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PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
Mestrado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional - MMADRE
PERSPECTIVA HISTÓRICA DOS IMPACTOS AMBIENTAIS NA REGIÃO DO PONTAL DO PARANAPANEMA
GRAZIELLA PLAÇA OROSCO DE SOUZA
Pré-projeto apresentado a Pró-Reitoria dePesquisa e Pós-Graduação, como parte dosrequisitos para o processo de seleção para o Curso de Mestrado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional – MMADRE, da Universidade do Oeste Paulista.Área de concentração: Planejamento Ambiental e Desenvolvimento Regional.
ORIENTADOR: Dr. Munir Jorge Felício
Presidente Prudente – SP
2013
RESUMO
Perspectiva histórica dos impactos ambientais na região do Pontal do
Paranapanema
O presente trabalho tenciona compreender de que forma vem sendo divulgada a história dos impactos ambientais na região do Pontal do Paranapanema. Tendo como referencial teóricos desta Ciência Social e pesquisadores que dedicaram seus estudos à análise regional, o estudo deverá considerar a divulgação das informações referentes aos impactos ambientais ocasionados principalmente pelo avanço capitalista à região. Deste modo, se pretende analisar e discutir as dimensões dos impactos ambientais na região do Pontal do Paranapanema, causados pela implantação e funcionamento das usinas hidrelétricas e dos empreendimentos movidos pelo agronegócio sucroalcooleiro na década de 1990, e verificar de que forma essas informações estão sendo divulgadas. O estudo justifica-se por tratar do assunto sob a ótica histórica, revelando como vem sendo realizada a interpretação do assunto. Por se tratar de uma discussão historiográfica, torna-se oportuna que ocorra no campo acadêmico, visto que, a região do Pontal do Paranapanema, amplamente estudada na perspectiva geográfica, política, social e econômica, poderá ser objeto de análises históricas relevantes na esfera ambiental.
Palavras-chave: Divulgação e interpretação. Perspectiva histórica. Impactos
ambientais.
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OBJETIVOS
Objetivo geral
Compreender de que forma vem sendo interpretada a história dos impactos ambientais
gerados pelo avanço capitalista na região do Pontal do Paranapanema.
Objetivos específicos:
1. Investigar, na perspectiva histórica, como a questão dos impactos ambientais vem
causando interesse nos meios acadêmicos e vários segmentos sociais da região do
Pontal do Paranapanema.
2. Analisar e discutir as dimensões dos impactos ambientais na região do Pontal do
Paranapanema e verificar de que forma essas informações estão sendo divulgadas.
3. Estudar as dimensões dos impactos ambientais causados pela implantação e
funcionamento das usinas hidrelétricas e dos empreendimentos movidos pelo
agronegócio sucroalcooleiro;
4. Refletir sobre os conteúdos históricos publicados na Região do Pontal e de que forma
contemplam os impactos ambientais ocorridos na década de 1990.
JUSTIFICATIVA
A História, por ser uma ciência integrante do campo das chamadas
Ciências Sociais, é construída e reconstruída na medida em que a humanidade se
desenvolve e deixa sua marca evolutiva no planeta. Esses registros de transformações
sociais, econômicas, políticas e culturais fazem com que o ser humano seja protagonista
de uma História que ultrapassa o movimento cíclico temporal. O ser humano passa deste
modo, a ser protagonista, buscando apropriar-se desta historicidade. A História, nesta
perspectiva, cumpre a função de trazer o conhecimento e trazer consciência ao ser
humano como agente transformador social.
Uma vez que a história da humanidade é reconstituída principalmente
através de documentos escritos deixados por pessoas contemporâneas aos fatos, a
racionalidade torna-se a ferramenta mais importante do historiador, por ser ela que o
auxilia nas análises sobre a realidade dos fatos. Portanto, o fato histórico não é um
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elemento dado e acabado, pois deriva da reflexão do historiador. Neste contexto porque
sempre se tem a impressão de que a História é contada pelos vencedores?
Esta questão pode ser respondida por meio do conceito de estratificação
social, inerente a sociedade humana organizada desde seus primeiros agrupamentos
sociais. A estratificação social seja ela econômica, política, profissional, sempre
segregará baseada em graus de importância: o rico é mais importante que o pobre, o
grupo que tem poder é mais importante que o que não tem; o intelectual é mais
respeitado que o desinformado.
Esta leitura capitalista das relações de poder e de como são interpretadas
e discutidas as informações históricas, podem ser verificadas em Max Weber (1997).
Para o autor,
O homem é dominado pela produção de dinheiro, pela aquisição encarada como finalidade última da sua vida. A aquisição econômica não mais está subordinada ao homem como meio de satisfazer suas necessidades materiais. Esta inversão do que poderíamos chamar de relação natural, tão irracional de um ponto de vista ingênuo, é evidentemente um princípio orientador do capitalismo, tão seguramente quanto ela é estranha a todos os povos fora da influência capitalista (WEBER, 1997, p. 33).
Huberman (1979) tenta explicar, em termos de desenvolvimento das
instituições econômicas, por que certas doutrinas surgiram em determinado momento,
como se originaram na própria estrutura da vida social, e como se desenvolveram,
modificaram e foram ultrapassadas, ao mudarem os padrões daquela estrutura.
Tratando dos bens mundanos do ser humano Huberman reuniu em duas
partes o que ele denominou de “História da Riqueza do Homem”. Na primeira parte ele
procura compreender como se deram as transformações da sociedade feudal para a
sociedade capitalista. “A sociedade feudal consistia dessas três classes – sacerdotes,
guerreiros e trabalhadores – sendo que o homem que trabalhava produzia para ambas as
outras classes, eclesiástica e militar” (HUBERMAN, 1979, p. 11). Na segunda parte ele
demonstra como surgiu o modo de produção capitalista e explica que “o capitalista é o
dono dos meios de produção – edifícios, máquinas, matéria-prima etc.; compra a força
de trabalho. É da associação dessas duas coisas que decorre a produção capitalista”
(HUBERMAN, 1979, p. 168).
As considerações de Leo Huberman (1980), em sua obra contribuem com
esta reflexão quando analisa a transição do feudalismo para o capitalismo:
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Poucos indícios há de que alguém devia produzir todas essas coisas, que armaduras não crescem em árvores, e que os alimentos, que realmente crescem, tem que ser plantados e cuidados. Mas assim é. (HUBERMAN, 1980, p. 11).
Enfatizando a questão ambiental no cerne desta discussão, a relação entre
a problemática dos impactos ambientais e o sistema capitalista é intrínseca e pertinente.
Segundo Burns (2001, p. 770),
o pessimismo com relação à condição humana não se derivava apenas de preocupação com problemas contemporâneos (...). Originava-se também do medo do futuro – do futuro dos seres humanos, da própria terra e daquilo que se chama de sua ecologia.
Burns (2001) em sua obra traz uma curta análise sobre as realizações e
limitações da ciência e da tecnologia. Neste texto, menciona que a grandeza dos
problemas tem deixado os intelectuais em dúvida:
A maioria daqueles a quem cabe a responsabilidade de encontrar soluções para os problemas – basicamente políticos e funcionários públicos - , mantém uma atitude de cauteloso otimismo. Em busca de soluções, voltam-se ainda, paradoxalmente, para aqueles mesmos setores responsáveis, em muitos casos, pela criação dos problemas: a ciência e a tecnologia. Foram os cientistas e os técnicos que inventaram e aperfeiçoaram o motor de combustão interna e o DDT. Agora outros cientistas e outros técnicos procuram meios de combater seus efeitos nocivos (BURNS, 2001, p. 773).
Neste contexto, cabe à ciência o papel de descortinar as causas dos
problemas ocasionados pela humanidade, em busca de reflexão que irão originar
possíveis soluções. No bojo desta discussão, o historiador torna-se relevante ao
contribuir para o debate desta nova História global, interdisciplinar e que traz consigo
novas considerações sobre o meio ambiente, em oposição à historiografia tradicional,
que se ocupa em relatar o passado e transmitir os fatos de maneira científica e racional.
Ao analisar as condições impostas ao meio ambiente com o avanço do
modelo capitalista em todos os segmentos, o desenvolvimento de novas tecnologias e os
efeitos da explosão populacional, urge trazer à luz da História, nova perspectiva sobre o
assunto em pauta - impacto ambiental - sua divulgação e interpretação, na tentativa de
uma reflexão holística do social que estude com novos olhares a sociedade do mundo
atual bem como das sociedades do passado.
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Devido a isto, é importante que se conheça a História locorregional para
que se reflita sobre os desdobramentos deste assunto em uma visão pontual do problema
em questão. Desta forma, as análises apontadas por Leite (1981) em relação aos
impactos ambientais na região do Pontal do Paranapanema são imprescindíveis para que
se iniciem as discussões.
O autor em sua tese descreve minuciosamente a região do Pontal do
Paranapanema, em uma visão histórica, geográfica, social, política, econômica e
ambiental. Sua principal preocupação foi analisar como as questões de ordem política e
econômica puderam interferir no meio ambiente de forma dramática e pontual.
Nesta região, o governo federal criou três reservas florestais, destinadas à
preservação da biodiversidade regional. No entanto, a ocupação da região, realizada de
forma desenfreada e desregulada culminou com a destruição total de duas destas
reservas, restando somente na atualidade a conhecida como Parque Estadual Morro do
Diabo, situado no município de Teodoro Sampaio-SP.
Isto se deu pela forma de ocupação e posterior exploração das terras
devolutas, que envolveram todo tipo de arbitrariedade e violência no processo. Essas
ocupações irracionais e irregulares provocaram mudanças irreparáveis que “acabaram
por ferir fundo o meio ambiente; irregular também porque poucos se apoderaram de
muito, enquanto muitos permaneceram sem nada”. (LEITE, 1981, p. 10).
De acordo com o autor,
A multidão que chegava em busca de terras para plantar, pouco se importava se estas eram públicas, particulares, com titulação regular ou não. Uma distinção ficara patente: enquanto que as glebas ocupadas por particulares eram defendidas até a bala pelo seu ocupante maior e suposto proprietário, as do Estado foram vítimas de aventureiros grandes e pequenos que passaram a disputar, entre si, sortes de terras que não lhes pertenciam (LEITE, 1981, p. 71).
Somadas ao impacto ambiental ocasionado pelo processo de ocupação,
novos empreendimentos fixam-se à região por encontrar terras a baixos preços e mão-
de-obra barata. Foi o caso das usinas hidrelétricas e das usinas de açúcar e álcool. Não
se pode desconsiderar o impacto causado por tais empreendimentos.
Para esta pesquisa, no entanto, o assunto em tela é a discussão sobre
como a história vem divulgando e interpretando esses impactos ambientais. Nesta
perspectiva, a pesquisa justifica-se por buscar compreender de que maneira as
informações sobre impactos ambientais, ocasionados principalmente pelo
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funcionamento das usinas hidrelétricas e empreendimentos do agronegócio
sucroalcooleiro na região do Pontal do Paranapanema são disseminadas na sociedade.
Importa por tratar do assunto sob a ótica histórica, revelando como vem sendo realizada
a interpretação do assunto. Por se tratar de uma discussão historiográfica, torna-se
oportuna que ocorra no campo acadêmico, visto que, a região do Pontal do
Paranapanema, amplamente estudada na perspectiva geográfica, política, social e
econômica, poderá ser objeto de análises históricas relevantes na esfera ambiental.
REVISÃO DA LITERATURA
A preocupação em analisar de que forma os impactos ambientais são
divulgados e interpretados pelos autores sugeridos para esta pesquisa foi a proposta
desta revisão. O recorte temporal escolhido – 1990 a 2000 – refletirá a implantação de
empreendimentos que ocasionaram grande parte destes impactos: as quatro Usinas
Hidrelétricas (UHE Engenheiro Sergio Mota, UHE Taquaruçu, UHE Rosana e UHE
Capivara) e as usinas de açúcar e álcool instaladas na região. Esta periodização proposta
visa facilitar as análises dos trabalhos.
Foram selecionados para a revisão da literatura deste pré-projeto, os
seguintes autores: Leite (1981), Silveira (1990), Fernandes (1994), Hespanhol (2000) e
Felício (2011).
A ocupação da região do Pontal do Paranapanema, analisada por Leite
(1981) em sua tese de Livre-Docência apresenta vasto histórico de localização,
povoamento e constituição das reservas florestais: a Lagoa São Paulo, a Grande Reserva
do Pontal e a Reserva do Morro do Diabo. O povoamento da região se deu de forma
irregular, na qual as terras destinadas à preservação ambiental acabaram nas mãos de
grandes posseiros.
No processo de ocupação das terras, então reservadas, tudo era válido: o suborno de escrivães, juízes e promotores; o compadresco político e,eventualmente, o recurso as armas de grupos de jagunços a soldo dos interessados (LEITE, 1981, p. 8).
Ao tratar das reservas florestais, Leite (1981) relata as tentativas de
ocupação das terras demarcadas para este fim. Menciona que até mesmo “forças
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políticas regionais começam a pressionar o governo estadual no sentido de extinguir a
reserva” (LEITE, 1981, p. 79). No decorrer do trabalho, o autor aponta como essa
ocupação desenfreada e irregular afetou o meio ambiente, e já nas considerações finais
de sua tese, o autor aponta um panorama geral da situação na região na época,
mencionando o impacto que estava sendo causado com a instalação da Usina
Hidrelétrica de Porto Primavera:
O imenso lago a ser formado pela Usina Hidrelétrica Porto Primavera cobrirá toda a área da Lagoa São Paulo situada a cerca de 140 km ao norte do complexo. As lagoas desaparecerão melancolicamente com as matas que rodeavam e as gerações futuras não saberão de sua existência (LEITE, 1981, p. 241).
A ocupação capitalista da região também é explorada em Silveira (1990),
que trata da “Recriação capitalista do campesinato”, abordando o histórico do processo
de formação da estrutura fundiária em Presidente Prudente. Em sua tese, cujo recorte
temporal é 1950 a 1985, a autora relata as relações capitalistas do trabalho no campo,
abordando as condições do trabalho familiar e do colonato, e como os latifundiários
exploravam esta mão-de-obra. Interessante analisar como as sucessões de culturas
agropecuárias e transformações no modo de produção contribuíram para a valorização
das terras.
De acordo com a autora, “nem todas as fazendas eram exploradas, muitos
adquiriam terras e as mantinham como reserva de valor”. (SILVEIRA, 1990, p. 45). Ao
alcançar altos preços por serem intocadas, as áreas florestais eram subdivididas em lotes
e vendidas, principalmente para a produção do café.
Tais características – fertilidade e localização – determinavam uma hierarquização entre as terras mais e menos adequadas à produção do café que se traduzia toda a mercantilização das terras, numa hierarquia correspondente de preços (SILVEIRA, 1990, p. 45).
Neste ritmo de ocupação, predominou a devastação ambiental:
Por volta de 1970, quase todo o desmatamento da região, principalmente do Pontal do Paranapanema, já estava efetuado, ultimando uma forma de arrendamento em que o grande grileiro subarrendava pequenas parcelas para os rendeiros e iniciava-se a derrubada da mata (SILVEIRA, 1990, p. 100).
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Assim como Leite (1981), Silveira (1990) relata sobre a criação das três
reservas florestais na região do Pontal do Paranapanema, e como foram pouco a pouco
ocupadas. Menciona, também, sobre o impacto ambiental decorrente da instalação “das
Usinas Hidrelétricas de Rosana, Porto Primavera e Taquaruçu, que deu origem aos
projetos de reassentamento” (SILVEIRA, 1990, p. 86).
Nesta perspectiva de ocupação territorial, Fernandes (1994) analisa a luta
pela terra na perspectiva do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST.
Em sua pesquisa, traz todo um levantamento histórico sobre a organização deste
movimento social e como o governo federal interferiu para refrear suas ações. Relata,
também, sobre a valorização dos recursos naturais por parte dos trabalhadores rurais,
que em seu programa de reforma agrária, contempla a preservação ambiental:
7. Desenvolver tecnologias adequadas à realidade, preservando e recuperando os recursos naturais, com um modelo de desenvolvimento agrícola auto-sustentável (FERNANDES, 1994, p. 73).
Alguns fatos chamam a atenção, como a estratégia do governo em
promover a exploração da Amazônia utilizando-se da “bandeira” da reforma agrária
para este fim. Segundo Fernandes (1994, p. 28),
Como o objetivo era colonizar para não reformar, o problema da terra jamais seria resolvido com os projetos de colonização na Amazônia, pois o que estava por trás deste processo era uma estratégia geopolítica de exploração total dos recursos naturais pelos grandes grupos nacionais/internacionais. Desta forma, o envolvimento das Forças Armadas, do Estado autoritário garantiram aos grandes grupos econômicos a exploração da Amazônia.
A visão apresentada pelo autor possibilitará um recorte social
diferenciado em relação ao objeto de estudo deste trabalho, visto que possibilitará a
análise sob outro prisma, o do trabalhador rural organizado.
Hespanhol (2000) em seu trabalho analisa a produção familiar na
Microrregião Geográfica de Presidente Prudente. De acordo com sua pesquisa, os
investimentos financeiros no campo não provocaram o desaparecimento dessas
unidades produtivas, mas desencadearam um processo de mudanças, que geraram
exclusão e diversidade de categorias, alterando a dinâmica econômica regional.
O recorte temporal estudado pela autora compreende no período que se
estende de 1950 a meados de1990, no qual discorre sobre as características da produção
familiar e as transformações decorrentes do avanço do capital. As mudanças na
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agricultura brasileira oriundas do processo de modernização e consolidação do
Complexo Agroindustrial (CAI) provocaram novas perspectivas de análise da produção
familiar no decorrer dos anos 1980.
Com a abertura política e a intensificação da crise financeira do Estado a partir de meados dos anos 1980, os debates sobre a questão agrária brasileira passaram a incorporar crescentemente as críticas ao modelo de modernização conservadora do agro nacional, através de análises que procuravam ressaltar as implicações sociais, ambientais e espaciais decorrentes desse processo (HESPANHOL, 2000, p. 59).
Um pouco a frente, no momento em que pondera sobrea importância da
agricultura familiar para a Revolução Verde na década de 1990, a autora ressalta:
A emergência na década de 1990, de um novo paradigma tecnológico consubstanciado nos pressupostos da sustentabilidade ambiental, em contraposição aos da Revolução Verde, também encontrou na produção familiar, caracterizada por sua diversificação produtiva e maior flexibilidade em seu processo decisório, um espaço privilegiado para sua propagação (HESPANHOL, 2000, p. 79).
A partir das inferências da autora, tenciona-se no decorrer desta pesquisa,
conferir de que modo a agricultura familiar e suas transformações favoreceram a
preocupação com a sustentabilidade ambiental.
O objeto de estudo de Felício (2011) é o debate paradigmático da questão
agrária e do capitalismo agrário. O autor se propôs a analisar a resistência do
campesinato frente ao avanço do capital. O ponto de apoio do paradigma do capitalismo
agrário é a investida do capitalismo no desenvolvimento rural, definindo que esse
desenvolvimento resolverá todos os problemas no campo. Para os teóricos do paradigma
da questão agrária, “o capital não é a única perspectiva para o desenvolvimento do
campesinato, e, que o campesinato, historicamente, soube criar alternativas mantendo
sua independência e autonomia (...)”. (FELÍCIO, 2011, p.8).
Os teóricos do paradigma da questão agrária acreditam que há
possibilidade de sobrevivência e autonomia no contexto agrário. Esta luta por
emancipação denomina-se recampesinização. Para o autor,
Recampesinização consiste numa tentativa de redefinir a recriação do campesinato frente à exclusão social cada vez mais intensa. Consiste em uma população que luta para sobreviver, unindo-se pelo controle de seus meios de produção como a terra, a água e os recursos naturais, dos quais são expropriados. Ploeg defende a recriação do campesinato via processo de
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recampesinização na busca por autonomia, por meio da produção agroecológica sustentável onde as sementes e as nascentes de água potável são recuperadas, como também os demais recursos renováveis (FELÍCIO, 2011, p. 18).
A agricultura familiar, neste contexto, encontra-se ligada a produção
sustentável. O autor menciona este fato ao analisar Sabourin (2009):
Além de atualizar as questões que marcaram o século XX como o papel da agricultura camponesa, suas identidades e modos de resistência, discute os novos elementos da agricultura familiar, em relação ao desenvolvimento sustentável e à gestão dos recursos de base comum (FELÍCIO, 2011, p. 38).
Esta verificação se apresenta mais adiante:
A precariedade e os obstáculos do acesso à terra incrementa valores culturais e simbólicos, como integrantes das práticas do processo de recampesinização, como “as relações simbólicas de reciprocidade entre os camponeses e o meio natural, a terra e seus recursos, são ainda mais fortes à medida que o acesso à terra é precário, difícil” (SABOURIN, 2009, p. 29). O legado cultural que sustenta o processo de recampesinização vai em direção à herança cultural camponesa (...) (FELÍCIO, 2011, p. 75).
Deste modo, torna-se possível a análise da agricultura familiar e sua
relação com o desenvolvimento sustentável em oposição à análise dos impactos
ambientais ocasionados pelo avanço do capital. De acordo com Felício (2011, p. 79):
O campesinato sabe fazer agricultura de forma sustentável e socialmente justa e pode oferecer à humanidade alimentos saudáveis. É exploração econômica que prioriza a abertura de postos de trabalhos, que pode e quer preservar os recursos naturais, a manutenção e o desenvolvimento da cultura com usos e costumes indígenas, afroamericanos como patrimônio herdado.
E ainda:
Os questionamento advindos da questão agrária atual desafiam a pesquisa científica de várias áreas do saber, ao defrontar o agronegócio interpretado como modelo de produção moderna e o campesinato com sua forma de praticar a agricultura visando garantir a soberania alimentar com o desenvolvimento dos valores da cultura camponesa e na preservação dos recursos renováveis (FELÍCIO, 2011, p. 84).
Desta feita, as análises de Felício importam por proporcionar a leitura de
uma gama de autores partidários dos dois paradigmas em questão, e por instigar a
reflexão sobre a forma como são divulgados os impactos ambientais na perspectiva de
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cada paradigma. Neste contexto, o autor aponta ainda, outros estudos que poderão
contribuir com esta análise:
Os estudos de Silveira (1990); Fernandes (2001); Oliveirs (1991); Shanin (1980) e Fabrini (2003) demonstram que a recriação do campesinato se constitui das mais diversas formas. A recriação pode se dar pela diversificação da produção camponesa, pelo processo de diferenciação através das relações mercantis e pela territorialização camponesa com a luta pela terra. Todavia, outros estudos defendem a recriação do campesinato via processo de recampesinização que se dá na busca de autonomia, através da produção agroecológica sustentável onde as sementes e as nascentes de água potável e demais recursos são recuperados (FELÍCIO, 2011, p. 173).
Tendo em vista esses aspectos e o propósito deste estudo, vale informar
que a proposital organização das referências em ordem cronológica deu-se por ser haver
percebido que os autores aqui apresentados complementam-se entre si, cada qual
tratando da questão do impacto ambiental no seio de seus respectivos objetos de estudo.
Esta breve explanação dos conteúdos a serem profundamente analisados reflete uma
prévia de como a questão dos impactos ambientais na região do Pontal do
Paranapanema vem sendo divulgada e interpretada.
Pretende-se, no decorrer da pesquisa, perpetrar novas leituras que possam
complementar as aqui apresentadas e poder suscitar consistente reflexão sobre o tema
abordado.
METODOLOGIA
A abordagem metodológica depende essencialmente da proposta de
pesquisa que se anseia desempenhar. Em alguns casos, como o da presente pesquisa,
cuja investigação tenciona compreender aspectos históricos sobre fenômenos ocorridos
em um período de tempo determinado, e que envolve correlação de dados históricos e
processos de diferentes esferas do saber (econômicos, sociais, políticos e ambientais), a
preocupação está em contribuir com a construção de uma visão mais ampla e geral, e
que ao mesmo tempo possibilite reflexão sobre a realidade.
Ao possibilitar o resgate histórico e documental, os dados impetrados e
as análises empreendidas permitem explorar a realidade numa busca de arrolamento
entre tais dados, produzindo informações importantes ao entendimento da questão
proposta, tida como um processo social e histórico.
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De acordo com MINAYO (2007, p. 21):
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes.
Em verdade, a pesquisa qualitativa precisa ser interpretada e exposta pelo
pesquisador. No caso da discussão que se propõe, pretende-se compreender as
representações projetadas à sociedade no que tange a história dos impactos ambientais
na Região do Pontal do Paranapanema.
Deste modo, a pesquisa será realizada utilizando-se de levantamento
documental de domínio público sobre as quatro usinas hidrelétricas e as principais
usinas de açúcar e álcool instaladas na região do Pontal do Paranapanema, no intuito de
descrever um panorama e contextualizar, historicamente, a região no momento de suas
instalações, levantando o que motivou a chegada destes empreendimentos e o impacto
ocasionado por estas instalações. Pretende-se apresentar breve histórico regional de
modo a proporcionar reflexão acerca do contexto histórico, social, econômico e
ambiental da região, utilizando-se, para esta finalidade, de pesquisadores cujos trabalhos
focaram as análises regionais face aos teóricos dos estudos históricos. Que esteja claro
que não se trata apenas de um levantamento historiográfico sobre os impactos regionais,
mas sim a compreensão de como esses impactos vem sendo tratados à luz da ciência
histórica.
As apreciações dos dados coletados serão realizadas baseando-se nos
estudos apresentados por ECO (2012), procurando também apontar a relevância social
mencionada em PESCUMA e CASTILHO (2008) que em suas obras trazem reflexão
sobre a importância da pesquisa científica para a sociedade. Segundo os autores,
Mesmo os trabalhos mais teóricos e aparentemente desligados de uma prática social ou política possuem essa dimensão. Por isso, o pesquisador de estar consciente da contribuição que seus estudos podem prestar a projetos políticos, ficando alertas sobre isso (PESCUMA; CASTILHO, 2008, p. 26).
Sob o aporte dessas considerações metodológicas tidas, pelas
características da investigação, como adequadas à análise de que se ocupa esta pesquisa,
busca-se compreender de que forma vem sendo contada a história dos impactos
ambientais na região do Pontal do Paranapanema.
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Para o levantamento das usinas hidrelétricas e dos empreendimentos do
agronegócio sucroalcooleiro, o ponto de partida foi a delimitação do espaço geográfico
a ser estudado. Para tanto, optou-se por utilizar a listagem de municípios considerados
pela Unidade Hidrográfica de Gestão dos Recursos Hídricos do Pontal do
Paranapanema – UGRHI 22. De acordo com dados disponibilizados pelo Comitê da
Bacia Hidrográfica do Rio Paranapanema, esta delimitação (UGRHI 22) compreende os
municípios de Anhumas; Caiuá; Euclides da Cunha Paulista; Iêpe; Marabá Paulista;
Mirante do Paranapanema; Nantes; Narandiba; Pirapozinho; Presidente Bernardes;
Presidente Epitácio; Presidente Prudente; Presidente Venceslau; Regente Feijó; Rosana;
Sandovalina; Santo Anastácio; Taciba; Tarabai; Teodoro Sampaio.
Ainda de acordo com o Comitê, a UGRHI 22 possui 4 grandes usinas
hidrelétricas (UHEs): UHE Engenheiro Sergio Mota, UHE Taquaruçu, UHE Rosana e
UHE Capivara.
O trabalho de delimitação das usinas de açúcar e destilarias de álcool
tomará por base os dados disponibilizados pela União dos Produtores de Bioenergia –
UDOP, que em sua homepage oficial, listou 196 unidades produtoras no Estado de São
Paulo. Dentre estas, apenas 7 encontram-se instaladas na região do Pontal do
Paranapanema, nos municípios de Narandiba, Mirante do Paranapanema, Presidente
Prudente, Presidente Venceslau, Sandovalina, Santo Anastácio e Teodoro Sampaio.
O levantamento dos trabalhos publicados será realizado nas Bibliotecas
das Instituições de Ensino Superior de Presidente Prudente, no qual serão utilizados os
trabalhos de conclusão de Curso de Graduação, monografias de Cursos de Pós-
Graduação lato-sensu, dissertações de Pós-Graduação stricto-sensu.
CRONOGRAMA
Planejamento 2013. Meses
Atividades Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Elaboração do pré-projeto.
X X
Levantamento bibliográfico
X X X X X X X X X X X X
Leitura e fichamento de obras
X X X X X X X X X X X X
Coleta e seleção de X X X X X
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dados nos municípiosCadastramento da pesquisa
X
Planejamento 2014. Meses
Atividades Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Revisão bibliográfica X X XColeta e seleção de dados nos municípios
X X X
Análise crítica do material
X X X X X X
Redação provisória X X XEntrega ao orientador XExame de qualificação XRevisão e redação final X X XApresentação no ENEPE
X
Defesa da monografia X
BIBLIOGRAFIA
BENTO, A. (2012, Maio). Como fazer uma revisão da literatura: Considerações teóricas epráticas. Revista JA (Associação Académica da Universidade da Madeira), nº 65,ano VII (p. 42-44). ISSN: 1647-8975.
BURNS, Edward McNall. História da Civilização Ocidental: do homem das cavernas às naves espaciais. v. 2. 40 ed. São Paulo: Globo, 2001.
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HESPANHOL, Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol. Produção familiar: perspectivas de análise e inserção na microrregião geográfica de Presidente Prudente –
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