a flexibilizaÇÃo das normas trabalhistas, sob a ... · 2.5 a consolidação das leis do trabalho...

61
1 INSTITUTO A VEZ DO MESTRE 2 3 A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS 4 TRABALHISTAS, SOB A PERSPECTIVA DE 5 UMA “REALIDADE NECESSÁRIA”, FRENTE 6 À PRESERVAÇÃO DOS CONTRATOS DE 7 TRABALHO. 8 9 10 MARIA LUIZA ARAUJO SILVA 11 12 13 14 15 ORIENTADOR: JOSE ROBERTO 16 11 DE SETEMBRO DE 2010. 17 18

Upload: tranthuan

Post on 08-Dec-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

1

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE 2

3

A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS 4

TRABALHISTAS, SOB A PERSPECTIVA DE 5

UMA “REALIDADE NECESSÁRIA”, FRENTE 6

À PRESERVAÇÃO DOS CONTRATOS DE 7

TRABALHO. 8

9

10

MARIA LUIZA ARAUJO SILVA 11

12

13

14

15

ORIENTADOR: JOSE ROBERTO 16

11 DE SETEMBRO DE 2010. 17

18

Page 2: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

1

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE 1

2

3

A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A 4

PERSPECTIVA DE UMA “REALIDADE NECESSÁRIA”, FRENTE 5

À PRESERVAÇÃO DOS CONTRATOS DE TRABALHO. 6

7

8

Este estudo busca apresentar a proposta de flexibilização como uma 9

realidade necessária diante de uma economia altamente competitiva de 10

mercados, na qual a legislação trabalhista protege o hipossuficiente que é o 11

trabalhador, de fato, mas que, no entanto, não assiste de forma apropriada o 12

empregador, o qual encontra dificuldades diversas para a manutenção dos 13

postos de trabalho. Neste intuito, este trabalho tem por foco demonstrar que a 14

flexibilização em nada se compara à desregulamentação das normas 15

trabalhistas, quando aplicada com o propósito de perpetuar e/ou preservar a 16

manutenção dos contratos de trabalho, assegurando em sua totalidade 17

princípios fundamentais constitucionais. 18

19

20

21

Curso: Direito e Processo do Trabalho 22

Autor: Maria Luiza Araujo Silva 23

24

Page 3: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

2

AGRADECIMENTOS 1

2

. A Deus e à espiritualidade por todas as oportunidades que tive. 3

. A minha mãe, sempre ao eu lado, acompanhando cada passo. 4

. Ao meu noivo, grande amigo e companheiro, em todos os momentos. 5

6

A todos que de alguma forma contribuíram para que aqui eu chegasse. 7

8

9

10

11

12

13

14

15

16

17

18

19

20

Page 4: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

3

DEDICATÓRIA 1

2

3

4

5

6

“Bom mesmo é ir à luta com determinação, 7

Abraçar a vida com paixão, 8

Perder com classe e 9

vencer com ousadia, 10

pois o triunfo pertence a quem se atreve... 11

A vida é muita para ser insignificante.” 12

13

Charles Chaplin 14

15

16

Page 5: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

4

RESUMO 1

2

A flexibilização das normas trabalhistas é um tema polêmico e que divide 3

opiniões. O cerne da discussão está na aplicabilidade, ou seja, em que 4

contexto torna-se necessária a flexibilização das normas trabalhistas? 5

Necessária faz-se a análise sobre a influência da economia nas relações de 6

trabalho, uma vez que frente aos avanços tecnológicos, a globalização acirra a 7

competitividade de mercados forçando empresas a reduzir postos de trabalho, 8

não sendo possível a muitos empregadores administrar o investimento 9

tecnológico necessário e a tributação imposta pela legislação trabalhista aos 10

contratos de trabalho. A flexibilização é uma tendência mundial. A CLT, 11

legislação antiga, não consegue adequar a função tutelar do Direito do 12

Trabalho aos interesses recíprocos dos atores sociais. De tal forma, faz-se 13

necessária uma maior liberdade entre os contratantes com o propósito de estes 14

estabelecerem, diretamente ou através de suas entidades sindicais, a 15

regulação de suas relações sem total subordinação ao Estado, mediante 16

recíprocas concessões. A flexibilização possui aplicabilidade quando os reais 17

interesses entre empregados e empregadores são convergentes, ou seja, 18

ambos lucram na relação contratual, preservando-a. Nesse intuito busca-se, 19

conseqüentemente, a redução da numerosa força de trabalho brasileira que se 20

encontra à margem da lei. 21

22

. 23

24

25

26

Page 6: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

5

METODOLOGIA 1

2

A partir do estudo sobre o processo de industrialização e as 3

conseqüentes relações de trabalho por ele estabelecidas, dar-se-á o início 4

deste trabalho. Será observado o contexto mundial e inserido neste cenário 5

será enfocado o contexto sócio-econômico do Brasil; as conquistas alcançadas 6

pelos trabalhadores, com a edição da CLT, até a década de 70, quando a 7

tecnologia mostrou avanços em larga escala, promovendo mudanças nas 8

relações trabalhistas que serão intensificadas com o processo de globalização. 9

Apresentado o cenário brasileiro será então possível a discussão acerca da 10

flexibilização, significado, importância, aplicação e limitações. O estudo será 11

pautado nas observações de diferentes doutrinadores tendo como principais 12

referências bibliográficas, a própria CLT de 1943, a Carta Magna de 1998, os 13

autores Arnaldo Süssekind, Amauri Mascaro Nascimento, Vólia Bomfim Cassar 14

e José Pastore. 15

16

17

18

19

20

21

22

23

24

25

Page 7: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

6

SUMÁRIO 1

2

FOLHA DE ROSTO 01

AGRADECIMENTOS 02

DEDICATÓRIA 03

RESUMO 04

METODOLOGIA 05

1. INTRODUÇÃO 09

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO 11

2.1 A Revolução Francesa 11

2.2 A Revolução Industrial 12

2.2.1 A industrialização no Brasil 13

2.3 O viés social do processo de Industrialização 14

2.4 O Direito do Trabalho 17

2.4.1 Princípios Norteadores do Direito do Trabalho 19

3

Page 8: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

7

2.4.1.1 Princípio da Irrenunciabilidade 20

2.4.1.2 Princípio da Continuidade da relação de emprego 21

2.4.1.3 Princípio da Primazia da Realidade 22

2.4.1.4 Princípio da Razoabilidade 23

2.4.1.5 Princípio da Boa-Fé 25

2.4.1.6 Princípio da Proteção ao Trabalhador 26

2.4.1.6.1 Princípio In Dubio Pro Misero ou Operário 27

2.4.1.6.2 Princípio da norma mais favorável 28

2.4.1.6.3 Princípio da prevalência da condição mais

Benéfica

29

2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30

2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32

2.6.1 A crise econômica frente ao processo de globalização 35

3. Flexibilização como via alternativa frente à globalização 37

3.1 Conceito de flexibilização 38

3.3 Flexibilização e desregulamentação 40

Page 9: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

8

3.4 As Correntes de Flexibilização do Direito do Trabalho 43

3.5 Flexibilização como alternativa à crise econômica 44

3.6 Flexibilização e sua aplicabilidade no Direito Brasileiro 47

3.7 Limites à Flexibilização 53

4. CONCLUSÃO 54

5. BIBLIOGRAFIA 55

1

2

3

4

5

6

7

Page 10: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

9

1. INTRODUÇÃO 1

O presente estudo busca mediante uma perspectiva positiva avaliar o 2

papel da flexibilização das normas trabalhistas, buscando-se avaliar sua 3

importância na manutenção dos contratos de trabalho diante da atua 4

conjuntura sócio-econômica mundial, a qual dificulta a manutenção de postos 5

de trabalho dada a competitividade de mercados. 6

A flexibilização das relações de trabalho vem avançando no Brasil, 7

seguindo uma tendência verificada e outros países1. Tal prática passa a figurar 8

nos debates acadêmico relacionados ao Direito do Trabalho em face dos 9

impactos provocados pela crise econômica e crescimento dos indicadores 10

relacionados ao desemprego. (CARTONI & LORENZETTI, 2008). 11

O mundo, nas décadas de 50 e 60, passou por um grande 12

desenvolvimento econômico. Em contrapartida, os anos 70 e 80 foram 13

marcados pelo impacto de dois choques petrolíferos, que atingiram a política 14

mundial de emprego. O questionamento do Direito do Trabalho tornou-se 15

inevitável. Segundo NASCIMENTO (1993) a economia e o direito implicam-se 16

de tal modo que tanto os fatos econômicos podem influir no direito do trabalho, 17

como o direito do trabalho influencia a ação destinada à produção de bens e 18

distribuição de riquezas. 19

A crise econômica levou os empregadores a exigirem maior flexibilidade 20

do mercado do emprego. Além das crises econômicas e do grande 21

desequilíbrio social, caracterizado pela grande concentração de riquezas, a 22

globalização trouxe para as empresas a necessidade de desenvolverem 23

eficientes métodos de competição econômica, uma vez que vivemos em um 24

cenário mundial de livre fluxo de mercados. O processo de globalização parece 25

indicar no sentido de que as relações de trabalho de um modo geral devem ser 26

1. CACCIAMALI, Maria Cristina, BRITO, Andre. Revista Brasileira de Estudos do Trabalho. Vol.2, nº. 2. 2002. p.91-120.

Page 11: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

10

modernizadas, por exemplo, para melhor proporcionarem uma adequada 1

harmonização a nível regional e talvez a nível internacional (ANDRADE, 1993). 2

Como não poderia deixar de ser, o período pós-industrial trouxe a 3

informática, a telemática e a robotização, elevando as taxas de desemprego a 4

níveis insuportáveis. Hoje, uma das maiores preocupações das entidades 5

internacionais, bem como dos governos é a questão do desemprego tendo-se a 6

flexibilização como saída para tal crise laboral. 7

Tal proposta permite que os sistemas legais lancem mão de fórmulas 8

alternativas de estipulação das condições de trabalho, através de negociação 9

coletiva, dos contratos individuais de trabalho ou dos próprios empresários2. 10

Dessa maneira, ampliam-se as possibilidades de complementação do 11

ordenamento legal, bem como se permite a adaptação de normas cogentes às 12

peculiaridades regionais ou do setor econômico, admitindo, também, a 13

derrogação de condições anteriormente ajustadas, para adaptá-las a novas 14

situações. 15

Este trabalho tem por objetivo apresentar a flexibilização como 16

importante ferramenta para a criação de normas aos casos específicos, aos 17

contratos reais. Parece acordante entre juristas e economistas, que o objetivo 18

primordial da flexibilização nas relações de trabalho, no contexto atual de 19

globalização da economia e de crises na oferta de empregos, pelo menos no 20

que diz respeito ao seu aspecto prático, é o de evitar a extinção de empresas, 21

com evidentes reflexos nas taxas de desemprego e agravamento das 22

condições socioeconômicas. Flexibilizar normas do Direito do Trabalho visa 23

assegurar um conjunto de regras mínimas ao trabalhador e, em contrapartida, 24

a sobrevivência da empresa, por meio da modificação de comandos legais, 25

procurando outorgar aos trabalhadores certos direitos mínimos e ao 26

2 COSTA, Orlando Teixeira Filho da.Direito Alternativo ou Flexibilização. In: Ver. LTr. São Paulo: LTr, 1992. nº 56, p.779

Page 12: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

11

empregador a possibilidade de adaptação de seu negócio, mormente em 1

épocas de crise econômica (MARTINS, 2000). 2

Segundo Letícia Braga Santos, a Flexibilização busca a elaboração da 3

regra, jamais sua eliminação (SANTOS, 2009, apud SARTÓRIO, 2006). Deverá 4

ocorrer sempre in mellius (melhorando condições), pois no contrario, virá de 5

encontro aos preceitos que regem o contrato de trabalho, ou seja, de alguma 6

forma deverá ser benéfica ao trabalhador. 7

8

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO TRABALHO 9

10

2.1 A Revolução Francesa 11

Uma nova organização social é estabelecida com o fim do Sistema 12

Feudal. A Revolução Francesa apresenta um novo perfil de sociedade, de 13

capital, em que a produção e o consumo tornam-se geradores de necessidades 14

artificiais. O trabalho como atividade humana introduz o ideal de acúmulo de 15

propriedade e de conhecimento, gerando um modo de organização liberal-16

individualista de nova dimensão. ARENDT (2002). 17

A classe burguesa, destituída de títulos de nobreza e não conectada à 18

Igreja Católica, possuía a moeda, cada vez mais importante como instrumento 19

de poder; o capitalismo liberal se assentou como modelo econômico e social; E 20

a propriedade, como decorrência lógica, passa a ser concebida como fruto 21

legítimo do trabalho. O Homem volta os olhos para si mesmo e em lugar do 22

SER, assume importância o processo. Instaura-se uma nova ordem social, 23

política e econômica. Com o capitalismo, houve a necessidade da 24

transformação dos servos em trabalhadores livres e assalariados e da 25

liquidação da propriedade feudal do solo. A segurança constitui uma 26

Page 13: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

12

necessidade premente. Torna-se fundamental a existência de um 1

conjunto de Leis que garanta a legitimidade do novo governo. (MORAES 2000). 2

Ao ser instaurado, o capitalismo trazido pelo liberalismo clássico contou 3

com a força do Estado (sobretudo através das Leis) para se consolidar. 4

Fortaleceu o Estado-legislador, tratando-o como aliado. E a Constituição de 5

1791, no lugar da antiga divisão dos indivíduos em nobres e plebeus, 6

tipicamente feudal, consagrou um novo princípio de distinção entre os 7

indivíduos: a riqueza, a qual segregou a sociedade em pobres e ricos 8

(REZENDE & DIDIER, 1996). 9

2.2 A Revolução Industrial 10

O sistema capitalista consiste em produzir para vender, visando o lucro, 11

a fim de continuar produzindo e vendendo em escala cada vez mais ampla e, 12

portanto, com uma lucratividade cada vez maior. E foi exatamente isso que a 13

Revolução Industrial tornou possível ao mudar totalmente a face do mundo 14

(KOSHIBA, 2000) 15

O industrialismo levou ao liberalismo, doutrina pela qual se entende o 16

trabalho como a atividade humana aplicada à produção, ou seja, é um fator de 17

produção. Assim, “o salário depende da relação entre o capital e o número de 18

operários, sujeito à lei d a oferta e da procura” (NASCIMENTO, 1998). 19

A Inglaterra desempenhou um papel pioneiro na Moderna 20

industrialização, a partir do século XVIII, baseado na substituição da ferramenta 21

pela máquina, da manufatura pela fábrica e da energia física pela mecânica na 22

produção de mercadorias. Graças à expansão ultramarina e a colonização da 23

América, amplo mercado de transferência de riqueza para a Europa, foi 24

possível a acumulação primitiva de capital proporcionando os recursos 25

necessários à deflagração da 1ª Revolução Industrial, marcada pelo 26

surgimento da indústria fabril, e posteriormente da 2ª Revolução Industrial, com 27

o aparecimento do dínamo e motores a combustão Interna (MELLO & COSTA, 28

1994).29

Page 14: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

13

A Revolução Industrial não teve como personagens principais nem os 1

comerciantes nem os artesãos tradicionais, e sim o fabricante-mercador, que 2

adotando um estilo propriamente capitalista, selecionava os trabalhadores, 3

reunia-os num único local, supervisionando o trabalho com rigor. Tornou-se 4

característico do novo empresário capitalista, especializando-se na criação de 5

novas necessidades de consumo. Além disso, introduzia inovações e subvertia 6

o modo tradicional de produção, a fim de aumentar a produção e diminuir 7

custo. Dessa pratica resultou uma feroz concorrência, tornando o mercado 8

uma arena em que grandes fortunas surgiam e fabricantes antes prósperos 9

eram esmagados (KOSHIBA, 2000). 10

11

2.2.1 A industrialização no Brasil 12

As primeiras indústrias apareceram depois da vinda da Família Real em 13

1808. A abolição de quase 800 mil escravos foi fundamental para a 14

modernização da economia, assim como a chegada dos imigrantes trouxe a 15

perspectiva de novas relações de trabalho, embora ainda tivessem ligações 16

com o campo. 17

Em 1889 tem-se a proclamação da República e com a Constituição de 18

1891 o Brasil se torna uma Republica Federativa Presidencialista, sendo o 19

café, ainda, a principal e crescente fonte de renda da economia do país. 20

Conseqüentemente tem-se a expansão da rede ferroviária e a melhoria nos 21

serviços portuários e urbanos fortalecendo o mercado interno e abrindo 22

caminhos para a instalação de indústrias. O Brasil importava a maior parte das 23

mercadorias manufaturadas que consumia e exportava também, alem do café, 24

produtos como cacau, algodão e borracha (REZENDE & DIDIER, 1996).25

Page 15: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

14

Embora a economia brasileira fosse predominantemente cafeeira, havia 1

interesse em diversificar as atividades uma vez que as cidades cresciam e o 2

numero de substabelecimentos industriais aumentava em larga escala. A 3

Primeira Guerra Mundial foi favorável para a economia chegando a 5.936 o 4

número de indústrias no Brasil, no período de 1915 a 1919. A política 5

econômica nacionalista vigente na década de 30 permitiu um aumento na 6

produção de 11,3% e o Estado em seu papel interventor facilitava os 7

investimentos, sendo, portanto, fundamental na industrialização do Brasil. A 8

população urbana representava, em 1940, 31% da população total, cerca de 9

41.236.315 habitantes. O eixo da economia brasileira deslocava-se, 10

principalmente do nordeste, para o sudeste, e a vida social nas cidades ganhou 11

uma nova dimensão (COTRIM, 1995). 12

13

2.3 O viés social do processo de Industrialização 14

O sistema fabril na Inglaterra possibilitou a concentração de 15

trabalhadores tanto nos locais de trabalho quanto em seus bairros. As pessoas 16

puderam assim trocar experiências, discutir pontos de vista e atuar em 17

conjunto, criando uma realidade muito diferente daquela de seus 18

antepassados, ou seja, os servos ou escravos (MELLO & COSTA, 1994). 19

A Revolução Industrial intensificou o crescimento da população urbana e 20

contribuiu para a formação de uma nova classe social, a operária. Destituída da 21

posse dos instrumentos de trabalho (ferramentas e utensílios) e da propriedade 22

dos meios de produção (fábricas e máquinas), essa classe foi submetida no 23

início da industrialização a extenuantes condições de vida e de trabalho 24

(KOSHIBA, 2000).25

Page 16: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

15

O proletário do século XVIII tinha uma jornada de trabalho de até 16 1

horas, transformado em um ser desumanizado, com pouca formação intelectual 2

e seu ambiente de trabalho e de casa eram extremamente insalubres (BUDÓ, 3

2010). 4

Os primeiros industriais britânicos empregavam um elevado número de 5

crianças e mulheres, às quais impunham uma dura jornada de trabalho, de até 6

dezesseis horas diárias, em fábricas insalubres executando tarefas que não 7

precisavam ser executadas necessariamente por homens adultos. Os baixos 8

salários, as péssimas condições e a longa jornada de trabalho começaram a 9

ser combatidos com protestos e greves na defesa dos interesses da classe. 10

Nasciam desse modo, no calor do confronto entre trabalhadores e empresários, 11

os primeiros sindicatos, em meados do século XIX, clandestinos, haja vista que 12

o movimento era considerado ilegal. Sendo organismos de defesa de classe, 13

circunscritos à esfera econômica, os sindicatos dos trabalhadores restringiam-14

se às reivindicações salariais, à melhoria das condições de trabalho e à 15

diminuição da jornada de trabalho, sem que tais reivindicações, uma vez 16

atendidas, se estendessem obrigatoriamente por todas as empresas 17

(KOSHIBA, 2000). 18

As lutas, aliadas ao surgimento do Estado intervencionista já no século 19

XX, trouxeram a possibilidade de uma maior regulamentação dos direitos dos 20

trabalhadores, são exemplos a redução do horário de trabalho, a garantia das 21

férias e de repouso semanal remunerado. Foi com a intervenção do Estado na 22

tutela dos direitos dos trabalhadores que estes, após muitos anos de luta e de 23

sofrimento, foram reconhecidos. O aparecimento do sindicalismo foi bastante 24

significativo neste sentido, visto que foi o movimento dos trabalhadores 25

organizados o estopim para a mudança nas relações de trabalho (BUDÓ, 26

2010).27

Page 17: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

16

No Brasil, o movimento da classe operária, nas primeiras décadas de 1

república, era relativamente pequeno em função das atividades agrícolas 2

serem predominantes, e também porque o Estado reprimia duramente as 3

manifestações políticas de rua que contrariassem seus interesses (REZENDE 4

& DIDIER, 1996). 5

Segundo o estudioso contemporâneo Everaldo Dias (1977), o 6

desenvolvimento fabril brasileiro foi orientado por uma oligarquia patronal, que 7

estabelecia condições de vida sub-humanas, mediante base salarial 8

baixíssima, alimentação parca, moradias confinadas a barracões de fundo de 9

quintal, porões insalubres e cortiços próximos às fábricas. Tal proletariado 10

fabril era em grande parte feminino e jovem, com jornadas de 14 ou 15 horas 11

de trabalho e suscetível a doenças como anemia e tuberculose. 12

Eram duas as principais razões da superexploração do proletariado no 13

capitalismo selvagem, que então se delineava claramente no país: a primeira, 14

de natureza política, era decorrente da inexistência de leis de proteção ao 15

trabalho e de assistência social. Com dificuldades para se organizar – 16

repressão e autoritarismo por parte dos empresários e dos governos – a classe 17

operária ficava exposta à livre cobiça da oligarquia empresarial. A segunda 18

razão, de natureza econômica, estava relacionada ao barateamento da força 19

de trabalho no “mercado livre” capitalista. A mecanização rápida das industrias 20

instaladas no país, limitando o grau de qualificação dos operários, associado a 21

grande oferta de mão-de-obra em razão das imigrações, resultavam e 22

condições favoráveis aos empresários. Podiam pagar salários baixos e 23

contratar mulheres e crianças para serviços mais simples, exigir mais horas de 24

trabalho e não se viam obrigados a melhorar as condições insalubres das 25

fábricas (ALECAR et al, 1985). 26

Page 18: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

17

A insatisfação crescente dos trabalhadores, levou os mesmos a criarem 1

caixas beneficentes e associações de socorro mútuo, com fins assistenciais. 2

Percebendo que isso não bastava fundaram ligas e sindicatos de resistência 3

destinados a mobilizar e conscientizar a classe. As primeiras associações 4

operárias surgiram na ilegalidade e as manifestações dos sindicatos tinham por 5

objeto de luta principalmente a redução do horário de trabalho e das horas 6

extras, o fim do trabalho infantil e do trabalho noturno feminino (SILVA, 2002). 7

A primeira greve geral, em 1903, ocorreu no Rio de Janeiro sendo este o 8

início de uma onda de paralisações que perduraram ate a metade do século 9

XX, quando os direitos do proletariado enfim foram reconhecidos (BUDÓ, 10

2010). 11

2.4 O Direito do Trabalho 12

O Direito do trabalho representa uma conquista da classe operária no 13

Brasil. Uma vitória obtida mediante lutas incessantes tendo como pilar os 14

princípios norteadores do direito e visando à tutela do trabalhador, pólo 15

hipossuficiente na relação trabalhista. Busca-se desta forma uma igualdade 16

substancial sem perder de vista a valorização da dignidade do trabalhador 17

como pessoa humana (GROSSO, 2007). 18

Assim, o Direito do trabalho tem como propósito a preocupação com o 19

homem trabalhador inserido em seu ambiente de trabalho, assim como com as 20

melhorias das condições sociais do mesmo. 21

CASSAR (2010) destaca que a proteção ao trabalhador é a maior 22

característica do Direito do Trabalho, mediante a implementação de medidas 23

sociais pelo governo e sociedade, assim como através da regulamentação 24

legal das condições mínimas da relação de emprego.25

Page 19: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

18

Filho da modernidade, o direito do trabalho veio dar forma à relação de 1

emprego moderna associada ao mercado. É elemento estabilizador da 2

sociedade capitalista. Segundo Rüdiger (2004): 3

4

“O moderno Direito do trabalho, como um 5

direito que delimita a exploração dos 6

trabalhadores pelo capital, nasce, de um lado, 7

em razão da preocupação do próprio capital 8

com a reprodução da força de trabalho e, de 9

outro, no momento em que os trabalhadores se 10

reconhecem como coletivo. Esse 11

reconhecimento leva, no século XIX, a um 12

debate sobre o papel político dos trabalhadores 13

enquanto classe organizada.” 14

Em uma luta diária, os trabalhadores organizam-se em sindicatos com o 15

intuito de assegurar, de forma coletiva, o valor da compra e venda do trabalho 16

e a duração da jornada de trabalho como limites imediatos à exploração. O 17

Estado Liberal, ausente na defesa dos trabalhadores, permite que os mesmos 18

organizem a força de seu coletivo para obter melhores condições de trabalho. 19

O direito do trabalho possui caráter socializante, visto que destaca a 20

finalidade social e o caráter coletivo do direito. Através de uma legislação 21

imperativa, rompe-se a inércia do Estado buscando-se a garantia de direitos 22

mínimos e fundamentais à pessoa humana. Tal caráter social também está 23

ligado às questões coletivas, já que impõe a divisão dos problemas com toda a 24

sociedade, demonstrando a necessária solidariedade que deve existir entre os 25

agentes sociais que influenciam nas relações de trabalho (CASSAR, 2010).26

Page 20: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

19

Dessa forma, um conjunto de princípios, regras e institutos constitui o 1

Direito do trabalho, atuando sobre a vida em sociedade, sobre a mesma 2

produzindo efeitos, direcionando a vida humana e regulando práticas voltadas 3

à geração de empregos (GROSSO, 2007). 4

5

2.4.1 Princípios Norteadores do Direito do Trabalho 6

No intuito de estabelecer o equilíbrio na relação entre empregado e 7

empregador, consagrou-se o Principio da proteção ao trabalhador, de forma 8

que os direitos trabalhistas não sejam sobrepujados. A intervenção estatal 9

sustenta a existência da tal principio, mediante imposição de regras mínimas a 10

serem respeitadas pelas partes na relação de trabalho. 11

Observa-se uma mudança no contexto de aplicação do princípio da 12

proteção ao trabalhador, o qual alterna de um cenário de excessiva proteção 13

para uma realidade de desproteção ou de menos proteção do empregado. 14

Jurisprudência e súmulas recentes dos tribunais do trabalho caminham neste 15

sentido de uma defesa menos enfática do trabalhador (CASSAR, 2010). 16

Neste trabalho serão abordados, de forma sucinta, seis dos principais 17

princípios que norteiam o direito do trabalho, os quais apresentam opiniões 18

variadas uma vez que não apresentam uma elaboração definitiva. Serão 19

avaliados os seguintes princípios: Princípio da Irrenunciabilidade de Direitos, 20

Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, Princípio da Primazia da 21

Realidade, Princípio da Razoabilidade, Princípio da Boa-fé e Princípio da 22

Proteção, o qual se divide em três idéias gerais: princípio in dúbio pro misero 23

princípio da norma mais favorável e princípio da prevalência da condição mais 24

benéfica.25

Page 21: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

20

Sobre os princípios, NUNES3 (2002) esclarece que: 1

2

“Na realidade, o princípio funciona como vetor 3

para o intérprete. E o jurista, na análise de 4

qualquer problema jurídico, por mais trivial que 5

ele possa ser, deve, preliminarmente, alçar-se 6

ao nível dos grandes princípios, a fim de 7

verificar em que direção eles apontam.” 8

9

10

2.4.1.1 Princípio da Irrenunciabilidade 11

Este artigo dispõe a impossibilidade de o empregado renunciar ou 12

transacionar seus direitos trabalhistas expressa ou tacitamente. 13

Segundo o artigo 9º da CLT, é nulo todo ato vise à fraude dos direitos 14

trabalhistas, assim também o art. 468 da CLT, que considera nula toda 15

alteração contratual que prejudique o trabalhador. 16

GROSSO (2007) destaca que o princípio da irrenunciabilidade no Direito 17

do Trabalho é verificado na medida em que não é válido qualquer ato que 18

venha a retirar do empregado direito que já lhe pertence. Este princípio busca 19

evitar que mediante ato de pressão por parte do empregador, o empregado 20

possa ter diminuído alguns direitos ou até mesmo perdê-los. Vale ressaltar que 21

tanto faz se o direito já exista ou venha ainda a existir, o empregado não pode 22

renunciá-lo antes e nem depois.23

3. NUNES, Rizzato. O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana. São Paulo: Saraiva, 2002, p.37.

Page 22: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

21

Vale ressaltar que o empregado poderá, mediante declaração unilateral 1

de vontade, abandonar ou desistir de direito que possui sobre alguma coisa, é 2

a renúncia, a qual poderá ser expressa claramente, renúncia expressa, ou de 3

forma deduzida ou presumida, renúncia tácita, decorrente da omissão, ou 4

inexecução do ato, dentro de um prazo legal (CASSAR 2010). 5

Plácido e Silva (1993) 4, por sua vez, diz que: 6

“renúncia - (...) no sentido jurídico designa o 7

abandono ou a desistência do direito que se 8

tem sobre alguma coisa. Nesta razão, a 9

renúncia importa sempre num abandono ou 10

numa desistência voluntária, pela qual o titular 11

de um direito deixa de usá-lo ou anuncia que 12

não o quer utilizar (...). 13

14

2.4.1.2 Princípio da Continuidade da relação de emprego 15

Este princípio busca a manutenção da relação entre as partes, 16

empregador e empregador, visando à segurança e tranqüilidade para aquele 17

que realiza as atividades laborais. Através do princípio a continuidade da 18

relação de emprego o Direito do trabalho encontrou uma alternativa para 19

fornecer maior segurança aos contratos individuais de trabalho. 20

Segundo Junior (2010), este princípio é francamente favorável ao 21

trabalhador, na medida em que com o passar do tempo incorporam-se ao seu 22

patrimônio jurídico vantagens alcançadas pelas negociações coletivas e pelas 23

inovações legislativas e, principalmente, aquelas de caráter pessoal, como por 24

exemplo, promoções e adicionais que, por sua habitualidade, passam a 25

integrar o contrato de trabalho.26

4. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico .12. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1993, 4 v.

Page 23: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

22

Os reflexos práticos deste preceito podem ser observados nos termos 1

dos artigos 10 e 448 da CLT, no que tange a sucessão de empregadores: 2

“Art. 10 da CLT – Qualquer alteração na 3

estrutura jurídica da empresa não afetará os 4

direitos adquiridos por seus empregados.” 5

“Art. 448 da CLT – A mudança na propriedade 6

ou na estrutura jurídica da empresa não afetará 7

os contratos de trabalho dos respectivos 8

empregados.” 9

10

2.4.1.3 Princípio da Primazia da Realidade 11

Também conhecido como “contrato realidade”, este princípio preconiza 12

que na análise das questões relativas às relações de trabalho, deve-se 13

observar a realidade dos fatos em detrimento dos aspectos formais que 14

eventualmente os atestem. 15

Tem por finalidade fazer com que as situações de fato prevaleçam sobre 16

aquelas ajustadas entre as partes em havendo divergência entre elas. Aquilo 17

que sucede no terreno dos fatos sempre prevalece (GROSSO, 2010). 18

Mauricio Godinho Delgado5 assim entende: 19

“No Direito do Trabalho deve-se pesquisar, 20

preferentemente, a prática concreta efetivada 21

da prestação de serviços, independentemente 22

da vontade eventualmente manifestada pelas 23

partes na respectiva relação jurídica. A prática 24

habitual - na qualidade de uso – altera o 25

contrato pactuado, gerando direitos e 26

obrigações novos às partes contratantes 27

5. GODINHO, Mauricio Delgado. Introdução ao Direito do Trabalho. 3 ed. São Paulo: LTr, p. 182.

Page 24: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

23

(respeitada a fronteira da inalterabilidade 1

contratual lesiva).” 2

Havendo diferença entre o que foi pactuado através de documentos ou 3

registros, tendo como base os princípios da Boa-fé e da Dignidade da pessoa 4

humana, prevalece o que foi realmente realizado no desempenho da atividade 5

laboral. 6

7

8

2.4.1.4 Princípio da Razoabilidade 9

10

O princípio da razoabilidade está na essência do próprio homem, o qual 11

deve proceder conforme sua razão. 12

Embora ausente na Constituição Federal de 1988, inegável é que a 13

razoabilidade integra, inquestionavelmente, o ordenamento jurídico nacional. 14

No entanto, sua existência não pode ser ignorada, vez que é possível auferi-la 15

implicitamente em vários dispositivos, assim como no próprio histórico de 16

elaboração da Carta Magna. 17

Para Peixoto et al (2004), deverá o operador jurídico ser capaz de 18

perceber a realidade em função dos valores que a constituem, i.e., exercer o 19

juízo de verossimilhança com moderação em relação aos valores que 20

prestigiam a realidade social. Em outras palavras, deverá o operador jurídico 21

ser capaz de identificar a lógica do razoável num dado caso concreto. Ainda 22

segundo o autor:23

Page 25: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

24

“(...) cumpre ao aplicador do direito, para aferir 1

a razoabilidade da medida posta à sua 2

apreciação, indagar: Qual o meio mais eficaz 3

para levar a cabo o fim almejado baseando-se 4

no interesse público? A meio eleito é 5

indispensável para conservação do fim, ou 6

existem outras opções menos danosas? Há 7

ponderação na relação existente entre os 8

meios e o fim, ou seja, entre os ônus imposto e 9

os bônus conseguido?” 10

11

Segundo Pinto (2001): 12

“A regra básica do princípio da racionalidade, 13

como também é conhecido, não se aplica 14

apenas ao Direito do Trabalho, mas a todos os 15

ramos do Direito. O fundamento do princípio da 16

razoabilidade visa ao comportamento das 17

partes realmente envolvidas na relação laboral. 18

O empregado e o empregador devem agir 19

normalmente onde a norma não prescreve 20

limites rígidos, nem em um sentido, nem em 21

outro, e, sobretudo, onde a norma não pode 22

prever a infinidade de circunstâncias 23

comportamentais possíveis.”24

Page 26: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

25

2.4.1.5 Princípio da Boa-Fé 1

2

Princípio de origem moral que representa o respeito recíproco entre as 3

partes para o fiel cumprimento do pacto contratual, abrangendo, portanto, 4

ambas as partes e não apenas o trabalhador. 5

A Boa-Fé deverá estar presente em todas as etapas do contrato de 6

trabalho: contratação, execução e extinção do mesmo. Tal princípio deve ser 7

levado em conta para a aplicação de todos os direitos e obrigações que as 8

partes adquiram como conseqüência do contrato de trabalho. 9

Vólia Bomfim Cassar (2010) esclarece: 10

“O princípio da Boa-Fé pressupõe que todos 11

devem comportar-se de acordo com um padrão 12

ético, moral, de confiança e lealdade que se 13

espera de um homem comum. Como 14

conseqüência disso, as partes contratantes 15

devem se comportar de forma adequada, 16

mesmo que isto não esteja previsto 17

expressamente na lei ou no contrato. É uma 18

espécie do gênero “norma de conduta”, pois 19

determina como as partes devem agir.” 20

21

22

A Aplicação do princípio da Boa-Fé trata-se de condição sine qua non 23

para o cumprimento, de maneira honesta, da obrigação pactuada, servindo 24

como via de orientação para a interpretação do legislador.25

Page 27: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

26

2.4.1.6 Princípio da Proteção ao Trabalhador 1

O principio da Proteção ao trabalhador, já abordado anteriormente neste 2

trabalho, tem fundamento na desigualdade, cuja natureza é característica da 3

relação contratual entre empregado e empregador. 4

O trabalhador encontra-se em desvantagem na relação de trabalho visto 5

que é dependente do emprego, logo se torna suscetível às condições impostas 6

pelo empregador, sendo vulnerável economicamente. 7

Américo Plá Rodrigues6 leciona que: 8

9

“O princípio de proteção se refere ao critério 10

fundamental que orienta o Direito do Trabalho, 11

pois este, ao invés de inspirar-se num propósito 12

de igualdade, responde ao objetivo de 13

estabelecer um amparo preferencial a uma das 14

partes: o trabalhador.” 15

16

17

O principio protetivo está presente na Constituição Federal, 18

expressamente no Art. 7º, “caput”, e de maneira implícita no inciso I e 19

dispositivo 10 do ADCT. 20

6. RODRIGUES, Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2002, p. 123.

Page 28: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

27

Segundo GROSSO (2010), o princípio protetor visa o nivelamento que 1

falta na relação jurídico-trabalhista frente ao desequilíbrio entre as partes, em 2

detrimento do operário e favorecendo o empregador. 3

A partir deste principio se originam três outros cujo propósito é 4

corroborar o princípio protetivo do trabalhador, os quais são: Princípio do In 5

Dúbio Pro Misero ou Operário, Princípio da aplicação da Norma Mais Favorável 6

e o Princípio da Observância da Condição Mais Benéfica: 7

8

9

2.4.1.6.1 Princípio In Dubio Pro Misero ou Operário 10

Norteando o principio de proteção ao trabalhador, este princípio sugere 11

ao interprete que mediante norma que propicie mais de uma interpretação 12

razoável e distinta, cabe optar por aquela mais favorável ao trabalhador, pólo 13

hipossuficiente da relação. Portanto, a interpretação deverá sempre trazer 14

benefício ao empregado, uma vez que não haja duvidas sobre o direito do 15

mesmo. 16

Segundo Arnaldo Sussekind (2003): 17

18

“(...) princípio ‘in dubio pro operario’, aconselha 19

o intérprete a escolher, entre duas ou mais 20

interpretações viáveis, a mais favorável ao 21

trabalhador, desde que não afronte a nítida 22

manifestação do legislador, nem se trate de 23

matéria probatória”.24

Page 29: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

28

2.4.1.6.2 Princípio da norma mais favorável 1

Havendo conflito de normas aplicáveis ao mesmo trabalhador, 2

pressupõe o Princípio da Norma mais favorável que se opte pela norma que for 3

mais favorável ao empregador, não se levando em consideração a hierarquia 4

das normas. 5

Segundo Cassar (2010) no Direito do Trabalho não há um respeito à 6

hierarquia formal da norma e sim, em cada caso, à fonte que for mais benéfica 7

ao empregado, desde que esteja acima do mínimo legal, prevalecendo a norma 8

que lhe trouxer mais benefícios. 9

Para Marcelo Oliveira Rocha (2005)7, neste princípio encontra-se 10

contidas três funções, sendo elas: 11

12

“O princípio da norma mais favorável constitui 13

tríplice função: em primeiro lugar, é princípio de 14

elaboração das normas jurídicas significando, 15

nesse sentido, que as novas leis devem dispor 16

no sentido de aperfeiçoar o sistema, 17

favorecendo o trabalhador, só por exceção, 18

afastando-se desse objetivo. Justifica-se 19

plenamente essa assertiva sabendo-se que as 20

leis trabalhistas devem contribuir para a 21

melhoria da condição social do trabalhador. A 22

segunda função é hierárquica, assim sendo 23

porque o direito do trabalho é plurinormativo, 24

constituído de uma ampla diversidade de tipos 25

de normas concorrentes que podem dispor 26

sobre o mesmo termo. É necessário 27

7. ROCHA, Marcelo Oliveira. Flexibilização do Direito do Trabalho. Campinas: LZN, 2005, p. 38.

Page 30: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

29

estabelecer uma ordem de hierarquia na sua 1

aplicação. Assim, havendo duas ou mais 2

normas, estatais ou não estatais, aplica-se a 3

que mais beneficiar o empregado. Por fim, têm 4

função interpretativa de modo que é, também, 5

um princípio de interpretação de normas 6

jurídicas. Havendo obscuridade quanto ao 7

significado destas deverá prevalecer a 8

interpretação capaz de conduzir ao resultado 9

que melhor se identifique com o sentido social 10

do Direito do Trabalho.” 11

12

13

2.4.1.6.3 Princípio da prevalência da condição mais 14

Benéfica 15

16

Quando na existência de situação concreta disciplinada por norma surge 17

novo ordenamento para o mesmo caso, o qual é prejudicial ou desrespeite 18

direitos inerentes ao trabalhador, fica valendo a primeira norma, já existente, 19

uma vez que esta beneficia o trabalhador. 20

Este princípio tem como propósito a igualdade jurídica entre os 21

contratantes, protegendo-se e ao mesmo tempo fortalecendo a parte mais fraca 22

da relação contratual: o trabalhador. 23

Plá Rodrigues (2002) sobre o assunto esclarece: 24

Page 31: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

30

“Contudo, é justamente a aplicação do próprio 1

princípio da norma mais favorável que torna 2

questionável o pressuposto e que outorga ao 3

Direito do Trabalho, sob este aspecto, caráter 4

peculiar. Não se aplicará a norma 5

correspondente dentro de uma ordem 6

hierárquica predeterminada, mais se aplicará, 7

em cada caso, a norma mais favorável ao 8

trabalhador.” 9

Todo tratamento concedido ao trabalhador tacitamente ou de modo 10

habitual, em prol do mesmo, prevalece, pois já que incorporado ao patrimônio 11

do trabalhador, não pode ser suprimido, sendo clausula tacitamente ajustada – 12

art. 468 da CLT (CASSAR, 2010). 13

Desta forma o principio da prevalência da condição mais benéfica busca 14

diminuir as desigualdades existentes na relação empregatícia, permitindo ao 15

Direito do trabalho amparar juridicamente o empregado ante a sua debilidade 16

econômica quando comparado ao empregador. 17

2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 18

No início da década de 40 o Estado Novo alcançava certa estabilidade, 19

graças não só à repressão aos adversários, mas à conciliação, obtida por 20

Getúlio Vargas, entre várias frações das classes dominantes. Era interesse do 21

governo intervir nos assuntos ligados ao trabalho para conter o avanço do 22

movimento dos trabalhadores e, paralelamente, criar mercado para alguns 23

setores da industria nacional. Passou a cuidar com enorme interesse da 24

questão social elaborando numerosas leis trabalhistas. Importantes 25

instrumentos e que serviram de base para a manipulação da classe 26

trabalhadora foram o imposto sindical, a justiça do trabalho e o salário mínimo, 27

criado em 1940 (ALENCAR et al, 1985).28

Page 32: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

31

Em 1943, toda a legislação social e trabalhista foi reunida, formando a 1

Consolidação das Leis do Trabalho. Para o governo, a legislação social tinha 2

um significado político especial: impedir a organização independente da classe 3

trabalhadora, além de se constituir (sobretudo pela subordinação dos 4

sindicatos ao Estado) na base da manipulação populista das massas anos 5

depois. Segundo Arnaldo Süssekind (2002), a CLT fez parte de um contexto de 6

medidas visando a transformar o Brasil de um país eminentemente agrícola 7

para um país a caminho da industrialização. Ainda segundo o ministro, Getulio 8

Vargas tinha certeza de que, terminada a guerra, os trabalhadores iriam para 9

as ruas, talvez com movimentos grevistas, para exigir a complementação da 10

legislação do trabalho. Direitos que trabalhadores de outros países já tinham 11

adquirido. De modo que ele se quis antecipar e facilitar a industrialização sem 12

movimentos grevistas. 13

Dentre os membros responsáveis pela elaboração da CLT tem-se 14

Arnaldo Sussekind, Rego Monteiro, Segadas Vianna, Dorval Lacerda e Oscar 15

Saraiva. Normas já em vigor foram sistematizadas e compiladas num único 16

texto, algumas sem qualquer alteração, como decretos-leis e regulamentos de 17

1939 e 1942 concernente à Justiça do Trabalho e à Organização Sindical; 18

Outras sofreram alterações, adaptações e ajustes legislativos, como as normas 19

de proteção ao trabalhador em decretos legislativos publicados entre 1930 e 20

1934; leis publicadas entre 1934 a 1937 e decretos-leis de 1937 até 1942. 21

Algumas normas foram elaboradas, necessárias para a sistematização e 22

exeqüibilidades da CLT como o Título I, referente à introdução, Capítulos I, II, 23

III e IV do Título IV, referentes ao contrato de trabalho, remuneração, alteração, 24

suspensão e interrupção, e as normas posteriores referentes aos capítulos V a 25

VIII, do mesmo título, adaptadas.26

Page 33: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

32

2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 1

Globalização em sentido amplo constitui conjuntos diferenciados de 2

relações sociais, visando entre outros aspectos a acelerar e ampliar o processo 3

de trocas entre nações do mesmo e de outros continentes, ou seja, os 4

principais objetivos constituem-se da abertura do comercio e da eliminação de 5

todo tipo de barreiras que possam impedir a prática e desenvolvimento do livre 6

comércio. É um processo irrefreável de integração ou de intercâmbio 7

internacional envolvendo as pessoas, as empresas e as nações como um todo, 8

contemplando vários aspectos, entre os quais o político, o cultural, e o 9

econômico, com conseqüências mais dramáticas e inquietantes relativas a este 10

último (JÚNIOR, 2010). 11

Fenômeno irreversível, a globalização tomou uma proporção mundial 12

principalmente com o surgimento dos meios de comunicação que transmitem 13

informação em tempo real, o que é positivo do ponto de vista da integração, do 14

conhecimento. É um produto inevitável da tecnologia nas áreas da informática 15

e das comunicações (CASSAR, 2010). 16

A globalização está multiplicando a riqueza e desencadeando forças 17

produtivas numa escala sem precedentes. Tornou universais valores como a 18

democracia e a liberdade. Envolve diversos processos simultâneos: a difusão 19

internacional da notícia, redes como a internet, o tratamento internacional de 20

temas como o meio ambiente e direitos humanos e a integração econômica e 21

global (PIMENTA, 2004). 22

Para Antônio Delfim Neto: 23

“a globalização é a revolução do fim do século. 24

Com ela a conjuntura social e política das 25

nações passa a ser desimportante na definição 26

de investimentos. O indivíduo torna-se uma 27

peça na engrenagem da corporação.”28

Page 34: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

33

O direito do trabalho parece ser um dos ambientes jurídicos mais 1

suscetíveis às transformações decorrentes do processo de globalização, como 2

demonstra o doutrinador Pedro Paulo Teixeira Manus (2005): 3

4

“vemos, portanto, que o fenômeno da 5

globalização interfere no direito do trabalho, 6

trazendo como uma de suas conseqüências a 7

tendência de modificações nas relações entre 8

prestadores e tomadoras de serviços, como 9

forma de aproximação entre os modelos 10

jurídicos de vários países.” 11

12

O empresário vê-se forçado a competir em condições que exigem mão-13

de-obra barata e manipulação de horários. A reversão da concentração 14

industrial promove uma descompensação da migração setorial da mão-de-15

obra, determinando a massificação do desemprego, provocando o pânico, a 16

adesão a qualquer aceno de oportunidade de trabalho, a qualquer preço sob 17

quaisquer condições, desigualdade social, política, cultural, religiosa e racial, 18

nações desnacionalizadas, subordinadas aos ditames dos países ricos e 19

países mais pobres. 20

Sem dúvida alguma, a globalização econômica enseja a 21

construção de novas relações trabalhistas. Faz-se necessária uma reflexão 22

sobre a possibilidade de realização da democracia e das garantias dos direitos 23

fundamentais sendo certo que as conquistas trabalhistas até então alcançadas 24

devem ser mantidas (CASSAR, 2010). 25

26

Page 35: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

34

Não se pode negar que a Constituição de 1988 no contexto brasileiro, 1

promoveu avanços significativos na consolidação dos direitos sociais. As 2

desigualdades foram reduzidas, no plano formal, beneficiando segmentos 3

historicamente desrespeitados (mulheres e idosos, por exemplo), contribuindo 4

para lançar as bases de uma sociedade mais justa e democrática. 5

Estas bases estão consolidadas nos fundamentos do Estado 6

Democrático de Direito, entre eles a dignidade da pessoa humana e o valor 7

social do trabalho. Este mesmo Estado atende ao seu fim precípuo, o homem, 8

defendendo a liberdade como primado básico devendo atuar firmemente em 9

setores cruciais à concretização da cidadania como segurança, saúde, 10

educação e economia. A ideologia de um Estado regulador/mediador, não 11

omisso, pode orientar a política governamental pátria, concretizando-se num 12

ferramental formatador de um novo pacto social (MEDEIROS, 1997). 13

O Estado social surge como solução frente ao paradoxo estabelecido 14

com o processo de globalização, entre uma população necessitada de recursos 15

e uma Constituição que lhe assegura direitos básicos. 16

Segundo Cassar (2010): 17

18

“No Estado democrático de Direito a lei passa a 19

ser, privilegiadamente, um instrumento de ação 20

concreta do Estado, tendo como método 21

assecuratório de sua efetividade a promoção 22

de determinadas ações pretendidas pela ordem 23

jurídica.”24

Page 36: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

35

2.6.1 A crise econômica frente ao processo de globalização 1

Com relativa margem de segurança e respaldo de diversas análises 2

recentes, parece razoável supor que o processo de globalização poderá, em 3

tese, gerar aumento no nível geral de desemprego. Conseqüência direta do 4

aumento da competitividade, com a entrada no país de produtos estrangeiros 5

de melhor qualidade e menor preço. A busca da competitividade implicaria a 6

necessidade de diminuição progressiva da força de trabalho empregada - 7

devido à necessidade de redução dos encargos sociais - o que também 8

redundaria em desemprego (GÓIS, 1998) 9

Segundo ROMITA (1997), o crescimento do desemprego avançou de tal 10

forma que adquiriu características estruturais difíceis de serem ignoradas: 11

“No Brasil, a globalização da economia produz 12

efeitos correspondentes aos registrados no 13

primeiro mundo, observadas as características 14

de um país ainda em vias de desenvolvimento. 15

Aqui, os problemas são agravados pela 16

necessidade de integração econômica de 17

consideráveis segmentos sociais 18

marginalizados. O maior impacto localiza-se 19

nos efeitos nocivos do desemprego. Na 20

Europa, preocupa o desemprego aberto. No 21

Brasil, além deste, há o subemprego e o 22

crescimento do emprego informal, subprodutos 23

da economia subterrânea, clandestina marginal 24

ou oculta.”25

Page 37: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

36

Muito embora a informalidade das relações trabalhistas no país já 1

fizesse parte da economia na década de 1980, esta cresceu estacionando em 2

torno de 60% ao longo dos anos 90. A explosão da informalidade nesta última 3

década promoveu um cenário de heterogeneidade do mercado de trabalho 4

indicando um sinal de deterioração das condições de inserção ocupacional 5

para grande parte da classe operária no Brasil. Tal heterogeneidade, nos anos 6

70, era vista como o resultado de crescimento das atividades modernas 7

insuficiente para absorver a disponibilidade existente de força de trabalho. Já 8

na década de 1990 a heterogeneidade do mercado de trabalho pode ser 9

analisada também como produto da passagem de trabalhadores formais para a 10

situação de informalidade em crescimento contínuo acentuada pela perda por 11

parte do sistema econômico do dinamismo global (BALTAR & DEDECCA, 12

1997). 13

Com a globalização da economia mundial, faz-se necessário que o 14

Estado atue, de forma incisiva, na economia, a fim de possibilitar a criação, 15

manutenção e qualidade do emprego. Segundo SARLET (2004), com efeito, no 16

âmbito da globalização econômica e da afirmação do pensamento neoliberal, 17

verifica-se que a redução do Estado, caracterizada principalmente pela 18

desnacionalização, desestatização, desregulação e diminuição gradativa da 19

intervenção estatal na econômica e sociedade, tem ocasionado, paralelamente 20

ao enfraquecimento da soberania interna e externa dos Estados nacionais 21

(sem que se possa, contudo, falar em seu desaparecimento), um fortalecimento 22

do poder econômico, notadamente na esfera supranacional. 23

O desemprego no país clama por medidas que solucionem o problema 24

urgentemente. É necessária e urgente a modificação das políticas 25

macroeconômicas, a fim de viabilizar uma efetiva negociação coletiva entre 26

trabalhador e empregador, consolidando o princípio da liberdade sindical. Sob 27

tal perspectiva regulamentam-se os contratos de trabalho à luz dos novos 28

interesses sociais. 29

Page 38: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

37

Importante se torna fortalecer as negociações sindicais, retomando as 1

bases da formulação de um sistema de relações de trabalho efetivamente 2

democrático no Brasil. Os sindicatos, nos locais de trabalho e na economia 3

informal terão de ampliar seu poder de representação e negociação, 4

globalizando atividades, unificando a lutas trabalhistas, e lutando por um novo 5

mundo de trabalho (CARTONI & LORENZETTI, 2008). 6

Dessa forma, é necessário que o Estado desenvolva políticas 7

macroeconômicas que viabilizem o crescimento econômico da população. É 8

míster a responsabilidade do Estado em transformar os parâmetros 9

econômicos baseados em princípios fundamentais, assim como assegurar 10

direitos fundamentais do homem, de forma intrínseca, à questão trabalhista 11

(GROSSO, 2007). 12

13

3. Flexibilização como via alternativa frente à 14

globalização 15

O Período pós industrial trouxe a informática, a telemática e a 16

robotização elevando as taxas de desemprego a níveis insuportáveis. A 17

globalização promoveu crises econômicas, desequilíbrio social, além da 18

necessidade de ampliar mercados e, conseqüentemente, a competição 19

econômica, em um cenário mundial de livre fluxo de mercados. 20

A flexibilização surge, portanto, como uma alternativa para a crise 21

laboral. Segundo o jurista Plá Rodrigues (2002): 22

“o que era indisponível, rígido e inviolável se 23

converte em flexível e derrogável.” 24

25

Page 39: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

38

3.1 Conceito de flexibilização 1

O termo “flexibilização”, a rigor, não possui definição na língua 2

portuguesa. No entanto, já existe definição aceita por grande parte da doutrina, 3

onde flexibilidade é qualidade do que é flexível. 4

Tal vocábulo no Direito do trabalho é utilizado de forma genérica para 5

representar um conjunto variado de hipóteses, abrangendo campo amplo, 6

contemplando inúmeras formas de modificação. Daí as diferentes concepções 7

de estudiosos no ramo do Direito do trabalho sobre o tema, conforme 8

apresentadas a seguir. 9

Segundo a jurista NASSAR (1992): 10

“O termo flexibilização vincula-se à 11

necessidade de conceder às leis trabalhistas 12

maior plasticidade, maior maleabilidade, 13

destituindo-as da rigidez tradicional.” 14

15

A flexibilização no Direito do trabalho consiste numa ampliação na 16

capacidade e no poder das partes envolvidas no contrato de trabalho, tanto o 17

empregado como o empregador, em estabelecerem e definirem os parâmetros 18

e limites que regerão as suas relações de trabalho (JÚNIOR, 2010). 19

Amauri Mascaro Nascimento (2003) assim define: 20

“A flexibilização é o afastamento da rigidez de 21

algumas leis para permitir, diante de situações 22

que o exijam, maior dispositividade das partes 23

para alterar ou reduzir os seus comandos.” 24

25

26

Page 40: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

39

A flexibilização no Direito do trabalho consiste numa ampliação na 1

capacidade e no poder das partes envolvidas no contrato de trabalho, tanto o 2

empregado como o empregador, em estabelecerem e definirem os parâmetros 3

e limites que regerão as suas relações de trabalho (JÚNIOR, 2010). 4

Segundo MARTINS8 (2002): 5

“Prefiro dizer que a flexibilização das 6

condições de trabalho é o conjunto de regras 7

que tem por objetivo instituir mecanismos 8

tendentes a compatibilizar as mudanças de 9

ordem econômica, tecnológica, política ou 10

social existentes na relação ente capital e o 11

trabalho.” 12

Ives Gandra da Silva Martins Filho9 (1999) assinala: 13

“A flexibilização representa a atenuação da 14

rigidez protetiva do Direito do Trabalho, com a 15

adoção de condições trabalhistas menos 16

favoráveis do que as previstas em lei, mediante 17

negociação coletiva, em que a perda de 18

vantagens econômicas poderá ser 19

compensada pela instituição de outros 20

benefícios de cunho social, que não onerarão 21

excessivamente a empresa, nos períodos de 22

crise econômica (efeito da globalização) ou de 23

transformação na realidade produtiva (efeito do 24

avanço tecnológico).”25

8. MARTINS. Sérgio Pinto. Flexibilização das condições de trabalho. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

9. MARTINS FILHO, Ives Gandra. Os fundamentais e os direitos sociais na Constituição de 1988 e sua defesa. Revista LTr, São Paulo,1999, p. 588-59.

Page 41: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

40

3.3 Flexibilização e desregulamentação 1

A atenuação da rigidez protetiva do Estado, finalidade a ser alcançada 2

pelo processo de flexibilização, é interpretada por muitos estudiosos como, na 3

verdade, um retrocesso quanto aos direitos conquistados pelos trabalhadores 4

ao longo da história. 5

A perda de direitos pela classe trabalhadora não é característica da 6

flexibilização, e sim da desregulamentação, instituto que possui definição, e 7

portanto proposta divergente de flexibilização. 8

Flexibilização pressupõe a existência de intervenção estatal. Ou, melhor 9

dizendo, implica a possibilidade de intervenção estatal, na hipótese de proteção 10

de direitos fundamentais dos empregados e empregadores. 11

Como bem salienta Alice Monteiro de Barros (2006) a flexibilização 12

trabalhista não pode ser confundida com uma desregulamentação normativa 13

por parte do Estado, que tenha interesse de anular as vantagens trabalhistas 14

atuais por benefícios menores. A flexibilização é utilizada para adaptar as 15

empresas às novas exigências do mercado, enquanto a desregulamentação 16

tem por objetivo apenas a retirada por parte do Estado de todas as normas de 17

proteção a fim de que as relações de trabalho sejam ditadas pelas leis de 18

mercado. 19

A jurista Vólia Bomfim Cassar (2010) assim entende : 20

21

“Flexibilizar pressupõe a manutenção da 22

intervenção estatal nas relações trabalhistas 23

estabelecendo as condições mínimas de 24

trabalho, sem as quais não se pode conceber a 25

vida do trabalhador com dignidade (mínimo 26

existencial), mas autorizando, em determinados 27

casos, exceções ou regras menos rígidas, de 28

Page 42: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

41

forma que possibilite a manutenção da 1

empresa e dos empregos.” 2

Segundo SÜSSEKIND (2003) há distinção entre flexibilização e 3

desregulamentação, e com veemência registra: 4

5

“A flexibilização pressupõe a intervenção 6

estatal, ainda que básica, com normas gerais 7

abaixo das quais não se pode conceber a vida 8

do trabalhador com dignidade. [...] a 9

desregulamentação do Direito do Trabalho, que 10

alguns autores consideram uma das formas de 11

flexibilização, com esta não se confunde. A 12

desregulamentação retira a proteção do Estado 13

ao trabalhador, permitindo que a autonomia 14

privada, individual ou coletiva, regule as 15

condições de trabalho e os direitos e 16

obrigações advindos da relação de emprego. 17

18

A flexibilização não retira o caráter protetivo do Direito do Trabalho ante 19

o empregador sendo mister o intervencionismo para a proteção jurídica e 20

econômica do trabalhador por meio de leis destinadas a estabelecer um 21

regulamento mínimo sobre as suas condições de trabalho, e de medidas 22

econômicas voltadas para a melhoria de sua condição social (NASCIMENTO 23

2001). 24

Sérgio Pinto Martins (1996) também faz referência à distinção existente 25

entre flexibilização e desregulamentação, esclarecendo que não se pode 26

confundi-las:27

Page 43: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

42

“Não se confunde flexibilização com 1

desregulamentação. Desregulamentação 2

significa desprover de normas heterônomas as 3

relações de trabalho. Na desregulação, o 4

Estado deixa de intervir na área trabalhista, não 5

havendo limites na lei para questões 6

trabalhistas, que ficam a cargo da negociação 7

individual ou coletiva. Na desregulação, a lei 8

simplesmente deixa de existir. Na flexibilização, 9

são alteradas as regras existentes, diminuindo 10

a intervenção do Estado, porém garantindo um 11

mínimo indispensável de proteção ao 12

empregado, para que este possa sobreviver, 13

sendo a proteção mínima necessária. A 14

flexibilização é feita com a participação do 15

sindicato. Em certos casos, porém, é permitida 16

a negociação coletiva para modificar alguns 17

direitos, como reduzir salários, reduzir e 18

compensar jornada de trabalho, como ocorre 19

nas crises econômicas. [...]” 20

21

Assim sendo, fica claro que a flexibilização deverá ter sempre como 22

pressuposto a presença do Estado assegurando as garantias mínimas ao 23

trabalhador insuscetíveis de qualquer restrição. Um dos fundamentos do 24

“Estado Democrático de Direito”, prescrito no art. 1º da Constituição da 25

República é a “dignidade da pessoa humana”, e não é possível admitir 26

qualquer medida flexibilista sem atentar para este valor fundamental da nação 27

(BRANT, 2010). 28

Page 44: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

43

3.4 As Correntes de Flexibilização do Direito do Trabalho 1

Pode-se distinguir três correntes que se posicionam sobre a questão da 2

flexibilização das relações de trabalho (NASCIMENTO, 1997): 3

. Flexibilista: segundo essa corrente é preciso distinguir precisamente as fases 4

por que passa o Direito do Trabalho. Em um primeiro momento deve-se 5

assegurar os direitos trabalhistas. Trata-se de uma conquista dos 6

trabalhadores. Após, tem-se o momento promocional do Direito do Trabalho. 7

Na terceira fase, ocorre a adaptação desses direitos à realidade dos fatos, 8

como no que diz respeito às crises, o que é feito por meio das convenções 9

coletivas, que tanto pode assegurar melhores condições de trabalho como 10

também situações in pejus. 11

. Antiflexibilista: entende essa corrente ser a proposta de flexibilização mero 12

pretexto para reduzir os direitos dos trabalhadores. É a posição adotada por 13

quem vislumbra a possibilidade do agravamento das condições dos 14

hipossuficientes, sem qualquer contribuição para o fortalecimento das relações 15

de trabalho. Para essa corrente a flexibilização do Direito do Trabalho é algo 16

nocivo para os trabalhadores e vem a eliminar certar conquistas que foram 17

feitas ao longo anos. Seria uma forma de reduzir direitos dos trabalhadores, 18

agravando a situação dos mesmos sem que houvesse qualquer 19

aperfeiçoamento ou fortalecimento das relações de trabalho. 20

. Semiflexibilista: entende-se, segundo esta corrente, que a flexibilização deve 21

começar pela autonomia coletiva, para evitar riscos, por meio de negociações 22

coletivas. Prega-se a observância da autonomia privada coletiva e também sua 23

valorização plena. A flexibilização seria feita pela forma coletiva, havendo uma 24

desregulamentação do Direito Coletivo do Trabalho, por meio das convenções 25

ou acordos coletivos. Sob a ótica desta teoria, seria possível afirmar a 26

existência de uma norma legal mínima, estabelecendo regras básicas, ficando 27

o restante para ser determinado pelas convenções ou acordos coletivos.28

Page 45: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

44

É fato que a tese da flexibilização ganha hoje generalizada aplicação em 1

qualquer ramo da ordem jurídica que necessite adaptar-se à realidade da 2

sociedade contemporânea; principalmente no Direito do trabalho, onde as 3

atividades econômicas refletem diretamente nas relações trabalhistas e, 4

conseqüentemente criação e manutenção dos postos de trabalho. 5

6

3.5 Flexibilização como alternativa à crise econômica 7

A legislação trabalhista brasileira é extremamente rígida intervindo em 8

todos os detalhes das relações de emprego. Tal característica retrata a 9

realidade e contexto histórico do país na criação da legislação do trabalho em 10

1943. Um país de economia predominantemente agrícola, não havendo uma 11

organização sindical que garantisse o equilíbrio de forças entre empregados e 12

empregadores nos procedimentos de negociação coletiva. A realidade atual é 13

extremamente diversa e clama por revisão dos padrões ultrapassados, sendo 14

urgente a adequação da função tutelar do Direito do trabalho com os interesses 15

recíprocos dos atores sociais (BRANT, 2010). 16

PASTORE (1996) alerta: 17

“o excesso de rigidez da Constituição, 18

consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e 19

Justiça do Trabalho tem provocado uma reação 20

selvagem por parte do mercado. Mais de 55% 21

da força de trabalho brasileira está à margem 22

da lei, sem nenhuma proteção, lembrando-se 23

que, nesse caso, o Estado nada arrecada, 24

ficando apenas com ônus de socorrer essas 25

pessoas na doença e na velhice. A 26

flexibilização Selvagem, é o resultado da 27

combinação de pouco investimento com muita 28

rigidez”29

Page 46: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

45

Ainda segundo o autor, a flexibilização teve uma função auxiliar 1

importante. Na Europa, ela ajudou a alocar as pessoas nas novas modalidades 2

de trabalho, tais como o trabalho por projeto, por empreita, em tempo parcial, 3

com prazo determinado, etc. No Brasil, a flexibilização possui um papel 4

adicional estratégico. Ela facilita a desobstrução dos entraves legais que hoje 5

bloqueiam a entrada das pessoas no mercado formal. 6

As mudanças administrativas, assim como as inovações tecnológicas 7

permitem um aumento quantitativo e qualitativo, certamente com menos mão-8

de-obra. Os novos métodos de produção se utilizam de pouco trabalho, 9

jornadas em tempo parcial, geram trabalho temporário, subemprego e 10

desemprego. Dessa forma o paradigma buscado passa a ser um modelo de 11

Direito do Trabalho, com regras um pouco mais flexíveis, aberto a mudanças, 12

adaptável à nova situação econômica mundial e de cada empresa (CASSAR, 13

2010). 14

A flexibilização das normas do Direito do Trabalho visa assegurar um 15

conjunto de regras mínimas ao trabalhador e, em contrapartida, a 16

sobrevivência da empresa, por meio da modificação de comandos legais, 17

procurando outorgar aos trabalhadores certos direitos mínimos e ao 18

empregador a possibilidade de adaptação de seu negócio, mormente em 19

épocas de crise econômica (MARTINS, 2000). 20

Carli (2005) em sua posição de flexibilista assumida, avalia a 21

flexibilização como um fenômeno irreversível e o direito do trabalho deve 22

aceitá-la para não obstar o desenvolvimento; com ela conviver, apesar dela 23

promover melhorias no mercado de trabalho. Segundo a autora pela 24

desregulamentação a taxa de desemprego pode ter aumento significativo, pois, 25

sabe-se que os fatores para seu surgimento são produzidos pela crise 26

econômica, através das transformações tecnológicas e de melhor qualidade de 27

vida.28

Page 47: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

46

O Direito do Trabalho reclama por reformas profundas, como meio de 1

remoção dos entraves, propiciando a sua vocação maior, que é a 2

instrumentalidade das formas; a flexibilização do caráter protecionista 3

excessivo em relação ao trabalhador; e a promoção de uma maior celeridade e 4

justiça social, desobstruindo, inclusive, as varas trabalhistas, além de procurar 5

minimizar e suprir as deficiências do sistema, adequando-o à realidade. 6

Não se trata da desregulamentação e inobservância da base 7

principiológica fomentadora do regramento trabalhista, mas sim, de centralizar 8

os interesses no equilíbrio jurídico como forma de inclusão, permitindo a 9

adoção de meios inovadores e, ao mesmo tempo, seguros, para que haja 10

verdadeira eficácia nas soluções. 11

Frente ao posicionamento de muitos autores em tratar a flexibilização 12

como desregulamentação, ROBORTELLA (1994) reflete no sentido que a 13

tensão proposta não deva ser entre emprego pleno e emprego precário e sim 14

entre emprego e desemprego. Coloca que se a moderação da proteção ao 15

emprego e o advento de formas atípicas, como expressão de flexibilização, 16

puderem ensejar maior distribuição de postos de trabalho, não se pode 17

descartá-los de plano, ao argumento de que constituiriam um retrocesso ou 18

uma involução da técnica jurídica trabalhista. 19

A maleabilidade no trato das normas laborais visa à aproximação do 20

capital ao trabalho, que não é facultativa e sim obrigatória segundo os preceitos 21

constitucionais. Não se vislumbra mais, com todo o ordenamento já positivado, 22

à disposição para a aplicação imediata, a relação de trabalho típica, com o 23

contrato de duração indeterminada, o salário, proteção contra a despedida 24

imotivada, entre outros. A participação dos trabalhadores nos lucros e gestão 25

das empresas deverá se incorporar ao costume do pacto laboral, trazendo o 26

trabalhador para o lado do capital com incentivo à produtividade (CASTILHO, 27

2009).28

Page 48: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

47

ROBOREDO (1997), esclarece que um dos princípios primordiais da 1

flexibilização é o princípio protetor do Direito do Trabalho, que incentiva o 2

sindicato a atuar como representante dos empregados, para zelar pela classe 3

operária. Esse princípio protetor fundamenta-se basicamente sobre outro 4

princípio: da razoabilidade ou da racionalidade, cuja premissa é que o ser 5

humano age de forma razoável e racional, estruturando suas ações e 6

comportamentos dentro de padrões preestabelecidos socialmente. 7

8

3.6 Flexibilização e sua aplicabilidade no Direito Brasileiro 9

10

A idéia flexibilista ocorreu, no Brasil, principalmente nos anos 90, a partir 11

das vitórias eleitorais de candidatos comprometidos com propostas políticas 12

neoliberais. Ao longo da tradição jurídica do país várias normas flexibilistas 13

foram implantadas no ordenamento brasileiro, algumas inclusive ampliadas 14

pela Lei Maior em 1988. Dentre elas pode-se destacar: 15

a) A Lei 4.923/65, em seu art. 2º possibilita a redução da jornada de trabalho e 16

de salários, em até 25%, respeitado o salário mínimo e reduzidas 17

proporcionalmente a remuneração e as gratificações de gerentes e diretores, 18

mediante acordo coletivo, nas empresas que, em face a conjuntura econômica, 19

necessitem de tais medidas. O artigo em foco, apresenta nítida tendência 20

flexibilizadora, eis que atinge o princípio da inalterabilidade das condições 21

contratuais. 22

23

b) A Lei 5.107/66, que trata do FGTS eliminou a estabilidade, autorizando a 24

demissão dos empregados regidos pelo FGTS. 25

Page 49: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

48

c) O artigo 442 da CLT, ao tratar do cooperativismo, traz que não existe relação 1

de emprego entre os cooperados e as respectivas cooperativas, nem entre 2

estas e os tomadores de serviços. Apesar de toda a confusão que tal artigo 3

gera, pode-se dizer que é uma forma de flexibilização, pois permite às 4

empresas contratarem serviços sem a necessária configuração do vínculo 5

empregatício. 6

d) O artigo 443 da Consolidação das Leis Trabalhistas (1943) estabelece o 7

contrato por prazo determinado, não excedente a dois anos (art. 445, CLT). O 8

dispositivo confere liberdade às partes na estipulação das relações contratuais, 9

respeitada as disposições de proteção de trabalho conforme estabelece o 10

artigo 444 do mesmo diploma legal. 11

e) A CLT, em seu art. 503, acena com a possibilidade de redução dos salários, 12

em até 25%, respeitado a salário mínimo, em caso de força maior ou prejuízo 13

devidamente comprovados. 14

f) O artigo 4º da Lei 7.855/89 admite a força maior para o atraso de pagamento 15

de salários e possibilita o estabelecimento de prazos para quitação salarial 16

através de acordos ou convenções coletivas e sentenças normativas. 17

g) O art. 3º da Lei 8.030/90 reza que os aumentos salariais, além de reajuste 18

mínimo previsto no art. 2º desta mesma lei, poderão ser negociados livremente 19

entre as partes. 20

h) A consolidação das Leis do Trabalho permite a subempreitada como forma 21

de contratação (art. 455), sendo a subempreitada é espécie de contrato de 22

empreitada. 23

i) O trabalho a domicílio está amparado pelo artigo 6º consolidado que veda 24

qualquer distinção entre trabalho executado no estabelecimento do 25

empregador e o realizado no domicílio do empregado, desde que configurada a 26

relação de emprego. 27

Page 50: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

49

j) No campo da locação de mão de obra, a Lei 7.102/83, que impôs sistema de 1

segurança a todo estabelecimento financeira onde haja guarda de valores a 2

movimentação de numerários (art. 1§), permite a prestação de serviços de 3

vigilância e transportes de valores por empresas especializadas contratadas. 4

k) O trabalho temporário foi oficializado pela Lei 6.019/74. É definido como 5

aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade 6

transitória de substituição de seu pessoal regular ou permanente ou a 7

acréscimo extraordinário de serviços (art. 2º). O trabalhador temporário é 8

empregado da empresa de trabalho temporário (pessoa física ou jurídica cuja 9

atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, 10

temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas 11

remunerados e assistidos - art. 3º da Lei 6.019/74) que possui caráter 12

mercantil. 13

Com a Constituição Federal (1988) a flexibilização alcançou patamar 14

constitucional. A carta magna admite a flexibilização de Direitos trabalhistas 15

em três hipóteses: redução do salário (art. 7º, VI); redução da jornada de oito 16

horas diárias (art. 7º, XIII); em trabalhos ininterruptos de revezamento, 17

redução da jornada para seis horas (art. 7º, XIV). 18

Em tais hipóteses, previstas no art. 7º da Constituição, o sindicato 19

representará os interesses individuais dos empregados por ele representados, 20

sendo as normas flexibilistas aplicadas imediatamente aos contratos vigentes. 21

Assim, a flexibilização poderá ser feita através de acordo coletivo de trabalho, 22

de modo descentralizado, atendendo a individualidade de cada empresa, ou 23

decorrerá de convenção coletiva, possuindo, neste caso, caráter geral, 24

atingindo toda uma categoria, sem distinguir pequenas e grandes empresas. 25

A jurisprudência não tem se mostrado uníssona quanto ao tema 26

flexibilização. Ainda não há parâmetros claros e seguros definindo o tema. No 27

entanto, destacam-se as hipóteses em que se admite flexibilizar direitos 28

trabalhistas mediante negociação coletiva:29

Page 51: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

50

I. pagamento proporcional do adicional de periculosidade ao tempo de 1

exposição ao agente de risco (Súmula nº 364, II, do TST); 2

II. redução do intervalo intrajornada para a categoria dos motoristas (conforme 3

precedente jurisprudencial da SDC-TST)[1]; 4

III. limitação do pagamento de horas in itinere a uma diária, independentemente 5

do tempo efetivamente gasto pelo empregado em condução fornecida pelo 6

empregador (precedentes da Corte)[2]; 7

IV. no que diz respeito aos minutos residuais, tolerância de 15 minutos antes e 8

15 minutos depois da jornada de trabalho sem o pagamento de horas extras 9

(precedentes da Corte). [3] 10

A irredutibilidade salarial flexibilizada não traduz a perda de ganho do 11

trabalhador, haja vista que sua aplicação deverá observar o estabelecido em 12

acordo e convenções coletivas, ou seja, o trabalhador, via indireta, participará 13

das deliberações a respeito da redução, que claramente deverá vir 14

acompanhada de uma compensação financeira, haja vista que seria irracional e 15

contra-evolutivo concluir que o empregado abrirá mão de uma importância para 16

preservar o emprego e ainda assim, legitimado pela norma Magna. 17

Da mesma forma, com relação à redução da jornada de trabalho e a 18

eventual aplicação da carga horária para o trabalho realizado em turnos 19

ininterruptos de revezamento (CASTILHO, 2010). 20

Além das hipóteses constitucionais expressas de flexibilidade negociada, 21

nosso sistema jurídico, 22

23

“possui também hipóteses implícitas, que 24

decorrem da chamada flexibilidade 25

interpretativa (salário mínimo proporcional à 26

jornada de trabalho), da flexibilidade por 27

omissão legislativa (ausência de proteção ao 28

Page 52: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

51

trabalhador contra despedida arbitrária ou sem 1

justa causa) [...] de flexibilidade do tempo de 2

serviço (contrato temporário de trabalho) e de 3

flexibilidade salarial (vale-transporte e 4

participação nos lucros da empresa). Tudo isto 5

sem falar na incidência absurda do instituto da 6

prescrição do direito de ação [...] tem o seu 7

termo “a quo” acionado enquanto ainda em 8

curso o contrato de trabalho, ou seja, a 9

prescrição tem incidência antes da extinção do 10

contrato de trabalho e da decorrente cessação 11

da subordinação jurídica do trabalhador em 12

face do empregador10” 13

14

Recentemente o projeto de lei nº 5483/2001 foi aprovado alterando o 15

artigo 618 da CLT, cuja redação Atual é “as empresas e instituições que não 16

estiverem incluídas no enquadramento sindical a que se refere o art. 577 desta 17

Consolidação poderão celebrar Acordos Coletivos de Trabalho com os 18

Sindicatos representativos dos respectivos empregados, nos termos deste 19

Título”. Segundo o PL o texto vigoraria da seguinte maneira: “As condições de 20

trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo prevalecem sobre o 21

disposto em lei, desde que não contrariem a Constituição Federal e as normas 22

de segurança e saúde do trabalho”. 23

O projeto sofreu mudanças na sua redação original: 24

10 .SILVA, Reinaldo Pereira e. Flexibilidade ou Rigidez? Em Defesa do Direito do Trabalho. Florianópolis: 1997. p.182.

Page 53: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

52

“Art. 618. Na ausência de convenção ou acordo 1

coletivo firmados por manifestação expressa da 2

vontade das partes e observadas as demais 3

disposições do Título VI desta Consolidação, a 4

lei regulará as condições de trabalho. §1º A 5

convenção ou acordo coletivo, respeitados os 6

direitos trabalhistas previstos na Constituição 7

Federal, não podem contrariar lei 8

complementar, as Leis nº 6.321, de 14 de abril 9

de 1976, e nº 7.418, de 16 de dezembro de 10

1995, a legislação tributária, a previdenciária e 11

relativa ao Fundo de Garantia por Tempo de 12

Serviço- FGTS, bem como as normas de 13

segurança no trabalho. §2º Os sindicatos 14

poderão solicitar o apoio e o acompanhamento 15

da central sindical, da confederação ou 16

federação a que estiverem filiados quando da 17

negociação de convenção ou acordo coletivo 18

previsto no presente artigo.” 19

20

Tal projeto inverte a hierarquia das normas, passando o 21

acordo coletivo a ser superior à lei, asseguradas as garantias constitucionais. 22

Com a aprovação de tal projeto muitas garantias conquistadas pelos 23

trabalhadores poderão ser suprimidas. É mister a ponderação das normas, 24

independentemente de hierarquia, visto que prevalecerá sempre aquela que 25

traga benefício ao trabalhador, consoante o principio da Norma mais favorável 26

(CASTILHO, 2010). 27

Page 54: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

53

3.7 Limites à Flexibilização 1

Há que se estabelecer limites à flexibilização cabendo observar que esta 2

não poderá contrariar a ordem jurídica, social, ou seja, ferir os direitos 3

fundamentais do trabalhador, como os relacionados à vida, saúde e outros 7 4

relativos à personalidade e a dignidade do trabalhador. 5

O direito deve ser encarado como postulado básico universal e ser 6

garantido a todas as pessoas e dessa forma, a flexibilização somente poderia 7

ser aceita, desde que considerados os seguintes elementos (CARTONI & 8

LORENZETTI, 2008): 9

I. contibuidade da relação individual de trabalho; 10

II. formação profissional e mobilidade funcional; 11

III. redução e flexibilidade do tempo de trabalho; 12

IV. liberdade sindical e negociação coletiva; 13

V. rede de previdência social ou de mecanismos de proteção social e de 14

inclusão; 15

VI. os direitos mínimos do trabalhador estatuídos e Constituições 16

nacionais; 17

VII. evitar-se contratos temporários, precariedades de vínculos, 18

incentivos a grandes e prejudiciais rotatividades de mão-de-obra. 19

20

21

22

Page 55: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

54

4. CONCLUSÃO 1

2

A partir do estudo elaborado, conclui-se que a flexibilização é um 3

processo inevitável como já ocorre no atual texto constitucional, possibilitando 4

negociação coletiva de direitos até então indiscutíveis. 5

A flexibilização esta diretamente conectada à negociação coletiva, ou 6

seja, para alterar qualquer norma deverá haver a precedência da negociação 7

coletiva, do acordo entre as partes, e acordo realizado sobre o manto 8

constitucional assegurados princípios fundamentais. 9

A flexibilização deve ocorrer sem descuidar o Estado dos direitos 10

mínimos a serem garantidos ao empregado, garantido-se a dignidade do ser 11

humano. Portanto, diferente da desregulamentação, deve existir imposição de 12

limites pelo Estado, a fim de garantir um Estado democrático de Direito, tendo 13

como princípio basilar a dignidade da pessoa humana. 14

Os interesses e os direitos dos trabalhadores podem ser defendidos, 15

ampliados ou até mesmo restringidos por meio de uma atuação efetiva dos 16

entes coletivos, conforme a necessidade dos maiores interessados, ou seja, os 17

sujeitos das relações de trabalho. Uma flexibilização verdadeira, consciente, 18

conduziria a privilegiar a liberdade sindical, instrumento capaz de concretizar a 19

perspectiva atual e inevitável que corresponde à autonomia privada coletiva, 20

visando proteger os objetivos do trabalhador e do empregador de forma 21

equilibrada, adequando-se à realidade do caso concreto e, mais uma vez, 22

evitando o desemprego.23

Page 56: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

55

5. BIBLIOGRAFIA 1

. ALENCAR, Francisco; CARPPI, Lucia, RIBEIRO; Marcus Venício. Historia 2

da Sociedade Brasileira. 3ª ed. Rio de Janeiro: ao livro técnico, 1985, p. 219-3

225. 4

. ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes. O Mercosul e as relações de trabalho. 5

São Paulo : LTr, 1993. 6

. ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense 7

Universitária, 2002, p. 221. 8

. BALTAR, Paulo; DEDECCA, Claudio S. Mercado de Trabalho no Brasil: o 9

aumento da informalidade nos anos 90. Campinas, IE-UNICAMP. 1997. 10

. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª ed., São 11

Paulo: LTr, 2006. 12

. BRANT, Izabella Marinho. Flexibilização das Normas de Proteção ao 13

Trabalho. <URL:http://www.juspodivm.com.br/artigos/artigos_cat_12.html>. 14

Acesso em 18/06/2010. 15

. BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto - Lei nº 5.452, de 1 16

de maio de 1943. Aprova a consolidação das leis do Trabalho. 10 ed. São 17

Paulo: RIDEEL, 2010. 18

. BRASIL. Constitução (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. 19

10 ed. São Paulo: RIDEEL, 2010. 20

. BUDÓ, MArilia de Denardin. Flexibilização do Direito do Trabalho, E a 21

Justiça Social? <URL:http://www.ufsm.br/direito/artigos/trabalho/flexibilização-22

clt.htm>. Aceso em 14/05/2010.23

Page 57: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

56

. CARLI, Vilma Maria Inocêncio. Flexibilização dos Contratos de Trabalho. 1

1ª ed. Campinas: ME, 2005, p. 50 2

. CARTONI, Daniela Maria, LORENZETTI, Katiusca. A Flexibilização no 3

Direito do Trabalho e a Globalização. Revista de Direito. São Paulo. v. XI, n. 4

13, p. 73-86, 2008. 5

. CASSAR, Vólia Bomfim Cassar. Direito do Trabalho. 4ª ed. Niterói: Impetus, 6

2010, p. 20-42. 7

. CASTILHO, Mario Luiz Balster Moreira de. Reflexos positivos da 8

Flexibilização do Direito do Trabalho no Emprego. 9

<URL://http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/files/journals/2/articles/23996/pub10

lic/23996-23998-1-PB.pdf>. Acesso em 25/04/2010. 11

. COTRIM, Gilberto. História e Consciência do Brasil. 2 ed. São Paulo: 12

Saraiva. 1995, p. 255-282. 13

. DELFIM, Antonio Netto. A globalização e suas implicações. Economia 14

Aplicada, v.1, n. 1, p. 115-135, 1997. 15

. DIAS, Everaldo. História das Lutas Sociais no Brasil. 2ª ed. São Paulo: 16

Alfa- Omega, 1977. 17

. GÓIS, Ancelmo César Lins de. A flexibilização das normas trabalhistas 18

frente à globalização. <URL: 19

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1145&p=2>. Acesso em 20

03/04/2010. 21

. GROSSO, Cristiano Pinheiro. Limites da flexibilização no direito do 22

trabalho à luz do desenvolvimento econômico e social. 2007. 126 f. 23

Dissertação (Mestrado em Direito). Universidade de Marília. Marília. 2007. 24

Page 58: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

57

. JUNIOR, Alcidio Soares. A Flexibilização no direito do Trabalho 1

enquanto instrumento de mudanças nas relações de Trabalho. <URL: 2

http://www.uepg.br/rj/a1v1at07.htm, Acesso em: 22/05/2010. 3

. JÚNIOR, Luiz Vicente. Princípios do Direito do Trabalho. <URL: 4

http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/luizvicente/direitodotrabalho002.asp.> 5

Acesso em: 05/06/2010. 6

. KOSHIBA, Luiz. História: origens, estrutura e processos. São Paulo: Atual, 7

2000, p. 357-358. 8

. MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do Trabalho. 9 ed. São Paulo: Atlas, 9

2005, p. 123-124. 10

. MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 3 ed. São Paulo: Malheiros. 11

1996. 12

. ______. Flexibilização das Condições de Trabalho. 1 ed. São Paulo: Atlas. 13

2000. 14

. MEDEIROS, Márcio Rogério de. A flexibilidade nas relações trabalhistas: 15

do fordismo à acumulação flexível. 1997. 48 f. Graduação em Direito. 16

Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis. 1997. 17

. MELLO, Leonel Itaussu; COSTA, Luís César Amad. História Moderna e 18

Contemporânea. 4 ed. São Paulo: Scipione, 1994, p. 149-155. 19

. MORAES, Maria Celina Bodin de. Constituição e Direito Civil: Tendências. 20

Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 779, p. 47-63, set.2000. 21

. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 6 ed. São 22

Paulo : Saraiva. 1993. 23

. ______. Curso de Direito do Trabalho. 13 ed. São Paulo: Saraiva. 1997. 24

. ______. Curso de direito do trabalho. 14 ed. São Paulo : Saraiva. 1998.25

Page 59: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

58

. ______. Curso de direito do trabalho. 17. ed. São Paulo: Saraiva: 2001. 1

. ______. Iniciação ao Direito do Trabalho. 29 ed. São Paulo: LTr, 2003. 2

. NASSAR, Rosita de Nazaré Sidrim. Flexibilização do direito do trabalho. 3

São Paulo: LTr. 1992. 4

. PASTORE, José Pastore. Encargos Sociais no Brasil e no Exterior. São Paulo: 5

LTr. 1996. 6

. PEIXOTO, Alexandre Sivolella; QUEIROZ, Taísa, MENDES; Fábio Carvalho. 7

Princípio da Razoabilidade. Revista Jurídica UNIGRAN. Dourados, v. 6, n. 11, 8

Jan./Jul. 2004. 9

. REZENDE , Antônio Paulo; DIDIER, Maria Tereza. O Brasil e o Mundo 10

Contemporâneo. São Paulo: Atual, 1996, p. 3-10. 11

. ROBOREDO, Maria Lucia. Flexibilização do direito laboral no Cone Sul. 12

1997. Tese de Doutorado. Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro. 1997 13

. ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim. O Moderno Direito do Trabalho. São 14

Paulo: LTr, 1994. 15

. RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de Direito do Trabalho. 3 ed. São 16

Paulo: LTr, 2002, p. 83. 17

. ROMITA, Arion Sayão. Globalização da economia e Direito do Trabalho. 18

São Paulo: LTr, 1997, p. 87 19

. RÜDIGER, Dorothee Susanne. Teoria da flexibilização do trabalho: uma 20

tentativa de contextualização histórica. Revista Prim@Facie, ano 3, n.4, 21

jan./jun.2004. 22

. SANTOS, Antônio Silveira R. dos. Meio Ambiente do trabalho: 23

considerações. Jus Naigandi, 2000. <URL: 24

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1202>. Acesso em 13/05/2010.25

Page 60: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

59

.SARLET, Ingo Wolfgang. Doutrina Nacional: o problema de sua proteção 1

contra o poder e reforma na Constituição de 1988. Revista de Direito 2

Constitucional e Internacional. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 46, p. 42-3

73, 2004. 4

. SARTÓRIO, Tiago Elias Santos. As Formas de Flexibilização e a sua 5

Irrenunciabilidade perante as relações laborais. <URL: 6

<http://www.direitonet.com.br/textos/x/15/44/1544/> Acesso em: 16/06/201. 7

. SILVA, Jorge E. O nascimento da Organização Sindical no Brasil e as 8

primeiras lutas operárias. <URL: 9

http://www.cecaiorg.br/edgar/Primeiraslutas.htm> Acesso em 05.jun.2010. 10

. SUSSEKIND, Arnaldo. Instituições de Direito do Trabalho. 11 ed. São 11

Paulo: Ltr, 2003. p. 129. 12

13

14

NOTAS 15

1. "NEGOCIAÇÃO COLETIVA. INTERVALO INTRAJORNADA. VALIDADE. Quando a norma 16

coletiva estabelece condições que não implicam, necessária e objetivamente, ofensa à saúde, 17

à segurança e à dignidade do trabalhador, não se pode concluir que ela a norma ofende o § 3º 18

do art. 71 consolidado. É o que acontece com a negociação que prevê o intervalo intrajornada 19

fracionado, isto é, composto de vários intervalos menores. É sob essa ótica que deve ser 20

examinada a teoria do conglobamento, que, como se sabe, não autoriza a ampla e restrita 21

negociação. Mas, no caso concreto, o negociado deve ser preservado, pois ele não colide com 22

normas fundamentais e indisponíveis. Neste caso, portanto, não se decide com ofensa à 23

Orientação Jurisprudencial nº 342/SBDI-1" (TST-ROAA-141.515/2004-900-01-00.5, Rel. Min. 24

José Luciano de Castilho Pereira, SDC, "in" DJ de 11/04/06). 25

Page 61: A FLEXIBILIZAÇÃO DAS NORMAS TRABALHISTAS, SOB A ... · 2.5 A Consolidação das Leis do Trabalho 30 2.6 A globalização e o Direito do Trabalho 32 2.6.1 A crise econômica frente

60

2. TST-RR-414.174/1998.9, Rel. Juiz Convocado Aloysio Corrêa da Veiga, 1ª Turma, "in" DJ de 1

28/06/02; TST-RR-451.673/1998.2, Rel. Min. José Simpliciano Fernandes, 2ª Turma, "in" DJ de 2

07/03/03; TST-RR-1.616/2000-031-15-00.2, Rel. Juíza Convocada Terezinha Célia Kineipp 3

Oliveira, 3ª Turma, "in" DJ de 14/02/03; TST-RR-225/2003-023-09-00.1, Rel. Min. Antônio José 4

de Barros Levenhagen, 4ª Turma, "in" DJ de 17/03/06; TST-RR-1.064/2002-092-09-00.7, Rel. 5

Min. João Batista Brito Pereira, 5ª Turma, "in" DJ de 10/03/06. 6

3. "DIFERENÇAS DE HORAS EXTRAS PELA CONTAGEM MINUTO A MINUTO PREVISÃO, 7

EM INSTRUMENTO COLETIVO, DE DESCONSIDERAÇÃO DOS QUINZE MINUTOS QUE 8

ANTECEDEM E SUCEDEM A JORNADA LABORAL - VALIDADE DA NORMA COLETIVA. O 9

direito às horas extras decorrentes do critério de contagem minuto a minuto (OJs 23 e 326 da 10

SBDI-1 do TST) é conseqüência de construção jurisprudencial e, embora recentemente 11

transformado em dispositivo consolidado (art. 58, § 1º), não se insere dentre os direitos 12

trabalhistas irrenunciáveis, de modo que não há óbice para que o referido direito seja objeto de 13

negociação coletiva. Com efeito, a previsão em norma coletiva, no sentido de desconsiderar os 14

quinze minutos que antecedem e sucedem a jornada laboral, constitui hipótese típica de 15

prevalência do negociado sobre o legislado, em flexibilização autorizada pela própria 16

Constituição Federal. Isso porque a possibilidade de inserir período de tolerância para a 17

marcação dos cartões de ponto encontra respaldo no princípio da razoabilidade e nas 18

hipóteses de flexibilização autorizadas pela Constituição Federal, pois, se a Carta Magna 19

admite a redução dos dois principais direitos trabalhistas, que são o salário (CF, art. 7º, VI) e a 20

jornada de trabalho (CF, art. 7º, XIII e XIV), todos aqueles que deles decorrem também são 21

passíveis de flexibilização. Nesse contexto, a decisão recorrida, ao desconsiderar a norma 22

coletiva em comento, vulnerou o disposto no art. 7°, XXVI, da Constituição Federal, que 23

determina o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho, razão pela qual 24

deve ser reformada para que seja aplicada a norma que instituiu a cláusula de tolerância de 25

quinze minutos no tempo que antecede e sucede a jornada de trabalho" (TST-RR-26

126.174/2004-900-04-00.1. Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, 4ª Turma, "in" DJ de 11/02/05). 27

28

29