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1 A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM SOB UMA PERSPECTIVA DIALÉTICA: POR UMA NOVA PRÁTICA DO PROFESSOR DAS SÉRIES FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL. Vicente Moreira da Silva 1 Resumo: Este artigo pretende discutir a avaliação do aproveitamento escolar como um dos grandes desafios no processo de ensino e aprendizagem, pois os resultados que se depara constantemente no interior das escolas públicas, principalmente nas séries finais do Ensino Fundamental, demonstram que a concepção de avaliação pela maioria dos docentes, ainda é a abordagem tradicional, em que se faz somente um juízo de valor e não um juízo de qualidade da aprendizagem do aluno e do trabalho do professor em sala de aula. Fundamentada na concepção pedagógica histórico-crítica, o texto possibilita a reflexão da necessidade de uma nova prática pedagógica em torno do processo avaliativo. Palavras-chaves: avaliação. dialética. ensino. escola. fundamental. Resumen: Este artículo se prepone discutir la evaluación del referente a la explotación de la escuela como uno de los grandes desafíos en curso de educación y el aprender, por lo tanto los resultados que si están parecidos constantemente dentro de las escuelas públicas, principalmente en la serie final de Ensino básico, demuestran que el concepto de la evaluación para la mayoría de los profesores, sigue siendo el subir tradicional, donde si hace solamente un juicio del valor y no un juicio de la calidad de aprender de la pupila y del trabajo del profesor en sala de clase. De acuerdo con el concepto pedagógico descripción-crítico, el texto hace posible la reflexión de la nueva necesidad práctica de pedagógica alrededor del proceso del avaliativo Palabra-llaves: evaluación. dialéctico. educación. escuela. Básico. 1 Professor pedagogo – Graduado em Pedagogia pela Faculdade de Ciências e Letras de Jandaia do Sul, com especialização em Educação Infantil, Pré-escola e Séries Iniciais do Ensino Fundamental, pela Faculdade de Ciências e Letras de Campo Mourão. Professor PDE _ SEED/PR: 2008/2009 E-mail: [email protected]

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A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM SOB UMA PERSPECTIVA DIALÉTICA: POR UMA NOVA PRÁTICA DO PROFESSOR DAS SÉRIES FINAIS DO ENSINO

FUNDAMENTAL.

Vicente Moreira da Silva1 Resumo: Este artigo pretende discutir a avaliação do aproveitamento escolar como um dos grandes desafios no processo de ensino e aprendizagem, pois os resultados que se depara constantemente no interior das escolas públicas, principalmente nas séries finais do Ensino Fundamental, demonstram que a concepção de avaliação pela maioria dos docentes, ainda é a abordagem tradicional, em que se faz somente um juízo de valor e não um juízo de qualidade da aprendizagem do aluno e do trabalho do professor em sala de aula. Fundamentada na concepção pedagógica histórico-crítica, o texto possibilita a reflexão da necessidade de uma nova prática pedagógica em torno do processo avaliativo. Palavras-chaves: avaliação. dialética. ensino. escola. fundamental. Resumen: Este artículo se prepone discutir la evaluación del referente a la explotación de la escuela como uno de los grandes desafíos en curso de educación y el aprender, por lo tanto los resultados que si están parecidos constantemente dentro de las escuelas públicas, principalmente en la serie final de Ensino básico, demuestran que el concepto de la evaluación para la mayoría de los profesores, sigue siendo el subir tradicional, donde si hace solamente un juicio del valor y no un juicio de la calidad de aprender de la pupila y del trabajo del profesor en sala de clase. De acuerdo con el concepto pedagógico descripción-crítico, el texto hace posible la reflexión de la nueva necesidad práctica de pedagógica alrededor del proceso del avaliativo Palabra-llaves: evaluación. dialéctico. educación. escuela. Básico.

1 Professor pedagogo – Graduado em Pedagogia pela Faculdade de Ciências e Letras de Jandaia do Sul, com especialização em Educação Infantil, Pré-escola e Séries Iniciais do Ensino Fundamental, pela Faculdade de Ciências e Letras de Campo Mourão. Professor PDE _ SEED/PR: 2008/2009 E-mail: [email protected]

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I. Concepção dialética da avaliação da aprendizagem: primeiras reflexões.

É possível a mudança da concepção de avaliação do professor das

séries Finais do Ensino Fundamental? Inicia-se a discussão desse texto a partir

desse questionamento.

Durante muito tempo, a escola teve como princípio norteador de seu

trabalho educativo a reprodução, memorização, classificação e exclusão do acesso

ao conhecimento. Via-se nitidamente a clara separação entre os que “podiam” e

“não podiam”, aqueles que deveriam avançar e uma grande massa que deveria ficar

aquém do processo educativo, aceitando passivamente sua condição de alienação

ao sistema educativo, econômico e político-social2.

Nesse contexto, poderia perguntar ao leitor, a partir de

questionamentos já levantados nas discussões suscitadas sobre essa temática: o

sistema capitalista atual permite a inserção de todos os indivíduos nos vários

campos sociais? Não seria utopia declarar esse princípio de igualdade, numa

saciedade desigual como a que vivemos? Ora, penso que o sentido crucial dessa

discussão não seria o fato de todos terem acesso a tudo, mas de entender que a

partir de uma situação vivida, experenciada e concretizada socialmente e

economicamente pelo indivíduo, este seja capaz de estabelecer a luta pela

transformação de sua condição social.

Não se pretende aqui abordar questões sociais, já que esse não é o

foco desse texto, mas de se fazer entender que o norte da pedagogia Histórico-

crítica é justamente a luta de classes, a possibilidade de transformar a realidade a

partir do concreto, o conceito de “práxis”, base da teoria marxista.

A partir das idéias acima evidenciadas, poder-se-ia então pairar a

dúvida do que isso tenha a ver com a avaliação da aprendizagem. Quando falamos

em perspectiva dialética, supomos o entendimento de que o termo se relaciona à

mudança, ao movimento, a antagonismos e à transformação. Dialética, no sentido

próprio da palavra, significa a arte de argumentar ou discutir, maneira de filosofar

2 Para se aprofundar nessa discussão, sugiro a leitura do caderno temático, produzido como material didático do PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional – pág. 12-19, disponível no site http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br

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que procura a verdade por meio de oposição e conciliação de contradições (lógicas

ou históricas).

Quando falamos em avaliação, qual seria o seu sentido no processo de

ensino-aprendizagem? Somente detectar uma realidade ou conhecer a realidade

para transformá-la? Seria avaliar para constatar ou avaliar para intervir?

Penso que alguns argumentos podem por si só, provocar algumas

reflexões. Conforme enfatiza Mello (1974, p. 347):

[...] É profundamente ridículo para não dizer inconsciente, grotesco e criminoso, o procedimento de alguns pseudoprofessores que se jactam de reprovar em massa. Seria o caso do cirurgião que se vangloriasse de ter um alto índice de mortalidade nas intervenções cirúrgicas que realizasse, ou do engenheiro que se gabasse do desmoronamento dos prédios que construísse.

O que se percebe, é que além de uma concepção de avaliação, que se

traduz numa visão tipicamente tradicional, por uma grande maioria dos professores

da escola pública, há também uma concepção de ensino, de aprendizagem, de

método, de educação, de homem, de sociedade e de mundo que acabam por

configurar-se nesse “modelo” vigente3 de avaliação e de aprendizagem que permeia

o trabalho pedagógico em sala de aula.

Discutir os resultados alcançados a partir da proposta e perspectiva de

trabalho em sala de aula é, em si, evidenciar não somente os resultados, mas

também o processo que se chegou a esses resultados; que tanto são questionados,

analisados e acabam por transformar-se num “jogo do empurra-empurra”. E quando

se brinca de jogar a “batata-quente” nas mãos do outro, não se quer isentar de

responsabilidade coletiva. Quando falamos de resultados negativos, não podemos

responsabilizar o aluno, a família, o sistema, o governo, como muitos o fazem, sem

fazer uma leitura crítica do processo. Mas se trata de que a partir desses resultados,

se possa também estabelecer o principio dialético do movimento, do antagonismo,

de se fazer perceber também o professor, como sujeito de sua prática.

Os resultados alcançados na educação, nos últimos tempos, tem sido

satisfatórios e se estes fazem com que o professor se sinta realizado por sua prática

de sala de aula? É bem provável que alguns tentariam justificar, dizendo, por

3 Quando aqui me refiro á palavra modelo, não tenho a intenção de me fazer entender que há uma receita pronta, algo eficaz que se possa aplicar em sala de aula, pelo professor; mas que resulte numa reflexão, numa visão dialógica de novas perspectivas do trabalho educativo e, sobretudo, avaliativo.

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exemplo, que a reprovação, a não-aprendizagem de alguns alunos, ou de muitos

que seja, seria natural, visto que o ser humano tem que ser considerado em sua

heterogeneidade e não em sua homogeneidade. É claro que as diferenças em sala

de aula são perceptíveis e que a incompletude do ser humano se faz em sua

essência, como condição humana. Percebamos a seguinte situação, corriqueira de

nossos dias: se temos em nossa casa dois filhos, um que já tenha dominado

completamente todos os movimentos necessários pra se locomover. Enfim, consiga

andar. E outro que ainda esteja em processo de entendimento de correção de

postura e de movimento. Qual destes precisará mais de acompanhamento no

sentido próprio de sua necessidade? É uma resposta óbvia, não? Certamente,

praticamente todos colocariam que o segundo seria o que mais precisaria de apoio,

de acompanhamento e de intervenção no seu processo de desenvolvimento.

Nessa perspectiva analógica, se colocássemos a situação de que, em

sala de aula, tendo em vista a heterogeneidade dos alunos, uns consigam aprender

e outros tenham maior dificuldade, ou ainda em relação á realidade de turmas

diferentes, em que uma seja mais receptiva, comportada, com maiores condições de

acesso ao conhecimento, porque vivenciam isso em sua realidade familiar e outra

que seja uma sala problemática, com alunos indisciplinados, com problemas

familiares e dificuldades de aprendizagem. Qual destes/destas precisariam

certamente, de nossa intervenção, acompanhamento e um “novo olhar”?

Não se tem a pretensão de levantar questionamentos de que há uma

indiferença por parte dos docentes perante essa situação. Ao contrário. Há, sim,

uma mobilização presente em algumas escolas em se fazer algo pelos excluídos;

não pensando na exclusão em termos de condições especiais, mas na exclusão que

se quer pensar, também, social e principalmente educativa, de condições de

aprendizagem. Num certo sentido, como enfatiza Hoffmann (2005, p. 18), os

professores não são “culpados” pelos resultados obtidos pelos alunos, mas são sim,

“responsáveis”.

Por outro lado, quando em sua prática, o professor internaliza algumas

concepções includentes em relação ao trabalho pedagógico, pensando

constantemente sobre o seu “fazer” em sala de aula, percebendo o aluno como um

agente ativo do processo educativo, quando se tem a concepção de não deixar “o

aluno passar pela escola, sem que a escola passe por ele” penso que, conforme,

enfatiza Hoffmann, apud Demo (2004, p.79):

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“(...) os professores não podem ser “saco de pancadas” como se fossem os vilões da história. Muito ao contrário, primeiro são vítimas desse sistema perverso, e, segundo, são figuras-chave da cidadania popular e esta tem como uma de suas perspectivas mais essenciais mudar a sociedade em que vivemos”.

O trabalho realizado na maioria das escolas públicas vem no sentido

de atender a essas expectativas: de não permitir as arbritariedades que deixaram

marcas em nós, professores, quando alunos. Basta voltarmos ao tempo e

pensarmos de como se constituiu nossa trajetória escolar e vamos encontrar

marcas, muitas vezes, indeléveis, que carregamos conosco até hoje, principalmente

no sentido da avaliação.

Quando abrimos caminhos para a discussão em torno da reprovação,

estamos de certa, forma entendendo o processo avaliativo em sua essência: o

aproveitamento escolar. Há a visão de que o bom professor é aquele que reprova;

que impõe medo; que tem em seus resultados, que sejam bimestrais ou não, a

maior parte dos alunos abaixo de uma média estipulada pelo sistema. Essa é uma

concepção de ensino e de aprendizagem totalmente equivocada. Como diz Demo4,

“o bom professor é aquele que faz com que o aluno aprenda, tenha sucesso e se

desenvolva em sala de aula”. Poder-se-ia afirmar aqui, então, que o fracasso do

aluno, é também o fracasso do professor.

Analisando-se à ótica dos problemas que encontramos em sala de

aula, muitos afirmariam que essa seria uma visão utópica de educação, pois os

alunos de hoje, não se interessam, não tem responsabilidade, não querem aprender,

não “fazem nada” em sala de aula. Poderia então se pensar de que deveríamos

ressignificar o sentido de ser educador, de ser professor. Isso se constitui como um

eixo norteador do trabalho pedagógico.

Por outro lado, simplesmente não se pretende isentar a

responsabilidade do indivíduo, enquanto aluno e nem tampouco, eximir de

responsabilidades outros segmentos tão responsáveis pela educação quanto o

sistema escolar, em si; mas de repensar, a partir das idéias aqui apresentadas, o

sentido da avaliação no processo ensino-aprendizagem, como educadores e

partícipes do processo educativo.

4 O livro: “Ser professor é cuidar que o aluno aprenda”, de Pedro Demo, Editora Mediação, 2005; traz uma discussão pertinente ao que aqui é tratado.

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II. A avaliação como intervenção na prática pedagógica do professor das

séries finais do Ensino Fundamental.

Pensando nos resultados atingidos pela educação, nos últimos

tempos, analisa-se que deveríamos refletir um pouco mais sobre a prática

pedagógica concretizada na escola pública. Demo (2005, p. 6), especifica que por

volta de um terço dos alunos do Ensino Fundamental não completa a 8ª. Série e os

que a completam, aprendem muito pouco. E continua: “segundo dados da UNESCO

de 2003, grande parte dos alunos da 8ª. Série não entende o que lê. A rigor,

continuam analfabetos”.

Hoffmann (2005, p. 77), enfatiza que a última pesquisa feita pela

Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que

avaliou 41 países, surpreendeu gestores, educadores e toda a sociedade, com a

posição do Brasil nos últimos lugares do ranking final, atrás de países muito pobres

como a Tunísia e a Indonésia. Na tabela apresentada sobre a posição do Brasil no

PISA (instrumento de avaliação Internacional sobre indicadores de qualidade da

Educação Básica), mostra o Brasil em 40º. Lugar em Matemática, 37º. Lugar em

Leitura e 39º. Lugar em Ciências.

Partindo dessa constatação, voltamos a elencar os motivos que levam

muitos educadores a defenderam o mau rendimento do aluno, por meio da

“Pedagogia da justificativa do fracasso escolar” (grifo nosso):

1ª. proposição: “O mau rendimento, uma avaliação abaixo da

média, no bimestre, por exemplo - serve como forma a fazê-lo

despertar a motivação. Sabendo que está indo mal, este terá que

se esforçar mais”;

2ª. proposição: “Precisa reprová-lo, já que ele não tem condições

nenhuma de acompanhar a série seguinte”

3ª. proposição: “faltou base pra série em que o aluno está. Não

dominou conteúdos essenciais da série anterior”. (Como enfatiza

Vasconcelos, 2005, p. 61: a “síndrome da falta de base”).

4ª. proposição: “sempre foi empurrado. Ano a ano passa só pelo

conselho de classe”.

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Essa é uma visão bastante presente na concepção pedagógica de

muitos docentes, seja pela deficiência de uma formação pedagógica mais ampla em

suas licenciaturas, seja pelo fato de uma opção pessoal e profissional de que se

aprovar todos os alunos, demanda-se a idéia de má qualidade de ensino. Ora, se

pensarmos por essa perspectiva, iríamos também afirmar que quando o médico

detecta uma doença em um paciente, este deveria fazê-lo sofrer primeiramente,

sentir dores, aflições, para depois curá-lo, como princípio de que esta atitude, por si

só, o ajudaria a não ficar mais doente e a se cuidar.

Assim, pensamos: o mau rendimento incentiva a melhora ou estimula o

fracasso? Poderíamos pensar nos antagonismos presentes nessa situação, pois

alguns afirmariam veentemente que ajudaria sim, porque, de certa forma, se

aprende muito com o sofrimento e o fracasso. Seria esta, então uma visão futurista

de ensino e de aprendizagem frente aos dias atuais ou uma volta aos tempos mais

primórdios das civilizações, em que os aspectos presentes no processo

educativo/avaliativo/formativo do aluno se concretizavam por meio do medo, do

sofrimento, da dor, do fracasso e da exclusão?

Vasconcelos5, diz que a reprovação, o mau rendimento do aluno não é

resultado, é processo. Entendamos melhor a questão. Vamos pensar no que se

configura o termo processo. Como princípio etimológico da palavra em si, processo

significa método; sistema, adotar novas formas de ensino, seqüência contínua de

fatos que apresentam certa unidade, ou que se reproduzem com certa regularidade;

andamento, desenvolvimento. Também assim, deve ser vista a avaliação em sala de

aula. Como ela é percebida pelo docente? Como resultado final (simplesmente

porque temos que apresentar um conceito numérico ao final de um período à

secretaria escolar para registro no histórico do aluno) ou como processo

(conseqüência de um trabalho de ensino e possivelmente, de aprendizagem, de um

trabalho realizado em sala de aula).

Verificando-se a média alcançada pelo aluno pelo primeiro ponto de

vista, estaremos sendo educadores meros reprodutores da lógica capitalista. No

entanto, se vermos pela ótica do segundo ponto, podemos então pensar elucidando

as idéias evidenciadas por Luckesi (1998, p. 85) de que “(...) a avaliação subsidia

5 Como possibilidade de aprofundamento dessa discussão, sugere-se a leitura do Capítulo 2: conteúdo e forma da avaliação do livro: Avaliação da Aprendizagem: práticas de mudança – por uma práxis transformadora, 7ª edição, 2005.

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decisões a respeito da aprendizagem dos educandos, tendo em vista garantir a

qualidade do resultado que estamos construindo”. Nesse sentido, podemos perceber

a avaliação não simplesmente como o alcance de um resultado final, mas desta

como uma forma de intervenção a partir de uma realidade conhecida e vivida em

sala de aula na relação aluno x professor.

A avaliação como intervenção, creio garantir a essência das

discussões aqui apresentadas até então. Se pensarmos a partir dessa perspectiva,

estaremos entendendo também o sentido crucial desta no processo educativo. O

que se percebe é que há uma dicotomia de concepção entre avaliar e medir. Se

pretendermos avançar nessa discussão, não podemos deixar entremeada a idéia

subjacente de que não há um sentido claro entre os dois termos.

Quando pensamos em Avaliação, podemos entender o sentido próprio

da palavra entre aval-i-ação. Aqui fica claro que quando pretendemos dar o aval a

alguém sobre alguma coisa, isso significa que estamos dando autonomia e

possibilidade de avanço, de seguir em frente a partir de uma condição apresentada.

Por outro lado, se esse aval se constitui como uma possibilidade de retenção a partir

da “falta de base”, de dificuldades, de não-assimilação do conhecimento, então

temos que pensar primeiramente, de como se efetivará a nossa ação (intervenção)

sobre a realidade detectada. Isso se configura num processo dialético de ensino-

aprendizagem. E podemos ir além desse conceito, estabelecendo a partir da prática

pedagógica do professor, uma auto-análise/auto-avaliação entre o resultado e o

fazer, o produto final e o processo, entre o ensino e a aprendizagem.

Partindo da análise desses fatores, estabelecemos um princípio de

assimilação e reflexão sobre o fazer pedagógico em sala de aula. Podemos assim,

partir do entendimento do que seja ensinar e do que significa aprender. Numa

relação dialógica, entendemos que, conforme a concepção freireana sobre o

trabalho do professor no processo formativo do aluno, ao mesmo tempo em que

ensinamos, também aprendemos. No entanto, se direcionarmos à prática de sala de

aula, fica a seguinte indagação. Quando não houve aprendizagem, podemos afirmar

que houve ensino?

Analisemos a seguinte situação: se ao aplicarmos uma avaliação em

uma turma e percebermos que a maioria dos alunos obteve um resultado

insatisfatório, então de que forma será a nossa intervenção? Ou permaneceremos

apenas ao nível da constatação? Se pensarmos no sentido da avaliação como

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medida, logicamente a segunda indagação é a mais pertinente, pois medir é mostrar

aquilo de que se é capaz, estar em condições ou simplesmente relacionar-se ao

princípio da quantidade (aspecto quantitativo da avaliação). Nesse sentido questiono

ao leitor, valendo-se do pensamento de Luckesi (1998, p.85): verificação ou

avaliação: o que pratica a escola? É uma pergunta que necessita de uma resposta e

que esta demanda a formação de uma concepção que venha de encontro a todos os

questionamentos apresentados até então.

A prática pedagógica escolar se efetiva numa concepção autoritária, de

poder, de massificação, de exclusão ou numa prática libertadora, transformadora,

resultante de possibilidades de avanços e melhorias no decorrer do trabalho

educativo?

Como já tratado anteriormente, se pensarmos em avaliação, ninguém

se sente à vontade para ser avaliado. Pensamos em nossa própria condição de

professor: nos momentos em que percebemos a avaliação presente em situações de

nosso dia-a-dia, nos sentimos desconfortáveis e ansiosos6: os concursos públicos, o

momento de falar num grande grupo, entre nossos pares. Isso se manifesta

justamente pelo fato de que se estamos sendo submetidos ao processo de provação

a alguém de que sabemos, de que podemos, de que somos capazes; a situação

gera angústia, medo, insegurança, aflição, de sujeição ao outro que nos impregna

com seu olhar que seja de aprovação ou de reprovação. Se nos sentimos assim,

também não se diferencia, em grande parte, em relação aos nossos alunos em sala

de aula.

Entender o princípio dialético da avaliação da aprendizagem, nas

séries finais do Ensino Fundamental é entender o princípio da ação-reflexão, onde,

conforme enfatiza Vasconcelos (2005, p. 14-17), de que assumir uma posição

dialética pressupõe entender um sujeito concreto, síntese de múltiplas relações, num

contexto também concreto. O mesmo autor ainda coloca que devemos sim, pensar

em novas possibilidades de trabalho pedagógico em torno do processo avaliativo,

porque segundo ele, se o sujeito acha que as coisas não podem mudar, não tem

sentido falar em avaliação, uma vez que esta – na sua acepção mais original _ está

intrinsecamente ligada à mudança.

6 Do ponto de vista educacional, Demo afirma em seu livro “Ser professor é cuidar que o aluno aprenda”, 2005, Editora Mediação, p. 57-58, de que toda avaliação é sempre injusta, incômoda, incompleta, ideológica, autoritária, excludente, humilhante e insidiosa.

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Mais uma vez, enfatiza-se a idéia da avaliação como reflexão e como

intervenção, tendo o intuito de descobrir as deficiências do processo educativo, no

sentido de resolvê-los, conforme enfatiza Vasconcelos (2005, p.19). E Luckesi

(1998, p. 132), também vem afirmar essa concepção quando diz:

“(...) é preciso que o conhecimento adquirido seja iluminativo da realidade, é preciso que ele revele os objetos como são em seus contornos, em suas conexões objetivas e necessárias. Só assim, teremos conhecimento. Um aluno que não conseguiu “entender” bem o conteúdo de uma disciplina não a aprendeu e, por isso mesmo, o conteúdo oferecido não lhe serviu de apoio para seu desenvolvimento. Quando um professor diz ao aluno, que ainda não conseguiu aprender uma lição, _ “se vire por você mesmo” _, não está ajudando em nada o desenvolvimento do educando, pois a compreensão do conteúdo é o ponto de partida para a criação de habilidades e hábitos por meio da exercitação (...) Do ponto de vista do desenvolvimento do educando “passar por cima de um determinado conteúdo” ou “nada fazer” tem o mesmo resultado no que se refere à aprendizagem (...)”.

Por outro lado, traz-se á tona a seguinte indagação: estabelece-se a

diferença entre avaliar e medir, como já discutido anteriormente? Percebemos as

diferenças entre avaliar e emitir uma opinião? Têm-se o conceito do que seja avaliar,

entendamos então o que seja opinar: julgar, entender; ser de opinião, dizer,

manifestando opinião, dar seu parecer. Então, podemos elucidar que quando

estamos avaliando, estamos emitindo ou não uma opinião, dando um parecer?

Entendo que sim. O que diferencia é que esta opinião, no processo educativo, se

formaliza por meio do uso de instrumentos de avaliação, seja em forma de avaliação

escrita, oral, etc.

Vamos pensar então que quando achamos algo bonito ou feio (seja um

carro, um sapato, uma peça de roupa, uma pessoa, etc.), emitimos uma opinião.

Para que essa opinião seja emitida, é necessário estabelecer critérios (a base que

fundamenta nossa visão sobre alguém ou alguma coisa). Não ficamos a nível do

“achismo” (grifo nosso). Evidenciamos o nosso propósito a partir de uma afirmação

ou de várias afirmações, no sentido de explicar o que pensamos. Assim, a avaliação

acaba se concretizando nessas fases: a percepção do objeto, a subjetividade de

nossa visão e a síntese (conclusão a que chegamos).

Ressalta-se o princípio da subjetividade pelo fato de que os resultados

ou opiniões emitidas sobre algo nunca são definitivas. A partir do momento em que

avaliamos algo inicialmente, temos uma visão e depois, com o alargamento dessa

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percepção, vamos encontrando detalhes antes nunca vistos. Exemplo disso, é

quando conhecemos uma pessoa, emitimos um juízo de valor sobre ela (seja

negativo ou positivo). Com o tempo e a convivência, vamos entendendo melhor a

pessoa e mudando esse juízo de valor para um juízo de qualidade. Aí chegamos a

um conceito mais elaborado, embora nunca totalmente definido; pois podemos viver

muitos anos com uma pessoa, mas jamais a conhecermos totalmente. Quantos

casos de pessoas que são tidas socialmente como idôneas acabam por parar nos

meios de comunicação de massa por feitos jamais imaginados?

Pensando no processo avaliativo, entenderemos certamente o

pensamento de Demo, 2005, p. 39, de que ter muitos anos de estudo não significa,

necessariamente, ser “bem educado”: há analfabetos elegantes e doutores

estúpidos. Essa é uma avaliação que praticamos inconscientemente em nosso dia-

a-dia: avaliamos as pessoas, as coisas, as classes sociais. Enfim, tudo aquilo que

nos rodeia. E emitindo nossa opinião, não significa que estamos deixando de

avaliar, até porque avaliar pressupõe o estabelecimento de critérios. E quando se

estipula esses critérios, é isso que caracteriza simplesmente a avaliação como algo

formal, na forma como é praticada pela escola.

Tomando como exemplo de que sempre estamos emitindo opinião em

sala de aula sobre situações diversas. Imaginemos a seguinte situação de um trecho

do livro: avaliação da aprendizagem – práticas de mudança: por uma práxis

transformadora (Vasconcelos, 2005, p. 35) e que certamente já nos

deparamos/ouvimos em nossa trajetória educativa:

“Tem aluno que aprende de primeira, outros, de segunda; mas tem aluno que não vai nem com reza brava”; “este aluno não vai; eu me recordo do irmão: era a mesma coisa”, etc. “os pais estão se separando, a criança não aprende mesmo...” “Bom professor é aquele que, logo no começo do ano, dando uma olhada na turma, já é capaz de dizer quem vai ser reprovado”.

Certamente, estamos emitindo uma opinião, mas não estamos

deixando de avaliar, formalizando o nosso entendimento, por meio do uso dos

instrumentos avaliativos, de acordo com a disciplina que ensinamos.

Partindo dessas exemplificações, podemos ir amadurecendo a nossa

concepção sobre a avaliação sob uma perspectiva dialética. Quando da elaboração

do material didático referente ao PDE (programa de Desenvolvimento Educacional) -

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SEED/PR (2008, p. 32-34 / 41-42)- foram suscitadas algumas indagações a respeito

dessa concepção no processo educativo. Transcrevo-as a seguir:

“(...) Só é possível a avaliação assumir seu papel de diagnóstico, a

partir do momento em que ela esteja sob uma concepção, preocupada com a

transformação social e não com a perpetuação das desigualdades, ou seja, a

preservação do modelo social vigente.

É necessário questionar que transformar o sentido da avaliação num

processo dialético e diagnóstico não significa o “afrouxamento” da prática do

professor, mas uma retomada e busca de novas possibilidades a partir dos

resultados obtidos ao longo do trabalho na sala de aula.

A partir das reflexões e da busca de novas possibilidades na prática

educativa, almeja-se a mudança de posturas e posicionamentos pedagógicos do

professor das séries finais do Ensino Fundamental em torno da avaliação, fazendo

com que os encaminhamentos favoreçam a tomada de novas decisões que possam

redirecionar o “fazer pedagógico”, “sair do papel” e tornar-se realidade no chão da

escola.

Tendo-se em vista o constante fracasso dos alunos, a avaliação, posta

em prática, numa concepção dialética, acredita-se possibilitar o alcance de

resultados melhores para a educação. Sob um teor essencialmente qualitativo,

certamente promoverá a real aprendizagem e desenvolvimento dos alunos.

Assim, a proposta de avaliação, na concepção apresentada, visa à

solidariedade, ao invés da competição e a inclusão, ao invés da exclusão, tornando-

se uma atitude benéfica ao processo educativo e uma forma de dar maior significado

ao trabalho desenvolvido pelo professor. Vejamos algumas características acerca

dessa concepção de avaliação na perspectiva dialética:

• Se faz como um diagnóstico da situação do aluno, tendo-se em vista

subsidiar a tomada de decisões para a melhoria da qualidade da

aprendizagem;

• É um processo inclusivo, na medida em que não seleciona os

melhores dos piores, mas sim, subsidia a busca de meios pelos quais

todos possam aprender aquilo que é necessário para seu próprio

desenvolvimento;

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• É um “ato amoroso”, pois acolhe o aluno, verificando o que pode ser

feito para o seu crescimento;

• Caracteriza-se num processo dinâmico, de forma que não classifica o

aluno dentro de um nível, mas sim, permita uma tomada de novas

posturas pedagógicas a partir das dificuldades apresentadas durante o

processo de ensino-aprendizagem.

Questionar sobre os objetivos da avaliação escolar, sua função no

processo pedagógico, bem como a leitura a partir dos resultados obtidos por meio

dela, são princípios importantes no entendimento da avaliação como algo

significativo e transformador.

Na perspectiva da classificação, tal como é utilizado, nos desperta para

algumas considerações, que servem de base para reflexões, pois assim organizado,

tem a função exclusiva de:

• Julgar, examinar, averiguar e conseqüentemente, aprovar ou reprovar

o aluno;

• Selecionar, na medida em que excluem os que não sabem no contexto

dos parâmetros considerados “aceitáveis” pelas provas aplicadas;

• Permitir uma avaliação pontual, pois nem sempre o conhecimento

apresentado pelo aluno durante a prova é o mesmo ocorrido durante o

processo de ensino-aprendizagem;

• Firmar um processo estático, pois classifica o aluno num determinado

nível de aprendizagem, considerando esse nível como definitivo. Tanto

assim que normalmente os conceitos são apresentados na forma de

menções numéricas, que por sua vez, classifica o aluno dentro de uma

escala.

A concepção dialética, aqui proposta, vem no sentido, justamente, de

despertar a atenção do leitor ao entendimento da avaliação como processo, de

forma que a mesma seja diagnóstica, detectando problemas na aprendizagem dos

alunos e procurando, solucioná-los. Luckesi (1997, p. 82), afirma que “[...] para que a

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avaliação diagnóstica seja possível, é preciso compreendê-la e realizá-la

comprometida com uma concepção pedagógica. No caso, consideramos que ela

deva estar comprometida com uma proposta pedagógica histórico-crítica [...]”. Daí a

idéia de conciliar o método dialético à concepção dialética de avaliação. È possível?

Certamente àqueles que acreditam em um novo modelo de educação, sim. Basta

comprometimento e abertura à discussão pedagógica, que tantas vezes, tem se

tornado enfadonha aos ditos não-pedagogos.

Abro a essa discussão, certamente pelo fato de que muitos docentes

acabam por criar a idéia de que seu papel é somente ensinar, e não pensar sobre a

aprendizagem e o desenvolvimento de seu aluno, alegando que isso cabe à Equipe

Pedagógica da escola ou propriamente, ao pedagogo da instituição. Paira em

questionamentos e argumentos do professor de que ele ensina. Se o aluno não

aprendeu, problema dele. Indago a partir daí: todo professor deve ter resquícios da

Pedagogia, senão, sua prática pedagógica torna-se inconsistente diante das

necessidades educativas de seus alunos. Ou na pior das situações, o professor até

que domina os conteúdos, domina sua área de conhecimento, “sabe”, mas não

consegue chegar até seu aluno. Resumindo: “sabe, mas não sabe ensinar”.

A partir da leitura desse texto, espera-se a absorção de concepções da

prática pedagógica, diferente da que vivenciamos no chão de nossas escolas

públicas. Não se trata de desmerecer o trabalho do professor, mas de despertar a

reflexões constantes em torno do processo de ensino e aprendizagem.

Assim, entende-se que, conforme especifica Sanmartí, 1993, p. 20-23,

que, se queremos mudar a prática educativa, é necessário mudar a prática da

avaliação, ou seja, mudar sua finalidade e o que e como se avalia. Ainda, que um

bom dispositivo de avaliação deve estar a serviço de uma pedagogia diferenciada,

capaz de dar resposta aos interesses e dificuldades de cada aluno (...)”.

III. A busca de caminhos para uma nova prática educativa em torno da

avaliação da aprendizagem – considerações finais

O grande desafio que se propõe é buscar pensar e fazer diferente,

buscar o “jogo do contrário”, como propõe Hoffmann. As proposições estão aí pra

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afirmar de que a mudança é necessária, mas a vontade de mudar também é tanto

quanto necessária para a mudança da prática.

Se na prática pedagógica encontramos os “descaminhos”, o descarrilar

do trem, como enfatiza Demo, então é necessário a busca de novas concepções,

novos espaços de discussão, de mudança de rumo. Entender a subjetividade da

avaliação é entender a subjetividade de nós mesmos, enquanto seres humanos, na

nossa incompletude, no nosso “vir a ser”.

Haydt (2000, p. 22), faz uma referência à necessidade de auto-

avaliação da prática pedagógica do professor em relação á aprendizagem de seus

alunos, especificando que mesmo quando apenas um pequeno grupo de alunos

apresentar um resultado não satisfatório numa avaliação, antes de considerar que o

problema está no próprio aluno, o professor deve questionar se a causa desse mal

desempenho não estaria no seu processo de ensino, que não logrou êxito com os

alunos mais fracos.

Não se pretende a partir das discussões propostas, chegar a um

modelo, que justifique o sucesso ou o fracasso da escola, do professor ou do aluno

na escola, mas sim, apresentar argumentos e possibilidades de mudança de

concepção, de visão pedagógica em torno do processo avaliativo. Em educação, se

trabalha com o que é concreto, porém, não visível, que é a formação humana, a

formação de mentes, que demandam novas atitudes; atitudes estas que se quer, de

mudanças.

No entanto, as mudanças que vislumbramos não ocorrerão no campo

educativo no “estalar dos dedos”, de forma repentina, simultânea, nem tampouco de

maneira acelerada, mas se faz necessário trilhar o caminho, buscar novos rumos ou

até mesmo achar o rumo perdido.

O que é necessário em nossa prática é estar aberto, saber ouvir e

interpretar os anseios educativos contemporâneos. Se vivermos no saudosismo,

permaneceremos eternamente frustrados, pois vivemos numa sociedade em

constante transformação, e uma das grandes vertentes dessas mudanças é,

certamente, a formação humana, o campo educativo.

Imaginarmos um modelo de aluno, um modelo de escola, de educação,

de mundo, a partir de nossas experiências é frustrar-se continuamente em nosso

trabalho pedagógico. Não temos o modelo de escola, o modelo de aluno e

tampouco, o modelo de sociedade que vislumbramos. Não trabalhamos, muitas

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vezes, com o ideal, mas temos o real à nossa frente e que necessita de

intervenções, de apoio e de modificações. Escolheremos, pois, o rumo mais

propício. Se a partir de toda a discussão aqui feita sobre a avaliação haver somente

uma mudança de concepção, mas não da prática, então poderemos afirmar que

teremos que recomeçar. E recomeçar é no sentido próprio, começar de novo,

repensar o fazer, reaprender.

Percebe-se é que, frente a uma concepção já enraizada na prática dos

professores, torna-se difícil abrir caminhos para a discussão em torno da avaliação,

como possibilidade de intervenção e melhora da prática educativa, sem que isso não

gere conflitos, enfrentamentos e troca de culpa. Ainda se caracteriza, na própria

formação do professor, a idéia de que avaliar é provar, é isentar-se de uma

responsabilidade de que se o aluno foi mal, a culpa é tão somente dele, porque

houve o ensino em sala de aula.

Abre-se caminho para apresentar uma terminologia que bem enfatiza a

discussão. O que é provar? Provar significa submeter-se à prova, demonstrar a

verdade. Se pensarmos que constantemente usamos a palavra “prova” na escola,

ao invés de “avaliação”, isso demonstra um sentido próprio da concepção sobre o

processo avaliativo.

Pensemos que quando pedimos pra que alguém prove algo, estamos

num certo sentido, colocando-o à parede, forçando-o a nos provar, por exemplo, se

ele é capaz ou não. Ilustremos essa colocação:

“Você é acusado de cometer um crime. No entanto, quem cometeu foi

uma outra pessoa, mas em seu nome; porque seus documentos foram

clonados ou suponhamos que você os tenha perdido. A pessoa em

questão que cometeu o delito fez todo o planejamento no sentido de sair

ileso da situação e de forma que a acusação recaia inteiramente sobre

você. Você é preso e fica na cadeia por alguns anos, até que você

encontra um álibi que realmente demonstre que você não é o culpado”.

Até dessa comprovação, imaginemos o que essa pessoa deve ter

passado e sofrido na cadeia, inocentemente. Se pensarmos que não podemos

analogicamente pensar na avaliação a partir dessa ilustração, então reflitamos sobre

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como a chamada “prova” é vista na escola pelos pais, professores e alunos. Sempre

se associa avaliar a provar, a sofrer, a padecer, a demonstrar a verdade.

Quando se percebe essa concepção ainda impregnada/arraigada na

prática dos professores, acaba-se por gerar maiores questionamentos no sentido de

mudar-se não tão somente a concepção em torno da avaliação da aprendizagem,

mas à própria prática docente, no que diz respeito a método, a objetivos

educacionais, a currículo, à visão que se tem sobre o processo didático, em sua

totalidade. É imprescindível a retomada constante para reflexão sobre a prática

educativa, no intuito de haver a formação pedagógica do professor, que por ora,

muitas vezes, deficiente. Mas, para isso, demanda-se espaço, tempo e possível

abertura para o debate na escola em torno do assunto.

É, pois, necessário, se repensar a prática avaliativa, em todas as suas

dimensões, sejam elas afetiva ou cognitiva, até pelo fato de que a realidade da

escola pública acaba por demonstrar que isso se faz como uma necessidade

urgente. As discussões aqui fomentadas evidenciam que são necessárias

mudanças, se quisermos melhorias nos resultados alcançados até então no

processo pedagógico. Em avaliação, para mudar, basta começar. E para começar, é

necessário estar aberto a aprender. Acredito que este seja o caminho.

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(Orientação 02/2008). Curitiba, 2008 VASCONCELOS, Celso dos S., Avaliação: Concepção Dialética-libertadora do processo de avaliação escolar. São Paulo: Libertad, 1994. ______________ Avaliação da Aprendizagem: práticas de mudança – por uma práxis transformadora. São Paulo: Libertad, 2005.