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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS CEJURPS CAMPUS ITAJAÍ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA NPJ SETOR DE MONOGRAFIAS A (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA MARIELI EITZ Itajaí, 08 de novembro de 2010. DECLARAÇÃO DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PÚBLICA EXAMINADORA ITAJAÍ, 08 DE NOVEMBRO DE 2010. ________________________________ Professora Mestre Emanuela Cristina Andrade Lacerda

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CAMPUS ITAJAÍ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA – NPJ SETOR DE MONOGRAFIAS

A (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

MARIELI EITZ

Itajaí, 08 de novembro de 2010.

DECLARAÇÃO

DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PÚBLICA EXAMINADORA

ITAJAÍ, 08 DE NOVEMBRO DE 2010.

________________________________ Professora Mestre Emanuela Cristina Andrade Lacerda

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS – CEJURPS CAMPUS ITAJAÍ CURSO DE DIREITO NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA – NPJ SETOR DE MONOGRAFIAS

A (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

MARIELI EITZ

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito. Orientador: Professora Mestre Emanuela Cristina Andrade Lacerda.

Itajaí, 08 de novembro de 2010.

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AGRADECIMENTO

Agradeço primeiramente a Deus, por me permitir

estar aqui hoje, e poder realizar o presente trabalho,

e conceder-me a vida que tenho.

Agradeço ao meu pai Carlos e minha mãe Dulcinéia,

que tiraram de onde não tinham, para me ajudar a

ser a pessoa que sou hoje e a conquistar um futuro

melhor.

Agradeço ao meu marido Alex Sandro, por ser tão

dedicado e compreensivo, muitas vezes autoritário,

mas que funcionava para que eu efetivasse este

trabalho. Deu-me ânimo, amor e carinho. Minha

inspiração!

Agradeço ao meu irmão Guilherme, simplesmente

por ser e estar junto comigo nesta caminhada.

Agradeço ainda à minha querida avó (Oma), bem

como minha tia Vera, pela contribuição ao meu

crescimento, e por toda a paciência que teveram ao

meu lado, e pelo até hoje, incansável carinho por

mim.

Agradeço a minha irmã Francieli, que sempre esteve

ao meu lado, mesmo de longe, seu apoio era certo.

Agradeço a minhas amigas Cássia, Marina e

Jaqueline pelo apoio e sermões que me fizeram não

desistir deste trabalho.

Agradeço ainda a minha orientadora, pela paciência

e orientação, sem a qual dificilmente chegaria ao

término deste trabalho.

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DEDICATÓRIA

Ao meu marido, por ser sempre o meu eterno

companheiro, pessoa admirável e única. Sem o qual

impossível seria ter conhecido o verdadeiro amor.

Ao meu pai, Carlos Ludwig Eitz, por sempre

acreditar em mim e no meu potencial. E me ensinar

tudo que sou, e serei, e a me fazer ter a vontade de

viver em um mundo muito melhor, e batalhar por

isso.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 08 de novembro de 2010.

Marieli Eitz Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Marieli Eitz, sob o título da aplicabilidade

do Princípio da Dignidade Humana pelo Tribunal, foi submetida em ____ de

novembro de 2010 à banca examinadora composta pelos seguintes professores:

__________________________________, e aprovada com a nota ______

(__________).

Itajaí, 08 de novembro de 2010.

Professor Mestre Emanuela Cristina Andrade Lacerda Orientador e Presidente da Banca

Coordenação da Monografia

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SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................... 7

INTRODUÇÃO ....................................................................................... 7

CAPÍTULO 1 ........................................................................................ 11

PRINCÍPIOS E SUA PREVISÃO NA CONSTITUIÇÃO ..................... 11

1.1 CONSTITUIÇÃO - PRINCÍPIOS E SUA FUNDAMENTAÇÃO ...................... 11

1.2 ABORDAGEM CONCEITUAL........................................................................ 15

1.3 LOCALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS NO ÂMBITO JURÍDICO E SUA FINALIDADE. ....................................................................................................... 21

1.4 DIFERENCIAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS, NORMAS, REGRAS E VALOR ... 25

CAPÍTULO 2 ........................................................................................ 27

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA .............................................. 29

2.1 EMBASAMENTO HISTÓRICO ...................................................................... 29

2.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – FUNDAMENTAÇÃO 38

2.3 CONCEITO .................................................................................................... 39

CAPÍTULO 3 ........................................................................................ 42

A (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ............................................................................ 43

3.1 AUSÊNCIA DA DIGNIDADE HUMANA ......................................................... 43

3.2 DA APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA ............... 53

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 60

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................ 62

ANEXOS .............................................................................................. 67

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RESUMO

Esta monografia tem por objeto de estudo verificar a (in)

aplicabilidade do princípio da dignidade da pessoa humana. Para encetar a pesquisa

trata-se no primeiro capítulo de um estudo acerca dos princípios, juntamente com

sua conceituação, aplicação, eficácia, através deste estudo percebe-se a

importância deles não somente o âmbito jurídico, mas como para o entendimento de

qualquer ciência, visto esta, fundamentar-se sempre neles, os princípios,

fundamentos, a base de qualquer ciência, assim como no Direito. Dedica-se no

segundo capítulo a abordagem do princípio da dignidade da pessoa humana, desde

o seu surgimento, procurando demonstrar sua evolução histórica até os dias de hoje,

percebe-se que nele esta o segredo de um mundo melhor, tudo se resume a isso, ao

respeito a esse renomado princípio que rege o mundo tanto em sociedade como

individualmente e que faz com que cada pessoa tenha esperança de um futuro cada

vez mais digno. Seguidamente, no ultimo capítulo, terá o estudo acerca do mesmo

princípio, o da Dignidade da pessoa humana ressaltando a sua ausência como sua

aplicação, ou seja, verificando se o princípio fundamental, assegurado pela carta

magna e até mesmo pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, está

realmente sendo efetivo como deveria ser.

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INTRODUÇÃO

As categorias fundamentais para a monografia, bem como os

seus conceitos operacionais serão apresentados no decorrer da monografia.

A presente monografia tem como objeto analisar a

aplicabilidade do princípio da dignidade humana nas decisões judiciais.

O objeto institucional é a obtenção do grau de Direito, na

Universidade do Vale do Itajaí- UNIVALI.

O seu objetivo é verificar e demonstrar se a aplicação do

princípio da dignidade humana está ocorrendo e em que situações e se está

realmente sendo efetivada, bem como as situações onde a dignidade da pessoa

humana encontra-se ausente.

Para tanto, inicia-se o Capítulo 1, tratando dos princípios, seus

conceitos, as várias concepções doutrinárias, sua efetividade, e seu lugar no âmbito

jurídico, com demais explicações que se fazem necessárias para melhor

entendimento do presente trabalho.

No Capítulo 2, tratando do princípio da dignidade da pessoa

humana em sua essência, obviamente com seu conceito, surgimento, esclarecendo

sempre da necessidade da observância do mesmo.

No Capítulo 3, tratando da aplicação do princípio da dignidade

da pessoa humana, exemplificado em que caso, e situações que o princípio é

concretizado.

A presente monografia se encerra com as Considerações

Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da

estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a aplicabilidade do

princípio da dignidade da pessoa humana.

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Os problemas que de início se apresentam no desenvolver do

trabalho consubstanciam-se nas seguintes indagações:

a) Princípio é aplicado concretamente ou abstratamente no

sistema jurídico atual?

b) Existe a observância do princípio da dignidade humana de

forma individual e coletivamente?

c) Ocorre a aplicação adequada do princípio da dignidade

humana nos dias de hoje?

Diante de tais problemas elegeram-se, no projeto, as seguintes

hipóteses1:

Hipótese 1 – Princípio é aplicado concretamente e não

abstratamente no sistema jurídico atual, visto que por se tratarem de fundamento,

tanto a regra, como normas, ou qualquer disposição jurídica há de respeitar sempre

o que dispõe os princípios, desta forma concretizando a sua aplicação.

Hipótese 2 – Existe a observância do princípio da dignidade

humana de forma individual como coletivamente, porém não inteiramente, nem

sempre existe o respeito a pessoa humana como deveria ser, da forma como esta

disposta no referido princípio, existem sérias falhas, que necessitam de urgência

para sua reparação.

Hipótese 3 – A aplicação adequada do princípio da dignidade

humana não ocorre, ou ao menos não se pode alegar sua completa aplicação, com

certeza poderia ser mais respeitada, porém, muitas vezes devido às grandes

divergências de interesses, um causa o desrespeito ao outro, muitas vezes sem

perceber, contribuído ainda mais para o mundo, onde cada dia se percebe mais e

mais a ausência da dignidade da pessoa humana.

1 Define PASOLD como a “[...] suposição [...] que o investigador tem quanto ao tema escolhido e ao equacionamento do problema apresentado” PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito.2003.p.138.

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Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação2 foi utilizado o Método Indutivo3, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano4, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas

do Referente5, da Categoria6, do Conceito Operacional7 e da Pesquisa Bibliográfica8.

2 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.

3 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.

4 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.

5 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.

6 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.

7 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.

8 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.

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CAPÍTULO 1

OS PRINCÍPIOS E SUA PREVISÃO NA CONSTITUIÇÃO

1.1 CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL/88 - OS

PRINCÍPIOS E SUA FUNDAMENTAÇÃO

Brasil, um Estado democrático de direito, constituído com base

e fundamento no conteúdo expresso na Constituição da República Federativa do

Brasil/88, na qual o direito essencial de tudo e de todos encontra-se resguardado, é

a segurança do povo de uma vida harmônica e justa.

O Estado Democrático de direito, refere-se ao direito

igualmente concedido a todos, um Estado onde sempre prevaleça o bem de todos,

não só como indivíduo, mas também olhando como uma coletividade, ou melhor,

como uma sociedade.

Como meio de assegurar a todos uma vida digna, tem-se a

Constituição da República Federativa do Brasil/88, onde se encontram assegurados

os direitos mínimos à manutenção da existência da pessoa, é o guia de uma

sociedade, que deve sempre respeitá-la acima de tudo.

Konrad Hesse9 aduz que a Constituição da República

Federativa do Brasil/88 deve ser entendida como a “ordem jurídica fundamental de

uma comunidade ou o plano estrutural para a conformação jurídica de uma

comunidade, segundo certos princípios fundamentais”, uma tarefa cuja realização só

se torna possível porque a Lei Fundamental:

Fixa os princípios diretores segundo os quais deve formar a unidade política

e desenvolver as tarefas estatais; (grifou-se)

Define os procedimentos para a solução dos conflitos no interior da

comunidade;

9 HESSE, Konrad. Elementos de direito constitucional da Republica federal da Alemanha. 20. ed. Tradução alemã por Luis Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio A. Fabris, Editor, 1998.pag 37

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Disciplina a organização e o processo de formação da unidade política e da

atuação estatal; e

Cria as bases e determina os princípios da ordem jurídica global;

Verifica-se que é a Constituição da República Federativa do

Brasil/88 que fixa os princípios que ora, são objetos de estudo no presente trabalho.

A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado

Democrático de Direito estruturando-se em cinco fundamentos (princípios), que

direcionam todo o atual sistema jurídico, é o que norteia toda e qualquer norma que

possa surgir ou se modificar, tudo e todos devem respeitar esses fundamentos

elencados no artigo 1º incisos I-V da Constituição da República Federativa do

Brasil/88, que assim está prescrito:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; (grifou-se) IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.

Para J.J. Gomes Canotilho10 o Estado Constitucional moderno

estrutura-se como “Estado de Direito Democrático, isto é, como uma ordem de

domínio legitimada pelo povo. A articulação do 'direito' e do 'poder' no Estado

Constitucional significa, assim, que o poder do Estado deve organizar-se e exercer-

se em termos democráticos.

Celso Antonio Pacheco Fiorillo11 ensina que:

Com efeito. É exatamente em decorrência da existência de um Estado Democrático de Direito que qualquer brasileiro ou estrangeiro residente no País – no plano individual ou mesmo no plano coletivo – tem assegurado o direito material constitucional não só de poder

10

CONOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição, 3. ed. Coimbra, Almedina, 1999, pag. 94.

11 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Princípios do Direito Processual Ambiental.. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007 pag 6.

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submeter à apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou mesmo ameaça de seus direitos (art. 5º, XXXV, da CF) mas também de poder ter conhecimento da existência de eventuais ações em que estaria fazendo parte de determinado litígio ou mesmo sendo acusado de algo, oportunidade em que poderia se defender de forma ampla. O estado Democrático de Direito, no âmbito da Constituição da República Federativa do Brasil, passa a exercer importante papel, em decorrência do que acabamos de apontar, no sentido de prestar serviços aos brasileiros e estrangeiros residentes no país, principalmente no que se refere à Apreciação de lesão ou ameaça a direitos, ou seja, prestar o serviço de apreciar lesões ou ameaça a direitos faz o moderno Estado Democrático de Direito apontado no art. 1º da Carta Magna de nosso País, no século XXI, um Estado fornecedor, subordinado à Constituição da Republica Federativa do Brasil.

Lenio Luiz Streck12 afirma que:

A noção de Estado Democrático de Direito está, pois, indissociavelmente ligada à realização dos direitos fundamentais-sociais. É desse liame indissolúvel que exsurge aquilo que se pode denominar de plus normativo do Estado Democrático de Direito. Mais do que uma classificação ou forma de Estado ou de uma variante de sua evolução histórica, o Estado Democrático, o Estado Democrático de Direito faz uma síntese das fases anteriores, agregando a construção das condições de possibilidades para suprir as lacunas das etapas anteriores, representadas pela necessidade do resgate, justiça social e a garantia dos direitos humanos fundamentais.

Assim, é esse Estado Democrático de Direito que justamente

assegura o Direito, pode-se entender como um Estado justo e igualitário, sem

desigualdades, abusos ou injustiças, onde prevaleça sempre o bem em todas as

situações ou circunstâncias, e sempre como voz direcionadora, a voz do povo.

Segundo Alexy13, direitos fundamentais são democráticos na

medida em que garantam direitos de liberdade e igualdade e assegurem o

desenvolvimento e a existência de pessoas capazes de manter as condições

funcionais do processo democrático.

Entende-se assim, que a segurança tanto jurídica como até

mesmo humana, encontra-se assegurada nesse pequeno livro de normas e

12

STRECK. Lenio Luiz. Novos Estudos Jurídicos – Volume 8 – Nº 2- pag.261. maio/agosto.2003.

13 ALEXY, Robert. “Los Derechos Fundamentales en el Estado Constitucional Democrático”. In: Neoconstitucionalismo(S), Madrid: Trotta, 2005. P.37

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princípios, instituídos somente para garantir a todo e qualquer brasileiro as

condições mínimas de sobrevivência em um mundo onde geralmente o que

prevalece é o egoísmo e o individualismo, dificultando cada vez mais a existência de

um lugar solidário e DIGNO para se viver. Sendo um direito de todos, exigirem o

cumprimento e a eficácia dos mesmos, na vida em sociedade assim como também

individualmente.

Esses fundamentos, instituídos na Constituição da República

Federativa do Brasil/88, são os princípios norteadores do nosso sistema de normas

jurídicas, mostrando de onde se deve partir, o “princípio”, e para onde se deve

seguir, aonde queremos e vamos chegar, e o caminho que DEVEMOS tomar.

1.2 ABORDAGEM CONCEITUAL

A palavra princípio vem do latim principium e significa início,

começo, ponto de partida. Na linguagem filosófica, o termo foi introduzido por

Anaximandro com o significado de fundamento, causa.14 Não indica a coisa, mas a

razão de ser da coisa ensina José Cretella Junior, pois, “no âmbito da filosofia,

princípio é o fundamento ou a razão para justificar por que é que as coisas são o que

são”.15

De acordo com Rizzato Nunes16, a conceituação de princípio

se da na seguinte forma:

Os princípios são, dentre as formulações deônticas de todo sistema ético-jurídico, os mais importantes a ser considerados não só pelo aplicador do Direito mas também por todos aqueles que, de alguma forma, ao sistema jurídico se dirijam. Assim, estudantes, professores, cientistas, operadores do Direito – advogados, juízes, promotores públicos etc. -, todos têm de, em primeiro lugar, levar em consideração os princípios norteadores de todas as demais normas jurídicas existentes.

Com isso, percebe-se que princípio é justamente o início de

qualquer ciência, a observância dos mesmos é absolutamente imprescindível. São

14

MACEDO, Enciclopédia Saraiva do direito. Verbete Princípio, p. 504-505.

15 CRETELLA , Júnior. Comentário à Constituição brasileira de 1988, v.1, p.129.

16 NUNES, Rizzato. Manual de introdução ao estudo de Direito. 6. Ed. São Paulo. Saraiva, 2005. Pag.177-178.

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estes que direcionam toda e qualquer ciência no mundo atual, sempre sendo

observados os princípios, pois assim como o conceito literal da palavra já

demonstrado, ele é o ponto de partida, a referência para qualquer ciência.

Por Crisafulli17: "Princípio é, com efeito, toda norma jurídica,

enquanto considerada como determinante de uma ou de muitas outras

subordinadas, que a pressupõem, desenvolvendo e especificando ulteriormente o

preceito em direções mais particulares (menos gerais), das quais determinam, e

portanto resumem, potencialmente, o conteúdo: sejam, pois, estas efetivamente

postas, sejam, ao contrário, apenas dedutíveis do respectivo princípio geral que as

contém".

Ja Rizzatto Nunes18 alega que princípio é um axioma

inexorável e que, do ponto de vista do Direito, faz parte do próprio linguajar desse

setor de conhecimento, não podendo afastá-lo.

Para Paulo Bonavides19, os princípios gerais, desde as

derradeiras Constituições da segunda metade do século XX, se tornaram fonte

primária de normatividade, corporificando do mesmo passo na ordem jurídica os

valores supremos ao redor dos quais gravitam os direitos, as garantias e as

competências de uma sociedade constitucional.

Para Ruy Samuel Espindola, os princípios designam “a

estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia

mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as

demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se

subordinam”.20

17

Crisafulli apud Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.pag. 257

18 Nunes, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e jurisprudência: Saraiva; 1º Ed. São Paulo.2002. p 5/6.

19 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.pag.283

20

ESPINDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais: elementos teóricos para uma formulação dogmática constitucionalmente adequada. 2 ed., atual e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 53.

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16

Percebe-se então que há o mesmo entendimento, qual seja o

de que por se constituírem nos alicerces de todo o sistema jurídico, mesmo que não

expressamente existente em cada norma, o princípio está dentro de cada uma

delas, pois são eles quem as constituem, sendo que eles são aqueles que as guiam,

direcionando sempre aquele que irá interpretá-la, pelo caminho guiado por ele, o

princípio.

Nesse sentido, verificam-se os ensinamentos de Geraldo

Ataliba21:

[...] princípios são linhas mestras, os grandes nortes, as diretrizes magnas do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos por toda a sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do governo (poderes constituídos).

Eles expressão a substância última do querer popular, seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados; têm que ser prestigiados até as últimas conseqüências.

Geraldo Ataliba trata princípio como um guia, com a

capacidade de direcionar todo o sistema jurídico, ele é o caminho que se deve

percorrer, não devendo nunca desviar-se dele, pois os princípios, de acordo com

ele, são as diretrizes de toda nossa legislação, que nos organiza e nos mantém

como uma sociedade harmônica.

Assim também ensina Celso Antônio Bandeira de Mello22:

Princípio é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, dispositivo fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. (...) Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalismo, conforme o escalão do princípio atingido porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

21 ATALIBA, Geraldo. República e Constituição, p 6 e 7.

22 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 12.ed. Malheiros, p.747-748.

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17

Assim, no mesmo entendimento, Celso Antônio Bandeira de

Mello, acredita que os princípios são a base de nosso sistema jurídico. Eles seriam o

ápice de todo um sistema de normas que rege a vida em sociedade, e assim sendo,

tratando-se de base, pilares, sustentação, a não atenção a eles, traria a desatenção

de todo o sistema, que por sua vez é baseado e sustentado por eles. Assim o

desrespeito a eles, é como não respeitar a norma alguma, já que eles são o princípio

de tudo, a origem do sistema jurídico.

No mesmo sentido, têm-se os ensinamentos de José Cretella

Junior23 que princípio é, antes de tudo, ponto de partida, os princípios de uma

ciência, são as proposições básicas, fundamentais, típicas que condicionam todas

as estruturações subseqüentes, são os alicerces, os fundamentos da ciência.

Assim, entende ele também que os princípios são os pilares, a

sustentação de qualquer ciência, e aqui no presente trabalho, a ciência estudada é a

do direito, portanto, de acordo com o seu entendimento, as estruturações

subsequentes, no caso, todo o sistema de normas, derivam todas de um complexo

mundo de princípios.

Miguel Reale24 define princípios como sendo “enunciações

normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do

ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a

elaboração de novas normas”.

Ou seja, para ele princípio é o que direciona, orienta aquele

que irá interpretar, aplicar ou até mesmo criar o ordenamento jurídico. Mostrando

assim, a importância da existência e da observação dos princípios.

23

CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Administrativo Brasileiro. Ed. Forense; 2º ed. Rio de Janeiro: 2002.p. 44.

24 REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito, 27a ed. ajustada ao novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 304.

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18

Segundo Geraldo Ataliba, os princípios são a chave e essência

de todo direito; não há direito sem princípios. As simples regras jurídicas de nada

valem se não estiverem apoiadas em princípios sólidos25.

Ou seja, limita a existência das regras jurídicas aos princípios,

com isso, assim como nos autores acima citados, ele acredita que princípio é

literalmente o “princípio” das regras jurídicas.

Além disso, os princípios mostram-se como normas de

natureza aberta, visto que, expressos em uma ou poucas palavras, acabam por

comportar um rol bastante extenso de significados que se irradiam por todo o

ordenamento jurídico, apontando o caminho a ser seguido pelo interprete, é que

afirma Erhardo Denninger.26

Percebe-se assim, que existem várias acepções de princípios,

seja cada um com o seu ponto de vista, mas nenhum exclui a importância dos

mesmos, sem dúvida alguma, são de grande importância ao nosso sistema

normativo atual, sendo eles sua fundamentação.

Neste mesmo sentido, Roberto Babtista Dias da Silva:

[...] os princípios são vetores de interpretação, na medida em que se revelam como alicerces do ordenamento jurídico, dando coerência a sistema, e, em função de sua natureza aberta, seus enunciados favorecem a realização do trabalho interpretativo, especialmente o evolutivo.27

Já Robert Alexy define princípios assim:

[...] ordenam que algo sea realizado em la mayor medida posible, dentro de lãs posibilidades jurídicas y reales existentes. Por lo tanto, los princípios son mandatos de optimización, que están caracterizados por El hecho de que pueden ser cumplidos em

25

“Mudança da Constituição”, RDP 86/181 apud Revista do Advogado da Associação dos Advogados de São Paulo, nº 51, Outubro/97, artigo “Princípios e origens da lei de arbitragem” de autoria de Selma Maria Ferreira Lemes, p. 32.

26 DENNINGER, Erhardo. Princípios Constitucionales y derechos fundamentales como „normas abiertas‟. In: División de poderes e interpretación: hacia uma teoria de La práxis constitucional. Antonio López Pina ( edición y prólogo), p. 179 e 180.

27

SILVA, Roberto Baptista Dias da. Manual de direito constitucional. 1º ed. Barueri, SP: Manole, 2007. Pg. 34

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diferetes grados y qe La medida debida de su cmplimento o solo dependente de lãs posibilidade reales sino también de las jurídicas.28

A idéia de princípio, segundo Luís Diez Picazo29, deriva da

linguagem da geometria, "onde designa as verdades primeiras". Logo acrescenta o

mesmo jurista que exatamente por isso são "princípios", ou seja, "porque estão ao

princípio", sendo "as premissas de todo um sistema que se desenvolve more

geometrico".

Analisando como origem, ponto de partida, “princípios de uma

ciência são as proposições básicas, fundamentais básicas, fundamentais, típicas,

que condicionam todas as estruturas subseqüentes”, sedo os alicerces, os

fundamentos da ciência.30

Classificam-se em:

a) Onivalentes ou universais, os que se encontram em qualquer ciência (por

exemplo, princípio da identidade e da não contradição);

b) Plurivalentes ou regionais, os que “são comuns a um determinado grupo

de ciência que guarda certa semelhança entre si” (por exemplo, princípios

éticos, que interessam à moral, mas não são desprezados pela ciência

jurídica);

c) Monovalentes, os que fundamentam um só campo de conhecimento ( por

exemplo, princípio da legalidade, que informa a ciência di direito);

d) Setoriais, os que informam um setor de determinada ciência.31

Considerando as ciências em geral, os princípios são

“verdades ou juízos fundamentais que servem de alicerce ou de garantia de certeza

a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada

porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas preposições

28

ALEXI. Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madris: Centro de Estudios Constitucionales, 1993. P. 86.

29 PICAZO, Luís-Diez apud Paulo Bonavides. Curso de Direito Constitucional. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.pag. 255-256.

30 CRETELLA , Júnior. Comentário à Constituição brasileira de 1988, v.1, p.129.

31 CRETELLA, Junior. Curso de Direito Administrativo. Pag. 14-15.

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que, apesar de ao serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas

como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimento, como seus

pressupostos necessários.32

Como dito anteriormente, os princípios são a direção de

qualquer ciência, eles constituem a ciência, pois ela não pode fugir ao que predispõe

os princípios que a constitui.

1.3 LOCALIZAÇÃO DOS PRINCÍPIOS NO ÂMBITO JURÍDICO E SUA

FINALIDADE.

A finalidade dos princípios no direito, sempre foi um tema muito

discutido entre os doutrinadores da área, surgindo teses em vários sentidos. Porém,

a maioria não diverge muito em seus ensinamentos, pois todos ou a grande maioria

dos doutrinadores passam em seus ensinamentos, a relevância destes no âmbito

jurídico.

A História a seguir, foi contada por Heinz Von Foerstes, e

recontada por Lenio Luiz Streck33, como uma forma de explicar a função e a forma

de aplicação dos princípios:

Um mullah (religioso islâmico) cavalgava pelo deserto, quando

encontrou alguns homens com um grupo de camelos. Os homens estavam muito tristes. Perguntados acerca da razão da tristeza, responderam que seu pai havia morrido. Disse-lhes então mullah : “ –

Isto é muito triste, mas seguramente Allah o aceitou. Deve haver-lhes deixado alguma coisa”. Os homens, tristes, responderam que o pai havia lhes deixado tudo que possuía, ou seja, os 17 camelos, que deveriam ser repartidos entre eles segundo a tradição. Assim, o irmão mais velho deveria ficar com metade dos camelos, o segundo com um terço e, o último, com um nono dos camelos. Porém, acrescentaram os homens, nesses parâmetros, era absolutamente impossível fazer a divisão. Em face disso, compreendendo o drama e a tristeza daqueles homens, o mullah junta o seu camelo aos 17 daqueles tristes homens e, então, começa a dividir: a metade de 18 é 9; um terço é 6; um nono é 2. A soma de nove, sei e dois é 17. Então, saltou em seu camelo (que era o 18º) e foi embora, deixando os homens felizes.

32

REALE, Miguel. Filosofia do direito. Pag. 60.

33 STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito: Livraria do advogado. Porto Alegre.1999.p.87

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No entendimento do doutrinador, assim como o 18º camelo, os

princípios gerais do direito só teriam significado, em conjunto com o restante do

sistema jurídico. A presença deles seria necessária para a resolução dos fatos, os

princípios seriam como a peça chave para a aplicação do restante do direito em si,

como meio de adaptar o direito ao fato, de maneira perfeita. Os princípios que

mostram por onde se deve prosseguir, nos guiam pelo caminho certo a tomar, sendo

eles quem estruturam todo o sistema de normas.

Rizzato nunes leciona que:

[...] os princípios situam-se no ponto mais alto de qualquer sistema

jurídico, de forma genérica e abstrata, mas essa abstração não significa incidência no plano da realidade. é que, como as normas jurídicas incidem no real e como devem respeitar os princípios, acabam por levá-los à concretude.é nesse aspecto que reside a eficácia dos princípios: como toda e qualquer norma jurídica deve a eles respeitar, sua eficácia é – deve ser – plena.

Sabe-se que, muitas vezes, autores dizem que os princípios ficam situados em tal abstração que só muito longinquamente se pode buscá-los, de modo que sua influência efetiva torna-se dificultosa ou rara. Não é incomum clamar-se pelo princípio apenas na exceção de casos concretos excepcionais.[...]34

Assim, Rizzato acredita que os princípios estão “acima” das

normas. Isso porque, a norma deve sempre respeitar os princípios, nunca podendo ir

contra eles, revelando assim, a sua eficiência de forma abstrata, pois ao respeitar o

principio na aplicação da norma, automaticamente está dando eficácia e concretude

aos princípios.

Ainda o entendimento de Rizzato, remete-se a uma longínqua

exceção, citada acima, seria o disposto no art. 4º da Lei de Introdução ao Código

Civil, que assim dispõe:

Art. 4 º Quando a lei for omissa, o Juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.

Da mesma forma, o Código Civil repete a regra:

34

NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e jurisprudência: Saraiva; 1º Ed. São Paulo. 2002. p 20-21.

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Art. 126. O Juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade na lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.

O que Rizzato quer dizer, é que ao se buscar a resolução de

um problema onde se encontre lacuna nas normas do sistema, não encontrando na

analogia, ou no reconhecimento do costume jurídico, ai então é que se aplicam os

princípios. Mas não porque eles seriam os últimos, mas sim, porque eles seriam

aquilo que resta quando não existe norma alguma. Quanto ao disposto nos artigos

anteriores, seria então, uma maneira de lembrar a aquele que irá interpretar, para

que nunca deixe de considerar a base fundamental que sempre esteve presente.

Com isso de uma forma ou de outra, o princípio sempre será

respeitado, pois se a norma não pode contrariá-lo, o princípio sempre estará lá e

assim, sempre será respeitado.

Ainda observa Rizatto Nunes35, em relação aos princípios e

sua interpretação, que “nenhuma interpretação será bem feita se for desprezado um

princípio. É que ele, como estrela máxima do universo ético-jurídico, vai sempre

influir no conteúdo e alcance de todas as normas”. Assim ele é que limita, direciona

e coordena qualquer possível surgimento de regra ou norma jurídica. Pois estas

sempre terão como limitação, o contido nos princípios seja de qual ciência for.

Rizzato, ressalta ainda que os princípios não existem somente

de forma abstrata, eles possuem eficácia real e concreta. Conduzem-se a aplicação

das normas, sendo estas das mais simples a mais complexa, são eles que tornam

concreto e viável esta aplicação. Esse pensamento é contrário a grande número de

doutrinadores, que alegam que os princípios situam-se em tal abstração que dificulta

a sua eficácia.

Portanto, mesmo que estejam situadas de forma abstrata, sua

eficácia e certa, visto que o restante (norma, regra) terá sempre de respeitar ao que

dispõe os princípios. Com isso, efetivando a concretude deles.

35

NUNES, Rizzato. Manual de introdução ao estudo de Direito. 6. Ed. São Paulo. Saraiva, 2005. Pag. 178.

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23

Outro ponto de vista, seria a de Jorge Miranda36 que, alega que

os princípios não se colocam acima ou além do direito, mas fazem parte do

ordenamento jurídico, para ele seriam essas as funções deles:

A ação mediata dos princípios consiste, em primeiro lugar, em funcionarem como critérios de interpretação e de integração, pois são eles que dão a coerência geral do sistema. E, assim, o sentido exato dos preceitos constitucionais tem de ser encontrado na conjugação com os princípios e a integração já de ser feita de tal sorte que se tornem explícitas ou explicitáveis as normas que o legislador constituinte não quis ou não pôde exprimir cabalmente.

Além disso, os princípios mostram-se como normas de

natureza aberta, visto que, expressos em uma ou poucas palavras, acabam por

comportar um rol bastante extenso de significados que se irradiam por todo o

ordenamento jurídico, apontando o caminho a ser seguido pelo interprete, é que

coleciona Erhardo Denninger.37

Percebe-se assim, que existem várias acepções de princípios,

seja cada um com o seu ponto de vista, mas nenhum exclui a importância dos

mesmos, sem dúvida alguma, são de grande importância ao nosso sistema

normativo atual, sendo eles sua fundamentação.

1.4 DIFERENCIAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS, NORMAS, REGRAS E VALOR.

Após essa conceituação de princípio, se faz necessário ainda,

fazer uma breve diferenciação entre os princípios, o valor, as regras e as normas,

para que haja melhor entendimento acerca do conteúdo abordado.

Sobre princípios e regras, Tercio Sampaio Ferraz Jr.38 propõe

alguns critérios distintivos:

1.Os princípios não exigem um comportamento específico, isto é, estabelecem ou pontos de partida ou metas genéricas; as regras, ao contrario, são específicas ou em pautas; 2. Os princípios não são

36

MIRANDA, Jorge, apud, SILVA, Roberto Babtista Dias da. Manual de direito constitucional. Ed. Manole. Barueri-SP; 2007.pg. 34.

37 DENNINGER, Erhardo. Princípios Constitucionales y derechos fundamentales como „normas abiertas‟. In: División de poderes e interpretación: hacia uma teoria de La práxis constitucional. Antonio López Pina ( edición y prólogo), p. 179 e 180.

38 FERRAZ, Junior. Interpretação e estudo da constituição de 1988, p. 88.

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aplicáveis à maneira de um „tudo ou nada‟, pois enunciam uma ou algumas razões para decidir em determinado sentido, sem obrigar a uma decisão particular; já as regras enunciam pautas dicotômicas, isto é, estabelecem condições que tornam necessária sua aplicação e conseqüências que se seguem necessariamente; 3. Os princípios têm um peso ou importância relativa, ao passo que as regras tem uma imponibilidade mais estrita; assim, os princípios comportam avaliação, sem que a substituição de um por outro de maior peso signifique a exclusão do primeiro; já as regras, embora admitam exceções, quando contraditadas provocam a exclusão do dispositivo colidente; 4. O conceito de realidade cabe bem para as regras (que ou são válidas ou não o são), mas ao para os princípios, que, por serem submetidos à avaliação de importância, mais bem se

encaixam no conceito de legitimidade. Para Kildore Gonçalves Carvalho39:

[...] o conflito entre princípios leva a solução distinta das regras. É que os princípios coexistem, e não se excluem como as regras. Assim, os princípios, por encerrarem mandados de otimização, permitem o balanceamento dos valores e interesses, conforme se peso e ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes. Os princípios não obedecem, portanto, à lógica do tudo ou nada. Destarte, se em determinado caso concreto, algo é permitido por um princípio mas negado por outro, um deles deve recuar, sem que se declare inválido o outro, resolvendo o conflito na dimensão de valor e não validade.

Josef Esser40 distingue essas duas espécies normativas

dizendo que “os princípios jurídicos, diferentemente das normas [regras] de direito,

são conteúdo em oposição à forma, embora o uso dessas categorias aristotélicas –

adverte – não nos deva induzir a pensar que a forma seja o acessório de algo

essencial”, até porque histórica e efetivamente, a forma, entendida processualmente

como meio de proteção do direito ou materialmente como norma, é sempre o

essencial, o único que pode conferir realidade e significação jurídica àquele

conteúdo fundamental ainda não reconhecido como ratio.

Se por outro lado adotarmos o critério de Ronald Dworkin41,

diremos que a diferença entre regras e princípios é de natureza lógica e que decorre

dos respectivos modos de aplicação.

39

CARVALHO. Kildare Gonçalves. Direito constitucional. – 14. Ed., Ed. Del Rey, Belo Hoizonte: 2008 pg 632-633.

40 ESSER, Josef. Principio y norma em la elaboración jurisprudencial del derecho privado. Barcelona: Bosch, 1961. pg 65

41 DWORKIN, Ronald. Los derechos en serio, Barcelona: Ariel, 1995, p. 74 e s

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Kerl Larenz42, diríamos que, em si mesmos, os princípios, não

são – ou ainda não são – regras suscetíveis de aplicação direita e imediata, mas

apenas pontos de partida ou pensamentos diretores, que sinalizam – aí se detém o

legislador – para a norma a ser descoberta ou formulada por quem irá aplicá-la

conforme as exigências do caso.

No mesmo sentido, Peter Häberle43 observa, por exemplo, que

todo direito fundamental aspira a ser “regra”, para que a sua normatividade se

converta em normalidade ou prática efetiva no âmbito da sociedade em que

pretender atuar.

Já para, Robert Alexy44 parte do pressuposto de que princípios

e regras são espécies do gênero norma, pelo fato de ambos dizerem o que “deve

ser”. Acrescenta, ainda, o autor que a diferença entre princípios e normas será

sempre sob o aspecto qualitativo (e não somente referindo-se a uma graduação

entre ambos). Enquanto os princípios são “mandatos de otimização”, que estão

caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferente grau, (...) as

regras são normas que só podem ser cumpridas ou não. (…) Toda norma e ou uma

regra ou um principio.

Acerca do tema, Joaquim Gomes Canotilho apresenta alguns

critérios para diferenciar regras e princípios:

a)o grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstração relativamente reduzida; b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por

serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, do juiz), enquanto as regras sao susceptíveis de aplicação direta; c) Caráter de fundamentalidade no sistema de fontes de direito: os princípios são normas de natureza

estruturante ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido a sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex.: princípios constitucionais) ou a sua importância estruturante dentro

42

LARENZ, Kerl. Derecho justo : fundamentos de ética jurídica, Tradução de Luis Díez- Picazo, Madrid: Civitas, 1993, p. 33

43 La liberdad fundamental em el Estado constitucional, Lima: Pontifícia Universidad Católica del Peru, 1997, p. 101 e 197

44ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Politicos y Constitucionales, 2002, p.83-87

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do sistema jurídico (ex.: principio do Estado de Direito); d) „Proximidade da idéia de direito‟: os princípios são “Standards”

juridicamente vinculantes radicados nas exigências de “justiça” (Dworkin) ou na "idéia de direito” (Larenz); as regras podem ser

normas vinculantes com um conteúdo meramente funcional; e) Natureza normogenética: os princípios são fundamento de regras, isto e, são normas que estao na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.45

Ainda diferenciado valor de princípios, Rizzato Nunes ressalta

que:

[...] enquanto o valor é sempre um relativo, na medida em que „vale‟, isto é, aponta para uma relação, o princípio se impõe como um absoluto, como algo que não comporta qualquer tipo de relativização. [...] O valor sofre toda a influência de componente histórico, geográfico, pessoal, social, local, etc. e acaba se impondo mediante um comando do poder que estabelece regras de interpretação – jurídicas ou não [...]. O princípio não. Uma vez Constatado, impõe-se sem alternativa de variação.

Percebe-se assim que para Rizzatto Nunes, o princípio, mesmo

com a individualidade de cada um, a história de vida de cada um, opiniões formadas

de cada pessoa, os princípios continuaram tendo a mesma relevância, pois ele não

se trata se um valor imposto a determinada situação ou coisa. O princípio não muda,

não se transforma, não se adapta de acordo com o mundo, e sim, o mundo é quem

deve se adaptar ao que regem os princípios.

Destarte, princípios, normas e regras possuem conceituação

diversa, porém o objetivo até pode ser o mesmo, assegurar direitos e deveres às

pessoas. Os princípios são os reflexos dos valores defendidos por toda a sociedade,

sendo amparados pela própria constituição. As regras derivam dos princípios,

estando eles positivados na Constituição da República Federativa do Brasil/88.

Princípio é a base, fundamentação, é o que estrutura as regras e as normas e

concretiza o valor, é o ponto de partida para a criação daquelas. Sendo um como

“dever ser” outro já efetivamente sendo, todos tendem ao mesmo objetivo, a

JUSTIÇA.

45

CANOTILHO, Joaquim Jose Gomes. Direito Constitucional. 5 ed., Coimbra: Almedina, p 1145-1146.

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CAPÍTULO 2

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

2.1 EMBASAMENTO HISTÓRICO

A palavra dignidade tem origem etimológica no latim dignitas,

significa respeitabilidade, prestígio, consideração, uma qualidade daquilo que é

digno, merece respeito e reverência. “[...] do adjetivo “dignus”, cuja forma arcaica

decnos revela sua origem do verbo decet = decente. É a atitude de respeito a si

mesmo e aos outros, pelo reconhecimento de que todo criatura humana possui

características que a elevam acima das outras criaturas. O mais pobre, degradado e

viciado de todos os homens, não perde sua dignidade essencial e inalienável” 46.

Antigamente, o conceito de dignidade da pessoa humana era

um pouco diferente, pois para Aristóteles, o homem era um animal político ou

social47, o significado do termo não era encontrado na idade antiga, pois a

expressão personalidade só se constituía a partir do latim persona.

Porém, mesmo na antiguidade, encontram-se sinais de que

havia certa preocupação ao respeito à dignidade humana, exemplo disso é o código

de Hamurabi, escrito em 1750 a.c na Babilônia, foi o primeiro código de leis do

mundo, possuindo 282 artigos, exemplos deles:

Injuria e Difamação. Art. 1º. Se algum home livre acusou outro

homem livre e lançou sobre ele suspeita de morte, mas não pode comprovar, seu acusador será morto; Falso Testemunho. Art. 3º. Se um homem livre, em processo, se

apresenta como testemunha de acusação e não prova o que disse, se o processo importa em perda de vida, ele deverá ser morto. Crimes de furto e de roubo. Art 6º. Se um homem livre roubou

bens de deus ou do palácio, deverá ser morto juntamente com aquele que recebeu o objeto roubado. Regras sobre Adoção. Art. 185. Se um home livre adotou uma criança desde o seu nascimento e a criou, essa criança adotada não

46

AVILA, Fernando Bastos de. Pequena enciclopédia de doutrina social da igreja. 2 ed. Ed Loyola. São Paulo – SP.1993.pg 158

47 STONE, I.F. O julgamento de Sócrates. Ed. Companhia das letras. São Paulo- SP. 2005 pg. 28.

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poderá ser reclamada. Art 186. Se um homem livre adotou uma

criança, e , depois que a adotou, ela continuou a reclamar por seu pai ou mãe, essa criança adotada deverá voltar a casa de seus pais. Regras de direito criminal. Art. 195. Se um filho bater em seu pai, cotarão sua mão. Art. 196. Se um homem livre destruir um olho de

outro homem livre, destruirão o seu olho. 48

É possível perceber, que mesmo naquela época, a

intenção era preservar a igualdade entre todos, com punições severas é claro, e

baseado em suas crenças e cultura da época, mas estavam imbuídos da vontade de

garantir a justiça, logo existindo ali, vestígios da dignidade da pessoa humana.

O Código de Manu teve sua origem na Índia, cerca de

1000 anos após o Código de Hamurabi. O Código de Manu não teve tanta

repercussão, e nem boa reputação na visão dos historiadores. Na cultura hinduísta

acabou por fixar as regras que definiram a Índia como uma sociedade de castas

fechadas até os dias de hoje, contendo regras sobre a administração da justiça,

regras processuais, como sistema de provas, regras monetárias, direito empresarial,

direito das obrigações, regras sobre injurias e ofensas físicas, dos deveres da

mulher e do marido. Assim como o Código de Hamurabi, tinha o objetivo, claro que

observando a cultura local e temporal, de resguardar o direito e justiça para cada um

como pessoas que são. Exemplos do conteúdo contido neste código são:

Dos ofícios dos juízes. Art1. O rei deve comparecer a Corte de

Justiça em porte Humilde, sendo acompanhado de brâmanes49 e de conselheiros experimentados. Dos meios de provas. Art 44. Somete homens dignos de confiança,

isentos de cobiça, podem ser admitidos como testemunha de fatos levado à Juizo. Dos roubos e dos furtos. Art 324. A ação de tirar uma coisa por

violência, à vista do proprietário, é um roubo; em sua ausência é furto, do mesmo modo que se nega a ter recebido. Regras sobre filiação e herança. Art 519. O primeiro filho da ao pai a imortalidade e os demais são considerados pelos sábios como nascidos do amor. 50

Dentro deles, havia preceitos religiosos, morais, jurídicos e

políticos, mostrando assim o interesse, naquela época e a necessidade de se

48

VAZ, Anderson Rosa. Introdução ao direito. Ed. Juruá. Curitiba: 2007. pg.121-122

49 Na cultura deles, eram sacerdotes originários direitamente do deus Brahma e por isso superior a todas as demais castas.

50 VAZ, Anderson Rosa. Introdução ao direito. Ed. Juruá. Curitiba: 2007. pg. 123-124.

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proteger a dignidade de cada um. Por mais cruéis que fossem as penalidades, ou

irracionais as normas, foi daí que iniciou o processo de evolução, chegando ao

direito positivado existente até os dias de hoje, eles fazem parte das leis existentes,

tendo assim como tudo, evoluindo, junto com toda a história da humanidade.

A partir do surgimento do cristianismo, com os sentimentos de

fraternidade, solidariedade, igualdade entre os irmãos, ai sim, a idéia de que a

pessoa seria portadora da dignidade e dos direitos fundamentais se fortaleceu.

Assim ensina Cleber Francisco Alves:

De qualquer sorte, parece inequívoco que o tema da dignidade da pessoa humana encontra no pensamento e na doutrina cristã um marco fundamental, como verdadeiro e decisivo “divisor de águas”. A contribuição do cristianismo para o desenvolvimento de um efetivo humanismo, ainda que possa ser encontrada desde o primórdios de sua difusão, no caso da Idade Antiga, veio a se expressar de forma contundente no contexto contemporâneo com a edição de inúmeros documentos pontíficos a partir da Encíclica Rerum Novarum, de Leão XVIII, no ano de 1891.51

Assim, com essa percepção de vida em comunidade,

fraternidade, houve também o surgimento dos direitos e deveres, a percepção da

existência e logo a positivação dos mesmos.

Como importantes antecedentes históricos das declarações de

direitos humanos fundamentais, primeiramente cita-se a Inglaterra na Carta Magna

Charta Libertatum, outorgada por João Sem-Terra em 15 de junho de 1215, “ela foi

confirmada seis vezes por Henrique III, três vezes por Eduardo I, catorze vezes por

Eduardo III, seis vezes por Ricardo II, seis vezes por Henrique IV, uma vez por

Henrique V e uma vez por Henrique VI”52, e também a Petition of Right, de 1628 que

previa expressamente que “ninguém seria obrigado a contribuir com qualquer

dádiva, empréstimo ou benevolência e a pagar qualquer taxa ou imposto, sem o

consentimento de todos, manifestado por ato do parlamento; e que ninguém seria

chamado a responder ou prestar juramento, ou a executar algum serviço, ou

encarcerado, ou , de qualquer forma, molestado ou inquietado, por causas destes

51

ALVES, Cleber Francisco. O Princípio Constitucional da Dignidade Humana: o enfoque da doutrina social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. P. 14-15.

52 MIRANDA, Jorge. Textos Históricos do direito constitucional. 2. Ed. Lisboa : Casa da Moeda, 1990, p. 13

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tributos ou da recusa em pagá-los; que nenhum homem livre ficasse sob prisão ou

detido ilegalmente.” 53

E ainda o Habeas Corpus Act, de 1679:

Regulamentou esse instituto que, porém, já existia na common Law. A Lei previa que por meio de reclamação ou requerimento escrito de alguma indivíduo ou a favor de algum indivíduo detido ou acusado da prática de um crime (exceto se tratar-se de traição ou felonia, assim declarada no mandado respectivo, ou de cumplicidade ou de suspeita de cumplicidade, no passado, em qualquer traição ou felonia, também declarada no mandado, e salvo o caso de formação de culpa ou incriminação em processo legal), o lorde-chanceler ou, em tempo de férias, algum juiz dos tribunais superiores, depois de terem visto cópia do mandado ou certificado de que a cópia foi recusada, poderiam conceder providencias de habeas corpus (exceto se o próprio indivíduo tivesse negligenciado, por dois período, em pedir a as libertação) em benefício do preso, a qual será imediatamente executada perante o mesmo lorde-chanceler ou juiz; e se, afiançável, o individuo seria solto durante a execução da providência, comprometendo a comparecer e a responder à acusação no tribunal competente. Alem de outras previsões complementares, o Habeas Corpus Act previa multa de 500 libras àquele que voltasse a prender, pelo mesmo fato, o individuo que tivesse obtido a ordem de soltura.54

Teve também a Bill of Rights, de 1689 que foi

Decorrente da abdicação do rei Jaime II e outorgada pelo Príncipe de Orange, no dia 13 de fevereiro, significou enorme restrição ao poder estatal, prevendo, dentre outras regulamentações: fortalecimento ao principio da legalidade, ao impedir que i rei pudesse suspender leis ou a execução das leis sem o consentimento do Parlamento; criação do direito de petição; liberdade de eleição dos membros do Parlamento; imunidades parlamentares; vedação à aplicação de penas cruéis; convocação freqüente do Parlamento. Saliente-se, porém, que apesar do avanço em termos de declaração de direitos, o Bill of Rights expressamente negava a liberdade e igualdade religiosa, ao prever em seu item IX que, considerando que a experiência tem demonstrado que é incompatível com a segurança e bem-estar desde reino protestante ser governado por um príncipe papista ou por um rei ou rainha casada com um papista, os lordes espirituais e temporais e os comuns pedem, além disso, que fique estabelecido que quaisquer pessoas que participem ou comunguem da Sé e Igreja de Roma ou professem a religião papista ou venha a casar com um papista sejam excluídos e se tornem para sempre incapazes de herdar, possuir ou ocupar o trono deste reino, da

53

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.26

54 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.26

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Irlanda e seu domínios ou de qualquer parte do mesmo ou exercer qualquer poder, autoridade ou jurisdição régia; e, se tal se verificar, mais reclamam que o povo destes reinos fique desligado do dever de obediência e que o trono passe para a pessoa ou as pessoas de religião protestante que o herdariam e ocupariam em caso de morte

da pessoa ou das pessoas dadas por incapazes.55

Em 12 de junho de 1701, teve o Act of Seattlemente,

configurou-se como um ato normativo reafirmador do princípio da legalidade, item IV

– E considerado que as Leis da Inglaterra constituem direitos naturais do seu povo e

que todos os reis e rainhas que subirem ao trono deste reino deverão governá-lo em

obediência às ditas leis, e que todos os seus oficiais e ministros deverão servi-los

também de acordo com as mesmas leis [...] 56

Continuando a evolução dos direitos humanos, encontra-se a

participação da Revolução dos Estados Unidos da América, com os documentos:

Declaração de Direitos de Virgínia, de 6 de junho de 1776, onde na sua seção I já

proclamava o direito á vida, á liberdade e a propriedade, assim como outros direitos

humanos; Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, de 4 de

julho de 1776, produzido por Thomas Jefferson que dispunha:

A história do atual Rei da Grã- Bretanha compõe-se de repetidos danos e usurpações, tendo todos por objetivo direto o estabelecimento da tirania absoluta sobre estes Estados. Para prová-lo, permitam os submeter os fatos a um cândido mundo: recusou assentimento a leis das mais salutares e necessárias ao bem público [...] Dissolveu Casas de Representantes repetidamente porque se opunham co máscula firmeza às invasões dos direitos do povo [...] Dificultou a administração da justiça pela recusa de assentimento a leis que estabeleciam poderes judiciários. Torou os juízes dependentes apenas da vontade dele para gozo e valor e pagamento dos respectivos salários [...] Tentou tornar o militar independente do

poder civil e a ele superior [...]57

55

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.26-27

56 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.27

57 MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.27-28

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Tiveram várias, após estas, que de alguma forma expressaram

sua vontade de resguardar os direitos de cada pessoa, os direitos fundamentais à

sua existência e manutenção de uma vida harmônica e justa.

Na teoria de Kant58, em seus estudos acerca do conhecimento,

ele passa a colocar o homem no centro do processo de evolução, assim, o que

dotava o ser humano de dignidade especial, seria o fato de que agora, não era mais

o meio para os objetos e sim fim em si mesmo.

Assim, para Kant, sendo o homem um ser racional, passou a

existir como fim em si, e não apenas como meio, enquanto aqueles desprovidos de

razão teriam então um valor condicionado às coisas. Dessa forma, com o fim em si

mesmo, com um valor único, não podendo ser usado para nada como instrumento,

começaram então, a exigir uns dos outros o ou até respeito a essa condição

especial, onde o homem deveria respeitar e ser respeitado.

Outro fator importante, e que levou a concretização dos direitos

do homem, foi à crueldade e hostilidade demonstrada entre o período de guerra.

Exemplo disso foram os campos de concentração, onde as pessoas eram

torturadas, desumanizadas, martirizadas, tirando qualquer vestígio de dignidade

contidas naquelas pessoas. Naquele campo, mostrou-se até onde a maldade do

homem pode chegar.

Após todo esse sofrimento pelo qual a humanidade passou,

adveio finalmente a paz, dando espaço para a criação da Carta do Atlântico, a

Declaração das Nações Unidas, a Declaração de Cairo, o Acordo de Itália, o Acordo

de Potsdam e a criação das Nações Unidas (ONU).

Foi em 10 de dezembro de 1948 em Paris que se instituiu a

mais importante conquista, no que tange aos Direitos Humanos Fundamentais em

nível internacional, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, com 37 artigos

precedidos de um preâmbulo com sete considerações, em que reconhece

solenemente a dignidade da pessoa humana, como base da liberdade, da justiça e

da paz; o ideal democrático com fulcro no progresso econômico, social e cultural; o

58

Revista da ESMESC/ Escola da Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina-v.16, n22. Folrianópolis-SC; 2009. p.15-16

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direito de resistência à opressão e, finalmente, a concepção comum desses

direitos, para tentar garantir, uma vida em paz e munida de justiça. Foi elaborada a

partir da previsão da Carta da ONU de 1944 que em seu artigo 55 estabeleceu a

necessidade dos Estados-partes promoverem a proteção dos direitos humanos, e da

composição, por parte da Organização das Nações Unidas, de uma Comissão dos

Direitos Humanos, presidida por Eleonora Roosevelt.59 Considerando principalmente

a manutenção de todos os direitos humanos fundamentais à vida de cada um.

Senão vejamos:

Preâmbulo Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos

os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos

humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum, Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam

protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão, Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de

relações amistosas entre as nações, Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na

Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a

promover, em cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades, Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso, A Assembléia Geral proclama A presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua

59

MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos art. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, doutrina e jurisprudência; 2º. Ed. São Paulo : Atlas, 1998.p.36

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observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.60

Com a leitura do disposto no preâmbulo da Declaração

Universal dos Direitos do Homem, já se percebe que prezavam pelo reconhecimento

da Dignidade Humana, com um tom de mágoa, diante de todo o sofrimento que as

pessoas são capazes de causar umas às outras, motivados por ódio, egoísmo,

ambição, a razão deixava de existir, restando somente dor e sofrimento a aqueles

que tinham sua dignidade afetada.

Logo, se existe um Estado a proteger e reger leis para uma

vida harmônica, este mesmo Estado é o que deveria proteger o que mais importa, a

Dignidade da pessoa humana de cada um. Ainda hoje com certeza existem falhas,

porém, a intenção de proteção é de grande valia.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem foi uma grande

conquista para a humanidade, visto esta criação ser de nível internacional,

demonstrando a preocupação em resguardar a toda e qualquer pessoa uma vida

digna.

A primeira referência constitucional à dignidade da pessoa

humana parece ser encontrada na Constituição do México, de 1917, a qual

mencionava a dignidade humana como valor que deveria orientar o sistema

educacional daquele país.61

Portanto mesmo que não expressa como principio basilar, e

direcionador, já encontrava-se como um dos requisitos de uma vida social

harmônica.

60

Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php Acesso em: 24 de outubro de 2010

61 ALVES, Cleber Francisco. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana: O enfoque da Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. Pg.129.

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Após, a Constituição Italiana, de 27 de dezembro de 1947, que

estabelecia no seu artigo 3º, que: “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social

e são iguais perante a lei”.62

Porém, a primeira constituição a acolher a dignidade da pessoa

humana em uma formulação principiológica foi a da Alemanha, de 24 de maio de

1949, estabelecendo expressamente em seu artigo 1º, nº 1, que: “ A dignidade

humana é inviolável. respeitá-la e protegê-la é obrigação de todos os Poderes

estatais”.63

Após o reconhecimento como princípio, pela Constituição

Alemã, ele se espalhou por varias Constituições no mundo. Assim como, dispondo

como princípio, a Constituição de Portugal, de 25 de abril de 1976, estabeleceu

referente aos princípios fundamentais que: “Portugal é uma República soberana,

baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na

construção de uma sociedade livre, justa e solidária”.64

A Constituição Espanhola, também aderiu ao princípio,

dispondo em seu artigo 10, nº 1, que: “A dignidade da pessoa, os direitos invioláveis

que lhe são inerentes, o livre desenvolvimento da personalidade, o respeito à lei e

aos direitos dos outros são fundamentos da ordem política e da paz social”.65

Na França, o princípio não esta previsto no texto constitucional,

foi objeto de criação hermenêutica do Conselho Constitucional. 66 Na Bélgica a

Constituição foi revisada em 31 de janeiro de 1994, dispondo em seu artigo 23 que:

“cada um tem o direito de levar uma vida de acordo com a dignidade humana”.67

62

NOBRE JUNIOR. Edilson Pereira. O Direito Brasileiro e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, nº 219:237-257, jan./mar.2000. pg. 238.

63 MARTINS, Flademir Jerônimo Belinati. Dignidade da pessoa humana: princípio constitucional fundamental. Curitiba : Juruá, 2003. p. 15

64 SILVA, José Afonso da. A Dignidade da Pessoa Humana como Valor Supremo da Democracia, Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, nº 212:89-94, abr./jul. 1998. p. 89.

65 SILVA, José Afonso da. A Dignidade da Pessoa Humana como Valor Supremo da Democracia, Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, nº 212:89-94, abr./jul. 1998. p. 89.

66 NOBRE JUNIOR. Edilson Pereira. O Direito Brasileiro e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, nº 219:237-257, jan./mar.2000. p. 238

67DELPÉRÉE, Francis. O Direito à Dignidade Humana, in: Direito Constitucional: Estudos em homenagens a Manoel Gonçalves Ferreira Filho. São Paulo: Dialética, 1999. p. 151.

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Após a queda do chamado socialismo real, no Leste Europeu,

as Constituições dos países incluíram entre suas diretrizes a dignidade humana. O

Princípios da Dignidade da Pessoa Humana foi mencionado na Constituição da

Croácia, de 22 de dezembro de 1990, em seu art. 25, na Constituição da Bulgária,

de 12 de julho de 1991 no preâmbulo, na Constituição da Romênia, de 08 de

dezembro de 1991, em seu art. 1º, na Constituição da Letônia, de 10 de dezembro

de 1991, art. 21, na Constituição da Estônia, de 28 de junho de 1992, art. 10, na

Constituição da Lituânia, de 25 de outubro de 1992, art. 21, na Constituição

Eslovaca, de 1 de setembro de 1991, no preâmbulo e a Constituição da Rússia, de

12 de dezembro de 1993 em seu artigo 21.68

Todo esse processo de evolução do homem, desde os

primórdios, onde sua busca de autoconhecimento efetivou um crescimento cultural,

levando o homem a chegar até onde se encontra agora. Na espera que, como ser

humano, e depois de toda evolução e sofrimento até o momento, não cometa mais

os erros do passado e mantenha sempre como ideal, a vida justa e digna a todos.

Agora, após esse breve estudo acerca da evolução do homem

nas suas conquistas para efetivar uma vida melhor e digna, nada mais justo do que

direcionar o presente trabalho a um dos fundamentos da própria constituição, como

de toda a humanidade; O princípio da dignidade humana.

2.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – FUNDAMENTAÇÃO

A sua origem, e sua evolução também já foi abordada, agora

será visto a dignidade da pessoa humana nos tempos de hoje, seu conceito atual. A

Constituição da República Federativa do Brasil/88 consagra a dignidade da pessoa

humana como princípio norteador dos direitos fundamentais no seu artigo 1º, inciso

III. E ainda o artigo 3º, passa-se a mesma idéia, quando dispõe expressamente

como objetivo fundamental da república a construção de uma sociedade livre, justa e

68 NOBRE JUNIOR. Edilson Pereira. O Direito Brasileiro e o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Renovar, nº 219:237-257, jan./mar.2000. pg. 239

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solidária, e estabelecendo como meta, objetivo, a erradicação da pobreza e da

marginalização, reduzindo-se a desigualdades sociais.

Rodrigo da Cunha69 dispõe:

Expressa na Constituição Federal, a dignidade humana é um dos cinco fundamentos da República Federativa do Brasil, que visa também a uma sociedade mais justa e solidária, com a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de discriminação./ Foi no século XVIII que a idéia de dignidade começou a se constituir enquanto conceito construído a partir de uma história e uma demanda social. Kant, considerado o "filósofo da dignidade", talvez não imaginasse que as suas idéias originais de dignidade ocupariam o centro e seriam o veio condutor das constituições democráticas do final do século XX e do século XXI.

Mesmo tendo essa proteção na própria constituição, a pobreza

e as desigualdades são situações presentes ainda na sociedade como no mundo.

Se olhar para o lado, não é preciso ir muito longe para ver a miséria estampada nos

rostos de certas pessoas, transmitindo tristeza ao retribuir o olhar, mostrando

claramente a ausência do objeto em estudo hoje.

Alem da própria Constituição da República Federativa do

Brasil/88 como vimos a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em seu artigo

1º, dispõe que “toda a pessoa nasce livre e igual em dignidade e direitos. E tal

dignidade e inerente a pessoa e não comporta qualquer limitação” 70.

2.3 CONCEITO

Para São Tomás de Aquino71, pessoa é toda “substância

individual de natureza racional”, ou seja a noção de pessoa já não é uma

exterioridade, mas sim a própria substância, é a forma que se dá ao ser de

determinado ente individual as características de permanência e invariabilidade.

69

Rodrigo da Cunha Pereira. Família e dignidade humana: V congresso brasileiro de direito de família. São Paulo: IOB Thomson, 2006.pg 08

70 Disponível em: http://www.onu-brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php Acesso em: 24 de outubro de 2010

71 COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 19

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Destarte, essa característica diferencia o ser humano dos

demais seres, pela sua racionalidade, assim como também se remete a idéia de que

todos os seres humanos são iguais em dignidade, já que todos são igualmente

dotados da mesma racionalidade.

Então para São Tomás de Aquino72 a dignidade humana,

estritamente relacionada com a sua concepção de pessoa, nada mais é do que uma

qualidade inerente a todo ser humano e que o distingue das demais criaturas, a

racionalidade.

Segundo Ingo Wolfgang Sarlet73, a dignidade da pessoa

humana é:

[...] a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, alem de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.

Portanto essa seria uma “qualidade” dada á todas as

pessoas, justamente por se tratar de “pessoa”, tornando-as merecedoras do respeito

e consideração por parte do Estado, ou seja, a dignidade da pessoa humana reflete

da forma individual como em sociedade, respeita-se um ao outro e se ganha o

direito de ser respeitado por todos, inclusive o Estado.

A dignidade da pessoa humana, na visão de Alexandre de

Moraes é a seguinte:

A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que manifesta singularmente na autodeterminação e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre

72

NOGARE, Pedro Dalle. Humanismo e Anti-Humanismo: Introdução Antropologia Filosófica. 10 ed. Petrópolis: Vozes, 1985. p.52-54

73 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p. 60.

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sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.74

E ainda, o mesmo doutrinador:

O princípio fundamental consagrado pela Constituição Federal da dignidade da pessoa humana apresenta-se em uma dupla concepção. Primeiramente, prevê um direito individual protetivo, seja em relação ao próprio Estado, seja em relação aos demais indivíduos. Em segundo lugar, estabelece verdadeiro dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes. Esse dever configura-se pela exigência de o indivíduo respeitar a dignidade de seu semelhante tal qual a Constituição Federal exige que lhe respeitem a própria. A concepção dessa noção de dever fundamental resume-se a três princípios do Direito Romano: honestere vivere (viver honestamente), alterum non Laedere ( não prejudique ninguém) e suum cuique tribuere (dê a cada umm o que

lhe é devido).75

Percebe-se que o intuito do princípio da dignidade humana é

um modo de garantir no mínimo, uma vida onde a pessoa como ser humano teria

direito ao respeito, a igualdade, a uma vida com as condições necessárias para sua

subsistência, teria a proteção quanto ao próprio Estado, evitando posteriores

abusos, ou algo semelhante. E uma proteção que se da tanto coletivamente como

individualmente, mostra a intenção do homem na convivência em um mundo sem

desigualdades, injustiças ou qualquer fator degradante ao homem.

Na visão de Celso Antonio Pacheco, sobre a dignidade da

pessoa humana dispõe:

[...] o princípio fundamental da República do Brasil que consagra a dignidade da pessoa humana deve não só ser estabelecido como “piso” determinante de toda e qualquer política de desenvolvimento, como, necessariamente, projetar-se sobre o modo como devam ser assegurados todos os demais direitos na sociedade previstos na Constituição Federal. Daí duas conclusões importantes, com reflexo no direito constitucional brasileiro em vigor: 1) a pessoa humana passa a ser a verdadeira razão de ser de todo o sistema de direito positivo em nosso país e evidentemente do direito ambiental brasileiro; 2) a importância da pessoa humana se reafirma, o plano normativo e particularmente perante o direito ambiental brasileiro, em face de restar assegurada no plano constitucional sua dignidade como mais

74

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002. p. 128-129.

75 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002. p.129.

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importante fundamento da Republica Federativa do Brasil, constituída que foi em Estado Democrático de Direito, a saber, uma vida com dignidade reclama desde logo a satisfação dos valores mínimos fundamentais descritos no âmbito de nossa Carta Magna no art. 6º (direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade, à proteção a infância, assim como à assistência aos desamparados), verdadeiro piso vital mínimo a ser assegurado pelo Estado Democrático de Direito.76

Canotilho e Moreira77 conceituam de forma minuciosa:

A dignidade da pessoa humana fundamenta e confere unidade não apenas aos direitos fundamentais – desde os pessoais (direito à vida, à integridade física e moral, etc.) até aos direitos sociais (direito ao trabalho, à saúde, à habitação), passando pelos direitos dos trabalhadores (direito à segurança no emprego, liberdade sindical, etc.) – mas também à organização econômica (princípio da igualdade da riqueza econômica e dos rendimentos, etc.) Concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido de dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a no caso dos direitos sociais ou invocá-la para construir uma “teoria do núcleo da personalidade” individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana.

Assim, a dignidade da pessoa humana engloba todas as áreas

do direito, ela é um requisito obrigatório que deve ser sempre observada, é a

garantia de uma vida digna e honrosa a todas as pessoas.

Para finalizar, de acordo com Rizzato Nunnes:

Dignidade é um conceito que foi sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleta de si mesma como um valor supremo, construído pela razão jurídica. [...] Claro que, se de um lado, a qualidade da dignidade cresce, se amplia, se enriquece, de outro, novos problemas em termos de guarida surgem. Afinal, na medida em que o ser humano age socialmente poderá ele

próprio – tão dignamente protegido – violar a dignidade de outrem.

76

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Princípios do Direito Processual Ambiental.. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2007 p. 13-14.

77 CANOTILHO, José Joaquim Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa anotada. 3.ed. ver. Coimbra, 1993.p. 58-59.

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Importante ressaltar com o ensinamento de Rizzato Nunnes

que, depende de cada um a manutenção deste tão respeitável princípio, o da

dignidade Humana, não se pode exigir de alguém o respeito à sua dignidade, se não

é capaz de respeitar a do outro.

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CAPÍTULO 3

A (IN) APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA

3.1 AUSÊNCIA DA DIGNIDADE HUMANA

Por mais que esteja resguardado como princípio, protegido

pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, ainda existem situações, onde se

demonstram a ausência deste princípio fundamental à vida.

Interessante é o relato de Rizzato Nunes, onde ele conta

histórias que ocorreram nos Estados Unidos da América, histórias verídicas, trocado

somente os nomes das pessoas:

No dia 28 de julho, Artur James, policial pertencente a certo presídio americano, junto com outros dois colegas, pegou pelos braços Clark Forest. Colocaram-no numa cadeira, amarraram-no e ligaram vários fios elétricos a seu corpo, inclusive na cabeça. Seu rosto, a altura da vista, foi vedado por uma banda amarrada bem firme para que, com a descarga elétrica que ele iria sofrer, os olhos não pulassem para fora. Alguns segundos depois submeteram-no a portentoso choque elétrico. Uma boa platéia assistia ao evento para testemunhá-lo. Depois de algum tempo de descarga elétrica, vários fios de sangue escuro, ocre, quase marrom, e grosso, como que derramando uma parte de sua essência vital. Um terrível cheiro de carne queimada invadiu a sala. Poucos segundos depois ele morreu.78

Outro caso, também citado por Rizzato Nunes:

Antony Carton rodava com seu veículo pela High Way 720 nu Estado Americano, na noite de 18 de março de 1993. Um dos faróis do carro estava queimado. Por esse motivo Le foi parado pela Polícia Rodoviária. Abordado, dois policiais examinaram seus documentos e levaram-no preso.

78

NUNES. Rizzato. O princípio Constitucional da Dignidade Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. Pag. 1-2

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Antony nada fizera, mas um homônimo cometera um crime e era procurado pela polícia. Ele disse isso aos guardas, mas não adiantou. Enjaulado, foi-lha oferecido um advogado. Passaram dias e por um falha processual o advogado não conseguiu peticionar no prazo ao Juiz, requerendo a soltura de seu cliente (que era absolutamente inocente). O Juiz não apreciou o pedido por excesso de prazo, mas percebeu que se tratava de homonímia. Disse, então, para o advogado recorrer. Dias depois, no exato momento em que o Tribunal finalmente concedera liberdade a Antony, ele se suicidava. Amarrando uma corda feita de pedaços de tecido a uma grade do teto do refeitório, ele se enforcou. Um dia ates havia sido violentado em sua celapor dois outros prisioneiros.79

Ocorreu nos EUA, porém, no mesmo mundo que todos vivem.

E onde está a dignidade humana destes homens que morreram desta forma tão

violenta e cruel?

E este último que morreu por um equívoco daqueles que

deveriam o proteger, e por mera burocracia judiciária.

Agora, histórias contadas por Rizzato Nunes, que ocorreram no

Brasil, também alterado apenas o nome:

Antonio da Silva mora na cidade-satélite chamada Ceilândia, nos arredores de Brasília, Distrito Federal. Numa tarde de abril de 2000, foi até um bosque perto de sua humilde casa e retirou um pequeno pedaço de casa de uma árvore par fazer chá. É que sua esposa adoecera e todos os dias ali na região tomam chá da casca daquela árvore, que é muito bom para a saúde. Mas, para espanto e surpresa de Antonio, logo ao retirar a casca da árvore foi preso por um policial, pois desrespeitara a lei ambiental brasileira. Foi encarcerado junto com vários presos perigosos. Arguido pela imprensa sobre o porquê de ter arrancado a casca da árvore, mostrou-se atônico como um livro de Kafka. Mal pode entender a pergunta. Que dirá do “direito”. Sempre tomara aquele chá, como todos os outros. Ficou mais de 15 dias prezo!80

79

NUNES. Rizzato. O princípio Constitucional da Dignidade Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. Pag. 02

80 NUNES. Rizzato. O princípio Constitucional da Dignidade Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. Pag. 03

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E com tantas pessoas realmente más no mundo cometendo

atrocidades, se preocupam com um pedaço da casca da árvore, tirada para fazer

chá.

Agora a história de Marta de Souza e de seus quatro filhos

menores, com dois, quatro, cinco e oito anos, sendo que o de dois anos encontrava-

se muito doente, com infecção intestinal, ela não possuía dinheiro nem para comprar

os medicamentos que o SUS receitou:

Marta e seus filhos moravam há mais de dez anos num barraco construído pelo marido, já falecido. João de Souza era pedreiro e com muito esforço conseguiu construir o barraco. Antes de morrer, João entregou para Maria alguns documentos e disse que ela os guardasse, pois eram muito importantes. Era o compromisso de compra do terreno onde estava o barraco. Certo dia ouviu baterem na porta do barraco. Atendeu: era um homem, que se apresentou como Oficial de Justiça de uma Vara Cível do Fórum. Entregou um documento e pediu para Marta assinar. Ela assinou: era a única coisa que sabia fazer, pois é analfabeta; apenas aprendeu a assinar o nome. O Oficial de Justiça disse para Marta que aquele papel era muito importante e que ela devia procurar um advogado. O Oficial de Justiça foi-se embora. Marta ficou um pouco preocupada, mas como faria para encontrar um advogado? Onde iria? “ Deve custar dinheiro”, pensou. Mas ela não tinha nem para o remédio de seu filho. Nada fez. Passados alguns meses, o Oficial de Justiça voltou. Estava acompanhado de outras pessoas. Eles expulsaram Marta e os filhos do barraco, tiraram os pertences e derrubaram-no. Agora Marta e os quatro filhos estão morando ao relento, a céu aberto, num terreno exatamente do outro lado da rua da terra onde estava construído seu barraco.81

São histórias antigas, mas nem por isso deixam de ser

verdadeiras. Hoje em dia, as histórias ainda são piores, moça que mata pai e mãe

que estão dormindo, em sua cama. Ou pai que joga sua filha do prédio. Pai que

tortura menina com queimaduras, priva de tratamento médico, a mantém em um

quartinho, presa e amarrada, até que leva para o hospital, infelizmente tarde demais,

pois não agüenta e morre lá.

81

NUNES. Rizzato. O princípio Constitucional da Dignidade Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. Pag. 03-04

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Mãe que depois de um ato impensado engravida, e com 8

meses de gravidez resolve que não é isso que quer, e aborta a criança, e o enterra,

e vai continuar a viver sua vida sem peso na consciência.

E assim vão inúmeras situações em que inexiste a dignidade

humana, ferindo qualquer vestígio dela.

Fazendo uma análise do artigo I da Declaração Universal dos

Direitos do Homem, “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade

e direitos. São dotados de razão consciência e devem agir em relação uns aos

outros com espírito de fraternidade.” Ele relata simplesmente a vida como um conto

de fadas, infelizmente não é o que ocorre diariamente, ainda temos que conviver

com pai matando filho, filho matando pai, inocentes morrendo a cada segundo,

sendo que para isso parar de ocorrer, seria simples, seguir ipsi literis o disposto no

art. I.

Assim, estudando artigo por artigo, verifica-se que nem tudo

está como deveria estar, mas pelo menos, o interesse em ter uma vida como a

disposta na Declaração dos Direitos Universais do Homem, está claramente

comprovada, resta agora, colocá-la em prática todos os dias, por todas as pessoas.

Outro artigo que é importante ser ressaltado e comentado é o

III, “Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.” Quem

dera isso fosse respeitado todos os dias, a cada minuto, ou melhor, a cada segundo,

pessoas iam deixar de morrer violentamente, pela falta de segurança.

O artigo IV, “Ninguém será mantido em escravidão ou servidão;

a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas” é

polemico, quem acredita que ainda existem formas de trabalho escravo? E sim,

existe. Não somente pessoas adultas como crianças também, é somente ler revistas

ou assistir ao jornal. Impossível de acreditar, porém verdade.

Se for analisar, artigo por artigo em quase todos, existem

situações que hoje em dia, século 21, ainda ocorrem contrário ao que está disposto

na Declaração Universal Humana, ou em qualquer disposição relativa a isso.

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Essa foto abaixo demonstra uma destas situações onde se

percebe explicitamente a ausência do princípio da dignidade humana. Ela foi tirada

no Conflito de Biafra, em 1968. Na foto o menino espera cupons para receber leite e

peixe em um centro de nutrição.

82

Conflito de Biafra, 1968. Menino espera cupons para receber leite e peixe em um centro de nutrição. Foto: Divulgação/H. D. Finck/CICV.

Rizzato Nunes83 defende que a dignidade da pessoa humana

não se trata de uma categoria relativa e variável, pois ela nasce juntamente com o

indivíduo. Destarte, todo indivíduo tem dignidade só pelo fato de ser pessoa. A

dignidade da pessoa humana demonstra uma conquista da razão ético-jurídica, fruto

da reação à história de atrocidades que, infelizmente, marcam a experiência

humana, até mesmo em dias atuais.

Já foi utilizado este ensinamento para encerrar o capítulo

antecedente, porém necessário se faz, a presença deste mesmo ensinamento no

presente capítulo:

(...) Se de um lado, a qualidade da dignidade cresce, se amplia, se enriquece, de outro, novos problemas em termos de guarida

82

Disponível em: http://www.band.com.br/jornalismo/galeria Acesso em: 24 de outubro de 2010. 83

NUNES. Rizzato. O princípio Constitucional da Dignidade Humana. Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 2002. Pag. 50

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surgem. Afinal, na medida em que o ser humano age socialmente, poderá ele próprio – tão dignamente protegido – violar a dignidade de outrem.

Ou seja, por mais que por sermos humanos, e por isso

estarmos protegido por tal princípio, não impede de que individualmente um

prejudique ao outro. E isso evidentemente é fato, não é preciso olha muito longe,

para ver as conseqüências que pessoas egoístas, orgulhosas e ambiciosas demais

causam ao seu semelhante.

É repugnante observar que em um mundo cheio de riquezas

perceba-se neste mesmo mundo tanta miséria e pobreza. Pessoas com tanto outras

com tão pouco.

Esse assunto com certeza tem haver e muito com o princípio

da dignidade humana visto que se pugna pela efetivação da dignidade humana

quanto sociedade, porém esquece-se de analisar se cada um faz isso com aquele

que convive consigo. Uma coisa é certa, não se pode cobrar o que não se consegue

realizar.

A percepção do homem quanto ao fato de ser solidário e digno

uns com os outros geralmente se mostra frustrada, são poucos os que valorizam a

dignidade humana alheia.

Uma questão das muitas que merecem um olhar bem mais de

perto é a prostituição infantil, ela tem sido um tumor para nossa sociedade,

destruindo o que tem de mais inocente e puro, a infância.

Perguntas como: Porque tais situações acontecem agredindo

tanto a dignidade humana? O que se pode fazer pra não se repetir e perdurar? Essa

foto retrata muito bem o que se quer expressar84:

84

Disponível em: http://www.amnesty.org/es Acesso em: 24 de outubro de 2010.

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48

85

Foto produzida por Amnesty International.

Outra situação que merece ser ressaltada são os famosos

mensalões, a falta de decência para com o povo que elege alguém para representá-

lo, e sem a mínima consideração tira, privando os muitos que nada tem do pouco

que conseguem ter.

Como podem não reagir ao ver alguém passando fome, como

podem não se indignar, com o fato de alguns esbanjando dinheiro com coisas fúteis

enquanto outros não fazem sequer uma refeição diária decentemente. Se lendo é

difícil de entender, quem sabe vendo, será melhor:

85

Disponível em: http://www.br.amnesty.org/ Acesso em: 24 de outubro de 2010.

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49

86

Foto: Rastreadores de Impurezas

Situações como esta, simplesmente não deveriam existir.

Deveria prevalecer sempre a solidariedade e igualdade. Mas o egoísmo e a ambição

de sempre querer tudo para si e sempre mais, dificulta essa possibilidade.

Um pouco mais longe, mas infelizmente neste mesmo mundo,

de uma maneira um pouco mais grave, na África, o que mata a grande maioria não

são tiros, balas perdidas, nem assaltos ou seqüestro, infelizmente lá, o que mais

leva a vida das pessoas, e de pouquinho em pouquinho, lentamente e

agonizantemente é a falta de ter o que comer, tiram forças de onde não tem para

continuar a tentar sobreviver.

Sofrem pelo que muitos nem dão valor, uma refeição diária,

têm de conviver com a sua própria fome, além das dos seus filhos, vendo-os

lentamente perder a vida. Como não se comover?

86

Disponível em: http://www.rastreadoresdeimpurezas.org/ Acesso em: 24 de outubro de 2010.

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50

87 Foto tirada por Kevin Carter em 1994.

A foto acima foi tirada no ano de 1994, pelo fotógrafo Sudanês

Kevin Carter, ele ganhou o prêmio Pulitzer de foto jornalismo com esta fotografia,

tirada na região de Ayod, uma pequena aldeia em Suam, ela percorreu o mundo

todo, demonstrando com ela, a ausência explicitamente da dignidade humana.

A figura de uma pequena menininha esquelética, notoriamente

desnutrida, rastejando sobre a terra, em direção ao campo das Nações Unidas, a 1

km de distância, esgotada de fome, sem forças para continuar, a ponto de morrer,

enquanto um abutre se encontra atrás dela, esperando ansiosamente pela morte da

pequena menina. Ninguém sabe o que aconteceu com ela, nem mesmo Kevin

Carter, que saiu do local após tirar a foto.

Quatro meses após o dia em que esta foto foi tirada, o

fotógrafo suicidou-se, tomado pela culpa e forte dependência às drogas.

87

Disponível em: http://pesquisafotografica.blogspot.com Acesso em: 24 de outubro de 2010.

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51

88

Esta não tem história, ou pelo menos não encontrei, mas a

imagem já é o suficiente para demonstrar o que se quer expressar. Ela demonstra a

total falta de dignidade para com as pessoas humanas, afeta até mesmo a dignidade

de quem está meramente olhando para isso, e de não conseguir fazer nada pra

mudar isso sozinho.

Quem dera se um dia, cada um olhasse para o outro como olha

para si mesmo, querendo para o outro, aquilo que quer para si, quem sabe assim, o

mundo seria um pouco mais agradável de viver.

88

Disponível em: http://nihilsubsolenovum.files.wordpress.com/2008/07/africa.jpg Acesso em: 24 de outubro de 2010.

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3.2 DA APLICABILIDADE DO PRINCIPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

Foi abordado acima o tema ausência da Dignidade da Pessoa

Humana, demonstrando algumas das muitas situações onde a observância deste

princípio é falha, aqui, serão demonstradas situações onde a aplicação dele ocorre.

Todos deveriam reger-se pelo princípio da dignidade da pessoa

humana, o mundo seria com certeza muito mais confortável e agradável de se viver,

ainda mais por se tratar de um princípio que ilumina todos os demais princípios e

normas constitucionais e infraconstitucionais e justamente por isso ele não deve,

nunca, ser desconsiderado em nenhum ato de interpretação, aplicação ou criação

de normas jurídicas.89

Sendo os tribunais um dos instrumentos da aplicação da

justiça, o concessor dos direitos, e aquele que pune ao ferir estes, certamente

aplicam e concretizam o princípio da dignidade humana.

De nada seria útil se nem mesmo este princípio restasse

protegido pelo tribunal, já que tudo e todos devem obediência a ele.

De acordo com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, na

área de Direito de propriedade temos:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REIVINDICATÓRIA C/C PERDAS E DANOS - ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DEVIDAMENTE ASSENTADA NO REGISTRO DE IMÓVEIS - PROPRIEDADE COMPROVADA - TROCA DE IMÓVEL REALIZADA ENTRE O AUTOR E A SOGRA DA REQUERIDA ¿ SUPERVENIENTE SEPARAÇÃO DA REQUERIDA, E CONTINUAÇÃO DA OCUPAÇÃO INJUSTA QUE JUSTIFICOU A RETOMADA DO IMÓVEL - REQUISITOS DA REIVINDICATÓRIA PREENCHIDOS - INEXISTÊNCIA DE POSSE AD USUCAPIONEM E NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUSITOS PARA USUCAPIÃO URBANA COM FIM DE MORADIA - AFASTAMENTO DOS EFEITOS DA REVELIA - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - DETERMINAÇÃO PARA PERMANÊNCIA DA REQUERIDA NO IMÓVEL ATUALMENTE OCUPADO PELO AUTOR - DIREITO FUNDAMENTAL À MORADIA - SOBREPOSIÇÃO DA DIGNIDADE HUMANA AOS LIMITES DA TÉCNICA PROCESSUAL - POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO SOBRE O IMÓVEL EM AÇÃO

89

NUNES. Luiz Antônio Rizzato. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana : doutrina e jurisprudência; 1ª Ed. São Paulo: Saraiva. 2002. p. 51

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PRÓPRIA QUE AUTORIZA MEDIDA DRÁSTICA - RECURSO DESPROVIDO. 1. "Em restando comprovado pela autora a titularidade do domínio da área reivindicada, a individuação da coisa e a posse injusta da ré, o acolhimento da pretensão reivindicatória é medida que se impõe" (TJSC, Apelação Cível n. 2005.016297-2, de Blumenau, Relator: Des. Subst. Carlos Adilson Silva, julgado em 18/09/2009).90

Aqui neste julgado cita-se o princípio da dignidade humana,

devido ao fato de que a apelante ficaria sem lugar para morar, quando da casa ela

fosse retirada, infringindo assim sua dignidade, portanto tratando-se de

desfazimento de permuta, foi determinado que após a desocupação da apelante do

imóvel em discussão, o apelado deverá imediatamente deixá-la morar na casa que

foi juntamente com o imóvel da lide, objeto da permuta. Portanto há o interesse no

resguardo da dignidade humana dela, assegurando-a uma moradia já que aquela

que perderá era onde morava.

Aqui, um julgado na área do Direito Previdenciário, também do

Tribunal de Santa Catarina:

Apelação Cível. Previdenciário. Cautelar. Restituição de valores pagos a mais pelo INSS. Descontos no atual benefício percebido pelo segurado. Art. 115, II, da Lei n. 8.213/91. Boa-fé. Princípio da irrepetibilidade das verbas alimentares. Muito embora o art. 115, inciso II, da Lei n. 8.213/91 preveja, de fato, a possibilidade de desconto de pagamento de benefício além do devido, há que se interpretar tal autorização restritivamente, dada a manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, a evidenciar que qualquer supressão de parcela deste comprometeria a subsistência do segurado e seus dependentes, em afronta ao princípio do respeito à DIGNIDADE HUMANA (art. 1º, III, da CF/88). Assim, não se pode negar as condições mínimas para a sobrevivência do segurado, diminuídas por um erro que a ele não pode ser atribuído, cometido unicamente pela Administração. Nesse passo, a aplicação da disposição em comento restringe-se às hipóteses em que, para o pagamento a maior feito pela Administração, tenha concorrido o beneficiário. (TRF4, Ap. Civ. n. 2008.71.09.000557-3, rel. Des. Celso Kipper, j. 12.6.2009).91

90

Apelação Cível n. 2006.048165-5, de São José. Relator: Juiz Saul Steil. Juiz Prolator: Denise de Souza Luiz Francoski . Órgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil Data: 29/10/2010.

91 Apelação Cível n. 2009.047452-5, de São Miguel do Oeste. Relator: Des. Pedro Manoel Abreu. Juiz prolator Marcelo Elias Naschenweng. Orgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público. Data: 13/10/2010

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Neste julgado, foi usado como fundamento na decisão, o

princípio da dignidade da pessoa humana, pois tratava-se de verba de caráter

alimentício, e estavam fazendo descontos, sem autorização da aposentada,

aduzindo que fora pago a mais o benefício de auxilio doença. Prevaleceu o direito

dela, em não ter prejuízo em sua aposentadoria, pois se tratava de seu meio de

sustentar.

Aqui, encontramos o princípio da dignidade humana, no direito

Civil, mais especificadamente em contratos:

REVISÃO CONTRATUAL. ABERTURA DE CRÉDITO PESSOAL. REVISÃO DE CONTRATO. PACTA SUNT SERVANDA. RELATIVIZAÇÃO. CUMPRIMENTO PARCIAL DO PACTO. IMPOSSIBILIDADE DE RATIFICAÇÃO DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. O princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda) não é absoluto e deve ser interpretado de acordo com a DIGNIDADE da pessoa HUMANA, a função social do contrato e as disposições do Código de Defesa do Consumidor. Do mesmo modo, as cláusulas nulas não podem ser corroboradas pelo cumprimento parcial do pacto, porque a nulidade decorre da própria lei (CDC, art. 51). JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO À TAXA MÉDIA DE MERCADO. NÃO ABUSIVIDADE.92

Aqui, neste julgado, existe a aplicação do Princípio da

Dignidade Humana, pois o apelante queria impedir que houvesse a revisão do

contrato, alegando o “pacta sunt servanda”, a força obrigatória dos contratos, porém,

sobrepõe a ele o princípio da dignidade humana, que foi o que prevaleceu.

Encontra-se o principio da dignidade aplicado, também no

Direito Tributário:

APELAÇÃO CÍVEL - TRIBUTÁRIO - AQUISIÇÃO DE VEÍCULO PARA TRANSPORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA FÍSICA - PLEITO DE ISENÇÃO DO IPVA - POSSIBILIDADE - AMPLIAÇÃO DO ALCANCE DA NORMA - PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA IGUALDADE E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA -

92

Apelação Cível n. 2010.000218-4, de Chapecó . Relator: Gilberto Gomes de Oliveira . Juiz Prolator: Giuseppe. Battistotti Bellani. Órgão Julgador: Câmara Especial Regional de Chapecó . Data: 05/11/2010.

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PRECEDENTES DA CORTE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.93

Como fundamentação neste julgado usou:

Deveras, em que pese a Lei n. 7.543/88 e o Regulamento aprovado pelo Decreto n. 2.993/89, estabeleçam que a isenção do IPVA somente seja concedida em casos de veículos adaptados e conduzidos exclusivamente por portadores de deficiência física, bem como o art. 111 do Código Tributário Nacional determine que os dispositivos legais que disponham acerca de isenções tributárias devam ser interpretados literalmente, deve o julgador ampliar o alcance daquela norma às situações em que representantes legais utilizam o veículo em proveito do deficiente, sob pena de afronta aos princípios constitucionais da igualdade e da dignidade humana. [...]

Ora, se a lei concede isenção do ICMS para a compra de veículos adquiridos por pessoas portadoras de deficiência física, ainda que sejam eles conduzidos por seus representantes legais, não se pode permitir que a isenção do IPVA se restrinja tão-somente àqueles automóveis dirigidos exclusivamente pelo deficiente, porquanto estar-se-ia conferindo um tratamento desigual a pessoas em situações essencialmente idênticas.

Percebe-se que, neste caso, também é observado e com

grande relevância o princípio que aqui é o objeto de estudo, não é por não conduzir

o veículo que não teria o mesmo direito que qualquer outro deficiente físico teria,

pois merece atenção especial, assim como condições igualmente concedidas aos

seus iguais.

No Direito de Família, também se encontra resguardado a

Dignidade Humana, senão vejamos:

DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. DEMANDA MOVIDA POR TERCEIRO. ILEGITIMIDADE. EXAME DE DNA QUE EXCLUI O ESTADO DE FILIAÇÃO. IRRELEVÂNCIA NA HIPÓTESE. RECONHECIMENTO ESPONTÂNEO, VOLUNTÁRIO E IRRESPONSÁVEL DA PATERNIDADE. ATITUDE QUE EM PRINCÍPIO APARENTA GESTO DE NOBREZA E QUE POSTERIORMENTE, ANTE A FRUSTRAÇÃO DO RELACIONAMENTO MANTIDO COM A GENITORA DA MENOR, TRANSFORMA-SE EM DESASTRE PARA A INFANTE. COMPORTAMENTO QUE DEVE SER DESESTIMULADO EM HOMENAGEM AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA PATERNIDADE RESPONSÁVEL ESTATUÍDOS NO ART. 226, § 7º, DA

93

Apelação Cível n. 2010.059967-0, de Palhoça . Relator: Cláudio Barreto Dutra . Juiz Prolator: Luciana Santos da Silva . Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público . Data: 04/11/2010

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CONSTITUIÇÃO. IRREVOGABILIDADE DO ATO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1º DA LEI N. 8.560/92 E 1.609 E 1.610 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. FALTA DE INTERESSE DE AGIR E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO RECONHECIDOS DE OFÍCIO PELO JUÍZO AD QUEM.CONDIÇÕES DA AÇÃO QUE

PODEM SER ANALISADAS EM QUALQUER TEMPO OU GRAU DE JURISDIÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. RECURSO DA RÉ PREJUDICADO. 1. "É um contra-senso pretender-se a busca da verdade real, com arrimo em exame pericial do DNA, quando o próprio interessado fez questão de esconder a dita verdade e, ipso facto, declarar espontânea e voluntariamente uma falsa paternidade, sem sopesar as conseqüências que poderiam advir para si e, sobretudo, para o menor." (AC n. 2005.014014-1, deste relator.) "No confronto de tais interesses, há que prevalecer o da criança, porquanto inserido numa realidade sócio-afetiva sem ter o direito nem sequer de opinar. É que, "na aplicação da lei, a proteção aos interesses do menor sobrelevará qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado" (REsp n.º 4.987, Min. Sálvio de Figueiredo

Teixeira). 2. O Poder Judiciário, através de suas decisões, não deve estimular tais atitudes, eis que absolutamente irresponsáveis e sustentadas, na maioria das vezes, em interesses pessoais de quem confirma falsamente a paternidade. 3. "Não configura motivo de nobreza se o agente registra a filha em seu nome enquanto convivia com a mãe, ingressando com ação negatória de paternidade ao separar-se" (TJRS, AC n.º 70006332209, Desª Elba Aparecida Nicolli Bastos, julg. em 30.9.2004).

Foram usados na sua fundamentação, importantes

ensinamentos acerca do Princípio da Dignidade Humana aplicado no âmbito do

Direito de Família:

[...] Para melhor compreensão, destaco-os: "Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - [...]; II - [...]; III - a dignidade da pessoa humana;" "Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 7º. Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas." "Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar

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e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."[...] Relembre-se, neste momento, por igualmente oportuno, as palavras do preclaro Juiz de Direito do Rio de Janeiro Mauro Nicolau Junior acerca da dignidade de uma criança, verbis: "A dignidade de uma criança fundamenta-se no amor, no respeito e no carinho a ela dedicados" (Revista Brasileira de Direito de Família

n.º 21 - DEZ-JAN/2004, p. 113). E será que o comportamento do autor nestes autos revela amor e respeito para com a criança cuja paternidade quer se desvincular de um instante para outro? Certamente que não. Não há dúvida que na hipótese em exame o princípio da dignidade da pessoa humana, particularmente da menor A. de S. M., estaria sendo vilipendiado com o resultado pretendido na inicial, retirando da referida menor um de seus atributos pessoais, qual seja, a filiação com relação ao autor, que, diga-se de passagem, teve significativa publicidade nestes 11 (onze) anos de vida da infante.94

É notório, no presente caso citado a afronta à Dignidade da

Pessoa Humana, alguém que enquanto conveniente, assume a responsabilidade do

que é ser pai, e das conseqüências não somente à ele como a menor também, e

assim que a conveniência se ausenta, fácil para ele é deixar de ser pai, sem

considerar as conseqüências que causará a criança. Assim, também, é resguardado

aqui, esse princípio fundamental à vida de qualquer pessoa, adulta como criança.

Importante ressaltar a frase utilizada na fundamentação já

citada, “A dignidade de uma criança fundamenta-se no amor, no respeito e no

carinho a ela dedicados”. Frase do Juiz de Direito do Rio de Janeiro Mauro Nicolau

Junior. Essa frase diz tudo quanto se trata de uma criança, que a única coisa que

espera daquele que ama, é o mesmo, amor.

Registro tardio de nascimento, no Direito Civil, também tem

como fundamento, a dignidade da pessoa humana:

REGISTRO TARDIO DE NASCIMENTO. EXTRAVIO DOS DOCUMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO CIVIL DA GENITORA E DA DECLARAÇÃO DE NASCIDO VIVO FORNECIDA PELA MATERNIDADE. MORTE DO GENITOR ANTES QUE SE PROCEDESSE AO REGISTRO CIVIL DO NASCITURO. DESNECESSIDADE DE PROPOSITURA DE AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE E DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA GENÉTICA. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA

94

Apelação Cível n. 2007.038936-1, de Criciúma . Relator: Marcus Tulio Sartorato . Juiz Prolator: Não. Informado . Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Civil . Data: 10/01/2008

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FILIAÇÃO PATERNA, NESTA SEDE, E POR INTERMÉDIO DE TODAS AS PROVAS ADMITIDAS EM DIREITO. DESSACRALIZAÇÃO DO EXAME DE DNA. ARCABOUÇO PROBATÓRIO SUFICIENTE À DEMONSTRAÇÃO DA RELAÇÃO PATERNO-FILIAL. DECLARAÇÕES DE FAMILIARES DO FALECIDO QUE DEMONSTRAM, ESTREME DE DÚVIDA, A UNIÃO ESTÁVEL COM A MÃE DA INFANTE POR MAIS DE DEZ ANOS, DA QUAL NASCERAM OUTROS TRÊS FILHOS. DIREITO AO NOME E À IDENTIFICAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (ARTS. 16 E 1.605 DO CC/02, ART. 332 DO CPC, ARTS. 46 E 50 DA LEI N. 6.015/1973 E ART. 1º, INC. III, DA CR). RECURSO DESPROVIDO. 1. Em sede de ação de registro tardio de nascimento, nada obsta a declaração incidental da paternidade, especialmente na hipótese de inexistir litigiosidade quanto à filiação e desde que do arcabouço probatório exsurja, com dose quase absoluta de certeza, o laço biológico entre a nascitura e o finado genitor dela, o qual, comprovadamente, manteve com a mãe da infante união estável por mais de 10 (dez) anos e da qual advieram outros 3 (três) filhos, estes devidamente registrados. 2. O princípio da DIGNIDADE da pessoa HUMANA alberga o direito

à identificação, nele compreendido o nome e sobrenome, pelo que o registro do nascimento, mesmo que tardio, ante as provas coerentes e seguras coligidas ao processo deve ser garantido ao indivíduo que teve obstado seu assento em virtude do extravio dos documentos de identificação civil da mãe e da concomitante e súbita morte do pai.

Como fundamentação utilizou:

Penso que, agir de modo contrário, como o quer o recorrente, seria negar à recorrida o direito de personalidade relativo ao nome e à identificação, constante art. 16 do Código Civil de 2002, afrontando, conseguintemente, o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, insculpido no art. 1º, inc. III, da Constituição

Federal.95

O direito de identificação, como nome, sobrenome, mesmo que

seja de forma tardia, o princípio da dignidade assegura isto também a qualquer

pessoa.

Diante do demonstrado, denota-se que mesmo diante de todas

as falhas e situações existentes onde o princípio da dignidade da pessoa humana

encontra-se aplicado precariamente ou muitas vezes ausente por completo, existe a

preocupação de resguardar este princípio na vida de cada pessoa humana.

95

Apelação Cível n. 2008.008468-4, de Lages . Relator: Eládio Torret Rocha. Juiz Prolator: Sílvio Dagoberto Orsatto. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Civil. Data: 25/10/2010

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente monografia teve como objeto a verificação da

existência ou não da aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, se está

ocorrendo e em que situações e se está realmente sendo efetiva.

Ante o exposto, no decorrer da pesquisa, verificou-se que

existe a aplicação dos princípios, de forma concreta, mesmo que possa parecer ser

abstrata, já que eles são o guia de qualquer norma no âmbito jurídico.

Para se chegar ao pretendido, que foi analisar a aplicação e

efetivação do Princípio da Dignidade Humana, foi necessária a construção de três

capítulos, cada qual com seus próprios objetivos. O primeiro tinha como objetivo

verificar onde estavam localizados os princípios na nossa constituição, bem como o

conceito, nas várias acepções doutrinárias existentes. Necessário foi ainda, fazer

uma breve diferenciação no que tange aos princípios, normas, regras e valores, para

mostrar que cada um é diferente e possuiu suas próprias características.

Demonstrado a fundamentação bem como o conceito de

princípio, com o referente sempre em mente, foi abordado no segundo Capítulo

especificadamente o princípio da Dignidade Humana, com toda a sua evolução

histórica até os dias atuais, demonstrando que a sua introdução no mundo jurídico

adveio de muito sofrimento pela humanidade, que então sentiu a necessidade de

resguardá-lo como um fundamento essencial à nossa existência.

Feito o estudo acerca da evolução de tal princípio, iniciou-se o

terceiro capítulo, abordando a sua aplicação. Primeiramente foi demonstrado que

mesmo assegurado como direito fundamental, princípio que rege a nossa

Constituição existem vários casos onde ainda hoje, claramente verifica-se a sua

ausência, situações que ano após ano perduram e nada é feito para que não ocorra

mais. Mas seguidamente, demonstra quais as situações onde é aplicado o princípio,

e que mesmo estando ausente em certas situações, a esperança de que um dia sua

efetivação seja completa continua.

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Terminando o trabalho proposto, isto é, a descrição dos

capítulos, entende-se não só por conveniência, mas também, pelo prumo

metodológico, ressaltar alguns itens que correspondem aos problemas e as

hipóteses que se formularam na introdução.

Tinha-se como primeiro problema: Princípio é aplicado

concretamente ou abstratamente no sistema jurídico atual? Como resposta a esse

problema elegeu-se a seguinte hipótese: Visto que por se tratarem de fundamento,

mandamento nuclear de qualquer sistema jurídico, tanto a regra, como normas, ou

qualquer disposição jurídica existente terá de respeitar sempre o que dispõe os

princípios, o que por sua vez, desta forma acaba por concretizar a sua aplicação.

Por sua vez o segundo problema que se tinha era: Existe a

observância do princípio da dignidade humana de forma individual e coletivamente?

Como resposta tem: A observância do princípio da dignidade humana se da de

forma individual como coletivamente, porém não inteiramente, nem sempre há o

respeito à pessoa como deveria ser, da forma como está disposta no referido

princípio, existem sérias falhas, até mesmo porque, quando se trata de seres

humanos, cada um defendendo os seus interesses, este mesmo, é capaz de ferir a

dignidade do outro em detrimento do seu interesse, da mesma forma analisando

coletivamente, pois sempre será uma pessoa que tomará a decisão por outra, se

tratando do Estado, o que induz é que esta também defenderá os seus interesses

primeiramente e após o coletivo.

No terceiro problema tinha-se: Ocorre a aplicação adequada do

princípio da dignidade humana pelo tribunal?Elegeu-se a seguinte hipótese: Ocorre,

ou ao menos não se pode alegar sua completa ausência, com certeza poderia mais

do que já o faz, porém, muitas vezes devido à grandes divergências de interesses,

um causa o desrespeito ao outro, muitas vezes sem perceber, contribuído ainda

mais para cada dia se perceba mais e mais a ausência da dignidade humana.

Verifica-se que analisando as decisões pelo Tribunal do Estado

de Santa Catarina em suas decisões, pondera-se sempre o referido princípio, mas

no que tange a sua aplicação diariamente, no cotidiano de cada um a aplicação do

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princípio se da de forma não completa. Falta muito para vivermos em um mundo

completamente digno.

Estas são as considerações que se julgam oportunas a

apresentar. O que se verifica é que, conforme todo o exposto, necessário é uma

aplicação melhor desse princípio, para que se possa viver de forma digna e honrosa.

E quem ler este trabalho terá a oportunidade de repensar em cada gesto ou ato seu

e começar a prestar atenção se estes atos ou gestos não estão ferindo um direito ou

a dignidade de alguém, para que então possa cobrar para si a mesma coisa. A

EFETIVAÇÃO DA DIGNIDADE HUMANA.

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Apelação Cível n. 2007.038936-1, de Criciúma . Relator: Marcus Tulio Sartorato . Juiz Prolator: Não. Informado . Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Civil . Data: 10/01/2008.

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ANEXOS

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948

Preâmbulo

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da

família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo,

Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os todos gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum,

Considerando ser essencial que os direitos humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o ser humano não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão,

Considerando ser essencial promover o desenvolvimento de relações amistosas

entre as nações,

Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla,

Considerando que os Estados-Membros se comprometeram a promover, em

cooperação com as Nações Unidas, o respeito universal aos direitos e liberdades humanas fundamentais e a observância desses direitos e liberdades,

Considerando que uma compreensão comum desses direitos e liberdades é da mais alta importância para o pleno cumprimento desse compromisso,

agora portanto,

A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos

como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua

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observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.

Artigo I. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Artigo II.

1. Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. 2. Não será também feita nenhuma distinção fundada na condição política, jurídica ou internacional do país ou território a que pertença uma pessoa, quer se trate de um território independente, sob tutela, sem governo próprio, quer sujeito a qualquer outra limitação de soberania.

Artigo III. Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo IV.

Ninguém será mantido em escravidão ou servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas formas.

Artigo V. Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.

Artigo VI. Todo ser humano tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como pessoa perante a lei.

Artigo VII. Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Artigo VIII. Todo ser humano tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.

Artigo IX.

Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.

Artigo X. Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.

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Artigo XI.

1. Todo ser humano acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. 2. Ninguém poderá ser culpado por qualquer ação ou omissão que, no momento, não constituíam delito perante o direito nacional ou internacional. Também não será imposta pena mais forte do que aquela que, no momento da prática, era aplicável ao ato delituoso.

Artigo XII.

Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, em sua família, em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.

Artigo XIII.

1. Todo ser humano tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das fronteiras de cada Estado. 2. Todo ser humano tem o direito de deixar qualquer país, inclusive o próprio, e a este regressar.

Artigo XIV.

1. Todo ser humano, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países. 2. Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XV. 1. Todo homem tem direito a uma nacionalidade. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.

Artigo XVI. 1. Os homens e mulheres de maior idade, sem qualquer restrição de raça, nacionalidade ou religião, têm o direito de contrair matrimônio e fundar uma família. Gozam de iguais direitos em relação ao casamento, sua duração e sua dissolução. 2. O casamento não será válido senão com o livre e pleno consentimento dos nubentes. 3. A família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado.

Artigo XVII.

1. Todo ser humano tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade.

Artigo XVIII.

Todo ser humano tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar

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essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, em público ou em particular.

Artigo XIX. Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

Artigo XX.

1. Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. 2. Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Artigo XXI. 1. Todo ser humano tem o direito de fazer parte no governo de seu país diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2. Todo ser humano tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país. 3. A vontade do povo será a base da autoridade do governo; esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.

Artigo XXII. Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social, à realização pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade.

Artigo XXIII.

1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Todo ser humano que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e a neles ingressar para proteção de seus interesses.

Artigo XXIV.

Todo ser humano tem direito a repouso e lazer, inclusive a limitação razoável das horas de trabalho e a férias remuneradas periódicas.

Artigo XXV.

1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar-lhe, e a sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. 2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas

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as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio gozarão da mesma proteção social.

Artigo XXVI. 1. Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito. 2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos, e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz. 3. Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos.

Artigo XXVII. 1. Todo ser humano tem o direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir das artes e de participar do progresso científico e de seus benefícios. 2. Todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor.

Artigo XXVIII.

Todo ser humano tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos na presente Declaração possam ser plenamente realizados.

Artigo XXIX. 1. Todo ser humano tem deveres para com a comunidade, na qual o livre e pleno desenvolvimento de sua personalidade é possível. 2. No exercício de seus direitos e liberdades, todo ser humano estará sujeito apenas às limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento e respeito dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática. 3. Esses direitos e liberdades não podem, em hipótese alguma, ser exercidos contrariamente aos objetivos e princípios das Nações Unidas.

Artigo XXX. Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos.