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Capítulo 12 Traumas térmicos: Lesões provocadas pelo calor e frio Ao completar este curso o estudante estará apto a: A versão em portugues deste capítulo deve-se a colaboração de Roberto Stefanelli. Dúvidas, sugestões, correções e comentários a respeito desta tradução são muito bem-vindos e devemser enviados para o endereço a seguir, aos cuidados do autor. Listar os critérios básicos para determinar a gravidade da queimadura Listar duas lesões que ameaçam a vida resultante de queimaduras que necessitam de tratamento pré hospitalar de emergência. Listar cinco sinais que indicam lesão inalatória e possíveis sequelas respiratórias depois de uma queimadura. Definir a regra dos nove para pacientes adultos e pediátricos. Conhecer a maneira de avaliar e conduzir queimaduras químicas e elétricas. Identificar e diferenciar lesões críticas e não críticas na hipertermia. Listar os elementos principais no controle da hipotermia nas diferentes causas. Definir frostibite superficial e profundo e explicar o controle de cada uma delas. Identificar e listar o tratamento dos pacientes com hipotermia primária e secundária. Explicar a diferença entre hipotermia por imersão e submersão e o tratamento de cada uma delas.

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Capítulo 12

Traumas térmicos:Lesões provocadas pelo calor e frio

Ao completar este curso o estudante estará apto a:

A versão em portugues deste capítulo deve-se a colaboração de Roberto Stefanelli. Dúvidas, sugestões, correções e comentários a respeito desta tradução são muito bem-vindos e devemser enviados para o endereço a seguir, aos cuidados do autor.

• Listar os critérios básicos para determinar a gravidade da queimadura

• Listar duas lesões que ameaçam a vida resultante de queimaduras que necessitam de tratamento pré hospitalar de emergência.

• Listar cinco sinais que indicam lesão inalatória e possíveis sequelas respiratórias depois de uma queimadura.

• Definir a regra dos nove para pacientes adultos e pediátricos.• Conhecer a maneira de avaliar e conduzir queimaduras

químicas e elétricas.• Identificar e diferenciar lesões críticas e não críticas na

hipertermia.• Listar os elementos principais no controle da hipotermia nas

diferentes causas.• Definir frostibite superficial e profundo e explicar o controle de

cada uma delas.• Identificar e listar o tratamento dos pacientes com hipotermia

primária e secundária.• Explicar a diferença entre hipotermia por imersão e

submersão e o tratamento de cada uma delas.

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Endereço:Programa ATLS/PHTLSFundação faculdade de MedicinaR. Dr. Ovídio Pires de Campos, 241 - Térreo05403-010 SÃO PAULO - SPf. 11 852 2949 F/FAX 11 3069 7125E-MAIL: [email protected]

[email protected]

Este capítulo cobre um grande número de possibilidades de causas de lesões térmicas. No final do curso você estará apto a resolver todos os cenários apresentados.

O trauma térmico inclui uma grande variedade de lesões e origens. Para facilitar a compreensão vamos dividi-las em duas categorias: calor e frio. Cada uma é dividida em local (pele), como queimaduras e frostibite e sistêmica, como hipertermia e hipotermia que produzem efeito por todo o organismo.

Dentre as lesões pelo calor temos mais divisões refletindo a diferença entre as lesões pelo calor (de ambas térmicas e não térmicas) há condições nas quais existe temperatura do corpo elevada e outras onde a temperatura do corpo esta normal mas ele recebe uma onda de calor repentina.

As lesões pelo frio incluem frostibite , hipotermia e lesões por imersão e submersão.

Este capítulo também inclui discussão das diferentes prioridades necessárias para o tratamento do trauma térmico. Por exemplo, a severidade da hipotermia que requer tratamento de reaquecimento hospitalar antes que qualquer seja iniciado; o paciente queimado politraumatizado é tratado inicialmente do trauma e das lesões sistêmicas relacionadas a queimadura, e somente depois da superfície queimada. A exaustão pelo calor ou intermação é tratada mais no controle do ambiente que em lesões específicas.

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Cenário

Um rapaz de 25 anos tem uma queimadura de espessura parcial e total envolvendo suas pernas dos dedos até o meio das coxas. Uma moça de 30 anos estava saindo de um edifício em chamas com grande dificuldade respiratória. Um garoto foi encontrado desmaiado em um carrinho de neve com respiração lenta e superficial e um pulso carotídeo lento e fino. Um corredor de maratona foi encontrado vagando fora de seu curso, confuso, sudoreico e caminhando estranhamente. Um dia com temperaturas bem abaixo de zero, uma mulher sem teto reclama de falta de sensibilidade de suas extremidades

Lesões e alterações relacionadas ao calor

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Queimaduras é a Quarta causa de óbito precedida apenas por acidentes de trânsito, traumas penetrantes e quedas. A origem da lesão depende da idade do grupo envolvido. Escaldamentos por líquidos quente são mais comuns em pré escolares enquanto queimaduras por chamas são mais frequentes em crianças maiores. Queimaduras industriais por líquidos ou cáusticos são obviamente mais comuns em adultos.

Lesões associadas são responsáveis por uma parte significante da morbidade e mortalidade nas lesões térmicas. Lesões pulmonares inalatórias são a maior causa de morte. Lesão química do tecido pulmonar e substancias tóxicas da combustão são os provocadores da lesão pulmonar.

Pacientes idosos tem frequentemente outras patologias que complicam seu tratamento. Redução da reserva fisiológica, menor resistência a infeção e doença aterosclerótica vascular fazem da idade um fator importante na gravidade da queimadura. A idade do paciente em anos - acima de 50 ou abaixo de 2 - mais a porcentagem da superfície corpórea com queimadura parcial (segundo grau) e total (terceiro grau) dá a estimativa da mortalidade.

Lesão cutâneas pelo calor

O calor coagula proteínas. Este é o mecanismo primário de lesão nas queimaduras. Pouca caloria por um longo período de tempo ou muita caloria por um período curto de tempo que produzam a mesma liberação de calor produzem o mesmo resultado. Cozinhar um ovo é uma excelente analogia para a queimadura.

As prioridades para o tratamento de queimados seguem os mesmos princípios e prioridades de qualquer politraumatizado:

• Primeiro, paralise o processo de queimadura (térmico ou químico)• Siga usando o A B C D E para avaliação e condução do paciente• Finalmente promova o tratamento específico para a lesão (queimadura)

Um grande número de mortes por queimaduras ocorrem por inalação de produtos da combustão derivados de carbono, inalação de gases tóxicos ou se mantiveram em ambientes hipóxicos por longos períodos de tempo. Frequentemente estas lesões não apresentam sintomas importantes no período imediato após a lesão. É importante que o socorrista reconheça a chance destas lesões estarem associadas a queimadura e ofereçam grande porcentagens de oxigênio e ventilação assistida quando necessária.Uma vítima em um incêndio que ficou por um longo período de tempo confinada deve ser considerada como portando monóxido de carbono (CO) em seu sangue e também com alterações pulmonares e cutâneas que podem ser causadas pela inalação de produtos tóxicos (fumaça). Estes pacientes mesmo sem alterações na avaliação 1ária e 2ária devem ser considerados instáveis e transportados sem perda de tempo para um hospital apropriado com uma Fi O2 próximo a 85.Queimaduras frequentemente estão associados a outros traumas como quedas e traumas recebidos por outros objetos projetados em explosões. Em alguns casos estes traumas são mais graves que a própria queimadura. Devemos supor sempre

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que outras lesões estão associadas as queimaduras até que sejam afastadas por um completo exame 1ário e 2ário.

ANATOMIA E FISIOLOGIA

A pele. O maior órgão do corpo humano, é composto de três camadas, a epiderme, a derme e o tecido celular subcutâneo. A epiderme, que é a camada mais externa, é constituída de células epiteliais e não há vasos. Abaixo há a derme, formada por tecido conectivo contendo vasos, terminações nervosas e glândulas sebáceas e sudoríparas. O tecido celular subcutâneo é uma combinação de tecido elástico, fibroso assim como é um depósito de gordura, é chamado também de fascia gordurosa superficial.A pele é composta de 3 camadas – epiderme, derme e tecido celular subcutâneo - e músculos associados. Algumas camadas contém estruturas como glândulas, folículos pilares, vasos e nervos. A profundidade da queimadura determina a porção deste órgão envolvido.A pele tem várias funções, a mais importante é formar uma barreira de proteção contra o meio externo que auxilia na prevenção das infecções. A pele também evita a perda de líquidos e na regulação da temperatura. Na derme temos terminações nervosas que transportam impulsos entre o cérebro e o corpo. Quando ocorre uma lesão térmica da pele, algumas destas funções podem ser destruídas ou muito comprometedoras. Esta camada protetora deve ser perfundida adequadamente com células vermelhas do sangue e nutrientes. O calor além de coagular proteínas pode comprometer o fluxo sangüíneo.

O conhecimento do valor da superfície das regiões do corpo será de grande valor na avaliação da extensão da área queimada. Esta avaliação auxiliara na decisão da quantidade de líquidos a ser reposta para o paciente. A porcentagem de superfície corpórea representada por cada região do corpo varia com o tamanho da região. Esta porcentagem varia de acordo também com o desenvolvimento individual e com a idade desde a infância até ser um adulto maduro. Uma avaliação aproximada pode ser realizada de acordo com a regra dos nove (figura 12-2), entretanto este não é o método mais fiel, é bom o .......................................................249................................................ suficiente para determinar os valores da reposição volêmica, estimar mortalidade e calcular outros elementos que levem em consideração a área corporal queimada.

Figura 12-2 Determinar a quantidade de área envolvida é uma das mais importantes determinações para a reanimação do paciente queimado. A regra dos nove é simples e próxima da realidade. Embora não seja completamente exata esta muito próxima e serve para o cálculo da reposição de volume muito bem, estima a mortalidade e pode ser utilizada para outros cálculos que utilizem a porcentagem de área corpórea.

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Em um adulto a superfície de cada membro superior corresponde a 9 % do total corpóreo, a frente do tronco 18 % a região posterior mais 18 %. A superfície total do corpo vale 36 % , cada membro inferior vale 18 %, a cabeça 9 % e a área genital 1 % ( note que todos estes são múltiplos de nove). Em uma criança (de 3 a 9 anos) os membros superiores, o tronco – anterior e posterior – e a genitália recebem a mesma porcentagem do adulto. Entretanto na criança menor de 3 anos graças a seu tamanho maior da cabeça e menor das pernas a porc3entagem da cabeça aumenta para 18 % e das pernas caem para 13,5 % (pode lhe facilitar lembrar que comparando com o adulto se subtrai 4,5 % de cada perna e soma-se este valor de 9 % a cabeça). Para queimaduras pequenas a mão pode ser usada como uma escala ( palma da mão = 1 % da superfície corpórea total ).

Fisiopatologia

A pele humana pode não apresentar lesão aparente quando exposta a temperaturas acima do normal (acima de 40 graus celsius) mesmo que por períodos longos, entretanto quando exposta a grandes temperaturas por curtos períodos ou temperaturas moderadas por longos períodos a destruição tecidual ocorre. Esta mesma relação serve para as lesões pelo frio.

As lesões térmicas também diferem com respeito ao local do corpo, extensão e profundidade, queimaduras nas mãos, pés, genitais ou face e queimaduras circulares no corpo são consideradas prioridades. Outro pontos importantes são as lesões inalatórias, tempo de exposição temperatura corporal interna, idade, estado de saúde, outras lesões e passado médico.

Avaliação da gravidade

Sete fatores são importantes na avaliação de qual paciente é crítico`, qual necessita de um centro de queimados, qual pode ficar em um hospital geral e Qual será a taxa de sobrevida:1. Profundidade da queimadura2. Superfície corpórea envolvida:área totalárea crítica3. Idade do paciente4. Lesão pulmonarinalação de fumaçagases tóxicos5. Lesões associadas6. Situações especiaisquímicaselétricasmonóxido de carbono7. Doenças pré existentes

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passado médico

Profundidade

O primeiro passo na avaliação de uma queimadura é a avaliação visual da profundidade (figura 12 - 3 )

Figura 12-3 Queimaduras são divididas em superficial (1o grau), espessura parcial (2o grau) e espessura total (3o grau). Cada nível trás um prognóstico, diagnóstico e tratamento diferente.

Como temos uma avaliação estimada da profundidade a extensão total pode não aparecer por vários dias.

Queimaduras superficiais (1o grau)• Lesão apenas da epiderme• Vermelhidão, pele inflamada, dor ao toque• Geralmente não necessita de tratamento na cena

Espessura parcial (2o grau)• Lesão da epiderme e derme• Áreas avermelhadas, bolhas íntegras ou rompidas, feridas exsudativas• Paciente refere muita dor• Volume significante de líquido é perdido podendo levar ao choque

Espessura (3o grau)• Lesão da epiderme, derme e TCSC (as vezes até mais profundo)• Pode Ter aspecto de queimadura parcial ou com aspecto de couro• Não é doloroso ( quando houver 2o grau associado haverá dor)• Não há enchimento capilar

Área corpórea envolvida

Usando o esquema para o cálculo da superfície corpórea (figura 12-2) a área total envolvida é estimada. Para o cálculo de reposição de volume apenas as áreas de espessura parcial e total (2o e 3o graus) são usadas.

Idade do paciente

A idade do paciente tem um impacto importante na sobrevida. Os muito jovens ou muito idosos respondem mal as queimaduras. Acima dos 50 anos há um aumento gradual na mortalidade graças a uma diminuição na capacidade de resposta do organismo a lesões maciças. Esta queda gradual na sobrevida pode ser estimada adicionando-se a idade do paciente em anos a porcentagem de área corpórea com queimaduras parciais e totais. Por exemplo:

60 (idade em anos) + 30 (% de área queimada) = 90% (probabilidade de morte)

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Lesão pulmonar e sepsis são os principais componentes para se atingir este resultado. Patologias prévias diagnosticadas ou não a admissão agravam as situações anteriores. Patologias prévias habitualmente cursam com idade avançada e esta é parte do motivo do fator idade determinar a gravidade.

Inalação de fumaça

A lesão por inalação de fumaça é responsável por mais da metade das mortes anuais por queimadura. Dos 75000 pacientes internados com queimaduras extensas 30 % apresenta envenenamento por fumaça e lesão inalatória.

A via aérea superior pode ser lesada diretamente pelo calor, isto é especialmente verdade quando tivermos vapor envolvido no acidente, o ar não consegue transportar muita caloria entre o nariz e boca a ponto de provocar queimadura, mas a água - vapor - tem esta capacidade.

As partículas de fumaça inalada são a principal causa de lesão pulmonar, este tipo de lesão é uma forma de lesão química que atua sobre as células da forração dos brônquios e alvéolos, se estas partículas forem filtradas e eliminadas não se permitindo que elas cheguem aos pulmões não teremos lesão. Usando-se algum tipo de máscara (ou um lenço úmido) em uma casa com fumaça, a chance de lesão diminui muito. O socorrista não deve entrar em uma área com fumaça sem uma proteção adequada.

Excesso de volume seguido de inalação de fumaça pioram a lesão pulmonar. Reposição volêmica intracelular deve ser realizada com critérios rígidos.

Inalação de resíduos tóxicos

Muitas das lesões pulmonares associadas a inalação de gases tóxicos ou de fumaça já que há neles grandes quantidades de partículas que não sofreram combustão completa. Muitos destes resíduos são bastante ácidos e causam destruição do epitélio de brônquios, alvéolos e capilares pulmonares. Após a exposição, os primeiros sintomas pulmonares podem não ser evidentes por até 12 a 36 horas. De forma geral quanto mais precoces forem os sintomas, mais grave terá sido a lesão. Além disso uma variedade de resíduos tóxicos e voláteis (tal como o cianeto) podem ser liberados quando materiais como o plástico queimam, resultando em envenenamento por inalação.

Queimaduras de vias aéreas

Lesões por inalação de calor estão geralmente limitadas as vias aéreas superiores, enquanto que queimaduras nas vias aéreas inferiores são causadas

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Lesão pulmonar

Lesões associadas

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pelo vapor. Quando presente nas vias aéreas o calor se dissipa na nasofaringe e nas vias superiores causando queimadura e inflamação. A obstrução das vias aéreas secundária ao edema pode ocorrer dentro de 24 horas. Quando existe o potencial de perda da via aérea pela progressão do edema está indicada a intubação precoce.

Outras lesões associadas não relacionadas a queimadura

O que mais acontece com um paciente durante um incêndio ? Quedas, colisões de veículos, contato com a rede elétrica e qualquer outro tipo de trauma. Choque provocado somente pela queimadura aparece mais tardiamente. Choque em fase mais imediata aparece pela hipovolemia, hipóxia e outras causas de choque que não a queimadura. Pacientes queimados que apresentam sinais precoces de choque, geralmente os apresentam graças a lesões associadas que levam a hipovolemia ou por hipóxia severa causada pela lesão pulmonar. O mecanismo de trauma deve ser revisado e outras lesões que causam choque devem ser tratadas.

Nas queimaduras, como em todos os traumas, o choque ocorre quando há uma redução no volume circulante de sangue com queda da oxigenação tecidual. A resposta do corpo a queimadura é a formação de edema. Toda queimadura, não importa o tamanho, produz edema no local. Quando a queimadura for maior que 20 % da superfície corpórea total, o líquido do edema sairá do compartimento vascular para o tecido, isto produzira uma diminuição gradual no volume circulante que será detectada como hipoperfusão tecidual com hipotensão e outros sinais de choque. Esta saída de líquido não será aparente até que um grande volume saia, isto devera levar algumas horas e só então teremos sinais perceptíveis de choque, logo se um paciente apresentar sinais de choque a chegada do socorrista a sua causa não deve ser a queimadura. Choque hipovolêmico precoce no pré hospitalar não é causado por queimaduras, mas sim por outras lesões.

A avaliação do volume de sangue circulante no queimado grave pode ser difícil e a sua pressão arterial pode ser impossível de ser medida. Taquicardia pode ser a 1a indicação de choque mas ela também pode estar presente pela dor da queimadura parcial. Cuide de um paciente queimado como você cuidaria de qualquer outro paciente politraumatizado, ao apresentar sinais de choque cuide dele como que um choque hipovolêmico estivesse presente. Em pacientes idosos a possibilidade de lesão miocárdica (isquemia) esta presente logo não utilize volume em excesso. A reposição de volume, preservação do calor (após cessar o processo de queimadura), imobilização de possíveis fraturas, controle das hemorragias e oxigenioterapia suplementar com F i O2 alta estão indicadas.

Queimaduras químicas

As queimaduras químicas ocorrem quando a pele toma contato com produtos cáusticos. Em vários casos a diluição e a lavagem com volumes grandes

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Considerações especiais

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de água é o primeiro passo pois o produto continua a reagir até ser retirado do contato. Não perca tempo, comece a lavar imediatamente. Não utilize neutralizantes pois eles podem causar reações exotérmicas (liberam calor) e provocam queimaduras adicionais (maior lesão tecidual). Não se pode prever o tempo exato de lavagem, mas ela deve ser iniciada na cena e continuar até o hospital.

O hospital receptor deve ser notificado e prepara uma área para continuar a lavagem, que tenha como conter os líquidos utilizados nesta. Se o produto for identificado o hospital deve ser notificado para preparar possíveis antídotos antes do paciente chegar.

Produtos em pó devem ser escovados antes de serem lavados para reduzirmos sua concentração. Enquanto o paciente é lavado suas roupas são retiradas, os calçados devem ser retirados primeiro para não acumularem água com produtos químicos. Devemos tomar cuidado para que não espirre água nem produtos químicos nas roupas ou no próprio socorrista. A segurança do socorrista é primordial. Luvas e óculos de proteção são fundamentais.

Queimaduras químicas dos olhos devem ser lavadas com abundantes quantidades de solução fisiológica, anestésicos tópicos como a tetracaina podem ser utilizados se for necessário o controle dos movimentos oculares. A irrigação deve ser continuada durante o transporte para o hospital. Devemos tomar cuidado ao posicionarmos o paciente para que o produto não espirre no outro olho.

Produtos químicos que necessitam de tratamento especial.• Cal e soda cáustica, como qualquer pó, devem ser escovados pois o contato

com a água forma uma substancia corrosiva. Áreas contaminadas não podem ser lavadas até estarem totalmente limpas. Grandes quantidades de água devem ser utilizados se o processo de queimadura já tive iniciado.

• Fenol é muito utilizado na indústria como agente de limpeza. Como ele não é solúvel em água devemos utilizar álcool para lavar o local afetado. Obviamente quando não tivermos álcool disponível podemos utilizar água em abundância.

• Litium ou sódio metálico são substancias que reagem com a água e liberam fumaça tóxica provocando queimaduras, todo o resto de substancia que for encontrado na ferida deve ser retirado com pinça e acondicionado em um frasco com óleo, somente após este procedimento que podemos lavar a ferida com água abundante até chegar ao hospital.

Para outras substancias o socorrista deve entrar em contato com o centro de intoxicação de sua região.

Queimaduras elétricas

O grau de lesão tecidual em uma queimadura elétrica esta relacionada a quantidade de energia envolvida e a duração da exposição. A prioridade do socorrista é determinar se a vítima ainda esta em contato com a rede elétrica, não se deve entrar em contato com a vítima se não tivermos certeza que não exista energia sendo transmitida pela vítima. Um socorrista eletrocutado adiciona problemas ao cenário, adiciona uma vítima ao acidente que requer

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mais material para o atendimento. Não tente retirar a vitima da rede elétrica se você não tiver treinamento e material próprios. Queimaduras elétricas podem provocar parada cardíaca que necessitara de RCP para a correção.

Fisiopatologia

Três tipos de lesões podem ocorrer:• Queimaduras pelo contato direto, a passagem da corrente elétrica pelo tecido pode provocar extensas áreas de necrose. A pele geralmente avermelhada e em alguns casos esta semelhante a uma explosão. Teremos sempre uma lesão de entrada e uma de saída que aparecem pequenas na superfície. O socorrista deve inferir que há lesões de nervos, ossos, músculos, vasos sangüíneos e outros órgãos que estiverem no caminho da passagem da corrente.• Dois pontos podem apresentar contato próximo a pele e provocar formação de um arco, isto pode expor a pele a temperaturas de 2500 a 3000o C. Isto pode produzir queimaduras cutâneas significativas. Estas lesões podem ser reconhecidas pela perda ou chamuscamento de pelos pela passagem do arco. Todo o corpo pode ser exposto.• Queimaduras pelo "flhash" podem ser vistas quando a vítima estiver muito próxima de uma fonte elétrica. Isto resulta em queimadura térmica, geralmente em pele não protegida por roupas no lado próximo ao fogo.

Tratamento

O tratamento inicial inclui uso de Ringer Lactato ou soro fisiológico intravenoso em infusão rápida. Isto auxilia na prevenção da insuficiência renal pela lavagem da mioglobina que é resultado da lesão muscular. A seguir temos pontos importantes nas lesões elétricas.• Não seja parte do circuito• Acredite em lesões maiores que as vistas externamente• Examine procurando lesões ósseas e de órgãos internos• Reponha volume também para proteção renal• Observe as possíveis arritmias cardíacas

Envenenamento por Monóxido de Carbono

O envenenamento por monóxido de carbono (CO) deve ser suspeitado e tratado em todos os pacientes que sofreram queimaduras e ficaram restritos em uma área fechada do incêndio, que apresentem sintomas ou não. Os sintomas de envenenamento por CO incluem hipóxia com alteração do nível de consciência, déficit neurológicos e dor de cabeça severa. Uma coloração vermelho cereja pode estar presente mas este sinal clássico pode estar mascarado pela cianose provocada pela hemoglobina não oxigenada, disfunção cárdio respiratória ou inalação de ar pobre em O2 pois este foi consumido pelo fogo, nestes casos a

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coloração cereja não é vista, é um destes achados, como o da crepitação, que pode auxiliar no diagnóstico mas não descarta o envenenamento quando estiver ausente.

O monóxido de carbono é um gás incolor, inodoro e sem gosto, não provoca agressão direta a via aérea mas se fixa a hemoglobina com força 200 vezes maior que o oxigênio. Como a meia vida da carboxihemoglobina é longa todas as suspeitas devem ser tratadas com altas concentrações de oxigênio, isto eleva a pressão parcial de oxigênio arterial (PaO2), aumentando o deslocamento do CO e a ligação do oxigênio. Com uma FiO2 de 100 % a meia vida da carboxihemoglobina cai de acima de 4 horas para 40 a 60 minutos. O paciente deve ser levado rapidamente a um hospital com capacidade para tratar queimados, se um centro de queimados estiver a uma distancia razoável podemos nos dirigir diretamente a ele. Pacientes com alt5as concentrações de CO (> 30) necessitam de tratamento com oxigenioterapia hiperbárica.

Doenças pré existentes

Alterações prévias na saúde do paciente podem compromete-lo ainda mais em quadros de queimaduras. Algumas situações que ocorrem durante ou depois da reanimação, sepsis, reposição volêmica agressiva, edema pulmonar, múltiplas cirurgias, grandes períodos acamados, queda do controle da temperatura e enxertos são partes da recuperação do queimado, algumas situações como insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal, hipertensão ou doença arteriosclerótica periférica podem Ter impacto negativo na evolução do doente.

Lesões críticas que necessitam de unidade de queimado

Pacientes com queimaduras severas, lesões de partes anatômicas importantes e lesões ou doenças associadas necessitam de tratamento em unidades de queimados, isto aumenta as chances de sobrevida e reduzem as sequelas. A associação americana de queimaduras desenvolveu uma lista de lesões:1. Queimaduras complicadas com lesões da via respiratória2. Todas as queimaduras de face3. Queimaduras em mais de 30 % da SCT independente do grau4. 3o grau maior que 10 %5. Queimaduras por produtos químicos muito agressivos (cáusticos)6. Todas as elétricas7. Queimaduras com outras lesões associadas (Ex. fraturas)8. Queimaduras em crianças, idosos ou pacientes com doenças associadas9. Queimaduras em mãos, pés e genitais (perda de função ou inabilidade para

realizar suas manobras básicas)

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Abordagem do paciente queimado

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Segurança, cena e situação

Ao chegar a cena do incidente a situação deve ser rapidamente controlada.Riscos potenciais ao paciente e a equipe devem ser imediatamente identificados, se os bombeiros já tiverem chegado esta função deve ser passada imediatamente ao comandante da operação. Entretanto entenda que você nunca deve realizar um salvamento se não tiver treinamento, equipamento e experiência para aquela ação específica.

Assim que o paciente estiver em um local seguro devemos paralisar o processo de queimadura, controlar o dano e a perda de tecido (resfriar o local com água).

Atendimento inicial (exame inicial e objetivo)

Durante o primeiro atendimento atenção especial deve ser dada as vias aéreas, inclusive na procura de sinais de lesões inalatórias, queimaduras de face e área superior do tronco, carbonização de pelos da face e nariz, escarro carbonáceo, respiração ruidosa ou queimaduras ao redor da boca e nariz.................253.........................Envenenamento por fumaça, CO e lesão das vias aéreas devem ser consideradas quando a vítima permaneceu confinada após termos uma aérea segura devemos analisar outros sinais como FC, esforço respiratório, cor da pele e nível de consciência. Como o exato grau de conhecimento da quantidade de lesão da via aérea não pode ser obtido na cena devemos iniciar o tratamento com alta FiO2 (>0,85%). Outras lesões que ameaçam agudamente a vida devem ser tratadas neste momento também

Atendimento secundário

A avaliação secundária não deve ser realizada quando tivermos um ambiente inseguro ou um paciente com alterações críticas. Em alguns casos a única maneira de se assegurar que o ambiente é seguro é sair dele (com o paciente), mas devemos sempre nos preocupar com as lesões instáveis e com a imobilização de coluna. Quando o ambiente estiver seguro e o paciente estável, o exame da cabeça aos pés deve ser realizado rapidamente, avaliar as queimaduras e outras lesões, história médica pregressa e alergias (quando estas informações forem possíveis de serem retiradas), durante este período pode-se iniciar a reposição volêmica.

Vias aéreas e ventilação

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Tratamento do queimado

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Além da grande possibilidade da inadequada oxigenação e má circulação, todo paciente, consciente ou inconsciente que sofreu uma lesão térmica, deve ser tratado com suplementação de 02 com uma alta FiO2 e Ter sua via aérea e ventilação constantemente observada. Monóxido de carbono e cianeto respondem bem a FiO2 o mais próximo de 1 possível. Isto deve ser utilizado no transporte mesmo que não exista suspeita de lesão ou intoxicação. Um paciente estável com reflexo de vômito mantido a via aérea pérvia deve receber O2 e ter seu estado monitorado. A intubação deve ser utilizada quando necessária. Queimaduras que tem sintomas laríngeos precoces devem apresentar edema pela inalação de vapor ou produtos químicos, o tratamento através da intubação endotraqueal pode ser necessário e pode permitir somente 1 tentativa e esta tentativa deve ser realizada pela pessoa experiente na cena. O potencial para laringoespasmo é grande em pacientes com lesão de laringe pelo calor.

Nos pacientes em apneia ou hipóxicos, a intubação deve ser realizada precocemente para evitar aspiração devemos iniciar ventilação com pressão positiva. Se o paciente hipóxico tiver seu reflexo de vômito preservado devemos optar pela seqüência rápida para a intubação, se a equipe não tiver preparo necessário para esta seqüência a intubação nasotraqueal deve ser realizada. O contato do laringoscópio com as cordas vocais pode provocar espasmo, logo a intubação deve ser realizada quando necessário e pelo membro mais experiente da equipe.

Pacientes com queimaduras ao redor de todo o tórax terão limitação para a sua expansão. A limitação para a expansão causada pela perda da elasticidade dos tecidos queimados provoca diminuição do volume corrente e volume minuto. Um número pequeno de pacientes necessitam de procedimentos cirúrgicos (escarotomia) no tecido queimado para melhorar a expansão do tórax, este deve ser realizado na cena e por pessoal treinado, se não houver ninguém com esta qualificação a vítima deve ser intubada, receber ventilação com pressão positiva e Fi O2 de 0,85 % e transportada rapidamente para um hospital que tenha suporte para reanimar pacientes grandes queimados.

Circulação

Os pacientes queimados com lesões associadas o transporte de O2 aos órgãos pode estar diminuído pela queda do volume sangüíneo circulante alem de outras lesões associadas. A queda do volume sangüíneo tão comum nos pacientes queimados não acontece no período imediato pós queimadura, geralmente somente após 6 a 8 horas que este tipo de choque se manifesta. Choque na cena é mais comum por outras causas. O controle da hipovolemia deve incluir os seguintes passos:

• Infusão intravenosa de Ringer Lactato ou solução salina por cateter de grosso calibre em grande volume a menos que outras condições contra indiquem.• Aplicação de PASG quando outras lesões indicarem. O PASG não é tratamento de escolha para choque associado a queimadura.

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O membro superior não queimado deve ser utilizado para a cateterização venosa a não ser que os dois estejam queimados, nestes casos pode-se puncionar na área queimada.

Existem várias fórmulas para a reposição volêmica, usamos a de Parkland para o pré hospitalar pois não necessitamos de dados laboratoriais para o seu cálculo. O nome vem do hospital de Parkland, em Dallas no Texas onde a fórmula foi desenvolvida. Esta fórmula diz que o paciente deve receber 4 ml de soro nas primeiras 2 horas para cada 1 % de área de 2o e 3o graus por quilo de peso do paciente.

4 ml x Área queimada x peso em Kg........................................................254...............................................Metade deste volume deve ser administrado nas primeiras 8 horas4ml x % de 2o e 3o grau x Peso em Kg / 2 = reposição nas primeiras 8 h

Um exemplo do uso desta fórmula ilustra a necessidade de reposição precoce. Um paciente de 70 Kg com 50 % de área corpórea de lesão parcial (2o

grau) requer 7 litros nas primeiras 8 horas4 x 50 x 70 / 2 = 7000 ml = 7 l

O socorrista deve usar o total para as 8 horas como base para calcular a velocidade de infusão.

Muitos centros de queimados usam outras fórmulas de reposição, cada socorrista deve saber utilizar o método preferido pelo hospital de sua região.

Controle da dor

A dor do paciente queimado depende da profundidade da lesão. Queimaduras de terceiro grau (espessura total) não apresenta dor pois já houve destruição da terminação nervosa, entretanto no segundo grau (espessura parcial) apresenta a maior intensidade de dor. Como temos frequentemente espessuras variadas (2o e 3o graus) estes pacientes mesmo com espessura total apresentam muita dor.

Analgésicos como morfina ou óxido nitroso podem ser utilizados para controlar a dor. Como a morfina causa vasodilatação e os analgésicos provocam depressão respiratória eles podem ser perigosos se o choque ou alterações respiratórias estiverem presentes, seu uso deve ser de acordo com a avaliação geral do paciente e não somente pela dor. Todos os analgésicos devem ser utilizados por via intravenosa.

Outro método de controle da dor é resfriar a lesão com compressas frias e estéreis, não há evidências científicas que justifiquem a diminuição da dor pelo resfriamento mas esta sensação trás um benefício psicológico para o paciente. Quando se opta pelo resfriamentos compressas úmidas e frias devem cobrir no máximo 10 % da superfície corpórea e por apenas 10 a 15 minutos. Devemos frisar que o método preferido para curativos fechados em queimados é com compressas estéreis secas. No paciente grande queimado a hipotermia causada pelo uso das compressas úmidas pode comprometer seriamente o mesmo, como o paciente queimado perde a capacidade de controle térmico devemos tomar cuidado para não agravar ou até provocar hipotermia.

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Perda de calor pela área queimada é um dos maiores problemas no tratamento dos pacientes queimados e ele não deve ser agravado pelo uso de compressas úmidas no campo. O tremor indica frio, não podemos chegar a este ponto.

Cuidado com a ferida

O objetivo do tratamento da área queimada é prevenir maiores danos e infeção. Retire toda a roupa ao redor da área queimada mas não retire roupas grudadas a ferida. Cubra a vítima com compressas secas e estéreis ou8 limpas. Evite compressas que soltem pelos ou pedaços na ferida e evite também óleos ou outras soluções. Todo o tecido queimado tem que ser coberto com compressas secas. Não rompa bolhas elas são um mecanismo de defesa. Onde houver um sangramento ativo comprima a área e trate outras lesões associadas antes de cobrir a queimadura. Nenhum debridamento deve ser realizado no campo, tempo é fator primordial. Uma vez que a vítima esta respirando adequadamente, não esta sangrando e foi tratada para o choque, pode ser transportada para o serviço de emergência mais adequado antes de ser transferida para um centro de queimados. Alternativamente o paciente pode ser transferido diretamente a um centro quando o tempo de transporte for razoável.

Resumo: Queimaduras e lesões associadas.

Considere o grande queimado como qualquer outro paciente com lesões multicêntricas e proceda de acordo.

A permeabilidade da via aérea é primordial, tratamento agressivo pré hospitalar pode reduzir a mortalidade em até 2/3 dos queimados que morrem anualmente antes de chegar ao hospital.

A seguir teremos considerações importantes no atendimento ao paciente queimado.• Não se transforme em uma vítima: Identifique áreas de segurança para a

equipe e vítima assim que chegar ao local.• Manter a via aérea pérvia é a preocupação mais importante com o paciente

queimado. Tenha todos os equipamentos a mão, se a intubação for necessária seja delicado e preciso.

• Todos os pacientes com suspeita de lesão inalatória devem receber O2 suplementar com alta Fi O2.

• A primeira causa de choque no paciente queimado é a hipovolemia. O choque deve ser tratado com a reposição volêmica adequada.

........................................................255................................................................Choque precoce é por outras causas; identifique-as e trate-as.

• A grande maioria dos produtos químicos devem ser tratados com grandes volumes de água (lavagem)

• Pacientes queimados devem ser transportados sem atraso para hospitais próprios.

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• Evite a hipotermiaMuitas mortes podem ser evitadas por um acesso e tratamento sistematizados

do paciente queimado pelo socorrista, baseado na fisiopatologia e etiologia da queimadura. No politraumatizado grave primeiro trate o trauma e os efeitos sistêmicos da queimadura e somente depois da queimadura.

Lesões sistêmicas provocadas pelo calor

A elevação da temperatura corporal provocada pelo meio externo ou por alterações endógenas (metabolismo interno) podem causa doenças ou morte por exceder a capacidade do organismo de regular a sua produção de calor. Quando a produção de calor for maio que a perda muitos sistemas orgânicos passam a funcionar mal, em alguns casos somente a intervenção do socorrista pode alterar este ciclo destrutivo. Há três estágios ou tipos de lesões sistêmicas provocadas pelo calor : cãibras, exaustão pelo calor e intermação. Estes termos não descrevem as alterações fisiológicas que ocorrem mas como são termos muito usados continuaremos a utilizá-los. O socorrista deve reconhecer que estes termos são apenas nomes, eles não descrevem condições fisiopatológicas.

Cãibras

Cãibras pelo calor ocorrem quando o indivíduo es de repouso mas se exercitou muito ou desenvolveu trabalho físico pesado em ambientes quentes sem Ter se reidratado corretamente com líquidos e eletrólitos. Os primeiros eletrólitos a serem perdidos nestes casos são o sódio e potássio. A perda de água pode agravar o quadro. Podemos perder de 15 a 20 gramas de sódio através do suor em trabalhos musculares pesados em ambientes quentes.

Abordagem

As cãibras pelo calor geralmente afetam a musculatura dos MMII, dorso, abdome ou braços. A musculatura afetada fica dura, tensa a palpação e existe história de esforço físico relacionado ao caso.

Tratamento

O tratamento inicial inclue a retirada do paciente do ambiente quente e o alongamento cuidadoso da musculatura até aliviar as cãibras. A oferta ao paciente de bebidas com eletrólitos geralmente resolvem o problema, raramente se necessita reposição intravenosa.

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Cuidado para não se esquecer de diagnosticar uma intermação que pode estar associada as cãibras.

Exaustão

Exaustão pelo calor é o resultado da perda excessiva de líquidos e eletrólitos através do suor sem a reposição necessária quando o paciente estiver em local quente por período prolongado de tempo. Atividades físicas durante este período aumentam a perda de volume podendo chegar a hipovolemia. Os sinais e sintomas são de desidratação e o tratamento é igual.

Abordagem

Pacientes com quadro de exaustão podem desmaiar, apresentar náuseas, delírios, ansiedade ou mostrar sinais de confusão, eles se sentem melhor quando deitam mas ficam muito tontos se levantarem (hipotensão ortostática), sua pele fica fria e úmida (pegajosa) sudorese intensa não é rara, respiração e pulso estão acelerados e o pulso fica fino na artéria radial. Pressão arterial sistólica pode estar normal ou um pouco reduzida, um teste ortostático das funções vitais (tilt teste) pode ser positivo. A temperatura interna do paciente pode estar normal ou pouco elevada

Tratamento

O tratamento da exaustão pelo calor é semelhante ao dos pacientes hipovolêmicos, mas ele deve ser levado a um ambiente fresco (diferentemente dos hipovolêmicos que devem ir a um ambiente aquecido). O paciente deve ser colocado em posição supina e as roupas quentes devem ser retiradas. Ringer lactato ou solução fisiológica devem ser administrados por via intravenosa a caminho do hospital.

Intermação

Intermação ocorre pela perda repentina da habilidade corporal em realizar o controle interno da perda de calor. Pode ser proveniente de duas causas distintas que são a clássica e por esforço.

A intermação clássica é a mais comumente encontrada nos idosos, esta relação com a idade pode ser agravada pelo uso de algumas medicações comumente usadas pelos idosos, Exposições a ambientes com altas temperaturas.........................................................256...............................................................sem ar condicionado é a apresentação clássica durante os meses de verão, isto é muito comum em cidades grandes onde não se consegue boa ventilação nas casas. Idosos que vivem de aposentadoria geralmente não usam ar condicionado pelos altos custo, eles não abrem as janelas por questão de segurança. O socorrista deve observar estes fatores que auxiliam no diagnóstico.

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Intermação causada pelo esforço é uma associação entre altas temperaturas ambientais e esforço físico que rapidamente elevam a produção interna de calor a um ponto onde o organismo não mais consegue controlar o ganho e a perda de calor. Quando a umidade ultrapassa os 75 % o corpo perde a capacidade de perder calor pelo suor. Atletas que treinam em altas umidades estão expostos ao risco de intermação física. Quando não se diagnostica esta patologia a temperatura corpórea pode atingir41 a 42o C e a morte é iminente.

Abordagem

Os pacientes com intermação geralmente se apresentam com pele seca e rosada, podem ou não estarem sudoreicos dependendo do local onde foram encontrados e do tipo de intermação (clássica ou de esforço). A pressão arterial pode estar elevada ou diminuída e o pulso esta geralmente elevado e fino. O nível de consciência pode variar de pouco alterado até inconsciente e tonturas podem estar presentes. A maneira de se diferenciar intermação das outras alterações provocadas pelo calor é que na intermação temos aumento da temperatura corpórea e alteração do nível de consciência.

Tratamento

Intermação é uma emergência real, quanto maior a temperatura e maior tempo o paciente fica com a temperatura interna elevada maior o poder de destruição e a chance de morte. Temperatura cardíaca (e cerebral) aumentada é muito mais destrutiva quando associada a idade avançada, níveis tolerados por crianças não são tolerados por adultos.

Tratar significa rapidamente esfriar o paciente com o que tivermos a mão. Água gelada espirrada sobre o paciente é a maneira mais rápida de esfriá-lo, se gelo não estiver acessível água gelada ou álcool podem ser utilizados. O resfriamento deve ser iniciado antes do transporte. Alguns passos que devem ser tomados são a retirada de roupas quentes, colocar o paciente em ambulância com ar condicionado e irrigar o paciente com líquidos, ventilar o paciente para facilitar a evaporação, pacotes com gelo devem ser colocados nas virilhas, axilas e ao redor do pescoço e em alguns casos quando o transporte for muito demorado podemos parar em algum estabelecimento comercial para conseguirmos algum gelo.

A lesão pelo frio apesar de também afetar a pele se diferem das queimaduras pois estas frequentemente tem lesões pulmonares associadas

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LESÕES RELACIONADAS AO FRIO

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enquanto que nas lesões pelo frio teremos alterações circulatórias importantes (redução) e diminuição da temperatura central. As alterações clínicas nas lesões pelo frio não são tão dramáticas quanto nas provocadas pelo calor, nem na velocidade do início do quadro nem na velocidade do aparecimento de bolhas. A extensão e a profundidade das lesões pelo frio podem ser muito mais superficiais que as provocadas pelo calor em condições semelhantes de aparecimento. Exposição prolongada e umidade são fatores usuais de lesão pelo frio.

Física e fisiologia

Perda de calor é a transferência de calor (energia) de um corpo para o outro ou para a atmosfera.

Perda de calor ocorre através de vários mecanismos: convecção, condução, evaporação e radiação.

Convecção : ar corrente passa pelo corpo do paciente e carrega consigo seu calor diminuindo sua temperatura.

Condução : passagem direta de calor de um corpo ou superfície a outro, o segundo corpo pode ser o ar, uma superfície sólida ou um líquido em contato direto com o paciente.

Evaporação : transforma um líquido em um gás - requer calorias - evaporação de um líquido na superfície da pele consome calorias do paciente até que se converta em gás.

Radiação: energia na forma de calor irradia ondas através do ar ou de outros meios, neste caso a irradiação do paciente aquece os objetos ao redor dele, mesmo sem a condução (contato direto).

A perda de calor pode ocorre de diversas formas associadas e geralmente estas associações existem.

40 % da perda de calor ocorre pela cabeça e pelo pescoço, isto deve auxiliar o socorrista a saber como proteger a si mesmo, como auxiliar no tratamento dos pacientes com lesão pelo frio e como reduzir a temperatura interna dos hipertérmicos.

Alterações cutâneas no frio

Lesões pelo frio geralmente afetam áreas isoladas da pele como dedos dos pés ou das mãos, mãos pés, face ou orelhas, áreas onde existe uma desproporção entre superfície e circulação (grande superfície com pouco volume de sangue circulando). Estas áreas são mais distantes da zona central do corpo (no tronco) fazendo com que elas fiquem mais susceptíveis a lesões pelo frio. A lesão mais comum nestas áreas é o frostibite.

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Anatomia, fisiologia e fisiopatologia

Frostibite é um comprometimento do tecido como resultado da exposição a temperatura de congelamento ou até menores que esta.

A resposta normal ao frio é a diminuição da circulação sangüínea da pele que reduz a perda de calor para o ambiente, isto é complicado pela vasoconstricção periférica que ocorre para aumentar o shunt sangüíneo na tentativa de manter o sangue aquecido na região central e manter a temperatura cardíaca normal. A redução do fluxo sangüíneo reduz o envio de calor para as extremidades (regiões mais distais do corpo).

Quanto maior a exposição maior a redução do fluxo sangüíneo periférico. O corpo conserva a temperatura central (interna, cardíaca) as custas da temperatura das extremidades e da pele, isto faz com que ela venha a perder mais calor que ela recebe, nos casos de temperaturas abaixo de zero e que as extremidades não estejam protegidas os líquidos intra e extra celular podem se congelar formando cristais de gelo que causam dano local ao tecido das áreas expostas. Coágulos podem ser formados ,o que piora ainda mais. Drogas, intoxicação por álcool e roupas molhadas podem também contribuir para o desenvolvimento da frostibite.

A abordagem do paciente que ficou exposto a temperaturas congelantes sem roupas próprias deve sempre incluir o exame das áreas mais susceptíveis a frostibite. Hidrocarbonetos líquidos, como a gasolina, podem causar quando em contato com a pele e em temperaturas ambientes congelantes lesões tipo frostibite aprecem imediatamente após o contato pois apresenta rápida evaporação e condução. Frostibite também pode ser formada após contato entre a pele quente e úmida com metais extremamente frios pela rápida condução.

Tipos de frostibite

Frostibite é dividida em dois tipos: superficial (ou frostinip) e profunda, a superficial é menos severa que a profunda. A frostibite superficial provoca dor leve ou queimação que depois passa a adormecimento, a pele da região afetada fica acinzentada ou amarelada, quando se aplica a compressão digital o tecido abaixo da extremidade descorada parece maleável e mole como um tecido normal.

O frostibite profundo se desenvolve quando o paciente não reconhece ou não reage ao adormecimento da extremidade, se o congelamento do tecido continua a avançar a área afetada apresenta aparência cerúlea (de cera). Quando a terminação nervosa se congela o adormecimento e a dor cessam. As partes congeladas ficam duras e não se moldam quando comprimidas. Quanto mais tempo as extremidades permanecem congeladas e quanto mais frio o ambiente, mais grave será a lesão. A gravidade da lesão profunda não pode ser determinada até que se descongele o membro e se inicie o processo de reparação. Extremidades afetadas podem apresentar alterações por um período de dias até semanas. Debridamentos precoces não são a melhor conduta para o frostibite.

Abordagem e tratamento

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A abordagem pré hospitalar do paciente com frostibite superficial é uma combinação de reconhecimento das condições ambientais e reconhecimento da sintomatologia do paciente com dor ou adormecimento de um dedo, mão, pé ou área da face, observando que esta área também se encontra sem coloração (pálida, cerúlea). A palpação delicada da área determina se o tecido abaixo esta duro ou de consistência normal. O paciente com lesão superficial geralmente apresenta grande desconforto a manipulação da área afetada. O tecido congelado nas lesões profundas esta endurecido e geralmente sem dor quando tocado ou comprimido.

O tratamento imediato é retirar o paciente do ambiente gelado para uma área aquecida. Pacientes com lesões superficiais devem ser tratados colocando a área afetada em contato com uma superfície corpórea quente (como cobrindo as orelhas afetadas com as mãos aquecidas ou os dedos afetados embaixo dos braços) . Lesões superficiais devem ser aquecidas apenas até a temperatura normal.

O tratamento pré hospitalar para as lesões profundas consiste no uso de roupas apropriadas, medidas de suporte e transporte imediato para um hospital capacitado para este tratamento. O paciente pode receber algo aquecido para beber (não alcóolico) dependendo do seu nível de consciência e da presença ou não de outras lesões. O uso de tabaco (fumar, mascar ou patchs) é proibido pois a nicotina provoca vasoconstricção.

Evite iniciar o reaquecimento de pacientes com lesão profunda no local, pode ser perigoso, a não ser que o tempo de transporte seja muito longo. O reaquecimento do paciente com lesão profunda deve ser realizado em ambiente hospitalar controlado pelas seguintes razões:• O reaquecimento das extremidades pode ser realizado pelo processo de

imersão rápida usando-se água na temperatura de 38,5 a 42o C• O processo de reaquecimento é extremamente doloroso para o paciente, que

pode necessitar do uso de analgésicos intravenosos para o controle.• Se o processo de reaquecimento for iniciado e por alguma razão a extremidade

for recongelada, ela provavelmente sofrera gangrena em toda a sua extensão ou em parte dela, necessitando de amputação.

Como foi mencionado anteriormente a gravidade da lesão profunda é determinada após o final do degelo. O frostibite é dividido em 4 graus de gravidade como as queimaduras, o superficial é o primeiro grau, já o quarto grau, que é o mais severo, desenvolve gangrena logo após a descongelação.

Quando o reaquecimento foi iniciado antes da chegado dos socorristas a parte afetada deve ser elevada para reduzir o edema. Os dedos devem ser separados gentilmente e protegidos com algodão para evitar a irritação da pele e diminuir a chance de aderência, se forem formadas bolhas nas extremidades elas devem ser transportadas intactas (sem serem perfuradas). Quando for transportado um indivíduo que esteja sendo reaquecido devemos tomar cuidado para que não ocorra recongelação. O controle da dor é necessário durante todo o transporte.

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Reações sistêmicas ao frio

A reação sistêmica ao frio mais comum é a hipotermia. Hipotermia é definida como temperatura interna abaixo de 35o C, quando a medida é tomada se usando um termômetro retal a 15 centímetros da borda anal. Infelizmente a hip0termia associada a frostibite pode ocorrer em temperaturas bem acima da de congelação. Hipotermia pode afetar indivíduos saudáveis que se encontram em locais com condições adversas sem o preparo necessário (hipotermia primária) ou se desenvolver secundário a uma doença ou lesão pré existente (hipotermia secundária), se não diagnosticada ou tratada erradamente a hipotermia pode ser fatal, em alguns casos dentro de 2 horas. A taxa de mortalidade é de 50 % em casos de hipotermia secundária originada de complicações de outras lesões ou em casos severos onde a temperatura interna chega abaixo de 32o C.

Anatomia, fisiologia e fisiopatologia

Existem muitas situações que provocam hipotermia em humanos. Condições ambientais podem reduzir a temperatura interna do indivíduo ao ponto de alterar seu nível de consciência (pela hipotermia), neste ponto ele necessita confiar em outros para diagnosticarem sua alteração, se não for diagnosticada e tratada a morte estará próxima.

Temperaturas centrais abaixo de 35o C reduzem a freqüência cardíaca, o controle respiratório, a pressão arterial e o fluxo sangüíneo cerebral, a musculatura esquelética começa a produzir tremores na tentativa de produzir mais calor, inicialmente tremores finos que evoluem para tremores mais violentos, isto pode cessar e a musculatura se torna contraída quando a temperatura interna cai abaixo de 32o C. Associado a queda do débito cardíaco temos o aumento do déficit de oxigênio causado pelos tremores que levam a hipóxia celular e aumento da produção de ácido lático com eventual acidose metabólica. Incontinência urinária chamada de diurese fria ocorre neste momento.

As alterações do sistema nervoso central progridem de uma confusão inicial até o coma, as pupilas se tornam fixas e dilatadas, fibrilação atrial se instala e permanece entre os 32 a 28o C, quando a temperatura central (cardíaca) atinge 28 a 25o C qualquer estimulação física ao músculo cardíaco causa fibrilação ventricular, a estimulação pode ser causada pela RCP ou pelo transporte rude realizado pelos socorristas, temperatura central (cardíaca) abaixo de 25o C geralmente causam morte pois as funções respiratória e cardíaca falham juntas com o desenvolvimento de edema pulmonar e fibrilação ventricular, entretanto não se pode confirmar o óbito para o paciente antes dele estar reaquecido e neste momento não apresentar sinais de vida ( ECG, pulso, respiração e função cerebral).

Gravidade e exposição

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A gravidade da hipotermia é determinada pela temperatura cardíaca (central) em sua menor leitura. É classificada em dois tipos: suave - temperatura central maior ou igual a 32o C e profunda - temperatura central abaixo de 32o C.

A duração da exposição, que contribui para a hipotermia, é dividida em 3 categorias:

Aguda : exposição de até 1 horaSub aguda : exposição entre 1 hora e 1 diaCrônica : exposição por mais de 1 dia

O significado da medida do tempo de exposição é quantificar o tempo em que houve diferença de temperatura entre a temperatura central e a periférica. Quanto mais tempo o paciente ficar exposto mais próxima a temperatura central ficará da periférica. Com um tempo de exposição mínimo a glicemia permanece normal ou pouco elevada, permitindo que o metabolismo aeróbico ocorra, com o metabolismo celular normal, a produção de ácido lático e o balanço ácido - base permanecem normais.

Com o tempo de exposição aumentado (sub aguda ou crônica) a temperatura c3ntral fica próxima a periférica, quando isto acontece o paciente começa a ter hipoglicemia e acidose e o metabolismo aeróbico passa a ser ameaçado, entretanto é importante sabermos qual o tempo exato de exposição pois alguns pacientes podem desenvolver hipotermia profunda mesmo em pequenos períodos de exposição.

Situações que levam a hipotermia

As equipes de socorro podem encontrar pacientes em hipotérmicos em várias situações, descreveremos quatro delas.

1. Hipotermia de imersão ocorre quando um indivíduo é colocado em um ambiente frio sem preparação ou planejamento. Qualquer um que caia através do gelo em um lago ou rio esta imediatamente exposto ao risco de hipotermia. Um motorista de um carro quebrado que precisa caminhar em uma estrada com chuva e ventos de temperatura congelante pode ser vítima de hipotermia e semi afogados em águas com temperaturas de 21o C ou menos caem nesta categoria. Estas situações habitualmente provoca hipotermia aguda.2. Hipotermia de submersão é uma combinação de hipotermia e hipóxia. Especialistas em esportes de natureza e a quarda costeira americana tem mostrado ótimos resultados na reanimação de pacientes semi afogados em águas geladas. Reanimações bem sucedidas sem déficit neurológicos tem acontecido em reanimação de submersões em água gelada por até 66 minutos. O reflexo do mergulhador que envolve o bloqueio instintivo da respiração, redução das funções vitais e “shunt" circulatório na circulação central é que provavelmente permitem com que

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estes indivíduos sobrevivam. A água fria provavelmente protege o sistema nervoso central da hipóxia.

Muitos fatores influenciam a evolução do paciente vítima de submersão em água fria como: idade, tempo de submersão, temperatura da água, pureza da água, qualidade da RCP e outras manobras de reanimação e quaisquer outras lesões ou doenças que o paciente possa Ter.

Idade : Há uma grande porcentagem de reanimações em crianças e pré escolares, com sucesso, e bem documentadas nos EUA e Europa. Acredita-se que pela menor massa do corpo de uma criança ela se resfrie mais rápido e forme menor quantidade de resíduos do metabolismo anaeróbico, formando com isto um menor número de lesões irreversíveis.

Tempo de submersão : Obviamente quanto menor o tempo de submersão, menores as chances de lesão celular produzida pela hipóxia. O socorrista deve se preocupar em obter informações o mais corretas possível com relação ao tempo de submersão mas o resgate e a reanimação deve se iniciar independente do tempo de submersão.

Esforços : Vítimas de submersão que se debatem muito tem menor chance de Ter uma reanimação bem sucedida (a não ser claro que os esforços tenham evitado o afogamento). Indivíduos que estão intoxicados por álcool ou drogas geralmente se esforçam (debatem) menos e são reanimados com mais sucesso. Debater-se menos significa menor atividade muscular, menor produção de calor (energia) e menor vasodilatação, que em última análise leva a menor déficit de oxigenação muscular (menor déficit de oxigênio significa menor produção de CO2 e ácido lático) e isto tudo provoca esfriamento mais rápido.

Pureza da água: geralmente a reanimação de pacientes que sofreram submersão em águas limpas tem melhor resposta que os submergidos em águas sujas ou contaminadas, mas parece não existir diferença na sobrevida entre submersão em água doce ou salgada.

Qualidade da RCP e dos esforços de reanimação : Pacientes que receberam RCP imediata e adequada combinada com reaquecimento e suporte avançado da vida geralmente evoluem melhor que quando estes itens são atrasados ou mal realizados. Início imediato da RCP é o fator primordial na reanimação do paciente com hipotermia de submersão.

Lesões ou doenças associadas : Pacientes com lesões ou doenças pré existentes ou que as desenvolveram em combinação com a submersão não se restabelecem tão bem quanto os indivíduos saudáveis.

Esta lista de fatores que parecem contribuir par o sucesso da reanimação dos pacientes submersos foi desenvolvida a partir de pesquisas que ainda estão em andamento. Todo paciente submerso deve receber todos os esforços de reanimação a não ser que tenhamos a presença ou ausência de um destes fatores. O paciente tem que estar reaquecido para que se possa diagnosticar o óbito.

3. Hipotermia de campo envolve a exposição sem proteção a elementos naturais, geralmente indivíduos saudáveis participando de esportes "outdoor" (de natureza) e atividades de aventura. Esquiadores, caçadores,

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alpinistas e intusiastas de outros esportes externos podem ficar hiper expostos a temperaturas frias e correrem o risco de ficarem hipotérmicos.

4. Hipotermia urbana pode ser esquecida pela possibilidade de outras doenças ou lesões mais comuns estarem presentes. Uma grande variedade de doenças crônicas ou agudas podem deixar o paciente mais susceptível a hipotermia a hipotermia pode reduzir a efetividade de tratamentos habituais. Hipotermia deve ser suspeitada nos seguintes casos.

• Recém nascidos e crianças• Doenças e lesões relacionadas ao álcool• Uso de drogas ou overdose (nesta categoria entram as drogas

lícitas e ilícitas como beta bloqueadores e sedativos)• Hipotermia induzida pela cocaína• Idosos principalmente os com doenças ou lesões associadas• Doenças como o hipotireoidismo, cardiopatias ou diabetes• Queimados• Desnutridos• Moradores de rua que estão com pouca proteção (roupas

............................................................260..................................................................Uma situação típica em que a hipotermia deve ser suspeitada são dias

chuvosos e frios com temperaturas em torno de 15o C, pacientes dormindo, alcoolizados, utilizando roupas úmidas em solo frio ou na rua, esta é uma situação perfeita para a hipotermia severa não reconhecida.

Abordagem

Devemos Ter um grande índice de suspeita mesmo quando as condições ambientais não sugiram (vento, umidade, frio, etc...). A temperatura retal não é um procedimento comum de ser realizado em campo nem por equipes de pré hospitalar. As ambulâncias geralmente só levam termômetros comuns (orais para adultos ou retais para crianças) que alcançam temperaturas mínimas de 34,4o C, para aferirmos temperaturas hipotérmicas temos que Ter um termômetro de baixas temperaturas.

A melhor maneira de um socorrista abordar um hipotérmico é observar os tremores musculares e o nível de consciência. Pacientes com hipotermia moderada (temperatura cardíaca maior que 32o C) terão um nível de consciência alterado ou confusão mental. Eles estarão letárgicos e geralmente estarão parados em pé ou deitados e estarão tremendo. Esta condição pode ser interpretada por policiais ou socorristas como uma intoxicação por drogas ou álcool.

Quando a temperatura interna cai abaixo de 32o C o paciente apresenta hipotermia profunda e provavelmente não sentira frio, o tremor estará ausente e haverá uma importante diminuição do nível de consciência, possivelmente ao ponto da inconsciência ou coma, as pupilas terão reação lenta ou estarão fixas e dilatadas, o pulso estará diminuído ou ausente, a pressão arterial estará diminuída

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ou inaudível, a freqüência respiratória estará tão baixa quanto 1 2 movimentos por minuto e o ECG mostrara fibrilação atrial ou ventricular.

Tratamento

O tratamento pré hospitalar do paciente hipotérmico consiste prevenir maior perda de calor, manipulação cuidadosa, transporte imediato e iniciar reaquecimento em alguns pacientes.

Prevenir maior perda de calor é remover o paciente para uma ambulância aquecida ou aquecê-lo e protegê-lo com cobertores se for realizado transporte aéreo, roupas molhadas devem ser retiradas cortando-as para evitar movimentos desnecessários com o paciente. Cobrir o paciente com cobertores aquecidos e se o paciente estiver acordado e consciente devemos oferecer líquidos aquecidos e doces. Fluidos intravenosos aquecidos a 40o C devem ser administrado se um acesso venoso puder ser obtido sem agitar demais o paciente, não dê ao paciente líquidos frios (temperatura ambiente) pois este fluido estará com temperatura abaixo da temperatura corpórea do paciente que fará com que a temperatura deste caia ainda mais, estas duas formas de terapia são mínimas para o reaquecimento e o bom senso deve decidir se o uso de líquidos (oral ou intravenoso) pode levar a aspiração, tosse ou dor. Devemos evitar a aplicação de bolsas aquecidas ou massagem nas extremidades.

O reaquecimento da extremidades ou outro método de aumentar a circulação periférica antes do reaquecimento central pode aumentar a acidose, a hipercalemia e pode até reduzir a temperatura interna, isto pode complicar a reanimação e precipitar uma fibrilação ventricular não responsiva.

A frase eles não estão mortos até estarem mortos e quentes" foi dita especificamente para o paciente hipotérmico, todos os esforços de reanimação devem ser realizados até que a morte cerebral seja determinada com a temperatura interna normal.

Pacientes com hipotermia profundo o manuseio cuidadoso e gentil é de suma importância, se pudermos utilizaremos o ECG para controlar a atividade elétrica do coração, se os pulsos palpáveis habitualmente não estiverem palpáveis, o monitor cardíaco é a única maneira de se determinar a necessidade de se iniciar a RCP, se este mostrar algum tipo de ritmo cardíaco elétrico organizado não devemos iniciar a RCP, mesmo que o pulso estiver ausente porque a RCP frequentemente precipita uma fibrilação ventricular, mas se a FV já estiver presente a RCP deve ser iniciada normalmente e mantida durante o transporte até o reaquecimento no hospital, já pacientes que sofreram submersão devem ser tratados como um afogamento com início imediato da RCP (se a vitima estiver em apneia e sem pulso) e procedimento de suporte cardíaco avançado.

Os pacientes com hipotermia profunda devem estar bradicárdicos, mas, equipamentos de proteção das vias aéreas como cânulas orais, obturadores esofágicos e cânulas endotraqueais não devem ser usados até que a fibrilação ventricular seja diagnosticada pelo ECG e a RCP tenha sido iniciada. Oxigênio pode ser oferecido por máscara, mas seu uso é questionável, ele oferecera maior benefício se for aquecido.

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Para pacientes com hipotermia profunda a desfribrilação e o suporte cardíaco avançado com drogas que se usam convencionalmente pode não Ter boa ação graças a queda da temperatura cardíaca, alguns protocolos orientam a realização de uma tentativa de desfibrilação para a fibrilação ventricular seguida de suporte cardíaco básico até que o paciente seja reaquecido no hospital.

Raras são as situações onde o paciente devera ser reaquecido no local do acidente, como, na impossibilidade de transportar o paciente ao hospital (nevasca ou outro acidente ), ele deve ser posto em uma banheira ou local similar que esteja cheia de água aquecida (40o C), as extremidades devem ser deixadas de fora da água.............................................................261.................................................................para que a região cardíaca seja aquecida primeiro, isto ajuda a evitar o "after drop" que ocorre quando as extremidades são aquecidas mais rapidamente que a região cardíaca promovendo vasodilatação que leva a hipotensão central e fibrilação ventricular. Este tipo de reaquecimento é uma tentativa de campo extrema. O reaquecimento central em ambiente hospitalar é o método mais adequado.

Lesões provocada pelo frio ou pelo calor podem ser provocadas por condições ambientais e provocam alterações de saúde, elas podem provocar tanto complicações locais quanto sistêmicas e levam a situações que ameaçam a vida ou a perda de membros. O diagnóstico precoce, abordagem e tratamento pela equipe pré hospitalar limitam as lesões e reduzem a morbidade e a mortalidade destas emergências, em alguns tipos de hipotermia o suporte básico no campo é mais seguro e eficiente para o paciente que terapias invasivas. Abordagem correta do paciente com doença produzida pelo ambiente pode fazer a diferença na reanimação e no prognóstico do paciente.

Um homem de 25 anos de idade tem queimadura de espessura parcial e total no 2 MMII, dos dedos a metade das coxas. Este caso representa um problema comum: o paciente apresenta-se com uma lesão óbvia, de aspecto muito feio e o socorrista tem a tendência de se preocupar com esta lesão e se esquecer de iniciar a abordagem pela procura de lesões que ameaçam agudamente a vida. A abordagem correta para este paciente é iniciarmos com a avaliação da segurança do local e se houver segurança a próxima ação é paralisar o processo de queimadura, depois o A, B, C, D, E deve ser realizado e somente após isto que o tratamento de queimadura deve ser realizado, neste caso o tratamento da queimadura envolve a cobertura da área com compressas estéreis e secas, iniciar infusão intravenosa se houver necessidade e controle da dor se o paciente estiver

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Resumo

Solução do cenário

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hemodinamicamente estável. O transporte para um centro de queimados, se houver um, esta indicado.

Uma mulher de 30 a sai cambaleando de um edifício que estava pegando fogo com grave desconforto respiratório. Este caso representa a necessidade de uma abordagem e tratamento agressivos de um distúrbio respiratório associado a uma estrutura pegando fogo. Este paciente apresenta-se sem queimaduras mas com grave distúrbio respiratório secundário a inalação de produtos tóxicos. O tratamento deste paciente inicia-se pela abordagem e controle das lesões que ameaçam agudamente a vida, o distúrbio respiratório que este paciente apresenta será tratado durante esta avaliação, O2 a 100 % deve ser iniciado e suporte ventilatório pode ser necessário, procedimentos avançados podem ser necessários para manter a via aérea pérvia.

Um homem idoso foi encontrado arresponsivo em um carrinho de neve, com uma respiração lente e superficial e um pulso carotídeo fraco e lento. Este caso apresenta a sintomatologia típica de hipotermia. Os idosos são mais sensíveis a temperaturas extremas, o cuidado com estes pacientes deve começar com a avaliação primária e com o tratamento das lesões que ameaçam agudamente a vida, nos pacientes hipodérmicos os sinais vitais podem estar alterados mas a oxigenação pode estar adequada ainda. Esta paciente deve ser manipulado gentilmente pois movimentos rudes podem provocar fibrilação ventricular, as roupas, se molhadas, devem ser retiradas e o paciente coberto para evitar maior perda de calor, o transporte para um centro especializado deve ser rápido mas com cuidado. O contato precoce com o hospital permitira com que este ganhe tempo para preparar o equipamento e o pessoal necessário para o atendimento.

Um maratonista foi encontrado fora de se percurso, confuso, diaforético e caminhando erroneamente. Este caso representa uma situação que se desenvolveu em um ambiente muito quente. Este paciente apresenta intermação, o tratamento deve seguir a sequencia da avaliação primária, colocarmos o paciente em um ambiente fresco, mantê-lo em posição supina e iniciar infusão venosa com solução salina ou ringer lactato se possível.

Um dia com temperaturas congelantes, uma mulher moradora de rua apresenta perda da sensibilidade dos pés e pernas e sensação de descontrole dos membros inferiores. Este paciente apresenta uma frostibite severa, que é comumente vista em áreas urbanas, o tratamento deste paciente estável é removê-lo do ambiente frio e transportá-lo para um hospital. O reaquecimento não deve ser iniciado no local a não ser que o tempo de transporte até o hospital seja elevado.

Respostas na página 333

1- Qual a melhor maneira de se realizar um curativo em queimados no pré hospitalar ?

A. Compressas úmidas

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Revisão

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B. Compressas secas e estéreisC. Gel hidrossolúvelD. Silvaderme

2- O maior interesse na queimadura elétrica é ?

A. O efeito wick B. Perda de tecidoC. Lesões de entrada e saídaD. Alterações cardíacas

................................................................262..............................................................

3- O primeiro passo nas lesões relacionadas ao calor é :

A. Retirar o paciente do ambienteB. Administrar líquidos intravenosos friosC. Colocar sacos de geloD. Vestir roupas molhadas

4- Afogados em águas geladas sofrem os efeitos da hipóxia e :

A. Hipotermia de imersãoB. Hipotermia de submersãoC. hipotermia urbanaD. Hipotermia de campo

5- Uma queimadura envolvendo a face e a região anterior dos 2 membros superiores, qual é a superfície corpórea atingida ?

A. 50 %B. 35 %C. 13,5 %D. 9,5 %

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