brutalidades.

O professor Luís Roberto Barroso explica que:

“Uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do

século XX foi a atribuição à norma constitucional do status de norma

jurídica. Superou-se assim o modelo que vigorou na Europa até

meados do século passado, no qual a Constituição era vista como um

documento essencialmente político, um convite à atuação dos

poderes públicos. A concretização de suas propostas ficava

invariavelmente condicionada à liberdade de conformação do

legislador ou à discricionariedade do administrador. Ao judiciário não

se reconhecia qualquer papel relevante na realização do conteúdo da

Constituição” (BARROSO, 2009, p. 298)

Por meio do fenômeno da constitucionalização do direito, acrescida de

uma interpretação que preza mais por princípios jurídicos do que por

12

interpretação strito sensudas normas jurídicas, o direito se transmutou.

Segundo Luiz Edson Fachin esse movimento de constitucionalização é de

extrema importância, visto que:

“Por meio da doutrina, da jurisprudência e mesmo da legislação

infraconstitucional o sentido e o alcance das normas constitucionais

(compostas de regras e princípios) são permanentemente

contextualizados. Assim, numa dimensão prospectiva, o doutrinador,

o magistrado e o legislador, desenvolvem, sempre, uma ação de

reconstituir, dentro do sistema jurídico, as expressões (...), de modo

coerente com a contraprova histórica de todo discurso jurídico”.

(FACHIN, 2007, s/p)

O direito tributário, como todos os ramos do direito também foi

influenciado por todo esse movimento Constitucional. Especialmente do Brasil,

como foi discutido no subcapítulo anterior, podemos ressaltar a importância da

interpretação constitucional do direito nas lides que versam sobre matéria

fiscal, visto a existência de um título exclusivo (Título VI – artigos 145 ao 169)

na própria Carta Magna nacional. Importante ressaltar e ressalvar que esse

movimento não tem o condão de comprometer a ordem jurídica estruturada,

mas sim de garantir ao contribuinte uma maior segurança no que tange a

tributação de sua renda.

2.3 OS TRIBUTOS: IMPOSTOS, TAXAS E CONTRIBUIÇÕES

A fim de prosseguir o estudo do Sistema Tributário Nacional, essencial

se faz explicar o gênero tributo e seus subgêneros, quais sejam impostos,

taxas e contribuições, para uma compreensão adequada do funcionamento

fiscal do nosso Estado.

Vimos, anteriormente, que com o propósito de que sejam satisfeitas as

necessidades públicas e coletivas dos cidadãos, há a necessidade de

produção de receita, receita essa produzida, em sua maior parte por meio dos

tributos.

Mas o que são tributos? O artigo 3º do Código Tributário Nacional define

tributo como toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor

13

nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei

e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

Nesse trabalho, adotaremos a definição tributo como sinônimo de

relação jurídica tributária, instaurando-se essa relação na ocorrência do fato

previsto no antecedente normativo, estabelecendo ao sujeito passivo

(contribuinte) o dever jurídico de confiar dinheiro aos cofres públicos.

Como o objeto desse estudo é um imposto, iniciar-se-ão por ele as

definições das espécies tributárias.

O Código Tributário, em seu artigo 3º. define imposto como o tributo cuja

obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer

atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. Franklin Alves Felipe,

explica, didaticamente, esse tributo da seguinte forma:

“Nos impostos, o indivíduo paga ao Estado, mas não recebe,

diretamente, em razão do que pagou, nenhum tipo de serviço. É

beneficiado, sim, como membro da comunidade que recebe os

serviços públicos, mas não há nenhuma relação direta entre o que

pagou e os serviços que recebeu. Assim, enquanto uns pagam, por

exemplo, o imposto de renda, outros usufruem do ensino gratuito nas

universidades”. (ALVES FELIPE, 2001, p. 5).

A definição de taxas é encontrada em nosso ordenamento jurídico no

artigo 77 do Código Tributário Nacional, o qual doutrina que as taxas cobradas

pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito

de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do

poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público

específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto a sua disposição. Em

seu parágrafo único, inserido através do Ato Complementar nº 34, de 30 de

janeiro de 1967 é garantido que a taxa não pode ter base de cálculo ou fato

gerador idênticos aos que correspondam a imposto nem ser calculada em

função do capital das empresas.

A partir dessa definição, compreende-se que nas taxas, diferentemente

dos impostos, o contribuinte paga por um serviço específico e divisível que

recebe ou o tem a disposição.

14

Além dos impostos e das taxas, existem as contribuições. A

compreensão do instituto da contribuição é mais entendível se feita via

exemplo do que por uma definição. Podemos citar a contribuição de melhoria,

que ocorre quando, por exemplo, uma determinada calçada é realizada. O

Estado realiza a obra pública e pode distribuir o custo dessa obra pelas

pessoas beneficiadas. Importante ressaltar que existem várias espécies de

contribuição com natureza tributária. Fazendo uma ponte com a Constituição,

vemos a inserção das contribuições no capítulo atinente ao Sistema Tributário

Nacional, o que demonstra, assim, a “inequívoca intenção do legislador maior,

no sentido de que, como tributos, fossem tratadas”. (ALVES FELIPE, 2001,

p.7).

2.4 OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, FATO GERADOR E LANÇAMENTO

Durante nossa vida realizamos as mais diversas atividades sociais e

econômicas, entretanto, não são todas as nossas atividades que possuem

relevância para o direito. A escolha do que é tributado ou não é realizada em

função de fatos socioeconômicos escolhidos pelo poder legislativo.

Em uma explicação resumida, os fatos que são eleitos como geradores

de obrigação tributária precisam, primeiramente estarem positivados no

ordenamento jurídico. Estando definido determinado ato em lei, a ocorrência do

fato gera a obrigação de pagar. Isso é definido no direito tributário como fato

gerador. Nosso Código Tributário Nacional define fato gerador como a situação

definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

Tendo isso em mente, concluímos que a obrigação tributária nasce com

o fato gerador. J. Franklin Alves Felipe nos explica que:

“Quando ocorre o fato gerador, em tese, o fisco deveria comunicar ao

contribuinte a sua obrigação de pagá-lo, no prazo e forma

determinados. Isso se denomina lançamento. A compreensão do

fenômeno do lançamento se faz, de forma muito mais nítida no caso

do Imposto Predial e Territorial Urbano, cobrado pelos municípios. As

prefeituras têm o cadastro dos imóveis da cidade. Anualmente, com

base nos elementos desse cadastro, faz o lançamento do IPTU. Isso

15

é, notifica os proprietários ou possuidores para pagar esse imposto”

(ALVES FELIPE, 2001, p.10)

Importante notar que o lançamento dado como exemplo pelo doutrinador

é direto, contudo nem todos o são. Alguns podem adotar a sistemática do

lançamento por homologação (alguns doutrinadores o denominam como

autolançamento), como o ICMS, no qual o próprio contribuinte calcula o

imposto devido e o recolhe, podendo o Fisco cobrar eventual diferença em

caso de erro ou má-fé. Há também a possibilidade do lançamento feito após

informações prestadas pelo próprio contribuinte, como o imposto de renda de

pessoa física. Quando quem deve pagar o tributo, não o faz, gera-se a

promoção, por parte do Fisco, de realizar o lançamento de ofício, geralmente

com multas e outras penalidades.

16

3 DO IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS

Nesse capítulo, discutir-se-á a respeito do Imposto sobre Produtos

Industrializados, procurando-se abordar algumas de suas particularidades.

Utilizar-se-á a abreviatura IPI, visto a notória popularidade da abreviação, o que

não acarretará de maneira alguma em prejuízo às noções as quais se pretende

explicar.

O IPI está previsto no artigo 153, IV, da Constituição Federal, na sua

seção III, relativa aos impostos de competência da União, no Código Tributário

Nacional, dos artigos 46 ao 51 e tem suas disposições no Decreto nº 7.212 de

2010, a fim de regulamentar sua cobrança, fiscalização, arrecadação e,

finalmente, a sua administração.

Primeiramente e de suma importância, deve-se definir o que é

industrialização. De acordo com o disposto no art. 4º do Decreto 7.212 de

2010, é qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o

acabamento ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para consumo.

Assim, percebemos que em qualquer produto que passe por um

processo de industrialização, ressalvadas as exceções legais, haverá a

incidência do IPI. De acordo com informações prestadas pela Receita Federal,

o fato gerador desse imposto ocorrerá, principalmente, na importação, quando

realizado o desembaraço aduaneiro de produtos de procedência estrangeira (o

que será discutido, a posteriori, com maior profundidade) e na operação

interna, quando ocorre a saída de produto de estabelecimento industrial ou

equiparado a industrial.

A alíquota aplicada desse imposto varia conforme o produto e é fixada

pelo poder executivo, razão pela qual, é utilizado frequentemente pelo governo

federal para a realização de políticas econômicas, freando-se, quando

necessário o consumo de determinados produtos (aumentando-se a alíquota)

ou, estimulando o consumo de outros (diminuindo-se a alíquota, muitas vezes

até zerando-a). A Receita Federal mantém uma Tabela de Incidência do

Imposto sobre Produtos Industrializados.

Não é exagero falar que o IPI é o imposto mais utilizado na realização de

políticas econômicas do governo. Pode-se citar o caso da indústria

automobilística, que teve o IPI reduzido com o intuito de se impulsionar as

17

vendas com o fim declarado oficialmente da manutenção de postos de

trabalhos. Por essa razão diz-se que esse tributo é parafiscal, parafiscalidade

entendida aqui como a delegação dos elementos da capacidade tributária ativa.

3.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS E O IPI

O cerne da discussão acerca da legalidade da cobrança do IPI sobre a

cobrança do IPI na importação de veículo automotor para pessoa física,

destinada ao uso próprio, reside, essencialmente, no conflito dessa cobrança

com as normas principiológicas dos tributos disciplinadas na Constituição

Federal.

Paulo Roberto de Barros advertiu que:

“Se o Código Magno atribui à União a competência ara instituir

imposto sobre a importação de produtos estrangeiros (art. 153, I),

claro que as operações com produtos industrializados nacionais não

poderão estender seu manto por sobre a importação de produtos

estrangeiros, sob pena de invadirem a materialidade da hipótese de

outro tributo. Exatamente isso foi o que tentou fazer o legislador

federal quando instituiu o IPI nas importações”. (BARROS, 2000, p.

98)

Esse e outros doutrinadores, tais como Antônio Maurício da Cruz e

Paulino Manfrinato, classificam o IPI, nessa circunstância como um verdadeiro

sobreimposto de importação.

Paulino Manfrinato acautela que

“Poder-se-ia argumentar que, com o desembaraço dos produtos

industrializados estrangeiros importados, estes já teriam adquirido a

condição de nacionalizados, ou seja, teriam deixado de ser

estrangeiros. No entanto (...), outra evidência se apresenta, qual seja

a de o IPI se apresentar como um sobreimposto de importação: o

próprio legislador da União de certa forma intuiu, implicitamente, esta

conotação aduaneira de incidência do IPI sobre produtos

industrializados forasteiros, tanto assim que vinculou às isenções do

II iguais isenções do IPI (Decreto-Lei nº 2433/88, art. 3º, e RA, art.

18

219). Vinculação que se torna inócua e dispensável, frente à natureza

adicional ora reconhecida. (MANFRINATO, 2002, p. 114).

Entende-se, nesse trabalho, que o princípio da não cumulatividade deve

ser aplicado, o que impossibilitaria a cobrança do IPI de produtos no

desembaraço aduaneiro, se os produtos forem importados por pessoas físicas,

para consumo próprio. Conforme já decidido pela STF,

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO:

PESSSOA FÍSICA NÃO COMERCIANTE OU EMPRESÁRIO:

PRINCÍPIO DA NÃO- CUMULATIVIDADE: CF, art. 153, § 3o, II. NÃO-

INCIDÊNCIA DO IPI. I. – Veículo importado por pessoa física que não

é comerciante nem empresário, destinado ao uso próprio: não-

incidência do IPI: aplicabilidade do princípio da não-cumulatividade:

CF, art. 153, § 3o, II. Precedentes do STF relativamente ao ICMS,

anteriormente à EC 33/2001: RE 203.075/DF, Min. Maurício Corrêa,

Plenário, “DJ” de 29.10.1999; RE 191.346/RS, Min. Carlos Velloso, 2a

Turma, “DJ” de 20.11.1998; RE 298.630/SP, Min. Moreira Alves, 1a

Turma, “DJ” de 09.11.2001. II. – RE conhecido e provido. Agravo não

provido. (RE 255682 AgR, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO,

Segunda Turma, julgado em 29/11/2005, DJ 10-02-2006 PP-00014

EMENT VOL- 02220-02 PP-00289 RDDT n. 127, 2006, p. 182-186

RIP v. 7, n. 35, 2006, p. 247- 251)

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO

EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULO

PARA USO PRÓPRIO. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. I

– Não incide o IPI em importação de veículo automotor, por pessoa

física, para uso próprio. Aplicabilidade do principio da não

cumulatividade. Precedentes. II – Agravo regimental improvido. (RE

550170 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira

Turma, julgado em 07/06/2011, DJe-149 DIVULG 03-08-2011

PUBLIC 04-08-2011 EMENT VOL- 02559-02 PP-00291)

19

3.2 O ARTIGO 46 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL

Ora, se o bis in idem na tributação deve ser evitado, como explicar a

cobrança de IPI quando já há a incidência de um imposto de exportação?

Como explicar a cobrança desse mesmo imposto frente a um particular, que

não exerce ato algum deindustrialização?

No que tange a segunda questão, objeto desse estudo, foi reconhecida

pelo Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal a existência de repercussão

geral do tema, abordada no Recurso Extraordinário (RE) 723651. Apesar do

Supremo Tribunal Federal já ter decidido a favor da matéria, conforme citado

no capítulo anterior, ainda não há pronunciamento no pleno das duas casas do

STF.

O caso do Recurso Extraordinário em que foi reconhecida a repercussão

geral e que servirá de base para demais julgamentos é representativo para se

entender o conflito entre os princípios constitucionais aplicados à matéria

tributária e a aplicação do artigo 46 do Código Tributário Nacional.

Esse processo refere-se a mandado de segurança impetrado contra ato

da Alfândega da Receita Federal no porto de São Francisco do Sul, Santa

Catarina. O referido remédio constitucional foi impetrado com o objetivo da

abstenção da cobrança do tributo sobre um automóvel importado, ano 1964.

Em primeira instância a decisão foi favorável a não incidência do Imposto,

entretanto, a posteriori, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu pela

incidência do imposto, entendendo como irrelevante a destinação final do

produto.

Não é de todo incompreensível o entendimento do Tribunal Regional

Federal da 4ª Região, visto que, realmente, não se diz nada a respeito da

destinação final no Código Tributário Nacional. Numa análise ipsis litteris da lei,

a cobrança deve ser realizada, pois houve a incidência do fato gerador.

Entretanto, como foi discorrido, extensivamente, vimos que o direito tributário

pátrio também é regido por princípios constitucionais.

Sendo nosso direito tributário, suis generis, deve-se analisar a matéria

tributária frente aos princípios constitucionais. A nossa Corte Constitucional,

quando confrontada, garantiu uma interpretação conforme a constituição,

entretanto, ainda há a possibilidade de mudança de entendimento.

20

3.3 CONTROVÉRSIAS SOBRE A COBRANÇA DO IPI

Como vimos nos dois subcapítulos anteriores, a principal controvérsia

em torno da possibilidade ou não da cobrança do IPI no desembaraço

aduaneiro do produto industrializado de procedência estrangeira, quando a

compra for feita por pessoa física, gira em torno da pessoa que realiza a

compra.

No que tange a pessoa jurídica, apesar de algumas divergências, como

a do professor Manfrinato, por exemplo, já está pacificado o entendimento

doutrinário e jurisprudencial da possibilidade da cobrança.

Algumas decisões, como a do TRF-4 que gerou a repercussão geral do

tema, discorrem que não há ofensa ao princípio da não cumulatividade, visto

que, esse princípio tem como objetivo principal impedir o efeito cascata do

imposto, melhor dizendo, que ele venha a incidir em mais de uma etapa do

processo produtivo e econômico de forma cumulativa. Discorre-se que a

eventual impossibilidade de creditamento e compensação não invalida o

princípio. Questões de índole sócio-política também são levantadas por alguns

doutrinadores, como Arnaud da Silva, que afirma que se essa tendência for

confirmada, acarretará em prejuízos à indústria nacional.

Entretanto, importante ressaltar que, conforme disciplina o professor Luis

Eduardo Oliveira Alejarra:

“A Receita Federal exige o IPI na importação de todo e qualquer bem

industrializado, independente do importador ser ou não contribuinte

do imposto. Ocorre, que o importador pessoa física, por óbvio, não é

contribuinte do imposto, pois sua exigência atenta contra o princípio

da não cumulatividade, uma vez que a pessoa física não pode

usufruir os créditos gerados pela exação. O não aproveitamento do

imposto para geração de créditos ocorre, pois como pessoa física,

consumidor final do produto importado, não sofrerá o bem qualquer

ato posterior de industrialização, sendo inviável a compensação do

IPI recolhido como crédito de uma posterior”. (ALEJARRA, 2012, p. 3)

Com isso, podemos concluir que o artigo 46 do Código Tributário

Nacional, em seu inciso I, fere o princípio da não cumulatividade, pois o

21

destinatário pessoa física não poderá utilizar o benefício da compensação do

imposto pago.

22

4 DIREITO TRIBUTÁRIO OU DIREITO FISCAL?

Etimologicamente, a expressão direito fiscal é mais abrangente do que a

de direito tributário. Isso porque fiscalidade refere-se a todas as questões

financeiras relacionadas ao Estado, sejam elas tributárias, econômicas,

patrimoniais e por aí afora, enquanto tributo é um conceito limitado. Entretanto,

etimologias a parte, cumpre ressaltar que, contemporaneamente não se faz

mais essa distinção.

Isso porque a linguagem científico-jurídica atual utiliza ambas as

expressões como sinônimas. A Associação Internacional de Direito Financeiro

e Fiscal, com sede em Haia, crivou, chancelou a correspondência de ambas as

expressões, nos mais diversos idiomas, como, por exemplo: droit fiscal (em

francês), fiscal law(em inglês), diritto tributário (em italiano), direito tributário

(em português).

Nesse trabalho já se utilizou ambas as expressões como sinônimas,

amparado pelo entendimento majoritário atual da questão. Entretanto, ainda

não se foi dada nenhuma definição do que é Direito Tributário, strictu sensu.

Apesar da multiplicidade de conceitos que encontramos na atual doutrina e

jurisprudência, podemos resumi-lo em dois, número que pode ser considerado

suficiente para a devida compreensão do tema. O professor Alfredo Augusto

Becker nos ensina que:

“O Direito Tributário é o sistema formado pelas regras jurídicas que

disciplinam a vida e a extinção daquele dever, qual seja, o dever de

entregar dinheiro ao Estado, a título de tributo, sempre que praticada

a respectiva hipótese de incidência (fato gerador in abstracto)

tributária”. (BECKER, 1995, p. 257)

Paulo de Barros Carvalho, no mesmo sentido, professa que:

“O direito tributário positivo é o ramo didaticamente autônomo do

direito, integrado pelo conjunto das proposições jurídico-normativas

que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação

e fiscalização de tributos”. (CARVALHO, 2004, p. 29)

23

A escolha desses dois conceitos foi realizada pela complementariedade

entre eles. Enquanto o conceito de Becker é, de certa forma, mais técnico,

enquanto o de Carvalho mais acadêmico, procurando também explicar a

autonomia didática do Direito Tributário.

4.1 POLÍTICAS: MONETÁRIA, CAMBIAL e FISCAL

Para se entender o conceito de política econômica, é preciso entender

suas subdivisões e quais são os órgãos responsáveis por realizá-las. Inserir-

se-á, nesse trabalho, dentro do conceito de política monetária, as políticas

creditícias, visto a impossibilidade de desassociá-las do quadro monetário de

um país.

As políticas monetárias têm suas normas estabelecidas pelo Conselho

Monetário Nacional, órgão superior do Sistema Financeiro Nacional, criado

pela lei nº 4.595 de 1964, instituída formalmente no ano subsequente, devido à

necessidade de vacatio legis. Ao longo dos anos, a composição foi alterada

diversas vezes, tendo desde representantes das classes trabalhadoras até

representantes da iniciativa privada. Em 2014, a composição conta com a

participação do Ministro da Fazenda, do Ministro do Planejamento, Orçamento

e Gestão e do Presidente do Banco Central do Brasil.

Enquanto a elaboração das normas de política monetária e política

creditícia ficam a cargo do Conselho Monetário Nacional, sua execução é de

responsabilidade do Branco Central. Liquidez da moeda e taxa de juros são

suas maiores responsabilidades.

As políticas cambiais também estão sob a égide do Conselho Monetário

Nacional e do Banco Central, sendo o primeiro responsável pela elaboração de

suas normas e o segundo pela sua execução, tal como nas políticas

monetárias. As políticas cambiais tratam, essencialmente, dos indexadores das

taxas de câmbio, responsáveis pela exportação e importação do país.

As políticas fiscais funcionam de forma diversa. As suas normas são de

responsabilidade do Tesouro Nacional (também chamado de Fazenda Pública

ou Erário Público) e a execução das mesmas são feitas pela Secretaria do

Tesouro Nacional.

24

Ao que se refere ao caixa da União, de acordo com o Decreto-Lei nº 200

de 1967, em seu artigo 92, com o objetivo de obter maior economia operacional

e racionalizar a execução da programação financeira de desembolso, o

Ministério da Fazenda promoverá a unificação de recursos movimentados pelo

Tesouro Nacional através de sua Caixa junto ao agente financeiro da União.

Utiliza-se, portanto, no Brasil, o sistema de caixa único, mantido pelo Banco do

Brasil. Esse modelo permite, em tese, um controle mais amplo e uma melhor

fiscalização na aplicação desses recursos. No capítulo específico sobre política

fiscal, aprofundaremos a discussão sobre suas principais características e

particularidades.

4.2 POLÍTICAS EXPANSIONISTAS E CONTRACIONISTAS

Um país pode adotar dois tipos principais de políticas econômicas:

expansionista ou uma contracionista. Visto que esse trabalho gira em torno do

poder fiscal do governo, o foco maior se dará nessa área.

Políticas expansionistas têm, como objetivo maior, impulsionar o

consumo e os investimentos das e nas indústrias. Uma política expansionista,

bem feita, pode aumentar de maneira considerável o Produto Interno Bruto de

um país. A redução do IPI, por exemplo, pode ser considerado um tipo de

política fiscal expansionista.

O revés desse tipo de política é o aumento da inflação, inerente à

adoção da mesma. Isso porque com a estimulação do consumo, muitas vezes,

a indústria acaba por não dar conta da demanda (por diversas razões, por

exemplo: dificuldade de conseguir matéria prima, mão de obra especializada,

etc) o que acarreta em um aumento de preços.

A taxa de juros nesse tipo de política também cai, o que desestimula o

investimento em prol do consumo. Os impostos têm suas alíquotas reduzidas e

o Poder Público aumenta seus gastos, diminuindo também a taxa de câmbio do

país. Corriqueiramente ocorre a valorização do dólar frente a moeda nacional.

Visto que é necessário, muitas vezes, controlar os gastos

governamentais e reduzir a inflação, adota-se uma política contracionista, que

acaba por diminuir o consumo, o investimento das indústrias e,

consequentemente a inflação. O Produto Interno Bruto nesse tipo de política

25

também sofre reduções, visto a diminuição do consumo. O governo aumenta

as alíquotas dos impostos e diminui seus próprios gastos. A adoção desse tipo

de política é de extrema importância para evitar flutuações no PIB. Apesar

disso, fatores externos influenciam tanto quanto a adoção dessas políticas,

como crises mundiais, falta de qualificação do mercado, etc.

4.3 EXTRAFISCALIDADE

A fim de se entender o que é extrafiscalidade, é preciso, nesse primeiro

momento, diferenciá-la da fiscalidade. Fiscalidade, conforme explica a

professora Regina Helena Costa em seu Curso de Direito Tributário:

[A fiscalidade] “traduz a exigência de tributos com o objetivo de

abastecimento dos cofres públicos, sem que outros interesses

interfiram no direcionamento da atividade impositiva. Significa olhar

para o tributo, simplesmente, como ferramenta de arrecadação, meio

de geração de receita. É a noção mais corrente quando se pensa em

tributação”. (COSTA, 2012, p.83)

.

Compreendendo-se o que é fiscalidade, torna-se menos complexo o

entendimento do que é extrafiscalidade. Extra é um prefixo latino, que designa

o que está fora, o além, o não normal ou não habitual. Pela própria etimologia

da palavra, pode-se perceber que há algo além do que a simples arrecadação

e produção de receita no que tange aos impostos extrafiscais. Conforme a

autora supracitada:

“A extrafiscalidade, por sua vez, consiste no emprego de

instrumentos tributários para o atingimento de finalidades não

arrecadatórias, mas, sim, incentivadoras ou inibitórias de

comportamentos, com vista à realização de outros valores,

constitucionalmente contemplados”. (COSTA, 2012, p.84)

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Diz-se que o IPI é um imposto extrafiscal justamente por seu caráter

inibidor e incentivador. O cigarro, por exemplo, por não ser um bem necessário

à subsistência de qualquer pessoa, têm a alíquota mais alta, como medida

arrecadatória, certamente e também, em menor parcela, como medida de

saúde pública. Alimentos, por exemplo, por serem necessários à subsistência

possuem alíquotas menores. A indústria automobilística, quando precisa ser

promovida, recebe incentivos do governo federal, recebendo reduções de

alíquotas e até isenções. Em muitos casos também se empregam técnicas de

progressividade e de regressividade, além de incentivos fiscais outros.

Com isso, podemos extrair que a extrafiscalidade está intrinsicamente

ligada ao poder de polícia do Estado, visto que pode e consegue limitar o

exercício dos direitos individuais em prol dos interesses coletivos.

4.4 POLÍTICAS FISCAIS

No âmago da discussão sobre extrafiscalidade, encontra-se a

necessidade de entender o que se entende por política fiscal. O professor

Emerson Santiago, economista, nos explica que:

“Política Fiscal é o nome dado às ações do governo destinadas a

ajustar seus níveis de gastos, assim monitorando e influenciando a

economia de um país. Nos diversos manuais de Economia, a política

fiscal está intimamente ligada à política monetária, podendo-se

afirmar, em termos bastante simplistas, que as duas políticas

econômicas são como irmãs, pois ambas buscam influenciar um

aspecto da economia: a política monetária irá modificar o

comportamento da moeda, e a política fiscal irá operar frente aos

gastos estatais. Todo o governo invariavelmente irá utilizar as duas

políticas sob várias combinações e graduações, num esforço para

orientar as metas econômicas de um país”. (SANTIAGO, 2012).

A economia clássica liberal, aplicada na maioria dos países, no início do

sistema capitalista (leia-se aqui: a partir da Revolução Industrial) até a queda

da bolsa de Nova Iorque em 1929 se mostrou insuficiente e perigosa.

Acreditava-se que o mercado sempre encontraria seu próprio caminho, como

27

se houvesse uma mão invisível que orientasse, conforme conceito de Adam

Smith em A Riqueza das Nações.

Todavia esse sistema que funcionou de maneira coerente (para alguns)

por algumas décadas teve um colapso. No ano de 1929 a bolsa de valores

mais importante do mundo entrou em um colapso gerando uma crise ferrenha

nos Estados Unidos da América e em vários outros países do mundo.

Gradualmente, os Estados (alguns em maior grau, outros em menor)

foram admitindo a necessidade de intervir no âmbito econômico, monitorando e

gerindo possíveis excessos e criando políticas fiscais.

Conforme explica o economista supracitado:

“Os governos passam então a regular os níveis de desemprego,

inflação, desaceleração na economia, e para exercer esse controle,

contando com uma combinação das políticas monetárias e fiscais que

serão utilizadas de modo a controlar os fenômenos econômicos. É

nesse momento, que além das políticas econômicas e fiscais, iremos

presenciar o nascimento do "Welfare State", um conjunto de políticas

econômicas e sociais promovidas pelo governo de modo a garantir

não só a normalidade do setor econômico, mas também o bem-estar

da população em geral”. (SANTIAGO, 2012).

Entende-se, portanto que as políticas fiscais devem trabalhar em dois

níveis: no nível microeconômico e também no macroeconômico, a fim de se

garantir um valor adequado ao dinheiro e o controle da inflação e do

desemprego, entre outras variáveis. Após a revisão dos conceitos liberais

clássicos, a obrigação dos Estados se ampliou, visto que precisam também

controlar e apaziguar os mais diversos fatores econômicos.

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CONCLUSÃO

Como se pode auferir ao longo desse trabalho, nos aliamos a corrente

que acredita na impossibilidade da cobrança do IPI no caso estudado.

Entretanto, apesar de já haver decisões em prol da abolição do referido

imposto, há a possibilidade de uma reversão desse entendimento,

principalmente pelo animus arrecadatório do Estado e influências políticas.

Procurou-se correlacionar, sempre que possível, o Direito Tributário com

a Constituição Federal, visto a mais moderna doutrina, de todas as áreas do

direito, penderem, atualmente, para uma análise constitucionalista. Todavia,

apesar da doutrina reiteradamente estudar e fornecer os amparos intelectuais e

legais necessários para essa abordagem, assim como as cadeiras

universitárias, há certo conservadorismo em nosso Judiciário, o qual extrapola

os limites do positivismo, com certa frequência.

Não foi à toa, a citação do Professor Fachin, que, embora civilista, e,

portanto, um pouco distante do objeto estudado, é proeminente doutrinador

sobre a constitucionalização do direito, além de ser referência no Paraná e no

Brasil para quem busca se enveredar por essas áreas. Suas reflexões servem

de inspiração a todas as áreas do direito.

Ao longo do trabalho, percebeu-se a impossibilidade de desassociar o

Direito de outras áreas do saber. Muitas vezes pensa-se que o Direito

Tributário se foca apenas nos tributos. Mas como entender essa incidência

fiscal, sem pensar nas diretrizes econômicas, nos planos de governo, enfim, na

macroeconomia brasileira? Ao trabalharmos com outras áreas só se tem a

aprender e também aprimorar o que já se conhece, como novas reflexões e

também novas dúvidas.

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REFERÊNCIAS

ALEJARRA, Luis Eduardo Oliveira. Não incidência do IPI no desembaraço

aduaneiro de importação por pessoa física. Disponível em:

http://jus.com.br/artigos/22728/nao-incidencia-do-ipi-no-desembaraco-

aduaneiro-de-importacao-por-pessoa-fisica Acesso em 07/08/2014

ALVES FELIPE, Jorge Franklin. Direito Tributário na Prática Forense. 2. ed.

São Paulo: Saraiva: 2002

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. 2. ed. São Paulo.

Noeses: 1995

BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do

Direito. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/7547/neoconstitucionalismo-e-

constitucionalizacao-do-direito> Acesso em 12/08/2014

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 16. ed. São Paulo.

Saraiva: 2004

COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. 4. ed. São Paulo. Saraiva:

2012

FACHIN, Luis Edson. Constitucionalização do Direito Civil. Consultado em:

<http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/constitucionalizacao-do-

direito-civil/1098 > Acesso em 08/08/2014

KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6. ed. São Paulo. Martins Fontes: 1998

SANTIAGO, Emerson. Política Fiscal. Consultado em:

http://www.infoescola.com/economia/politica-fiscal/ Acesso em 17/08/2014

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TAVARES, Alexandre Macedo. Fundamentos de Direito Tributário. 2. ed. São

Paulo. Saraiva: 2008