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A INICIAÇÃO À DOCÊNCIA NARRADA POR UM PIBIDIANO EM COMPUTAÇÃO
Cristina Carvalho de Almeida*
Adair Mendes Nacarato
Universidade São Francisco
Resumo: O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) foi
criado visando incentivar a iniciação à docência de estudantes dos cursos de
licenciatura e valorizar a formação de professores para a educação básica. Esta
pesquisa é de abordagem qualitativa e teve como campo para produção dos dados os
licenciandos em Computação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) - campus Machado - que participam do
PIBID. O objetivo deste trabalho é refletir sobre as contribuições do PIBID para a
formação inicial docente, analisando a entrevista narrativa e os registros reflexivos de
um licenciando em Computação que participa deste programa, bem como
evidenciando os fatores que contribuíram para a escolha da profissão de professor. A
pesquisa mostrou que as influências familiares e a participação em programas de
iniciação à docência, como o PIBID, podem contribuir para que os licenciandos
desejem assumir a profissão docente. Foi possível constatar que o PIBID
Computação, através da relação entre professores da educação básica e os
licenciandos, é uma das ações de iniciação à docência que incentivam os futuros
professores de Computação a descobrirem as potencialidades de uso de recursos
computacionais nos processos de ensino e aprendizagem. Com a experiência
vivenciada nos processos metodológicos de produção e análise dos dados para esta
pesquisa, manifestamos nosso desejo em continuar ouvindo os licenciandos em
Computação do IFSULDEMINAS para aumentar o escopo de nossas reflexões sobre
este curso de licenciatura e identificar as contribuições do PIBID, enquanto política
pública de formação, para que os licenciandos venham a se tornar professores.
Palavras-chave: iniciação à docência, licenciatura em Computação, PIBID.
Apoio financeiro: CAPES
*Bolsista CAPES (bolsa-taxa).
Introdução
Com o objetivo de incentivar a iniciação à docência de estudantes dos cursos de
licenciatura e valorizar a formação de professores para a educação básica, o
Ministério da Educação (MEC), por intervenção da Secretaria de Educação Superior
(SESu), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), instituiu o Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) em 2007.
Os estudantes das licenciaturas, que recebem uma bolsa de iniciação à docência,
desenvolvem suas atividades em escolas públicas sob a supervisão de professores da
educação básica que também são bolsistas. Assim, o PIBID proporciona a inserção
dos licenciandos no cotidiano escolar oferecendo-lhes possibilidades de interação com
professores que permitem a participação deles nas atividades metodológicas e
práticas docentes.
Na atual conjuntura econômica e educacional do país, é válido relatar que há uma
tendência para a redução do número de bolsas deste programa. Entretanto, não cabe
discutir neste trabalho perspectivas desta natureza pela magnitude dos aspectos
envolvidos.
Esta pesquisa é de abordagem qualitativa e teve como campo para produção dos
dados os licenciandos em Computação do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) - campus Machado - que
participam do PIBID. Esta escolha deve-se ao fato da pesquisadora, doutoranda em
Educação pela Universidade São Francisco (USF), ter sido coordenadora deste
subprojeto por cerca de três anos, além de ser professora da Licenciatura em
Computação.
O objetivo deste trabalho é refletir sobre as contribuições do PIBID para a formação
inicial docente, analisando a entrevista narrativa e o diário reflexivo de um licenciando
em Computação que participa deste programa bem como analisar os fatores que
contribuíram para a escolha da profissão de professor.
Ao refletirmos sobre estes temas, adotamos a perspectiva de formação, segundo
Bolívar (2006), como um processo de apropriação pessoal e reflexiva, de integração
da experiência de vida e profissional, em função das quais uma ação educativa
adquire o significado de formar-se, em lugar de formar aos professores.
Cabe destacar que em alguns trechos deste trabalho, o texto foi escrito na 1ª pessoa
do plural por se tratar das concepções da pesquisadora e sua orientadora e por
pretendermos tecer um texto com tom narrativo que, segundo Clandinin e Connelly
(2011), caracteriza-se como um processo dinâmico de viver e contar histórias.
A esta introdução, segue a abordagem metodológica. Em seguida, são apresentadas
reflexões a partir das análises, bem como as considerações finais e as referências.
Método
Esta pesquisa teve seu projeto aprovado pelo Comitê de Ética da USF, através da
Plataforma Brasil, em abril de 2014, com o parecer nº 627605 e caracteriza-se como
um recorte de uma investigação qualitativa desenvolvida no Programa de Pós-
graduação Stricto Sensu – Doutorado em Educação – no campus de Itatiba da USF.
Para a tese, entre os instrumentos usados para a produção de dados, citam-se os
diários reflexivos e as entrevistas narrativas com seis alunos que desenvolvem
atividades de iniciação à docência sob a supervisão de uma professora de Matemática
em uma escola pública estadual de Machado, cidade da região sul de Minas Gerais.
Entretanto, neste trabalho, optamos por analisar a entrevista narrativa concedida por
um aluno que participa do PIBID Computação bem como os relatos feitos por ele em
seu diário reflexivo, elaborado a partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre
e Esclarecido. Doravante este colaborador será denominado “pibidiano” pretendendo
vinculá-lo diretamente ao projeto do qual participa e ao contexto desta pesquisa.
A opção por apresentar os dados produzidos por um dos pibidianos tem como objetivo
aprofundar a análise dos processos formativos vivenciados por ele bem como
ponderar sobre os aspectos primordiais de sua formação enquanto professor, além de
refletir sobre sua trajetória pessoal e acadêmica até à graduação e sua participação no
PIBID Computação.
Por questões éticas, o nome do pibidiano não será apresentado. Entretanto, é
importante descrever algumas características que nos ajudarão a entender o contexto
dos dados produzidos: no dia 16/04/2015, data da entrevista, este pibidiano estava
com 20 anos de idade, cursava o 7º período da Licenciatura em Computação e
participava do PIBID há 13 meses. Para apresentarmos estes dados, baseamo-nos na
premissa de Clandinin e Connelly (2011, p. 222) que afirmam: “Da mesma forma que
consultamos nossas consciências sobre as responsabilidades que temos em uma
relação de amizade, precisamos consultar nossa consciência sobre nossa
responsabilidade como pesquisadores narrativos em uma relação de participação no
processo de pesquisa”.
Para caracterizar o uso dos diários reflexivos, cabe mencionar que foram distribuídos
aos pibidianos pequenos cadernos e pedimos para que neles fossem registradas as
reflexões sobre as atividades desenvolvidas nas escolas estaduais bem como as
críticas e sugestões sobre o PIBID com o objetivo de contribuir para a formação inicial
dos licenciandos em Computação que trabalham para o enriquecimento dos processos
de ensino e aprendizagem de Matemática subsidiados pelas tecnologias e recursos
computacionais. O vínculo da Computação com a Matemática do ensino fundamental
se fez necessário porque as escolas públicas onde o projeto é desenvolvido não
possuem a Informática como conteúdo curricular.
Para caracterizar metodologicamente o segundo instrumento para a produção de
dados, destacamos que as entrevistas narrativas tiveram o áudio gravado e
posteriormente transcrito na íntegra para análise. As entrevistas narrativas foram
realizadas nas dependências do campus Machado em horários diferentes das
atividades do PIBID e do curso de Licenciatura em Computação, após a permissão
concedida pela coordenação institucional do projeto, com o consentimento da direção
geral do campus e coordenação de ensino, após a aprovação do projeto pelo Comitê
de Ética.
Como procedimento metodológico para análise e apresentação dos resultados,
optamos por referenciar o pibidiano como colaborador desta pesquisa, baseando-nos
em Bolívar (2006) ao caracterizar o “eu” como um sujeito descentrado que encontra
sua identidade nos fragmentos da linguagem ou do discurso. Todos os trechos que
foram transcritos da entrevista apresentam a sintaxe: (Pibidiano / Entrevista Narrativa /
16-04-2015). Já os relatos transcritos do diário reflexivo são apresentados como
(Pibidiano / Diário reflexivo / Data do relato). Nos dois casos, utilizamos a letra com a
formatação do tipo itálico para destacar as falas do pibidiano no texto.
Conhecidos os procedimentos metodológicos utilizados, passamos a tecer algumas
reflexões com aproximações dos referenciais teóricos que nortearam nossa pesquisa.
Resultados/Discussão
O processo de análise dos dados iniciou-se desde o momento em que a entrevista
narrativa foi concedida pelo pibidiano em Computação, bem como a partir de todos os
registros feitos por ele e pela pesquisadora em seus respectivos diários. A
necessidade de análise contínua fica evidente para Bertaux (2010, p. 68) ao afirmar
que “escutar de novo, transcrever, ler, reler e analisar essas entrevistas, reler as notas
do diário de campo: tudo isso constitui um bom método para fazer avançar
rapidamente a ‘formação’ do pesquisador” (grifo do autor).
A princípio, ficamos temerosas quanto ao contexto no qual as entrevistas foram
realizadas já que a pesquisadora encontrava-se, no referido momento, como
professora de conteúdo técnico (Banco de Dados) para os alunos e havia deixado há
pouco tempo a coordenação do PIBID Computação. Além destas peculiaridades, esta
era sua primeira experiência com entrevistas narrativas. Entretanto este foi um temor
apenas inicial porque percebemos a desenvoltura dos alunos de iniciação à docência
ao narrarem suas trajetórias, apesar de algumas pausas para reflexão e inúmeros
“né?”, “assim” e “então”, típicos dos jovens licenciandos.
Com as leituras e discussões no grupo de pesquisa denominado “História de formação
de professores que ensinam Matemática” (HIFOPEM), coordenado pela professora
Adair Mendes Nacarato na USF, e com todo o referencial teórico utilizado como base
para produção desta pesquisa, tivemos o discernimento necessário para compreender
que “coletar uma narrativa de vida mais desenvolvida não demanda esforços sobre-
humanos. Se você tem diante de si alguém com vontade de falar, se você deseja
escutá-lo e sabe manifestar esse interesse, o essencial já está feito” (BERTAUX,
2010, p. 73).
Provavelmente tenham sido estes os motivos que permitiram que esta investigação
pudesse se concretizar. Desta forma, iniciamos esta análise caracterizando o pibidiano
como um aluno que estudou apenas o primeiro ano de sua educação infantil numa
escola particular e que passou todos os outros anos de sua trajetória acadêmica em
instituições públicas, destacando o fato de que a escola onde estudou desde a 5ª
série, na antiga nomenclatura do ensino básico, até o 3º colegial, é a mesma onde
desenvolve as atividades do PIBID Computação.
O pibidiano faz uma autoavaliação do seu período de escola básica comentando sobre
suas notas e perfil enquanto aluno:
No Ensino Fundamental foi super normal. A escola era pública, então sempre
tinha os bagunceiros da sala. Eu era considerado o quietinho, ‘nerdezinho’ que
fazia as coisas, mas nunca fui daqueles que gostam de ficar na frente. Ainda
mais por pressão dos amigos que sempre querem levar a gente pra bagunça.
Eu acabava cedendo um pouquinho, às vezes, mas as minhas notas nunca
foram das piores (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Percebe-se que o pibidiano usa o diminutivo de ‘nerd’ para caracterizar, de forma
estereotipada, as pessoas com intensas atividades intelectuais, em sua narrativa,
“aquele que fazia as coisas”. Mas este rótulo parece incomodá-lo ao ponto de tentar
destacar que, apesar disso, não era o primeiro da fila na sala de aula. Ele parece
pretender, com isso, definir sua identidade enquanto aluno e amigo da classe. Este
desejo individual pode ser reforçado pelo fato de que:
Todas as identidades são denominações relativas a uma época histórica e a
um tipo de contexto social. Assim, todas as identidades são construções
sociais e de linguagem que são acompanhadas, em maior ou menor grau, por
racionalizações e reinterpretações que às vezes as fazem passar por
“essências intemporais” (DUBAR, 2005, p. XXI) (grifos do autor).
Apesar de trazer à tona muitas lembranças boas da escola, na época de sua formação
básica, como, por exemplo, o convívio com alguns bons amigos e professores, o
pibidiano deixa transparecer algumas frustrações e angústias dessa época:
No 2º colegial, eu já comecei a gostar menos da minha turma porque começou
a vir gente que era da turma da tarde e acabava que eu não gostava. Eles
eram muito bagunceiros, muito encrenqueiros e não dava aquele clima
amistoso pra você estudar. Ficava gente querendo ir lá peitar o professor. Era
muito ruim. Teve até briga com professor (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-
04-2015).
Talvez esta frustração narrada pelo pibidiano pudesse ter seus impactos minimizados
se observássemos, enquanto professores, o que sugere Nóvoa:
O desafio que temos pela frente é romper com uma excessiva uniformização
escolar, que não consegue dar respostas úteis aos alunos e às distintas
necessidades e projetos de vida de que eles são portadores. Hoje, talvez mais
do que nunca, impõe-se reabilitar os modelos da “diversificação pedagógica”
como referência para uma escola centrada na aprendizagem (NÓVOA, 2009, p.
65) (grifos do autor).
Sobre o processo avaliativo na educação básica, o pibidiano faz uma crítica a respeito
de uma prova aplicada por um de seus professores e que por nenhum aluno
conseguiu ser resolvida. A observação feita por ele foi assim narrada:
A única vez que eu peguei recuperação foi numa matéria que o professor deu
uma prova que ninguém sabia fazer, nem eu. Eu deixei a prova na carteira e
não entreguei ao professor. O povo assinou a prova e entregou pra ele em
branco. Ele deu nota média pra todo mundo que entregou a prova e quem não
entregou não recebeu nota (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Esta crítica nos faz pensar que “observar o trabalho de rememoração de um sujeito
que se esforça para reconstituir o fio de seu percurso biográfico informa sobre o que
faz sentido para ele” (BERTAUX, 2010, p. 98). Talvez este fato o tenha marcado
profundamente e poderá refletir em sua postura como futuro docente levando-o a
tentar não cometer o mesmo ato que considerou equivocado.
Quanto à escolha da profissão, o pibidiano demonstra gostar da parte técnica de
computação desde a infância e ter tido a influência de seus tios que cursaram
bacharelado em Ciência da Computação:
Eu não queria fazer licenciatura. Eu queria fazer bacharelado porque eu
sempre gostei mais da parte da computação. Quando eu tinha 11 anos, fiz meu
primeiro curso de informática básica. E eu tenho exemplos dos meus tios: um
que trabalha hoje aqui no instituto e outro que também é formado em Ciência
da Computação. Eu sempre tive o exemplo deles. No começo eu era bem
tímido, não sabia o que cada coisa fazia... tinha medo de dar algum problema,
mas sempre gostava de mexer, de jogos e de tecnologia em si (Pibidiano /
Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Entretanto, por incentivo de seus pais, sendo a mãe professora do ensino fundamental
e o pai do ensino superior, o pibidiano foi influenciado a cursar licenciatura numa
instituição pública, já que não poderiam custear seus estudos em uma universidade
particular onde havia passado no vestibular para Ciência da Computação. O pibidiano
destaca também, como fator que o levou a cursar Licenciatura em Computação, o fato
de seu pai ter assistido uma palestra no campus Machado onde o palestrante, um
professor de Computação da rede privada, incentivou os licenciandos. O pibidiano
narra este fato da seguinte forma:
Meu pai me contou que o palestrante fez bacharelado, mas se ele pudesse
escolher licenciatura na época, ele faria porque além de você poder atuar na
área, você pode também ser professor. Você ganha pontos num concurso e
tudo mais. Aí, meu pai foi me convencendo de pouquinho em pouquinho e
falando: “Vai, dá uma chance pra licenciatura”. Aí, eu vim mesmo contrariado.
Preferia fazer bacharelado, mas eu vim estudar perto de casa, não ia dar
gastos para meu pai (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Estando na Licenciatura em Computação, as disciplinas pedagógicas, aquelas que
são assim denominadas pelos licenciandos por não apresentar conteúdo técnico,
contribuíram para que o jovem pibidiano passasse a compreender o contexto de sua
formação. Isto fica evidente no trecho:
Fui transformando a minha mente. Fui fazendo as matérias pedagógicas e
acabei gostando da área e com isto eu lembro que no começo tinha que
apresentar trabalho na frente, eu era o mais... eu era bem mais duro... não
sabia me expressar muito bem. Ficava gaguejando, era mais tímido. Ficava
nervoso demais, ficava suando... estas coisas. A matéria de Práticas de Ensino
me ajudou bastante e as matérias de Psicologia e Sociologia da Educação
permitem você aprender maneiras, técnicas pra você fazer isto, pra dar aula...
me ajudaram bastante também (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Mesmo com os elogios às disciplinas citadas pelo pibidiano, é preciso destacar que a
“questão da formação docente não é puramente pedagógica ou metodológica [...] A
questão é muito mais vasta e remete para um novo equilíbrio entre as funções
tradicionais da Universidade: o ensino e a investigação. (NÓVOA, 2000, p. 133)”. É
neste cenário que pretendemos que esta pesquisa contribua para a formação integral
dos licenciandos em Computação do IFSULDEMINAS.
O pibidiano rememorou seu ingresso no PIBID ao narrar a experiência vivenciada nos
primeiros dias que frequentou a escola:
No começo, era um pouco difícil me adaptar a rotina de “professor”, ter que
preparar aulas era meio que novidade pra mim. E do primeiro contato com
alunos, eu não sabia o que esperar. Ficava imaginando o que eu iria fazer para
conquistar a atenção deles. Mas, por incrível que pareça, foi muito bom. Me
portei como o “professor camarada” e eles acabaram gostando de mim
(Pibidiano / Diário reflexivo / 26-11-2014) (grifos do pibidiano).
Apesar de toda a ansiedade da iniciação à docência, percebemos que o PIBID tem
colaborado para mostrar aos licenciandos que a profissão docente é digna de respeito
e que deve ser valorizada. Além disso, o programa tem permitido que os licenciandos
se vejam como professores. Isto fica evidente quando o pibidiano conta sobre o seu
percurso no PIBID Computação:
No PIBID você aprende o dia a dia dentro de uma escola, você tem que ter
responsabilidade para entregar relatórios dentro do prazo, você tem que
montar uma aula atraente para os alunos, fazer os alunos gostarem da sua
aula, você tem que saber convencer os alunos que você é amigo deles, o que é
uma coisa muito difícil. Eu até desenvolvi umas técnicas para conseguir fazer
isto. Eu geralmente converso com a linguagem própria dos alunos. Então se
eles falam muita gíria, eu tento conversar no mesmo nível. E tem a técnica de
identificar o líder. Você tem que convencer o líder que você é amigo dele
(Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
O aspecto prático proporcionado pelo PIBID a fim de que os alunos de iniciação à
docência possam experimentar o cotidiano escolar, fica evidente quando diz:
Às vezes fica só no campo teórico de “o ideal é fazer isto”, acaba sendo
utópico. Tem muitos autores que falam coisas ideais que, de fato, deviam ser
mas que, na prática, é muito difícil de acontecer. E o PIBID me proporcionou
muito desta parte: aprender a lidar com aluno, ter cronograma pronto para
montar uma aula, montar uma aula de qualidade. E com isso, eu entrei no
PIBID e comecei a melhorar meu desempenho em trabalhos que tenho que
apresentar... Nossa, o melhor professor que eu tive até agora foi o próprio
PIBID que me ajudou bastante nesta parte de dar aulas (Pibidiano / Entrevista
Narrativa / 16-04-2015).
Este trecho nos remete à Antônio Nóvoa:
O campo da formação de professores está particularmente exposto a este
efeito discursivo, que é também um efeito de moda. E a moda é, como todos
sabemos, a pior maneira de enfrentar os debates educativos. Os textos, as
recomendações, os artigos e as teses sucedem-se a um ritmo alucinante
repetindo os mesmos conceitos, as mesmas ideias, as mesmas propostas
(NÓVOA, 2009, p. 27).
Além do caráter de formação, o PIBID Computação faz com que o pibidiano se sinta
reconhecido como professor e isto parece deixá-lo contente com o fato de poder
ajudar os alunos da educação básica:
Acho que estou fazendo um bem... Pode ser que esta turma que a gente está
trabalhando hoje ou que a gente já trabalhou, pode ser que eles tenham uma
nova mentalidade, um novo jeito de pensar na escola; que a escola não é
somente um ambiente chato, tradicional, que é quadro com giz, o professor
falando e uma aulinha chata. É muito gratificante você sair da sala de aula e ir
para sua casa e no meio do caminho você encontrar um aluno teu, aluno entre
aspas, né? Mas, você acha uma pessoa que você ajudou, deu uma aula, te
falando... despedindo de você, falando “Tchau. Vai com Deus”. E ver que ele
lembrou de você, lembrou da sua aula (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-
2015).
O PIBID também tem contribuído para que os pibidianos melhorem seu desempenho
como alunos da licenciatura. O pibidiano registrou desta forma em seu diário reflexivo:
Tem sido uma experiência incrível poder participar do PIBID. Com certeza, já
estou colhendo os frutos que esse projeto me deu. Posso notar isso na sala de
aula, onde me tornei mais comunicativo e nas apresentações de trabalho, onde
me tornei mais didático (Pibidiano / Diário reflexivo / 26-11-2014).
Quanto à relação estabelecida com a professora de Matemática que supervisiona o
projeto na escola estadual, o pibidiano a define como alguém que os alunos da
educação básica respeitam e que perante os pibidianos demonstra total confiança
para que executem as atividades:
Ela viu que nós dávamos conta de dar aula sem precisar ela ficar corrigindo.
Ela é muito boa para elogiar. Ela sempre fala: “Vocês foram muito bem.
Parabéns!”. Quando a gente faz uma coisa que ela não gosta, principalmente
aqui na reunião, ela fala: “Não gostei de tal coisa. Tem que melhorar”
(Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Ele ressalta que, apesar dos elogios, a professora supervisora os repreende, quando
necessário, para que identifiquem pontos a serem melhorados. Podemos compreender
esta prática ao interpretarmos Nóvoa (2009, p. 28) que afirma: “O meu ensaio constrói-
se em torno de um argumento muito simples: a necessidade de uma formação de
professores construída dentro da profissão.”
Quando mencionado se o pibidiano se via como professor, ele narrou que antes de
assumir a profissão docente pretende trabalhar com a parte prática para, na sua visão,
conhecer melhor o assunto:
Eu desenvolvi um plano pra minha vida. Eu pretendo, se eu puder, começar na
parte prática mesmo, sabe? Trabalhar em uma empresa porque eu vejo que a
melhor maneira de dar uma aula é você conhecer o assunto. Então eu não
quero chegar, dar uma aula sendo um professor medíocre. Eu quero ter uma
formação antes. Olha: dois dos meus melhores professores trabalharam na
parte prática de desenvolvimento de sistemas informatizados para depois
começar a dar aulas (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-04-2015).
Embora o pibidiano diga que ainda não se sente totalmente preparado para assumir a
docência, apesar das contribuições dadas pelo PIBID, ele se imagina como professor
no futuro e até faz planos de aposentar-se nesta carreira:
Eu quero ser professor um dia, certo? É uma meta na minha vida: ser
professor. Porém, eu não me vejo preparado para sair da faculdade e começar
a dar aulas. Pode ser que se eu tivesse me empenhado mais durante a
faculdade, pra me esforçar para ter uma prática maior, eu poderia sair. Mas, eu
me vejo aposentando como um professor (Pibidiano / Entrevista Narrativa / 16-
04-2015).
Neste sentido, preocupamo-nos com o cenário dos cursos de licenciatura observando
o que diz Nóvoa (2009, p. 44): “Se os programas de formação não compreenderem
esta nova realidade da profissão docente passarão ao lado de um dos principais
desafios deste princípio do século XXI”.
Feitas as principais análises sobre os dados produzidos pelo pibidiano, apresentamos
na próxima seção nossas considerações finais.
Conclusão/Considerações finais
Esta pesquisa evidenciou que as influências familiares e a participação em programas
de iniciação à docência podem contribuir para que os licenciandos queiram assumir a
profissão docente. O uso do diário reflexivo e a realização da entrevista narrativa
permitiram a reflexão sobre estes aspectos na formação inicial de um licenciando em
Computação.
Foi possível constatar que o PIBID Computação, através da relação entre professores
da educação básica e os licenciandos, é uma das ações de iniciação à docência que
incentivam os futuros professores de Computação a descobrirem as potencialidades
de uso de recursos computacionais nos processos de ensino e aprendizagem.
Com a experiência vivenciada nos processos metodológicos de produção e análise
dos dados para esta pesquisa, manifestamos nosso desejo em continuar ouvindo os
licenciandos em Computação do IFSULDEMINAS para aumentar o escopo de nossas
reflexões sobre este curso de licenciatura e identificar as contribuições do PIBID,
enquanto política pública de formação, para que os licenciandos venham a se tornar
professores.
Referências
BERTAUX, Daniel. Narrativas de vida: a pesquisa e seus métodos. Tradução Zuleide
Alves Cardoso Cavalcante, Denise Maria Gurgel Lavallée; revisão científica Maria da
Conceição Passegi, Márcio Venício Barbosa. Natal, RN: EDUFRN; São Paulo: Paulus,
2010.
BOLÍVAR, Antonio. La identidad profesional Del profesorado de secundaria: crisis
y reconstrucción. Málaga: Ediciones Aljibe, 2006.
CLANDININ, D. Jean, CONNELLY, F. Michael. Pesquisa narrativa: experiências e
história na pesquisa qualitativa. Tradução do Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação
de Professores ILEEL/UFU. Uberlândia: EDUFU, 2011.
DUBAR, Claude. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais.
Tradução Andréa Stahel M. da Silva. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
NÓVOA, António. Universidade e formação docente. Interface (Botucatu),
Botucatu, v.4, n.7, p.129-138, Ago. 2000. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1414-32832000000200013>. Acesso em 04 Jan 2016.
NÓVOA, António. Professores: Imagens do futuro presente. Lisboa: EDUCA, 2009.