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1 Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral de Justiça. Ref. procedimento SEI 29.0001.0042613.2020-6 A ASSOCIAÇÃO PAULISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu Presidente, vem à presença de Vossa Excelência expor e requerer o que segue. Trata-se de consulta formulada pela d. Assessoria, lavrada nos seguintes termos: a) Membro da Instituição, poderá continuar a ter utilizados para fins de concessão da aposentadoria, bem como abono de permanência, de acordo com a nova legislação (E.C. nº 49/2020 e L.C. 1.354/2020), tempos fictos e acréscimo de 17% ao tempo exercido até 16/12/1998? 1.1. a.1) Membro da Instituição, que completou as condições para aposentadoria até 06/03/2020, antes da vigência da L.C. 1354/2020 (nos termos do artigo 26 da mencionada Lei), poderá computar os tempos fictos e o acréscimo de 17% (no tempo prestado até 16/12/1998).

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Page 1: A ASSOCIAÇÃO PAULISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, por ......3 Justiça no pt. 118.589/09, em igual teor (fls. 89/96), 6 – decisão da E. Procuradoria-Geral de Justiça no pt. 125196/06,

1

Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral de Justiça.

Ref. procedimento SEI 29.0001.0042613.2020-6

A ASSOCIAÇÃO PAULISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, por seu

Presidente, vem à presença de Vossa Excelência expor e requerer o que segue.

Trata-se de consulta formulada pela d. Assessoria, lavrada nos

seguintes termos:

“a) Membro da Instituição, poderá continuar a ter utilizados para fins de

concessão da aposentadoria, bem como abono de permanência, de acordo

com a nova legislação (E.C. nº 49/2020 e L.C. 1.354/2020), tempos fictos e

acréscimo de 17% ao tempo exercido até 16/12/1998? 1.1.

a.1) Membro da Instituição, que completou as condições para aposentadoria

até 06/03/2020, antes da vigência da L.C. 1354/2020 (nos termos do artigo 26

da mencionada Lei), poderá computar os tempos fictos e o acréscimo de

17% (no tempo prestado até 16/12/1998).”

Page 2: A ASSOCIAÇÃO PAULISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, por ......3 Justiça no pt. 118.589/09, em igual teor (fls. 89/96), 6 – decisão da E. Procuradoria-Geral de Justiça no pt. 125196/06,

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A consulta foi encaminhada pela D. Diretoria-Geral à d.

Subprocuradoria-Geral de Justiça Jurídica (fl. 147).

De interesse, jungidos ao procedimento cópias: 1- de Ação Direta de

Inconstitucionalidade1 proposta por entidades que compõem a FRENTAS - Frente

Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Associação Nacional dos

Procuradores da República – ANPR, Associação Nacional dos Procuradores do

Trabalho – ANPT, Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho

– ANAMATRA, Associação Nacional dos Membros do Ministério Público –

CONAMP e Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB) face a Emenda

Constitucional 103 (Reforma da Previdência), inclusive com impugnação de seu

artigo 25 (fls. 12/38 e 152/178)1; 2 – ofício com manifestação do então

Procurador-Geral de Justiça de São Paulo, datado de 03 de maio de 2019,

endereçado ao Presidente do Tribunal de Conta dos Estado (ofício 714/19-JUR,

de 03.05.19), enfocando, no r. parecer a ele acostado (pt. 34.339/19) questões

atinentes à aposentação, como contagem do acréscimo de 17% sobre o tempo de

serviço apostilado até 16.12.98 (para os membros do sexo masculino) e computo

de tempo de advocacia anterior à Emenda Constitucional nº 20 (pgs. 39 a 55); 3 –

acórdão do Conselho Nacional do Ministério Público-CNMP prolatado no Pedido

de Providências 2.001/2010-79, apenso ao PCA 1.883/2010-55 (fls. 65/75), em

que reconhecido o acréscimo de 17% sobre o tempo de serviço apostilado até

16.12.98 (para os membros do sexo masculino), inclusive em sua combinação

com as regras da EC 47/05); 4 - voto do e. Relator do Conselho Nacional de

Justiça-CNJ no Pedido de Providências 0005125-61.2009.2.00.0000, de mesmo

esteio (fls. 76/89); 5 – parecer dado pela Assessoria da E. Procuradoria-Geral de

1 ADI 6256-STF.

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Justiça no pt. 118.589/09, em igual teor (fls. 89/96), 6 – decisão da E.

Procuradoria-Geral de Justiça no pt. 125196/06, reconhecendo tempo de estágio

em órgão público para fins de aposentação de membro do Ministério Público (fls.

97/101); 7 – análise de setor de técnico do Tribunal de Constas do Estado de São

Paulo (fls. 103/142).

Em 12.08.20 esta Associação requereu vista do procedimento, para

memorial (fl. 188).

Em 09.09.20 recebidas cópias do procedimento, para manifestação.

Cinge-se, este procedimento, à consulta sobre a possibilidade de

contagem de tempo ficto (tempo de advocacia e de estágio) e do abono de 17%

sobre tempo de serviço anterior à EC 20/98 (membros do sexo masculino).

É o breve relatório.

I – INTRODUÇÃO

As três hipóteses em comento (tempo de advocacia e de estágio, bem

como o abono de 17%) são, no gênero, tempo ficto para a aposentação.

Tempo de advocacia e tempo de estágio – com exercício de munus

público – contavam, até o advento da EC 20/98, como tempo de serviço para fins

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de aposentação aos membros da carreira, até o limite máximo de 15 anos,

conforme disposto nos arts. 50, § 2º, da Lei 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do

Ministério Público) e nos arts. 181. § 2º e 194, da Lei Complementar Estadual

734/93 (Lei Orgânica do Ministério Público do Estado de São Paulo). Bastava,

para sua comprovação, certidão expedida pela Ordem dos Advogados do Brasil,

ao que indiferente – pela dicção legal – a comprovação de recolhimento

previdenciário.

A Emenda Constitucional nº 20 passou a exigir contribuição efetiva

para fins de aposentação (nova redação aos incisos e alíneas do parágrafo 1º do

artigo 40 da CF/88), vedando à lei estabelecer contagem ficta para fins de

aposentadoria (inclusão do § 10 ao artigo 40 da CF/88).

Porém, em proteção ao direito adquirido, bem como à segurança

jurídica, ressalvou a Emenda Constitucional nº 20 que: “o tempo de serviço

considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido até

que a lei discipline a matéria, será contado como tempo de contribuição.” (art. 4º).

Tocante aos 17% de tempo ficto concedido em forma de bonificação

aos membros do sexo masculino, de rigor a sua contextualização.

Na vigência da Constituição originária de 1988, os Magistrados e

membros do Ministério Público, de ambos os sexos, poderiam se aposentar

voluntariamente (e com proventos integrais) aos trinta anos de serviço, com cinco

anos no exercício do cargo (art. 93, inciso VI e 129, §4º).

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Com o advento da Emenda Constitucional nº 20, o tempo de

aposentadoria para os Magistrados e Membros do Ministério Público (e também

Conselheiros dos Tribunais de Contas) do sexo masculino passou a ser de 35

anos de contribuição (redação conferida ao art. 93, VI, da CF/88).

Justamente por esse aumento de 5 anos (de trinta para trinta e cinco

anos), concedido abono ficto de 17% sobre o tempo de serviço então cumprido

por esses agentes políticos (art. 8º, § 3º, da EC 20). De se gizar que 35 anos

significam, em percentual sobre 30 anos, acréscimo de 17%. Daí porque

concedido abono – compensatório – de 17%. Não se trata de número cabalístico

ou aleatório.

Como não houve o aumento do tempo de aposentadoria para as

mulheres (então mantido em 30 anos), a elas não concedeu o legislador

constituinte derivado bonificação compensatória.

Esse abono foi reproduzido ipsis litteris no art. 2º, § 3º, da Emenda

Constitucional nº 41 (daí porque descabido dizer que houve revogação do abono

pela EC 41), e não foi revogado pela Emenda Constitucional 47.

Poderia causar certa confusão ao interprete a regra disposta no artigo

25 da EC 103, em especial de seu § 3º, que torna nula aposentação concedida

com tempo ficto.

Porém, ali não se criou direito (no sentido de norma), nada mais fez a

EC 103, em seu artigo 25, inclusive no § 3º, que reproduzir vedação (de contagem

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ficta de tempo) constitucional de antanho existente, além de trazer interpretação

autêntica ao comando constitucional vigente desde a EC 20, porquanto foi essa

última acresceu o parágrafo 10º ao art. 40 da CF e desde então vedou contagem

ficta para fins de jubilação, ressalvada, em intepretação integrada do texto

constitucional, as exceções previstas pela própria norma constitucional que

introduziu a regra (EC 20), quer sejam a admissão: 1 - admissão do tempo de

serviço previsto na legislação como tempo de contribuição até que lei discipline a

matéria (art. 4º, da EC 20); 2 - a incorporação, como bônus, de 17% do tempo de

serviço então existente para os Magistrados e membros do Ministério Público e

dos Tribunais de Contas (art. 8º, § 3o da EC 20; norma reproduzida no art. 2º, §

3º, da EC 412).

Significa isto dizer que a EC 103 aclarou haver nulidade de

aposentação concedida com tempo ficto, mas esta impossibilidade de antes

existia.

Claro, impossibilidade com a ressalva das exceções constitucionais

acima gizadas.

Portanto, e a exemplo, não é nula aposentadoria de membro de

Ministério Público concedida com acréscimo de tempo ficto de até 15 anos de

advocacia adquiridos até o marco ad quem ou com acréscimo do bônus de 17%

do tempo de serviço havido até a EC 20, mas seria nula a aposentadoria de

mesmo agente público se houvesse: 1- a contagem de 20 anos de advocacia; 2 -

2 Mesma regra semelhante também foi trazida pela EC 20 para professores da rede pública de ensino,

inclusive com bonificação a maior para as mulheres (17% homem e 20% mulher), conforme se vê em seu art. 8º, § 4º, reproduzida no art. 2º, § 4º, da EC 41.

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acréscimo de tempo de advocacia ulterior à lei de regulamentação da norma

constitucional prevista no art. 4º da EC 20, bem considerada como tal, no âmbito

do MP/SP, a Lei 10.887/04 (fls. 97/101, pt. 125191/06; fl. 51, protocolado

34.339/19); 3 – bônus de 17% sobre tempo ulterior à EC 20.

As situações cá em análise (tempo de estágio e de advocacia havidos

até a Lei 10.887/04 e abono de 17% para homens e sobre tempo de serviço

havido até a EC 20), como adiante se exporá mais amiúde, determinam contagem

de tempo de serviço incorporada ao patrimônio dos membros do Ministério

Público, como vantagem pro labore factio, aplicando-se a regra do tempus regit

actum.

II – DO ABONO DE 17% DO TEMPO DE SERVIÇO HAVIDO ATÉ A EC 20,

PARA OS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO SEXO MASCULINO

Afora as observações gerais colocadas no item anterior, a questão foi

mui bem decidida no âmbito do CNMP, que considerou válida a contagem do

abono de 17% para os membros do sexo masculino, inclusive em sua

combinação com as regras da EC 47:

“EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. APOSENTADORIA

VOLUNTÁRIA POR TEMPO DE SERVIÇO COM PROVENTOS

INTEGRAIS. EC N" 20/98. MODIFICAÇÃO DO REGIME DE

PREVIDÊNCIA VIGENTE. REGRA DE TRANSIÇÃO PARA

MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA MAGISTRATURA.

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BONIFICAÇÃO DE 17% (DEZESSETE POR CENTO) NO TEN PO

DE EFETIVO EXERCÍCIO PRESTADO ATÉ 16 DE DEZEMBRO DE

1998. NOVAS ALTERAÇÕES ESTABELECIDAS PELA EC N47/2005.

SILENCIO DO CONSTITUINTE DERIVADO QUANTO À REGRA

DE TRANSIÇÃO ANTERIORMENTE IMPOSTA. NECESSIDADE

DE OBSERVÂNCIA DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DO

DIREITO ADQUIRIDO.

1. Não se confunde a contagem do tempo de serviço c om regime de

aposentadoria.

2. O Supremo Tribunal Federal mantém o entendimento de que a

contagem do tempo de serviço caracteriza-se como vantagem de

natureza pro labore facto, que se incorpora ao patrimônio pelo fato da

prestação do serviço.

3. O bônus de 17% do tempo de serviço configurou, à época da

edição da EC 20/98, norma de transição e forma de compensar, para os

membros da magistratura e do Ministério Público do sexo masculino, que

já se encontravam em atividade laboral, os prejuízos que sofreram em

decorrência do aumento do tempo de serviço exigido para

aposentadoria no cargo.

4. Norma destinada a pessoas determinadas, inseridas em contexto

determinado de tempo, que instituiu bônus que se incorpora ao patrimônio

jurídico dos seus destinatários, pela sua natureza de regra instituidora de

vantagem decorrente exclusivamente do tempo de serviço.

5. Procedência do pedido para acrescer o bônus de 17% (dezessete por

cento) à contagem de tempo de serviço dos membros do Ministério Público,

do sexo masculino, com incidência sobre o período compreendido entre o

início da atividade laboral, cujo tempo é computável para efeitos de

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9

aposentadoria no cargo e a data da entrada em vigor da referida Emenda

Constitucional.

...

Em esforço simples se constata que, ainda que a Suprema Corte tenha

entendido — como de fato entende — não haver direito adquirido em matéria

de regime previdenciário, escapa à razoabilidade considerar que uma

Emenda Constitucional poderia estabelecer, por exemplo, que aos servidores

públicos que já trabalharam por dez anos somente serão contabilizados, para

efeitos de aposentadoria, cinco anos.

Ou seja, se é verdade que é possível a alteração do regime previdenciário

para, por exemplo, acrescer mais cinco anos de contribuição como requisito

para a concessão da aposentadoria, mas verdadeiro é que a norma não

poderia ser alterada para desconsiderar um fato que já se esgotou no tempo,

como, por exemplo, o tempo de serviço efetivamente prestado.

Desse modo, com a simples promulgação da Emenda Constitucional nº

20/98, justamente pelo fato de a norma em questão dispor sobre tempo de

serviço, ainda que de modo ficto, foi incorporada a bonificação dos 17% ao

patrimônio jurídico dos destinatários da norma.

Qualquer interpretação que sustentasse a aplicabilidade de tal dispositivo

somente para aqueles que viessem a se aposentar no período de vigência da

referida Emenda n° 20/98, a par de violar a garantia do direito adquirido, estaria a

violar o princípio constitucional da igualdade, visto que, no caso, o fator de

discrimen da norma não é o momento da aposentadoria, mas a atividade

exercida (magistrado, membro do Ministério Público ou professor do ensino

fundamental e médio).

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A norma em questão é destinada, claramente, a fixar critérios de transiçáo, a

fim de minimizar a perda considerável imposta às categorias já elencadas.

Outro ponto merecedor de atenção é a pretensa alegação de que a ausência

de disposição expressa na Emenda Constitucional n° 47/2005 sobre o tema

configuraria a modificação radical dos efeitos das Emendas anteriores.

Tem-se aqui verdadeiro absurdo interpretativo, que pretende dirimir o

aparente conflito normativo pela via do critério temporal.

Ocorre, contudo, que referido critério somente encontraria espaço se inviáveis

os critérios da hierarquia e da especialidade, o que não ocorre no caso

concreto.

Isso porque, tratando-se de normas de mesma hierarquia, a especialidade

somente poderia ser afastada se ambas as normas em aparente conflito

dispusessem sobre o mesmo tema. E ainda assim estariam sujeitas a exame

em face da garantia do direito adquirido.

O direito alegado pelos Requerentes in casu encontra amparo na

especialidade justamente em virtude de a Emenda Constitucional n° 20/98

trazer norma de transição aplicável especificamente às carreiras do Ministério

Público e da Magistratura.

Assim, uma vez lançada no ordenamento jurídico, entra em inércia de

movimento, produzindo o efeito de incorporar ao patrimônio jurídico as

vantagens que especifica. Não quanto a regime jurídico, mas quanto a

direitos substanciais.

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Há de se reconhecer, assim, que não obstante a última das Emendas

tratadas não mencione expressamente a questão relativa ao 17%, o benefício

instituído como forma de composição aos que se encontravam em regime de

transição, pela Emenda Constitucional n° 20/98 produziu seus efeitos,

incorporando-se ao patrimônio jurídico de seus destinatários, efeitos estes,

por sua vez, cobertos pelo manto protetivo da garantia constitucional do

direito adquirido.

Como bem assentado pelo Conselheiro Marcelo Neves, relator no CNJ de

procedimento análogo (PP 5125/2010), ´a revogação posterior do artigo 8º da

EC n 20/98 pela EC n 41/2003 em nada afetou o disposto no § 3° do

referido artigo, visto se tratar de regra de transição, a qual opera efeitos

imediatos. É norma de efeitos concretos que, uma vez entrando em vigor,

atinge instantaneamente seu objetivo e, automaticamente, deixa de produzir

qualquer efeito jurídico (o exercício do direito e a correspondente aplicação

da norma é que ocorrerá após a incidência). Nesse sentido, sua revogação

não traz qualquer alteração jurídica ou fática´.

...

O bônus de 17% do tempo de serviço configurou, à época da edição da EC

20/98, forma de compensar, para os membros da magistratura e do Ministério

Público do sexo masculino, os prejuízos que sofreram em decorrência do

aumento do tempo de serviço exigido para aposentadoria no cargo. A escolha

do constituinte foi estabelecer norma de transição para estes, criando direito

consubstanciado em tempo de serviço. Esta norma, destinada a pessoas

determinadas, inseridas em contexto determinado de tempo, incorpora-se,

pela sua natureza de instituidora de vantagem decorrente do tempo de

serviço já prestado, ao patrimônio jurídico dos seus destinatários.

Page 12: A ASSOCIAÇÃO PAULISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, por ......3 Justiça no pt. 118.589/09, em igual teor (fls. 89/96), 6 – decisão da E. Procuradoria-Geral de Justiça no pt. 125196/06,

12

Desse modo, vejo enfraquecido o argumento que entende estar a questão

pacificada em alegado posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal

Federal em sede de ADI, uma vez que, conforme expresso na decisão que

indeferiu a liminar da Reclamação, a matéria em discussão não foi objeto de

declaração de inconstitucionalidade e há posicionamento anterior da Corte

acerca da relação entre o tempo de serviço e o direito adquirido.

No confronto entre a certeza da interpretação sistêmica do Texto

Constitucional, em que se prestigia, a um só tempo, a vigência de uma

Emenda, o princípio da igualdade e a garantia constitucional do direito

adquirido, que antes de tudo é um direito fundamental; e a dúvida da

interpretação literal, a razoabilidade impõe a escolha pela primeira opção.”3

De mesmo esteio da decisão do Conselho Nacional de Justiça,

transcrevendo-se:

“PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. Aposentadoria voluntária. Magistrados. EC nº

20/98. Artigo 8º, § 3º. Norma de transição de efeitos concretos. Tempo de

serviço. Acréscimo de 17%. Incidência. Direito adquirido. Integração ao

patrimônio jurídico. Pedido procedente. Deve ser reconhecido o direito

adquirido ao acréscimo de 17% ao tempo de serviço dos magistrados,

previsto no § 3º do artigo 8º da Emenda Constitucional nº 20/98, por se tratar

de norma de transição de efeitos concretos, que passou a integrar o

patrimônio jurídico dos magistrados.

...

3 CNMP, Pedido de Providências 2.001/2010-79, apenso ao PCA 1.883/2010-55, Rel.

Conselheira Thaís Schilling Ferraz, j. 22.02.11, v.u..

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13

6. Mas o direito adquirido ou exaurido, não precisaria dizê-lo, só se

caracteriza como situação tutelada, invulnerável à eficácia de lei nova,

quando haja norma jurídica que o contemple como tal no segundo membro de

sua estrutura linguística (proposição normativa), como consequência jurídica

da perfeita realização histórica (fattispecie concreta) do fato hipotético

previsto, como tipo (fattispecie abstrata), no primeiro membro da proposição

normativa.

Talvez conviesse recordar ao propósito, conquanto em esquema simplificado,

que toda norma jurídica prática, cuja vocação está em induzir comportamento,

prevê, na primeira cláusula de sua formulação linguística, enunciados em

termos típicos mais complexos, fatos ou fatos de possível ocorrência histórica

(fattispecie abstrata), e liga à sua realização completa no mundo físico

(fattispecie concreta), por imputação ideal (causalidade normativa), na

segunda cláusula, a produção de certo efeito ou efeitos jurídicos, redutíveis,

de regra, às categorias conceituais de obrigações ou de direitos subjetivos.

De modo que, reproduzido na realidade, em toda a sua inteireza, com

ocorrência do fato, o modelo ou tipo normativo, descrito como hipotético na

primeira cláusula, dá-se, no mundo jurídico, o fenômeno chamado de

incidência da norma sobre o fato (ou subsunção do fato à norma), mediante o

qual o fato realizado se jurisdiciza e, fazendo-se jurídico, dá origem, por

suposição, ao nascimento de direito subjetivo, isto é, direito reconhecido a

titular ou titulares personalizados (com adjetivo possessivo). Daí afirmar-se:

‘Inexiste direito subjetivo sem norma incidente sobre fato do homem ou sobre

o homem como fato: sobre seu mero existir ou sobre conduta sua. O direito

subjetivo é efeito de fato jurídico, ou de fato que se jurisdicizou: situa-se no

lado da relação, que é efeito. Isso quer nos direitos subjetivos absolutos,

privados ou públicos, quer nos direitos subjetivos relativos’ LOURIVAL

VILANOVA. Causalidade e Relação no Direito. 2ª ed. São Paulo: Saraiva,

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1989, p. 146, nº

2)”.

Ora, em se tratando da vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, a qual

garantiu o acréscimo de 17% de tempo de serviço aos magistrados do sexo

masculino, para fins de aposentação, observo que a aplicação jurídica do

instituto do “direito adquirido”, conforme manifestado acima, é perfeitamente

cabível ao presente caso.

O artigo 8º da EC nº 20/98 configura, exatamente, a proposição normativa

que veio dar suporte jurídico à aquisição do direito à contagem do tempo de

serviço acrescido de 17% aos magistrados que já se encontravam em

atividade no momento de sua entrada em vigor, e como tal, desde então, este

direito já poderia ter sido averbado em suas respectivas anotações funcionais.

O que difere a questão posta na ADI nº 3.105 do presente caso é que, na

primeira, a norma que alterou o sistema de arrecadação previdenciária tem

por escopo regular relações jurídicas para o futuro, enquanto o disposto no

art. 8º da EC nº 20/98 produziu seus efeitos imediatamente, pois seu objetivo

foi o de incidir plenamente sobre situações fáticas já existentes quando de

sua entrada em vigor.

2. Analogamente, pode-se concluir que essa espécie normativa que atribuiu o

direito aos magistrados a acrescerem 17% ao seu tempo de serviço reveste-

se de caráter nitidamente transitório, assim como as regras contidas no Ato

da Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT, e sob esta configuração

deve ser interpretada e aplicada.

No dizer de José Afonso da Silva (Aplicabilidade das Normas Constitucionais,

São Paulo: Malheiros, 2004, pp. 204 ss):

´As normas das disposições transitórias fazem parte integrante da

constituição. Tendo sido elaboradas e promulgadas pelo constituinte,

revestem-se do mesmo valor jurídico da parte permanente da constituição.

Mas seu caráter transitório indica que regulam situações individuais e

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específicas, de sorte que, uma vez aplicadas e esgotados os interesses

regulados, exaurem-se, perdendo a razão de ser, pelo desaparecimento do

objeto cogitado, não tendo, pois, mais aplicação no futuro.

(…)

São normas que regulam situações ou resolvem problemas de exceção. (…)

As normas transitórias têm, como visto, o mesmo valor jurídico das normas

constitucionais. Quer isso dizer que são normas constitucionais. Têm, em

regra, eficácia plena e aplicabilidade imediata. (…) ´ (grifos nossos).

Com efeito, ainda que não se trate tecnicamente de um dispositivo contido

topologicamente no ADCT, não há como negar sua natureza transitória, visto

que a regra contida no § 3º do art. 8º da EC nº 20/98 nada mais fez do que

regular uma situação específica de determinadas categorias profissionais,

buscando equalizar eventuais distorções causadas pela reforma.

Norma de caráter transitório, incide em relação às situações para as quais se

destina e, em seguida, perde a vigência (no sentido de Pontes de Miranda,

“Incidência e aplicação da lei”, in: Revista da Ordem dos Advogados de

Pernambuco, ano I, nº 1, Recife, 1956: não pode mais incidir). Pode-se

acrescentar que se trata de norma jurídica temporalmente uno-incidente, ou

seja, ´regra jurídica para classe de um caso só´ (Pontes de Miranda, Tratado

de Direito Privado, 4ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, tomo I,

p.8). Daí por que não ser relevante disposição ´revogatória´ ou cláusula

restritiva contida nos textos das Emendas Constitucionais supervenientes,

que deram continuidade à reforma previdenciária. Seu alcance exauriu ao

incidir imediatamente aos casos por ela tutelados, fazendo o acréscimo de

17% ao tempo de serviço ser incorporado ao patrimônio jurídico dos

magistrados que se encontravam em efetivo exercício à época.

3. Observe-se que a possibilidade de não acatamento dessa disponibilidade

dos 17% como categoria de direito adquirido ensejaria seu reconhecimento

como mera expectativa de direito. Nesse sentido, a balizada doutrina de

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16

Pontes de Miranda esclarece que a expectativa de direito corresponde ´à

posição de alguém em que se perfizeram elementos de suporte fáctico, de

que sairá fato jurídico, produtor de direitos e outros efeitos, porém ainda não

todos os elementos do suporte fáctico: a regra jurídica, a cuja incidência

corresponderia o fato jurídico, ainda não incidiu, porque suporte fáctico ainda

não há´ (Tratado de Direito Privado, 4ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais,

1974, tomo V, p. 291 – grifo no original). À toda evidência, as disposições da

EC nº 20/98, no que tange à questão destes autos, incidiram imediatamente,

eis que o suporte fático para a produção de seus efeitos era, especificamente,

a existência de tempo de serviço já cumprido por magistrados e membros do

Tribunal de Contas e do Ministério Público, aos quais se devem acrescer

17%. Portanto, há o suporte fático e há a norma jurídica sobre ele incidindo.

Somente não ocorrera, à época, a imediata aposentadoria dos agentes

públicos, porque isto não integrou os requisitos exigidos pela norma

constitucional para o aproveitamento da disposição equalizadora. Adquiriu-se

o direito à percepção do acréscimo, a ser computado no momento futuro da

aposentação, assim que atingidos os demais requisitos para tanto (tempo

total de serviço e idade). Quanto a estes últimos é que não se pode invocar o

direito adquirido, uma vez que, enquanto não se perfizerem, norma posterior

poderá vir a alterá-los e, caso esta norma traga novas regras de adaptação

(transitórias), como a presentemente discutida, também tornar-se-ão direitos

subjetivos de seus titulares e, assim também, tornar-se-ão integrantes de

seus respectivos patrimônios jurídicos; inatingíveis, como a do caso em tela,

por alteração posterior; e assim sucessivamente.

Nesse sentido, a lição de Carlos Ayres BRITTO (Teoria da constituição, p.

116 e 117):

´(…) o direito subjetivo que se leva ao patamar de direito adquirido (o

adquirido é um plus em relação ao direito subjetivo) pode até não se

encontrar em fase de exercício. Nem por isso deixa de ser direito adquirido,

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17

pois o exercício pode ficar pendente de pressupostos, a saber… o aguardo do

lapso temporal, ou do preenchimento de certa condição, prefixados pela

própria norma geral. Mas prefixados, não como requisitos de obtenção do

direito (matéria de outra norma), e, sim, como requisitos do respectivo

exercício; ou seja, é preciso distinguir entre a norma geral que dispõe sobre a

implementação de termo ou de condição para a empírica fruição daquele

mesmo direito que a primeira norma elementarizou´.

4. Caminhando um pouco além do reconhecimento ao direito adquirido, tem-

se que a regra do § 3º do art. 8º da EC nº 20/98 traduz a manifestação de um

ato jurídico perfeito, que nada mais é do que o próprio fundamento de

garantia do direito adquirido. A respeito, preleciona DINIZ (1998, pp. 182 ss):

´(…) A segurança do ato jurídico perfeito é um modo de garantir o direito

adquirido pela proteção que se concede ao seu elemento gerador, pois se a

nova norma considerasse como inexistente, ou inadequado, ato já

consumado sob o amparo da norma precedente, o direito adquirido dele

decorrente desapareceria por falta de fundamento´.

E continua:

´(…) Claro está que a garantia do ato jurídico perfeito seria um modo de

assegurar o direito adquirido, uma vez que o ato jurídico perfeito é um dos

elementos geradores de direito adquirido e do dever jurídico correlato. Assim

sendo, o ato jurídico perfeito não poderá ser alcançado por lei posterior,

sendo inclusive imunizado contra quaisquer requisitos formais exigidos pela

nova norma´.

Com efeito, o disposto no § 3º do art. 8º da EC nº 20/98 é o ato jurídico

perfeito que concede legitimidade plena ao direito adquirido de computar 17%

ao tempo de serviço exercido até sua entrada em vigor, qual seja, a data de

16 de dezembro de 1998.

A revogação posterior do artigo 8º da EC nº 20/98 pela EC nº 41/2003 em

nada afetou o disposto no § 3º do referido artigo, visto se tratar de regra de

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18

transição, a qual opera efeitos imediatos. É norma de efeitos concretos que,

uma vez entrando em vigor, atinge instantaneamente seu objetivo e,

automaticamente, deixa de produzir qualquer efeito jurídico (o exercício do

direito e a correspondente aplicação da norma é que ocorrerá após a

incidência). Nesse sentido, sua revogação não traz qualquer alteração jurídica

ou fática.

Por fim, a referida ´revogação´ foi apenas aparente, permaneceu no plano do

significante, ou seja, da disposição constitucional, não atingindo a própria

norma, pois o art. 2º, § 3º, da EC nº 41, manteve esse benefício (o acréscimo

do tempo ficto de 17%), dentro do regime jurídico por ela estabelecido.

5. Diante do exposto, concluo pela aplicabilidade das disposições do § 3º do

art. 8º da Emenda Constitucional nº 20, de 16 de dezembro de 1998, à

contagem de tempo de serviço dos magistrados do sexo masculino, incidindo

o tempo ficto de 17% (dezessete por cento) sobre o tempo de serviço

exercido pelo magistrado até a data de publicação da referida Emenda. E,

tendo em vista que este entendimento deverá ser aplicado a todos os

magistrados que se encontrem em situação análoga, determino a expedição

de ofício aos tribunais brasileiros, integrantes do Poder Judiciário, a fim de dar

conhecimento do presente.”4

Necessária, aqui, exegese mais aprofundada do tema.

Não se descura a parcial concessão de liminar monocrática no

Mandado de Segurança 31.299 e na Reclamação 10.823, ambos correntes

perante o Supremo Tribunal Federal.

4 Pedido de Providências 0005125-61.2009.2.00.0000, j. 31.08.10, Rel. Conselheiro Marcelo Neves.

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19

Porém, certos parênteses devem ser gizados para correto balizamento

da questão.

Tocante à reclamação em si, de se pontuar, a latere, que o abono de

17% previsto na EC 20 não foi objeto da ADI 3104, ao que, não se pronunciado a

Suprema Corte sobre o tema, falta – em abstrato – suporte que de amalgama ao

teor reclamado.

Nesse esteio, alias, o r. parecer da D. Procuradoria-Geral da

República, subscrito pelo então exerceste do cargo, Dr. Roberto Monteiro Gurgel

Santos:

“O caso julgado pelo Conselho Nacional de Justiça, embora pudesse

eventualmente considerar-se abrangido, em tese, pelo fundamento utilizado

no julgado do Supremo Tribunal Federal – de inexistência de direito adquirido

a regime jurídico de aposentadoria -, parece trazer questão distinta. É que na

se falou, na ADI 3.104, acerca do acréscimo de 17% garantido pela EC 20/98,

mesmo porque ele foi mantido pela EC 41/03 então analisada.

O § 3º do art. 8º da EC 20/98 previu, como regra de transição:

´Art. 8º. (...) § 3º Na aplicação do disposto no parágrafo anterior, o magistrado

ou o membro do Ministério Público ou de Tribunal de Contas, se homem, terá

o tempo de serviço exercido até a publicação desta Emenda contado com

acréscimo de dezessete por cento.´

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20

A EC 41/03 revogou o artigo em que inserida a norma transcrita, mas fez a

previsão de idêntico conteúdo no preceito que trouxe os novos requisitos para

a aposentadoria:

Art. 2º. (...) § 3º Na aplicação do disposto no parágrafo 2º deste artigo, o

magistrado ou o membro do Ministério Público ou de Tribunal de Contas, se

homem, terá o tempo de serviço exercido até a data da publicação da

Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, contado com

acréscimo de dezessete por cento, observado o disposto no § 1º deste

artigo.´

Mantido o direito ao acréscimo na emenda constitucional impugnada, é

correto dizer que nem poderia ter havido exame pelo Supremo Tribunal

Federal dessa específica questão na ADI 3.104, não cabendo, via de

consequência, em sede de reclamação, a sua invocação como paradigma.

Dizer que a EC 47/05 não faz previsão do acréscimo e que, por isso, dele não

se pode beneficiar o magistrado aposentado quando já em vigor a referida

emenda é propor discussão que não tem espaço em sede de reclamação em

que se indica como paradigma julgado que tratou da emenda anterior, sem

qualquer consideração sobre o benefício.

Não se faz qualquer juízo, porque incabível, acerca do direito em si ao

acréscimo de 17%. Verifica-se, apenas, que dele não cuidou a ação invocada.

O que pretende a reclamante é utilizar os seus fundamentos e, assim, garantir

a aplicação da EC 47, não analisada pelo STF, sem a concessão do

acréscimo.

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21

Ante o exposto, o parecer é pela improcedência do pedido.” (r. parecer

ofertado em 24.07.11).

Desconsiderada essa questão de forma, impende ressaltar que as

liminares mencionadas incorreram em equívoco, ao afirmarem que: 1) A EC 41

revogou o abono de 17%; 2) impossível a combinação do abono de 17% com as

regras da EC 47.

Conforme de antes exposto, a EC 41 não revogou o abono em

comento. Do contrário, reproduziu-a em seu artigo 2º, § 3º.

Tocante à alegação de não ser intercambiável o abono de 17% com as

regras da EC 47, de se recordar o princípio de antanho gizado pelo Supremo

Tribunal Federal em situações analógicas.

Os médicos servidores da União eram celetistas, e contavam com

tempo de aposentação a menor. Quando sobreveio o Regime Jurídico Único, com

a Lei 8.213/91, não tiveram, administrativamente, reconhecido o direito ao tempo

a menor de antes aquinhoado.

Em reiteradas decisões, determinou a Suprema Corte:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA

ESPECIAL. REQUISITOS. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE

LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL E DO CONJUNTO FÁTICO-

PROBATÓRIO. SÚMULA N. 279 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL. PRINCÍPIO TEMPUS

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22

REGIT ACTUM. RECURSO EXTRAORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA

PROVIMENTO NO PONTO. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 57, § 8º,

DA LEI N. 8.213/1991: TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL

RECONHECIDA. CONTROVÉRSIA SUSCETÍVEL DE REPRODUZIR-SE EM

MÚLTIPLOS FEITOS. ART. 1.036 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ART.

328, PARÁGRAFO ÚNICO, DO REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL. DEVOLUÇÃO DOS AUTOS À ORIGEM. (...)

5. Quanto à possibilidade de conversão do tempo comum em especial, o

acórdão recorrido harmoniza-se com a jurisprudência deste Supremo

Tribunal de dever ser realizada a averbação de tempo de serviço

considerando-se a legislação vigente ao tempo da prestação do serviço

(princípio tempus regit actum):

“Recurso Extraordinário. 2. Serviço prestado antes do advento da Lei no

9.032, de 1995. Caracterização como especial. Atividade insalubre prevista

nos Decretos nos 53.831, de 1964 e 83.080, de 1979. Desnecessidade do

laudo exigido pela citada lei.

3. Recurso extraordinário a que se nega provimento (RE n. 392.559, Relator o

Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 3.3.2006). (...)” (STF, RE

983.595/RS, Rel. Min. Carmen Lúcia, decisão singular, DJ. 09.08.2016).

“EMENTA: 1. Servidor público federal: contagem especial de tempo de

serviço prestado enquanto celetista, antes, portanto, de sua

transformação em estatutário: direito adquirido, para todos os efeitos,

desde que comprovado o efetivo exercício de atividade considerada

insalubre, perigosa ou penosa. Com relação ao direito à contagem de

tempo referente ao período posterior à L. 8.112/90, firmou esta Corte

entendimento no sentido de que, para concessão de tal benefício, é

necessária a complementação legislativa de que trata o artigo 40, § 4º, da CF.

Precedentes. 2. Agravo Regimental provido, em parte, para, alterando-se a

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23

parte dispositiva da decisão agravada, dar parcial provimento ao

extraordinário e reconhecer ao agravado o direito à contagem especial do

tempo de serviço prestado sob efetivas condições insalubres no período

anterior à L. 8.112/90.”

(RE 367314 AgR, Relator: Min. Sepúlveda Pertence, 1ª. Ta. DJ 14-05-2004).

“SERVIDOR PÚBLICO. ATIVIDADE INSALUBRE. CONTAGEM ESPECIAL

DE TEMPO DE SERVIÇO. DIREITO ADQUIRIDO. MUDANÇA DE REGIME.

O direito à contagem especial do tempo de serviço prestado sob

condições insalubres pelo servidor público celetista, à época em que a

legislação então vigente permitia tal benesse, incorporou-se ao seu

patrimônio jurídico. Não obstante, para o período posterior ao advento da

Lei 8.112/90, é necessária a regulamentação do art. 40, §4º da Carta Magna.

Precedentes. Recurso extraordinário conhecido em parte e, nesta parte,

provido.” (RE 352322, Relatora: Min. Ellen Gracie, 2ª Ta., DJ 19-09-2003).

Os julgados abaixo colacionados reproduzem vetusto entendimento da

Suprema Corte:

“TEMPO DE SERVIÇO PÚBLICO. EQUIPARAÇÃO LEGAL DAQUELE

PRESTADO A ESTABELECIMENTO PARTICULAR. CONSTITUI DIREITO

ADQUIRIDO A SUA CONTAGEM, NOS TERMOS DE LEI AUTORIZADORA,

PARA FINS DE APOSENTADORIA, PELO QUE NÃO PODE SER

ALCANÇADA POR LEI POSTERIOR, REVOGADA DA PRIMEIRA.

ENTENDIMENTO DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO

JULGAMENTO DO RE 82.881, DE 5.5.76. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

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CONHECIDO, MAS NÃO PROVIDO.” (RE 85218, Relator Min. Xavier de

Albuquerque, Pleno, DJ 10-09-1976).

“TEMPO DE SERVIÇO PÚBLICO. EQUIPARAÇÃO LEGAL DAQUELE

PRESTADO A ESTABELECIMENTO PARTICULAR. CONSTITUI DIREITO

ADQUIRIDO A SUA CONTAGEM, NOS TERMOS DE LEI AUTORIZADORA,

PARA FINS DE APOSENTADORIA, PELO QUE NÃO PODE SER

ALCANCADA POR LEI POSTERIOR, REVOGADORA DA PRIMEIRA.

ENTENDIMENTO DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO

JULGAMENTO DO RE 82.881, DE 5.5.76. RECURSO EXTRAORDINÁRIO

CONHECIDO, MAS NÃO PROVIDO. (RE 82883, Relator Min. Xavier de

Albuquerque, Pleno, DJ 03-09-1976)

“SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. - CARACTERIZAÇÃO DE TEMPO DE

SERVIÇO PÚBLICO; DIREITO ADQUIRIDO. - ESTABELECIDO, NA LEI,

QUE DETERMINADO SERVIÇO SE CONSIDERA COMO TEMPO DE

SERVIÇO PÚBLICO, PARA OS EFEITOS NELA PREVISTOS, DO FATO

INTEIRAMENTE REALIZADO NASCE O DIREITO, QUE SE INCORPORA

IMEDIATAMENTE NO PATRIMÔNIO DO SERVIDOR, A ESSA

QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO TEMPO DE SERVIÇO,

CONSUBSTANCIANDO DIREITO ADQUIRIDO, QUE A LEI POSTERIOR

NÃO PODE DESRESPEITAR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO,

MAS DESPROVIDO. - VOTOS VENCIDOS...

...

Reproduzo uma manifestação (parte do voto) do Min. Moreira Alves,

convergente com o voto vencedor, durante os debates que se estabeleceram,

que bem situa e sintetiza a questão:

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25

´O SR. MINISTRO MOREIRA ALVES: V. Exa. me permite? A explicação é

simples. Há dois direitos diferentes: um, é o direito à contagem do tempo; o

outro, o direito a aposentar-se.

Façamos a abstração da eficácia: ´contagem de tempo, para efeito de

aposentadoria´; e isso é possível, pois para haver efeito – embora

diferido –, é preciso haver uma causa. Essa causa é o tempo de serviço

qualificado como tempo de serviço público. Esse direito se adquire

antes da aposentadoria, embora sua eficácia só ocorra quando se

completem os demais requisitos para a aposentação. A lei do tempo da

produção do efeito não pode impedi-la sobre o fundamento de que, nesse

instante, o direito de que decorre o efeito não é mais admitido. É justamente

para evitar isso que há a proibição da retroatividade, quando existe

direito adquirido antes da lei nova, embora sua eficácia só ocorra depois

dela.

Este o meu pensamento.´ ” (RE 82881, Relator Min. Xavier de Albuquerque,

Relator p/ Acórdão: Min. Eloy da Rocha, DJ 19/11/1976).

Dos v. arestos acima citados extrai-se inafastável princípio: O abono de

17% trazido pelo art. 8º, § 3º, da EC 20, imediatamente se incorporou ao

patrimônio dos membros do Ministério Público integrantes da carreira até então, e

não pode norma superveniente rechaçá-lo, sob pena de ofensa ao direito

adquirido e à segurança jurídica, princípios de assento constitucional e que

constituem cláusulas pétreas (arts. 5º, XXXVI e 60, § 4º, ambos da CF/88).

E agora sob o enfoque da superveniência de normas constitucionais, e

ainda com análise do abono de 17%, mais uma vez se diz: 1- Foi trazido como

medida compensatória pelo art. 8º, § 3º, da EC 20, imediatamente se

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26

incorporando ao patrimônio dos beneficiados pela norma; 2 – ainda que revogado

o art. 8º, da EC 20, pela EC 41, o direito em exame continuou a ser reconhecido

pela novel norma (e nem o precisaria) porquanto reproduzido em seu artigo 2º, §

3º.

A isto se acresce: A EC 47 revogou tão somente o art. 6º da EC 41,

fazendo-o em seu art. 5º. Não revogou ela, portanto, a norma que reproduziu o

abono de 17% sobre o tempo de serviço para os Magistrados, membros do

Ministério Público e dos Tribunais de Contas.

Mais do que isso.

Em seu art. 3º, e ao ressalvar o direito da norma prevista no art. 2º da

EC 41 (onde reproduzido o abono temporal de 17%), a EC 47 permitiu – sem

qualquer dúvida – a aplicação do instituto em apreço às condições de

aposentação que trouxe a última emenda citada.

Exatamente nesse esteio o r. parecer ofertado pelo Ilustre Advogado

Alberto Pavie Ribeiro para a Associação dos Magistrados Brasileiros-AMB:

“E ao fazê-lo, tal como havia feito a EC n. 20/98, deixou expresso a EC n.

41/03 que ´o magistrado ..., se homem, terá o tempo de serviço exercício até

a data de publicação da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de

1998, contado com acréscimo de dezessete por cento, observado o disposto

no § 1º deste artigo´ o período de serviço

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27

Não se referiu, em 2003, aos magistrados que teriam direito de se

aposentar ´até a data de publicação da Emenda Constitucional 20´ e sim que

teria o direito de CONTAR O TEMPO exercido até aquela data para poder

aposentar (no futuro).

Referiu-se à aposentadoria voluntária prevista no caput do art. 2º da EC

42/03, quanto aos magistrados que teriam direito de requerer a aposentadoria

voluntária, para que ´o tempo de serviço´ exercido ´até a data de publicação

da Emenda Constitucional 20´ fosse ´contado com acréscimo de dezessete

por cento´.

Impossível, portanto, d.v., cogitar da revogação do direito à contagem do

tempo ficto, com acréscimo de 17%, do serviço exercido antes da EC n.

20/98.

A razão foi uma só: houve a ampliação do tempo de serviços dos

magistrados homens pela EC n. 20/98, de 30 para 35 anos.

Os 17% de contagem ficta refere-se exatamente à diferença proporcional do

tempo existente entre 35 e 30 anos. Havia necessidade de preservar aquele

tempo de serviço trabalhado sob a certeza de que a aposentadoria se daria

ao final de 30 anos de atividade.

Indague-se, ainda, EM QUE TRECHO do texto da EC n. 47/05 teria

ocorrido a revogação da norma do § 3º do art. 2º da EC n. 41, e a resposta

será a de que EM NENHUM trecho ocorreu a revogação.

A EC n. 47/05 revogou apenas o art. 6º da EC n. 41/03:

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28

Art. 5º Revoga-se o parágrafo único do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de

dezembro de 2003.

Não é só. A EC 47/05 reafirmou, mais uma vez, os requisitos que precisariam

ser preenchidos de forma cumulativa para o servidor poder exercer o direito

de aposentadoria (incisos I a III do art. 3º.), MAS introduziu uma “ressalva” ao

“direito” contido nas regras previstas no artigo 2º. da EC 41/03, ou seja, o

direito previsto no § 3º do art. 2º, anteriormente reproduzido, que é o direito

de computar 17% sobre o tempo de trabalho exercido até a EC n. 20/98:

Art. 3º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas

pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos e 6º da Emenda

Constitucional nº 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até

16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha,

cumulativamente, as seguintes condições: (...).

Então, também a EC 47/05 reafirmou o direito de os magistrados homens

acrescerem 17% sobre o tempo de trabalho exercido até a EC 20/98, para o

fim da aposentadoria.

...

O que parece que tem ocorrido é uma confusão, por parte dos contrários ao

direito, dos institutos jurídicos de ´critério de contagem de tempo´ da

prestação de serviço, com ´direito a regime jurídico´.

Com efeito, o direito deferido na EC n. 20/98, reafirmado nas EC n. 41/03 e

47/05 é pertinente ao critério de contagem de tempo da prestação de serviço,

em face do qual a jurisprudência do eg. STF é pacífica no sentido de aplicar a

lei vigente à época da prestação de serviço.

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29

Afinal, o que a EC n. 20/98 fez foi determinar uma contagem ficta de tempo de

serviço (17%), em razão do aumento de 30 para 35 anos de trabalho, como

idade mínima de aposentadoria para os magistrados homens.

Então, não se está diante da hipótese de pretensão a direito adquirido a

determinado regime jurídico, mas sim ao direito de aplicação da lei vigente à

época da prestação de serviço para a contagem especial do tempo de

aposentadoria (tempus regit actum).”5

Daí porque irreprochável o r. parecer da d. Subprocuradoria-Geral de

Justiça Jurídica, da lavra do Dr. Wallace Paiva Martins Júnior, que bem ratificou a

incidência do abono temporal de 17%, inclusive na jubilação com as regras da

EC. 47:

“No julgamento da questão no Conselho Nacional de Justiça venerando

acórdão estampou acerca da regra do § 3º do art. 8º da Emenda

Constitucional n. 20/98 que:

´(...) Seu alcance ao incidir imediatamente aos casos por ela tutelados,

fazendo o acréscimo de 17% ao tempo de serviço ser incorporado ao

patrimônio jurídico dos magistrados que se encontravam em efetivo exercício

à época.

(...) Adquiriu-se o direito à percepção do acréscimo, a ser computado no

momento futuro da aposentação, assim que atingidos os demais requisitos

para tanto (tempo total de serviço e idade). Quanto a estes últimos é que não

se pode invocar o direito adquirido, uma vez que, enquanto não se

perfizerem, norma posterior poderá vir a alterá-los e, caso esta norma traga

5 DOC. 01, em anexo.

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30

novas regras de adaptação (transitórias), como a presentemente discutida,

também tornar-se-ão direitos subjetivos de seus titulares e, assim, também,

tornar-se-ão integrantes de seus respectivos patrimônios jurídicos´ (Pedido de

Providências nº 0005125-61.2009.2.00.0000- doc. anexo).

E ao final observou que ´o art. 2º, § 3º, da EC nº 41, manteve esse benefício

(o acréscimo de tempo ficto de 17%), dentro do regime jurídico por ela

estabelecido´.

O Conselho Nacional do Ministério Público trilhou idêntica vereda

acentuando, ademais, a respeito da omissão da Emenda Constitucional n.

47/05 que:

´(...) não obstante a última das Emendas tratadas não mencione

expressamente a questão relativa ao 17%, o benefício instituído como forma

de composição aos que se encontravam em regime de transição, pela

Emenda Constitucional nº 20/98 produziu seus efeitos, incorporando-se ao

patrimônio jurídico de seus destinatários, efeitos estes, por sua vez, cobertos

pelo manto protetivo da garantia constitucional do direito adquirido´ ( Pedido

de Providencias nº 2.001/2010-79- doc. anexo.).

Concorre a esse raciocínio a premissa que indica a contagem de tempo de

serviço como vantagem pro labore facto, consoante exposto nesse

venerando acórdão.

Destarte, a adição de 17% (dezessete por cento) originalmente prevista no §

3º do art. 8º da Emenda Constitucional n. 20/98 deve ser aplicada à contagem

de tempo para fins de aposentadoria voluntária ainda que os demais

requisitos da jubilação tenham experimentado modificações posteriores

(como as provocadas pelas Emendas Constitucionais n. 41/03 e 47/05),

inclusive no tocante à disciplina dos vários aspectos inerentes à aposentação

(proventos, cálculo, paridade etc.), porque cuida esse acréscimo de tempo

ficto de uma compensação, como ressaltado no venerando acórdão do

Conselho Nacional do Ministério Público:

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31

´O bônus de 17% de tempo de serviço configurou, à época da edição da EC

20/98, forma de compensar, para os membros da magistratura e do Ministério

Público do sexo masculino, os prejuízos que sofreram em decorrência do

aumento do tempo de serviço exigido para a aposentadoria no cargo.’

E esse acréscimo é aproveitado no requisito objetivo de 20 (vinte) anos de

efetivo exercício no serviço público (art. 6º, II, Emenda Constitucional n.

41/03), aumentado para 25 (vinte e cinco) anos (art. 3º, II, Emenda

Constitucional n. 47/05), porque respeita ao mesmo elemento (tempo de

serviço).

Nem se alegue que o Supremo Tribunal Federal deu entendimento diverso à

questão. Decisões monocráticas proferidas foram impugnadas pelos

competentes recursos, pendentes de julgamento (RCL 10.823; MS

31.229). A outra decisão invocada pelo Tribunal de Contas é isolada e foi

tomada por maioria de votos apenas no âmbito da colenda 1ª Turma do

Excelso Pretório, não refletindo o entendimento consolidado da Corte.” (fls.

40/54, parecer no pt. 34.319/19, aprovado por r. decisão de 03.05.19, fl. 55).

Também por tais argumentos a Ilustrada Procuradoria-Geral da República -

que opinou pelo indeferimento da Reclamação 10.823 por falta de hipótese paradigma -

ao se pronunciar sobre o mérito do MS 31.299 opinou pela concessão da segurança,

ante ao direito líquido e certo do impetrante em se aposentar, de acordo com as regras

da EC 47 e com a aplicação do abono temporal de 17%:

“Com efeito, o art. 93, VI, da Carta Política assegurava aposentadoria

especial aos magistrados, de ambos os sexos, aos 30 anos de serviço e 5

anos de judicatura, sem exigência de idade mínima. A Emenda Constitucional

nº 20/98, a pretexto de “reformar a Previdência”, trouxe modificações

substanciais às regras de aposentadoria e determinou, no âmbito assinalado,

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32

a incidência da sistemática geral, segundo as disposições do art. 40, da

CF/88, estabelecendo, todavia, regras de transição.

Passou-se a exigir dos magistrados [e, da mesma forma, dos membros do

Ministério Público e do Tribunal de Contas - art. 8º, § 3º, EC20/98] 35 anos de

contribuição, se homens, e 30 anos, se mulheres, tendo o legislador atribuído

um acréscimo de 17% ao tempo de serviço - exercido pelos integrantes de

sexo masculino das mencionadas carreiras até a publicação da Emenda

Constitucional nº 20/98 - de forma a minimizar os efeitos das novas regras,

mais gravosas.

Evidencia-se o caráter transitório da norma, voltada, exclusivamente, a

viabilizar a mudança de regime jurídico, equalizando eventuais distorções,

com eficácia plena e aplicabilidade imediata. Assim, ao regular a situação –

específica, in casu, de determinadas categorias – exauriu-se, perdendo a

vigência.

Conforme bem ressaltou o Conselho Nacional de Justiça, retomando

ensinamento de Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, 4ª ed., São

Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, tomo I, p. 8), trata-se de norma

temporalmente uno incidente, ou seja, “regra jurídica para classe de um caso

só” - daí ser impossível falar em norma posterior “revogatória” ou restritiva do

direito assegurado na transição.

Nesse contexto, a EC 20/98 foi suficiente a incorporar, ao patrimônio jurídico

dos magistrados do sexo masculino e demais destinatários da norma que se

encontravam em efetivo exercício, o acréscimo de 17% ao tempo de serviço

prestado nos limites do anterior regime previdenciário. Trata-se, em verdade,

de um ato jurídico perfeito, idôneo a conferir plena legitimidade ao direito

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33

adquirido de computar o referido acréscimo, insuscetível de posterior

subtração.

Do exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL opina pela concessão da

ordem, nos termos assinalados.”

Aliás, de mesma posição manifestação do Presidente do E. Tribunal

de Justiça Paulista (e neste ponto com ela se concorda), em posicionamento

acolhido pelo E. Órgão Especial da Colenda Corte (j. 10.09.20, processo

57.348/2020; DJE, caderno administrativo, 11.09.20, pg. 30):

“As modificações constitucionais e legislativas que incidiram sobre a matéria

previdenciária, especificamente no que diz com o regime próprio de

previdência social, nada trouxeram de novo no que se refere à antiga

discussão acerca da previsão constante da Emenda Constitucional nº

20/1998, no sentido de acrescer 17% ao tempo de serviço prestado por

magistrados homens que ingressaram na carreira até 16/12/1998.

Por isso, enquanto não transitar em julgado a decisão do Supremo Tribunal

Federal nos autos da Reclamação n. 10.823, mantém-se hígida a decisão

proferida pelo Conselho Nacional de Justiça no Pedido de Providências n.

0005125-61.2009.2.00.0000 que, ao interpretar o artigo 8º, § 3º, da Emenda

Constitucional n. 20/1998, considerou que o acréscimo de 17% ao tempo de

serviço prestado por aqueles que ingressaram até 16/12/1998 constitui direito

adquirido e se incorporou ao patrimônio de tais magistrados, qualquer que

seja o momento da aposentação.

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34

A resposta à consulta apresentada pela Secretaria da Magistratura é uma só:

deve ser mantida a sistemática de aplicação da norma contida no artigo 8º, §

3º, da EC n. 20/1998 aos magistrados que ingressaram na carreira até

16/12/1998, mesmo que não tenham preenchido os requisitos para

aposentação até a data da vigência da EC nº 41/2003. Destaque-se, por

importante, que há decisão pendente perante a Corte Suprema e situações

jurídicas consolidadas, decorrentes da boa-fé e de fato consumado.” (TJ/SP,

PROCESSO DIGITAL Nº 2020/00057348).

Do exposto, é de se concluir que cabente a bonificação de 17% sobre

o tempo de serviço havido até a EC 20 (reproduzida pela EC 41) para os

membros do Ministério Público do sexo masculino, ainda que obtenham o termo

ad quem para a aposentação com regras havidas por noveis normas

constitucionais.

Não se trata de regra atinente ao direito à aposentação. E sim de

tempo de serviço acrescido, em definitivo, por típica disposição de conteúdo

transitório, ao patrimônio dos beneficiados pela norma.

Como corolário, tempo ficto premial acrescido para acesso à

aposentação, mesmo efeito deve haver para a concessão do abono

permanência, que tem por pressuposto a fruição das condições para a

aposentadoria:

“2. O impetrante é magistrado estadual desde 04.01.1984. Nessa data já tinha

tempo de serviço a averbar, para todos os fins, o que foi feito, de acordo com

os apontamentos do próprio Tribunal de Justiça.

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35

Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 20/98, possuía 29

anos, 7 meses e 11 dias de serviço público. Em cumprimento ao disposto

no artigo 2o , § 3o , da referida Emenda, foram agregados 17%, por força

de decisão proferida pelo Conselho Nacional de Justiça, no Pedido de

Providências n° 0005125- 61.2009.2.00.0000, em 03.08.2010.

Ato contínuo, o impetrante requereu ao Presidente do Tribunal de Justiça a

recontagem do seu tempo de serviço, a implantação imediata do abono de

permanência e o cálculo dos valores atrasados. A Diretoria de Gerenciamento

Funcional da Magistratura - 1, Serviço de Estudo e Aplicação de Legislação -

DGFM-2.1, fez outros cálculos para fins do abono de permanência e de

tempo de serviço, concluindo que o impetrante cumpriu todos os requisitos

para a aposentadoria voluntária, com proventos integrais.

Quanto ao requerimento do abono de permanência, a Assessoria da

Presidência entendeu, por parecer proferido pelo Exmo. Dr. Alcides Leopoldo

e Silva Júnior, que apesar de preenchidos os requisitos para aposentadoria

voluntária, propunha o indeferimento dos demais pedidos, ao fundamento de

que a Emenda Constitucional n° 47/05 não mencionou o direito ao referido

abono, devendo tal benefício ser pago somente quando o impetrante

completasse 53 (cinqüenta e três) anos de idade.

Tal parecer foi acolhido integralmente pela Presidência do Tribunal de Justiça,

em 13.12.2010. Sustenta o impetrante que tal ato é ilegal, porque o direito ao

abono de permanência nasce no mesmo momento em que o servidor

preenche os requisitos para a aposentadoria voluntária, que no caso em

apreço se deu em 02.03.2009.

...

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36

4. O abono de permanência, assim como a isenção da contribuição

previdenciária, é beneficio ou incentivo instituído ao servidor público, de

modo geral, para permanecer em sua atividade pública, a despeito do

preenchimento dos requisitos legais - gerais ou transitórios - para a

aposentadoria.

Preenchidos os requisitos constitucionais, nasce ao servidor o direito

subjetivo à aposentadoria voluntária, percebendo seus proventos da ativa. No

mesmo átimo, o servidor que tiver interesse em permanecer na sua função

pública tem o direito subjetivo ao abono de permanência, constituindo

benefício ao servidor que não se aposenta quando satisfaz os requisitos

legais à aposentadoria voluntária.

...

6. Com base em tais fundamentos, concede-se a segurança, para

reconhecer o direito líquido e certo do impetrante ao abono de

permanência, desde guando completou todos os requisitos para a

aposentadoria.” (TJ/SP, Mandado de Segurança n° 0018696-

07.2011.8.26.0000, Órgão Especial, segurança concedida por v.u.).

III – DO COMPUTO DO TEMPO DE ADVOCACIA

PELOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Sem prejuízo dos argumentos já lançados no item anterior, aplicáveis à

espécie porquanto há aqui, igualmente, tempo ficto incorporado ao patrimônio

dos membros do Ministério Público (de ambos os sexos), de se relembrar que a

contagem desse tempo – recepcionado pela EC 20 como tempo efetivo de

contribuição, até superveniência de lei regulamentar – tem por pressuposto leis

específicas, d´antes cá já mencionadas, e que permitiam o carregamento do

tempo de advocacia em até 15 anos, para fins de aposentadoria (arts. 50, § 2º, da

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37

Lei 8.625 e 181 § 2º, da LC 734/93, com idêntica previsão no art. 231, § 1º, da LC

75/93).

Há uma ratio para isso. Conquanto que em exercício privado, a

advocacia, justamente erigida a atividade essencial à Justiça, tem inexorável

função pública.

Função pública, não cargo público.

Essa questão veio muito bem explicada em voto (vencedor) do

Desembargador Paulista Roberto Mac Cracken:

“No que diz respeito à natureza pública do serviço de Advocacia, a doutrina

lançada pelo Professor José Afonso da Silva: ´(...) a advocacia não é apenas

uma profissão, é também um munus, é a única habilitação profissional que

constitui pressuposto essencial à formação de um dos Poderes do Estado: o

Poder Judiciário' (Curso de Direito Constitucional Positivo, 21 Ed. São Paulo:

Malheiros, 2002, pág. 580). (o grifo não consta do original)

Paulo Lobo, na sua consagrada obra ´Comentários ao Estatuto da Advocacia

e da OAB´, 5a edição, segunda tiragem, 2010, Editora Saraiva, São Paulo,

pág. 28, bem deixa lançado que: ´Contudo, sem embargo da natureza não

estatal de sua atividade, imprescindível para assegurar-lhe a independência

diante do próprio Estado, o Estatuto equipara-a a serviço público, em suas

finalidades.´ (o grifo não consta do original).

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38

Na verdade, ao menos o período pleiteado pelo requerente, deve ser

considerado como serviço público, na medida em que o Advogado participa

necessariamente da Administração Pública da Justiça. Claro resta, portanto,

para o fim almejado, o reconhecimento da atividade do Advogado, em

especial no tempo pleiteado, respeitado o regime contributivo, como de

natureza de serviço público.

Verdade inquestionável é que o serviço prestado pelo Advogado é de

natureza pública, não estando este obrigado, para tanto, a fazer parte dos

quadros estatais, pois, como se sabe, se toda atividade estatal é atividade

pública, nem toda atividade pública é rigorosamente estatal.

Atente-se para esse ponto, portanto: se assim não fosse, não haveria

justificativa para um Advogado privado vir a integrar os quadros do Poder

Judiciário que não pela via normal de acesso ao cargo público, que é o

concurso. Somente o Advogado pode vir a integrar o Quinto Constitucional na

sua classe e não outro operador do direito.

Não se pode, pois, nem se deve confundir exercício de serviço público com

cargo público. O Advogado privado exerce aquele que é o que exige o inciso

III do art. 6o da EC n. 41/2003.

Por força de deveres institucionais, em favor, inclusive, de toda a sociedade,

é que a lei confere a natureza de serviço publico à Advocacia, não se

olvidando que a atividade é legitimada, inclusive, no que diz respeito à

natureza social, por convênio celebrado por anos com a Digna Procuradoria

Geral do Estado, atualmente com a Nobre Defensoria Pública.

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39

O Colendo Superior Tribunal de Justiça, nos autos de recurso em mandado

de segurança n° 1.275 - RJ - 91.0018673-2, onde constou como recorrente a

Ordem dos Advogados do Brasil Seção do Estado do Rio de Janeiro e

impetrado o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Rio de

Janeiro, que foi devidamente provido, de Relatoria do Douto e Nobre Ministro

Gomes de Barros, julgado em 05 de fevereiro de 1992, constou,

expressamente, em trecho da ementa e do voto do Culto Ministro Relator,

respectivamente, que:

´A advocacia é serviço público, igual aos demais, prestados pelo Estado.´

´A advocacia é, pois, serviço publico, da mesma natureza que os demais

serviços prestados pelo Estado´.

A posição do Colendo Superior Tribunal de Justiça (a advocacia é serviço

público), de uma vez por todas, de forma insofismável, define a natureza de

tal nobre e indispensável atividade. Mais ainda, de rigor constar que o

Colendo Órgão Especial do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São

Paulo, por votação unânime, nos autos do Mandado de Segurança n° 62.490-

0/9, de São Paulo, tendo como impetrante a Ordem dos Advogados do Brasil

- Seção de São Paulo e impetrado o Nobre Conselho Superior da

Magistratura desta Egrégia Corte, datado 10 de novembro de 1.999, de

relatoria do Douto e Culto Desembargador Gildo dos Santos, em trecho do

seu voto, expressamente, fez constar que:

´A advocacia, além dos processos em que os profissionais atuam, tem muito

de preventiva, na orientação de pessoas físicas e jurídicas, de modo que se

há de compreender, por isso, que a legislação ampara o ato de colher

´informação útil ao exercício da atividade profissional´, examinando autos

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40

judiciais, em cartório, sempre que esteja presente qualquer servidorj ainda

que somente para expediente interno, isto é, aberto áo público, mas, sim, ao

advogado que necessitar, certo que a advocacia é serviço público (STJ - RT

687/187).´ (o grifo não consta do original)

Além do mais, o supra referido v. Acórdão do Colendo Superior Tribunal de

Justiça (RMS 1.275-RJ), que reconhece a advocacia como serviço público,

conforme acima detalhado, vem sendo adotado em v. Acórdãos deste

Egrégio Tribunal de Justiça como fundamentação, ao menos em parte, de r.

Arestos como da apelação n° 7.204.460-3, da Colenda Décima Quarta

Câmara de Direito Privado, julgado em 07 de maio 2008, da apelação n°

7.234.158-7, da Colenda Décima Nona Câmara de Direito Privado, julgado

em 13 de outubro de 2008 e a apelação n° 013.7966-84.2009.8.26.0100, da

Colenda Décima Nona Câmara de Direito Privado, julgado em 16 de maio de

2011.

...

Em tal contexto, com todas as vênias, não Consta da Constituição Federal

qualquer elemento norteador que, porventura, pudesse inferir a exclusão do

exercício da Advocacia do elenco dos serviços de natureza pública. Pelo

contrário, a interpretação sistemática conduz ao entendimento de que,

quando o legislador constituinte cravou a expressão ´efetivo exercício de

serviço público´, não apartou a atividade do Advogado atuando, em

consonância com os artigos 5 o , "caput", e 133 da Constituição Federal,

artigo 77 da Lei Complementar n° 35/79 (LOMAN) e artigo 133 da Lei Federal

n° 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), normas estas recepcionadas pela

Constituição Federal de 1988.

...

Nesse sentido, o tempo de exercício de advocacia deve ser considerado

como tempo de serviço público para todos fins próprios, sendo oportuno

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41

registrar trecho do Parecer n° 11/2006, do Colendo Tribunal de Contas do Rio

Grande do Sul, de 20 de junho de 2006, firmado pelo Auditor Substituto de

Conselheiro Alexandre Mariotti que, com precisão, destacou:

Ementa: ´Emenda Constitucional n° 41/2003. Estabelecimento de critérios

administrativos para efeito de fixação de proventos de aposentadoria. Ainda

que se admita que, ´no sistema democrático não há, a rigor, solução única

correta´, é ´irrenunciável a busca da melhor interpretação´. Natureza

estatutária da relação entre servidor público e Estado. Possibilidade de

modificação do regime jurídico do servidor público, na forma da lei, com efeito

imediato, exceto quando esbarrar em norma constitucional que o vede. Dever

do Estado, entretanto, de assegurar, em nome da segurança jurídica, da boa-

fé e da proteção da confiança, uma transição razoável, que não frustre as

expectativas de direito mais próximas de se concretizarem. Limites ao campo

de ação do intérprete. Conclusões. Parecer: (...) A primeira diz com a

consideração, como tempo de ´efetivo exercício no serviço público´, nos

termos do inciso III do art. 6o da Emenda Constitucional n° 41/2003, do tempo

de exercício de advocacia anteriormente averbado como tempo de serviço

público, nos termos de legislação específica que o considerava para todos os

efeitos legais. A aparente complexidade da questão se desfaz, para efeitos

práticos, na medida em que o Supremo Tribunal Federal já enfrentou hipótese

semelhante, pacificando entendimento no sentido da ´existência de um direito

adquirido à contagem de tempo, inconfundível com o direito à aposentação´

a partir do julgamento do Recurso Extraordinário n° 82.881-SP, que ficou

assim ementado: Servidor público estadual. - Caracterização de tempo de

serviço público; direito adquirido. - Estabelecido, na lei, que determinado

serviço se considera como tempo de serviço público, para os efeitos nela

previstos, do fato inteiramente realizado nasce o direito, que se incorpora

imediatamente no patrimônio do servidor, a essa qualificação jurídica do

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42

tempo de serviço, consubstanciando direito adquirido, que a lei posterior não

pode desrespeitar. Recurso extraordinário conhecido, mas desprovido. -

Votos vencidos. (STF, Tribunal Pleno, RE 82881/SP, Relator Min. XAVIER DE

ALBUQUERQUE, Relator p/ Acórdão Min. ELOY DA ROCHA, julgamento em

05/05/1976. Publicações: DJ 19- 01-1976, pp-00031. Ement., vol-01043-01,

pp-00152. RTJ, vol-00079-01, pp-000268. Grifou-se). A caracterização, pelo

Supremo Tribunal Federal, da qualificação jurídica do tempo de serviço como

direito adquirido do servidor público, pode-se ainda acrescentar, como

reforço, que o art. 4o da Emenda Constitucional n° 20/1998 já havia

assegurado a contagem, como tempo de contribuição, do ´tempo de serviço

considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria, cumprido

até que a lei discipline a matéria´, ressalvada a hipótese de tempo fictício, de

que aqui não se trata. Por tais razões, parece descaber reparo à parte inicial

da conclusão da letra ´e´, de que o tempo de exercício da advocacia

averbado como tempo de serviço público, nos termos da lei, pode ser

aproveitado para os fins do inciso III do art. 6o da Emenda Constitucional n°

41/2003." (os grifos não constam do original)” (TJ/SP, Mandado de Segurança

n° 0190125-08.2012.8.26.0000, Tribunal Pleno, segurança concedida por

maioria, j. 11.12.13).

Justamente por isso, de antanho, editado o Assento CPJ 46 (de

24.01.96), recomendando o reconhecimento do tempo de advocacia, até o

máximo de quinze anos, para todos os fins.

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43

O E. Tribunal de Contas da União, em recente decisão (conquanto que

não transitada em julgado, e ainda que com limitação temporal não aplicável6)

afirmou o direito de Magistrado do Trabalho em ver somado ao seu tempo de

contribuição, para fins de aposentadoria, de até quinze anos de advocacia, lapso

comprovado por certidão da OAB e sem recolhimento de contribuição

previdenciária (TCU, processo TC 012.621/2016-1, j. 29.08.18; embargos de

declaração apostos pela AGU rejeitados em 07.08.19).

De mesmo teor as decisões do C. Supremo Tribunal Federal:

“Ementa

Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo.

Servidor público municipal. Averbação do tempo de serviço de advocacia

anterior à EC nº 20/98. Possibilidade. Ofensa a direito local. Reexame de

fatos e provas. Impossibilidade. Precedentes.

1. O Supremo Tribunal Federal, no exame do AI nº 727.410/SP, concluiu pela

possibilidade da contagem do tempo de serviço prestado como advogado e

estagiário, para fins de aposentadoria e disponibilidade no cargo de

Procurador Municipal (Lei 10.182/86), haja vista que “o art. 4º da Emenda

Constitucional 20/98, ao estabelecer regra de transição, admite que o tempo

de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria,

cumprido até que a lei discipline a matéria, seja contado como tempo de

contribuição”. (Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo

890.269 SÃO PAULO, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 25.08.15).

6 O art. 4º da EC 20/98 não limitou à sua vigência o tempo de serviço ficto previsto em Lei, e sim

reconheceu sua validade até que lei regulamentasse a hipótese, o que se deu, conforme aqui já mencionado, com a Lei 10.887/04.

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44

“O SENHOR MINISTRO GILMAR MENDES (RELATOR): O agravante não

deduz argumentação capaz de alterar o resultado da decisão impugnada.

Como bem salientado pela decisão ora agravada, o art. 4º da Emenda

Constitucional 20/98, ao estabelecer regra de transição, admite que o tempo

de serviço considerado pela legislação vigente para efeito de aposentadoria,

cumprido até que a lei discipline a matéria, seja contado como tempo de

contribuição. Assim, tendo em vista que a Lei municipal n. 10.182/86 admite a

contagem do referido período – 25.3.1980 a 24.3.1981 (na condição de

estagiário) e 26.6.1981 a 24.3.1982 (na qualidade de advogado) – para fins

de aposentadoria, não merece amparo a pretensão do recorrente.” (Agravo

Regimental no Agravo de Instrumento 727.410 SÃO PAULO, Rel. Min.

Gilmar Mendes, j. 20.03.12).

No mesmo sentido, STF: 1- ARE 1024173, Relator(a): Min. EDSON

FACHIN, julgado em 22/08/2017, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-

188 DIVULG 24/08/2017 PUBLICADO EM 25/08/2017; 2 - ARE 824.426,

Relator(a): Min. Carmen Lucia, julgado em 19/08/2013; 3 - RE 612.521/MG,

Relator Ministro Ricardo Lewandowski, DJe 15.6.2010; 4 – MS 34.401, Relator

Ministro Marco Aurélio, Sessão Virtual de 19.6.2020 a 26.6.2020.

Verte-se, do exposto, que o exercício de advocacia, por até 15 anos,

deve ser considerado como tempo de serviço dos membros do Ministério Público,

e recepcionados como tempo de contribuição, valendo para a aposentação e

concessão de abono permanência, independente ao recolhimento da contribuição

previdenciária, postando-se como termo ad quem a Lei 10.887/04, conforme

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45

escorreita decisão exarada no pt. 125.196/06 (marco temporal igualmente

aplicável ao tempo de advocacia).

A toda evidência isto não implica em rechaçar a validade de tempo de

advocacia posterior à Lei 10.887/04, que deve ser considerado mediante a

comprovação do recolhimento de contribuição previdenciária.

IV – DO COMPUTO DO TEMPO DE ESTÁGIO

PELOS MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Sem prejuízo dos argumentos já lançados nos item anteriores, também

aplicáveis ao fato agora em comento, de mesma feita tempo ficto incorporado ao

patrimônio dos membros do Ministério Público (de ambos os sexos), de se

relembrar que a contagem desse tempo – recepcionado pela EC 20 como tempo

efetivo de contribuição, até superveniência de lei regulamentar – tem por

pressuposto lei específica e que permitia o carregamento do tempo de estágio,

para fins de aposentadoria (art. 194 da LC 734/93).

In verbis:

“Computar-se-á, para todos os efeitos legais, o tempo de serviço prestado na

qualidade de funcionário público, o tempo de atividade privada e o de

estagiário de direito.” (art. 194 da LC 734/93).

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46

Na norma citada a motivação do r. Assento CPJ 53 (de 12.06.96), que

recomendou o reconhecimento do tempo de estágio em direito, comprovado por

certidão da OAB, como tempo de serviço público, para todos os fins.

De se dizer que o r. Assento CPJ 62 (de 16.08.12) preservou as

situações jurídicas consolidadas pelos r. Assentos CPJ 43 e 63, de maneira que a

suspensão desses últimos, a partir da data da edição do primeiro Assento, não

pode desconstituir o direito adquirido, que não se confunde com o exercício do

direito à aposentação.

Trata-se de tempo ficto recepcionado, como tempo de contribuição,

pelo art. 4º da EC 20, com termo ad quem na Lei 10.887/04, consoante acertada

decisão exarada no pt. 125.196/06.

De se acrescer que o Supremo Tribunal Federal já assentou que o

tempo de estágio em direito deve ser considerado para fins de aposentadoria no

Regime Próprio de Previdência Social, se previsto (como prevê a Lei Orgânica do

Ministério Público de São Paulo) na norma de regência da carreira, consoante se

infere dos julgamentos do: 1- Agravo Regimental no Agravo de Instrumento

727.410 SÃO PAULO, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 20.03.12); 2- Agravo

Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo 890.269 SÃO PAULO, Rel.

Min. Dias Toffoli, j. 25.08.15; 3- ARE 824.426, Relator(a): Min. Carmen Lucia,

julgado em 19/08/2013; 4- ARE 1024173, Relator(a): Min. EDSON FACHIN,

julgado em 22/08/2017, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-188

DIVULG 24/08/2017 PUBLICADO EM 25/08/2017.

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47

De igual teor decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal

Superior do Trabalho (essa lavrada em recurso ordinário manejado em mandado

de segurança tirado contra ato de Presidente de Tribunal Regional Federal):

"PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. MAGISTRADA FEDERAL.

ATIVIDADE DE SOLICITADORA ACADÊMICA.CONTRIBUIÇÃO.

RECOLHIMENTO. DESNECESSIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL

20/98. Admite-se o cômputo do tempo de serviço em favor de magistrados

que exerceram antes da investidura a advocacia ou atuaram como

solicitadores sem a obrigatoriedade do recolhimento das contribuições

exigidas pelo INSS para fins de averbação do referido tempo laboral. - Com o

advento da Emenda Constitucional nº 20 de 1998, o sistema previdenciário

tornou obrigatório o recolhimento das contribuições para fins de contagem de

tempo de serviço, resguardando, entretanto, as situações já consolidadas. -

As alterações na Lei Previdenciária não podem retroagir para alcançar fatos

anteriores a ela, em face do princípio do tempus regit actum. - Recurso

Especial improvido." (REsp 627.472, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, DJ

01.07.2004, p. 282)

“Com o advento da Emenda Constitucional nº 20 de 1998, o sistema

previdenciário tornou obrigatório o recolhimento das contribuições para fins de

contagem de tempo de serviço, resguardando, entretanto, as situações já

consolidadas. In casu, verifica-se que a recorrida faz jus ao direito ao

cômputo do tempo de serviço na advocacia ou na atividade de solicitador

acadêmico, posto que desempenhou as referidas atividades no período de

09.04.80 a 08.09.80 e de 02.08.81 a 31.12.92, sem a exigência de qualquer

contraprestação pecuniária, podendo o tempo de advocacia ser perfeitamente

comprovado mediante a prova da inscrição na OAB e certidões emitidas por

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48

cartórios judiciais. Urge, ainda, ressaltar que, à época em que foi exercida a

referida atividade, não era obrigatória a filiação à Previdência Social, devendo

aplicar-se a legislação vigente naquele período.

Semelhante questão fora julgada por esta Corte, quando o renomado

tributarista Sacha Calmon Navarro Coelho, à época também Juiz Federal,

requereu a averbação de tempo de serviço prestado como estagiário em

escritório de advocacia, sem recolhimento das devidas contribuições. O voto-

condutor do relator, Min. Américo Luz, reformou o acórdão proferido pelo

Tribunal Regional da 1ª Região, que tinha entendido que "o serviço que

estagiário tenha prestado em escritório de advocacia sem relação de

emprego e sem ter recolhido contribuições previdenciárias não pode ser

computado para fins previdenciários". Assim, considerou o referido tempo se

serviço prestado para fins de aposentadoria, restando o acórdão assim

ementado: "PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO

POR ESTAGIÁRIO EM ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA.

RECONHECIMENTO. CONTAGEM PROVA TESTEMUNHAL. Prova material

comprovada, na espécie, a impossibilidade de produzi-la, a carreada aos

autos, documental e testemunhal, mesmo não sendo contemporânea a

atividade exercida, cujo tempo se quer contar, e válida na hipótese, tanto

mais pelas peculariedades que o caso encerra, bem como pela certidão de

fls. 19, que goza de fé pública. Recurso provido. " (REsp. 5241, DJ

09/03/1992).” (STJ, RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 17.683

- MG 2003/0238107-2, 6ª Turma, Rel. Min. Paulo Medina, j, 26.04.05).

“RECURSO ORDINÁRIO. RECONHECIMENTO, PARA FINS DE

APOSENTADORIA, DO TEMPO DE SERVIÇO COMO ADVOGADO E

ESTAGIÁRIO ANTERIOR À MUDANÇA CONSTITUCIONAL OPERADA

PELA EC 20/98. MAGISTRADO. DIREITO ADQUIRIDO. REGÊNCIA DO

TEMPO DE SERVIÇO E SEUS EFEITOS PELA LEI VIGENTE QUANDO DE

SUA PRESTAÇÃO. Até a EC 20/1998 era admitido pela ordem jurídico-

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49

constitucional o cômputo do tempo de serviço para fins de aposentadoria,

sendo prescindível a comprovação de recolhimento das contribuições

previdenciárias para averbação do tempo laboral (antiga redação dos arts. 40,

III, ‘c’ e 93, VI, da CF). Portanto, antes da alteração constitucional pela EC

20/1998, o direito à aposentadoria era possível com o implemento da

condição tempo de serviço. O advento da EC 20/1998 trouxe profunda

alteração no regime previdenciário, substituindo o critério de tempo de serviço

pelo tempo de contribuição, passando-se, assim, a ser imprescindível a

comprovação de recolhimento das contribuições para fins de contagem de

tempo de serviço, mediante certidão do INSS, órgão competente para atestá-

lo. Nesse sentido, devem ser resguardadas as situações já consolidadas, não

podendo a alteração jurídico-constitucional previdenciária retroagir para

alcançar fatos anteriores a ela, sob pena de ofensa ao direito adquirido (art.

5º, XXXVI, CF). Vale dizer, o tempo de serviço anterior à EC 20/1998, sem as

devidas contribuições, não pode ser desconsiderado, para fins de

aposentadoria, em respeito ao princípio do tempus regit actum. Registre-se

que não se trata de reconhecimento a direito adquirido a regime anterior à

aposentadoria, o que não se admite, segundo o STF. A lei nova,

efetivamente, pode alterar os critérios exigidos para implementação da

aposentadoria. Contudo, essa premissa não se confunde com o

reconhecimento de determinado tempo que se realizou antes da alteração,

segundo as normas vigentes ao tempo de sua prestação. Nesse mesmo

sentido, precedentes do STF, STJ, TCU e outros Tribunais. Recurso de

revista conhecido e desprovido. (RO - 12600-40.2012.5.17.0000, Redator

Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 02/12/2013, Órgão

Especial, Data de Publicação: DEJT 13/12/2013).

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50

De mesmo jaez r. decisão do E. Tribunal Regional Federal da 2ª

Região:

“ADMINISTRATIVO. MAGISTRADO. REVISÃO DO CÔMPUTO DO TEMPO

DE SERVIÇO. DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. ATO NULO.

INAPLICABILIDADE. TEMPO DE EXERCÍCIO DA ADVOCACIA ANTERIOR

AO ADVENTO DA EC 20/98. CÔMPUTO PARA FINS DE APOSENTADORIA.

COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES

PREVIDENCIÁRIAS. DESNECESSIDADE. DECISÃO DO PLENÁRIO DO

TCU 966/2002. PRECEDENTES. 1. Afigura-se inaplicável o prazo

decadencial de que trata o art. 54 da Lei 9.784/99, abarcado pela sentença

recorrida, eis que não se aplica a atos como o de ADMINISTRATIVO.

MAGISTRADO. REVISÃO DO CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO.

DECADÊNCIA. ART. 54 DA LEI 9.784/99. ATO NULO. INAPLICABILIDADE.

TEMPO DE EXERCÍCIO DA ADVOCACIA ANTERIOR AO ADVENTO DA EC

20/98. CÔMPUTO PARA FINS DE APOSENTADORIA. COMPROVAÇÃO DE

RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.

DESNECESSIDADE. DECISÃO DO PLENÁRIO DO TCU 966/2002.

PRECEDENTES. 1. Afigura-se inaplicável o prazo decadencial de que trata o

art. 54 da Lei 9.784/99, abarcado pela sentença recorrida, eis que não se

aplica a atos como o de União tem reconhecido aos magistrados, para as

situações constituídas antes da Emenda Constitucional nº 20/98, o cômputo

de tempo de advocacia, para efeitos de aposentadoria e disponibilidade,

mediante a apresentação da certidão da OAB, sendo que com o advento da

aludida Emenda, o tempo de serviço prestado em qualquer atividade

profissional só poderá ser computado se acompanhado das respectivas

contribuições, em face da introdução explícita dessa nova sistemática no

campo previdenciário nacional (TRF-4ª. Região, AC 199971000226506, DJ de

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51

21/05/2003). 7. Recurso e remessa desprovidos.” (TRF-2 - REEX:

200951010028032, Relator: Desembargador Federal POUL ERIK DYRLUND,

Data de Julgamento: 08/02/2012, OITAVA TURMA ESPECIALIZADA, Data de

Publicação: 23/02/2012).

Portanto, o tempo de estágio em direito, e não só na própria Instituição,

deve ser considerado como tempo de serviço dos membros do Ministério Público

e recepcionado como tempo de contribuição, valendo para a aposentação e

concessão de abono permanência, independente ao recolhimento da contribuição

previdenciária, postando-se como termo ad quem a Lei 10.887/04, conforme

acertada decisão dada no pt. 125.196/06.

V – CONCLUSÃO

De todo o exposto, verifica-se que continuam aplicáveis aos membros

do Ministério Público as normas de transição, trazidas com a Emenda

Constitucional nº 20, atinentes à contagem ficta do tempo de advocacia e estagio,

até a superveniência da Lei regulamentadora (Lei 10.887/04), bem como o abono

de 17% de tempo de serviço, havido até a EC Constitucional nº 20 (com teor

reproduzido pela Emenda Constitucional 41).

Tais direitos (contagem dos tempos de advocacia e estágio, bem como

o abono temporal de 17%) devem ser mantidos, inclusive em sua aplicação às

condições da Emenda 47 (para aqueles que satisfizeram as condições em sua

vigência), que se operou, por força dos arts. 4º, § 9º, 5º, § 2º, 10, § 7º e 20, § 4º

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52

da Emenda Constitucional 103, até a publicação da EC Estadual 49/20 e da Lei

Complementar Estadual 1.354/20), bem como para aqueles que terão a

aposentação reguladas pela EC Estadual 49/20 e pela Lei Complementar

Estadual 1.354/20, tanto para fins da própria aposentadoria como para a

concessão de abono permanência, e isso porque se tratam de situações jurídicas

imediatamente incorporadas ao patrimônio dos beneficiários, aderindo à

contagem de tempo de serviço de forma imutável.

De se ressaltar mais uma vez, e ao final, que tais disposições não

sofreram qualquer mutação com a superveniência do art. 25, 3º, da Emenda

Constitucional nº 103, porquanto a vedação à contagem ficta ali prevista não

significou criação de novel regra jurídica, e sim mera reprodução, como

interpretação autêntica, de norma existente desde a Emenda Constitucional nº 20

(art. 10, § 4º), ao que deve a ela se dar interpretação conforme, quer seja, de que

a vedação à contagem ficta não se aplica a normas transitórias de índole

constitucional que trouxeram vantagem pro labore factio e incorporada ao

patrimônio dos destinatários, aplicando-se ai a regra do tempus regit actum, assim

protegendo-se o direito adquirido e a segurança jurídica.

.

São Paulo, 15 de setembro de 2020.

PAULO PENTEADO TEIXEIRA JUNIOR

Presidente da Associação Paulista do Ministério Público