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Física A Física sob a Perspectiva do Éter Luminífero. Fernando S. Lordêlo¹, Roberto dos S. Menezes Jr.² 1. Bolsista de IC do curso de Licenciatura em Física do Instituto Federal da Bahia - IFBA; * [email protected] 2. Professor e Pesquisador do Depto. de Física, IFBA, Salvador/BA Palavras Chave: Éter Luminífero, Ótica, História da Ciência. Introdução A teoria do éter luminífero na história da Física parece ter se iniciado e se encerrado em um mesmo ponto: o experimento de Michelson-Morley [1]. Seriam os físicos da época ingênuos a ponto de depositarem toda a ideia acerca do éter luminífero em um único experimento (que mais tarde viria a dar um resultado inesperado e seria ponto de partida para uma nova teoria)? A resposta a essa pergunta não é simples, mas antes do experimento do interferômetro a ideia que permeava, a respeito do éter luminífero, estava bem consolidada na mente dos físicos da época através de uma teoria bem estruturada sob o ponto de vista teórico e bem fundamentada sob o ponto de vista experimental [2], particularmente após a importante contribuição de A. Fresnel [3]. O notório físico J. J. Thomson chegou a afirmar que “O éter (...) é essencial para nós como o ar que respiramos.” Fazendo-se uma investigação mais profunda na história é possível perceber que existiam evidências experimentais que corroboravam a teoria do éter, entre elas: A medida do ângulo de aberração da luz com o telescópio cheio d’água [4]; A medida dos ângulos de reflexão e refração em espelhos e prismas movimentando-se através do éter [5]; A medida da velocidade da luz na água em movimento (experimento de Fizeau – 1851) [6]. Quando efetuamos uma busca a respeito dos referidos experimentos, a fim de buscarmos entender seus aspectos técnicos e como a teoria justifica seus resultados, excetuando-se o experimento de Fizeau, não encontramos qualquer relato mais aprofundado, a não ser os próprios originais. A falta de material que analisa profundamente esses experimentos (encontramos facilmente referências a eles, no entanto, sem uma abordagem detalhada [2,7,8]) reforça a ideia atual de que a teoria do éter consistia em uma mera especulação filosófica. Neste trabalho, buscamos apresentar detalhes a respeito dos experimentos supra citados, fazendo uma abordagem detalhada do que pretendiam medir, dos resultados encontrados e da explicação desses resultados à luz da teoria do éter de Fresnel. Resultados e Discussão Em nossa pesquisa, verificamos que os experimentos citados (excetuando-se o de Fizeau) buscavam determinar a presença de um movimento absoluto da Terra em relação ao éter. Entretanto, nas suas realizações, foram observados apenas resultados nulos, ou seja, a ausência de tal movimento. A teoria do éter proposta por Fresnel consegue explicar tais ausências de movimento através da introdução de um coeficiente de arrastamento parcial (do éter, o qual determinava que o éter no interior dos corpos transparentes em movimento se movia com velocidade inferior à velocidade desse corpo em relação ao éter livre (longe do corpo). Essa hipótese, conjuntamente com o fenômeno da aberração da luz, dão explicação satisfatória para os resultados nulos, ao menos até a primeira ordem em V/c (onde, V é a velocidade da Terra em relação ao éter livre e c é a velocidade da luz no vácuo) [9]. Além disso, o único experimento de caráter não-nulo é o de Fizeau, que confirma a existência do coeficiente de arrastamento. Conclusões O século XIX foi grandioso no aspecto de elevar a teoria do éter (que já existia desde o século XVII) ao patamar de uma teoria experimentalmente consistente. O grande desafio desse século era o de se medir a velocidade da Terra em relação ao éter, de acordo com as previsões experimentais nascidas das teorias desenvolvidas mas, o que de fato ocorreu, foi que as predições teóricas não corresponderam aos resultados experimentais. Esses fatos justificaram a adição de uma hipótese ad hoc, a do coeficiente de arrastamento, para justificação dos resultados encontrados. A partir disso, foi possível explicar uma gama de resultados dando forte embasamento experimental à teoria do éter de Fresnel. Entretanto, o que ocorreu anos mais tarde (1905) foi o surgimento da teoria da relatividade restrita [10] que torna supérflua a existência de um meio referencial absoluto, pondo-o em um caráter secundário. Apesar de ter sido deixado de lado, o estudo da ótica por meio do éter permite-nos vislumbrar o desenvolvimento gradual da ciência e compartilhar das dificuldades e anseios de muitos cientistas na tentativa de solucionar seus problemas, proporcionando assim uma visão mais humana da ciência, passível de limitações, além de um conhecimento mais profundo em Física. Agradecimentos Essa pesquisa está sendo financiada pelo IFBA através da Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Inovação – PRPGI. ____________________ [1] MICHELSON, A. A., MORLEY, E. W. American Journal of Science, n. 203, v. 34, 1887. [2] MARTINS, R. de A. Cad. Bras. Ens. Fís., v. 29, n.1: p. 52-80, 2012. [3] FRESNEL, A. Annales de Chimie et de Physique. , n. 49, p. 79-89, 1818. [4] HOEK, M. Archives Neérlandaise des Sciences Exactes et Naturelles, v.3, p. 180-185, 1868. [5] ARAGO, F. Comptes Rendus des Séances de l'Académie des Sciences de Paris. v. 36, p. 38-49, 1853. [6] FIZEAU, H. Comptes Rendus des Séances de l'Académie des Sciences de Paris, v.33, p. 349-355, 1851. [7] LANG, F. L. da. Cad. Bras. Ens. Fís.., v. 23, n. 1: p. 26-52, 2006. [8] OLIVEIRA, M. P. de. Cad. Cat. Ens. Fís., v.10, n. 2: p. 157-172, 1993. [9] MASCART, E. Annales Scientifiques de l’ Ecole Normale Supérieure, v. 3, p. 363-420, 1874. [10] EINSTEIN, A. On the Eletrodynamics of Moving Bodies In: Principle of Relativity, 1923. 68ª Reunião Anual da SBPC

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Page 1: A Física sob a Perspectiva do Éter Luminífero. · Física A Física sob a Perspectiva do Éter Luminífero. Fernando S. Lordêlo¹, Roberto dos S. Menezes Jr.² 1. Bolsista de

Física

A Física sob a Perspectiva do Éter Luminífero.

Fernando S. Lordêlo¹, Roberto dos S. Menezes Jr.²

1. Bolsista de IC do curso de Licenciatura em Física do Instituto Federal da Bahia - IFBA; *[email protected]. Professor e Pesquisador do Depto. de Física, IFBA, Salvador/BA

Palavras Chave: Éter Luminífero, Ótica, História da Ciência.

IntroduçãoA teoria do éter luminífero na história da Física

parece ter se iniciado e se encerrado em um mesmoponto: o experimento de Michelson-Morley [1]. Seriam osfísicos da época ingênuos a ponto de depositarem toda aideia acerca do éter luminífero em um único experimento(que mais tarde viria a dar um resultado inesperado eseria ponto de partida para uma nova teoria)? A resposta aessa pergunta não é simples, mas antes do experimentodo interferômetro a ideia que permeava, a respeito do éterluminífero, estava bem consolidada na mente dos físicosda época através de uma teoria bem estruturada sob oponto de vista teórico e bem fundamentada sob o pontode vista experimental [2], particularmente após aimportante contribuição de A. Fresnel [3]. O notório físicoJ. J. Thomson chegou a afirmar que “O éter (...) éessencial para nós como o ar que respiramos.”

Fazendo-se uma investigação mais profunda nahistória é possível perceber que existiam evidênciasexperimentais que corroboravam a teoria do éter, entreelas:

A medida do ângulo de aberração da luz com otelescópio cheio d’água [4];

A medida dos ângulos de reflexão e refração emespelhos e prismas movimentando-se através doéter [5];

A medida da velocidade da luz na água emmovimento (experimento de Fizeau – 1851) [6].

Quando efetuamos uma busca a respeito dosreferidos experimentos, a fim de buscarmos entender seusaspectos técnicos e como a teoria justifica seusresultados, excetuando-se o experimento de Fizeau, nãoencontramos qualquer relato mais aprofundado, a não seros próprios originais. A falta de material que analisaprofundamente esses experimentos (encontramosfacilmente referências a eles, no entanto, sem umaabordagem detalhada [2,7,8]) reforça a ideia atual de quea teoria do éter consistia em uma mera especulaçãofilosófica. Neste trabalho, buscamos apresentar detalhes arespeito dos experimentos supra citados, fazendo umaabordagem detalhada do que pretendiam medir, dosresultados encontrados e da explicação desses resultadosà luz da teoria do éter de Fresnel.

Resultados e DiscussãoEm nossa pesquisa, verificamos que os

experimentos citados (excetuando-se o de Fizeau)buscavam determinar a presença de um movimentoabsoluto da Terra em relação ao éter. Entretanto, nas suasrealizações, foram observados apenas resultados nulos,ou seja, a ausência de tal movimento. A teoria do éterproposta por Fresnel consegue explicar tais ausências demovimento através da introdução de um coeficiente de

arrastamento parcial (do éter, o qual determinava que oéter no interior dos corpos transparentes em movimentose movia com velocidade inferior à velocidade dessecorpo em relação ao éter livre (longe do corpo). Essahipótese, conjuntamente com o fenômeno da aberraçãoda luz, dão explicação satisfatória para os resultadosnulos, ao menos até a primeira ordem em V/c (onde, V é avelocidade da Terra em relação ao éter livre e c é avelocidade da luz no vácuo) [9]. Além disso, o únicoexperimento de caráter não-nulo é o de Fizeau, queconfirma a existência do coeficiente de arrastamento.

ConclusõesO século XIX foi grandioso no aspecto de elevar a

teoria do éter (que já existia desde o século XVII) aopatamar de uma teoria experimentalmente consistente. Ogrande desafio desse século era o de se medir avelocidade da Terra em relação ao éter, de acordo com asprevisões experimentais nascidas das teoriasdesenvolvidas mas, o que de fato ocorreu, foi que aspredições teóricas não corresponderam aos resultadosexperimentais. Esses fatos justificaram a adição de umahipótese ad hoc, a do coeficiente de arrastamento, parajustificação dos resultados encontrados. A partir disso, foipossível explicar uma gama de resultados dando forteembasamento experimental à teoria do éter de Fresnel.Entretanto, o que ocorreu anos mais tarde (1905) foi osurgimento da teoria da relatividade restrita [10] que tornasupérflua a existência de um meio referencial absoluto,pondo-o em um caráter secundário.

Apesar de ter sido deixado de lado, o estudo daótica por meio do éter permite-nos vislumbrar odesenvolvimento gradual da ciência e compartilhar dasdificuldades e anseios de muitos cientistas na tentativa desolucionar seus problemas, proporcionando assim umavisão mais humana da ciência, passível de limitações,além de um conhecimento mais profundo em Física.

AgradecimentosEssa pesquisa está sendo financiada pelo IFBA através daPró-Reitoria de Pós-Graduação e Inovação – PRPGI. ____________________

[1] MICHELSON, A. A., MORLEY, E. W. American Journal of Science, n. 203, v.34, 1887.[2] MARTINS, R. de A. Cad. Bras. Ens. Fís., v. 29, n.1: p. 52-80, 2012.[3] FRESNEL, A. Annales de Chimie et de Physique., n. 49, p. 79-89, 1818.[4] HOEK, M. Archives Neérlandaise des Sciences Exactes et Naturelles, v.3, p.180-185, 1868.[5] ARAGO, F. Comptes Rendus des Séances de l'Académie des Sciences deParis. v. 36, p. 38-49, 1853.[6] FIZEAU, H. Comptes Rendus des Séances de l'Académie des Sciences deParis, v.33, p. 349-355, 1851.[7] LANG, F. L. da. Cad. Bras. Ens. Fís.., v. 23, n. 1: p. 26-52, 2006.[8] OLIVEIRA, M. P. de. Cad. Cat. Ens. Fís., v.10, n. 2: p. 157-172, 1993.[9] MASCART, E. Annales Scientifiques de l’ Ecole Normale Supérieure, v. 3, p.363-420, 1874.[10] EINSTEIN, A. On the Eletrodynamics of Moving Bodies In: Principle ofRelativity, 1923.

68ª Reunião Anual da SBPC