a criacao de tilapia no amapa - autora: cecile de souza gama

6
525 VOL. 38(3) 2008: 525 - 530 A criação de tilápia no estado do Amapá como fonte de risco ambiental Cecile de Souza GAMA 1 RESUMO O Estado do Amapá, apesar de apresentar condições favoráveis ao crescimento da piscicultura, ainda apresenta pouco desenvolvimento desta atividade. A criação de peixes no Estado vem atraindo a atenção de muitos pequenos empreendedores que conseguem financiamento para tal, no entanto, seu investimento é concentrado na criação da Tilápia. Trata-se de uma espécie exótica, cujo processo de criação já foi amplamente estudado, mas que oferece risco de sua introdução no ambiente caso seja criada sem planejamento, como acontece no Amapá. A grande concentração de empreendimentos com criação de Tilápia no Estado se encontra em áreas ambientalmente frágeis, podendo causar danos ambientais em caso de soltura ou escape, que normalmente acontece. Como não existem estudos na região sobre o potencial dano ambiental causado por esses peixes, preventivamente deve-se evitar esse tipo de criação, uma vez que existem outras espécies possíveis de serem criadas que são nativas do ambiente, como o Tambaqui. PALAVRAS-CHAVE: Tilápia, Amapá, Espécie exótica, The tilápia creation in the Amapá state as source of environmental risk ABSTRACT The state of Amapá presents great conditions for aquaculture growth, but continues to present little development of this activity. The creation of fish in the State is attracting the attention of many small entrepreneurs who concentrate in creating Tilápia, an exotic species, whose process of creation has been widely studied. However, there is the risk of introducing it into the environment, if created without planning, as happens in Amapá. The heavy concentration of enterprises creating Tilápia in the State is located in fragile areas, which can cause environmental damages if it is let loose or escapes, which normally happens. As there are no studies in the region on the potential environmental damage caused by these fish, this type of creation must be prevented, since other possible species native to the environment, such as the Tambaqui, can be bred. KEYWORDS: Tilápia, Amapá, Exotic species. 1 [email protected]

Upload: fabio-ferreira

Post on 08-Nov-2015

216 views

Category:

Documents


4 download

DESCRIPTION

O Estado do amapá, apesar de apresentar condições favoráveis ao crescimento da piscicultura, ainda apresenta poucodesenvolvimento desta atividade. a criação de peixes no Estado vem atraindo a atenção de muitos pequenos empreendedoresque conseguem financiamento para tal, no entanto, seu investimento é concentrado na criação da Tilápia. Trata-se de umaespécie exótica, cujo processo de criação já foi amplamente estudado, mas que oferece risco de sua introdução no ambientecaso seja criada sem planejamento, como acontece no amapá. a grande concentração de empreendimentos com criação deTilápia no Estado se encontra em áreas ambientalmente frágeis, podendo causar danos ambientais em caso de soltura ouescape, que normalmente acontece. Como não existem estudos na região sobre o potencial dano ambiental causado por essespeixes, preventivamente deve-se evitar esse tipo de criação, uma vez que existem outras espécies possíveis de serem criadas quesão nativas do ambiente, como o Tambaqui.Autora: Cecile de Souza Gama

TRANSCRIPT

  • 525 vol. 38(3) 2008: 525 - 530

    A criao de tilpia no estado do Amap como fonte de risco ambientalCecile de Souza Gama1

    RESUMOO Estado do amap, apesar de apresentar condies favorveis ao crescimento da piscicultura, ainda apresenta pouco desenvolvimento desta atividade. a criao de peixes no Estado vem atraindo a ateno de muitos pequenos empreendedores que conseguem financiamento para tal, no entanto, seu investimento concentrado na criao da Tilpia. Trata-se de uma espcie extica, cujo processo de criao j foi amplamente estudado, mas que oferece risco de sua introduo no ambiente caso seja criada sem planejamento, como acontece no amap. a grande concentrao de empreendimentos com criao de Tilpia no Estado se encontra em reas ambientalmente frgeis, podendo causar danos ambientais em caso de soltura ou escape, que normalmente acontece. Como no existem estudos na regio sobre o potencial dano ambiental causado por esses peixes, preventivamente deve-se evitar esse tipo de criao, uma vez que existem outras espcies possveis de serem criadas que so nativas do ambiente, como o Tambaqui.

    PalavRaS-chavE: Tilpia, amap, Espcie extica,

    The tilpia creation in the Amap state as source of environmental riskaBSTRacTThe state of amap presents great conditions for aquaculture growth, but continues to present little development of this activity. The creation of fish in the State is attracting the attention of many small entrepreneurs who concentrate in creating Tilpia, an exotic species, whose process of creation has been widely studied. However, there is the risk of introducing it into the environment, if created without planning, as happens in amap. The heavy concentration of enterprises creating Tilpia in the State is located in fragile areas, which can cause environmental damages if it is let loose or escapes, which normally happens. as there are no studies in the region on the potential environmental damage caused by these fish, this type of creation must be prevented, since other possible species native to the environment, such as the Tambaqui, can be bred.

    KEywORdS: Tilpia, amap, Exotic species.

    1 [email protected]

  • 526 vol. 38(3) 2008: 525 - 530 gama

    a criao de tilpia no estado do amap como fonte de risco ambiental

    INTRODUOa piscicultura vem despertando um interesse crescente por

    parte de pequenos e mdios empresrios em todo pas por se tratar de um empreendimento que tem seu produto final com uma alta taxa de aceitao pelo mercado.

    reconhecido que o Estado do amap possui grande potencial para o desenvolvimento da aqicultura, por contar com uma ampla variedade de espcies de peixes, disponibilidade de recursos hdricos e clima propcio, relativamente constante ao longo do ano, o que levaria a uma produo continuada, sem perodos de entressafra, como acontece nos principais plos aqicultores situados na regio Sudeste. Estas caractersticas fazem com que esta atividade, potencialmente, tenha grande importncia no que diz respeito sustentabilidade ecolgica, econmica e nutricional.

    apesar de todas as potencialidades da regio, o amap um dos estados brasileiros onde a aqicultura encontra-se menos desenvolvida. a falta de poltica direcionada para a atividade no permitiu que se alcanassem melhores nveis de crescimento. as iniciativas privadas encontram dificuldades de ordem tcnica e financeira para progredirem em empreendimentos maiores. algumas dificuldades, no entanto, j podem ser destacadas, como o isolamento do Estado, a precariedade em termos de infra-estrutura e a conseqente dificuldade de transporte para o escoamento da produo, falta de acesso aos insumos, que, quando obtidos, chegam a um custo muito elevado, falta de mo de obra qualificada, entre outros aspectos. Fez-se necessrio, ento, um estudo detalhado do quadro atual da piscicultura, com relao inclusive aos aqicultores novos e em potencial, para que essas dificuldades sejam melhor identificadas e equacionadas solues para o crescimento efetivo da atividade no Estado, em bases que possibilitem sua sustentabilidade ao longo do tempo, nos aspectos econmicos, sociais e ambientais.

    a grande facilidade de reproduo da Tilpia estimula os criadores a adquirirem esta espcie e povoarem seus tanques, porque com um baixo investimento, logo eles tm seus tanques repletos de peixes. alm disso, a Tilpia constitui uma espcie rstica que ocorre numa ampla gama de variaes ambientais, suportando limites extremos de temperatura e oxignio bem como a presena de poluentes de natureza variada (Beyruth et al., 2004).No entanto no h um planejamento para se evitar a superpopulao dos tanques e a falta de alimento para o desenvolvimento dos peixes, que constituem fatores limitantes para o sucesso da criao, alm da perda de indivduos, seja por ataque de predadores ou atravs do escape destes atravs de enchentes no perodo chuvoso ou pelo escoamento e abastecimento dgua.

    Os dejetos liberados pelos peixes modificam as caractersticas fsicas, qumicas e biolgicas do tanque ou

    viveiro. Esses resduos orgnicos, aps ao microbiolgica, fornecem nutrientes essenciais para o desenvolvimento de plncton e de macrfitas aquticas, podendo, quando em excesso, causar eutrofizao do ambiente e alterao da composio e abundncia de diversos organismos aquticos (Pdua, 2001). Kestmont (1995) reuniu informaes sobre efeitos negativos que a aqicultura em geral exerce sobre o meio ambiente biolgico, destacando: alterao dos valores da temperatura da gua; aumento da demanda qumica e bioqumica de oxignio e da concentrao de fsforo e slidos em suspenso; diminuio da concentrao de oxignio dissolvido; contaminao com produtos qumicos; acmulo de sedimento rico em matria orgnica; poluio e eroso; e aumento do risco de disseminao de doenas.

    METODOLOGIAEste estudo fez parte de um projeto financiado pelo

    PROBEm-mma e executado pelo IEPa (Instituto de Pesquisas Cientficas e Tecnolgicas do Estado do amap), denominado Diagnstico da Pesca e aqicultura do amap que tinha como objetivo levantar dados bsicos sobre o estado dessas atividades no que diz respeito produo, entraves e perspectivas futuras para servir como subsdio a formulao de polticas para seu desenvolvimento.

    Os dados foram obtidos atravs da aplicao de um questionrio a cada aqicultor encontrado. Para encontrar os aquicultores, foram consultados cadastros no IBama, SEma (Secretaria de Estado do meio ambiente), SEaF (Secretaria de Estado da agricultura, Pesca, Floresta e abastecimento), aQUIaP (associao dos aqicultores do Estado do amap), RURaP (Instituto de Desenvolvimento Rural do amap), BaSa (Banco da amaznia), alm de aqicultores encontrados atravs de busca e informaes levantadas pelos prprios entrevistadores durante as entrevistas. Foram levantados dados em todas as regies do Estado durante os anos de 2001 e 2002, atravs de visitas aos empreendimentos. Em alguns locais havia a inteno de se iniciar um cultivo com a utilizao de tanques-rede, mas como no havia sido iniciado at o momento das entrevistas, os dados coletados foram referentes ao sistema de cultivo convencional, em geral, com tanques cavados na terra firme ou cavados em reas de vrzea para aproveitar a disponibilidade de gua ou atravs do uso de cercas nos corpos dgua (Figura 1)

    Nos questionrios eram feitas perguntas aos aqicultores acerca das espcies criadas, tipo e caractersticas da criao, tempo de existncia do empreendimento, se j sofreu algum tipo de dano ambiental e perda de peixes ao ambiente, tipo e freqncia de alimentao, dados acerca da comercializao dos peixes, com o objetivo de obter uma caracterizao completa de cada empreendimento visitado.

  • 527 vol. 38(3) 2008: 525 - 530 gama

    a criao de tilpia no estado do amap como fonte de risco ambiental

    Foram realizadas 92 entrevistas com aqicultores em todo o Estado de forma a se obter resultados amostrais o mais prximo possvel da realidade. 57% da criao de peixes analisada neste estudo proveniente de macap e Porto Grande (Figura 2). Destas entrevistas, foi obtido um total de 147 tanques que j apresentavam peixes em criao no momento da entrevista. Dentre os entrevistados haviam 14 propriedades que se encontravam em construo ou com tanques vazios ou sem peixes.

    alm do preenchimento dos questionrios pelos aqicultores, todos os tanques foram georreferenciados e fotografados a fim de se registrar a grande diversidade de formas de criao encontrados.

    Os dados referentes criao de Tilpia foram tratados separadamente e posteriormente inseridos no contexto geral da atividade piscicultora do Estado do amap.

    RESULTADOS E DISCUSSONo amap foi constatado que existe a criao das trs

    espcies de Tilpia introduzidas no Brasil (Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1758), Tilapia rendalli (Boulenger, 1897), Sarotherodon urolepis hornorum (Trewavas, 1966)). Em alguns casos, principalmente por falta de conhecimento, o criador coloca mais de uma espcie em consrcio no mesmo tanque.

    Dentre os 92 aqicultores entrevistados, 54% afirmaram cultivar a Tilpia. Este fato no seria to preocupante se no fossem consideradas as condies nas quais realizado este cultivo. Segundo as entrevistas, foram liberados 144.580 alevinos de Tilpia em tanques espalhados em todo o Estado, sendo que 46% destes tanques esto localizados no municpio de Porto Grande (Figura 2), onde se encontram as nascentes de dois importantes rios do Estado, o matapi e o Pedreira, alm do municpio ser cortado pelo rio araguari (Figura 3). Este grande nmero de criadores principalmente devido grande atividade produtora da colnia agrcola do matapi que fica no entorno da nascente do rio matapi, alm desta rea ser cercada por inmeros igaraps que iro formar este rio. Os

    municpios de Pedra Branca do amapari e mazago aparecem em seguida como grandes produtores de Tilpia. Vale ressaltar que apesar do municpio de macap no se encontrar entre os grandes criadores de Tilpia, esse fato pode estar mascarado, visto que devido s propores do municpio apenas foi feita uma amostragem, enquanto que nos outros municpios foi realizado um censo.

    Com o potencial desenvolvimento da aqicultura no Estado, necessrio se preocupar primeiramente com a questo ambiental, principalmente por se tratar de empreendimentos que interagem diretamente com o meio ambiente estando localizados muito prximos aos corpos dgua e nascentes, inclusive prximos a reas de proteo e o uso no controlado desse corpo dgua, assim como o efluente no tratado do tanque/viveiro, podem causar impacto negativo nos recursos hdricos (Castellani & Barrella, 2005). Um dficit na qualidade de gua que pode ser causado por maus criadores que no se preocupam em manter intactas as fontes de gua a jusante de seus empreendimentos pode vir a causar um prejuzo ambiental muito grande, impossibilitando o estabelecimento de vrios organismos essenciais cadeia alimentar, seja pelo alto grau de eutrofizao do ambiente ou pela introduo de espcies exticas. Tudo isto pode causar um impacto social muito grande, pois o peixe, aquele nativo das principais fontes dgua, constitui a base da alimentao da populao amapaense, o que leva a supor que, caso a atividade piscicultora no seja bem planejada em todos seus aspectos, quando incentivada, pode gerar benefcios a alguns poucos que tm condies de investir neste tipo de empreendimento e causar danos muito maiores queles que dependem do peixe em seu ambiente natural para seu sustento.

    muitas so as espcies de peixes criadas no amap. 62 % dos tanques analisados apresentaram tambaqui (Colossoma macropomum), destes, 37% continham o tambaqui com uma ou mais espcie de peixes, sendo que 21% combinava o tambaqui com a Tilpia. alm desses, outros 33% apresentavam a Tilpia exclusivamente ou em combinao com outras espcies (Figura 4). Outros peixes criados, com exceo

    Figura 1- Ambientes de criao de Tilpia no Estado do Amap.

    Figura 2- Distribuio dos empreendimentos aquicultores nos municpios do Estado do Amap.

  • 528 vol. 38(3) 2008: 525 - 530 gama

    a criao de tilpia no estado do amap como fonte de risco ambiental

    da carpa que, como a Tilpia, que uma espcie extica, e do tambacu que constitui um hbrido entre o tambaqui e o pacu, so encontrados no ambiente e chegam aos tanques seja intencionalmente ou por acaso, principalmente pela falta de isolamento do tanque com o meio por meio de telas. Os peixes encontrados sob criao foram o acar catitu (Geophagus surinamensis), mafur (Serrasalmus denticulatus), trara (Hoplias malabaricus), jeju (Hoplerythrinus sp.), apaiari (Astronotus ocellatus), pratinha (Metynnis sp.), Curimat (Curimatidae), tamoat (Hoplosternum sp., Callichthys sp. Megalechis sp.), aracu branco (Leporinus sp.), bacu (Doradidae), e o pirarucu (Arapaima gigas). muitos desses peixes so indesejveis criao, pois so predadores e causam danos muito srios ao empreendimento.

    No amap, 70% dos tanques com Tilpia se encontram em reas de vrzea e destes, 26% j tiveram parte de seu estoque liberado ao meio devido a enchentes e outros 37% no possuem nenhum tipo de tela no escoamento dos tanques. Cerca de 4% dos tanques so feitos dentro de igaraps e 8%

    se utilizam de nascentes de igaraps. Destes ltimos, em 50% dos casos j aconteceram solturas para o corpo dgua.

    apenas 40% dos entrevistados afirmaram no ter sofrido nenhum tipo de dano ambiental. Como dano ambiental, podemos citar o problema de secas, enchentes e predadores. 40% sofreram danos com predadores como ariramba (Chloroceryle amazona, Ceryle torquata), gara (Casmerodius sp.), jacar (Caiman sp., Paleosuchus sp.), lontra (Lontra longicaudis), soc (ardeidae), bem-te-vi (Pitangus sulphuratus), Odonata, sucuri (Eunectes sp.), gavio (Falconiformes), mucura (Didelphis sp.), arapap (Cochlearius cochlearius), maarico (Charadriformes), gaivota (Laridae), sapo, mussum (Symbranchus marmoratus), trara (Hoplias sp.), barata dgua (Hemiptera), jacund (Crenicichla sp.), mergulho (Podicipedidae), jeju (Hoplerythrinus sp., Erythrinus sp.), poraqu (Electrophorus electricus) e morcegos. 12% j sofreram com prejuzos causados por enchentes, seja por chuva forte que aumenta o nvel do reservatrio causando o transbordamento, ou por inundao do corpo dgua, este ltimo fator ainda mais grave quando so utilizadas represas e telas dentro de igaraps. Os predadores que entram nos tanques causam danos to grandes criao que mesmo num tanque em Serra do Navio, onde foram colocadas 90 Tilpias de 10cm esperando que elas se reproduzissem e povoassem os tanques, devido presena de predadores no tanque como jacund (Crenicichla sp.), uua (Acestrorhynchus sp.) e trara (Hoplias malabaricus), apenas sobraram 10 peixes entre 20 e 30 cm. O proprietrio no sabe como esses predadores apareceram no tanque, pois ele afirmou que o tanque nunca sofreu enchente, mas como o tanque no apresentava nenhuma tela na entrada de gua pode-se concluir que os predadores conseguem entrar nos tanques e da mesma forma os indivduos criados tambm conseguem sair dos mesmos.

    Um dos fatores que desestimula a criao de outros peixes diferentes da Tilpia que, por exemplo, muito dizem que o

    Figura 3 - Mapa do Estado do Amap com a localizao dos empreendimentos criadores de Tilpia analisados. Fonte: Convnio PROBEM/IEPA-CPZG e COT/IEPA.

    Figura 4- Espcies de peixes encontradas nos tanques analisados.

  • 529 vol. 38(3) 2008: 525 - 530 gama

    a criao de tilpia no estado do amap como fonte de risco ambiental

    tambaqui oferece pouco retorno. Os criadores reclamam do preo da rao e dizem que necessitariam de uma alimentao mais barata, pois o tempo necessrio para o tambaqui alcanar um tamanho satisfatrio para a venda maior que no caso da Tilpia.

    mesmo com o grande incentivo que existe no Estado para a criao da Tilpia existem aqicultores que reclamam de sua criao. Um entrevistado afirmou que no criaria mais a Tilpia, depois de j ter tentado e se decepcionado. Ele afirmou que mesmo com um ano e meio de criao, a Tilpia no alcana 1kg. Isso acontece com todos os criadores de Tilpia do Estado, pois todos os alevinos adquiridos que chegam ao amap no so revertidos sexualmente e segundo Leonhardt & Urbinati (1999) os machos revertidos sexualmente apresentam incremento em peso dirio acima do observado para machos sexados, no entanto, deve-se sempre considerar a densidade de cultivo, o ambiente de cultivo, o regime alimentar e outros fatores que possam interferir no incremento dirio em peso dos peixes. Como a Tilpia uma espcie que comea a se reproduzir em muito pouco tempo, quando so cultivados machos e fmeas no mesmo tanque, logo eles esto superpovoados, causando uma falsa sensao de satisfao ao criador, pois ele no tem recurso para alimentar um nmero to grande de peixe e nem espao para que os eles se desenvolvam, aumentando a biomassa do tanque, mas diminuindo o valor comercial dos peixes como observado por mainardes-Pinto et al. (2007). Beyruth et al. (2004) realizaram estudos sobre alimentao de Oreochromis niloticus em tanques de terra e observaram que apesar do arraoamento, os alimentos naturais foram utilizados em propores considerveis pela espcie cultivada, mostrando a importncia de se manter um ambiente de criao estvel. No municpio de Serra do Navio um produtor liberou 230 indivduos de Tilpia em seu tanque, que na verdade era uma represa dentro do igarap e mesmo tendo muitos predadores e tendo sofrido perda de peixes com uma enchente, aps cerca de um ano da liberao dos peixes que estavam sendo devidamente alimentados durante esse perodo, o criador estima que possui cerca de 6.000 exemplares de Tilpia.

    apesar de a criao de Tilpia ser ilegal, pois se trata de um peixe extico e que deve ser portanto desestimulado, principalmente por existir uma quantidade muito grande de peixes nativos, de fcil criao e de boa aceitao no mercado, como o caso do tamoat, do acar e do aracu, por exemplo, ainda existem vrios projetos sendo aprovados com financiamento pblico para a produo desses peixes, inclusive em propriedades pblicas como escolas famlias agrcolas. alm disso, ainda existem casos como o de um criador que depois de ter todos seus peixes mortos devido a um parasita que os atacou, ganhou da prefeitura de seu municpio 80 indivduos de Tilpia para recomear a sua produo.

    Nenhum dos criadores entrevistados se preocupou em adquirir exemplares sexualmente revertidos, deixando que se reproduzam continuamente em seus tanques e em casos de solturas, so liberados exemplares em todos os estgios de desenvolvimento. Isto parece no incomodar muito os criadores, pois muitos acham que seria um muito bom se a Tilpia povoasse os corpos dgua da regio. muitas das solturas registradas foram feitas intencionalmente segundo esta perspectiva como tambm foi observado por Castellani & Barrella (2006) na bacia do rio Ribeira de Iguape, SP, onde os peixes eram liberados ao ambiente seja por deciso do piscicultor ou por inundaes devido ao alto regime pluviomtrico da regio. Este ato considerado muito grave e segundo a lei 9.605 de 12 de fevereiro de 1998, Captulo V, artigo 31, da Legislao Brasileira do meio ambiente, considerado crime ambiental introduzir espcime animal no Pas, sem parecer tcnico oficial favorvel e licena expedida por autoridade competente, podendo conferir a pena de deteno por 3 meses a um ano e multa (Rocco, 2002). a introduo de espcies exticas em reservatrios brasileiros foi recomendada durante as dcadas de 1960-70 visando medidas profilticas no combate aos vetores de algumas doenas tropicais. mais recentemente essas introdues passaram a ter outros enfoques, como o fornecimento de protena de boa qualidade e de baixo custo, alm da melhoria da qualidade da gua de reservatrios que tm como principal finalidade o abastecimento de centros urbanos (Barbieri et al., 2000). a falta de conhecimento a principal causa destes atos. muitas vezes os produtores no so informados sobre a possibilidade de se adquirir exemplares revertidos e muito menos sobre possveis danos ao meio ambiente. as pessoas que incentivam a criao de Tilpia no Estado costumam afirmar que seria timo se todos os rios do Estado fossem povoados por Tilpia, no se preocupando com as conseqncias que isto pode causar sua biodiversidade. a falha no processo de introduo traz impactos desastrosos ao ecossistema ao invs de benefcios (minns & Cooley, 1999). muitas introdues tm produzido poluies biolgicas ao longo do mundo, degradando os frutos da evoluo.

    Esta preocupao com introdues de peixes oriundas de atividades piscicultoras tem aumentado em todo o mundo. a FaO (1995) ressalta que por causa da alta probabilidade dos impactos causados pela introduo de espcies serem irreversveis e imprevisveis, muitas introdues de espcies no so desejveis por precauo.

    Segundo Castellani & Barrella (2006), a alterao da composio da fauna ictica pela introduo de peixes exticos, alguns do quais carnvoros e de grande voracidade, pode ser considerada preocupante. Pescadores artesanais entrevistados em Registro (SP) afirmaram ter capturado bagre-africano (Clarias gariepinus) junto com cardume de manjuba, e que no

  • 530 vol. 38(3) 2008: 525 - 530 gama

    a criao de tilpia no estado do amap como fonte de risco ambiental

    estmago de um bagre-africano havia 19 manjubas. Outros pescadores atribuem a recente diminuio do sagiru e de pequenos bagres nativos predao por espcies exticas.

    CONCLUSOPode-se concluir que o r i sco ambienta l dos

    empreendimentos visitados muito grande principalmente devido localizao dos tanques. a falta de recursos faz com que os criadores procurem reas prximas a corpos dgua, que seria completamente aceitvel caso fossem tomadas medidas preventivas para evitar impactos ambientais. Grande parte dos tanques so construdos em ambientes de vrzea, que so muito frgeis por apresentarem contato direto com o corpo dgua. alm disso ainda foram encontrados tanques construdos em ressacas, nascentes de rios e o mais preocupante que seria o caso de pessoas que fecham igaraps e lagos com algum tipo de tela e jogam os peixes diretamente dentro destes corpos dgua, tornando visvel o impacto que pode estar sendo causado por tais atos.

    apesar de a Tilpia no conseguir resistir num tanque com muitos predadores, no possvel afirmar que, quando solta no ambiente, esta no se estabeleceria. So necessrios estudos nos locais onde houveram as introdues registradas para a definio do impacto causado no ambiente por esta espcie.

    O desenvolvimento de piscicultura com a utilizao de espcies nativas pode ser visto como um impacto positivo, portanto faz-se necessrio um trabalho de incentivo criao destes peixes e, conseqentemente, ao uso de boas prticas nesse tipo de empreendimento.

    BIBLIOGRAFIA CITADAminns, C. K.; J.m. Cooley. 1999. Intentional Introductions: are

    the Incalculable Risks Worth It? In: Claudi, R.; Leach, J. H. (eds.). Nonindigenous freshwater organisms: vectors, biology and impacts. Boca Raton. Lewis Publisher. pp. 57-60

    Rocco, R. 2002. Legislao Brasileira do meio ambiente. Rio de Janeiro, DP&a Editora. 283p.

    Beyruth, Z.; mainardes-Pinto, C. S. R.; Fusco, S. m., Faria, F. C.; Silva, a. L. 2004. Utilizao de alimentos naturais por

    Oreochromis niloticus em tanques de terra com arraoamento. B. Inst. Pesca, So Paulo, 30(1): 9 24.

    Barbieri, G.; Teixeira-Filho, a. R.; Campos, E. C., Vermulm Jr., H.; Giamas, m. T. D. 2000. Biologia populacional da Tilpia Oreochromis niloticus, da represa de Guarapiranga, So Paulo III. atividade alimentar. B. Inst. Pesca, So Paulo, 26(1): 15-17.

    Castellani, D.; Barrella, W. 2005. Caracterizao da piscicultura na regio do Vale do Ribeira, SP. Cincia e agrotecnologia, Lavras, 29(1): 168-176.

    Pdua, H.B. 2001. Impacto ambiental: um impacto na aqicultura. Revista Brasileira de agropecuria, 1(12): 1-66.

    mainardes-Pinto, C. S. R.; Paiva, P.; Verani, J. R.; andrade-Talmelli, E. F.; Wirz, m. V. m. a.; Silva, a. L. 2007. Desempenho produtivo da tilpia tailandesa, Oreochromis niloticus, estocada em diferentes quantidades de tanques-rede instalados em viveiros povoados com a mesma espcie. B. Inst. Pesca, So Paulo, 33(1): 53 62.

    Leonhardt, J. H.; Urbinati, E. C. 1999. Estudo comparativo do crescimento entre machos de tilpia do nilo, Oreochromis niloticus, sexados e revertidos. Boletim do Instituto de Pesca, So Paulo, 25 (nico): 19 26.

    Kestmont, P. 1995. Different system of carp production and their impacts on the environment. aquaculture, amsterdam, 129: 347-372.

    Recebido em 28/03/2006Aceito em 10/06/2008