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II ENPES - Encontro Nacional de Pesquisa sobre Economia Solidária

“A economia solidária sob diversos olhares”

22 de setembro de 2012

Anhembi Parque, São Paulo

A atuação das políticas públicas governamentais voltadas para a Economia

Solidária

Ana Paula da Silva Pinto

Graduanda em Direito – UFAL

Bolsista pelo Núcleo da UNITRABALHO/UFAL

Jairo da Silva Gomes

Graduando em Ciências Sociais - UFAL

Bolsista pelo Núcleo da UNITRABALHO/UFAL

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo compreender a atuação das

políticas públicas voltadas para empreendimentos solidários. Através de um

corte metodológico, buscou-se dedicar especial atenção ao papel de

protagonismo exercido pelos setores populares no concernente à definição das

ações de mudanças ligadas às políticas públicas governamentais.

Dentro deste contexto, entende-se que as ações relativas à geração de

trabalho e renda – tomadas como estratégias de combate a uma realidade

marcada por mazelas socias bem como a um quadro de precarização do

trabalho e vulnerabilidade do trabalhador – tornam-se indispensáveis para

reduzir as desigualdades e promover o equilíbrio social.

Busca-se assim, através de um breve escorço histórico, analisar a

evolução das políticas púbicas voltadas para a economia solidária. Esses

espaços que incluem associações e cooperativas populares, procurando agir

coletivamente para superar os problemas sociais em que estão inseridos,

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tornaram-se pautas de uma série de elaborações de políticas públicas que

serão abordadas sucintamente neste artigo, como no caso do Programa

Nacional de Incubadores de Cooperativas Populares (Proninc).

Ao fim, dar-se-á especial enfoque a novos tipos de modelo de gestão

pública, que proponham elaboração de diferentes arranjos institucionais

desenvolvidos no contexto da economia solidária, capazes de promover maior

permeabilidade do Estado à participação social.

Palavras-chave: Economia Solidária, políticas públicas, participação social.

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INTRODUÇÃO

A economia solidária no Brasil vem se destacando como estratégia

surgida no âmago das resistências contra mazelas sociais que atingem de

forma mais perversa setores menos favorecidos da população. Neste presente

artigo, abordar-se-á os aspectos mais relevantes acerca da importância das

políticas públicas como forma de interferência nessa realidade social.

Composta por atividades econômicas cujo primado é o do trabalho sobre

o capital, diferenciando-se assim das atividades segundo as quais as

engrenagens sociais estão sempre subordinadas à ideia de lucro, a economia

solidária vem demonstrando ser um potente instrumento de promoção do

desenvolvimento econômico, social e cultural, estando permeada por valores

como a sustentabilidade, equidade e democratização e autogestão.

Isso se torna ainda mais claro se considerados os desafios impostos

pelas transformações no mundo do trabalho nas últimas décadas, oportunidade

em que as iniciativas governamentais de apoio à economia solidária também

se destacam por sua potencial contribuição para a politização da sociedade

civil, a democratização do Estado e a redefinição das relações entre Estado e

sociedade. É também importante destacar o papel de protagonismo exercido

pelos setores populares na busca por emancipação e maior autonomia.

Nesse contexto, evidencia-se a relação existente entre a economia

solidária e as políticas de trabalho, renda e desenvolvimento como forma de

colaboração na construção de uma política pública de economia solidária que

seja estruturada a nível amplo e que atue efetivamente no combate às causas

estruturais de pobreza.

Embora reste evidente tal correlação, ainda são tímidas, a nível

nacional, as ações que visem direcionar as políticas públicas segundo moldes

amplamente difundidos pela economia solidária, tais como: o resgate da

dimensão política da economia solidária, auto-gestão, participação social,

solidariedade, entre outros. Uma das razões para isso está constituída na

própria forma com que o Estado brasileiro promove sua política de

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desenvolvimento, buscando em geral, sempre as mesmas fórmulas e

mecanismos pautados pelo sistema capitalista.

Desse modo, a economia solidária, quando refletida segundo iniciativas

governamentais como possibilidade de ressignificação do espaço público

estatal e do campo de co-relação Estado-sociedade, é ainda abarcada por

construções residuais, que se difundem apenas com estratégias próprias ou

com apoio de políticas públicas insuficientes ou inadequadas, o que lhes dá

poucas oportunidades de romper os círculos de reprodução da pobreza.

Políticas Públicas e Economia Solidária

Por natureza teórica e prática, a economia solidária se apresenta como

uma resposta às questões sociais advindas do modelo econômico vigente, ao

menos no que concerne à inclusão dos setores mais fragilizados presentes na

sociedade, incapazes de potencializar sua produção e sua comercialização

devido às problemáticas e os desafios de um mercado competitivo.

A economia solidária, enquanto realidade, vem redesenhando esses

setores que estão fora do mercado e que necessitam de uma demanda política

voltada ao fomento dessa proposta, desvinculando dessa forma, o

indivíduo/trabalhador de um cenário econômico perverso e o integrando em um

novo no qual haja redistribuição de bens e recursos, bem como acesso a

direitos sociais básicos.

Nesses termos, entendemos Políticas Públicas a partir da lógica de

Elenaldo Celso Teixeira, quando afirma que:

As políticas públicas visam responder a demandas,

principalmente dos setores marginalizados da sociedade,

considerados como vulneráveis. Essas demandas são

interpretadas por aqueles que ocupam o poder, mas

influenciadas por uma agenda que se cria na sociedade civil

através da pressão e mobilização social.1

Com base nessa visão, poderíamos citar uma quantidade enorme de

situações que refletem claramente as conquistas sociais empreendidas pela

militância, abordando a motivação e o aspecto das relações de trabalho.

1 TEIXEIRA, Elenaldo Celso. O papel das políticas públicas no desenvolvimento local e na

transformação da realidade. UFBA, Salvador, 2002, p. 03.

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Todavia, interessa-nos aqui, os desafios que vem enfrentando as políticas

públicas para economia solidária, que ainda não alcançaram sua legitimidade

diante da sociedade civil.

Neste cenário, as políticas públicas demandam diretamente participação

social. Esta se dá com a mobilização dos indivíduos, trabalhadores, dos

militantes políticos e sociais, comunidade acadêmica, ou seja, setores ativos

que reconhecem a situação de exclusão pela qual passa parcela significativa

da sociedade e ao mesmo tempo investe na organização popular, na luta pelo

fortalecimento das esferas democráticas no país.

Um fator de extrema importância é o dialogo recorrente entre os que

compartilham dos valores da economia solidária e o poder público. Essa

articulação é pautada segundo princípios de fomento à economia solidária,

através de eventos como feiras, plenárias estaduais e municipais, fóruns, que

analisam, sobretudo, as ações do poder público de incentivo ao setor,

trabalhando na construção e organização do movimento segundo perspectivas

da Política Pública de Economia Solidária.

Em todo o caso, é quase unânime, quanto às políticas públicas, o

reconhecimento do Estado como força propulsora para o estabelecimento de

tais políticas, que se tornam necessária para a construção de pressupostos

políticos/econômicos, que garantam mecanismos convincentes para o

fortalecimento da luta por uma economia pautada no comércio justo e solidário.

É importante ressaltar que a política pública deve ser apresentada como

uma ação necessária ao bom funcionamento da democracia, e que além disso,

é fundamental como instrumento de reconhecimento da luta dos sujeitos

sociais e de garantia de acesso a direitos por uma parcela da sociedade que

busca condições dignas de existência. Esta política enquanto demanda tem

como objetivo precípuo a garantia do protagonismo popular desta classe, sua

independência, dispensando partidarismos ou políticas meramente

assistencialistas.

Diante da necessidade de superar os desafios sociais e as

transformações bruscas no mercado de trabalho, a partir de uma logística

solidária, pequenos grupos têm ampliado seus espaços em busca de

autonomia.

Esse pensamento é corroborado por França Filho, quando assinala:

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A economia popular diz respeito a uma de atividades de

produção, comercialização ou prestação de serviços efetuado

coletivamente (e sob diferentes modalidades de trabalho

associado) por grupos populares, principalmente no interior de

bairros pobres e marginais das grandes cidades latino-

americanas.2

Deste modo, a adoção de políticas públicas descentralizadas é de

extrema importância, pois cumpre um papel significativo na formulação do

sistema de formação para a consolidação dessa ação positiva, com metas

reais a serem atingidas.

O fato de não haver uma política de economia solidária

estipulada na forma de uma lei promulgada pela Câmara

Municipal, não significa a inexistência de uma política, enquanto

conjunto de idéias e de ideais para o encaminhamento de

problemas tão complexos, quanto os que estão implícitos e

explícitos no campo da economia solidária, principalmente num

país, como o Brasil, que nunca teve políticas públicas na direção

de um estado de bem estar social.3

Ainda que a inexistência de um marco jurídico específico para a

economia solidária prejudique a regulamentação de suas diversas dimensões,

não se pode afirmar, que em decorrência disso, a economia solidária não se

configure como algo concreto. Exemplo disso é que ela já possui uma

dinamicidade própria, dialogando com diversas áreas, quais sejam, educação,

psicologia, administração, saúde, meio ambiente, etc. Apesar dessa existência

no plano real, é importante que o poder público continue somando esforços no

sentido de aprovação de uma Lei específica.

Entretanto, a forma como as Leis são criadas e como de fato afetam a

sociedade são benefícios desconhecidos muitas vezes pela grande parcela da

população.

Nessa trajetória, surgem exemplos positivos: há uma parcela da

população que apoia o fortalecimento desse novo panorama econômico

2 FRANÇA FILHO, G.C. A Economia Popular e Solidária no Brasil. Ação Pública e Economia

Solidária: uma perspectiva internacional. Civitas – Revista de Ciências Sociais, v. 7, n. 1, jan.-jun. 2007, pg. 166. 3 Avaliação das políticas públicas de Economia Solidária (Relatório final do convênio TEM /

IPEA / ANPEC – 01/2003). – Brasília: MET, IPEAA, ANPEC, 2005, pg. 28.

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brasileiro, do mesmo modo que já se nota uma ampliação da participação do

poder público. Um exemplo dessa participação está na esfera municipal, onde

as prefeituras têm se mostrado mais atuantes no acompanhamento de diversos

grupos que trabalham organizados sob a forma de empreendimentos

econômicos solidários.

Cumpre ressaltar que o apoio da prefeitura a esses projetos revela-se de

fundamental importância. Por ser detentora de recursos financeiros, do aparato

burocrático, e dispor dos mais diversos meios de divulgação, o ente municipal,

quando mobilizado, pode representar um grande avanço no fortalecimento dos

empreendimentos.

Os benefícios advindos dessa parceria perpassam razões de mero

cunho financeiro. As possibilidades geradas a partir das diversas formas de

atuação dos empreendimentos contribuem para o desenvolvimento local, ,

geração de emprego e renda, atração de turistas, e em muitos casos, geram

benefícios ao meio ambiente (catadores de materiais recicláveis unidos sob a

forma de cooperativa, por exemplo). Tudo isso somado ao próprio benefício

social atrelado à disseminação dos empreendimentos.

Dessa forma, os empreendimentos econômicos solidários podem trazer

grandes benefícios se considerados dentro da microestrutura no qual estão

inseridos. Esses benefícios referem-se à promoção da transformação social,

econômica e política, através de um processo gradual. Essas transformações,

que contam com a participação dos agentes dos empreendimentos, são

realizadas no próprio seio da sociedade, e estão voltadas para a resolução de

uma série de problemas enfrentados em determinado momento e contexto

territorial.

Nesse sentido, as políticas públicas simbolizam o compromisso do poder

público em responder as demandas sociais, buscando a inclusão social e

econômica dos trabalhadores marginalizados. Para isso, é necessário que

essas políticas sejam construídas sob estruturas sólidas e que possuam

caráter continuado.

A economia solidária como movimento social e sua relação com o

Estado: o caso nacional

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A expansão da economia solidária no Brasil, enquanto movimento social

ou ainda enquanto política estratégica de desenvolvimento territorial vem

acompanhando as transformações históricas do país e vem evidenciando a

importância da articulação de forças sociais para a construção de políticas

públicas que atendam a demandas sociais cada vez mais complexas.

É evidente o processo de transformação social em curso no Brasil,

processo esse que deita raízes na ampla crise do trabalho que vem assolando

o país desde os anos 1980. A desindustrialização, suscitando a perda de

milhões de postos de trabalho, a abertura do mercado acirrando a competição

global e o dessalariamento em massa, a precarização das relações de trabalho

– tudo isso vem afetando e modificando significativamente as estruturas sociais

do país.

As políticas públicas voltadas para a economia solidária inserem-se

neste contexto mais amplo de se repensar as políticas sociais e de trabalho

frente às novas configurações do trabalho. Inicialmente, elas configuraram um

reconhecimento, por parte do Estado brasileiro desse cenário conturbado.

Assim, a década de 90 foi marcada por uma nova institucionalidade das

políticas públicas, que passa pela redefinição das atribuições entre os

diferentes níveis da federação e pela participação organizada da sociedade.

Começa a se configurar um novo espaço público de articulação entre governo

e sociedade. Como esta participação se dá de forma organizada na sociedade,

as associações organizativas assumem papel fundamental na democratização

das informações, na abertura de espaços participativos, proporcionado um

avanço na consciência política.

Tais esforços resultaram, por exemplo, na criação, no âmbito do Ministério

do Trabalho e Emprego, da Secretaria Nacional de Economia Solidária

(Senaes). Conforme assevera Maurício Sardá e Fábio Sanchez:

A secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do

Trabalho e Emprego foi criada em junho de 2003. Ela é parte da

história de mobilização e articulação do movimento da Economia

Solidária existente no país. No final dos anos 1990, como

surgimento nos anos anteriores de várias cooperativas,

empresas de autogestão e outros empreendimentos solidários, o

espaço de discussão e articulação nacional começou a ser

formado durante as atividades da Economia Solidária no I Fórum

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Social Mundial, quando as entidades nacionais de Economia

Solidária articularam-se em torno de um Grupo de Trabalho

Brasileiro de Economia Solidária.4

Insta salientar que a criação do Senaes foi fruto de uma série de

reflexões, mobilizações e articulações empreendidas por ampla parcela da

sociedade civil interessada e, por isso, representa uma conquista dos sujeitos

envolvidos com a economia solidária no Governo Federal.

Hodiernamente, a Senaes é reconhecida como valioso espaço de

discussão e encaminhamento de sugestões sobre ações do governo federal no

concernente à consecução e implementação de políticas públicas voltadas para

a economia solidária.

No mesmo contexto, foi criado o Conselho Nacional de Economia

Solidária (CNES), que vem exercendo papel de protagonismo no sentido de

ampliar as discussões sobre os suportes necessárias para que a expansão da

economia solidária se dê de forma sustentável e contínua. A criação de

legislações específicas para as cooperativas populares é resultado exatamente

da expansão desses suportes.

Seis meses após a criação da Senaes, o Governo Federal lançou, em

2004, o Programa Economia Solidária em Desenvolvimento, que “marcou a

introdução de políticas públicas específicas para a economia solidária no

âmbito nacional” (BRASIL, 2009).

Desde logo, urge ressaltar que o nascimento das instâncias

representativas da economia solidária a nível nacional ocorreu em um mesmo

momento histórico tanto no plano do Estado (Secretaria Nacional, Ministério do

Trabalho) quanto no da sociedade civil (com o Fórum Brasileiro de Economia

Solidária), fato que contribui para hipótese de profundo imbricamento entre

organizações estatais e não-estatais no espaço de produção da política de

economia solidária.

O Programa Nacional de Incubadoras de Cooperativas Populares

(Proninc) representa outro programa de significante relevância, especialmente

quando analisado à luz do objeto de pesquisa do presente artigo, posto que

constitui uma das principais ações inscritas na Política Nacional de Economia

Solidária empreendida pela Senaes. Criado em 1998, e tendo como signatários 4 Gestão pública e sociedades: fundamentos e políticas de economia solidária / Édi Benini... [et

al] (Maurício Sardá de Faria e Fábio José Bechara Sanchez). – 1. ed. – São Paulo: Outras Expressões, 2011, p. 417.

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a FINEP, o Banco do Brasil, a FBB e o COEP, o Proninc tem por objetivo

apoiar e desenvolver as experiências de Incubadoras Tecnológicas de

Cooperativas Populares (ITCPs), realizadas por universidades brasileiras.

Desde sua criação, o programa passou por diversas reformulações, ampliando

seus objetivos e alavancando o número de incubadoras financiadas.

É importante, contudo observar que o Proninc já existia antes da criação

do Senaes, em 2003. Para isso, volta-se ao cenário brasileiro do início dos

anos 90, marcado pela fome, aumento do desemprego, aumento da

informalidade e precarização do trabalho. Nesse quadro, difundiram-se

diversas campanhas de reestruturação do cenário sócio-econômico nacional. A

ação de incubação tem origem nas universidades brasileiras dentro do

Movimento de Ação da Cidadania, contra a Fome, a Miséria e pela Vida,

iniciado pelo sociólogo Hebert de Souza (Betinho).

Diante de tal quadro, as incubadoras surgiram como uma resposta das

universidades brasileiras ao desafio que lhes são impostas de aderir a esse

conclame, articulando o campo do desenvolvimento e disseminação do saber

com a problematização da realidade social, ou seja com o campo das

necessidades sociais, objetivando promover a geração de trabalho e renda, e

consequentemente a inclusão de trabalhadores que embora inseridos no

mercado de trabalho, não mais encontram empregos.

Conforme explana Beatriz Gomes, a proposta das IRCPs:

busca viabilizar iniciativas populares, por meio da formação

continuada, assessoria e assistência técnica, o

desenvolvimento de tecnologia social na perspectiva de inverter

a lógica das incubadoras de empresas, ou seja, produzir

conhecimento científico a partir do conhecimento tácito dos

trabalhadores e assim direcionar a produção de conhecimento

científico aos setores produtivos populares.5

Em 1995, sob estímulo do Comitê de Entidades de Combate à

Fome e pela Vida (Coep) e da Finep, surge a primeira incubadora de

cooperativas populares, criada inicialmente para apoiar a Cootram –

5 VICTÓRIA, Lia Beatriz Gomes. O PRONINC e seu reflexo na ação social das Incubadoras

Tecnológicas de Cooperativas. – Pelotas: UCPEL, 2011, p. 44. Disponível em: < http://www.ucpel.tche.br/mps/dissertacoes/Mestrado/2011/Disserta%E7%E3o_LiaVictoria.pdf >

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Cooperativa de Trabalhadores Autônomos do Complexo de Maguinhos – um

dos maiores complexos de favelas do Rio de Janeiro.

O Proninc surgiu, assim, em 1988, quando órgãos públicos e entidades

não governamentais decidiram apoiar ações de incubadoras universitárias de

todo o país. Foi iniciado no governo do então presidente Fernando Henrique

Cardoso, mas teve sua continuidade comprometida e quase desapareceu

nesse mesmo governo devido ao déficit de recursos, permanecendo assim, até

que, com a criação da Senaes, ganhou novos rumos.

PRONINC enquanto Política Pública

Enquanto política pública, o PRONINC vem promovendo apoio às

atividades de incubagem através de algumas práticas, quais sejam: a) estender

políticas públicas para dentro das ações universitárias; b) estimular novas

formas de relação da universidade com a sociedade; c) garantir o apoio às

atividades universitárias, promovendo nítido diálogo entre ensino e pesquisa; d)

fortalecer as práticas de assessoria universitária às organizações formadas por

pessoas consideradas excluídas da sociedade; e e) possibilitar uma inter-

relação entre universidades situadas em diversas regiões do país propiciando

um rico debate metodológica e a ampliação da produção acadêmica que

estimulam as reflexões a respeito da economia solidária e das alternativas de

desenvolvimento com sustentabilidade.

Outrossim, através do financiamento de projetos de incubadoras de

empreendimentos econômicos solidários, o Proninc atua promovendo a

emancipação integral dos trabalhadores que optam pelo trabalho cooperado ou

associado nas diversas dimensões da economia solidária.

Os objetivos do Proninc estão, nesse sentido, diretamente relacionados

às perspectivas que se vislumbram acerca das possibilidades e significados da

economia solidária, que envolvem, além do potencial para o estabelecimento

de parcerias entre agentes da sociedade e poderes públicos (FRANÇA FILHO,

2004, p.98), as possibilidades de geração de trabalho e renda, de recuperação

da dignidade humana, auto-estima e a auto-confiança, superação das

desigualdades sociais e do círculo de miséria.

Essas ações representam uma inovação na relação estabelecida entre

as universidades e os setores sociais, que as enxergavam como um ambiente

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de privilégio para camadas mais favorecidas da sociedade, motivo pelo qual

essa relação por diversas vezes se manteve distante.

É inegável a importância dessa política pública na ressignificação da

extensão universitária, e nas novas perspectivas daí surgidas. O PRONINC

atua justamente estimulando novas formas de se pensar as atividades

universitárias, interligando-as com as demandas de outros autores que

participam e são diretamente interessados na construção de um pensar

alternativo para o desenvolvimento brasileiro.

Segundo uma perspectiva mais pragmática, o PRONINC destaca-se

atuando assessorando e apoiando diversas redes de incubadoras de trabalho e

acompanhando indiretamente centenas de cooperativas populares,

associações, redes de solidariedade, clubes de troca, grupos de ajuda mútua

etc. Esse assessoramente se dá através do financiamento de projetos e do

intercâmbio de conhecimento. Desse modo, essa política pública possui uma

dinamicidade intrínseca a sua própria natureza, vez que configura-se valioso

suporte ao desenvolvimento da economia solidária e ainda, atua como uma

política de incentivo a um novo e promissor “fazer” e “pensar” universitários.

Atualmente, segundo dados dos Anais referentes ao 1º Seminário

Nacional de Acompanhamento do Proninc, que data de setembro 2008,

existem em torno de 70 incubadoras apoiadas pelo Proninc, distribuídas por

todo o território nacional. Elas agem não só apoiando empreendimentos

econômicos já existentes, como também ajudam a criar novos

empreendimentos, oferecendo-lhes assessoria e formação gratuita. Uma das

vantagens apresentadas pelas incubadoras universitárias refere-se exatamente

à possibilidade de disporem de equipes multidisciplinares compostas por

alunos, técnicos e professores oriundos de diferentes áreas do conhecimento,

todas importantes e necessárias alguma forma no processo de incubação de

empreendimentos econômicos solidários (EES).

As incubadoras apresentam, dessa forma, significativo potencial de

fortalecimento da extensão universitária, constituem importantes espaços de

formação das equipes que as compõem e atuam na indução do

desenvolvimento local, por meio do redesenho da relação

Universidade/Sociedade. A experiência e prática adquiridas durante o processo

de incubação revelam-se inovadoras e demandam uma série de reflexões dos

desafios e possibilidades dessa prática.

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Nesse diapasão, o reconhecimento conquistado por muitas incubadoras

dentro de suas instituições evidencia-se como um dos méritos do Proninc.

Dificuldades e Desafios do Proninc

O Proninc, como programa estruturado no âmbito do Governo Federal,

apresenta alguns limites concernentes às suas características de atuação. Elas

se dão por conta de prinipalmente, uma nítida fragilidade institucional.

O aprofundamento da institucionalização do Proninc como uma política

do Estado é fator indicativo dos novos rumos que vem tomado o programa, que

vem inserindo-se no campo de uma administração pública que tem como pilar

a participação social de diversos atores envolvidos.

Por ser um programa federal, a gestão do Proninc apresenta, também

dificuldades para se adaptar à heterogeneidade do campo em que atua,

questão que remete à própria discussão acerca dos limites e desafios

localizados no âmbito das incubadoras.

A fragilidade institucional manifestada, sobretudo nas dificuldades

vividas em relação às fontes instáveis e inseguras de recursos, implica uma

limitação da efetividade da política, comprometendo seu pleno exercício.

Do mesmo modo, essa incerteza no tocante à garantia e perenidade dos

recursos, muitas vezes ocasionada pelo aparato burocrático e pela morosidade

de liberação dos financiamentos interfere diretamente nas atividades das

incubadoras, gerando assim, problemas de estruturação e geração internas. A

garantia de uma fonte de recursos permanente representa elemento

indispensável à continuidade e solidez de uma política pública.

Diante dessa fragilidade institucional legal e de um respaldo financeiro e

político adequados, o Proninc encontra dificuldades em coordenar e articular

ações conjuntas ante todas as instituições participantes, o que conduz, entre

outros, à fragmentação das ações do Governo Federal dentro do programa.

É de bom alvitre esclarecer que a problemática relacionada à

insuficiência e má distribuição de recursos não restringe-se ao Proninc, mas é

tida como mal crônico das políticas e programas sociais no Brasil,

configurando-se como uma das causas da falha no planejamento de políticas

públicas em países em desenvolvimento.

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CONCLUSÃO

Compreende-se que o fomento da economia popular solidária é uma

política de desenvolvimento, portanto não deve ser tratada como questão de

minoria. Configura-se, portanto, questão de maioria, como estratégia que

envolve a participação social dos mais diversos setores populares, em pró de

uma economia mais justa, solidária e sustentável.

A proposta deste estudo foi priorizar a causa social, a partir dos

princípios e práticas da economia solidária, priorizando-a como objeto de uma

política pública que tenha caráter universal e perene. O caminho percorrido até

aqui já concretiza e demonstra o avanço na construção de políticas públicas

que possam contribuir para a efetivação de um novo modelo de

desenvolvimento.

Buscou-se também avançar na investigação acerca da adoção por parte

do poder público de medidas voltadas para a construção de um campo de

políticas de geração de trabalho e renda pautada segundo uma perspectiva

social. Nesse diapasão, intentou-se perquirir os avanços já conquistados pelo

Proninc, que destaca-se das demais políticas, justamente por incluir em seu

bojo, ações que demandam a participação das universidades.

As principais dificuldades analisadas em relação ao Proninc sejam de

ordem burocrática, orçamentária, ou ainda relacionadas à sua descontinuidade

apontam para um panorama mais amplo, ligado à própria forma como o poder

público trata da adoção de políticas públicas no país. A superação desses

desafios mostra-se questão imprescindível para que o modelo de

desenvolvimento pautado pela participação social, democratização dos

espaços, e na redução de desigualdades seja alcançado.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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convênio TEM / IPEA / ANPEC – 01/2003). – Brasília: MET, IPEAA, ANPEC,

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<http://www.mte.gov.br/ecosolidaria/ ecosolidaria_default>. Acesso em: 14 set.

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e Economia Solidária: uma perspectiva internacional. Civitas – Revista de

Ciências Sociais, v. 7, n. 1, jan.-jun. 2007.

Gestão pública e sociedades: fundamentos e políticas de economia

solidária / Édi Benini... [et al] (Maurício Sardá de Faria e Fábio José Bechara

Sanchez). – 1. ed. – São Paulo: Outras Expressões, 2011.

TEIXEIRA, Elenaldo Celso. O papel das políticas públicas no

desenvolvimento local e na

transformação da realidade. UFBA, Salvador, 2002.

VICTÓRIA, Lia Beatriz Gomes. O PRONINC e seu reflexo na ação social das

Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas. – Pelotas: UCPEL, 2011, p. 44.

Disponível em:

<http://www.ucpel.tche.br/mps/dissertacoes/Mestrado/2011/Disserta%E7%E3o

_LiaVictoria.pdf >.