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A Implantação do Modelo Gerencial na Administração Pública Brasileira e a Resistência à Mudança:

A Análise da Implantação do Processo Judicial Eletrônico no Tribunal Regional do Trabalho na Cidade de São Paulo

Autoria: Renata Ferretti, Guilherme Smaniotto Tres, Sergio Vinicius Louzada

RESUMO

A Reforma do Estado apresentou avanços modestos no Brasil nos últimos anos, influenciado pelos valores organizacionais e elementos culturais fortes das instituições públicas brasileiras e, provocado pela resistência à mudança dos atores organizacionais. A proximidade da implantação do processo eletrônico no Judiciário brasileiro, como instrumento necessário para elevar a eficiência governamental, apresenta-se como um processo de mudança organizacional, cujo sentimento de perda é caracterizado como morte simbólica. Assim, a presente pesquisa de natureza exploratória e quantitativa visou responder a pergunta: Situações de mudanças, com a implantação do modelo gerencial na administração pública, causam resistência por parte dos atores internos institucionais? Palavras-chave: Administração pública gerencial. Resistência à mudança. Morte simbólica.

1 INTRODUÇÃO Muito tem se falado sobre a implantação do modelo gerencial na administração

pública brasileira, contudo, anos após a publicação do Plano Diretor da Reforma do Estado, em 1995, apenas avanços modestos foram verificados. Dentre os diversos eixos estratégicos no processo de modernização do Estado brasileiro, destaca-se a informatização como instrumento para aumentar a eficiência organizacional, nesse aspecto, a implantação do processo judicial eletrônico (PJe) em nível nacional, unificaria com segurança e racionalização a tramitação de demandas judiciais. Assim, na iminência de implantação do PJe no judiciário brasileiro, a presente pesquisa ganha relevância ao propor a identificação dos aspectos de resistência à mudança de seus atores internos.

Uma vez que algumas das características das organizações públicas brasileiras, como a centralização, o apego às regras, rotinas e ao poder, a supervalorização da hierarquia, e a aversão ao empreendedorismo são contrárias às características instituídas pela administração pública gerencial. Ao considerar a resistência à mudança como uma das disfunções das organizações burocráticas, pontua-se que a percepção dos atores internos sobre a mudança depende do conjunto de indícios apresentados pela organização e a percepção que os mesmos desenvolverão, podendo ser interpretada como uma oportunidade de ascensão ou risco e incertezas.

Caso a mudança organizacional represente risco e incerteza aos atores internos, poderá ser considerada como uma ruptura irreversível de perda, denominada como morte simbólica, em que o sentimento dominante é o medo e ansiedade, resultando em problemas de saúde, físicos e psicológicos, dos envolvidos. Nessas situações também é comum encontrar pessoas estressadas, com exaustão emocional, perda de qualidade de vida no trabalho e em desequilíbrio emocional, ou com outras questões psíquicas.

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Assim, com o intuito de responder a pergunta – Situações de mudanças, com a implantação do modelo gerencial na administração pública, causam resistência por parte dos atores internos institucionais? – foi elaborada uma pesquisa exploratória e quantitativa, com a aplicação do questionário aos diretores das Varas do Trabalho da cidade de São Paulo, com o objetivo de identificar o grau de resistência à mudança dos agentes governamentais à implantação do modelo gerencial na administração pública. Para tanto, a hipótese nula (H0) da presente pesquisa é – Não há relação entre a implantação do modelo gerencial e o processo de resistência por parte dos atores internos e a hipótese alternativa (H1) é – Há relação entre a implantação do modelo gerencial e o processo de resistência por parte dos atores internos. Em que a implantação do modelo gerencial na administração pública é a variável independente e o grau de resistência à mudança é a variável dependente.

Os resultados encontrados sugerem a expectativa de ganho com a implantação do PJe, apesar de parcela expressiva dos respondentes demonstrarem receio de perda do cargo em comissão com essa mudança. Contudo, os estados de ânimo, representados por sentimentos de esperança, otimismo, ansiedade, coragem, disposição, ânimo e inquietação demonstram que os entrevistados vivem em situações de risco e incerteza, e os resultados encontrados sobre os sintomas somáticos demonstram situações de estresse, sugerindo desequilíbrio da saúde física dos respondentes e fragilidade psicológica, muito presente em situações de percepção de mudanças como perdas, originando processos de luto.

As contribuições para a teoria estão relacionadas com a abordagem empírica de processo de resistência à mudança com o conceito de luto organizacional e os estudos em gestão pública, além de contribuir para prática, ao discutir a necessidade de preparar as pessoas para o novo e o desconhecido, a fim de preservar a saúde física e psicológica dos envolvidos com a mudança, minimizando os processos de luto. 2 REFERENCIAL TEÓRICO

Nos últimos anos, intensificou-se a discussão sobre a abordagem de uma administração pública gerencial e a reforma do Estado em todo o Mundo, contudo, após alguns anos do início da implantação de tal reforma no Brasil, algumas ações sugeridas ainda não foram efetivadas, levantando questionamentos sobre a influência da cultura organizacional nas instituições públicas brasileiras, como ponto de resistência às mudanças propostas.

Assim, torna-se relevante apresentar um breve referencial sobre a administração pública gerencial e a reforma do estado, a cultura organizacional em instituições públicas e o aprofundamento no processo de resistência à mudança por parte dos atores internos.

Administração Pública Brasileira: breve histórico

A abordagem de serviço público brasileiro inicia-se com uma definição teórica do autor Melo (2002, p. 153-154) como “uma atividade que corresponde a uma necessidade de interesse geral” e Amato (1971, p. 19) que define servidor ou administrador público como “todo aquele que, como funcionário ou empregado, participa dos trabalhos do governo”. Neste contexto, torna-se pertinente aludir a burocracia como categoria administrativa na caracterização da estrutura organizacional pública.

Considerando a definição de burocracia pelos autores Tojal e Carvalho (1997, p.2) como um “reino de papelório, da morosidade, da ineficiência”. Em especial, durante o regime da antiga União Soviética, a burocracia passou a dominar todos os meios de vida como classe dominante, e caracterização das relações de trabalho como hierarquizada e pela estabilidade do emprego.

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No Brasil, principalmente após 1964, inicio do regime militar, e com a implantação de 302 novas empresas estatais, formou-se no interior do Estado uma burocracia profissionalizada e o enfraquecimento do pacto desenvolvimentista, demonstrando a fragilidade da gigantesca estrutura industrial desejada pelo projeto estatal.

Como estudado por Motta (2007), apesar da manutenção das características tradicionais da administração pública brasileira, nos últimos 40 anos, devido à democratização, ocorreram grandes transformações com o desenvolvimento de novas praticas de modernização. Contudo, as ações ainda obedecem a critérios políticos para o alcance de objetivos de grupos no poder.

A partir da década de 80, iniciou em diversos países a aplicação de medidas para melhoria da eficiência de organizações públicas, igualmente a aplicação de uma administração gerencial, nos moldes do setor privado, como bem colocou Seabra (2001) em seus estudos. Estas medidas posteriormente seriam chamadas de “nova administração pública” – NAP, que introduzidas em uma organização, gerariam mudanças em diversos componentes organizacionais como no sistema de remuneração, estrutura e cultura.

Administração Publica Gerencial no Brasil

De acordo com Seabra (2001) a nova proposta da administração publica começou a despontar no Brasil a partir de 1995 com a publicação do Plano Diretor da Reforma do Estado, editado pelo então Ministério da Administração e Reforma do Estado. Apesar de plano não oferecer detalhes deste novo modelo administrativo, apresentou uma cultura gerencial focada em resultados e em conceitos modernos da administração.

No entanto, não se trata da simples importação dos princípios da administração de mercado, mas sim de que as novas funções do Estado, em um mundo globalizado, exigem novas competências, estratégias administrativas e novas instituições. Assim Pereira e Spink et all descreveram:

A necessidade de aumentar a eficiência do estado é uma imposição do processo de globalização, que acirrou a competição entre os países. Em consequência, a administração publica burocrática tornou-se obsoleta e as burocracias públicas estão sendo levadas cada vez mais a adotar uma abordagem gerencial, baseada na descentralização, no controle de resultados e não no controle de procedimento, na competição administrativa, e no controle social direto. (2006, p. 11)

Ainda para Pereira e Spink et all (2006), cada vez mais os cidadãos são conscientes que a administração publica burocrática não corresponde às necessidades da sociedade, exigindo ações eficientes do Estado, apesar da limitação de recursos econômicos. E, para os Estados formularem e implantarem suas políticas públicas estratégicas, de acordo com as características de suas respectivas sociedades, é necessária a utilização de práticas gerenciais modernas, sem perder o propósito da função publica. Nesta condição, atribui-se valor estratégico a função da administração publica gerencial, com impacto direto na redução da diferença entre a necessidade da sociedade e a satisfação dessa demanda. Enquanto a administração publica burocrática está atenta aos processos, independentemente da ineficiência, com definição sobre procedimentos de contratação de pessoal, compras de bens e serviços, considerando ser a prevenção o melhor controle contra o nepotismo e a corrupção. A administração publica gerencial é definida por algumas características básicas, como o foco no cidadão e na obtenção de resultados, com a predominância de descentralização do poder e tomada de decisão. Incentivando a criatividade e inovação por parte dos políticos e funcionários públicos. Esta modalidade de gestão também possui o principio de combate à corrupção e o nepotismo, mas opta por não aplicar procedimentos de controle rígidos.

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De acordo com Guimarães: no setor público, o desafio que se coloca para a nova administração pública é como transformar estruturas burocráticas, hierarquizadas e que tendem a um processo de insulamento em organizações flexíveis e empreendedoras. Esse processo de racionalização organizacional implica a adoção, pelas organizações públicas, de padrões de gestão desenvolvidos para o ambiente das empresas privadas, com as adequações necessárias à natureza do setor público. As tentativas de inovação a administração pública significam a busca da eficiência e da qualidade na prestação de serviços públicos. Para tanto, são necessários o rompimento com os modelos tradicionais de administrar os recursos públicos e a introdução de uma nova cultura de gestão. (2000, p. 127)

Para Bresser-Pereira (2005), entre 1995 e 1998, por conta da Reforma do Estado, a mudança cultural em Brasília foi enorme, se considerar que núcleos burocráticos foram substituídos por núcleos gerenciais e pela aprovação de Emendas constitucionais e legislações específicas. Contudo, a implementação dessa Reforma obteve avanço modesto, especialmente pela falta de informação e de conhecimento dos dirigentes governamentais, que assimilaram apenas parte da nova cultura gerencial pública.

Já para Abrucio (2007) existem quatro eixos estratégicos no processo de modernização do Estado brasileiro, a profissionalização, eficiência, efetividade e transparência. Dentre esses quatro eixos, o autor pontuou o governo eletrônico como instrumento necessário para elevar a eficiência governamental, e apesar de considerar que o governo brasileiro teve avanço neste aspecto, ainda há espaço para crescimento. O autor considerou que a eficiência, além de reduzir os custos das atividades governamentais, facilita o acesso aos serviços públicos, responsável pela otimização de recursos. A efetividade foi considerada pelo autor como uma visão de gestão de longo prazo, relacionada aos resultados das políticas públicas. Cultura Organizacional em Organizações Públicas

Cultura organizacional, conforme Pires e Macêdo (2006) constitui a vida em comum de um grupo social, compartilhado por seus membros, de modo formal ou não, objetivo ou simbólico, caracterizando a forma de pensar, agir e pensar do grupo. Os resultados dessas ações são compartilhados e transmitidos por seus membros, ao passo que ao interagirem, distinguem-se de outros grupos.

Cesar (2006) conceituou cultura organizacional como conjunto de hábitos e uma socialização geral, a partir do ajustamento dos membros da organização. Cultura organizacional é algo profundo, importante e inserido nas estruturas sociais, na história, no inconsciente, na experiência vivida e no ser coletivo, responsável pelo relacionamento dos grupos, com o propósito de garantir uma identidade e uma ideologia particular. Por fim, a autora considerou que os dirigentes exaltam os valores dominantes da cultura organizacional, uma vez que são exemplos para os demais autores internos.

Bem citado por Pires e Macêdo (2006, p. 88) “a cultura de uma organização será um conjunto de características que a diferencia em relação a qualquer outra.” As interações entre seus atores organizacionais, cada um com seus valores culturais, são responsáveis pela formação da cultura organizacional, e com o ambiente em que a organização está inserida. Em que a cultura produzirá regras de comportamentos a serem aceitos por todos, expressa por todos os membros.

Para Bergue (2010), a absorção de elementos culturais novos apenas acontece quando a organização reúne previamente condições adequadas, especialmente se essas condições

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estão relacionadas à permeabilidade das fronteiras organizacionais em relação a fatores externos dos mais diversos.

Para o autor, alguns traços culturais são inerentes as organizações públicas, diferenciando das organizações privadas, com impacto direto no modelo cultural, como o paternalismo representado por licenças, vantagens e concessões especiais aos servidores públicos, a presença de cargos de livre nomeação e exoneração, e sua característica heterogeneidade, devido à convivência de diversas culturas em uma mesma organização. A instituição pública brasileira possui aspectos de natureza histórica, solidificados pelos valores organizacionais e elementos culturais fortes, intensificados pelos aspectos normativos e legais.

As organizações públicas são sistemas complexos com alto índice de burocracia em seu funcionamento, cujas condições e a organização do trabalho tendem a uniformizar-se no setor público. Tal situação é justificada por Pires e Macêdo (2006) ao definirem que os dirigentes dessas organizações são responsáveis perante uma autoridade externa à organização pública, gerando, assim, uma tendência à centralização das decisões.

Para Pires e Macêdo (2006), algumas das características das organizações públicas brasileiras são a centralização, o apega à regras e rotinas, supervalorização à hierarquia, paternalismo nas relações, apego ao poder, e aversão ao empreendedorismo. Características essas contrárias às características instituídas pela administração pública gerencial, provocando grande resistência às mudanças propostas pela Reforma do Estado.

Enquanto que forças inovadoras, apesar de se deparar com grandes dificuldades para implantar o novo modelo gerencial, tentam introduzir uma cultura mais flexível, focada na gestão empreendedora, a fim de atuarem de forma mais eficiente. Assim, como colocado por Bergue (2010), a inserção do novo modelo gerencial, incompatíveis com os valores culturais das organizações públicas brasileiras, tenderá a ser superficial e essencialmente estético, podendo inclusive provocar danos à organização social, e poderá justificar o reduzido nível de sucesso das reformas administrativas.

Resistência à Mudança e a Morte Simbólica

Num contexto de mudança, agora apresentada pelas forças inovadoras do modelo gerencial de administração pública, é aceitável certa resistência por parte dos atores internos organizacionais, podendo ser tanto um fator positivo ou negativo, para tanto, Bergue define resistência à mudança como:

resultado de uma contabilização de perdas e ganhos potenciais que possam decorrer de uma inovação introduzida por um processo de mudança. A resistência à mudança pode ser minimizada, ou mesmo elidida, se o indivíduo ou grupo destinatário da mudança for capaz de constatar resultado positivo no balanço de perdas e ganhos decorrentes da inovação. (2010-2, p. 51)

Cesar (2010) conceituou que a mudança organizacional depende do conjunto de indícios apresentados pela organização aos atores internos e percepção que os mesmos desenvolverão, podendo ser interpretada como uma oportunidade de ascensão ou risco e incertezas. Assim, para a autora, “o que determina a interpretação são as crenças pessoais em relação ao novo, à incerteza, ao risco” (2010, p. 186). Quando são interpretadas pelos atores que a vivem, como risco e incerteza, poderá ser considerada como uma ruptura irreversível, de perda, denominando-a como morte simbólica. Desse modo, se a mudança é percebida como um estímulo irreversível, o sentimento dominante é o medo, a ansiedade e o estresse, resultando em problemas de saúde, físicos e psicológicos, dos atores envolvidos. O processo de resistência à mudança é considerado por Bergue (2010-1) como um dos principais elementos de disfunção da organização burocrática, como uma decorrência lógica

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do apego às normas e regulamentos, cuja essência está relacionada ao medo da perda do espaço e do poder. Para o autor, nas organizações em processo de mudança sempre haverá pessoas ou grupos a serem impactados negativamente, tendentes a perturbar a ordem vigente em resposta ao risco que tais mudanças podem provocar às conquistas já consolidadas ou em processo. Mas considera haver atores organizacionais que adotam um comportamento diverso, quando identificam que a mudança pode refletir em melhorias pessoais ou para o grupo. Bergue (2010-1) também considera a ausência de inovação e a conformidade com as rotinas como um fenômeno comum em organizações públicas brasileiras. Para o autor, principalmente quando as rotinas de trabalho são mais formalizadas e padronizadas, é natural aos autores internos “buscarem a manutenção de um estado de segurança e de constante redução de esforços despendidos no trabalho, as inovações nos processos organizacionais tendem a ser reduzidas (ou nulas).” (Bergue, 2010, p. 73) Para o autor, as mudanças nos processos, ou o arranjo físico do ambiente de trabalho podem ser vistos como prejudicial à cultura existente, provocando perda de poder e espaço dos indivíduos frente ao grupo ou do grupo frente à outros subgrupos, ou mesmo, medo de que as mudanças transpareçam a fragilidade ou dificuldade dos atores internos, frente às novas atividades ou atribuições. Assim, Bergue afirma que “as pessoas nesses casos e situações acabam conformando-se com as atividades e os métodos de trabalho vigentes, desconsiderando muitas vezes a possibilidade e a necessidade de mudança.” (Bergue, 2010, p. 73) Para Bergue (2010-1) as características presentes nas organizações públicas, como a valorização da hierarquia e a falta de autonomia dos atores, dificultando o processo de tomada de decisão, são representadas como típicas disfunções do modelo proposto por Max Weber. Sendo que a compreensão desses fenômenos organizacionais é um estágio necessário à concepção de um plano para transformação das organizações públicas, com o intuito de melhorar o desempenho institucional. Mudança Organizacional para Cesar (2006) é representada por rupturas de forma irreversível, de estados estabelecidos, especialmente quando tais mudanças estão relacionadas com mudança de padrões culturais. Para a autora, a tecnologia é apontada como geradora de mudanças do sistema de produção e organização do trabalho e o desempenho dos gestores frente à situação de mudança é identificado como responsável pela origem das crises organizacionais.

A transformação de estruturas organizacionais para estruturas inovadoras exige a ruptura de crenças e valores estabelecidos, exigindo padrões culturais diversos, repleto de criatividade, iniciativa e inovação. Cesar (2006) acredita que são exigidos dos atores internos em situações de mudanças para estruturas inovadoras, novas atitudes e comportamentos, contudo, as mudanças provocam nos atores internos, situações de ansiedade e de perda do referencial, pois perdem os padrões de reconhecimento das relações sociais e o senso de coletividade.

Os funcionários das organizações em processo de mudança, conforme apontado por Cesar (2006), passam por dificuldades originadas por perdas de posição, ameaça ao emprego, solvência da equipe de trabalho ou outras situações de ruptura irreversível. Nessas situações é comum encontrar pessoas estressadas, com exaustão emocional, perda de qualidade de vida no trabalho e em desequilíbrio emocional, ou com outras questões psíquicas, devido ao medo diante do novo e da implantação de novas tecnologias ou processos.

Assim, Cesar descreve os períodos de transição de mudança: Quando as empresas introduzem programas de modificação organizacional nem sempre há tempo para o desenvolvimento e interiorização de novos valores. Embora as mudanças possam até

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ocorrer de forma paulatina, no período de transição há uma fase de caos intermediário, onde padrões antigos (principalmente normas e comportamentos) estão em fase de abandono e os novos ainda não foram totalmente introjetados. Como neste momento também se convive com a irreversibilidade da mudança, pelo fato de que as situações abandonadas nunca voltarão, pois estarão configuradas em outro tempo e espaço, o sentimento de pertinência à empresa fica ameaçado, pois os empregados não sabem mais a qual empresa pertencem. (2006, p. 6)

O sentimento de perda dos atores internos é caracterizado por Cesar (2006) como “mortes simbólicas”, havendo elaboração de luto decorrente das possibilidades de vivência de perda. Ao negar tais perdas, impedindo que as pessoas expressem seus sentimentos, por significar fragilidade por parte dos atores internos, podem provocar distúrbios de natureza psicológica com impactos no nível de produtividade organizacional. Por fim, Cesar (2006) caracteriza a aproximação do estágio de morte, como “o novo também gera medo, pois é completamente desconhecido, mesmo que represente uma situação almejada.” (p. 7). Contudo, entende que quanto mais preparadas as pessoas estiverem para uma elevação de patamar no trabalho, mais facilmente elas se despedirão das fases anteriores. O tempo de aproximação da morte também é considerado uma variável nos estudos de morte simbólica nas organizações, a partir da análise da percepção de perigo como ameaça interna. Tribunal Regional do Trabalho da 2a Região e a Implantação do Processo Judicial Eletrônico

A Justiça do Trabalho foi instalada em 1941 no centro da cidade de São Paulo, abrangendo as demandas judiciais dos estados de São Paulo, Mato Grosso e Paraná, na época com a denominação de Conselho Regional do Trabalho da 2a Região. Quando em 1946 passou à condição de Tribunal.

Em 1975 foi criada a 9a Região no estado do Paraná e em 1981 foi criada a 10o Região, desmembrando o estado do Mato Grosso, transferindo assim, as demandas judiciais pertinentes àqueles territórios. Em 1986 foi criado a 15a Região sediado na cidade de Campinas, com jurisdição do interior do estado de São Paulo, permanecendo sob responsabilidade da 2a Região os municípios da capital paulista, da Região Metropolitana e da Baixada Santista.

No ano de 2010, conforme dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ – o Tribunal da 2ª Região recebeu 345.266 casos novos em 1ª Instância, respondendo por 16,23% de todos os processos novos da Justiça do Trabalho no país. Contudo, vale ressaltar que atualmente a Justiça do Trabalho é dividida nacionalmente em 24 Regiões, sendo que a 2ª Região, São Paulo (Capital, Região Metropolitana e Baixada Santista) é a maior do país.

Já de acordo com o divulgado pelo TRT2, dos 345.266 mil processos novos de 1ª Instância, 219.119 foram distribuídos na comarca de São Paulo, aleatoriamente entre as 90 Varas do Trabalho, e os 126.147 processos restantes foram distribuídos entre as demais comarcas, confirmando ser a comarca de São Paulo a maior do país.

Algumas mudanças estruturais fazem parte da história desse grande órgão da administração direta federal, como o início do processo de informatização na década de 90 do século passado, com poucos computadores distribuídos para auxiliar as atividades dos servidores. Em 1994 foi implantado o Sistema de Acompanhamento Processual (SAP), desenvolvido pelo próprio regional, gerando uma grande mudança organizacional com impacto direto nas rotinas e nas atividades de magistrado e servidores. Em 2003 e 2004, iniciou-se o projeto de modernização relacionado à inauguração do Fórum Ruy Barbosa, com

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o intuito de uniformizar as estruturas das Varas do Trabalho da Capital a partir da revisão dos processos de trabalho.

Contudo, os sistemas informatizados utilizados pelos diversos regionais e ramos do judiciário federal, dificultam o trabalho dos advogados e a comunicação entre todas as unidades judiciais do país. Assim, em 2009, O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) iniciou esforços para o desenvolvimento do processo judicial eletrônico (PJe) em nível nacional, com o intuito de criar para os tribunais brasileiros um sistema único e aberto. O PJe unificaria com segurança, racionalização e tramitação de demandas judiciais, permitindo o acesso à rotina e ao acompanhamento dos processos jurisdicionais e administrativos no Judiciário, com mais transparência e rapidez no andamento dos autos.

Em parceria com diversos tribunais brasileiros, as funcionalidades específicas da Justiça do Trabalho estão em desenvolvimento pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), Tribunal Superior do Trabalho (TST) e a Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) entre eles o TRT da 2ª Região (São Paulo). Para os próximos anos, a Justiça do Trabalho possui meta de implantação do PJe em diversas Varas do Trabalho dos Regionais de todo Brasil. Apesar de nenhum Tribunal, atualmente funcionar de forma 100% digital, o PJe tem sido implantado em diversos regionais, ainda na forma de testes.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região – SP foi o 4o Regional Trabalhista a criar uma vara-piloto do PJe, implantada em fevereiro de 2012 na cidade de Arujá, totalmente eletrônica. Ainda nesse ano, foi apresentado projeto de previsão de implantação de novas Varas para o ano de 2013, nas comarcas da Baixada Santista e grande São Paulo, além da capital. 3 MÉTODO

A pesquisa proposta para este trabalho possui natureza exploratória e quantitativa, com a utilização do método do estudo de caso, cuja unidade de análise foi o maior órgão do Poder Judiciário Federal, em fase de implantação do processo judicial eletrônico, com o intuito de identificar o processo de resistência à mudança dos atores internos.

A análise dessa organização como estudo de caso é fundamental para o alcance do objetivo geral da presente pesquisa. Yin (2003) destaca o estudo de caso não apenas como uma tática de coleta de dados, ou uma característica do planejamento em si, mas sim de uma estratégia de pesquisa abrangente, explicitando o estudo de caso como:

Estratégia de pesquisa compreende um método que abrange tudo – com a lógica do planejamento incorporando abordagens específicas à coleta de dados e à análise de dados. (Yin, 2003, p. 33)

Segundo Gil, o estudo de caso consiste em: Estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, de maneira que permita seu amplo e detalhado conhecimento. [...] a crescente utilização do estudo de caso no âmbito das Ciências Sociais, com diferentes propósitos, tais como explorar situações da vida real cujos limites não estão claramente definidos. (Gil, 2002, p. 54)

Yin (2003) ainda salienta que como se torna difícil o discernimento entre fenômeno e contexto, outras características técnicas são importantes para a definição do estudo de caso. O estudo de caso é uma estratégia de pesquisa que abrange a lógica de planejamento, evidenciando a coleta e a análise de dados, caracterizando-se como um processo global e não apenas como sendo uma tática para coleta de dados.

Com o intuito de identificar o nível de resistência à mudança dos atores internos, foi aplicado questionário extraído da pesquisa acadêmica realizada por Cesar (1999), pré-testado na ocasião, e aplicado 3 anos posterior à mudança na organização estudada pela autora. No

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entanto, como a presente pesquisa visa identificar a resistência à mudança anterior ao seu acontecimento, o questionário precisou ser adaptado e foi pré-testado com 5 diretores escolhidos aleatoriamente, dentre os 75 diretores respondentes.

Assim, o questionário utilizado na presente pesquisa é dividido em quatro partes, a saber:

• 1º com intuito de medir perdas e ganhos foi definida uma escala balanceada de 6 pontos, sem ponto neutro. Nesta seção foram abordados os aspectos relacionados à recursos humanos, filiação ao grupo, comprometimento com a organização e mudanças dos procedimentos, com a implantação do processo judicial eletrônico;

• 2º caracterização do estado de ânimo, para que os respondentes escolhessem os 10 sentimentos mais comuns nos últimos 12 meses, indicando do mais frequente ao menos frequente;

• 3º apresentação de uma lista de sintomas somáticos associados ao luto e estresse a serem selecionados pelos respondentes apenas se alguns dos sintomas fossem presentes, sem obrigatoriedade de seleção, nos últimos 12 meses;

• 4º informações pessoais sobre os respondentes, como tempo como servidor da instituição, tempo no cargo de direção, idade, sexo, estado civil e escolaridade. Ao aplicar o questionário, a pesquisadora pessoalmente orientou todos os respondentes

retornando ao final do expediente ou no dia seguinte para a retirada, informando que os formulários não deveriam ser identificados.

Os questionários foram aplicados aos ocupantes de cargos de direção das 90 Varas do Trabalho de São Paulo. Estimou-se o tamanho da amostra a partir do procedimento da amostra probabilística, considerando a população de 90 diretores de secretaria da cidade de São Paulo. Importante frisar que a todos foi requisitado o preenchimento dos questionários, contudo, apenas 75 responderam a pesquisa, garantindo no máximo de 5% erro da pesquisa.

A escolha por esses atores internos é justificada por ser uma organização funcionalista, cuja hierarquia é culturalmente muito valorizada, pela proximidade desses gestores com seus subordinados, uma vez que trabalham no mesmo ambiente, sem qualquer divisão, pois entende que os mesmos podem influenciar diretamente as percepções e expectativas de seus subordinados em relação à organização e sua cultura. E, por último, pelo impacto que a implantação do processo judicial eletrônico pode provocar a esses atores, pois, caso não se adaptem a esta nova situação, podem ter seu cargo ameaçado.

Já a escolha pela aplicação apenas nas Varas do Trabalho na cidade de São Paulo é justificada pela homogeneidade estrutural e de carga de trabalho, além de ser a maior comarca do Brasil, em quantidade de processos trabalhistas distribuídos.

Os resultados do questionário foram tratados estatisticamente, com o uso de Excel, da seguinte maneira: foram analisados individualmente os aspectos relacionados às expectativas de ganhos e perdas com a implantação do PJe; também foram analisados os sentimentos mais frequentes, do 1º ao 10º mais frequente, a fim de identificar a existência de medo e ansiedade dos atores frente a uma situação de mudança organizacional; foram analisados os estados somáticos, com análise individual por cada respondente, com o objetivo de traçar o perfil de estresse dos mesmos; e por fim, foram analisados os dados pessoais com o intuito de identificar o perfil dos respondentes. Desse modo, todos os resultados foram relacionados à análise de conteúdo, com o objetivo de responder a pergunta de pesquisa: Situações de mudanças, com a implantação do modelo gerencial na administração pública, causam resistência por parte dos atores internos institucionais?

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4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

De acordo com Bergue (2010-2) a resistência à mudança resultante de forças inovadoras do modelo gerencial da administração pública resulta de uma contabilização de perdas e ganhos potenciais pelos atores internos, podendo ser minimizada caso o grupo destinatário constate resultados positivos. Assim, ao analisar as expectativas de ganho ou perda com a implantação do processo judicial eletrônico o mais expressivo foi a posição de ganho, com a média de 85,25% entre todos os aspectos apresentados no questionário. No entanto, a posição neutra apresentou destaque, com o total de 48,50% das respostas, considerando a soma das escolhas de pouca perda e pouco ganho.

Dentre os itens perguntados, foram apresentados valores mais significativos de perda em relação aos quesitos estabilidade no cargo, com 33,33% dos respondentes com expectativa de perda, e em apoio da equipe em situações de crise pessoal, com posição de perda de 29,33% dos respondentes. Nesse caso, os resultados apresentam medo de perda de cargo e poder, e como mencionado por Bergue (2010-1), nas organizações em processo de mudança sempre haverá pessoas a serem impactadas negativamente, e estas poderão perturbar a ordem vigente em resposta ao risco de mudança. Os respondentes que demonstraram condição de perda no item estabilidade no cargo, isto é, 33,33% dos entrevistados, 32% ocupam o cargo de diretor entre 1 ano ou menos, e desse total, 80%, no geral, demonstram uma posição de pouco ganho, 16% acreditam ter muito ganho e 4% acreditam ter pouca perda com a implantação com o processo judicial eletrônico. Tais resultados demonstram que o pouco tempo no cargo de direção pode significar a não permanência no cargo numa situação de mudança, além de demonstrar uma posição neutra diante da implantação do novo sistema.

Em contrapartida, os aspectos que apresentaram maior índice de ganho foram cooperação dentro da equipe de trabalho com 90,67% relacionado a filiação de grupos, controle sobre os processos na secretaria com 93,33% e tempo de tramitação de processo com 96%, estes dois últimos, relacionados à mudança de procedimentos com a implantação do processo judicial eletrônico.

Entre os quatro aspectos abordados, recursos humanos, filiação ao grupo, comprometimento com a organização e mudanças dos procedimentos, de modo geral, o aspecto relacionado à mudança de procedimentos apresentou maior índice de ganho com média de 91,33%, enquanto que o aspecto que apresentou menor média de ganho foi relativo à recursos humanos, com 77,33%, principalmente por incluir o item estabilidade no cargo, apresentado com aquele com maior índice de perda entre os respondentes.

Os resultados expressivos de ganho, numa situação de mudança organizacional podem representar, como afirmado por Bergue (2010-1), a existência de atores organizacionais com comportamento diverso da resistência por identificarem que a mudança poderá refletir em melhorias pessoais ou para o grupo. Contudo, tais resultados precisam ser analisados em conjunto aos demais aspectos abordados ao longo da pesquisa.

Em relação aos estados de ânimo, de acordo com Cesar (2006) em situações de mudanças são exigidos dos atores internos novas atitudes e comportamentos, podendo provocar situações de ansiedade e perda de referencial, por isso da importância da análise dos sentimentos mais frequentes entre os respondentes. Assim, os sentimentos mais presentes nos últimos 12 meses pelos diretores de secretaria, a moda em cada posição, do 1º ao 10º sentimento mais presente, estão demonstrados no quadro a seguir:

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Sentimentos 1a Moda 2a Moda

1o Esperança Otimismo

2o Realização Alegria

3o Ansiedade Esperança

4o Ansiedade Frustração

5o Ansiedade Realização, Tristeza, Coragem e Disposição

6o Coragem Ansiedade

7o Inquietação Ânimo

8o Abandono e Ansiedade Inquietação e Disposição

9o Fadiga Desânimo

10o Fadiga Frustração e Paz

Tabela 1. Incidência de Sentimentos nos últimos 12 meses – do 1º ao 10º mais frequente. Como demonstrado, exceto os sentimentos de realização e alegria que figuraram como

o 2º mais frequente, em geral, ocorre a predominância de sentimentos negativos como ansiedade (sugerindo presença de medo quanto à mudança com a implantação do processo judicial eletrônico), frustração, tristeza, inquietação, desânimo e fadiga. Figuram, também, sentimentos positivos como esperança, otimismo e coragem, mas estes podem sinalizar dificuldades ou algum grau de fragilidade psicológica para enfrentar mudanças.

A presença do sentimento fadiga, como comentado por muitos dos respondentes quando da apresentação do questionário, pode estar relacionada a carga atual de trabalho, por se tratar de uma grande comarca em movimentação de processos trabalhistas e pelos procedimentos burocráticos e as tecnologias obsoletas disponíveis atualmente pela instituição. Podendo, também, ser esta uma das justificativas pelo resultado de ganho com a implantação do processo judicial eletrônico, mesmo que para alguns possa gerar insegurança quanto à estabilidade no cargo.

Já a figuração do sentimento de abandono, também como comentado por alguns respondentes, pode estar relacionada com situações de mudanças de procedimentos ou normas e provimentos que não respeitam à condição de trabalho das Secretarias, sendo que esses diretores muitas vezes não são participados ou nem mesmo recebem orientações e informações para tratarem essa nova condição. Assim, a ideia de abandono é resultante da falha de comunicação e relacionamento com a instituição.

Por esse mesmo motivo, muitos dos respondentes demonstraram preocupação com a implantação do processo judicial eletrônico, que de maneira geral acreditam ser positiva para a Justiça do Trabalho, mas temem o modo como essa implantação aconteça, sem informações, capacitação e estrutura necessária, e o suporte aos diretores e servidores que participarão desse processo de mudança. Essa mesma posição, pode justificar a presença dos sentimentos de ansiedade, esperança, otimismo, coragem, ânimo, inquietação e disposição. Reforçando as palavras de Cesar (2006, p.7) ao descrever que “o novo também gera medo, pois é completamente desconhecido, mesmo que seja uma situação almejada”.

Já a importância da análise sobre a existência dos sintomas somáticos nos processos de mudança, de acordo com Cesar (2006), é relacionada à situações comuns de pessoas estressadas, com exaustão emocional, perda de qualidade de vida no trabalho e em

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desequilíbrio emocional e com outras questões psíquicas, devido ao medo diante do novo e da implantação de novas tecnologias ou processos.

Sobre a existência dos sintomas somáticos, apenas 6,67% dos respondentes não apresentaram nenhum dos sintomas, 42,67% apresentaram de 1 a 3 sintomas, 44% apresentaram de 4 a 7 sintomas, e 6,67% apresentaram de 8 a 11 sintomas. Os sintomas menos presentes são vômito, boca amarga e tremores, figurando em menos de 10% dos respondentes, já a frequência de câimbras, respiração curta, perda de peso, palpitações e náuseas, variaram de 11 a 20% e a frequência de nó na garganta, queda de cabelo e boca seca figurou entre 31 a 40% dos questionários respondidos. Os demais sintomas foram mais frequentes, apresentando os seguintes resultados: suspiros – 30,67%; azia – 32%; aumento de peso – 34,67%; insônia – 50,67%; e, dores de cabeça – 65,33%.

A grande frequência desses sintomas representam várias situações de estresse, sugerindo desequilíbrio da saúde física dos respondentes e também, fragilidade psicológica, muito presente em situações de percepção de mudanças como perdas, originando processos de luto.

Por fim, 36,49% dos respondentes são servidores da instituição entre 1 a 10 anos, 33,78% são servidores de 11 a 20 anos e 29,73% são servidores a 20 anos ou mais. Já o tempo de ocupação do cargo, 33,78% estão no cargo a 1 ano ou menos, 50% ocupam o cargo entre 2 a 10 anos, e 16,21% são diretores a mais de 10 anos. Dos respondentes, 10,81% tem menos de 30 anos, 32,43% tem idade entre 30 a 39 anos, 36,49% tem idade entre 40 a 49 anos e 18,92% possuem mais de 50 anos de idade. Desses servidores, 55,41% são do sexo feminino, 40,54% são solteiros e 48,65% são casados, 40,54% possuem escolaridade com nível superior e 55,41% possuem pós-graduação completo. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos últimos anos, com os esforços de desenvolvimento do processo judicial eletrônico, a chegada de novas ferramentas tecnológicas que impactam o trabalho de magistrados e servidores torna-se iminente.

Assim, a proximidade da implantação do PJe nos Tribunais de todo país, a afirmação de Bresser Pereira (2005) de que a Reforma do Estado teve avanço modesto, de Abrucio (2007) de que o governo eletrônico é um instrumento necessário para elevação da eficiência governamental e por Bergue (2010-1) de que a resistência à mudança é elemento da organização burocrática, motivou a presente pesquisa com o intuito de responder a pergunta: Situações de mudanças, com a implantação do modelo gerencial na administração pública, causam resistência por parte dos atores internos institucionais?

Os resultados encontrados de ganho sobre a percepção dos respondentes com a implantação do processo eletrônico, como mencionado por Bergue (2010-1) pode minimizar ou eliminar a resistência à mudança dos atores internos, por identificar resultado positivo no balanço de ganhos e perdas decorrentes da inovação, apesar de parcela expressiva de diretores demonstrar receio de perda do cargo em comissão com essa mudança.

Contudo, apesar de expectativa de ganho, os estados de ânimo, principalmente representados por esperança, otimismo, ansiedade, coragem, disposição, ânimo e inquietação demonstram que os atores entrevistados vivem em situações de risco e incerteza, e como colocado por Cesar (2006), situações com essas características podem ser percebidas como um estímulo irreversível, cujo sentimento dominante é o medo, ansiedade e o estresse, denominando morte simbólica.

Como também colocado por Cesar (2006), nessas situações é comum encontrar pessoas estressadas, com exaustão emocional, perda de qualidade de vida no trabalho e em

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desequilíbrio emocional, ou com outras questões psíquicas, devido ao medo diante do novo e da implantação de novas tecnologias ou processos. Desse modo, os resultados encontrados sobre os sintomas somáticos demonstram várias situações de estresse, sugerindo desequilíbrio da saúde física dos respondentes e também, fragilidade psicológica, muito presente em situações de percepção de mudanças como perdas, originando processos de luto.

Assim, apesar de conscientemente os respondentes perceberem situações de ganho com o PJe, os resultados com os estados de ânimo e sintomas somáticos demonstram, principalmente, sentimentos de ansiedade e estresse, e podem resultar em resistência à mudança, confirmando a pergunta de pesquisa e a hipótese alternativa H1 – Há relação entre a implantação do modelo gerencial e o processo de resistência por parte dos atores internos.

Demonstra-se importante a realização de pesquisas futuras em estágios diversos do processo de mudança apresentado na presente pesquisa, a fim de identificar situações de resistência e a existência de luto organizacional. Podendo também, aprofundar os estudos com o intuito de identificar os impactos na saúde física e psicológica dos atores envolvidos, e o reflexo no nível de absenteísmo e na produtividade organizacional. As limitações da presente pesquisa estão relacionadas com a impossibilidade de aplicação o questionário a todos os envolvidos com a implantação do processo eletrônico em 1ª e 2ª instância, em outros regionais e outras justiças.

A presente pesquisa contribui para a teoria ao relacionar os conceitos de resistência à mudança com o conceito de luto organizacional, com os estudos em gestão pública, além da utilização de análise empírica de uma situação que antecede à mudança organizacional. Contribui para prática, ao levantar a discussão que numa situação de mudança, as pessoas precisam ser preparadas para o novo e sua saúde física e psicológica deve ser preservada, minimizando os processos de luto. Numa organização pública, principalmente pelas características culturais, a valorização da hierarquia e a estabilidade dos servidores, um processo de mudança não gerenciado adequadamente pode gerar prejuízos irreversíveis.

Finalmente, os resultados apresentados, de forma geral, levam à reflexão de como esses atores entrevistados, com sentimentos de medo, ansiedade e estresse, podem ser responsáveis pelo entusiasmo e motivação de número expressivo de servidores no processo de mudança organizacional. E, principalmente, na situação de modernização e informatização, tratada como protagonista principal, não se pode esquecer que as pessoas participantes e impactadas por esse processo precisam ser cuidadas e sua saúde física e psicológica preservadas, pois serão esses os grandes responsáveis pelo sucesso dessas mudanças.

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