a afilhada rebelde, daniela pinheiro - piauí

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E ra o final de uma manhã de brisa fri a e so l quente, no início de se - tembro, quando o presidente do sindi cato do s tax istas de São Paulo, Na - talício Bezerra da Silva, tomou o micro- fone e se dirigiu à restrita pl ate i a: "Vamos re speitar, he in? Nada ele grac inh as . Não se convida uma pessoa para vi r na casa da ge nte e a ge nte ho st il iza ." O grupo agua rd ava a chegada da presidente da Repúbli ca e ca ndi cb ta à reeleição, Dil- ma Vana Rousseff, do Partido dos Traba- lhadores, que naquele momento tinha 36 % das intenções de votos - o que a colocava em empate técn ico, no primei- ro e segundo turn os, com Marina Silva , do Partido Sociali sta Brasil eiro, c<J tap ul- tada às alturas nas pes qui sas depois da morte do cabeça ela chapa , o ex-gove rn a- dor Eduardo Carnp os, em agos t o. "Eu nJo estou preoc upado com vocês, não. Nossa categoria é respeitosa, mas pode aparecer alguém el e fora, querer aprontar, tumultu ar, va i ter", conti- nuou o sindi ca li sta , a ind a que sua preo- cupação fosse infundada, que o am bi ente estava cirurgicamente contro- lado. A imp re n sa foi espremida num pe- queno palanque. Apenas dirigentes sindi cais id enti fi cados - a maio ri a trazen- do esta mp ados no peito adesi vos com a cara ela candidat a- tinham acesso à éÍ r ea diante do palco. Populares eram vetados. Uma mu lh er, moradora de um prédi o vizinh o, foi orien tada por um segurança piauí_outubro a dar a volta no quarteirão para entrar em casa. Meia hora depois, Dilma Rousseff foi receb id a por uma audiência calor osa . A eq uipe da cand id ata film ava tudo. A menos de um mês das eleições, a campanha ela presiden te precisava se blindar de vaias, perguntas in cômodas, manif es tações pop ul ares fora do sc ript. E pi or: tinha que lidar com uma in éd ita e som bri a perspectiva nas urnas. Dentre os ele itor es, apena s 38% achavam sua ges- tão "boa ou ótima". Ainda seg undo o Da- tafolha, mais el a metade da população a cons id er ava entre reg ul ar e péss ima. Sua rejeição em São Paulo- maior colégio ele itoral do país - alcançava 47 %. Em âm bito nac ion al, 34% do ele itorad o afir- mavam não votar nela "ele jeito nenhum". Era o maior percentual nega ti vo entre os pres id enc ve i s. Desde o início ela co rrid a elei toral , pela primeira vez pa rec ia con- creto o risco el e o PT deixar o poder depois de doze anos no comando el o país. A popularidade ele Dilma Rousseff , ao chega r ao gove rno, ultrapassava os 70 % de aprovação. O cam inho entre o pedestal e a corda bamba foi curto e difu so . É difíc il determin ar a pedra que pavimentou a rota do declíni o: se as decisões econô mi cas ou a in experiência política ela gove rn ante; se a onda ele mudança que ve io ;I na s manifestaçõ es de junho ou o t·clnper;l- mento in sular el a mandat(iri a; se a oj eri ;r .a aos rituais el a política ou a t·c lll ali v:l de illl - pnmlr a própria mar ca ao gove n 10 ; se a persistê ncia ela cri se internacional ou o es pectro el e seu padrinho político, o ex- pres id ente Luiz Inácio Lula ela Sil va, que lh e fez sombra durante todo o proce sso. Uma relação pec uli ar qu e - como di sse ce rta vez o ministro Gilberto Carva lh o- aind a va i merecer est ud os acadêmicos. Para es ta reportagem, foram ouvid as 26 pessoas 1 i gaclas à pres id ente ou ao Partido dos Trabalhadores. A maior ia pediu anonimato. Dentre os procma- dos, apenas Dilma Rousseff e o minis- tr o da Casa C ivil , Aloizio Merca cl an te, se negaram a falar com piauí. A o ass umir o mandato, Dilma Rous- se ff -a ge rentona, a mãe el o Progr a- ma el e Aceleração el o Crescimento -tinha em mente o que queria faze r: dar continuidade às políticas ele inclusão so - cial el o gove rn o Lula e impl ementar uma age nda desenvolvimentista, el as grandes obras el e infra es trutura, ass unto que sem- pre lhe foi caro, para mover a economia. O país tinha cresc id o em ritmo chin ês e parecia recuperad o elo imp ac to ela cri se global el e 2008. Além di sso, hav ia a pers- pec ti va el os ga nh os el o pré-sal e ela vitri- ne ela Copa el o Mundo. A prime ira equ ip e ministerial tinh a a Gira da d upl a. Dos 37 min is tro s, quin ze l1 :1viam sid o indicados por Lul a. Entre eles, C uido Man tega, mantido na Fa - i' .e 11 d;1, c Fe rn ando Haclclacl, na Ecl uca- < .J ío, co lll vistas à sua ca mpanha ele itoral para a Prefei tura de São Paulo. O ex- pr esi dente também pediu para scaurar José Sérgio Cab ri elli no co mall(lo d:1 Petrobras. Dilma ai nda he rd ou boa par- te dos d iri gentes de esta tai s e autarq ui as, e até a ch efe do escri tório ela Pres idência em São Paulo, a então desconhec id a Rosemary Noronha . E acomodou as no- meações ele ocasião fe it as pelos partid os el a col igação. De sua lavra, empla cou as ministras mulheres e o ex-prefe it o de Belo Horizonte, o ami go Fe rn an do Pi- mentel , no Desenvo lvimen to. Desde que Lula in ven tou a can did atu - ra de sua ex-mini st ra das Minas e Energia e da Casa C ivil , o que ele via como qua- lid ade em Dilma, uma fatia elo petismo e elos partidos ali ados enxer gava como defei- to intransponível: o voluntarismo, as op i- ni ões fo rtes, o temperamento irasc ível, a in ex pe ri ência política e até o vocab ul ári o prolixo, ele fal as lon gas e enfadon has, per- meadas ele termos técnicos. Um el os ma is próx imos interl ocutor es ele Lula di sse ter se mpre defendid o que ela precisava el e "as- sesso ria emociona l" para ser presidente. Lul a parec ia calcular que sua presen- ça ao alcance em caso de emergênc ia , a competência ge rencial ela sucessora, a boa onda na econom ia e a força do apoio el e deze sse te partidos e de mais el e 80% do Congresso Naci onal ga rantiriam um gove rno de sucesso. O resto era contor- vel. No mais, ele era o gra nd e ve ncedor el a eleição. Seu pos te havia chegado hí.

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A Afilhada Rebelde, Daniela Pinheiro - Piauí

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Page 1: A Afilhada Rebelde, Daniela Pinheiro - Piauí

E ra o final de uma manhã de brisa fri a e sol quente, no início de se­tembro, quando o presidente do

sindicato dos tax istas de São Paulo, Na­talício Bezerra da Silva, tomou o micro­fone e se dirigiu à restrita plateia: "Vamos respeitar, h e in? Nada ele grac inhas. Não se convida uma pessoa para vi r na casa da gente e a gente host il iza ." O grupo agua rdava a chegada da presidente da República e candicb ta à reeleição, Dil­ma Vana Rousseff, do Partido dos Traba­lhadores, que naquele momento tinha 36% das intenções de votos - o que a colocava em empate técn ico, no primei­ro e segundo turnos, com Marina Silva, do Partido Socialista Brasileiro, c<J tapul­tada às alturas nas pesquisas depois da morte do cabeça ela chapa, o ex-governa­dor Eduardo Carnpos, em agosto.

"Eu nJo estou preocupado com vocês, não. Nossa categoria é respeitosa , mas pode aparecer alguém ele fora, querer apron tar, tumultuar, aí va i ter", conti­nuou o sindica lista , ainda que sua preo­cupação fosse infundada, já que o ambiente estava cirurgicamente contro­lado. A imprensa foi espremida num pe­queno palanque. Apenas dirigentes sindicais identi fi cados - a maioria trazen­do estampados no peito adesivos com a cara ela candidata- tinham acesso à éÍ rea diante do palco. Populares eram vetados. Uma mulher, moradora de um prédio vizinho, foi orien tada por um segurança

piauí_outubro

a dar a volta no quarteirão para entra r em casa. Meia hora depois, Dilma Rousseff foi recebida por uma audiência calorosa . A equipe da cand idata filmava tudo.

A menos de um mês das eleições, a campanha ela presiden te precisava se blindar de vaias, perguntas incômodas, manifestações populares fora do script. E pior: tinha que lidar com uma inédita e sombria perspectiva nas urnas. Dentre os eleitores, apenas 38% achavam sua ges­tão "boa ou ótima". Ainda segundo o Da­ta folha, mais ela metade da população a considerava entre regular e péssima. Sua rejeição em São Paulo- maior colégio eleitoral do país - alcançava 47%. Em âmbito nacional, 34% do eleitorado afir­mavam não votar nela "ele jeito nenhum". Era o maior percentual negativo entre os presidenciáveis. Desde o início ela corrida elei toral , pela primeira vez parec ia con­creto o risco ele o PT deixar o poder depois de doze anos no comando elo país.

A popularidade ele Dilma Rousseff, ao chegar ao governo, ultrapassava os 70% de aprovação. O cam inho entre o pedestal e a corda bamba foi curto e difuso. É difícil determinar a pedra que pavimentou a rota do declínio: se as decisões econômicas ou a inexperiência política ela governante; se a onda ele mudança que veio ;I lOll ~l nas manifestações de junho ou o t·clnper;l­mento insular ela mandat(iria; se a ojeri;r.a aos rituais ela política ou a t·clll aliv:l de illl­pnmlr a própria marca ao goven 10 ; se a

persistência ela crise internacional ou o espectro ele seu padrinho político, o ex­presidente Luiz Inácio Lula ela Silva, que lhe fez sombra durante todo o processo. Uma relação peculiar que - como disse certa vez o ministro Gilberto Carvalho ­ainda va i merecer estudos acadêmicos.

Para es ta reportagem, foram ouvidas 26 pessoas 1 igaclas à presiden te ou ao Partido dos Trabalhadores . A maioria pediu anonimato. Dentre os procma­dos, apenas Dilma Rousseff e o minis­tro da Casa C ivil , Aloizio Merca cl an te, se negaram a falar com piauí.

A o assumir o mandato, Dilma Rous­seff - a gerentona, a mãe elo Progra­ma ele Aceleração elo Crescimento

-tinha em mente o que queria faze r: dar continuidade às políticas ele inclusão so­cial elo governo Lula e implementar uma agenda desenvolvimentista, elas grandes obras ele infraes trutura, assunto que sem­pre lhe foi caro, para mover a economia. O país tinha cresc ido em ritmo chinês e parecia recuperado elo impac to ela crise global ele 2008. Além disso, havia a pers­pec ti va el os ganhos elo pré-sal e ela vitri­ne ela Copa elo Mundo.

A primeira equ ipe ministerial tinha a Gira da dupla. Dos 37 min istros, quin ze l1 :1viam sido indicados por Lula. Entre eles, C uido Mantega, mantido na Fa­i'.e 11 d;1, c Fernando Haclclacl, na Ecluca­<.Jío, colll vistas à sua campanha eleitoral

para a Prefei tura de São Paulo. O ex­presidente também pediu para scaurar José Sérgio Cabrielli no comall(lo d:1 Petrobras. Dilma ai nda herdou boa par­te dos dirigentes de esta tais e autarq ui as, e até a chefe do escri tório ela Presidênc ia em São Paulo, a então desconhecida Rosemary Noronha . E acomodou as no­meações ele ocasião feitas pelos partidos ela col igação. De sua lavra, emplacou as ministras mulheres e o ex-prefeito de Belo Horizonte, o amigo Fernando Pi­mentel , no Desenvolvimento.

Desde que Lula inventou a candidatu­ra de sua ex-ministra das Minas e Energia e da Casa C ivil , o que ele via como qua­lidade em Dilma, uma fatia elo petismo e elos partidos aliados enxergava como defei­to intransponível: o voluntarismo, as opi­niões fo rtes, o temperamento irascível, a inexperiência política e até o vocabulário prolixo, ele falas longas e enfadonhas, per­meadas ele termos técnicos. Um elos mais próximos interlocutores ele Lula disse ter sempre defendido que ela precisava ele "as­sessoria emocional" para ser presidente.

Lula parecia calcular que sua presen­ça ao alcance em caso de emergência , a competência gerencial ela sucessora, a boa onda na econom ia e a força do apoio ele dezessete partidos e de mais ele 80% do Congresso Nacional ga rantiriam um governo de sucesso. O resto era contormí­vel. No mais, ele era o grande vencedor ela eleição. Seu poste havia chegado hí.

Page 2: A Afilhada Rebelde, Daniela Pinheiro - Piauí

E DEUS CRIOU A MULHER

O s pri111 ·iros 111 l'S l'~ dv 1',111'1'11111 I" ram rcdc1 1torcs. 1•. 111 p111 1C:1\ :.< '111 :1 nas, Dilme~ jií lll us lr<~ V: I :1 <JII<'

viera: vetou a distribu ição de cargos k ­derais para parl amentares ela b:1sc go­vern ista e anunciou um corte el e 50 bilhões ele rea is no Orçamento. Foi à Ch ina, visitou vizinhos latino-amer ica­nos, recebeu no Plana I to o pres idente amer icano Barack Obama. Jactava-se el e ser a primei ra mulher a di scursar na abertura da Assem bleia Geral das Na­ções Unidas. Era uma es tadi sta .

A classe média e a elite enfim reco­nheciam um rosto fam iliar: Dilma era di screta, tinha compos tura, fal ava por­tuguês sem erros de concordância, faz ia o estilo durona c pnrccia intransigente diante ele cv idê11 Ci<1 s ele corrupção. Dis­t·a11Ci;Jv;t-s ~do j ·it o I .tda de se r. Rapicla-111 ·11! ·, :1 i11q >r ·ss:io foi ca ptada pelas pl·sq11i s: Js d · opi11iJo. Em maio ele 2011, o I hop · r ·g isl rava que ela tinha 73% ele aprovac,:Jo popular.

Ainda na primeira qu adra elo ano, Dilma teve uma pneumonia e preci­sou se afastar. A bancada do PMDB apro­veitou para faze r o que melhor sabe: escambo político. Na votação elo Códi­go Florestal , ameaçou ir contra o go­verno caso não fossem atendidos os pedidos el e emendas e cargos. Em seu primeiro choque ele realidade, a pres i­den te também respondeu com ~1s ar­mas qu e melhor maneja: ameaçou demitir os ministros elo partido. Insta­lou-se a primei ra das muitas crises com a base aliada. Sem av isar Dilma, Lula desembarcou em Bras ília para acalmar os ânimos dos correligionários. Reu­ni u-se com o vice-presidente, Michel Temer, foi fotografado ao lado de José Sarney e Rena n Ca lheiros, dourou a pílula e, para alguns, atribuiu à inex­periência ela sucessora a confusão, afi­nal contornada.

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/\ 11 1<'11\:IJ',t' IIII Í('IIII t•l:11.1 : :1 !JJ:r.do po·. lt• L' l.l ·k . l)il111:1, Í' l<í.r•ico, 11:10 gosl1111. Sc 11

IÍII-Sl' :ll rop ·lad:1 por I .1d:J, 'l lqll :llllo 1·k :ICJ' ·dii ;IV: I 'S I:Jr ;qJC11 :1S :IC01 110d:111dO :1 si­IU aÇJO. O I'MDI\ acabm1 votando '111 p ·so a favor da emenda que anistiava os clcs111a­tadores, derrotando o governo. F ninguém foi demitido. Recentemente, um petista paulista resumiu o caso: "Essa inabilidade política, misturada com arrogância, mar­cou as ações dela. Como pôde achar que era liga r, ameaça r o vice e ele ia pedir desculpas? " Mas Dilma sa iu maior do episódio: era ela brigando quixotesca­mente contra os venais ela política.

Em maio, o país tomou conhecimen­to elo portentoso aumento ele patrimônio do ministro Antonio Palocci . Em apenas um ano, sua empresa de consultoria ha­via faturado 20 milhões de rea is. Na épo­ca, uma ministra disse ter ouvido da presidente : "Eu achei que fossem 3 ou 4, mas 20 é fada ."

A sa ída de Palocci da Casa Civil foi um divisor ele águas. Além de ter a con­fi ança elo empresariado mais graúdo, era ele quem negociava a votação de proje­tos e o preenchimento de cargos no go­verno. No Planalto, também acalmava o ambiente. Com ele, Dilma não precisa­va se expor às querelas brasilienses, à romaria dos parlamentares atrás ele ver­bas, às visitas de ocasião dos representan­tes do PIB. Palocci fazia bem o serviço.

No lugar dele, assumiu a senadora peti sta Gleisi Hoffmann . Ao lado ela também petista Ideli Salvatti, na articu­lação política, elas formavam, com Dil­ma, a trinca que passou a dar o tom das negociações do governo com seus alia­elos. A nomeação repercutiu ma 1 no entorno, que ficou com a impressão de que as duas eram "café com leite": não tinham pulso firme ou estofo político. Como ve rbalizou o então ministro da Defesa, Nelson Jobim , a piauí, em agos-

to de 2011: "Ideli é muito fraquinha e Gle isi nem sequer conhece Brasília."

A pres iden te tinha suas razões. Pri­meiro, não queria outro "superministro" para lhe fazer frente - Palocci era uma exceção. Até o último minuto, Lula ga­rantiu ao titular da Casa Civil que ele ficaria no ca rgo, mas Dilma sepultou a hipótese. Em público, ele ped iu dem is­são, acei ta por ela depois ele vin te dias de crise. Quis para o luga r alguém em que pudesse confiar, mas, sobretudo, mandar. Agradava-lhe ainda a icleia de va lorizar duas mulheres naqueles car­gos, antes só ocupados por homens.

Nesse momento, para vencer a tenta­ção ele dar palpites - como ele mesmo declarou-, Lula se embren hou numa maratona ele viagens internac ionais que lhe tomaram quase todo o ano ele 2011. Coincidiu com a época em que o gover­no Dilma começou a ter uma feição própria. As demissões em sé ri e deram ao marqueteiro João Sa ntana uma se­nha para colar na presidente: Dilma era a faxi neira ela corrupção.

Em se is meses , sete ministros foram ,J, .IIIilid ll·· '.t· i•. l " íi VIIl v i,] o~ r m rl r nt'ln (' i:J, d(' ill ('/ ',111.11 i d : HJ,.~ 11 11 ('; 11 /',1 1, . ·1· :1 i:1 s i11:1 1'11 \' :IJII!HI p:1ilv d:1 opilJi:J\1 pi.dJiic: J, ilil l' lll :llll t'lli l· :H'<"IIci l·ll tllll si11 :d de :d ·r-1:1. 10: 111 1' 'OS :di:Hios, () l' t'; lci i;Í de J: IXÍ11CÍf:l pn.:ss tlptudl :t :1 corn qH;:io i11crttsl:ld:1 11 :-1 máq t1i11 a do l•:s1:1do, cxpc)lldo-lhc as tri­pas. Quatro dos se is lllinistros vinham do govcmo Lula. No I'J ; comentava-se a fa­cil idade com que Dilma rifava compa­nheiros. "Dem issões por malfeito são ossos elo ofíc io", disse ela à época.

Sem Lula e sem Palocci , Dilma ia ficando mais Dilma. Em meados ele 2011, por ocasião do an iversá rio

ele 80 anos ele Fernando Henrique Ca r­doso, ela enviou um cartão de feli cita­ções cheio ele elogios ao ex-presidente tucano. O petismo estremeceu. Não bas­tasse, ela tomava providências em áreas elas quais seus antecessores mal haviam tido coragem de se aproximar: instalou a C om issão ela Verdade para esclarecer crimes da ditadura militar, assunto que Lula procrastinava, e aprovou a Lei de Acesso à Informação, acabando com o sigilo eterno ele documentos públicos.

O empresariado es tava encantado. Como havia assumido o governo com o dólar depreciado, o que prejudicava a in­dústria, Dilma Rousseff procurou bene­fici ar o setor controlando o câmbio, por exemplo. Preparava o maior pacote ele concessões da história, que daria à inicia­tiva privada um bom pedaço elas estradas, aeroportos e ferrovias elo país. Com a im­prensa, o clima era de início ele namoro.

O governo seguia em velocidade ele cruze iro quando, no final ele outubro, veio o baque: Lula foi diagnosticado com um câncer na laringe. Ela, que havia tra­tado a mesma doença hav ia pouco mais ele dois anos, ficou devastada com a notí­cia. Sem o padrinho por perto, o poder elos lulistas no Planalto foi se esvaziando. A começar pelo elo secretári o-gera l ela

Presidência, Gilberto Carvalho, e ele Marco Aurélio Garcia, assessor especial para Assuntos Internacionais, sobre os quais ela costuma dizer que "falam coi­sas que não são elo nosso governo". No Planalto, ela já era chamada ele "a tia", apodo cunhado pela velha guarda lu lista . Até hoje, não raro um estranho pode es­cu tar durante uma visita que "a tia está procura nclo" por alguém.

No fim de 2011, Dilma atingiu o maior índice de aprovação ele um presi­dente: 59% elos brasileiros consideravam sua gestão ótima ou boa. Foi o maior percentual já alcançado desde a volta das eleições diretas no país. A economia cresceu menos que no ano anterior, mas o Brasil havia criado 2 milhões ele em­pregos e superado a Inglaterra, tornando­se a sexta econom ia do mundo. O poste começava a brilhar sozinho.

Por essa época, num encontro no Pla­nalto, ela confidenciou a um ex-ministro elo governo Lula, com quem ambo~

mantêm boas relações: "Se o Lula qui­ser, a próxima é dele. É só ele me falar", di sse, referindo-se às eleições de 2014.

O St'l', lllldo :1110 dl· gowr 11o 1'11111 \'ttlll l{pido 'ÍIIOdorO COIIIO lllll :ll :d:t d1 Micl 1cl ' lc111cr. Co111 :1 pcrspt'l' il l, ,

das clcit<õcs municipais Clll otilt lhro, I ld 111 a di111inuiu a agenda de v i a gc 11 ~ t ' •,1 trancou no Pia na I to para traça r os lc 1 tll il , elo bilionário pacote de conccssõc .~ t ' lll

infraestrutura. Estava em seu <1 111hi l' t 1!1 imersa em números, cláusulas, Í11d il' l "•, percentagens, muito PowerPoi1tl.

A performance da presidente j;í t ' L I

conhecida desde os tempos elas M i11 :1.' ,. Energia: ela abria o computador, Vl' lll:t uma miríade ele estatísticas, elencava pl:1 nilhas, "espancava o projeto" - co11, , gosta de di zer- até não sobrar ele pé ll l' nhuma brecha ou dúvida. Comand:1v:1 reuniões infindáveis, em que se clebal i:1 por horas um mero ponto e vírgula. N: 1 ~ negociações elo pacote dos aeroporhJs. um ministro di sse terem passado oit o meses falando sobre aTIR-a taxa ele rc torno elos investidores. O cletalhismo en1 perrava o processo, decisões se arrastava111 e o projeto demorava a sa ir elo papel.

A essa altura, já estava evidente su ~1 ojeriza pelos rituais da viela brasiliense: reuniões com ministros, encontros com deputados, recepções no ltamaraty, fu ­xicas com a base aliada. Receber entida­des ele classe era um parto. Movimentos sociais, muito ele vez em quando. Em­presá rios tentavam, em vão, marca r au­diências na agenda sempre lotada- pelo menos para eles. Nos encontros com parl amentares, chamava atenção a falta de autonomia ele Icleli Salvatti. Ou ela respond ia às demandas dizendo que "ia ver com a pres iden te", ou chegava chu­tando a canela elos interlocutores, como um ventríloquo da chefe.

Dilma não falava nem com a bancada elo n "Para ela, a pol ítica era o mal em si. Empresário era abutre, e político era picareta. É assim que ela pensa", disse um importante dirigente elo Partido elos Tra-

Page 3: A Afilhada Rebelde, Daniela Pinheiro - Piauí

balhadnl t',\, dm:llll c um café ela manhã, no Rio. I ) ii111 :1 11:"io li berava dinheiro, di­ficultava :1 di slri ill li c.,;:lo ele cargos, não re­cebia os pol íl icos, 11 :lo respondia aos empr ·s:írios. l J111 :1sscssor ela Presidência resulllill :1s r:1zm·s do comportamento: "Ela ilcll :lv:l q11c j:í s:1bia o que eles iam pedir 011 rccl:ll ll :lr. l<111 :io, 11 <1 cabeça dela, não tin h:1 tj ll t' •:Jsl:1r lc111pu com isso."

Os c:q>ricl 1os d ·s11orlcavam o cerimo­nial elo Pal:ício do l ' l : ll~<ill o. l hna vc1., na Espanha, cl:1 q11i s f: 11.Cr c0111 pras no 10: 1 Corte lnglés, III :IS vclou a C:011 1p:1nhia de seguranças. O gn 1po prec: iso11 se escon­der atr<1s elas araras ela loja ele elcparbl­mentos. Em Londres, quis anela r el e metrô, causando rebuliço entre os segu­ranças ela Scotlancl Yarcl, que iam abrindo passagem para a com itiva brasileira. Em Washington, deixou em apuros o embai­xador Mauro Vieira porque se recusava a se sentar, durante o encontro com Barack Obama, no sa lão ele entrevistas ela Casa Branca. Depois ele muita argumentação, ela concordou. Um ex-integrante elo ceri­monial disse que era para evitar ser foto­grafada sentada- ela usava sa ia .

Aos poucos, as reuniões ministeriais também foram minguando. Desde a posse, todos os ministros hav iam sido proibidos ele falar com a imprensa. Qual­quer declaração oficial, só por meio el o porta-voz ou ela própria presidente.

Em seu governo, Lula usava os vaza­mentos ele informação para testar vá ri as

icleias. Deixava deputados fomentarem boatos ele maneira a ter um termômetro elo que pensava em fa zer - ou não fa zer. Também aprove itava os di scursos para mandar recados, responder a ataques, fazer a defesa elo governo, dar a tônica ela disputa política. Conseguia traduzir ques­tões complexas nos termos elas massas.

Com Dilma, nada di sso acon tec ia. Para ela, vazamento era apenas insubor­dinação, traição. Quem o faz ia era posto na geladeira . O senador Vita l elo Rêgo, do PiviDB el a Paraíba, perdeu um ministé­ri o porque a hipótese ele sua nomeação vazou. Testar uma icleia , só nas pesqui­sas qualitativas encomendadas pelo mar­queteiro João Santana, partilhadas com um ou dois interlocu tores. Logo se ev i­denciou que a comunicação era um em­pecilho incontornável no caso ele Dilma : ela se expressava numa sequência el e elipses ele <1rclua compreensão; suas fra­ses eram desconexas, longas, truncadas. A imprensa registrou: nascia o di/mês.

"Temos um sistema hidrológico mui­to sensível à água"; "Sempre que você olha uma criança, há sempre uma figura oculta, que é um cachorro atrás, o que é algo muito importante"; "Prec isamos cada vez ma is cooptar e captar novas fron teiras tanto na Ásia quanto no Orien­te Médio"; "Todos nós aqui sabemos que cada um el e nós escolhe - a viela faz a gente escolher - alguma elas datas em que a gen te nunca vai esquecer dessa

data." Assessores afirmam que, quando escreve, ela é clara, objetiva e focacla .

A cumulan.1-se ao redor ele Di lma his­tórias ele gritos, esculachos e rom­pantes. Mais ele uma pessoa me

contou ter visto a filha Paula repreender em público as grosserias ela mãe, extensi­vas a ministros, secretá rias, funcionários elo palácio. Um ex-ministro elo governo Lula, com quem Dilma trabalhou dire­tamente na Casa C ivil, presenciou cenas ele descontrole. "O que é perverso é que os esporros dela são sempre para quem est<1 embaixo. Ela sabe com quem pode gritar. É que nem lobisomem, sabe para quem pode aparecer", disse, irônico.

Quatro entrevistados se va leram ele conceitos elo livro O Príncipe, el e Nico­lau Maqu iavel, para definir a maneira ele Dilma lidar com o poder. Se Fernan­do Henrique queria ser admirado e Lula queria ser amado, Dilma quer ser temi­ela. Certa brutalidade seria uma manei­ra ele se fazer respeitar, um sintoma ele insegurança. "Sou uma mulher dura cercada ele hom ens meigos", Dilma aprendeu a repetir desde a campanh a ele 2010, sempre que seu temperamento era questionado. Acertos ela equipe nun­ca são comemorados, não passa m de obri gação; desculpas, sinal ele fraqueza; dúvidas, prova ele descon hecimento.

Ela costuma formar sua opinião ou­vindo pequenos grupos distintos- sem

que eles tenham conhecimento dessa comunicação estereofônica. Insiste em saber tudo o que pode dar errado, e só então se interessa pelo que pode dar cer­to. Bombardeia ele perguntas o mensa­geiro ele um projeto ou uma icleia. Faz isso uma oitava ac ima, com expressão similar à exibida quando entregou a taça ele campeões do mundo para os jogadores alemães. Os mais vulneráve is tremem. Nas discussões com a equipe, muitas ve­zes ela externa ele cara sua opinião sobre o assunto a ser tratado- o que intimida boa parte elos presentes, que se cala, ain­da mais se tiver ponto ele vista contrário. O resultado é que metade ela equipe não gosta dela e a outra metade tem medo.

"Esse método prejudicou muito por­que ninguém tinha coragem, ânimo ou saco ele se contrapor a ela. A ausência elo contrad itório fez com que ela embarcas­se em muitas canoas furadas", comentou um ex-integrante ela equipe econômica elo governo, em meados ele se tembro, durante um almoço, no Ri o. "Na econô­mica, por exemplo", disse.

E m uma manhã ele setembro, o elé­trico Roberto Kalil Filho, diretor elo Hospital Sírio-Libanês, médico ele

Dilma e Lula, es tava ele mau humor. "Hoje é bandeira vermelha", disse uma ele suas assistentes, num cód igo que indi­ca o espírito elo chefe. Amigo e responsá­vel pela saúde ele autoridades, empresários

EAKONOMICS DOS AUTORES DE FR

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e famosos, Kalil também é a ponte de vários políticos e jornalistas com a cúpu­la elo JYT. Fala frequentemente com a pre­sidente ao telefone. Dão-se muito bem porque, ele di sse, são parecidos. As con­versas costumam começar com: "Oi , como estamos de humor hoje?"

Sentado em frente ao computador, ele falava sobre a paciente e amiga. Para prova r o que di zia, chamou uma secre­tária. "Vem aqu i, quem é mais cão? Eu ou a Dilma?" A moça perguntou se po­dia falar a verdade. "É o doutor Kalil , ele é o professor dela ." Segundo o cardiolo­gista, avaliações sobre o temperamento ela presidente são a maior injustiça con­tra seu governo. "Você acha que a lg11 '•111 chega num ca rgo desses s ·11do boa zi­nha , pedindo por favor ". Jll'I'J5 1111I< JII . "Ela é inc ríve l, marav ilhosa, mas não

f\'ol6€Lí

está aqui para ficar ele nhe-nhe-nhém. É. igual a mim aqui no Sírio: o povo fala mal porque a gente cobra."

Kalil também dirige o Instituto elo Co­ração. Quando se está no comando, disse, "se a gente não mantém o tônus de doido, as coisas não anelam". "Ela é igualzinha. A gente leva no chicote porque senão não sa i nada", comentou enquanto mastigava um sanduíche de queijo. "Claro que toda pessoa como eu e ela às vezes erra na ma­neira ele se expressar, acontece." Mas eles­culpas, acrescentou, ele não cos tuma pedir: "Até porque estou certo."

Quando a conversa derivou para as ele­cisões pol íhcas e cconôm icas cl.1 pres iden­te, ele sa i11 pcL1 tangc 11lc. "P:dpitci 110 Mais Mt dicos. I•: s(>. Diss · p:1r:1 el:1 q11 ·lo i 11111;1 C'O iS: I (" llfl :lri:t J50cJ:1 :IIJ:Ii Xcl, 111 :1S l1oj t· conheço melhor o programa e acho muito

bom", afirmou. Para Kalil , se as pessoas soubessem do outro lado de Dilma, enten­deriam melhor sua gestão. "Poucas vezes vi alguém tão comprometido em mudar a vida dos pobres. Mas a Dilma é fechada. Por tudo que ela passou na vida, ela é iso­lada, é o perfil dela." Segundo ele, a "ver­dadeira Dilma" é a mulher que sai de madrugada, driblando a segurança, para andar de moto por Brasília- como havia revelado meses antes uma reportagem da Folha de S. Paulo. "Olha que ser pitoresco! Ninguém a conhece de verdade."

A maioria dos entrevistados confir­mou a impressão. Ao conversa r sobre assuntos variados, fora da Presidência, Dilma relaxa, conta casos engraçados, deixa brotar o lado leve, tem o humor afiado. Vaidosa, fi ca lisonjeada quando seu conhecimento sobre artes, música ou literatura é reconhecido. "Ela tam­bém tem uma certa coquetterie", disse­me um ex-ministro. "Mas, em geral, é muito defensiva", acrescentou.

Nas ocasiões em que se permitiu baixar as armas- foram dez - , Dilma chorou em público. "Ela sempre tratou o governo como uma grande família . E sempre no papel da mãe durona, re­pressora, que coloca de castigo o minis­tro que desobedece", comentou um ex-integrante do Ministério da Fazen­da. A exigência se es tende a ela própria. "Não posso erra r, não posso errar" é uma frase recorrente da pres idente ouvida nos corredores do Pl analto.

Perguntei a Kalil se Dilma contari a com seu voto. "Claro que não! Sou malu­fi sta! O pastor Everalclo é meu cand idat-o", respondeu, llllnttorn cn1 que a troça soou ambígua. E o qttC sc11 paciente mais G11110-so pe11sav:1 disso? "A g '111 · n:lo Gda do as­SIIItlo. O I .td :l di ;. q11 l· c11 ai11d:1 so11 do le111po dos 111;1 ~ a cos c <pw 110 di :1 q11 · ·11 l'vo lt1i r para 1111111 :111 0 :t I',V IIIc podt· co11-wrs:1r sol>rt' polli C': I", ll ':,poiHicll .

A equipe da Secretaria de Comun ica­ção Social da Presidência era obriga­ela a preparar relatórios periódicos só

para Dilma e Gleisi Hoffman, listando as besteiras cometidas pelos ministros . De­talhe: só as besteiras. D ilma não confia, não delega, não divide in fo rmação sobre o governo com o próprio time. as reu­niões, avisava aos presentes: "Nem todo mundo va i saber de tudo. A informação aqui será compartimentada. Quem tem que saber ele tudo sou eu, não vocês."

Se um ministro demitia alguém sem consultá-la, corr ia o risco ele se ver clesmo­rali zaclo, como ocorreu com Fernando Pimentel, que exonerou o secretário exe­cu ti vo Alessa nclro Teixe ira . Quando soube, Dilma repreendeu o ministro e chamou o demit ido para traba lhar no Plana lto. Da agend a elos ministros nos fin s ele semana - eles eram proibidos de de ixa r Brasília sem av is<í-la- a conver­sas de pé de ouvido entre aux iliares, ela quer saber de tudo. Não raro, tom a sa­tisfações com os envolvidos.

Há quem ve ja nesse comportamento um eco elo próprio passado. D ilma foi

torturada pela ditadura e ficou presa durante três anos. "A cabeça dela é a cabeça de célula , de aparelho, como se ainda estivéssemos na luta armada, com gente do nosso lado podendo nos trair ou gente atrás ele nós querendo nos pe­ga r", disse um ministro que passou pe­los governos tucano e petista. Segundo ele, tudo faz sentido: a preferência pelo isolamento, a autossuficiência, a eles­confiança, o controle ela informação, o hábito ele guardar grandes somas ele di­nheiro em casa "para qualquer emer­gência" ou, ainda , a mania el e dormir ele sapatos, "caso precisasse sair às pres­sas", que a acompanhou por anos. "Ela ainda é a menina elos anos 60", di sse.

E mbora o modo ele governar e o esti­lo pessoal prenunciassem ruídos, Dilma estava nas alturas quando

começou o segundo ano elo seu governo. Elogiada pela imprensa, respeitada pelos empresá rios, aprovada pelo eleitorado, temida pelos seus- chega ra a hora dr dar seu primeiro grito de independência. O poste queria luz própria. Em vez de: recuar nas medidas ele incentivo ao COII ·

sumo e ao investimento que hav iam sidn tomadas para contornar a crise global dr 2008, ela decidiu pôr o pé no acelerador.

A seu lado, Cuido Mantega funciona va como um "aperfeiçoaclor das ideia~".

Na concepção econômica ela presideuh-, va lia tudo para promover o crescimculo, proteger a indústria e o emprego, bmnhar o consumo e manter a balança comcrl'ial positiva . Um pouquinho ele inflação u:lo fa zia mal a ninguém, essa era a idci.r Dilma passou a ser acusada ele abattdn nar o tripé econômico- meta de i11llu c,;:lo, snpcr:ívit· fiscal c câ mbio fllrltt:tnl - sobre o qtt :d se snst·cntara a cshthilid.ul d:t eCOIIOIIIi:t I lOS (dliiiiOS doze :1110~ .

Cdli l'<JS :dcrlava111 p~tr:t o risC'o tl r J'IIIIIIIIV\' f lllll :l l'X Jl:III S:l!l C('OIIÍ>IIIil ':tlo,r . . seacla no endivida mento. "Ela não li g:1 va para críticas. Nunca ligou. T inha 11.1 cabeça uma ideia ele país cla ra. De fal o, ela sabe ma is ele econom ia elo que :1\ pessoas pensam, e sabe menos elo qui' ela pensa que sabe", afirmou um ex-i11 tegrante dos governos Dilma e Lula.

Na concepção da presidente, a interfc rência elo Estado na economia é crucial. Há em suas decisões um viés ideológico, ele esquerda, muito mais arra igado do que no governo Lula. A má vontade em rehl­ção à independência do Banco Central é um exemplo. Dilma costuma di zer que, no dia em que se colocar um banco priva­elo para financ iar obras de infra estrutura c programas sociais - como o Min ha Cas~ 1

Minha Viela, cujos recursos são 95% elo governo - , o país não va i ter mais nenhu­ma morad ia subsidiada para os pobres.

Guiada por suas convicções, ela baix011 as taxas de juros elos bancos estatais par~1 fomentar o crédito e obrigar as instituições pri vadas a fa zer o mesmo. No primeiro pacote de concessão das rodovias, limitou a lucratividade elas empresas. "Ela acha que é preciso controlar tudo. Caso contr<í­rio, o empresá rio ia oferecer o pior serviço

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pelo 111 :1 ior prl'<,·o, o que podia ser verdade. Mas voei- podl' conl rolar isso aumentando a concorrê11t ia , por exemplo", observou o ex-intcgrank rb cq1 1ipc econômica.

Na I' ·I mhras, fc.; z o mesmo para con­trolar a inn:l (.':lo : rc.; prc.;sou os preços dos combusl ívc.; is, a i 11da que.; a medida repre­sentasse.; 11111 b:Jq11 c.; para o caixa da esta­tal. A fin1 rk fon;ar :1 queda elo preço da eletricicL1rk, :111lcc ipo11 :1 renovação das concessões das oc racloras c d istribu ido­ras de ene rg ia , impcd i 11do-as de conti­nuar a cobrar elo consumido r a reposição elo que haviam investido. As ações elas empresas elétricas despenca r a m.

Em paralelo, Dilma lançava mão elo que a imprensa batizou de "contabilichlcle criativa": inflou as "receitas" elo governo e mascarou as" despesas" ele modo a aumen­tar artificialmente o superávit primário­dinheiro reservado para o pagamento dos juros ela dívida pública e que sinaliza ao mercado que as contas internas vão bem.

Em uma tarde na sede do Partido elos Trabalhadores, o presidente ela legenda, Rui Falcão, falava sobre as críticas à gestão econôm ica. "Por má von tade ou desinfor­mação, ela é acusada de ser intervencio­nista, mas, na verdade, ela tomou decisões que beneficiaram a população, não acio­nistas ou empresários", comentou. "Por que a grita? Porque muita gente rica, pela primeira vez, perdeu dinheiro."

À medida que Dilma ia imprimindo sua marca, parte do petismo castiço per-

dia terreno, como ocorreu nos fundos de pensão e nos bancos estatais. Em abri l de 2012, ela deu o passo mais ousado. Mandou a nova presidente ela Petrobras, Maria das Graças Foster, demitir parte ela diretoria da empresa . Três diretores ligados a três partidos foram clefenestra­clos. Um deles era Paulo Roberto Costa, responsável pelo Abastecimento. No PT,

as demissões caíram mal. Sobretudo a ele Renato Duque, da diretoria de Servi­ços e Engenharia, responsável por gran­des encomendas ele plataformas e sondas ele perfuração. Petista da corrente Cons­truindo um Novo Brasil, tendência inter­na m ais poderosa do partido, Duque fora indicado pelo ex-ministro José Dir­ceu . É bom guardar esse nome.

Ainda convalescente do tratamento contra o câncer e mergulhado na campa­nha de Fernando Haddad à prefeitura paulistana, Lula assistia ele longe ao mo­vimento. Quando vinham lhe falar mal elo governo, costumava responder com uma frase pronta: "Calma, ela vai mudar. Aquela cadeira muda as pessoas."

O Instituto Lula ocupa um sobrado de três andares no bairro do lpiran­ga, na Zona Sul ele São Paulo. De­

corado com móveis de escritório em ferro, divisórias ele fórmica e chão acar­petado, lembra as instalações de um sin­dicato. É h1 que Lula despacha desde que deixou a Presidência. O local virou tam-

bém o ponto de romaria ele empresários e políticos para se queixar de Dilma. Logo, ganhou o apelido ele "Serpentário do lpiranga". Ali, dizem, as víboras desti­lam veneno puro contra o Planalto.

Numa manhã ele agosto, um elos diri­gentes elo Instituto falava sobre o governo e as eleições vindouras. Segundo ele, Dil­ma enfrentava uma combinação de fato­res preocupante: a crise internacional, o ressentimento da el ite- que se viu divi­dindo aeroportos e tendo de pagar hora extra para a empregada doméstica - e a dificuldade de vender o próprio governo. "Gastaram meses querendo emplacar a gerentona e a faxineira. Isso pegou muito bem para a elite, mas não quer dizer nada para o povão", comentou.

Em sua avali ação, o que ganha votos são ações sociais- Dilma as tinha, mas não conseguia mostrar. Para provar o que disse, ele citou pesquisas internas elo partido evidenciando que os eleitores atribuíam a Lula programas implemen­tados por Dilma.

Nas hostes petistas , Dilma sempre foi vista como forasteira. Com passado de esquerda, fez sua trajetória no Parti­do Democrático Trabalhista, nas filei­ras caudilhistas ele Leonel Brizola. Por muito tempo- e ainda hoje - , os petis­tas fazem questão de lembrar: Brizola foi aquele que se referia a Lula como "o sapo barbudo". Petistas mais mordazes comentam que ela herdou tudo elo bri-

zoli smo, menos a qualidade: a coragem ele enfrentar a TV Globo.

No mandato de Dilma, os petistas imaginavam pôr em prática a regulamen­tação dos meios de comunicação, defen­dida com ardor pelo partido. Mas ela não chegou nem perto do assunto. Na sua ges­tão, ocorreu uma mudança significativa na distribuição de verbas publicitárias para a imprensa. No segundo mandato de Lula, o então ministro da Secretaria de Comunicação Social , Franklin Martins, irrigou pequenos jornais, rádios e blo­gueiros. Com Dilma, esses veículos per­deram dinheiro e influência.

Cobrada pelo PT, ela também ficava presa à necessidade de justificar o que não havia feito . Havia uma pressão enorme para que fosse a público defender os réus do partido no caso do mensalão. Nem Lula o fez . Os petistas se sentiam sem uma cúmplice. E Lula, às vezes, idem. Quando estourou o caso Rosemary Noro­nha- funcionária da Presidência em São Paulo, apontada como "am iga íntima" de Lula e acusada ele tráfico ele influência-, Dilma nem titubeou. "Ela mandou demi­tir na hora, não quis nem saber", contou uma ex-assessora da presidente.

A todo tempo, os petistas trazem à tona que Dilma nunca pensou , dese­jou, quis ou se preparou para ser presi­dente da República. Repetem que e la se comportava como alguém independen­te, que não havia entendido que na ver-

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O ENIGMA ELEITORAL

-Decifrem-me, ou vos devoro!

elacle era apenas parte ele um projeto político mais amplo. "Ela foi eleita para ttttt proJt·lo l'nlílt \'1 1, N: t" (· d\'b , tt \' ttt tlo I .ula , é d ·todos. lo'.l: t tllttt ·a Sl't:Í :1 t':ttt el ielata dela lli CSIII ;( , d ÍSSC-111 ' () di ri "C li ­te elo instituto I .ttla. "() qu e vai se r julgado nas urnas siio doze anos, niio quatro", concluiu.

No final ele 2012 , as queixas elos em­presários, a revolta elos parlamentares que se sentiam desprestigiados e sobre­tudo o baixo crescimento (0,9%) deram fim ao clima ele lua de mel. Na impren­sa, a presidente era criticada pelo fra­casso elas medidas para impulsionar a economia e prometia em troca um "pi­bão" para breve. O Brasil havia perdido a posição para a Inglaterra e voltado a ser a sétima economia elo mundo. O gover­no tinh<l 62% de aprovação.

P 01 1co d ·pois, :1 rev ista inglesa The t <cc mo111Í~t pediu a cabeça ele Cui­do Ma1 ttega em extensa reporta­

a 'ITI com críticas à condução ela política econômica brasileira. O "pibinho" assus­tava investidores e empresários. Durante todo tempo, o governo acrecl itou que a queda ela taxa de juros e o aumento elo crédito elos bancos oficiais implicariam um enorme incentivo ao investimento privado- que entretanto não aumentou. Ocorreu o inverso. De seu lado, Dilma respondia com evasivas e mantinha o pé firme nas diretrizes. A dificuldade ele admiti r erros é uma ele suas ca racterísti­cas mais notáveis.

Na mesma época, o prefeito ele São Paulo, Fernando Haddad, e o elo Rio, Eduardo Paes, estiveram no Planalto para tratar elo aumento elas tarifas ele transpor­te público. Mantega teve uma icleia: já que a inflação continuava próxima ele 6%, resistindo a voltar para o centro ela meta ( 4,5% ), era melhor segurar o reajus­te. A resposta veio elas ruas meses depois, quando o aumento foi enfim anunciado.

24

Em fevereiro, o "Volta, Lula" já ha­via se espalhado como gripe no inver­

tllt . 1tt. J'ilttliiS ,j · Jl l'M !II ~ .'• : I : ittlltL I':tt tl 11 ttOi tt l' dtt n- I H'v ~ íd ·tt k 11 :ts :tposl:ts ·!v i lor: ti s - c ele g:ttd t:tv: t co ttt lol •:t . o pcli sttto alittt 'ttl:t v: t o ho:tlo ·os ·tllpn.:­sários, iiiSalisfc itos, Cltgross:IV<llll o coro. Di! ma procurou I .ula c ped iu-lhe UI I\ gesto capaz de aplacar a boai'<Jria. Dias depois, durante a comemoração elo ani­versário elo PT, Lu la fez seu papel: antes ele encerrar sua fala, como se cumprisse uma tarefa, finalmente mencionou a reeleição ele Dilma. O resultado foi dú­bio. Parte ela legenda achou que era um erro antecipar a campanha, já que ain­da havia quase dois anos ele governo pela frente. Outros entenderam ter sido uma maneira ele fortalecer o projeto ele poder num momento delicado. A verda­deira opinião ele Lu la ficou restrita a amigos e familiares. "Lu la é igua l à Bí­blia, cada um interpreta como quer", disse José Eduardo Dutra, ex-presidente elo PT e atual diretor ela Petrobras.

Na casa elo próprio Lula, o anúncio da reeleição de Dilma repercutiu mal. A ex­primeira-dama Marisa Letícia achou um absu rdo, uma ingratidão, uma traição que Dilma não tivesse perguntado a Lula, em nenhum momento, se ele queria ser candidato- conforme a presidente havia confidenciado para um ex-ministro, ami­go ele ambos, um ano antes. A família fi­cou magoada. E especialmente Lula. '1,

Desde que deixara o Alvorada, Marisa Letícia sentia falta ela rotina brasiliense -as manhãs pescando no píer da Presi­dência, o entourage, os salamaleques, o poder. Dizia que Lula ainda era a única pessoa capaz de manter o país nos trilhos. Fazia coro com o Serpentário do lpiran­ga. "Ele sempre quis voltar, a Marisa que­ria que ele voltasse, os filhos queriam e boa parte elo PT também", disse-me um advogado ele renome ligado ao partido, em seu escritório, em São Paulo.

De sua parte, Dilma defendia que o mandato era dela. Deveria terminar o que hav ia começado e, como seus an teces­sores, tinha o direito à reeleição. Nada disso, no entanto, era explicitado. Em público, Lula negava a hipótese ele se candidatar, mas no privado era sempre ambíguo. Ainda que não estimulasse o boato, não movia uma palha para matá­lo na origem. Em encontros rese rvados, ele passou a critica r a presidente.

Durante todo o mandato, Dilma e Lula nunca se afastaram ou deixaram de se falar. Ele sempre foi cuidadoso na apro­ximação e nas críticas. Dava sugestões ele modo que sua interlocutora pudesse acatá­las ou não. Em vez ele dizer que ela estava negligenciando a política externa, Lula perguntava, como elo nada: "E a Africa , Dilminha? Está abandonada ... " Quando se estranhavam , um ou outro "sumia". Como relatou um auxi liar direto ela presi­dente: "Mito não telefona. Ele nunca tele­fonou, mas ele sumia. E ela, quando achava que ele estava dando declarações demais à imprensa, ou se julgava estar no caminho certo e queria preserva r-se ele ingerências externas, fa zia o mesmo."

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\Tidt :d d:t.\':tllljl:lltlt :l <il' l)tl111:t 1\lltl ~~d l vs Ltloc: tll z:tdo ·111 tl ttt cc ttlrto l'tottt ·rci;tl d · 13ras íli ;t.

N:1 ·ttl r: 1d:1. v· 'ltl-s · ·:1rl:1/. ·s ei ·eriattças cot tl C: ltlti s ·las vc rt11clhas, a sc rigrafia de 1 1111 ~1 fo to cl:t ca11clidata quando mi litava conlr<l a ditadura c um ctt orm c painel com a i 111agem dela, sorridente, ao lado ele Lu la. No mezanino, fica a sa la eleGi­les Azevedo, ex-chefe de gabinete ela presidente no Planalto, hoje um dos co­ordenadores ela campanha.

Há vinte anos, ele é a sombra ele Oil­ma Rousseff, que o chama carinhosa­mente ele "Gil eLes"- como se ele fosse duas pessoas. Se há no mundo alguém em quem ela confie, é ele. Em uma tarde ele julho- quando ainda não havia Ma­ri na Silva no páreo-, Azevedo comenta­va as dificuldades da chefe: "As pessoas não querem resolver problema, querem carinho, atenção. Ela quer resolver, não quer gastar tempo com firul a." Segundo ele, a praticidade e a cl iscrição ela presi­dente eram uma novidade no cargo. "Ela trabalha para dentro. Não quer ho­lofote, quer resultado, isso é uma coisa diferente na política brasileira."

Para ele, é um grande equívoco afir­mar que Dilma não sabe fa zer política. "Baixar os juros do sistema financeiro mexendo com lucros ele banqueiros, de­safiar interesses econômicos nos contra­tos ele energia elétrica, criar a Com issão da Verdade, isso é não fa zer política?", indagou. "Ela fez isso sozinha."

O celular tocou. Passaram-lhe o resul­tado ele uma pesquisa recen te, mas ele não quis comentar os números. Com voz mansa , pôs-se a listar as conquistas do governo: o Minha Casa Minha Viela ha­via construído 2 milhões ele morad ias; o Brasil Carinhoso retirara 8,7 milhões ele pessoas ela m iséria; das dez ma iores hi­drelétricas elo mundo, três seriam cons-

truíclas no Brasil; o Pronatec ofereceu cursos técnicos a 8 milhões ele estudan­tes. "Na crise, o mundo perdeu 60 mi­lhões ele empregos, e o Bras il gan hou 11 milhões. Como que alguém pode di­zer que esse governo fracassou? "

Naqueles dias, a dicotomia entre o Ipi­ranga e o Planalto era explícita. Os mais próximos ela presidente se incomodavam com o fato de Lula despontar como um gên io da lâmpada, sempre com uma frase ele efeito, uma solução mágica, um con­selho incrível, ainda que o JYI' amargasse derrotas fragorosas em dois dos principais estados brasileiros: Linclberg Farias, no Rio, e Alexandre Pacl ilha, em São Paulo. A eterna comparação entre ela e Lula também a incomodava. Ela sorria amare­lo quando ele falava em público sobre "o criador e a criatura" ou quando explicita­va que o governo era "meu e ela Dilma", ratificando ataques ele advers<ír ios. Ela também percebia que o "Volta, Lula" aparecia sempre nos momentos em que u governo estava frag il izaclo, quase comu um corretivo a sua gestão. E quem está :1

seu lado repara que Dilma se refere a Lula como "presiden te" e o trata ele "se.• nhor", enquanto ele, a despeito elo cargn qtl c cl:1 oc11p:1, sc111pr · s ·r ·fcr · :'1 Jll t".l clc111c co 1110 "Di111 1i 11ha" c "você". I0: 1tl t• os dois, a rclaçJo nunca foi ele jX1rid:1tl1 Qua ndo o pres idente da Vcncwcl:l , N1 col<is Maduro, visitou o Brasil, 110 :1111• passado, engatou numa conversa att itll ,l ela com Lula. Deixa ram Dilma, ; I pt <"ot dente, esperando por quarenta mi111tl• "·

Mas era fato que, depoi s el e qlt. l'•l quatro anos ele mandato, ela aind:1 jll <' cisava un_1bilicalmente ele Lula par:1 '" eleger. "E difícil suceder o Lula. O t'.t risma, o processo ele transferência, é ttll l peso muito grande", afirmou G iles /\ ,,,. vedo. Segundo ele, qualquer canclicl :tl tl elo partido es tar ia na mesma situa c;;: 11 1 A relação ele ambos, ele disse, para ap l:1 car qualquer boato de desentendime11l o, era excelente. "lVIas ela pensa, né? "

O prejuízo de se ter an tecipado :1 campan ha eleitoral logo ficou visí vel. O governo passou a ser avali ;l

elo com lupa, cada ação ele Dilma fic011 sob suspeição ele ser eleitoreira. Quando o preço elo tomate chegou a lO reai s o quilo- um aumento ele 80% em menos ele um ano-, a opinião pública gri tou: :1 inflação está mordendo a dona ele cas::J .

No Congresso, a relação com o Execu­tivo também ia ma l. Nos primeiros doi s anos, Dilma havia feito algo se mover no pântano elo fisiologismo brasiliense. "Aca­bou a conversinha mole, tangenciacla , uma coisa querendo dizer outra, segun­das intenções. Com ela , não tem", co­mentou um ministro elo PMDB, durante um jantar em Brasília. Um ex-ministro paulista também me disse: "Ela é hones­ta, não pensa em dinheiro e não tem filho para fazer negócio. Isso já cria uma bar­reira para as conversas esquisitas."

Press ionada por Lula, ela ced ia nas alianças, mas até a última hora tentav::J uma carta diferente. Foi o caso ela ida ele

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Renan Calheiros pa ra a presidência do Congresso Nac ional. Ainda que o PT ti­vesse combinado, por escrito, o reveza­mento com o outro partido, quando a posse se ap rox imou, ela insinuou que Calheiros dcsishsse elo ca rgo ern troca elo apoio incondicional el o governo para elegê-lo gov ·rnador ele Alagoas . Ele agra­deceu. "l•:la ia com o m il ho e eles volta­vam com a pipoca. F ia não entendia o quão mais fundo era o buraco", comen­tou uma x-aux iliar da presidente.

O est ilo D il ma tinha um preço. Uma coisa era ser faxi neira quando estava por cima, outra era manter a pose sendo bom­bardeada de todos os lados. "Deputado dá troco. É um horror, mas é fa to", comen­tou um parlamentar ela base aliada, em Brasília. A retal iação vinha elo próprio quinta l. Numa ocasião, o então presiden­te ela Câmara, o petista Marco Maia , que­ria indicar um afilhado político para o Banco elo Brasil. Dil ma não o atendeu. Em represália, ele abandonou uma sessão no meio para atrapalhar a votação.

No Congresso, Dilma perdeu em vá­rias votações relevantes para o governo. Com uma articulação política frágil , sem vocação para fazer o jogo da arraia-miú­da, ela ficou à mercê elo fisiologismo. " o segundo e terceiro anos de governo, como estava sem anteparo, ela se expôs muito", comentou o deputado Paulo Teixeira, elo PT ele São Paulo, em seu gabinete na Câ­mara, em agosto. Um elos exemplos ocor-

reu durante a votação da Lei elos Portos, quando o deputado Eduardo C unha, lí­der do PMDB na Câmara, emparedou o governo. "A presidente ficou em simetria com um deputado. Isso não pode. Na Fa­zenda, a mesma coisa. Ela foi virando o alvo direto elas críticas por não ter esse mu ro ele defesa", comentou. Ao longo do tempo, o pragmatismo ganhou. Dilma liberou o aumento elos ministérios para acomodar aliados, ministros fax inaclos indica ram sucessores, e ela trocou um ministro por causa ele um minuto a mais no programa eleitoral na tevê. A imagem ele fax ineira ficara para trás.

Vieram as manifestações ele junho de 2013. Começaram contra o aumen­to elas passagens ele ônibus, mas logo

ganharam dimensão nacional e se trans­formaram em revolta contra os gastos com a Copa, a precariedade dos serviços pú­bl icos, a venali clacle da política bras il ei­ra. Em vinte di as, a aprovação elo governo Dil ma despencou el e 57% para 30%. O grito ele independência não tinha ma is eco. No meio da crise, foi ela quem pegou um avião para São Paulo para se encon­trar com Lula. O poste precisava de luz.

Foi quando Lula sugeriu a sa ída de C uido Mantega. Mais uma vez, ela se fez ele surda. "A maior força de Mantega du­rante todo o governo foi ter sido vulnerá­vel. Poucos naquele ca rgo permitiram ta manha ingerência elo presidente daRe-

pública", comentou um ex-integrante ela equipe econôm ica. Para ela, demiti-lo signi ficava perder o poder irrestrito ele mandar na economia. Nessa época, Lula comentou com um grupo no lpiranga: "Ela não va i mudar." E viajou para uma longa série ele compromissos na Áfri ca. Mais uma vez, ela entendeu o recado.

Paradoxalmente, depois de junho, teve início o período mais profícuo elo governo Dilma. Em poucos dias, os protestos fi ze­ram o Congresso aprovar projetos contra a corrupção, governos recuaram no rea­juste elo transporte público e o Judiciário mandou para a cadeia um político acu­sado ele corrupção - o deputado Natan Donaclon, do PMDB ele Roraima. O Pla­nal to emplacou o Mais Médicos e con­segui u aprovar no Congresso a le i para destinar à educação o di nheiro elos royal­ties do petróleo.

As mani fes tações também provoca­ram uma reação inéd ita na presiden te: ela mudou de icleia. Quando não apare­ceu nenhum interessado no leilão pela concessão ele um trecho ela rodovia BR-

262, que liga o Espírito Santo a Minas Gerais, ela fl ex ibili zou as regras elo jogo e só aí as negociações deslancharam . Ao mesmo tempo, Dilma passou a se en­contrar com os movimentos sociais, lide­ranças indígenas, representantes el e igrejas evangélicas. Reuniu-se até com o presidente ela Central Única elas Favelas, o Preto Zezé. Recebeu parlamenta res,

ministros, empres<írios. Também fi cou assídua no Twitter, em sintonia direta com os eleitores. "Ali , deu uma rev igora­da em todo mundo. As coisas anelavam, aconteciam", disse-me um ministro do governo, no final de setembro.

Na imprensa, ela era atacada sem dó: as obras para a Copa não ficariam prontas, os protestos paralisari am o país, a im agem do Brasil no exterior se ria abalada -em suma, o desastre era imi­nente. Dois meses depois elas manifesta­ções de junho, o governo era aprovado por 44% da população. A presidente ti­nha coisas a resolver e se trancou no Planalto novamente. Em pouco tempo, a rotina voltou ao normal: reuniões in­find áveis, encontros secretos, broncas. A geren tona estava ele volta.

A reforma min isteri al, no início el e 2014, produziu o pri meiro homem forte do governo : Aloiz io Merca­

clante, alçado para a Casa C ivil depois que Gleisi Hoffmann se clesincompati­bilizou para concorrer ao governo elo Pa raná. Ao longo elo manda to, os inter­locutores ele Dilma eram ldeli , Gleis i, G iles Azevedo, Fernando Pimentel e José Eduardo Carclozo, ministro ela Jus ti­ça. Quando substituiu Fernando Haddad na Educação, Mercadante fo i galgando espaço no grupo.

Ainda ministro da Educação, passou a acompanhar a presidente nas viagens

I

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internacionai s, mesmo que o assunto não di ssesse respeito à sua pasta. Apro­veitava os longos voos para palpitar sobre o governo em geral. Di z-se dele se r "o maior especialista no ministério dos ou­tros". A demissão ele Antonio Patriota, do Min istério das Relações Exteriores, foi gestacla en tre os fi os do hirsuto bigode. l'":1 011 ~ , . , 11 .1 :., . ,ll' '''" í.nJ!.,, ,.,,,, 11 ,,. ~ í,.,, .:, .i :Jiil l' IH H'<Ill !lld< 'lil ilil·:l '!JII .i ll ' lll l',! ll l' .' :l 11 11' ~: 1 p:11 :1 _. ,. snd :ll' I'L'I' In dv l)i iiJI :I.

(0: le dL·s: dmlcl l<lll !lOS olliOS d:1 (ll'l'Sl dente dura11l <.: as r ·volt·as d<.: j111d H>. N:1s reuniões no Alvorada para debater as pro­vidênc ias diante da crise, Mercadantc ti ­nha sempre uma opinião aguerrida, era assertivo, não titubeava- o que, para Di l­ma, é uma virtude. Entregava resultados num governo que tinha pouco a mostrar e teve importante papel na elaboração do Mais Médicos e elo Pronatec - duas vitri­nes do governo. Logo, mais urn apelido foi cunhado nos corredores elo Planalto. Mercaclante se tornara "O Príncipe".

Quadro históri co elo PT, ele sempre teve uma relação conturbada com Lula

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para nada", ressaltou sua inabilidade po­lítica e a dificuldade de tocar o governo.

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Dois elos presentes relataram o ocorrido a um conhecido empresário brasileiro elo ramo do comércio exterior. "Se ela depen­der dele para se eleger, coitada dela", co­mentou um deles, segundo o empresário contou, em seu escritório, em São Paulo. A declaração na Itália foi apenas uma das várias feitas por Lula em reun iões fecha­elas. Recentemente, a um grupo ele execu­tivos ele um grande banco ele investimentos, com sede na avenida Faria Lima, na capi­tal paulista, a cena se repetiu.

e a ala paulista do partido. É conside­rado vaidoso, arrogante, megalômano. No governo Lula, jamais teve um mi­nistério. Mas, na ausência de nomes de peso do partido - José Dirceu, José Ge­noino, Antonio Palocci - , era ele a me­lh or opção case ira para auxili a r a presiden te. Quando se tornou um dos

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E m maio deste ano, as pesquisas apontavam para a perspec tiva el e haver segundo turno nas eleições

pres idenciais. A reação elo governo veio a reboque: aumentou o valor elo Bolsa Família e anunciou a correção na tabe­la do Imposto ele Renda.

Dilma teve de lidar com as críticas e adversidades. Na abertura ela Copa, fora vaiada e insultada em coro pela torcida presente ao ltaquerão. Sua popularidade despencara e o padrinho a deixara soz i­nha. "Ela não passa recibo, não deixa a emoção tomar conta", disse um ministro do governo. É mesmo uma búlgara. Na lapela, nos bordados, no crepe, nos botões trabalhados, nas cores, nos modos, no pa­lada r, mas, sobrei lido, na maneira de ex­ternar emoções. "t:: como se da hv<.:ss<.: uma missão. Você não vai vê-la se lamen­tando por aí. É uma causa, é uma missão", observou. Nem quando fala do assunto que lhe é mais doloroso - a tortura- ela o fa z em tom ele lamúria. O relato, r~se r­vaclo a poucos, é contado com detalhes es tarrececlores. Um elos episódios mais degradan tes envolveu um rato vivo.

Fora dos campos, a Copa el o Mundo transcorreu melhor elo que se esperava . infraestrutura, segurança , telecomunica­ções, tratamento aos turistas, às seleções e aos chefes ele Estado - em geral, não houve problemas. Os poucos foram aco­bertados pela simpatia ela hospitalidade.

Logo depois do campeonato, o gover­no convocou uma entrevista coletiva com a presença de todos os ministros para falar do sucesso elo evento. Mas já no dia se­guinte Rui Falcão di sse ~ imprensa que era hora ele "reeleger Dilma e trazer Lula de volta em 2018". A presidente mal tivera tempo ele colher os louros quando a luz do poste a ofuscou novamente. "Aquela fala era uma maneira ele dar um hori zon­te à militância para a continuidade elo projeto", di sse-me Falcão, dias depois.

Um pouco antes ela Copa, o ex-presi­dente Lula es tev~ em M ilão para visitar a sede ela Pirell i. A noi te, num jantar pri­vado, fez uma breve explanação sobre o Bras il e a América Latina. Ali , para os cerca ele vinte convidados, clesancou a sucessora. Disse que ela não o "consulta

O escle março ele 2011, uma auditoria interna da Petrobras investigava a venda da refinaria de Pasaclena, nos

Estados Unidos. O negócio custou 1,18 bilhão à Petrobras, quase 27 vezes mais do que o valor pelo qual a empresa america­na havia sido vendida em 2005. Como presidente do Conselho de Administra­ção ela estatal, Dilma foi uma elas pessoas que aprovou a transação. Quando engros­sa ram as suspeitas sobre o negócio, em março deste ano, Graça Fostcr preparou uma nota, limitando-se a dizer que o as­sunto era objeto de sindicância interna.

Dilma rechaçou a explicação e consi clerou a nota "ingênua". Sentada em s<.: ll gabinete, batucou no computador, du rante horas, outra resposta , sob o olhar dt• quatro assessores, entre eles o advogado geral ela Un ião, Luis Inácio Adams. "!•. para sa ir assim", ordenou. Em nenh1 1111 momento ela consultou Lula ou o PT. Nu nova versão, ela indicava que a COilllll .l

hav ia se baseado em "documentação l.1 lha" e " informações incompletas".

A nota caiu -como un{a .bon~ba ;,, nêutron. Baseada nela, a oposição pl'd11 1 a abertura ele uma Comissão Paria '' "'" tar ele Inquérito a fim ele apurar as dl' núncias . Na opinião el e um renom:1d 11 advogado que trabalha para as emprcil <'l ras envolvidas, Di lma "trouxe o assu1 Jl, 1 para o centro elo pa lco". A interl ocutorl'.,, Lula propalava que ela hav ia dado "1111 1 tiro no pé" ao jogar dúvidas sobre o Clll basamento técnico e jurídico para :1 compra ela refinaria. O assunto, apos l:1 vam os petistas, teri a morriclo por si s" com a vaga explicação ela Petrobras.

Pouco depois, o Tr ibun al ele Conl ~ 1.' el a União entendeu que os membros elo conselho- incluindo Dilma, o empre­sário Jorge Gerclau e Fábio Barbos:1, pres idente elo Grupo Abri l - nada ti­nh am a ver com o assunto. Os suspeitos a serem julgados seriam ex-diretores cl;1 Pe trobras, entre eles Paulo Robertu Cos ta - um dos presos na Operação Lava a Jato, ela Polícia Federal , que apu­rava as denúncias - e o ex-pres iden te cL1 empresa, José Sérgio Gabrielli . Ambos dem itidos por Di lma dois anos antes.

Segundo a rev ista Veja, em troca da redução el a pena e proteção à família. Costa teri a revelado, num acordo ele de­lação premiada , que hav ia repassad o dinheiro ela corrupção para políticos como os ex-governadores Sérgio Cabra I (PMDB) e Edua rdo Campos (PSB), a go-

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vern;~dora peemedebista Roseana Sa r­ney c seus colegas de partido Renan Calheiros e Edison Lobão, ministro das M inas e Energia.

Em uma noite de setembro, encontrei­me com um advogado de um dos réus da Operação Lava a Jato, em um bar do Le­blon, no Rio. Preocupado com a repercus­são da delação premiada, ele corroborou o que já havia dito o réu : "Se ele falar, não tem eleição." Comentou que Cos ta "era um ser ún ico na política bras ileira" - pela primeira vez, um operador atuava nas duas frentes: na arrecadação de recursos de campanha e na distribuição para polí­ticos. " a época do PC Farias, ele só arre­cadava , não sabia para quem ia o quê. Esse Paulinho sabe tudo", afirmou .

O caso ganhava contornos a inda mais preocupan tes porque, por causa da nova Lei Anticorrupção- sancionada por Dilma Rousseff - , atualmente são os con troladores das empresas que res­pondem pelos crimes, não mais um diretor ou um secretári o. "Você imagi­na o que é ter o dÓno de uma emprei­teira rea lmente correndo o ri sco de ir pa ra a cadeia?", observou o advogado.

O que moveu Dilma ainda é contro­verso. Havia a informação de que o rela­tor do caso no TCU, o ministro José Jorge, ampliaria as investigações para o governo. "O que ela fez foi se defender, com razão. O que ela acha que é defesa própria, o PT

chamou de 'falta de solidari edade"', disse­me um ministro palaciano. O curto-ci r­cuito era da luz, não do poste.

D a janela da sala d<l pr ·s icl ·111 · d:1 Petrobras, Ma ri a das C raças ]•'os­

ter, tem-se uma visão magnífica da Baía de Guanabara. Em uma manhã de julho, sentada de cos tas para o cenário, ela fa lava sobre a chefe e am iga D il ma Rousseff. As duas se conheceram em reuniões de traba lho na Petrobras há de­zo ito anos. Quando va i a Bras ília, Graça é uma das poucas a ser convidada a per­noitar no Alvorada. Lá, passam a noite conversando, ouvindo música e lendo.

Encontram o-nos quase do is meses antes do acordo de delação premiada fe ito por Paulo Roberto da Costa . Co­mentei que gostaria de ouvir uma "voz amiga" da presidente, pois me surpreen­dia como seus assessores e interlocutores mais próximos reservavam a Dilm a cr í­ticas tão élc idas c comcnt;-ír ios tfío fe ri­nos." ]~ injusto colll la, 11 111 ilo inj1 1sto", di sse l•'os ler logo 110 co 111 ·r;o d:~ conver­sa. " I~ isso <ICO II I · · · porq1 1' ·l:1 ~ j11 sta e paga um preço alio por isso", ava liou.

No final de se tembro, com 111 ais uma queda brusca das ações, a Pctrobras l1avia deixado de ser a maior emprc a bras i I eira e perdera 144 bilhões de rea is de va lor de mercado desde o in ício do governo de D ilma Rousseff. Perguntei o que ela pen­sava ;~o o11vir que a presidente hav ia "aca­bado co111 :1 Petrobras e destruído o se tor clélri ('o". "Conheço essa empresa como a p:d111 :1 d:1 111 inha mão, não tem isso", di s~v . <'lll :lli ;.:llldo a nega tiva com um 111 0\'illl l' lilll d:1 ·abeça. "Como uma em-

piau 111\llilllll

prcs<l q1 1 · i11 vcs tc 100 bilhões de rea is por ano, I'CIII 70 bi lhões em ca ixa e produz 500 n1i l b:11-r is de petróleo por dia , só no pré-s;d, 1 ocl ·estar mal?", perguntou.

C h • ' <I III OS a Pasadena . Relatei a ela o qu · h ;~v ia ouvido de ci nco pessoas li­gadas ciO 1''1', com palav ras a mais ou a menos, 111 as sempre com o mesmo sen­tido: ;1 pr sidente hav ia ex·pos to o es­qucnw q11 • ela sabia ter financiado sua ca mp<lllha c a de vá rios companheiros el o P'l' c de p<1rtidos aliados . Sem hes itar, G raça respondeu, grave: "Não se i nada disso el o que você es tá fa lando."

Ulll copeiro trouxe café. Ela retomou o rac iocínio. Acredita que Dilma é víti­ma da própria honestidade. "Ela é justa, honesta, mui to justa e honesta. Esse é o ponto fu ndamental de tudo", di sse. Era ele se imaginar que ela ficasse doída com as críti cas inclementes. "Não é fác il para ninguém. Olha, eu vou até parar de falar porque eu já chorei aqu i hoje. Mas, pode ficar tranquila, não foi por causa da Pe­trobras", disse, sorrindo.

A trágica morte ele Eduardo Campos varreu como um fu racão o cenário ele itoral. A par tir ele então, tudo o

que se especulava ficou velho. Em Brasí­lia , passou-se a ouvir a expressão : "Ah, isso é tão 12 de agosto!", em referência à véspera do desastre. O PT havia se prepa­rado para repetir o mote "Nós con tra eles", no embate com o PSDB. Quando Marina Silva se tornou uma ameaça real, o partido não sabia o que fa zer. De novo o "Voll a, I .1da" surgi11 fo1t · dentro do n.

Naqueles dias, um influente empresá­rio, com negócios no Sudeste e a rdeste, foi recebido para jantar na casa ela famí­li a Lu la em São Bernardo do Campo. Como era domingo, ped iram pi zza pelo telefone e se reuniram em volta da mesa. O assunto logo resvalou para o governo. Ele, que estava decepcionado com o PT,

externou sua opinião. Foi a deixa para Ma risa desancar D ilma mais uma vez : ingrata, falsa e traidora foram alguns elos adjetivos que empregou. Os filhos ele Lula corroborava m a opinião el a mãe. O ex-presidente permaneceu calado.

Ali , o empresá rio teve uma epifani a. Percebeu que, por ma is forte que fosse o "Volta, Lula", o ex-pres idente jamais teri a coragem el e se apresentar como cand idato. Nem para sa lva r a eleição ele 2014, j<í que ele já ti nha em vista 2018. O preço ele deixa r de se r um mito e de­sembarcar na viel a real, num cenário el e in certeza ag uda , era pesado demais. Logo que Marina se lançou candidata , as pesquisas encomendadas pelos parti­elos não davam grande va ntagem a Lula sobre sua ex-ministra, quando confron­tados na mesma cédula.

Com o alerta vermelho na campanha ele Dilma, Lula passou a viajar pelo país fazendo comícios e acompanhando a candidata em eventos. Quatro ministros se licenciaram elos cargos para cuidar da ar ticulação política. A 32 dias do primeiro turno, um grupo se reun iu na suíte elo hotel Uni que, em São Paulo, onde Dilma

estava hospedada . Lula deu a ordem de comando : "Va i ser o segundo tu rno mais longo da história. Ele tem que começar agora", disse. Isso sign ificava atacar Ma ri­na com todas as armas, para que ela che­gasse ao segundo turno fragilizacla.

A part ir daí o tom da propaganda eleitora l engrossou: Mar ina foi compa­rada a Jânio Quadros e Fernando Collor de Mello. Em outro spot, di zia-se que, com a autonom ia que ela pretende dar ao Banco Central, a comida va i sum ir elo prato das famíli as, em benefício dos banqueiros, ca rac teri zados na propa­ganda como vi lões. No jargão publicitá­rio, a ordem era "clescons lruir" l'vlarina: explorar suas incongruências, dubieda­des, fragil idades, o túnel desconhecido que se ria seu governo. A es tratégia sur­tiu efe ito. Em três semanas, D il ma abriu quin ze pontos de va ntagem sobre Ma rina , mas aind a não tinh a o sufi­cien te pa ra vencer no primeiro turno.

A poucos dias elas eleições, o Brasil havia saído elo Mapa Mundial da Fome das Nações Un idas . Pela pri­

meira vez em cinco anos, registrava-se retração da economia, que havia entrado em recessão técn ica. Ao contrário do que pregava o governo, o país crescia menos do que seus pares na América Latina. A inflação recuava a passos lentos. lnda­gada se far ia mudanças na equipe minis­terial caso reeleita, Dilma respondeu de bate-pronto "Ano novo, equipe nova", in­corporando a s u repertório a expressão "novo, nova", bordão ela adversá ria Ma ri­na e sua "nova política". O recado tinha alvo: Ma ntega esta ri a fora no próximo governo. Ele soube ela notícia pela inter­net. "Ela só não esclareceu se também vai mudar. Se va i deixa r ele ministrar para começar a presidir", disse um secretário do governo com status de m inistro.

No final ele setembro, durante um café da manhã no Rio, um importante dirigen­te do PT comentava o enredo elei toral. "Ninguém ia imaginar a morte elo Eduar­do Campos, a cri se econômica mundial, o sentimento que ia surgir das man ifesta­ções de junho. Mas todo mundo sabia da inabi lidade ela D il ma, da ojeriza pela po­lít ica, desse temperamento", resumiu.

A reeleição ele Di lma ganhara fôlego. De nada adiantara mos trar as obras, os programas, as falas de Lula. A vantagem só foi recuperada quando o PT pegou em armas e passou a atacar sem piedade a adversá ri a. As difi culdades do governo, segundo meu interl ocutor, nunca foram ele macroeconom ia, mas de estilo. "Arro­gâ ncia", ele d isse. Argumentei que, se eleita, ela poderia fa zer um governo mais 1 ivre, sem se preocupar com Lula ou com o JYr, já que provavelmente seria seu últi­mo cargo político na viela. Ele ba lançou a cabeça e deu um sorrisinho. Antes de se retirar, arriscou o porvir: "O fato é que, se ela ganhar, fo i o PT que aj udou. E aí, no dia 1 o de jane iro, o governo passa a funcionar no lpiranga. Se perder, ela va i levar essa culpa para sempre. Infe­li zmente, isso é a políti ca." O

Texto de Flávio Cafiero Direção de Zé Henrique de Paula

Com Fúlvio Stefanini, Roney Focchini, Chris Couto e atriz convidado Karin Rodrigues

Sox e Sob 6s 21 h30 o Dom 6s 19h I TUCA

Texto lngmar Bergman Direçõo de Ulysses Cruz

Com Gabrielo Duarte, Ne lson Boskerville, Marcos Suchara e Lucas Lentini

Sex21h30, Sob 21h00 e Dom 19h30 J TUCARENA Estréia dia 18 de Outubro.

Espetáculo de improvisação teatral. Cio Borbixos de Humor.

Com Anderson Bizzocchi , Daniel Nascimento, Elídio Sonno e convidados.

Qui, 6s 21 h30 i TUCA

Texto de Le Plat du Jour - Adoptoçõo livre do Livro Peter Pon e Wendy, de J.M. Borríe Direção de Pedro Pires

Cynthio Folobell o, Antonielo Conto, Alexandra Golik e Corlo Condiotto

Sob o Dom 6s 16h00 J TUCARENA