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80 www.backstage.com.br ILUMINAÇÃO Karyne Lins [email protected] O A Evolução dos Moving Lights no Brasil A necessidade de acompanhar o mercado internacional, o movimento da música sertaneja no Brasil, que investiu em equipamentos, e a concorrência das empresas impulsionaram a aquisição de novas tecnologias e informação. uso dos moving lights se popularizou no Brasil nos anos 90, década em que também começaram a ser empregadas as novas tecnologias dos novos moving lights no mundo. “Em 1991, eu vi o primeiro Scan da High End (Intellabean) em São Francisco, em turnê dos Paralamas do Sucesso, e seis meses depois já estava comprando os meus primeiros seis aparelhos, mas a popularização apareceu no ano de 1996”, lembra o lighting designer Marcos Olívio, que trabalha há 28 anos no mercado de iluminação. Césio Lima e Nelson Martini praticavam hóquei sobre patins no Palmeiras e faziam o show Periquitos em Revista, na década de 70, quando iniciaram suas carreiras na iluminação como ope- radores de canhão. Em meados de 1991, Césio Lima fazia luz para o cantor Roberto Carlos, que, segundo Césio, sempre pres- tou atenção em tudo relacionado à iluminação. “Já tínhamos feito tudo de luz com material disponível no Brasil naquela época e o Roberto também queria dar uma vira- da. Foi quando, em 1995, trouxemos os Vari-Lites e o Patrick Woodroffe (lighting designer dos Rolling Stones) fez alguns shows com a gente. Valeu a pena e foi uma turnê maravilhosa. Éramos a única equipe no Brasil usando esse equipamento, que era top em tecnologia da época, só que, na realidade, não dava para ganhar dinheiro usando esses movings. O contrato acabou em dois anos e, em seguida, Roberto passou a usar o Mac 500, que coincidiu com a época que a Martin lançou os Mac 500 e Mac 600”, conta Césio Lima, hoje diretor da empresa LPL Ilumi- nação e diretor de iluminação da Rede Globo de Televisão. Os modelos da Vari-Lites em questão eram os VL-5 e VL-6, que a empresa norte- americana patenteou e que não poderiam ser comprados. A equipe de Césio alugou esse equipamento, que no fim do contrato, teve de ser entregue. Vicente Ruggiero, iluminador de Roberto Carlos desde que o cantor adquiriu esses movings, disse que não havia profissional no Brasil para “mane- jar” moving lights. Ele foi para Dallas (EUA) fazer um curso de 30 dias sobre operação de Vari-Lites, pois possuem sistema de controle para mudar movimento de formas de cor. “Os Intellabeans, que chegaram em 1992, na verdade eram espelhos; em 1995 estávamos falando de equipamentos de luz direta que se moviam. Depois de Roberto ter sido o artista pioneiro nesta evolução, outros artistas, especialmente os da linha sertane- ja, como Chitãozinho & Xororó e Zezé di Camargo & Luciano, alugavam os Vari-Lites. Roberto também foi referência para o uso “Os Intellabeans, que chegaram em 1992, na verdade eram espelhos; em 1995, estávamos falando de equipamentos de luz direta que se moviam” (Vicente Ruggiero) Fotos: Divulgação

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Page 1: A Evolução dos - Revista Backstage · que a empresa norte- americana patenteou e que não poderiam ser comprados. A equipe de Césio alugou esse equipamento, ... “Os Intellabeans,

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Karyne [email protected]

O

A Evolução dosMoving Lights no BrasilA necessidade de acompanhar o mercado internacional, o movimento damúsica sertaneja no Brasil, que investiu em equipamentos, e aconcorrência das empresas impulsionaram a aquisição de novastecnologias e informação.

uso dos moving lights se popularizou no Brasil nos anos 90,década em que também começaram a ser empregadas asnovas tecnologias dos novos moving lights no mundo. “Em

1991, eu vi o primeiro Scan da High End (Intellabean) em SãoFrancisco, em turnê dos Paralamas do Sucesso, e seis meses depoisjá estava comprando os meus primeiros seis aparelhos, mas apopularização apareceu no ano de 1996”, lembra o lighting designerMarcos Olívio, que trabalha há 28 anos no mercado de iluminação.

Césio Lima e Nelson Martini praticavam hóquei sobre patinsno Palmeiras e faziam o show Periquitos em Revista, na décadade 70, quando iniciaram suas carreiras na iluminação como ope-radores de canhão. Em meados de 1991, Césio Lima fazia luzpara o cantor Roberto Carlos, que, segundo Césio, sempre pres-tou atenção em tudo relacionado à iluminação.

“Já tínhamos feito tudo de luz com material disponível noBrasil naquela época e o Roberto também queria dar uma vira-da. Foi quando, em 1995, trouxemos os Vari-Lites e o PatrickWoodroffe (lighting designer dos Rolling Stones) fez alguns

shows com a gente. Valeu a pena e foi uma turnê maravilhosa.Éramos a única equipe no Brasil usando esse equipamento, queera top em tecnologia da época, só que, na realidade, não davapara ganhar dinheiro usando esses movings. O contrato acabouem dois anos e, em seguida, Roberto passou a usar o Mac 500,que coincidiu com a época que a Martin lançou os Mac 500 e

Mac 600”, conta Césio Lima, hoje diretor da empresa LPL Ilumi-nação e diretor de iluminação da Rede Globo de Televisão.

Os modelos da Vari-Lites em questão eram os VL-5 e VL-6,que a empresa norte- americana patenteou e que não poderiamser comprados. A equipe de Césio alugou esse equipamento,que no fim do contrato, teve de ser entregue. Vicente Ruggiero,iluminador de Roberto Carlos desde que o cantor adquiriu essesmovings, disse que não havia profissional no Brasil para “mane-jar” moving lights. Ele foi para Dallas (EUA) fazer um curso de30 dias sobre operação de Vari-Lites, pois possuem sistema decontrole para mudar movimento de formas de cor.

“Os Intellabeans, que chegaram em 1992, na verdade eramespelhos; em 1995 estávamos falando de equipamentos de luzdireta que se moviam. Depois de Roberto ter sido o artista pioneironesta evolução, outros artistas, especialmente os da linha sertane-ja, como Chitãozinho & Xororó e Zezé di Camargo & Luciano,alugavam os Vari-Lites. Roberto também foi referência para o uso

“Os Intellabeans, que chegaram em1992, na verdade eram espelhos; em

1995, estávamos falando deequipamentos de luz direta que se

moviam” (Vicente Ruggiero)

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dos Mac, daí a coisa começou a se populari-zar”, explicou Vicente Ruggiero, iluminadordo cantor Roberto Carlos há dez anos.

A evolução em termos de tecnologiaé constante, pois as empresas fabrican-tes estão sempre aperfeiçoando os mo-delos anteriores, buscando dar mais op-ções aos iluminadores, visando a aten-der a todos os segmentos de trabalhoonde se utiliza a iluminação, como TV,teatro, shows e eventos. “No caso do te-atro e da TV, até pouco tempo o movingera pouco considerado na parte dedramaturgia, usava-se somente paramusicais. Hoje, nós já temos usado osmovings em duas peças de teatro e emvárias novelas”, disse Vicente Vitali, há28 anos fazendo iluminação e hoje dire-tor da Novalite.

“Essa evolução, ou profissionalização,do mercado de iluminação no Brasil demo-rou porque foi preciso que os artistas inves-tissem no segmento. Na verdade, o grandeproblema foi o custo. Não faz muito tempoque a iluminação conseguiu manter umnível de fornecimento para ter altos orça-mentos”, disse Nelson Martini.

Processo de evoluçãoA evolução consistiu basicamente

em melhores softwares, ópticas e lâmpa-das, visando a atender as necessidadesde atualização do mercado com apare-lhos mais confiáveis, rápidos e com maisrecursos. Os efeitos, sem dúvida, forama maior evolução destes equipamentos:lâmpadas mais potentes, velocidade de

movimento, controle mais fiel de posicio-namento e a confiabilidade nas máqui-nas. “A evolução começou com a compe-tição com as lâmpadas Par. Precisávamosde mais potência, lâmpada boa paracompetir com as lâmpadas Par, ter espe-lhos que se mexiam, e os movings evolu-íram com suas lâmpadas, gobos, cores,etc.”, disse Ruggiero.

“Acredito que estamos na quarta gera-ção dos moving lights. Primeiro, vieram osScan, que são aparelhos com espelhos que

se movem. Depois, estes mesmos aparelhoscom lâmpadas mais potentes e maior quan-tidade de efeitos. Terceiro, foi o movinghead wash com RGB e spot com efeitossimples e agora estamos com todas as possi-bilidades juntas”, disse Marcos Olívio.

O desenvolvimento tecnológico per-mitiu a diminuição dos processadores,circuitos integrados e conseqüentemen-te refletiu no designer do aparelho tor-nando-o mais compacto. A participação

dos lighting designers e iluminadoresneste processo de desenvolvimentotecnológico dos movings é constante. Odesenvolvimento de material humanotambém segue essa tendência do merca-do onde as empresas formam técnicospara a manutenção e criam cursos dentrode suas empresas para ensinar como utili-zar os equipamentos. Os iluminadoresajudam passando informações do que elesgostariam de inovar para melhor adaptaros equipamentos em seus projetos.

“No meu caso, tenho linha direta comos fabricantes DTS E SGM da Itália,onde trocamos informações que servempara melhorar ou consertar defeitos quesó aparecem no uso do dia-a-dia. São pe-ças frágeis e fabricadas basicamente paraos mercados Norte Americanos e Euro-peu, e não suportam uma viagem para oNorte ou Nordeste do Brasil”, disseVicente Vitale.

“O problema é que o mercado, nesteaspecto, é muito competitivo e muitas ve-zes os lighting designes e iluminadores emvez de trocarem informações as omitem.O mercado é muito cada um por si. Naminha opinião, a classe deveria ser maisunida. Acredito que se existissem maisfeiras, workshops, palestras, os ilumina-dores e técnicos seriam mais profissio-nais, pois conheceriam mais sobre o pró-prio ramo em que trabalham. A Associa-ção Brasileira de Iluminação Cênica(ABRIC) organiza algumas palestras, masacho que deveria ter mais divulgação nes-se sentido”, desabafou Arnaldo Soderi,

“Se existissem maisfeiras, workshops,

palestras, osiluminadores e técnicos

seriam mais profissionais,pois conheceriam mais

sobre o próprio ramo emque trabalham” (Soderi)

Nelson Martini Vicente Vitale Vicente Ruggiero

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que trabalha há seis anos com manuten-ção de moving lights na Aurolights.

Acesso à informaçãoe à tecnologiaPara Valmor Neves, chamado por

‘Bolinho’, iluminador há 32 anos e hojesócio-diretor da Zuluz Iluminação, hojeé indiscutível o acesso à informação, po-rém, o preço pago para acompanhar essatecnologia ainda é alto para o padrãoBrasil. O mesmo pensamento de Arnal-do Soderi, que acha que o Brasil aindanão pode ter esse acesso. “Só para fazeruma comparação de preço, uma lâmpa-da par 64 custa em média R$ 70,00 reaiscada uma, enquanto a lâmpada do apa-relho Mac 500 da Martin custa em mé-dia R$ 500,00. No Brasil se paga muitoimposto que acaba encarecendo o preçodos aparelhos”, disse Arnaldo.

Marcos Olívio trabalhou em gran-des produções fora do Brasil e, pela ex-periência, acredita que o país estámuito próximo do trabalho que os es-trangeiros fazem, apesar de havermais dificuldade em relação ao custodos equipamentos.

Utilização dos movingsNa opinião de Bolinho, os iluminadores

brasileiros já sabem utilizar o equipamentoem toda a sua potencialidade e isso se devea pesquisas, estudos e práticas. No entanto,Vicente Vitale discorda. “Há muitas opçõese recursos, que no final você nem semprepode explorá-los ao máximo”. A falta deinformação técnica não deixa de ser umdos problemas no segmento, mas muitosprofissionais, a exemplo de Arnaldo Soderi,acreditam que a partir do momento emque os iluminadores estudarem um poucomais e se interessarem mais pelo equipa-mento, a tendência é vermos shows muitomais interessantes em termos de criati-vidade. “Conheço dois iluminadores quede fato conhecem bem o que o aparelhopode fazer: Michel Pinheiro (Barão Ver-melho) e Rafael Auricchio (Nando Reis)”,opinou Arnaldo Soderi.

“Tudo que usamos éimportado e o custo

para o mercadobrasileiro é bem

maior se comparadoa qualquer outro

mercado no mundo”(Marco)

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“Tenho assistido a alguns espetácu-los e tenho gostado bastante, acreditoque o potencial está ligado também acontroles (mesa de controles) muitomais eficientes”, diz Marcos que acre-dita que isso deve-se ao treinamento,experiência do uso contínuo, à possibi-lidade de informação na Internet e ouso constante do equipamento comoparte obrigatória nos eventos. “O Brasilevoluiu bastante neste sentido e conti-nua aprendendo. Estive em tour naEuropa e EUA e vi coisas muito ruins.Tenho visto iluminadores dando showno Brasil”, ressalta Olívio.

ManutençãoOs profissionais do ramo dividem

opiniões sobre este assunto. Na empre-sa de Vicente, a Novalite, por exem-plo, existem departamentos de manu-tenção e os técnicos têm o apoio dire-to dos fabricantes. “Tudo que usamosé importado e o custo para o mercadobrasileiro é bem maior se comparado aqualquer outro mercado no mundo.Pagamos duas vezes mais o que as em-presas de fora pagam e alugamos pelametade do preço. A disponibilidadede peças também é outro problema.Porém, os técnicos brasileiros conse-guem milagres com muito improviso”,comentou Marcos.

Na opinião de Arnaldo, o Brasil estámuito atrasado em relação a outros países.A maioria das empresas não tem uma pes-soa específica para esse segmento e os téc-

Marcos OlívioArnaldo Soderi

nicos acabam fazendo um pouco de tudoe não se especializam em nada. “Quandocomecei a trabalhar na Aurolights, parti-cipei e conheci tudo que havia na empre-sa em termos de equipamento, porém ha-via uma necessidade de alguém só na par-te de moving light. O Auro me deu o su-porte necessário para que eu me especi-alizasse nesta área”, lembrou.

Para Vicente Riggiero, as empresas seespecializaram e, da mesma forma queadquirem equipamentos mais profissio-nais e de alta tecnologia, há técnicos qua-lificados para atender ao mercado. “Vejoque estamos bem adiantados”, disse.

Tendências e referênciasinternacionaisHoje, o Brasil consegue seguir as ten-

dências mundiais em termos de movinglights para shows. Porém, o investimentopara isso ainda é alto. “Temos muitas res-trições de orçamento e o moving acaba

sendo uma coisa muito cara”, disseVicente. Segundo Marcos Olívio, os téc-nicos brasileiros têm aplicado o movingpara todo tipo de segmento em ilumina-ção corretamente e continuam a apren-der como usar melhor.

Bolinho diz que buscou informaçãocom iluminadores estrangeiros apenasobservando os seus trabalhos e suas en-trevistas. Vicente Vitale também usoua pesquisa como fonte de conhecimen-to, além de estar nas feiras e eventos deiluminação. “Na segunda geração domoving light, procurei bastante infor-mação de fora, como utilizar o equipa-mento da melhor forma e tirar o maiorproveito das máquinas. Hoje procurobastante informação aqui mesmo commeus amigos de profissão”.

“A maneira que os gringos trabalham ébem profissional. Cada pessoa da equipe éresponsável por um segmento. Por exem-plo, existe uma pessoa que só cuida da se-gurança na montagem e por aí vai. O únicoproblema é que para a maioria dos produto-res brasileiros os gringos devem ser pratica-mente reverenciados por nós. Acreditoque o tratamento teria que ser recíproco. Ogringo mais profissional que conheci foi oiluminador do Rush, sr. Howard. Ele soubeexplorar tudo o que o equipamento podeoferecer”, disse Arnaldo.

Mercado nacionalVicente Vitale, como muitos outros,

acredita no mercado nacional. Bolinho,há 32 anos trabalhando no segmento deiluminação no Brasil, acha que empre-sas nacionais ainda precisam evoluir,principalmente nas óticas dos aparelhos,mas já deram um passo muito grande.“O problema no Brasil é sempre o altoimposto, que impede a facilidade deadquirir recursos. Se não fosse isso, comcerteza existiriam muitas outras de igualpara igual, com grandes marcas”, opi-nou Arnaldo.

“Na segunda geração domoving light, procureibastante informação de

fora, como utilizar oequipamento da melhor

forma e tirar o maiorproveito das máquinas”

(Vicente)