a balística forense e sua realização no estado do ceará

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CURSO DE DIREITO

ANTNIO ALMEIDA LIRA JNIOR

A BALSTICA FORENSE E SUA REALIZAO NO ESTADO DO CEAR

Fortaleza 2010

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ANTNIO ALMEIDA LIRA JNIOR

A BALSTICA FORENSE E SUA REALIZAO NO ESTADO DO CEAR

Monografia apresentada ao curso de Direito da Faculdade 7 de Setembro, como requisito parcial para obteno do grau de bacharel em Direito. Professor orientador: Prof. Ms. Victor Hugo Medeiros de Alencar.

Fortaleza 2010

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ANTNIO ALMEIDA LIRA JNIOR

A BALSTICA FORENSE E SUA REALIZAO NO ESTADO DO CEAR

Monografia apresentada ao curso de Direito da Faculdade 7 de Setembro, como requisito parcial para obteno do grau de bacharel.

Data de Aprovao: Fortaleza, 21 de junho de 2010.

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________________________________

Prof. Ms. Victor Hugo Medeiros de Alencar Orientador

___________________________________________________________ Prof. Ms. Alcio Saraiva Diniz Membro

___________________________________________________________ Prof. Ms. Rafael Gonalves Mota Membro

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A minha famlia, que sempre me incentivou para a conquista deste sonho. Em especial a minha me, Darci de Vasconcelos Lira, e ao meu pai, Antnio Almeida Lira, pilares e referncias de minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeo primeiramente a Deus, por ter me dado, todos os dias, fora, coragem e determinao para que eu pudesse enfrentar esse magnfico caminho da vida. Ao meu professor e orientador, Victor Hugo Medeiros Alencar, que, com sua pacincia e sabedoria, me apresentou e me ensinou sobre esse fantstico mundo da Balstica Forense. Ao professor Pedro Jairo, grande Mestre, a quem devo, sem dvidas, parte desta caminhada. Aos membros da banca, professor Alcio Diniz e professor Rafael Gonalves Mota, por quem tive a honra de ser apresentado ao Direito Penal. Ao meu grande amigo Naclio Gondim, policial competente da COTAM, que sempre nos orgulha com seu trabalho e determinao. Dra. Luciana Canito, Perita chefe do Ncleo de Balstica do estado do Cear, na qual colaborou brilhantemente com este trabalho. coordenao do curso de Direito e aos demais professores, em quem a disciplina e a competncia sempre estiveram presentes. Aos grandes amigos da sala 23, com quem tive o prazer de compartilhar parte de minha vida. Exemplos de companheirismo!

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Todos gostariam de ter um mapa da mina para a felicidade. S que isso no existe. Mas temos pistas e ferramentas para penetrar no territrio da emoo, desenvolver nossa inteligncia e aprender a superar nossas dificuldades. Augusto Cury

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RESUMO

LIRA JNIOR, Antnio Almeida. A balstica forense e sua realizao no estado do Cear. Fortaleza, 2010. Monografia Curso de Direito, Faculdade 7 de Setembro - FA7. Este trabalho objetivou estudar a Balstica Forense como fundamental meio de prova para a Justia nos crimes praticados por armas de fogo, com destaque para os tipos de armas existentes, os efeitos que provocam e o modo como se identifica a autoria do disparo pela arma, munies e resduos deixados pelo tiro. Mais especificamente, props-se a verificar como est sendo realizada a percia de Balstica no estado do Cear e a estrutura fsica e funcional de que dispe para o atendimento aos pedidos de exames pela autoridade policial e o poder judicirio, identificando as consequncias de um pedido mal elaborado para o inqurito ou processo criminal. Adotou-se como metodologia para a concretizao desses objetivos a realizao de um estudo exploratrio-descritivo, de natureza qualitativa, em duas fases: na primeira, buscou-se coletar, mediante a realizao de uma pesquisa bibliogrfica e documental na literatura, legislao e doutrina j produzida sobre a temtica, os dados necessrios construo de um referencial terico consistente; na segunda, inseriu-se no campo objeto deste estudo para buscar, in loco, informaes que trouxessem luz aos questionamentos propostos, mediante a aplicao de uma entrevista com o profissional responsvel pelo Ncleo de Balstica do estado do Cear. Concluiu-se pela presena cada vez mais inexpressiva do exame de microcomparao balstica como meio de prova nos processos criminais em razo da falta de recursos humanos, materiais e infraestrutura adequada para a sua realizao nos moldes exigidos pela legislao, situao agravada quando se leva em conta que o nmero de homicdios por arma de fogo, no estado, cresce significativamente a cada dia. Palavras-chave: balstica forense armas de fogo meios de prova percia criminalstica medicina legal. .

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SUMRIO

INTRODUO..................................................................................................... 09 1 BALSTICA FORENSE, ARMAS DE FOGO E OS COMPONENTES DE UMA MUNIO............................................................................... 11 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.6.1 1.6.2 1.6.3 1.6.4 2 CONCEITO DE BALSTICA FORENSE................................................ 11 DIVISES DA BALSTICA FORENSE.................................................. 12 CONCEITO DE ARMA........................................................................... 13 CONCEITO DE ARMA DE FOGO......................................................... 14 CLASSIFICAO GERAL DAS ARMAS DE FOGO............................. 14 COMPONENTES DE UMA MUNIO.................................................. 23 Estojo..................................................................................................... 24 Espoleta................................................................................................. 25 Plvora................................................................................................... 26 Projtil.................................................................................................... 27 LESES E EFEITOS PRODUZIDOS PELO DISPARO DE ARMA DE FOGO.................................................................................................... 29 2.1 2.1.1 2.1.2 2.1.3 2.1.4 2.1.5 2.1.6 2.2 2.3 2.4 2.4.1 2.4.2 2.4.3 3 ORIFCIO DE ENTRADA....................................................................... 29 Orla de contuso................................................................................... 32 Orla de enxugo...................................................................................... 32 Orla de equimose.................................................................................. 32 Zona de chama ou queimadura............................................................. 33 Zona de esfumaamento ou falsa tatuagem......................................... 34 Zona de tatuagem.................................................................................. 35 TRAJETO.............................................................................................. 36 ORIFCIO DE SADA............................................................................. 39 DISTNCIAS DO TIRO......................................................................... 41 Tiro encostado....................................................................................... 42 Tiro a curta distncia............................................................................. 43 Tiro distante........................................................................................... 45 A PERCIA FORENSE NA INTERLIGAO ENTRE A ARMA E O CRIME................................................................................................... 46 3.1 A PERCIA FORENSE COMO MEIO DE PROVA................................. 46

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3.2 3.3

IDENTIFICAO DO ATIRADOR PELOS RESDUOS DO TIRO........ 49 IDENTIFICAO DA ARMA DE FOGO PELOS COMPONENTES DA MUNIO.............................................................................................. 51

4 4.1 4.2

A JUSTIA E A BALSTICA FORENSE NO ESTADO DO CEAR...... 54 O LAUDO PERICIAL DE BALSTICA FORENSE................................. 54 ESTRUTURA DA PERCIA FORENSE NO ESTADO DO CEAR....... 58

CONSIDERAES FINAIS................................................................................. 61 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS..................................................................... 63 APNDICE........................................................................................................... 67 APNDICE A - Entrevista com a Dra Luciana Canito, Perita chefe do Ncleo de Balstica da Percia Forense do estado do Cear (PEFOCE)........................ 68

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INTRODUO

A violncia, no Brasil, vem crescendo de maneira significativa a cada dia. Frequentemente, telejornais noticiam homicdios praticados sob os mais variados tipos e formas, produzindo uma sensao de insegurana na sociedade, como um todo, e descrdito na polcia e no poder judicirio. No estado do Cear a situao no diferente. A ttulo de ilustrao, de acordo com os dados da Secretaria de Segurana Pblica e Defesa Social (SSPDS) (HOMICDIOS..., 2010), o nmero de homicdios no perodo de janeiro a maro de 2010 (794) cresceu 52,9% em relao ao mesmo perodo de 2009 (mais de 519). Segundo matria publicada pelo jornal O Povo em 28 de maio de 2010 (HOMICDIOS..., 2010), uma pesquisa realizada pelas Naes Unidas denuncia que 92,5% da populao cearense consideram que a violncia cresceu ultimamente, revelando que as polticas adotadas pelo poder pblico no esto conseguindo barrar o avano criminal. Em relao aos homicdios bala, verifica-se que o acesso cada vez mais fcil arma de fogo associado disputa acirrada entre traficantes pelos pontos de comercializao de drogas vem ceifando dezenas de vidas a cada semana no estado. Somente no final de semana do perodo do dia 22 de maio de 2010 meia noite do dia 23 de maio de 2010, das 18 pessoas mortas, vtimas da violncia na grande Fortaleza, 14 o foram por armas de fogo, sendo lavrado o auto de priso em flagrante em apenas dois deles. (HOMICDIOS..., 2010) O nmero de apreenses de armas de fogo na regio metropolitana de Fortaleza no ano de 2008 teve um aumento de 30% em relao a 2007, sugerindo, assim, a falta de eficincia das polticas pblicas adotadas para uma possvel diminuio da crescente violncia no estado. (CEAR..., 2009) Diante desses calamitosos nmeros, a sociedade pede uma soluo rpida e eficiente das autoridades competentes, assim como a devida punio para os culpados. Mas, para que se possa chegar a uma punio eficiente representativa da justia que se deseja seja efetivada h que se dispor de provas irrefutveis, o que apenas uma percia bem equipada e bem realizada poder proporcionar. Para a Justia, a Balstica Forense desempenha um importante papel na elucidao dos crimes praticados com o emprego de armas de fogo, fornecendo os

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meios de convencimento acerca da autoria do disparo e de sua origem, identificando se a arma daquele acusado expeliu ou no o projtil que veio a provocar a morte da vtima, oferecendo provas suficientes para que a Justia venha a absolver ou condenar aquele acusado com segurana. A Balstica Forense compreende o estudo bastante detalhado das armas de fogo, assim como de suas munies e das leses e caractersticas provocadas pelo tiro, sempre que houver relao direta ou indireta com alguma infrao penal, visando sempre esclarecer e provar sua ocorrncia. Neste trabalho, pretende-se discorrer no apenas sobre o que vem a ser arma de fogo, mas tambm acerca de todo o percurso trilhado pelo projtil desde a sada da boca do cano da arma at a sua identificao com a arma que o disparou, e os efeitos que produziu em seu percurso. Pretende-se, ainda, verificar como est sendo realizada essa percia no estado do Cear e a estrutura fsica e funcional de que dispe, destacando-se as qualidades e defeitos deste importante instituto pericial chamado Balstica Forense.

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1 BALSTICA FORENSE, ARMAS DE FOGO E OS COMPONENTES DE UMA MUNIO

Aqui neste primeiro captulo aborda-se a Balstica Forense, discorrendose sobre seu conceito, divises e classificaes, como tambm sobre armas de fogo e munies, cujas particularidades sero descritas na continuidade.

1.1 CONCEITO DE BALSTICA FORENSE

Aduz Domingos Tocchetto (2006, p. 03) que:Balstica Forense uma disciplina, integrante da criminalstica, que estuda as armas de fogo, sua munio e os efeitos dos tiros por elas produzidos, sempre que tiverem uma relao direta ou indireta com infraes penais, visando esclarecer e provar sua ocorrncia.

Por meio dos exames, das percias, a Balstica Forense no s visa provar as infraes penais cometidas com o emprego de arma de fogo, mas tambm, e principalmente, esclarecer a maneira como ocorreram tais infraes. A Balstica Forense possui um contedo eminentemente tcnico, mas com uma finalidade jurdica e penal, motivo pelo qual recebe a denominao de forense. A Balstica Forense assume um valor um tanto especial no meio jurdico, porquanto, alm de servir como meio de prova, decide, em muitos casos, a condenao ou absolvio de um determinado acusado que cometeu infrao penal com arma de fogo. Vinda da Medicina Legal, situada no captulo da Traumatologia Forense, a Balstica Forense passou, posteriormente, a se desenvolver dentro da criminalstica, integrando, atualmente, o contedo dessas duas cincias. Nesse sentido, Armando Hermes Ribeiro Samico explica que:A Criminalstica, a mais nova, como cincia de aplicao, que a medicina legal, herdou da mais anciana, o mesmo mtodo de conduta, as mesmas normas deontolgicas, o mesmo interesse de servir e o mesmo amor a justia. A par disso, formulou atravs dos tempos suas regras especficas, tcnicas e tticas, buscando contribuir para o estabelecimento da verdade, em suas funes de auxiliar a justia.

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Ao longo dos anos, a Balstica Forense atingiu uma extenso e complexidade tais que justificam o seu tratamento como disciplina autnoma, tanto nos contedos, quanto nos mtodos de investigao e de pesquisa.

1.2 DIVISES DA BALSTICA FORENSE

Para Tocchetto (2006), a Balstica Forense uma cincia que estuda as armas de fogo, o alcance e a direo dos projteis por elas expelidos, e os efeitos produzidos, podendo ser dividida em Balstica interna, Balstica externa e Balstica dos efeitos. A Balstica interna ou interior a parte da Balstica que estuda toda a estrutura, os mecanismos e o funcionamento da arma de fogo, as tcnicas de tiros, os efeitos da detonao da espoleta e da deflagrao da plvora dos cartuchos, at a sada do projtil da boca do cano da arma. A balstica interna, alm de estudar a arma e seus mecanismos, analisa tambm o tipo de metal utilizado em sua construo e sua resistncia s presses desenvolvidas em razo do tiro. Rabello (1982) revela que, quando efetuado um disparo, ocorre no cartucho a combusto da plvora, uma reao qumica que gera, quase instantaneamente, uma grande quantidade de gases, em alta temperatura. A fora expansiva destes gases fornecer energia suficiente para que o projtil seja expelido. A balstica externa ou balstica exterior estuda a trajetria do projtil desde a sua sada da boca do cano da arma at a parada final. Analisa as condies do movimento, a forma do projtil, a velocidade inicial, a massa, a resistncia do ar e a ao gravitacional. A balstica externa muito utilizada na rea militar, pois l se analisa o ngulo do tiro, o alcance til, o alcance mximo ou real e o alcance com preciso, em detalhes, por seus interesses estratgicos. Rabello (1982) ainda aduz que a Balstica dos efeitos, tambm chamada de Balstica terminal, estuda os efeitos produzidos pelo projtil desde que abandona a boca do cano at atingir o alvo, contemplando, nesse trajeto, possveis ricochetes, perfuraes, impactos e leses externas ou internas nos corpos atingidos como objetos de estudo. Ocorre que, quando o alvo atingido por um projtil for um ser humano, o estudo dos efeitos nele produzidos, em especial as leses traumticas, levar a Balstica Forense a se relacionar de forma direta com a Medicina Legal. Os vestgios materiais extrnsecos ao ser humano so objetos de estudo da Balstica

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dos efeitos, enquanto os intrnsecos so analisados e estudados pela Medicina Legal.

1.3 CONCEITO DE ARMA Conforme discorre Domingos Tocchetto (2006, p. 1), Arma todo objeto que pode aumentar a capacidade de ataque ou defesa do homem. Para o mesmo autor (TOCCHETTO, 2006), toda arma tem por objetivo principal aumentar a capacidade de ataque ou defesa do indivduo que a porta. Alguns objetos so feitos pelo homem com a finalidade especfica de serem usados como arma, caso em que recebem a denominao de armas prprias. Outros objetos, no entanto, que podem ser usados por indivduos para matar e ferir seus semelhantes. so fabricados pelo homem no com o intuito e finalidade de serem usados como armas, de aumentar sua capacidade de ataque ou defesa, mas como utenslios, de uso domstico ou industrial, para facilitar a sua vida. o caso do martelo, do machado e da foice, s para citar alguns exemplos, que recebem a denominao de armas imprprias. H que se mencionar, por pertinncia, o hbito de algumas pessoas de carregarem, no interior de seus veculos, uma chave de fenda, com a finalidade de utiliz-la para defesa ou ataque, considerada, devido forma de sua utilizao por essas pessoas, no mais como arma imprpria, e sim, arma prpria. Tocchetto (2006) ainda explica que as armas prprias compreendem duas categorias: armas manuais e armas de arremesso. As manuais, como o nome j indica, necessitam da fora manual do indivduo para o seu funcionamento, mais precisamente, do prolongamento do brao, sendo usadas no combate corpo a corpo. Pode-se mencionar como exemplos de armas manuais o punhal, a espada e a grande maioria das armas brancas, ou seja, qualquer objeto simples constitudo por ponta ou lminas, servido para defesa ou ataque. J as armas de arremesso so aquelas cujos efeitos, ora como expelidoras de projteis, ora atuando elas prprias como projteis, so produzidos a distncia de quem as utiliza. Integram esse ltimo grupo o dardo e a granada de mo, lanados diretamente pela mo do atirador, motivo pelo qual so consideradas como armas de arremesso simples. As armas de arremesso complexo, quando produzidas para expelir projteis, so compostas de

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um aparelho arremessador, tais como as pistolas, revlveres, fuzis, metralhadoras, espingardas e carabinas. Pode-se ainda classificar as armas, de acordo com as leses que produzem, em cortantes, perfurocortantes, cortocontundentes, perfurantes,

contundentes e perfurocontundentes. Para o estudo da Balstica Forense vai interessar as armas classificadas como perfurocontundentes, em cujas leses, provocadas por objeto perfurocontundente, ocorrem a perfurao e a ruptura dos tecidos, com ou sem lacerao e esmagamento, tpicas dos efeitos produzidos pelos projteis de arma de fogo.

1.4 CONCEITO DE ARMA DE FOGO

Rabello (1982) ensina que as armas de fogo so armas de arremesso complexo que, para expelir seus projteis, utilizam a fora expansiva dos gases resultante da combusto da plvora. Seu funcionamento, a princpio, no depende da fora fsica do homem. Para Frana (2008, p. 72), as armas de fogo:So peas constitudas de um ou dois canos, abertos numa das extremidades e parcialmente fechados na parte de trs, por onde se coloca o projtil, o qual lanado a distncia atravs da fora expansiva dos gases pela combusto de determinada quantidade de plvora.

Neste mesmo raciocnio, Rabello (1982) demonstra que so considerados elementos essenciais de uma arma de fogo o aparelho arremessador, ou seja, a arma propriamente dita, e a carga de projeo que, no caso, so a plvora e o projtil, integrando, na maioria dos casos, o cartucho. A combusto da carga de projeo dar origem aos gases que, expandindo-se, iro produzir presso contra a base do projtil, expelindo-o atravs do cano e o lanando ao espao, para que venha a produzir os efeitos desejados por quem o disparou, a distncia.

1.5 CLASSIFICAO GERAL DAS ARMAS DE FOGO

Vrios autores j tentaram estabelecer uma classificao das armas de fogo, sem muito sucesso, porquanto deparam sempre com um problema comum em

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qualquer tipo de classificao: a dificuldade para se estabelecer os critrios a serem adotados. Tais critrios, na classificao das armas de fogo, tero que estar intrinsecamente relacionados s prprias armas para serem elementos especficos e diferenciadores, no vindo a consistir uma mera diviso emprica, mas uma classificao corretamente tcnica que possua, alm disso, valor prtico. Rabello (1982), ciente das dificuldades mencionadas, fundamenta-se em cinco critrios especficos e diferenciadores, independentes entre si, para estabelecer sua classificao dessas armas: alma do cano; sistema de carregamento; sistema de inflamao; funcionamento e, por fim, mobilidade e uso. Em sua classificao, o autor seguiu, nos quatro primeiros critrios, uma ordem cronolgica de acordo com a evoluo da arma de fogo. Assim, se as armas de fogo foram consequncia da inveno da plvora, sua evoluo esteve sempre atrelada a ela. (RABELLO, 1982) Na classificao das armas de fogo quanto alma do cano, leva-se em conta o fato de que so fabricadas a partir de um cilindro, constitudo em ao, usinado, perfurado longitudinalmente, em sua regio mediana, por uma broca. Caso esse cano, aps ser perfurado, venha a ser calibrado e depois polido, estar-se- diante de um cano de alma lisa. As armas que se utilizam desse cano so classificadas como armas de alma lisa. (Figura 1.1)

Figura 1.1: Cano de alma lisa Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

A grande maioria das espingardas dotada de cano com alma lisa, podendo apresentar, ou no, um estrangulamento prximo boca do cano, denominado choque. Esse estrangulamento serve para um melhor agrupamento dos

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projteis, visto que esses tendem a se expandirem conforme se distanciam da boca do cano da arma. Os tipos de choque podem ser visualizados na Figura 1.2.

Figura 1.2: Tipos de chokes Fonte: PROVAS..., 2009.

De acordo com Tocchetto (2006), existem tipos de canos sobre os quais, depois de confeccionados, podem ser insculpidos, mediante uma ou mais brocas especiais, sulcos paralelos ou helicoidais, denominados de raias, razo pela qual as armas com esse tipo de cano classificam-se como armas de fogo de alma raiada. A razo de existirem, segundo Cavalcanti (1996), est em que, quando ocorre um disparo de arma de fogo, em mdia, nas armas curtas, o projtil sai da boca do cano da arma com uma velocidade aproximada de 310 m/s, necessitando girar em torno de seu prprio eixo para que mantenha sua estabilidade e trajetria; esse movimento giratrio impresso pelas raias. Pode-se citar como exemplos dessas armas revolveres, pistolas, submetralhadoras, rifles, carabinas e fuzis. H tambm as armas de alma mista, que possuem tanto cano de alma lisa quanto cano de alma raiada, como o modelo Apache, marca Rossi, com dois canos sobrepostos, o superior de calibre 22 (cano raiado) e o inferior, de calibre 36 (de alma lisa).

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Rabello (1982) informa que os raiamentos das armas de fogo so projetados e fabricados de acordo com os critrios estabelecidos por cada fabricante, em especial quanto ao nmero, orientao, se para a direita ou para a esquerda (dextrogira ou sinistrogira), largura, profundidade e ngulo de inclinao. A quantidade de raias mais utilizadas por esses fabricantes a de cinco ou seis, no entanto, existem canos tambm com quatro, sete, oito, nove, dez e doze raias. A indstria Forja Taurus S.A. produz, simultaneamente, armas com quatro, cinco ou seis raias. A Taurus fabrica o revlver calibre .30, Carbine, com quatro raias; revlveres calibres .32, S&WL, .38, Special, .357, Magnum e .44, Magnum, com cinco raias; e o restante dos calibres das pistolas, revlveres, rifles, carabinas e submetralhadoras, com seis raias, estes ltimos sempre orientados dextrogiramente. O que predomina na orientao das raias das armas curtas e longas o dextrogiro, isso , o giro no sentido horrio. H indstrias que tambm fabricam armas cujas raias so sinistrogira, ou seja, giram no sentido anti-horrio. (Figuras 1.3 e 1.4)

Figura 1.3: Cano de alma raiada Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

ORIENTAO DESTROGIRA: Sentido de giro horrio ou para a direita.

ORIENTAO SINISTROGIRA: Sentido de giro anti-horrio ou para a esquerda. Figura 1.4: Orientao das raias Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

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Na classificao quanto ao sistema de carregamento, Tocchetto (2006) ensina que o ato de municiar consiste na introduo de munio, feita por um indivduo, nas cmaras do tambor de um revolver ou no pente de uma pistola, assim, podemos dizer que esta arma est municiada. Mas quando um indivduo faz o carregamento, ou seja, pe carga, coloca cartucho ou munio na cmara de combusto de um revolver ou no pente de uma pistola que, ao acionar o gatilho, vem a disparar, pode-se dizer que esta est carregada. Vale ressaltar que nem sempre uma arma municiada estar, ao mesmo tempo, carregada. Rabello (1982) lembra que, nas primeiras armas de fogo, fixas ou portteis, o carregamento era bastante demorado. Nas armas de antecarga, o carregamento era feito pela extremidade anterior do cano (boca), sendo necessrio grande mobilidade e uso de instrumento para que pudesse ser realizado. Era comum o uso de uma vareta para socar a plvora e o restante da carga. Esse tipo de arma caiu em desuso, no Brasil, sendo atualmente fabricada somente artesanalmente em alguns estados, sobretudo para utilizao na caa, principalmente na regio nordeste. (Figura 1.5)

Figura 1.5: Arma de antecarga Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

Com a inveno do cartucho, cilindro metlico contendo, em seu interior, a espoleta (carga de inflamao), a plvora (carga de detonao) e o projtil, surgiram as armas de retrocarga (Figura 1.6). Nelas, o cartucho colocado na cmara, localizada na parte posterior do cano. Nos revlveres, ficam alojados nas cmaras do tambor e, na maioria das pistolas, no carregador ou pente. Ao longo do tempo, as armas de alma lisa e de antecarga foram, aos poucos, substitudas por armas de alma raiada e de retrocarga. (RABELLO, 1982)

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Figura 1.6: Arma de retrocarga Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

Na classificao quanto ao sistema de inflamao, observa-se toda a evoluo histrica do sistema de inflamao das armas de fogo. O primeiro sistema utilizado nas primeiras armas de fogo foi o sistema de inflamao por mecha, bastante complexo e perigoso, pelo risco de queimaduras que podia acarretar para o atirador. Com essas particularidades, foi substitudo pelo sistema de inflamao por atrito, mediante a utilizao do fecho de miquelete ou do fecho de roda, ambos obsoletos, na atualidade. Rabello (1982) comenta que, com o surgimento do cartucho, o sistema de inflamao acompanhou a evoluo da plvora. As primeiras armas utilizavam a plvora preta, mistura manual de salitre, enxofre e carvo. Para que pudesse inflamar, era necessria a comunicao do fogo diretamente com a mistura (plvora), motivo pelo qual aquelas armas eram dotadas de inflamao por mecha. O sistema por atrito surgiu para que, com o aproveitamento das fascas produzidas pelo contato da ponta do slex (pedra de fogo) contra uma pea serrilhada, viesse a inflamar a plvora por um orifcio aberto no cano. (Figuras 1.7 e 1.8)

Figura 1.7: Sistema de inflamao por mecha Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

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Figura 1.8: Sistema de inflamao por atrito Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

Tocchetto (2006) comenta que o surgimento de certas substncias, como fulminato de mercrio, clorato de potssio e estifinato de chumbo, de inflamao instantnea, possibilitou a sua colocao em cpsulas de espoletamento, originando o sistema de inflamao por percusso. Logo aps, vieram s plvoras de base qumica, de nitrocelulose ou nitroglicerina, com o que surgiram s armas de repetio: no automticas, semiautomticas e automticas. Garcia (2000) classifica as armas de fogo de percusso em extrnsecas, armas exclusivamente portteis de antecarga e de percusso nas quais a cpsula de espoletamento fica na parte externa, de forma isolada, sobre um pequeno tubo saliente chamado de chamin, que se comunica por um ouvido com a plvora (carga de projeo) contida no interior do cano. A cpsula de espoletamento detonada por meio da ao do percussor, que comprime a espoleta contra um tubo de salitre. Nos dias de hoje, o uso dessas armas bastante restrito, tendo em vista que a maioria das armas produzidas de percusso intrnseca, mais prticas e de fcil manejo. A munio utilizada constituda por cartuchos, em que se encontram embutidos a cpsula de espoletamento ou espoleta. (Figura 1.9)

Figura 1.9: Sistema de inflamao por percusso Fonte: CLASSIFICAO..., 2009.

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Em relao aos tipos de cartucho utilizados, Rabello (1982) ensina que podem as armas ser classificadas em armas de percusso central e de percusso radial. As armas de percusso central comportam a espoleta no centro do cartucho, no culote ou base metlica do cartucho. J as de percusso radial, anelar ou perifrica no possuem espoleta, e a carga de inflamao, que corresponderia espoleta, fica alojada em anel, no interior da orla oca do prprio culote do estojo. Para Rabello (1982), a percusso pode ser direta ou indireta. Quando o percussor, ou percutor, o prprio co, ou nesse est montado, podendo ser fixo ou mvel, est-se diante da percusso direta. Ser indireta quando o percutor for uma pea retrtil, inerte, apenas acionada pelo impacto do co, por ocasio do tiro. O sistema de inflamao por contato eltrico s utilizado nas bazucas e em peas de artilharia, assim como na detonao de algum artefato. Quanto ao sistema de funcionamento, Tocchetto (2006) revela que as armas podem ser de tiro unitrio e de repetio. As primeiras se subdividem em armas de tiro unitrio simples e de tiro unitrio mltiplo. Quando uma arma comporta somente uma carga para um nico disparo, necessitando, para seu prximo tiro, que lhe seja extrado o estojo e introduzida nova carga, manualmente, diz-se que se est diante de uma arma de tiro unitrio simples, como no caso das espingardas de um cano e das pistolas de tiro unitrio. As de tiro unitrio mltiplo so compostas por dois ou mais canos com suas cmaras independentes, servidas, cada uma, por seu mecanismo de disparo tambm independente, mesmo em armas que possuem monogatilho. Funcionam como se fossem duas ou mais armas de tiro unitrio simples montadas em uma s estrutura, denominada de coronha. Nesse caso, podese citar como exemplo a espingarda de dois canos, paralelos ou sobrepostos. Armas de repetio, por sua vez, so aquelas que comportam carga para dois ou mais tiros, de carregamento mecnico, podendo possuir dois ou mais canos. Distinguem-se das armas de tiro unitrio mltiplo, pois mesmo providas de dois ou mais canos, o mecanismo de disparo um s. (RABELLO, 1982) As armas de repetio podem ser divididas em no automticas, semiautomticas e automticas. No automticas so aquelas em que os mecanismos de repetio e de disparo dependem exclusivamente da fora muscular do atirador, como no caso dos revlveres e das carabinas. Nas armas de repetio semiautomticas, a fora do atirador somente necessria para o acionamento do mecanismo de disparo, pois, logo aps o primeiro tiro, o sistema de carregamento se

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aproveita dos gases gerados pela combusto da plvora para alimentar a arma novamente. Nesse caso, se enquadra a maioria das pistolas. Por fim, diz-se que as armas so de repetio automtica quando tanto o mecanismo de disparo como o mecanismo de repetio so acionados pela fora expansiva dos gases gerados pela combusto da plvora. No caso das armas semiautomticas, o tiro intermitente, ao contrrio do que ocorre com a arma automtica, que dispe da opo do tiro intermitente, do tiro de rajada e do tiro contnuo. (TOCCHETTO, 2006) Em relao mobilidade e ao uso, com o passar do tempo as armas de fogo foram evoluindo tambm em tamanho. Antigamente, eram to grandes e complexas que era necessrio mais de uma pessoa para a sua operacionalizao. Nos dias de hoje, a grande maioria das armas individual, ou seja, um s indivduo tem condies de oper-las devido reduo e modernizao dos materiais utilizados em sua fabricao. (RABELLO, 1982) Quanto ao uso, para o mesmo autor, podem ser classificadas em armas de fogo individual e coletivo. Uma arma de fogo ser de uso coletivo quando sua operao, em benefcio do grupo, requerer dois ou mais indivduos, como ocorre com os canhes. Quando, porm, for utilizada apenas por um indivduo, essa arma de fogo individual. Quanto mobilidade, Tocchetto (2006) ensina que classificam-se em quatro grupos: fixas, mveis, semiportteis e portteis. As armas sero fixas quando estiverem presas em um determinado local, podendo se mover apenas vertical ou horizontalmente. Como exemplo, tem-se a metralhadora antiarea e os canhes. As armas mveis so aquelas que somente podero ser transportadas de um local para outro por trao animal, motora ou motriz. J as semiportteis dividem-se entre arma e suporte (morteiro de infantaria e metralhadora pesada), podendo ser deslocadas, com maior facilidade, por dois ou mais homens, por exemplo. Por ltimo, as armas portteis so aquelas facilmente conduzidas por um nico indivduo. Dividem-se em armas curtas e armas longas. As armas curtas so operadas normalmente por uma ou duas mos, no necessitando do apoio no ombro. uma arma de maior facilidade de porte e conduo, visto seu tamanho reduzido, ao contrrio da arma longa, cuja operao requer o uso das duas mos e o apoio no ombro. Essa arma no utilizada para porte, visto seu tamanho e dificuldade de transporte. Diante do exposto, no se pode deixar de referir a uma arma de fogo que no considerada como tal por usurios e fabricantes, mas que pode ser utilizada

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para cometer crimes: a ferramenta utilizada na construo civil, nos calibres .22, .32 e .38, para a fixao de pinos em concreto armado e chapas de ao. Uma vez que os pinos disparados por essa ferramenta tm a capacidade de penetrar em concreto e ao, o mesmo ocorre no corpo humano, com bastante facilidade. Essa ferramenta chamada de fincapinos, e sua comercializao (tanto da ferramenta quanto do cartucho) livre de regulamentao e fiscalizao.

1.6 COMPONENTES DE UMA MUNIO

Grande a variedade de cartuchos que existem no mercado. Cada um tem suas particularidades quanto forma, tamanho, poder de disparo e outros. Em seu livro, Ferreira (1948, p. 189) comenta com preciso a diferena entre os cartuchos:Os cartuchos se diferem em forma; tamanho; comprimento; peso; dimetro; qualidade e quantidade da carga de plvora; nmero, forma, peso e natureza do dimetro dos projteis; o modo de percusso e a inscrio. A inscrio abreviada e compreende o nome do fabricante, sua marca comercial, calibre e o tipo da arma a que se destina.

Segundo Tocchetto (2006), o cartucho uma unidade de munio das armas de fogo de retrocarga. O primeiro, de Lefaucheux, foi patenteado em 1836, tendo sofrido, at hoje, vrias modificaes em relao a sua estrutura e composio. Atualmente, dividem-se em dois grupos: das almas raiadas, cuja percusso poder ser central ou radial, e para armas de alma lisa, em que a percusso ser central. Os cartuchos das armas que possuem o cano raiado, cuja percusso central, detm os seguintes elementos: estojo, cpsula da espoleta com sua mistura iniciadora (carga de inflamao) ou espoleta, plvora ou carga de projeo e, por fim, projtil. A maioria das espingardas, de almas, em sua maioria, lisas, especialmente as do calibre 12, pode conter em sua munio um nico projtil, chamado de balote, cuja venda absolutamente restrita devido ao seu alto poder de impacto/perfurao, podendo transfixar at mesmo a estrutura de alguns carros de valores. Regra geral, a munio das espingardas detm vrios chumbos (projteis) de diversos tamanhos, uma bucha e, por vezes, discos de papelo. (Figura 1.10)

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COMPONENTES: 1 - Estojo. 2 - Espoleta. 3 - Carga de projeo. 4 - Projtil.

Figura 1.10: Componentes de uma munio Fonte: ARMAS..., 2009.

1.6.1 Estojo

Ferreira (1948) revela que nas armas raiadas, os estojos so fabricados em metal, sem exceo; os estojos das armas de alma lisa podem ser fabricados inteiramente em metal ou somente sua base, tendo o restante do tubo constitudo de carto plstico. O estojo o componente externo do cartucho que tem maior dimenso, a quem compete dar a dimenso da cmara ou das cmaras de combusto de uma arma em que for utilizado o calibre nominal. Para Rabello (1982), as dimenses do estojo, determinadas por seus comprimentos, dimetro mdio e forma, definiro a capacidade de carga de um cartucho. Geralmente so fabricados em lato ou cobre, sendo o lato, uma liga de cobre e zinco, o preferido na fabricao. Segundo Ferreira (1948), o estojo cilndrico ou levemente cnico nos cartuchos de munio das armas raiadas. Pode ser liso ou estrangulado em sua regio anterior, com gargalo. O estojo cnico tem por finalidade facilitar a extrao da cmara em que estiver alojado, como no caso, por exemplo, das pistolas semiautomticas em que, aps cada disparo, o projtil projetado ao alvo e o estojo extrado pela garra do extrator para fora da arma, recebendo a cmara um novo cartucho, pronto para um novo disparo. Os estojos do tipo garrafa so mais calibrosos do que os projteis, razo pela qual tm sua regio anterior estrangulada em gargalo. Esse tipo de estojo geralmente utilizado em cartuchos de grande potncia, encontrados em armas de pequeno calibre e grande potncia como os fuzis, mosquetes, rifles, carabinas e algumas pistolas.

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Ferreira (1948) ainda ensina que a boca do estojo compreende a parte superior aberta, na qual engastado o projtil, que pode ter parte aparente ou no, dependendo do tipo de munio. Na base do estojo, o chamado culote, contm um orifcio circular para que seja alojada a espoleta ou a cpsula de espoletamento, que se comunica com o interior do estojo, onde fica a plvora (carga de projeo), por um ou dois orifcios. No centro desse orifcio poder haver uma bigorna, cuja funo consiste em, no momento da percusso, receber a compresso da cpsula de espoletamento, iniciando, assim sua inflamao. O estojo ora citado pertence ao cartucho do tipo fogo central, em que a espoleta inserida no orifcio circular do prprio estojo. Existe tambm o cartucho de fogo circular ou radial, que no possui espoleta, consequentemente, no possui alojamento para ela. (Figura 1.11)

Figura 1.11: Tipos de estojo Fonte: ARMAS..., 2009.

1.6.2 Espoleta

Tocchetto (2006) ensina que a espoleta consiste em uma pequena cpsula em forma de um pequeno cubo que tem por funo armazenar a mistura iniciadora, ou seja, a carga de inflamao, para que venha, no momento do disparo, iniciar a queima da carga de projeo (plvora). A espoleta pode estar montada no alojamento no centro do culote do estojo (cartucho de fogo central) ou pode ser parte integrante do estojo, como no caso dos cartuchos de fogo circular ou radial. Nesse ltimo caso, tem-se como exemplo os cartuchos de calibre .22 Long Rifle (.22LR), que no possui cpsula de espoletamento, mas a mistura iniciadora se aloja na prpria orla oca do estojo, em contato direto com a plvora (carga de projeo). (Figura 1.12)

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Figura 1.12: Espoleta de uma munio Fonte: ARMAS..., 2009.

De acordo com Fvero (1991), no momento do disparo a ponta do percutor da arma (co) choca-se violentamente contra a cpsula de espoletamento contra a bigorna do estojo. Com esse esmagamento, a mistura detonada e assim produz chamas de alto poder calorfico e de alta presso, que passam dos orifcios para a carga de projeo (plvora) dando incio a sua combusto. A plvora em combusto produz um grande volume de gases, fazendo com que o projtil seja expelido atravs do cano da arma. Alm de expelir o projtil, os gases ainda iro impulsionar o estojo para trs, violentamente, contra a culatra da arma, deixando sulcos microscpicos da culatra no estojo, servindo, assim, para um futuro exame de balstica (micro comparao).

1.6.3 Plvora

Segundo Rabello (1982), a plvora um combustvel slido, granular, que, quando entra em combusto, produz quase que instantaneamente uma grande quantidade de energia calorfica e um grande volume de gases, para que possa expelir o projtil sem que seja necessria a presena de oxignio do exterior, pois seus prprios componentes possuem o oxignio necessrio para a devida detonao. Com isso, pode-se dizer que a plvora o componente ativo do cartucho. Existem dois tipos de plvoras: a plvora preta, ou plvora com fumaa, e a plvora branca ou piroxilada, conhecida tambm como plvora sem fumaa ou plvora qumica. Garcia (2000) explica que a plvora mais antiga a plvora preta, mistura de salitre, carvo vegetal e enxofre em propores variveis. Ao queimar-se, tanto em espao livre quanto confinado, produz uma grande quantidade de fumaa.

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Devido a essa caracterstica, a plvora preta tambm conhecida como plvora com fumaa. Rabello (1982) explica que, em poca mais recente, surgiu a chamada plvora branca ou sem fumaa, conhecida tambm como plvora qumica. Este tipo consiste em um ingrediente ativo, a nitrocelulose, menos sensvel s variaes de temperatura.

1.6.4 Projtil

Projtil a parte da munio, instrumento perfurocontundente, expelida pela fora dos gases resultante da detonao da plvora com o fim de atingir um determinado alvo. De acordo com Gomes (1987, p. 559):Os principais movimentos do projtil so os de propulso ou de deslocamento para frente, que resultam da fora expansiva dos gases da plvora, e o de rotao, que lhe comunicado pelas ranhuras do cano da arma, visando a vencer a resistncia do ar.

Segundo Tocchetto (2006), o projtil pode ser constitudo por apenas um elemento (projtil nico) ou por vrios (projtil mltiplo). Em regra geral, os cartuchos de fogo central ou fogo circular so carregados com um nico projtil, que poder ser, dependendo do tipo e da finalidade da munio, alojado total ou parcialmente no interior do estojo. o caso das munies das pistolas, revlveres e algumas espingardas. Vale ressaltar que os projteis mltiplos, quando disparados, saem da boca do cano da arma todos agrupados, e depois comeam a separar-se, atingindo uma rea de projeo bem maior, denominada rosa do tiro. Para Fvero (1991), o que determina a velocidade inicial do projtil o tipo de arma, a quantidade de carga de projeo e seu formato, pois quanto maior for sua velocidade, maior ser sua fora viva. Ao sair da boca do cano de uma arma, o projtil poder encontrar, em sua trajetria, diversos obstculos, podendo sofrer uma srie de modificaes, dentre as quais as mais importantes so: deformao, esmagamento, fragmentao e desvio de direo. Mesmo que um projtil no atinja nenhum obstculo, poder ele se deformar naturalmente, pois quando a velocidade ultrapassa certo limite (varivel para cada tipo de projtil), a energia cintica do projtil decresce, podendo desorganiz-lo. (Figura 1.13)

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A - OGIVA - Favorece as propriedades balsticas concernentes resistncia do ar. 1 - Anel de Vedamento - rea onde o estojo engasta o projtil. B - CORPO CILNDRICO - Favorece as propriedades balsticas concernentes a arma. 2 - Sulco Serrilhado - Depsito de lubrificante slido. 3 - Anel de Foramento - Adere fortemente no raiamento. C - BASE - rea de aplicao dos gases. 4 - Cncavo da Base - Amplia a rea de aplicao dos gases.

Figura 1.13: Detalhamento de um projtil de arma de fogo Fonte: ARMAS..., 2009.

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2 LESES E CARACTERSTICAS PRODUZIDAS PELO DISPARO DE ARMA DE FOGO

Devido mobilidade e ao fcil manuseio, facilidade com que so encontradas no mercado clandestino e tambm aos fatores econmicos, as armas de fogo curtas so as mais utilizadas pelos criminosos, razo pela qual este trabalho ir ater-se anlise dos efeitos do tiro produzido por essas armas. Para Tocchetto (2006), as leses provocadas por uma arma de fogo sempre estaro ligadas munio e arma utilizada. Com o surgimento de novas tecnologias produzidas pelas indstrias blicas, as armas de fogo esto cada vez mais perfeitas quanto ao ajuste de peas e utilizao de acessrios, como, por exemplo, os compensadores de recuo e os silenciadores. Isso implica diretamente a reduo do nvel de rudo produzido por um disparo, assim como dos resduos do tiro expelidos pela boca do cano da arma. Outro fator relevante o emprego de cartuchos carregados com projteis de alta energia, expansivos ou expansivos fragmentveis, que inevitavelmente implica o surgimento de leses com

caractersticas diferentes das descritas nos livros de Balstica Forense e Medicina Legal. Frana (2008) explica que, ao atingir um corpo humano, os projteis de arma de fogo so verdadeiros instrumentos perfurocontundentes produzindo leses com caractersticas muito peculiares, constantes, quase sempre, de orifcio de entrada, trajeto percorrido, orifcio de sada e zonas, que iro depender da distncia da qual o tiro for efetuado. Com a ajuda da Balstica e da Medicina Legal, pode-se estabelecer, em muitos casos, a que distncia o disparo foi efetuado.

2.1 ORIFCIO DE ENTRADA

O orifcio de entrada, tambm chamado por alguns autores de ferimento de entrada, poder ser resultante de tiro encostado, a curta distncia ou a distncia. Segundo Gomes (2004), o projtil de arma de fogo comum, como um objeto perfurocontundente, ir atuar de forma circular sobre a superfcie onde sua ponta romba penetra. No corpo humano, o primeiro plano ser a epiderme, depois a derme. Devido ao contundente, a epiderme arrancada, formando-se, com isso, a chamada orla de escoriao ao redor do orifcio de entrada. Devido a sua maior

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elasticidade, a derme s ir se romper quando o limite dessa elasticidade for ultrapassado. devido a esse fato que o orifcio de entrada menor que o calibre do projtil. O projtil rompe a derme com bastante esforo, levando consigo impurezas que estavam no cano da arma. Assim, forma-se uma orla chamada de orla de enxugo, que recebe essa denominao porque como se o projtil se enxugasse na derme, transferindo para ela sujeiras como plvora, material de oxidao do cano, leo de limpeza da arma e outros possveis materiais. (Figura 2.1)

Figura 2.1: Leso de entrada de projtil de arma de fogo calibre 38 Fonte: Leses..., 2010r.

Para Croce e Croce Jnior (1998, p. 230), o projtil exerce ao perfurocontundente, produzindo, na grande maioria das vezes:Orifcio de entrada aparentemente circular, redondo (tiro perpendicular), oval, linear ou em fenda (tiro inclinado ou em regio abaulada), lembrando leso determinada por instrumento perfurante, pois no atuando os gases e demais elementos da munio, o projtil limitasse a afastar as fibras cutneas, sem seccion-las.

Complementando tal raciocnio, Cavalcanti (1996) explica que o orifcio de entrada apresenta as seguintes caractersticas: bordas invertidas, orifcio geralmente menor que o de sada, apresentando duas orlas de contuso e enxugo, aqui no importando a que distncia o tiro foi dado; quando for a curta distncia, poder possuir trs zonas, de tatuagem, esfumaamento e chamuscamento (queimadura). O autor aqui tambm revela que a curta distncia o cone de impurezas que atinge o alvo, que, no caso em anlise, a pele. Gomes (2004) alerta para possveis casos em que haja modificao do orifcio de entrada, o que ocorre, na maioria das vezes, quando o indivduo atingido usava roupa de textura grossa. Ao passar pelo tecido grosso, ou at mesmo quando atinge um material resistente no bolso dessa roupa, o projtil poder empurr-lo para

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dentro do ferimento, ampliando a orla de escoriao, tornando-a irregular. Caso semelhante ocorre quando esse disparo penetrar em regies de dobras naturais, pescoo, axila, cotovelo e outros. Ao passar por essas regies, o projtil raspar os dois lados da pele antes de penetrar na linha de sua unio. (Figura 2.2)

Figura 2.2: Leso de entrada de projtil de arma de fogo calibre 38 distncia, sob a blusa Fonte: Leses..., 2010.

Frana (2008) aduz para outro tipo de orifcio de entrada, esse bastante particular, causado por projteis de alta energia. Esses projteis atingem velocidades superiores a 750 mt/seg, causando uma verdadeira destruio dos tecidos, ossos e msculos, deixando mostra regies ou estruturas mais profundas, com orifcios muito maiores do que os projteis. O tnel da leso formado por uma vasta lacerao de tecidos, mostrando, s vezes, materiais de estruturas vizinhas. (Figura 2.3)

Figura 2.3: Orifcio de entrada e sada produzido por projtil de alta energia (fuzil 7.62) Fonte: Leses..., 2010.

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J os orifcios de entrada provocados por projteis mltiplos podem produzir um nico ou vrios ferimentos com caractersticas que iro depender dos elementos que compem a carga ou da distncia em que o disparo foi efetuado.

2.1.1 Orla de contuso

Segundo Gomes (2004), quando um projtil disparado por uma arma de fogo e atinge a pele de um indivduo, o primeiro plano que ultrapassa a epiderme, seguido da derme. Quando a epiderme arrancada pela ao contundente do projtil, forma-se ao redor desse ferimento de entrada uma orla de colorao escura, chamada de orla de contuso. Essa orla estar presente no importa a que distncia foi efetuado o disparo, tornado-se mais ntida quanto mais prximo for o tiro. Apresenta-se na forma circular quando o disparo for efetuado perpendicularmente sobre a pele, e ovulada, nos disparos oblquos.

2.1.2 Orla de enxugo

Para Frana (2008), a orla de enxugo, ou orla de limpeza, uma das caractersticas exclusivas do orifcio de entrada. Isso se d pelo fato de as sujidades do projtil ficarem retidas na pele da vtima durante sua passagem. Com isso, formase essa orla, composta de graxa, sarro de plvora e outros materiais. Croce e Croce Jnior (1998, p. 231) explicam que, regra geral:A orla de enxugo de cor escura e produzida pelo movimento rotatrio do projtil disparado por arma raiada, por adaptao da bala s margens do orifcio de entrada enxugando-a dos resduos de plvora, graxa, sarro da arma, fragmentos de indumentria etc.

A orla de enxugo estar presente em qualquer distncia do disparo, sendo menos frequente nos tiros encostados. A orla de enxugo obedece ao mesmo princpio da orla de contuso quanto caracterizao do orifcio de entrada, de formato circular nos disparos perpendiculares pele, e ovular nos tiros oblquos.

2.1.3 Orla de equimose

Para Frana (2008), a zona de equimose estar presente tanto nos

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disparos efetuados a curta distncia quanto nos distantes. Essa mancha de colorao violcia que se forma ao redor do ferimento de entrada do projtil decorre da ruptura de capilares, vnulas e arterolas atingidos pelo projtil. Somente com a presena da zona de equimose no se pode determinar a que distncia da vtima o tiro foi efetuado, muito menos a direo do disparo. Serve, entretanto, para concluir se a leso foi causada quando a vtima estava viva.

2.1.4 Zona de chama ou queimadura

Fvero (1991) define que a zona de chama, tambm chamada de zona de queimadura ou zona de chamuscamento, o resultado dos gases superaquecidos e inflamados da queima da plvora em contato com o corpo da vtima, produzindo a queimadura da pele da regio, dos pelos ou at mesmo das vestes da vtima. Essa zona circunda o orifcio de entrada e pode ser percebida nos tiros encostados ou muito prximos. Ao atingir regies com pelos e cabelos, haver a sua crespao, diferentemente de quando a regio atingida for um tecido, no qual podem aparecer pequenas regies queimadas. (Figura 2.4)

Figura 2.4: Leso produzida por entrada de projtil de arma de fogo. Disparo a curta distncia (queima roupa). Presena de tatuagem excntrica, disparo oblquo Fonte: Leses..., 2010b.

Tocchetto (2006) ensina que diferena bastante considervel ocorre na zona de chama nos tiros efetuados com plvora preta (com fumaa), em que a quantidade de resduos slidos expelidos ainda incandescentes bastante elevada. Foi devido a esse motivo que se originou a expresso tiro queima-roupa. Essa zona ser menos intensa quando se utilizar a plvora qumica (sem fumaa).

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Frana (2008) revela que nos tiros queima-roupa existe a chamada zona de compresso de gases. Devido elasticidade da pele que volta ao normal, somente vista nos primeiros instantes no vivo, pois se mostra como uma depresso da pele em virtude da ao mecnica dos gases que seguem o projtil. Para Tocchetto (2006: p. 249), A zona de chama serve para o diagnstico do orifcio de entrada, da distncia e direo do tiro, da quantidade de carga (plvora) e do ambiente em que foi realizado o tiro, razo pela qual de suma importncia que o mdico legista a identifique.

2.1.5 Zona de esfumaamento ou falsa tatuagem

A zona de esfumaamento a zona na qual a fuligem, oriunda da queima da plvora, fica depositada ao redor do orifcio de entrada. De acordo com Carvalho, Bruno e Segre (1965, p. 102), a zona de esfumaamento: formada pela deposio da fumaa resultante da combusto da plvora e ter colorido correspondente natureza dos produtos qumicos empregados para a composio da plvora, aps sua combusto.

Tocchetto (2006) informa que essa zona formada por resduos finos e impalpveis, sendo facilmente removveis do orifcio de entrada, com uma simples lavagem. Por essa razo, essa rea tambm conhecida como zona de tatuagem falsa, pois a fuligem no fica incrustada na pele da vtima. (Figura 2.5)

Figura 2.5: Leso produzida por entrada de projtil de arma de fogo. Disparo a curta distncia. Esfumaamento Fonte: Leses..., 2010e.

Dispe ainda o autor que, nos disparos perpendiculares, dependendo da

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distncia, a forma dessa zona no se apresentar circular, e sim estrelada ou ovulada. Sua colorao ir depender do colorido da plvora e da forma do residuograma, cujas dimenses e grau de concentrao iro determinar os elementos fundamentais para se chegar a qual direo e distncia o tiro foi efetuado em relao vtima. Gomes (2004) ressalta, com bastante importncia, que a zona de esfumaamento estar presente nos disparos a curta distncia. Ocorre que, se o local atingido estiver coberto por algum tipo de vestimenta, as caractersticas do esfumaamento ficaro total ou parcialmente retidas na roupa, podendo no ser percebidas ao redor do orifcio de entrada.

2.1.5 Zona de tatuagem

Para Cavalcanti (1996), a zona de tatuagem poder ser determinada como falsa ou verdadeira. A zona, quando falsa, facilmente removida com uma simples lavagem. J na verdadeira, os gros de plvora ficam incrustados na pele da vtima, somente sendo retirados por meio de cirurgia plstica. (Figura 2.6) Fvero (1991, p. 296), assim nos diz:Essa zona produzida pelos grnulos de plvora, queimada ou no que, partindo com o projtil, percutem o contorno do orifcio de entrada e se incrustam mais ou menos profundamente na regio atingida.

Figura 2.6: Leso produzida por entrada de projtil de arma de fogo. Disparo a curta distncia. Zona de tatuagem Fonte: Leses..., 2010c.

Frana (2008) ensina que o halo ou a zona de tatuagem ser mais ou menos arredondado nos tiros perpendiculares, ou de forma crescente, nos

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inclinados. Nos disparos inclinados, a zona de tatuagem ser menos extensa do lado do ngulo menor de inclinao da arma, e mais intensa do lado de maior ngulo. Ressalta ainda o autor que a zona de tatuagem um sinal indiscutvel de disparo a curta distncia. Poder a percia determinar a distncia exata do disparo fazendo vrios disparos de prova com a mesma arma e o mesmo tipo de munio at chegar a um halo de mesmo dimetro que o original. Isso orienta os peritos quanto posio da vtima e do autor do disparo. Ocorre que, se a arma dispuser de silenciador ou compensador de recuo, tanto a zona de esfumaamento, quanto as zonas de queimadura e de tatuagem, vm a sofrer significativas alteraes quanto s suas caractersticas. Tocchetto (2006) explica que os compensadores de recuo so, na maioria das vezes, localizados em ambos os lados da massa de mira, orifcios produzidos no cano da arma com a finalidade de permitir uma sada controlada dos gases que impulsionam o projtil, obtendo, dessa forma, um recuo de cerca de 25% e 30% menor nos revlveres calibre .38 Special, e de aproximadamente 50%, para revlveres calibre .357 Magnum e .44. Essa reduo confere ao atirador, no momento do tiro, a possibilidade de uma retomada mais rpida da visada (mira), permitindo-lhe, assim, efetuar os prximos disparos com maior eficincia de acerto de alvo. Quando um disparo efetuado em uma arma que possui compensador de recuo, ao invs de os gases e partculas serem projetados para frente, como ocorre nas armas comuns, em grande parte so projetados para cima atravs dos furos do compensador de recuo, fazendo com que o formato do residuograma se modifique completamente, em especial nos tiros encostados. J nos tiros a curta distncia, essa modificao pode no ser significativa. Esse residuograma pode assumir vrias formas, de leque, similar a um semicrculo ou de chifres de animal, dependendo do modelo e marca da arma utilizada.

2.2 TRAJETO

Croce e Croce Jnior (1998) explicam que, ao sair da boca do cano da arma, o projtil encontra-se com o corpo humano com bastante velocidade e energia suficiente para penetrar e deixar seu caminho. O trajeto (Figura 2.7) no nada mais

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que o segmento percorrido pelo projtil no interior de um determinado corpo, um pouco diferente da trajetria, que o percurso percorrido desde a sada da boca do cano da arma at o seu caminho final. Compete Medicina Legal o seu exame, anlise e interpretao, pois, em caso de dvida, a autoridade competente dever formular quesitos ao mdico legista que realizou a necrpsia, para, com isso, sanar as dvidas questionadas. Para Gomes (2004, p. 200):Trajeto a leso em forma de tnel que une a entrada ao ponto de repouso ou de sada do projtil. Ao longo do trajeto, os tecidos so rompidos de modo semelhante ao que acontece com a pele, diferindo o resultado lesional de acordo com sua textura. Forma-se um espao real de forma aproximadamente tubular preenchido por sangue e resto de tecidos lacerados.

Figura 2.7: Orifcio de entrada e sada de um projtil calibre 38, onde podemos observar o trajeto percorrido Fonte: Leses..., 2010g.

Gomes (2004) aduz que, no caso dos projteis mais comuns da maioria das armas de uso civil, com velocidade por volta de 300 mt/seg, a onda de presso provocada pela passagem do projtil tem pouca influncia no ferimento produzido, pois no atinge os tecidos imediatamente vizinhos ao trajeto. Isso se verifica, ao contrrio, quando se trata de projteis de alta energia, daqueles que atingem velocidades superiores a 750 mt/seg, que provocam uma onda de presso que influencia os tecidos vizinhos, chegando a rasg-los durante seu caminho, modificando significativamente as caractersticas do ferimento, como se pode perceber na Figura 2.8.

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Figura 2.8: Trajeto de um projtil de Fuzil 223. Nota-se que o orifcio de entrada est acima do joelho, um pouco menos lacerado Fonte: Leses..., 2010l.

Segundo Gomes (2004), quando o projtil atravessa um corpo, vindo a transfix-lo, logo se poderia imaginar uma linha reta ligando o orifcio de entrada com o orifcio de sada. Mas ocorre que os trajetos dessas feridas so dos tipos mais variados. Vo desde linhas retas at curvas criando ngulos dos mais inesperados. Tudo isso ir depender de vrios fatores como: distncia do tiro, ngulo de penetrao e regio do corpo atingida. Na grande maioria dos casos, os desvios mais acentuados so provocados pela coliso do projtil com as estruturas sseas, forando-os a desviar. Tocchetto (2006) explica que, dependendo da regio atingida, no encontrando o projtil resistncia maior nos tecidos e tendo energia suficiente para transfixar o corpo, pode-se extrair seu trajeto traando uma linha reta entre o orifcio de entrada e o orifcio de sada. Nos casos em que o projtil encontra uma resistncia mais dura, como um osso ou tendo, por exemplo, chegando a ricochetear, mudar de direo, esse percurso poder ser bastante alterado. Nesse caso, a linha que representa o trajeto no poder ser uma reta, pois dever partir do orifcio de entrada, passar pelo ponto do desvio ou ricochete e ir at o orifcio de sada, formando, assim, um ngulo. Para Cavalcanti (1996), a verdadeira trajetria depende da posio do atirador e da vtima no momento do disparo. E ser de suma importncia que o mdico legista, durante uma necrpsia, determine que trajeto o projtil percorreu e sua trajetria, para com isso determinar em que posio estava a vtima no momento do disparo. Isso dar aos peritos fundamentos importantes para que possa concluir se a vtima praticou suicdio, se foi um homicdio sem chance de defesa ou acidente. (Figura 2.9)

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Figura 2.9: Guia de trajeto de projtil de arma de fogo Fonte: Leses..., 2010i.

Gomes (2004) atenta para o fato de uma possvel fragmentao do projtil, ou seja, o prprio projtil poder se dividir em vrios pedaos e ampliar a rea da leso. Tal fragmentao poder ser provocada pelo impacto do projtil em um osso ou at mesmo por sua baixa consistncia, da, poder o mdico legista deparar com um ou vrios trajetos. Grande dificuldade ser para o mdico legista determinar o trajeto de uma vtima quando alvejada com vrios disparos, porquanto, na maioria dos casos, os ngulos se cruzam impossibilitando, por vezes, determinar uma avaliao precisa, sendo o mais aconselhado mapear os orifcios de entrada e os orifcios de sada antes de se iniciar a autpsia. Caso um projtil fique retido no corpo da vtima, ter que ser retirado o mais delicadamente possvel, pois a identificao da arma poder ser feita por meio de exames feitos no prprio projtil. No dever ser retirado com instrumentos metlicos e nem ser rastreado com sonda feita de metal, pois isso alteraria suas caractersticas, fazendo com que o exame de balstica viesse a se tornar duvidoso.

2.3 ORIFCIO DE SADA

Quando um determinado projtil possui energia suficiente para transfixar um determinado corpo, ir deixar um orifcio de sada maior do que o de entrada, irregular, com bordas dilaceradas e reviradas para fora, ou seja, evertidas. Segundo Frana (2008, p.100):

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Orifcio de sada, tambm chamado de leso de sada, so as feridas produzidas por projteis de arma de fogo que, tem forma irregular, bordas reviradas para fora, maior sangramento e no apresenta orla de escoriao nem halo de enxugo e nem a presena dos elementos qumicos resultantes da decomposio da plvora.

Frana (2008) ensina que o orifcio de sada consiste em feridas irregulares em forma de fenda ou desgarro, cujo dimetro ser maior que o do orifcio de entrada, pois o projtil nunca sair da mesma forma que entrou. Como a ao do projtil se processa ao contrrio da que se verifica na entrada, de dentro para fora, o orifcio de sada tem as bordas irregulares e reviradas para fora, possuindo um maior dimetro, o que faz com que essa rea possua um maior sangramento devido a um maior fluxo sanguneo. Nesse tipo de ferimento no h de se encontrar halo de enxugo, pois toda impureza do projtil ficou retida durante a passagem pelo corpo. Tambm no se ir encontrar nenhum vestgio de decomposio da plvora, visto que esta ficar no orifcio de entrada ou um pouco no trajeto, quando o disparo for encostado. (Figura 2.10)

Figura 2.10: Orifcio de sada de projtil de arma de fogo por calibre 38 Fonte: Leses..., 2010j.

Devido a sua alta energia, quando um projtil atinge um determinado corpo vem a se deformar, sofrendo aumento em sua ponta romba, um ligeiro achatamento na ponta do projtil. Isso aumenta o dimetro do trajeto e ainda um pouco mais no orifcio de sada. Vale ressaltar que isso se d nos projteis de baixa energia, pois h casos curiosos de projteis de alta energia que, quando transfixam dois corpos, pode o orifcio de entrada do segundo atingido ser maior do que o orifcio de sada, em face de o projtil sofrer uma rotao de at 90, reencontrandose, assim, com seu verdadeiro eixo. (Figura 2.11)

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Figura 2.11: Orifcios de entrada e sada produzidos por projtil de alta energia, em dois corpos Fonte: Tocchetto, 2006, p. 264.

Gomes (2004) revela a possibilidade de tanto o orifcio de sada quanto o de entrada possurem bordas evertidas, nos casos de tiros efetuados na cabea da vtima devido hipertenso intracraniana e eliminao de tecidos lacerados por ambos. J Tocchetto (2006) conduz para uma possvel situao em que se pode deparar com um orifcio de entrada e dois ou mais de sada. Isso ocorre quando o projtil, ao bater em um osso, por exemplo, se fragmenta e cada pedao em que se dividiu produzir seu prprio orifcio de sada, assim como pode ocorrer, tambm, com o fragmento do osso. Para Fvero (1991, p. 304), o orifcio de sada produzido pelo projtil propriamente dito, isoladamente ou reforado por corpos outros que a ele se juntarem no decorrer do trajeto (vestes, botes, ossos, dentes).

2.4 DISTNCIAS DO TIRO

Tocchetto (2006, p. 256) explica que:Por meios de exames das leses produzidas por armas de fogo (projteis e chumbos) e do estudo dos resduos dos tiros encontrados junto s leses, nas vestes da vtima ou no alvo, podese determinar a distncia do tiro, o orifcio de entrada e de sada, sua direo, trajetria e trajeto.

Quando ocorre um disparo, a quantidade de resduos e a leso provocada sempre iro depender da distncia entre a boca do cano da arma e a vtima. Essa distncia ser calculada diante dos efeitos provocados pelo tiro, seja esse primrio ou secundrio. Os efeitos primrios sero aqueles provocados pela prpria ao perfurocontundente do projtil, ou seja, pela ao mecnica. J os efeitos

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secundrios so aqueles provocados pelos gases provenientes da queima da plvora, pelos resduos em combusto e at mesmo por pequenas partculas do projtil. Tocchetto (2006) mostra que, diante dos efeitos primrios e secundrios, pode-se classificar o tiro como encostado, a curta distncia e distantes, como se ver a seguir.

2.4.1 Tiro encostado

Tocchetto (2006) explica que o tiro encostado (Figura 2.12) aquele em que o agressor apoia a boca do cano da arma no corpo da vtima, fazendo com que a leso seja provocada tanto pela ao perfurocontundente do projtil, quanto pela ao dos gases em alta energia oriundos da detonao da plvora. Nos tiros encostados, o projtil penetra juntamente com os gases superaquecidos resultantes da queima da plvora, produzindo um orifcio de entrada com forma irregular e de dimetro maior que o projtil. Isso ocorre devido vedao que criada entre a pele da vtima e a boca do cano da arma, pois, no momento do disparo, parte dos gases em alta energia escapa por essa vedao, fazendo com que a pele seja rasgada em torno do orifcio de entrada. Nesse tipo de tiro, ao redor do ferimento de entrada nota-se uma creptao gasosa da tela subcutnea proveniente da infiltrao dos gases. Aqui no se encontra rea de esfumaamento, muito menos zona de tatuagem, pois todos os elementos da detonao iro penetrar juntamente com o projtil e, por isso, suas vertentes mostram-se enegrecidas e desgarradas, com aspecto de cratera de mina. Nos disparos efetuados em estruturas sseas como costelas, crnio e escpulas, pode-se encontrar um halo fuliginoso na lmina externa do osso referente ao orifcio de entrada (sinal de Benassi). Tambm se pode deparar com uma impresso, na pele da vtima, deixada pela boca do cano da arma e da massa de mira, ou da guia da mola recuperadora, que tanto pode ser pela ao contundente como pelo aquecimento dessas peas (sinal de Werkgaertner). (FRANA, 2008)

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Figura 2.12: Disparo de arma de fogo encostado. Cmara de mina de Hofmann e sinal de Benassi Fonte: Leses..., 2010k.

Para Gisbert Calabuig (2004), ser de suma importncia para um seguro diagnstico de tiro encostado encontrar a presena de carboxiemoglobina no sangue do ferimento, assim como de nitratos da plvora, nitritos de sua degradao e enxofre decorrente da combusto da plvora. Sobre os novos conceitos de distncia de tiro e de ferimentos de entrada em tiros prximos, Frana (2008, p. 104) ensina que:As armas que apresentam compensadores de recuo alteram profundamente o formato do residuograma e deixam de apresentar os formatos habituais nos tiros encostados ou bem prximos ao alvo. Assim, por exemplo, os ferimentos em boca de mina nos tiros encostados no so encontrados quando as armas que os deflagram apresentam os compensadores de recuo, isso em virtude da disperso dos gases pelos furos da extremidade distal do cano da arma.

2.4.2 Tiro a curta distncia

Frana (2008, p. 95) explica que:Os ferimentos de entrada nos tiros a curta distncia podem mostrar: forma arredondada ou ovular, orla de escoriao, bordas invertidas, halo de enxugo, halo de tatuagem, orla de esfumaamento, zona de queimadura, arola equimtica e zona de compresso de gases.

Pode-se dizer que o tiro foi efetuado a curta distncia quando se encontra, no orifcio de entrada, alm do ferimento provocado pelo projtil, leses provocadas pelos gases, resduos de combusto ou semicombusto da plvora expelidos pelo cano da arma. Quando, nesse tipo de ferimento, alm das zonas de esfumaamento e de tatuagem encontra-se tambm pelos e cabelos chamuscados,

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crestados, e/ou roupas e pele queimada, esse tiro ser chamado de tiro queima roupa. Gomes (2004) mostra que, quando efetuado um disparo, cria-se na frente da boca do cano da arma um cone de exploso, composto de gases superaquecidos (chama), resduos da combusto (fuligem) e gros de plvora incombusta ou em combusto. Ocorre que, ao longo do trajeto, esses elementos vo desaparecendo conforme a distncia entre a boca do cano da arma e a vtima. O elemento que tem o menor alcance a chama, que vem a queimar as vestes, pelos ou pele da vtima. Por seguinte vem a fuligem, que pode se depositar na vtima causando a zona de esfumaamento, cuja orla ter uma cor acinzentada mais ou menos escura, variando de acordo com a plvora utilizada, bastando uma simples lavagem para sua retirada. J os gros de plvora que esto ou no em combusto tero o maior alcance. Eles conseguem atingir o corpo da vtima de forma a atravessar a epiderme e ficarem incrustados na derme, formando, assim, a zona de tatuagem, que pode vir a se constituir na nica prova de que o tiro foi efetuado a curta distncia. No se pode jamais esquecer que as orlas caractersticas dos tiros a curta distncia (zona de esfumaamento e de tatuagem) podero estar presentes somente nas vestes da vtima, podendo no ser percebidas ao redor do orifcio de entrada. (Figura 2.13)

Figura 2.13: Disparo de arma de fogo a curta distncia Fonte: Leses..., 2010q.

Frana (2008) aduz que para esse tipo de tiro no existe uma distncia exata entre a boca do cano da arma e o alvo, sendo o conceito de tiro a curta distncia eminentemente prtico, se admitindo at quando se evidenciarem os efeitos secundrios.

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2.4.3 Tiro distante

Tocchetto (2006, p. 263) esclarece que:Tiro distante ou distncia aquele desferido contra alvo situado dentro dos limites da regio espacial varrida por gros de plvora comburida ou incombusta e por fragmentos do projtil (chumbo ou lato) expelidos pelo cano da arma, ou somente pelo projtil.

Quando um disparo feito por uma arma curta a uma distncia aproximada de 50 cm, os pontos de tatuagem j so poucos e bastante esparsos, indo at por volta de 70 cm a 80 cm, mas cessando por volta de 1 m. Ser muito raro tais caractersticas ultrapassarem essa distncia, mas caso ocorra, a tatuagem ser formada apenas por fragmentos do projtil. Se formar com esses fragmentos uma zona de tatuagem, estar-se- diante dos efeitos secundrios do tiro distante. (Figura 2.14)

Figura 2.14: Disparo de arma de fogo a distncia Fonte: Leses..., 2010m.

Tocchetto (2006) explica que o dimetro da zona de tatuagem cresce continuamente at a distncia em que os gros da plvora incombusta no tenham mais resistncia, vindo a cair antes mesmo de atingir o alvo. Cavalcanti (1996) acrescenta que nos tiros distantes, o orifcio de entrada apresenta bordas invertidas, assim como no tiro a curta distncia, geralmente menor que o orifcio de sada, orla de contuso e enxugo e aurola equimtica. Ocorre que, se o tiro for dado na perpendicular, a forma do orifcio de entrada ser circular, assumindo a forma ovular quando o tiro por dado inclinado.

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3 A PERCIA FORENSE NA INTERLIGAO ENTRE A ARMA E O CRIME

Neste captulo, aborda-se a percia forense como meio de prova de forma genrica, passando-se, posteriormente, para a percia de Balstica quanto identificao do indivduo pelos resduos deixados pelo tiro e tambm pelos componentes da munio.

3.1 A PERCIA FORENSE COMO MEIO DE PROVA

Percia um exame realizado por pessoas especializadas em determinada matria e rea para ser til em determinado caso como meio de prova, para instruir os julgados. Para Nogueira (2000, p. 197), em regra geral percia :[....] determinada pela autoridade policial (art. 6, VII) na fase de inqurito, pois quando a infrao deixar vestgios ser indispensvel o exame de corpo de delito, direto ou indireto, no podendo supri-lo a confisso do acusado.

Em locais de crime onde exista arma de fogo, Dorea (2006, p.111) aduz para a seguinte situao:Existindo a(s) arma(s) no local, uma ateno especial dever ser dada a ela(s), anotando, segundo seu tipo, os dados a seguir relacionados, bem como estabelecer detalhadamente sua posio em relao ao corpo da vtima. A distncia da arma, em relao vtima, o tipo de carga e sua localizao nas cmaras do tambor (tratando-se de revlver) podero levar a uma diagnose diferencial entre homicdio, suicdio e acidente (tiro acidental).

Nogueira (2000) explica que a percia ter que ser realizada o mais rpido possvel, com base no princpio da imediatidade, pois, com o passar do tempo, os vestgios latentes podem desaparecer, prejudicando a apurao dos fatos. Quando houver, a percia poder ser realizada por peritos oficiais e, na falta desses, por duas pessoas que tenham diploma de curso superior, preferencialmente na rea. Sobre o assunto, o Cdigo de Processo Penal brasileiro, em seu art. 159, preceitua que:

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Art. 159. O exame de corpo de delito e outras percias sero realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior. (Redao dada pela Lei n 11.690, de 2008) 1o Na falta de perito oficial, o exame ser realizado por 2 (duas) pessoas idneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na rea especfica, dentre as que tiverem habilitao tcnica relacionada com a natureza do exame. (Redao dada pela Lei n 11.690, de 2008) 2o Os peritos no oficiais prestaro o compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo. (Redao dada pela Lei n 11.690, de 2008) 3o Sero facultadas ao Ministrio Pblico, ao assistente de acusao, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulao de quesitos e indicao de assistente tcnico. (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) 4o O assistente tcnico atuar a partir de sua admisso pelo juiz e aps a concluso dos exames e elaborao do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta deciso. (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) 5o Durante o curso do processo judicial, permitido s partes, quanto percia: (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) I requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimao e os quesitos ou questes a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedncia mnima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar; (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) II indicar assistentes tcnicos que podero apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audincia. (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) 6o Havendo requerimento das partes, o material probatrio que serviu de base percia ser disponibilizado no ambiente do rgo oficial, que manter sempre sua guarda, e na presena de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossvel a sua conservao. (Includo pela Lei n 11.690, de 2008) 7o Tratando-se de percia complexa que abranja mais de uma rea de conhecimento especializado, poder-se- designar a atuao de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente tcnico. (Includo pela Lei n 11.690, de 2008)

Complementando tal raciocnio, Dorea (2006) explica que a percia formalizada por meio de um laudo pericial, uma exposio minuciosa dos fatos observados pelos peritos e de suas concluses. Este laudo tem um valor inegvel,

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pois se constitui em uma prova tcnica indispensvel para a livre convico do magistrado. Aps sua apreciao, o juiz ter total liberdade para aceit-lo ou rejeitlo, em parte ou no todo, conforme art. 182 do Cdigo de Processo Penal, sendo necessrio, no entanto, que justifique as razes pelas quais no seguiu o parecer dos peritos. O perito no funcionrio do Ministrio Pblico, nem advogado de defesa. Quanto a sua funo, Gomes (2004, p. 29) preceitua que:O perito no defende nem acusa. Sua funo limita-se a verificar o fato, indicando a causa que o motivou. No exerccio de sua alta misso, pode preceder a todas as indagaes que julgar necessrias, devendo consignar, com imparcialidade exemplar, todas as circunstncias, sejam ou no favorveis ao acusado. Expondo sua opinio especfica, o perito age livremente, senhor da sua vontade, das suas convices, no podendo ser coagido por ningum, nem pelo juiz, nem pela prpria polcia, no sentido de chegar a concluso preestabelecidas. Caso sinta-se pressionado e sem liberdade para realizar de modo adequado o exame, o perito deve recusar-se a faz-lo, mesmo que sua recusa o exponha a possveis e injustas sanes administrativas.

Para Gomes (2004), embora o perito tenha f pblica, a fiscalizao dessa percia muito bem-vinda. Como se trata de um ser humano, o perito passvel de erro, que poder ser evitado por meio de medidas acauteladoras que impeam falhas de qualquer natureza. Com isso, o processo penal sugere que haja dois peritos, um perito relator e outro revisor do laudo (art. 159 do Cdigo de Processo Penal), funcionando, assim, como uma confirmao do laudo. Continuando com tal raciocnio, Gomes (2004, p. 30) ainda aduz, no caso de divergncia entre os peritos, que:Na hiptese de haver divergncia entre os dois peritos, cada qual far seu laudo e ambos sero submetidos autoridade que solicitar a percia. Esta, aps a leitura de ambos, poder designar um terceiro perito, oficial ou no, ao qual encaminhar os laudos discrepantes. Na eventualidade de ser estabelecida terceira posio diferente das precedentes, a autoridade poder determinar a realizao de um novo exame, desconsiderando o que j tiver sido feito.

Quando determinado crime deixar algum tipo de vestgio, o exame de corpo de delito ter que ser realizado. Esse exame uma modalidade de percia voltada para a captao de vestgios deixados pelo crime, podendo ser direto ou indireto. Sobre esse assunto Nogueira (2000, p. 198) explica que:

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Pode ser direto, se depende de inspeo ocular sobre os elementos sensveis que permaneceram atestando a prtica delituosa, ou indireto, quando se forma por depoimentos testemunhais acerca da materialidade do fato e de suas circunstncias.

Nogueira (2000) ainda mostra que no processo penal todas as provas tm valor relativo, inclusive a prova pericial, devendo, assim, o magistrado, examin-las em conjunto e no separadamente. Para Tocchetto (2006), quando um crime praticado por arma de fogo, a balstica um importante meio de prova, visto que estuda detalhadamente no s os mecanismos da arma de fogo, mas tambm os efeitos do tiro, direo e trajeto dos projteis. Com o exame de balstica, vrios problemas jurdicos podero ser solucionados, como se a leso foi mortal (produzida em vida) ou ps-mortal (delito impossvel); a natureza do fato (suicdio, homicdio ou acidente); a identificao da arma de fogo e a distncia e direo do tiro, todos esses visando autoria do disparo. So vrios os tipos de crimes em que a arma de fogo poder ser empregada, como por exemplo, no homicdio, latrocnio, leso corporal e outros. Assim, pode-se dizer que a Balstica Forense anda lado a lado com a justia, pois seus mtodos e tcnicas permitiro identificar o verdadeiro autor daquele disparo, fornecendo subsdios para que a justia condene ou absolva determinado acusado.

3.2 IDENTIFICAO DO ATIRADOR PELOS RESDUOS DO TIRO

Gomes (2004) revela que quando ocorre um disparo, o atirador recebe parte da descarga dos gases que escapa da cmara de combusto por pequenas fendas, variando de uma arma para outra. O principal ponto de fuga desses gases, no caso das pistolas, ser pela janela de ejeo e a culatra. J nos revlveres, o ponto ser entre o tambor e a antecmara do cano. Nos cartuchos em que se utiliza chumbo nu, ou seja, somente chumbo, podero ser projetadas, atravs dos gases, partculas desse metal sobre a pele do atirador. A regio das mos mais atingidas pelo esfumaamento ser a regio radial e dorsal do indicador e entre o dedo indicador e o polegar. Aqui, o autor destaca o caso de suicdio, em que tero que ser examinadas as duas mos da vtima, pois h casos em que a vtima produz o disparo com os dois polegares no gatilho, fazendo com que os resduos do tiro se propaguem pelas duas mos. Vale ainda ressaltar que preciso no confundir esse tipo de impregnao com o decorrente de luta da vtima contra o agressor pela

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posse da arma, pois durante essa luta, ocorrendo um disparo, os resduos iro se propagar tanto pelas mos da vtima quanto do agressor. (Figura 3.1)

Figura 3.1: Momento exato de um disparo por arma de fogo Fonte: ARMAS..., 2009.

Sobre as principais formas de se colher material para a pesquisa dos resduos, Gomes (2004, p. 206) descreve que:Uma precria e consiste em esfregar um algodo limpo ou leno de papel sobre a regio suspeita. Outra o processo de Iturrioz, conhecido tambm como prova da parafina. Esta prova consiste em fundir uma quantidade adequada de parafina limpa em gua quente e utiliz-la assim que comear a se solidificar para fazer moldes das regies suspeitas da mo do suposto atirador. O operador deve utilizar luvas limpas para evitar contaminao da parafina. Uma vez feitos os moldes, eles devem ser tornados planos enquanto a parafina no endurece muito e colocados em envelopes lacrados e identificados. As peas de parafina devem ser examinadas em microscpio para localizao de pontos suspeitos sobre os quais se pinga o reagente de Lunge (soluo de difenilamina em cido sulfrico). A reao tem por finalidade revelar agentes oxidantes, no caso os nitratos provenientes da queima da escorva e da carga propelente. Quando positiva, produz uma cor azulada que dura pouco tempo e no pode ser repetida. A adio do reagente e a observao devem ser feitas em exames microscpios de pequeno a mdio aumento.

A respeito desse meio de prova, Gomes (2004) preconiza seu abandono por no haver uma especificidade para a plvora, podendo resultar em falsos positivos ou falsos negativos. A reao poder dar resultados positivos naqueles que fizeram uso de arma de fogo (atiraram) nos trs a cinco dias anteriores ao exame. Ressalta ainda o autor que nesse tipo de exame no se pode provar que o acusado deu o tiro fatal. Com isso, orienta o autor que, ao invs de se utilizar o reativo de Lunger, deve-se optar pelo rodizonato de sdio para se pesquisar resduos de

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chumbo, que podem provir tanto do projtil, quanto da mistura que forma a escorva (cpsula). Ressalta o autor que, aqui, a especificidade para o chumbo. Seguindo tal raciocnio, Frana (2008, p. 105) conta que:Durante o I Seminrio Nacional de Balstica Forense, realizado de 20 a 25 de outubro de 1996, na cidade de Porto Alegre, tendo-se levado em conta os novos fundamentos tcnicos aplicveis balstica forense e considerando-se: I) que os chamados exames de recenticidade do tiro no se revestem de idoneidade, por no definirem data nem perodo provvel de tiro de arma de fogo; lI) a especificidade dos reagentes disponveis, a no garantia de que as espcies qumicas liberadas da munio durante o tiro se depositam na mo do atirador, assim como a comprovada ineficincia dos meios disponveis das pr-faladas espcies e as suas origens, no se podem valorar estes exames sob critrios tcnico-cientficos irrefragveis; IlI) que os exames de resduos de tiro nas armas de fogo e nas mos, vestes e objetos de suspeitos podem ser feitos pelo uso das tcnicas de rodizonato de sdio, absoro atmica e, de preferncia, por microscpio eletrnico de varredura, devendo ser excluda, definitivamente, a prova de parafina (difenilamina sulfrica); IV) que a presena ou ausncia de resduos compatveis com os provenientes do tiro, na mo do suspeito, no pode ser usada como nico elemento de vinculao com a ocorrncia, no devendo ser utilizada para diagnstico diferencial entre suicdio e homicdio; V) que a determinao da distncia de tiro, tendo em vista a diversidade de configuraes de canos e acessrios produtores de distintas configuraes morfolgicas de residuogramas, no poder ser realizada se no se utilizar da mesma arma e de munio com a mesma especificidade das utilizadas no fato gerador de exame: Recomendaram-se: a) que os exames mencionados no item I sejam considerados obsoletos; b) que os exames referidos nos itens III e IV sejam realizados conforme proposto, devendo as autoridades competentes providenciar a qualificao dos profissionais e fornecer os equipamentos necessrios para a realizao de tais exames; e c) que o contido no item V deva ser considerado apenas de orientao.

3.3 A IDENTIFICAO DA ARMA DE FOGO PELOS COMPONENTES DA MUNIO

Quando em um determinado local de crime no se possa encontrar a arma de fogo utilizada, tampouco apreend-la com o suspeito, ainda assim ser possvel fazer uma determinao genrica do seu tipo, com base no recolhimento dos projteis do corpo da vtima ou de estojos e projteis deixados na cena do crime. Para Fvero (1991), quando se recolhe projteis do corpo da vtima, pode-se chegar, de imediato, no s ao calibre da arma, mas ao conhecimento acerca de se houve o uso de mais de um tipo de arma de fogo no crime, bastando,

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para isso, encontrar projteis de diferentes calibres ou composies. De posse do projtil recolhido, os peritos iro examinar, sempre verificando e catalogando, seu peso, composio, raiamento, deformaes, estriaes laterais finas e formato. A composio ir mostrar o material do qual o projtil foi constitudo, chumbo nu, encamisado ou cobre, por exemplo. Isso servir para que os peritos verifiquem a possibilidade de existncia de mais de uma arma de fogo utilizada no crime, pois, podero deparar com vrios projteis de mesmo calibre, mas de composies diferentes. J o raiamento ir demonstrar para os peritos o sentido de rotao daquela estria, permitindo-lhes realizar uma correspondncia com a arma suspeita (arma incriminada). A individualizao da arma s ocorre quando se analisa de forma microscpica as estriaes finas deixadas pelos cheios da raiao no corpo do projtil e suas deformaes. Fvero (1991, p. 308), explica que a estriao lateral fina: produzida pelas salincias e reentrncias que a alma do cano apresenta e passveis de serem moldadas nas faces laterais do projtil, ao passar, este forado pelo interior do cano onde receber tambm as raias.

Segundo Gomes (2004), para que se possa identificar a arma da qual saiu quele projtil, primeiramente ser necessrio que o perito criminal tenha posse tanto da arma de fogo utilizada no crime (arma incriminada), quanto do projtil encontrado no local de crime ou no corpo da vtima (projtil incriminado). Assim, o perito ir realizar vrios disparos com a arma incriminada, com cartuchos idnticos aos do projtil recolhido. Aps esses disparos (tiros de prova), recolhem-se os projteis disparados com a arma incriminada e, um a um, so comparados com o projtil incriminado, verificando-se a estriao fina deixada pelos cheios da raiao no corpo do projtil recolhido com a dos projteis disparados pela arma suspeita. Essa comparao feita por meio de um microscpio comparador, equipamento que visualiza e compara as ranhuras de um estojo padro, por exemplo, com o incriminado, afirmando, em caso de coincidncia, que o estojo incriminado saiu daquela arma em exame. (Figura 3.2)

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Figura 3.2: Exame de microcomparao Fonte: ARMAS..., 2009.

Fvero (1991) explica que o amassado deixado pelo pino percutor (co da arma) na espoleta tambm servir para micro comparao, logicamente quando se dispuser de estojos recolhidos no local do crime. Ressalta ainda o autor que o estojo tambm servir para exame de micro comparao, visto que quando ocorre um disparo, a base do estojo bate violentamente na culatra da arma, fazendo gravaes de seus relevos, que podero tambm ser examinados ao microscpio. Para Tocchetto (2006), nos cartuchos de fogo circular, em que o calibre mais utilizado o .22, por no serem providos de espoleta ou cpsula de espoletamento, a marca de percusso estar sempre na periferia da base do culote, razo pela qual denominada de marca de percusso radial ou perifrica. Assim, as microestrias podero aparecer somente na marca da percusso, ou na base do culote. Para os cartuchos de fogo central, por possurem espoleta, os elementos usados no exame microcomparativo podem estar presentes tanto no fundo da marca da percusso, como na superfcie externa da espoleta, produzidos pelo impacto daquele contra a superfcie da culatra. Nos estojos provenientes de armas automticas e semiautomticas, Garcia (2000) informa que, alm dos elementos j expostos acima, pode-se utilizar, para a identificao individual da arma, as marcas do extrator e do ejetor no culote dos estojos. No momento do disparo, nesse tipo de arma, o estojo violentamente descartado pela janela de ejeo da arma e um novo cartucho reposto. Isso faz com que o extrator e o ejetor deixem suas marcas no estojo, que poder ser examinado.

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4 A JUSTIA E A BALSTICA FORENSE NO ESTADO DO CEAR

Neste quarto captulo, descreve-se o contedo e a formalidade de um laudo pericial de Balstica forense para, com isso, verif