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Revista Brasileira de Geociências Ivaldo Rodrigues da Trindade et al. 38(2): 303-318, junho de 2008 Arquivo digital disponível on-line no site www.sbgeo.org.br 303 Comportamento de elementos químicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Seridó, Província Borborema Ivaldo Rodrigues da Trindade 1 , Jaziel Martins Sá 2,3 & Maria Helena de Freitas Macedo 2,3 Resumo A Faixa de Dobramento Seridó, na porção central do Domínio Rio Grande do Norte no NE do Bra- sil, Província Borborema, contém alguns depósitos de ouro associados a zonas de cisalhamento. Os depósitos de ouro São Francisco e Ponta da Serra estão associados e hospedados nestas zonas de cisalhamento que cor- tam micaxistos do Grupo Seridó e ortognaisses do embasamento respectivamente. As zonas de cisalhamentos hospedeiras destes depósitos são canais por onde fluidos hidrotermais circularam e provocaram lixiviação com retirada de elementos das litologias e/ou adicionou elementos químicos contidos nesse fluido. As condições de pressão e temperatura foram respectivamente de 3,5±0,7 kbar e 574 o ±30 o C para as rochas originais e milo- nitizadas. O estudo petrográfico mostrou que a biotita e o plagioclásio, nos dois depósitos, foram os minerais que tiveram o papel mais importante nas reações químicas. Estas reações mostram a formação de muscovita, cordierita e sillimanita nos micaxistos milonitizados e muscovita e microclinio nos ortognaisses milonitizados. Os estudos de mobilidade de elementos químicos mostraram que durante o evento de deformação/metassoma- tismo hidrotermal, os elementos Al, Ti e Zr, no geral, permaneceram imóveis. Os elementos mobilizados foram o K e o Rb que aumentaram suas concentrações em todas as faixas de rochas transformadas, enquanto que os elementos Ca, Na e Sr, diminuíram suas concentrações. Os elementos Sm e Nd se comportaram como imóveis no depósito São Francisco, enquanto que no depósito Ponta da Serra, ambos aumentaram suas concentrações. Para a formação de muscovita, além do K liberado pela biotita, também ocorreu a adição desse elemento a partir do fluido hidrotermal. Já a perda de Ca e Na se deveu à incorporação desses elementos na fase fluida. Palavras-chave: Zonas de cisalhamento, Milonitização, Circulação de fluidos, deformação/metassomatismo hidrotermal, comportamento de elementos químicos. Abstract Chemical elements behaviour in gold mineralized rocks in the Seridó Belt, Borborema Province. The Seridó fold Belt, central part of Rio Grande do Norte Domain, Borborema Province, NE Brazil, contain by some gold deposits associated with shear zones. The São Francisco and Ponta da Serra gold deposits are associated to and hosted in shear zones that crosscut the Seridó Group and basement orthogneisses, respectively. These gold-bearing shear zones are channels through where a great volume of hydrothermal fluids circulated and caused leaching and/or chemical precipitation. The pressure and temperature conditions of the original rock and the mylonite are estimated to have been 3.5±0.7 kbar and 574 o ±30 o C, respectively. Petrographic studies indicate that biotite and plagioclase, in both deposits, were the most important minerals in the chemical reactions. These reactions were responsible for the formation of muscovite, cordierite and sillimanite in the mylonitic mica-schists, and of muscovite and microcline in the mylonitic orthogneisses. The study of chemical element mobility showed that during the event of deformation/hydrothermal metasomatism, Al, Na and Zr, (here) stayed immobile. The mobilized elements were K and Rb that show increase of the concentration in all transformed rocks, while Ca, Na and Sr show decrease of the concentration. The elements Sm and Nd behaved as immobile in the São Francisco deposit, while in the Ponta da Serra deposit, both elements lost mass. Regarding the formation of muscovite, K was liberated by the biotite brakdown and also entered the system via hydrothermal fluids. The loss of the Ca and Na was due to the incorporation of these elements in the fluid phase. Keywords: Shear zone, Mylonitization, Fluid circulation, deformation/hydrothermal metassomatism, chemical element behaviour. 1 - DGEO, Universidade Federal do Amazonas, Manaus (AM), Brasil. E-mail: [email protected] 2 - PPGG, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal (RN), Brasil. 3 - DG, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal (RN), Brasil. INTRODUÇÃO Zonas de cisalhamento são condutos por onde pode circular um grande volume de fluidos, que interagem com as rochas hospedeiras provocando lixi- viação e/ou adição de elementos químicos modificando a textura e a composição primária das rochas. Entender o comportamento dos elementos químicos nesse ambiente é fundamental para se fazer correções nos dados usados em estudos litoquímicos, geocronológicos e no entendi- mento da gênese de depósitos minerais associados. Na última década vários pesquisadores desen- volveram estudos com o objetivo de entender o com- portamento dos elementos químicos em ambientes de

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  • Revista Brasileira de Geocincias Ivaldo Rodrigues da Trindade et al. 38(2): 303-318, junho de 2008

    Arquivo digital disponvel on-line no site www.sbgeo.org.br 303

    Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    Ivaldo Rodrigues da Trindade1, Jaziel Martins S2,3 & Maria Helena de Freitas Macedo2,3

    Resumo A Faixa de Dobramento Serid, na poro central do Domnio Rio Grande do Norte no NE do Bra-sil, Provncia Borborema, contm alguns depsitos de ouro associados a zonas de cisalhamento. Os depsitos de ouro So Francisco e Ponta da Serra esto associados e hospedados nestas zonas de cisalhamento que cor-tam micaxistos do Grupo Serid e ortognaisses do embasamento respectivamente. As zonas de cisalhamentos hospedeiras destes depsitos so canais por onde fluidos hidrotermais circularam e provocaram lixiviao com retirada de elementos das litologias e/ou adicionou elementos qumicos contidos nesse fluido. As condies de presso e temperatura foram respectivamente de 3,50,7 kbar e 574o30oC para as rochas originais e milo-nitizadas. O estudo petrogrfico mostrou que a biotita e o plagioclsio, nos dois depsitos, foram os minerais que tiveram o papel mais importante nas reaes qumicas. Estas reaes mostram a formao de muscovita, cordierita e sillimanita nos micaxistos milonitizados e muscovita e microclinio nos ortognaisses milonitizados. Os estudos de mobilidade de elementos qumicos mostraram que durante o evento de deformao/metassoma-tismo hidrotermal, os elementos Al, Ti e Zr, no geral, permaneceram imveis. Os elementos mobilizados foram o K e o Rb que aumentaram suas concentraes em todas as faixas de rochas transformadas, enquanto que os elementos Ca, Na e Sr, diminuram suas concentraes. Os elementos Sm e Nd se comportaram como imveis no depsito So Francisco, enquanto que no depsito Ponta da Serra, ambos aumentaram suas concentraes. Para a formao de muscovita, alm do K liberado pela biotita, tambm ocorreu a adio desse elemento a partir do fluido hidrotermal. J a perda de Ca e Na se deveu incorporao desses elementos na fase fluida.

    Palavras-chave: Zonas de cisalhamento, Milonitizao, Circulao de fluidos, deformao/metassomatismo hidrotermal, comportamento de elementos qumicos.

    Abstract Chemical elements behaviour in gold mineralized rocks in the Serid Belt, Borborema Province. The Serid fold Belt, central part of Rio Grande do Norte Domain, Borborema Province, NE Brazil, contain by some gold deposits associated with shear zones. The So Francisco and Ponta da Serra gold deposits are associated to and hosted in shear zones that crosscut the Serid Group and basement orthogneisses, respectively. These gold-bearing shear zones are channels through where a great volume of hydrothermal fluids circulated and caused leaching and/or chemical precipitation. The pressure and temperature conditions of the original rock and the mylonite are estimated to have been 3.50.7 kbar and 574o30oC, respectively. Petrographic studies indicate that biotite and plagioclase, in both deposits, were the most important minerals in the chemical reactions. These reactions were responsible for the formation of muscovite, cordierite and sillimanite in the mylonitic mica-schists, and of muscovite and microcline in the mylonitic orthogneisses. The study of chemical element mobility showed that during the event of deformation/hydrothermal metasomatism, Al, Na and Zr, (here) stayed immobile. The mobilized elements were K and Rb that show increase of the concentration in all transformed rocks, while Ca, Na and Sr show decrease of the concentration. The elements Sm and Nd behaved as immobile in the So Francisco deposit, while in the Ponta da Serra deposit, both elements lost mass. Regarding the formation of muscovite, K was liberated by the biotite brakdown and also entered the system via hydrothermal fluids. The loss of the Ca and Na was due to the incorporation of these elements in the fluid phase.

    Keywords: Shear zone, Mylonitization, Fluid circulation, deformation/hydrothermal metassomatism, chemical element behaviour.

    1 - DGEO, Universidade Federal do Amazonas, Manaus (AM), Brasil. E-mail: [email protected] - PPGG, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal (RN), Brasil.3 - DG, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal (RN), Brasil.

    INTRODUO Zonas de cisalhamento so condutos por onde pode circular um grande volume de fluidos, que interagem com as rochas hospedeiras provocando lixi-viao e/ou adio de elementos qumicos modificando a textura e a composio primria das rochas. Entender o comportamento dos elementos qumicos nesse ambiente

    fundamental para se fazer correes nos dados usados em estudos litoqumicos, geocronolgicos e no entendi-mento da gnese de depsitos minerais associados.

    Na ltima dcada vrios pesquisadores desen-volveram estudos com o objetivo de entender o com-portamento dos elementos qumicos em ambientes de

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    304 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    falhas e zonas de cisalhamento (e.g. Kerric 1986, Cox et al. 1987, Selverstone et al. 1991, Legrand & Magini 1992, Luiz Silva 1995, Streit & Cox 1998, Luiz Silva 2000, Luiz Silva et al. 2000, Trindade 2000, Trindade et al. 2000, Dantas et al. 2002, entre outros). Os primeiros estudos de mobilidade de elementos qumicos, na Faixa Serid, foram realizados por Legrand & Magini (1992), onde foi determinado o comportamento de elementos qumicos durante a formao de cordierita, andaluzita e estaurolita, nos micaxistos do Grupo Serid, e na trans-formao de um augen gnaisse do embasamento em um muscovita quartzito por cisalhamento. Posteriormente Luiz Silva (1995), e Luiz Silva et al. (2000) realizaram estudos de mobilidade de elementos qumicos no dep-sito de ouro So Francisco.

    A Faixa Serid hospeda vrias ocorrncias de ouro como as de Tapera, Ponta da Serra, Fazenda Sim-ptico, Serra dos Patos e So Fernando, nos municpios de Caic e de So Fernando, que formam uma espcie de corredor mineralizado, e a ocorrncia de So Fran-cisco no municpio de Currais Novos, todas hospedadas em zonas de cisalhamento.

    Neste artigo, mostramos os estudos do compor-tamento de elementos qumicos em rochas metassedi-mentares e ortoderivadas milonitizadas e mineralizadas em ouro em duas destas ocorrncias, os depsitos So Francisco (DSF) em Currais Novos-RN e Ponta da Ser-ra (DPS), em Caic-RN, respectivamente. Algumas das principais caractersticas observadas nas sees delga-das, que indicam a ao de um fluido nas rochas hos-pedeiras, foram texturas de dissoluo mineral, bordas de reao e substituio mineral parcial ou total. Em ambos os depsitos, as rochas hospedeiras foram sub-metidas a processos de transformaes semelhantes, porm no domnio da rocha metassedimentar a princi-pal mudana observada em sees delgadas foi textu-ral, enquanto que na ortoderivada foram evidentes as mudanas texturais e composicionais. Com isso, este estudo possibilitou que se confrontassem estas proprie-dades com o comportamento dos elementos qumicos durante a milonitizao e circulao de fluidos.

    CONTEXTO GEOLGICO Os depsitos So Fran-cisco (DSF) e Ponta da Serra (DPS) esto inseridos no Domnio Rio Grande do Norte (DRGN) de Brito Neves et al. (2000), poro NE da Provncia Borborema de Al-meida et al. (1977), (Fig. 1). O embasamento paleopro-terozico da Faixa Serid, na poro a oeste das rochas supracrustais, foi denominado de Grupo So Vicente por Ebert (indito), de Macio Rio Piranhas por Brito Neves (1975), Complexo Caic por Jardim de S (1978, 1994). constitudo por uma seqncia de rochas metavulca-nossedimentares que inclui rochas metassedimentares grauvquicas e psamticas, englobando gnaisses diver-sos, metavulcnicas bsicas, andesticas e anfibolticas. Esse contexto intrudido por rochas plutnicas clcio-alcalinas de composio grantica a tonaltica correspon-dentes aos granitides G1 de Jardim de S et al. (1981). Estas unidades tm idades em torno de 2,15 Ga (Hacks-pacher et al. 1990, Macedo et al. 1991, Legrand et al.

    1991, Jardim de S 1994, Legrand et al. 1997). Os granitides G2 de Jardim de S et al. (1981)

    so rochas granticas a granodiorticas com textura por-firtica ou equigranular transformadas em ortognaises. Jardim de S (1994) definiu estas rochas como domi-nantemente augen gnaisses de afinidade subalcalina (monzontica e shoshontica) a clcio-alcalina potssica, com termos granodiorticos e mais bsicos, de afinidade clcio-alcalina, estes ltimos em volume aparentemente subordinado. As idades obtidas pelos mtodo Rb/Sr e U/Pb por diluio isotpica variam de 1,95 a 2,15 Ga. Estes dados levaram Hackspacher et al. (1990) e Legrand et al. (1997) a sugerir que os granitides G1 e G2 so repre-sentativos do mesmo segmento crustal, com esse ltimo representando o termo mais diferenciado.

    Na poro a leste das rochas supracrustais, o embasamento foi denominado de Macio So Jos de Campestre por Dantas et al. (1995 e 1997). So unida-des compostas por ortognaisses tonalticos com interca-laes de anfibolito e meta-ultramficas, ortognaisses e migmatitos diversos, hornblenda sieno-monzogranitos calcio-alcalino. Este macio contm rochas com idades arqueanas que variam de 2,7 a 3,41 Ga. Circundando as rochas arqueanas, ocorrem unidades paleoprotero-zicas, representadas por rochas metaplutnicas varia-velmente migmatizadas, que incluem augen gnaisses e ortognaisses com piroxnio (Dantas 1996, e Dantas et al. 1995 e 1997).

    As rochas supracrustais da Faixa Serid consti-tuem o Grupo Serid, que segundo Jardim de S e Salim (1980) formado por trs unidades sendo da base para o topo: Formao Jucurutu, constituda de paragnaisses quartzo-feldspticos com biotita, tendo xidos de fer-ro, muscovita, epidoto, apatita e zirco como minerais acessrios. Subordinadamente ocorrem intercalaes de anfibolitos, mrmores, quartzitos, micaxistos, calciossi-licticas e formaes ferrferas. A Formao Equador composta por muscovita-quartzitos com variao facio-lgica para muscovita quartzo-xistos. Tambm ocorrem horizontes de quartzitos feldspticos com muscovita, quartzitos ferrferos, paragnaisses e intercalaes de metaconglomerados. A unidade de topo a Formao Serid, composta por micaxistos diversos, ocorrendo localmente nveis enriquecidos nos aluminossilicatos andaluzita, silimanita e menos freqentemente cianita, sendo comum a presena de cordierita e por vezes es-taurolita. Ocorrem intercalaes subordinadas e locali-zadas de quartzitos, mrmore, metavulcnicas, rochas calciossilicticas e metaconglomerados.

    A intruso dos granitides brasiliano do tipo G3 de Jardim de S et al. (1981) se constitui na mais expressiva atividade gnea na Faixa Serid, compreendendo seqn-cias de composio intermediria bsica mais antiga que se constitui nas sutes de K-dioritos, de afinidade shosho-ntica a clcio-alcalina potssica, e as sutes de graniti-des porfirticos, de afinidade subalcalina/monzontica e granitides tardi-tectnicos, representados por tipos sob a forma de diques e stocks de composio granodiorti-ca, equigranular, fino a mdio e pegmatitos homogneos e heterogneos zonados. As idades U-Pb em zirco entre

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 305

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    580 e 550 Ma colocam os corpos de granitides G3, como neoproterozico correlatos orognese brasiliana.

    A idade do Grupo Serid tem sido discutida nas duas ltimas dcadas, com preferncias para ida-des paleoproterozica (ca. 1.9 Ga) segundo Jardim de S (1994). Porm, idades U-Pb em zirces detrticos das Formaes Jucurutu e Serd revelaram valores que colocam o Grupo Serid com idade neoproterozi-ca (Van Schmus et al., 2003). Observando a variao isotpica de C13 no Grupo Serid, Nascimento et al. (2004 e 2007) comparando esta variao com os trends de variao isotpica de C13 existentes na literatura, sugerem que a idade de sedimentao das rochas car-

    bonticas do Grupo Serid, estaria aproximadamente entre 620 a 580 Ma, concordando com os valores U-Pb obtidos por Van Schmus et al. (2003).

    PROCEDIMENTOS ANALTICOS As amostras utilizadas nesse estudo foram coletadas perpendicular-mente ao trend estrutural em ambos os depsitos de ouro. O procedimento em laboratrio se deu com a preparao mecnica das amostras para fins geoqumicos tomando-se aproximadamente 100 mg de p da amostras numa frao < 300 mesh. As amostras foram fundidas com tetraborato de ltio, foram feitas pastilhas fundidas para anlise dos elementos maiores e prensadas para os elementos traos.

    Figura 1 - Arcabouo geolgico da Provncia Borborema e do Domnio Rio Grande do Norte (DRGN), com a localizao dos afloramentos (pontos 1 e 2) estudados nesse traba-lho. (Adaptado de Jardim de S, 1994, Brito Neves 2000 e Dantas et al, 2002).

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    306 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    A dosagem dos elementos foi realizada no espectrmetro de fluorescncia de raios X da marca Phillips modelo PW 2400. Os limites de deteco, de determinao e de quan-tificao foram para o Rb (0,9-1,8-3,0 ppm) e para o Sr (1,3-2,7-4,5 ppm), respectivamente.

    A preparao de amostra para anlise de Sm e de Nd foi realizada segundo o procedimento descrito por Pimentel et al (2002). Aproximadamente 100 mg de p da amostras foram misturados com uma soluo traadora mista (spike) de 149Sm-150Nd e a digesto qu-mica foi realizada em etapas sucessivas com mistura de HF+HNO3 7 M e com HCl 6 M em cpsulas Savillex de teflon. A extrao dos elementos terras raras foi re-alizada em colunas de troca inica confeccionadas em quartzo, usando resina BIO-RAD AG-50W-X8. A ex-trao do Sm e do Nd foi realizada em coluna de teflon carregada com resina LN-Spec. A dosagem do Sm e de Nd foi determinada por diluio isotpica em espectr-metro de massa por ionizao termal marca Finnigan MAT-262 multi-coletor do laboratrio de geocronolo-gia da UNB. Os valores dos brancos variaram entre 20 e 50 pg para Sm e entre 50 e 100 pg para Nd.

    Para determinarmos a perda ou ganho de mas-sa dos elementos qumicos utilizamos o mtodo grfico isocon desenvolvido por Grant (1986). Em um sistema de eixos cartesianos, quando as concentraes da rocha original so lanadas no eixo X e as da rocha transfor-mada no eixo Y, as concentraes dos elementos im-veis devem se dispor obrigatoriamente ao longo de uma reta, que denominada de reta isocon. J os elementos que foram introduzidos se localizaro acima e os que saram do sistema, abaixo dessa reta, respectivamente.

    Como nem sempre os pontos analticos defini-ram um bom alinhamento, optou-se por usar o elemento Al para se determinar a reta isocon, em funo do que foi observado nos estudos petrolgicos e da grande capaci-dade desse elemento permanecer imvel ou de sua pou-ca mobilidade frente maioria dos eventos geolgicos estudados na Faixa Serid por outros autores (Legrand & Magini 1992) e em outras regies estudadas (Grant 1986; Selverstone et al. 1991; Streit & Cox 1998).

    Os clculos de diminuio ou aumento da con-centrao dos elementos qumicos foram obtidos com a Equao de Grant (1986) (Equao 1):

    Ci/Ci=CEiO/CEi

    T (CiT/CiO) 1. (1)

    Esta a equao fundamental para os clculos de variao da concentrao dos elementos envolvidos em processos de deformao, metamorfismo e metassomatis-mo hidrotermal, onde: Ci/Ci a variao de concentra-o do elemento na rocha transformada, CEi

    O a concen-trao, na rocha original, de um dos elementos considera-dos imveis, CEiT a concentrao desse mesmo elemento na rocha transformada e CiT e CiO so as concentraes do elemento que sofreu variao da concentrao nas rochas transformada e original, respectivamente e 1 corresponde a uma variao de massa ou volume de 100%. Usamos a equao simplificada de Grant (1986): CEi

    O/CEiT 1 para

    calcularmos a variao volumtrica da rocha transforma-

    da com relao a rocha original.Calculamos as densidades relativas das rochas

    usando um picnmetro de 50 ml, gua milli-Q tri-des-tilada, amostra britada e uma balana qumica com 6 casas decimais. Os clculos foram determinados com a equao dada por Dana & Hurlbut (1969) (Equao 2):

    D = {(Pp+m Pp)/(Pp+a + Pp+m Pp Pp+m+a)}, (2)

    onde: Pp = peso do picnmetro vazio, Pp+a = peso do picnmetro com gua destilada, Pp+m = peso do picnmetro com a amostra, Pp+m+a = peso do picnmetro com a amostra e gua destilada.

    DEPSITO SO FRANCISCOGeologia do Depsito So Francisco (DSF) Os mi-caxistos aurferos do DSF esto estratigraficamente in-seridos na Formao Serid (Fig. 2) e so representados regionalmente por um granada-biotita xisto feldsptico finamente bandado que consideramos como a rocha original (RO) (lmina MFG-06). Um evento cisalhante transformou progressivamente esta rocha em um cordie-rita-biotita xisto feldsptico, que a rocha transformada intermediria (Rtint) (lminas MFG-08 e MFG-14D). Nos locais onde a deformao foi mais intensa, forma-ram-se zonas de sillimanita-muscovita xisto feldsptico milontico, sendo esta a rocha transformada final (Rtf) e mineralizada (lminas MFG-14E e MFG-14F).

    O granada-biotita xisto feldsptico fino a m-dio, com uma xistosidade proeminente marcada pelas alternncias de nveis micceos com niveis quartzo-fel-dspticos. Esses nveis evoluem para remobilizados de quartzo. Nesse ltimo caso, o aspecto passa de xistoso para bandado, concedendo uma maior consistncia rocha, que se mostra mais grossa nestas pores.

    O cordierita-biotita xisto feldsptico se caracte-riza pelo desenvolvimento de ndulos de cordierita que podem chegar a 25 cm em seu eixo maior, mascarando a xistosidade da rocha. Para evitar que esses ndulos pudessem superestimar os percentuais desses minerais, evitou-se confeccionar lminas sobre os mesmos.

    O silimanita-muscovita biotita xisto feldspti-co, desenvolvido na zona de mais alta taxa de deforma-o, de granulao mdia a grossa onde se destacam ndulos decimtricos ricos em muscovita e silimani-ta. Vale salientar que ocorre cordierita e granada, que so minerais tpicos das faixas anteriores. As zonas de cisalhamento mineralizadas tm atitudes mdias N40oE/60o-80oSE.

    Estudos termobarometricos com o termmetro granada-biotita e dos barmetros granada-plagioclsio-aluminossilicato-quartzo e granada-plagioclsio-mus-covita-biotita realizados por Luiz Silva (1995, 2000), indicam que a rocha original e a transformada foram submetidas praticamente s mesmas condies com mdias de P = 3,5 0,7 kbar e T = 574o 30oC.

    Petrografia A lmina estudada da rocha original (RO) foi a MFG-06. Selecionamos 04 lminas representativas

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 307

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    do domnio das transformada. A amostra MFG-08, de-signada de rocha transformada intermediria-1 (Rtint-1), a amostra MFG-14D, mesmo localizada no interior da zona cisalhada mineralizada (Fig. 2), que domnio da rocha transformada final (Rtf), em funo de sua mine-ralogia foi considerada como rocha transformada inter-mediria-2 (Rtint-2). A amostra MFG-14E, classificada como Rtf-1 e a MFG-14F, classificada como Rtf-2.

    Os estudos mostraram que em todos os do-mnios o quartzo o principal constituinte da matriz. Ocorre como cristais xenomrficos (Figs. 3a e 3b), e tambm na forma de ribbons, nesse caso nos domnios das Rtf, s vezes com contatos retos poligonais (Fig. 3c). Identificamos duas geraes de biotita, a primeira marcando a foliao milontica e uma segunda, dis-cordante. No domnio das Rtf, essas biotitas mostram transformao para muscovita (Fig. 3d). O plagiocl-sio do tipo oligoclsio com teor mdio de 29% de

    anortita; est saussuritizado quando associado aos n-veis micceos e nas Rtf ocorre o desenvolvimento de muscovita segundo os planos de clivagem, sendo que apenas na amostra MFG-14D foi identificado carbo-nato. Tambm observamos uma segunda gerao de plagioclsio, mais albtico. A granada na RO ocorre como cristais com muitas incluses de quartzo no n-cleo, por vezes orientados (Fig. 3b), mostrando bordas sem incluses e contatos irregulares. Nas Rt ocorre uma gerao de cristais de granada com poucas in-cluses (Fig. 3e). A cordierita, restrita ao domnio das Rtint, ocorre como porfiroclastos que desviam a folia-o milontica. Mostra textura poiquiloblstica, com destaque para as incluses ativas de biotita, granada, minerais opacos, turmalina, quartzo e plagioclsio, sendo comum o desenvolvimento de placas de mus-covita em sua superfcie (Figs. 3f e 3g). A silimani-ta ocorre como cristais de fibrolita, desenvolvida nos

    Figura 2 - Mapa metamrfico simplificado do Depsito So Francisco com a loca-lizao das amostras. Adaptado de Luiz Silva (1995).

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    308 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    planos de clivagem da muscovita e da biotita (Fig. 3e) e no contato desta com a cordierita. Tambm obser-vamos cristais formados a partir da transformao de biotita e plagioclsio (Fig. 3h).

    Luiz Silva (2000) determinou a composio das principais fases mineralgicas do DSF com base em es-tudos de microssonda. A partir dos aspectos texturais e mineralgicos observados em lminas e das compo-sies das fases apresentadas por Luiz Silva (2000), sugerimos algumas reaes para a formao de mine-rais nas Rt, a partir das equaes (no primeiro membro esto os minerais que participaram como reagentes e no segundo membro os minerais produtos) (Equao 3 a 8):

    Biotita(1) + Plagioclsio(1) + Fluido cor-dierita + Muscovita(1) + ilMenita + esPinlio + Quartzo + FluidoK(Fe,Mg)3TiAlSi3O10(OH)2 + [6NaAlSi3O8 + CaAl2Si2O8] + [8H

    + + 3/2O2]

    FeMg2Al4Si5O18 + KAl3Si3O10(OH)2 + FeTiO3 + MgFeAl2O4 + 15SiO2 + [4H2O + 6Na

    + + Ca++]

    Plagioclsio(1) + Fluido Muscovita(1) + Plagioclsio (2) + calcita + Quartzo [7NaAlSi3O8 + 3CaAl2Si2O8] + [K

    + + H2O + CO2] KAl3Si3O10(OH)2 + [6NaAlSi3O8 + 2CaAl2Si2O8] + CaCO3 + 2SiO2 + Na

    +

    Muscovita(1) + Plagioclsio(1) + Fluido Biotita(2) + siliManita + Quartzo + Fluido KAl3Si3O10(OH)2 + [6NaAlSi3O8 + CaAl2Si2O8] + 3Fe++ + Mg++ KFe3MgAlSi3O10(OH)2 + 5Al2SiO5 + 6Na

    + + Ca++ + 15SiO2 + 1/2O2

    Biotita1 + Plagioclsio(1) + Fluido gra-nada + Biotita2 + Muscovita(1) + Quartzo K(Fe,Mg)3AlSi3O10(OH)2 + [5NaAlSi3O8 + CaAl2Si2O8] + [4H

    + + K+ + Ti4+]

    (3)

    (4)

    (5)

    (6)

    Figura 3 - Fotomicrografias das rochas do depsito So Francisco. Apenas a figura (b) foi fotografada com analisadores paralelos, as demais foram fotografadas com analisadores cruzados. (a) Cristais de plagiocl-sio (Pl) saussuritizado associado a quartzo (Qz) e biotita (Bt) na rocha original (MFG-06). (b) Cristais de granada (Gr) com sobrecrescimento nas bordas e incluses de quartzo (Qz). (c) Cristais com contatos retos poligonais evidenciando recristalizao esttica na amostra da rocha transformada intermediria - 2 (MFG-14D). (d) Placas de muscovita (Mus) gerada a partir da biotita (Bt), amostra MFG-14D. (e) Desenvolvimento de silimanita (Sil) na forma de fibrolita gerada a partir da biotita (Bt) e plagioclsio (Pl), amostra MFG-14D. (f) Incluses de plagioclsios (Pl) e desenvolvimento de muscovita (Mus) tardia em cristais de cordierita (Cd), amostra MFG-14D. (g) Placas de muscovita (Mus) corroda em cristais de cordierita (Cd), amostra MFG-14D. (h) Cristais de cordierita (Cd) e biotita (Bt), amostra MFG-14D.

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 309

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    Fe2Al2Si3O12 + KMg2FeTiAlSi3O10(OH)2 + KAl3Si3O10(OH)2 + 11SiO2 + 5Na

    + + Ca++ + Mg++

    Biotita(1) + Plagioclsio(1) + Fluido Biotita(2) + Muscovita(2) + Quartzo + heMa-tita + FluidoK(Fe,Mg)3AlSi3O10(OH)2 + [8NaAlSi3O8 + 2CaAl2Si2O8] + [8H

    + + 4K+ + 3/2O2] KMg3FeAl3Si3O10(OH)2 + 4KAl3Si3O10(OH)2 + 16SiO2 + Fe2O3 + 8Na

    + + 2Ca++

    Biotita(2) + Fluido turMalina + Quartzo + Fluido (Luiz Silva 1995)1,7831K1,65Na0,05(Mg2,20Fe2,44Mn0,01Cr0,01(Al3,55Ti0,21)(Si5,37)20(OH)4 +( 5,8756H

    + + 0,4508Na+ + 0,12Ca++ + 2,97B+++ + 0,0522+++) K 0 , 0 1 N a 0 , 5 4 C a 0 , 1 2 ( M g 1 , 6 7 F e 0 , 8 4 C r 0 , 0 7 )Al5,93O27(OH)4 + 3,6452SiO2 + 2,9321K

    + + 2,2528Mg++ + 3,5108Fe++ + 0,0178Mn++ + 0,2845Ti4+ + 4,504H2O

    As caractersticas observadas nas Rt, com re-lao RO, foram empobrecimento de plagioclsio, quartzo e granada e o aumento de biotita(2), alm da for-mao de muscovita, silimanita, cordierita, turmalina e, mais raramente, calcita. Os minerais que tiveram parti-cipao mais importante nas reaes de transformao foram o plagioclsio(1) e a biotita(1). As transformaes so evidenciadas por bordas de reaes nos contatos envolvendo estes dois minerais. Alguns aspectos como textura de dissoluo, textura em atol e esqueletal, alm de um aumento de remobilizados de quartzo nas faixas de rochas transformadas, so consistentes com a parti-cipao de fluidos nas reaes mineralgicas ocorridas durante o evento de cisalhamento. Estes fluidos foram os responsveis pela liberao e transporte dos ctions envolvidos nas transformaes e formao das novas fases mineralgicas.

    Nos estudos petrogrficos sistemticos obser-vamos que a variao mineralgica entre a RO e as Rt no foram significativas. A biotita(1) e o plagioclsio(1), na maioria das reaes minerais, participaram como reagentes. Porm, observamos que estes minerais tam-bm ocorrem como produto na zona milonitizada, com recristalizao esttica sob condies de altas tempera-turas, como mostram os contatos poligonais dos cristais e o aumento das dimenses dos constituintes mineral-gicos da rocha transformada com relao rocha origi-nal. Observa-se que o plagioclsio(2) mais albtico.

    Todas as reaes propostas aqui apresentadas so dos domnios das Rtint e Rtf. Na Rtint a reao mais importante foi a expressa pela equao (3), responsvel pela formao de cordierita e biotita(2). A formao da silimanita ocorreu principalmente a partir da reao ex-pressa pela equao (5), e a formao de muscovita in-dicativa de que ocorreram as reaes retrometamrficas sugeridas pelas equaes (3), (4), (6) e (7). A calcita e a granada tardia foram formadas a partir das transforma-es mostrada nas equaes (4) e (6), respectivamente.

    No domnio da Rtf, as fases minerais formadas que se sobressaem so muscovita, silimanita e turmalina. Essa ltima foi formada a partir da reao do quartzo com o fluido rico nos ctions Na+, Mn2+, Fe2+, e no anion F-, liberados nas reaes anteriores e do boro, segundo mos-trado pela equao (8) de Luiz Silva (1995).

    As transformaes mineralgicas mostram que na RO a associao granada-biotita indica que a rocha foi submetida a um metamorfismo da fcies xisto verde. O surgimento de cordierita e silimanita nas faixas das Rt implica em um aumento do gradiente geotrmico, atingindo a fcies anfibolito.

    A associao granada-biotita tpica de meta-morfismo regional por absoro de calor do ambiente, sendo P e T reflexos do calor da deformao. Nas faixas de Rt o aparecimento de minerais tipomrficos est rela-cionado a um metamorfismo hidrotermal, com um fluxo contnuo de fluidos, os quais possibilitou o desenvolvi-mento de cordierita em stios que tiveram a atuao de uma deformao moderada e a associao com silima-nita em stios de mais alta taxa de deformao. Resulta-dos semelhantes tambm foram obtidos por Luiz Silva (1995, 2000) e Luiz Silva & Legrand (1996).

    Comportamento geoqumico no Depsito So Fran-cisco Os grficos isocon da figura 4, foram constru-dos comparando-se os dados qumicos da RO com os das Rtint, bem como das rochas de maior grau de milonitizao com maior percentual das fases minerais transformadas (ver Tab. 1).

    Nos grficos isocon da figura 4, onde compa-ramos sistematicamente as mudanas de volume e de comportamento de elementos qumicos que ocorreram progressivamente da rocha encaixante para a zona mi-lonitizada, observa-se que houve aporte de K e Rb en-quanto que Na, Ca, Mn, Sr e volteis (PF) saram do sistema. Os elementos Al, Ti, Fe, Mg, Sm e Nd (Fig. 4A) se comportaram como imveis.

    O Si na maioria das vezes aparece na regio de diminuio de concentrao. A fixao do Al, Mg, Fe e Ti deve-se formao da cordierita, ilmenita e bio-tita, no estgio intermedirio e de biotita, muscovita e silimanita na zona milonitizada. A fase fluida reagente tinha em sua composio alm de H+, tambm K, que foi adicionado ao sistema como mostram os grficos isocon (Fig. 4). Esse K foi fixado nas novas geraes de muscovita e biotita. A sada de Na e de Ca do sistema explicada pelo consumo do plagioclsio. Na figura 4D observa-se que K, Na e Ca mostram uma recuperao com relao s rochas anteriores. Isso se deu em funo da gerao, no estgio final do evento, de biotita que fixou o K e plagioclsio que fixou Na e Ca como mos-tram as observaes petrogrficas. As variaes volu-mtricas apresentadas nos diagramas isocon, so cor-roboradas pelas variaes das densidades apresentadas pela RO e as Rt mostradas na tabela 1.

    O comportamento inicial dos volteis deve-se ao consumo da biotita para a formao da cordierita e silimanita, liberando suas molculas de H2O. O com-portamento do elemento Rb est diretamente ligado ao

    (7)

    (8)

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    310 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    do K e do Sr ao do Ca, uma vez que no ciclo geoqumico estes pares de elementos tm afinidades. Quanto ao Sm e Nd, em funo da pouca mobilidade destes durante o metamorfismo e da pequena variao composicional entre as rochas original e milonitizada, permaneceram relativamente imveis durante o evento.

    DEPSITO PONTA DA SERRA Geologia do Depsito de Ponta da Serra (DPS) Co-letamos as amostras do DPS numa cava garimpada (Fig. 5A) e em uma trincheira (Fig. 5B), onde ocorre um exemplo tpico da evoluo progressiva da trans-formao tectnica de um augen gnaisse de composi-o tonaltica em um milonito quartzoso. O ortognaisse apresenta nveis diferenciados de composio grano-diortica. Identificamos pelo menos duas foliaes me-tamrficas: S2 com atitude mdia N25

    oW/30oSW e S3 com direo N25oW/30-65oSW. Em xenlitos tambm foi reconhecida uma foliao pretrita correspondente a S1. A mineralizao encontra-se hospedada em zonas de cisalhamento D3 (Fig. 5).

    Na rea da cava garimpada as amostras MFG-22B e MFG-22D so as representantes do domnio da

    rocha original (RO). Apenas uma amostra do domnio da rocha intermediria (Rtint) foi analisada MFG-22C e na rea da trincheira a RO corresponde amostra MFG-22G, enquanto que no domnio da Rtint foram escolhi-das as amostras FJ-14B e a FJ-14C, classificadas como Rtint-1 e Rtint-2 respectivamente, por apresentarem um aumento progressivo na taxa de deformao. Trata-se de um protomilonito, apresentando nveis quartzo fel-dspticos descontnuos formando um discreto banda-mento com os nveis ricos em muscovita. Em zonas de deformao mais intensa essa rocha transformada em milonito leucocrtico cinza esbranquiado.

    Do domnio da rocha transformada final (Rtf), as duas amostras apresentam algumas caractersticas distintas: a amostra FJ-14A coesa, rsea a esbranqui-ada, classificada como Rtf-1; j a amostra MFG-22F cinza esbranquiada, classificada de Rtf -2 por apresen-tar-se num estgio de milonitizao mais avanado.

    Luiz Silva (1995, 2000) determinou as condi-es de presso e temperatura nos corpos de minrio hospedados em rochas do embasamento, os quais va-riam de 2,7 a 4,0 kbar e de 560 a 600oC, respectiva-mente. Esses valores provavelmente correspondem s

    Figura 4 - Grficos isocon do DSF da Rocha original (RO) X rochas transformadas intermedirias. Em (A) transformao foi isovolumtrica, em (B) a transformao se deu com perda de volume da rocha de aproximadamente 13%, em (C) com perda de volume da rocha de aproximadamente 12% e em (D) com uma perda de volume da rocha de aproximadamente 26%.

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 311

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    condies de cisalhamento dessas rochas.

    Petrografia As lminas estudadas foram confeccio-nadas a partir das amostras de todos os domnios. O quartzo constituinte principal da matriz (Figs. 6a, 6b e 6c). Alguns cristais mostram contatos retos poligonais, resultado de recristalizao esttica (Fig. 6d e 6e). No domnio das Rt, aumenta a ocorrncia de ribbons orien-tados segundo a foliao milontica. A biotita ocorre como palhetas hipidomrficas definindo a foliao da rocha. Palhetas de biotita de uma foliao dobrada (Fig. 6c) por vezes mostram bordas de reao com plagiocl-sio e muscovita (Fig. 6d).

    O plagioclsio oligoclsio -andesina com An 25-35%. Ocorre como porfiroclastos com bordas co-minudas (Fig. 6a) e como gros recristalizados que compem a matriz (Fig. 6d e 6e). Os primeiros esto bastante saussuritizados, com desenvolvimento de muscovita nos planos de clivagem. A muscovita ocorre como palhetas hipidiomrficas a idiomrficas, quando associada biotita (Fig. 6c) e xenomrficas quando desenvolvida na superfcie do plagioclsio (Fig. 6b).

    Estas ltimas possuem bordas irregulares e superfcies corrodas, preenchidas por quartzo, dando um aspecto de textura em atol. O microclnio constituinte mine-ralgico apenas nos domnios das Rt. intersticial na matriz recristalizada (Fig. 06d e 06e), caracterizando-se como um mineral neoformado, normalmente associado a biotita e muscovita com as quais mostra bordas de reao (Fig. 6d). A granada s foi verificada na amostra MFG-22C. Seus cristais ocorrem com textura de dis-soluo desviando parcialmente a foliao milontica (Fig. 6f) ou como cristais de forma arredondada com poucas incluses de quartzo (Fig. 6g e 6h). O rutilo ocorre como cristais xenomrficos alongados segundo a foliao milontica.

    Na rea do DPS temos um exemplo clssico da transformao de um ortognaisse em uma rocha milo-ntica rica em muscovita, feldspatos e quartzo. Os estu-dos petrogrficos mostraram que os minerais que tive-ram maior participao nas reaes, durante o evento de transformao, foram o plagioclsio e a biotita. A qumi-ca mineral de amostra de rea similar a do DPS realizado por Luiz Silva (2000) mostra a composio mdia das

    Elem/Am MFG-06 (RO)MFG-08 (RTint-1)

    MFG-14D (RTint-2)

    MFG-14E (RTf-1)

    MFG-14F(RTf-2)

    Fator de Correo

    SiO2 6,6 6,6 6,1 6,3 5,6 SiO2/10

    TiO2 4,0 3,9 4,4 4,5 5,3 TiO2 X 5

    Al2O3 7,3 7,3 8,4 8,3 9,9 Al2O3/2

    Fe2O3 6,4 5,9 7,7 7,4 7,7

    MnO 1,5 0,9 1,3 1,2 1,4 MnO X 10

    MgO 2,7 2,8 3,9 3,6 3,6

    CaO 2,6 2,2 1,7 1,4 2,9

    Na2O 2,9 3,2 2,1 1,7 3,6

    K2O 2,1 2,3 3,5 3,4 3,3

    P2O5 0,3 0,2 0,2 0,2 0,1

    PF 2,0 1,3 1,9 1,9 2,7

    Rb 7,4 7,6 10,7 10,2 11,3 Rb/10

    Sr 7,1 6,9 4,5 3,7 8,7 Sr/25

    Sm 2,2 2,4 Sm/2

    Nd 9,7 11,2 Nd/2

    Densidade 2,73 2,81 2,93

    Tabela 1 - Anlises qumicas dos elementos maiores (em % de peso) e traos (em ppm) das unidades litolgicas do Depsito So Francisco. Os volteis esto representados pela PF (Perda ao Fogo).

    Legenda: Elem = Elemento; Am = Amostra; RO = Rocha original, RTint-1 = Rocha intermediria menos trans-formada, RTint-2 = Rocha intermediria mais transformada, RTf-1 e RTf-2 = Rocha transformada final. O fator de Correo um valor escolhido para adequar os valores analticos a escala do grfico.

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    312 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    principais fases minerais envolvidas nas reaes:

    Biotita (K1,86Mg0,66Fe3,94Mn0,43Al3,17Ti0,44Si5,37 O20(OH)4)Plagioclsio (K0,01Na0,64Ca0,34Al1,43Si2,60O8)

    Estudo de incluses fluidas realizado por Luiz Silva (2000) indica que as rochas mineralizadas sofre-ram a influncia de um fluido inicialmente de natureza aquo-carbnica (XCO2 0,35), com baixa salinidade (< 8% em peso de NaCl equivalente) baixa concentrao de N2 e CH4. Posteriormente esse fluido evoluiu para aquoso com salinidade variada o que foi responsvel pelas reaes fluido-rocha, como evidenciado pelas texturas tpicas da ao de fluidos nos constituintes mi-

    neralgicos das rochas do DPS. Com isso, sugerimos as reaes de hidrlise em todos os casos. As principais reaes so as dadas pelas equaes 9 a 12:

    Biotita(1) + Plagioclsio(1) + Fluido Biotita(2) + Muscovita(1) + Quartzo + oPaco + Fluido K(Fe,Mg)3AlSi3O10(OH)2 + [7NaAlSi3O8 + CaAl2Si2O8] + [6H

    + + 3K+ 3/2O2] KMg3FeAlSi3O10(OH)2 + 3KAl3Si3O10(OH)2 + Fe2O3 + 14SiO2 + 7Na

    + + Ca++

    Plagioclsio(1) + Fluido Muscovita + Plagioclsio(2) + Quartzo + Fluido

    Figura 5 - Mapa geolgico simplificado do Depsito de Ponta da Serra (A) com a localiza-o das amostras das reas do garimpo (B) e da trincheira (C).

    (9)

    (10)

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 313

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    [7NaAlSi3O8 + 3CaAl2Si2O8] + [2H+ + K+]

    KAl3Si3O10(OH)2 + [6NaAlSi3O8 + 2CaAl2-Si2O8] + 2SiO2 + Ca

    ++ + Na+

    Biotita(1) + Fluido Microclnio + oPacos + Fluido K(Fe,Mg)3AlSi3O10(OH)2 + 6H

    + + 2O2 KAlSi3O8 + Fe3O4 + 3Mg

    ++ + 4H2O

    Biotita(1) + Fluido Microclnio + Biotita(2) + oPaco + Fluido 2K(Fe,Mg)3AlSi3O10(OH)2 + [8H

    + + 9/2O2] KAlSi3O8 + KMg3AlSi3O10(OH)2 + 2Fe3O4 + 3Mg++ + 5H2O

    As observaes em sees delgadas do DPS re-velaram alguns aspectos importantes, quando se com-param as constituies mineralgicas da RO com os seus produtos de transformaes. Observa-se aumento

    nos contedos de quartzo, muscovita e microclnio com a diminuio progressiva no percentual de biotita(1) e plagioclsio(1). No domnio das Rtint as reaes retro-metamrficas propostas so: equaes (9) e (10), na formao de muscovita(2), plagioclsio (2) e biotita(2) e no domnio da Rtf: equaes (11) e (12), na formao de microclnio, caracterizando anatexia. As observa-es tambm mostraram que ocorreu um aumento do percentual de muscovita na rocha cisalhada formada tanto a partir da biotita como a partir do plagioclsio sugeridas pelas equaes (9) e (10).

    Comportamento geoqumico no Depsito Ponta da Serra Para a confeco dos grficos isocon das figu-ra 7 e 8 utilizamos os dados qumicos mostrados nas tabelas 2 e 3. Sm e Nd foram determinadas apenas nas amostras MFG-22B, MFG-22D e MFG-22C da rea da cava garimpada, como mostra as tabelas 2 e 3.

    Os grficos isocon da figura 7A e 7B que com-param individualmente as RO com a Rtint-2, coletada na

    Figura 6 - Fotomicrografias das rochas do Depsito Ponta da Serra. (a) Porfiroclasto de plagioclsio (Pl) com incluses de biotita (Bt) e quartzo (Qz) na rocha original MFG-22B. (b) Cristais de plagioclsio (Pl) saussuritizado com desenvolvimento de muscovita (Mus) e incluses de quartzo (Qz), na amostra MFG-22B. (c) Foliao marcada por biotita dobrada na rocha transformada intermediria MFG-22C. (d) Placa de muscovita (Mus) mostrando borda de reao com microclnio (Mc). Na matriz, cristais de quartzo (Qz) e plagioclsio (Pl) com contatos poligonais, evidenciando recristalizao esttica, na rocha transformada intermediria FJ-14C. (e) Matriz de quartzo (Qz), microclnio e plagioclsio (Pl) em estgio avanado de recristalizao esttica, com contatos poligonais na amostra FJ-14C. (f) Granada (Gr) com textura de dissoluo, amostra MFG-22C. (g) Cristal de granada (Gr) com forma arredondada desviando a foliao marcada por biotita na amostra MFG-22C.

    (11)

    (12)

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    314 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    cava garimpada do DPS, mostraram que, independente-mente da amostra de RO utilizada, a transformao se pro-cessou com variao volumtrica desprezvel, compatvel com as densidades relativas observadas na tabela 3, e o comportamento dos elementos foi o mesmo, salvo peque-nas variaes nas quantidades de perda ou ganho de alguns elementos. Apenas os elementos Al e Si se comportaram como imveis durante o evento cisalhante. Os elementos Fe, Ti Mg, K, Rb e os volteis, ficam na regio de ganho de massa, enquanto que os elementos Ca, Na, P, Sr, Sm e Nd sofreram diminuio de concentrao.

    Os grficos isocon da rea da trincheira no do-mnio das Rtint mostra que a transformao ocorreu com um pequeno aumento de volume das rochas trans-formadas intermedirias em relao rocha original, em mdia 7%, ficando dentro de uma faixa de variao natural da composio das rochas, podendo ser consi-derada uma transformao isovolumtrica. Essas varia-es so compatveis com as densidades relativas apre-sentadas pelas RO e Rt mostradas nas tabelas 2 e 3.

    Os grficos mostram que os elementos Si, K e Rb nas Rtint, apresentam aumento da concentrao en-quanto que Ti, Ca, Sr, P e Fe apresentam perda de massa diminuio da concentrao). No domnio da Rtf existem diferenas texturais e composicionais entre as amostras escolhidas como representantes desse domnio. Utilizou-se, com isso, as duas Rtf com a RO em grficos separa-dos (Figs. 8A e 8B), para observar o comportamento dos elementos em ambas durante cisalhamento. A transfor-mao se processou com um pequeno ganho de volume das Rtf com relao a RO, de 4% em mdia, podendo

    Tabela 2 - Anlises qumicas dos elementos maiores (em % de peso) e traos (em ppm) das unidades litol-gicas da rea da cava garimpada.

    Elem\Am MFG-22B (RO)MFG-22D

    (RO)MFG-22C (RTint-2)

    F. de correo

    SiO2 6,3 6,5 6,2 SiO2/10

    Al2O3 8,2 8,0 8,2 Al2O3/2

    Fe2O3 6,4 6,0 7,5

    CaO 3,0 3,1 2,6

    MgO 1,8 1,5 2,3

    Na2O 4,1 3,9 3,4

    K2O 2,3 2,3 3,3

    MnO 1,3 1,1 1,6 MnO X 10

    TiO2 6,7 6,5 8,4 TiO2 X 10

    P2O5 1,9 1,9 1,1 P2O5 X 10

    PF 5,5 4,3 8,8 PF X 5

    Rb 8,1 8,4 12,1 Rb/10

    Sr 13,5 13,3 8,9 Sr/25

    Sm 2,7 2,6 1,3 Sm/2

    Nd 14,4 13,7 6,9 Nd/2

    Densidade 2,79 2,75 2,79

    Legenda: Elem = Elemento; Am = Amostra; RO = Rocha original, RTint-2 = Rocha intermediria mais transformada.

    Tabela 3 - Anlises qumicas dos elementos maiores (em % de peso) e traos (em ppm) das unida-des litolgicas da rea da trincheira.

    Elem\AmMFG-22G

    (RO)FJ-14B

    (Rtint-1)FJ-14C

    (RTint-2)FJ-14A (RTf-1)

    MFG-22F (RTf-2)

    Fator correo

    SiO2 6,5 6,9 7,2 7,3 7,2 SiO2/10

    Al2O3 7,9 7,5 7,3 7,6 7,6 Al2O3/2

    Fe2O3 5,8 3,7 2,2 0,6 1,7

    Co 2,9 1,8 1,8 0,8 0,7

    MgO 1,4 0,7 0,3 0,2 0,5

    Na2O 4,1 3,6 4,1 3,8 1,7

    K2O 2,6 4,5 4,0 4,6 5,8

    MnO 0,6 0,3 0,3 0,1 0,1 MnO X 5

    TiO2 6,1 5,6 4,4 4,3 5 TiO2 X 10

    P2O5 0,9 0,7 0,5 0,4 0,5 P2O5 X 5

    PF 0,9 0,8 0,4 1,0 1,9

    Rb 6,1 11,4 7,2 9,9 13,7 Rb/15

    Sr 10,9 7,8 6,9 5,8 3,3 Sr/30

    Densidade 2,80 2,71 2,66

    Legenda: Elem = Elemento; Am = Amostra; RO = Rocha original, RTint-1 = Rocha intermediria menos transformada, RTint-2 = Rocha intermediria mais transformada, RTf-1 e RTf-2 = Rochas transformada final.

  • Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008 315

    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    Figura 8 - Grficos isocon do DPS da Rocha original RO X rochas transformadas inter-mediria 1 e 2. Com relao a variao de volume das rochas, em (A) transformao ocor-reu com aumento de cerca de 5%, em (B aumento de cerca de 5%, em (C)e (D) aumento de cerca de 4%.

    Figura 7 - Grficos isocon do DPS das Rochas originais RO X rocha transformada intermediria. Em (A) transformao foi isovolumtrica e em (B) a transformao se deu com aumento de volume da rocha de aproximadamente 3%.

  • Comportamento de elementos qumicos em rochas mineralizadas em ouro na Faixa Serid, Provncia Borborema

    316 Revista Brasileira de Geocincias, volume 38 (2), 2008

    ser considerada como uma transformao isovolumtri-ca. O comportamento dos elementos no domnio das Rtf foi semelhante ao observado no domnio das Rtint, com Si, K, Rb e os volteis sempre apresentando aumento da concentrao, enquanto que Ti, Ca, Mg, Sr e Fe diminui-o da concentrao. O Na na Rtf-1, se comporta como imvel e na Rtf-2 mostra uma elevada perda de massa com relao rocha original.

    DISCUSSES As mineralizaes de ouro da Faixa Se-rid so epigenticas formadas por circulao de fluidos hidrotermais, a maioria controlada por zonas de cisalha-mento que funcionaram como canais por onde circularam grandes volumes destes fluidos. A interao dos fluidos com as rochas possibilitou a permuta entre elementos transportados e os elementos formadores dos constituintes mineralgicos da rocha. As evidncias de interao fluido-rocha so texturas de dissoluo em mineral, bordas de reao e substituio parcial ou total de minerais.

    A composio inicial do fluido era complexa com H2O, CaCl2, NaCl KCl LiCl MgCl2 FeCl2 pas-sando a ter menor quantidade de NaCl e KCl a medida que esse fluido percorria as rochas. As condies de P e T foram respectivamente de 3,5 0,7 kbar e 574o 30oC (Luiz Silva 1995, 2000; Luiz Silva et al. 2000). Essa tem-peratura mais elevada do que a obtida por Streit & Cox (1998) na transformao de um granito em milonito.

    Os estudos mostraram que a biotita e o pla-gioclsio, foram os minerais com participaes mais efetivas em todas as reaes ocorridas nas rochas mi-

    lonitizadas, principalmente na formao de muscovita, requerendo aumento na quantidade de K e, conseqen-temente, liberao de Na e Ca para a fase fluida. No depsito So Francisco, porm, a rocha transformada apresenta recristalizao destes dois minerais como produto da fase tardia do evento. Esse foi o fator prin-cipal para justificar o comportamento do Fe e Mg que apresentaram aumento da concentrao nas rocha in-termediria e imveis na transformada final (Fig. 9A). Isso confirmado pela pequena variao composicio-nal entre a rocha original e a transformada final. Em contrapartida, n depsito Ponta da Serra, esses minerais praticamente desapareceram na rocha transformada final, justificando o comportamento diferenciado dos elementos Fe e Mg e a diminuio da concentrao de Na, Ca e Sr pelo fato de terem sido fixados em nenhu-ma fase mineral tardia (Fig. 9B). Essa hiptese tambm pode justificar comportamento dos elementos Sm e Nd, os grficos isocon das figuras 4C, 7A e 7B mostram que no primeiro caso Sm e Nd se comportaram como elementos imveis e no segundo ambos apresenta con-sideravel diminuio da concentrao. A causa mais provvel para o primeiro caso que os elementos Sm e Nd tenham sido incorporados nas estruturas da biotita e do plagioclsio recristalizados na rocha transformada final do depsito So Francisco. No caso do depsito Ponta da Serra, o consumo da biotita e do plagioclsio nas reaes para a formao de muscovita e microclnio possibilitou a liberao do Sm e Nd para a fase fluida, pois estes so os minerais da rocha original que normal-

    Figura 9 - Integrao dos dados de aumento da concentrao e diminuio da de ele-mentos qumicos obtida a partir dos diagramas isocon das rochas transformadas com relao s rochas originais dos depsitos (A) So Francisco, (B) Ponta da Serra.

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    Ivaldo Rodrigues da Trindade et al.

    mente possuem as maiores concentraes de Sm e Nd.Porm, um fato que chama a ateno que o

    Sm e o Nd apresentam diminuio de suas concentra-es na mesma proporo confirmando o carter isoqu-mico desses elementos, indicando que a razo Sm/Nd no deve ter sido modificada significativamente, no afetando assim o sistema isotpico, conforme descrito em Trindade (2000), Trindade et al. (2001) e Dantas et al (2002). J o Rb e o Sr tiveram comportamentos dis-tintos mostrando que o uso dos dados isotpicos desse sistema deve ser visto e interpretado sempre com mui-ta cautela, salvo quando da realizao de estudos que comprovadamente mostrem a no mobilidade destes elementos durante os processos geolgicos.

    CONCLUSES Com os resultados que obtivemos, ficou evidente que as propriedades reolgicas, compo-sicionais e texturais das rochas submetidas a processos deformacionais e/ou acompanhadas por hidroterma-lismo podem exercer influncia sobre a mobilidade de elementos qumicos, com alguns apresentando maior ou menor capacidade de permanecer no sistema.

    O estudo de mobilidade qumica nos depsitos So Francisco e Ponta da Serra, como visto na figura 9, deixa claro que o K e o Rb juntamente com os vol-teis, apresentaram aumento da concentrao quando se compara a rocha transformada final com a original. Os elementos Na, Ca e Sr, em ambas as mineralizaes,

    apresenta diminuio da concentrao, enquanto que o Fe e o Mg na primeira apresenta aumento da concen-trao, mesmo que na amostra MFG-14F do depsito So Francisco tenham se comportado como imveis, enquanto que no depsito Ponta da Serra, estes elemen-tos tiveram aumento da concentrao. No depsito So Francisco o aumento da concentrao dos elementos K e Rb e diminuio da concentrao dos elementos Na, Ca e Sr so bem menores do que o observado no dep-sito Ponta da Serra como mostra a figura 7. O Sm e o Nd, apesar do nmero reduzido de amostras analisadas em cada depsito, mostraram-se imveis no depsito So Francisco e com diminuio da concentrao na mesma proporo no depsito Ponta da Serra.

    Uma caracterstica marcante nas rochas cisa-lhadas, hospedeiras das mineralizaes, com relao s rochas originais em ambos os depsitos, o aporte do K, sugerindo que a mineralizao est associada a um metassomatismo potssico.

    Agradecimentos Os autores agradecem a CAPES pelo apoio financeiro. Ao professor. Mrcio M. Pimen-tel e professora Maria Helena B. M. de Hollanda pelas anlises de Rb, Sr, Sm e Nd no Laboratrio de Geocro-nologia da UNB e ao DG-UFRN por ter permitido o uso de seus laboratrios para preparao das amostras para as anlises qumicas.

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    Manuscrito AE 077/2006Submetido em 24 de janeiro de 2007

    Aceito em 24 de junho de 2008