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Relatório Nacional 2016

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Relatório Nacional 2016

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Brasil do Avesso: os Descaminhos de um Povo Batalhador e o Golpe de Estado em 2016 – as velhas elites oligárquicas contra-atacam

“A luta é mundial e a esquerda brasileira pode ocupar um papel central ou definhar rumo à irrelevância e à miséria nacional.”

(Immanuel Wallerstein, sobre o golpe de Estado no Brasil em 2016.)

São Paulo Outubro de 2016

SEDE NACIONAL

Rua Dona Brígida, 299 - Vila Mariana – São Paulo/ SP Fone: (+ 55 11) 3105-0884 / Fax: (+ 55 11) 3107-0538 [email protected] www.os.org.br

II Informe Nacional RedLat – 2016

A Construção do Trabalho Decente no Brasil

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Apresentação

Este estudo consiste numa análise do mercado de trabalho brasileiro, a partir de

quatro dimensões principais, quais sejam: oportunidades de trabalho, remuneração, proteção

social e liberdade sindical, além do contexto socioeconômico. Em outras palavras, aborda os

desafios à construção do Trabalho Decente no Brasil, assim como o define a Organização

Internacional do Trabalho (OIT): Trabalho Decente é um “trabalho produtivo e

adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, sem

quaisquer formas de discriminação e capaz de garantir uma vida digna a todas as pessoas

que vivem de seu trabalho”.

Desenvolvido no escopo de um projeto que abrange sindicatos e institutos de

pesquisa sobre o mundo do trabalho da Argentina, Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai,

assim como do Brasil, o estudo tem como objetivo principal estabelecer um cenário

comparativo entre esses países, que compõem a Rede Latino-Americana de Pesquisas em

Empresas Multinacionais (RedLat). Abarcando o período histórico recente, vêm sendo

elaborados anualmente relatórios nacionais e um comparativo regional, numa série de três

volumes (correspondentes aos anos de 2015, 2016 e 2017).

A proposta central é subsidiar o movimento sindical, bem como trabalhadoras e

trabalhadores em geral, com um material analítico compromissado em oferecer informação

reflexiva e crítica, segundo uma perspectiva aliada da promoção dos direitos sociais

trabalhistas e da cidadania plena, no esforço conjunto propositivo – o que requer, portanto,

parceria com os atores políticos. E num contexto histórico e social tão adverso, conforme o

prefácio desta edição aponta, no Brasil e no mundo.

Agradecemos o apoio e o financiamento da DGB Bildungswerk (DGBBW),

entidade de formação e cooperação da Deutscher Gewerkschaftsbund (DGB), central sindical

alemã.

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Preâmbulo:

“Tempos Sombrios no Brasil”

Enquanto escrevemos estas linhas que seguem para analisar aspectos do

mercado de trabalho (com enfoque nos dados de 2015), o Brasil enfrenta um dos momentos

mais dramáticos e dissimulados de sua história: um golpe de Estado em curso. Desfecho de

uma conspiração orquestrada por parlamentares adversários e da base aliada – cujos

expoentes estão implicados nos esquemas de corrupção investigados –, uma parcela do poder

Judiciário – com a conivência e aprovação do Supremo Tribunal Federal (STF), o guardião da

Constituição –, que atua seletiva e parcialmente por meio de vazamentos de áudios

inconstitucionais, conduções coercitivas arbitrárias e delações premiadas por prisioneiros,

recursos muito bem explorados pela conservadora mídia de massas partidária e

antidemocrática, ancorados pelo empresariado retrógrado e o mercado financeiro, com a cabal

traição do vice-presidente da República, transformando o país em um Estado de Direito

Autoritário e violando a soberania popular.

Em 12 de maio de 2016, por 55 a 22 votos contrários indicados no painel

eletrônico, na sessão deliberativa extraordinária que durou 20 horas e 34 minutos, os

congressistas do Senado Federal – após autorizada a instauração pela Câmara, no domingo 17

de abril, no que teria sido hilário, se não fosse trágico e vexatório em seu antirrepublicanismo,

espetáculo midiático, com dedicação de voto, pelos deputados Bolsonaros, ao torturador

coronel Ustra e outros oficiais da ditadura militar – votaram em plenário o parecer favorável à

admissibilidade do processo de impeachment contra Dilma Rousseff. A farsa está em marcha.

Afastada do cargo segue a presidenta, pelo prazo máximo de 180 dias, período em que os

senadores concluirão o processo e decidirão se efetivamente Dilma cometeu o famigerado,

vago e controverso crime de responsabilidade pelo qual supostamente teria sido afastada.

Entre juristas, legisladores e outros especialistas brasileiros não há consenso sequer sobre o

que define o crime de responsabilidade.

O Tribunal Internacional, presidido pelo jurista Juarez Tavares (professor de

Direito Penal e ex-subprocurador-geral da República), que reuniu no Rio de Janeiro figuras

notáveis das Américas e da Europa em um júri – entre professores, juristas e defensores de

direitos humanos – e elaborou um parecer, condenou o impeachment como um “golpe de

Estado”. Em julgamento aberto ao público, a sentença foi proferida a partir de depoimentos de

testemunhas e sustentações orais da acusação e da defesa: “O fundamento comum de todos os

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pronunciamentos ofertados no Tribunal reside na vacuidade do pedido de impeachment e na

inexistência de delito de responsabilidade ou de conduta dolosa que implique em um atentado

à Constituição da República e aos fundamentos do Estado brasileiro”. O documento será

encaminhado aos senadores e ministros do STF.

Efetivamente, um golpe de Estado forjado pelas vias institucionais: uma

ruptura que em luta transporemos ou inaugurará o fim da Nova República no Brasil, que teve

início em 1985 com a transição “lenta, gradual e segura” da ditadura civil-militar, instalada

em 1964, para a democracia? As classes dominantes, hegemônicas econômica e

ideologicamente, atuando em bloco para retomar as instâncias do poder político-institucional

nacional e conduzir o país rumo ao abismo antidemocrático e neoliberalista: princípios dentre

os quais o demonstram a anunciada adoção da prevalência do negociado sobre o legislado,

com acordos estabelecidos diretamente entre empregadores e trabalhadores, negociados em

condições desiguais, podendo se sobrepor à legislação trabalhista – a expansão da jornada de

trabalho, de 40 horas legais para 80 horas semanais já está nos rondando –; a liberalização da

terceirização nas atividades-fim das empresas, em tramitação no parlamento; a reforma

restritiva da previdência, sob argumentos fiscais falaciosos; além das privatizações, tal qual a

entrega da camada de petróleo do pré-sal, como propõe e articula o ministro ilegítimo e

delatado das Relações Exteriores.

Assistiremos ofendidos e pasmados ao agravamento da desigualdade social

estruturante da sociedade brasileira – contra a qual temos combatido cotidiana e arduamente

em contextos políticos tão adversos – e ao reposicionamento do Brasil à condição de

subordinado na ordem geopolítica imperialista, ou seremos capazes de organizar um

movimento coletivo, uma resposta condizente, de resistência ao golpe e seus efeitos

devastadores às conquistas históricas de trabalhadoras e trabalhadores em nosso país? Terá o

Partido dos Trabalhadores (PT), no qual foram depositadas nossas esperanças emancipatórias

e ao qual nos unimos em nossa práxis política, empenho em realizar uma autocrítica e, dessa

reflexão, redirecionar a cúpula e seu pragmatismo segundo orientações e anseios de sua

honrosa militância de base? Retornar, em suma, às suas raízes históricas, conforme o apelo do

próprio ex-presidente Lula em discurso, aos aplausos numa manifestação. Indagações que, em

pleno turbilhão, estamos por responder. O modelo de desenvolvimento adotado nas gestões

petistas na Presidência da República, fundamentado pela inclusão via mercado consumidor,

mobilizando recursos e políticas públicas ainda modestas para o atendimento às históricas

reivindicações sociais e à custa da manutenção de concessões à burguesia nacional

especulativa e ao capital internacional, sem alterar essencialmente a ordem econômica

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desigual brasileira e a cidadania restrita, esgotou-se. Com a consolidação do golpe

parlamentar de 2016, as recentes conquistas sociais estão ameaçadas, assim como as

normativas jurídicas das relações de trabalho, sindicais e de proteção social instauradas com a

Constituição da República de 1988.

Para encerrar este preâmbulo, cedemos espaço às palavras da presidenta Dilma

Rousseff, um breve trecho da carta divulgada em 16 de agosto de 2016 “Ao Senado Federal e

ao povo brasileiro”, em que manifestou sua defesa do Estado Democrático de Direito, da

Constituição Cidadã de 1988, da soberania popular, assim como reforçou seu compromisso de

não compactuar com qualquer anistia em favor da impunidade dos que houveram praticado

atos ilícitos ou de improbidade – nos moldes do pacto infausto que vem sendo construído nos

bastidores entre as cúpulas dos poderes Legislativo e Executivo, com anuência de ministros

do STF, na expectativa de uma possível delação do ex-presidente da Câmara dos Deputados,

Eduardo Cunha, para beneficiar políticos citados na Operação Lava-Jato –, propondo a

convocação de um plebiscito para consulta à população sobre a realização antecipada de

eleições, caso retorne à presidência:

“(...) Jamais se encontrará na minha vida registro de desonestidade, covardia ou traição. Ao contrário dos que deram início a este processo injusto e ilegal, não tenho contas no exterior, nunca desviei um centavo do patrimônio público para meu enriquecimento pessoal ou de terceiros e não recebi propinas de ninguém. (...) A vida me ensinou o sentido mais profundo da esperança. Resisti ao cárcere e à tortura. Gostaria de não ter que resistir à fraude e à mais infame injustiça. Minha esperança existe porque é também a esperança democrática do povo brasileiro, que me elegeu duas vezes Presidenta. Quem deve decidir o futuro do País é o nosso povo. A democracia há de vencer”. Dilma Rousseff (16/8/2016).

Estas palavras encontrarão eco na decisão que se aproxima pelo Senado Federal ou

permanecerão como um registro para o julgamento na História, presente em páginas e

memórias de mais um momento em que prevaleceu no Brasil o projeto de desigualdade e

autoritarismo do poderio oligárquico?

Juliana Sousa (Instituto Observatório Social). São Paulo, 17 de agosto de 2016.

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Prefácio 2

Com a prorrogação do prazo para o fechamento e a publicação da edição do II

Informe Nacional da RedLat, nessa dolorosa tarefa de registrar este momento tenebroso da

história no Brasil, constatamos o consumado golpe parlamentar de Estado em 2016. Foi

decretado o fim de nossa jovem república brasileira, inaugurada em 1985 com a eleição

indireta de Tancredo Neves e posse de José Sarney, após 21 anos de ditadura militar.

Condenada por congressistas, dos quais 60% são acusados ou suspeitos de crimes de diversas

naturezas, a guerreira presidenta Dilma Rousseff foi arbitrariamente destituída da presidência,

em um cínico julgamento instaurado em regime de exceção em que as provas de sua inocência

foram em vão e a sentença ardilosamente preconcebida. Será a penúria da classe trabalhadora

no Brasil? Está anunciado um governo (ilegítimo) e seu programa foi derrotado nas urnas nas

quatro últimas eleições no país. A batalha e a repressão estão nas ruas.

Juliana Sousa (Instituto Observatório Social). São Paulo, 31 de agosto de 2016.

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Sumário

Introdução: Contexto Socioeconômico: “A Recessão Econômica e a Crise Política no

Brasil”......................................................................................................................................................6

1. Oportunidade de Emprego: “O Avanço do Trabalho Indecente”...................................................16

1.1 A regulamentação dos Serviços Domésticos no Brasil e a Convenção nº 189 da

OIT...................................................................................................................................................31

1.2 Observações preliminares..........................................................................................................33

2. Remuneração do Trabalho...............................................................................................................34

2.1 Observações preliminares..........................................................................................................45

3. Seguridade Social: “A Narrativa do Déficit e o Regresso à Barbárie”............................................46

3.1 Observações preliminares..........................................................................................................55

4. Liberdade Sindical: “Protagonismo e Alianças Horizontais em Combates”...................................56

4.1 As Negociações Coletivas em 2015...........................................................................................61

4.2 Movimentos paredistas: um balanço das greves........................................................................63

4.3 Observações preliminares..........................................................................................................65

Referências Consultadas........................................................................................................................ 67

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Lista de gráficos, tabelas e quadros Gráfico 1 - Brasil: variação anual do PIB.................................................................................................7 Gráfico 2 - Brasil: PIB per capita em US$ de 2013 (mil).........................................................................7 Gráfico 3 - Brasil: Desigualdade de Renda Coeficiente de Gini..............................................................9 Gráfico 4 - Brasil: Número de indivíduos pobres - Linha de Pobreza Baseada em Necessidades Calóricas.................................................................................................................................................10 Gráfico 5 - Brasil: Evolução da dívida pública líquida (% do PIB).......................................................14 Gráfico 6 - Brasil: Taxa de atividade das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas.........................................................................................................................................16 Gráfico 7 - Brasil: Taxa de desocupação das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas.........................................................................................................................................17 Gráfico 8 - Brasil: Taxa de ocupação das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas.........................................................................................................................................18 Gráfico 9 - Brasil: Salário Mínimo Real Médio e Salário Mínimo Nominal.........................................19 Gráfico 10 -Brasil: Participação das Centrais Sindicais por Número de Sindicatos Filiados, Maio/2016...............................................................................................................................................61 Tabela 1 - Brasil: Proporção de Pessoas Pobres e Proporção de Pessoas Extremamente Pobres, segundo a renda domiciliar per capita, no período de 2004 a 2013 (%).................................................11 Tabela 2 - Brasil: Taxas de desocupação total, por gênero e de jovens.................................................19 Tabela 3 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por anos de estudo e sexo de todos os trabalhos, de 2012 a 2014..........................................................21 Tabela 4 - Brasil: Pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, total e respectiva percentual, por sexo e posição na ocupação, de 2012 a 2014...............................................23 Tabela 5 - Brasil: Proporção de pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência em trabalhos formais e informais, por cor ou raça, de 2004 a 2014 (%)...............................25 Tabela 6 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, segundo o sexo e a atividade do trabalho principal, em 2013 e 2014.....................................................27 Tabela 7 - Brasil: Salário Mínimo Real Médio Anual¹ em Reais de 1º de janeiro de 2016 e Salário Mínimo Nominal Nacional no mês de janeiro, em Reais (R$)..................................................35 Tabela 8 - Brasil: Valor do rendimento médio real recebido no mês pelo trabalho principal, da população com 16 anos ou mais de idade, segundo o setor de atividade, em 2013...............................39

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Tabela 9 - Brasil: Rendimento médio nominal do trabalho principal, efetivamente recebido no mês de janeiro pelas pessoas de 10 anos ou mais de idade, empregadas com carteira de trabalho assinada do setor privado, no trabalho principal da semana de referência, no total das regiões metropolitanas¹ brasileiras, no período de 2002 a 2016, em estimativas de Reais (R$); Salário Mínimo Nacional e Salário Mínimo Necessário.....................................................................................................................40 Tabela 10 - Brasil: Valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos das pessoas de 15 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, segundo o sexo, em Reais........................................41 Tabela 11 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, e valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos, por classes de rendimento, no Brasil........................43 Tabela 12 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por sexo, segundo a contribuição para instituto de previdência em qualquer trabalho, em 2013 e 2014........................................................................................................................................................46 Tabela 13 - Brasil: Quantidade de Aposentadorias Urbanas e Rurais Ativas, por grupos de espécies, posição em Dezembro, de 2010 a 2014..................................................................................................47 Tabela 14 - Brasil: Quantidade de Benefícios Previdenciários do RGPS ativos, no total de clientelas Urbanas e Rurais.....................................................................................................................................48 Tabela 15 - Brasil: Quantidade de acidentes de trabalho, por situação de registro e motivo, de 2005 a 2014........................................................................................................................................................49 Tabela 16 - Proporção do total de gastos da Previdência sobre o PIB (valores correntes)....................51 Tabela 17 - Fórmula de aposentadoria....................................................................................................52 Tabela 18 – Brasil: Seguro Desemprego Formal - Valor do Benefício..................................................53 Tabela 19 - Brasil: Histórico do Seguro-Desemprego do Trabalhador Formal (anos selecionados)..................................................................................................................................53 Tabela 20 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por sexo, segundo a associação a sindicato, em 2013 e 2014.................................................................57 Tabela 21 - Brasil: Distribuição dos Sindicatos por Central Sindical, Maio/2016.................................60 Tabela 22 - Brasil: Total de greves, nas esferas públicas e privadas, em 2012 e 2013..........................63 Quadro 1 – Brasil: Projetos em tramitação no Congresso Nacional que afetam a classe trabalhadora, em 2016...................................................................................................................................................66

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Contexto Socioeconômico: “A Recessão Econômica e a Crise Política no Brasil”

Com o prolongamento e a intensificação da deterioração da conjuntura

econômica internacional, até então favorável à balança comercial brasileira pelo incremento

dos preços das commodities – o denominado “superciclo das commodities”, entre 2003 e

2012, circunscrevendo, no entanto, o Brasil a um capitalismo dependente –, que associado ao

boom do consumo doméstico impulsionaram o crescimento econômico e a arrecadação do

governo federal, a crise econômica, sobretudo a partir de 2014, agravada pela crise política

nacional que se instalou e recrudesceu desde as vésperas da posse em segundo mandato da

presidenta eleita Dilma Rousseff em 2015, golpearam a economia brasileira e o mercado de

trabalho.

Embora em discurso de campanha o modelo desenvolvimentista, respaldado

nas políticas econômicas anticíclicas e na alavancagem econômica pelo Estado adotadas no

primeiro mandato (como a redução continuada da taxa básica de juros, a Selic), tenha sido

vitorioso, por margem restrita mas irrefutável, nas eleições de 2014, a agenda política não

tomou posse e o governo de Dilma sucumbiu às pressões do capital financeiro e seu bloco

histórico. Na tentativa equivocada e frustrada de salvaguardar a governabilidade, o governo

foi se fragilizando, rumando ao autossacrifício e aprofundando a recessão: as medidas de

“austericídio” fiscal – sendo que o Programa de Aceleração do Crescimento, criado no

governo Lula para incentivar os investimentos em obras de infraestrutura, foi um dos mais

atingidos pelos cortes de verbas públicas, tendo o pacote pró-cíclico também reduzido o

crédito oferecido pelos bancos públicos, em conformidade com o imperativo de assegurar o

superávit primário – foram contestadas pelas classes trabalhadoras que, contudo, em defesa da

democracia, denunciam o golpe.

Em 2015, o Produto Interno Bruto (PIB) encerrou o ano com recuo de 3,8% em

relação a 2014 (acompanhe no gráfico 1 que segue). No acumulado do ano, em valores

correntes, o PIB totalizou R$ 5.904,3 bilhões1. Como decorrência, o PIB per capita –

resultado da divisão do valor corrente do PIB pela população residente no meio do ano – foi

calculado em R$ 28.876,00, em valores correntes em 2015, com recuo, em termos reais, de

4,6% em relação ao ano anterior (veja no gráfico 2 a evolução do PIB per capita, em Dólares

de 2013).

1 Em 2015, o PIB anual foi de US$ 1,775 trilhões e o PIB per capita, de US$ 8.538,60, em valores correntes calculados pelo Banco Mundial. Disponível em: <http://databank.worldbank.org/data/reports.aspx?Code=NY.GDP.MKTP.CD&id=af3ce82b&report_name=Popular_indicators&populartype=series&ispopular=y >. Acesso em: 26/07/2016.

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Fonte: IBGE.

Fonte: IPEADATA.

Na comparação da taxa acumulada ao longo do ano de 2015 em relação a 2014,

a contração de 3,8% do PIB representou a maior queda desde o princípio da série histórica

iniciada em 1996. A Agropecuária registrou crescimento de 1,8% no ano em 2015 no

comparativo ao ano precedente, em virtude do desempenho de algumas safras relevantes na

agricultura, de acordo com o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola realizado pelo

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (LSPA-IBGE), divulgado em fevereiro de 2016

4,2

2,2

3,4

0,4 0,5

4,4

1,3

3,1

1,2

5,7

3,14,0

6,05,0

-0,2

7,6

3,9

1,82,7

0,1

-3,8

Gráfico 1 - Brasil: variação anual do PIB

5,507,12

8,32

7,52

8,367,83

8,718,72

9,2210,58

11,27 11,45

1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000 2004 2008 2012 2013

Gráfico 2 - Brasil: PIB per capita em US$ de 2013 (mil)

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– com destaque positivo para as culturas de soja e milho, ao passo que as lavouras de trigo,

café e laranja registraram queda na produção anual.2

Já a Indústria, sofreu o impacto intenso com decréscimo de 6,2% no ano, tendo

a Indústria de Transformação despencado 9,7%, ainda na comparação entre os resultados de

2015 frente a 2014. O resultado foi decorrente da contração na produção de máquinas e

equipamentos, da indústria automotiva, de aparelhos eletroeletrônicos e equipamentos de

informática, alimentos e bebidas, artigos, têxteis e do vestuário e produtos de metal. O setor

de Serviços caiu 2,7% no mesmo período, sendo que, dentre as atividades que compõem o

setor, o Comércio (atacadista e varejista) despencou 8,9% no acumulado do ano.

Entre os componentes da demanda interna, a Despesa de Consumo das

Famílias registrou contração de 4,0% em 2015 em relação ao ano precedente – resultado da

deterioração dos indicadores nacionais de inflação, juros, crédito, emprego e renda no

decorrer do período de referência. Quanto à Formação Bruta de Capital Fixo, foi verificada

queda de 14,1% no ano, explicado pela queda das importações e da produção interna de bens

de capital, também influenciado pelo desempenho negativo do setor da construção. A despesa

de Consumo do Governo teve recuo de 1,0%, na mesma base temporal de comparação. A

Exportação de bens e serviços apresentou crescimento de 6,1%, em contrapartida, tendo a

Importação de bens e serviços se contraído em 14,3% no ano.

Esse contexto tem impactado e degradado progressivamente o mercado de

trabalho brasileiro, conforme veremos ao longo deste informe: elevação das taxas de

desemprego, afetando sobretudo trabalhadoras e trabalhadores jovens; elevação da taxa de

participação, com a inserção ou retorno de indivíduos para contrabalançar a restrição de renda

nos domicílios; evolução do grau de informalidade, com destaque à expansão do grupo dos

empregados sem carteira e de trabalhadores por conta própria; redução da média do

rendimento do trabalho principal.3

A deterioração dos índices do mercado de trabalho preocupa pela repercussão

em termos de intensificação do empobrecimento da classe trabalhadora. Já no segundo

mandato da presidenta afastada Dilma Rousseff a desigualdade social tornou a crescer,

consequência do ajuste fiscal recessivo e da inflexão da política econômica que a gestão

adotou. Estimativas prévias apontam que o coeficiente de Gini apresentou elevação em 2015

2 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Indicadores IBGE. Contas Nacionais Trimestrais: Indicadores de Volume e Valores Correntes. Outubro/Dezembro de 2015. 3 Fonte: OLIVEIRA, Ana Luíza Matos de. “Mercado de trabalho brasileiro em momento de fragilidade”. Notas FPA (Fundação Perseu Abramo). Boletim de Política Social 309. Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/notas-fpa-pol%C3%ADtica-social-309>. Acesso em: 27/07/2016.

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(veja no gráfico 3 abaixo a evolução do coeficiente de Gini no Brasil entre 2001 e 2014) –

embora a informação consolidada do ano deva ser divulgada em setembro pelo IBGE –, após

mais de uma década em notável recuo4. O Índice de Gini é um instrumento para medir o grau

de concentração de renda, apontando a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos

mais ricos. Numericamente, varia de zero a um, sendo que o valor zero representa a situação

de igualdade, ou seja, todos têm a mesma renda, e o valor um está no extremo oposto, o que

representa a posse de toda a riqueza por uma única pessoa.5

Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEADATA).

Com a interrupção e reversão da trajetória de queda da pobreza, conforme

vinha sendo verificado na última década (acompanhe, no gráfico 4 que segue, o decréscimo

continuado, entre 2009 e 2014, do número de pessoas em domicílios com renda domiciliar per

capita inferior à linha da pobreza6 e na tabela 1, na sequência, a proporção de pessoas

pobres e extremamente pobres7, segundo a renda domiciliar per capita, de 2004 a 2013), as

4 Fonte: Folha-UOL. SINGER, André. “O que vais restar?” (02/07/2016). Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/andresinger/2016/07/1787852-o-que-vai-restar.shtml>. Acesso em: 27/07/2016. 5Fonte: IPEA. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&id=2048:catid=28&Itemid=23>. Acesso em: 27/07/2016. 6 A linha de pobreza considerada neste caso equivale ao dobro da linha de pobreza extrema, uma estimativa do valor de uma cesta de alimentos com o mínimo de calorias necessárias para suprir adequadamente uma pessoa, com base em recomendações da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e da Organização Mundial de Saúde (OMS). São estimados diferentes valores para 24 regiões do país. Série calculada a partir das respostas à Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE). Fonte: IPEADATA. 7 Trata-se do percentual de pessoas em domicílios com renda domiciliar per capita inferior à linha de pobreza (ou indigência, ou miséria). A linha de extrema pobreza considerada é de R$ 70,00 em Junho de 2011, tal como

0,5960,589 0,583

0,572 0,570 0,563 0,5560,546 0,543 0,531 0,530 0,527 0,518

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Gráfico 3 - Brasil: Desigualdade de Renda Coeficiente de Gini

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10

políticas de transferência de renda deveriam ser fortalecidas e ampliadas – tais como o

Programa Bolsa Família, que não teve reajuste em 2015, sob os auspícios do Ministro da

Fazenda de Dilma, Joaquim Levy, vulgo “mãos de tesoura”. Em 2014, de acordo com

informações do IPEADATA, os 10% mais pobres da população tiveram renda domiciliar per

capita mensal média (R$ 133,12) equivalente a 2,83% da renda dos 10% mais ricos no país

(R$ 4.711,91); dito de outra maneira, os mais ricos ganharam 35,40 vezes mais do que os

mais pobres. Em 2004, o estrato inferior recebia o equivalente a 1,90% dos mais ricos, cuja

renda (R$ 2.967,81) superava em 52,76 vezes à dos mais pobres (R$ 56,25).

Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEADATA).

estipulado no Decreto 7492 (Programa “Brasil sem Miséria”). Série calculada a partir dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE). Fonte: IPEADATA.

40.066.02034.355.298

30.350.786 28.698.59825.888.565

05.000.000

10.000.00015.000.00020.000.00025.000.00030.000.00035.000.00040.000.00045.000.000

2009 2011 2012 2013 2014

Gráfico 4 - Brasil: Número de indivíduos pobres -Linha de Pobreza Baseada em Necessidades Calóricas

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11

Tabela 1 - Brasil: Proporção de Pessoas Pobres e Proporção de Pessoas Extremamente Pobres, segundo a renda domiciliar per capita, no período de 2004 a 2013 (%)

Ano de referência Na Linha de Pobreza¹ Na Linha de Pobreza Extrema² 2004 22,4 7,6 2005 21,0 7,0 2006 17,3 5,7 2007 16,1 5,7 2008 14,1 4,8 2009 13,4 4,7 2011 11,1 4,4 2012 8,9 3,6 2013 9,0 4,0

Fontes: IPEADATA. Notas: ¹ Proporção de pobres (P0) – Linha de Pobreza Baseada no Decreto 7492 (Brasil sem Miséria) - (%) - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) - PMP140. ² Proporção de extremamente pobres (P0) – Linha de Pobreza Baseada no Decreto 7492 (Brasil sem Miséria - (%) - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) - PMP070.

No intuito de arregimentar apoio popular e tentar legitimar perante os cidadãos

sua gestão golpista, Michel Temer anunciou em junho de 2016 um aumento de 12,5% do

valor repassado aos beneficiários do Programa Bolsa Família, percentual 3,5% acima do

proposto por Dilma às vésperas de seu afastamento. Seu programa de governo neoliberal,

nomeado “Travessia Social”, contudo, já ponderou que as políticas sociais serão focalizadas

nos 5% mais pobres da população brasileira, que representa cerca de 10 milhões de

brasileiros, argumentando que os demais estão inseridos no mercado de trabalho e, nessa

visão equivocada e reprovável, estariam em iguais condições de competir por oportunidades e

renda, pois a despeito da informalidade, rotatividade, discriminações de gênero, raciais,

regionais e geracionais8.

No estilo tradicional da oligarquia política brasileira, a ascensão dos “de baixo”

da pirâmide social, que marcou o período Lula e o primeiro mandato da presidenta Dilma,

está sendo estrangulada. A depressão econômica que o país enfrenta tem se configurado em

subterfúgio para a adoção de medidas de austeridade, com cortes de investimento público,

retomada da escalada das taxas de juros (a Selic está em 14,25% em julho de 2016, o mesmo

patamar fixado em julho de 2015, praticamente o dobro da taxa referente a março de 2013, em

7,25%) e choque de tarifas que afetam as cadeias produtivas e os serviços, propagando-se pela

economia. O compromisso em combater a desigualdade social brasileira está em retirada na

agenda do governo e os programas sociais estão na berlinda. No mote da política econômica a 8 Fonte: OLIVEIRA, Ana Luíza Matos de. “Os riscos da travessia social de Temer”. Notas FPA (Fundação Perseu Abramo). Boletim de Política Social 309. Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/notas-fpa-pol%C3%ADtica-social-308 >. Acesso em: 27/07/2016.

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12

tendência é a prevalência da lógica do crescimento econômico via contenção e contração de

salários.9

Com a retração econômica, a evolução dos gastos públicos em relação ao PIB

tem justificado as restrições fiscais e também provocado críticas, pelo descuido, nas elegantes

palavras do economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ou má intenção por alguns, acrescentaríamos,

da maioria das análises no tratamento da evolução dos gastos públicos proporcionalmente ao

produto nacional. Especialistas do IPEA, Gobetti e Almeida, na publicação “Uma

Radiografia do Gasto Público Federal entre 2001 e 2015”, apontaram que: “As análises

convencionais também subestimam a contração fiscal ao comparar as despesas em

proporção do PIB e não dar a devida importância ao efeito da profunda recessão sobre o

denominador.” 10

Com o pretexto da primazia do maior controle e saneamento das contas

públicas, as áreas de educação e saúde são as mais afetadas pelos cortes de investimento

realizados pelo governo. Diante do alegado “rombo”, dentre as devastadoras medidas

anunciadas pelo governo interino estão a desvinculação de receitas e o estabelecimento de um

limite ao crescimento das despesas públicas em saúde e educação ao mesmo patamar da

inflação. A expansão real seria nula – atualmente as despesas são fixadas pela Constituição

Federal de 1988, que determina a destinação de um percentual obrigatório da arrecadação de

tributos para as áreas de saúde, educação e outros gastos na área social.

A tributação dos estratos sociais mais ricos, em contrapartida, tais como o

retorno do imposto de 15% sobre lucro e dividendos auferidos pelos proprietários e acionistas

de empresas, não está na agenda política. Com a retomada da cobrança do tributo, extinguido

em 1995 no governo de Fernando Henrique Cardoso, o governo poderia arrecadar mais de R$

43 bilhões anualmente, de acordo com o IPEA, montante que equivale a 25% da estimativa de

rombo nas contas públicas esperado para 2016. Impostos mais altos sobre heranças, assim

como defendido por Piketty, poderiam contribuir para a redistribuição de renda e da riqueza

nacional. No Brasil a tributação é regressiva, aplicada enfaticamente de forma indireta sobre o

9 Fonte: NASSIF, Luis. “Belluzzo diz que Brasil pode crescer, mas desigualdade vai aumentar” (16/05/2016). Disponível em: http://jornalggn.com.br/noticia/belluzzo-diz-que-brasil-pode-crescer-mas-desigualdade-vai-aumentar. Acesso em: 29/07/2016. 10 Fonte: Carta Capital. BELLUZZO, Luiz Gonzaga. “Labirinto de mentiras” (15/06/2016). Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/905/labirinto-de-mentiras>. Acesso em: 29/07/2016.

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13

consumo da população. A taxação sobre grandes fortunas, prevista na Constituição Federal,

nunca foi instituída.11

Entretanto, no decorrer de 15 anos, no período de 1998 a 2013, os superávits

primários percorridos pelo governo brasileiro não contiveram o salto da dívida bruta do

setor público, que passou de 40%, verificada em 1998, para quase 58% do PIB em 2013

(acompanhe no gráfico 5 abaixo a evolução da dívida pública líquida, até 2015, em relação ao

PIB). A carga fiscal também foi elevada no período, com crescimento de 6%, também

calculada em relação ao PIB.12 Em outubro de 2015, a dívida bruta do governo geral

(DBGG), de acordo com dados apresentados pelo IPEA, teve seu ritmo de crescimento

reduzido, atingindo 66,11% em proporção ao PIB, ao passo que a dívida líquida do setor

público foi registrada em 34,19% do PIB.13

A dinâmica é resultado dos efeitos da política monetária nas contas fiscais: em

2015, as despesas com juros e swap cambial14 totalizaram um valor equivalente a mais de

quatro vezes o orçamento destinado aos investimentos em saúde e educação, mais de cinco

vezes o propalado déficit da previdência, dezoito vezes as despesas de custeio ao Programa

Bolsa Família e vinte e cinco vezes o orçamento de transporte. Em 2016, cerca de 90% do

déficit nominal que infla a dívida bruta é proveniente do pagamento de juros nominais, não se

deve ao déficit primário. Conforme o modelo econômico brasileiro, de orientação ao

capitalismo financeiro, a estratégia consiste em atrair os investimentos estrangeiros

oferecendo os juros mais elevados do mundo, apreciando a moeda doméstica no combate à

inflação. 15

11Fonte: El País. MENDONÇA, Heloísa. “E se os mais ricos ajudassem a pagar o rombo nas contas públicas?” (2505/2016). Disponível em: <http://brasil.elpais.com/brasil/2016/05/24/politica/1464108533_703976.html>. Acesso em: 01/08/2016. 12 Fonte: Carta Capital. BELLUZZO, Luiz Gonzaga; GALÍPOLO, Gabriel. “Aposta. Uma estratégia errada” (01/06/2016). Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/903/uma-estrategia-errada>. Acesso em: 27/07/2016. 13 Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Carta de Conjuntura Nº 29. Dezembro de 2015. 14 Swap cambial é um derivativo financeiro controlado pelo Banco Central pelo qual os especuladores, sem gastos, participam do mercado de câmbio comprando e vendendo dólar virtual no mercado futuro. Se o dólar sobe, o mercado ganha. O prejuízo realizado com as operações de swap é transferido ao Tesouro Nacional. Fonte: ASSIS, J. Carlos de. Disponível em: <http://jornalggn.com.br/tag/blogs/swap-cambial>. Acesso em: 27/07/2016. 15 Fonte: Carta Capital. BELLUZZO, Luiz Gonzaga; GALÍPOLO, Gabriel. “Aposta. Uma estratégia errada” (01/06/2016). Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/903/uma-estrategia-errada>. Acesso em: 27/07/2016.

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14

Fonte: Banco Central do Brasil (BACEN). Nota: em dezembro dos respectivos anos.

Em relatório recente do FMI, a relação entre a dívida bruta e o PIB deverá

manter movimento ascendente, subindo de 73,7% em 2015 para 91,7% em 2021. Entre 2014 e

2015, houve um salto de 10,4%. Alguns analistas afirmam que o quadro fiscal brasileiro é

crítico: a trajetória da dívida não é sustentável e a reversão é dificultada pela rigidez

orçamentária e a queda da arrecadação de impostos do governo federal. Tais justificativas têm

se constituído no cerne do acirramento da defesa de um ajuste fiscal austero e de reformas

perversas à classe trabalhadora e aos pobres no país, como a reforma da Previdência, a

liberalização plena das terceirizações em atividades-fim das empresas e a prevalência do

negociado sobre o legislado – que prevê a possibilidade de que acordos coletivos negociados

diretamente possam se sobrepor às leis trabalhistas brasileiras, inclusive a Consolidação das

Leis do Trabalho (CLT), de 1943, ameaçando direitos como vale-transporte, alimentação,

Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), férias e horário de almoço –, anunciadas no

famigerado projeto de Temer, que violentamente pode nos empurrar para o abismo, intitulado

“Ponte para o Futuro”16. O receituário corresponde ao clamor do empresariado brasileiro, cujo

porta-voz é o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Paulo

Skaf.

16 Fonte: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/economia/com-ou-sem-dilma-os-maiores-desafios-da-economia-brasileira>. Acesso em: 01/07/2016.

51,559,9

54,350,2 47,9 46,5 44,6

37,6 40,9 38,0 34,5 32,3 30,6 33,1 36,2

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Gráfico 5 - Brasil: Evolução da dívida pública líquida(% do PIB)

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15

Observações preliminares

Na década de 1980, período da redemocratização do Brasil, a hiperinflação e a

aguda crise da dívida externa provocaram a estagnação econômica. Superados esses dois

problemas, o crescimento econômico sustentado não se concretizou e em meados da segunda

década do século XXI a pobreza retorna a expandir-se, impulsionada pela queda acentuada

dos preços das commodities, o aprofundamento da crise internacional e também pela

conjuntura política interna. O grau de industrialização do país está em regressão e voltamos a

ser um país exportador de commodities: a indústria já representou 30% do PIB nacional,

declinando a apenas 9% atualmente. O Brasil está refém da “armadilha macroeconômica”,

conforme Bresser-Pereira: taxa de juros exorbitante e taxa de câmbio apreciada no longo

prazo, que inibem os investimentos.

A economia brasileira não enfrenta uma situação de caos, embora práticas de

financeirização estejam comandando o setor produtivo, de acordo com Leda Paulani. Por

outro lado, no período das gestões de presidentes do PT, as políticas sociais (em 2014 a ONU

retirou o Brasil do mapa da fome), em especial a valorização do salário mínimo, tiveram

efeito multiplicador, embora a economia tenha sido alavancada pelo incentivo ao consumo –

amparado em uma política de concessão de crédito – e os investimentos, sobretudo privados,

contudo, permanecido debilitados. Para Armando Boito, havia um propósito de conformação

de uma aliança produtivista e antifinanceirização no país, que se esboçaram no início do

governo de Dilma. A ira das elites “predatórias” no país e o movimento antipetista e golpista,

contrários às conquistas populares, instalaram o que Paulani denominou por “terrorismo

econômico”, quando se exacerba aspectos ruins da economia: sobre a relação dívida-PIB, está

na ordem de 60% no Brasil, mas é de 90% no Reino Unido e de 230% no Japão: esse patamar

“(...) não é o caos, não é barbárie. É terrorismo econômico”, afirmou a professora.

Com a taxa de juros valorizada e a elevada taxa cambial, mesmo a burguesia

produtiva age de modo especulativo e como rentista, como destaca Guilherme Mello.17 A

guinada neoliberal intensificada a partir de 2013, com cortes dos investimentos planejados e

abandono das políticas anticíclicas, contribuiu para a deterioração do cenário socioeconômico

brasileiro e a fragilização do governo de Dilma Rousseff.

17 Fonte: Vermelho Portal. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/noticia/276673-2>. Acesso em: 01/08/2016.

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16

1. Oportunidade de Emprego: “O Avanço do Trabalho Indecente”

No decorrer de 2015 o quadro econômico brasileiro apresentou um

aprofundamento da crise que vinha dando sinais desde o final de 2014, afetando a dinâmica

do mercado de trabalho, concomitantemente com desaceleração da ocupação e dos

rendimentos. A ocupação, contudo, registrou queda mais acentuada do que a retração

verificada quanto aos rendimentos reais. Esse recuo da população ocupada vem acontecendo

sobretudo no mercado formal da economia, com fração considerável de trabalhadoras e

trabalhadores deslocando-se rumo aos segmentos de “conta própria”, o que tem limitado a

elevação mais aguda do desemprego. No quarto trimestre de 2015, o número de trabalhadores

com carteira de trabalho assinada caiu para 35,4 milhões, tendo em vista que correspondiam a

36,5 milhões no mesmo período de 201418.

Embora observada a recente aceleração nos últimos meses nas taxas de

crescimento da População Economicamente Ativa (PEA), esta ainda se mantém em patamares

inferiores aos verificados no passado recente, atenuando as pressões negativas sobre a taxa de

desemprego. Acompanhe no gráfico 6 a seguir a taxa de atividade no Brasil, que em 2015

permaneceu na trajetória de queda, com baixa de 0,5% em relação a 2014, embora em

proporção menor às registradas anualmente desde 2013:

Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal de Emprego.

18 Fonte: Carta Capital. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/economia/com-ou-sem-dilma-os-maiores-desafios-da-economia-brasileira. Acesso em: 01/07/2016.

55,3

56,856,7

56,256,6

56,557,1

56,957,0

56,7

57,8

56,7

55,755,2

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Gráfico 6 - Brasil: Taxa de atividade das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas

Dez./2002 a Dez./2015

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17

Em 2015, houve a destruição de 1,625 milhão de postos de trabalho formal na

economia brasileira, segundo dados do então Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) – no

governo interino e ilegítimo, Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS) –, número

próximo ao que havia sido gerado nos três anos anteriores. Boa parte desses empregos foram

encerrados não por meio do aumento do número de demissões mas, a rigor, pela sensível

queda no contingente de contratações. Nos dez primeiros meses de 2015, o saldo de

contratações caiu 17% comparativamente ao mesmo período do ano anterior, ao passo que as

demissões sofreram recuo de 8% nessa mesma base de comparação. A atual recessão tem

repercutido negativamente sobre o emprego de modo mais acentuado do que até então se

verificara desde 1996, quando a pesquisa do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados

(Caged/MTE) teve início, superando os comportamentos ruins apresentados em 1999, 2003 e

2009 (IPEA, 2015: 29).

Dados referentes a dezembro de 2015 apontam o avanço do desemprego, com a

taxa de desocupação registrada em 6,9%, com elevação de 2,6% perante dezembro de 2014,

quando foi registrada em 4,3%, no mesmo patamar do ano anterior, de acordo com dados da

Pesquisa Mensal de Emprego (PME), realizada pelo IBGE. As sucessivas elevações da taxa

de desocupação registradas em 2015 interrompem o já saudoso movimento de declínio do

desemprego no Brasil que vinha sendo construído desde 2003 (vide nos gráficos 7 e 8

abaixo). Com esse resultado, a taxa média de desemprego em 2015 foi de 6,8%, isto é, 1,9%

acima do verificado no mesmo período de 2014. Embora tenha se iniciado no segundo

trimestre de 2014, a recessão brasileira passou a exercer impacto mais direto sobre o emprego

no país a partir do início de 2015.

Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal de Emprego.

10,5 10,9

9,6 8,3 8,4 7,4 6,86,8

5,3 4,7 4,6 4,3 4,3

6,9

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Gráfico 7 - Brasil: Taxa de desocupação das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas

Dez./2002 a Dez./2015

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18

Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal de Emprego.

A elevação da taxa de desocupação em 2015, conforme revela a PME/IBGE,

foi decorrente da retração nos índices de ocupação bem como da reversão da trajetória de

queda da PEA, pontuada acima, e diferentemente do que ocorreu em 2014. Análise do IPEA

(2015) pondera, entretanto, que o comportamento dessas duas variáveis poderia afetar de

modo mais acentuado a taxa de desocupação, caso não fossem acompanhadas de dois

movimentos distintos. No que diz respeito à ocupação, como se trata do mercado de trabalho

formal que vem sendo mais afetado pelo quadro recessivo que tem se instalado – portanto, são

os trabalhadores com carteira assinada que se destacam nessa conjuntura negativa –, os

demais segmentos, especialmente os por conta própria, têm incorporado uma parcela da força

de trabalho dispensada, restringindo uma retração mais expressiva da ocupação no país.

No que se refere à PEA, a despeito de que tenha se encerrado em 2014 com

variação negativa de 0,7%, o contingente de pessoas que integra a força de trabalho reverteu

essa trajetória e teve incremento ao longo de 2015, ainda que se situando, no entanto, abaixo

da taxa média de crescimento dos últimos dez anos, de 1,2%. Na margem, segundo o IPEA

(2015), mesmo com taxas de crescimento negativas, os segmentos de trabalhadores mais

jovens constituem a maior parcela que contribui para a aceleração da PEA. Esse recente

movimento de retorno dos jovens à força de trabalho ocorre em decorrência da deterioração

do cenário econômico no Brasil, que associa aumento da inflação, desaceleração dos salários

e demissão de membros no domicílio, prejudicando o orçamento familiar.

Nesse sentido, decompondo as taxas de desocupação segundo o gênero e o

corte geracional, verificamos que os jovens e as mulheres permanecem apresentando as

maiores taxas de desocupação assim como as maiores taxas de incremento desta desocupação.

89,589,1

90,4

91,791,6

92,693,2

93,294,7

95,395,4

95,795,7

93,1

2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Gráfico 8 - Brasil: Taxa de ocupação das pessoas de 10 anos ou mais de idade, total das regiões metropolitanas

Dez./2002 a Dez./2015

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19

Em 2015 (acompanhe na tabela 2 abaixo), enquanto a taxa de desocupação dos homens teve

elevação de 2,5% frente ao ano anterior, a relativa às mulheres aumentou 2,7% e a dos jovens,

6% em relação a 2014.

Tabela 2 - Brasil: Taxas de desocupação total, por gênero e de jovens, em anos selecionados (%)

Ano Total Homens Mulheres Jovens 2005 8,3 6,9 10,2 17,7 2010 5,3 4,1 6,6 11,4 2013 4,3 3,5 5,3 10,2 2014 4,3 3,8 4,9 10,5 2015 6,9 6,3 7,6 16,5

Fonte: PME/IBGE. Nota: Para o Brasil, em dezembro. Regiões Metropolitanas (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre). Jovens: pessoas de 18 a 24 anos.

Analisando as características da população desocupada, conforme estatísticas

da PNAD/IBGE (2015: 55), em 2014 destacaram-se: mais da metade (56,7%) dos

desocupados era composta por mulheres; 28,3% nunca haviam trabalhado; 34,3% eram jovens

na faixa de 18 a 24 anos de idade; 60,3% eram pretos ou pardos e 50,1% não apresentavam o

ensino médio completo. Diante do observado em 2013, as variações mais significativas

referem-se à proporção dos desocupados que não tinham trabalhado anteriormente

(decréscimo de 2,7%) e dos jovens de 18 a 24 anos de idade (acréscimo de 1,6%).

Analisando a desagregação por grau de instrução formal, de acordo com os

dados apontados pelo IPEA (2016: 12), em 2015 a faixa intermediária, ou seja, com formação

entre o ensino fundamental completo e o ensino médio incompleto sobressaiu-se com avanço

de 40,4% na taxa de desemprego, registrada entre o quarto trimestre de 2014 e o mesmo

período de 2015, quando oscilou de 8,7% para 12,2%. Em termos relativos, o ajuste do

desemprego atingiu com maior ênfase este grupo do que os menos escolarizados, com ensino

fundamental incompleto, cuja taxa de desemprego também observou expansão, de 38,2% no

mesmo intervalo, saltando de 5,7% para 7,9%. Já em se tratando da faixa populacional

implicada em nível mais elevado de escolaridade, com ensino médio completo, houve

crescimento de 37,6% na taxa de desemprego.

Ainda no que concerne aos anos de estudo da população ocupada (para

acompanhar a evolução do número de ocupados referente ao período de 2012 a 2014, vide a

tabela 3 a seguir), a análise segundo o sexo, a partir dos dados da PNAD/IBGE, reafirma o

maior grau de instrução formal das mulheres no Brasil: em 2014, 40,29% das mulheres

ocupadas estavam localizadas na faixa de 11 a 14 anos de estudo, ao passo que tal proporção,

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20

para os homens, era de 33,57%. Na faixa de instrução formal com 15 ou mais anos de estudo,

17,34% das mulheres ocupadas estavam abrangidas, enquanto essa proporção equivalia a

10,58% dos homens na força de trabalho brasileira no mesmo ano.

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21

Tabela 3 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por anos de estudo e sexo de todos os trabalhos, de 2012 a 2014

Ano

2012 2013 2014 Anos de estudo Total

Nº abs. (em mil)

Total (%)

Nº abs. (em mil) Total Nº abs. (em mil)

Total (%)

Nº abs. (em mil) Total Nº abs. (em mil)

Total (%)

Nº abs. (em mil)

Homem Mulher

Homem Mulher Homem Mulher Total 95.293 100,00 54.843 40.449 95.880 100,00 55.011 40.870 98.621 100,00 56.040 42.580 Sem instrução e menos de 1 ano 6.329 6,64 4.365 1.965 6.811 7,10 4.666 2.144 6.515 6,61 4.391 2.124 1 a 3 anos 6.938 7,28 4.592 2.346 6.469 6,75 4.294 2.175 6.717 6,81 4.347 2.371 4 a 7 anos 19.578 20,54 12.426 7.151 18.623 19,42 11.970 6.652 19.267 19,54 12.265 7.002 8 a 10 anos 16.382 17,19 10.010 6.372 16.452 17,16 10.044 6.408 16.729 16,96 10.242 6.487 11 a 14 anos 34.188 35,88 18.069 16.119 34.826 36,32 18.344 16.482 35.967 36,47 18.812 17.155 15 anos ou mais 11.750 12,33 5.308 6.442 12.583 13,12 5.632 6.950 13.312 13,50 5.929 7.382 Não determinados 128 0,13 73 55 118 0,12 60 58 114 0,12 54 60 Fonte: PNAD/IBGE.

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22

Em 2014 a distribuição da população ocupada segundo a posição no mercado

de trabalho foi composta, como é possível analisar a partir dos dados da PNAD/IBGE na

tabela 4 a seguir, em 61,3% de empregados (60,5 milhões); 21,4% de trabalhadores por conta

própria (21,1 milhões); 6,5% de trabalhadores domésticos (6,4 milhões) e 3,8% de

empregadores (3,7 milhões). Os demais trabalhadores, 6,9 milhões, estavam assim

compreendidos: 2,6% como trabalhadores não remunerados; 4,3% trabalhadores na produção

para o próprio consumo e 0,1%, trabalhadores na construção para o próprio uso.

Na comparação com 2013, a participação dos empregados teve contração de

1,0% em 2014 e, numa análise regional, a queda foi mais acentuada na região Sudeste do país,

onde a proporção passou de 67,7% para 66,2% no período. A evolução mais desfavorável do

emprego na região Sudeste pode estar relacionada com a composição setorial do emprego,

uma vez que houve ajuste bastante expressivo na indústria manufatureira. Já as regiões Norte

e Nordeste apresentaram as maiores participações de trabalhadores por conta própria em

2014: 27,8% e 25,2%, nesta ordem, também em 2014, segundo a PNAD/IBGE.

No que se refere às trabalhadoras e trabalhadores domésticos, a pesquisa da

PNAD Contínua/IBGE apontou que 34,9% destas tinham assinatura em carteira de trabalho

no primeiro trimestre de 2016, diante da proporção de 32,3% relativa ao mesmo trimestre de

2015. Empregadores que não registram a carteira de trabalho de empregadas domésticas

podem ser multados de acordo com a Lei Nº 12.964 de 2014, assinada pela presidenta Dilma

em abril de 2014, concedendo 120 dias para início da vigência após a publicação oficial.

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23

Tabela 4 - Brasil: Pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, total e respectiva percentual, por sexo e posição na ocupação, de 2012 a 2014

Posição na ocupação

Ano 2012 2013 2014

Variação relativa (%) Variação relativa (%) Variação relativa (%) Total Homem Mulher Total Homem Mulher Total Homem Mulher

Empregado Com carteira de trabalho assinada 39,8 42,7 36,0 40,3 43,1 36,6 39,6 42,4 36,0 Sem carteira de trabalho assinada 14,9 17,0 12,1 14,5 16,5 11,9 14,4 16,4 11,9 Trabalhador doméstico Com carteira de trabalho assinada 2,0 0,5 4,2 2,2 0,4 4,7 2,1 0,4 4,3 Sem carteira de trabalho assinada 4,7 0,4 10,5 4,5 0,5 9,8 4,4 0,5 9,6 Militar ou funcionário público estatutário 7,5 5,4 10,2 7,5 5,5 10,2 7,3 5,2 10,0 Conta própria 20,8 24,8 15,5 20,8 24,8 15,4 21,4 25,6 16,2 Empregador 3,8 4,7 2,6 3,8 4,7 2,6 3,8 4,9 2,4 Trabalho na produção para o próprio consumo e na construção para o próprio uso 3,7 2,8 4,9 4,2 3,2 5,5 4,4 3,1 5,8 Trabalho não remunerado 2,6 1,6 3,9 2,1 1,2 3,3 2,6 1,4 3,9 Total (números relativos, %) 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Total (números absolutos, em mil) 94.733 54.451 40.281 95.407 54.702 40.705 98.112 55.693 42.420 Fonte: PNAD/IBGE.

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24

O grau de informalidade na economia brasileira vinha numa trajetória

permanente de queda desde 2004 até 2013, quando atingiu o patamar de 42,0% pelos cálculos

da PNAD/IBGE (vide tabela 5 que segue). A análise da evolução do grau de informalidade

leva em consideração o contraste entre os resultados verificados para o contingente dos

trabalhadores protegidos, ou seja, empregados com carteira de trabalho assinada,

trabalhadores domésticos com carteira de trabalho assinada, militares, funcionários públicos

estatutários, conta própria e empregadores que contribuíram para a Previdência Social, de um

lado, e o outro grupo de ocupados sem registro em carteira e os não remunerados, sem a

cobertura da Previdência Social. Em 2014 a taxa tornou a subir, quando a proporção de

trabalhos informais correspondeu a 42,3% da ocupação, ao passo que englobava 54,3% do

total de ocupados no país em 2004.

Estabelecendo uma análise pontuando a desigualdade de cor ou raça no país,

observamos que a formalização, para pessoas autodeclaradas brancas – conforme metodologia

do IBGE –, saltou de 53,0% do total de ocupados em 2004 para 64,7% em 2014, com avanço

de 11,7%. Em contrapartida, no que se refere às pessoas pretas e pardas ocupadas, a

formalização abrangia 37,3% destas em 2004, atingindo 51,6% em 2014, com acréscimo de

14,3%. Ressaltamos, nesse sentido, que a formalização contemplou proporcionalmente de

modo mais acentuado a população brasileira preta e parda no período de 2004 a 2014. No

entanto, vale frisar que no mercado de trabalho, assim como na sociedade brasileira, ainda

persiste o racismo, haja vista que quase a metade das pessoas pretas e pardas ocupadas

(48,4%) estava em trabalhos informais, ao passo que em torno de um terço (35,3%) das

pessoas brancas vivenciava a informalidade no trabalho em 2014.

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Tabela 5 - Brasil: Proporção de pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência em trabalhos formais e informais, por cor ou raça, de 2004 a 2014 (%)

Ano Trabalhos formais¹ Trabalhos informais Total² Branca Preta e parda Total² Branca Preta e parda

2004 45,7 53,0 37,3 54,3 47,0 62,7 2005 46,2 53,6 38,3 53,8 46,4 61,7 2006 47,5 54,8 39,6 52,5 45,2 60,4 2007 48,9 55,9 41,7 51,1 44,1 58,3 2008 50,1 56,8 43,3 49,9 43,2 56,7 2009 51,3 58,5 44,1 48,7 41,5 55,9 2011 56,0 62,8 49,4 44,0 37,2 50,6 2012 56,9 64,0 50,4 43,1 36,0 49,6 2013 58,0 65,3 51,3 42,0 34,7 48,7 2014 57,7 64,7 51,6 42,3 35,3 48,4

Fonte: PNAD/IBGE. Notas 1:Inclui empregado com carteira de trabalho assinada, trabalhador doméstico com carteira de trabalho assinada, militar, funcionário público estatutário, conta própria e empregador que contribuíam para a previdência social; 2: Inclusive amarelos e indígenas.

Avaliando o desempenho da ocupação de acordo com os grupamentos de

atividade econômica, segundo evolução expressa na tabela 6, em 2014 havia 13 milhões de

trabalhadores na indústria, que registrou queda da participação na população ocupada: o

contingente passou de 13,5% em 2013 para 13,1% em 2014. Contudo, apesar da queda de

participação, o contingente na atividade incorporou mais 59 mil trabalhadores nesse período.

A construção era responsável pela colocação de 9,2% da população ocupada em 2014, o

mesmo patamar referente ao ano anterior. Com 9,0 milhões de trabalhadores em 2014, a

atividade ainda mantinha trajetória de crescimento, com elevação de 224 mil pessoas,

equivalente a 2,5%, na comparação com 2013.

Prosseguindo na análise da população ocupada por setor de atividade, a queda

no número de ocupados, de acordo com dados do IPEA (2016: 16-7), esteve concentrada

principalmente na administração pública – nas três esferas de governo da Administração

geral, nas instâncias do executivo, legislativo, administração tributária etc., nas atividades de

regulamentação e fiscalização das atividades nas áreas social e econômica, nas atividades de

defesa, justiça, relações exteriores, bem como na gestão do sistema de seguridade social –,

com decréscimos registrados em todos os trimestres de 2015 frente a 2014.

O setor de Construção, por sua vez, apresentou baixas sucessivas na população

ocupada desde o primeiro trimestre de 2015, de 5,0%, recuperando-se levemente no quarto

trimestre desse ano, com aumento de 2,0% da população ocupada em comparação com o

mesmo trimestre do ano anterior. A atividade industrial registrou decréscimo maior da

população ocupada nos dois últimos trimestres de 2015, com perdas de 3,9% e 7,9%,

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26

respectivamente. Quanto à agricultura, foram observadas sucessivas quedas na população

ocupada no decorrer de 2015, na ordem de 1,5% em média.

As estatísticas do IPEA também apontam que o setor de Serviços teve destaque

por apresentar crescimento da população ocupada nos quatro trimestres de 2015 analisados,

com alta de 4,2% no primeiro e no segundo trimestre do ano em relação ao mesmo período do

ano precedente e de 1,2% no último trimestre. O comércio, embora tenha registrado leve

queda de 0,2% no primeiro trimestre, nos três períodos consecutivos registrou crescimento

médio de 1,4%.

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Tabela 6 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, segundo o sexo e a atividade do trabalho principal, em 2013 e 2014

Atividade

Ano 2013 2014

Nº absolutos (em mil)

Variação relativa (%) Nº absolutos (em mil)

Variação relativa (%)

Total Homens Mulheres Total Homens Mulheres Total 95.880 100,0 57,4 42,6 98.621 100,0 56,8 43,2 Agrícola 13.568 14,2 9,9 4,2 14.025 14,2 9,7 4,5 Indústria 12.906 13,5 8,6 4,8 12.965 13,1 8,3 4,8 Indústrias de transformação 12.170 12,7 8,0 4,7 12.173 12,3 7,7 4,7 Construção 8.848 9,2 8,9 0,3 9.072 9,2 8,9 0,3 Comércio e reparação 17.055 17,8 10,4 7,4 17.906 18,2 10,6 7,6 Alojamento e alimentação 4.414 4,6 2,0 2,6 4.595 4,7 2,0 2,7 Transporte, armazenagem e comunicação 5.393 5,6 4,9 0,7 5.441 5,5 4,8 0,8 Administração pública 5.353 5,6 3,4 2,2 5.145 5,2 3,0 2,2 Educação, saúde e serviços sociais 9.912 10,3 2,4 7,9 10.200 10,3 2,5 7,9 Serviços domésticos 6.423 6,7 0,5 6,2 6.439 6,5 0,5 6,0 Outros serviços coletivos, sociais e pessoais 3.769 3,9 1,4 2,5 4.175 4,2 1,5 2,7 Outras atividades 8.176 8,5 4,9 3,6 8.593 8,7 5,0 3,8 Atividades mal definidas 63 0,1 0,1 0,0 65 0,1 0,1 0,0 Fonte: PNAD/IBGE.

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Entre janeiro e abril de 2015 e o mesmo período de 2016, os pedidos de

recuperação judicial de empresas quase duplicaram no país, passando de 289 para 571. De

acordo com a Serasa Experian, as empresas foram asfixiadas pela queda das vendas e

aumento das dívidas, impossibilitando-as de contrair novos empréstimos bancários. As

solicitações de recuperação judicial por médias e pequenas empresas foram de 172 para 327,

na mesma base de comparação, e entre os grandes estabelecimentos aumentou de 49 para 95.

A trajetória da recessão tem impactado, dessa maneira, sobretudo os negócios de menor porte:

nas micro e pequenas empresas, uma devastação: em maio de 2016, 49% dos

estabelecimentos estavam inadimplentes, 27% não conseguiam pagar bancos ou financeiras e

53% previam novas demissões de trabalhadores nos próximos meses. As Microempresas e

Empresas de Pequeno Porte (MPEs) perfazem 99% do total no Brasil, responsáveis por 52%

dos empregos com carteira assinada no setor privado. A cada dia útil, 1,4 mil firmas são

encerradas no país e um total de 354,4 mil fechou em 2015, segundo Joseph Couri, presidente

do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo, com base em dados do

Departamento de Registro Empresarial e Integração da Secretaria Especial da Micro e

Pequena Empresa, ligada à Presidência da República.19

A desvalorização do Real, de 40% em 2015 – com a cotação do Dólar

passando de 2,69 Reais para 3,90 Reais entre fevereiro e dezembro – reanimou, entretanto, as

exportações e atenuou a situação de empresas que atuam no comércio exterior. A recente

revalorização do Real em 2016 tem ameaçado essa oportunidade – economistas calculam que

o câmbio de equilíbrio é de pelo menos 3,80 Reais por Dólar. A depreciação ao longo de 2015

favoreceu as indústrias de alimentos, têxteis e confecção, couros e calçados, produtos de

madeira, farmacêuticos e produtos químicos, conforme acompanhamento do Instituto de

Estudos para o Desenvolvimento Industrial.20

O avanço das demissões em 2016 tem preocupado as centrais sindicais e os

metalúrgicos da região do ABC paulista, uma das categorias mais bem organizadas

profissionalmente, têm realizado protestos em defesa de mais de 4 mil trabalhadores,

considerando somente os empregados nas principais montadoras de São Paulo, que

apresentavam estoque encalhado de 251,7 mil veículos em junho de 2016. A Ford e a

Mercedes-Benz anunciaram que não renovarão o Programa de Proteção ao Emprego (PPE),

19 Fonte: Carta Capital. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/revista/902/em-outro-patamar. Acesso em: 01/07/2016. 20 Fonte: Carta Capital. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/revista/902/em-outro-patamar. Acesso em: 01/07/2016.

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aprovado em 2015, e que assegurou a estabilidade no emprego de quase 20 mil metalúrgicos

paulistas.21

A recessão também afetou a evolução do setor da Construção. O presidente da

Câmara Brasileira da Indústria da Construção, José Carlos Martins, calculou que desde que a

crise se intensificou, em novembro de 2014, até abril de 2016 o setor perdeu quase 700 mil

empregos diretos. Destes, em torno de 70 mil eram referentes a obras do Programa Minha

casa Minha Vida (MCMV), lançado em 2009 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como

uma política de habitação popular22. Reduzindo o déficit habitacional no Brasil, até julho de

2016 foram 4,219 milhões de unidades contratadas, das quais 2,632 milhões entregues, em

investimento de R$ 294,5 bilhões23. No dia 1º de junho de 2016, o governo do presidente

interino anunciou a suspensão da modalidade Entidades – que permite que famílias com renda

mensal bruta de até R$ 1,8 mil, organizadas de forma associativa por uma Entidade

Organizadora (EO) habilitada, como cooperativas e associações, por exemplo, produzam suas

unidades habitacionais24 – mas, com a ocupação do escritório da Presidência da República em

São Paulo por 800 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), uma das

organizações participantes do programa, o governo foi obrigado a recuar.

O programa atende trabalhadores sem teto, extrativistas, pescadores,

quilombolas, indígenas e comunidades tradicionais. O Ministério das Cidades também foi

ocupado alguns dias depois por 500 militantes das organizações Frente Revolucionária

Mulheres de Luta, Frente Nacional de Luta e Confederação Nacional dos Agricultores

Familiares Rurais, em protesto contra o corte da meta da etapa 3 do programa, anunciada no

dia 30 de março de 2016 ainda pela gestão da presidenta Dilma, que previa 2 milhões de

moradias populares até 2018 e foi reduzida para 1,5 milhão de unidades. Em 2014, contudo, a

presidenta havia anunciado que a terceira fase do programa habitacional entregaria 3 milhões

de residências. Os manifestantes também condenaram a extinção dos subsídios para as

famílias da Faixa 1, com renda familiar bruta de até R$ 1,8 mil, e da Faixa 2, com renda

familiar máxima de R$ 3,6 mil. Depois dos protestos, o ministro das Cidades de Temer

21 Fonte: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/904/temer-prepara-uma-reforma-trabalhista-para-agradar-aos-empresarios>. Acesso em: 01/07/2016. 22 Fonte: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/905/sem-teto-cutucados-com-vara-curta>. Acesso em: 01/07/2016. 23 Fonte: Brasil. Governo Federal. Disponível em: <http://www.minhacasaminhavida.gov.br/resultados-do-programa.html>. Acesso em: 01/07/2016. 24 Fonte: Brasil. Ministério das Cidades. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/habitacao-cidades/programa-minha-casa-minha-vida-pmcmv/modalidades/mcmv-faixa-1-entidades>. Acesso em: 01/07/2016.

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declarou a continuidade das modalidades Entidades e Rural, assim como a manutenção dos

contratos previstos anteriormente na etapa 3 do MCMV.25

No cenário de degradação do mercado de trabalho nacional, com o

prolongamento da recessão, a taxa de desocupação vem se acelerando ao longo de 2016, o que

deve impactar mais incisivamente os salários reais, prejudicando a retomada do crescimento,

em função da retração da demanda interna. O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro

apresentou variação negativa de 0,3% na comparação entre o primeiro trimestre de 2016 e o

quarto trimestre de 2015, na série com ajuste sazonal. No comparativo com o mesmo período

do ano precedente, a contração do PIB foi de 5,4% no primeiro trimestre de 2016 e, no

acumulado dos quatro trimestres encerrados nesse primeiro trimestre de 2016, houve queda de

4,7% em relação aos quatro trimestres imediatamente anteriores.

No primeiro trimestre de 2016, a taxa de desocupação no Brasil foi estimada

em 10,9% pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (PNAD Contínua/IBGE). A população desocupada está em torno de

um total de 11,1 milhões de pessoas no país. Em ranking internacional do número de

demissões, elaborado pela Trading Economics, o Brasil está na terceira posição entre os

países com as maiores taxas: a liderança é da Espanha, com taxa de desemprego de 21%,

seguida pela Itália, com 11,4%26. No Brasil, a estimativa apresentou elevação de 1,9% na

comparação com o quarto trimestre de 2015 (9,0%) e aumento de 3% frente ao primeiro

trimestre de 2015 (7,9%). Segundo as Grandes Regiões do país, a taxa de desocupação

registrou expansão em todas estas comparativamente ao primeiro trimestre de 2015: na região

Norte, de 8,7% para 10,5%; Nordeste, de 9,6% para 12,8%; Sudeste, de 8,0% para 11,4%;

Sul, de 5,1% para 7,4%, e Centro-Oeste, de 7,3% para 9,7%.

A taxa de desocupação dos jovens com idade entre 18 a 24 anos foi de 24,1%,

permanecendo em patamar superior ao registrado para a taxa média total, também para o

primeiro trimestre de 2016, o que foi verificado tanto para o Brasil assim como para todas as

cinco Grandes Regiões. Ainda no primeiro trimestre de 2016, 78,1% dos empregados no setor

privado tinham carteira de trabalho assinada – as regiões Nordeste e Norte apresentaram as

menores estimativas desse indicador, com 63,1% e 63,5%, respectivamente. Do primeiro

trimestre de 2015 para o mesmo período de ano seguinte, apenas a região Sul observou

acréscimo dessa proporção, com a formalização sendo ampliada de 84,7% para 85,1%. 25 Fonte: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/905/sem-teto-cutucados-com-vara-curta>. Acesso em: 01/07/2016. 26 Fonte: Carta Capital. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/economia/desemprego-atinge-10-9-e-brasil-e-o-terceiro-pais-com-mais-demissoes. Acesso em: 22/06/2016.

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A regulamentação dos Serviços Domésticos no Brasil e a Convenção nº 189 da OIT

Com o propósito de avançar na defesa dos direitos usufruídos pelas

trabalhadoras domésticas, esteve em tramitação, no Congresso Nacional, a Proposta de

Emenda Constitucional (PEC) nº 478/2010, com relatoria da deputada Benedita da Silva (PT-

RJ). Apresentada no plenário da Câmara Federal, a denominada “PEC das Domésticas”

propunha a revogação do parágrafo único do artigo 7º da Constituição Federal, a fim de, a

princípio, proporcionar as bases jurídicas para a igualdade de direitos trabalhistas entre

trabalhadoras domésticas e os demais trabalhadores urbanos e rurais. Tendo, contudo, sofrido

algumas flexibilizações no Congresso Nacional, após sanção da presidenta Dilma Rousseff, a

Lei Complementar nº 150, de 2015, que regulamenta a Emenda Constitucional nº 72 de 2013

e dispõe sobre o contrato de trabalho doméstico, passou a vigorar integralmente mais de dois

anos depois da promulgação da PEC.

O texto da emenda apresentada estava em consonância com a Convenção nº

189 da OIT sobre o trabalho doméstico, adotada em 2011 – e que vinha sendo discutida pelo

Escritório da OIT no Brasil desde 2009 –, que recomenda aos países membros a equiparação,

à categoria, do direito a um trabalho digno assim como é defendido aos trabalhadores em

geral. O tema esteve em pleno debate no Brasil e no mundo. No entanto, a despeito de

avanços significativos na recente regulamentação nacional dos direitos das trabalhadoras

domésticas (tais como obrigatoriedade do registro em carteira de trabalho, com previsão de

multa em caso de descumprimento; regulamentação da jornada de trabalho, com adoção de

registro de ponto e pagamento de horas extras; obrigatoriedade da inscrição no FGTS,

prevendo indenização rescisória em caso de despedida imotivada, entre outros), as conquistas

foram cerceadas por não ter havido de fato a equiparação social da categoria no sentido da

igualdade de direitos tão almejada e que ensejou tantos esforços ao longo das últimas décadas.

Dentre os temas mais controversos estão: 1. a indenização compensatória em

caso de despedida sem justa causa – cujo montante retorna ao empregador doméstico se

houver justificativa apresentada motivando a demissão e tornando a trabalhadora mais

vulnerável a demissões arbitrárias –; 2. o estabelecimento de vínculo de emprego somente

quando houver prestação de serviço de forma continuada por mais de dois dias na semana – a

regulamentação não abrange, portanto, uma parcela expressiva e em ampliação da força de

trabalho doméstica, as diaristas, que permanecem na informalidade laboral e sem a cobertura

da proteção social –; 3. o pagamento somente das 40 primeiras horas mensais extraordinárias

ao horário regular de trabalho, com as demais compondo um banco de horas, cujo saldo pode

ser compensado no período de até um ano; e 4. a não previsão do pagamento de adicional de

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remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas. A representação sindical da

categoria também não foi regulamentada, assim como a incidência do imposto sindical. Nesse

sentido, a Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços da Central

Única dos Trabalhadores (Contracs-CUT) avalia que: “A isenção da contribuição sindical

para empregador e empregado inviabiliza o funcionamento dos sindicatos e é

discriminatória, pois as demais categorias contam com o dispositivo. A Contracs defende que

a contribuição sindical seja estabelecida também ao trabalhador doméstico, conforme prevê

a CLT” (Jornal da Contracs-CUT, nº 15, setembro/2015).

No dia 7 de abril de 2016 a presidenta Dilma Rousseff enviou ao Congresso

Nacional a posição oficial do governo federal favorável à ratificação da Convenção nº 189 da

OIT, último estágio do processo de ratificação. Há, entretanto, aspectos em que a legislação

brasileira é mais avançada do que a Convenção nº 189: a Lei Complementar nº 150 de 2015

supera a norma internacional ao prever o direito à indenização financeira por demissão sem

justa causa, pagamento de salário família, seguro-desemprego, licença maternidade

remunerada, proibição de emprego para menores de 18 anos e de pagamento de salário in

natura. Conforme assinalou a então Secretária Especial de Políticas para as Mulheres,

Eleonora Menicucci, a posição do governo dá “(...) continuidade a um compromisso, porque

a nossa lei (PL 150) é maior e mais avançada e deveria servir de exemplo para outros

países” 27. A relevância de ratificar a Convenção nº 189 deve-se também ao fato de que se

trata de fortalecer uma norma de direito internacional.

27 Fonte: Ministério do Trabalho e Previdência Social. Disponível em: <http://www.mtps.gov.br/noticias/3319-convencao-189-da-oit-reforca-compromisso-do-brasil-com-trabalhadoras-domesticas-diz-rossetto>. Acesso em: 25/06/2016.

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33

Observações preliminares

O emprego e a formalização no mercado de trabalho estão passando por um

processo acelerado de degradação no Brasil. Em 2015, a taxa de desocupação foi registrada

em 6,9%, superando em 2,6% a taxa referente a 2014 (4,3%). Em julho de 2016, 11,6 milhões

de pessoas estão desocupadas no país e o avanço do desemprego deve-se tanto à elevação das

demissões quanto à entrada de novas pessoas à procura de emprego. Na comparação entre o

segundo trimestre de 2016 e o mesmo período do ano passado, houve um acréscimo de 38,7%

da população desempregada.

Trabalhadores em postos de trabalho formal têm sido os mais afetados pelo

desemprego e boa parte tem migrado para o trabalho exercido por conta própria – no período

de um ano, 857 mil pessoas incorporaram-se à posição ocupacional. O número de

trabalhadores domésticos também registrou elevação, com alta de 3,7%, incorporando mais

224 mil trabalhadoras. A atividade industrial foi a mais afetada pela crise, com fechamento de

1,44 milhão de vagas no segundo trimestre de 2016 ante o mesmo período do ano anterior,

com retração de 11%, propagando a recessão por outras atividades, tais como informação,

comunicação e atividades financeiras, imobiliárias, profissionais e administrativas. Atrelados

à atividade da indústria, os serviços terceirizados verificaram recuo de 10% no período de

referência, encerrando 1,08 milhão de postos de trabalho.

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2. Remuneração do Trabalho: “Defesa do Salário Mínimo contra o Reempobrecimento”

Tendo analisado o recente movimento contínuo de desaceleração da ocupação

e avanço do desemprego no Brasil, podemos afirmar que no decorrer de 2015 o

comportamento dos rendimentos reais, de certo modo, surpreendeu. As expectativas, no

princípio do processo de deterioração no mercado de trabalho, eram de acentuada queda do

salário real, entretanto, ao longo dos meses, a desaceleração demonstrou-se mais suave,

diferentemente do que temos observado em 2016. Esse movimento de contração mais amena

dos salários em 2015 pode ser explicado por três características principais que dizem respeito

ao contexto mais recente dos aspectos socioeconômicos e políticos no país, em seus avanços e

limitações.

A primeira refere-se ao incremento da formalização do trabalho que se

destacou na última década, tornando os salários mais rígidos. Adicionalmente, podemos

apontar a política nacional de reajuste do salário mínimo (acompanhe na tabela 7 e no

gráfico 9 a seguir o histórico de valores do salário mínimo nacional no período de 2002 a

2016), que possibilitou ganhos reais nos últimos anos, e balizou os patamares de reajustes

conquistados nas negociações salariais das diversas categorias profissionais. Além destas, há a

tendência de que os empresários dispensem, no início da recessão, trabalhadores menos

qualificados e com menores rendimentos, uma vez que estes são mais facilmente

recontratados quando da retomada econômica, o que resulta na elevação da média salarial

dentre os empregados.28

28 Fonte: IPEA (2016).

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35

Tabela 7 - Brasil: Salário Mínimo Real Médio Anual¹ em Reais de 1º de janeiro de 2016 e Salário Mínimo Nominal Nacional no mês de janeiro, em Reais (R$),

no período de 2002 a 2016 Ano Salário Mínimo Real Médio Salário Mínimo Nominal

2002¹ 475,50 180,00 2003 479,74 200,00 2004 498,30 240,00 2005 535,31 260,00 2006 619,27 300,00 2007 653,35 350,00 2008 668,76 380,00 2009 720,96 415,00 2010 752,78 510,00 2011 752,90 540,00 2012 811,76 622,00 2013 832,37 678,00 2014 836,58 724,00 2015 821,85 788,00 2016 880,00 880,00

Fontes: DIEESE; PME/IBGE. Notas: ¹ Valores deflacionados por projeção do ICV – estrato inferior. ² Referente ao mês de fevereiro.

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Fontes: DIEESE; PME/IBGE. Notas: ¹ Valores deflacionados por projeção do ICV – estrato inferior. ² Referente ao mês de fevereiro

A partir de 1º de janeiro de 2016, o valor do salário mínimo nacional passou

para R$ 880,00, o que representa um acréscimo de 11,68% sobre os R$ 788,00 em vigor

durante 201529 e corresponde à fórmula adotada pela política de valorização: 0,1% referente

ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014 mais a variação anual do Índice

29 Em 2015, a média anual do salário mínimo mensal nacional foi equivalente a US$ 236,02, tendo decaído ao longo do ano pela forte depreciação do Real, despencando de US$ 297,36 em janeiro a US$ 201,53 em dezembro, após ter atingido US$ 200,00 em outubro de 2015, segundo estimativas do MTE para o salário mínimo e do Banco Central Brasileiro (BCB) para a taxa de câmbio.

475,50479,74498,30

535,31

619,27653,35668,76

720,96752,78752,90

811,76832,37836,58821,85

880,00

180,00200,00

240,00260,00

300,00

350,00380,00

415,00

510,00540,00

622,00

678,00

724,00

788,00

880,00

2002² 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Gráfico 9 - Brasil: Salário Mínimo Real Médio e Salário Mínimo Nominal

Salário Mínimo Real Médio¹ Salário Mínimo Nominal

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Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), calculado pelo IBGE, que registrou alta de

11,28% em dezembro de 2015 no acumulado do ano. Com a simples aplicação da regra o

valor seria de R$ 877,73, mas o governo arredondou para R$ 880,00.

A política permanente de valorização do salário mínimo foi acordada em 2007

com expectativa de prevalência até pelo menos 2023, em sua concepção original. Estabelecida

objetivamente em lei em 2011 (Lei nº 12.382), foi renovada em 2015 e a legislação

atualmente em vigor assegura a política até 2019 (Lei nº 13.152/2015). A fórmula foi fixada

pela Medida Provisória nº 672/2015, cujas regras vêm sendo periodicamente replicadas.

Resultante de uma campanha que unificou as centrais sindicais brasileiras em 2004, que

realizaram marchas a Brasília, trata-se de uma política de longo prazo para a recuperação do

valor do piso nacional, cujos critérios obedecem à fórmula: repasse da inflação do período

entre as correções, o aumento real pela variação do PIB, bem como a antecipação da data-base

de revisão, a cada ano, até ser fixada em janeiro, conforme aconteceu em 2010.30

A adoção dessa sistemática tem se apresentado eficiente na recuperação

gradativa do valor do salário mínimo, reconhecida como um dos fatores mais importantes

para o aumento da renda da população mais pobre: acompanhando o crescimento da

economia, consiste em um marco na história do país de um luta exitosa na promoção de um

grande acordo salarial. Fortalecendo a economia brasileira ao ampliar o mercado consumidor

interno, exige sua defesa intransigente, sobretudo, pela refratária e abismal desigualdade

social.

Como aponta o DIEESE (2016), a economia brasileira permanece refém da

armadilha de uma estrutura produtiva ancorada em baixos salários. A desigualdade de renda é

verificada na comparação entre indivíduos e famílias assim como entre o trabalho e o capital:

Do ponto de vista do sistema produtivo, o desafio é fazer com que se reduza a desigualdade na distribuição funcional da renda (isto é, entre trabalho e capital) e na distribuição salarial, promovendo a transição para uma estrutura mais igualitária com um patamar de rendimento mais elevado na média. O SM, em um processo de elevação contínua e acelerada, deve ser considerado como um instrumento para buscar um patamar civilizatório de nível superior para o Brasil, atendendo aos anseios da maioria dos brasileiros. (DIEESE, 2016: 3. Grifos meus.)

30 Fonte: DIEESE (2016).

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Entre abril de 2002 e janeiro de 2016, o salário mínimo teve reajuste nominal

de 340,00%, oscilando de R$ 200,00 a R$ 880,00 (no mesmo período a inflação calculada

pelo INPC foi de 148,34%), com aumento real de 77,18%, de acordo com o DIEESE

(2016). Instituído em 1º de maio de 1940, pelo Decreto-Lei nº 2.162 do presidente à época

Getúlio Vargas, durante a ditadura do Estado Novo (de 1937 a 1945), passou a vigorar em

julho de 1940, com valores diferenciados entre estados e sub-regiões. Em 1943, foi

incorporado à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e, em 1963, estendido ao campo via

Estatuto do Trabalhador Rural. Em maio de 1984, foi nacionalmente unificado e a Lei

Complementar 103 permite, desde 2000, que estados fixem pisos estaduais sempre superiores

ao mínimo nacional.

O salário mínimo, como remuneração básica do conjunto de trabalhadoras e

trabalhadores formais brasileiros, dos aposentados, pensionistas e beneficiários da assistência

social – que transfere um salário mínimo mensal a idosos com idade acima de 65 anos e a

pessoas com deficiência, com renda familiar inferior a um quarto do salário mínimo, por meio

do Benefício de Prestação Continuada, criado pela Constituição Federal de 1988 e

regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social (BPC-LOAS) –, “foi a mais

importante negociação ocorrida na primeira década dos anos 2000” (DIEESE, 2016: 3). A

relevância da política foi demonstrada também nas campanhas à presidência da república em

2014, quando a candidata reeleita e o candidato da oposição compromissaram-se em assegurar

a continuidade do processo de valorização. Resta-nos indagar quanto aos propósitos do então

vice-presidente, que o presente já nos demonstrou ser um conspirador inescrupuloso e ávido

pelo poder, à revelia da soberania popular.

Acerca dos impactos da elevação do salário mínimo na economia, estimativas

pré-golpe para 2016 apontam que: 48,3 milhões de pessoas no país tenham rendimento

referenciado no salário mínimo; R$ 57,042 bilhões será o incremento de renda nacional e R$

30,7 bilhões correspondem ao acréscimo na arrecadação tributária sobre o consumo (DIEESE,

2016: 6). Em 2015, ao completar 75 anos de implementação política, o salário mínimo

possuía seu maior poder de compra dos últimos 30 anos. Com reconhecimento internacional,

a política de valorização do salário mínimo reposicionou o Brasil no cenário mundial: de

acordo com o relatório da OIT, de 2000 a 2011 o Brasil saltou do 14º ao 4º lugar no ranking

dos países segundo o salário mínimo em dólares na América Latina – na sequência de

Paraguai (US$ 384,40), Costa Rica (US$ 382,10) e Chile (US$ 366,00). Em 2000 o salário

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mínimo era de US$ 80,50 e, em 2011, atingiu US$ 324,90, o que representa valorização de

300%31.

Como afirmamos no início desta seção, o comportamento dos rendimentos

reias mostrou-se mais suave em sua retração ao longo de 2015: a média anual do

rendimento médio real habitualmente recebido no trabalho principal (segundo a PNAD

Contínua/IBGE) foi registrada em R$ 1.887,00 (equivalente a US$ 565,19), valor

praticamente estável frente ao observado na média de 2014, de R$ 1.888,00. Na análise da

evolução trimestral, nos dois primeiros trimestres de 2015 o rendimento médio real

permaneceu acima do relativo ao ano anterior, ao passo que, no terceiro e quarto trimestres,

ocorreram duas quedas sucessivas, de 1,70% e 0,30%, respectivamente. Desse modo, o valor

dos rendimentos no último trimestre de 2015 foi inferior ao registrado no mesmo período de

2014 assim como de 2013 (veja na tabela 8 abaixo o rendimento médio real segundo a

atividade econômica em 2013).

Tabela 8 - Brasil: Valor do rendimento médio real recebido no mês pelo trabalho principal, da população com 16 anos ou mais de idade, segundo o setor de atividade, em 2013 Setor de Atividade Rendimento (em Reais)

Administração Pública 2.826,54 Agrícola 600,02 Comércio/Serviços 1.377,53 Construção 1.385,86 Indústria 1.537,03 Outras Atividades 1.656,65

Fonte: PNAD/IBGE. Elaboração: IPEA/DISOC/NINSOC - Núcleo de Informações Sociais.

Em 2016 o rendimento médio nominal em janeiro foi de R$ 2.062,00

(acompanhe na tabela 9 abaixo), tendo havido, na comparação com o mesmo mês de 2015,

elevação de 3,8%. Em contrapartida, o salário mínimo nominal foi reajustado em 11,7% no

mesmo período. Na análise da evolução do biênio anterior, de 2014 para 2015 o rendimento

médio teve oscilação bem mais próxima da referente à do salário mínimo: 7,9% e 8,8%,

respectivamente. Esses dados reforçam a constatação da queda dos rendimentos médios no

país em 2016, ainda que, por força da lei, os salários mínimos permaneçam sendo reajustados.

31 Fonte: Portal Brasil. Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/07/pais-comemora-aumento-real-de-76-do-salario-minimo-na-ultima-decada>. Acesso em: 04/07/2016.

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Tabela 9 - Brasil: Rendimento médio nominal do trabalho principal, efetivamente recebido no mês de janeiro pelas pessoas de 10 anos ou mais de idade, empregadas com carteira de trabalho assinada do setor privado, no trabalho principal da semana de referência, no total das regiões metropolitanas¹ brasileiras, no período de 2002 a 2016, em estimativas de Reais

(R$); Salário Mínimo Nacional e Salário Mínimo Necessário Relação Rendimento Médio Nominal e Salário Mínimo Nominal

Ano de

referência

Rendimento Médio

Nominal (A)

Salário Mínimo

Nominal³ (B)

A/B4

Salário Mínimo

Necessário5

2002² 774,50 180,00 4,30 1.084,91 2003 850,30 200,00 4,26 1.385,91 2004 913,00 240,00 3,80 1.445,39 2005 951,50 260,00 3,66 1.452,28 2006 1.012,70 300,00 3,38 1.496,56 2007 1.102,90 350,00 3,15 1.565,61 2008 1.137,30 380,00 2,99 1.924,59 2009 1.277,60 415,00 3,08 2.077,15 2010 1.336,30 510,00 2,62 1.987,26 2011 1.425,60 540,00 2,64 2.194,76 2012 1.575,70 622,00 2,53 2.398,82 2013 1.695,90 678,00 2,50 2.674,88 2014 1.840,30 724,00 2,54 2.748,22 2015 1.986,60 788,00 2,52 3.118,62 2016 2.062,00 880,00 2,34 3.795,24

Fontes: IBGE (Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal de Emprego); IPEADATA; DIEESE. Notas: ¹ Incluídas as regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. ² Referente ao mês de fevereiro. 3Salário Mínimo Nominal vigente em janeiro dos períodos. 4Elaboração: IOS. 5 Valor estimado pelo DIEESE, necessário para suprir as despesas de um trabalhador e sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência, conforme previsto no regimento constitucional acerca do salário mínimo.

O IPEA (2016) avalia que a rotatividade no mercado de trabalho brasileiro,

complementarmente à atual elevação da participação do trabalho exercido em condição de

informalidade – em todas as grandes regiões brasileiras houve acréscimo na taxa de

informalidade na média de 2015 em comparação a 2014 –, contribua para a redução das

remunerações, como é possível verificar pelas estatísticas do Caged/MTE. Os salários dos

trabalhadores contratados tornaram-se cada vez mais baixos que os salários daqueles que

eram demitidos, com a diferença tendo atingido 16,60% no último trimestre de 2015.

A massa salarial encerrou 2015 com queda de 3%32 e a renda disponível para o

consumo sofreu retração acelerada e volumosa, resultado da sobreposição de elevação da

32 Fonte: Valor. Disponível em: <http://www.valor.com.br/brasil/4533311/queda-no-rendimento-real-puxa-piora-do-mercado-de-trabalho-no-inicio-do-ano>. Acesso em: 12/07/2016.

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inflação, redução da ocupação e recuo da renda33. No primeiro trimestre de 2016, a massa de

rendimento médio real de todos os trabalhos, habitualmente recebido por mês, pelas pessoas

de 14 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, com rendimento de trabalho,

foi estimada em R$ 173.450 milhões, registrando estabilidade em relação ao trimestre anterior

(R$ 175.706 milhões). Na comparação com o mesmo trimestre de 2015, com volume de R$

180.812 milhões, houve retração de 4,1%, segundo a PNAD Contínua do IBGE.

Em relação à faixa etária, os jovens apresentaram a maior queda no rendimento

real em 2015, de 2,30%. Os adultos observaram decréscimo mais sutil, de 0,40% e, quanto

aos mais velhos, com 60 anos de idade ou mais, tiveram estabilidade em relação à média de

2014. Na desagregação do rendimento dos ocupados segundo o sexo, o estudo do IPEA

(2016) pondera que as mulheres tiveram crescimento de 1,20% no rendimento médio real

entre 2014 e 2015, enquanto para os homens foi verificado declínio de 0,60% no mesmo

intervalo de tempo. No entanto, no que concerne à discrepância de gênero, é imperativo

reafirmar que as mulheres no Brasil, a despeito de percorrerem maiores níveis de instrução

formal, conforme já tenhamos apontado acima, receberam rendimentos expressivamente

inferiores aos auferidos pelos homens: de fato, em 2014 (vide tabela 10 a seguir), elas

receberam rendimentos quase 30% inferiores àqueles usufruídos pelos homens.

Tabela 10 - Brasil: Valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos das pessoas de 15 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, segundo o sexo, em Reais

Ano Total Homens (B) Mulheres (A) A/B 2012 1.396,00 1.602,00 1.119,00 69,85% 2013 1.539,00 1.763,00 1.240,00 70,33% 2014 1.644,00 1.882,00 1.332,00 70,78%

Fonte: PNAD/IBGE.

Analisando por faixas o rendimento médio mensal comparativamente ao salário

mínimo nacional, a partir de dados da PNAD/IBGE para pessoas de 15 anos ou mais de idade

ocupadas no Brasil (tabela 11 a seguir), verificamos que mais de 25% destes trabalhadores,

ou seja, uma em cada quatro pessoas abrangidas pela pesquisa, receberam rendimentos de até

um salário mínimo no triênio de 2012 a 2014. Aproximadamente 60% das pessoas ocupadas

obtiveram como rendimento até dois salários mínimos no Brasil: 61,73% em 2012, 59,97%

em 2013 e 58,6% em 2014. Detendo-nos um pouco mais acerca da desigualdade de gênero no

mercado de trabalho brasileiro, podemos mais uma vez constatar, proporcionalmente, a maior 33 Fonte: Valor. Disponível em: <http://www.cnf.org.br/noticia/-/blogs/queda-da-massa-salarial-ja-e-maior-que-na-da-crise-de-2003>. Acesso em: 12/07/2016.

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representação das mulheres em posições ocupacionais abrangidas nas classes de rendimento

inferiores: recebendo, em 2014, até um salário mínimo mensal, estavam 30,58% das mulheres

ocupadas, realidade enfrentada por 21,50% dos homens ocupados. Já em se tratando de

ocupados sem rendimento, estiveram representadas 9,78% das mulheres ocupadas, diante de

5,01% dos homens. No outro extremo, em relação aos vultosos rendimentos acima de 20

salários mínimos, eram usufruídos por 0,94% dos homens ocupados no país, ao passo que o

percentual de mulheres equivalia a 0,39% das ocupadas.

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43

Tabela 11 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, e valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos, por classes de rendimento, no Brasil (%)

Classes de rendimento mensal

Ano 2012 2013 2014

Nº Absolutos (em mil)

Total (%)

Nº abs. (em mil) Nº Absolutos

(em mil) Total (%)

Nº abs. (em mil) Nº Absolutos

(em mil) Total (%)

Nº abs. (em mil)

Homem Mulher Homem Mulher Homem Mulher Total 95.293 100,00 54.843 40.449 95.880 100,00 55.011 40.870 98.621 100,00 56.040 42.580 Até 1/2 salário mínimo 7.593 7,97 3.372 4.221 7.012 7,31 3.140 3.871 7.005 7,10 3.063 3.942 Mais de 1/2 a 1 salário mínimo 18.850 19,78 9.597 9.254 17.124 17,86 8.651 8.473 18.064 18,32 8.986 9.078 Mais de 1 a 2 salários mínimos 32.379 33,98 18.831 13.548 33.370 34,80 18.920 14.450 32.718 33,18 18.451 14.266 Mais de 2 a 3 salários mínimos 10.480 11,00 7.173 3.307 13.682 14,27 9.395 4.287 14.542 14,75 9.882 4.660 Mais de 3 a 5 salários mínimos 9.817 10,30 6.650 3.167 7.381 7,70 4.924 2.457 8.814 8,94 5.869 2.945 Mais de 5 a 10 salários mínimos 4.897 5,14 3.246 1.651 5.163 5,39 3.398 1.765 5.562 5,64 3.674 1.888 Mais de 10 a 20 salários mínimos 1.625 1,71 1.170 455 1.879 1,96 1.332 548 1.804 1,83 1.258 546 Mais de 20 salários mínimos 568 0,60 447 121 661 0,69 509 151 692 0,70 525 167 Sem rendimento¹ 6.332 6,65 2.677 3.655 6.327 6,60 2.679 3.648 6.974 7,07 2.808 4.166 Sem declaração 2.752 2,89 1.680 1.072 3.281 3,42 2.061 1.220 2.446 2,48 1.523 922 Fonte: PNAD/IBGE. Nota 1: Inclusive as pessoas que recebiam somente em benefícios.

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No triênio de 2014 a 2016, o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação

Getulio Vargas (Ibre-FGV) estima que haverá retração acumulada de 9,4% do PIB per capita

brasileiro, a segunda maior queda em 116 anos – na série iniciada em 1900, somente no

triênio 1981-1983 foi registrado recuo mais acentuado da renda per capita, 12,3%, a preços de

2015, na moeda nacional, ao passo que sob efeito da crise de 1929, entre 1929 e 1931, o país

sofreu retrocesso de 7,9% do PIB per capita.

Marcelo Neri, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

(IPEA), assinalou em entrevista ao Valor que as recentes conquistas em nosso país, no que se

refere à redução da desigualdade, estão ameaçadas pela conjuntura: “O Brasil está à beira do

precipício e corre risco iminente de cair. Descemos um barranco, mas ainda estamos

surpreendentemente perto do topo”34. Essa análise sustenta-se na constatação de que, até

meados de 2015, a massa da renda do trabalho e seus componentes mantiveram-se estáveis.

No terceiro trimestre de 2015 a massa de salários declinou e, em 2016, essa queda é

acentuada. Neri complementa, contudo, que metade da elevação do desemprego ocorre em

função de que mais pessoas estão à procura de emprego no país35. A Tendências Consultoria estima que, no período de 2014 a 2018, 5,21 milhões

de famílias brasileiras devem deixar a classe C rumo à base da pirâmide social, o que deve

afetar sobretudo os trabalhadores de baixa qualificação. Esse movimento deverá reverter a

expansão da classe média – mais apropriadamente a nova classe trabalhadora ou os

“batalhadores brasileiros”, de acordo com Jessé Souza, ou ainda as classes populares, segundo

Marcio Pochmann – que aconteceu nos anos recentes, quando, entre 2006 e 2013, 3,87

milhões de famílias saíram das classes D e E, ascendendo à classe C, na esteira do boom do

consumo e da renda. Com o avanço do desemprego, a queda da renda e a economia em

recessão, o sistema de proteção social será fundamental no país.36

34 Fonte: Valor (04/07/2016). Disponível em: <http://www.valor.com.br/brasil/4622867/renda-do-brasileiro-cai-mais-de-9-em-tres-anos>. Acesso em: 08/07/2016. 35 Fonte: Valor (04/07/2016). Disponível em: <http://www.valor.com.br/brasil/4622891/renda-capita-tera-segunda-maior-queda-em-116-anos >. Acesso em: 08/07/2016. 36 Fonte: Valor (04/07/2016). Disponível em: <http://www.valor.com.br/brasil/4622889/familias-da-nova-classe-media-voltam-para-base-da-piramide >. Acesso em: 08/07/2016 >.

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Observações preliminares

O salário mínimo é uma das conquistas da classe trabalhadora que estão no

alvo principal do golpe em curso no Brasil. Com a proposta de prevalência do negociado

sobre o legislado, o valor de referência poderia não ser mais uma obrigatoriedade,

sobressaindo os argumentos que enfatizariam os custos para os empresários e as supostas

implicações para a competitividade da economia brasileira. Argumentos falsos, haja vista que

o salário dos trabalhadores de baixa renda é integralmente gasto em despesas no comércio,

alavancando o mercado interno e dinamizando a produtividade nacional. Além disso, é

importante salientar que desde 2003, sobretudo na gestão do ex-presidente Lula, quando foi

formulada a atual regra de reajuste anual – que cobre a inflação do ano anterior mais o

crescimento econômico de dois anos anteriores –, o salário mínimo teve valorização de mais

de 70% e a informalidade no mercado de trabalho foi reduzida significativamente, ou seja, a

propalada elevação dos custos não implicou em expansão da informalidade. O salário mínimo

também estabelece um piso para os benefícios pagos pela Previdência Social no Brasil.

Associados, salário mínimo e benefícios previdenciários consistiram nos principais

instrumentos recentes de distribuição de renda no país.

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3. Seguridade Social37: “A Narrativa do Déficit e o Regresso à Barbárie”

De acordo com a PNAD, em 2014 havia 98.621 milhões de pessoas (tabela 12)

ocupadas no Brasil. Dentre elas, 60.825 milhões contribuíam para o instituto de previdência:

56 milhões eram homens e 42 milhões, mulheres. Percebe-se que entre os anos de 2013 e

2014 o total de não contribuintes subiu 2,5%, enquanto o de contribuintes foi um pouco

maior, 3,1%. É interessante notar que entre os homens houve um aumento de 2,5% dos que

contribuíam e 1,0% em relação aos não contribuintes, já as mulheres o aumento foi maior

entre as que não contribuíam 4,6%, enquanto as contribuintes foi de 3,9%.

Ou seja, proporcionalmente o número de mulheres ocupadas cresceu mais do

que os homens, entretanto o número de mulheres que não contribuem para a previdência

social também cresceu. Este indicativo reforça a ideia de que as mulheres estão se ocupando

no mercado de trabalho de atividades mais precárias do que os homens, o que é possível

afirmar com base no maior número de mulheres trabalhando sem registro em carteira em

relação aos homens. Isto pode gerar problemas para essas mulheres no futuro, já que sem a

contribuição para a Previdência Social elas terão de postergar a aposentadoria e o valor do

benefício também será menor.

Tabela 12 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência,

por sexo, segundo a contribuição para instituto de previdência em qualquer trabalho, em 2013 e 2014

Brasil: Contribuição à Previdência 2013

Total Homens Mulheres Nº abs.

(em mil) Variação

% Nº abs. (em mil)

Variação %

Nº abs. (em mil)

Variação %

Total 95.880 100,0 55.011 100,0 40.870 100,0 Contribuintes 58.994 61,5 33.360 60,6 25.634 62,7 Não contribuintes 36.886 38,5 21.651 39,4 15.235 37,3

2014 Total Homens Mulheres Nº abs.

(em mil) Variação

% Nº abs. (em mil)

Variação %

Nº abs. (em mil)

Variação %

Total 98.621 100,0 56.040 100,0 42.580 100,0 Contribuintes 60.825 61,7 34.181 61,0 26.645 62,6 Não contribuintes 37.795 38,3 21.860 39,0 15.936 37,4 Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2013-2014.

37 A seguridade social abrange as áreas de Saúde, Assistência Social e Previdência.

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A tabela 13 mostra que a maioria das aposentadorias concedidas no Brasil é

por tempo de contribuição e tanto nas áreas urbanas quanto nas áreas rurais houve

crescimento no número de segurados pela previdência.

Tabela 13 - Brasil: Quantidade de Aposentadorias Urbanas e Rurais Ativas, por grupos de espécies, posição em Dezembro, de 2010 a 2014

Ano

Quantidade de Aposentadorias Urbanas Ativas Quantidade de Aposentadorias Rurais Ativas

Total

Grupos de Espécies

Total

Grupos de Espécies Tempo

de contribuição Idade Invalidez

Tempo de

contribuição Idade Invalidez 2010 9.552.656 4.400.427 2.670.766 2.481.463 5.948.329 15.357 5.501.054 431.918 2011 9.923.854 4.585.098 2.809.757 2.528.999 6.105.570 16.358 5.655.293 433.919 2012 10.338.862 4.773.494 2.983.749 2.581.619 6.279.789 17.259 5.825.220 437.310 2013 10.788.462 4.975.405 3.178.849 2.634.208 6.460.330 18.304 5.998.771 443.255 2014 11.231.112 5.170.891 3.377.916 2.682.305 6.614.693 19.396 6.145.258 450.039 Fonte: Anuário Estatístico da Previdência Social.

Entretanto, nota-se que a aposentadoria por idade nas áreas urbanas foi a que

apresentou o maior percentual de crescimento entre 2010 e 2014, 26,5%, enquanto no caso

das rurais o maior crescimento foi o das aposentadorias por tempo de contribuição, 26,3%.

Isso se deve ao fato de que a maioria dos casos de aposentadoria do campo é por idade, então

qualquer aumento nas aposentadorias por tempo de contribuição – leia-se formalização –

superará os índices da cidade, além disso, há muito mais espaço para formalização no campo

do que na cidade.

Seguindo uma trajetória de crescimento das aposentadorias vemos na tabela 14

que a quantidade de benefícios pagos pela Previdência também continuou crescendo ao longo

do período. Entre os auxílios chama atenção aquele destinado aos acidentados, este cresceu

16,66% contra 7,86% (auxílio doença) e 9,73% (auxílio reclusão).

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Tabela 14 - Brasil: Quantidade de Benefícios Previdenciários do RGPS ativos, no total de clientelas Urbanas e Rurais, por grupos de espécies, posição em Dezembro, de 2012 a 2014

Ano Previdenciários

TOTAL Aposentadorias Pensão por

Morte Auxílios Salário-

Maternidade Outros Total Doença Reclusão Acidente 2012 25.035.331 16.618.651 6.980.140 1.364.149 1.275.190 48.550 40.409 72.039 352 2013 25.990.492 17.248.792 7.165.712 1.497.247 1.394.833 54.916 47.498 78.488 253 2014 26.844.069 17.845.805 7.323.921 1.596.578 1.483.183 58.399 54.996 77.584 181

Fonte: Anuário Estatístico da Previdência Social.

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Existe no país um problema muito conhecido que é a subnotificação dos

acidentes de trabalho, ela impede que as estatísticas nos deem uma fotografia concreta da

realidade do trabalhador brasileiro em relação ao tema. Não se sabe com certeza qual é a

quantidade exata de acidentes sofridos pelos trabalhadores, mas o debate aponta para a certeza

de que a quantidade é maior do que os dados encontrados nos sensos de acidentes de

trabalho38.

Para se ter uma ideia da situação nacional, ao comparar a taxa de acidentes em

2013 nos Estados Unidos verificou-se que ela é de 3,2 acidentes por 100.000 trabalhadores, já

no Brasil ela é pouco maior que o dobro, 6,53. Portanto, apesar da subnotificação o país ainda

tem muito a percorrer para baixar a taxa de acidentes de trabalho39.

No Brasil, a maior parte dos acidentes de trabalho é do tipo típico (acidentes de

trabalho decorrentes da atividade laboral): em 2014, representaram 76,5% do total de

acidentes de trabalho com Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT) registrada.

Tabela 15 - Brasil: Quantidade de acidentes de trabalho, por situação de registro e motivo, de 2005 a 2014

Ano Total Com CAT registrada

Sem CAT registrada

Total Típico Trajeto Doença do trabalho

2005 499.680 499.680 398.613 67.971 33.096 - 2006 512.232 512.232 407.426 74.636 30.170 - 2007 653.090 514.135 414.785 78.564 20.786 138.955 2008 755.980 551.023 441.925 88.742 20.356 204.957 2009 733.365 534.248 424.498 90.180 19.570 199.117 2010 701.496 525.206 414.824 94.789 15.593 176.290 2011 720.629 543.889 426.153 100.897 16.839 176.740 2012 713.984 546.222 426.284 103.040 16.898 167.762 2013 725.664 563.704 434.339 112.183 17.182 161.960 2014 704.136 559.061 427.939 115.551 15.571 145.075

Fonte: Anuário Estatístico da Previdência Social.

Do total de acidentes de trabalho nas áreas urbanas registrados em 2014, cerca

de 251.594 milhões (24,80%) geraram afastamento por mais de 15 dias40 e oneraram o INSS

em R$194.304 milhões, pagos em forma de auxílio acidente41.

38 Estratégia Nacional para Redução dos Acidentes de Trabalho 2015- 2016, 2015, p. 3. 39 Estratégia Nacional para Redução dos Acidentes de Trabalho 2015- 2016, 2015, p. 3. 40 Este tipo de afastamento gera obrigatoriedade por parte do INSS pagar benefício acidentário ao trabalhador. Fonte: Anuário de Estatísticas de Acidentes de Trabalho, 2014: 288-290. 41 Fonte: Anuário da Previdência Social, 2014: 346.

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Entre 2005 e 2014, a população ocupada cresceu em média 2,68%, com o

crescimento da população ocupada a expectativa é que a quantidade de acidentes de trabalho

também aumente.

Ao compararmos o crescimento da população ocupada e a taxa de crescimento

dos acidentes que tiveram afastamento por mais de 15 dias nas áreas urbanas, vemos que as

duas taxas crescem, entretanto os acidentes cresceram muito mais do que a população

ocupada entre 2005 e 2014, neste período a taxa de crescimento médio de acidentes foi de

assustadores 69,15%.

A diferença de mais de 25 vezes entre as duas taxas é enorme, isso sem contar

que não foram calculados os auxílios pagos por doença. Esta diferença brutal aponta para uma

sociedade em que o tema da saúde e segurança de seus próprios trabalhadores não é

prioritário.

O aumento na quantidade de acidentes significa um retrocesso na prevenção de

acidentes e apesar dos esforços no sentido de preveni-los, estes se mostram ainda insuficientes

para deter o avanço de um problema que, além de onerar financeiramente a sociedade,

também reduz a produtividade. Além disso, afeta os trabalhadores e trabalhadoras, que são os

maiores prejudicados pelas más condições dentro do local de trabalho.

É flagrante a trajetória de crescimento de todos os benefícios pagos pelo

sistema previdenciário nacional, todavia se comparado ao Produto Interno Bruto (PIB) em

valores correntes as despesas têm ficado praticamente estáveis (tabela 16).

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Tabela 16 - Proporção do total de gastos da Previdência sobre o PIB (valores correntes)

Ano PIB R$ (Tri) Total de gastos Previdência (Bi)

% dos gastos da previdência sobre o PIB Variação %

2012 R$ 4.806,00 R$ 4.533,00 9,43% 100

2013 R$ 5.316,00 R$ 5.142,00 9,67% 13,43%

2014 R$ 5.521,00 R$ 5.485,00 9,94% 21,00%

2015 R$ 5.904,00 R$ 5.139,00 8,70% 13,37% Fonte: http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2014/02/em-2013-pib-cresce-2-3-e-totaliza-r-4-84-trilhoes http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2016/03/1745810-pib-cai-38-em-2015-o-pior-resultado-desde-1996.shtml http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2015/03/27/pib-2014.htm

A tabela 16 mostra como essas despesas aumentaram anualmente entre 2012 e

2014 e diminuíram de 2014 a 2015, em média o gasto anual ficou em 9,44% e a taxa de

crescimento foi 15,93%.

Atualmente existe grande pressão para que haja uma reforma na previdência,

parte disto deve- se aos déficits mensais registrados em 2015 que chegaram a quase R$86

bilhões no final do ano e ao aumento da longevidade da população.

Já em 2015, foi sancionada a Lei 13.183 que introduzia uma nova reforma no

sistema previdenciário e instituiu a fórmula 85/95. Após esta lei as pessoas que querem se

aposentar devem somar o tempo de contribuição para a previdência mais a idade para dar o

total de 85 anos para mulheres e 95 para homens, ou seja, para que uma mulher se aposente

no prazo mínimo ela deve ter 50 anos de idade mais 35 anos de contribuição que dá a soma de

85. O mesmo caso se aplica aos homens só que a soma final deve dar 95. A fórmula vai

mudar com o passar do tempo como podemos ver na tabela 17 a seguir.

Tabela 17 – Fórmula de aposentadoria Período Mulheres Homens

2015 a 2018 85 95

2019 a 2020 86 96

2021 a 2022 87 97

2023 a 2014 88 98

2025 a 2026 89 99

2027 90 100 Fonte: http://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2015/07/04/entenda-como-funciona-a-regra-8595.htm.

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52

Em termos gerais isso significa que cada trabalhadora e trabalhador para se

aposentar por essa nova lei terá que trabalhar mais tempo do que no modelo antigo – 30 anos

de contribuição para mulheres e 35 para homens.

O coro em favor de uma reforma mais abrangente e que retire direitos dos

trabalhadores e das trabalhadoras é cada vez maior. Entretanto, é necessário salientar que o

déficit nas contas da previdência é fruto de uma manobra fiscal feita pelo governo em 2015.

O sistema de proteção social é financiado não apenas pelas contribuições dos

trabalhadores ativos, mas por vários impostos ou por porcentagens de impostos (chamados

impostos sobre a folha de pagamento) que ajudam neste financiamento.

Todavia nos últimos anos o governo tem permitido às empresas de vários

setores fazerem renúncias fiscais para desonerar a folha de pagamento, com isso impostos

como COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), CSLL

(Contribuição sobre o Lucro Líquido) e outros repasses do governo federal têm diminuído ao

longo do tempo.

Em 2015 essas receitas simplesmente sumiram dos balanços contábeis da

Previdência Social e foram redirecionadas para outros fins, isso contribuiu para transformar

uma média anual de superávit entre 2011 e 2014 de R$ 15 bilhões, e um total de mais de R$

61 bilhões para o período, em um déficit de R$ 85 bilhões em 2015.

Os ataques ao sistema previdenciário não se limitam apenas à retirada de

receitas, mas à contabilidade relativa ao sistema de proteção social em que os gastos do INSS

(Instituto Nacional do Seguro Social) são contabilizados a parte do sistema nacional de

proteção social. Com essa manobra a única fonte de receitas do INSS são as contribuições

diretas dos trabalhadores e empresas resultando em déficit42.

Dentro da rede de proteção social brasileira, há um item específico ao

trabalhador com carteira assinada que perde seu emprego. Este refere- se ao seguro

desemprego cujo valor do benefício não poderá ser inferior ao Salário Mínimo Nacional de

R$ 880,00 em vigor a partir do dia 11/01/2016. A quantidade de parcelas variam entre 3 e 5, o

menor valor da parcela é R$880,00 e o maior de R$1.542,24 (tabela 18).

42 Fonte: http://www.correiodobrasil.com.br/economista-desmonta-crise-da-previdencia-e-aponta-fraude-contabil/?ref=yfp.

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Tabela 18 – Brasil: Seguro Desemprego Formal - Valor do Benefício. Tabela para Cálculo do Benefício (Janeiro/2016)

Faixas de Salário Médio Valor da Parcela

Até R$ 1.360,70 Multiplica-se o salário médio por 0,8 (80%)

De R$1.360,71 até R$ 2.268,05 O que exceder a R$1.360,70 multiplica-se por 0,5 (50%) e soma-se a R$1.088,56

Acima de R$ 2.268,05 O valor da parcela será de R$1.542,24 invariavelmente Fonte: MTPS.

Com os dados das tabelas 18 e 19 é possível concluir que em 2014 e 2015 o

valor médio do benefício foi de 1,30 salário mínimo, ou seja, na média o valor da parcela foi

de R$1.114,00.

Tabela 19 - Brasil: Histórico do Seguro-Desemprego do Trabalhador Formal (anos selecionados)

Ano Total de

Requerentes Total de

Segurados Taxa de

Habilitação

Valor Emitido do Benefício

(em moeda corrente)

Valor Médio do Benefício em SMR

1986 204.324 150.741 73,78% 224.475.933,00 - 1990 3.099.910 2.806.820 90,55% 97.272.435.280,17 1,75 1996 4.397.264 4.360.917 99,17% 3.309.166.687,18 1,56 2000 4.260.699 4.176.004 98,01% 4.053.431.405,33 1,51 2001 4.772.779 4.686.756 98,20% 4.808.307.730,23 1,48 2002 4.884.001 4.803.535 98,35% 5.677.882.289,93 1,42 2003 5.051.407 4.971.712 98,42% 6.616.842.241,54 1,38 2004 4.892.760 4.812.008 98,35% 7.020.915.730,91 1,39 2005 5.473.693 5.362.968 97,98% 8.770.725.441,33 1,36 2006 5.857.041 5.749.511 98,16% 10.302.100.879,07 1,31 2007 6.275.716 6.149.789 97,99% 12.497.137.105,00 1,29 2008 6.950.857 6.816.600 98,07% 14.101.807.891,83 1,28 2009 7.485.475 7.330.864 97,93% 18.685.057.880,91 1,28 2010 7.593.338 7.439.915 97,98% 19.884.749.529,02 1,26 2011 8.006.731 7.839.900 97,92% 22.781.535.838,13 1,29 2012 8.061.722 7.779.832 96,50% 25.696.406.576,91 1,28 2013 8.570.257 8.291.800 96,75% 30.688.177.429,58 1,28 2014 8.798.671 8.440.041 95,92% 33.218.007.669,33 1,30 2015 8.191.170 7.668.624 93,62% 34.424.351.026,65 1,30

2016* 1.192.575 1.089.650 91,37% 5.320.953.129,87 1,27 Fonte: CGSAP/DES/SPPE/MTE. Nota: Emitido em: 07/03/2016.

De 1986 a março de 2016, o seguro-desemprego foi solicitado por 151.947.740

requerentes no total, dos quais 147.128.471 foram atendidos como segurados (96,83%),

representando 7.634.464.932.084,81 em valores nas respectivas moedas correntes nacionais

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(US$ 144.868.974.423,11). Em comparação ao salário mínimo, o valor médio do benefício,

nesse período de quase duas décadas, foi equivalente à proporção de 1,43.

Entre 2002 e 2015 o total de segurados no seguro desemprego cresceu em

média 41,97% e o maior crescimento foi entre 2004 e 2005, 11,45%.

Ao comparar a média da taxa de crescimento da população desocupada que

para o período é de 7,06% e a taxa de crescimento do seguro desemprego, vemos que a do

seguro desemprego é muito superior a taxa de desocupação, de modo, que os dados reforçam

a ideia de que a rotatividade dentro do mercado de trabalho brasileiro é grande e tem se

intensificado desde 2013 quando o país começou a sentir os seus primeiros sintomas de crise

econômica.

Em 2015 o governo federal alterou as regras para o recebimento do seguro

desemprego, a quantidade de meses que o trabalhador teria que ter com carteira assinada para

ter direito a receber o seguro pela primeira vez passou a ser de 12 meses ininterruptos, a

quantidade de meses para o segundo para 9 meses e para o terceiro 6 meses. Antes dessa

mudança o prazo era de 6 meses para qualquer pedido.

É interessante notar que o governo mudou as regras, dificultando o acesso ao

seguro-desemprego em um momento em que o país passa por uma crise econômica e,

portanto, havia uma tendência de que a rotatividade do mercado de trabalho aumentaria, o que

de fato ocorreu, já que a taxa de desocupação aumentou 60% entre 2014 e 2015.

Com o aumento da taxa de desocupação o que se esperava é que o volume total

de segurados pelo seguro-desemprego aumentasse muito, entretanto, ele diminuiu, registrando

um declínio de 9,14% entre 2014 e 2015.

Os números sugerem que as medidas do governo funcionaram, todavia, é

necessário salientar que os mais prejudicados com essa medida foram os trabalhadores

porque, no período, estavam sujeitos a um mercado de trabalho com menos empregos

formais, maior rotatividade e com regras que continuam dificultando o acesso ao seguro

desemprego.

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55

Observações preliminares

A Previdência Social brasileira incorporou, no século XXI, 13 milhões de

pessoas, ao passo que o gasto com aposentadorias e benefícios em geral permaneceu

praticamente estável proporcionalmente ao PIB43. Em dezembro de 2015, os benefícios pagos

pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) somaram 32,7 milhões, dos quais 23,5

milhões de atendidos domiciliados em zonas urbanas e 9,3 milhões, em áreas rurais. O total

de beneficiários ao final de 2015 significou um crescimento de 67% em comparação a 2000,

impulsionada pela destacada criação de postos de trabalho com carteira assinada. Com

orçamento de R$ 500 bilhões anuais, a abrangência da Previdência Social é de tal ordem que

especialistas a consideram o maior programa social e de redistribuição de renda no país. Com

efeito, os gastos previdenciários e assistenciais no Brasil constituem mecanismos de redução

da miséria e atenuação da desigualdade social.

Com o recente avanço do desemprego, bem como dos rendimentos, e a

consequente queda das contribuições decorrentes dos empregos formais, ímpetos restritivos

têm se fortalecido. A Reforma da Previdência que já vem sendo anunciada consiste em um

dos principais objetivos do governo instaurado pelo golpe em 2016. A reforma seria realizada

mediante: a alteração das normas para restringir o acesso aos benefícios; a desvinculação do

valor dos benefícios ao salário mínimo, que atualmente estabelece um piso; a definição de

uma idade mínima para aposentadoria – alegando a maior expectativa de vida no Brasil

apontada pelos dados estatísticos, embora discrepâncias regionais e setoriais sejam muito

expressivas –; e estabelecendo ainda a uniformização das idades mínimas para aposentadoria

de mulheres e homens. A defesa contra o desmonte da Previdência Social brasileira é um dos

mais importantes espaços em que a resistência ao golpe deve concentrar sua denúncia e

articulação.

43 Fonte: Carta Capital. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/economia/cobertura-da-previdencia-explode-mas-gasto-fica-estavel>. Acesso em: 01/08/2016.

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4. Liberdade Sindical: “Protagonismo e Alianças Horizontais em Combates”

A estrutura sindical brasileira é atualmente caracterizada pelos seguintes

princípios fundamentais: a unicidade sindical, isto é, apenas um sindicato segundo a categoria

e a base territorial; a contribuição sindical compulsória, o imposto sindical; bem como o

reconhecimento legal pelo Estado, que realiza o registro oficial das instituições.

Implementada por legislação em 1931, no governo de Getúlio Vargas, embora essa estrutura

geral tenha perdurado, houve distintos modelos de sindicalismo em exercício,

correspondentes aos contextos das relações entre as forças sociais e aos momentos históricos.

De 1968 a 1978, período de estabilidade da ditadura militar, os sindicatos

oficiais foram submetidos à tutela dos governos militares, que exerciam rígido controle das

eleições sindicais, nomeavam ou depunham os dirigentes, além de estabelecer uma política

salarial do governo e implementar uma lei de greve. A partir de 1978, no entanto, esse modelo

de sindicalismo instituído pela ditadura militar entrou em crise, tendo contribuído nesse

processo um conjunto de transformações da estrutura de classes do país, a partir do

crescimento acentuado do proletariado, sobretudo o contingente de trabalhadores manuais do

setor industrial. A retomada da atividade participativa dos trabalhadores teve como marco o

movimento grevista de 1978, inicialmente no ABC paulista – berço do “novo sindicalismo” –

e que se irradiou pelo país, num movimento amplo em defesa da redemocratização e dos

direitos trabalhistas e sociais das classes populares. Em consonância com essa nova práxis

sindical, em 1983, foi criada a Central Única dos Trabalhadores (CUT).

Marco mais recente dessa trajetória histórica do sindicalismo, uma nova

legislação reconheceu formalmente, em 2008, as centrais sindicais como entidades

associativas de direito privado de representação dos trabalhadores em âmbito nacional.

Atualmente a participação do sindicalismo rural tem se destacado na manutenção das taxas de

sindicalização no Brasil, envolvendo assalariados assim como agricultores familiares, com

crescimento significativo da participação associativa das mulheres no campo nas duas últimas

décadas, superando a sindicalização dos homens, e principalmente nas regiões Nordeste e

Norte.

Nas duas últimas décadas a taxa de sindicalização no Brasil tem permanecido

relativamente constante, oscilando em representações próximas ao intervalo entre 19% e 16%,

a despeito das mudanças ocorridas no âmbito do trabalho e da produção. Em 2014

(acompanhe na tabela 20 que segue), do total das mulheres ocupadas no país, com idade a

partir de 15 anos, 16,7% estavam filiadas ao sindicato de sua categoria profissional, frente aos

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15,5% referentes ao ano anterior. Independentemente do sexo, em 2014, 16,8% do total de

ocupados no Brasil estavam associados ao sindicato correspondente, enquanto no ano anterior

o total de associados somava 16,1%.

Tabela 20 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por sexo, segundo a associação a sindicato,

em 2013 e 2014 Brasil: Associação a Sindicato

2013 Total Homens Mulheres Nº abs.

(em mil) Variação

% Nº abs. (em mil)

Variação %

Nº abs. (em mil)

Variação %

Total 95.880 100,0 55.011 100,0 40.870 100,0 Associados 15.460 16,1 9.139 16,6 6.321 15,5 Não associados 80.420 83,9 45.872 83,4 34.548 84,5

2014 Total Homens Mulheres Nº abs.

(em mil) Variação

% Nº abs. (em mil)

Variação %

Nº abs. (em mil)

Variação %

Total 98.621 100,0 56.040 100,0 42.580 100,0 Associados 16.534 16,8 9.406 16,8 7.128 16,7 Não associados 82.086 83,2 46.634 83,2 35.452 83,3 Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2013-2014.

Numa análise segundo as Grandes Regiões brasileiras, a taxa de associação ao

sindicato mais elevada em 2014 foi registrada na Região Nordeste, com 22,4% das mulheres

trabalhadoras filiadas ao sindicato, ao passo que, quanto aos homens, a taxa de associação era

de 18,1%. Em 2013, esse percentual equivalia a 20,2% para as mulheres e 18,3% para os

homens ocupados. Nessa região, pelo menos uma em cada quatro mulheres ocupadas estavam

associadas à sua respectiva entidade de classe.

Esses dados confirmam a análise que vimos apontando no informe anterior: um

dos componentes que tem contribuído para a relativa estabilidade das taxas de sindicalização

no Brasil é o significativo crescimento da sindicalização feminina e nas atividades do campo,

em especial entre trabalhadores agrícolas não assalariados (vinculados à pequena produção

e/ou por conta própria, à agricultura familiar etc.), nas últimas décadas. Em estudo de 2014,

Rodrigues e Ramalho destacaram dois principais argumentos que possivelmente explicam o

associativismo rural e o incremento da filiação das trabalhadoras. O primeiro tem por

referência a criação do Fundo de Assistência Rural (FUNRURAL), em 1970 – que

reconheceu alguns benefícios, como as aposentadorias por idade e por invalidez aos

trabalhadores rurais –, e que foi modificado pela Constituição de 1988. Até 1988 somente

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uma pessoa por domicílio possuía o direito à aposentadoria por idade no âmbito rural (em

geral o dito “chefe de família”) mas, a partir de então, o benefício foi estendido a outros

membros da unidade familiar, ampliando o acesso pelas mulheres à aposentadoria rural. Os

trâmites institucionais para a obtenção do benefício são normalmente confiados à área jurídica

de sindicatos, associações ou cooperativas.

A segunda explicação para a elevação do associativismo sindical rural está

relacionada à criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(Pronaf), em 1995, responsável pelo oferecimento de uma linha de crédito especial destinada

ao custeio e investimento de atividades desenvolvidas pelos agricultores familiares e cujo

acesso requer do agricultor familiar uma Declaração de Aptidão do Pronaf (DAP), que pode

ser emitida pelo sindicato, associação ou cooperativa. Uma das bandeiras do movimento

sindical dos trabalhadores rurais reivindicava havia muitos anos uma política agrícola

diferenciada aos pequenos produtores. Em 1994, depois da Jornada de Luta, atualmente Grito

da Terra, liderada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), foi

criado o Programa de Valorização da Pequena Produção Rural (Provape). No ano seguinte, a

proposta foi aprofundada com definição de taxa de juros, fonte de recursos e foco no

agricultor familiar, com a instituição do Pronaf, “destinado ao apoio financeiro às atividades

agropecuárias exploradas mediante emprego direto da força de trabalho do produtor e de

sua família”. Até 2015, em duas décadas de implementação, a concessão de crédito rural via

Pronaf havia contemplado mais de 2,6 milhões de unidades familiares de produção44.

Com a acentuada fragmentação da estrutura oficial do sindicalismo brasileiro, a

pulverização tem se intensificado continuamente, embora expressivo número de entidades

sindicais não tenha efetivamente representatividade perante suas bases, tampouco acesso aos

locais de trabalho, fragilizando as negociações coletivas. De acordo com o cadastro de

atualização sindical do Sistema Integrado de Relações do Trabalho (SIRT), em junho de 2016

estão em operação 14.302 sindicatos filiados a centrais sindicais no Brasil, incluindo as

entidades em processo de tramitação de registro e as atualizações inválidas (veja detalhes na

tabela 21 abaixo). Em agosto de 2015 eram 14.266 sindicatos filiados a centrais sindicais,

conforme a versão anterior deste estudo pontuou.

As centrais sindicais reconhecidas oficialmente permanecem as 6 apontadas

anteriormente: Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical (FS), União Geral dos

Trabalhadores (UGT), Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), Central dos

44 Fonte: Portal Brasil. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/08/em-20-anos-o-pronaf-transformou-a-vida-de-mais-de-2-6-milhoes-de-familias. Acesso em: 07/06/2016.

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Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB).

Em número de sindicatos filiados, conforme gráfico 10 que segue, a CUT englobava, em

junho de 2016, 31% das entidades no país. A Força Sindical mantém-se na segunda posição,

com 21% do total de sindicatos filiados, seguida pela UGT e NCST, com 16% e 14%,

respectivamente, enquanto a CTB abrange 10% dos sindicatos filiados e a CSB, 7%.

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Tabela 21 - Brasil: Distribuição dos Sindicatos por Central Sindical, Maio/2016

Central Sindical

Atualizações em Tramitação – Filiação à Central Sindical

CNES –

Atualizações Invalidadas

CNES –

Atualizações Validadas

Aguardando Protocolo SRTE/MTE

Aguardando Correção

Entidade Sindical

Aguardando Providência SRTE/MTE

Central dos Sindicatos Brasileiros – CSB 10 2 9 499 638 Central Sindical e Popular Conlutas 0 0 1 98 102 Central Geral dos Trabalhadores do Brasil – CGTB 1 0 0 681 207 Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB 2 0 5 547 747 Central Única dos Trabalhadores – CUT 10 1 5 1.242 2.321 Força Sindical – FS 5 0 6 729 1.596 Central da Classe Trabalhadora – Intersindical 0 0 0 2 4 Nova Central Sindical de Trabalhadores – NCST 7 0 3 722 1.147 Pública – Central do Servidor 2 0 3 40 45 União Geral dos Trabalhadores – UGT 4 1 3 1.490 1.300 União Sindical dos Trabalhadores – UST 0 0 0 60 5

TOTAL 41 4 35 6.110 8.112 Fonte: Sistema Integrado de Relações do Trabalho (SIRT). Nota: Atualizada até 23/05/2016.

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Fonte: Sistema Integrado de Relações do Trabalho (SIRT). Notas: Atualizada até 23/05/2016. A partir das atualizações validadas – CNES/MTE.

As Negociações Coletivas em 2015

No dia 6 de abril de 2016 o Departamento Intersindical de Estatísticas e

Estudos Socioeconômicos (DIEESE) e as Centrais Sindicais realiaram a 12ª Jornada

Nacional de Debates – Desafios na Negociação Coletiva em Cenário de Crise, que contou

com a presença de 40 dirigentes sindicais, reunidos no auditório da Escola DIEESE de

Ciências do Trabalho, em São Paulo. No início do evento foi apresentado, pelo coordenador

de relações sindicais, José Silvestre, o Balanço das Negociações dos Reajustes Salariais de

2015. Elaborado pelo Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS), o levantamento

analisou os reajustes salariais de 708 unidades de negociação da indústria, do comércio e de

serviços, em estabelecimentos localizados em quase todo o território nacional45.

Desde 2004, de acordo com o Balanço, não era observado um cenário tão

desfavorável a trabalhadoras e trabalhadores no país: em 2015, ganhos e perdas reais

concentraram-se nas faixas mais próximas à variação da inflação. Do total de reajustes

salariais relativos a 2015, aproximadamente 52% obtiveram ganhos, situando-se acima da

inflação medida pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, calculado pelo

45 Fonte: DIEESE. DIEESE Comunic@. Ano VI – Número 170 – 17/04/2016. Disponível em: http://www.dieese.org.br/materialinstitucional/2016/dieeseComunica170.html. Acesso em: 06/06/2016.

CUT30%

FS20%

UGT17%

NCST15%

CTB10%

CSB8%

Gráfico 10 - Brasil: Participação das Centrais Sindicais por Número de Sindicatos Filiados, Maio/2016

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IBGE); 30% tiveram valor equivalente à variação do índice e 18% ficaram abaixo. O aumento

real médio em 2015 foi de 0,23%. Em 2014 haviam sido analisadas 779 unidades de

negociação, das quais 90,2% obtiveram reajustes acima do INPC-IBGE; 7,3% igual ao índice

e apenas 2,4% dos reajustes foram inferiores ao INPC. A variação real média de 2014 foi de

1,34%. Ainda que tenha sido registrada a degradação dos reajustes, os resultados verificados

em 2015 foram significativamente melhores do que os observados no período precedente a

200446.

Em 2015, o desempenho das negociações salariais foi deteriorando-se

conforme as datas-bases avançavam no calendário anual, possivelmente em decorrência do

agravamento do desfavorável quadro econômico brasileiro, particularmente quanto ao nível

de atividade (no quarto trimestre o PIB nacional decresceu 5,9% em relação ao mesmo

período de 2014), da ocupação e da inflação.

Ainda de acordo com a pesquisa do DIEESE, as negociações realizadas no

setor industrial sofreram o maior impacto pela crise em 2015, na análise entre os setores

econômicos, quando 45% dos reajustes resultaram em ganhos reais ao salário, 36% foram em

valor igual à variação do INPC e 19%, abaixo. No comércio, as negociações coletivas

apresentaram resultados um pouco mais positivos, com aumentos reais em 53% dos casos e

perdas reais em quase 15%; quanto aos reajustes no mesmo patamar do INPC, foram

observados em 32% das categorias analisadas no setor. Em se tratando do setor de serviços,

foi verificada a maior proporção de aumentos reais, tendo aproximadamente 62% das

categorias monitoradas registrado ganhos reais aos salários. As perdas reais, entretanto,

apresentaram proporção próxima à da indústria, de 18%; os reajustes iguais ao índice

ocorreram em 20% das negociações no setor.

O estudo do DIEESE também aponta que as negociações firmadas entre

categorias profissionais e econômicas – que resultam em convenções coletivas – obtiveram

um desempenho melhor do que as negociações realizadas entre categorias profissionais e

empresas – e que configuram acordos coletivos. Cerca de 55% das convenções coletivas

registradas em 2015, diante de 31% dos acordos coletivos, informaram reajustes acima do

INPC. Respectivamente, o percentual de reajustes em patamares iguais à inflação foi de 29%

e 34%.

46 Fonte: DIEESE. Estudos e Pesquisas. Balanço das Negociações dos Reajustes Salariais de 2015. Nº 80 – abril de 2016. Disponível em: http://www.dieese.org.br/balancodosreajustes/2016/estPesq80balancoReajustes2015.pdf. Acesso em: 06/06/2016.

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Movimentos paredistas: um balanço das greves

Em 2013 foram registradas 2.050 greves no Brasil. Houve crescimento de

134% em relação a 2012, quando haviam sido registradas 877 greves, e este consistiu no

maior número de toda a série histórica (acompanhe na tabela 22 que segue). Os dados

indicadores são apresentados pelo Sistema de Acompanhamento de Greves (SAG),

desenvolvido e mantido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos

Socioeconômicos (DIEESE), que reúne informações das paralisações e greves de

trabalhadores desde 1978. Esse movimento de greves e paralisações, que tomaram novo

impulso desde 2008 no Brasil, demonstra que, na contramão da tendência declinante que se

verifica nos países do Norte global, os sindicatos brasileiros seguem mais ativos e

mobilizados, a despeito de todas as dificuldades, tais quais as já apontadas, como

pulverização progressiva e baixa representatividade de parcela significativa das instituições,

além da rigidez hierárquica e da excessiva burocratização da estrutura sindical oficial.

Tabela 22 - Brasil: Total de greves, nas esferas públicas e privadas, em 2012 e 2013

Esfera 2012 2013 Taxa de

crescimento (%)

Variação da participação

(pp) Nº % Nº %

Esfera pública 410 46,8 933 45,5 127,6 -1,2 Funcionalismo público 381 43,4 796 38,8 108,9 -4,6 Empresas estatais 29 3,3 137 6,7 372,4 3,4 Esfera privada 464 52,9 1.106 54,0 138,4 1,0 Esfera pública e privada¹ 3 0,3 11 0,5 266,7 0,2

Total 877 100,0 2.050 100,0 133,8 - Fonte: DIEESE. Sistema de Acompanhamento de Greves (SAG-DIEESE). Nota 1: Greves empreendidas conjuntamente por trabalhadores das esferas pública e privada.

Em total de horas paradas, que correspondem à soma da duração de horas em

cada greve, foram 111.342 horas paradas em 2013, o que significa aumento de 28% em

comparação às registradas em 2012, quando foram verificadas 86.921 horas paradas. É o

número mais elevado desde o ano de 1990, com registro de 117.027 horas paradas. Em termos

de duração, as greves tornaram-se mais curtas, tendo ampliação do número de paralisações

que se encerraram no mesmo dia em que foram deflagradas: corresponderam a 30% do total

em 2012 e tornaram-se 49% em 2013. Em 2013 as greves mobilizaram 2 milhões de

grevistas, com média de 2.164 trabalhadores por greve.

A proporção das greves que apresentaram reivindicações propositivas observou

recuo de 64% em 2012 para 57% em 2013, enquanto a proporção das que manifestaram

reivindicações defensivas experimentou incremento de 67% para 75% no mesmo período.

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Somente entre as greves do funcionalismo público houve, entre 2012 e 2013, elevação da

participação das greves propositivas. Contudo, o incremento do caráter defensivo das greves

foi expressivo nas empresas estatais. O reajuste salarial permaneceu em 2013 como a

principal reivindicação no conjunto das greves analisadas, abrangendo 36% (em 2012, 41%).

As demandas relativas à alimentação corresponderam a 27%, mesmo patamar do ano anterior.

Já as demandas por melhores condições de trabalho tiveram elevação na participação entre as

reivindicações, saltando de 15% para 21% entre 2012 e 2013, passando ao terceiro lugar e

superando as demandas por um Plano de Cargos e Salários.

Dentre as 1.032 greves (50% do total em 2013) que geraram informações ao

SAG-DIEESE acerca dos meios adotados pelas partes para a resolução dos conflitos, em 92%

dos casos houve o recurso à negociação direta e/ou mediada e, em 27% foi apurado o

envolvimento do Poder Judiciário – que pode intervir, em uma mesma greve, em um

momento como conciliador e em outro como árbitro. Esses dois mecanismos de solução dos

conflitos podem ser acionados de modo complementar.

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Observações preliminares

As recentes informações registradas pela PNAD-IBGE apontam que as taxas

de associativismo sindical no Brasil têm se deslocado das regiões urbanas e industrializadas,

bem como de um perfil mais expressivamente masculino – assim como formatado a partir do

final da década de 1970, com o movimento grevista e a luta exitosa pela redemocratização do

país, os direitos do trabalho e a cidadania plena, conforme as conquistas inscritas na

Constituição de 1988 –, em direção ao trabalho desempenhado no campo, especialmente entre

não assalariados, e mais enfaticamente às mulheres trabalhadoras. Esse diagnóstico, aliás,

também se verifica no perfil de sindicalizados da CUT, a maior central sindical brasileira.

Com as mudanças contemporâneas nas relações de trabalho, decorrentes do processo de

reestruturação produtiva que se intensificou na década de 1990, da abertura comercial no país,

do avanço das privatizações, da flexibilidade na produção e da globalização neoliberal, novos

desafios têm se apresentado à ação sindical, em escalas nacional e global, nas últimas

décadas.

Os novos contratos de trabalho refletem esse movimento: o crescimento da

precariedade e da instabilidade dos vínculos profissionais, características que ademais tendem

a ampliar-se na conjuntura econômica recessiva e de grave crise política que o país enfrenta

em nossos dias. Por outro lado, este contexto amplia os espaços de oportunidades para

revigorar os sindicatos, fortalecendo a organização e sua apropriação, nas diversas instâncias

da estrutura sindical, pelas mulheres e a juventude trabalhadora, principais alvos da

precarização do trabalho e do desemprego. A possibilidade desse refortalecimento, no

entanto, passa pela superação do sexismo e a composição de uma aliança com a juventude

brasileira, entre estudantes e trabalhadores jovens (nos moldes da formação que insurgiu em

Paris em 2016, com protestos e greves contra as reformas trabalhistas anunciadas pelo

presidente François Hollande), o que por sua vez exigirá que o movimento sindical brasileiro

se reinvente criticamente e se reconfigure de modo mais horizontal. Afinal, tornou-se evidente

o descolamento significativo entre a juventude brasileira e os sindicatos, tal como as

manifestações sociais de junho de 2013 escancararam.

Afinal, a ocasião é imperativa, haja vista as propostas legislativas em

tramitação, e que afetam incisivamente a classe trabalhadora, defendidas pela base

parlamentar que dá sustentação ao governo Temer. Podemos agrupá-las em três eixos

principais: 1) terceirização; 2) negociado sobre legislado e 3) jornada e contratos flexíveis.

Além disso, a Justiça do Trabalho também se tornaria fragilizada, com estímulos à mediação e

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conciliação extrajudiciais, individual e coletiva. Acompanhe no quadro abaixo os principais

projetos de lei que golpeiam as conquistas trabalhistas:

Quadro – Brasil: Projetos em tramitação no Congresso Nacional que afetam a classe trabalhadora, em 2016

Projetos em tramitação

Tema

Casa legislativa

PLC nº 30/2015 Terceirização sem limites Senado

PL nº 427/2015 Acordo extrajudicial de trabalho permitindo a negociação direta entre empregado e empregador

Câmara

PL nº 4.193/2012 Prevalência do negociado sobre o legislado Câmara

PL nº 7.341/2014 Prevalência das convenções coletivas sobre as instruções normativas do Ministério do Trabalho

Câmara

PL nº 6.411/2013 Vedação da ultratividade das convenções e acordos coletivos Câmara PL nº 3.785/2012 PLS nº 218/2016

Contrato de trabalho intermitente Câmara Senado

PL Nº 3.342/2015 Contrato de trabalho de curta duração Câmara PLS nº 190/2016 Contrato multifuncional Senado PL nº 948/2011 PL nº 7.549/2014

Impedimento do empregado demitido de reclamar na Justiça do Trabalho Câmara

PL nº 4.497/2001 PLS nº 710/2011 PLS nº 327/2014

Direito de greve Câmara Senado

PLS nº 211/2016 Prestação de contas ao TCU sobre aplicação da contribuição sindical Senado Senado

PL nº 5.244/2016 PEC nº 71/1995 Extingue a contribuição sindical obrigatória Câmara

PLP nº 268/2016 Alteração na governança dos fundos de pensão Senado PLS nº 710/2011 PLS nº 327/2014 PL nº 4.497/2001

Regulamentação do direito de greve dos servidores Senado Câmara

PEC nº 139/2015 Extinção do abono de permanência do servidor público Câmara PEC nº 18/2011 Redução da idade para início da atividade laboral de 16 para 14 anos Câmara PL nº 3.842/2012 PL nº 5.016/2005 PLS nº 432/2013

Restrições ao conceito de trabalho escravo Câmara Senado

Fonte: LOGUERCIO, 2016.

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Referências consultadas:

Braga, Rui; Santana, Marco Aurélio. “Dinâmicas da Ação Coletiva no Brasil Contemporâneo: encontros e desencontros entre o sindicalismo e a juventude trabalhadora”. In: Santana, Marco Aurélio (coord.). Dossiê: Para Onde foram os Sindicatos? Caderno CRH, Salvador, V. 28, Nº 75, p. 529-544, Set./Dez. 2015. Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE). Balanço das Greves em 2013. Estudos e Pesquisas, nº 79 – dezembro de 2015. Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE). Política de Valorização do Salário Mínimo: valor para 2016 é fixado em R$ 880,00. Nota Técnica Número 153 - Dezembro de 2015 (atualizada em janeiro de 2016). Gentili, Pablo (Editor). Golpe en Brasil. Genealogía de uma farsa. CLACSO. Octubre Editorial. Buenos Aires. Junio de 2016. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Carta de Conjuntura Nº 29. Dezembro de 2015. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Mercado de Trabalho: Conjuntura e Análise. Nº 60, ano 22, abril de 2016. Loguercio, José Eymard. Cenários para as relações de trabalho no Brasil pós-2016. LBS, Julho de 2016. Martins, Carlos Eduardo. Fim da Nova República? Crise da hegemonia petista, golpe de Estado e soberania popular no capitalismo brasileiro. Disponível em: <https://blogdaboitempo.com.br/2016/03/16/fim-da-nova-republica/>. Acesso em: 27/07/2016. Rodrigues, Iram Jácome; Ramalho, José Ricardo (2014), “Novas Configurações do Sindicalismo no Brasil? Uma análise a partir do perfil dos trabalhadores sindicalizados”, Contemporânea – Revista de Sociologia da UFSCar, v. 4, n. 2, São Carlos, pp. 381-403. Rodrigues, Iram Jácome. “Trabalhadores e Sindicalismo no Brasil: para onde foram os sindicatos?”. In: Santana, Marco Aurélio (coord.). Dossiê: Para Onde foram os Sindicatos? Caderno CRH, Salvador, V. 28, Nº 75, p. 479-491, Set./Dez. 2015.