71 revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … ling. acadêmica batatais v. 8 n....

14
Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira Trailing Arm: uma alternativa ao sistema Duplo A do veículo Mini Baja SAE João Paulo Muniz BARBOSA 1 Kawey Roberto ALVALAZ 2 Eduardo CASARIN 3 Resumo: O presente artigo científico apresenta o desenvolvimento de um estudo de caso sobre o mecanismo de suspensão utilizado na elaboração de um veículo Mini Baja SAE. O Mini Baja é um campeonato organizado pela SAE BRASIL, que consiste no desenvolvimento de um projeto de veículo automotivo com características off-road, em que os participantes, estudantes de Engenharia de todo o Brasil, confeccionam o veículo, e competem entre si, com a finalidade de testar a qualidade do projeto. A equipe vencedora é aquela cujo rendimento é devidamente alcançado. A análise da suspensão do veículo foi realizada por meio de revisão de literatura para o desenvolvimento e construção de uma suspensão do tipo Trailing Arm, visando alcançar melhor rendimento em futuros campeonatos, considerando que a suspensão utilizada, do tipo Duplo A, não obteve o rendimento esperado, prejudicando a execução da prova. Por meio deste artigo, pretende-se auxiliar futuros estudantes de Engenharia que venham a participar do campeonato desenvolvido e organizado pela SAE. Além disso, espera- se que os resultados possam garantir maior rendimento do veículo Mini Baja. Palavras-chave: Suspensão. Trailing Arm. Mini Baja SAE. 1 João Paulo Muniz Barbosa. Bacharel em Engenharia Mecânica pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>. 2 Kawey Roberto Alvalaz. Bacharel em Engenharia Mecânica pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>. 3 Eduardo Casarin. Especialista em Administração Industrial e Especialista em Logística Empresarial pelo Instituto Nacional de Pós-graduação (INPG). Especialista em Metodologia de Educação a Distância pelo Claretiano – Centro Universitário. Bacharel em Engenharia Mecânica pela Escola de Engenharia da Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba (EEP/FUMEP). E-mail: <[email protected]>.

Upload: others

Post on 22-Mar-2021

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

71

Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira Trailing Arm: uma alternativa ao sistema Duplo A do veículo Mini Baja SAE

João Paulo Muniz BARBOSA1

Kawey Roberto ALVALAZ2

Eduardo CASARIN3

Resumo: O presente artigo científico apresenta o desenvolvimento de um estudo de caso sobre o mecanismo de suspensão utilizado na elaboração de um veículo Mini Baja SAE. O Mini Baja é um campeonato organizado pela SAE BRASIL, que consiste no desenvolvimento de um projeto de veículo automotivo com características off-road, em que os participantes, estudantes de Engenharia de todo o Brasil, confeccionam o veículo, e competem entre si, com a finalidade de testar a qualidade do projeto. A equipe vencedora é aquela cujo rendimento é devidamente alcançado. A análise da suspensão do veículo foi realizada por meio de revisão de literatura para o desenvolvimento e construção de uma suspensão do tipo Trailing Arm, visando alcançar melhor rendimento em futuros campeonatos, considerando que a suspensão utilizada, do tipo Duplo A, não obteve o rendimento esperado, prejudicando a execução da prova. Por meio deste artigo, pretende-se auxiliar futuros estudantes de Engenharia que venham a participar do campeonato desenvolvido e organizado pela SAE. Além disso, espera-se que os resultados possam garantir maior rendimento do veículo Mini Baja.

Palavras-chave: Suspensão. Trailing Arm. Mini Baja SAE.

1 João Paulo Muniz Barbosa. Bacharel em Engenharia Mecânica pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.2 Kawey Roberto Alvalaz. Bacharel em Engenharia Mecânica pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <[email protected]>.3 Eduardo Casarin. Especialista em Administração Industrial e Especialista em Logística Empresarial pelo Instituto Nacional de Pós-graduação (INPG). Especialista em Metodologia de Educação a Distância pelo Claretiano – Centro Universitário. Bacharel em Engenharia Mecânica pela Escola de Engenharia da Fundação Municipal de Ensino de Piracicaba (EEP/FUMEP). E-mail: <[email protected]>.

Page 2: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

72

Literary review of the rear suspension system Trailing Arm: an alternative to the Double A system of the Mini Baja SAE vehicle

João Paulo Muniz BARBOSA1Kawey Roberto ALVALAZ2

Eduardo CASARIN3

Abstract: This paper presents the development of a case study on the suspension mechanism used in the design of a Mini Baja SAE vehicle. The Mini Baja is a championship organized by SAE BRASIL, which consists of the development of an off-road vehicle design in which the participants, Engineering students from all over Brazil, make the vehicle, and compete with each other, with the purpose of testing the quality of the project. The winning team is the one whose performance is properly achieved. The suspension analysis of the vehicle was carried out by means of literature review for the development and construction of a suspension of the Trailing Arm type, aiming to achieve better performance in future championships, considering that the suspension used, of the Double A type, did not obtain the yield performance of the test. The article, intends to help future Engineering students who will participate in the championship developed and organized by SAE. In addition, it is expected a guarantee of greater performance of the Mini Baja vehicle from the results.

Keywords: Suspension. Trailing Arm. Mini Baja SAE.

Page 3: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

73

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo foi desenvolvido após a equipe do Claretiano – Faculdade, em Rio Claro, par-ticipar da 21ª competição Baja SAE Nacional, no ano de 2015. Nessa competição, o objetivo é que os alunos projetem e construam um veículo monoposto, off-road, de acordo com os critérios e regulamen-tos da SAE Brasil. Os participantes do projeto foram alunos de Engenharia Mecânica, Elétrica e Meca-trônica do Claretiano – Faculdade, em Rio Claro.

A equipe, denominada Clarengex, elaborou o veículo passo a passo, no período aproximado de dois anos, contando desde a preparação do projeto até sua finalização para competição.

O veículo elaborado, por sua vez, utilizou uma suspensão traseira do tipo Duplo A, e não obteve o desempenho esperado, visto que ocorreu o desencaixe do semieixo da roda pela variação angular da cambagem, impossibilitando que o protótipo finalizasse o enduro, que é a principal prova na classifica-ção das equipes e tem duração de quatro horas. Em decorrência da falha, o veículo elaborado suportou aproximadamente uma hora.

O objetivo principal deste artigo, considerando as problemáticas encontradas com o veículo elabo-rado, é de propor uma possível solução para o problema que ocorreu com a suspensão traseira do veículo Mini Baja Clarengex.

A primeira medida a ser tomada em um projeto de suspensão é a definição do tipo de emprego geral do veículo, ou seja, se ele será um veículo off-road ou para uso predominante em asfalto (MER-LING, 2007).

Ao demonstrar as características de funcionamento das suspensões do tipo independente, pode-se chegar a uma alternativa que atenda aos requisitos propostos e que se enquadre na aplicação proposta.

Tendo em vista a relação entre custo e benefício, buscamos uma solução em literaturas, artigos e projetos já elaborados. Buscou-se uma suspensão traseira que se adequasse a um movimento unicamente vertical e com movimento restrito de cambagem. Com isso, chegou-se à suspensão do modelo Trailing Arm (braços arrastados).

A suspensão do tipo Trailing Arm consiste em um único braço transversal, que normalmente é posicionado em conexão a uma barra de torção, com a finalidade de dificultar a rolagem do veículo, per-mitindo maior compactação do conjunto de suspensão, com melhor aproveitamento do espaço interno, quando comparado a outros tipos de suspensão (OKABE, 2003).

A suspensão de braços arrastados se trata de uma suspensão independente e, neste sentido, se dife-rencia das suspensões que contêm eixo rígido, devido ao fato de o movimento vertical de uma roda não interferir no movimento da outra de mesmo eixo. Outro benefício dessa suspensão consiste em promo-ver maior rigidez à rolagem relativamente à rigidez vertical (FREITAS JUNIOR, 2006).

Para melhor entendimento da suspensão proposta, é relevante explicar como funciona um sistema de suspensão e qual seu modo de operação em um veículo.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Nos tópicos a seguir, relataremos, de modo detalhado, alguns modelos de suspensões indepen-dentes, citando suas principais características e seus modos de funcionamento. Esta seção é de suma importância para o entendimento do projeto.

Page 4: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

74

Suspensões

A suspensãoSuspensão é um mecanismo utilizado com a finalidade de absorver impactos causados pelo solo

e diz respeito a um conjunto de componentes que conectam as rodas com o chassi de um determinado veículo. Além de absorver impactos, a suspensão também é responsável por garantir conforto, segurança e a devida dirigibilidade ao condutor e aos passageiros do veículo (ALMEIDA JUNIOR, 2007).

Nos últimos tempos, o desenvolvimento de suspensões tem sido auxiliado por softwares de si-mulações matemáticos que realizam comparações de dados e cálculos. Esse sistema de softwares vem poupando tempo e dinheiro com relação a projeto de suspensões, devido à confiabilidade de seus dados (REZENDE; BORGES, 2003).

A maior problemática na criação de uma suspensão mecânica consiste na definição de uma rigi-dez da mola e uma relação de amortecimento, de modo que haja sincronia entre o comportamento da suspensão e o conforto do piloto (SAVARESI et al., 2010). Daí a importância de se pensar em um tipo de suspensão que possa contribuir, de modo geral, com todas as demandas necessárias para o bom de-sempenho do veículo.

Basicamente, as suspensões são compostas por molas, amortecedores e isoladores (coxins). Esses componentes estão presentes na maioria das suspensões utilizadas no dia a dia.

De maneira a atender os diferentes tipos de construções de veículos, existe uma grande variedade de sistemas de suspensão disponíveis atualmente no mercado. Essas variações de sistemas são necessá-rias para atender os inúmeros conceitos adotados pelos fabricantes de automóveis devido aos diferen-tes requisitos de utilização e às condições características de solicitação das suspensões dos veículos a serem produzidos para os vários tipos de mercados e consumidores (ALMEIDA JUNIOR, 2007, p. 24).

As suspensões existentes se dividem em dois grupos, as independentes, que funcionam sem a in-terferência uma da outra, e as dependentes, mais conhecidas como eixo rígido.

Suspensões independentesAo analisar o posicionamento do veículo, levando em consideração o terreno no qual a prova é

realizada, foi possível identificar que o sistema de suspensão independente teve maior desempenho que uma suspensão dependente (eixo rígido). Isso se deve pelo fato de as rodas do veículo sempre estarem perpendiculares ao solo. Quando a suspensão é dependente, qualquer desnivelamento do terreno acarre-ta a variação da cambagem em relação ao veículo.

Modelo Trailing Arm (braços arrastados)

O sistema de suspensão Trailing Arm (braços arrastados) trata-se de um sistema independente, sendo considerado um dos mais eficientes, pelo fato de possuir elevada resistência, bem como manu-tenção simples e barata. Esse sistema se mostra mais eficiente em suspensões traseiras, devido à sua robustez e a seu sistema de funcionamento, que faz com que as rodas se posicionem paralelamente em qualquer situação de terreno exigida, evitando a variação da cambagem, existente em outros sistemas.

Um dos mais simples e econômicos projetos de suspensão dianteira independente foi a Trailing Arm usada pela Volkswagen e pela Porsche, por volta da época da II Guerra Mundial (ALMEIDA JU-NIOR, 2007).

Quando o sistema de suspensão Trailing Arm é empregado, seu método para instalação é simples, porém preciso, e seu custo baixo, porém suas opções de regulagem são limitadas. Esse sistema tem como benefício a variação de cambagem zero, em relação ao veículo, independentemente da situação exigida.

Quando se opta pelo sistema de suspensão Trailing Arm, o funcionamento do mecanismo faz com que a roda suba e desça sem alteração de cambagem. Todo movimento de variação angular é restringido

Page 5: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

75

em seus movimentos paralelos. Quando o veículo é submetido a uma curva, sua carroceria tende a rolar, fazendo os braços paralelos se posicionarem no mesmo ângulo. Ocorre, assim, uma alteração de camba-gem em relação ao solo, e o veículo tende ao subesterçamento.

Figura 1. Suspensão dianteira Trailing Arm.

Fonte: adaptado de Almeida Junior (2007, p. 27).

Modelo Semi-trailing Arm (braços semiarrastados)

A suspensão traseira do tipo Semi-trailing foi popularizada pela BMW e pela Mercedes Benz. Esse sistema não apresenta nenhuma alteração de câmber em relação à carroceria. Seus eixos de fixação são usualmente posicionados a 25 graus em relação à linha de rolagem do veículo. Esse sistema produz um efeito de esterçamento quando as rodas se movem da posição inicial à final (ALMEIDA JUNIOR, 2007).

Figura 2. Suspensão Semi-trailing Arm.

Fonte: adaptado de Gillespie (1992, p. 246).

Double Wishbone (Duplo A)

A suspensão Duplo A, utilizada no projeto, também conhecida como Double Wishbone, é compos-ta por dois braços em forma de “A”, dando origem ao seu nome. Nela, os amortecedores e molas podem ser fixados em qualquer um dos braços, e também na manga.

Page 6: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

76

Utilizada na maioria dos veículos na parte dianteira, ela se caracteriza pelas infinitas possibilida-des de instalação e regulagem, influenciando diretamente em parâmetros dinâmicos como: centro de rolagem, subesterçamento, sobre-esterçamento, cambagem e cáster.

A bandeja dupla (Duplo A) foi o tipo mais comum de suspensão empregada no eixo dianteiro de veículos. Atualmente ainda é muito útil, principalmente nos casos em que se deseja ter o total controle sobre os ângulos característicos da suspensão do veículo (MERLING, 2007).

Figura 3. Suspensão Duplo A.

Fonte: adaptado de Almeida Junior (2007, p. 24).

Em casos em que o desempenho do veículo está acima de outros fatores, a melhor solução é normalmente a utilização desse tipo de geometria. No mercado nacional, é muito implementada em ve-ículos off-road, caminhonetes e em alguns sistemas traseiros, como no caso do Honda Civic 2011. Em competições automobilísticas de alto desempenho, como a Fórmula 1 e Stock Car, e em superesportivos, esse tipo de geometria é amplamente utilizado (ANDRADE, 2013).

Geometrias

A seguir, apresentaremos os principais conceitos relacionados às geometrias dos principais tipos de suspensões.

Suspensão dependente

Suspensão eixo rígido (Solid Axle)

Esse tipo de suspensão normalmente é utilizado em associação com feixes de mola, sendo assim a melhor opção para veículos de transporte como caminhões, ônibus e caminhonetes (OKABE, 2003).

Page 7: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

77

Figura 4. Suspensão eixo rígido.

Fonte: adaptado de Okabe (2003, p. 92).

Cambagem

A cambagem é um dos parâmetros mais importantes com relação ao desenvolvimento cinemático e dinâmico de suspensões, devido a suas influências nas forças laterais e longitudinais de um automóvel. Identifica-se o ângulo no plano frontal do veículo como sendo o ângulo dado entre a linha vertical (eixo Z) e a linha de centro do pneu, conforme imagem a seguir (ANDRADE, 2013).

Figura 5. Demonstrativo de cambagem.

Fonte: adaptado de Andrade (2013, p. 12).

A cambagem possui dois tipos de regulagem, a regulagem positiva (câmber positivo) e a regula-gem negativa (câmber negativo). Para cada tipo, o comportamento dinâmico é diferente.

No que diz respeito ao comportamento dinâmico, o câmber afeta na aderência, seja nas retas ou nas curvas. Um câmber negativo reduz o subesterçamento (tendência de deslizamento das rodas diantei-ras) e aumenta a aderência nas curvas, entretanto reduz a aderência nas retas. Já o câmber positivo reduz o sobre-esterçamento (tendência de deslizamento das rodas traseiras), mas pode tornar o carro instável (ANDRADE, 2013).

Page 8: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

78

Cáster

Cáster é o ângulo lateral entre o pino mestre e a vertical, sendo considerado positivo quando parte superior da roda está inclinada para a parte traseira do veículo, e negativo quando a parte superior está inclinada para a frente.

O cáster é responsável pela estabilidade do veículo e pelo autoalinhamento, mesmo efeito que ocorre, por exemplo, em um carrinho de supermercado.

O cáster é, por definição, positivo quando o eixo de giro tem a parte superior voltada para a frente do veículo e negativo se a parte superior do eixo de giro estiver para trás. Quando o cáster é positivo, a direção torna-se mais estável e, quanto mais positivo ele for, maior o será o esforço necessário para alterar a trajetória retilínea do veículo. A principal função do cáster é possibilitar a estabilidade da direção do veículo, sendo responsável pelo retorno da direção à posição de trajetória em linha reta após as curvas. Sua inclinação não influi no desgaste dos pneus nas retas (MERLING, 2007, p. 69).

Figura 6. Ângulo cáster.

Fonte: adaptado de Andrade (2013, p. 14).

Convergência e divergência

Entre as regulagens possíveis de uma suspensão, estão a convergência e a divergência. Segundo Merling (2007), veículos com tração traseira utilizam rodas dianteiras convergentes e traseiras divergen-tes, isso ocorre inversamente em trações dianteiras, que possuem rodas dianteiras divergentes e traseiras convergentes. Essa configuração se dá por conta do torque que o veículo produz ao tracionar o veículo.

Essas implementações nos sistemas de suspensão do veículo são utilizadas, pois os torques que as ro-das causam ao tracionar o veículo ocasionam a geração de força nos braços da suspensão, para frente no caso de tração no eixo, e para trás no caso de frenagem. O eixo sem tração deve ser sempre consi-derado como se estivesse executando uma pequena frenagem, pois, mesmo que não esteja atuando o freio, a força de resistência ao rolamento do pneu estará apontando sempre para a traseira do veículo (MERLING, 2007, p. 74).

Page 9: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

79

Figura 7. Ângulos de convergência e divergência.

Fonte: adaptado de Merling (2007, p. 74).

Subesterçamento e sobre-esterçamento

Segundo Andrade (2013), esses dois tipos de configurações influenciam muito na dinâmica de um veículo, podendo ser configuradas para tipos diferentes de finalidade, como uma competição ou uma simples viagem.

O subesterçamento é o comportamento que o veículo tende a ter quando sai pela dianteira em uma curva, a regulagem de um subesterçamento atenuado aumenta a aderência nas retas e curvas, e evita o excessivo desgaste dos pneus.

Sobre-esterçamento é praticamente o oposto. Quando o veículo é submetido a uma curva, tende a sair de traseira, mantendo a trajetória da direção e diminuindo assim seu esforço. Esse sistema é o mais utilizado no geral e na maioria dos veículos Baja. Devido à localização do motor e pela tração traseira, esse efeito é mais significante (ANDRADE, 2013).

Figura 8. Subesterçamento e sobre-esterçamento.

Fonte: adaptado de Andrade (2013, p. 9).

Page 10: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

80

Centro de rolagem

Segundo Fontana Júnior (2005), o centro de rolagem estabelece o ponto de uma junção de forças situadas entre a massa suspensa e não suspensa do veículo. Quando o veículo é submetido a uma curva, ocorre uma força centrífuga, que atua no centro de gravidade, deslocando-o no sentido do centro de rolagem.

Quanto mais próximo o centro de rolagem estiver do centro de gravidade, menor o momento de rolagem (centro de rolagem positivo). Com isso, obtém-se mais controle do veículo em curvas, exigindo menos da suspensão. Quando ocorre o inverso (centro de rolagem negativo), tende-se a um ganho de tração e a uma perda da estabilidade em curvas, exigindo assim mais da suspensão.

O centro de rolagem está diretamente ligado à geometria da suspensão do veículo, influenciando diretamente o comportamento dinâmico. Portanto, cada suspensão tem sua característica em relação ao centro de rolagem. Para cada modelo de suspensão, o centro de rolagem muda.

Figura 9. Centro de rolagem positivo/negativo (suspensão Duplo A).

Fonte: adaptado de Gillespie (1992, p. 265-266).

Figura 10. Centro de rolagem “triângulo traseiro perpendicular” (geometria usada também em uma suspensão Trailing Arm).

Fonte: adaptado de Merling (2007, p. 81).

Page 11: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

81

3. METODOLOGIA

A metodologia empregada neste trabalho consiste no levantamento literário, que tem por base explorar referenciais teóricos a respeito dos principais tipos de suspensões e seus conceitos, propondo a sugestão de uma alternativa ao modelo empregado no projeto desenvolvido pela equipe Clarengex.

Análise do problema

Podemos verificar, nas figuras a seguir, uma vista traseira do veículo Mini Baja e dos dois tipos de suspensão: do lado direito, a suspensão do tipo Duplo A; e, do lado esquerdo, a suspensão proposta Trailing Arm.

A figura 11 nos mostra os dois tipos de suspensão em posição de alívio da massa do veículo. Po-demos perceber, na suspensão Duplo A, que a roda está mais próxima do chassi do Mini Baja. O mesmo acontece com a suspensão Trailing Arm.

Figura 11. Comparativo de movimentação entre as suspensões Trailing Arm e Duplo A (posição baixa).

Fonte: adaptado de Canamoffroadmedia (2011).

Analisando a figura 12, com o veículo em repouso, podemos observar que a suspensão Duplo A teve uma variação horizontal e vertical. A suspensão Trailing Arm teve apenas uma variação vertical, sendo assim uma das opções mais adequadas para resolução do problema apresentado.

Page 12: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

82

Figura 12. Comparativo de movimentação entre as suspensões Trailing Arm e Duplo A (posição neutra).

Fonte: adaptado de Canamoffroadmedia (2011).

Figura 13. Comparativo de movimentação entre as suspensões Trailing Arm e Duplo A (posição alta).

Fonte: adaptado de Canamoffroadmedia (2011).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após a análise do problema de suspensão no Baja Clarengex, foi proposta a modificação do siste-ma de suspensão, devido a problemas relacionados à variação excessiva do câmber. Com isso, buscamos uma suspensão que não apresentasse variação de cambagem. Assim, optamos pela suspensão Trailing Arm. Sua fabricação é de simples complexidade e seu funcionamento atende aos resultados esperados. A modificação é, então, possível, porém é necessária uma alteração na gaiola do veículo, a fim de melhorar a fixação da suspensão.

Pode-se concluir, frente ao problema inicial, que uma falha no projeto da geometria da suspensão em relação ao veículo Mini Baja fez com que não se obtivesse o desempenho esperado.

Verificou-se, portanto, que o sistema de suspensão do tipo Trailing Arm, por sua vez, atenderia as necessidades do veículo, visto que esse tipo de suspensão é considerado um dos mais eficientes para veículos off-road. Além disso, esse sistema traz benefícios financeiros, por ser mais barato e com manu-tenção simples de se realizar (ALMEIDA JUNIOR, 2007).

De acordo com a construção do sistema Duplo A da equipe Clarengex, podemos analisar a Tabela 1, mostrando como o sistema Trailing Arm tem uma melhor relação entre custo e benefício.

Page 13: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

83

Tabela 1. Tabela de comparação.

COMPARAÇÃO - DUPLO A × TRAILING ARM

Duplo A Trailing Arm

Peso 2,93 Kg 1,46 KgTubo 1”.1/4 2 metros 1 metroTerminal rotular 2 unidades 2 unidadesManga de eixo 2 unidades 2 unidadesBucha de poliuretano 8 unidades 4 unidadesPontos de fixação 4 pontos 2 pontosParafusos e porcas para fixação 6 unidades 4 unidades

Mão de obra/Horas 8 horas 4 horas

Fonte: elaborado pelos autores.

O Trailing Arm seria, portanto, o sistema de suspensão mais indicado para aplicação no veículo Mini Baja Clarengex.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA JUNIOR, V. Parametrização dos valores de geometria do sistema de suspensão de veículos de passageiros. 2007. 104f. Trabalho de Conclusão de Curso (Mestrado em Engenharia Automotiva) – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2007. Disponível em: <http://www.automotiva-poliusp.org.br/wp-content/uploads/2013/02/valdeck_almeida.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2017.

ANDRADE, G. O. Dimensionamento geométrico e análise elastocinemática de suspensão automotiva tipo Duplo A. 2013. 96f. Monografia (Bacharel em Engenharia Automotiva) – Universidade de Brasília Faculdade do Gama. Brasília, 2013. Disponível em: <https://pt.scribd.com/document/260171027/2013-GuilhermedeOliveiraAndrade-Suspensao-Duplo-A>. Acesso em: 17 ago. 2017.

CANAMOFFROADMEDIA. Torsional Trailing arm Independent (TTI) rear suspension with external sway bar. 2011. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=CldP_o95zEY>. Acesso em: 15 jul. 2016.

FREITAS JUNIOR, L. M. P. Estudo da dinâmica vertical de uma suspensão veicular do tipo Macpherson. São Carlos, 2006. 122f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecanica) – Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/18/18149/tde-19012011-114031/publico/DissertacaoMestradoLuisMauro.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2017.

FONTANA JÚNIOR, R. Estudo das características dinâmicas de um veículo 4X4. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.

GILLESPIE, T. D. Fundamentals of vehicle Dynamics. Warrendale: Society of Automotive Engineers, 1992.

MARTINS, H. L. M. Simulação dinâmica de um veículo sob diferentes geometrias de direção. 2010. 118f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) – Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana, São Bernardo do Campo, 2010. Disponível em: <http://livros01.livrosgratis.com.br/cp144377.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2017.

MERLING, M. C. C. Uma abordagem gerencial para o procedimento de projeto de suspensões de veículos terrestres. 2007. 174f. Dissertação (Mestrado em Ciências em Engenharia Mecânica) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007. Disponível em: <https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/11506/11506_1.PDF>. Acesso em: 17 ago. 2017.

OKABE, E. P. Metodologia de projeto para o desenvolvimento de suspensão veicular. 2003. 180f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) – Faculdade de Engenharia Mecânica - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2003. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/264482>. Acesso em: 17 ago. 2017.

REZENDE, J. C.; BORGES, J. A. F. Desenvolvimento, projeto e construção de um protótipo de suspensão automotiva para bancada de laboratório. In: POSMEC – SIMPÓSIO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA

Page 14: 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira … Ling. Acadêmica Batatais v. 8 n. 1 p. 71-84 janjun. 2018 71 Revisão literária sobre o sistema de suspensão traseira

Ling. Acadêmica, Batatais, v. 8, n. 1, p. 71-84, jan/jun. 2018

84

MECÂNICA, 13., Universidade Federal de Uberlândia – Faculdade de Engenharia Mecânica, Uberlândia, 2003. Disponível em: <http://www.posgrad.mecanica.ufu.br/posmec/13/artigos/trb110.pdf>. Acesso em: 17 ago. 2017

SAVARESI, S. M. et al. Semi-Active Suspension Control Design for Vehicles. Atlante: Elsevier, 2010.

URATA, D. Y. H. Sistema undercar parte 2, suspensão e geometria de suspensão. 2015. Disponível em: <http://kuruma-maniacs.blogspot.com.br/2015/08/sistema-undercar-parte-2-suspensao-e.html>. Acesso em: 20 maio 2016.