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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ NÚCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZÔNICOS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DO TRÓPICO ÚMIDO EDUARDO LIMA DOS SANTOS GOMES A DINÂMICA DAS ORGANIZAÇÕES TURÍSTICAS E O CONSUMO DE ÁGUA EM SÃO LUÍS (MA) E BELÉM (PA) Belém, PA 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAR

NCLEO DE ALTOS ESTUDOS AMAZNICOS PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL

DO TRPICO MIDO

EDUARDO LIMA DOS SANTOS GOMES

A DINMICA DAS ORGANIZAES TURSTICAS E O CONSUMO DE GUA EM SO LUS (MA) E BELM (PA)

Belm, PA 2018

EDUARDO LIMA DOS SANTOS GOMES

A DINMICA DAS ORGANIZAES TURSTICAS E O CONSUMO DE GUA EM SO LUS (MA) E BELM (PA)

Tese apresentada como requisito para obteno do ttulo de Doutor em Desenvolvimento Socioambiental, pelo Ncleo de Altos Estudos Amaznicos, Universidade Federal do Par. Orientao Cientfica: Profa. Dra. Ligia Terezinha Lopes Simonian.

Belm, PA 2018

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) (Biblioteca do NAEA/UFPA)

Gomes, Eduardo Lima dos Santos A dinmica das organizaes tursticas e o consumo de gua em So Luis (MA)

e Belm (PA); Orientadora, Ligia T. L. Simonian. - 2018.

221 f.: il.; 29 cm Inclui bibliografias

Tese (Doutorado) Universidade Federal do Par, Ncleo de Altos Estudos

Amaznicos, Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Sustentvel do Trpico mido, Belm, 2018.

1. Dinmica das organizaes tursticas So Luis (MA). 2. Dinmica das

organizaes tursticas Belm (PA) . Consumo de gua. 3. Mercado Desenvolvimento sustentvel. I. Simonian, Ligia T. L., Oientadora. II. Ttulo.

CDD 21. ed. 338.9

Elaborada por Rosngela Caldas Mouro

CRB-2/888

EDUARDO LIMA DOS SANTOS GOMES

A DINMICA DAS ORGANIZAES TURSTICAS E O CONSUMO DE GUA EM SO LUS (MA) E BELM (PA)

Tese apresentada como requisito para obteno do ttulo de Doutor em Desenvolvimento Socioambiental, pelo Ncleo de Altos Estudos Amaznicos, Universidade Federal do Par.

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Ligia Terezinha Lopes Simonian Orientadora PPGDSTU/NAEA/UFPA Profa. Dra. Mirleide Chaar Bahia Examinadora Interna PPGDSTU/NAEA/UFPA Prof. Dr. Hisakhana Pahoona Corbin Examinador Interno PPGDSTU/NAEA/UFPA Profa. Dra. Ponciana Freire de Aguiar Examinadora Externa PPGGP/NAEA/UFPA Profa. Dra. Marilena Loureiro da Silva Examinadora Externa - PPGEDAM/NUMA/UFPA Profa. Dra. Gisalda Carvalho Filgueiras Examinadora Externa PPGECO/ICSA/UFPA

Ao meu sobrinho, Leandro Gomes Ribeiro (in memoriam).

AGRADECIMENTOS

Ao CNPq pela concesso de Bolsa GDE, processo 234821/2014-0;

Senhora Sandra Rodrigues Braga, da Coordenao do Programa de

Pesquisa em Cincias Sociais Aplicadas e Educao (COSAE/CNPQ), pelo

acompanhamento do meu processo;

Ao PPGDSTU/NAEA/UFPA, nomeadamente Coordenao e Secretaria

Acadmica;

FACTUR/ICSA/UFPA, especialmente Direo Acadmica, aos colegas

docentes e Tcnicos Administrativos;

Ao DETUH/CCSO/UFMA, pelo apoio logstico durante as fases de

desenvolvimento da pesquisa de campo, sobretudo Chefia de Departamento, aos

colegas docentes e ao Tcnico Administrativo;

Ao Prof. Dr. Silvio Figueiredo (PPGDSTU/NAEA/UFPA), pelo prstimo e

incentivo;

Profa. Dra. Ligia Simonian (PPGDSTU/NAEA/UFPA), pelo aceite na

orientao e pelo acompanhamento na produo desta tese;

amiga, Monica Arajo, pela amizade, companheirismo, apoio, hospitalidade

e ajuda nas horas mais dificieis. No tenho palavras para expressar o meu muito

obrigado;

Ao amigo, Lcio Bentes, pela amizade e companheirismo ao longo deste

processo de doutoramento;

Fernanda Carvalho pela ajuda na pesquisa de campo em So Lus (MA);

E, de um modo geral, agradeo a todo (a)s aquele (a)s, que perto ou longe e

mesmo com o mnimo de ateno, apoiaram-me na realizao deste trabalho, com

seus saberes, palavras afveis, respeito, prstimo, orao e, acima de tudo,

compreenso nas minhas ausncias, no meu mau humor frequente e nos momentos

mais intensos na finalizao desta tese. Destaco os meus pais, Olavo e Deusarina;

minhas irms, Lienne, Luciana e Regiane; meu irmo Caio; sobrinhos, Luan, Lucas,

Arthur; Aliete Abenoada, Cristina e Igor, Cecilia e Ibrahim, Moema Raya, Maria

Costa, Neila Cabral, Silvia Helena Cruz, Marinete Boulhosa, Mrcia Lopes,

Silvaneide Corte Brilho, Madalena Freire, Tricia Amoras, Adriana Lima, ngela

Negro, Jacqueline Honorato, Flvia Gomes, Coronel Firmino Gomes e Famlia,

dentre outros.

RESUMO

Esta tese discute os limites e as possibilidades do recurso natural gua tornar-se

oportunidade de vantagem competitiva no setor de turismo, particularmente nas

organizaes tursticas de meios de hospedagem. Nessa perspectiva, surgem os

questionamentos acerca do lugar e do papel destas organizaes tursticas no

cenario poltico e socioambiental da gua. Com isso, o objetivo foi analisar em que

medida as implicaes do consumo de gua posicionam as organizaes tursticas

de meios de hospedagem de So Lus (MA) e Belm (PA), a formulao de

estratgias de sustentabilidade para a eco-inovao. Para tal baseia-se numa

reviso de literatura sobre as teorias que explicam o desenvolvimento econmico, a

partir de uma viso schumpeteriana e neoschumpeteriana, assim como a

abordagem do desenvolvimento sustentvel na via para a sustentabilidade da gua

no setor de turismo. Com base na reviso de literatura, uma hiptese foi sugerida e

testada na parte emprica da tese atravs de uma anlise da dinmica das

organizaes tursticas concernente s implicaes do consumo de gua nestas

duas cidades amaznicas, em questo. A metodologia teve a orientao

interdisciplinar entre a economia e a antropologia, por meio do desenvolvimento da

pesquisa qualitativa de tipo exploratria, descritiva e explicativa com o procedimento

do estudo de caso de carter mltiplo. Para isso, utilizou-se a tcnica da entrevista

semiestruturada com a aplicao do instrumento formulrio. Esta anlise baseia-se

em dados obtidos atravs de entrevistas-formulrio realizadas aos gestores das

organizaes tursticas e concessionrias de gua. Os resultados obtidos mostram

que as estratgias adotadas pelas organizaes tursticas so meramente paliativas

diretamente proporcionais otimizao de custos financeiros. Com isto, salienta-se

a importncia da questo da gua para a pesquisa, principalmente em face s

possibilidades de crescente crise hdrica e, no setor de turismo, a gua pode ser

uma oportunidade de estratgia de sustentabilidade para a eco-inovao,

promovendo o turismo responsvel e inteligente.

Palavras-Chave: Dinmica das organizaes tursticas. Consumo de gua. So Lus (MA). Belm (PA).

ABSTRACT

This thesis discusses the limits and possibilities of the natural water resource to

become an opportunity of competitive advantage in the tourism sector, particularly in

tourist accommodation organizations. From this perspective, questions arise about

the place and role of these tourist organizations in the political and

socioenvironmental water scenario. Therefore, the objective was to analyze the

extent to which the implications of water consumption position the tourist

organizations of accommodation, in So Lus (MA) and Belm (PA), the formulation

of sustainability strategies for eco-innovation. For this purpose, the study is based on

a review of the literature on theories that explain economic development from a

Schumpeterian and Neoschumpeterian view, as well as the approach to sustainable

development on the path to water sustainability in the tourism sector. Based on the

literature review, a hypothesis was suggested and tested in the empirical part of the

thesis through an analysis of the dynamics of tourism organizations concerning the

implications of water consumption in these two amazonian cities in question. The

methodology had the interdisciplinary orientation between economics and

anthropology, through the development of qualitative research of an exploratory,

descriptive and explanatory type with the procedure of the case study of multiple

character. For this, the technique of semi-structured interview with the application of

the instrument form was used. This analysis is based on data obtained through

interviews-formulary aimed at chief executives of the tourism organizations and water

companies. The results show that the strategies adopted by tourism organizations

are merely palliative measures directly proportional to the optimization of financial

costs. With this, the water issue, especially in the face of the possibilities of a growing

water crisis, becomes important for research and, in the tourism sector, water can be

an opportunity for sustainability strategy for eco-innovation, promoting the

responsible and smart tourism.

Key-Words: Dynamics of tourism organizations. Water consumption. So Lus (MA). Belm (PA).

LISTA DE ILUSTRAES

Mapa 1- Localizao geogrfica das reas de pesquisa. Projeto do mapa...................................................................................... 21

Grfico 1- Contribuio direta da atividade turstica para o PIB/Brasil... 68

Grfico 2- PIB So Lus (MA)................................................................. 112

Grfico 3- IDHM So Lus (MA).............................................................. 112

Grfico 4- PIB Belm (PA)...................................................................... 117

Grfico 5- IDHM Belm (PA).................................................................. 117

Mapa 2- Distribuio espacial das OTMH de So Lus (MA). Projeto do mapa: E. Gomes, W. Fernandes, J. Alves, 2018........... 148

Mapa 3- Distribuio espacial das OTMH de Belm (PA). Projeto do mapa: E. Gomes, W. Fernandes, J. Alves , 2018................. 149

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Diagrama dos elementos conceituais do pensamento econmico schumpeteriano................................................................................ 44

Figura 2 - Diagrama da fundamentao microeconmica evolucionria......... 51

Figura 3 - Cadeia de Distribuio Turstica...................................................... 62

Figura 4 - Censo Demogrfico de So Lus (MA)............................................ 111

Figura 5 - Censo Demogrfico de Belm (PA)................................................. 116

Figura 6 - Abastecimento de gua de So Lus (MA)...................................... 123

Figura 7- Plo Belm....................................................................................... 130

Figura 8 - Identidade visual Hotel..................................................................... 151

Figura 9 - Identidade visual Resort................................................................... 151

Figura 10 - Identidade visual Hotel Fazenda...................................................... 152

Figura 11 - Identidade visual Cama e Caf........................................................ 152

Figura 12 - Identidade visual Hotel Histrico...................................................... 153

Figura 13 - Identidade visual Pousada............................................................... 153

Figura 14 - Identidade visual Flat/ Apart Hotel................................................ 154

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 -

Quadro 2 -

Padro tipo de inovaes ou regimes tecnolgicos......................

Caracterizao das OTMHSLS (Rede ou Familiar, Habilitao Acadmica, Gnero), So Lus (MA), 2017..................................

41

156

Quadro 3 - Caracterizao das OTMHBEL (Rede ou Familiar, Habilitao Acadmica, Gnero), Belm (PA), 2017.......................................

157

Quadro 4 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHSLS (Comportamento inovador, Posicionamento estratgico, Aes executadas), So Lus (MA), 2017.................

160

Quadro 5 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHBEL (Comportamento inovador, Posicionamento estratgico, Aes executadas), Belm (PA), 2017......................

161

Quadro 6 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHSLS (Indicadores tomada deciso, Demanda diversificada renovada, Cooperao tcnica UF/IF), So Lus (MA), 2017...................................................................................

162

Quadro 7 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHBEL (Indicadores tomada deciso, Demanda diversificada renovada, Cooperao tcnica UF/IF), Belm (PA), 2017.............................................................................................

163

Quadro 8 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHSLS (Economia de energia, Coleta seletiva de descarte energtico), So Lus (MA), 2017................................................

165

Quadro 9 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHBEL (Economia de energia, Coleta seletiva de descarte energtico), Belm (PA), 2017.....................................................

166

Quadro 10 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHSLS (NBR 15401, NBR 16534), So Lus (MA), 2017......

168

Quadro 11 - Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMHBEL(NBR 15401, NBR 16534), Belm (PA), 2017............

168

Quadro 12 - Consumo de gua nas OTMHSLS (Consumo perdulrio, Gerenciamento processo, Requalificao infraestrutura predial), So Lus (MA), 2017.....................................................................

172

Quadro 13 - Consumo de gua nas OTMHBEL (Consumo perdulrio, Gerenciamento processo, Requalificao infraestrutura predial), Belm (PA), 2017..........................................................................

173

Quadro 14 - Consumo de gua nas OTMHSLS (Comportamento demanda, Variveis comportamento demanda, Indicador de sustentabilidade para eco-inovao), So Lus (MA), 2017.........

176

Consumo de gua nas OTMHBEL (Comportamento demanda,

Quadro 15 - Variveis comportamento demanda, Indicador de sustentabilidade para eco-inovao), Belm (PA), 2017.............

177

Quadro 16 - Consumo de gua nas OTMHSLS (Poo artesiano, Bairro falta de gua), So Lus (MA), 2017....................................................

181

Quadro 17 - Consumo de gua nas OTMHBEL (Poo artesiano, Bairro falta de gua), Belm (PA), 2017.........................................................

182

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 -

Tabela 2 -

Chegada de turistas ao Brasil .........................................................

Distribuio da amostra com os DA/Belm ....................................

68

120

Tabela 3 - Abastecimento urbano de gua em Belm ..................................... 121

Tabela 4 - Abastecimento urbano de gua em So Lus (MA)................................................................................................. 122

Tabela 5 - Taxa mdia mensal % de ocupao dos meios de hospedagem de So Lus (2009 2014).............................................................. 126

Tabela 6 - Oferta de meios de hospedagem no Par........................................ 127

Tabela 7 - Indicadores da hotelaria em Belm, 2011-2015............................... 128

Tabela 8 - Nmero de turistas por plo turstico paraense, 2015..................... 134

Tabela 9 - Renda (US$) gerada pelo turismo no estado por plo turstico, 2015.................................................................................................. 134

Tabela 10 -

Tabela 11 -

Tabela 12 -

Nmero de turistas e Gasto de turistas no Crio de Nazar, 2014-2015..................................................................................................

Caracterizao das OTMHSLS (Categoria, UH, Cadastur), So Lus (MA), 2017................................................................................

Caracterizao das OTMHBEL (Categoria, UH, Cadastur), Belm (PA), 2017.............................................................................

137

155

155

LISTA DE SIGLAS

ABIH Associao Brasileira da Indstria Hoteleira

ABNT Associao Brasileira de Normas Tcnicas

AE Anurio Estatstico

ANA Agncia Nacional de guas

APEX Agncia de Promoo de Exportaes do Brasil

APL Arranjos Produtivos Locais

ABAE Associao Bandeira Azul da Europa

BELEMTUR Companhia Municipal de Turismo de Belm

BID Banco Inter-Americano de Desenvolvimento

BOH Boletim de Ocupao Hoteleira

CB Convention Bureau

CB54 Comit Brasileiro de Turismo

CBTS Conselho Brasileiro de Turismo Sustentvel

CADASTUR Cadastro de pessoas fsicas e jurdicas do setor de turismo

CAEMA Companhia de Saneamento Ambiental do Maranho

CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

CCSO Centro de Cincias Sociais

CELPA Centrais Eltricas do Par

CEMAR Companhia Energtica do Maranho

CHB Centro Histrico de Belm

CHSL Centro Histrico de So Lus

CMAD Comisso Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

CNPQ Conselho Nacional do Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

CPRM Servio Geolgico do Brasil

COSANPA Companhia de Saneamento do Par

COSAE Coordenao do Programa de Pesquisa em Cincias Sociais Aplicadas e Educao

DA Distrito Administrativo

DABEL Distrito Administrativo de Belm

DABEN Distrito Administrativo do Bengui

DAE Departamento de guas e Esgotos

DAENT Distrito Administrativo do Entroncamento

DAGUA Distrito Administrativo do Guam

DAICO Distrito Administrativo de Icoaraci

DASAC Distrito Administrativo da Sacramenta

DEGEIT Departamento de Economia, Gesto, Engenharia industrial e

Turismo

DETUH Departamento de Turismo e Hotelaria

DMC Distritos de Medio e Controle

ECO 92 Conferncia das Naes Unidas de Meio Ambiente e Desenvolvimento

EMBRATUR Instituto Brasileiro do Turismo

ETA Estao de Tratamento de gua

EUROSTAT Agncia Europeia de Estatstica

FAPESPA Fundao de Amparo Pesquisa e Estudos do Estado do Par

FEE Foundation for Environmental Education

FIEMA Federao das Indstrias do Estado do Maranho

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

IBH Instituto Brasileiro de Hospedagem

IDHM ndice de Desenvolvimento Humano Municipal

IES Instituies de Ensino Superior

INFRAERO Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroporturia

IPHAN Instituto do Patrimnio Histrico Nacional

LAENA Laboratrio de Anlises Espaciais Prof. Thomas Peter Hutienne

MA Maranho

MCA Metro de Coluna Dgua

MTUR Ministrio do Turismo

MIV Manual de Identidade Visual

NAEA Ncleo de Altos Estudos Amaznicos

NBR Norma Brasileira

NIH Norma Tcnica de Implementao da Sustentabilidade em Meios de Hospedagem

ODS Objetivos do Desenvolvimento Sustentvel

OMT Organizao Mundial do Turismo

ONU

ONGA

Organizao das Naes Unidas

Organizao No-Governamental de Ambiente

OTMH

OTMHBEL

OTMHSLS

Organizao Turstica de Meios de Hospedagem

Organizao Turstica de Meios de Hospedagem Belm

Organizao Turstica de Meios de Hospedagem So Lus

PA Par

PARATUR Companhia Paraense de Turismo

PCTS Programa de Certificao de Turismo Sustentvel

PDA Plano de Desenvolvimento da Amaznia

PDT

PI

Programa Doutoral em Turismo

Piau

PIB Produto Interno Bruto

PEQT Programa Estadual de Qualificao no Turismo

PME Pequenas e Mdias Empresas

PNAS Programa Nacional de guas Subterrneas

PNT Plano Nacional de Turismo

PNRH Poltica Nacional de Recursos Hdricos

PPGDSTU Programa de Ps-Graduao em Desenvolvimento Sustentvel do Trpico mido

PQPMH Programa de Qualificao dos Pequenos Meios de Hospedagem

PRODETUR Programa de Desenvolvimento do Turismo

RM Regio Metropolitana

SBCLASS Sistema Brasileiro de Classificao de Meios de Hospedagem

SCIELO Scientific Electronic Library Online

SCOPUS Banco de dados de resumos e citaes de artigos para jornais/revistas acadmicos

SEBRAE/MA Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas do Maranho

SECTUR/MA Secretaria de Estado da Cultura e Turismo do Maranho

SEMA/MA Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hdricos do Maranho

SESC Servio Social do Comrcio

SETUR/PA Secretaria de Estado de Turismo do Par

SETUR SO LUS Secretaria Municipal de Turismo So Lus

SNGRH Sistema Nacional de Gesto de Recursos Hdricos

SPVEA Superintendncia do Plano de Valorizao Econmica da Amaznia

SUDAM Superintendncia do Desenvolvimento da Amaznia

SUDENE Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste

TAV Tubo Ajustador de Vazo

UA Universidade de Aveiro

UC Unidade de Conservao

UH Unidade Habitacional

UFMA Universidade Federal do Maranho

UFPA Universidade Federal do Par

UNESCO Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura

UNWTO World Tourism Organization

VRP Vlvula Reguladora de Presso

WTTC World Travel & Tourism Council

SUMRIO

1 INTRODUO........................................................................................... 16

2 METODOLOGIA....................................................................................... 25

3 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO ECONMICO SCHUMPETERIANA, TURISMO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL E GUA: ENFOQUES TERICOS.............................. 35

3.1 A via schumpeteriana da destruio criativa para a dinmica do desenvolvimento econmico................................................................ 36

3.2 A via neoschumpeteriana evolucionria para a dinmica do desenvolvimento econmico................................................................ 45

3.3 Turismo na via e contravia para o desenvolvimento econmico e social........................................................................................................ 55

3.4 Desenvolvimento sustentvel na via e contravia para a eco-inovao do turismo..............................................................................

73

3.5 A gua na via para o desenvolvimento sustentvel do turismo........ 95

4 CARACTERIZAO DAS REAS DE PESQUISA................................ 108

4.1 So Lus (MA): aspectos histricos e atuais de uma cidade multirregional.......................................................................................... 108

4.2 Belm (PA): aspectos histricos e atuais de uma cidade estuarina amaznica............................................................................................... 113

4.3 So Lus (MA) e Belm (PA): consideraes e desafios para o ordenamento territorial da gua............................................................ 118

4.4 O turismo em So Lus (MA) e Belm (PA): aspectos relevantes para um possvel processo de ordenamento territorial...................... 125

5 RESULTADO DA PESQUISA E DISCUSSO DOS DADOS................. 143

5.1 Distribuio espacial das OTMH........................................................... 147

5.1.1 OTMSLS................................................................................................... 148

5.1.2 OTMHBEL................................................................................................. 149

5.2 Caracterizao das OTMH...................................................................... 150

5.3 Potencialidades e estratgias para a sustentabilidade das OTMH.... 159

5.4 O consumo de gua nas OTMH............................................................. 171

6 CONCLUSO........................................................................................... 188

REFERNCIAS ....................................................................................... 196

APNDICES............................................................................................. 212

ANEXOS 218

16

1 INTRODUO

A sociedade atual tenta, h dcadas, incessantemente encontrar a via para o

futuro comum da humanidade (MORIN, 2016). Conforme aponta a literatura

(BRUSEKE, 1994; BURGENMEIER, 2009; CASTRO, PINTON, 1997; FENZL, 2009;

SACHS, 2004), desde a dcada de 1970, e mais precisamente a partir da dcada de

1990, inmeros dilogos foram feitos nas reunies internacionais, com resultados

positivos, apesar da resistncia de algumas naes.

Outrossim, diretrizes e mximas foram colocadas em discusso e orientou-se

que uma aproximao gradual entre os seres humanos e a natureza, buscando uma

salvaguarda possvel dos recursos naturais para as prximas geraes, a sada de

emergncia mais provvel para o planeta terra. Assim, conceitos foram construdos

e desconstrudos acerca de desenvolvimento e meio ambiente, e originaram-se

estudos relevantes que culminaram com o desdobrar do conceito de

desenvolvimento sustentvel.

notrio destacar que o desenvolvimento sustentvel favorece o crescimento

econmico centrado na integrao da economia com o social e o ecolgico, pois

sem essa conjugao tridimensional, possivelmente, as velhas prticas de

desenvolvimento no sero substitudas (BRUSEKE, 1994; SACHS, 2004; VEIGA,

2005). Desta maneira, para Burgenmeier (2009), o conceito de desenvolvimento

sustentvel passa a ser referncia inevitvel em qualquer debate que alie a proteo

do ambiente economia e ao mbito social.

Ento, verifica-se que estas premissas, obrigatoriamente, devem estar

correlatas para a operacionalizao do desenvolvimento sustentvel no mbito da

sociedade global com a orientao metodolgica mais apropriada para a insero

das dimenses de eficincia econmica, justia social e prudncia ecolgica nos

postulados de desenvolvimento alternativo.

Ademais, conforme Sachs (2004), o desenvolvimento sustentvel prope uma

forma de desenvolvimento em que os interesses particulares devem estar alinhados

aos interesses coletivos de conservao e desenvolvimento. A este respeito, a

questo crucial saber como conciliar, dentro desse modelo societal, a prossecuo

do crescimento econmico de produo e consumo com as necessidades atuais de

preservao e conservao ambiental sob a garantia do exerccio da tica poltica,

social e cultural.

17

Veigas (2005) aponta que o desafio para as prximas dcadas saber como

o enquadramento e a operacionalizao do desenvolvimento sustentvel, nas

atividades produtivas, sero as orientaes metodolgicas para a ressignificao da

produo e do consumo, rompendo com o estilo de desenvolvimento da mera

economia de mercado eficiente.

Assim sendo e de acordo com Foster (2010), os recursos naturais passam por

processos de esgotamento das fontes face necessidade de produo de bens e

servios para abastecer a sociedade capitalista. De fato, a apropriao sem a devida

precauo descortina um cenrio de escassez e de limites da explorao das fontes

dos recursos naturais, a exemplo dos recursos hdricos. Isso evidencia a

necessidade de tomada de deciso racional partilhada e mudana urgente de

padres de comportamento socioeconmico da sociedade.

Nisso, percebe-se que a questo da gua uma preocupao mundial e um

problema visvel em todas as estruturas econmicas dos pases, principalmente

quanto ao condicionamento referente sua disponibilidade e uso, o qual implica em

restries no fornecimento proveniente da extrapolao da capacidade de

distribuio normal pelas concessionrias, muitas vezes motivadas pelo aumento

exponencial do consumo perdulrio.

Esse cenrio promove uma vulnerabilidade, tanto para os usarios

residenciais quanto para os usarios comerciais. Assim, tem-se a gua como uma

necessidade vital para a humanidade e para a dinmica da economia capitalista.

Ento, a gua torna-se um desafio para a sustentabilidade do ambiente e para a

sobrevivncia humana.

De fato, como menciona Swyngedouw (2004), comprometer o seu ciclo

hidrossocial por meio de restries e constrangimentos socioambientais para o

empoderamento do crescimento econmico, a priori, agir com austeridade e

expropriao do direito cidado gua e do direito do ambiente de autossustentar-

se.

Pode-se verificar que a questo da gua est presente nas agendas polticas,

a exemplo, dos fruns mundiais, que foram criados, em 1996, pelo Conselho

Mundial da gua, com o propsito de estabelecer compromissos polticos e agendas

mnimas acerca dos recursos hdricos. Com isso, salienta-se que aconteceu no

18

Brasil, no perodo de 18 a 23 de maro de 2018, o 8 Frum Mundial da gua1,

(WORLDWATERFORUM, 2018, no paginado) com o propsito de estabelecer

compromissos polticos acerca dos recursos hdricos.

A esse respeito, ao trmino do Frum, foi elaborado o documento Declarao

de Sustentabilidade, que objetiva a uma mobilizao urgente de todos os setores

para garantir um futuro sustentvel para o mundo e o compromisso coletivo global

para enfrentar os crescentes desafios da gua. interessante destacar que nesta

declarao de sustentabilidade, a principal recomendao de que as atuais

polticas de recursos hdricos no sero suficientes para atingir as metas dos

Objetivos do Desenvolvimento Sustentvel (ODS).

Nesse mbito, faz-se necessrio destacar, conforme a Associao Bandeira

Azul da Europa2 (ABAE, 2016), o Programa Green Key, que foi criado durante o ano

de 2015, denominado pela Organizao das Naes Unidas (ONU) como o ano

decisivo para a sustentabilidade. Este Programa tem como objetivo reconhecer as

operaes sustentveis e responsveis no setor de turismo. Ademais, representa o

compromisso das organizaes tursticas, na adeso e cumprimento dos critrios

rigorosos estabelecidos a nvel internacional pela Foundation for Environmental

Education (FEE).

De acordo com o Programa, o setor de turismo constitui um importante

componente do desenvolvimento sustentvel e, com isso, os critrios do Green Key

contribuem para os objetivos estipulados pelas Naes Unidas, por meio do

crescimento econmico verde, produo e consumo sustentveis e o uso

sustentvel dos recursos naturais.

Em relao gua no setor de turismo, o Green Key tem o propsito de

promover a poupana da gua e a inovao nas solues implementadas nas

organizaes tursticas. O Programa monitora o consumo de gua e incorpora

medidas de reduo do consumo, melhoria na gesto das guas residuais e reduo

dos impactos negativos no meio ambiente. Com isso, uma das prioridades a

partilha das boas prticas na gesto da gua nas organizaes tursticas.

1 Disponvel em: www.worldwaterforum8.org/pt-br/home 2A ABAE uma Organizao No-Governamental de Ambiente (ONGA) sem fins lucrativos, dedicada educao para o desenvolvimento sustentvel e gesto e reconhecimento de boas prticas ambientais. A ABAE faz parte da Fundao para a Educao Ambiental (FFE), a qual agrupa entidades internacionais que em conjunto promovem atividades de sensibilizao e educao para o desenvolvimento sustentvel. Disponvel em:

http://www.worldwaterforum8.org/pt-br/homehttp://www.bandeiraazul.abae.pt/

19

Nessa acepo, Gossling (2015) sinaliza que nas organizaes tursticas,

principalmente as organizaes de meios de hospedagem, entretenimento e

alimentao, o consumo de gua intenso. Desta maneira, percebe-se estas

organizaes como consumidoras potenciais de gua e, consequentemente,

integram o ciclo hidrossocial da gua (COSTA, 2015; SWYNGEDOUW, 2004),

provocando relaes sociais assimtricas no territrio.

Mendes et al. (2012) definem o consumidor de gua como componente de um

sistema de abastecimento que possui elementos que interagem entre si e com o

ambiente. Para os autores, a garantia da manuteno do sistema passa pelo

entendimento das relaes entre os elementos e o ambiente que estes compem;

isso permite uma avaliao da sustentabilidade do sistema de forma a evitar

prejuzos sociais e ambientais.

Logo, percebe-se que a gua tambm uma questo crucial no setor de

turismo, tanto do lado da oferta como do lado da demanda. Em territrios perifricos

e deprimidos de desenvolvimento, a situao mais agravante, uma vez que a

ausncia de discusses e de planejamento de intervenes por meio de

instrumentos para medir a vulnerabilidade e o desempenho da gua, tanto no setor

do turismo como no binmio cidade-campo, compromete a qualidade do servio

prestado e gera srios constrangimentos socioambientais com visveis relaes

conflituosas em torno do acesso e manejo da gua.

Para tanto, urge-se por introduzir a questo da gua na perspectiva do

consumo nas organizaes tursticas, principalmente nas organizaes localizadas

em recortes deprimidos de desenvolvimento econmico, em que os conflitos

hidrossociais so intensos. Contudo, importante dotar-se de elementos de anlise

e instrumentos para formular proposies e medidas mais condizentes com a

realidade dos parmetros ecolgicos e sociais locais.

Desse modo, faz sentido compreender as relaes hidrossociais

estabelecidas nas organizaes tursticas, com vistas a colmatar as deficincias do

abastecimento, os custeios financeiros e, principalmente, a manuteno da

qualidade do servio prestado e o conforto dos hspedes, que Sinclair e Stabler

(2009) apontam como o dilema enfrentado nessas organizaes tursticas.

Nessa perspectiva, surgem os questionamentos acerca do lugar e do papel

das Organizaes Tursticas de Meios de Hospedagem (OTMH) no cenario poltico e

socioambiental da gua. A este respeito, os estudos de Gossling (2015) indicam a

20

preocupao com a apropriao e o manejo da gua nas organizaes tursticas e

suas consequncias para o desenvolvimento sustentvel. Nota-se que estas

organizaes tursticas, no perodo intenso de fluxos de turistas, provocam a

sobrecarga do consumo de gua e descortinam o ambiente favorvel

vulnerabilidade da estrutura, comportamento e performance econmicas.

Os estudos de Gossling (2015), de um modo geral, consideram a importncia

do uso e da aplicao de ferramentas de planejamento e gesto que permitam que

as organizaes tursticas possam inovar e colmatar as possveis transformaes

assimtricas, mais especificamente as transformaes relacionadas aos

constragimentos ambientais de exausto, rarefao e poluio dos recursos hdricos

ocasionados, muitas vezes, pela mobilidade espaciotemporal intensa dos fluxos

tursticos.

Nessa direo, para o desenvolvimento do referido estudo, escolheu-se como

as reas de pesquisa, as cidades brasileiras da Amaznia Oriental So Lus (MA) e

Belm (PA), conforme o Mapa 1, a seguir e abaixo; na qualidade de objeto de

estudo, as OTMH das duas cidades brasileiras, em questo; e como as unidades de

anlise, as implicaes do consumo de gua nas OTMH de So Lus (MA) e Belm

(PA).

21

Mapa 1- Localizao geogrfica das reas de pesquisa

Fonte: Projeto do mapa: E. Gomes e W. Fernandes,3 2017; LAENA/NAEA/UFPA

(2017).

Essas reas de pesquisa foram escolhidas por serem destinos indutores de

turismo, reconhecidos pelo Ministrio do Turismo (MTUR), e por So Lus (MA), de

acordo com a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranho (CAEMA), ter a

3 Fernandes, W. gegrafo do Laboratrio de Anlises Espaciais Prof. Thomas Peter Hurtienne (NAEA/UFPA).

22

problemtica do abastecimento de gua que, historicamente, em conformidade com

Pinheiro (2017), arrasta-se desde os tempos conflituosos entre Ana Jansen, a

matrona do Maranho, detentora das fontes de comercializao de gua, e a

Companhia do Anil, idealizada pelo engenheiro Teixeira Mendes.

Dessa maneira, a presente tese surgiu da necessidade de conhecer a

dinmica das OTMH dos referidos destinos tursticos indutores, respectivamente,

quanto questo fulcral da gua, nomeadamente na perspectiva das implicaes do

consumo como estratgia de sustentabilidade para a eco-inovao.

Sendo assim, buscou-se responder a seguinte problemtica: poder as

implicaes do consumo de gua posicionar as OTMH de So Lus (MA) e Belm

(PA), formulao de estratgias para o planejamento e a gesto da

sustentabilidade para a eco-inovao?

Nesse sentido, a partir da reviso da literatura (FIGUEIREDO; NBREGA,

2015), definiu-se como a hiptese central desta tese que o setor produtivo de

turismo na Amaznia Brasileira, nomeadamente em So Lus (MA) e Belm (PA),

vem h muito tempo trabalhando com a perspectiva do turismo como potencial, mas

sem conseguir efetiv-lo de fato como produto.

Consequentemente, como hipteses complementares: a tomada de deciso e

o posicionamento das OTMH, relacionados s implicaes do consumo de gua,

formulao de estratgias de sustentabilidade para a eco-inovao, como diferencial

e vantagem competitiva, so irrelevantes, uma vez que as estratgias adotadas so

meramente paliativas e diretamente proporcionais otimizao de custos

financeiros.

Logo, para a compreenso dessa realidade tardia e perifrica turstica, foi

proposto o seguinte objetivo geral: analisar em que medida as implicaes do

consumo de gua posicionam as OTMH de So Lus (MA) e Belm (PA) a

formularem estratgias de sustentabilidade para a eco-inovao, percebendo isso

como uma vantagem competitiva no mercado turstico. E, conectado a este objetivo

geral, tem-se os seguintes objetivos especficos:

i. Examinar o contexto poltico da gua e possveis conflitos hidrossociais na

capital maranhense e paraense;

ii. Caracterizar as OTMH de So Lus (MA) e Belm (PA);

iii. Analisar as potencialidades e estratgias de sustentabilidade para a eco -

inovao das OTMH de So Lus (MA) e Belm (PA);

23

iv. Verificar o consumo de gua nas OTMH de So Lus (MA) e Belm (PA).

Conforme Varum et al. (p. 316, 2016):

O EIO4 Methodological report (EIO, 2010) define a Eco Inovao como []the introduction of any new or significantly improved product (good or service), process, organisational change or marketing solution that reduces the use of natural resources (including materials, energy, water and land) and decreases the release of harmful substances across the life cycle.

A considerar a assertiva, ainda Varum et al. (2016) reforam a reflexo ao

mencionarem que a eco-inovao urge nesses tempos atuais como o diferencial

para a obteno de vantagem competitiva dentro da lgica dos mercados

sustentveis. Ento, Varum et al. (2017) salientam que a adoo de eco-inovaes

como benefcios ambientais para as organizaes, principalmente de servios

recente e no setor de turismo ainda mais.

Assim, percebe-se que a sustentabilidade para a eco-inovao pode contribuir

tanto para a diferenciao do produto como para a diferenciao do servio de

organizaes, e promover o desenvolvimento econmico, principalmente nos

territrios tursticos, que padecem de estratgias de planejamento e gesto com fito

atenuar a assimetria existente.

Nota-se que Coriolano (2007, p. 33) menciona que, de fato, no setor de

turismo, as assimetrias, ao nvel da relao sociedade e natureza, so ilaes

perceptveis. Para a autora, a atividade turstica associada s demais atividades

econmicas acarreta uma srie de impactos de natureza diversificada, que podem

ser agrupados em ambientais, socioculturais e econmicos. Todavia, salienta-se,

conforme Saarinen (2014), que embora as inmeras crticas, a sustentabilidade

turstica j uma realidade como estratgia de desenvolvimento simtrico.

Varum et al. (2017) salientam que, geralmente, para muitas organizaes que

operam no turismo (e tambm para outros setores), os avanos tecnolgicos abriram

a oportunidade de prestar o servio de maneira mais ecolgica. No entanto,

conforme as autoras, a adoo de prticas ambientais por organizaes

relacionadas ao turismo provavelmente ser mais uma resposta s mudanas do

lado da demanda.

4 Eco-Innovation Observatory. Disponvel em:

http://www.eco-innovation.eu/

24

De fato, Carvo (2010) corrobora ao apontar que h uma tendncia crescente

do lado da demanda por turismo: a conscincia ambiental. Para a autora, essa

conscincia ambiental tende a crescer entre turistas, gestores de destinos e

empresas, no que se refere incorporao de prticas de desenvolvimento

sustentvel na atividade turstica. No entanto, a autora adverte que a maioria dos

turistas ainda no incorpora as preocupaes ambientais na sua deciso de compra.

Com isso, ressalta-se que esta tese contribuir para o conhecimento acerca

de questes relacionadas s implicaes do consumo de gua e ao posicionamento

inovador e empreendedor das OTMH, especialmente de So Lus (MA) e Belm

(PA). Portanto, intenciona-se promover contributos, tanto para a academia, no

sentido de provocar reflexes acerca do uso dos recursos naturais, pelo e para o

setor de turismo, como para o mercado, no que tange orientao sobre as

estratgias de sustentabilidade para a eco-inovao das organizaes tursticas.

Este trabalho, quanto formatao, teve a seguinte estrutura: Introduo,

com a relevncia, a problemtica, a hiptese, os objetivos e as implicaes futuras

do estudo ora realizado. No segundo captulo, tem-se o percurso metodolgico da

tese. Apresentam-se as razes da metodologia adotada e a importncia do mtodo,

principalmente numa perspectiva ps-positivista e interdisciplinar.

Em Teoria do desenvolvimento econmico schumpeteriana, turismo,

desenvolvimento sustentvel e gua: enfoques tericos, terceiro captulo desta tese,

percorre-se por meio da teoria schumpeteriana e neoschumpeteriana do

desenvolvimento econmico, o caminho da compreenso acerca do posicionamento

das organizaes perante a necessidade de empreender e inovar para promover o

desenvolvimento econmico. Ainda nesse captulo, tem-se a discusso, numa

perspectiva de organizaes, acerca do turismo, desenvolvimento sustentvel e

gua, com autores expoentes que fazem uma dialogicidade com ilaes pertinentes.

No quarto captulo, tem-se a caracterizao das reas de pesquisa, a partir

dos aspectos histricos e atuais. Logo em seguida, tm-se as consideraes e os

desafios para o ordenamento territorial da gua e, por fim, a discusso do turismo,

nas duas capitais brasileiras, a partir dos aspectos relevantes para um possvel

processo de ordenamento territorial. J o quinto captulo, resultados da pesquisa e

discusso dos dados, apresentam-se os principais resultados encontrados com as

discusses validadas na reviso de literatura. E, ao final da tese, apresentam-se a

concluso e as referncias bibliogrficas utilizadas.

25

2 METODOLOGIA

A Amaznia um territrio construdo a partir de um patrimnio natural e

cultural que abriga a maior floresta tropical do planeta e tem uma

sociobiodiversidade distribuda em terras de fronteiras geopolticas do Centro Norte

da Amrica do Sul, a estender-se por nove pases, a saber: Bolvia, Brasil, Colmbia,

Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. A extenso

territorial do territrio amaznico equivale a 1/20 da superfcie da Terra. Possui 1/5

de toda a gua doce e 1/3 das florestas tropicais. Tal territrio tambm conhecido

como Pan-Amaznia ou Amaznia Internacional.

Silva et al. (2013) apontam que o espao amaznico brasileiro, ao longo de

sua histria, passou por um intenso processo de transformaes conjunturais e

contextuais, envolvendo diferentes atores e polticas, que estiveram associados a

interesses diferenciados, tanto na esfera local, quanto nacional e internacional.

Ento, percebe-se que a Amaznia Brasileira conhecida, de um modo geral, a

partir de sua funcionalidade, tanto como patrimnio natural quanto estratgia poltica

e econmica, tendo a sua biodiversidade disputada no cenrio geopoltico e

econmico internacional.

Verifica-se que o territrio amaznico pauta de discusso poltica nos

espaos coletivos de deliberao com a finalidade de encontrar meios eficazes de

conciliar desenvolvimento, sociedade e meio ambiente. Silva (2010) ressalta que a

Amaznia Brasileira deixou de ser um desafio para a sustentabilidade regional e

nacional e integra-se ao debate global em torno da sustentabilidade, uma vez que os

interesses e presses externas so direcionados para o territrio amaznico a fim de

produzir institucionalidades estratgicas de segurana planetria.

Bastos, Castro e Ravena (2011) apontam que o Ncleo de Altos Estudos

Amaznicos (NAEA), como uma unidade acadmica da Universidade Federal do

Par (UFPA), contempla todas as discusses acerca do processo de

desenvolvimento regional para e pela a Amaznia brasileira e Pan-Amaznia, ou

seja, conforme as autoras, preciso pensar a Amaznia brasileira como regio e

sociedade e, ao mesmo, tempo, suas relaes com as Amaznias de outros paises

fronteirios.

26

Ainda segundo Bastos, Castro e Ravena (2011, p. 647-648):

O NAEA se iniciou na Amaznia com os programas de ps-graduao em Planejamento e Desenvolvimento, a princpio especializao, em seguida mestrado e, mais tarde, doutorado. Como primeira iniciativa no norte brasileiro, desde seu incio se props a discutir o desenvolvimento dessa regio com base em paradigmas de sustentabilidade social e ambiental, de forma interdisciplinar, influenciando e irradiando as confluncias de ideias no cenrio regional, mas alargando-o na perspectiva pan-amaznica. Assim, em sua criao, evitou-se juntar um grupo de especialistas disciplinares que se debruasse sobre a complexidade regional como um patchwork de interpretaes, mas procurou-se, sim, encontrar um confluncia de metodologias de anlise em um crescendo interdisciplinar mais abrangente. E apesar de na sua fundao haver um grupo de professores unidisciplinares, que formava um bloco multidisciplinar, as discusses tericas e metodolgicas tentavam avanar para a interpretao interdisciplinar do desenvolvimento.

Dessa maneira, correspondendo s dinmicas e aos desafios inerentes ao

desenvolvimento sustentvel na Amaznia brasileira e Pan-Amaznia, a abordagem

metodolgica interdisciplinar faz-se presente nos programas de ps-graduao do

NAEA, pela relevncia que lhe reconhecida para a compreenso da realidade

amaznica. Neste contexto, a interdisciplinaridade marca as discusses conceituais

e metodolgicas como um convite ao debate relevante e necessrio para a evoluo

do conhecimento sistematizado, principalmente baseando-se na experincia

emprica.

Outrossim, percebe-se a relevncia da abordagem interdisciplinar para a

compreenso mais alargada, sensvel e comunicante do percurso metodolgico

adotado no fazimento desta pesquisa. Com isso, faz-se necessria a imerso

despida de conceitos estabelecidos com vistas a construir, a partir do que foi pr-

definido como conhecimento cientfico, os fios condutores para uma complexidade

do pensamento cientfico.

Bastos, Castro e Ravena (2011, p. 650) marcam que a interdisciplinaridade

ampla cincias da sociedade com cincias da natureza algo absolutamente

central para a cincia complexa, e o que o iderio de sustentabilidade tende a

exigir. Assim, a interdisciplinaridade assenta-se firmemente no processo de

contrapor a fragmentao/especializao da produo do conhecimento.

Por essa razo e a seguir os objetivos do Programa de Ps-Graduao em

Desenvolvimento Sustentvel (PPGDSTU), ao qual esta pesquisa est inserida,

pertinente enquadr-la metodologicamente no contexto da interdisciplinaridade.

27

Logo, entende-se que a interdisciplinaridade assenta-se firmemente no processo de

contrapor a fragmentao/especializao da produo do conhecimento.

Nesse aspecto, percebe-se que a integrao e a cooperao de abordagens

cientficas distintas tendem a possibilitar a construo do conhecimento na via para a

produo de uma cincia com reflexo e crtica, que para Morin (2005) saber/fazer

cincia com conscincia. Ainda a corroborar, Japiass (1976) destaca que a

interdisciplinaridade a tentativa de superar as dificuldades e as lacunas da

unicidade da cincia.

A este respeito, tem-se a tica como a condio ontolgica para o

enfrentamento, pois a reflexo do conjunto moral do sujeito imprescindvel para o

processo de desenvolvimento da prxis da episteme interdisciplinar. Ainda, Morin

(2005) aponta que as questes ticas norteiam a construo do conhecimento

interdisciplinar, uma vez que a responsabilidade do sujeito perpassa os processos

observveis de verificao dos objetos.

Nessa acepo, S (1987) destaca os vasos comunicantes para designar a

necessidade da comunicao, articulao e interao das disciplinas a nveis de

complexidade e aponta para a promoo da interdisciplinaridade na construo do

conhecimento cientfico mais sensvel e conectado. , portanto, importante observar

que, embora no que diz respeito interdisciplinaridade, S (1987) ressalta que o

processo dos vasos comunicantes uma espcie de articulao crtica. Nesta flexo

reside o cerne da relevncia dos estudos interdisciplinares, a reflexo e a crtica, que

foram a ruptura das disciplinas com vistas a desconstruir a episteme e reconstru-la

integrada e alargada por elos heursticos, tanto positivos como negativos.

Para tanto, Nunes (2012) remete que no lastro da histria moderna do

pensamento, a fragmentao das disciplinas vista como patologia e a

interdisciplinaridade como a promessa de desfragmentao. Assim, o

enquadramento metodolgico disciplinar conflita com a emergente necessidade de

comunicao entre disciplinas que possam explicar a descontruo do sentido da

verdade nica, do sujeito separado do objeto e dos achados puramente positivistas5.

Logo, reflete-se a necessidade de pensar sob a gide de uma realidade em

construo e a reconstruir-se, para evidenciar os vasos comunicantes como a

5 Augusto Comte (1798-1857), fundador do mtodo baseado na cincia positiva, a qual caracteriza-se pela sua nfase na unificao da cincia pelo modelo de explicao hipottico-dedutivo e pelo papel central da linguagem matemtica na construo do rigor e da universalidade do conhecimento cientfico (SANTOS, 2003, p. 52 apud GERMANO, 2011, p. 149).

28

conexo do pensamento interdisciplinar com a desconstruo do conhecimento

cientfico, ou melhor, com a ruptura epistemolgica e a descolonizao do

conhecimento, muito presente na literatura de Germano (2011), Kuhn (2011), Dussel

(2009), Santos (2009), Grofosguel (2008), Said (2007), Feyerabend (2007), Quijano

(2005), Bachelard (2005), Morin (2005), Leis (2005), Mignolo (2000), Latour e

Woolgar (1997), Funtowicz (1993), Pombo (1993), Foucault (1987), Gozzer (1982),

Japiass (1976), entre outros.

Nessa acepo, Feyerabend (2007) faz a crtica cincia moderna e aponta

que urgem-se os contradiscursos na perspectiva de provocar mudanas na

construo do conhecimento cientfico, principalmente para provocar debates contra

o racionalismo cientfico muito presente no positivismo. Para ele, os mtodos so

questionveis e frgeis. A verdade no pode ser absoluta, mas sim uma verdade

aproximada proveniente da ruptura epistemolgica e, neste aspecto, Feyerabend

(2007) defende que no h mtodo cientfico que garanta a existncia de uma

verdade absoluta.

Nesse sentido, evidenciam-se as possveis rupturas conceituais e os

questionamentos acerca das bases filosficas do conhecimento cientfico. Assim,

instaura-se a crise epistemolgica com vistas a perceber as questes metodolgicas

no avano da fronteira do conhecimento. Outrossim, o debate fundamental da

descolonizao do conhecimento (DUSSEL, 2009; QUIJANO, 2005) permite a

marcao do contradiscurso (FEYERABEND, 2007), no sentido de resignar o sujeito

despido do colonialismo latente, principalmente do eurocentrismo, e empoder-lo

para tomar para si o processo de construo epistemolgica da cincia, e ter novas

perspectivas mais compreensivas e comunicantes.

Assim, a compreenso da necessidade da interao a nveis de complexidade

do conhecimento e da emancipao de perspectivas predominantemente positivistas

urgem-se como questes cruciais na reformulao do pensamento cientfico

contemporneo. Nisso, tem-se o contributo para pensar o ps-positivismo no

apenas como mais um neologismo, mas sim como a via para a crtica dos mtodos

positivistas e, com isso, interrogar-se sobre os limites dos polos metodolgicos

(BRUYNE, 1991).

Nessa direo, tem-se a sensibilidade de compreender e enquadrar terico-

metodologicamente a pesquisa em andamento a partir da orientao interdisciplinar

que d conta de explicar, compreender e delinear resultados condizentes com novas

29

perspectivas de uma epistemologia anrquica (FEYERABEND, 2007). Logo, torna-

se imperioso o conhecimento das razes que conduzem a produo da

interdisciplinaridade nas cincias. Ademais, de mais valia a aplicao desta

metodologia nos campos investigativos que j romperam com os ditames ortodoxos

e fragmentados do conhecimento.

A este respeito, a descolonizao e a desconstruo do conhecimento (in)

comunicante fazem-se necessrias com vistas reformulao de trajetrias

metodolgicas e aproximao de domnios cientficos, que promovam a

comunicao na perspectiva da interao dos saberes e do localismo plural de

diversidades e adversidades do conhecimento cientfico.

Ento, a seguir essa compreenso, a abordagem terico-metodolgica da

pesquisa, teve lugar no positivismo, estabelecendo pontos de inflexo e insuficiente

teorizao, e tem a preponderncia de estudos mais empricos, entretanto, com forte

influncia de Popper6. Logo, tal posio filosfica justifica-se face ao contexto da

Universidade predominantemente positivista e popperiana com o domnio cientfico

da economia e gesto, a qual esteve inserida na primeira pesquisa. Hodiernamente,

a partir de um novo contexto e imerso no ambiente frtil dos vasos comunicantes, a

metodologia interdisciplinar est a orientar o fazimento da atual pesquisa.

Com isso, questionamentos pertinentes surgiram ao longo do percurso do

polo metodolgico7 (BRUYNE, 1991), impulsionando o olhar mais atento, sensvel e

compreensvel para a necessidade de desenvolver uma pesquisa conectada s

especificidades locais de So Lus (MA) e Belm (PA), e tanto relacionadas s

implicaes da gua, como de uma realidade turstica tardia e perifrica.

Dessa maneira, o desafio foi reenquadrar gradualmente a abordagem terico-

metodolgica da pesquisa, a partir das contribuies do ambiente acadmico atual e

6 Karl Popper (1902-1994), austraco, filsofo da cincia. considerado um dos mais influentes filsofos da cincia do sculo XX (GERMANO, 2011, p. 149). Alguns autores consideram Popper, ainda hoje, um filsofo da cincia cuja origem se debrua sobre os mesmos problemas que interessavam aos adeptos do positivismo lgico. Uma caracterstica que marca uma diferena fundamental de Popper para com o positivismo lgico a superao do verificacionismo. Ele prope uma metodologia que privilegia o experimento a partir de hipteses elaboradas com base no conhecimento cientfico produzido e acumulado. Popper jamais foi um positivista de qualquer matiz; ao contrrio, foi um antipositivista decidido, o homem que, desde o princpio, adiantou os argumentos que produziram (depois de um tempo excessivamente longo) o esfacelamento do positivismo lgico (MAGEE, 1973, p. 50-51), e nem poderia s-lo, uma vez que, ao longo de sua obra, busca demonstrar a fragilidade de solidificar uma cincia baseada no acmulo de dados e em verdades absolutas (SILVINO, 2007, p. 281). 7 Segundo Bruyne (1991), o polo metodolgico compreende os polos epistemolgico, terico, morfolgico e tcnico.

30

do olhar sensvel, crtico e reflexivo para a realidade investigada. Portanto, o

ambiente acadmico e o olhar sensvel foram os parmetros peremptoriamente

adotados para a tomada de deciso acerca deste reenquadramento terico-

metodolgico.

Assim sendo, houve a necessidade de reenquadrar o polo metodolgico

(BRUYNE, 1991) da investigao, uma vez que a aproximao do investigador com

a realidade experiementada despertou-o para a necessidade de buscar no apenas

as questes ortodoxas das cincias sociais aplicadas, mas tambm as questes

heterodoxas, principalmente ligadas ao socioambientalismo.

Nessa acepo, enquadra-se o polo metodolgico (BRUYNE, 1991) a partir

de uma perspectiva interdisciplinar com vistas a dar fiabilidade na recolha dos dados

e garantir um contributo significativamente reflexivo e crtico para corroborar com o

processo de construo epistemolgica do turismo, uma vez que o turismo carece

de uma posio filosfica ps-positivista.

Panosso Neto e Nechar (2014) apontam que urge-se por repaginar o discurso

meramente economicista e produtivista oficial de turismo e apostar na construo do

conhecimento turstico, e propem uma viso reflexiva da epistemologia do turismo

com elementos que levem produo de conhecimentos crticos.

Ainda, Panosso Neto e Nechar (p. 121, 2014):

A epistemologia tema relativamente novo no cenrio de investigao do turismo, porm vem se intensificando na atualidade com crescente bibliografia, tal como a produzida por Leiper (1981, 2000), Comic (1989), Centeno (1992), Spode (1993), Tribe (1997, 2000 e 2004), Beni (1998), Phillimore e Goodson (2004), Panosso Netto (2005), Castillo Nechar e Lozano Corts (2006), Ateljevic, Pritchard, e Morgan (2007) e Darbellay e Stock (2012) entre outros. Disciplina fundamental para o estabelecimento dos alicerces cientficos de qualquer campo de estudos, a epistemologia, em turismo, ainda vista como tema complexo, extico, terico, filosfico e com pouca aplicabilidade. Por isso tudo, seguidas vezes menosprezada pelos cientficos da rea turstica, conforme comprovou o estudo de Castillo Nechar, Tomillo Noguero, e Garca Gmez, (2010).

Nessa direo, o incentivo aos estudos mais crticos no turismo reverbera a

possibilidade de compreender os complexos problemas enfrentados pela dinmica

do turismo na sociedade capitalista atual e, mais ainda, na Amaznia Brasileira. Com

isso, posicionar-se filosoficamente em escolas que tecem o contradiscurso ao

positivismo, arrisca-se a ser uma alternativa para os estudos do turismo em

sociedades perifricas de desenvolvimento.

31

Compreender o processo seminal do enquadramento terico-metodolgico

perceber a existncia de uma complexidade significativa do objeto de pesquisa.

Nota-se que a complexidade a via para a desconstruo do conhecimento

colonizado. Para tanto, a ruptura epistemolgica necessria para (re) delinear o

percurso da construo do conhecimento e firmar o polo metodolgico passvel de

questionamentos e sensvel s mudanas e adequaes de teorias, formas,

mtodos, tcnicas e instrumentos.

No caso especfico da abordagem terico-metodolgica da pesquisa

concluda, percebeu-se a necessidade de alargar as possibilidades de interao,

articulao e comunicao de disciplinas para promover o elo hermenutico capaz

de apoiar-se s crticas e s reflexes com vistas a evidenciar achados

descolonizados de um conhecimento pr-concebido.

Conforme visto por pesquisadores de turismo, a caracterizao

epistemolgica e a posio filosfica instam por orientar a construo do

conhecimento turstico. Ento, concorda-se com as assertivas dos pesquisadores e

verifica-se que um desafio enquadrar metodologicamente o turismo numa base

filosfica que consiga tecer fortes crticas ao positivismo.

No obstante, tem-se a convico de explicar e compreender o objeto de

investigao apoiado em um polo metodolgico robusto, direcionando o fio condutor

do conhecimento dentro de uma perspectiva coerente e interdisciplinar. Ento,

percebe-se a importncia da cooperao do conjunto interativo cognitivo.

Ademais, salienta-se que a via para os vasos comunicantes a

descolonizao do conhecimento, que possibilita a insero de um conjunto

interativo de disciplinas na perspectiva de promover metodologias e mtodos

capazes de desvelar a verdade aproximada e questionvel. Logo, faz sentido ter

uma base filosfica crtica que d conta de explicar e compreender os fios

invisveis da racionalidade simtrica de resultados predominantemente positivistas.

Considerando a perspectiva interdisciplinar entre a economia e a antropologia

com vistas a perceber a relao entre a gua e o turismo, a pesquisa foi

desenvolvida a partir de uma abordagem terica e emprica de natureza exploratria

e explicativa (FARIAS FILHO; ARRUDA FILHO, 2013). Destarte, optou-se por uma

metodologia nomeadamente qualitativa com vistas ao enquadramento metodolgico

mais prximo de uma confiabilidade de informaes qualitativas recolhidas, que de

32

acordo com Gunther (2006) e Poupart el al. (2008), apresenta como caracterstica a

construo da realidade e um ato subjetivo de construo.

Para tanto, a presente pesquisa comporta subdivises. A primeira a terico-

bibliogrfica, com o propsito de construir o modelo terico-conceitual, a partir da

captura da informao cientfica sistematizada, a ter o suporte terico da teoria

schumpeteriana (SCHUMPETER, 2012) e neoschumpeteriana de Nelson & Winter

(1982) do desenvolvimento econmico (DALTHEIN, 2015; NELSON, WINTER, 1982;

POSSAS, 2008), para a validao das trs categorias analticas da reviso da

literatura: i. Turismo na via e contravia para o desenvolvimento econmico e social;

ii. Desenvolvimento sustentvel na via e contravia para o turismo; iii. A gua na via

para o desenvolvimento sustentvel do turismo.

Para os efeitos desta pesquisa, opta-se, por razes terico-metodolgicas,

enquadrar a Teoria Schumpeteriana para o Desenvolvimento Econmico e seus

desdobramentos atuais; e a neoschumpeteriana como a teoria de base para a

validao da reviso da literatura com vistas a empoderar teoricamente as

especulaes tericas encontradas nas bases de dados de contedos digitais.

As fontes da informao cientfica foram as bases de dados da plataforma

digital de contedos cientficos do banco de dados de resumos e citaes de artigos

para jornais/revistas acadmicos (SCOPUS), Scientific Electronic Library Online

(SCIELO) Brasil, Portal de Peridicos da Coordenao de Aperfeioamento de

Pessoal de Nvel Superior (CAPES) e tambm os repositrios institucionais da

UFPA, especificamente do NAEA, assim como o acervo pessoal de livros impressos

e digitais correlacionados s discusses valiosas presentes neste referencial terico

reflexivo da tese.

Outrossim, a segunda subdiviso se referiu pesquisa terica documental,

com a finalidade de recolha de informaes referentes s OTMH e aos planos de

manejo e gesto da gua de So Lus (MA) e Belm (PA). A pesquisa foi feita nos

seguintes repositrios institucionais: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

(IBGE), Agncia Nacional de gua (ANA), Superintendncia do Desenvolvimento da

Amaznia (SUDAM), Ministrio do Turismo (MTUR), Secretaria de Estado do

Turismo do Par (SETUR/PA), Secretaria de Estado da Cultura e Turismo do

Maranho (SECTUR/MA), Secretaria Municipal de Turismo de So Lus (SETUR

SO LUS), Associao Brasileira da Indstria Hoteleira do Par e Maranho (ABIH-

33

PA/MA), Companhia de Saneamento do Par (COSANPA) e Companhia de

Saneamento Ambiental do Maranho (CAEMA).

A prosseguir, teve-se a pesquisa emprica por meio da aplicao da tcnica

da amostragem no probabilstica no intencional, que, de acordo com Reis et al.

(2015), uma amostragem no probabilstica regida por critrios de convenincia

e/ou disponibilidade dos inquiridos. Ainda, os autores salientam que a amostra por

convenincia selecionada em funo da disponibilidade e acessibilidade dos

elementos que constituem a populao-alvo.

Para tanto, teve-se uma amostra por julgamento e convenincia, aceitvel e

selecionada como representativa das OTMH de So Lus8 (MA) e Belm (PA). O

pesquisador selecionou a sua amostra estabelecida por critrios plausveis, que

julgou ser de mais valia para a recolha de dados. A este propsito, Eusbio,

Kastenholz e Carneiro (2003) apontam que nas pesquisas em turismo, o processo

de amostragem comprometido face falta de informao confivel sobre a

populao.

Nessa perspectiva, foram considerados para a entrevista os gestores e/ou

tcnicos das organizaes tursticas e das concessionrias de gua. A convenincia

deu-se a partir da disponibilidade e boa vontade do gestor e/ou tcnico em

responder o inqurito por formulrio de entrevista semiestruturada (SILVA, 2012), o

qual ser o instrumento metodolgico adotado.

SILVA (2012) ressalta que a entrevista, no campo da pesquisa e avaliao,

uma das maneiras mais antigas de se obter informaes. Logo, a entrevista um

dilogo que intenciona recolher informaes precisas aproximadas do propsito

delineado e definido pelo entrevistador, que o sujeito quem conduz a entrevista,

determina as questes e quem ser entrevistado, mediante critrios conectados e

articulados com os objetivos da pesquisa.

Silva (2012, p. 156) destaca que:

O sucesso desse instrumento depende, em grande parte, da capacidade do entrevistador de saber questionar e, principalmente, de saber ouvir. A capacidade de se obterem as informaes buscadas primordial. sabido que qualquer indivduo capaz de responder quando algo lhe perguntado; no entanto, poucas pessoas sabem perguntar.

8 Conforme o Anurio Estatstico (2015), a cidade de So Lus conta com 89 organizaes de meios de hospedagem. Segundo Nascimento (2017), h 86 organizaes de meios de hospedagem na Regio Metropolitana (RM) de Belm.

34

A esse ponto, salienta-se que o domnio do entrevistador sobre as questes

norteadoras imprescindvel no processo de saber perguntar. Outro ponto-chave

quanto composio das questes, que, a priori, devem ser objetivas e claras para

a obteno de respostas precisas e calibradas.

A esse respeito, as questes norteadoras do formulrio de entrevista, para as

organizaes tursticas, esto delineadas a partir da seguinte estrutura: i.

Caracterizao do respondente; ii. Potencialidades e estratgias para o

posicionamento das organizaes tursticas; iii. As implicaes do consumo de gua

pela e para as organizaes tursticas.

Quanto ao formulrio de entrevista para os gestores e/ou tcnicos das

concessionrias de gua, a questo norteadora abordou sobre o diagnstico atual

da gua. Objetivou-se obter informaes atualizadas das implicaes da gua e

possveis percepes quanto ao turismo, uma vez que ambas as cidades

selecionadas tm, mesmo que incipientes, fluxos tursticos e, na literatura

(GOSSLING, 2015), h evidncias de uma relao conflituosa entre gua e turismo.

Concernente s OTMH, elas foram selecionadas por meio do CADASTUR9,

ou seja, somente as organizaes classificadas por este sistema faro parte da

amostra. Este procedimento dar confiabilidade na escolha das organizaes

tursticas que so reconhecidas legalmente pelo MTUR.

Hodiernamente, a presente pesquisa enquadrou-se no contexto metodolgico

de um estudo de caso (FARIAS FILHO; ARRUDA FILHO, 2013; YIN, 2010) de

carter mltiplo, no qual props-se uma anlise detalhada e concisa sobre o objeto

de estudo com vistas de contributos para a promoo de aes intervencionistas.

9 o Sistema de cadastro de pessoas fsicas e jurdicas que atuam no setor do turismo. Executado pelo MTur, em parceria com os rgos Oficiais de Turismo nos 26 Estados do Brasil e no Distrito Federal, permite o acesso a diferentes dados sobre os prestadores de servios tursticos cadastrados. O CADASTUR visa promover o ordenamento, a formalizao e a legalizao dos prestadores de servios tursticos no Brasil, por meio do cadastro de empresas e profissionais do setor.

35

3 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO ECONMICO SCHUMPETERIANA, TURISMO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL E GUA: ENFOQUES TERICOS

No presente captulo, apresenta-se o referencial terico hodiernamente

enquadrado e fundamentado, principalmente por meio da reviso de literatura

nacional e internacional, com a captura da informao cientfica relevante e

pertinente fundamentao terica. As fontes da informao cientfica foram as

bases de dados da plataforma digital de contedos cientficos SCOPUS, SCIELO

BRASIL, Portal de Peridicos da CAPES e tambm os repositrios institucionais do

NAEA/UFPA, assim como o acervo pessoal de livros impressos e digitais

correlacionados s discusses valiosas presentes neste referencial terico reflexivo

da tese.

Para tanto, justifica-se que a escolha deste referencial terico deu-se por

razes de aderncia aos objetivos da investigao proposta. Outrossim, o presente

referencial produziu uma reviso de literatura adequada, relevante e pertinente, a

qual fundamentou e validou a empiria da investigao.

Ressalta-se que para efeito desta reviso de literatura, adotou-se a

perspectiva interdisciplinar para o enquadramento terico do turismo, a partir das

discusses sobre a economia do desenvolvimento e seus reflexos para o

desenvolvimento sustentvel, isto porque o turismo uma atividade econmica com

uma complexidade articulada de operaes de servios e organizaes.

Vasconcelos e Lezana (2014) apontam o turismo como atividade de operaes

importantes de servios e detentor de uma cadeia de suprimentos complexa que

contribui para o desenvolvimento econmico, principalmente de paises perifricos.

Nessa acepo de perceber o turismo como uma complexidade articulada de

servios e organizaes fomentado, a partir da consumao de bens e servios, a

perspectiva terica interdisciplinar marca-se como de mais valia para a construo

deste enquadramento terico. Nota-se que a epistemologia do turismo ainda carece

de uma cientificidade (PANOSSO NETO, NECHAR, 2014) com vistas a gerar

conceitos e abordagens que consolidem uma base terica confivel.

Sinclair e Stabler (2009), assim como Cunha (2013), apontam que a maioria

dos artigos publicados acerca do turismo teve a natureza mais aplicada com

aspectos mais atrelados gesto, economia e planejamento. Para os autores, as

caractersticas mais prticas do turismo dominaram, por um certo perodo de tempo,

36

a reviso da literatura. Todavia, esse quadro terico ampliou-se face ao despontar

de estudos sobre as problemticas pertinentes e relevantes resultantes da

aplicabilidade do turismo na sociedade, principalmente concernente aos impactos

promovidos pelos aspectos mencionados acima.

Portanto, o contedo do presente captulo se encontra dividido em cinco

subcaptulos. O primeiro designado de a via schumpeteriana da destruio criativa

para a dinmica do desenvolvimento econmico. O segundo subcaptulo a via

neoschumpeteriana evolucionria para a dinmica do desenvolvimento econmico.

Objetiva-se com estes dois subcaptulos perceber o posicionamento estratgico das

organizaes frente necessidade de mudana, face aos constrangimentos no

desempenho das operaes de servios.

O terceiro designado de turismo na via e contravia para o desenvolvimento

econmico e social, e tem como objetivo avaliar os aspectos econmicos do turismo

na promoo do desenvolvimento de territrios. O quarto subcaptulo,

desenvolvimento sustentvel na via e contravia para o turismo, tem como propsito

marcar a discusso acerca do turismo pela ptica da economia do desenvolvimento

e da necessidade alarmante da sustentabilidade. Por fim, no quinto, a gua na via

para o desenvolvimento sustentvel do turismo, objetiva-se entender a dinmica de

relaes de poder e conflitos que a gua estabelece no territrio urbano e destaca-

se a gua no contexto do territrio e organizaes tursticas.

3.1 A via schumpeteriana da destruio criativa para a dinmica do desenvolvimento econmico

No h como refletir o desenvolvimento econmico da atual sociedade

capitalista, na perspectiva da dinmica das organizaes, sem ter o conhecimento e

a leitura apropriada do legado da teoria do desenvolvimento econmico

desenvolvida pelo economista austraco Joseph Alois Schumpeter (1883-1950).

O contexto histrico do desenvolvimento do pensamento econmico de

Schumpeter estava imerso nos perodos das guerras entre as principais potncias

mundiais. Esse contexto histrico, marcado violentamente pela bancarrota das

economias das principais potncias mundiais, favoreceu o surgimento de ideias que

alavancaram e impulsionaram o desenvolvimento econmico.

37

Atualmente, verifica-se que h uma extensa e exaustiva literatura sobre o

desenvolvimento econmico na perspectiva do processo dinmico e evolucionrio da

economia capitalista proveniente das ideias de Schumpeter. Os termos inovao e

empreendedorismo foram fortemente conhecidos, alargados, articulados e

empregados na sociedade como estratgias para o desenvolvimento, com vistas a

uma evoluo econmica fertilizada pelo prprio sistema econmico, a ter a

orientao do pensamento schumpeteriano. Isto , a base terica schumpeteriana

e neoschumpeteriana para a discusso sobre inovao e empreendedorismo.

As insignes publicaes Die Theorie der Wirschaftlichen Entwicklung, de

1911, Business cycles, de 1939, e Capitalism, Socialism and Democracy, de

1942, proporcionaram a Schumpeter suscitar polmicas poca, ao propor uma

leitura do processo de desenvolvimento econmico, a partir de uma anlise de

desertao dos pressupostos de equilbrio do mercado, por meio da introduo do

processo de inovao, cujas condies do ambiente favoreceram mudanas e

transformaes na organizao industrial dos mercados.

A teoria do desenvolvimento econmico de Schumpeter (2012) explica o

comportamento dos sistemas econmicos tangente a um estado de turbulncias no

equilbrio que motiva, foradamente, a tomada de deciso com vistas a arar um

terreno frtil para a mudana estrutural da organizao neoclssica. Para isso,

Schumpeter (2012) centrou esforos, primeiramente, em cima do elemento humano,

na figura do empresrio da organizao, como estratgia para o desenvolvimento de

ideias que pudessem causar mudanas no padro de produo.

Nessa perspectiva, percebe-se na ptica de Schumpeter (2012) que a

questo da turbulncia do equilbrio econmico, muito presente em Walras (1834-

1910)10, fulcral para dar direcionamento s relaes estabelecidas no sistema

econmico. De fato, Schumpeter (2012) afirmou que h uma tendncia ao equilbrio

geral dos sistemas econmicos por meio da expanso de forma anloga do seu

estado de essncia, a transcorrer repetidos comportamentos, tanto na produo

como no consumo.

10 O francs Lon Walras (1834-1910) foi no apenas um dos pioneiros da teoria neoclssica, mas o seu equilbrio geral permanece ainda como o modelo de referncia para numerosos economistas contemporneos. o fundador da Escola de Lausana, cujo o discpulo mais clebre no seio desta escola foi incontestavelmente o italiano Vilfredo Pareto (1848-1923), que aprimorou o sistema de equaes walrasiano a originar um prolongamento do modelo inicial, num sentido normativo, o equilbrio walrasiano realiza um bem estar coletivo ptimo, que ficou conhecido na literatura como o ptimo de Pareto (Saby & Saby, 1997, p. 66;118).

38

Schumpeter (2012) enfatizou que a mudana no fluxo circular do

desenvolvimento econmico, advindo da iniciativa da organizao, importante para

que haja a desertao do estado de equilbrio, para, com isso, promover um espiral

estocstico a fim de promover as mudanas que, na sua viso, so necessrias para

dar uma renovao no fluxo circular do desenvolvimento econmico.

Para Schumpeter (2012), a situao de instabilidades e incertezas, a qual o

mercado estava vulnervel, descortinava um cenrio econmico propcio para que

os empresrios das organizaes tomassem a deciso de renovar os pretritos

padres de produo, por meio da introduo de ideias de destruio da criao,

para que houvesse a dinmica no processo produtivo, a possibilitar a descoberta de

novos padres focados na explorao de inovaes.

Ao avanar-se nos entendimentos sobre a teoria do desenvolvimento

econmico schumpeteriana, Schumpeter (2012) enfatizou, com veemncia, que o

empresrio da organizao quem inicia o processo de mudana no sistema

econmico, instrumentalizando meios eficazes de influenciar o comportamento dos

consumidores, fazendo-os adquirir bens novos ou bens dissemelhantes, em alguns

aspectos, daqueles bens que os mesmos tinham o consumo frequente. Para

Schumpeter (2012), o papel do empresrio da organizao o de dar condies

para que o padro de produo possa ser constantemente renovado, explorando

invenes e possibilidades de tecnologias para a promoo de novos bens de

consumo.

Schumpeter (2012) destacava que o empresrio das organizaes se

diferenciava dos demais empresrios, poca, porque tinha o esprito de inovao

para destruir os pensamentos pretritos e limitados, direcionando os recursos

existentes para a transposio do contexto de inrcia e resistncia; e esse foi o

motivo precpuo que induziu a dinmica da economia capitalista, quando se props a

agir em prol do desenvolvimento econmico territorial.

De fato, na concepo schumpeteriana de desenvolvimento econmico, o

papel do empresrio da organizao tem uma importncia fundamental na

economia, uma vez que ele era incumbido de iniciar o processo de mudana, por

meio da obteno de crdito do mercado, que o permitiu introduzir as ideias que

causaram, poca, novidade e renovao no processo produtivo de bens para o

consumo potencial no mercado capitalista.

39

Quanto a essa questo da obteno de crdito, destaca-se que Schumpeter

(2012) viveu em um ambiente cerceado dos negcios e da ascenso econmica das

elites, que, poca, tinham o poder de deciso para emitir o crdito necessrio para

o desenvolvimento econmico com vistas a favorecer a imunidade do desempenho

dos seus negcios, uma vez que os donos do crdito eram os empresrios das

organizaes, muito ligados ao mercado financeiros, como banqueiros e outros

agentes financeiros, que mobilizavam a circulao do capital, avaliavam as

possibilidades de riscos dos projetos de inovao submetidos e monitoravam a

gesto do mercado.

Schumpeter (2012) apontava para o fato de que a construo do

conhecimento de cincia e tecnologia voltado para a inovao das organizaes

estava concentrado nas elites com o poder do capital. Neste aspecto, verificou-se

que a cincia e a tecnologia, poca, no eram independentes e eram vistas como

produto da cultura elitista detentora dos negcios e as qualificaes profissionais

excepcionais e os homens excepcionais pensantes encontravam-se no seio

pujante da cultura burguesa do poder.

Nesse caso, adverte-se que sem um sistema de crdito para financiar as

inovaes das organizaes, as mesmas seriam fadadas a colocar em risco as suas

sobrevivncias. Assim, a questo do crdito, na concepo schumpeteriana, era

fulcral para o desenvolvimento econmico.

Ademais, Schumpeter (2012) considerava que as relaes intertemporais de

consumo eram explicadas pela teoria dinmica a fim de compreender o papel das

organizaes no processo de desenvolvimento econmico. Acredita-se que a resida

uma das limitaes da teoria schumpeteriana: ver o desenvolvimento econmico

como uma frao da realidade social por meio apenas da ptica das organizaes,

pois Schumpeter (2012) concentrou os esforos de construo cognitiva da sua

teoria nas causas internas econmicas do processo produtivo das organizaes,

sem explorar outras preocupaes do desenvolvimento econmico.

Para Schumpeter (2012), a dinmica do desenvolvimento econmico estava

centrada no ambiente de fazimento dos negcios e o mesmo defendia a tese de que

o Estado deveria concentrar esforos para investimentos na construo de um

ambiente favorvel aos negcios com a instituio de polticas em benefcio das

inovaes para o fortalecimento do poder econmico das organizaes. Ele afirmava

que a dinmica das inovaes, poca, era o motor do desenvolvimento

40

econmico, pois articulava as ideias de inovao, ao do empresrio e a criao de

novos mercados.

Schumpeter (2012) percebia que a destruio criativa era a estratgia para a

dinmica dos sistemas econmicos por meio da gesto para o desenvolvimento de

vantagens competitivas com vistas produtividade e ao crescimento econmico.

Esta expresso foi criada em 1942 por ele e usada como metfora para descrever a

natureza subjacente da substituio dos produtos pretritos e das pretritas formas

de produo por novos produtos e novas formas de produo.

Portanto, depreende-se que, no tocante s dinmicas das inovaes, as

organizaes assimilavam as suas orientaes metodolgicas como a via para a

mudana no processo produtivo. Para Schumpeter (2012), as inovaes vinham em

ondas e uma onda de inovao puxava a outra, e assim por diante, at delinear

uma nova maneira de relacionar-se com o mercado ao produzir os bens e, com isso,

permitir a abertura de novas fronteiras mercadolgicas, explorando possibilidades de

novas matrias-primas e estabelecendo uma ruptura para a renovao da estrutura

de organizao industrial.

Diniz (2008) corrobora com essa assertiva ao mencionar que, para

Schumpeter, o sistema capitalista era visto numa perspectiva evolucionria que

nunca chegaria a atingir o equilbrio, mas sim estaria em permanente mudana para

promover outras mudanas e assim gerar a inovao para a dinmica ondulatria do

processo produtivo com vistas ao desenvolvimento econmico.

Dathein (2015, p. 197) destaca que:

A partir da anlise de Schumpeter, os dois padres bsicos de inovaes ou regimes tecnolgicos das empresas foram classificados como de tipo Mark I (ou ampliador) e Mark II (ou de aprofundamento). O primeiro um padro de destruio criadora, a partir de firmas que nunca inovaram antes, com baixas barreiras tecnolgicas entrada, com papel fundamental dos empresrios e de novas firmas. O segundo um padro de acumulao criadora, a partir de firmas que j possuem um histrico inovador, em que prevalecem grandes empresas j estabelecidas e existem maiores barreiras entrada para novas firmas. Esse ltimo, portanto, est relacionado positivamente com o grau de concentrao das atividades inovadoras e com a estabilidade hierrquica das firmas inovadoras, e negativamente com a importncia da presena de novos inovadores (Breschi; Malerba; Orsenigo, 2000; Nelson; Winter, 1982, parte V).

Ainda, Dathein (2015, p. 198) mostra que esses padres bsicos de inovaes ou

regimes tecnolgicos das firmas so definidos pela combinao de 4 fatores:

41

1) Altas oportunidades tecnolgicas: significa que, para um dado montante

de recursos aplicados, existe elevada probabilidade de ocorrncia de inovaes;

2) Apropriabilidade de inovaes: representa a possibilidade de proteo

contra a imitao e, portanto, captura de lucro;

3) Cumulatividade dos avanos tecnolgicos: significa a capacidade de

inovaes presentes gerarem um fluxo de inovaes subsequentes;

4) Natureza do conhecimento: representa a generalizao, codificao ou a

especificao tcita e complexa maneira de manifestao do saber fazer.

Ento, conforme o quadro 1 abaixo, percebe-se que:

Quadro 1- Padro tipo de inovaes ou regimes tecnolgicos

Fonte: Adaptado de Dathein (2015, p. 198).

Com isso, verifica-se que essa padronizao da dinmica de inovaes em

tipo Mark I (destruio criadora) e II (acumulao criadora) constitui um enfoque

interessante para analisar as variveis de processos de inovao e evoluo

industrial das organizaes. Dathein (2015) afirma que a anlise dos padres de

inovaes pode ser aplicada para o ciclo de vida das indstrias, no tocante, s

vulnerabilidades que as organizaes esto expostas e que ocasiona a substituio

de um padro Schumpeter Mark I para um padro Schumpeter Mark II. Isto , em

um contexto de grandes descontinuidades tecnolgicas, proporciona-se o

surgimento de novas organizaes com atuao em novas tecnologias e novas

demandas.

importante ressaltar que, segundo Llerena & Oltra (2002) apud Dathein

(2015, p. 198), a existncia de diferentes estratgias inovativas por parte das

organizaes favorece o surgimento de resultados importantes sobre a estrutura do

mercado e a dinmica tecnolgica. Dathein (2015, p. 198) menciona que:

42

Em um modelo de duas estratgias coexistentes, existem dois tipos de firmas, as com estratgia cumulativa (C-firmas) e as com estratgia no cumulativa (NC-firmas). As C-firmas adotam uma estratgia interna de aprendizado p