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    UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

    ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL

    A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA PARA O

    TRATAMENTO DE ÁLCOOL E OUTRAS

    DROGAS

    Joelma Santos da Costa

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    Rio de Janeiro

    2008

    Joelma Santos da Costa

    A IMPORTÂNCIA DA FAMÍLIA PARA O TRATAMENTO

    DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS

    Trabalho de Conclusão de Curso deGraduação, apresentado aoDepartamento de Fundamentos doServiço Social da Escola de ServiçoSocial da Universidade Federal do Rio de

    Janeiro.

    Orientadora: Prof. Dr. Mariléia FrancoMarinho Inoue

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    Rio de Janeiro2008

     A importância da família para o tratamento de álcool e outras

    drogas

     Autor:

    Joelma Santos da Costa

    Orientador:

    Prof. Dr. Mariléia Franco Marinho Inoue

    Examinadores:

    Prof. Dr. Luiz Eduardo Acosta Acosta

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    Joelma Santos da Costa

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    AGRADECIMENTOS

     Agradeço a Deus por tornar possível esta conquista em minha vida que

    sem dúvida possibilitou meu crescimento pessoal e sempre me amparou nos

    momentos difíceis que não foram poucos.

     À minha família principalmente a minha mãe Maria José, pela

    compreensão e ajuda que me foi dada durante toda a minha vida e

    especialmente durante o período acadêmico, o que tornou possível aconcretização desta vitória.

     Ao meu irmão George que muito contribuiu para minha permanência na

    universidade.

     À minha orientadora a professora Mariléia Inoue que teve muita

    paciência e sempre entendeu as minhas dificuldades, inclusive quandodesanimei em algumas situações, tranqüilizou-me nos momentos em que

    estava apreensiva se conseguiria tornar realidade um sonho, a conclusão

    deste trabalho que é algo cristalino em minha vida, um troféu, por tudo que vivi.

     Ao meu namorado Luiz Carlos que de forma indireta contribuiu com o

    trabalho através de discussões sobre assuntos que mesmo sem que ele

    percebesse articulei a pesquisa realizada neste estudo.

     Agradeço ao empenho e dedicação do meu supervisor de estágio Ivan

    Freire Nunca esquecerei o incentivo e presteza dedicado durante todo período

    de convivência no Hospital Escola São Francisco de Assis.

     Aos meus amigos e todos os professores que me deram força e apoio

    sempre com muito otimismo e palavras positivas.

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     Agradeço a todos pela contribuição!

    Eu sei,Que os sonhos são pra sempre.Eu sei, Aqui no coração...Eu vou ser mais do que eu souPra cumprir as promessas que eu fizPorque eu sei que é assimQue os meus sonhos dependem de mimEu vou tentar, sempreE acreditar que sou capazDe levantar uma vez mais.

    Eu vou seguir, sempreSaber que ao menos eu tenteiE vou tentar mais uma vezEu vou seguir...Não sei,Se os dias são pra sempre.Guardei,Você no coração...Eu vou correndo atrás, Aprendi que nunca é demaisVale a pena insistir

    Minha guerra é encontrar minha paz...Eu vou tentar, sempreE acreditar que sou capazDe levantar uma vez mais.Eu vou seguir, sempreSaber que ao menos eu tenteiE vou tentar mais uma vezEu vou seguir...

    Versão de Marina Elali e Dud Falcão

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    RESUMO

    O presente Trabalho de Conclusão de Curso discorre sobre a

    importância da família para o tratamento de álcool e outras drogas e o

    interesse pelo referido tema surgiu a partir da experiência de estágio no

    HESFA  –  Hospital Escola São Francisco de Assis e tem como objetivo

    compreender o processo no qual as famílias de usuários de álcool e outras

    drogas estão inseridos.

    Buscou-se enfatizar a importância da família no processo de tratamento

    familiar, articulando o contexto social à dinâmica vivenciada pela família em

    relação a dependência química. A família como principal agente de

    socialização do indivíduo tem uma contribuição fundamental a dar na

    recuperação e na reintegração social de usuários de álcool e outras drogas.

    Foram analisados os prejuízos ocasionados em decorrência do uso de

    drogas para que se possa encontrar alternativas saudáveis e trazer adiscussão das drogas para o âmbito da saúde na perspectiva de qualidade de

    vida e descriminalização do usuário.

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    ABREVIATURAS

     ABEAD – Associação Brasileira de Estudos do Álcool

     AIDS –  Síndrome de Imunodeficiência Adquirida

     A A – Alcoólicos Anônimos

     AL-ANON – Grupos Familiares

    CEBRID – Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas

    DST – Doenças sexualmente Transmissível

    HESFA – Hospital Escola São Francisco de Assis

    HUPE – Hospital Universitário Pedro Ernesto

    MS – Ministério da Saúde

    N A – Narcóticos Anônimos

    NEPAD – Núcleo de Estudos e Pesquisa em Atenção ao Uso de Drogas

    OBID – Observatório Brasileiro de Informação sobre Drogas

    OEA –  Organização dos Estados Americanos

    OMS – Organização Mundial de Saúde

    SENAD – Secretaria Nacional Antidrogas

    UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro

    UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e

    Cultura

    UNIAD – Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas

    UNIPRAD – Unidade de Projetos Relacionados ao Uso de Drogas

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    ONU –  Organização das Nações Unidas

    LISTA DE TABELAS

    Tabela I - Terminologia e Conceitos Básicos sobre Drogas

    Tabela II  – Classificação das Drogas Quanto a Ação no Sistema Nervoso Central

    Tabela III - Classificação dos Níveis de Prevenção

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    SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO...........................................................................................................

     

    1 - CAPÍTULO I  – A família em constante mudanças .....................................

    1.1 Perspectiva Histórica .....................................................................................

    1.2 O que é família..................................................................................................

    1.3 A mulher no âmbito familiar ............................................................................

    1.4 A configuração da família nos anos 90 ............................................................

     

    2 - CAPÍTULO II  – Droga e Família ....................................................................

    2.1 Considerações sobre drogas ...........................................................................

    2.1.1 Dependência .................................................................................................

    2.1.2 Por que tratar...................................................................................................

    2.1.3 Por que a família é importante no tratamento ................................................

    2.1.4 A influência da mídia no consumo de drogas .................................................

     

    3 - CAPÍTULO III –

     Trabalhos Diferenciados e Equipes Interdisciplinares

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    Tratamento da Dependência Química.........................38 

    3.1 O Trabalho dos Grupos de Apoio aos Dependentes Químicos e suas

    Famílias......................................................................................................................

     3.1.1 Alcoólicos Anônimos (AA)..............................................................................

     3.1.2 Narcóticos Anônimos (NA).............................................................................

    3.1.3 Grupos Familiares (AL-ANON)........................................................................

    3.2 O Trabalho do NEPAD.....................................................................................

    3.2.1 O Trabalho do HESFA................................................................................... .

    3.2.2. O Trabalho do Centra-Rio ...............................................................................

     

    4 - CAPÍTULO IV - A Análise dos Dados Obtidos na Pesquisa....................

    4.1 Universo Pesquisado.....................................................................................

    4.2 Identificação das famílias entrevistadas.........................................................

    4.3 Quanto à percepção do que é família.............................................................

    4.4 Quanto aos prejuízos que ocorreram na família em decorrência do uso da

    droga..........................................................................................................................

    4.5 O processo de Co-dependência......................................................................

    4.6 Análise do discurso das Assistentes sociais....................................................

    4.6.1 Quanto ao trabalho interdisciplinar ................................................................

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    4.7 Análise do discurso dos demais profissionais.................................................

    4.7.1 A relevância da família no tratamento ............................................................

    4.7.2 Fatores negativos e positivos no Grupo de Família ........................................

    4.7.3 O acolhimento aos familiares de usuários em tratamento...............................

     

    CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................

     

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................

     

    ANEXOS....................................................................................................................

     

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    INTRODUÇÃO

    O uso de drogas1 vem tomando proporções muito expressivas em todo omundo.

    De acordo com a ONU, em todo o planeta, 162 milhões de pessoas,entre 15 e 64 anos de idade, seriam usuárias de maconha, ou seja,4% da população mundial. O Brasil é o quinto país da América do Sulno consumo de maconha entre estudantes de ensino médio, deacordo com estudo realizado pelas Nações Unidas e pelaOrganização dos Estados Americanos (OEA) (Revista, Mundo emFoco, 2007. p. 47).

    Diante desse quadro, este estudo de graduação inicialmente intenciona

    analisar a família do usuário ou dependentes de drogas como uma categoriaque em decorr ência das transformações que ocorrem na sociedade capitalista

    sofrem implicações nas relações sociais e tem conseqüências singulares no

    indivíduo e conseqüentemente em sua família. 

    O uso de álcool e outras drogas vêm expressando significados distintos

    de acordo com o processo histórico. O consumo e agravos sociais decorrentes

    do uso e abuso de substâncias constatam a proporção de grave problema de

    saúde pública no país por isso o enfrentamento desta problemática constituiuma demanda mundial.

    De acordo com a Organização Mundial de Saúde, cerca de 10% daspopulações dos centros urbanos de todo o mundo consomemabusivamente substâncias psicoativas2, independentemente de sexo,idade, nível de instrução e poder aquisitivo (BRASIL, 2004, p.5).

    É necessária uma ação política eficaz que vise o fortalecimento das

    redes de assistência associada à de saúde que possibilite a reinserção social

    e a reabilitação dos usuários. A política social não pode ser analisada sem se

    remeter a questões de desenvolvimento econômico, ou seja, a transformação

    quantitativa e qualitativa das relações econômicas decorrentes do processo de

    acumulação particular de capital (VIEIRA, 2004, p.142).

    Os assistentes sociais compõem uma das categorias profissionais

    envolvidas na implementação de políticas sociais e seu significado social só

    1 Droga é toda substância que introduzida no organismo, pode modificar uma ou mais de suasfunções (Organização Mundial de Saúde).

    2  As substâncias psicoativas atuam no cérebro alterando o psiquismo.

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    será entendido ao levar em consideração tal característica (IAMAMOTO e

    CARVALHO, 2003).

    Os diversos serviços sociais previstos em políticas sociais específicassão uma expressão da classe trabalhadora em sua luta por melhorescondições de trabalho e de vida, que são consubstanciadas eratificadas na legislação trabalhista (IAMAMOTO e CARVALHO,2003, p. 2).

     A afirmação de elaboração de estratégias e propostas para efetivar e

    consolidar o modelo de atenção ao usuário de álcool e outras drogas não deve

    reduzir esta questão a um problema exclusivo de atenção à saúde. É preciso

    buscar uma articulação com outras políticas que visem subsidiar a intervençãoprofissional, tais como assistência, habitação e previdência.

    O presente trabalho se estrutura da seguinte forma: no capítulo I  A

    Família em constante mudança, é trabalhado o contexto no qual se constitui a

    família a partir das transformações presentes na sociedade.

    No capítulo II Drogas e Família, abordamos em primeiro lugar os

    conceitos acerca da droga a fim de subsidiar o exercício profissional dos

    envolvidos no tratamento da dependência química, e, em seguida, a dinâmica

    das famílias dos dependentes e qual a importância de inseri-las neste

    processo, bem como a influência da mídia no consumo de drogas.

    O capítulo III Trabalhos Diferenciados e Equipes Interdisciplinares no

    Tratamento da Dependência Química, apresentamos alguns trabalhos que são

    desenvolvidos no tratamento de dependentes químicos e suas famílias, nas

    diversas instituições que atuam no município do Rio de Janeiro.

    No capítulo IV  A Análise dos Dados Obtidos na Pesquisa, através dapesquisa qualitativa realizada nas instituições HESFA, Alcoólicos Anônimos,

    NEPAD Narcóticos Anônimos, Narcóticos Anônimos, AL-ANON e Centra Rio

    realizamos uma análise das formas de atendimento acerca desta demanda e o

    direcionamento do Serviço Social na prática interventiva.

    O presente estudo pretende contribuir para sinalizar não apenas a

    importância da família em todo o processo de recuperação dos adictos3 como

    3  O termo mais utilizado em grupos de auto-ajuda para designar o indivíduo que tem dependência química dedeterminadas substâncias. 

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    também o adoecimento vivenciado pelos familiares e a necessidade de apoio e

    atendimento profissional.

    Os relatos dos que trabalham com o uso de drogas e dependência

    química tem mostrado que é imprescindível incluir a família no processo de

    reabilitação do dependente. Esta discussão será iniciada no capítulo I

    ilustrando as constantes mudanças vivenciadas pela família e aprofundada no

    capítulo II.

    Muitos estudos, de diferentes referenciais teóricos, ressaltam a

    importância da família tanto na prevenção quanto no tratamento dos

    dependentes químicos, o que reforça a visão da dependência química como

    um fenômeno que atinge não apenas o individuo, mas toda a família.

    Tanto os jovens quanto os adultos fazem uso de drogas porque a

    realidade social não está atendendo as necessidades humanas. Inserir a

    discussão do uso de drogas na perspectiva de qualidade de vida evitando a

    criminalização do indivíduo amplia o debate em estudo.

    O objetivo geral desta pesquisa é analisar as repercussões do uso

    abusivo de álcool e outras drogas na família de usuários em tratamento. Assim

    pretendemos traçar um perfil das famílias, o tipo de auxílio prestado pela

    família no tratamento de usuários de drogas, também analisar as diferenciadas

    modalidades de atendimento disponibilizadas a estes usuários e abordaremos

    os encaminhamentos do Serviço Social no tratamento.

    O problema das drogas interroga a natureza e o sentido da existência. A

    ciência pode contribuir muito significativamente para a clareza do debate,

    operacionalizando conceitos e elucidando aspectos psicológicos, socioculturaise biológicos das toxicodependências4 (BAPTISTA e INEM, 1997,p.195 ).

    Sendo a família o principal agente de socialização do indivíduo

    (CARVALHO, 2005 p.13), e o lugar inicial para o exercício da cidadania se faz

    necessário dispensar a esta categoria sua devida importância na vida do

    indivíduo. Por ser a família um espaço privilegiado de convivência isto não

    significa que não haja conflitos e a forma de lidar com as dificuldades poderá

    4 Toxicodependência é um fenômeno gerado pelo uso contínuo de drogas que leva o corpo a produzir outro equilíbrio.

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    favorecer o tratamento, mas em algumas situações o resultado pode ser

    contrário. Não basta apenas o paciente querer deixar de ser dependente

    químico é preciso ter o apoio da família para que se efetive a superação desta

    doença. A família através das articulações constantes no dia-a-dia pode

    favorecer ou atrapalhar o andamento do tratamento por isso o trabalho a ser

    desenvolvido com as famílias é fundamental para obtenção de resultados

    satisfatórios.

    É conferida relevância à reflexão sobre a questão da importância da

    família no tratamento, nas instituições que desenvolvem trabalhos na

    perspectiva de prevenção e recuperação de adictos, a fim de buscar o apoio da

    família durante o processo de acompanhamento dos atendimentos, mas

    também trabalharem fatores externos que determinaram ou levaram o usuário

    à dependência5. 

    O impacto que a família sofre com o uso de drogas por um dos seus

    integrantes abala as estruturas de todos os seus membros embora a origem do

    uso de drogas possa estar na própria família.

     A perspectiva da saúde pública considera todas as drogas em pé de

    igualdade e analisa as suas implicações globalmente em termos de riscos para

    a população formulando os problemas (BAPTISTA e INEM, 1997, p.198).

    O presente estudo faz-se necessário devido à intervenção do Serviço

    Social, que pode esclarecer aspectos da questão junto à família no que se

    refere ao uso de drogas, tendo em vista que esta temática está cada vez mais

    presente na sociedade como mediadora das relações sociais (HYGINO e

    GARCIA, 2003, p.220). O Assistente Social, em seu exercício profissional sedepara cotidianamente com esta demanda e suas decorrências vivenciando

    impasses e limites devido à escassez de recursos disponibilizados na rede

    pública de atendimento ao usuário de drogas.

    5  Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/livre_das drogas acessado em 08 de agosto de 2007. 

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    CAPÍTULO I

    FAMÍLIA EM CONSTANTE MUDANÇA

    1.1 - Perspectiva Histórica.

     A família brasileira no decorrer da história sofreu transformações que

     justificam o mapeamento da realidade vivenciada por estas famílias nos dias

    atuais.Numa retrospectiva breve da história a partir do século X, tomando como

    base Àries (1981), veremos que até o referido século, a família, inclusive em

    termos de patrimônio, não tinha expressão. A partir de então, em decorrência

    das oscilações do Estado, a concepção de linhagem ganha força tendo como

    uma das preocupações a não divisão do patrimônio.

    Na sociedade agrária e escravocrata do Brasil colonial, a família era a

    organização fundamental, desempenhando as funções econômicas e políticas.

    O modelo de família patriarcal decorreu da transposição para os trópicos

    brasileiros, de padrões culturais portugueses. Impondo seu domínio na Colônia,

    subjugando os indígenas e mais tarde, importando escravos negros, os

    portugueses foram destruindo formas familiares próprias desses grupos.

    No século XIV, começam a se operar mudanças na família medieval,

    que vão se processar até o século XVII. Neste período é importante destacar

    que a situação da mulher é também alvo de mudanças, caracterizadas pela

    perda gradativa de seus poderes, o que culmina, no século XVI, com a

    formalização da incapacidade jurídica da mulher casada e a soberania do

    marido na família (GUEIROS, 2002).

    “Desta forma, a legislação reforça poder do marido e dos homens em

    geral, estabelecendo a desigualdade entre o homem em geral, estabelecendo a

    desigualdade entre o homem e a mulher”. (GUEIROS, p. 106). A escolaridade,

    por exemplo, passa a ser extensiva a meninas somente no final do século XVII

    e início do século XIX .

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    Somente no século XV as crianças (especificamente os meninos)passam gradativamente, a ser educadas em escolas e a famíliacomeça a se concentrar em torno delas, garantindo-se, entre outras

    coisas, a transmissão de conhecimentos de uma geração a outra pormeio da participação das crianças na vida dos adultos (GUEIROS,2002, p. 105).

     As transformações ocorridas no século XIX com o advento da

    urbanização, o início da industrialização, a abolição da escravatura e a

    imigração provocam, segundo Antônio Cândido, autor clássico da literatura a

    passagem da família extensa para o modelo conjugal, com privilégio das

    funções afetivas. O ingresso da mulher na força de trabalho rompe a tradicional

    divisão do trabalho. Os casamentos começam a ser realizados por interesses

    individuais. As atitudes em relação ao namoro se alteram e este se desloca dos

    limites da casa para os espaços abertos. Na “nova família” há maior igualdade

    entre os sexos, maior controle de natalidade, maior número de separações e

    de novos casamentos.

     A partir da segunda metade do século XIX, o processo de modernização

    e o movimento feminista provocam outras mudanças na família o modelo

    patriarcal6, vigente até então, passa a ser questionado. Começa a sedesenvolver a família conjugal moderna, na qual o casamento se dá por

    escolha dos parceiros, com base no amor romântico, presente na sociedade

    durante muito tempo, tendo como perspectiva a superação da dicotomia entre

    amor e sexo e novas formulações para os papéis do homem e da mulher no

    casamento (GUEIROS, 2002, p. 107).

     A urbanização e a expansão da indústria se acentuam nas primeiras

    décadas deste século, produzindo mudanças significativas nas feições dafamília e de toda sociedade (BRUSCHINI, 1990, p.69).

     A partir da década de 70 vêm à tona novas questões para se pensar a

    família como agência de reprodução ideológica, onde a vida cotidiana é o

    ponto de partida para o estudo do âmbito ideológico. É no “fazer” de todos os

    6  Denominamos família patriarcal, genericamente, a família na qual os papéis do homem e damulher e as fronteiras entre o público é o privado são rigorosamente definidos; o amor e o

    sexo são vividos em instâncias separadas, podendo ser tolerado o adultério por parte dohomem e atribuição de chefe da família é tida como exclusivamente do homem (GUEIROS,20021, p. 107).

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    dias que surgem e se modificam ou desaparecem idéias, atos e relações. A

    origem de pressupostos ideológicos se encontra na casa, nos hábitos das

    pessoas ou de um grupo. Para reproduzir a sociedade é preciso que os

    homens particulares se reproduzam como tal. A vida cotidiana é um conjunto

    de atividades que caracteriza a reprodução dos homens particulares criando,

    por sua vez a possibilidade de reprodução social.  A construção de uma vida

     pautada na felicidade é, portanto um compromisso de cada ser humano e,

    mais especialmente, da família enquanto grupo voltado para tal fim ( HELLER,

    1987, p. 7). 

    Não dá para pensar no átomo do parentesco a partir da unidade

    biológica, o que o leva a introduzir na análise a dimensão cultural: para se

    formar a família precisa de dois grupos que se casam fora do seu pr óprio

    grupo. O casamento nas sociedades primitivas, contudo não se originava dos

    indivíduos, mas de grupos interessados. A união entre os sexos não era um

    assunto privado (Lévi-Strauss, 1980). 

    Foi Lévi- Strauss, com as estruturas elementares do parentesco quemdeu o passo decisivo para a desnaturalização da família biológica ofoco principal [...] A família passou a ser vista como a atualização deum sistema mais amplo [...] Para ele o fundamento da família nãoestá na natureza biológica do homem, mas na natureza social(SARTI, 1995, p. 41).

    Freud mostrou que a mente não é algo previamente dado, mas sim uma

    estrutura construída na infância através de um longo processo de formação da

    personalidade e de estabelecimento de vínculos afetivos e emocionais que

    ocorre dentro da estrutura familiar (BRUSCHINI, 1990, p.62). 

    O fato de a vida familiar fazer parte do mundo simbólico de todas as

    pessoas e estar fortemente influenciada por valores morais, religiosos e

    ideológicos tem feito com que muitas vezes se tenha a ilusão de que as

    discussões sobre família estão assentadas sobre bases comuns. Ao estudar o

    discurso dos Assistentes Sociais sobre família, Silva (1984) assinalou a

    tendência de conceituarem a família a partir de suas próprias famílias e de

    enfatizarem as relações parentais a partir da consangüinidade. Ainda hoje no

    contexto das discussões dos profissionais que trabalham com famílias estão

    presentes esta visão de família. A família pode ser entendida como um fato

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    cultural, historicamente condicionada que não se constitui, a priori, como um

    “lugar de felicidade”. O ocultamento do caráter histórico determina socialmente

    a família como um espaço de felicidades (MIOTO, 1997).

    Por meio do estudo das estruturas elementares do parentesco, Lévi-

    Strauss (1976) chegou à tese de que a família surgiu no imbricamento entre a

    natureza e a cultura. Essa tese permitiu afirmar a supremacia da regra cultural

    da afinidade sobre a regra natural da consangüinidade.

     A pesquisa histórica de Ariès (1981) sobre a sociedade européia mostra

    claramente as diferenças na organização familiar ao longo da história, de modo

    que, foi na modernidade que se estabelecem os limites entre o familiar e o

    social. Nesta época se desenvolveu a idéia de privacidade, o “sentimento da

    casa”, e assim o sentimento familiar (originário da aristocracia e da burguesia)

    estendeu-se praticamente a toda sociedade, persistindo até nossos dias.

    Dentro dessa nova ordem as crianças foram retiradas da vida comum bem

    como de grande parte do tempo e das preocupações dos adultos.

     A família no contexto das fronteiras entre o público e o privado com base

    na sociedade francesa do pós-guerra até os nossos dias, aponta para

    historicidade da construção desses espaços. As mudanças no mundo do

    trabalho, com a dissociação família e empresa, foram fundamentais na

    constituição da família atual, cujas relações se alteraram significativamente.

    Dentro dessa nova ordem os indivíduos conquistaram na família o direito à

    autonomia, reconhecimento de uma vida privada individual até então

    desconhecida. Ressaltamos que esta alteração significa que a família pode

    estar deixando de ser uma instituição para se tornar um ponto de encontro devidas privadas, e assim estaria se encaminhando para as famílias informais.

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    1.2 - O que é Família. 

    No mundo externo ninguém tem piedade do outro e é dentro da família

    que cada um deseja receber atenção, respeito e reconhecimento. A casa não

    significa mais apenas o local de moradia agora é mais do que isso. Assim a

    família torna-se a esfera íntima de existência, o local exclusivo onde se pode

    exprimir a própria emoção e agregar-se aos outros. Representa ainda o lugar

    onde se pode refazer-se das humilhações sofridas no mundo externo, expandir

    a agressividade reprimida, exercitar o próprio autocontrole, repreender e vencer

    o outro. Diante de vários conflitos vivenciados pelos sujeitos na atualconjuntura, a família pode ainda ser um lugar onde se pode contar para

    extravasar suas angústias e ansiedades frente a tantos problemas

    (desemprego, desentendimentos com amigos, transportes, trabalho precário,

    baixos salários e outros) (HELLER, 1987).

    Na família são reproduzidos os padrões, os valores e os sistemas derelações sociais que são particularizados, vividos interiorizados aonível da família e de cada membro, na forma de continuidade edescontinuidade ( VITALE, 1987, p. 35).

     As trocas afetivas na família imprimem marcas que as pessoas carregam a

    vida toda, definindo direções no modo de ser com os outros afetivamente e no

    modo de agir com as pessoas. Esse ser com os outros, aprendido com as

    pessoas significativas, prolonga-se por muitos anos e freqüentemente projeta-

    se nas famílias posteriormente (SZYMANSKI,2002, p.12).

    Nas últimas décadas do século XX, novas mudanças ocorrem e são

    incorporadas pela Carta Constitucional: famílias monoparentais, por exemplo,

    e a condição do homem ou da mulher como chefe de família. Essas mudanças

    se processam entre conflitos e tensões e que certas características dos

    diferentes “modelos” de família convivem numa mesma família, acentuando,

    assim seu grau de complexidade (GUEIROS, 2002, p. 110). 

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    1.3. A mulher no âmbito familiar

     Ao examinar a história da civilização até a separação entre sociedade

    civil e Estado, ocorrida em fases sucessivas, do final do século XVIII em

    diante, seremos forçados a considerar meramente tautológica7 a expressão

    “as mulheres na família”. Na idade média, inclusive, as mulheres eram

    excluídas das reuniões do Estado. Tudo aquilo que se verificava fora do

    âmbito familiar, discussões políticas, comércio e guerra, era atividade

    reservada aos homens. As mulheres casadas, por outro lado, eram até mesmo

    excluídas das práticas religiosas. Durante todo processo histórico as mulheres

    envolvidas em questões relacionadas ao âmbito familiar, mesmo que de certa

    forma excluídas ou sem a sua devida importância (HELLER, 1987, p.8-9).

     A mulher tem um papel inquestionável no núcleo familiar e são

    destacadas como propulsoras de mudanças por meio de lutas no

    reconhecimento de seus direitos. Tidas sempre como a responsável pela

    socialização dos filhos e pelas tarefas domésticas.

     A mudança na ordem econômica mundial, a partir da década de 1970concorreu para a opção governamental no Brasil de adoção de ummodelo de desenvolvimento econômico que trouxe comoconseqüência o empobrecimento acelerado das famílias na décadade 1980. Acrescido a esse fato, houve a intensa migração do campopara a cidade e a ampliação dos padrões de exploração de mulherese crianças no mercado de trabalho, além da deterioração do setorpúblico na prestação de serviços, contribuindo para a queda dascondições de vida (COELHO, 2002, p. 76).

    Os cuidados com a saúde da família sempre foram competência

    exclusiva da mulher, cabia às mulheres ocuparem-se dos doentes, dos feridos

    e dos moribundos. Hoje na sociedade ainda estão vinculadas a mulher estes

    cuidados embora sua inserção no mercado de trabalho tenha submetido-a a

    outra dinâmica no seu dia-a-dia (HELLER, 1987).

     As mulheres no passado por não participarem mais diretamente das

    instituições sócio-políticas da sociedade, viveram quase sempre “em meio” aos

    acontecimentos. Estavam envolvidas nas batalhas dos homens, na troca de

    visita com os vizinhos, conservando, porém, além disso, suas atividades

    7 Consiste em dizer sempre a mesma coisa por formas diferentes.

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    produtivas. (HELLER, 1987, p.12).

     A família emerge, portanto como esfera prioritária de identificação

    feminina, isto é, o lócus no qual sua identidade é gerada, construída ereferida. Tal fenômeno se expressa, inclusive, no fato de a mulher sóconseguir se definir na ou através da família, esposa ou mãe(SALEM, 1981, p. 60 ). 

     A história da sociedade em que vivemos está repleta de modelos de

    famílias, que correspondem a diferentes papéis para homens e mulheres.

    Dentro desses papéis, aprendemos a pensar e a nos reconhecer. Nesta

    dinâmica no processo histórico as mulheres destacaram-se pela constante

    importância no âmbito familiar a exemplo da mãe que ocupa um lugar dedestaque. A divisão sexual dos papéis é uma realidade que vem sendo

    questionada pelas mulheres (mas também pelos homens) há alguns anos. A

    família contemporânea, que a literatura especializada chama de moderna

    intimista, nuclear, é uma realidade que vem constantemente sendo

    questionada em nosso dia-a-dia, o que, por implicação, tem demandado a

    revisão desses modelos (FREITAS, 2002).

    Na construção desses papéis, historicamente, coube às mulheres o

    espaço privado, o mundo da casa. Ser mãe foi o principal papel paraas mulheres nos discursos que a igreja e a medicina socialestabeleceram. Uma das grandes transformações presentes naconstituição desse ideal de família foi o sentimento da infância. Desdeo século XVIII, a criança passa a ocupar um lugar central no núcleofamiliar. Em torno dos filhos passa a girar a família, e à mulher coubea tarefa de materná-lo, educá-lo, de cuidar dele para que se tornasseum adulto disciplinado e ordeiro (FREITAS, 2002 p. 81). 

    É necessário que toda análise acerca da família leve em consideração

    às condições em que vivem as famílias, “não existe a mulher, a mãe” (Freitas,

    2002) ou a família. A construção desses papéis é resgatada a todo instante nasociedade.

     A entrada e o desempenho das mulheres (especialmente das mulheres

    casadas) no mercado de trabalho, nas universidades e nos mais diversos

    segmentos sociais é vista por Hobsbawm ( 2001 ) como um fenômeno novo e

    revolucionário.

    Embora a participação da mulher na esfera pública esteja associadaàs próprias dificuldades econômicas que exigiam a participação de

    um número maior de membros da família na composição doorçamento doméstico, certamente o movimento feminista nosespaços públicos contribuiu significativamente para esta vivência da

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    mulher também nos espaços públicos, anteriormente ocupadospredominantemente pelo homem (GUEIROS, 2002, p. 109).

    1.4 - A configuração da família nos anos 90

    Em decorrência do processo de modernização da sociedade na segunda

    metade do século XX a família brasileira sofreu mudanças significativas. Estas

    mudanças são compreendidas como decorrentes de diversos aspectos, dentre

    os quais se destacam:

    - o desenvolvimento técnico-científico, que proporcionou tantas invenções, osanticoncepcionais e o avanço dos meios de comunicação de massa.

    - a transformação e liberalização dos hábitos e dos costumes, especialmente

    relacionados à sexualidade e à nova posição da mulher na sociedade.

    Estas transformações revelaram um novo padrão demográfico na

    sociedade brasileira e acarretaram uma fragilização dos vínculos familiares e

    uma maior vulnerabilidade da família no contexto social onde não é possível

    falar de família, mas sim de famílias. O uso do plural se faz no sentido de

    abarcar, dentro da concepção família a diversidade de arranjos familiares

    existentes hoje na sociedade brasileira (MIOTO, 1997, p. 118).

    O reconhecimento da família como totalidade implica tambémreconhecê-la dentro de um processo de continuas mudanças. Estassão provocadas por inúmeros fatores nos quais estão aquelesreferentes à estrutura social em que as famílias estão inseridas eaqueles colocados pelo processo de desenvolvimento de seusmembros. Tais fatores constituem-se em fontes de estresse familiar econcorrem significativamente para o aparecimento das dificuldadesfamiliares e, conseqüentemente, para o surgimento dos membros

    sintomáticos (MINUCHIN, 1990).

    Pode-se dizer que a qualidade de vida das famílias depende da

    articulação que cada um consegue fazer entre as demandas internas e as

    demandas advindas de seu espaço social e as formas de lidar com as

    transformações ocorridas no âmbito das relações sociais (MIOTO, 1997,

    p.122).

     As mudanças produziram efeitos sobre a estrutura familiar, e na

    chamada “nova família” modernizaram-se as concepções sobre o lugar damulher nos alicerces da moral familiar e social. Ao contrário da família

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    tradicional a nova mulher “moderna” deveria ser educada para desempenhar o

    papel de mãe (também uma educadora dos filhos) e de suporte do homem

    para que ele pudesse trabalhar (NEDER, 2002, p. 31).

    Como exemplo das mudanças que ocorreram na estrutura familiar há

    que se ressaltar que duas famílias com a mesma composição podem

    apresentar modos de relacionamento completamente diferentes. O relevante,

    nesse caso são suas histórias, a classe social de pertencimento, a cultura

    familiar e sua organização significativa no mundo (SZYMANSKI, 2002, p. 17).

    Na família pobre as relações entre seus membros seguem um padrão

    tradicional de autoridade e é uma questão de ordem moral a subordinação dos

    projetos individuais aos familiares e a insistência na hierarquia. É nesse

    contexto que se estabelece a tarefa socializadora da família (SARTI, 1996).

    Numa cultura que valoriza o homem como o poderoso provedor dafamília, é desconcertante a situação em que a mulher, ou mesmofilhos adolescentes, consigam trabalho e remuneração maisfacilmente do que o “chefe da família” (SZYMANSKI, 2002, p. 18).

    Na sociedade moderna não existe um modelo padrão de organização

    familiar, devido às transformações no mundo do trabalho, nas relações sociais,culturais e políticas. Os diversos problemas vivenciados no âmbito familiar são

    decorrentes das mudanças mais amplas que estão ocorrendo. A dependência

    química é uma dessas conseqüências.

    Na história da civilização há presença de drogas em vários contextos:

    religioso, cultural, social, econômico, medicinal e cultural. A relação entre o

    homem e a droga é de longa data e está atualmente massivamente presente

    nos meios de comunicação estimulando o seu uso e propiciando emdecorrência deste uso uma série de problemas dentre os quais darei enfoque

    aos que ocorrem no âmbito familiar.

    Nos séculos XIX e XX, o advento da economia capitalista provocougrandes transformações sociais que repercutiram nos padrões decomportamento e conseqüentemente levaram a mudanças naestrutura familiar. Embora algumas dessas mudanças tenham sidograndemente reparadoras, outras provocaram o progressivoisolamento familiar, fatos que aliados a uma ideologia de consumo econdutora de uma busca de prazer instantâneo e imediatocontribuíram para o surgimento de conflitos e desastres dentre os

    quais apontamos o uso abusivo de drogas (BUCHER, 1988, p.52).

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    No Brasil as mudanças desencadeadas na década de 1990 com as

    políticas neoliberais através da reestruturação produtiva, o avanço tecnológico

    e a fragmentação e precariedade do trabalho ocasionou impactos na

    reprodução social. O crescente desemprego, a violência, a pobreza, o

    desmonte dos direitos sociais conquistados na década de 1980 e a

    vulnerabilidade dos grupos que cada vez mais tornam-se excluídos à margem

    da sociedade. Martins mostra que a pobreza, muito mais que falta de comida, e

    de habitação é “carência de direitos, de possibilidades, de esperança”

    (MARTINS, 1991, p. 11-15).

    Historicamente o homem e a droga são companheiros de muitos séculos

    conforme mencionado anteriormente, no entanto um fato se destaca nos dias

    de hoje em todo o mundo há uma expansão rápida. Podendo se assinalar à

    metade do século XX como ponto referencial.

     As mudanças que ocorrem no mundo afetam a dinâmica familiar como

    um todo e, de forma particular, cada família conforme sua composição historia

    e pertencimento social. (SZYMANSKI, 2002, p. 17). 

    Jovens e adultos tem feito uso abusivo de drogas em nossa sociedade

    questões como a violência doméstica, por exemplo, não pode ser vista

    separada do alcoolismo e consumo de outras drogas, que tem efeitos

    devastadores nas famílias e que não podem ser analisados fora de um quadro

    de referência da sociedade mais ampla (SZYMANSKI, 2002, p.20).

    É indispensável examinarmos aspectos que são compatíveis com o

    aumento do consumo de drogas numa sociedade cada vez mais competitiva,

    individualista e consumista. Há um favorecimento quanto ao uso de drogasonde não há restrição à classe social ou a determinada faixa de idade.

    Nesta perspectiva,

    Segundo estatísticas da Organização Mundial de Saúde, um emquatro habitantes do mundo recorre a drogas. Outro dado que sedestaca diz respeito à indústria farmacêutica que é, atualmente, umadas mais rendosas do mundo. Esses dados nos remete a existênciade regras tóxicas de sobrevivência. É um problema que envolveaspectos psicológicos, sanitários, educativos, políticos e sociais,exigindo, portanto integração entre ações preventivas, repressivas ede tratamento. (BUCHER, 1988, p. 48-49).

    Para entendermos as implicações do Neoliberalismo nas políticas

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    públicas sociais mais atuais, é significativo resgatar a conformação da política

    social no capitalismo do século XIX, construída a partir das mobilizações

    operárias sucedidas ao longo das primeiras revoluções industriais (VIEIRA,

    2004, p.140) e presente nas principais reivindicações trabalhistas, como fruto

    de contradições históricas do próprio capitalismo.

     A redução considerável dos gastos sociais indica uma redução dosserviços sociais públicos e dos subsídios ao consumo popular,contribuindo para deteriorar as condições de vida da maioria absolutada população, incluindo amplos setores das camadas médias(LAURELL, 1995, p. 151).

    Neste contexto a viabilização das políticas públicas de saúde deve ser

    reafirmada e o Assistente Social no seu exercício profissional deverá estar

    envolvido neste processo.

    Inúmeros são os desafios que permeiam a vida da família

    contemporânea. Várias temáticas estão envolvidas como violência intra e extra-

    familiar, desemprego, pobreza, drogas e tantas outras situações que atingem a

    família e desafiam sua capacidade para resistir e encontrar saídas. O impacto

    desses desafios e dessas mudanças sobre o cotidiano das relações familiares

    é absorvido pelo profissional que trabalha com famílias (VITALE, 2002, p. 45).Quando se lida com famílias, portanto depara-se com uma primeiradificuldade, a de estranhar-se relação a si mesmo. Como reaçãodefensiva, há uma tendência a projetar a família com a qual nosidentificamos – como idealização ou como realidade vivida  – no que éou deve ser a família, o que impede de olhar e ver o que se passa apartir de outros pontos de vista (SARTI, 1999, p.100).

    Entre as mudanças que estão ocorrendo no mundo, nenhuma é mais

    importante do que aquelas que acontecem em nossas vidas pessoais  –  na

    sexualidade, nos relacionamentos, no casamento e na família. É umarevolução que avança de maneira desigual em diferentes regiões e culturas,

    encontrando muitas resistências. O Assistente Social, assim como todos os

    profissionais também, estão inseridos nestas mudanças e precisam considerar

    estas transformações na atuação profissional (VITALE, 2002, p.60).

    Devido às imposições do neoliberalismo o Estado restringe sua

    participação, embora legalmente seja o responsável pela “solução” de

    questões de determinados segmentos  –  como, por exemplo, crianças,adolescentes, idosos, portadores de deficiências e pessoas com problemas

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    crônicos de saúde – a família tem sido chamada a preencher esta lacuna, sem

    receber dos poderes públicos a devida assistência para tanto (GUEIROS,

    2002, p.102). Diante do exposto coloca-se a reflexão da importância no que

    refere-se a família frente os desafios impostos aos profissionais e em particular

    ao Assistente Social que tem deparado com esta demanda cotidianamente.

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    CAPÍTULO II DROGA E FAMÍLIA

    2.1 - Considerações sobre drogas.

    Considerando a complexidade que envolve a discussão acerca

    desta temática na perspectiva multidisciplinar é necessário ir além da

    simplificação imposta na abordagem farmacológica médico-legal ou jurídica

    (Palatinik, 2002, p. 110).

    É importante ressaltar os conceitos básicos sobre drogas, os

    diferentes tipos de usuários, a classificação das drogas e os níveis de

    prevenção para entendermos a dinâmica na qual o profissional e o usuário está

    inserido. Estas informações podem contribuir na evolução do tratamento e

    instrumentalizar o profissional na sua atuação.

    TABELA I  – Terminologia e Conceitos Básicos sobre Drogas

    TERMINOLOGIA Conceitos BásicosMEDICAMENTO substância ou produto que se utiliza como remédio no

    tratamento de doença física ou mental.DEPENDÊNCIA QUÍMICA é um estado caracterizado pelo uso descontrolado de

    uma ou mais substâncias químicas psicoativas comrepercussões negativas em uma ou mais áreas da vidado individuo.

    TOLERÂNCIA é a necessidade do uso de doses crescentes de umadeterminada droga, para obter efeitos originalmentealcançados com doses menores ou a redução

    significativa do efeito, quando a dose consumida semantém estável.SINDROME DEABSTINÊNCIA

    é o conjunto de sintomas decorrentes da interrupção douso de uma droga.

    OVERDOSE é o uso de qualquer droga com produção de efeitosfísicos e ou mentais e freqüentemente letais, seja porquantidade excessiva, pureza da droga ou peladiminuição da tolerância do indivíduo.

    Fonte: “ Drogas: Conceitos Básicos”, Folder da Secretaria Especial de Prevenção àDependência Química, Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,s/data.

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    TABELA II  –  CLASSIFICAÇÃO DAS DROGAS QUANTO A AÇÃO NO

    SISTEMA NERVOSO CENTRAL

    TIPO DE DROGAS EFEITO SOBRE O ORGANISMO HUMANO

    ESTIMULANTES  Aceleram a atividade cerebral. Há uma aceleração dopensamento e euforia. Seus usuários tornam-se mais ativos.“ligados”. Exemplos: anfetaminas ( remédio para emagrecer),cafeína, cocaína, ecstasy e nicotina.

    DEPRESSORAS Pessoas sob o efeito dessas substâncias tornam-sesonolentas, lerdas, desatentas e desconcentradas. Exemplos:

    álcool, opiáceos (heroína e morfina), tranqüilizantes, inalantesou solventes (cola) e indutores do sono.

    PERTUBADORAS Modificam o sentido da realidade, provocando alterações napercepção, emoções e pensamento. O consumo podedesencadear também quadros psicóticos permanentes empessoas predispostas a essas doenças ou novas crises emindivíduos portadores de doenças psiquiátricas (transtornobipolar, esquizofrenia). Exemplos: anticolinérgicos, LSD(ácido), maconha, chá de cogumelo, trombeta e lírios.

    Fonte:“ Drogas,: Conceitos  Básicos”, Folder da Secretaria Especial de Prevenção àDependência Química, Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, s/data.

    Os efeitos das drogas dependem basicamente de três fatores: a droga, o

    meio ambiente e o usuário. Por isso é importante observarmos aspectos

    relacionados a estes três elementos. A forma como a substância é utilizada, a

    quantidade consumida e o grau de pureza também terão influência no efeito e

    as expectativas do usuário em relação à droga e seu estado emocional

    também poderão interferir nos efeitos.

    TABELA III  –  CLASSIFICAÇÃO DOS NÍVEIS DE PREVENÇÃO

    Níveis de Prevenção Descrição

    Primária deve intervir antes e consiste num conjunto de ações decaráter educativo, face à perspectiva de consumo de drogas.

    Secundária intervém quando é detectado um problema inicial deconsumo de drogas, tentando evitar o agravamento.

    Terciária intervém quando o problema de dependência química já estáinstalado e atua, antes, durante e após o tratamento, nointuito de reintegrar o indivíduo na sociedade e prevenirrecaídas.

    Fonte:“ Drogas,: Conceitos Básicos”, Folder da Secretaria Especial de Prevenção à

    Dependência Química, Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, s/data.

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    O álcool e as demais drogas são substâncias químicas que causam

    alterações na percepção e no comportamento das pessoas e cujo uso

    continuado pode levar a dependência. 

    Em termos de consumo de drogas o país campeão de uso de drogas é

    os Estados Unidos, seguido do Canadá e de vários países europeus. Os dados

    norte americanos apontam que mais de um terço dos habitantes daquele país

     já usaram maconha (34,2%)8. 

    2.1.1 - Dependência.

     A dependência encontra-se classificada mundialmente entre os

    transtornos psiquiátricos, o sujeito não se torna dependente de drogas de uma

    hora para outra; trata-se de um processo lento e gradual  (SCHENKER, 2003, p.

    211).

    Muitas pessoas que consomem bebidas alcoólicas, por exemplo, não setornam dependentes do álcool, porém é bom lembrar que o uso de drogas

    ainda que experimental pode vir a causar danos à saúde.

    O uso de algumas medicações podem ocasionar dependência também.

    É de suma importância a investigação das expectativas do pacientequanto ao tratamento. expectativas irreais, exageradas, acarretamfrustração e denotam, às vezes, pouca disponibilidade individual paramudança do estilo de vida, fator essencial para a manutenção dosresultados do processo terapêutico (LEITE, 2001, p. 8).

     A dependência é um desejo incontrolável que a pessoa tem de consumira droga, a fim de sentir seus efeitos e para evitar as sensações desagradáveis

    causados pela sua falta. No Brasil, as estatísticas indicam que o alcoolismo é

    responsável por: internações em hospitais psiquiátricos; grande número de

    faltas ao trabalho; parcela significativa dos acidentes de trânsito; parte dos

    acidentes de trânsito.

    O abuso de álcool pode levar à dependência física e psicológica com

    8 Disponível na série por dentro do assunto. Drogas: Cartilha sobre maconha, cocaína einalantes

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    danos irreversíveis no cérebro, fígado e outros órgãos.

    2.1.2  Por que tratar? 

    Levantamentos epidemiológicos apontam que o alcoolismo e outras

    drogas é um dos problemas mais importantes na saúde pública em todo

    mundo. Sendo a saúde um dos principais campos de atuação do Serviço Social

    se faz necessário à discussão sobre drogas, assunto presente em várias

    dimensões da sociedade – trabalho, escola, comunidade etc.

    O uso de drogas em nossa sociedade tem se ampliado em larga escalapor isso é necessário aprofundarmos as discussões sobre o tema em questão

    para os cidadãos tenham uma melhor qualidade de vida. Pesquisas dos mais

    variados tipos têm demonstrado como o uso de bebidas alcoólicas e de cigarro

    de nicotina têm conseqüências altamente danosas para a saúde individual e,

    em vários casos com de violência física e de acidentes (VELHO, 1997, p. 9).

    No ano de 2001 o Centro Brasileiro de Informações sobre DrogasPsicotrópicas (CEBRID) realizou uma pesquisa domiciliar de caráternacional em 107 cidades  brasileiras com população superior a200.000 habitantes na faixa etária compreendida entre 12 e 65 anos. A pesquisa teve como principal objetivo estimar pela primeira vez nopaís a prevalência do uso de álcool e outras drogas. Os resultadosencontram-se em um relatório intitulado “I Levantamento Domiciliarsobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil”. Os resultados emrelação ao uso de álcool no Brasil 1,2 revelam que 77,3% doshomens e 60,6% das mulheres já fizeram uso de álcool na vida,totalizando em 68,7% o número de participantes que já fizeram usode álcool na vida. Em todas as faixas etárias estudadas, os indivíduosdo sexo masculino fizeram mais uso de álcool na vida do que osindivíduos do sexo feminino. Quanto ao uso regular de bebidasalcoólicas (mínimo de 3 a 4 vezes por semana, incluindo aqueles que

    bebem diariamente), 9,1% dos homens e 1,7% das mulheres fazemuso regular de álcool, totalizando em 5,2% o número de indivíduosque bebem regularmente. É importante notar a diferença entre oconsumo regular de álcool por homens e mulheres.No ano de 2005, o CEBRID realizou a segunda versão desse estudo,intitulado de “II Levantamento Domiciliar sobre Uso de DrogasPsicotrópicas no Brasil  –  2005”, visando acompanhar o panoramageral de uso de álcool e outras drogas na sociedade brasileira e denotar possíveis flutuações na prevalência de uso dessas substâncias. A pesquisa indicou que o número de brasileiros, com idades entre 12e 65 anos, dependentes de bebidas alcoólicas foi de 12,3%, o quecorresponde à população de 5.799.005 pessoas.9 

    9  Dados fornecidos no II levantamento Domiciliar sobre ouso de drogas psicotrópicas noBrasil.

    http://www.alcoolismo.com.br/http://www.alcoolismo.com.br/http://www.alcoolismo.com.br/http://www.alcoolismo.com.br/http://www.alcoolismo.com.br/

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    P ara aqueles que injetam cocaína, o risco de contrair hepatites, AIDS e

    outras infecções, pelo uso de seringas contaminadas é também alto.10  Esta

    situação torna-se cada vez mais preocupante em nossa sociedade

    principalmente entre os jovens.

    Um estudo conduzido no Instituto Médico Legal de São Paulo, em 1994,

    analisou os laudos de todas as pessoas que morreram por acidentes ou

    violência na Região Metropolitana de São Paulo e constatou que:

    52% das vítimas morreram de homicídios,

    64% daqueles que morreram afogados e51% dos que faleceram em acidentes de trânsito apresentaram álcool na

    corrente sanguínea em níveis mais elevados do que o que permitido por lei

    para dirigir veículos (0,6 gramas de álcool por litro de sangue).

    É um equívoco pensar a questão das drogas de forma limitada e restrita

    a análise do produto. Aspectos fundamentais e importantes relativos ao

    indivíduo e ao contexto social e cultural devem ser considerados. Através do

    diálogo é possível fazer uma avaliação, qual é o lugar da droga na vida dousuário ou dependente. Às vezes criamos problemas onde não existe e

    atribuímos ao uso de drogas qualquer conduta ou comportamento fora dos

    padrões normais.

    De acordo com a OMS, no ano 2000 o álcool foi responsável por 4%da incidência de doenças, em países emergentes como a Chinatendo nessa substância o maior fator de risco à saúde. O usomoderado de álcool, contudo, apresenta efeitos controversos sobre asaúde. Está tanto associado com a diminuição na mortalidade emdecorrência de doenças coronárias entre indivíduos de mais de 40

    anos de idade quanto com o aumento no risco de manifestação decâncer. Ademais, seu uso está associado com problemas sociais, emespecial a violência11. 

    Diante da insuficiência dos mecanismos de fiscalização e repressão da

    oferta de drogas houve reconhecimento da necessidade de medidas

    10  Disponível na série por dentro do assunto. Drogas: Cartilha sobre maconha, cocaína e inalantes.

    Brasília: Presidência da República, 2001.

    11 Disponível em: http://www.alcoolismo.com.br acessado em 30 de outubro 2007. 

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    45

    preventivas.

    Em 1970, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para aEducação, a Ciência e a Cultura) convocou, pela primeira vezespecialistas de vários países para que discutissem a abordagempreventiva do uso de drogas. Em seguida, vários encontrosinternacionais foram realizados. A partir de 1972, a educaçãodestinada a prevenir o abuso de drogas foi considerada umanecessidade universal e premente (BUCHER, 1998, p. 55).

    O uso abusivo de drogas tem provocado constantes discussões na

    sociedade a partir de diversos casos principalmente envolvendo jovens quecolocam não somente suas vidas em jogo como também abalam toda a família,

    conforme ilustrado a seguir:

    “Festa rave de Itaboraí termina em morte” Dezoito freqüentadores de uma festa rave que começou na noite desábado deram entrada, domingo, no Hospital Estadual Prefeito JoãoBatista Caffaro, em Itaboraí. Um deles, um jovem de 17 anos moradorde Vila Isabel, chegou à unidade em coma e, de acordo com o diretordo hospital, Marcelo Bagueira, morreu em conseqüência de umaparada cardiorespiratória. Das 7h30m até o fim da tarde de domingo,foram registrados 18 atendimentos de pessoas que estavam na festa

    Tribe, realizada na Happy Land Diversões. De 16 atendimentos,segundo a assessoria do governo do estado, 14 estavam ligados aouso de drogas ou álcool.- A maioria dos atendidos era do sexomasculino, indo até a faixa etária de 31 anos. Jornal O DIA,01.11.2007 pág. 05.

    2.1.3 - Por que a família é importante para o

    tratamento.

     A família é sem dúvida fundamental para o sucesso do tratamento de

    dependência química. Acreditar que tudo se resolverá a partir de algumas

    consultas ambulatoriais ou de uma internação é no mínimo uma postura cética.

    O dependente muitas vezes não tem noção da gravidade do seu

    estado e pode sentir vontade de se “testar”, expondo-se a situações de risco. A

    família deve ajudá-lo estabelecendo regras para evitar a recaída. É importante

    evitar os locais de risco por isso todos devem ajudar: o patrão, os vizinhos, os

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    amigos, mas o suporte maior deve vir da família. Não se trata de fiscalizar,

    mas de chamá-lo à reflexão. Nesta perspectiva há uma desmistificação da

    culpabilidade do usuário de drogas para o campo da responsabilidade.

    É preciso entender que o uso abusivo de drogas é uma doença. Em

    primeiro lugar é preciso a motivação do dependente para iniciar o tratamento e

    em seguida o apoio da família para mantê-lo motivado.

     A família por estar desprovida de informações sobre a questão das

    drogas, principalmente as ilícitas, pode ter sua participação no tratamento

    comprometida por distorções presentes na sociedade. Afinal as drogas são

    apresentadas como algo demoníaco.

    O tratamento da dependência deve passar pela avaliação da família.

    Estudos mostram que vítimas de maus tratos, a presença de consumo

    problemático de drogas entre os mais velhos, violência, ausência de rotina

    familiar e a dificuldade dos pais em colocar limites nos filhos aumenta o risco

    do surgimento de dependência entre os seus membros.

    No espaço familiar são construídos valores, regras, papéis que

    solidificam a história de cada família que esta inserida numa realidade social e

    quando ocorre algo que provoca distorções nos comportamentos surgem

    conflitos. Em casa somos classificados pela idade, sexo e papel que

    desempenhamos e nossa conduta é regida por valores como honra, vergonha

    e respeito (GARCIA E MENANDRO, 2000, p. 344).

    É importante destacar aspectos do contexto familiar em que estão

    inseridos os dependentes químicos: desemprego, violência, insegurança. Um

    conjunto de ações que configuram expressões da questão social, por isso éfundamental trabalhar o papel da família que dada à realidade da sociedade

    ocupa posição difícil e conflitante.

     A família pode levar muito tempo para se dar conta que há um membro

    na família que é dependente químico, seja por desconhecimento das reações

    do uso da droga ou pelo fato de não considerar a droga uma doença.

     A família está sujeita às influências que a realidade econômica, social,

    cultural e histórica determinam e por isso constantemente vem atravessando

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    47

    crises. A idéia que temos de família como um grupo relativamente bem

    estruturado envolvendo o pai, a mãe e os filhos muitas vezes não corresponde

    à diversidade dos modelos de família existentes e das realidades em que

    vivem. Criamos em nossa cultura a idéia de uma família-modelo, porém vale

    ressaltar que nenhum relacionamento está livre de conflitos. Por isso nem

    sempre podemos ter a resposta ideal de nossas famílias.

    No âmbito familiar deve-se buscar espaço para o diálogo, na busca da

    superação de problemas, conflitos e na construção no dia-a-dia do respeito

    mútuo, consolidando comportamentos preventivos em relação ao uso de

    drogas. Em toda família coexistem tendências para saúde e para doença, o

    diferencial se fará a depender de como a família enfrente situações de crise,

    de como está à afetividade e a comunicação entre seus componentes.

     A família se organiza com padrões que dão sentido a sua dinâmica. E a

    estrutura familiar se constitui de um conjunto de regras que determinam os

    relacionamentos de seus membros, localizando o lugar de cada um,

    estabelecendo seu papel e função. Para ele, cada indivíduo aprende a

    relacionar-se dentro do sistema através de regras verbalizadas ou não. Estes

    padrões se formam pela troca do cotidiano, podendo não ser visíveis aos

    membros da família. Com isso, se ocorrer uma mudança num membro da

    família, conseqüentemente os outros serão afetados. Quando um indivíduo da

    família apresenta algum problema, isto pode significar que toda a família está

    com dificuldade. Ou seja, cada tipo de tensão vivida pela família, exigirá um

    processo de adaptação, transformações de interações familiares, a fim de

    manter-se o equilíbrio da família, conduzindo ao crescimento de seus membros

    (MINUCHIN, 1990).

    O Assistente Social deve saber que o dependente químico desenvolve

    um comportamento auto-destrutivo de desestruturação de sua pessoa e do

    meio onde se encontra, desenvolvendo reações disfuncionais em relação ao

    outro e que o primeiro alvo a ser atingido é a família. (BEATTIE, 1997, p. 15).

    Logo a atuação do Assistente Social ao lidar com o dependente e sua

    família, é de fundamental importância para a facilitação da reinserção social de

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    ambas as partes, a fim de promover a recuperação dos envolvidos. É preciso

    orientar o dependente e a família quanto aos prejuízos físicos e sociais

    causado pela droga, ou seja, envolver a família no tratamento. A abordagem

    familiar deve ser considerada como parte integrante do tratamento.

     A maioria dos usuários que chega às unidades para tratamento é

    trazida por parentes. O discurso utilizado pelas famílias responsabiliza o

    usuário assim, como a sociedade que criminaliza e estigmatiza o dependente

    sem considerar fatores externos que determinam sua condição. Nesta

    dinâmica é importante incluir a família que necessita participar ativamente do

    tratamento e do processo de recuperação do dependente, como núcleo de

    suporte fundamental do indivíduo  (LEITE, 2001, p. 23). No capítulo IV

    demonstraremos através da pesquisa que, no entanto, esta tarefa não é fácil

    devidos os prejuízos sofridos em decorrência do uso da droga.

    É comum o dependente ou a família se autodenominarem vítimas e se

    contrapor uns aos outros, sem perceber que ambos estão no processo de

    saúde-doença. Neste contexto vale ressaltar a co-dependência, onde co-

    dependente é uma pessoa que deixou o comportamento de outra afetar a si

    própria e tem obsessão em controlar o comportamento de outras pessoas.

    (BEATTIE, 1997, p. 28).

    Uma condição emocional, psicológica e comportamental que sedesenvolve como resultado da exposição prolongada de um individuoa  – e a prática de  – um conjunto de regras opressivas que evitam amanifestação aberta de sentimentos e a discussão direta deproblemas pessoais e interpessoais (BEATTIE, 1997p. 45).

     A co-dependência não ocorre apenas no que refere-se ao uso de

    substâncias químicas, no entanto é muito comum lidarmos com esta demanda

    quando o assunto em questão é drogas. 

    2.1.4 - A influência da mídia no consumo de

    drogas.

     A mídia tem estimulado o uso de bebidas alcoólicas, o que banaliza e

    legitima o consumo de álcool, sem revelar os verdadeiros efeitos que o seu uso

    excessivo pode ocasionar ao indivíduo. É interessante observar que os

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    49

    alcoólicos não consideram o álcool uma droga, porque seu uso é legalizado.

    No entanto o álcool é classificado conforme tabela II como uma droga

    depressora 12   que  produz através do consumo indevido, diversas

    conseqüências ao usuário: perda da auto-estima, conflitos na família, acidentes

    de trânsito, absenteísmo no trabalho, além de distúrbios físicos e psicológicos

    que podem levá-lo a dependência, interferindo de forma negativa no seu

    convívio social. Durante a vida, o ser humano cria relações de dependência.

     Algumas dessas relações são importantes para o bem-estar, outras causam

    prejuízo. A dependência química reflete no âmbito familiar de diversas formas,

    especialmente nos conflitos originados não apenas do usuário.

    É importante demarcarmos que neste contexto as pessoas que se

    encontram no estágio de co-dependência estão tão envolvidas pelo “outro” que

    esquecem de si mesmas. O Assistente Social precisa no seu exercício

    profissional estar atento a este usuário que dificilmente chegará ao

    atendimento com uma demanda sua e sim sempre do “outro”. 

    [...] e não se pode negar o peso simbólico que a mídia, principalmente

    a televisiva, desempenha em nossa sociedade (FREITAS, 2002,p.86).

     A visão proibicionista tem o foco na droga e não no sujeito, a questão

    do uso deixa de ser vista como algo inerente à individualidade de cada ser

    humano, e passa a ser uma questão de segurança pública. Nesta perspectiva o

    inimigo passa a ser o usuário que assume características de pessoa ruim e

    violenta, sem valores éticos ou morais. “O termo drogado começa a ser

    utilizado no Brasil ao lado da categoria subversivo como uma categoria de

    acusação” (VELHO, 1997).

     A lógica de somente publicar o que se encaixa no imaginário social

    acaba potencializando o problema do estigma no qual está inserido o usuário

    de drogas. Uma pessoa usuária, por exemplo, não necessariamente será um

    dependente. No entanto a sociedade vê todo usuário como um dependente. O

    profissional deve observar em que estágio se encontra o usuário que esta

    sendo atendido para que seja viabilizada uma intervenção eficaz e objetivar um

    12 grifo nosso

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    50

    encaminhamento adequado.

    Um dos caminhos para se alcançar o objetivo de diminuir os riscos

    associados ao uso de drogas começa na capacidade de discernimento do

    cidadão bem informado.

     Algumas palavras como “vício”, “drogado”, “bêbado” e “alcoólatra”,

    utilizadas cotidianamente principalmente nos noticiários reforça a imagem

    estigmatizada do usuário de drogas. “  O drogado se apresenta como uma

    pessoa sem autonomia sobre seu consumo e não como um ator de cena do

    uso” (VELHO, 1997, p.28).

     A droga deixa através da mídia suas marcas e suas seqüelas.

    Representações perpassam o imaginário dos cidadãos a seu respeito. Dos

    “paraísos artificiais” passam a “demônios do mal”. Suas conotações variam

    como variam as perspectivas daqueles que buscam compreendê-las. Aceita-

    se como realistas, visões provenientes da mídia sensacionalista, perpetuando

    uma situação de alienação no consumo. Estando atualmente associado à

    marginalidade, à improdutividade e à violência. O uso de drogas é referido de

    forma muitas vezes generalizada em conexão com esses aspectos. O impacto

    disso sobre a família é freqüentemente reforçado pela desinformação e pela

    associação imediata à criminalidade, podendo provocar reações de rejeição,

    exclusão e criminalização do usuário e muitas vezes um incremento do

    consumo (GARCIA, 1997, p. 25).

     A influência do marketing tem sido importante fator para o aumentoda ingestão de bebidas no nosso país. O consumo per capita de

    álcool cresceu 154,8% entre 1961 e 2000, situando o Brasil entre os25 países do mundo que mais aumentaram o consumo de bebidasdurante esse período (OMS, 2000).

    Vivemos numa sociedade capitalista altamente individualista, com um

    incessante apelo a adicção consumista  –  comprar, comprar; ter, ter: ser;

    consumo esse patrocinado pela mídia, principalmente a TV que se instala nos

    lares. Assim a sociedade vem se mostrando personalista e individualista.

    (SCHENKER, 2003).

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    51

    CAPÍTULO III

    TRABALHOS DIFERENCIADOS E EQUIPES

    INTERDISCIPLINARES NO TRATAMENTO

    DA DEPENDÊNCIA QUÍMICA

    3.1 - O Trabalho dos Grupos de Apoio aos Dependentes

    Químicos e suas Famílias.3.1.2 - Alcoólicos Anônimos (AA).

     Alcoólicos Anônimos iniciou-se em 1935 nos Estados Unidos através do

    encontro de um corretor de bolsa de valores de Nova Iorque, o Sr. Bill W., e um

    cirurgião de Akron o Dr. Bobvia ambos eram alcoólicos.

     Alcoólicos anônimos é uma irmandade de homens e mulheres quecompartilham suas experiências, forças e esperanças, a fim deresolver seu problema comum e ajudar os outros a se recuperarem do

    alcoolismo. O único requisito para tornar-se membro é o desejo deparar de beber. Para ser membro de A.A. não há taxas oumensalidades; somos auto-suficientes, graças às nossas própriascontribuições.A.A. não está ligada a nenhuma seita ou religião,nenhum movimento político, nenhuma organização ou instituição; nãodeseja entrar em qualquer controvérsia; não apóia nem combatequaisquer causas. Nosso propósito primordial é nos mantermossóbrios e ajudar outros alcoólicos a alcançar a sobriedade.13 

    Há cerca de 2 milhões de alcoólicos em recuperação em

    aproximadamente 150 países. Os integrantes se reúnem em grupos que

    podem ocorrer diariamente duas ou três vezes por semana a depender do

    grupo com duração de 1h. 30min. a 2 horas por encontro. Não há distinção de

    sexo ou idade, é importante ressaltar que é predominante a presença de

    homens e tem sido significativa a inserção de jovens nos grupos, no entanto,

    não há uma continuidade na permanência destes jovens nos encontros.

    Os alcoólicos anônimos se intitulam auto-suficientes. Não é obrigatória

    a contribuição financeira dos integrantes do grupo. Contribuem aqueles que

    podem e com o valor que quiser dentro dos limites pertinentes, ou seja, não é

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    52

    aceito doações com valores muito expressivos. Todas as aquisições de objetos

    para os grupos são definidas em assembléia.

    Não há distinção nos grupos. Os freqüentadores de um determinado

    grupo podem participar de outros grupos, inclusive freqüentemente há

    intercâmbio entre os mesmos. Não há controle de freqüência e a permanência

    depende exclusivamente do membro do grupo. As reuniões são realizadas

    geralmente às 19h30min e conduzidas por um coordenador que inicialmente

    expõe aspectos formais e em seguida indica os que irão se pronunciar ao

    grupo.

    No estado do Rio de Janeiro há cerca de 400 grupos e na Baixada

    Fluminense aproximadamente 96 e 02 escritórios que dão suporte aos grupos.

    14 

    3.1.3 - Narcóticos Anônimos (NA).

    Narcóticos Anônimos é uma associação comunitária de adictos em

    recuperação. Iniciado em meados de 1953, o NA é um dos maiores e mais

    antigos grupos deste tipo de demanda, com aproximadamente trinta mil

    reuniões semanais em 100 países.

    O primeiro grupo de Narcóticos Anônimos no Brasil estabeleceu-se em

    1985, no Rio de Janeiro.

     A base do programa de recuperação de Narcóticos Anônimos é uma

    série de atividades pessoais conhecida como Doze Passos15, adaptados dos

     Alcoólicos Anônimos. Estes "passos" incluem o reconhecimento de que existeum problema. A busca de ajuda visa reparar danos causados e trabalhar com

    outros adictos que queiram se recuperar. É importante ressaltar que tanto nos

    NA quanto nos AA a abstinência é cobrada aos usuários.

    Nas reuniões, cada membro partilha experiências pessoais com os

    outros buscando ajuda, não como profissionais, mas simplesmente como

    13 Disponível: http//www.alcoolicosanonimos.org.br acesso em : 18 de novembro de 2007.14 Informação sistematizada em visita realizada em: 03 de dezembro de 2007.15 Ver anexo I

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    53

    pessoas que tiveram problemas similares e encontraram uma solução.

    Narcóticos Anônimos não tem nenhum tipo de acompanhamento profissional.

    O principal serviço oferecido por Narcóticos Anônimos é a reunião em

    um grupo de NA. Cada grupo administra a si próprio, tendo como base

    princípios comuns a toda a organização.

    Narcóticos Anônimos é inteiramente auto-sustentado e não aceita

    contribuições financeiras de pessoas de fora do grupo. É recolhido em cada

    reunião um valor que não é estipulado a fim de colaborar com a manutenção

    do lanche, água e demais utensílios.

     As reuniões do NA são realizadas reuniões diárias em alguns grupos e

    em alguns espaços com 3 reuniões por dia (manhã, tarde e noite). Ocorrem

    reuniões fechadas e abertas. Geralmente as reuniões abertas são realizadas

    na 1ª e 2ª quarta-feira do mês. Não há limite de participantes, distinção de

    classe, gênero, droga de uso ou etnia. As reuniões são conduzidas sempre por

    membros mais antigos os quais fazem o acompanhamento da freqüência e

    direcionam os relatos. Cada integrante do grupo dirige-se à frente de todos e

    inicia seu relato.Dos 5000 membros de NA que responderam a uma pesquisa informal feitaem 1989, 64% eram homens e 36% eram mulheres. Entre estes mesmos5.000 membros, 11% tinham menos de 20 anos de idade, 37% tinham entre20 e 30, 48% tinham entre 30 e 45, e 4% tinham mais de 45 .16 

    Nos relatos dos adictos a família estava presente em todas as falas

    sempre num tom de sofrimento e angústia17. A palavra perda18 chamou minha

    atenção quando referia-se a família. Era dita num tom mais baixo e com seus

    os olhos em lágrimas, e foi muito visível pra mim tendo em vista que eu era a

    única visitante na reunião e estava sentada na primeira fileira. Ao fazerem

    seus relatos se dirigiam a mim, portanto não pude conter a minha emoção.

    Interessante que participo de Grupo de Reflexão em outra instituição há um

    ano e esta experiência foi completamente diferente. A observação participante

    ampliou minha visão sobre a dinâmica da dependência química.

    16 Disponível: http//www.na.org.br acesso em : 13 de dezembro de 2007.17 Informação sistematizada em isita realizada em: 02 de janeiro de 2008.18 Grifo nosso.

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    54

     Após a inserção no grupo os integrantes destacam o que recuperaram e

    destacam como sendo a maior conquista, a família19. Em vários discursos

    ressaltam “agora sou pai, marido, amante, filho, irmão e amigo. Antes não eram

    nada nem pelo nome eram chamados. As pessoas se dirigiam a mim como

     psiu, viciado e ai! Neguinho! Malandro!” 20 .  Através deste discurso é possível

    perceber o quanto à questão da família é valorizada pelos adictos e a

    importância de trabalhar também no grupo os aspectos que norteiam esta

    dinâmica.

    3.1.4 - Grupos Familiares (AL-ANON).

    Os Grupos Familiares Al-Anon são associações de parentes e amigos

    de alcoólicos que compartilham sua experiência, força e esperança, a fim de

    solucionar os problemas que têm em comum. A família pode fazer muito para

    se ajudar, quer o alcoólico procure ajuda ou não.

    Desde 1951 este grupo vem prestando serviço a familiares e amigos de

    alcoólicos. Hoje, existem mais de 30.000 Grupos em mais de 100 países. O Alateen, que é para adolescentes, tem mais de 3.500 Grupos no mundo todo.

    Já existem no Brasil desde 1965, mas somente em 1966 o Grupo foi registrado

    no Escritório de Serviços Mundiais. Hoje o Brasil dispõe de aproximadamente

    1000 Grupos.21 

    O propósito primordial do programa Al-Anon é dar compreensão e apoio

    a familiares e amigos de alcoólicos. Qualquer pessoa cuja vida foi ou está

    sendo afetada pelo alcoolismo de alguém pode fazer parte desta entidade. Issoinclui os familiares imediatos, parentes, amigos, colegas, empregadores etc.

    19 Gripo nosso. 20 Informação obtida na pesquisa de campo observação em 02 de Janeiro de 2008.  

    21 Disponível :www.al-anon.org.br  acesso: em 15 de novembro de 2007. 

    http://www.al-anon.org.br/http://www.al-anon.org.br/http://www.al-anon.org.br/http://www.al-anon.org.br/

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    55

    3.1.5 - O Trabalho do NEPAD.

    O trabalho no NEPAD – Núcleo de Estudos e Pesquisa em Atenção ao

    Uso de Drogas teve início na década de 80. O atendimento é oferecido a

    qualquer familiar que venha sozinho à instituição ou se outro profissional do

    setor atendendo ao dependente de drogas considerar que a abordagem

    familiar pode favorecer o tratamento.

    Em entrevista com o Assistente Social confirmei que a maioria dos

    usuários atendidos na referida instituição são do sexo masculino, e revela

    uma semelhança entre os usuários do HESFA que, na sua maioria também sãodo sexo masculino, e quanto aos familiares ocorre o inverso são geralmente

    mulheres e especificamente em relação aos atendimentos do NEPAD são

    geralmente mães.

    Não há exigência em relação à quantidade de drogas consumida pelo

    adicto, idade, classe social, raça ou localidade que resida, no entanto, o

    atendimento oferecido pela referida instituição se dá àqueles usuários de

    drogas lícitas e/ou ilícitas (menos álcool, quando seu uso é exclusivo) e éextensivo a seus familiares ou pessoas próximas. O atendimento também é

    extensivo às pessoas que tem algum familiar dependente ou usuário de

    drogas, mesmo que o usuário não seja paciente do NEPAD. O paciente ao

    chegar à instituição é atendido pelo plantonista da equipe (psicólogo ou

    médico). Não é exigido que o sujeito esteja abstinente.

     A equipe interdisciplinar é composta de médicos, psicólogos,

    assistentes sociais, pedagogos, terapeutas ocupacionais e pessoal

    administrativo.

     Atualmente a estrutura do NEPAD é formada pela Direção

    Coordenadora Administrativa e coordenadoria de Estudos e Assistência.

    Nestas se inserem três setores: atenção primária, epidemiologia e pesquisa

    médica e o de assistência terapêutica.

    No setor de atenção primária está inserido o Programa de Redução de

    Danos, que surgiu em convênio com a Coordenadoria Nacional de DVST /

     AIDS / MS, em 1996, neste setor são elaborados programas dos cursos

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    56

    oferecidos para professores de escolas públicas.

    O setor de epidemiologia desenvolve estudos sobre a temática da

    toxicomania, organiza banco de dados sobre os pacientes e elabora o perfil da

    clientela.

    O setor de Assistência terapêutica oferece atendimento ambulatorial aos

    usuários de drogas, adultos ou adolescentes e seus familiares. A modalidade

    básica de atendimento aos usuários é a psicoterapia de base psicanalítica.

    Quando necessária internação os pacientes são encaminhados para

    enfermaria do serviço de Psiquiatria e Psicologia Médica do Hospital

    Universitário Pedro Ernesto (HUPE – UERJ).

    Os atendimentos aos familiares ocorrem em duas modalidades Terapia

    Familiar (abordagem sistêmica) e atendimento a familiares, que é oferecido aos

    familiares, individualmente ou em grupo. Este atendimento surgiu quando os

    profissionais perceberam que os familiares que vinham acompanhando os

    usuários, na grande maioria mães que queriam conversar com os terapeutas.

     A instituição não considera a causa da dependência como sendo

    unicamente do produto e considera fatores psicológicos, sociais e políticos,

    entre outros.2