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RAP Rio de Janeiro 40(6):1077-96, Nov./Dez. 2006 A contabilidade da gestão ambiental e sua dimensão para a transparência empresarial: estudo de caso de quatro empresas brasileiras com atuação global* João Eduardo Prudêncio Tinoco** Léo Tadeu Robles*** S UMÁRIO : 1. Introdução; 2. Objetivos; 3. Desenvolvimento teórico; 4. Estudo de caso de empresas brasileiras; 5. Considerações finais. S UMMARY : 1. Introduction; 2. Objectives; 3. Theory development; 4. Case study of Brazilian firms; 5. Final remarks. P ALAVRAS-CHAVE : contabilidade da gestão ambiental; transparência; sus- tentabilidade. K EY WORDS : environmental management accounting; transparency; sus- tainability. Este artigo, com base nos casos de quatro empresas brasileiras com atuação global, aborda a contabilidade da gestão ambiental, em estudo exploratório que permitiu identificar a preocupação com a sustentabilidade econômica e o desenvolvimento social, bem como a importância do tema para a pesquisa acadêmica e para o apoio às decisões gerenciais e seu papel efetivo na comu- nicação das ações empresariais, em um passo à frente dos ditames legais. * Artigo recebido em dez. 2005 e aceito em ago. 2006. ** Doutor em ciências contábeis, FEA/USP; professor-assistente doutor do Programa de Pós- Graduação em Gestão de Negócios da Universidade Católica de Santos (UniSantos). Ende- reço: Rua Carvalho de Mendonça, 144 — Vila Mathias — CEP 11070-906, Santos, SP, Brasil. E-mail: [email protected]. *** Doutor em administração, FEA/USP; professor-assistente doutor do Programa de Pós-Gra- duação em Gestão de Negócios da Universidade Católica de Santos (UniSantos). Endereço: Rua Carvalho de Mendonça, 144 — Vila Mathias — CEP 11070-906, Santos, SP, Brasil. E-mail: [email protected].

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RAP Rio de Jane iro 40(6):1077-96, Nov. /Dez . 2006

A contabilidade da gestão ambiental e sua dimensão para a transparência empresarial: estudo de caso de quatro empresas brasileiras com atuação global*

João Eduardo Prudêncio Tinoco**Léo Tadeu Robles***

S U M Á R I O : 1. Introdução; 2. Objetivos; 3. Desenvolvimento teórico; 4. Estudode caso de empresas brasileiras; 5. Considerações finais.

S U M M A R Y : 1. Introduction; 2. Objectives; 3. Theory development; 4. Casestudy of Brazilian firms; 5. Final remarks.

PA L A V R A S - C H A V E : contabilidade da gestão ambiental; transparência; sus-tentabilidade.

KE Y W O R D S : environmental management accounting; transparency; sus-tainability.

Este artigo, com base nos casos de quatro empresas brasileiras com atuaçãoglobal, aborda a contabilidade da gestão ambiental, em estudo exploratórioque permitiu identificar a preocupação com a sustentabilidade econômica e odesenvolvimento social, bem como a importância do tema para a pesquisaacadêmica e para o apoio às decisões gerenciais e seu papel efetivo na comu-nicação das ações empresariais, em um passo à frente dos ditames legais.

* Artigo recebido em dez. 2005 e aceito em ago. 2006.** Doutor em ciências contábeis, FEA/USP; professor-assistente doutor do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Negócios da Universidade Católica de Santos (UniSantos). Ende-reço: Rua Carvalho de Mendonça, 144 — Vila Mathias — CEP 11070-906, Santos, SP, Brasil.E-mail: [email protected].*** Doutor em administração, FEA/USP; professor-assistente doutor do Programa de Pós-Gra-duação em Gestão de Negócios da Universidade Católica de Santos (UniSantos). Endereço:Rua Carvalho de Mendonça, 144 — Vila Mathias — CEP 11070-906, Santos, SP, Brasil. E-mail:[email protected].

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Environmental management accounting and its dimension in businesstransparency: case study of four Brazilian firms with global activityThis article, based on four Brazilian firms with global action, addresses envi-ronmental management accounting. An exploratory study identifies the firms’concerns with economic sustainability and social development, as well as thesubject’s relevancy not only for further academic research, but also in support-ing managerial decisions. The study shows effective role of environmentalmanagement accounting in communicating the firms’ actions, a step ahead oflegal constraints.

1. Introdução

A interferência do ser humano sobre os sistemas naturais, causando seu com-prometimento, tem feito com que se discuta e se implemente cada vez maisações que, ao contemplar a questão ambiental, visem não comprometer tantoa qualidade de vida da atual população e também a das próximas gerações.

A evolução das entidades ao longo do tempo evidenciou uma preocupa-ção centrada na eficácia e eficiência dos sistemas produtivos. Mais recentemen-te, essa visão revelou-se insatisfatória, ficando evidente que o contexto deatuação das empresas a cada dia torna-se mais complexo e o processo decisó-rio sofre restrições cada vez mais severas. Um dos componentes importantesdessa reviravolta nos modos de pensar e agir foi o crescimento da consciênciaecológica, na sociedade, nos governos e nas próprias empresas.

Recentemente, a sociedade passou a demandar das empresas informa-ções sobre a questão ambiental. Assim, a contabilidade, além do registro detransações econômicas, passa a apresentar eventos ambientais, assumindo opapel de divulgação das ações de gestão ambiental, tendo em vista prevenir ecorrigir danos, bem como salvaguardar os patrimônios empresarial e nacio-nal. Essa imposição independe da entidade ser ou não ambientalmente ínte-gra. Como explicitaram Lima e Viegas (2002:47),

a preocupação com a questão ambiental é ética e econômica. Dela depen-de a permanência da empresa no mercado. Nesse contexto, a contabilida-de se atualiza ao buscar procedimentos que proporcionem a evidenciaçãoda informação ecológica, promovendo a discussão do tema entre seus pes-quisadores e profissionais.

A contabilidade da gestão ambiental, conforme Bergamin Jr. (1999),passou a ter status de ramo da ciência contábil a partir da publicação em feve-reiro de 1998, do “Relatório financeiro e contábil sobre o passivo e custos am-

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bientais”, pelo Grupo de Trabalho Intergovernamental de Especialistas paraPadrões Internacionais de Contabilidade e de Relatórios das Nações Unidas(Isar — United Nations Intergovernamental Working Group of Experts on In-ternational Standards of Accounting and Reporting).

Bergamin Jr. (1999) diz que, paralelamente a esse trabalho, o Isar vemcoordenando esforços com o Comitê Internacional de Práticas de Auditoria(International Auditing Practices Committee — Iapc), a fim de formalizar umconjunto de padrões de auditoria voltados para a verificação do desempenhoambiental relatado nas demonstrações contábeis.

A contabilidade, entendida como meio de fornecer informações para share-holders (acionistas) e para stakeholders (parceiros ou atores sociais relevantes),no enfrentamento desse desafio, deve também atender aos interessados na atua-ção com relação ao meio ambiente por parte das empresas, clarificadas em sis-temas de gestão ambiental, explicitando suas respostas à sociedade no quetange à responsabilidade social e à questão ambiental, subsidiando o processode tomada de decisão.

Por outro lado, a gestão da qualidade nas empresas passa pela obriga-toriedade de implantação de sistemas organizacionais e de produção que va-lorizem os bens naturais, as fontes de matérias-primas, as potencialidades doquadro humano criativo, as comunidades locais e pelo início de um novo ci-clo onde a cultura do descartável e do desperdício seja coisa do passado. As-sim, impõem-se às entidades atividades de reciclagem, incentivo à diminuiçãodo consumo, controle de resíduos, capacitação permanente dos quadros pro-fissionais, em diferentes níveis e escalas de conhecimento, fomento ao traba-lho em equipe e às ações criativas.

A contabilidade da gestão ambiental alinha-se, portanto, aos esforçosda sustentabilidade, não somente econômica, mas sobretudo humana.

Dessa forma, analisa-se a utilização da contabilidade da gestão ambien-tal como facilitadora do uso e compartilhamento de informações contábeis,para a otimização da eficiência do uso dos recursos naturais, a fim de reduziro impacto e o risco ambiental e os gastos na preservação ambiental. A ques-tão ambiental, pela sua relevância junto à sociedade moderna, tem de ser in-corporada aos demonstrativos contábeis, pois seu impacto sobre os resultadosempresariais ocorre a curto, médio e longo prazos.

Com base numa revisão bibliográfica sobre o tema, analisamos e co-mentamos os resultados econômicos, financeiros e ambientais de quatro em-presas brasileiras, com inserção no mercado mundial, como exportadoras eimportadoras de produtos e insumos; com grandes volumes transportados emanuseios de cargas nos portos brasileiros; conhecidas pela sua preocupaçãoe atuação na questão ambiental, a partir de suas demonstrações contábeis e

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relatórios complementares publicados no Brasil e no exterior; complementa-da com entrevistas com profissionais dessas empresas e a análise de informa-ções obtidas em seminários técnicos especializados.

2. Objetivos

Este artigo tem os seguintes objetivos:

g analisar a nova dimensão que se apresenta para a contabilidade ao incor-porar informações sobre a questão ambiental, respondendo às exigênciasde uma sociedade mais consciente na utilização sustentável de recursosnaturais;

g verificar o estado da contabilidade da gestão ambiental, a partir da análi-se de informações econômico-financeiras, estudando os casos de quatroempresas nacionais com atuação global;

g apontar, a partir das informações analisadas, os próximos passos para essanova dimensão da contabilidade que, semelhantemente à questão ambien-tal para as estratégias empresariais, deve ser necessariamente incorporadaaos demonstrativos contábeis, relatórios de administração, notas explicati-vas e pareceres dos auditores.

A relativa recentidade do tema abordado indicou a conveniência daadoção de uma metodologia tridimensional, ou seja, uma revisão bibliográ-fica do tema, tanto de estudos nacionais, quanto internacionais, análise dosdemonstrativos econômicos, financeiros e socioambientais de quatro empre-sas brasileiras com inserção global, complementada com entrevistas junto aexecutivos dessas empresas e a participação em seminários técnicos espe-cializados realizados pela Abamec-SP (2002) e pela Apimec-SP (2004), quetêm como público-alvo profissionais do mercado de capitais e consultores eanalistas de empresas e investimentos.

A pesquisa foi fundamentada no estudo de casos múltiplos, de quatroempresas nacionais: a Vale — Companhia Vale do Rio Doce; a Petrobras —Petróleo Brasileiro S.A.; a CSN — Companhia Siderúrgica Nacional; e a CST— Companhia Siderúrgica de Tubarão. Foram analisados suas demonstra-ções contábeis, relatórios de administração, notas explicativas, pareceres dosauditores, bem como relatórios socioambientais, abordando questões relati-vas ao meio ambiente e seus reflexos na sustentabilidade econômica e social.

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De forma complementar, acessamos os instrumentos disponibilizadospelas empresas para atuação no mercado internacional de capitais, especifica-mente na Bolsa de Valores de Nova York. Em decorrência da negociação depapéis mobiliários nessa bolsa, as empresas devem fornecer informações por-menorizadas de seu desempenho econômico, financeiro, social e ambiental àComissão de Valores Mobiliários Americana (Securities and Exchange Comis-sion — SEC), utilizando um documento denominado formulário 20-F.

Esse fato, por si só, induziu a realização de entrevistas não-estrutura-das e abertas com executivos das empresas estudadas, para se qualificar eaprofundar a questão básica da utilização ou incorporação aos demonstrati-vos contábeis das questões ambientais e determinar-se, com base nos casos, autilização externa e aparente dessas informações e seu uso interno nas em-presas em apoio às decisões empresariais.

Ou seja, a metodologia utilizada e as formas de levantamento das infor-mações e de realização de entrevistas caracterizam o estudo como explorató-rio, pelo enquadramento do estudo na tipologia proposta por Yin (1990). Amaior limitação do método do estudo de caso é a de não permitir generaliza-ção para a população, da qual extraímos uma amostra para pesquisa. Os estu-dos realizados para este artigo, embora com a profundidade adequada, têmcomo objetivo de uso a sua replicação, conforme dito anteriormente, e nãosua generalização.

3. Desenvolvimento teórico

As inovações trazidas pela contabilidade da gestão ambiental estão associa-das a pelo menos três temas:

g definição de custos, despesas operacionais e passivos ambientais;

g forma de mensuração do passivo ambiental, com destaque para o decor-rente de ativos de vida longa;

g utilização intensiva de notas explicativas e divulgação de relatórios am-bientais abrangentes, bem como o uso de indicadores de desempenho ambi-entais — ecoindicadores — padronizados no processo de fornecimento deinformações ao público.

Neste momento, em que as questões sociais, ambientais e de sustenta-bilidade estão sendo abordadas pela comunidade, Gray (2003) explicita que

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as questões críticas que afetam a humanidade estão, no geral, sendo ignora-das e há uma inadequação na forma como estão sendo tratadas.

O objetivo necessário de conservação do meio ambiente tende a levar acontabilidade a assumir controles dos seguintes aspectos:

g fornecimentos — de recursos mínimos e uso extensivo de materiais reci-clados ou renováveis;

g processos produtivos e investimentos em imobilizado — mínimo consumode água e energia, mínima emissão atmosférica e mínima quantidade deresíduos;

g características do produto — mínimos vasilhames e embalagens, recicla-gem e reutilização.

Esse novo fazer foi construído com ênfase a partir dos resultados daRio-92, onde a noção de desenvolvimento sustentável se alastrou e se estrutu-rou. A noção e os conceitos de sustentabilidade trazem como novo desafio oscaminhos para a gestão ambiental.

O novo paradigma — gestão ambiental

Gestão ambiental é o sistema que inclui a estrutura organizacional, ativida-des de planejamento, responsabilidades, práticas, procedimentos, processos erecursos para desenvolver, implementar, atingir, analisar criticamente e man-ter a política ambiental. É o que a empresa faz para minimizar ou eliminar osefeitos negativos provocados no ambiente pelas suas atividades.

Logo, para que uma empresa passe realmente a trabalhar com gestãoambiental deve, inevitavelmente, mudar sua cultura organizacional e empre-sarial. A gestão ambiental tem se configurado como uma das mais importan-tes atividades relacionadas com qualquer empreendimento.

O gerenciamento ambiental passa a ser um fator estratégico para análi-se da alta administração das organizações, incluindo uma série de atividadesa serem consideradas, como: formular estratégias de administração para omeio ambiente; assegurar a conformidade com as leis ambientais; implemen-tar programas de prevenção à poluição; gerir instrumentos de correção de da-nos ao meio ambiente; adequar os produtos às especificações ecológicas;monitorar o programa ambiental da empresa de encontro ao conceito de ex-celência ambiental, como uma vantagem competitiva.

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O quadro 1 apresenta uma visão da gestão ambiental, explicitando as-pectos da gestão de processos, gestão de resultados, gestão da sustentabilida-de e gestão do plano ambiental.

A primeira dúvida que surge ao considerarmos a questão ambiental doponto de vista empresarial é o aspecto econômico. Qualquer providência que ve-nha a ser tomada em relação à variável ambiental, surge a idéia de que as despe-sas aumentam e o conseqüente acréscimo dos custos do processo produtivo.

Donaire (1999:51) menciona que

algumas empresas, porém, têm demonstrado que é possível ganhar di-nheiro e proteger o meio ambiente mesmo não sendo uma organizaçãoque atua no chamado “mercado verde”, desde que as empresas possuamcerta dose de criatividade e condições internas que possam transformaras restrições e ameaças ambientais em oportunidades de negócios.

Q u a d r o 1

Visão geral da gestão ambiental

Gestão de processos

Gestão de resultados

Gestão de sustentabilidade

Gestão do plano ambiental

Exploração de recursos Emissões gasosas Qualidade do ar Princípios e compromissos

Transformação de recursos

Efluentes líquidos Qualidade da água Política ambiental

Acondicionamento de recursos

Resíduos sólidos Qualidade do solo Conformidade legal

Transporte de recursos

Particulados Abundância e diversidade da flora

Objetivos e metas

Aplicação e uso de recursos

Odores Abundância e diversidade da fauna

Programa ambiental

Quadros de riscos ambientais

Ruídos e vibrações Qualidade de vida do ser humano

Projetos ambientais

Situações de emergência Iluminação Imagem institucional Ações corretivas e preventivas

Fonte: Macedo, 1994.

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Existem três razões básicas para uma empresa adotar essa especificida-de da contabilidade:

g gestão interna — está relacionada com uma ativa gestão ambiental e seucontrole, visando reduzir custos e despesas operacionais e melhorar a qua-lidade dos produtos;

g exigências legais — a crescente exigência legal e normativa pode obrigaros administradores a controlarem mais seus riscos ambientais, sob pena demultas e indenizações;

g demanda dos parceiros sociais — a empresa está submetida cada vez maisa pressões internas e externas. Essas demandas podem ser dos clientes,empregados, organizações ecológicas, seguradoras, comunidade local, acio-nistas, administração pública, bancos, investidores etc.

O quadro 2 mostra a classificação dos tipos de contabilidade da gestãoambiental proposta pela EPA (2002).

Tendo em vista a tipologia proposta no quadro 2, este artigo está fo-cado basicamente na contabilidade gerencial ambiental. Podemos definirentão a contabilidade da gestão ambiental (CGA), de acordo com a Di-visão para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, como “umaabordagem combinada que facilita a transição de informação da contabili-dade financeira e da contabilidade de custos para aumentar a eficiência demateriais, reduzir o impacto e o risco e reduzir os custos de salvaguardaambiental”.

Q u a d r o 2

Tipos de contabilidade da gestão ambiental

Discriminação Enfoque Dirigido ao usuário

Contabilidade nacional Macroeconômico, economia nacional Externo

Contabilidade financeira A empresa Externo

Contabilidade gerencial ou de custos

A empresa, departamentos, linha de produção etc.

Interno

Fonte: <http://es.inel.gov/partners/acctg/acctg.htm>.

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A utilização da contabilidade de gestão ambiental pode proporcionargrandes reduções de custos na gestão de resíduos, dado que os custos de ma-nuseio e de deposição de resíduos são relativamente fáceis de definir e de im-putar a produtos específicos. Outros custos/despesas ambientais, incluindo osda conformidade ambiental, legais, deterioração da imagem da empresa, ris-cos e responsabilidade ambiental, são mais difíceis de avaliar. A contabilida-de de gestão ambiental, segundo a EPA (2002):

g está focalizada nos custos internos à companhia;

g não inclui custos externos à sociedade;

g dá ênfase particular na contabilidade para custos ambientais;

g a sua informação pode ser usada para a maioria de tipos de atividade oude tomada de decisão da gerência dentro de uma organização, mas é par-ticularmente útil para atividades ambientais proativas da gerência.

Os problemas ambientais que afetam as empresas poderão ser reduzi-dos, ou até eliminados, se forem adotadas metodologias inovadoras de gestãono trato ambiental. Esses problemas tornam as empresas menos competitivas,já que incrementam seus custos, tornando-as débeis perante os concorrentes,podendo, inclusive, levar ao encerramento das atividades operacionais.

Ademais, a poluição e os impactos ambientais de toda ordem prejudi-cam a comunidade, gerando problemas de saúde para os cidadãos e gastoscrescentes para o poder público. Entre essas metodologias, que as empresaspodem lançar mão para adequar-se à competitividade e à sustentabilidadeeconômica, podemos destacar o uso do balanço de massa.

Um balanço de massa poderá ser elaborado para um conjunto específi-co de insumos ou processos, ou para todos os insumos e resíduos de uma em-presa. O objeto central do balanço aos processos é o registro dos insumosutilizados na empresa.

O balanço de massa é uma equação que se baseia no princípio de que“tudo o que entra terá de sair ou ficar estocado”, dessa forma propõe-se o re-gistro e o acompanhamento dos fluxos de materiais, segundo uma análise deentrada e saída no processo produtivo. Conforme a Divisão para o Desenvol-vimento Sustentável das Nações Unidas (2001:36):

com o aumento dos custos em gestão de resíduos e em cumprimento dalegislação ambiental, além da necessidade de melhorar a eficiência dosmateriais utilizados em mercados competitivos, o registro dos fluxos de

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materiais em toda a empresa tem sido a ferramenta mais importante naprocura de melhorias, quer na prevenção de resíduos, quer na utilizaçãode uma produção mais limpa.

Segundo Tinoco e Kraemer (2004), todos os itens, componentes doprocesso produtivo, que incluem normalmente matérias-primas, materiais au-xiliares, embalagens, água e energia, são mensurados em unidades físicas demassa (kg, t), de volume (l, m³) ou energia (MJ, kWh). O consumo dos diver-sos insumos no processo produtivo, em nível de centros de custos e de produ-tos, é comparado com as quantidades produzidas e vendidas, bem como osresíduos e as emissões. O balanço de massa objetiva a melhoria da eficiênciana gestão dos insumos em termos econômicos, sociais e ambientais, ou seja,de ecoeficiência.

Os balanços de massas podem ser elaborados para indicar as quanti-dades de matéria-prima e outros materiais secundários consumidos no pro-cesso produtivo, efetivamente incorporados ao(s) produto(s) final(is) e aquantidade que é desperdiçada, como resíduos e emissões líquidas ou gaso-sas. O desenvolvimento dos balanços de massa é geralmente elaborado emquilogramas e acompanhado por balanços de energia em kWh e balanços deágua em m³.

Para agregar e avaliar a informação para uma análise desse tipo, o sis-tema de informação da empresa terá que estar capacitado para fornecer in-formações sobre as quantidades compradas e consumidas, produzidas edesperdiçadas. Visando melhorar a qualidade de informação ambiental dis-ponível, bem como sua consistência, pode-se definir um sistema regular deacompanhamento.

O sistema de informação do balanço de massa permite obter e divul-gar, periodicamente: dia/semana/mês/ano, informações financeiras, físicas equalitativas sobre a origem das entradas de matérias-primas, materiais auxi-liares, insumos em geral, produção e saídas de produtos, emissões e resíduos.Esse sistema deve estar vinculado à contabilidade financeira e à contabilida-de de custos/gerencial.

4. Estudo de caso de empresas brasileiras

Em 27 de junho de 2002, aconteceu o Seminário da Abamec-SP com o tema“Meio ambiente e os resultados financeiros” e, em 11 de março de 2004, a Api-mec-SP realizou o seminário “O meio ambiente e os resultados financeiros nossetores petróleo, gás e mineração”. Nesses seminários, várias empresas industri-

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ais apresentaram os resultados econômicos, financeiros, sociais e ambientais desua política de gestão ambiental. Entre elas, optamos por analisar os casos daCompanhia Siderúrgica Nacional — CSN; da Petróleo Brasileiro S.A. — Petro-bras; da Companhia Vale do Rio Doce; e da CST — Companhia Siderúrgica deTubarão.

A escolha pode ser justificada pela possibilidade de se contar com de-monstrações financeiras publicadas nos EUA, para três dessas empresas, emfunção de exigências legais locais e pela possibilidade aberta aos pesquisado-res de terem contato com executivos dessas empresas, complementando da-dos para o estudo do caso. A CST, embora não opere no mercado acionáriointernacional, tem-se notabilizado por uma expressiva e consistente atuaçãoambiental responsável, conforme veremos adiante.

Companhia Siderúrgica Nacional (CSN)

A CSN evidenciou, em 2002, que tem sua política ambiental justificada tam-bém pela exigência de mercados externos, onde as certificações são uma prá-tica, inclusive as do tipo selos “verdes”, e mesmo em função do mercadonacional; no qual, conforme pesquisa do Instituto Ethos 2001, citada pela em-presa, 22% dos consumidores brasileiros privilegiam ou punem concorrentespelo desempenho ambiental. Outra questão levantada é a submissão à audito-ria ambiental como exigência de clientes, para determinar o desempenho doprocesso e a higiene do produto.

A política ambiental se materializa pela adoção dos princípios de:

g ecoeficácia — melhoria contínua em consumos e redução de perdas espe-cíficas por volume produzido, tratamento da poluição como forma de re-dução de custos marginais, diminuição de custos da reposição de perdas edos de tratamento;

g alavancagem — acesso a financiamentos para crescimento do negócio,vinculados à demonstração do desempenho ambiental, sujeição à audito-ria ambiental dos organismos de financiamentos;

g saúde ocupacional — diminuição de exposição ocupacional, redução deacidentes, absenteísmo e de riscos de liabilities, melhoria do clima organi-zacional e moral (orgulho de pertencer);

g valor de mercado — redução de passivos ambientais, valorização em bolsaspelo tripé bottom line, menor risco do capital investido e a responsabilidadesocial e ambiental como fator de solidez e representação de capacidade deinvestimento;

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g imagem corporativa — defesa do valor da “marca”;

g hedge ambiental — redução de riscos futuros de descontinuidade operacio-nal, prevenção de passivos futuros advindos de eventuais multas, indeni-zações e compensações, de custos tangíveis/intangíveis de recuperação deimagem/marca e eliminação de custos crescentes com seguro.

Para a CSN, a concepção de econegócios tem ampliado seu mercado. Umexemplo é a evolução da sua taxa de reciclagem, inclusive com a implementa-ção do programa Reciclaço, em iniciativa conjunta com a Metalic, destinado arecuperar latas de aço para bebidas pós-consumo, abrangendo o credenciamen-to de sucateiros; a realização de eventos; e a implantação de postos próprios decoleta em barracas de praia, bares, hotéis, restaurantes etc.

A CSN evidenciou que, em função de produção mais limpa, vem ampli-ando sua receita pelo processamento de resíduos transformados em produtosvendidos para a aplicação em outros processos industriais, representando umataxa de crescimento de cerca de 30% ao ano, no período de 1998 a 2001, al-cançando um faturamento de R$ 82,5 milhões.

Além disso, no mercado de econegócios, a CSN tem alcançado reduçãode custos nas diversas áreas da empresa, como: sinterização por meio de ma-terial particulado retido em precipitadores, que retorna como matéria-prima,provocando uma economia de R$ 700 mil/ano; alto-forno que, com o uso degases provenientes do sistema de controle de poluição como fonte energéti-ca, gera uma economia de R$ 96 milhões/ano; e o material particulado dossistemas de controle (400.000 t/ano), que retorna como matéria-prima, comeconomia de R$ 3,5 milhões/ano. Outras áreas da CSN, como aciaria e co-queria também têm apresentado resultados favoráveis.

Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras)

Em 2004, a Petrobras apresentou sua política ambiental, evidenciando sua mis-são e visão do futuro, compromissos estratégicos, evolução do negócio, agendapositiva de atuação, riscos inerentes ao negócio, programa Pegaso, vazamen-tos, taxa de freqüência de acidentados com afastamento, investimentos e cus-tos em meio ambiente, prêmios de seguros e multas ambientais aplicadas.

Expôs que a sua agenda positiva de atuação visa viabilizar novas fontes deenergia ambientalmente mais saudáveis. O expositor realçou que a empresa vemmantendo seus esforços na preservação do meio ambiente através do “Programade Excelência em Gestão Ambiental e Segurança Operacional” (Pegaso), tendo

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sido gastos, em 2003, R$ 2,3 bilhões, com previsão para todo o programa deR$ 6,8 bilhões. O sucesso desse programa pode ser medido pela queda significati-va no nível de vazamento de óleo e derivados ocorrido durante o programa (ini-ciou-se em 2000, com término então previsto para o final de 2003), saindo deum vazamento máximo ocorrido em 2000 de 5.983 m³ para 276 m³ em 2003. Onúmero das fatalidades também apresentou uma queda de 10% (empregadospróprios e contratados). Comentou, ainda, que 100% das unidades operacionaisno país possuem certificação ISO 14001 e BS 8800 ou OHSAS 18001.

Apresentou, ainda, como vantagens do programa de gestão ambiental,a redução do consumo de energia, que passou de 142.545 tEP (tonelada equi-valente de petróleo), em 1999, para 91.834 tEP em 2003, com reflexos positi-vos econômicos e financeiros. Os prêmios de seguro por conta do programade gestão ambiental após terem um acréscimo acentuado no período 2000 a2002 reduziram-se substancialmente em 2003, passando de R$ 136,47 milhõesem 2002, para R$ 90,42 milhões em 2003.

Companhia Vale do Rio Doce (Vale)

Em 2004, a Companhia Vale do Rio Doce apresentou sua política de gestãoambiental. Explicitou que o objetivo principal da gestão ambiental da Vale éo de salvaguardar valor para os acionistas, ou seja, permitir o desenvolvi-mento sustentável para os acionistas, dizendo que esse conceito pressupõe“garantir que os acionistas do futuro terão resultados iguais ou melhoresque os acionistas do presente”. Evidenciou o expositor da Vale que as par-tes interessadas no relacionamento da empresa no que tange ao meio ambi-ente são: clientes; fornecedores; comunidades (local, regional e global);órgãos políticos e ONGs; investidores, financiadores e seguradoras; leis, nor-mas e regulamentos; concorrentes; e empregados e sindicatos.

Expôs também que a legislação ambiental é complexa, abrangente, eestá em permanente mudança. Evidenciou que os principais objetivos do Sis-tema de Gestão e Qualidade Ambiental — SGQA da Vale são: inserir a variá-vel ambiental na gestão da empresa, visando salvaguardar e agregar valor;identificar o controle dos aspectos, impactos e riscos ambientais; estabelecere atender a política e os objetivos e metas ambientais, incluindo a conformi-dade legal; perceber oportunidades para aprimoramentos operacionais eambientais — custo/resultado; e monitorar e aperfeiçoar o desempenho am-biental — evitar surpresas.

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O expositor da Vale fez uma palestra de caráter qualitativo, não apre-sentando nenhuma cifra, com referência a custos, despesas, passivos ou ati-vos ambientais.

Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST)

Em exposição realizada em 2002, no seminário da Abamec-SP, a CST divulgouque tem entre suas prioridades empresariais o desenvolvimento sustentável dasociedade e o respeito ao meio ambiente. Assim, considera prioridade em suapolítica empresarial a existência de um sistema de gestão ambiental, que con-sidera o desenvolvimento tecnológico e o atendimento às expectativas daspartes interessadas, gerando, continuamente, melhorias que diminuam oseventuais impactos adversos e resultem em benefícios para a sociedade.

Nesse sentido, todo o corpo diretivo, gerencial e de colaboradores assu-mem como compromisso: estabelecer objetivos e metas ambientais associa-dos aos aspectos ambientais levando em consideração opções tecnológicas erequisitos financeiros.

Em outubro de 1996, foi criada uma gerência especializada para a manu-tenção dos sistemas e equipamentos de controle ambiental atmosférico. Com ofuncionamento e adequada manutenção dos EPAs — equipamentos de prote-ção ambiental, a empresa começou a ter ganhos econômico-financeiros. Os pós-recuperados são vendidos e/ou recirculados no processo industrial da CST, pro-piciando que a receita gerada por área seja de 75% do orçamento da gerência.

Na gestão de resíduos sólidos, até o ano de 2001, a CST já produziu co-produtos em volumes significativos. O resultado também foi de aprimora-mento tecnológico, capacitação, interação com clientes e parceria com uni-versidades e centros de pesquisa.

No aproveitamento dos gases e calor, em seu modelo energético basea-do no aproveitamento dos gases gerados em seu processo, e do calor do apaga-mento do coque, a CST possui uma potência geradora de energia elétrica daordem de 225 MW, quantidade superior à sua própria demanda. A energia elé-trica gerada na central termelétrica, além de evitar a compra de energia de ter-ceiros, a um custo da ordem de R$ 15 milhões mensais, propicia uma receitaadicional de R$ 670 mil mensais, com a venda da energia excedente.

A empresa ainda apresenta outros ganhos, de acordo com o seu expositor:

g fortalecimento do relacionamento com a comunidade regional pela doa-ção de escória de aciaria, útil na pavimentação de ruas e estradas vicinais;

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g desde 1995, a CST não recebe qualquer notificação de descumprimento dalegislação ambiental;

g a empresa foi a primeira que o Unibanco lançou um Company profile sobreSRI — socialy responsible investing.

Demonstrações contábeis publicadas

As empresas Petrobras, CSN e Vale divulgam seu desempenho econômico e fi-nanceiro (subsidiariamente social e ambiental) no Brasil e nos EUA, enquan-to a CST divulga no Brasil.

A Petrobras divulgou para seus stakeholders suas demonstrações finan-ceiras relativas ao exercício de 2003, no jornal Gazeta Mercantil, do dia 12 demarço de 2004. O relatório anual contempla 29 páginas, começando na páginaA-21 até a página A-50. Esse relatório inclui uma mensagem aos acionistas (fei-ta pelo presidente), relatório da administração, demonstrações contábeis, no-tas explicativas, pareceres dos auditores e do conselho fiscal. Evidencia, emvárias passagens do relatório, informações qualitativas e financeiras no que tan-ge às questões ambientais, detalhando-as. Essas são, de certa forma, assemelha-das às reveladas no seminário promovido pela Apimec-SP.

Todavia, verificou-se que essas informações não foram auditadas, o queempobrece o relatório anual, podendo sujeitar-se a vieses. A nota explicativa22, que trata do meio ambiente, diz textualmente que não foi auditada, con-forme página A-49 do jornal Gazeta Mercantil.

A Vale divulga suas informações econômicas, financeiras, ambientaise sociais em jornais econômicos de grande circulação, bem como junto àCVM — Comissão de Valores Mobiliários e na Security Exchange Commis-sion — SEC. As informações relativas ao exercício de 2002 foram arquiva-das em ambas as autarquias em 24 de março de 2004. O relatório da Vale, àsemelhança das outras empresas, é bastante detalhado e profundo, eviden-ciando informações qualitativas e financeiras. No relatório apresentado àCVM, explicita na página 42, no item 10.15 — Custos Ambientais e de Re-cuperação e Restauração —, que “os gastos relacionados ao atendimento deregulamentos ambientais são debitados ao custo de produção ou capitaliza-dos quando incorridos”. A Vale gerencia suas relações com o meio ambien-te como um fator estratégico, tendo como premissa o pleno atendimento dalegislação aplicável, e as diretrizes e normas internas estabelecidas por seusistema de gestão ambiental, em pleno acordo com as especificações daNorma ISO 14001. A Vale desenvolve programas contínuos que têm por ob-

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jetivo minimizar o impacto ambiental de suas operações de mineração, bemcomo reduzir os custos que venham a incorrer com o término das ativida-des da cada lavra. Em 2003, a provisão para passivos ambientais correspon-de ao montante de R$ 232 milhões (R$ 52 milhões em 2002) classificadaem “outros” no exigível a longo prazo.

A CST divulga seu desempenho econômico, financeiro, social e ambien-tal no Brasil, em jornais econômicos de grande circulação e em seu site:<www.cst.com.br>.

O relatório anual, relativo ao exercício de 2004, apresenta referências norelatório da administração e nas demonstrações financeiras de informaçõespertinentes à contabilidade e à gestão ambiental. Esses demonstrativos conti-nham informações sobre investimentos em equipamentos e sistemas de contro-le ambiental e financiamentos externos obtidos junto ao European InvestmentBank (EIB). A empresa evidencia em notas explicativas, como a nota 20 — cus-to ambiental —, que “os gastos relacionados ao atendimento de regulamentosambientais são debitados ao custo de produção ou capitalizados quando incor-ridos”. Nessa mesma nota verifica-se que:

a Companhia gerencia suas relações com o meio ambiente de acordo comas especificações da Norma ISO 14001 e desenvolve programas contínu-os que têm por objetivo minimizar o impacto ambiental, de suas opera-ções conforme atesta a certidão negativa de débito ambiental (CNDAno 386/03 expedida no final de 2003. Além disso, a CST é auditada emtodos os aspectos econômicos, financeiros, sociais e ambientais, confor-me relatório dos auditores Pricewaterhouse&Coopers.

A carta-relatório dos auditores expressa em seu primeiro parágrafo:

procedemos à revisão dos indicadores de desempenho ambiental e soci-al apresentados nas páginas 3 (Indicadores Ambientais) e 24 (BalançoSocial) do Relatório da Administração da Companhia Siderúrgica de Tu-barão — CST, referente ao exercício social findo em 31 de dezembro de2004. A apuração, a compilação e o cálculo dos indicadores de desempe-nho mencionados são de inteira responsabilidade da CST. O propósitode nossos trabalhos foi confirmar que os indicadores de desempenhoambiental e social contidos no Relatório da Administração da CST, refe-rentes ao exercício social de 2004, estão suportados pelos sistemas de in-formações gerenciais e contábeis, pelos instrumentos de monitoramentoambiental da Companhia, pela estrutura de controles internos, e estãoreportados de forma apropriada em todos os seus aspectos relevantes.

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Por causa da inserção no mercado internacional, tanto a Vale, quanto aPetrobras e a CSN divulgam informações de seu desempenho econômico, fi-nanceiro, social e ambiental à Comissão de Valores Mobiliários Americana —SEC. Utilizam para isso um documento denominado formulário 20F. Esse do-cumento, que se divide em três partes, inclui desde informações-chave da em-presa, relativas a dados financeiros selecionados e fatores de risco, análise eperspectivas operacionais e financeiras, informações financeiras, contendo,demonstrações consolidadas e demais informações financeiras, e, ainda, pro-cessos judiciais e administrativos, divulgações quantitativas sobre risco demercado, balanços dos últimos cinco anos, demonstrativos dos fluxos de cai-xa, notas explicativas dos demonstrativos financeiros, bem como dos parece-res dos auditores independentes, além de outras informações relevantes.

Foi verificado, pelo formulário 20F, que as empresas revelaram váriosacidentes ambientais em que se envolveram, nos últimos anos, detalhando-os,inclusive arrolando os processos judiciais a que estão sujeitas, especificandomultas que estão recorrendo, além de notas relativas a passivos ambientais quesão evidenciadas, o que não ocorre, com o mesmo detalhamento, no Brasil.Vale ressaltar, que nas demonstrações contábeis publicadas pelas empresas noBrasil a partir de 2002, houve um maior detalhamento dos eventos e riscos am-bientais, mas sem o mesmo rigor do que é divulgado externamente.

Uma análise dos relatórios da CSN, no site <www.csn.com.br>; da Va-le, em <www.vale.com.br>; e da Petrobras em <www.petrobras.com.br>,extraída do Formulário 20F revela-nos que o nível, a abrangência e o rigor dainformação são muito mais extensos e profundos quando divulgados junto àSEC americana. Além disso, os relatórios socioambientais publicados no exte-rior são auditados, o que não ocorre no Brasil, independentemente dessa in-formação ser divulgada no corpo das demonstrações contábeis, no relatórioda administração, na carta do presidente, ou em relatórios ambientais ou so-cioambientais, como as empresas os vêm designando ultimamente.

Todavia, merece destaque a CST, que em seu relatório anual de 2004,evidenciou que todas as operações econômicas, financeiras, sociais e ambien-tais foram objeto de auditoria, destacando-a no contexto das empresas brasi-leiras, já que são raras as empresas que são auditadas em seus aspectossociais e ambientais.

Os casos analisados permitem afirmar que, mesmo em organizações deponta e que apresentam políticas e estratégias claras com relação à gestãoambiental, sua contabilidade se apresenta mais em função da obediência apreceitos legais, embora existam internamente programas ambientais que têmseu desenvolvimento e acompanhamento próprios.

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Os resultados obtidos não permitem sua generalização, porém, permi-tem concluir por uma adoção presente nas organizações da abordagem dacontabilidade da gestão ambiental, em função das exigências de mercado,como as de investidores financeiros, e apontam ainda para um campo amplode desenvolvimento em que técnicas como a do balanço de massa podem vira ser incorporadas de maneira efetiva.

5. Considerações finais

Os levantamentos realizados indicam que a contabilidade da gestão ambien-tal tem seu papel reconhecido e apontado como elemento fundamental para odisclosure da questão ambiental nas empresas. Essa nova dimensão da conta-bilidade se dá, tanto em função de exigências externas (legais e de mercado)quanto internas, pela adoção de políticas explícitas do enfrentamento daquestão ambiental no prisma da sustentabilidade.

Demonstrativos contábeis de empresas de ponta já se referem costumei-ramente à questão ambiental, no seu enquadramento à dimensão mais amplada responsabilidade social. Entretanto, o que se verificou nos casos analisados éuma diversidade de tratamento da gestão ambiental, nos relatórios destinadosao Brasil e ao exterior. Ou seja, as empresas estudadas que têm suas ações ne-gociadas em bolsas no exterior detalham num grau relativamente maior seusdemonstrativos e, mais que isso, têm as informações apresentadas auditadaspor entidades externas, o que lhes confere um nível de credibilidade e de res-ponsabilidade mais significativo.

Essa situação pode sugerir duas constatações: a simples obediênciapragmática de ditames legais ou uma relativa importância dada à questãoambiental, que, apesar de presente nas comunicações empresariais de formabastante elaborada, se vê contida pela política de transparência de informa-ções públicas, inerente a qualquer tipo de organização.

Embora a metodologia adotada caracterize o estudo como explorató-rio, as indicações nesse sentido são evidentes. No entanto, cabe salientarque se apresenta um campo bastante vasto para a pesquisa acadêmica nocampo da administração e da contabilidade, em particular, para o qual sevislumbra duas dimensões, a saber, a da investigação das formas, extensãoe divulgação de tratamento contábil da gestão ambiental nas empresas e aexploração de novos procedimentos e indicadores que, com base ou a partirdos seus registros contábeis, contribuam para a tomada de decisão nas orga-

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nizações, contemplando a sustentabilidade como fundamental nas estraté-gias empresariais.

Assim, a contabilidade da gestão ambiental se apresenta como uma di-mensão presente nas organizações, com seu uso indo ao encontro da missãofundamental da contabilidade e seu desenvolvimento atrelado, de forma ine-quívoca, às exigências da sociedade consciente à questão ambiental e, deseja-velmente, de forma proativa ao avanço dos ditames legais.

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