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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE ESTUDOS SÓCIO-AMBIENTAIS PROGRAMA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA ELAINE BARBOSA DA SILVA A DINÂMICA SOCIOESPACIAL E AS MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA NO BIOMA CERRADO Goiânia 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

INSTITUTO DE ESTUDOS SÓCIO-AMBIENTAIS PROGRAMA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

EM GEOGRAFIA

ELAINE BARBOSA DA SILVA

A DINÂMICA SOCIOESPACIAL E AS MUDANÇAS NA

COBERTURA E USO DA TERRA NO BIOMA CERRADO

Goiânia

2013

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ELAINE BARBOSA DA SILVA

Tese apresentada ao Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Estudos Sócio-ambientais da Universidade Federal de Goiás como pré-requisito para a obtenção do título de Doutora em Geografia. Área de concentração: Análise ambiental e tratamento da informação geográfica. Orientador: Prof. Dr. Laerte Guimarães Ferreira Jr. Co-orientador: Prof. Dr. Fausto Miziara.

Goiânia

2013

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

GPT/BC/UFG

S586d

Silva, Elaine Barbosa da.

A dinâmica socioespacial e as mudanças na cobertura e

uso da terra no bioma Cerrado [manuscrito] / Elaine Barbosa

da Silva. - 2013.

148 f. : figs., tabs.

Orientador: Prof. Dr. Laerte Guimarães Ferreira Jr;

Coorientador: Prof. Dr. Flávio Miziara.

Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Goiás,

Instituto de Estudos Socio-Ambientais, 2013.

Bibliografia.

Inclui lista de figuras, Abreviaturas, Siglas e tabelas.

1. Cerrado – Solo – Uso. 2. Cerrado – Fronteira agrícola.

3. Agricultura – Modernização – Cerrado. I. Título.

CDU: 631.111.4(213.54)

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ELAINE BARBOSA DA SILVA

A DINÂMICA SOCIOESPACIAL E AS MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA NO BIOMA CERRADO

Tese defendida no Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Estudos Sócio-ambientais da Universidade Federal de Goiás como pré-requisito para a obtenção do título de Doutora em Geografia, aprovada em ____ de _____________ de 2013, pela Banca Examinadora constituída pelos seguintes professores:

_____________________________________________

Prof. Dr. Laerte Guimarães Ferreira Jr. - UFG Presidente

_____________________________________________

Profa. Dra. Celene Cunha Antunes Barreira – UFG Membro titular interno

_____________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Rodrigues Mendonça – UFG Membro titular interno

_____________________________________________

Prof. Dr. Alexandre Camargo Coutinho – Embrapa Membro titular externo

_____________________________________________

Prof. Dr. Ricardo Bonfim Machado – UnB Membro titular externo

_____________________________________________

Prof. Dr. Eguimar Felício Chaveiro – UFG Suplente interno

_____________________________________________

Prof. Dr. Edson Eyji Sano – UnB Suplente externo

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AGRADECIMENTOS

Ao Professor Laerte, pelo que contribuiu para minha vida pessoal, profissional e acadêmica desde 2006, não medindo esforços para a boa condução do Lapig e das minhas pesquisas de mestrado e doutorado. Ao Professor Fausto, pela excelente co-orientação e pela amizade. Aos Professores Eguimar e João de Deus, pelas contribuições no exame de qualificação. Aos colegas do Lapig, em especial ao Genival, Adriano, Marlon, Arielle, Janete e Sílvio, pela participação no processamento dos dados, e aos professores Noely, Manuel, Fabrízia e Nilson, pelo apoio e incentivo. Ao Antonio dos Anjos, meu namorado, pelo companheirismo. À Antônia, minha mãe, pelo incentivo. Ao Celso, motorista da UFG que conduziu-nos durante a viagem de campo, pela boa vontade e alegria. À direção do Iesa e à coordenação do PPPGG, pelo empenho em dirimir as dificuldades enfrentadas durante a realização desta pesquisa. Aos dois últimos governos federais, pela ampliação e fortalecimento das universidades brasileiras. Ao povo brasileiro, que proporcionou esta nossa conquista.

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TRAJETÓRIA ACADÊMICO-PROFISSIONAL

Entre 2002 e 2005 a autora cursou licenciatura em Geografia na

Universidade Estadual de Goiás (UEG), em Anápolis. No período de 2005 a

2006 cursou Especialização Lato Sensu em Geoprocessamento na Faculdade

Estácio de Sá, em Goiânia. De março de 2007 a março de 2009 cursou o

mestrado em geografia no Programa de Pesquisa e Pós-graduação em

Geografia (PPPGG) do Instituto de Estudos Sócio-ambientais (Iesa), onde

também cursou o doutorado aqui apresentado, entre março de 2009 e fevereiro

de 2013.

As atividades profissionais desde o ingresso na vida acadêmica tem

sido relacionadas às questões sócio-ambientais e à docência universitária.

Compôs o corpo de técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e

Recursos Hídricos (Semmarh) de Anápolis, durante o período de 2004 a 2011,

atuando na área de licenciamento e qualidade ambiental.

Atuou como professora na Faculdade Católica de Anápolis nos

cursos Sequencial em Gestão Ambiental e MBA em Gestão Ambiental, durante

o período de 2007 a 2011, e na Faculdade Senac, em Goiânia, no curso de

Gestão Ambiental, em 2009. Em março de 2011 ingressou como professora

substituta no Iesa/UFG, assumindo o cargo de professora efetiva nesta

instituição em janeiro de 2012.

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RESUMO

O bioma Cerrado tem passado por intensas mudanças na cobertura e uso da terra desde a década de 1970, desencadeadas por ação estatal e particular que visavam implantar nesse espaço a agropecuária moderna. Como consequência, ocorreu a conversão de mais de 50% de sua cobertura vegetal e a fragmentação de grande parte dos remanescentes, bem como impactos de ordem sócio-territorial, como a migração de grande parte da população rural para as cidades. A presente pesquisa busca compreender essas transformações, privilegiando a dimensão espacial e temporal da substituição da vegetação natural pelas pastagens cultivadas e pela agricultura moderna. Tendo em vista que as pastagens representam a maior classe de uso das terras no Cerrado e que a produção de bovinos está intimamente ligada à sua ocupação, busca-se compreender a expansão das pastagens cultivadas desde a década de 1970, com base na espacialização de dados censitários para todo o bioma. Outro interesse é analisar os processos de expansão da fronteira agrícola no Cerrado em áreas de uso consolidado e onde a fronteira agrícola está em franca expansão. Nesse sentido, selecionaram-se quatro áreas para as quais foram elaboradas mapas de cobertura e uso da terra entre 1975 e 2010: a) o centro-sul goiano, representativa das áreas de Cerrado com uso consolidado; b) a porção central do estado do Mato Grosso, próximo à divisa do Cerrado com a Amazônia; c) o Extremo Oeste Baiano e; b) a região do Mapito, formada pela confluência dos estados do Maranhão, Piauí e Tocantins. Evidencia-se que a distância dos grandes centros consumidores fez com que houvesse diferentes densidades de ocupação do espaço, modeladas pela demanda por produtos agropecuários e induzidas pela ação estatal. Assim, a porção centro-sul do bioma foi ocupada mais rapidamente pelas pastagens cultivadas e pela agricultura mercantil, criando aí uma fronteira agrícola tradicional, que precedeu a chegada das modernas técnicas de produção. A expansão da fronteira agrícola em espaços mais longínquos se deu mais recentemente e representa a consolidação da produção de commodities, cada vez mais conduzidas pelas ações privadas, tendo o Estado como um aliado estratégico. Consegue-se evidenciar, ainda, que tanto nas fronteiras agrícolas antigas quanto nas mais recentes as pastagens cultivadas disputam as melhores terras com a agricultura moderna, mas acaba por se conformar em áreas de solos menos férteis e mais declivosos, mantendo, por outro lado, a proximidade dos mercados consumidores, de modo que essas duas atividades se complementam na ocupação do bioma Cerrado, que mescla condições propícias ao desenvolvimento de ambas. Palavras-chave: Cerrado. Mudança na cobertura e uso da terra. Fronteira agrícola. Modernização da agricultura.

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ABSTRACT

The Cerrado biome has faced intense changes in land cover / land use since the 70´s, related to both governmental policies and private initiatives focused on the implementation of modern agricultural practices. In result, more than 50% of its original vegetation has been converted and intensively fragmented, and large-scale migration towards urban centers, in addition to others social-territorial impacts, has occurred. Within this context, this study aims at understanding these transformations, prioritizing the spatial and temporal dimensions regarding the conversion to cultivated pastures and croplands. Considering that pastures represent the largest land use in the Cerrado, and that such occupation is the main driver behind beef production, this work specifically focused on pasture expansion, based on the spatially-explicit analysis of historical census data. Likewise, we also investigated the expansion of the Cerrado agricultural frontiers, for which four distinct areas, representing both consolidated, as well as frontiers in development were selected and mapped regarding land cover and land use changes from 1975 to 2010: a) the central-south portion of the Goiás State, representative of consolidated areas; b) the central portion of Mato Grosso, near the Cerrado – Amazon border; c) the Bahia western portion, and d) the MAPITO region, encompassing the convergence of the Maranhão, Piauí, and Tocantins states. Clearly, the proximity to major consumption centers, induced by the demand for agricultural commodities governmental incentives, drove land occupation, at different rates. Thus, the biome central-south region, occupied more rapidly with both cultivated pastures and crops, can be characterized as a traditional frontier, which anticipated the establishment of the modern agriculture. On the other hand, expansion of the agricultural frontier in more remote areas occurred more recently, according to the consolidation of the private driven and state supported commodity agriculture. It is worth of mentioning that in both consolidated and expanding frontiers, cultivated pastures dispute the more suitable lands with the crop agriculture. Although pastures are usually constrained to low fertility soils and higher slope terrains, it remains close to the consumption centers, confirming the Cerrado ability in properly accommodating both economic activities. Key-words: Cerrado, Land cover and land use change. Agriculture frontier. Agriculture modernization.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1.1 Localização dos principais programas de ocupação do bioma Cerrado criados a partir da década de 1970, espacializados sobre o mapeamento da cobertura e uso da terra, referente ao ano de 2002 (Probio).................................................................... 18

Figura 2.1 Fluxograma dos dados e etapas metodológicas seguidos neste trabalho ............................................................................................................ 26

Figura 2.2 Evolução da área ocupada por pastagens permanentes (naturais e plantadas) no mundo, entre 1961 e 2009, e nos seis países com as maiores áreas ............................................................................. 31

Figura 2.3 Evolução do rebanho bovino no mundo, entre 1961 e 2010, e nos seis principais países produtores. ................................................................... 31

Figura 2.4 Área ocupada por pastagens no Brasil e nas regiões brasileiras, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006 ........................................................................................................................... 32

Figura 2.5 Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens naturais, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006 ........................................................................................................................... 33

Figura 2.6 Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens cultivadas, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006 ........................................................................................................................... 34

Figura 2.7 Pastagem natural, cultivada e total no bioma Cerrado, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006 .................................................. 35

Figura 2.8 Zonas de expansão das pastagens cultivadas no bioma Cerrado entre 1970 e 2006 ........................................................................................ 36

Figura 2.9 Fertilidade dos solos, polígonos de pastagens cultivadas (mapeados pelo Probio em 2002) e malha viária no bioma Cerrado ...................................................................................................................... 37

Figura 2.10 Mapas da ocupação por bovinos no bioma Cerrado, segundo os censos agropecuários de 1975 a 2006 e de pastagens degradadas em 2006. .............................................................................. 42

Figura 2.11 Evolução da área de pastagem cultivada (ha) e do efetivo bovino por estados do Cerrado (exceto PI, PR e DF), segundo os censos agropecuários de 1975 a 2006 .................................................. 41

Figura 3.1 Localização da área de estudo, conforme os limites estaduais, e em relação ao mapa de cobertura e uso da terra para a totalidade do bioma Cerrado em 2002. .................................................. 53

Figura 3.2 Exemplar de imagem antes e após o processo de classificação. ............................................................................................................. 55

Figura 3.3 Evolução espaço-temporal da cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 222/72, localizada sobre a 57

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região centro-sul do estado de Goiás. .......................................................................

Figura 3.4 Evolução da agricultura, pastagem, vegetação natural e bovinos na região compreendida pela cena Landsat TM 222/72 ........................................................................................................................ 60

Figura 3.5 Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas na região compreendida pela cena 222/72, entre 1973 e 2010 ............................................................................................................... 61

Figura 3.6 Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens naturais, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006. .......................................................................................................................... 62

Figura 3.7 Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens cultivadas, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006 ........................................................................................................................... 62

Figura 3.8 Mudanças nos vetores de localização da agricultura e da pecuária antes e depois da modernização da agropecuária...................................... 65

Figura 4.1 Mapa da extensão total dos alertas de desmatamento gerados pelo Siad no Cerrado entre 2002 e 2010 e localização das áreas de estudo ................................................................................ 72

Figura 4.2 Evolução espaço-temporal da cobertura e uso da terra na área correspondente à cena 226/70, localizada no centro-sul do estado do Mato Grosso. .................................................................................. 75

Figura 4.3 Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 226/70 (centro-sul do estado do Mato Grosso), no período de 1975 a 2010 ......................................................................... 76

Figura 4.4 Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 226/70 (centro-sul do estado do Mato Grosso), entre 1973 e 2010 (municípios de Acorizal, Campo Verde, Chapada dos Guimarães, Cuiabá, Diamantino, Nobres, Nova Brasilândia, Nova Mutum, Nova Ubiratã, Paranatinga, Planalto da Serra, Primavera do Leste, Rosário Oeste e Santa Rita do Trivelato). ....................................................... 77

Figura 4.5 Evolução espaço-temporal da cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 220/68, localizada sobre a região do Extremo Oeste Baiano. .............................................................................. 80

Figura 4.6 Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 220/68 (Extremo Oeste Baiano), no período de 1975 a 2010. ............................................................................................ 82

Figura 4.7 Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 220/68, entre 1973 e 2010 (municípios de Dianópolis, Novo Jardim, Ponte Alta do Bom Jesus, Taguatinga, Cristalândia do Piauí, Sebastião 82

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Barros, Angical, Barreiras, Catolândia, Cotegipe, Formosa do Rio Preto, Luís Eduardo Magalhães, Riachão das Neves, Santa Rita de Cássia e São Desidério). ........................................................

Figura 4.8 Evolução espaço-temporal da cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 221/66, localizada sobre a região do Mapito ........................................................................................................ 85

Figura 4.9 Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 221/66 (Mapito), no período de 1975 a 2010 ........................................................................................................................... 88

Figura 4.10 Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens cultivadas, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006 ........................................................................................................................... 89

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LISTA DE SIGLAS

Abiec Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne

Aiba Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia

Bird Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

Cang Colônia Agrícola Nacional de Goiás

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

Cop 15 15ª Conferência das Partes

Emater Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Goiás

Embrapa Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

Fao Food and Agriculture Organization of the United Nations

Fapcen Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor Norte

FCO Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste

Fomentar Fundo de Participação e Fomento à Industrialização do Estado de Goiás

Finor Fundo de Investimento do Nordeste

Fiset Fundo de Investimento Setorial

GEF Global Environmental Facility (Fundo Mundial para Meio Ambiente)

GEE Gases de Efeito Estufa

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

Inpe Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais

Lapig Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento

MMA Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal

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Nasa National Aeronautics and Space Administration

PMDBBS Projeto de Monitoramento do Desmatamento dos Biomas Brasileiros por Satélite

PND Plano Nacional de Desenvolvimento

Polocentro Programa de desenvolvimento dos Cerrados

Polonordeste Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do Nordeste

Probio Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira

Prodecer Programa de Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados

Produzir Programa de Desenvolvimento Industrial de Goiás

Siad Sistema Integrado de Alerta de Desmatamento

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO .......................................................................................................... 14

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 16

2 ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL DAS PASTAGENS CULTIVADAS NO BIOMA CERRADO ENTRE 1970 E 2006 ................................................................................................................................ 23

2.1 Introdução ....................................................................................................................... 24

2.2 Dados e abordagens....................................................................................................... 25

2.3 Panorama histórico ......................................................................................................... 28

2.4 Pastagens no cerrado ..................................................................................................... 33

2.5 Considerações finais....................................................................................................... 45

3 A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA E A MUDANÇA NA COBERTURA E USO DA TERRA NO CENTRO-SUL DE GOIÁS, ENTRE 1975 E 2010 ...................................................................................................... 48

3.1 Introdução ....................................................................................................................... 49

3.2 Área de estudo ............................................................................................................... 52

3.3 Materiais e métodos........................................................................................................ 53

3.4 Mudanças na cobertura e uso da terra na cena 222/72 .................................................. 55

3.5 Vetores das mudanças na cobertura e uso da terra no cerrado antes e depois da modernização da agropecuária ...................................................................... 63

3.6 Considerações finais....................................................................................................... 66

4 AS MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA EM

FRONTEIRAS AGROPECUÁRIAS RECENTES DO CERRADO ENTRE

1975 E 2010 .................................................................................................................... 68

4.1 Introdução ....................................................................................................................... 69

4.2 Escolha das áreas de estudo .......................................................................................... 71

4.3 Etapas metodológicas do processamento das imagens ................................................. 71

4.4 Cena 226/70: centro do estado do Mato Grosso. ........................................................... 73

4.5 Cena 220/68: região do Extremo Oeste Baiano. ............................................................. 78

4.6 Cena 221/66: região do Mapito ....................................................................................... 84

4.7 Considerações finais....................................................................................................... 89

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 92

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 94

APÊNDICE A: METODOLOGIA DE PROCESSAMENTO DAS IMAGENS ....................................................................................................................... 103

APÊNDICE B: RELATÓRIO DE TRABALHO DE CAMPO NAS CENAS 220/68 e 221/66 .............................................................................................................. 110

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APRESENTAÇÃO

A presente tese de doutorado compõe-se de artigos científicos e

apêndices e está organizada da seguinte forma:

1) Introdução, composta de uma descrição geral do tema tratado na

tese, i. e. a problematização, apresentada em forma de questões científicas, bem

como as hipóteses e os objetivos;

2) Desenvolvimento, que compreende três artigos, resultados

diretamente da pesquisa e correlacionados às questões científicas centrais;

3) Considerações gerais, onde são integrados todos os resultados

obtidos no desenvolvimento da tese;

4) Referências bibliográficas de todos os artigos;

5) Apêndices: A) Metodologia de processamento das imagens; e B)

Relatório do trabalho de campo.

Os procedimentos metodológicos, os resultados e as discussões

constam dos artigos, sendo que no apêndice “A” tem-se uma explanação mais

refinada da metodologia de processamento das imagens utilizadas no segundo e

terceiro artigos.

O primeiro artigo, intitulado “Análise da distribuição espaço-temporal

das pastagens cultivadas no bioma Cerrado entre 1970 e 20061”, busca analisar a

expansão das pastagens cultivadas e a evolução da produção bovina no Cerrado,

baseando-se nos censos agropecuários do IBGE, especializados conforme os

limites municipais históricos (reconstituídos durante esta pesquisa), em estudos

históricos e em dados de Sensoriamento Remoto.

O segundo artigo, sob o título “A expansão da fronteira agrícola e a

mudança de uso e cobertura da terra no centro-sul de Goiás, entre 1975 e 2010”,

tem como intuito compreender a dinâmica histórica da cobertura e uso da terra

em uma área de ocupação consolidada no bioma Cerrado, tendo por referência

os mapas de cobertura e uso da terra elaborados no âmbito desta pesquisa.

O terceiro artigo, “As mudanças de uso e cobertura da terra em

fronteiras agropecuárias recentes do Cerrado entre 1975 e 2010”, também se

baseia nos mapas de cobertura e uso da terra realizados nesta pesquisa,

1 Artigo submetido à revista IDeAS – Interfaces em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade .

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referentes a três áreas em franco processo de expansão da fronteira agrícola: o

centro-sul do estado do Mato Grosso, o Extremo Oeste Baiano e a região do

Mapito (acróstico que refere-se aos estados de Maranhão, Piauí e Tocantins), o

qual busca compreender os fatores intrínsecos e históricos da expansão dessas

fronteiras recentes, bem como a diferença entre essas áreas e entre aquelas com

ocupação consolidada.

O primeiro artigo encontra-se submetido e os outros dois estão em fase

de preparação para a submissão. Nos três, o segundo e quarto co-autores são o

orientador e o co-orientador da pesquisa. A terceira co-autoria é de Antonio

Fernandes dos Anjos, que tem o mesmo orientador e participa do mesmo projeto

de pesquisa em que a autora está inserida. O apêndice “A” é baseado em artigo

já aceito para o XVI Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto, tendo como

co-autores Genival Fernandes Rocha, Antonio Fernandes dos Anjos, Laerte

Guimarães Ferreira Jr., Adriano Silva de Faria, Janete Rego Silva e Arielle Elias

Arantes, todos pesquisadores do Lapig inseridos no trabalho de tratamento digital

das imagens utilizadas nesta pesquisa.

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1 INTRODUÇÃO

O Cerrado é, dentre as savanas do mundo, a que possui as melhores

condições edafoclimáticas para a produção agropecuária (GOEDERT et al.,

2008). Essas condições naturais, associadas à correção da acidez e à fertilização

artificial, a partir da década de 1970, possibilitaram a produção de variadas

commodities agropecuárias (MIZIARA; FERREIRA, 2008), com elevada

produtividade, fazendo com que o Cerrado fosse visto cada vez mais como uma

das principais soluções para a fome no mundo (BORLAUG, 2003). Em função dos

vários impactos ambientais observados, como a redução e a fragmentação dos

ecossistemas (MACHADO, 2000; CARVALHO et al., 2009), o bioma Cerrado é

considerado como um dos hotspots da biodiversidade mundial (MYERS et al.,

2000).

O Brasil é reconhecido internacionalmente como um dos principais

países produtores de grãos e de carne bovina para exportação (MUELLER;

MARTA JÚNIOR, 2008; BRASIL, 2007; ANUALPEC, 2012). Esses resultados são

reflexos das políticas e estratégias de ocupação do território nacional, criadas

sobretudo a partir da década de 1970, quando o governo militar criou o II Plano

Nacional de Desenvolvimento (PND) (BRASIL, 1975). No modelo pretendido, o

Estado teria o controle técnico e político da ocupação do território brasileiro e

induziria os setores da economia de acordo com a “vocação natural” de cada uma

das regiões do país, na intenção de implantar o que Becker (2001) chamou de

controle técnico e político de malha programada, particularmente visível na

Amazônia e no Cerrado. Neste contexto, o II PND enxergou na Região Centro-

Oeste, onde está boa parte do Cerrado, e na Região Norte, a “vocação” para o

desenvolvimento da agropecuária, visando atender os mercados interno e

externo.

Na Amazônia brasileira essas ações estatais tiveram como resultado o

desenvolvimento da agropecuária nas regiões denominadas Amazônia Meridional

e Amazônia Oriental, que grosso modo compõem o que se convencionou chamar

de Arco do Desmatamento da Amazônia, que faz limite com o Cerrado e até inclui

partes deste, abrangidas pela Amazônia Legal (RIVERO et al., 2009; ARRIMA et

al., 2005). No restante da Amazônia a expansão da agropecuária se viu

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dificultada pelas condições naturais, sociais e políticas, sobretudo pela pressão

internacional para sua conservação. Ao Cerrado, por outro lado, coube o estigma

de área desocupada, dotada de fauna e flora menos importante, por isso

apropriada para se usada como “zona de sacrifício”, discurso hoje já combatido,

em vista da valorização do Cerrado e de estudos científicos acerca da

interdependência desses dois biomas (MALHADO et al., 2010).

No âmbito do II PND foi criado o Programa de Desenvolvimento dos

Cerrados (Polocentro), executado entre 1974 e 1979, tendo como foco principal o

desenvolvimento agropecuário no Cerrado, baseado na oferta de crédito e na

implantação de infraestrutura por parte do Estado. A partir do final da década de

1970 a iniciativa privada nacional e japonesa vinculou-se aos Estados brasileiro e

japonês na criação do Programa de Cooperação Nipo-brasileira para o

Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer), implantado em três fases, sendo a

primeira em 1979, a segunda em 1985 e a terceira em 1995, ainda em execução

(Figura 1.1). Dentre os seus principais objetivos estava a implantação de colônias

de assentamento em diversas áreas do Cerrado visando à produção de

commodities para exportação, com preferência pela soja (INOCÊNCIO, 2010;

OLIVEIRA, 2000). Essas colônias, compostas sobretudo por sulistas, tornaram-se

polos disseminadores da moderna produção, impondo aos pequenos produtores a

adesão a esse novo padrão técnico ou mesmo coagindo-os a vender suas terras

ou abandonar suas posses.

Em pouco mais de quarenta anos, a modernização da agropecuária no

Cerrado resultou em rápidas mudanças na cobertura e o uso da terra, como pode

ser verificado no mapeamento realizado pelo Projeto de Conservação e Utilização

Sustentável da Diversidade Biológica Brasileira (Probio) (SANO et al., 2010), que

teve como base a classificação e interpretação de imagens Landsat ETM+ de

2002. Este mapeamento confirmou a perda de aproximadamente 50% da

vegetação do Cerrado até 2002, além da fragmentação de grande parte de seus

remanescentes (Figura 1.1).

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Figura 1.1 – Localização dos principais programas de ocupação do bioma Cerrado criados a partir da década de 1970, espacializados sobre o mapeamento da cobertura e uso da terra, referente ao ano de 2002 (Probio).

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Em 1998, a importância biológica e social do Cerrado começou a ser

reconhecida, por meio do projeto Ações Prioritárias para a Conversão da

Biodiversidade do Cerrado e Pantanal (BRASIL, 1999). Outra importante iniciativa

foi o mapeamento realizado pelo Probio, numa conjugação de esforços do

Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal (MMA),

do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), do

Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird) e do Fundo

Mundial para Meio Ambiente (Gef) (SANO et al., 2008). Além desse trabalho,

destacam-se o Sistema Integrado de Alerta de Desmatamentos (Siad Cerrado)

(FERREIRA et al., 2007), que foi pioneiro na geração sistemática de dados de

alertas de desmatamento para o bioma Cerrado, e o Projeto de Monitoramento do

Desmatamento dos Biomas Brasileiros por Satélite (PMDBBS), criado em 2008

pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Ibama).

Ressaltada a grande importância dos estudos e dados acima descritos,

cabe frisar que a compreensão do processo de transformação da paisagem

natural e social do Cerrado ainda encontra-se em fase embrionária. Dada a

grande extensão espacial desse bioma e a grande amplitude temporal das

transformações socioespaciais, a maioria dos estudos já empreendidos seguiu

dois caminhos: tornaram-se análises detalhadas de pequenas áreas,

normalmente municipais ou microrregionais, ou estudos mais abrangentes

espacialmente, todavia alcançando explicações genéricas. Neste contexto, a

presente pesquisa seguiu a estratégia de correlacionar essas duas escalas de

análise, investigando as mudanças na cobertura e uso da terra, ao mesmo tempo

que buscando entender as ações de natureza hegemônica no espaço,

notadamente a ação estatal e a modernização da produção agropecuária.

Outra preocupação relevante nesta pesquisa é a forma como se deu o

avanço da fronteira agrícola. Embora a característica fundamental das discussões

sobre a fronteira na Geografia distinga-se das concepções sociológicas e

antropológicas por considerar as transformações econômicas capitalistas na

produção do espaço, a exemplo da urbanização (BECKER 1988, INOCÊNCIO;

CALAÇA, 2009; MARTINS, 2009), nesta pesquisa a fronteira agrícola é estudada

partindo de sua expressão espacial dada pelos mapas históricos, buscando-se

então as explicações não visíveis, como a ação do Estado, dentre outras. O

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segundo artigo, ao tratar de uma fronteira antiga, mapeou uma surpreendente

sucessão de usos entre pastagens cultivadas e agricultura. Houve aí a

conformação de uma fronteira agrícola tradicional, que foi, com a chegada de

novas técnicas agropecuárias, transformada em uma fronteira agrícola moderna.

Houve um choque entre o tradicional e o moderno, com algum tempo para a sua

assimilação, diferentemente do que ocorreu nas outras três fronteiras recentes,

investigadas no terceiro artigo, onde inicialmente existiam produtores tradicionais,

em boa parte posseiros. Nessas áreas o modelo produtivo moderno chegou mais

bem arranjado técnica, política e economicamente, havendo, então, maior

violência. Essa violência, ainda que não seja o foco desta pesquisa, é evidenciada

nos mapas históricos pela rapidez na expansão e mudança dos usos.

Diante do exposto, esta pesquisa buscou responder as seguintes

questões:

a) Como os fatores naturais e antrópicos interferiram nas mudanças

na cobertura e uso da terra no Cerrado?

b) Qual o papel das pastagens cultivadas e da pecuária nas

mudanças na dinâmica de ocupação do bioma Cerrado?

c) Como a proximidade dos principais centros consumidores do

país influenciou a transformação das paisagens naturais e

antrópicas do Cerrado?

d) Qual a relação do Estado com a modernização da agropecuária

no Cerrado e por quais mudanças essa relação passou desde a

década de 1970?

e) Como a fronteira agrícola se diferenciou espacial e

temporalmente no Cerrado ao longo das últimas quatro décadas?

Essas questões estão centradas nas seguintes hipóteses:

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a) As peculiaridades naturais, aliadas aos diferentes aportes de

infraestrutura ao longo do tempo, modelaram a ocupação do

Cerrado pela moderna agropecuária, criando espaços com

densidades econômica e demográfica diversas;

b) O avanço das pastagens cultivadas reafirmou a presença da

pecuária no Cerrado e possibilitou tanto o compartilhamento do

espaço com a agricultura quanto a ocupação de terras menos

férteis e mais declivosas;

c) O centro-sul do Cerrado foi ocupado pela agropecuária moderna

mais intensa e rapidamente que as áreas mais distantes da

Região Sudeste do país, em função da demanda por essa

produção, da qualidade dos solos e da maior densidade de

infraestrutura de transporte;

d) O Estado foi o grande articulador da ocupação do Cerrado pela

agropecuária, auxiliando a iniciativa privada, que, após realizar a

acumulação primitiva suficiente, passou a participar mais

ativamente e até independentemente das ações do Estado;

e) As primeiras áreas de fronteira agrícola no Cerrado foram

transformadas mais lentamente que as mais recentes,

caracterizadas pela concisa articulação técnica, econômica e

política e pela capacidade de transformar rapidamente os

espaços incorporados à produção.

Com vistas à validação destas hipóteses, esta pesquisa se apoiou

nos seguintes objetivos principais:

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a) Analisar, a partir de dados censitários e análises

socioeconômicas, o processo histórico de avanço das áreas de

pastagens no bioma Cerrado;

b) Identificar, ao longo do tempo e do espaço, o impacto da ação

estatal nas mudanças de cobertura e uso da terra no bioma

Cerrado;

c) Analisar, com base em dados satelitários e censitários, o

processo de expansão e consolidação da fronteira agrícola no

bioma Cerrado.

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2 ANÁLISE DA DISTRIBUIÇÃO ESPAÇO-TEMPORAL DAS PASTAGENS

CULTIVADAS NO BIOMA CERRADO ENTRE 1970 E 2006

Analysis of the spatial-temporal distribution of cultivated pastures in the Brazilian savanna biome from 1970 to 2006

RESUMO

Em 2006, mais de 34% do bioma Cerrado era usado como pastagem, seguindo diferentes padrões de distribuição espacial. Este artigo busca analisar a expansão das pastagens cultivadas e da pecuária no Cerrado, entre 1970 e 2006, baseando-se em estudos históricos, nos censos agropecuários do IBGE e em dados de sensoriamento remoto. Os antigos limites municipais foram reconstituídos e os dados censitários foram mapeados. Verificou-se que a quantidade de pastagem cultivada aumentou até meados da década de 1980, quando começou a competir com a agricultura e a ser usada mais intensivamente. Notou-se ainda que as pastagens se expandiram de formas diferentes em cada porção do bioma e que a qualidade dos solos, a presença de infraestrutura viária e a proximidade de mercados consumidores influenciaram essa expansão. Trata-se, ainda, das pastagens degradadas, que hoje representam no mínimo 7% de toda a pastagem, constituindo-se num grande desafio econômico, social e ambiental para o desenvolvimento sustentável do bioma. Palavras-chave: Cerrado, Pastagem, Mapeamento histórico.

ABSTRACT

In 2006, more than 34% of Cerrado biome was already converted to pastures, according to different spatial distribution patterns. This study aimed to analyze the expansion of cultivated pastures and cattle ranching in the Cerrado, between 1970 and 2006, based on historical studies, IBGE census data, and satellite imagery. To this end, former municipality boundaries were reconstructed, in relation to which, census data was spatialized. It could be observed that the amount of cultivated pasture increased up to the early 80’s, when agriculture started to take over and pastures to be more intensively utilized. It was also noticed that the pastures expanded in different ways, regarding specific biome locations, soil quality, existent infrastructure, and the proximity to consumption markets. In this paper, we also considered pasture degradation, regarding both their spatial patterns and geographical associations. Amounting at least 7% of the entire cultivated pasturelands, degraded pastures represent a major social, economic and environmental challenge to the biome sustainable development. Key-words: Cerrado, Pastures, Historical mapping.

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2.1 INTRODUÇÃO

O Brasil destaca-se no cenário internacional como o maior produtor

comercial e exportador de carne bovina (BRASIL, 2007; ANUALPEC, 2012),

cenário propiciado pela abundância de terras e pela variabilidade climática, que

contribuíram para a inserção de várias espécies de forrageiras e de bovinos

(LACORTE, 2002). Embora essa produção esteja presente em praticamente todo

o seu território, é na região Centro-Oeste que se concentra a maior parte do

efetivo bovino. É também nessa região que se encontra a maior porção do bioma

Cerrado, o que ao longo da história resultou em grande correlação entre a

produção bovina e a conversão de vegetação de Cerrado em pastagem.

No início da década de 1990, o Brasil aumentou sua participação no

mercado mundial de carne bovina, devido principalmente à desvalorização da

moeda nacional. Mesmo com a valorização do real frente a outras moedas, a

partir de 1994, o país manteve paulatino crescimento das exportações, tornando-

se o maior exportador, depois de ultrapassar as exportações australianas

(BRASIL, 2007). Por outro lado, como a produção bovina brasileira originou-se da

produção tradicional, pulverizada em pequenas e médias propriedades, grande

parte da produção nacional não se inseriu nos padrões técnicos de alta

produtividade. Foi também na década de 1990 que o consumo de frangos e

suínos aumentou nos mercados interno e externo, limitando o preço da carne

bovina. Assim, como o preço da carne, leite e couro bovinos passou a ser

fortemente influenciado pela produção tecnologicamente avançada e

intermediada por grandes frigoríficos, houve desestímulo à produção extensiva

rudimentar, que tem diminuído sua participação no mercado e abandonado as

pastagens, já degradadas (BARCELLOS, 1996). Neste contexto, faz-se

necessário conhecer os padrões espaciais da ocupação do Cerrado por

pastagens e entender como as condições socioeconômicas e ambientais

influenciaram a expansão desse uso.

Uma das dificuldades dos estudos relativos à dinâmica espacial das

pastagens no Brasil está no mapeamento dessa realidade. O levantamento

cartográfico realizado pelo Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da

Diversidade Biológica Brasileira (Probio), à escala de 1/250.000, a partir de

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imagens de 2002 do satélite Landsat TM 7, é uma importante ferramenta para a

análise do uso do solo do Cerrado (SANO et al., 2007), haja vista a

disponibilização de dados quantitativos e geograficamente explícitos. Contudo,

estes dados são restritos ao ano de 2002, além de não permitirem a distinção

entre os diversos tipos de pastagens existentes no Cerrado e seu estado de

conservação.

Por sua vez, os censos agropecuários do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE) podem auxiliar na compreensão e no diagnóstico

da expansão das pastagens no bioma Cerrado em função do extenso período

recenseado. A limitação dos censos está na generalização da informação para

toda a área do município e na organização de toda a base de dados conforme os

limites municipais do ano de 2007. Além disso, as bases cartográficas do IBGE

anteriores a 2007 não coincidem com as datas dos censos agropecuários. Faz-se

assim necessário reconstituir as bases cartográficas do Cerrado para a data de

referência dos censos agropecuários de 1970, 1975, 1980, 1985, 1995 e 2007,

visando a representação cartográfica em consonância com os dados estatísticos.

Em particular, esta pesquisa buscou compreender o processo histórico

de inserção do Cerrado na produção pecuária para exportação, correlacionando-a

com os fatores naturais, econômicos e políticos associados à distribuição espacial

das pastagens cultivadas no Cerrado ao longo das quatro últimas décadas.

2.2 DADOS E ABORDAGENS

Um componente fundamental deste trabalho foi o mapeamento dos

dados censitários do IBGE, que norteou a interpretação da dinâmica espacial das

pastagens no Cerrado. A figura 2.1 sintetiza a estruturação dos dados e análises

realizados.

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Figura 2.1 – Fluxograma dos dados e etapas metodológicas seguidos neste trabalho

Desde 1920 o IBGE realiza censos das atividades rurais por meio da

aplicação de questionários aos proprietários. Até 1960 foram realizados os censos

agrícolas, que passaram a ser chamados de censos agropecuários a partir do

recenseamento de 1970. O censo agropecuário de 2006 utilizou metodologia de

coleta de dados diferente da dos anos anteriores, pois foi baseado em

questionário eletrônico e em refinamento após a coleta. Devido a essas

mudanças, os dados de 2006 e dos censos anteriores apresentam diferenças,

além de contar com onze anos de intervalo entre este e o censo de 1995, e não

cinco, como nos anteriores. Por esta razão, os mapas gerados correlacionam a

área dos municípios com os dados estatísticos, utilizando índices de área

municipal ocupada por pastagem e cabeças por mil hectares.

O mapeamento aqui apresentado distingue pastagens naturais e

cultivadas. O IBGE (2006) define como pastagem natural as áreas de pastos não

plantados, mesmo que fossem objetos de limpeza, gradeação ou outras

intervenções, utilizadas ou destinadas ao pastoreio dos animais. As pastagens

cultivadas são definidas como as áreas plantadas com espécies vegetais

destinadas ao pastoreio dos animais existentes no estabelecimento.

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Houve duas etapas de organização de dados do IBGE. Na primeira

etapa realizou-se a reconstituição dos limites municipais do bioma Cerrado para

os anos de 1970, 1975, 1980, 1985, 1990, 1995 e 2006. Na segunda etapa

organizaram-se os dados de pastagem e de produção bovina para estas datas,

tendo sido elaborados os mapas de pastagem, infraestrutura viária e fertilidade

dos solos.

A reconstituição cartográfica fez-se necessária em razão de nenhuma

das bases anteriores coincidirem com as datas de referência dos censos

agropecuários (tabela 1).

Tabela 1 – Datas de referência das bases cartográficas e dos censos agropecuários do IBGE

Bases cartográficas 1991 1994 1997 2001 2005 2007

Censos agropec. 1970 1975 1980 1985 1995 2006

Especificamente, foram realizados os seguintes procedimentos:

1) Aquisição das bases cartográficas municipais em formato vetorial (shapefile)

junto ao IBGE;

2) Obtenção do histórico territorial e político junto ao IBGE (data de criação,

emancipação, desmembramento, criação, anexação e extinção de distritos e

mudança de toponímia);

3) Organização das tabelas, em planilha eletrônica, para verificação das

mudanças ocorridas nos limites municipais nos períodos de 1970-1974, 1975,

1976-1980, 1981-1985, 1986-1995 e 1996-2006;

4) Reconstituição vetorial dos limites municipais, tendo como base cartográfica

inicial a divisão municipal de 2007 e como bases de apoio aquelas de 1991,

1994, 1997, 2001 e 2005.

Após a reconstituição, verificou-se que houve mudança em 376

municípios. A quantidade de municípios do Cerrado não se alterou entre os anos

de 1970, 1975 e 1980, quando totalizavam 1.008. Nos anos de 1985, 1995, 2006

e 2007 os municípios somavam 1.039, 1.052, 1.368 e 1.384, respectivamente.

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Contudo, não foi possível realizar a reconstituição de 19 municípios, tendo em

vista que os mesmos tiveram seus limites mudados a partir do desmembramento

de mais de dois municípios, não existindo bases cartográficas digitais de 1975 a

1990 a partir das quais se pudesse reconhecer esses limites. Além disso, o

documento básico para esse trabalho, Documentação Territorial do Brasil, do

IBGE, não apresenta os limites dos municípios criados ou desmembrados.

No processo de reconstituição optou-se por utilizar os limites integrais

dos municípios localizados nas zonas de transição entre o Cerrado e os outros

biomas, tendo em vista que ao eliminar parcialmente a área desses municípios o

dado estatístico atribuído a eles seria representado distorcidamente. Outra

possibilidade seria excluir totalmente os municípios da borda que tivessem menos

que a metade de sua área inserida no bioma, conforme realizado por Sano,

Barcelos e Bezerra (1999).

A divisão estadual atual foi utilizada em todos os mapas, ignorando-se

os desmembramentos estaduais, pois assim pode-se interpretar mais facilmente o

que ocorreu em cada um dos estados atuais. Da mesma forma, considerou-se

apenas a delimitação vigente do bioma Cerrado, disponibilizada pelo IBGE

(2006).

Na segunda etapa de organização dos dados do IBGE mapearam-se

os dados censitários de pastagem e de bovinos para o Cerrado a partir da base

cartográfica reconstituída. Por fim, os mapeamentos complementares foram

realizados a partir das bases cartográficas da malha rodoviária e de solos do

IBGE.

2.3 PANORAMA HISTÓRICO

Nas primeiras décadas do século XVIII, quando se iniciou a ocupação

da região atualmente conhecida como bioma Cerrado, a criação de bovinos em

pastagens naturais e a agricultura rudimentar ocorriam apenas para fornecer

alimentação à população que estava ocupada da única atividade estimulada pela

Coroa portuguesa: a extração de ouro. Com o declínio da mineração, após esse

período do ouro, a população que restou no Cerrado lançou mão da agropecuária

de subsistência e permaneceu isolada do litoral (DIAS, 2008). O gado vacum era

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o único produto exportável, em vista da falta de transporte, pois o gado

autotransportava-se. Assim, a consolidação da colonização do Cerrado ocorreu

com base na bovinocultura extensiva.

Com a chegada das ferrovias e a abertura de novas estradas nos

estados de Goiás e Mato Grosso (NUNES, 1984; BORGES, 1990), a partir da

primeira década do século XX, a pecuária pode aumentar sua produção,

destinada a atender sobretudo o crescente mercado paulista. A agricultura

também pode crescer, todavia limitada pela baixa fertilidade natural dos solos.

Em seguida, na década de 1930, a Marcha para o Oeste, criada pelo

governo Vargas (CHAUL, 2001), buscou integrar o país por meio da ocupação do

Planalto Central e da Amazônia, além de aumentar a produção agrícola visando o

sustento das indústrias do centro-sul do país e a absorção do excedente

populacional de outras regiões do país. Durante o governo de Juscelino

Kubitschek (1956-1961) houve maciço investimento em infraestrutura,

principalmente rodoviária, visando ao escoamento da produção do interior do

país. Os governos militares, a partir de 1964, incentivaram a ocupação das

regiões Centro-Oeste (Cerrado) e Norte (Amazônia). Na década de 1970, o

Estado produziu estudos que comprovavam o potencial agropecuário do Cerrado,

bem como técnicas para torná-lo mais produtivo (IPEA, 1976). Neste contexto, em

1974, criou-se o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), que previa a

ocupação produtiva do território brasileiro de acordo com o potencial de cada

área. Surge assim o Programa de Desenvolvimento dos Cerrados (Polocentro).

O Polocentro previu a ocupação de 3,7 milhões de hectares

distribuídos da seguinte forma: 1,8 milhões de hectares para lavouras, 1,2 milhões

para a pecuária e 700 mil hectares para reflorestamento (ALENCAR, 1975). Para

a intensificação da pecuária foram inseridas gramíneas exóticas das espécies

Panicum, Pennisetum, Andropogon e principalmente Brachiaria, substituindo

pastagens naturais ou mesmo a agricultura em alguns casos (MARTHA JÚNIOR;

VILELA, 2002). Essas novas espécies de pastagem possibilitaram a criação de

cinco a dez vezes mais animais por área que na criação com pastagem natural

(BROSSARD; BARCELLOS, 2005). Ainda que o Polocentro não tenha sido

executado em sua plenitude, o padrão técnico da agropecuária do Cerrado

começou a se transformar irreversivelmente, com a tecnologia mais avançada

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servindo de parâmetro para toda a produção. Assim, a quantidade de pastagens

cultivadas aumentou significativamente tanto nas áreas abrangidas pelo programa

quanto nas que não foram objeto de sua ação direta, já que durante os governos

militares os créditos agrícolas abaixo das taxas de juros de mercado e os

incentivos fiscais eram facilmente concedidos aos médios e grandes produtores

(SILVA, 1981). Esse programa, além do seu sucessor, o Programa de

Cooperação Nipo-brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer),

entre 1978 e 2001, transformou o Cerrado no bioma produtor de grande parte dos

alimentos e matérias-primas que atendem ao mercado interno e externo

(INOCÊNCIO, 2010).

Atualmente, o Brasil é o quarto país do mundo em área de pastagem e

o maior produtor comercial de bovinos (figuras 2.2 e 2.3) (FAO, 2012). O efetivo

bovino, por sua vez, sempre manteve crescimento mais acelerado que o da

pastagem, haja vista a intensificação das práticas de manejo e aumento da

produtividade, apesar do caráter ainda extensivo da criação, com lotação pouco

maior que uma cabeça por hectare. Por outro lado, a criação extensiva, baseada

em pastejo, aliada ao clima tropical, tem contribuído para a sanidade dos animais

no Brasil, já que o confinamento e a alimentação sintética aumentam o risco de

acometimento por doenças, como a encefalopatia espongiforme bovina,

conhecida como o mal da vaca louca, que se tornou epidemia nos rebanhos

europeus em 2003, fazendo com que o Brasil aumentasse suas exportações

(BARBOSA; SOUZA, 2007).

Quando se analisa a quantidade de pastagem em todo o Brasil e nas

regiões percebe-se que, embora a pecuária tenha apresentado rápido

crescimento, a área ocupada por pastagem tem diminuído desde o final da

década de 1980 (figura 2.4). As regiões Sudeste e Sul, tradicionais regiões de

pecuária, tem diminuído continuamente sua produção, ao passo que as regiões

Centro-Oeste e Norte, grosso modo o Cerrado e o “arco do desmatamento” da

Amazônia, tem encabeçado a pecuária do país (RIVERO et al., 2009). Sobretudo

na Amazônia, o crescimento da pecuária ainda segue os moldes tradicionais de

expansão horizontal, de baixa produtividade.

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Figura 2.2 – Evolução da área ocupada por pastagens permanentes (naturais e plantadas) no mundo, entre 1961 e 2009, e nos seis países com as maiores áreas

Fonte: FAO (2012)

Figura 2.3 – Evolução do rebanho bovino no mundo, entre 1961 e 2010, e nos seis principais países produtores

Fonte: FAO (2012)

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Figura 2.4 – Área ocupada por pastagens no Brasil e nas regiões brasileiras, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006

Em 2002, o Cerrado era o bioma mais ocupado por pastagens, seja em

área absoluta, ou em percentual por bioma (tabela 2), contribuindo com quase

metade de toda área de pastagem do país.

Tabela 2 – Área total e de pastagem dos biomas brasileiros segundo mapeamento do Probio em 2002.

Biomas Área total (ha) Área de pastagem

Área (ha) % do bioma

Amazônia 419.694.300 24.580.800 5,86

Cerrado 203.644.800 54.624.600 26,82

Mata Atlântica 111.018.200 29.560.700 26,63

Pantanal 15.035.500 1.651.700 10,99

Pampa * 17.649.600 9.673.500 54,80

Caatinga * 84.445.300 29.375.600 34,78

* Para estes biomas o mapeamento agrupou agricultura e pecuária em uma mesma classe. Fonte: IBGE (2006)

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2.4 PASTAGENS NO CERRADO

Conforme a figura 2.5, a área ocupada por pastagens naturais era

grande nos anos de 1970, 1975 e 1980, ocorrendo o paulatino declínio nos anos

de 1985, 1995 e 2006, quando as pastagens cultivadas passaram a se difundir no

bioma Cerrado (figura 2.6).

Figura 2.5 – Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens naturais, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006

Nota: nas legendas das figuras 5, 6 e 10, a categoria de menor valor destoa

da sequência de cores para se representar a “quase ausência” desses tipos

de pastagem nos municípios.

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Figura 2.6 – Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens cultivadas, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006

Desde meados da década de 1980 as pastagens totais começaram a

diminuir no Cerrado (figura 2.7). Quando comparadas as áreas ocupadas por

pastagens naturais e cultivadas, observa-se que até meados da década de 1990

houve intensa substituição de pastagem natural por cultivada. A mudança nas

curvas, entre 1995 e 2006, deve-se a dois motivos principais: 1) as pastagens

cultivadas passaram a competir com a agricultura, elevando o preço das terras e

fazendo com que a adoção de técnicas mais avançadas e a diminuição dos

pastos tornassem-se rentáveis; 2) o aumento das pastagens naturais relaciona-se

ao avanço da pecuária sobre áreas de fronteira e à metodologia do IBGE, que

considera pastagem natural apenas aquelas utilizadas para pastejo. Assim, as

fitofisionomias do Cerrado caracterizáveis como pastagem (campo limpo, cerrado

ralo), somente o são quando estiverem em uso produtivo, que tem aumentado em

função da ocupação de novas áreas.

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Figura 2.7 – Pastagem natural, cultivada e total no bioma Cerrado, segundo os censos agropecuários de 1970 a 2006

As figuras 2.5 e 2.6 mostram que a expansão das pastagens cultivadas

no Cerrado apresentou significativa variabilidade espacial, sendo intensa em

algumas áreas, média em outras e fraca ou tardia em certas porções (figura 2.8).

A expansão intensa de pastagens cultivadas ocorreu em apenas

alguns municípios durante a década de 1970. A partir da década de 1980, torna-

se mais clara a concentração espacial em duas zonas específicas:

a) Zona de expansão intensa 1: inclui o oeste do estado de São Paulo,

passando pelo Triângulo Mineiro e chegando ao centro-leste do estado do

Mato Grosso do Sul;

b) Zona de expansão intensa 2: compreende o centro-noroeste de Goiás.

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Figura 2.8 – Zonas de expansão das pastagens cultivadas no bioma Cerrado entre 1970 e 2006 Fonte: Os autores, a partir dos dados do IBGE (2006) e da ABIEC (2012)

A zona intensa 1 foi criada diretamente pelo mercado consumidor do

estado de São Paulo. Aí, a expansão das pastagens cultivadas ocorreu na

década de 1960, ocupando algumas antigas fazendas de café (SILVA, 1981;

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MONBEIG, 1984). Contudo, na década de 1970 a fronteira agropecuária

extrapolou os limites do estado e chegou ao Mato Grosso do Sul, ainda pouco

explorado, e à região do Triângulo Mineiro, que já era tradicional produtora de

bovinos. Toda essa expansão das pastagens na década de 1970 e 1980 se deu

em função da facilidade de escoamento da produção bovina para o maior

mercado consumidor do país, o próprio estado de São Paulo. Essa configuração

dura até o início da década de 1990, quando a retomada do crescimento

econômico nacional fez com que muitas áreas de pastagem cultivada cedessem

lugar às commodities, sobretudo cana, soja e milho, que, além de atender ao

mercado interno, passaram a ser exportadas. A favor dessa expansão da

agricultura esteve a relativa boa fertilidade natural dos solos da zona intensa 1

(figura 2.9).

Figura 2.9 – Fertilidade dos solos, polígonos de pastagens cultivadas (mapeados pelo Probio em 2002) e malha viária no bioma Cerrado Fonte: IBGE (2006); dados do Probio (SANO et al. 2007)

A zona intensa 2 tem como gene a capital do estado de Goiás, que

induziu a instalação de infraestrutura viária e se constituiu no mercado

consumidor inicial dessa produção pecuária, desde a década de 1930. A criação

de Brasília, no final da década de 1950, também contribuiu para o crescimento da

pecuária nessa zona, pois induziu a abertura de novas rodovias e ampliou o

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mercado consumidor. A partir da década de 1970 essa produção começa a se

deslocar para o centro-noroeste goiano por meio do prolongamento da GO-164,

que passou a ser conhecida como “Estrada do Boi” (BARREIRA, 1997). Desde a

década de 1980, Goiânia e Brasília tornam-se metrópoles e a exportação de

carne do estado de Goiás ampliou-se muito desde o final da década de 1990.

Essa zona tem perdido menos espaço para a agricultura do que a zona intensa 1,

já que está localizada em área de solo menos fértil (figura 2.8). Além disso, a

zona intensa 2 está na área central do bioma Cerrado, onde o regime climático é

mais regular que o das áreas de transição com outros biomas (SANO,

BARCELOS; BEZERRA, 1999), fazendo com que a pecuária dessa zona enfrente

menos estiagens prolongadas ou o excesso de chuvas.

Como visto, as zonas intensas 1 e 2 são áreas de ocupação mais

antiga e intimamente ligadas à proximidade de um mercado interno indutor desse

crescimento. Há, contudo, dois apontamentos necessários. A mesorregião Norte

de Minas Gerais apresentava grande percentual de pastagem cultivada em alguns

municípios na década de 1970, assim como as zonas intensas 1 e 2. No entanto,

a pecuária cedeu lugar à agricultura a partir da década de 1980. Uma das razões

é a influência do clima semiárido, que torna a fruticultura irrigada mais rentável

que a pecuária extensiva. A mesorregião Noroeste de Minas Gerais também

apresentou diminuição das pastagens, neste caso em função da produção de

commodities, sobretudo soja, milho e café (SANTOS; BARBIERI; CARVALHO,

2008). Um segundo caso específico é o recente crescimento das áreas de

pastagens no nordeste do estado de Mato Grosso até a região conhecida como

“bico do papagaio”, no estado do Tocantins. Pode-se ver que nessa área é mais

intenso o que acontece em quase todos os municípios da zona de transição entre

Cerrado e a Amazônia: os solos não são muito rentáveis à agricultura, mas

conseguem abrigar pastagens dadas ao pastoreio extensivo de bovinos.

Atualmente, a pecuária é considerada o principal vetor do desmatamento no

chamado “arco do desmatamento” da Amazônia (RIVERO et al., 2009).

A área de expansão média das pastagens cultivadas no bioma Cerrado

também se formou a partir da segunda metade da década de 1970. Grosso modo,

essa expansão significou a generalização das pastagens cultivadas no bioma

Cerrado, acompanhada do incremento da produção pecuária, visto que a maior

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parte dos solos do Cerrado é propícia às pastagens exóticas (REATTO;

MARTINS, 2005). Contudo, fatores como a infraestrutura viária e a proximidades

dos mercados consumidores modelaram a forma de ocupação do Cerrado pelas

pastagens, a exemplo do que Rodrigues e Miziara (2008) verificaram no estado

de Goiás. O principal exemplo disso foi o desenvolvimento da agropecuária ao

longo da rodovia BR-153, também conhecida como Belém-Brasília ou

Transbrasiliana. Tão logo foi implantada, há mais de 50 anos, essa rodovia

reconfigurou a rede urbana e produtiva às suas margens, fato muito visível no

estado do Tocantins, onde se pode ver a forte expansão das pastagens cultivadas

(figura 2.8).

Quanto ao papel da proximidade do mercado consumidor, pode-se ver

que essas áreas de expansão média das pastagens cultivadas são um

prolongamento dos efeitos que criaram as zonas intensas, pois o mesmo mercado

consumidor e, mais recentemente, a exportação deram vazão a essa produção.

Nesse sentido, as zonas de expansão média enfrentam, por um lado, maiores

distâncias dos mercados consumidores, mas, por outro lado, tem a seu favor

terras mais baratas, onde a intensificação tecnológica não é tão necessária

quanto nas zonas intensas, que estão em situação de competição com outros

usos da terra e necessitam manter alta produtividade (FERREIRA, 2009).

A expansão fraca ou tardia das pastagens ocorreu em seis zonas

isoladas entre si no Cerrado: o norte do Maranhão; o centro-norte do Mato

Grosso; a região “ma-pi-to-bá”, confluência dos estados do Maranhão, Piauí,

Tocantins e Bahia; o oeste da mesorregião do Extremo Oeste Baiano; o centro-

norte de Minas Gerais e o centro-sul do Tocantins. Essas seis zonas fracas tem

em comum a presença de solo arenoso, naturalmente pouco fértil, que atuou

como empecilho ao desenvolvimento da pastagem plantada. Somente se aí a

pecuária fosse intensiva seria possível investir o mesmo que a agricultura em

tecnologia de tratamento do solo. Todavia, o pecuarista correria grande risco de

não obter retorno desse investimento, pois teria que competir com o produto

advindo de terras que requerem menor investimento. Ora, tratar o solo para

criação de gado significa corrigir acidez e fertilizar quase um hectare para cada

animal, no sistema de criação extensiva, enquanto o retorno financeiro de um

hectare plantado com commodities é muito maior.

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O norte do Maranhão é composto por solos extremamente pobres,

facilmente erodidos pelas trilhas do gado, de modo que aí a criação de bovinos

encontra sérias dificuldades (figura 2.8). O centro-norte do Mato Grosso também

é formado por solos arenosos. A esta dificuldade se soma a distância do mercado

consumidor e a condição das vias. Assim, a agricultura, baseada na

transformação química do solo, é a atividade mais comum. A região ma-pi-to-bá

caracteriza-se por relevo acidentado, intercalado com chapadões de baixa

fertilidade natural. Historicamente, essa região teve dificuldade de ocupação

produtiva devido à falta de infraestrutura e à distância do litoral nordestino, onde

está a maior parte da população. Nas últimas duas décadas a agricultura

moderna tem ocupado seus chapadões, de modo que a pastagem artificial não

consegue competir, pois precisaria do mesmo investimento em correção de

acidez e fertilização do solo que a agricultura tem demandado.

O oeste da mesorregião do Extremo Oeste Baiano e seu

prolongamento pelo noroeste de Minas Gerais está assentado sobre cobertura

sedimentar rica em areia, por isso pouco fértil (figura 2.8). Até meados da década

de 1970 essa área havia sido pouco explorada produtivamente, em vista da

restrição viária e da baixa fertilidade natural dos solos (BRANNSTROM, 2009;

SILVA et al., 2011). A partir do final dessa década, essas terras baratas começam

a receber calcário e fertilizantes, tornando-se numa das áreas mais produtivas e

de maior produtividade do bioma Cerrado (MENDONÇA, 2006). O predomínio de

commodities (soja, algodão e milho) fez com que a presença de pastagens nessa

área nunca fosse muito expressiva.

O centro-norte de Minas Gerais possui planossolos pouco férteis e

relevo acidentado, portanto impróprio para as pastagens. O centro-sul do

Tocantins possui argissolos, plintossolos e planossolos, todos também pouco

férteis.

Como visto, as zonas de expansão fraca ou tardia de pastagens estão

fortemente ligadas à baixa qualidade dos solos, enquanto as zonas de expansão

média e intensa contam com solos melhores, sobretudo os Latossolos, que

ocupam quase metade de todo o Cerrado (BROSSARD; BARCELLOS, 2005).

Assim, a divisa entre os estados de Goiás e do Mato Grosso pelo Rio Araguaia é

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uma separação natural entre tipos de solo (figura 2.8), que deu origem a

diferentes padrões de expansão das pastagens cultivadas.

A figura 2.10 sugere grande correlação entre a expansão das

pastagens cultivadas e o aumento do efetivo bovino, o que seria esperado.

Contudo, é importante assinalar que a concentração da produção bovina nas

duas zonas intensas já citadas indica também que o padrão técnico produtivo

dessas áreas é mais avançado que aquele das zonas de expansão média das

pastagens. Isto por que essa produção, sobretudo a mais próxima do estado de

São Paulo, precisa competir com a produção agrícola. Daí a necessidade de se

aumentar a produtividade (cabeças por hectare) por meio do confinamento e

melhoramento genético de forrageiras e de animais (BARCELLOS, 1996). O

resultado dessas práticas para o setor é que as zonas de expansão média e fraca

ou tardia de pastagens cultivadas e de bovinos, ao investirem menos em

tecnologia, operam com produtividade muito abaixo daquela das zonas intensas,

de modo que aí as áreas de pastagem degradada, muitas delas naturais, são

relativamente maiores do que onde se emprega mais capital e tecnologia

(MARTHA JÚNIOR; VILELA, 2002). A densidade viária (figura 2.9) mantém

correlação com a lotação bovina (figura 2.10), com exceção do Mato Grosso do

Sul, que apresentou grande crescimento da pecuária a partir da década de 1980 e

ainda não conta com muitas vias pavimentadas.

A par de tudo isso, a relação entre frigoríficos e produtores tem sofrido

transformações importantes na última década (BRASIL, 2007; SCHLESINGER et

al., 2010). Se antes os produtores concorriam à venda entre si, hoje muitos

frigoríficos incorporam ou influenciam a fase de acabamento, além do

beneficiamento, agregando mais valor ao produto final e retendo a maior parte do

lucro da cadeia produtiva. Assim, o preço de compra dos bovinos mantém-se

abaixo do mínimo necessário para a manutenção do produtor que está a uma

distância maior dos frigoríficos e do mercado consumidor e que produz com

pastagens, insumos e genética de qualidade inferior. Essas condições atingem

mais fortemente a pequena produção e faz com que sua participação no mercado

tenda a diminuir.

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Figura 2.10 – Mapas da ocupação por bovinos no bioma Cerrado, segundo os censos agropecuários de 1975 a 2006 e de pastagens degradadas em 2006

Quanto à incorporação de novas áreas à pecuária, observa-se que até

a década de 1980 a área de pastagem cultivada no bioma Cerrado apresentou

taxa de expansão maior que a do efetivo bovino nos estados de Goiás, Mato

Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, que foram os estados onde a frente

de expansão da pecuária se deu mais intensamente (figura 2.11). O estado de

São Paulo, de onde essa frente se originou, manteve-se praticamente estável em

quantidade de animais e em área de pastagem cultivada, assim como os estados

do Maranhão e da Bahia, estes por conta da baixa qualidade do solo e pelos

condicionantes mencionados anteriormente. Note-se que as mudanças bruscas

entre 1995 e 2006 devem-se à mudança de metodologia do recenseamento, mas

também à retomada do crescimento econômico brasileiro e à intensificação do

uso das pastagens, sobretudo em áreas de ocupação antiga, o que torna a

análise desse último período complexa. Todavia, fica claro que entre os dois

últimos recenseamentos o efetivo bovino aumentou em todos os estados, exceto

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em São Paulo, e que a área ocupada diminuiu ou apresentou crescimento menor

que o do efetivo bovino, sugerindo que a partir de meados da década de 1990 o

perfil da pecuária no bioma Cerrado começou a se transformar, tendendo à

intensificação. Nesse sentido, os estados de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso

do Sul despontaram na década de 2000 em crescimento acelerado do efetivo

bovino, o que fez da Região Centro-Oeste a maior produtora de carne bovina,

ainda que a área de pastagem tenha diminuído (CEZAR et al., 2005).

Figura 2.11 – Evolução da área de pastagem cultivada (ha) e do efetivo bovino por estados do Cerrado (exceto PI, PR e DF), segundo os censos agropecuários de 1975 a 2006

Nota: Os estados do Piauí e Paraná e o Distrito Federal foram excluídos por conta da baixa participação na agropecuária em áreas de Cerrado.

Hoje, uma das maiores preocupações são as pastagens degradadas

no Cerrado, que no censo agropecuário de 2006 somavam 5.109.553 hectares,

cerca de 7% do total. Essa degradação está relacionada à perda de qualidade

física, química e biológica, que normalmente ocorre após cinco anos de pastejo

(OLIVEIRA et al., 2004; BROSSARD; BARCELLOS, 2005).

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A figura 2.10 mostra que há relativamente pouca pastagem degradada

nas zonas intensas 1 e 2 apresentadas anteriormente. Assim, as áreas de

produção bovina menos intensa contam com pastagens de menor qualidade, com

parte considerável degradada. É certo que também muitas das propriedades com

pastagem degradada encontram-se improdutivas pela impossibilidade de competir

com a produção moderna, sobretudo quando localizadas em regiões de solos

pobres, já que a degradação das pastagens está intimamente ligada à qualidade

dos solos. Os solos arenosos, ainda que não explorados intensamente,

degradam-se com grande facilidade. Um exemplo da importância do fator solo na

atividade pecuária é a presença de pastagens degradas no centro-sul do estado

do Tocantins, que, apesar de contar com a proximidade da BR-153, não pode

adensar a pecuária. Como se vê nos mapas de pastagem (figuras 2.6 e 2.7) e nos

mapas de lotação bovina e de pastagem degradada (figura 2.10), a alta

densidade de bovinos se deu em solos mais férteis, menos arenosos, que

competem com a agricultura e que estão mais próximos dos mercados

consumidores. Tudo isso trouxe a necessidade e a possibilidade de se conservar

melhor as pastagens, pois, ao contrário da produção situada em zona de fronteira,

nas áreas consolidadas é lucrativo investir no melhoramento das pastagens e ter

em troca menores gastos com transporte, facilidade de comercialização dos

produtos, mão-de-obra abundante, entre outras vantagens.

Outro tema relevante relacionado à expansão da agropecuária é a

perda de biodiversidade no bioma Cerrado enquanto há pastagens degradadas e

improdutivas. Dentre as possibilidades de novos usos, tem sido enfatizado o

potencial de desenvolvimento da agricultura em áreas atualmente cobertas por

esse tipo de pastagem (BROSSARD; BARCELLOS, 2005). Contudo, propostas

como a de expansão da cana-de-açúcar em áreas de pastagens degradadas não

encontra grande respaldo, pois as áreas mais duramente afetadas pela

degradação estão em localizações que diminuiriam sobremaneira a rentabilidade

da atividade sucroalcooleira. Historicamente, a cana tem disputado espaço com a

soja, milho, algodão e com a bovinocultura, que já ocupam as áreas mais

produtivas e dotadas de melhor infraestrutura (RIBEIRO, 2010; SILVA; MIZIARA,

2011).

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2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As pastagens cultivadas no bioma Cerrado encontraram fatores de

expansão e fatores de limitação. A favor da expansão estiveram o incentivo

estatal, o baixo preço das terras, a implantação de infraestrutura viária e o

crescimento do mercado da carne bovina. Os fatores de limitação, por sua vez,

foram a baixa fertilidade natural de grande parte dos solos do Cerrado, a

competição da pecuária com a agricultura e a distância dos grandes mercados

consumidores.

Os programas governamentais de ocupação do interior do país,

embora não atingissem diretamente todo o território, implantaram um novo padrão

técnico de produção, fazendo com que a pequena produção familiar, bem como a

grande produção rudimentar de bovinos, cedessem lugar à produção de alto

padrão técnico voltado para o mercado interno e, mais recentemente, para a

exportação. A urbanização do país foi, assim, produzida e produtora dessa

transformação, pois a mesma população dispensada do campo por esse novo

modo de produzir tornou-se consumidora urbana dos produtos agropecuários.

Grosso modo, a abertura do mercado da carne bovina pode ser

dividido em dois momentos. Antes da década de 1990 a expansão desse

mercado esteve circunscrita ao próprio país. A política de internacionalização da

economia nacional, a partir do governo Collor, foi consolidada com a estabilização

do Real frente ao dólar, fazendo com que, a partir da segunda metade da década

de 1990, o país aumentasse paulatinamente a exportação de carne bovina.

Portanto, foi o mercado interno, e só depois o externo, que consolidaram essa

produção.

As duas zonas de expansão intensa das pastagens estiveram

sustentadas em dois pontos principais: a proximidade de mercado consumidor

urbano e a disponibilidade de solos que se prestaram à pecuária extensiva sem

se desgastar rapidamente. Além disso, a presença de infraestrutura viária

razoável barateou o transporte. Por outro lado, a competição com a agricultura,

embora, por um lado, onerasse a produção dessas zonas, obrigava a adoção de

padrões técnicos mais elevados, que acabaram adequando a produção dessas

zonas para a exportação.

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A formação das zonas de expansão média e fraca ou moderada

baseou-se sobretudo no baixo preço das terras. Apesar dessa vantagem, nessas

zonas a fertilidade de boa parte dos solos é menor que a das zonas intensas e o

mercado consumidor está mais distante, aumentando o gasto com transporte.

Essas condições resultaram em maior ocorrência de degradação das pastagens e

em baixa produtividade. Assim, a competição com a produção das zonas intensas

impede que haja maior investimento em tecnologia de produção e em

melhoramento e recuperação de pastagens.

O Cerrado é o bioma que mais sofre pressão ambiental da

agropecuária brasileira. Seja pelas condições naturais e sociais favoráveis, seja

pelo imaginário a ele associado. Sua identificação como “celeiro do mundo” não

foi acompanhada da preocupação ambiental, que hoje encontra dificuldade em

ser considerada no processo produtivo, que tem incorporado áreas cada vez

maiores.

A recuperação de pastagens degradadas, apesar de ainda não contar

com forte apoio governamental, foi apresentada pelo governo brasileiro na 15ª

Conferência das Partes (Cop 15) como um dos meios de se atingir as metas de

redução de emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), que incluem a diminuição

do ritmo de desmatamento da Amazônia e do Cerrado (BRASIL, 2010). Uma das

propostas de recuperação de pastagens degradadas inclui a integração lavoura-

pecuária. A política internacional de rastreamento dos produtos bovinos, por meio

da certificação de que a produção atende aos parâmetros de sustentabilidade,

apesar de ainda ser proposta embrionária, pode contribuir para a adoção de

políticas de manutenção e recuperação de pastagens degradadas.

O uso de dados censitários para o estudo do processo de ocupação do

Cerrado por pastagens mostrou-se satisfatório, pois as imagens de satélite

anteriores à segunda metade da década de 1985 não possuem resolução

espacial compatível com a diferenciação entre pastagem, agricultura e outras

categorias de uso do solo. Mesmo imagens recentes de alta e altíssima resolução

encontram dificuldades para a realização do monitoramento de pastagens em

virtude da variabilidade de sua resposta espectral. No Cerrado, a pastagem se

confunde facilmente com fitofisionomias que possuem vegetação herbácea

natural e com alguns cultivos agrícolas. O uso de geotecnologias no censo

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agropecuário de 2006 e nos próximos irá possibilitar estudos mais precisos.

Contudo, os dados censitários e satelitários disponíveis já possibilitam bons

estudos sobre a transformação do espaço brasileiro pela agropecuária, que inclui

a urbanização, a industrialização e toda a transformação socioeconômica das

últimas décadas. No presente trabalho, além do esforço interpretativo, avançou-se

na técnica de mapeamento por meio da reconstituição dos limites municipais e

mostrou-se que as bases cartográficas históricas merecem maior atenção do

IBGE, tendo em vista que cada vez mais os estudos históricos, baseados nos

próprios dados dessa instituição, tem demandado mapeamentos, hoje facilmente

executados, desde que se tenha base cartográfica compatível com os dados. Um

exemplo é trabalho de Leite (2008) e Leite et al. (2012), que reconstituíram os

limites municipais do Brasil entre 1940 e 1995, seguindo metodologia própria, com

a finalidade de mapear as emissões históricas de GEEs.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação

em Geografia do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais da Universidade Federal

de Goiás (Iesa / UFG), se insere entre as várias iniciativas do Laboratório de

Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig / Iesa / UFG) voltadas

ao monitoramento sistemático e gestão territorial do bioma Cerrado. Os autores

agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(CNPq) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível

Superior (Capes) pelas bolsas concedidas (doutorado e produtividade em

pesquisa).

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3 A EXPANSÃO DA FRONTEIRA AGRÍCOLA E A MUDANÇA NA COBERTURA E USO DA TERRA NO CENTRO-SUL DE GOIÁS ENTRE 1975 E 2010

The expansion of the agricultural frontier and land-cover and land-use changes in central-south portion of the state of Goiás from 1975 to 2010

RESUMO

Desde a década de 1970 o Cerrado experimentou o rápido crescimento de sua produção agropecuária, fazendo com que a fronteira agrícola moderna avançasse sobre zonas de fronteira agrícola tradicional, onde a agropecuária já se encontrava desenvolvida, apesar das limitações. Neste artigo são estudadas as mudanças na cobertura e uso da terra na região centro-sul do estado de Goiás (cena Landsat 222/72) entre 1975 e 2010, por meio da classificação da imagem em classes de vegetação, pastagem e agricultura a cada dois anos. Recorreram-se também aos dados censitários para análise da evolução da produção agrícola e das pastagens cultivadas. Os resultados demonstraram a rápida expansão da agricultura e da pecuária na cena, com deslocamento da pecuária para onde os solos são menos férteis e o relevo é mais acidentado. Verificou-se, ainda, que mesmo dentro desses dois grupos houve concorrência entre culturas, com as pastagens cultivadas substituindo as naturais e algumas culturas agrícolas avançando sobre outras, a exemplo da queda na produção de arroz e feijão em face do crescimento da soja, na década de 1970 e 1980, seguido do aumento na produção de cana-de-açúcar, na década de 1990. Palavras-chave: Cerrado. Fronteira agrícola. Mudança na cobertura e uso da terra. Sensoriamento Remoto.

ABSTRACT

Dating back to the early 70´s, the Cerrado went through a rapid growth in its agricultural production, which expanded over traditional agriculture frontiers. This paper assess land-cover and land-use changes in the central-south portion of the state of Goiás (Landsat scene 222/72) between 1975 and 2010, via analysis of census data and image classification into remnant vegetation, pasture, and crop areas, every other year. Our results confirm an accelerated agriculture expansion, which caused cattle ranching to be displaced to areas of lower soil fertility and hilly terrains. Interestingly, even within these two major land-use domains, a competition within classes could be observed, with cultivated pastures replacing native grasses and substitution of traditional crops, mainly rice and beans, by soy, in the 70´s and 80´s, and sugarcane in the 90´s. Key-words: Cerrado. Agricultural frontier. Land-cover and land-use changes. Agricultural Remote Sensing.

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3.1 INTRODUÇÃO

Em todo o mundo, as mudanças na cobertura e uso da terra tem sido

estudadas sistematicamente nas três últimas décadas em função da importância

que a questão ambiental tem alcançado nos âmbitos econômico, político e social

(DE JONG et al., 2011). Mais recentemente, o aquecimento global serviu como

alerta acerca da necessidade de gerenciar melhor o uso dos recursos naturais, ao

passo que mudanças locais na qualidade da água e do solo tornaram evidente o

risco de perdas econômicas resultantes de práticas inadequadas na agricultura,

na criação de animais e na indústria (IPCC, 2001; NOBRE et al., 2007). Assim, o

estudo das mudanças na cobertura e uso da terra por meio do sensoriamento

remoto tem sido uma importante ferramenta para monitoramento da

transformação do padrão produtivo, auxiliando sobretudo no diagnóstico e nas

tomadas de decisão.

Antes dos estudos de mudança na cobertura e uso da terra, outros

estudos se aproximavam dessa ideia. O avanço dos colonizadores ingleses sobre

o meio oeste dos Estados Unidos foi a referência de Turner (1920) para o

conceito de fronteira, que se tornou parâmetro para os estudos de mesma

natureza em outros países. No Brasil, após o final da Segunda Guerra Mundial,

surgiram estudos acerca das possibilidades de ocupação do território brasileiro

por imigrantes de países devastados pela guerra, que começavam a chegar ao

país. Em especial, Neiva (1949) identificou uma fronteira demográfica no Brasil,

que começava não muito longe do litoral e atingia a floresta amazônica, e uma

fronteira econômica, restrita ao sudeste do país e a alguns pontos ao longo da

costa. Nesses termos, pela primeira vez o conceito de fronteira era aplicado ao

Brasil, ainda que diversos estudiosos estivessem preocupados com a ocupação

do espaço brasileiro, a exemplo de Caio Prado Júnior, Pierre Mombeig e Leo

Waibel (1955), que fizeram o primeiro estudo sobre as zonas pioneiras no Brasil,

desde o século XVIII. Por outra vertente, o contraste dos modos de vida presentes

nas fronteiras foram objetos de profunda reflexão de Sérgio Buarque de Holanda

em Monções, de 1945, e Caminhos e fronteira, de 1957, e também de Martins

(2009), que desde o final da década de 1960 dedica-se a essa matéria.

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A baixa fertilidade natural do Cerrado e a falta de meios de transporte

eficientes explicam, em parte, sua baixa densidade demográfica até meados do

Século XX. No estudo de Waibel (1955) percebe-se que onde primeiro se

instalaram fronteiras agrícolas no Cerrado foi nas proximidades dos municípios

paulistas de Limeira e de Ribeirão Preto/São Carlos, com a cultura cafeeira

expandindo sobre solos de baixa fertilidade, numa localização que reflete a

dificuldade de transporte, pois o oeste de São Paulo, que estava mais longe, tem

alta fertilidade natural. Além dessa zona de fronteira, havia, no centro do atual

estado de Goiás, uma área de solos basálticos de média/alta fertilidade,

conhecida como “Mato Grosso de Goiás”, ao norte do município de Goiânia, que

se tornou na década de 1940 (ESTEVAM, 1998) a fronteira agrícola mais

longínqua do sertão brasileiro, apoiada pelo Estado, com a criação da Colônia

Agrícola Nacional de Goiás (Cang) em 1941. Dessa região em direção ao sul de

Goiás se formou o que se pode chamar de uma fronteira agrícola tradicional, ou

seja, uma ocupação da terra baseada na propriedade privada e na produção

agropecuária tradicional, desprovida de correção de acidez, fertilizantes e

máquinas, e que enfrentava dificuldades com transportes e comunicações. Após

meados da década de 1970 difundiram-se rapidamente a correção da acidez e

fertilização dos solos e o uso de máquinas no cultivo de produtos primários para

exportação, chamados commodities, iniciando o que se pode chamar de fronteira

agrícola moderna. Percebe-se que ao longo da expansão dessa segunda fronteira

agrícola houve grande concorrência entre usos, não só entre pecuária e

agricultura, mas também entre culturas, a exemplo do arroz, que era abundante

inicialmente, e da soja e da cana-de-açúcar, que foram as culturas em expansão,

uma após a outra.

Para se entender o avanço da fronteira agrícola sobre o Cerrado há

que se considerarem duas especificidades: a baixa fertilidade natural e a

modernização da agropecuária. A primeira foi, por muito tempo, o maior

impedimento para a consolidação da fronteira demográfica. A segunda não só

possibilitou o avanço da agropecuária como rapidamente tornou obsoleta as

atividades rurais tradicionais. Assim, da mesma forma que população indígena

não pode impedir a ocupação das terras pelos brancos, também o pioneiro

tradicional não suportou a chegada de um sistema produtivo que estava fora de

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sua cogitação. Essa nova produção estava ligada ao mercado externo, “criava”

terra boa de solos quase estéreis, usava máquinas e podia pagar bem pelas

fazendas ou simplesmente expulsar antigos posseiros. Dessa forma, pode-se

considerar que até a década de 1960 havia em parte do Cerrado um estágio

embrionário da fronteira agrícola moderna. No caso estudado, com a chegada da

ferrovia ao Cerrado, na segunda década do Século XX, a criação de Goiânia na

década de 1930 e de Brasília na de 1950, o afluxo demográfico era considerável e

a produção agropecuária se expandia, apesar das condições naturais

desfavoráveis. Por isso Waibel (1955) enxergou no Mato Grosso de Goiás uma

zona pioneira, pois a dinamização causada pela produção dessa zona desde a

década de 1940 era semelhante à de outras zonas no Brasil, que também não

contavam com a alta tecnologia. O novo modo de produzir, então, “recomeçou”

essa história, reorganizando econômica, tecnológica e politicamente a produção

brasileira, especialmente a do Cerrado.

Nesses termos, a rápida urbanização pode ser entendida como parte

desse processo de reestruturação produtiva, que gerou uma nova realidade no

campo, em que boa parte dos produtores são recém-chegados ao Cerrado,

sobretudo do sudeste e sul do país, e em que quase todos os moradores das

cidades são ex-produtores rurais tradicionais ou migrantes desse mesmo matiz

social e seus descendentes. As cidades passam a ser o suporte dessa produção

agropecuária, que chega a ser mais moderna que as próprias cidades. Por um

lado, a produção mecanizada fez com que a agricultura não empregasse tanta

mão-de-obra como o de costume, retirando dessa atividade o antigo poder de

transformar socialmente o espaço, já que não necessita de uma rede urbana

adjacente para abrigar os numerosos trabalhadores, e isto era o que se via

quando se conceituou fronteira: a intensa vida urbano-rural. Por outro lado, a

pecuária, também incorporando a alta tecnologia em sua produção, aliando-se à

indústria numa cadeia e competindo por localização com a agricultura, consegue

transformar a paisagem quase como a esta, sobretudo quando localizada próximo

aos grandes mercados consumidores.

Mesmo dentro da própria estrutura produtiva moderna há ainda

disputas por localizações, que tem como base o aumento de demanda de certo

produto, que, por isso, invade o espaço de outros. Isto levou Miziara (2000) a

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entender que o fator econômico deve ser levado em conta na dinâmica produtiva

atual, pois ele pode causar esse avanço da fronteira sobre ela mesma, numa

renovação produtiva constante decorrente da variação da demanda e

rentabilidade dos produtos agropecuários. Para isso o autor recorre aos conceitos

de renda diferencial I e II de Marx, demonstrando que é a intensificação da

inversão de capital por unidade de área, ou seja, a renda diferencial II, que

determina as mudanças de localização dos produtos agropecuários no Cerrado. O

recente avanço da cana-de-açúcar sobre áreas já ocupadas por outras culturas é

um claro exemplo disso.

Na área aqui estudada pode-se ver, ao longo do tempo, diversas forças

conformadoras do Cerrado: o Estado, as transformações demográficas e a

tecnologia. O espaço mudou e as imagens de satélite possibilitaram o

mapeamento das sucessões de uso. Todavia interpretar em que medida cada

elemento participou desse resultado é um grande desafio. Especificamente,

busca-se aqui contribuir para a compreensão do processo de ocupação moderna

do Cerrado a partir de uma área onde a fronteira agrícola já se consolidou, bem

como observar o alcance e o limite do conceito de fronteira agrícola para essa

realidade.

3.2 ÁREA DE ESTUDO

A referência espacial para este estudo corresponde à cena Landsat –

TM 222/72, haja vista o intuito de se observar as mudanças na cobertura e uso da

terra em uma área de ocupação antiga do Cerrado. Por esta passaram as

estradas abertas por paulistas em busca de ouro, instalaram-se fazendas de

produção tradicional até o terceiro quartel do século XX e de aí em diante foi uma

das áreas de expressiva tecnificação da produção agropecuária (TEIXEIRA

NETO, 2001; ESTEVAM, 1998; NUNES, 1984). Ademais, as nuances de

fertilidade e de relevo na mesma cena determinaram, em parte, a competição

entre pecuária e agricultura pela melhor localização e a consequente migração de

uso. A figura 3.1 mostra que em 2002 a cena 222/72 possuía pouca presença de

vegetação remanescente, indicando que aí a ocupação já se encontra em estágio

avançado de consolidação.

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Figura 3.1 – Localização da área de estudo, conforme os limites estaduais, e em relação ao mapa de cobertura e uso da terra (Probio) para a totalidade do bioma Cerrado em 2002.

3.3 MATERIAIS E MÉTODOS2

Foram utilizadas imagens do satélite Landsat devido à sua boa

resolução espacial, ao longo do período monitorado continuamente e à gratuidade

de sua aquisição. Devido ao recorte temporal (1975 a 2010) foi necessário utilizar

imagens dos três sensores da série Landsat: MSS (80 m), TM (30 m) e ETM+ (30

m). As cenas de cada ano foram escolhidas entre os meses de junho a setembro,

tendo em vista ser este o período de menor ocorrência de nuvens no Cerrado.

2 Uma versão mais abrangente desta metodologia pode ser consultada no apêndice A e em Silva

et al. (2013)

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Para o período de 1975 a 1981 foi necessário formar mosaicos com

quatro cenas do sensor MSS para cobrir a área equivalente à de uma cena do

sensor TM, uma vez que as órbitas-pontos destes sensores são diferentes.

Devido à variação na posição das imagens TM, foi feito um recorte a partir da

região coincidente em todos os anos, reduzindo a área da cena de 32.400 km2

para 25.600 km2 (também foi utilizado para as cenas MSS). De 1982 a 1985 não

houve imagens disponíveis. Após esse período foram obtidas boas imagens,

também com intervalo de dois anos. O quadro 1 apresenta um resumo das cenas

utilizadas.

Quadro 1 – Cenas dos sensores MSS, ETM+ e TM dos satélites da série Landsat utilizadas neste estudo

Período Cenas por sensor

MSS ETM+ TM

1975 - 1981 16

1986 - 2000 8

2002 1

2004 - 2010 4

Total 29

O registro das imagens foi realizado através do processo imagem com

imagem a partir do mosaico GeoCover S23-10 2000, adquiridas junto ao site da

National Aeronautics and Space Administration (Nasa)

(https://zulu.ssc.nasa.gov/mrsid/). O erro médio admitido foi de 0,6 pixels.

O processo de classificação de imagens foi supervisionado, através

dos procedimentos de segmentação, que fragmentam uma região em unidades

homogêneas, considerando características como o nível de cinza dos pixels e a

textura, seguido do uso do algoritmo de agrupamento Bhattacharya (Moreira,

2011). Os parâmetros usados para a segmentação foram: similaridade de 35 % e

área mínima de 20 pixels, enquanto que para a classificação utilizaram-se 15

temas e 25 interações.

Após o processo de segmentação, foram inspecionadas as

amostragens para se realizar a classificação da imagem. Para se obter boa

separação dos elementos presentes nas imagens foi necessário a criação de

várias classes. Para a vegetação criaram-se as classes cerrado denso_1, cerrado

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denso_2, cerrado_ralo1, cerrado_ralo2, etc. O mesmo ocorreu com a agricultura,

como pode ser verificada na letra “b” da figura 3.2, pois também houve várias

respostas espectrais.

a) imagem não classificada (RGB 543) b) imagem classificada

Figura 3.2 – Exemplar de imagem antes e após o processo de

classificação

Após a classificação das imagens, os dados foram transformados em

vetores. Esses vetores, que são formados por vários polígonos, passaram por

uma nova etapa de inspeção visual, polígono a polígono. Assim, as classes foram

reorganizadas e o dado final foi composto por cinco classes, sendo elas

vegetação, agricultura, pastagem, mancha urbana e massa de água. Com esse

refinamento chegou-se a escala aproximada 1/100.000.

3.4 MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA NA CENA 222/72

A virada do século XIX para o XX marcou a instituição do acesso à

terra pela compra, sobretudo no sudoeste e sul de Goiás (AGUIAR, 2003).

Todavia, as propriedades eram muito grandes e o preço da terra era baixo, em

função da alta disponibilidade de terras em face da fraca demanda e da limitada

disponibilidade de capital. Assim, as primeiras décadas do século XX viram a

lenta consolidação do mercado de terras, que é a principal característica da frente

pioneira (MARTINS, 2009). Então, ocorrem algumas mudanças estruturais que

começam a implantar uma nova lógica produtiva, que reconfigura a apropriação

do espaço. A extensão da ferrovia até Goiás passou a conectar diretamente esse

espaço ao maior mercado consumidor nacional, com possibilidade de se acessar

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também o mercado internacional (BORGES, 1990). Da ferrovia começaram a

partir muitas e longas estradas (NUNES, 1984), que aos poucos foram tornando

possível o aumento da produção agropecuária.

É de se pensar que, nesses moldes, as décadas de 1930 a 1960 foram

um tempo em que já estava consolidado o valor de troca da terra característico da

produção capitalista, ao passo que a demanda nacional e internacional por

produtos agropecuários estava em ascensão. Dessa forma, o que aconteceu na

década de 1970 pode ser visto como um recomeço do processo de ocupação

produtiva, agora baseado na alta tecnologia.

Em decorrência do cenário internacional para o mercado de

commodities agropecuárias, da disponibilidade de terras e de capitais no Brasil e

do avanço nos setores de maquinaria, na década de 1970, a modernização da

agropecuária chegou a Goiás e à grande parte do Cerrado (RIBEIRO et al., 2008),

contando com forte apoio governamental. Dentre os programas federais atuantes

na área em estudo dois foram muito importantes. O Programa de

Desenvolvimento dos Cerrados (Polocentro), entre 1974 e 1979, promoveu

pesquisas, assistência técnica, crédito rural orientado e apoio à infraestrutura

(eletrificação rural, estradas vicinais e armazenagem) (ALENCAR, 1975). Esse

programa incluiu projetos em 16 dos 42 municípios da cena estudada (último

mapa da figura 3.3). Por sua vez, o Programa de Cooperação Nipo-brasileira para

o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer), atuando num raio de 600 km da

cena, executou ações similares aos do Polocentro, entre 1980 e 1990, nos

projetos Prodecer I e Prodecer II piloto, e ainda outras num raio de 1.200, entre

1985 e 2001, com os projetos Prodecer II expansão e Prodecer III piloto

(INOCÊNCIO, 2010; PIRES, 2000). Mesmo não agindo diretamente em todos os

municípios e nem em todos os empreendimentos rurais nos municípios, esses

programas instalaram uma lógica produtiva que homogeneizou a produção, pois

os métodos e os produtos tradicionais perderam sua rentabilidade em face do

novo modelo produtivo. O resultado foi, por um lado, o direcionamento da maior

parte da produção para o mercado de commodities, e, por outro, a diminuição

paulatina da produção tradicional e a migração de trabalhadores para as cidades

(IBASE, 1986).

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Figura 3.3 – Evolução espaço-temporal da cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 222/72, localizada sobre a região centro-sul do estado de Goiás. Fontes: Inpe e Nasa (imagens), Ibge (base cartográfica, censitária e classificação de solos e declividade)

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Apoiando esses programas federais estava a Empresa Brasileira de

Pesquisa Agropecuária (Embrapa), criada em 1973. Também em Goiás foi criada

a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Goiás

(Emater), em 1975, com a finalidade de conceder crédito agrícola e treinamento

aos produtores no uso dos novos insumos e técnicas de produção. Outro

importante indutor da modernização produtiva de Goiás foi a atuação do Fundo

Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste (FCO), criado em 1989

juntamente com outros fundos similares para as Regiões Norte e Nordeste, com

atuação no financiamento de projetos industriais e agropecuários. De modo

similar, no estado de Goiás foram instituídos dois programas consecutivos de

incentivo fiscal, o Fundo de Participação e Fomento à Industrialização do Estado

de Goiás (Fomentar), que funcionou entre 1984 e 1999, e o Programa de

Desenvolvimento Industrial de Goiás (Produzir), desde 2000.

O conjunto dessas empresas e fontes de financiamento deu suporte à

agropecuária em Goiás, sobretudo para médios e grandes produtores. Assim, a

década de 1970 inaugurou um novo modo de ação estatal em consonância com

os setores agropecuário e industrial. Esse modo de financiamento, bem como o

subsídio aos preços, foi preponderante até o início da década de 1990, quando o

setor privado, então dotado de maiores capitais e enfrentando riscos menores,

assumiu parte das funções de oferta de crédito, pesquisa e intermediação

comercial (BARROS, 2010).

Assim, as mudanças visíveis na paisagem da área de estudo são o

resultado de ações políticas direcionadas para o avanço da fronteira agrícola

moderna, associada aos condicionantes naturais e sociais aí encontrados. Ao

longo das últimas quatro décadas as mudanças da cobertura e uso da terra na

cena 222/72 resultaram na sua divisão diagonal em duas áreas distintas, que aqui

serão chamadas zona sudoeste e zona nordeste (figura 3.3). O principal vetor de

localização de usos foi a fertilidade, que é mais elevada na zona sudoeste,

composta de Latossolo e Nitossolo Vermelhos, enquanto a zona nordeste

predominam o Cambissolo Háplico e o Argissolo Vermelho.

Antes da modernização da agropecuária praticamente não havia

conflito entre as atividades, visto que a agricultura ocupava sobretudo os vales,

enquanto as pastagens naturais cresciam em lugares mais planos. O mapa de

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uso do solo de 1975 (figura 3.3) mostra que as pastagens (cultivadas e naturais)

ocupavam a maior parte do uso da cena, preferindo o Latossolo aos solos menos

férteis. A agricultura, nesse mesmo ano, já ocupava extensas áreas de Latossolo,

ainda que não fosse muito expressiva. O mapa de 1986 mostra que até aí havia

preferência pelo Latossolo e que a agricultura e a pecuária ocupavam áreas

equivalentes. É a partir desse momento que a agricultura expulsou rapidamente a

pecuária, que passou a ocupar as terras da zona nordeste da cena. Na verdade,

como a cena apenas faz parte de um ambiente maior, é válido dizer que a partir

de meados da década de 1980 houve um grande movimento de expansão da

agricultura do eixo da BR-153 em direção ao sudoeste do Estado de Goiás, ao

passo que a pecuária se consolidou em um eixo que vai do Triângulo Mineiro,

passando pelas proximidades de Goiânia e se estendendo pela região da Estrada

do Boi, a noroeste do estado de Goiás, como demonstrado por Silva et al. (2013).

Ao longo da ocupação dessa cena houve dois grupos de uso principais,

pastagem e agricultura, que disputaram a melhor localização (figura 3.3). A

pastagem quase dobrou sua área entre 1975 e 1981, quando a agricultura passou

a requerer parte de sua área, além de avançar sobre a vegetação natural, entre

1981 e 1988. Assim, a partir de 1989 a pastagem voltou a recuperar área, mas aí

sua expansão já não se dava na porção sudoeste da cena, mas a nordeste, onde

a vegetação natural foi paulatinamente substituída pelas gramíneas, como visto

nos mapas (figura 3.3). Todavia, esse deslocamento se deu com muita

dificuldade, seja pela qualidade dos solos da porção nordeste da cena, seja pela

saturação de usos, pois desde 1989 a vegetação natural passou a apresentar

uma inflexão em seu decréscimo, ou seja, as piores áreas em termos de

distância, fertilidade e topografia estavam sendo ocupadas pela pastagem, que

tendia a sair de onde a agricultura pudesse se instalar, com algumas exceções.

Toda essa movimentação no espaço, sem que a pastagem de fato perca área,

revela a complementaridade entre agricultura e pecuária no Cerrado, na qual se

sobressai a exigência da agricultura por solos planos e suave ondulados e a

adaptabilidade da pecuária em localizações menos favoráveis. A lotação bovina

aumentou na região rapidamente entre 1977 e 1986, numa clara resposta à

pressão exercida pela agricultura na disputa pela melhor localização, pois, para

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se manter em áreas onde a agricultura tem interesse de se fixar, a rentabilidade

da pecuária há de ser mais alta que onde há terras em abundância.

Figura 3.4 – Evolução da agricultura, pastagem, vegetação natural na cena Landsat TM 222/72 e efetivo bovino nos municípios abrangidos pela cena

Fonte: Landsat (usos), IBGE, 2012 (bovinos).

Há que se verificar, todavia, a disputa por espaço dentro da agricultura,

isto é, entre culturas, e das pastagens cultivadas contra as naturais. Na

agricultura houve gradativa substituição de culturas, como a diminuição da área

plantada com arroz, que resiste à acidez do solo ainda não corrigido, para ceder

lugar à soja e ao feijão (figura 3.5). As culturas do feijão e do milho passaram por

ciclos de aumento e diminuição da produção, e é o que parece estar acontecendo

com a soja, que tem diminuído, ao passo que a cana-de-açúcar está no início de

seu ciclo. Essas culturas apresentam pequenos ciclos menores de diminuição

seguidos de aumento de produção, reflexo das condições de produção e de

mercado. Percebe-se que é sempre em uma dessas pequenas crises que outro

produto ganha espaço e se coloca “no lugar”, ainda que esse avanço possa não

ser em áreas de produção específica do produto em crise, já que a expulsão da

pecuária das áreas de agricultura moderna e os desmatamentos tendem a abrir

espaço, que será ocupado, sobretudo pelas culturas em fase de expansão. Na

atualidade, a expansão do cultivo da cana-de-açúcar é a principal mudança na

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cobertura e uso da terra, não só na cena, mas também em outras áreas do

Cerrado (SPAROVEK, 2008).

Figura 3.5 – Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 222/72 entre 1973 e 2010 nos municípios abrangidos pela cena

Fonte: IBGE, 2012.

No caso da pastagem, houve primeiro o uso de gramíneas naturais

(figuras 3.6 e 3.7). O prolongamento da Ferrovia Mogiana até Goiás, no início do

século XX, ligou a porção sudeste desse estado à região do Triângulo Mineiro,

tradicional produtora bovina. Contudo, as pastagens naturais avançaram mais

pelo estado de São Paulo, no eixo da atual BR-153, e não por essa região de

pecuária tradicional, demonstrando que a modernização da agropecuária no

Cerrado se expressou espacialmente como um prolongamento da produção

moderna do oeste de São Paulo, atingindo também as pastagens, que todavia

tiveram que migrar quando a agricultura requereu mais área. Nessa migração, o

eixo do Triângulo Mineiro até Goiânia, em função da baixa qualidade dos solos,

se consolidou como uma importante área de pecuária, incluindo a zona nordeste

da cena aqui analisada. Note-se que a pecuária compensou sua transferência

para solos ruins com a manutenção da localização favorável, ou seja, quando a

agricultura avançou sobre ela não há necessidade de buscar terras de igual

fertilidade ou declividade, desde que a localização compense essas

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desvantagens, pois essas mesmas restrições farão o preço da terra se manter

acessível para a pecuária, que tende a se tornar estável nessa nova localização.

Figura 3.6 – Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens naturais, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006, destacando-se a cena Landsat 222/72

Figura 3.7 – Mapas da ocupação do bioma Cerrado por pastagens cultivadas, segundo os Censos Agropecuários de 1970 a 2006, destacando-se a cena Landsat 222/72

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Uma importante ressalva desse jogo de localizações é que a presença

de cidades médias e grandes pode interferir na ocupação do espaço à sua volta.

A proximidade das cidades faz elevar o preço da terra, dificultando a

concentração fundiária. As pequenas propriedades tendem a atuar no mercado

agrícola de frutas e hortaliças, enquanto a atividade pecuária tende a se voltar

para a produção de leite, abastecendo a indústria de laticínios comuns nas

médias e grandes cidades. A disponibilidade de mão-de-obra nas cidades é um

dos fatores de se desenvolver a produção de mercadorias que demandam mais

trabalho. Assim, na cena estudada o fator urbano explica tanto a frequência de

troca de usos quanto o predomínio das pastagens nos arredores da Região

Metropolitana de Goiânia, que tem solo e relevo igual ao da zona sudoeste da

cena, onde a pecuária tende a perder espaço para a agricultura.

3.5 VETORES DAS MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA NO

CERRADO ANTES E DEPOIS DA MODERNIZAÇÃO DA AGROPECUÁRIA

As transformações socioespaciais ocorridas na região compreendida pela

cena 222/72, onde a ocupação intensa do espaço é relativamente antiga, indicam

que a modernização da agropecuária mudou profundamente a lógica das

localizações no Cerrado. Antes e depois desse advento, as atividades produtivas

no Cerrado encontraram fatores de limitação/modulação da forma como a

pecuária e a agricultura se distribuíram no espaço.

Embora se possa aludir a vários condicionantes de localização da

agropecuária moderna no Cerrado, há quatro vetores principais, sendo um não

local, a demanda, e três locais, a fertilidade, a topografia e a distância em relação

aos mercados de insumos, mão-de-obra e comercialização (MIZIARA;

FERREIRA, 2008; FERREIRA et al., 2009). O preço da terra, que costuma ser

considerado como vetor de localização, é um reflexo dessas condições. A

especulação fundiária também é favorecida pelo aumento da demanda pela

localização que atende a essas condições fundamentais da produção. É

importante salientar a importância do aparato tecnológico na produção, transporte

e comercialização para a agropecuária moderna. Essas tecnologias se tornaram

cada vez mais hegemônicas, sobretudo em regiões de ocupação produtiva antiga,

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restando atualmente poucos espaços que consigam abrigar atividades pouco

desenvolvidas tecnologicamente, visto que mesmo as limitações naturais do solo

sob vegetação de Cerrado impedem a escolha pela não adoção da calagem e

fertilização artificial ou da pastagem exótica.

A demanda é a condição sine qua non para a expansão de qualquer

atividade agropecuária, não só no Cerrado. Quando a demanda varia, ocorre a

expansão ou retração da atividade agrícola ou pecuária e sobre cada produto

isoladamente, com reflexo nas localizações dos demais produtos. No caso do

Cerrado, é notável que desde o pós-guerra a demanda por alimentos aumentou

no Brasil e em todo mundo, em parte devido ao crescimento da população

urbana. O principal produto agrícola do Cerrado, a soja, teve sua demanda

ampliada ao substituir outros óleos vegetais e animais por seu óleo barato. Isto

ocorreu no Brasil, como nos países desenvolvidos e agora é fenômeno novo na

China, onde a enorme população está afluindo para as cidades e demandando

mais óleo e outros derivados da soja, boa parte comprada do Brasil.

Espacialmente, esse aumento da demanda tem o potencial de fazer esse produto

“expulsar” outras culturas ou atividades de onde lhe interesse estar localizada e

por onde possa pagar melhor, sempre que a alta demanda gera rentabilidade

maior que a das demais atividades.

Os vetores locais da ocupação do Cerrado mostram-se articulados

entre si na história da expansão da agricultura e da pecuária. Um ponto fulcral

nessa história foi a modernização da agropecuária, que mudou profundamente a

forma como cada um dos três vetores se comporta com essas duas atividades.

Assim, a importância de cada um deles foi modificada assim que se pôde romper

a distância com os transportes, mecanizar algumas etapas da produção e “criar” a

fertilidade dos solos, que foram as transformações básicas dessa modernização.

Antes dessas mudanças, tanto a agricultura quanto a pecuária estavam

limitadas pelas distâncias, que eram difíceis de se romper sem meios de

transportes modernos, fazendo com que a distância se tornasse o principal vetor

de localização (figura 3.8). A agricultura no Cerrado, então, se restringiu por

quase dois séculos à produção de subsistência, enquanto a pecuária, quando não

se voltava também para a subsistência, não conseguia estar muito longe do

mercado consumidor, já que quanto maior a distância, mais os animais morriam

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pelo caminho ou chegavam definhados ao fim do percurso (CHAUL, 2000;

TEIXEIRA NETO, 2008; ESTEVAM, 1998).

Os outros dois vetores, topografia e fertilidade, atuavam conjuntamente

na localização da agricultura e da pecuária. Enquanto os solos naturalmente mais

férteis e úmidos se restringem aos vales, as pastagens nativas são comumente

encontradas em planaltos. Isso fez com que praticamente não houvesse conflito

entre usos.

Com a difusão das modernas tecnologias de produção adaptadas ao

Cerrado, cada um dos vetores de localização da agricultura e da pecuária mudou

sua importância (figura 3.8). Para a agricultura, depois de vencidas as barreiras

do transporte e da fertilidade, o principal vetor de localização passou a ser a

topografia, pois a agricultura mecanizada exige solos planos ou suave ondulados.

Assim, a distância e a fertilidade estão hoje relacionados à composição de custos

com o transporte e com a fertilização. Por sua vez, a pecuária se distribui

espacialmente obedecendo a esses vetores de forma diferente da agricultura,

pois encontra menos limitações. Em função da necessidade de redução de

Figura 3.8 – Esquema empírico das mudanças nos vetores de localização da agricultura e da pecuária antes e depois da modernização da agropecuária

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custos, a fertilidade natural é o primeiro vetor de localização. Sempre que for

economicamente possível a pastagem se localiza em terras de melhor fertilidade.

Contudo, se for obrigada a se deslocar, buscará buscar manter menor distância,

enfrentando até mesmo condições topográficas e de fertilidade menos favoráveis.

Isto faz desta uma atividade extremamente adaptável, o que explica seu

desenvolvimento em conjunto com a agricultura no Cerrado. Há certa

complementaridade entre a agricultura e a pecuária, pois a primeira costuma

remunerar melhor as localizações de topografia, fertilidade e distância melhores,

enquanto a segunda se desenvolve bem onde essas condições estão em falta.

Por isso o mapa da distribuição dessas duas atividades em áreas de ocupação

antiga costuma dividir o espaço em duas tipologias: solos mais férteis e planos

com agricultura e solos menos férteis e mais declivosos com pecuária, como visto

na cena aqui analisada. Para ocupar solos requeridos pela agricultura moderna a

pecuária irá intensificar a inversão de capital em tecnologia de produção

avançada. É possível ainda a integração das duas atividades no sistema lavoura-

pecuária, que é uma tendência crescente (DUBOC et al., 2008), todavia é

incomum onde o relevo é acidentado, significando que essa seria uma área

predominantemente ocupada pela agricultura.

3.6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na cena estudada, a identificação de uma fronteira agrícola tradicional

antecedendo a chegada da agropecuária moderna no Cerrado é um avanço nas

discussões sobre o conceito de fronteira, pois normalmente se desconsidera o

nível de desenvolvimento que antecedeu a chegada da agropecuária moderna em

áreas de ocupação antiga do Cerrado. A estruturação pretérita dessa fronteira

agrícola tradicional certamente propiciou a assimilação das modernas tecnologias

por parte dos antigos proprietários, sobretudo os médios e grandes, ao contrário

do que ocorreu quando a fronteira agrícola moderna avançou sobre espaços

ainda pouco explorados, a exemplo do Extremo Oeste Baiano, onde nem mesmo

a propriedade privada de boa parte das terras estava definida na década de 1980

(SANTOS, 2008; HAESBAERT, 1996). Em realidades como esta, o que ocorre é

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reestruturação completa desses espaços, modificando inclusive a composição

demográfica, que passa a ser predominantemente migrante.

Pelas análises estatísticas a partir dos censos agropecuários não se

conseguia mapear bem os deslocamentos espaciais da agricultura e da pecuária

nem a qualidade das terras ocupadas, pois os dados são generalizados para toda

a área municipal e não são muito detalhados. Com o mapeamento da série

histórica de imagens foi possível compreender melhor como a pecuária se

adaptou às restrições impostas pelo avanço da agricultura e mesmo assim

expandiu sua área até o ano de 2000, quando encontrou seu limite de

crescimento e se estabilizou. Da mesma forma, a análise das sucessões de

diferentes culturas na agricultura a partir de séries históricas de imagens de

satélite mostra-se como um campo promissor, pois uma das grandes indagações

suscitadas pelo avanço de monoculturas como as da soja e da cana-de-açúcar

refere-se ao seu poder de substituição de usos anteriores. Ressalte-se, contudo,

que a nova forma de coleta e apresentação dos dados dos Censos Agropecuário

e Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dividindo

as áreas rurais em setores censitários, irá fornecer séries históricas com

informações mais apuradas e diversificadas que os censos anteriores,

possibilitando mesmo comparações mais refinadas com dados de sensoriamento

remoto.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq) (Edital Universal e bolsa de produtividade em

pesquisa PQ IC para o segundo autor), da Coordenação de Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior (Capes) (Bolsa de doutorado para o primeiro e terceiro

autores) e da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg).

Suporte financeiro para esta pesquisa também foi obtido junto à United States

National Aeronautics and Space Administration (Nasa) – Land-Cover and Land-

Use Change Program (LCLUC) (NNX11AE56G), em parceria com o Woods Hole

Research Center.

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4 AS MUDANÇAS NA COBERTURA E USO DA TERRA EM FRONTEIRAS

AGROPECUÁRIAS RECENTES DO CERRADO ENTRE 1975 E 2010

Land-cover and land-use changes in recent agricultural frontiers in the Brazilian savanna biome from 1975 to 2010

RESUMO

Desde a década de 1970 o Cerrado tem passado por um processo de mudança na cobertura e uso da terra fortemente heterogêneo. Neste artigo procura-se compreender essa dinâmica em áreas do Cerrado que são consideradas fronteiras agropecuárias mais recentes: centro-sul do estado do Mato Grosso, a do Extremo Oeste Baiano e a do Mapito (acróstico que refere-se aos estados de Maranhão, Piauí e Tocantins). Para cada fronteira foi selecionada uma cena dos satélites Landsat e realizados mapeamentos de cobertura e uso da terra a cada dois anos entre 1975 e 2010, destacando-se as áreas de agricultura, pastagem cultivada e vegetação. Esse mapeamento histórico foi analisado com o auxílio de dados censitários sobre a produção agropecuária e de estudos sobre essas fronteiras. Percebeu-se que os programas federais de modernização e expansão da agropecuária foram os grandes indutores das mudanças na estrutura produtiva e na dinâmica econômica e social desses espaços. Constatou-se, ainda, que as ações dos capitalistas individuais são fortemente influenciadas pelas características do espaço, pois a pecuária tende a ceder espaço para a agricultura, ocupando solos menos férteis e mais declivosos, e a agricultura já se aproxima do seu limite de expansão nessas áreas, visto que as áreas planas e suave onduladas já estão em boa parte ocupadas. Palavras-chave: Cerrado. Fronteira agrícola. Mudança de cobertura e uso da terra.

ABSTRACT

Since the 70´s, the Cerrado has being going through a rapid and strongly heterogeneous land-cover change process. Within this context, the present study aims at understanding the dynamics of three recent agricultural frontiers in the biome: The central-south portion of Mato Grosso, the Western Baiano and the MAPITO region (encompassing the portions of Maranhão, Piauí, and Tocantins). For each one of these frontier areas, corresponding to specific Landsat scenes, a thorough land-cover and land-use mapping, focused on the distribution of agriculture crops, pastures, and remnant vegetation, was conducted, every other year, from 1975 to 2010. The analysis of the resultant historical maps, accompanied by ancillary census data, confirmed the role of major governmental programs in inducing the substantial social and economical changes observed in these regions. As also observed, the individual, capital-based, initiatives were and are strongly influenced by natural attributes. In particular, the agricultural, already

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reaching its favorable expansion conditions, is currently disputing hilly cattle ranching areas, of lower soil fertility. Key-words: Cerrado. Agricultural frontier. Land-cover and land-use change.

4.1 INTRODUÇÃO

O Brasil é reconhecido internacionalmente como uma das principais

áreas de fronteira agrícola do mundo (MUELLER; MARTA JÚNIOR, 2008) devido

à expansão agropecuária impulsionada pela adoção de novas tecnologias de

produção e pelas políticas públicas de incremento de produção, iniciadas na

década de 1970. Essas políticas desencadearam-se a partir do II Plano Nacional

de Desenvolvimento (PND), do final de 1974, que criou o Programa de

Desenvolvimento dos Cerrados (Polocentro), voltado para a região Centro-Oeste,

onde está grande parte do bioma Cerrado (ALENCAR, 1975; BRASIL, 1975;

PIRES, 2000). Desde então foi disseminada a produção agropecuária de alta

tecnologia, envolvendo todas as etapas da produção, do melhoramento de

sementes à armazenagem e transporte. Dessa forma, a produção de grãos no

Cerrado cresceu 6,4% ao ano entre 1970 e 2003 (LOPES; DAHER, 2008),

inserindo-o no mercado internacional de alimentos, matérias-primas e

combustíveis.

Embora o incremento da produção agropecuária no Cerrado esteja

fortemente relacionado ao aumento de produtividade, a expansão da área

ocupada com o cultivo de grãos e com o pastejo de bovinos tem sido a principal

responsável pelo aumento de importância desse bioma para a economia brasileira

(LOPES; DAHER, 2008). Essa intensa mudança na cobertura e uso da terra tem

diminuído sua qualidade ambiental, ao ponto de o Cerrado ser classificado como

um dos 25 hotspots mundiais, isto é, uma área de alto endemismo de

biodiversidade e de estágio avançado de degradação ambiental (MYERS et al.

2000). Essa constatação foi reforçada pelo mapeamento de cobertura e uso da

terra realizado pelo Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da

Diversidade Biológica Brasileira (Probio) (SANO et al., 2010), que confirmou a

perda de aproximadamente 50% da vegetação do Cerrado bioma, além da

acentuada fragmentação em espaços que contam com poucos ambientes

naturais remanescentes (CARVALHO et al., 2009). Áreas como estas estão

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concentradas na porção centro-sul do bioma, que inclui o norte de São Paulo, o

oeste de Minas Gerais, o leste Mato Grosso e praticamente todo o estado de

Goiás e do Mato Grosso do Sul, notadamente áreas onde a produção

agropecuária se dá mais intensivamente.

Apesar de o bioma já estar em grande parte ocupado pela

agropecuária, estudos da Embrapa afirmam que dois terços da área do bioma são

agricultáveis e que, portanto, aproximadamente 36 milhões de hectares são ainda

passíveis de ocupação pela agricultura (EMBRAPA CERRADOS, 2005), além da

possibilidade de aumento do efetivo bovino em áreas não demandadas por esta

atividade. Da mesma forma, Rocha et al. (2013) apontam que em torno de 60,90

%, da área total remanescente (~ 725.636 Km2) situam-se em declividades de até

3%. Nessas áreas, as maiores limitações estão relacionadas ao custo do

tratamento de alguns tipos de solo, pois, apesar de os latossolos representarem a

maior parte, há solos que demandam maiores investimentos em correção de

acidez e fertilização e outros com condições hidráulicas impróprias para boa parte

das commodities produzidas no Cerrado.

Além da produção de grãos alimentícios e de carne, também o cultivo

de cana-de-açúcar apresenta tendências de expansão no Cerrado, numa clara

resposta à demanda interna e externa por combustíveis mais baratos e menos

poluentes que os derivados de petróleo (NOBRE et al., 2001). A recente

expansão do cultivo de cana-de-açúcar e a instalação de usinas no Cerrado tem

ocorrido em áreas com aspectos físicos propícios e com boa infraestrutura

(SPAROVEK et al., 2008; RIBEIRO, 2010). No entanto, as áreas com estas

características normalmente já são tradicionais produtoras de grãos, o que tem

promovido a disputa entre a produção destas commodities. Como consequência,

a produção de grãos tende a buscar novas áreas, contribuindo para a expansão

de fronteiras agrícolas em várias áreas do Cerrado (SILVA; MIZIARA, 2011).

Diante dessa realidade, faz-se necessário identificar os processos

envolvidos na expansão das novas fronteiras agrícolas e suas implicações

socioespaciais. Uma das limitações desses estudos está no conhecimento da

dinâmica espacial e temporal dos usos da terra ao longo da ocupação do bioma.

O mapeamento histórico, baseado em sensoriamento remoto, aliado aos dados

censitários, podem fornecer informações confiáveis sobre essas realidades.

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Assim, neste trabalho, com base em cenas dos satélites Landsat, localizadas em

áreas de fronteiras agrícolas recentes do Cerrado, foram gerados mapas de

cobertura e uso da terra a cada dois anos entre 1975 e 2010, os quais foram

analisados com o auxílio de dados censitários e de estudos anteriores sobre

essas áreas.

4.2 ESCOLHA DAS ÁREAS DE ESTUDO

Ao todo, três cenas Landsat, situadas em áreas de fronteira

agropecuária, caracterizadas pela rápida mudança na cobertura e uso da terra,

conforme dados do Sistema Integrado de Alertas de Desmatamento (Siad

Cerrado) (ROCHA et al., 2011), foram selecionadas (figura 4.1).

A figura 4.1 mostra que os desmatamentos ocorridos recentemente no

bioma Cerrado estão concentrados em áreas de expansão da fronteira

agropecuária. Especificamente, as cenas estudadas localizam-se no centro do

estado do Mato Grosso, na mesorregião Extremo Oeste Baiano e na confluência

entre os limites dos estados do Maranhão, Piauí e Tocantins, conhecido como

Mapito. Nesses espaços, a produção agropecuária moderna tem-se instalado

rapidamente, em função da escassez relativa de novas terras em áreas onde a

agropecuária já se consolidou (centro-sudeste do bioma) e da alta demanda por

commodities no mercado interno e externo (SAUER; LEITE, 2012).

4.3 ETAPAS METODOLÓGICAS DO PROCESSAMENTO DAS IMAGENS3

Foram utilizadas imagens do satélite Landsat em função da boa

resolução espacial, ao longo do período monitorado continuamente, e à

gratuidade de sua aquisição. Devido ao recorte temporal (1975 a 2010) foi

necessário utilizar imagens dos três sensores da série Landsat: MSS (80 m), TM

(30 m) e ETM+ (30 m). As cenas de cada ano foram escolhidas entre os meses

de junho a setembro, tendo em vista ser este o período de menor ocorrência de

nuvens no Cerrado. Entre 1982 a 1985 não houve imagens disponíveis, exceto

3 Uma versão mais abrangente desta metodologia pode ser consultada no apêndice A e em Silva

et al. (2013)

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para o Mapito, que contou com a imagem deste último ano. O quadro 1 apresenta

as cenas utilizadas de cada sensor.

Figura 4.1 – Distribuição espacial (base municipal) dos alertas de desmatamento gerados pelo Siad Cerrado entre 2002 e 2010 e localização das cenas Landsat analisadas neste estudo.

Quadro 1 – Cenas dos sensores MSS, ETM+ e TM dos satélites da série Landsat utilizadas neste estudo

Período Cenas por sensor

MSS ETM+ TM

1975 - 1981 48

1986 - 2000 32

2002 3

2004 - 2010 12

Total 92

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O registro das imagens foi realizado através do processo imagem com

imagem, a partir do mosaico GeoCover S23-10 2000 adquirido junto à National

Aeronautics and Space Administration (Nasa). O erro médio admitido foi de 0,6

pixel.

Em seguida as imagens foram segmentadas, utilizando-se 15 temas e

25 interações, com similaridade de 35 % e área mínima de 20 pixels, conforme o

método Bhattacharya (MOREIRA, 2011) e submetidas à classificação

supervisionada. Tendo em vista a variabilidade espectral, várias classes foram

criadas para um mesmo tema (ex. vegetação natural: cerrado denso_1, cerrado

denso_2, cerrado_ralo1, cerrado_ralo2, etc).

Após a classificação das imagens, os dados foram transformados em

vetores, cujos polígonos passaram por uma nova etapa de inspeção visual.

Assim, as classes foram reorganizadas e o dado final foi composto por cinco

classes: vegetação, agricultura, pastagem, mancha urbana e massa de água.

Com esse refinamento chegou-se à escala aproximada de 1/100.000.

4.4 CENA 226/70: CENTRO DO ESTADO DO MATO GROSSO

A frente de expansão que atingiu o atual estado do Mato Grosso foi

iniciada pelas entradas de bandeiras paulistas em busca de índios para o trabalho

escravo no Século XVII. Contudo, foi a descoberta e exploração do ouro de

aluvião nos Séculos XVIII e XIX que atraiu um contingente populacional

relativamente grande, dando início à sua ocupação por não índios. Com o declínio

do ouro, em meados do século XIX, a população se tornou rarefeita no grande

território desse estado. Devido ao distanciamento dos centros econômicos do

país, em função da localização geográfica e da carência de infraestrutura viária,

até o início da década de 1940 o estado se manteve pouco explorado, com as

atividades restritas à criação de gado, à agricultura, com destaque para o cultivo

de erva mate, e às explorações de madeiras e de seringueiras (FIGUEIREDO,

2003; COUTINHO, 2005).

A partir da década de 1950 se tornam mais visíveis tanto a ocupação

espontânea do território quanto políticas locais e nacionais indutoras desse fluxo.

Contudo, foi na década de 1970, no âmbito do II Plano Nacional de

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Desenvolvimento (PND), que ocorrem as maiores mudanças e exploração

agropecuária do estado (FIGUEIREDO, 2003). A cena 226/70 abrange partes das

mesorregiões Norte, Centro-sul e Sudeste do estado do Mato Grosso (figura 4.1).

A proximidade com o oeste paulista, ocupado rapidamente desde a década de

1950 em função da alta fertilidade natural, fez com que o estado do Mato Grosso

do Sul e o centro-sul do Mato Grosso respondessem à alta demanda da

agropecuária moderna, impulsionada por ações como a do Polocentro, a partir de

1974 (último quadro da figura 4.2). Os três municípios inseridos diretamente

nesse programa (Diamantino, Alto Teles Pires e Rosário Oeste) não são os que

tiveram as maiores proporções de conversão de vegetação em usos, mesmo por

que um aspecto importante na escolha dos municípios que receberiam o

Polocentro era a infraestrutura já existente. A partir deles houve a difusão das

novas técnicas produtivas, que procuravam homogeneizar toda a agropecuária.

Porém, a infraestrutura e a dinâmica gerada nestas áreas foram capazes de

dinamizar o seu entorno. Ao todo, o Polocentro foi implantado em 30 municípios

do Mato Grosso, sendo um dos fatores que o transformaram no maior produtor de

soja do País. Além desse programa, em 1985 foi implantado nos municípios de

Tapurah e Lucas do Rio Verde, no nordeste do estado, o Prodecer II. Esses

municípios fazem divisas com o município de Nova Mutum, localizado ao noroeste

da cena, aumentando aí as condições para a rápida ocupação pela agropecuária.

Na cena 226/70, as pastagens cultivadas foram o uso que mais se

expandiu inicialmente, na porção oeste, notadamente nos solos mais férteis e

planos (figura 4.2). A agricultura preferiu os Latossolos e Neossolos de relevo

plano e suave ondulado, vencendo a competição pela localização, relativamente

às pastagens encontradas nesses espaços, e tornando-se rapidamente o uso

mais comum no conjunto da cena.

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Figura 4.2 – Evolução espaço-temporal na cobertura e uso da terra na área correspondente à cena 226/70, localizada no centro-sul do estado do Mato Grosso. Fontes: Inpe e Nasa (imagens), Ibge (base cartográfica, censitária e classificação de solos e declividade)

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A figura 4.3 mostra que a expansão e acomodação dos usos foram

contínuas, mantendo um padrão de diminuição do avanço das pastagens sempre

que a agricultura acelerava seu crescimento. Ao fim da série, percebe-se que a

estagnação da agricultura, enquanto as pastagens passam a ser o principal

indutor dos desmatamentos no último período. Um dos motivos do sucesso da

pecuária no estado do Mato Grosso é abertura do mercado de carne bovina para

o Brasil no mercado exterior, sobretudo desde 2005, cujo efeito foi o aumento dos

investimentos em tecnologia de produção e instalação de numerosas plantas

frigoríficas (SILVA et al., 2013a).

Figura 4.3 – Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 226/70 (centro-sul do estado do Mato Grosso), no período de 1975 a 2010.

Na agricultura, o primeiro produto importante na área estudada foi o

arroz, que suporta bem a acidez dos solos do Cerrado (figura 4.4). O arroz é uma

cultura tipicamente associada ao desmatamento no Cerrado, já que é cultivada

por alguns anos logo que a vegetação é removida e comumente apropriada por

quem fez esse trabalho inicial de “formação” da propriedade. A presença da

produção desse grão na área estudada indica a presença de dois tipos sociais

presentes na frente de expansão: o meeiro, que trabalha em terras de outros, e os

pequenos proprietários migrantes do sul do país, muitos dos quais não mais

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presentes nessa área em função da venda das propriedades para grandes

proprietários e empresas. A partir da década de 1980, incentivada pelos projetos

de modernização da agricultura, a soja desponta como o principal produto. Outro

importante produto é o milho, que surgiu em resposta à crescente demanda

nacional e internacional. Assim, cada vez mais a agricultura desses municípios

substituiu produtos menos rentáveis por commodities. O efetivo bovino manteve

crescimento menor que o da agricultura, com certo declínio e desaceleração após

meados da década de 1995, provavelmente em função da competição por

localização com a agricultura, que cresceu muito desde essa data. Esta situação,

contudo, reflete a situação da cena, que destoa do que ocorre no estado do Mato

Grosso, onde não se registrou diminuição do efetivo bovino.

A soja produzida no Mato Grosso atende ao mercado nacional, mas

sobretudo o internacional, por meio de dez importantes portos, que mantém

distâncias aproximadas do estado em função de sua posição no território

Figura 4.4 – Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 226/70 (centro-sul do estado do Mato Grosso), entre 1973 e 2010 (municípios de Acorizal, Campo Verde, Chapada dos Guimarães, Cuiabá, Diamantino, Nobres, Nova Brasilândia, Nova Mutum, Nova Ubiratã, Paranatinga, Planalto da Serra, Primavera do Leste, Rosário Oeste e Santa Rita do Trivelato).

Fonte: IBGE, 2012.

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nacional: Santos (SP), Manaus (AM), Vitória (ES), Paranaguá (PR), Santarém

(PA), Maranhão (MA), Porto Murtinho (MS) e Rio Grande (RS). A infraestrutura

viária do Mato Grosso tem bom adensamento, principalmente nas áreas com usos

mais consolidados, a exemplo da área aqui estudada. No entanto, o

distanciamento das áreas de plantio até os portos aumenta muito o fluxo de

caminhões nas rodovias, levando à rápida deterioração e ao aumento do custo da

produção (FIGUEIREDO, 2005; PINHEIRO; CAIXETA, 2010).

4.5 CENA 220/68: REGIÃO DO EXTREMO OESTE BAIANO

A porção do Cerrado localizada no estado da Bahia é conhecida como

mesorregião do Extremo Oeste baiano. Essa região manteve-se praticamente

como um vazio demográfico até a década de 1950 em função da sua distância

aos grandes centros consumidores, da falta de vias de acesso e da baixa

fertilidade dos solos. A pouca ocupação humana existente estava voltada para a

subsistência e ocorria nos fundos de vale, áreas mais férteis para o

desenvolvimento de agricultura, ao passo que a criação de gado se dava nas

extensas pastagens naturais nas partes altas (SANTOS, 2008).

Assim como outras áreas do Cerrado, no final da década de 1970 o

Extremo Oeste Baiano foi inserido na produção agropecuária moderna, mudando

profundamente suas características econômicas, demográficas e fundiárias

(SANTOS, 2008; MONDARDO, 2010). É a partir deste momento que a terra

adquire valor de troca e se torna comum a compra e venda de propriedades,

muitas delas regularizadas pela grilagem e expulsão de antigos ocupantes. Com o

uso de técnicas de correção da acidez e fertilização dos solos, os chapadões,

comuns nessa região, tornaram-se muito atrativos para grandes explorações

agrícolas. Com o apoio dos governos municipais, estadual e federal, esses

projetos promoveram um intenso fluxo migratório para essa região, principalmente

do sul do país, estimado em 1995 em 40.000 pessoas (HAESBAERT, 1996).

Dentre os principais impulsionadores da agricultura moderna no

Extremo Oeste Baiano destaca-se o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira

para o Desenvolvimento dos Cerrados II (Prodecer), iniciado em 1985 com o

objetivo de promover o cultivo de grãos em larga escala (YOSHII et al., 2000;

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INOCÊNCIO 2010). Também no início da década de 1980 foi criado pelo governo

local o Programa de Ocupação Econômica do Oeste (Programa Básico)

(SANTOS, 2008). Destaca-se também uma série de programas voltados para a

irrigação, já que a rede hidrográfica da região é vasta, servida por muitos

afluentes da bacia do Rio São Francisco (ANA, 2012).

A figura 4.5 mostra que em 1977 surgiram as primeiras manchas de

pastagem ao nordeste da cena e que entre 1979 e 1981 esse uso se expandiu

nas porções sul e leste da área onde o relevo é montanhoso a escarpado e

altamente suscetível à erosão (VALLADARES et al., 2002). Apesar de a produção

de grãos ser conhecida como o ícone da ocupação do Extremo Oeste Baiano, na

cena analisada percebe-se que as pastagens cultivadas, atualmente

predominantes na porção leste da cena, foram o primeiro importante uso,

indicando que a pecuária começou a melhorar seu padrão técnico com a inserção

de espécies exóticas, mais resistentes e nutritivas que as naturais, mesmo antes

da modernização da agricultura. Infelizmente não houve imagens disponíveis para

os anos de 1982 a 1985, quando a agricultura começou a expandir, firmando-se

como o uso quase exclusivo na porção oeste da cena, onde predomina o relevo

plano e os solos dos tipos Latossolo Amarelo, Neossolo Litolíco e Neossolo

Quartezarênico, facilmente adaptados para a agricultura extensiva com o uso de

corretivos e fertilizantes (EMBRAPA, 1999).

Uma característica marcante do Extremo Oeste Baiano é que a pouca

infraestrutura viária existente até antes da década de 1980 não foi profundamente

transformada com a chegada da fronteira agrícola. A rede fluvial do Rio São

Francisco permaneceu como o principal meio de transporte de pessoas e

mercadorias até a difusão do transporte rodoviário e a pavimentação de rodovias

no país, impulsionadas pela criação de Brasília. Entre as rodovias importantes do

Extremo Oeste Baiano estão a BR-020 (Brasília-Fortaleza), a BR-242 (Barreiras-

Salvador) e a BR-135 (São Luís-Belo Horizonte), ainda hoje não pavimentadas

em alguns trechos. Ainda que precária, essa rede viária possibilitou a implantação

Prodecer nessa região, restando notável que no Cerrado a abertura e

manutenção de simples estradas de chão é o suficiente para se adentrar em

extensas áreas e se implantar a agropecuária.

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Figura 4.5 – Evolução espaço-temporal na cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 220/68, localizada sobre a região do Extremo Oeste Baiano. Fontes: Inpe e Nasa (imagens), Ibge (base cartográfica, censitária e classificação de solos e declividade)

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As figuras 4.5, 4.6 e 4.7 mostram o intenso ritmo das mudanças na

cobertura e uso da terra nessa porção do Cerrado e o reflexo das políticas de

ocupação. Percebe-se que da década de 1980 até o início da década de 1990

houve os maiores índices de conversão da vegetação, em função da expansão

da fronteira agrícola, apesar de a produção de soja, principal produto, ter sofrido

drástica queda no final da década de 1980. Na década de 1990, com o incentivo

do governo federal às exportações e início da estabilização da moeda nacional,

essa expansão ganha novo fôlego, resultando no uso de parte das áreas

propícias restantes na cena. No início da década de 2000 ocorreu um novo

aumento na área de agricultura, todavia ocupado pelo milho, pois a soja

enfrentou a ferrugem asiática durante a safra 2002/2003, o que desencorajou o

seu plantio e estabilizou a área colhida, tanto na região estudada quanto no

restante do país (PEIXOTO, 2005). Por outro lado, o milho enfrentou problemas

climáticos em outras partes do país entre 2004 e 2005, mas não nessa região,

onde consolidou-se como um dos principais produtos, acompanhado pelo

algodão, que tem alcançado bons preços no mercado internacional nos últimos

dez anos. Um traço marcante dessas três culturas no Extremo Oeste Baiano é a

rotação das culturas do milho e do algodão, que aproveitam o nitrogênio fixado

na terra pela soja, todos gozando historicamente de bons preços nos mercados

interno e externo. Assim, na década de 2000, as terras mais adaptadas à grande

lavoura foram incorporadas, indicando que, espacialmente, essa é uma fronteira

agrícola consolidada, estancada pelos seus próprios limites. Apesar de ainda

haver áreas propícias à expansão, a proximidade do Mapito fez com que essa

região atraísse a demanda por novas terras, causando, por outro lado, o

aumento da especulação imobiliária no Extremo Oeste Baiano.

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Figura 4.6 – Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 220/68 (Extremo Oeste Baiano), no período de 1975 a 2010.

Figura 4.7 – Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 220/68, entre 1973 e 2010 (municípios de Dianópolis, Novo Jardim, Ponte Alta do Bom Jesus, Taguatinga, Cristalândia do Piauí, Sebastião Barros, Angical, Barreiras, Catolândia, Cotegipe, Formosa do Rio Preto, Luís Eduardo Magalhães, Riachão das Neves, Santa Rita de Cássia e São Desidério).

Fonte: IBGE, 2012.

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Internamente, a produção de grãos passou por mudanças

importantes, que podem ser entendidas como fases do processo de avanço da

fronteira agrícola. Até a década de 1970, a produção de grãos, como o milho, o

feijão e o arroz, além do algodão, estava voltada para a subsistência e

comercialização do excedente. A partir de meados da década de 1980, o arroz,

uma das primeiras commodities, é progressivamente substituído pela soja, que

passa a ser dominante (figura 4.7).

Embora os desmatamentos continuem elevados, o aumento da

produção tem-se dado também em função do incremento da produtividade

baseada nos avanços tecnológicos e da difusão da irrigação, que permite mais de

uma colheita por ano. Atualmente a área irrigada é de 100 mil hectares com

previsão de expansão para 200 mil hectares (AIBA, 2012). Quanto às

fitofisionomias desmatadas, o monitoramento da expansão agropecuária na

região do Oeste da Bahia, realizado pela Embrapa em 2002, para o período de

1985 a 2000, mostrou que as classes Floresta Estacional e Transição Caatinga-

Floresta Estacional-Cerrado foram as mais atingidas e tiveram redução de 11,5%

e 15% respectivamente (BATISTELA et al., 2002). As classes Campo Cerrado e

as manchas de Vegetação Ciliar tiveram 6,7% e 2,8% de redução,

respectivamente. Esses dados confirmam a preferência por áreas de vegetação

mais densa, com solos e relevos mais adequados à agricultura moderna.

A pecuária, por sua vez, consolida-se rapidamente, entre o final da

década de 1970 e o final da década de 1980, quando começa a perder área para

a agricultura, sobretudo no centro da cena, onde ocupava terras apropriadas ao

cultivo extensivo, deslocando-se para terras não requeridas pela agricultura.

Apoiada no mercado da carne bovina cresceu primeiramente em função da

demanda interna, mas, a partir da década de 1990, passa também a ser

impulsionada pelo aumento das exportações brasileiras. Note-se que, nessa curta

história da pecuária, ocorre a exigência hegemônica por modernos padrões de

produção, como o melhoramento dos pastos e dos animais, fazendo com que

essa atividade, a exemplo da agricultura, passe a ser exercida, cada vez, por

grandes criadores e empresas.

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4.6 CENA 221/66: REGIÃO DO MAPITO

A cena 221/66 é representativa da área de confluência entre os

estados do Maranhão, Piauí e Tocantins, denominada “região do Mapito”, às

vezes incluindo o Extremo Oeste Baiano, quando passa a se chamar Mapitobá.

Tendo em vista que a formação da região do Mapito mantém muitas diferenças

em relação a esta parte do estado da Bahia, optou-se por estudá-las

separadamente. As principais semelhanças entre essas regiões são o isolamento

em relação aos centros consumidores, deficiência viária e a presença de extensos

chapadões pouco ocupados. Diferem, por outro lado, no relevo, pois, enquanto a

parte oeste do Extremo Oeste Baiano se caracteriza por chapadões extensos, no

Mapito esse tipo de relevo se mescla com o relevo ondulado, limitando a

contiguidade de sua ocupação pela agricultura. Outra importante diferença foi a

resposta mais lenta do Mapito às políticas de modernização da agropecuária,

talvez mesmo por conta da “concorrência” com regiões como o Extremo Oeste

Baiano, que tanto contavam com melhores condições estruturais para a ocupação

quanto conseguiam canalizar mais recursos públicos nas décadas de 1970 e

1980.

A frente de expansão chegou à região do Mapito muito cedo, ainda no

início do Século XVIII, pelo sul do Maranhão, movida por criadores de gado

vindos da Bahia e de Pernambuco, que expulsaram os grupos indígenas desta

região (CABRAL, 1992) e viveram da venda do gado e da agricultura de

subsistência até o início da década de 1970. No decorrer da segunda metade da

década de 1970 já era possível perceber a substituição das pastagens naturais

por cultivadas, de forma pulverizada, em quase toda a cena, indicando que a

criação de bovinos iniciou nessa década um importante melhoramento técnico

(figura 4.8).

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Figura 4.8 – Evolução espaço-temporal na cobertura e uso da terra na área correspondente à Cena 221/66, localizada sobre a região do Mapito (Maranhão, Piauí e Tocantins). Fontes: Inpe e Nasa (imagens), Ibge (base cartográfica, censitária e classificação de solos e declividade)

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Antes da década de 1970 o estado do Maranhão contou com alguns

pequenos projetos de colonização agrícola, muitos deles financiados apenas com

recursos municipais e pouco expressivos. Foi no decorrer da década de 1970, no

período em que o governo militar mais investiu em grandes projetos nacionais,

que se instituíram os programas federais de modernização da agropecuária, dos

quais se destacam o Programa de Desenvolvimento de Áreas Integradas do

Nordeste (Polonordeste), de 1974, e o Programa Especial de Apoio ao

Desenvolvimento da Região Semi-Árida do Nordeste (Projeto Sertanejo), de 1976.

Além dessas fontes de financiamento, foram instituídos, no final de 1974, dois

importantes fundos constitucionais do governo federal, o Fundo de Investimento

do Nordeste (Finor) e o Fundo de Investimento Setorial (Fiset), que contemplaram

os estados do Maranhão e do Piauí.

Contudo, o programa que alcançou maior sucesso e poder de

influência na estrutura produtiva do Mapito foi o Prodecer III, implantado em 1995

nos municípios de Balsas, no Maranhão, e de Pedro Afonso, no Tocantins

(FERREIRA, 2008; SANTOS, 2011). Embora os municípios abrangidos pela cena

aqui estudada não tenham sido diretamente inseridos nesses programas

especiais, com exceção de Balsas, a proximidade com o Extremo Oeste baiano,

cuja ocupação tem ocorrido aceleradamente, e com o município de Pedro Afonso,

resultou na ampliação da agropecuária moderna para esse espaço. Auxiliando as

pesquisas agropecuárias, além da presença da Embrapa, o Mapito conta com a

Fundação de Apoio à Pesquisa do Corredor Norte (Fapcen), criada em 1993 por

iniciativa dos próprios agricultores e pecuaristas.

Os condicionantes naturais e antrópicos da cena estudada, de forma

geral, poderiam limitar aí o avanço da agropecuária. Os Latossolos Amarelos e

Neossolos Litólicos, ambos de textura arenosa, e que ocupam 90% da área, são

importantes fatores limitantes à agropecuária moderna (figura 4.8). O relevo

predominante é o montanhoso à escarpado, sendo que a porção plana localiza-se

em partes da área central, cujo acesso é dificultado pela quase inexistência de

vias asfaltadas. Por outro lado, a proximidade desta área com os biomas

Amazônia e Caatinga propiciam um regime de chuvas regulares, além de cursos

d’água perenes e abundantes. Assim, o impedimento da ocupação dessas áreas

pela agropecuária moderna só ocorreria se o custo da correção dos solos e do

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transporte onerasse a produção a ponto de ameaçar a competitividade, o que não

é o caso.

A exemplo do que ocorreu em outras áreas do Cerrado, também no

Mapito a substituição das pastagens naturais pelas cultivadas precedeu a

chegada da agricultura, que inicialmente ocupou as áreas mais planas e se

expandiu para as áreas de baixa declividade, até então ocupadas pelas

pastagens. Tal dinâmica é observada, por exemplo, no noroeste da cena (figura

4.8), uma das primeiras zonas ocupadas pelas pastagens cultivadas e que ao

longo dos anos deu lugar a um grande polígono dominado pela agricultura.

Concomitantemente, as pastagens cultivadas continuam a se expandir na cena,

todavia cada vez mais conformadas às porções onde o relevo é montanhoso ou

escarpado. Na figura 4.9, o “crescimento zero” das pastagens, entre os períodos

1986-1988 e 1988-1990, sugere que estas, substituídas pela agricultura,

induziram desmatamentos em busca de novas áreas para sua expansão.

Também constata-se que essa competição atinge seu auge coincidentemente ao

pico da agricultura, entre os intervalos de 2000-2002 e 2002-2004, quando a

pastagem apresenta a maior perda de área. À esta época, i.e. início da década de

2000, a agricultura começa a se aproximar da saturação, conforme sugerem o

recorde de desmatamento e nos modestos crescimentos tanto das pastagens

como da agricultura nos três últimos períodos analisados, ainda que a demanda

dos produtos agropecuários continuasse alta.

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Figura 4.9 – Taxa de participação percentual cumulativa da área ocupada por cada classe mapeada em relação à situação em 2010 na cena 221/66 (Mapito), no período de 1975 a 2010.

Analisando-se internamente a produção agrícola (figura 4.10), percebe-

se claramente dois momentos da ocupação do Mapito: o arroz, típico da abertura

de novas áreas para a agropecuária, é preponderante até meados da década de

1990, quando a soja se torna dominante, contudo ainda havendo presença do

cultivo de arroz, visto que a abertura de novas áreas ainda estava em curso.

Todavia, em face da lucratividade da soja, é de se pensar que após meados

dessa década muitas das áreas novas não passaram pelo cultivo do arroz, tendo

sido precedidas principalmente pela semeadura das pastagens. Também do

ponto de vista do trabalho aí empregado, tem-se a mesma clivagem: enquanto o

cultivo do arroz é em grande parte cultivada sem o uso de técnicas avançadas,

por isso empregando mais trabalhadores, a soja, ao se tornar dominante, libera

essa mão-de-obra, que tende migrar para as cidades, pois também a pecuária,

apesar de expandir, tem baixa capacidade de absorver todos esses

trabalhadores.

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4.7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Uma das características centrais do processo de expansão da moderna

tecnologia agrícola no Cerrado – caracterizado como expansão da fronteira

agrícola – é a sua heterogeneidade. Combinam-se fatores com influência em

diversas escalas, tais como ação estatal, infra-estrutura de produção e

escoamento, mercado, além da diversidade inerente à terra: topografia,

fertilidade, recursos hídricos e regime pluviométrico. Tendo esse pano de fundo,

os agentes econômicos – especialmente os migrantes do Sul do país – adotam

estratégias diferentes quanto ao que produzir e onde produzir. Dessa forma,

temos como resultado um mosaico com distintos usos da terra e também com

diferentes níveis de tecnologia.

O presente estudo mostra como a dinâmica mais recente de expansão

de fronteira ocorre em três áreas emblemáticas do Cerrado. Apesar de ser

Figura 4.10 – Evolução da área cultivada dos principais produtos agrícolas e do efetivo bovino dos municípios compreendidos pela cena 221/66, entre 1973 e 2010 (municípios de Campos Lindos, Centenário, Goiatins, Lizarda, Recursolândia, Rio Sono, Alto Parnaíba, Balsas, Carolina, Riachão, Sambaíba, Tasso Fragoso, Gilbués, Ribeiro Gonçalves e Santa Filomena).

Fonte: IBGE, 2012.

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possível perceber uma dinâmica geral para o bioma, as análises específicas são

particularmente reveladoras da articulação dos distintos fatores que interferem

nesse processo. Assim, em cada caso analisado foi possível identificar os fatores

que influenciaram de forma mais significativa na mudança do uso da terra.

A análise das três áreas de fronteira em estudo revelou que a

ocupação do Cerrado, promovida a partir da década de 1970, criou um novo

modelo de exploração dos recursos naturais, com base na agricultura moderna e

profundamente heterogêneo no tempo e no espaço. No primeiro momento de

ocupação, antes da inserção da agricultura moderna, tem-se em comum, nas três

áreas investigadas, a predominância de atividades não voltadas prioritariamente

para o mercado, como a criação extensiva de gado e a agricultura em fundos de

vale e nas áreas com maior declividade. Entretanto, em porções do Mato Grosso

ocorre uma dinamização rápida, visível já no final da década de 1970, pois a

proximidade do estado com os grandes centros consumidores fomentou a

agricultura em escala industrial, voltada à exportação. Na porção do Extremo

Oeste Baiano, essa dinamização só corre a partir de meados da década de 1980

e no Mapito a partir de 1994.

As três áreas de fronteira aqui analisadas mantém algumas

semelhanças. Todas elas partiram de um ambiente pouco explorado na década

de 1970, com muitos chapadões, e passaram por um rápido processo de

desmatamento e plantio de pastagens e commodities, com destaque para a soja.

A adoção das modernas técnicas de produção foi induzida pelo Estado, que

passou a atuar menos intensamente assim que boa parte dos produtores se

consolidou e a iniciativa privada passou a explorar e a financiar parte da

produção.

Por outro lado, há diferenças importantes. Uma delas é a composição

do fluxo migratório. No Mato Grosso, além dos sulistas, que eram maioria, houve

a migração de paulistas, sobretudo os que se dedicavam à pecuária, impelidos

pelo aumento do preço das terras no Estado de São Paulo. O Extremo Oeste

Baiano contou com maior presença de sulistas (HAESBAERT, 1996). O Mapito

atraiu muitos sulistas, mas também migrantes de áreas como o Mato Grosso,

onde as condições eram menos favoráveis, como o preço da terra e a distância

dos portos. Esta dificuldade com os transportes é outra grande discrepância, pois,

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o Extremo Oeste Baiano e o Mapito, apesar de não contarem com densa rede

viária próxima das áreas de cultivo, conseguem menor custo com transporte, ao

que se soma o menor preço das terras e as grilagens, ainda presentes.

O Mapito, embora considerado como uma extensão do modelo de

ocupação do Extremo Oeste Baiano (e por esta razão, muitas vezes denominado

Mapitobá), só passou a ser ocupado de forma acelerada a partir da década de

1990, quando o poder público começa a deixar de financiar grandes projetos, o

que, aliado à estabilidade econômica que se iniciava, bem como à certeza de

mercado, possibilitou a concentração de grandes produtores e empresas

(BARROS, 2010).

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq) (Edital Universal e bolsa de produtividade em

pesquisa PQ IC para o segundo autor), da Coordenação de Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior (Capes) (Bolsa de doutorado para o primeiro e terceiro

autores) e da Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg).

Suporte financeiro para esta pesquisa também foi obtido junto à United States

National Aeronautics and Space Administration (Nasa) – Land-Cover and Land-

Use Change Program (LCLUC) (NNX11AE56G), em parceria com o Woods Hole

Research Center.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Devido à sua divisão em artigos, as principais conclusões desta

pesquisa já constam do final de cada uma dessas partes. Ainda assim, procura-se

aqui avançar na sintetização de questões que perpassam os temas internos e

externos à pesquisa.

Esta pesquisa insere-se num contexto histórico de crescimento das

preocupações acerca das rápidas transformações sociais e ambientais do bioma

Cerrado. Instituições públicas e privadas, nacionais e internacionais, tem

ampliado o apoio às ações e estudos acerca desse tema, cujo um dos produtos é

esta tese, que contou com os apoios mencionados nos artigos.

A estratégia de pesquisa de mapeamento da cobertura e uso da terra a

partir de imagens revelou, por um lado, a importância dos dados históricos para

os estudos espaciais do Cerrado e, por outro, o grande trabalho necessário para

se mapear essas séries para todo o bioma e se alcançar um produto capaz de

auxiliar estudos de pequena à grande escala. Neste sentido, destaca-se, a

reconstrução dos limites municipais para o mapeamento de dados censitários

históricos (a partir de 1970), os quais não são disponibilizados pelo IBGE.

A individualização do estudo das pastagens cultivadas no primeiro

artigo, bem como sua recorrência nos dois últimos, mostrou-se uma boa escolha

na pesquisa, pois avançou na compreensão de como a pecuária se distribui no

espaço e como os fatores naturais e antrópicos interferem nessas localizações. A

evidenciação da sua competição com a agricultura, sobretudo onde o preço da

terra é maior, clarificou algumas questões importantes: a) a disposição espacial

dos diferentes tipos de solo e relevo é a maior força modeladora das localizações

da pecuária e da agricultura no Cerrado; b) por outro lado, a proximidade dos

maiores centros urbanos consumidores (i.e. a demanda), faz com que a pecuária

consiga inverter a lógica dominante, ocupando terras requeridas pela agricultura,

necessitando, em contrapartida, elevar seu padrão técnico produtivo e sua

lucratividade. Essa inversão das localizações é vista nas proximidades das

regiões metropolitanas, enquanto nas novas fronteiras agrícolas, distantes desse

tipo de mercado, ainda predomina a regra primária das localizações, i.e. com a

agricultura de grãos dominando as áreas mais planas e com maior fertilidade.

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O papel do estado como indutor da ocupação do Cerrado, por ser

evidente e já muito debatido na literatura, não representa uma novidade desta

pesquisa. Todavia, a demonstração cartográfica da distribuição dos programas

federais no Cerrado representa um avanço e se mostra como uma importante

ferramenta para o entendimento da modernização da agropecuária. Ainda sobre o

financiamento público da produção, verifica-se que a mudança na ação do Estado

no Cerrado, a partir de meados da década de 1990, ainda se encontra em fase

inicial, apesar de sua importância. A presença de grandes grupos agroindustriais

nacionais e internacionais, como a Dreyfus, Bunge, Cargil e outras abrindo a

fronteira agrícola no Mapito (SAUER; LEITE, 2012) evidencia essa mudança do

papel do estado de indutor para acessório na agropecuária moderna.

A pesquisa aqui apresentada possibilitou maior compreensão dos

processos de ocupação do bioma Cerrado, desencadeado a partir da década de

1970. A principal característica deste processo foi a expansão da fronteira

agrícola brasileira no Cerrado aos moldes da produção da agropecuária moderna,

visando à produção de commodities para o abastecimento interno e,

principalmente para exportação. Esse modelo se estabeleceu ao longo do

Cerrado com diferenças espaciais e temporais, fazendo do Brasil um dos maiores

produtores e exportadores de grãos e de carne no mundo. No entanto, resultou

também, na fragmentação espacial da paisagem e em profundas mudanças

sociais no campo e na cidade.

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APÊNDICE A: METODOLOGIA DE PROCESSAMENTO DAS IMAGENS4

1 Cenas utilizadas

A escolha da cena do centro-sul de Goiás se deu em função do seu

histórico de mudança de uso e cobertura da terra, pois é uma das mais antigas

áreas de povoamento do Cerrado e onde a alta tecnologia de produção

agropecuária chegou mais cedo, no início da década de 1970. As outras três

cenas compõem a atual fronteira agrícola do Cerrado, onde a produção de

commodities tem mudado rapidamente o ambiente, como se pode ver pelos

mapeamentos do uso e cobertura da terra de 2002 (Probio) e dos alertas de

desmatamento ocorridos entre 2002 e 2010 (figura 1).

Figura 1 – Mapeamento do uso e cobertura da terra realizado pelo Probio em 2002 e alertas de desmatamentos gerados pelo Siad Cerrado para o período de 2002 a 2010, com destaque para a localização das cenas Landsat selecionadas para o presente

estudo.

4 Baseado no artigo intitulado “Mapeamento de mudança de uso e cobertura da terra no bioma Cerrado

entre 1975 e 2010 a partir da classificação de imagens Landsat”, aceito para publicação no XVI Simpósio

Brasileiro de Sensoriamento Remoto, tendo como autores Elaine Barbosa da Silva, Genival Fernandes

Rocha, Antonio Fernandes dos Anjos, Laerte Guimarães Ferreira Jr., Adriano Faria, Janete Rego Silva e

Arielle Elias Arantes.

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2 Etapas metodológicas do processamento das imagens

O mapeamento da mudança de uso e cobertura da terra seguiu as

etapas mostradas na figura 2.

Figura 2 – Fluxograma das etapas metodológicas do mapeamento de uso e cobertura da terra.

Foram utilizadas imagens do satélite Landsat devido à boa resolução

espacial, à disponibilidade de cenas para longo período e à gratuidade de sua

aquisição. O recorte temporal deste trabalho foi de 1975 a 2010, tendo sido

necessário utilizar imagens dos três sensores da série Landsat: MSS (80 m), TM

(30 m) e ETM+ (30 m). As cenas de cada ano foram escolhidas entre os meses

de junho a setembro, haja vista ser este o período de menor ocorrência de nuvens

e aerossóis no Cerrado, ou seja, imagens com menos interferências atmosférica.

Para o período de 1975 a 1981 foi necessário formar mosaicos com

quatro cenas do sensor MSS para cobrir a área equivalente à de uma cena do

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sensor TM, uma vez que as órbitas-pontos destes sensores são diferentes.

Devido à variação na posição das imagens TM, foi feito um recorte com a região

da cena que aparecia em todos os anos, reduzindo a área da cena de 180 km2

para 160 km2, a qual também foi utilizada para as cenas MSS. De 1982 a 1985

não houve imagens disponíveis. Após esse período foram obtidas imagens com

intervalo de dois anos (quadro 1).

Quadro 1 – Cenas Landsat utilizadas no estudo.

Período Cenas por sensor

Sensor Quantidade

1975 / 1981 MSS 64

1986 / 2000 TM 32

2002 ETM+ 4

2004 / 2010 TM 16

Total 116

A correção geométrica das imagens foi realizada por meio do processo

imagem com imagem a partir do mosaico GeoCover S23-10 2000, adquiridas

junto ao portal da National Aeronautics and Space Administration (Nasa)

(https://zulu.ssc.nasa.gov/mrsid/). O erro médio admitido foi de 0,6 pixels. Neste

processo, utilizou-se composição colorida RGB 543 por considerá-la melhor para

identificar os usos da terra (figura 3 a).

O processo de classificação de imagens foi o supervisionado com

segmentação (fragmenta uma região e unidades homogêneas, considerando

características como o nível de cinza dos pixels e a textura) por meio do algoritmo

de agrupamento Bhattacharya (Moreira, 2011), no software Spring, que

apresentou o melhor resultado. Os parâmetros usados para a segmentação

foram: similaridade de 35% e área mínima de 20 pixels. Para a classificação

utilizaram-se 15 temas e 25 interações (Inpe, 2010).

Após o processo de segmentação, foi feito a coleta de amostras

(treinamento) para realizar a classificação da imagem. O objetivo deste

mapeamento foi o de gerar as classes vegetação, agricultura e pastagem. No

entanto, para obter uma boa separação dos elementos presentes nas imagens foi

necessária a criação de várias subclasses. Para a vegetação foi necessário criar

mais de uma classe para cada fitofisionomia (i. e., cerrado denso_1; cerrado

denso_2; cerrado_ralo1; cerrado_ralo2, etc.), devido ao complexo comportamento

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espectral de cada uma delas. O mesmo ocorreu com a agricultura, como pode ser

verificada na letra “b” da figura 3. No final deste processo, estas várias subclasses

de vegetação foram integradas em uma única classe e, o mesmo tendo sido feito

para as subclasses de agricultura.

a) imagem não classificada (RGB 543) b) imagem classificada

Figura 3 – Imagem antes e depois do processo de classificação no Spring versão 5.2.1

Para subsidiar a interpretação dos alvos, foram utilizadas imagens de

alta resolução disponibilizadas online pelo Google Earth. No entanto, nem todas

as áreas que apresentavam dificuldades de interpretação estavam cobertas pelas

imagens de alta resolução, o que dificultou a distinção dos alvos nestas áreas.

Dentre as principais dificuldades destacam-se a confusão entre pastagem e

cerrado ralo e entre cerrado ralo e agricultura, principalmente nas cenas 220/68 e

221/66. A similaridade do comportamento espectral desses alvos resultou na

confusão entre pixels vizinhos de classes distintas. Assim, áreas próximas, mas

com distintos usos foram classificadas como uma única classe. Para se melhorar

a distinção desses alvos os arquivos vetoriais gerados passaram por criteriosa

inspeção visual e foram validados com dados de campo. Nas letras a, b e c da

figura 4 tem-se o exemplo de uma área de vegetação parcialmente classificada

como agricultura, enquanto as letas d, e e f referem-se à confusão espectral entre

vegetação rala e pastagem. Verificou-se em campo que esse tipo de confusão

ocorre onde a vegetação é rala e está sobre solo arenoso, fato que influencia na

segmentação e na classificação da imagem. Esses comportamentos foram

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verificados em toda a porção sul e leste da cena 220/68 e também na porção

leste e oeste da cena 221/66, todas com significativa quantidade de solo arenoso.

a) Imagem segmentada. Várias segmentações em áreas com mesmo uso. Coord. 12°01’ 20.66” S; 46° 02’ 26.41” O

b) Imagem classificada. Confusão parcial de vegetação com agricultura.

c) Foto da sequência a e b. Soja ao fundo e detalhes da vegetação rala sobre solo arenoso.

d) Imagem segmentada. Várias segmentações em áreas com a mesma ocupação. Coord. 12°16’ 39.11” S; 45° 50’ 37.94” O

e) Imagem classificada. Vegetação rala classificada como pastagem.

f) Foto da sequência d e e.

Figura 4 – Demonstrativo de áreas classificadas erroneamente e validação em campo.

Outra interferência no comportamento espectral dos alvos e na

interpretação das imagens são as multiplicidades de usos em uma mesma área. É

comum encontrar áreas de agricultura próximas de áreas ocupadas por

pastagens. Isso se deve ao fato do crescimento do sistema de rotação entre

pastagem e lavoura. Embora, esses alvos tenham sido bem separados no

processo de segmentação, na etapa de classificação houve confusão entre esses

alvos. Após a realização do trabalho de campo percebeu-se que os problemas

mencionados anteriormente estavam presentes em todas as cenas. Portanto,

para se chegar a uma escala próxima de 1/100.000, optou-se por utilizar apenas

os polígonos gerados no processo de segmentação e classificação das imagens e

através deles proceder a nova inspeção visual. Desta forma, todas as classes

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criadas foram consideradas como vegetação e sobrepondo os polígonos com a

imagem bruta realizou-se a nova inspeção, polígono a polígono (figura 5).

a) Polígonos obtidos

após a classificação por segmentação.

b) Polígonos sobrepostos a imagem bruta e nova etapa de inspeção visual

c) Processo de inspeção e criação das novas classes concluído.

Figura 5 – Processo de inspeção visual realizada após processo de classificação por segmentação.

Para minimizar o tempo gasto no processo de inspeção visual, a classe

de uso de um ano foi exportada e inserida na imagem seguinte (e. g., o uso de

1975 foi inserido no ano de 1977) e conferido se não havia ocorrido alguma

mudança de uso, pois uma área com pastagem em um ano pode ser convertida

em agricultura no outro e vice-versa, por exemplo. O resultado mostrou-se

satisfatório, inclusive a comparabilidade entre as imagens MSS e as TM e ETM+.

A escala aproximada do mapeamento final, de 1/100.000, mostrou-se apropriada

para estudos microrregionais.

3 Considerações

A boa qualidade das imagens Landsat e sua longa cobertura temporal,

além da gratuidade de aquisição, fazem delas um ótimo meio de estudo de

mudanças de uso e cobertura da terra. O período de dois anos entre as imagens

mostrou-se razoável para as cenas estudadas, que foram modificadas muito

rapidamente nas últimas três décadas, em função da produção de commodities.

Para o estudo de áreas de ocupação menos acelerada é possível adotar períodos

maiores entre as imagens.

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Destaca-se a dificuldade do software Spring em trabalhar com grandes

volumes de dados, sendo comum o travamento e a perda de dados durante a

conversão de dados matriciais em vetoriais. Outro problema encontrado foi na

segmentação das áreas que possuem muitos usos, com predominância de

pastagem, onde o software teve grande dificuldade de separar os alvos

pastagem, vegetação rala e agricultura, resultando na redução das demais

classes à de pastagem ou agricultura. Isto demandou maior trabalho com a nova

etapa de inspeção visual e redefinição das classes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Tutorial Spring 10 aulas – Spring 5.2. Disponível em: < http://www.dpi.inpe.br/spring/portugues/manuais.html >. Acesso em: jan. 2010. MOREIRA, M. A . Fundamentos do Sensoriamento Remoto e Metodologias de Aplicação. 4. ed. Viçosa: Ed. UFV, 2011.