a anatomia do corpo humano através da arte

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XIII Encontro Nacional de Educação em Ciências Actas A anatomia do corpo humano através da arte Wallace Lira 1 Karla dos Santos Guterres Alves 2 Professor de Artes e Marketing do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas e especialista em Arte-Educação. 1 Pedagoga do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas e mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências na Amazônia pela Universidade Estadual do Amazonas. 2 [email protected] 1 [email protected] 2 Resumo: O estudo pretende estimular o ensino da ciência através da história da arte, utilizando conhecimentos anatômicos baseados em manifestações artísticas, tendo o corpo humano como tema. O público alvo serão professores da Educação Básica, tendo como estratégia uma oficina com o tema: “A anatomia do corpo humano através da arte”. Pretende-se desenvolver atividades teórico-práticas com estratégias apoiadas na história da arte, a arte e a linguagem do corpo e a ciência e o corpo. A proposta pretende despertar o interesse pelo ensino de ciências por meio da arte, utilizando a história da arte como alternativa para o ensino. Palavras Chave: Anatomia do corpo humano, Ciência e arte, História da arte Introdução A relação entre a ciência e arte tem sido pouco valorizada no ensino. O homem enquanto ser imagético, retém a imagem e reproduz esteticamente suas representações mentais, capturadas em sua relação com o mundo. Estas percepções se processam em um contexto histórico, científico e cultural que fornece os referenciais inspiradores para a produção artística. Tanto a Biologia quanto a arte utilizaram-se do corpo como objeto de estudo, buscando compreender os mistérios da anatomia humana através da ciência e revelando-os através da arte. Este trabalho tem como objetivo contribuir para a compreensão do binômio arte-ciência, contextualizando o conceito de corpo nas diversas fases da história da arte. Esta proposta pretende romper com as concepções cristalizadas e reducionistas a respeito do conhecimento da ciência através da arte, tão presente nas escolas. Para tanto, elaborou-se uma proposta de oficina que pretende relacionar o universo científico e o artístico-cultural, estimulando a criação de propostas inovadoras que aliem os conhecimentos biológicos a histórica da arte e da ciência através dos tempos. 1285

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Page 1: A anatomia do corpo humano através da arte

XIII Encontro Nacional de Educação em Ciências Actas

A anatomia do corpo humano através da arte

Wallace Lira1 Karla dos Santos Guterres Alves2

Professor de Artes e Marketing do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas e especialista em Arte-Educação.1

Pedagoga do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas e mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências na Amazônia pela Universidade Estadual do Amazonas.2

[email protected] [email protected]

Resumo:

O estudo pretende estimular o ensino da ciência através da história da arte, utilizando conhecimentos anatômicos baseados em manifestações artísticas, tendo o corpo humano como tema. O público alvo serão professores da Educação Básica, tendo como estratégia uma oficina com o tema: “A anatomia do corpo humano através da arte”. Pretende-se desenvolver atividades teórico-práticas com estratégias apoiadas na história da arte, a arte e a linguagem do corpo e a ciência e o corpo. A proposta pretende despertar o interesse pelo ensino de ciências por meio da arte, utilizando a história da arte como alternativa para o ensino.

Palavras Chave: Anatomia do corpo humano, Ciência e arte, História da arte

Introdução

A relação entre a ciência e arte tem sido pouco valorizada no ensino. O homem enquanto

ser imagético, retém a imagem e reproduz esteticamente suas representações mentais,

capturadas em sua relação com o mundo. Estas percepções se processam em um contexto

histórico, científico e cultural que fornece os referenciais inspiradores para a produção

artística.

Tanto a Biologia quanto a arte utilizaram-se do corpo como objeto de estudo, buscando

compreender os mistérios da anatomia humana através da ciência e revelando-os através da

arte.

Este trabalho tem como objetivo contribuir para a compreensão do binômio arte-ciência,

contextualizando o conceito de corpo nas diversas fases da história da arte. Esta proposta

pretende romper com as concepções cristalizadas e reducionistas a respeito do

conhecimento da ciência através da arte, tão presente nas escolas. Para tanto, elaborou-se

uma proposta de oficina que pretende relacionar o universo científico e o artístico-cultural,

estimulando a criação de propostas inovadoras que aliem os conhecimentos biológicos a

histórica da arte e da ciência através dos tempos.

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A anatomia do corpo através da arte

Pela falta de uma relação mais lúdica entre o corpo físico e a sua representação imagética

tem-se negligenciado aspectos essenciais na interface entre ciência e arte, menosprezando-

se representações recheadas de informações simbólicas, culturais, míticas e ideológicas. O

corpo tem sido um enigma que, tanto a ciência quanto a arte tentam desvendar. Novaes

(2003, p.8) descreve a evolução dos estudos sobre ciência e corpo:

[...] a relação ciência-corpo não é nova. Pelo menos desde a Renascença, o corpo do homem vem sendo desvelado. Primeiro foi a pele, em seguida outras camadas, chegando-se aos músculos e tendões. Por fim, o crânio é aberto, pondo a nu o chamado “órgão da alma”, “regulador central desta máquina de ossos e músculos”. O desenvolvimento das artes mecânicas abre para o mito do homem artificial, inspirado no homem-máquina de La Metrie. Vaucanson constrói “anatomias moventes”, reproduções mecânicas da respiração, da digestão, movimentos do corpo, e até mesmo mecanismos da circulação do sangue. Merleau-Ponty chega a evidenciar uma coincidência de interesses, no século XVII, entre o autômato, nas experiências científicas, e a perspectiva, nas artes: tanto o autômato como a perspectiva davam a ilusão de realidade. Depois de muitas experiências na anatomia, os séculos XIX e XX são dominados pela teoria celular na biologia e pela patologia celular na medicina. Por fim, a ciência decifra o código genético, e o século XXI entra de maneira irreversível na biotecnologia.

O estudo da anatomia, em seu processo histórico de construção, evoluiu muito. Buscando a

compreensão da origem da anatomia, Queiroz (2005, p.3) destaca:

A palavra Anatomia é derivada do grego anatome (ana = através de; tome = corte). Dissecação deriva do latim (dis = separar; secare = cortar) e é equivalente etimologicamente a anatomia (Gray, 1977; Gardner, Gray e O’Rahilly, 1978). Contudo, atualmente, Anatomia é uma disciplina ou campo de estudo científico, enquanto dissecação é uma técnica usada para estudar a estrutura do corpo (Moore, 1990). Anatomia Humana é a ciência que estuda as estruturas do corpo humano sendo considerada como fundamento para as ciências médicas (Didio, 1974) e para tal utiliza-se como material de ensino e estudo o cadáver humano que, contribuiu e tem contribuído através dos séculos, com os ensinamentos e aprendizagem das maravilhas do corpo humano.

Apesar do termo anatomia originariamente tratar de processos dissecativos, seu campo de

estudo ampliou-se, propiciando a compreensão da estrutura corporal não somente

biologica, mas considerando aspectos históricos, filosóficos, éticos e estéticos. Para

Dangelo; Fattini (2007), a anatomia é a ciência que estuda o corpo humano, nomeando e

descrevendo sua estrutura constituinte macro e microscopicamente. A arte surge, neste

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sentido, para expressar os conhecimentos anatômicos de um corpo que vive e que se

constitui através da manifestação de seu conhecimento sobre si mesmo.

Grandes gênios de nossa civilização representaram artisticamente conhecimentos que nem

sempre podem ser traduzidos literalmente através de textos racionais e técnicos. A estética

da ciência se corporifica através do cientista-criador que, como todo artista, tem o sonho de

produzir o inusitado, de descobrir caminhos ainda não percorridos, dando significado a

fatos e coisas que o senso comum naturaliza.

A representação da anatomia do corpo na história da arte

Tendo como referencial teórico os estudos de Capra (2008); Barreto e Oliveira (2006); Eco

(2004); De Masi (2003); Novaes (2003); Sennett (2001); e as revistas Bravo! (2008) e

Colóquio, Educação e Sociedade (1994), além de sites especializados e periódicos

científicos sobre anatomia e história da arte, realizou-se uma breve retrospectiva histórica

da representação da anatomia humana na história da arte.

O homem da Pré-história foi por muito tempo, equivocadamente, considerado incapaz de

produzir registros estéticos. No período Paleolítico, o homem era um observador atento dos

animais e da natureza em si, caracterizando-se principalmente pela representação

animalista ou zoomórfica.

Através da arte parietal ou rupestre o conhecimento de anatomia era expresso através do

conhecimento dos animais. O homem paleolítico cria pinturas com a noção de movimento

bem realista. Como exemplo existe Lascaux, na França; Foz Côa, em Portugal e a Caverna

de Altamira, na Espanha.

Figura 2: Pinturas parietais e rupestres

Lascaux (França) Foz Côa (Portugal) Altamira (Espanha)

Fonte: http://artescnsf.wordpress.com/2008/06/22/historia-arte-gestos-parte-i/

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No registro da anatomia humana, a Vênus de Willendorf expressa a racionalidade do

homem do paleolítico e seus conhecimentos sobre a anatomia feminina, representada

através do exagero nas formas.

Figura 1: Vénus de Willendorf. Estatueta do período Paleolítico, Vale do Danúbio, Áustria.

Fonte: http://ruodger.wordpress.com/portfolio/estudos/paganismo/

No Neolítico, o animalismo é substituído pela figura humana, passando a fazer parte do

universo representativo. Através de uma pintura esquemática, a anatomia do homem é

representada de forma universal e generalizável. As pinturas do sítio arqueológico do

Piauí, no Brasil, caracterizam esta fase.

Figura 3: Arte Rupestre. Piauí, Brasil.

Fonte:http://3.bp.blogspot.com/_hbaKawTe_B8/R1TqLbhfAGI/AAAAAAAABQk/I2sRiWMAz_Y

/S300/Foto_capa1b_logo.jpg

Na História Antiga, o universo corporal é traduzido através das imagens e da escrita,

ampliando e reforçando o discurso imagético.

Na Mesopotâmia, as esculturas expressavam um corpo rígido, com poucos detalhes

anatômicos. Utilizavam-se da lei da frontalidade, colocando cabeças, pernas e pés de perfil

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e o busto de forma frontal. O olho é destacado, pois é o referencial anatômico de diálogo

com mundo.

Figura 4: Pinturas do Palácio de Mari.

Fonte: http://historiarte.net/descubrimientos/mari.html

No Egito, esculpiam-se faraós e deuses com aparência serena e corpos desproporcionais

visando a demonstração de poder e força. Na pintura, utilizava-se a lei da frontalidade,

com corpos esquemáticos, rígidos e sem representação de movimento.

Nas tumbas a arte surge a partir do imaginário a respeito da eternidade da alma. A

preocupação religiosa estava relacionada ao destino após a morte, pois o corpo íntegro

garantiria a continuação da vida. Os egípcios desenvolveram conhecimentos aprofundados

de anatomia e fisiologia. Conheciam ossos, juntas, músculos e tendões sem violar o corpo,

pois não poderiam danificar os corpos ao mumificá-los ou embalsamá-los. Queiroz (2005)

Figura 4: Mumificação

Fonte: http://sabedoriaevida.zip.net/images/EGITO11A.JPG

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Na Grécia, a arte é antropocêntrica, tendo o corpo humano como foco. As esculturas

representam a idealização do divino através do corpo humano, transcendendo aos aspectos

corpóreos.

A escultura grega Laocoonte é um exemplo dessa visão, onde a representação da tensão da

musculatura ocorre em oposição ao rosto calmo e sereno. Winckelmann (1797) citado por

Eco (2004)

Figura 5: Escultura Laocoonte e seus filhos, Museu do Vaticano - Roma

Fonte: http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-

BR&sa=1&q=Laocoonte&btnG=Pesquisar+imagens&aq=f&oq=

Em Roma, a arte era utilitarista e voltada aos interesses do estado. Representando poder, o

rosto de autoridades era esculpido em bustos de forma realista.

Utilizavam a pintura mural, onde os corpos eram mitificados e divinizados nas paredes das

casas, tendo Pompéia e Herculano como exemplos desta prática.

Figura 6: Fresco de uma casa de Herculano

Fonte: http://fotocache01.stormap.sapo.pt/fotostore01/fotos//e9/86/1b/2715361_5Huma.jpeg

Figura 7: Busto de Alexandre, o Grande. Museu Capitoline de Roma.

Fonte: http://www.discoverybrasil.com/guia_grecia/grecia_expansao/grecia_alexandre_grande/index.shtml

Na Idade Média a anatomia do corpo é transfigurado, passando a ser subjetiva e proibida.

Com base no sofrimento, os corpos são pálidos e desproporcionalmente alongados,

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geralmente encobertos, como nas pinturas Bizantinas. A influência da igreja impede o

conhecimento científico do corpo, que passa a ser estudado através da comparação da

anatomia humana com os órgãos dos animais.

Figura 8: Mosaico italiano: A imperatriz Teodora e sua corte, 547.

Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Theodora_mosaik_ravenna.jpg O homem moderno se instaura no Renascimento, a partir do retorno aos ideais greco-

romanos e o resgate do corpo como objeto da produção artística. O retrato surge como

expressão de identidade e a ciência recupera sua autonomia, tendo como diferencial o

artista cientista.

Como representante principal desta fase, temos Leonardo da Vinci (1452-1519) que com

genialidade representou a anatomia humana. Estudou o corpo e suas proporções e seus

movimentos, órgãos internos, o fluxo sangüíneo, a reprodução e o desenvolvimento

embrionário. Desenhou estruturas anatômicas de forma diagramática, representando

demonstrações do funcionamento das diversas partes do corpo. Capra (2008). Andreas

Versalius (1514 -1564), médico, considerado “Pai da Anatomia” cria o primeiro tratado

anatômico, associando texto e ilustrações belíssimas do corpo humano.

Figura 9: Wallpaper de desenhos sobre a anatomia de Da Vinci - Filipe Acosta

Fonte: http://www.thoo.com.br/wp_artistas/wp_anat_davinci.htm

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Michelangelo Buonarroti, outro expoente como artista cientista, deixou na Capela Sistina

uma verdadeira aula de anatomia, com ossos, nervos, músculos, vísceras, artérias e órgãos

humanos camuflados em meio a cenas bíblicas. Barreto e Oliveira (2006)

Figura 10: A Criação de Adão. Michelangelo, 1511. Capela Sistina, Vaticano, Itália.

Fonte: http://novahistorianet.blogspot.com/2009/01/o-renascimento-cultural.html

No Barroco, período altamente religioso, o corpo passa a ser representado de forma

contorcida e dramática, com a teatralização nas obras. Caravaggio representa a pintura que

busca a união entre o profano e o sagrado em um corpo comum. Rembrandt foi exímio no

uso do claro e escuro, sendo grande conhecedor de anatomia, utilizando-se deste tema em

seus quadros. Como exemplo, a pintura “A aula de anatomia do Dr. Tulp”, sobre a

dissecação de um cadáver.

Figura 11: A aula de anatomia do Dr. Tulp. Rembrandt, 1632.

Fonte: http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/view/906

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No período Neoclássico ocorre à volta ao corpo idealizado, retratado a partir da inspiração

Greco-romana. O corpo é representado com a palidez da pele ligada a textura das

esculturas clássicas, com uma imagem realista.

Figura 13: A morte de Marat. Jacques-Louis David, 1793.

Fonte: http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-

BR&sa=1&q=A+morte+de+Marat&btnG=Pesquisar+imagens&aq=f&oq=

O modernismo é a quebra dos paradigmas das escolas anteriores. Até então o registro da

realidade era função direta do pintor, com seus conhecimentos sobre anatomia. Agora é a

fotografia e o cinema que capturam esta realidade. A ciência está com os impressionistas,

pois o foco passa a ser o estudo da luz e seus efeitos na pintura, destacando-se Claude

Monet, Edgard Degas, Édouard Manet, Paul Cêzanne.

Ao não precisar ater-se ao corpo enquanto realidade, o corpo passa a ser representado

como subjeção. Surgindo assim, movimentos como impressionismo, cubismo, surrealismo,

dadaísmo, expressionismo, entre outros.

Figura 14: Os banhista. Paul Cézanne, 1890.

Fonte:http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-BR&q=Paul+C%C3%AAzanne+-+Os+banhistas&sa=N&start=18&ndsp=18

Figura 15: O Abaporu. Tarsila do Amaral, 1928.

Fonte: http://observarte.zip.net/

Figura 16: Les Demoiselles D’Avignon. Pablo Picasso,

1907 .

Fonte:http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-BR&sa=1&q=cubismo&btnG=Pesquisar+imagens&aq=f&oq=

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No Pós-modernismo um novo olhar para a anatomia humana redefine a noção de corpo. O

computador cria imagens de cunho artístico, unindo ciência, tecnologia e arte. O corpo

passa a ser um produto, com padrões estabelecidos de beleza e estética de cunho midiático.

O photoshop cria corpos “perfeitos” e mundializa padrões estéticos idealizados, visando o

consumo de um corpo inexistente e inatingível. A taxidermia transforma-se em plastinação

e, apesar de sofrer críticas e questionamentos de cunho ético, Gunther von Hagens busca a

articulação da anatomia humana e a arte.

Figura 17: Pop Art

Fonte: http://4.bp.blogspot.com/_W655jD7l9Fo/SPoj_JqTC2I/AAAAAAAAAF4/iWICHeaVBlo/s400/pop.jpg

Figura 18: Gisele

Bündchen em campanha publicitária

da Grendene

Fonte: http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-BR&sa=1&q=propaganda+corpo&btnG=Pesquisar+imagens&aq=f&oq=

Figura 19: Plastinação, Gunther von Hagens.

Fonte: http://images.google.com.br/images?gbv=2&hl=pt-BR&q=Gunther+Von+Hagens&sa=N&start=0&ndsp=18

O ensino da anatomia através da arte

Ao trabalhar o ensino de Biologia através da história da arte como agente facilitador da

aprendizagem, desmistifica-se o conceito de corpo como informação única e estereotipada.

A representação do corpo é construída culturalmente e a escola, ao trabalhar com crianças

e adolescentes, deve levar em consideração este fato. Os alunos conhecem e representam o

mundo através do corpo e, ao estudá-lo na escola, descorporificam-se, distanciando-se do

que os constitui enquanto ser. Este “corpo” estudado na escola não deve ser somente o

corpo biológico, mas deve refletir a pluralidade de perspectivas, contradições,

experimentações, definições e expressões éticas e estéticas que integram a evolução do

pensamento anatômico em todas as épocas, que é irredutível e complexa.

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XIII Encontro Nacional de Educação em Ciências Actas

No ensino da anatomia humana, dialeticamente ciência e arte podem constituir um “corpo”

de conhecimentos. Através da história da arte, resgatar-se-ia problemáticas (e soluções

originárias e características de cada época a respeito da estética na ciência em relação a

corporeidade e a anatomia humana. Segundo Bachelard (1996, p.51) “É preciso então

reavivar a crítica e pôr o conhecimento em contato com as condições que lhe deram

origem, voltar continuamente a esse ‘estado nascente’ que é o estado de vigor psíquico, ao

momento em que a resposta saiu do problema.”

Utilizando-se de forma multidimensional a história da arte, o estudo sobre o corpo recupera

seu sentido originário, ou seja, torna-se uma descoberta, um desafio em busca do

desvelamento da trajetória das hipóteses e descobertas da humanidade a respeito do

homem e sua constituição anatômica.

Em sala de aula, o professor deve instigar as perguntas, a problematização da compreensão

de corpo nas diversas épocas históricas e da estética enquanto expressão do conhecimento

anatômico em todos os tempos. O uso da imagem e da representação do conhecimento do

corpo no passado promoverá uma releitura da trajetória das concepções e conceitos

anatômicos através dos conhecimentos científicos e estéticos do presente.

Metodologia

Este trabalho é uma proposta de oficina de Ciência e Arte e tem como público alvo

docentes da Educação Básica. Através de um levantamento bibliográfico sobre a evolução

do conhecimento anatômico através da história da arte, estabeleceu-se uma linha temporal,

baseada no grau de representatividade das obras artísticas em cada época, sendo o eixo

norteador das seguintes etapas:

HISTÓRIA DA ARTE: Exposição oral, com recursos multimídia, sobre a representação

anatômica do corpo nos diversos períodos da história da arte. Esta etapa será enriquecida

através da exibição de vídeos, imagens e impressos.

ARTE E LINGUAGEM DO CORPO: Serão realizadas atividades de observação e

vivências corporais e sinestésicas onde, através da mimese se reproduzirá o tema proposto

pelo artista. Também serão realizadas reproduções e releituras de esculturas com o uso de

materiais alternativos. Para a realização das atividades serão utilizadas obras consagradas

dos diversos períodos da história da arte e seus principais representantes, envolvendo tanto

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pinturas quanto esculturas, em interface com as descobertas científicas inerentes aos

mesmos períodos.

CIÊNCIA E CORPO: Serão realizadas atividades de reconhecimento da anatomia do

corpo através de imagens e representações gráficas veiculadas em produções de origem

científica (atlas do corpo humano. livros, vídeos científicos, e outros.), estabelecendo-se

um paralelo entre o desenvolvimento dos conhecimentos anatômicos e a arte. Serão

realizadas atividades envolvendo pintura, desenho, escultura, colagem, entre outros.

Ao final da oficina, os participantes farão uma avaliação das atividades propostas e darão

sugestões para sua aplicação no contexto escolar.

Resultados Esperados

A oficina pretende levar aos docentes uma nova percepção do ensino de ciências através da

arte, baseando-se na história da arte em paralelo com a trajetória da evolução do

conhecimento científico. Pretende-se despertar o interesse por uma ciência dinâmica e

lúdica, onde a arte traduz o conhecimento científico esteticamente.

É imprescindível que os professores percebam que a ciência não tem fim em si mesma e

pode dialogar com outras áreas do conhecimento. No caso específico do estudo anatômico

do corpo humano, é preciso repensar as práticas pedagógicas desenvolvidas até então,

diversificando abordagens, metodologias e materiais, utilizando a história da arte como

uma alternativa para a melhoria na qualidade do ensino.

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