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  UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE FARMÁCIA VALIDAÇÃO DE LIMITES CRÍTICOS DO PLANO HACCP E AVALIAÇÃO DE RISCO MICROBIOLÓGICO NUM ESTABELECIMENTO DE RESTAURAÇÃO Ana Sofia João Morgado MESTRADO EM CONTROLO DA QUALIDADE E TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS 2007

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE FARMCIA

VALIDAO DE LIMITES CRTICOS DO PLANO HACCP E AVALIAO DE RISCO MICROBIOLGICO NUM ESTABELECIMENTO DE RESTAURAO

Ana Sofia Joo Morgado

MESTRADO EM CONTROLO DA QUALIDADE E TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS

2007

UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE FARMCIA

VALIDAO DE LIMITES CRTICOS DO PLANO HACCP E AVALIAO DE RISCO MICROBIOLGICO NUM ESTABELECIMENTO DE RESTAURAO

Ana Sofia Joo MorgadoDissertao apresentada para a obteno do grau de Mestre em Controlo da Qualidade e Toxicologia dos Alimentos pela Faculdade de Farmcia da Universidade de Lisboa. Dissertao orientada pelo Dr. Manuel Abreu Dias e pela Prof. Doutora Aida Duarte.

MESTRADO EM CONTROLO DA QUALIDADE E TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS

2007

Aos meus pais

AGRADECIMENTOSA realizao deste trabalho no teria sido possvel sem a contribuio de diversas pessoas e instituies, a quem desejo deixar expressos os meus agradecimentos. Perante a difcil tarefa de enumerar todas as pessoas, peo desculpa a quem no for referido e espero que no faltem oportunidades para lhes expressar a minha gratido.

Muito obrigado Ao Dr. Abreu Dias, pela superviso deste trabalho, pela sua disponibilidade sempre que necessitei de ajuda, pela transmisso de conhecimentos de forma clara e esclarecedora, e por todo o incentivo e apoio. Prof. Aida Duarte, a minha orientadora na faculdade, pela forma simples e eficaz de transmitir conhecimentos prticos que foram uma mais valia na realizao do trabalho laboratorial. Pela sua disponibilidade para esclarecer todas as dvidas, e pela simpatia e boa disposio que me ajudaram em dias de menor inspirao. Pastelaria Sequeira, por permitir a realizao deste trabalho nas suas instalaes. Aos vrios trabalhadores que me receberam com simpatia e curiosidade em dias atarefados. Faculdade de Farmcia, em particular Prof. Matilde Castro, pelas condies e apoio disponibilizados para a realizao deste mestrado.

A todos os meus colegas de mestrado quero agradecer a simpatia e apoio, nos bons e maus momentos, manifestados ao longo destes anos. Em especial, ao Vtor Martins por partilhar alguns resultados do seu trabalho. Doutora Rosrio Novais e a Roslia Furtado do Instituto Nacional de Sade Dr. Ricardo Jorge agradeo a disponibilidade e auxlio prestado. No posso deixar de agradecer Doutora Lusa Romo, pela sua valiosa ajuda e compreenso, sem a qual no teria sido possvel realizar este trabalho. Aos meus pais, pois sem o seu carinho, ajuda, compreenso e incentivo nunca teria percorrido o caminho que me permitiu chegar elaborao desta tese. minha irm por ser o meu porto de abrigo. Aos meus amigos de sempre quero agradecer toda a amizade e apoio, fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho, carinhosamente apelidado de tese do croquete.

v

RESUMO

Nos ltimos anos, surgiu uma tendncia de aumento do consumo de alimentos prontos a comer em estabelecimentos de restaurao a nvel mundial. No obstante a sua pequena dimenso, a vigilncia microbiolgica dos alimentos produzidos nestas unidades constitui uma rea de grande interesse na Sade Pblica. A segurana dos alimentos produzidos baseada na implementao e aplicao de medidas preventivas tais como as Boas Prticas de Fabrico e de Higiene e o sistema HACCP. Este sistema foca-se na identificao e controlo das etapas do processo de fabrico que afectam mais significativamente a segurana alimentar dos alimentos produzidos. A especificao de limites crticos de controlo, utilizados para garantir que o perigo eliminado ou reduzido a nveis aceitveis, constitui uma parte importante do HACCP. Existem poucos dados publicados sobre o crescimento e sobrevivncia de bactrias patognicas em alimentos prontos a comer na restaurao. Neste trabalho foram realizadas anlises microbiolgicas em produtos intermdios e finais do croquete, pastel de e mousse de chocolate. Adicionalmente, foram efectuadas avaliaes dos perfis de tempo-temperatura nas etapas de fabrico mais relevantes, envolvendo a refrigerao e confeco. Com base nestes resultados, foi discutida a segurana microbiolgica dos trs produtos alimentares e a validade de alguns dos limites crticos do plano HACCP proposto pelo estabelecimento de restaurao, utilizando-se uma abordagem cientfica baseada na Avaliao de Risco Microbiolgico. Verificou-se que a probabilidade de sobrevivncia e crescimento de bactrias patognicas nos alimentos estudados parece ser muito baixa, visto que no foi detectada a sua presena. Por conseguinte, desde que sejam mantidas as condies de tempotemperatura adequadas durante a refrigerao e confeco do croquete, do pastel de bacalhau e da mousse de chocolate, o risco para a sade derivado do seu consumo parece ser tolervel.

Palavras-chave: HACCP; Limites crticos; Avaliao de Risco Microbiolgico; Croquete; Pastel de bacalhau; Mousse de chocolate.vii

ABSTRACT

In the last few years, a worldwide trend of increased consumption of ready-to-eat foods in restaurants arose. Albeit their somewhat smaller dimension, the microbiological surveillance of the manufactured products in these food service units constitutes a Public Wealth important issue. Nowadays, food safety is based on the implementation and application of preventive measures such as Good Hygiene and Manufacturing Practices and HACCP system. This system aims to the identification and control of food production stages that affect significantly the safety of the finished product. The establishment of critical control limits, used to assure that the hazard is eliminated or reduced to acceptable levels, plays an important part in HACCP. Data concerning the pathogenic bacteria growth and survival in ready-to-eat food served in restaurants is scarce. In the present work, several microbiological analyses were performed in croquette, codfish cake and chocolate mousse intermediate and final products. In addition, time-temperature profiles were assessed in the most relevant production stages, involving cooling and cooking practices. The obtained results were used to discuss the above-mentioned food products microbiological safety and the validity of the critical limits included in the HACCP plan for the studied food service establishment, using a scientific approach based on the Microbiological Risk Assessment. Apparently, the probability of pathogenic bacteria survival and growth in the food studied seems to be very low, since their presence was not detected. Therefore, as long the time-temperature conditions are maintained during cooling and processing of croquette, codfish cake and chocolate mousse, the health risk for the consumer due to their intake seems to be tolerable.

Keywords: HACCP; Critical limits; Microbiological Risk Assessment; Croquette; Codfish cake; Chocolate mousse.

ix

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURASARM Avaliao de Risco Microbiolgico ATCC American Type Culture Collection aw Actividade da gua BPF Boas Prticas de Fabrico BPH Boas Prticas de Higiene CAC Codex Alimentarius Commission (Comisso do Codex Alimentarius) EFSA European Authority for Food Safety (Autoridade Europeia para a Segurana dos Alimentos) FAO Food and Agriculture Organization FDA Food and Drug Administration FMEA Failure, Mode and Effects Analysis FSIS Food Safety Inspection Service HACCP Hazard Analysis and Critical Control Point (Anlise de Perigos e Pontos de Controlo Crticos) ICMSF International Commission on Microbiological Specification for Foods ILSI International Life Sciences Institute INSA Instituto Nacional de Sade Dr. Ricardo Jorge ISO International Standards Organization NACMCF National Advisory Committee on Microbiological Criteria for Food NASA North American Space Agency PCC Ponto(s) de Controlo Crtico spp. Espcies UE Unio Europeia ufc Unidades formadoras de colnias USDA United States Department of Agriculture WHO World Health Organization (Organizao Mundial de Sade)

xi

NDICE GERALndice de tabelas.....................................................................................................................xvii ndice de figuras .....................................................................................................................xvii ndice de grficos................................................................................................................... xviii

I. INTRODUO............................................................................................................... 11. Doenas de origem alimentar ............................................................................................ 3 1.1. Ocorrncia de doenas de origem alimentar causadas por microrganismos ................ 4 1.1.1. Condies e definies ........................................................................................... 4 1.1.2. Gravidade das doenas........................................................................................... 5 1.1.3. Registo de ocorrncias na Unio Europeia............................................................. 5 1.1.4. Registo de ocorrncias em Portugal ....................................................................... 7 1.1.5. Causas da contaminao dos alimentos............................................................... 10 2. Ferramentas de gesto da segurana alimentar............................................................ 11 2.1. Boas Prticas de Fabrico e Boas Prticas de Higiene................................................. 11 2.2. Anlise de Perigos e Pontos de Controlo Crticos (HACCP) ....................................... 12 2.2.1. Metodologia de implementao do HACCP.......................................................... 14 2.2.2. Perigos microbiolgicos e potenciais pontos crticos de controlo na restaurao 18 2.3. Avaliao de Risco Microbiolgico ............................................................................... 26 2.3.1. Identificao de perigos......................................................................................... 26 2.3.2. Avaliao da exposio......................................................................................... 26 2.3.3. Caracterizao do perigo ...................................................................................... 27 2.3.4. Caracterizao do risco......................................................................................... 27 2.3.5. Interaco entre sistemas HACCP e Avaliao de Risco Microbiolgico............. 27 3. O problema em estudo...................................................................................................... 29 3.1. Descrio do estabelecimento de restaurao ............................................................ 30 3.2. Os alimentos estudados ............................................................................................... 35 3.3. Objectivos e metodologia ............................................................................................. 40

II. MATERIAIS E MTODOS ............................................................................................ 431. Introduo .......................................................................................................................... 45 2. Anlises microbiolgicas dos alimentos........................................................................ 45 2.1. Avaliao da qualidade microbiolgica ........................................................................ 45 2.1.1. Amostragem .......................................................................................................... 45 2.1.2. Colheita e transporte de amostras ........................................................................ 48 2.1.3. Contagem de microrganismos............................................................................... 48 2.1.4. Pesquisa de microrganismos ................................................................................ 50

xiii

2.2. Estudo do comportamento de duas espcies de Salmonella na mousse de chocolate refrigerada.................................................................................................................................51 2.2.1. Preparao da cultura de inculo ..........................................................................52 2.2.2. Preparao da amostra de mousse de chocolate .................................................52 2.2.3. Armazenamento e amostragem ............................................................................52 2.2.4. Contagem de Salmonella spp. ..............................................................................52 3. Avaliao das Condies de Processamento ................................................................53

III. RESULTADOS...........................................................................................................551. Avaliao da qualidade microbiolgica e condies de processamento do croquete ......................................................................................................................................................57 1.1. Condies de arrefecimento da massa de croquete....................................................57 1.2. Anlises microbiolgicas da massa de croquete armazenada em refrigerao ..........58 1.3. Condies de fritura do produto final............................................................................61 1.4. Anlises microbiolgicas do produto final ....................................................................62 2. Avaliao da qualidade microbiolgica e condies de processamento do pastel de bacalhau ......................................................................................................................................64 2.1. Anlises microbiolgicas da massa de pastel e do produto final .................................64 2.2. Anlises microbiolgicas da salsa................................................................................67 2.3. Condies de fritura do produto final............................................................................68 3. Avaliao da qualidade microbiolgica e condies de processamento da mousse de chocolate ................................................................................................................................69 3.1. Condies de arrefecimento.........................................................................................69 3.2. Anlises microbiolgicas ..............................................................................................70 3.2.1. Produto final...........................................................................................................70 3.2.2. Estudo do comportamento de duas espcies de Salmonella na mousse de chocolate refrigerada ............................................................................................................73

IV. DISCUSSO .............................................................................................................751. Croquete .............................................................................................................................77 1.1. Identificao de perigos................................................................................................77 1.2. Caracterizao dos perigos ..........................................................................................79 1.3. Avaliao da exposio ................................................................................................79 1.4. Caracterizao do risco ................................................................................................82 2. Pastel de bacalhau ............................................................................................................83 2.1. Identificao dos perigos ..............................................................................................83 2.2. Caracterizao dos perigos ..........................................................................................84 2.3. Avaliao da exposio ................................................................................................84 2.4. Caracterizao do risco ................................................................................................86

xiv

3. Mousse de chocolate ........................................................................................................ 86 3.1. Identificao dos perigos.............................................................................................. 86 3.2. Caracterizao dos perigos.......................................................................................... 87 3.3. Avaliao da exposio................................................................................................ 88 3.4. Caracterizao do risco................................................................................................ 89

V. CONCLUSES FINAIS ................................................................................................ 91 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................... 95 ANEXOS .................................................................................................................... 101ANEXO I. Nmero de surtos de doenas de origem alimentar notificados na Unio Europeia em 2005.......................................................................................................................... 103 ANEXO II. Agentes causadores de doenas de origem alimentar notificados na Unio Europeia em 2005. ......................................................................................................... 105 ANEXO III. Valores-guia para avaliao da qualidade microbiolgica de alimentos prontos a comer preparados em estabelecimentos de restaurao .............................................. 107 ANEXO IV. Composio de solues................................................................................... 109

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NDICE DE TABELASTABELA I-1. Ocorrncia de doenas de origem alimentar em Portugal em 1997-2000, 2004 e 2005. ........................................................................................................................................... 8 TABELA I-2. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por agentes causadores, em 1997-2000, 2004 e 2005....................................................................................................... 8 TABELA I-3. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por alimentos contaminados, em 1997-2000, 2004 e 2005. ............................................................................. 9 TABELA I-4. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por local onde os alimentos foram consumidos ou adquiridos, no perodo de 1997-2000, 2004 e 2005. .............................. 9 TABELA I-5. Caractersticas e limitaes do controlo de segurana alimentar tradicional. ........... 12 TABELA I-6. Perigos associados a alimentos. ................................................................................ 15 TABELA I-7. Categorizao da severidade de perigos microbiolgicos. ........................................ 22 TABELA I-8. Principais condies para a ocorrncia de alguns dos perigos microbiolgicos na restaurao. .............................................................................................................................. 22 TABELA I-9. Valores de doses mnimas de alguns microrganismos patognicos consideradas como causadoras de doena.................................................................................................... 23 TABELA I-10. Regimes de tempo e temperatura da cozedura. ...................................................... 24 TABELA I-11. Plano HACCP proposto pelo estabelecimento de restaurao para o processo genrico "confeco. ............................................................................................................... 33 TABELA I-12. Correspondncia de etapas do plano HACCP proposto com a descrio do processo de fabrico do croquete, pastel de bacalhau e mousse de chocolate........................ 37 TABELA II-1. Descrio das amostras dos produtos alimentares estudados no estabelecimento de restaurao. .............................................................................................................................. 46 TABELA II-2. Frequncia e momento de amostragem da massa de croquete e croquete frito analisados................................................................................................................................. 46 TABELA II-3. Frequncia e momento de amostragem da massa de pastel e pastel de bacalhau frito analisados.......................................................................................................................... 47 TABELA II-4. Frequncia e momento de amostragem da mousse de chocolate analisada. .......... 47 TABELA II-5. Anlises microbiolgicas efectuadas no croquete, pastel de bacalhau e mousse de chocolate................................................................................................................................... 47 TABELA IV-1. Ingredientes do croquete e seus potenciais patognios contaminantes. ................ 77 TABELA IV-2. Ingredientes do pastel e bacalhau e seus potenciais patognios contaminantes. .. 83 TABELA IV-3. Ingredientes da mousse de chocolate e seus potenciais patognios contaminantes. .................................................................................................................................................. 87

NDICE DE FIGURASFIGURA I-1. Diferenciao de perigos no significativos e significativos, e deciso sobre o respectivo controlo, atravs de pr-requisitos ou do plano HACCP.14xvii

FIGURA I-2. rvore de deciso utilizada para determinar quando uma etapa, ponto ou procedimento particular no processo ou preparao dos alimentos, deve ser considerada ponto de controlo crtico. ..........................................................................................................16 FIGURA I-3. Diagrama de fluxo com as etapas sequenciais envolvidas no processo genrico da confeco no estabelecimento de restaurao em estudo. .....................................................32 FIGURA I-4. Diagramas do processo de fabrico do croquete (A), pastel de bacalhau (B) e mousse de chocolate (C)........................................................................................................................36

NDICE DE GRFICOSGRFICO III-1. Perfil de tempo-temperatura do arrefecimento da massa de croquete.. ................57 GRFICO III-2. Contagem de mesfilos aerbios a 37C na massa do croquete (C) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados. ................................................................................................................59 GRFICO III-3. Contagem de leveduras na massa do croquete (C) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados......59 GRFICO III-4. Contagem de bolores na massa do croquete (C) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados......60 GRFICO III-5. Contagem de coliformes totais na massa do croquete (C) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados. ................................................................................................................................60 GRFICO III-6. Perfil de tempo-temperatura da etapa de fritura do croquete.. ..............................61 GRFICO III-7. Contagem de mesfilos aerbios no croquete frito (CF) em log ufc/g, produzido a partir de massas de croquete com diferentes dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados. ...........................................................................62 GRFICO III-8. Contagem de leveduras no croquete frito (CF) em log ufc/g, produzido a partir de massas de croquete com diferentes dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados. .....................................................................................63 GRFICO III-9. Contagem de bolores no croquete frito (CF) em log ufc/g, derivado de massas de croquete com diferentes dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 8 dias), nos 10 ciclos de produo estudados. ...........................................................................................................63 GRFICO III-10. Contagem de mesfilos aerbios em log ufc/g na massa do pastel (MP) e pastel de bacalhau frito (PF) confeccionados no 1 dia, ou armazenados em refrigerao e fritos no 2 dia, nos 10 ciclos de produo estudados. ..........................................................................65 GRFICO III-11. Contagem de leveduras em log ufc/g na massa do pastel (MP) e pastel de bacalhau frito (PF) confeccionados no 1 dia, ou armazenados em refrigerao e fritos no 2 dia, nos 10 ciclos de produo estudados................................................................................65 GRFICO III-12. Contagem de bolores em log ufc/g na massa do pastel (MP) e pastel de bacalhau frito (PF) confeccionados no 1 dia, ou armazenados em refrigerao e fritos no 2 dia, nos 10 ciclos de produo estudados. .................................................................................................66xviii

GRFICO III-13. Contagem de coliformes totais em log ufc/g na massa do pastel (MP) e pastel de bacalhau frito (PF) confeccionados no 1 dia, ou armazenados em refrigerao e fritos no 2 dia, nos 10 ciclos de produo estudados. .............................................................................. 66 GRFICO III-14. Contagem de Escherichia coli em log ufc/g na massa do pastel (MP) e pastel de bacalhau frito (PF) confeccionados no 1 dia, ou armazenados em refrigerao e fritos no 2 dia, nos 10 ciclos de produo estudados. .............................................................................. 67 GRFICO III-15. Resultados das contagens de mesfilos aerbios, leveduras, bolores, coliformes totais, Escherichia coli, Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa em log ufc/g, nos diferentes tipos de salsa estudados: salsa sem tratamento, salsa picada lavada e salsa picada lavada e desinfectada com cloro. ................................................................................. 68 GRFICO III-16. Perfil de tempo-temperatura da etapa de fritura do pastel de bacalhau. ............. 69 GRFICO III-17. Perfil de tempo-temperatura do arrefecimento da mousse de chocolate. Representao da mdia e desvios-padro das temperaturas medidas no centro de massa. Valores referentes a medies efectuadas em trs ciclos de fabrico distintos........................ 70 GRFICO III-18. Contagem de mesfilos aerbios na mousse de chocolate (MC) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 5 dias), nos 10 ciclos de produo. .................................................................................................................................................. 71 GRFICO III-19. Contagem de leveduras na mousse de chocolate (MC) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 5 dias), nos 10 ciclos de produo......... 71 GRFICO III-20. Contagem de bolores na mousse de chocolate (MC) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 5 dias), nos 10 ciclos de produo................ 72 GRFICO III-21. Contagem de coliformes totais na mousse de chocolate (MC) em log ufc/g, ao longo dos dias de armazenagem em refrigerao (de 1 a 5 dias), nos 10 ciclos de produo. .................................................................................................................................................. 72 GRFICO III-22. Estudo da evoluo ao longo do tempo da sobrevivncia de duas espcies de Salmonella na mousse de chocolate refrigerada em estudo.. ................................................. 73

xix

I . I NT ROD U O

1. DOENAS DE ORIGEM ALIMENTARO nmero crescente e a gravidade das doenas de origem alimentar a nvel mundial, podendo atingir at 30% da populao em pases desenvolvidos (WHO, 2006), tm aumentado consideravelmente o interesse do pblico e das entidades governamentais em relao segurana alimentar. Qualquer pessoa est em risco de contrair este tipo de enfermidades, geralmente de natureza infecciosa ou txica, provocadas por agentes que entram no organismo atravs da ingesto de alimentos (Forsythe, 2002). Tem sido reconhecido o papel cada vez mais predominante da restaurao na incidncia de casos de doena alimentar, principalmente devido s modificaes socioeconmicas que levaram um nmero crescente de pessoas a comer fora de casa. A dificuldade em produzir um alimento seguro baseia-se no facto da populao de consumidores ser bastante diversificada, com vrios graus de sensibilidade e estilos de vida. Para alm disso, existe uma procura crescente por parte dos consumidores de alimentos frescos e minimamente processados que possuam uma garantia de segurana absoluta (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). No entanto, este conceito pode ter vrias definies, dependendo do que se considera um risco significativo. O pblico em geral pode considerar que os alimentos seguros correspondem a um risco igual a zero, enquanto que um produtor de alimentos deve considerar o que um risco aceitvel. Um risco nulo impraticvel dada a quantidade de produtos alimentcios disponveis, a complexidade da cadeia de produo e distribuio e a natureza humana (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). No obstante, os riscos de ocorrncia de doenas de origem alimentar devem ser reduzidos para nveis aceitveis na restaurao, como em qualquer outra actividade do sector alimentar. Os perigos para a segurana alimentar so definidos como propriedades biolgicas, fsicas ou qumicas que podem tornar os alimentos inseguros para o consumo humano (Forsythe, 2002). Visto que muitos alimentos utilizados na restaurao so produtos agrcolas que tiveram a sua origem em animais e plantas explorados no ambiente, podem conter microrganismos que os colonizam naturalmente. Alguns destes organismos so patognicos, o que significa que sob as condies e nmeros certos, podem provocar doena em quem os consome. Os alimentos de origem animal, tais como carne de vaca e porco, aves, peixe, marisco e ovos, muitas vezes so portadores de bactrias, vrus ou parasitas que podem ser nocivos para os humanos. Para alm disso, os alimentos podem ser contaminados por qumicos txicos no ambiente. Objectos fsicos tambm podem contaminar naturalmente os alimentos a partir do solo ou de prticas de colheita,3

I. INTRODUO

armazenamento

ou

transporte

e

provocar

leses.

Alguns

alimentos

sofrem

processamento e por vezes, no obstante os melhores esforos, so contaminados. Estes perigos inerentes, em conjunto com os perigos que podem ser introduzidos no estabelecimento de restaurao podem conduzir a leses, doenas ou morte (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). Esta situao representa um custo social inaceitvel em termos de Sade Pblica e impacto econmico, sendo que as empresas alimentares podem registar grandes perdas a nvel de diminuio da produtividade e perda de confiana dos consumidores (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002).

1.1. Ocorrncia de doenas de origem alimentar causadas por

microrganismos1.1.1. Condies e definiesA maioria dos perigos para a segurana dos alimentos na restaurao de natureza microbiolgica (Maunsell, 2003). A degradao dos alimentos ocorre naturalmente por aco de microrganismos que os utilizam como a sua fonte de nutrientes, tornando-os imprprios para o consumo. No entanto, muitas vezes, embora a degradao do alimento ainda no seja perceptvel, este pode encontrar-se j de tal forma contaminado que o seu consumo pode originar doenas no consumidor, se estiverem presentes microrganismos patognicos ou as suas toxinas. Assim, na maioria dos casos de doenas provocadas por alimentos ser necessrio que: o microrganismo patognico se encontre em quantidade suficiente para causar uma infeco ou para produzir toxinas, o alimento seja capaz de sustentar o crescimento dos microrganismos patognicos, e seja ingerida uma quantidade suficiente do alimento, de modo a ultrapassar o limiar de susceptibilidade do consumidor (Forsythe, 2002). Embora genericamente conhecidas como toxinfeces alimentares, as doenas transmitidas por alimentos so classificadas como infeces, intoxicaes ou toxinfeces (Forsythe, 2002). Uma infeco transmitida por alimentos uma doena que resulta da ingesto de alimentos contendo microrganismos vivos prejudiciais, tais como Campylobacter spp., Escherichia coli, Listeria spp. e Salmonella spp. Por sua vez, as intoxicaes podem ser causadas por alimentos quando as toxinas esto presentes no alimento ingerido, mesmo que os microrganismos que lhes deram origem tenham sido eliminados. Essas toxinas geralmente no possuem odor ou sabor, no sendo a sua presena nos alimentos detectvel organolepticamente. Alguns exemplos deste tipo de toxinas incluem a toxina produzida pelo Clostridium botulinum e a enterotoxina do Staphylococcus aureus (Forsythe, 2002). No caso das toxinfeces, a produo da toxina d-se aps a ingesto do alimento, quando este possui uma determinada quantidade de microrganismos patognicos capazes de produzir ou libertar toxinas quando ingeridos.4

I. INTRODUO

Entre os microrganismos que podem ocasionar este tipo de situaes inclui-se o Bacillus cereus e o Clostridium perfringens (Forsythe, 2002).

1.1.2. Gravidade das doenasAs doenas de origem alimentar englobam um grupo bastante alargado de enfermidades. O sintoma clnico mais frequente, a gastroenterite, pode ser atribudo a um grande nmero de microrganismos, incluindo bactrias, vrus e parasitas. Normalmente, o perodo de incubao curto, de 1-2 dias a uma semana, podendo ser observados diferentes nveis de gravidade, desde sintomas brandos (dor de estmago, nusea, vmitos, diarreia e febre), que no requerem auxlio mdico, at doenas mais graves implicando hospitalizao, incapacidade de longo termo e/ou morte (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). O resultado da exposio a patognios de origem alimentar depende de factores relacionados com o hospedeiro, incluindo: imunidade pr-existente, capacidade de resposta imunitria, estado nutricional, idade; e de outros factores especficos do alimento e do microrganismo (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). A diarreia constitui o sintoma mais comum aps o consumo de alimentos contaminados. No entanto, a incidncia, a gravidade e a letalidade da doena de origem alimentar muito superior em alguns segmentos da populao particularmente sensveis, incluindo crianas com idades inferiores a 5 anos, mulheres grvidas, imunodeprimidos e idosos (Forsythe, 2002). Nestes casos, podem surgir complicaes graves, incluindo manifestaes sistmicas para alm das intestinais, como a sndrome urmico-hemoltica (HUS) (falha renal e distrbios neurolgicos) para 10% das infeces por Escherichia coli O157:H7, a sndrome Guillain-Barr (degenerao dos nervos, recuperao lenta e incapacidade residual grave) aps infeco por Campylobacter jejuni, e a artrite reactiva aps salmonelose (Forsythe, 2002; Jouve, 2002). As manifestaes clnicas da listeriose incluem septicemia, infeces do sistema nervoso central e aborto em mulheres grvidas, com uma taxa de fatalidade global de 25% (Forsythe, 2002). Por sua vez, o botulismo resultante da toxina de Clostridium botulinum causa paralisia de msculos esquelticos e respiratrios, podendo causar a morte em 8% dos casos (Forsythe, 2002). Vrios autores estimaram que podem ocorrer sequelas crnicas em 2% a 3% de todas as doenas de origem alimentar (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002).

1.1.3. Registo de ocorrncias na Unio EuropeiaOs casos registados e notificados de doenas provocadas por alimentos constituem apenas uma pequena fraco de todas as ocorrncias que ocorrem efectivamente. A probabilidade de que um caso seja reconhecido e notificado pelas autoridades de sade5

I. INTRODUO

depende, de entre vrios factores, da participao dos consumidores, do registo por parte das autoridades mdicas e das aces desenvolvidas pelas entidades nacionais com responsabilidade de vigilncia sanitria (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). Com vista a assegurar a obteno das informaes necessrias para a avaliao das tendncias e origens pertinentes das doenas de origem alimentar na Unio Europeia (UE), a Directiva 2003/99/CE estabeleceu a obrigatoriedade de recolha, anlise e publicao dos surtos de origem alimentar em todos os Estados-Membros. Um surto surge aqui definido como a incidncia, observada sob determinadas circunstncias, de dois ou mais casos humanos da mesma doena e/ou infeco, ou numa situao na qual o nmero de casos observados excede o nmero esperado e em que os casos tenham, ou tenham provavelmente, a mesma fonte alimentar (EFSA, 2006d). No ltimo relatrio sobre doenas de origem alimentar, divulgado em 2006 pela Autoridade Europeia para a Segurana dos Alimentos (EFSA), foram reportados 5.311 surtos envolvendo um total de 47.251 pessoas, resultando em 5.330 hospitalizaes (11%) e 24 mortes (0,05%) em 24 Estados-Membros no ano de 2005 (EFSA, 2006d). Em Portugal foram notificados 3 surtos, afectando um total de 166 pessoas (ver Anexo I). O nmero global de surtos notificados diminuiu em 22% relativamente ao ano anterior, onde 20 Estados-Membros e a Noruega reportaram um total de 6.860 surtos. No entanto, o nmero total de casos humanos registados aumentou em 10% comparado com 2004. Este facto pode ser explicado pela maior eficcia da recolha de informaes, induzida pela obrigatoriedade de notificao de surtos de doenas alimentares veiculada pela Directiva 2003/99/CE (Forsythe, 2002; EFSA, 2006d). A taxa de notificao da UE em 2005 foi de 1,2 surtos patognicos por 100.000 habitantes, sendo que em Portugal foi registada a mais baixa (0,03). Contudo, este nmero no reflecte a incidncia real de casos humanos envolvidos em surtos, visto que a taxa muito dependente da sensibilidade e eficincia do sistema de notificao de cada Estado-Membro (EFSA, 2006d). Por conseguinte, este relatrio fornece apenas uma indicao da situao em Portugal, devido a uma assumida situao de subdeteco e sub-notificao de toxinfeces alimentares que ocorre no nosso pas (FAO/WHO, 2000; Novais, 2003). Relativamente aos agentes causadores de doenas de origem alimentar, como observado em anos anteriores na UE, o mais comum em 2005 foi a Salmonella spp., responsvel por 63,6% de todos os surtos relatados (EFSA, 2006d) (ver Anexo II). A Salmonella enteritidis foi associada com 19% dos surtos, correspondendo a 88% dos surtos ocorridos com Salmonella em que a espcie envolvida foi identificada. Os ovos e produtos derivados foram as fontes alimentares mais frequentemente associadas com os surtos de Salmonella spp., para alm dos produtos crneos e de padaria (EFSA, 2006d). A segunda causa mais comum de surtos em 2005 foi a Campylobacter spp. (9,2%), sendo a carne de frango a maior fonte de infeco. No entanto, a maioria dos casos6

I. INTRODUO

foram causados por gua contaminada (EFSA, 2006d). Outras causas importantes de surtos patognicos foram os vrus (6%), toxinas bacterianas (na globalidade dos surtos, de Staphylococcus spp. (3,1%), Clostridium spp. (1,5%) e Bacillus spp. (1,4%)), Escherichia coli patognicas (1,1%), Shigella (0,9%) e Giardia (0,3%) (ver Anexo II). As fontes alimentares de contaminao incluram gua, frutos, vegetais, carne, lacticnios, produtos de padaria e pastelaria, marisco, ovos e produtos derivados (EFSA, 2006d). Considerando a localizao dos surtos de origem alimentar, para os trs agentes causadores mais frequentes (Salmonella spp., Campylobacter spp. e vrus de origem alimentar), os locais de exposio identificados mais comuns foram as casas particulares (37%), restaurantes (4%), servios de catering e instituies (EFSA, 2006d). Perante a escassez da informao disponvel, no foi possvel determinar o peso real da restaurao nas doenas de origem alimentar na UE. Embora a contribuio da restaurao aparente ser reduzida, em 2005 verificou-se que os surtos de Salmonella spp. oriundos de restaurantes afectaram, em mdia, o qudruplo das pessoas comparativamente aos provenientes de casas particulares (EFSA, 2006d).

1.1.4. Registo de ocorrncias em PortugalAo contrrio de outros pases europeus, Portugal no possui ainda um sistema nacional de vigilncia e controlo de doenas de origem alimentar. Uma avaliao da situao epidemiolgica nacional, na ltima dcada, pode ser efectuada a partir dos dados disponveis nos relatrios dos programas de vigilncia e controlo de doenas de origem alimentar na Europa da Organizao Mundial de Sade (WHO) e da EFSA. Os dados estatsticos relativos ao perodo de 1997 a 2000 foram disponibilizados pelo 7 e 8 Relatrios da WHO (FAO/WHO, 2000; FAO/WHO, 2003). Os dados de 2001 a 2003 ainda no foram divulgados, estando disponveis dados mais recentes referentes a 2004 e 2005, reportados nos relatrios da EFSA (EFSA, 2005a; EFSA, 2006a). A tabela I-1 apresenta os dados relativos s notificaes de algumas doenas de origem alimentar em Portugal, em termos de nmero de surtos ocorridos e de nmero de pessoas afectadas no perodo 1997-2000 e em 2004-2005.

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I. INTRODUO

TABELA I-1. Ocorrncia de doenas de origem alimentar em Portugal em 1997-2000, 2004 e 2005. Ano 1997 1998 1999 2000 2004 2005 T o ta l N. de surtos 60 47 42 17 19 3 188 N. de casos isolados 12 24 5 3 44 Casos humanos N. de admisses hospitalares 134 602 33 35 61 26 891

N. 1.615 1.411 666 140 181 166 4 .1 7 9

Fontes: FAO/WHO, 2000; FAO/WHO, 2003; EFSA, 2005a; EFSA, 2006a.

A tabela I-2 apresenta os incidentes (surtos e casos isolados) de doenas de origem alimentar, por agente causador, notificados em Portugal no perodo de 1997-2000 e em 2004-2005. Constata-se que em cerca de 40% dos incidentes no foi possvel identificar o agente causador. Para os casos em que foi possvel efectuar esta identificao verificou-se que Salmonella enteritidis, Clostridium botulinum, Staphylococcus aureus, Campylobacter jejuni e Bacillus cereus so responsveis por sensivelmente metade das ocorrncias.TABELA I-2. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por agentes causadores, em 1997-2000, 2004 e 2005. Agente causador Salmonella enteritidis Clostridium botulinum Staphylococcus aureus Campylobacter jejuni Bacillus cereus Salmonella spp. Clostridium perfringens Yersinia enterocolitica Escherichia coli Microrganismos aerbios Agentes mltiplos Desconhecido T o ta l N. de incidentes por ano 1998 1999 2000 2004 5 17 9 3 1 1 6 29 71 12 4 1 7 1 4 2 1 10 42 4 4 2 1 2 3 1 17 7 4 3 1 1 1 2 19 Total N. % 42 29 22 9 8 7 7 2 2 1 13 82 224 18,8 12,9 9,8 4,0 3,6 3,1 3,1 0,9 0,9 0,4 5,8 36,6 100

1997 12 8 3 1 1 1 3 43 72

2005 2 1 3

Fontes: FAO/WHO, 2000; FAO/WHO, 2003; EFSA, 2005a; EFSA, 2006a.

A tabela I-3 apresenta os incidentes de doenas de origem alimentar, por alimento contaminado, notificados em Portugal. Constata-se que bolos, produtos de pastelaria e refeies mistas so responsveis por cerca de 28% das ocorrncias registadas. Presunto, produtos crneos, snacks e pescado so os outros grupos de alimentos com maior preponderncia de ocorrncias.

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I. INTRODUO

TABELA I-3. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por alimentos contaminados, em 19972000, 2004 e 2005. Alimento Bolos / Pastelaria / Pr-misturas Refeies mistas Presunto curado Carne / Aves Snacks Pescado / Marisco Queijo Ovos / Maionese Salsichas Fiambre Outros alimentos Desconhecido T o ta l N. de incidentes por ano 1998 1999 2000 2004 10 7 8 2 8 2 1 1 32 71 3 8 2 4 1 2 8 14 42 2 5 2 3 5 17 6 2 1 1 3 1 3 2 19 Total N. % 33 28 13 13 11 8 5 4 4 1 13 91 224 14,7 12,5 5,8 5,8 4,9 3,6 2,2 1,8 1,8 0,4 5,8 40,6 100

1997 12 6 3 3 1 4 2 1 2 38 72

2005 2 1 3

Fontes: FAO/WHO, 2000; FAO/WHO, 2003; EFSA, 2005a; EFSA, 2006a.

Em Portugal, nos anos de 1997-2000, 2004 e 2005, foram identificados 80% dos locais de consumo ou aquisio dos alimentos em surtos investigados. Os locais mais frequentes foram as casas particulares (19,2%), restaurantes (18,3%) e cantinas (16,5%), notados em 54% dos surtos (ver Tabela I-4). no entanto necessrio ter em considerao que estes nmeros no reflectem a frequncia de consumo em cada local, sendo que a taxa de ocorrncia de surtos associada a casas particulares seria substancialmente inferior s outras. Segundo os dados disponveis, no perodo de 1999-2000, os surtos ocorridos em restaurantes afectaram, em mdia, o triplo das pessoas relativamente aos associados a casas particulares (FAO/WHO, 2003). Este facto indicia o papel preponderante dos estabelecimentos de restaurao nos surtos de toxinfeces alimentares em Portugal, onde atingem as cerca de 30.000 unidades (Bolton e Maunsell, 2004).TABELA I-4. Incidentes de doenas de origem alimentar em Portugal, por local onde os alimentos foram consumidos ou adquiridos, no perodo de 1997-2000, 2004 e 2005. Local Casas particulares Restaurantes Cantinas Pastelarias Outros locais Desconhecido T o ta l N. de incidentes por ano 1998 1999 2000 2004 6 14 11 6 9 25 71 9 12 5 14 2 42 5 5 1 2 4 17 9 5 1 2 2 19 Total N. % 43 41 37 14 45 44 224 19,2 18,3 16,5 6,3 20,1 19,6 100

1997 13 5 18 6 17 13 72

2005 1 1 1 3

Fontes: FAO/WHO, 2000; FAO/WHO, 2003; EFSA, 2005a; EFSA, 2006a.

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I. INTRODUO

1.1.5. Causas da contaminao dos alimentosOs surtos patognicos de doenas de origem alimentar surgem devido a uma sequncia de eventos, diferindo de certa forma com cada agente etiolgico, mas comeando com a contaminao do alimento por um agente infeccioso ou toxignico (Forsythe, 2002). Aps a contaminao, devem existir condies de tempo e temperatura adequadas de que permitam o crescimento do organismo em grandes nmeros, ou a produo de toxina, o suficiente para produzir doena. Adicionalmente, se ocorrerem, os processamentos subsequentes no devem matar o organismo ou desnaturar a toxina (Forsythe, 2002). Por conseguinte, a ocorrncia de toxinfeces alimentares em unidades de restaurao tm sido relacionados com diversos factores relativos a ms prticas de fabrico e de higiene (Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004; Reij et al., 2004), entre os quais: matrias-primas contaminadas, armazenagens em frio e arrefecimentos imprprios, prticas incorrectas de descongelao, confeces inadequadas, alimentos preparados com muita antecedncia, armazenagem temperatura ambiente, distribuio demorada, limpeza deficiente de superfcies em contacto com os alimentos, higiene pessoal insuficiente, contaminao cruzada, processamento ou armazenamento em instalaes inadequadas, equipamento contaminado, contaminao atravs dos manipuladores. No entanto, a contaminao dos alimentos por perigos microbiolgicos induzida por estes factores de insegurana alimentar na restaurao pode ser prevenida, reduzida e/ou eliminada atravs da implementao de prticas de segurana alimentar eficazes (Bolton e Maunsell, 2004).

10

I. INTRODUO

2. FERRAMENTAS DE GESTO DA SEGURANA ALIMENTAROs factores de segurana alimentar precisam de ser aplicados em toda a cadeia alimentar, da produo do alimento at ao consumidor. Para isso necessria a integrao de algumas ferramentas da qualidade (Forsythe, 2002), que sero apresentadas a seguir: Boas Prticas de Fabrico (BPF), Boas Prticas de Higiene (BPH), Anlise de Perigos e Pontos de Controlo Crticos (HACCP), Avaliao do Risco Microbiolgico (ARM).

2.1. Boas Prticas de Fabrico e Boas Prticas de HigieneA aplicao das Boas Prticas de Fabrico (BPF) e das Boas Prticas de Higiene (BPH), aliadas aos testes microbiolgicos do produto final, constituiu um dos primeiros sistemas de garantia de qualidade desenvolvido pela indstria alimentar (Notermans et al., 2002). As BPF abordam os princpios, os procedimentos e os meios fundamentais necessrios para providenciar um ambiente adequado para a produo de alimentos com qualidade aceitvel. J as BPH descrevem as medidas bsicas de higiene que os estabelecimentos devem manter, constituindo os pr-requisitos para outros sistemas, em particular o HACCP (Jouve et al., 1998). As BPF/BPH foram desenvolvidas por governos, pelo comit de higiene de alimentos do Codex Alimentarius (FAO/WHO) e por indstrias alimentares, muitas vezes em colaborao com outros grupos de inspeco e controlo (Jouve et al., 1998), sendo o resultado de uma longa experincia prtica. Para o sector de restaurao e bebidas, foi elaborado em 2002 o Cdigo de Boas Prticas para a Restaurao Pblica em Portugal, aprovado pela extinta Direco-Geral de Fiscalizao e Controlo da Qualidade Alimentar. O estabelecimento das BPF/BPH inclui vrios requisitos, entre os quais (Jouve et al., 1998; Notermans et al., 2002): configurao e construo higinica de instalaes de produo de alimentos, configurao, construo higinica e utilizao adequada de equipamentos, procedimentos de limpeza e desinfeco (incluindo o controlo de pragas), prticas gerais de higiene e segurana alimentar no processamento, incluindo: - qualidade microbiolgica das matrias-primas, - operao higinica de cada etapa do processo, - higiene do pessoal e sua formao em higiene e segurana alimentar. As BPF/BPH devem ser sempre aplicadas e documentadas, visto constiturem a base para a produo higinica de alimentos. No entanto, o conceito das BPF/BPH muito11

I. INTRODUO

subjectivo e qualitativo nos seus benefcios, no tendo relao directa com o estado de segurana do produto. Por estas razes, o conceito foi alargado pela introduo do sistema HACCP, que procura, entre outras coisas, evitar o apoio em testes finais como meio de controlo (Jouve et al., 1998; Notermans et al., 2002). Tradicionalmente, a segurana do alimento era verificada por meio de anlises do produto final para a presena de patognios e suas toxinas. Contudo, este controlo reactivo no garantia a segurana alimentar, alm de ser dispendioso em termos de tempo e custos (verTabela I-5). TABELA I-5. Caractersticas e limitaes do controlo de segurana alimentar tradicional. Controlo tradicional Inspeco do produto final ou em etapas consideradas crticas Anlises pontuais Controlo irregular Limitaes Quantidade significativa de produtos necessria para obteno de amostras representativas Segurana microbiolgica assegurada apenas nas amostras testadas Controlo dos perigos reactivo (correctivo)

2.2. Anlise de Perigos e Pontos de Controlo Crticos (HACCP)O sistema HACCP foi originalmente desenvolvido pela Pilsbury Company, em colaborao com a NASA e os laboratrios do Exrcito dos EUA, para assegurar a segurana microbiolgica dos alimentos fornecidos ao programa espacial. Nessa altura, na dcada de 60, foram reconhecidas as limitaes no controlo baseado em testes microbiolgicos do produto final, sendo ento necessria uma abordagem preventiva na produo de alimentos seguros. Um sistema de engenharia conhecido como Failure, Mode and Effect Analysis (FMEA) foi utilizado como base para este conceito. No sistema FMEA, eram identificadas as falhas potenciais em cada etapa de uma operao, sendo accionados mecanismos para prevenir a ocorrncia destas (Notermans et al., 2002; Gaze et al., 2002). O sistema HACCP foi ento criado como uma abordagem estruturada para garantir a segurana de produtos alimentares especficos e dos seus processos associados. Este sistema envolve: identificao de perigos potenciais e previsveis, tais como agentes patognicos, e das condies que levam sua presena e proliferao, identificao de requisitos especficos para o seu controlo, medidas para a medio e avaliao contnua da eficcia do sistema. Assim, as etapas consideradas como crticas para o controlo dos perigos para a segurana alimentar so geridas atravs da monitorizao de limites crticos das medidas de controlo. No caso de ocorrer um desvio de um limite crtico deve ser accionado um plano de aces correctivas predeterminado (Notermans et al., 2002; Gaze et al., 2002).12

I. INTRODUO

O HACCP foi inicialmente utilizado para assegurar a segurana microbiolgica, tendo sido posteriormente aplicado a perigos fsicos e qumicos. Nas ltimas dcadas, o HACCP foi reconhecido internacionalmente como o sistema preferencial de gesto da segurana alimentar na indstria alimentar. Os sistemas HACCP, ou sistemas baseados em princpios do HACCP, foram tornados obrigatrios por legislao na UE, EUA e Canad (Notermans et al., 2002; Gaze et al., 2002). A obrigatoriedade de todos os operadores da cadeia alimentar, incluindo as pequenas unidades de restaurao, de implementarem sistemas de autocontrolo, baseados nos princpios do HACCP, consta do Regulamento (CE) n. 852/2004 relativo higiene dos gneros alimentcios, aplicvel a partir de 1 de Janeiro de 2006. Foram criados guias internacionais abrangendo o desenvolvimento, implementao e manuteno do HACCP pela Codex Alimentarius Commission (CAC) e National Advisory Committee on Microbiological Criteria for Food (NACMCF), estando os seus princpios bsicos e terminologia em concordncia (Notermans et al., 2002; CAC, 2003). Ambos identificaram sete princpios-chave: Princpio 1: efectuar uma anlise dos perigos, Princpio 2: determinar os pontos de controlo crticos (PCC), Princpio 3: estabelecer limites crticos de controlo, Princpio 4: estabelecer um sistema para monitorizao do controlo dos PCC, Princpio 5: estabelecer a aco correctiva a efectuar quando a monitorizao indica que um PCC em particular est fora de controlo, Princpio 6: estabelecer procedimentos de verificao para confirmar que o sistema HACCP funciona eficazmente, Princpio 7: estabelecer documentao relativa a todos os procedimentos e registos apropriados para os princpios enunciados. Contudo, antes da implementao do HACCP, os princpios gerais de higiene e as boas prticas devem estar operacionais de forma a constituir uma base slida para a aplicao eficaz do HACCP. Estas medidas, estabelecidas pelo denominado programa de pr-requisitos, devem controlar os perigos associados com a envolvente do estabelecimento de restaurao (Notermans et al., 2002; Bolton e Maunsell, 2004), nomeadamente: instalaes e equipamentos, higiene e sade do pessoal, manipulao segura, controlo de resduos, limpeza e desinfeco, qualidade da gua, manuteno da cadeia de frio,13

I. INTRODUO

controlo de pragas, controlo de fornecedores, controlo recepo, formao.

PERIGOS PARA A SEGURANA ALIMENTAR Associados com a envolvente da unidade de restaurao Associados com etapas do processo Avaliao do risco No significativo Significativo Pr-requisitos HACCP HACCP

FIGURA I-1. Diferenciao de perigos no significativos e significativos, e deciso sobre o respectivo controlo, atravs de pr-requisitos ou do plano HACCP. (Adaptado de Bolton e Maunsell, 2004).

Desta forma, o sistema HACCP centra-se nos perigos associados directamente com as etapas de produo de alimentos que se revelem crticas para a segurana (ver FiguraI-1.). Para etapas do processo que no foram reconhecidas como pontos de controlo

crticos, a aplicao dos pr-requisitos garante que todos os outros aspectos relacionados com a segurana alimentar so controlados (Notermans et al., 2002; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1. Metodologia de implementao do HACCPOs guias da CAC e da NACMCF tambm fornecem orientaes para a aplicao do sistema HACCP, atravs de uma sequncia de actividades para a aplicao dos sete princpios. As 12 etapas preconizadas pela CAC so descritas a seguir (Notermans et al., 2002; CAC, 2003).

2.2.1.1. Etapa 1: reunir uma equipa HACCPA equipa HACCP deve ser multidisciplinar, incluindo todos aqueles que possuem conhecimentos apropriados e a experincia especfica do produto e nos processos utilizados. Nos estabelecimentos de restaurao a equipa deve incluir o chefe de cozinha, gerncia, pessoal de apoio, e se necessrio, um consultor de segurana alimentar (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1.2. Etapa 2: descrever o produtoA equipa HACCP dever reunir informao relativa aos produtos finais, incluindo informaes de segurana relevantes como a composio, caractersticas fsicas ou qumicas, processamento, conservao e acondicionamento, condies de armazenagem, mtodo de distribuio e durabilidade. Apesar do elevado nmero de produtos finais que podero ser servidos num restaurante ou noutro estabelecimento do sector alimentar, esta informao dever ser adquirida atravs dos fornecedores (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).14

I. INTRODUO

2.2.1.3. Etapa 3: identificar o uso pretendidoA equipa deve ter uma compreenso clara da utilizao pretendida do produto pelo consumidor. Esta informao tambm deve considerar o tipo de consumidores esperado para o produto, incluindo os grupos mais vulnerveis da populao, como crianas e idosos (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1.4. Etapa 4: elaborar fluxogramas do processoNesta etapa, deve ser reunida a informao relativa ao produto ou processos em estudo. Se possvel, a equipa HACCP dever elaborar fluxogramas detalhados para os diferentes processos com uma descrio clara, exacta e sequencial de todos os passos operacionais. Num restaurante, esta exigncia implica um fluxograma diferente para cada tipo de produto final preparado. Em alternativa, poder ser aplicado um fluxograma sumrio, caso contemple todos os processos existentes no estabelecimento de restaurao (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1.5. Etapa 5: verificar o fluxograma no localO fluxograma preparado deve ser confirmado para assegurar a sua exactido, incluindo a confirmao de algumas variaes nos procedimentos. Deve ser corrigido quando se identificam desvios, ou se o processo se modificar ao longo do tempo (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1.6. Etapa 6: identificar os perigos potenciais associados com cada etapa, efectuar uma anlise de riscos e determinar as medidas de controlo dos perigos identificados (Princpio 1)Nesta etapa, devem ser identificados os perigos, ou seja, agentes biolgicos, qumicos ou fsicos que podem estar presentes num alimento, com o potencial de causar um efeito adverso sade do consumidor (Forsythe, 2002) (ver Tabela I-6). Aps o levantamento dos potenciais perigos com possibilidade de vir a ocorrer numa cozinha de restaurao, devem identificar-se as suas fontes. Para alm disso, qualquer etapa que possa contribuir para o aumento da contaminao ou da contaminao cruzada, dever igualmente informao literatura ser identificada. com A os relacionada cientfica,TABELA I-6. Perigos associados a alimentos. Biolgico Qumico FsicoMacrobiolgico Microbiolgico Bactrias patognicas formadores de esporos no-esporulados Parasitas e protozorios Vrus Micotoxinas(Adaptado de Forsythe, 2002).

perigos pode ser encontrada em guias regulamentares, cdigos de boas prticas, reclamaes dos clientes, e em auditorias internas (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

Antibiticos Hormonas leos alimentares Pesticidas Fluidos de limpeza Metais txicos Aditivos alimentares Tintas de impresso

Vidro Metal Pedras Madeira Plstico Ossos Caroos de frutas Objectos pessoais

Aps a identificao dos potenciais perigos e as suas fontes, a equipa HACCP deve determinar quais so os perigos significativos em termos de graus de risco. A realizao15

I. INTRODUO

da anlise de perigos deve ter em considerao a severidade e a probabilidade de ocorrncia dos perigos no sentido de, numa primeira anlise, determinar aqueles que so significativos. Actualmente, muitos dos julgamentos efectuados na anlise de perigos so baseados em dados qualitativos (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). A equipa HACCP deve depois estabelecer medidas de controlo apropriadas para prevenir, eliminar ou reduzir os perigos significativos identificados para nveis aceitveis. Pode ser necessria mais do que uma medida para controlar um perigo especfico, embora nalguns casos uma medida de controlo pode controlar vrios perigos. Por sua vez, muitos perigos fsicos e qumicos na restaurao podem efectivamente ser controlados como parte do programa de pr-requisitos (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.1.7. Etapa 7: determinar os pontos de controlo crticos (Princpio 2)Um ponto de controlo crtico (PCC) constitui uma etapa, passo ou procedimento do processo de fabrico do alimento, onde se pode exercer controlo com o objectivo de prevenir, eliminar ou reduzir um perigo significativo para nveis aceitveis (CAC, 2003). Frequentemente pode ser utilizada uma rvore de deciso para determinar se uma dada etapa adequada para controlar perigos significativos (ver Figura I-2) (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). No existe um nmero limite de PCC que podem ser identificados num processo. De facto, diferentes restaurantes que confeccionem o mesmo produto podem ter etapas diferentes do processo consideradas como PCC, e um nmero total de PCC diferente (Notermans et al., 2002).1. Existem medidas preventivas nesta etapa ou em etapas subsequentes para o perigo identificado?SIMN O

Modificar a etapa, processo ou produtoSIM

2. Esta etapa especificamente designada para eliminar ou reduzir a probabilidade de ocorrncia deste perigo a um nvel aceitvel?SIM NO

O controlo nesta etapa necessrio para a segurana alimentar?NO

3. A contaminao com o perigo identificado poder atingir nveis inaceitveis?SIM

NO

4. Existem etapas subsequentes que eliminam o perigo identificado ou reduzam a probabilidade de ocorrncia a um nvel aceitvel?NO

Ponto de Controlo Crtico (PCC)

PARAR No um PCC

FIGURA I-2. rvore de deciso utilizada para determinar quando uma etapa, ponto ou procedimento particular no processo ou preparao dos alimentos, deve ser considerada ponto de controlo crtico. (Adaptado de Forsythe, 2002).

16

SIM

I. INTRODUO

2.2.1.8. Etapa 8: estabelecer limites crticos para cada PCC (Princpio 3)Os limites crticos consistem em caractersticas de natureza fsica, qumica ou biolgica que devem ser respeitadas para garantir que o controlo atingido, separando o aceitvel do inaceitvel no PCC (CAC, 2003). Os limites crticos devem ser especificados e validados para cada PCC, com base na experincia, regulamentos, pesquisas bibliogrficas ou dados microbiolgicos. Devem consistir em nveis definidos, que possam ser fcil e rapidamente medidos ou observados durante a monitorizao. Critrios muito utilizados incluem medies de temperatura, tempo, pH e parmetros sensoriais como a aparncia visual e textura (CAC, 2003).

2.2.1.9. Etapa 9: estabelecer um sistema de monitorizao (Princpio 4)A monitorizao consiste numa sequncia planeada de verificaes, tanto por observao ou medio. Constitui uma parte importante do sistema HACCP visto estabelecer se os limites crticos esto a ser cumpridos e se os PCC esto sob controlo. Os procedimentos devem detectar a perda de controlo ou uma tendncia de perda de controlo. A frequncia de monitorizao deve ser suficiente para permitir que uma aco correctiva recupere o controlo do processo. A responsabilidade da monitorizao deve ser claramente definida (Gaze et al., 2002; CAC, 2003).

2.2.1.10. Etapa 10: estabelecer medidas correctivas (Princpio 5)As medidas aplicadas em resposta a desvios nos limites crticos so referidas como aces correctivas e devem ser definidas em cada PCC. O plano de aces correctivas deve estipular claramente como proceder quando ocorrem desvios, para recuperar o controlo do PCC. O plano deve incluir a identificao e correco do problema, o tratamento e destino do produto afectado, a necessidade de registo do incidente e as aces efectuadas, a necessidade de investigar as causas do desvio e os passos necessrios para prevenir a sua recorrncia (Gaze et al., 2002; CAC, 2003).

2.2.1.11. Etapa 11: estabelecer procedimentos de verificao (Princpio 6)Os procedimentos de verificao averiguam se o sistema HACCP funciona eficazmente e est a ser cumprido. As orientaes expressas no Codex identificam trs elementos na verificao: auditorias, reviso e validao (CAC, 2003). A validao deve ser uma parte essencial do HACCP e deve ser executada antes da implementao do sistema. A validao envolve a confirmao de vrias situaes, entre as quais: os perigos foram correctamente identificados e podem ser realmente controlados,

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I. INTRODUO

os PCC foram correctamente determinados e os limites crticos controlam adequadamente os perigos para um nvel seguro, os procedimentos de monitorizao definidos permitem efectivamente monitorizar os limites crticos, as aces correctivas evitam que os alimentos inseguros cheguem ao consumidor, segundo procedimentos correctamente implementados (Mayes, 1999; Gaze et al., 2002; CAC, 2003). Por outro lado, a verificao s pode ser executada num sistema implementado, consistindo na recolha sistemtica de informao para averiguar o nvel de cumprimento e implementao do HACCP. Adicionalmente, devem ser efectuadas revises peridicas para estabelecer se houve modificaes na operao ou factores externos que impliquem uma actualizao do plano HACCP (Mayes, 1999; Gaze et al., 2002; CAC, 2003).

2.2.1.12. Etapa 12. Estabelecer um sistema de registos e documentao do HACCP (Princpio 7)Todos os elementos j abordados devem ser compilados num documento formal designado por plano HACCP, preparado de acordo com os princpios do HACCP para assegurar o controlo dos perigos significativos para a segurana alimentar. A anlise de perigos, determinao de PCC e determinao de limites crticos constituem exemplos de documentao. Por sua vez, os registos incluem actividades de monitorizao de PCC, desvios e aces correctivas associadas, procedimentos de verificao efectuados e modificaes do plano HACCP. A documentao e os registos devem ser apropriados para a natureza e tamanho da unidade de restaurao (CAC, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

2.2.2. Perigos microbiolgicos e potenciais pontos crticos de controlo na restaurao 2.2.2.1. Perigos microbiolgicosConsiderando os trs tipos de perigos, o biolgico o que representa maior risco para a segurana dos alimentos (Jouve et al., 1998; Jouve, 2002). Nesta categoria de perigo inclui-se as bactrias, fungos, vrus e parasitas patognicos e toxinas microbianas. Estes organismos esto frequentemente associados manipulao dos alimentos por parte dos operadores, e aos produtos crus contaminados utilizados como matrias-primas nas unidades de restaurao. Muitos desses microrganismos tambm ocorrem naturalmente no ambiente (ar, gua, equipamentos) onde os alimentos so produzidos (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

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I. INTRODUO

De entre os vrios tipos de microrganismos, as bactrias patognicas so as responsveis por uma grande proporo (aproximadamente 90%) das doenas de origem alimentar (Jouve, 2002). Vrios patognios, incluindo Campylobacter jejuni, Escherichia coli, Listeria monocytogenes, Salmonella spp., Staphylococcus aureus e Yersinia enterocolitica, esto presentes no ambiente das cozinhas de restaurao e tm sido detectadas em alimentos prontos a comer. O Clostridium perfringens e o Bacillus cereus merecem igualmente referncia, pelo facto de ambos poderem causar problemas graves, caso os alimentos sejam mantidos a temperaturas incorrectas aps a confeco (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (a) Campylobacter jejuni A Campylobacter jejuni, um bastonete Gram-negativo microaerfilo, reconhecida como a principal causa de gastroenterite no mundo desenvolvido (Forsythe, 2002). Vrias espcies de animais so portadoras assintomticas de C. jejuni, entre as quais aves domsticas, gado, sunos, ovinos, roedores e pssaros. As vias de infeco passam pela gua, leite e carne contaminadas. O frango constitui a maior fonte potencial de Campylobacter infecciosos (Forsythe, 2002). Consequentemente, a maioria dos casos oriunda de preparaes com higiene deficiente ou do consumo de produtos de aves (Maunsell, 2003). (b) Escherichia coli patognicas A Escherichia coli uma bactria Gram-negativa que faz parte da microflora anaerbica facultativa do tracto intestinal de humanos e animais de sangue quente. A maioria das estirpes inofensiva, no entanto existem algumas linhagens patognicas (Forsythe, 2002). Surtos associados com o catering tem envolvido centenas de pessoas (Maunsell, 2003). Os animais podem transportar estirpes patognicas no seu tracto intestinal, levando a um risco de contaminao da carne durante o abate e processamento subsequente (Forsythe, 2002). A transmisso para humanos ocorre principalmente por meio de consumo de alimentos contaminados, tais como carnes cruas ou pouco cozidas e leite cru (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). No entanto, sumo de ma, iogurte, queijo e vegetais tambm tm sido implicados. A contaminao fecal da gua e outros alimentos, bem como a contaminao cruzada durante a preparao dos alimentos pode ser responsvel pela infeco. A transmisso pelo contacto directo entre as pessoas tambm tem sido relatada (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (c) Listeria monocytogenes Sendo uma bactria Gram-positiva ubiquitria, a L. monocytogenes foi encontrada em vrios ambientes: solo, vegetao, animais, humanos, gua e esgotos. Particularmente resistente a stresses ambientais, a Listeria monocytogenes pode sobreviver a muitos mtodos de preservao de alimentos (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). Pode crescer a19

I. INTRODUO

temperaturas to baixas como 3C, permitindo a multiplicao em ambientes refrigerados. J foi encontrada numa variedade de alimentos, tanto crus como processados, incluindo leite cru e produtos derivados (queijo mole e gelado), carne (includo avcola) e produtos derivados, vegetais e pescado. Vrios alimentos prontos a comer tm sido implicados em casos de listeriose (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (d) Salmonella spp. Muitos animais e pssaros so portadores saudveis de Salmonella spp., bactrias anaerbias facultativas Gram-negativas, no seu tracto intestinal e fezes (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). A S. enteritidis e S. typhimurium constituem as estirpes mais frequentemente envolvidas em intoxicaes alimentares (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; EFSA, 2006b). A salmonelose foi associada a diversos alimentos contaminados, incluindo carne bovina, aves domsticas, ovos, leite e derivados, pescado, marisco, molhos e temperos para saladas, misturas para bolos, sobremesas, gelatina, cacau e chocolates (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; EFSA, 2006b). A contaminao do alimento ocorre devido ao controlo inadequado da temperatura, ms prticas de manipulao ou contaminao cruzada de alimentos crus com processados (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (e) Staphylococcus aureus Os estafilococos so bactrias Gram-positivas que existem no ar, poeira, esgotos, gua, animais, humanos, nos equipamentos de processamento de alimentos e nas superfcies expostas ao ambiente (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; EFSA, 2006b). Aproximadamente 45% do pblico em geral portador assintomtico de Staphylococcus aureus na sua pele e/ou cavidade nasal (Maunsell, 2003). Os manipuladores de alimentos constituem normalmente a principal fonte de contaminao dos alimentos. Os alimentos geralmente relacionados com as intoxicaes incluem carnes e produtos de carne, frango e produtos de ovos, saladas, produtos de panificao, sanduches e leite e produtos derivados (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; EFSA, 2006b). A gastroenterite estafiloccica causada por enterotoxinas produzidas por algumas estirpes de S. aureus. O microrganismo tolerante a altas concentraes de sal mas rapidamente inactivado pelo calor. No entanto, a enterotoxina muito termoestvel e resistente cozedura e a enzimas proteolticas, podendo persistir no alimento mesmo que o microrganismo j no se encontre presente (Forsythe, 2002). Os alimentos sujeitos a uma manipulao considervel durante a preparao e mantidos a temperaturas ligeiramente elevadas esto frequentemente envolvidos em intoxicaes estafiloccicas (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (f) Yersinia enterocolitica A Yersinia enterocolitica, bactria Gram-negativa anaerbia facultativa, est presente em todo o ambiente, podendo ser encontrada em carnes (suna, bovina, ovina), ostras,20

I. INTRODUO

peixe e leite cru (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; EFSA, 2006d). No entanto particularmente associada com carne de porco crua e pouco cozinhada. Isto pode resultar em contaminao da carne durante o abate e processamento e subsequente contaminao cruzada de outros alimentos (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). Uma caracterstica de Y. enterocolitica a sua capacidade de sobreviver e crescer, embora a uma taxa reduzida, a temperaturas de refrigerao (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004). (g) Clostridium perfringens O Clostridium perfringens encontra-se amplamente distribudo no ambiente, sendo frequentemente encontrado no intestino de humanos e animais (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). Sendo uma bactria Gram-positiva anaerbia formadora de esporos, pode persistir no solo, em sedimentos e em reas sujeitas contaminao fecal de humanos e animais. As clulas vegetativas de C. perfringens so destrudas pelo congelamento, refrigerao e cozimento mas os esporos podem sobreviver (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). Na maioria das vezes, a causa de intoxicao por C. perfringens o abuso de temperatura de alimentos preparados, sendo a carne e produtos derivados os alimentos mais frequentemente implicados. Alguns microrganismos podem persistir sob a forma de esporos aps o cozimento. O processo de cozedura retira o oxignio, criando dessa forma condies anaerbias favorveis para o crescimento dos clostrdios. Os esporos germinam e as clulas vegetativas multiplicam-se at nveis perigosos durante os perodos de arrefecimento e armazenamento. Aps a ingesto do alimento contaminado, a diarreia aguda de C. perfringens deve-se produo de uma enterotoxina no intestino (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004; Santos et al., 2005). (h) Bacillus cereus O Bacillus cereus um patognio alimentar Gram-positivo aerbio (embora cresa bem anaerobicamente) formador de esporos encontrado por toda a natureza, sendo isolado do solo, da vegetao e dos plos de animais (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003). Embora presente em nveis muito reduzidos nos alimentos, ocorrem intoxicaes quando o alimento sujeito a abusos de temperatura, permitindo a multiplicao at nveis significativos. Uma grande variedade de alimentos, incluindo carnes, leites, vegetais e pescado assim como produtos de arroz, batatas, massas, queijo, pudins, saladas foram implicados em intoxicaes por B. cereus (Forsythe, 2002; Notermans et al., 2002; Bolton e Maunsell, 2004). O estabelecimento de uma classificao de perigo quanto sua severidade constitui um passo importante no estabelecimento de um sistema HACCP (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). A gravidade das doenas causadas pelos organismos pode ser21

I. INTRODUO

determinada a partir da literatura, especialmente nos livros da International Commission on Microbiological Specifications for Foods (ICMSF) (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). A severidade de diferentes perigos microbiolgicos descrita na tabela I-7.TABELA I-7. Categorizao da severidade de perigos microbiolgicos. Efeitos dos perigos 1. Moderado, sem risco de vida, sem sequelas, normalmente de curta durao e autolimitantes 2. Srio, incapacitante, mas sem riscos de vida, com sequelas raras e de durao limitada 3A. Grave, risco de vida para a populao em geral, sequelas crnicas, longa durao 3B. Grave, risco de vida para populaes restritas, sequelas crnicas, longa durao(Adaptado de Jouve, 2002).

Patognios Bacillus cereus Clostridium perfringens Staphylococcus aureus Vibrio parahaemolyticus Salmonella spp. (excluindo typhi) Yersinia enterocolitica Shigella spp. (excluindo dysenteriae I) Listeria monocytogenes Clostridium botulinum Vibrio cholera O1 Salmonella typhi Escherichia coli enterohemorrgica Campylobacter jejuni Escherichia coli enteropatognica Listeria monocytogenes

A ocorrncia provvel de patognios alimentares nos alimentos tambm pode ser determinada a partir de dados do ICMSF e literatura relacionada (Forsythe, 2002). Para prever quais so os microrganismos de interesse em alimentos ou processos especficos, igualmente se podem considerar os diversos factores que determinam a sua sobrevivncia e crescimento (Forsythe, 2002). Entre estes incluem-se: i) factores intrnsecos aos alimentos, tais como a actividade da gua (aw), o pH, o potencial de oxidao-reduo, a composio qumica e a presena de substncias anti-microbianas naturais; ii) factores extrnsecos aos alimentos, tais como a temperatura, a humidade relativa e a composio da atmosfera em contacto com o produto; e iii) factores do processo de fabrico (Forsythe, 2002) (ver Tabela I-8).TABELA I-8. Principais condies para a ocorrncia de alguns dos perigos microbiolgicos na restaurao. Perigos Bacillus cereus Campylobacter jejuni Clostridium perfringens Escherichia coli Listeria monocytogenes Salmonella spp. Staphylococcus aureus crescimento toxina Yersinia enterocolitica Limites de crescimento pHmin pHmx4,9 4,9 5,5 4,4 4,39 4,39 4,0 4,5 4,2 8,8 9,0 9,0 9,0 9,4 9,4 10 9,6 9,6

Tmin (C)5 32 12 7 0 5 7 10 -1

Tmx (C)55 45 50 46 45 47 48 46 42

aWmin0,93 0,98 0,943 0,95 0,92 0,92 0,83 0,88 0,97

NaClmx (%)10 2 7 6,5 10 10 20 10 7

Fontes: ICMSF, 1980; FDA/CFSAN, 1992; Forsythe, 2002.

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I. INTRODUO

Existem tambm dados relativos dose infecciosa, ou seja, ao nmero mnimo de microrganismos patognicos necessrio para causar doena (Forsythe, 2002). No entanto, dada a variabilidade e alguma inconsistncia nos valores existentes na literatura, a dose infecciosa deve ser usada apenas para propsitos indicativos (Forsythe, 2002). Para alm disso, a susceptibilidade do consumidor varia de acordo com o seu sistema imunitrio, idade e estado de sade geral (Forsythe, 2002). A tabela I-9 apresenta, para alguns microrganismos patognicos, valores encontrados na literatura relativos a doses infecciosas susceptveis de causar doena em adultos saudveis.TABELA I-9. Valores de doses mnimas de alguns microrganismos patognicos consideradas como causadoras de doena. Microrganismo patognicoINFECCIOSOS Salmonella spp. Campylobacter spp. Listeria monocytogenes Escherichia coli Yersinia enterocolitica TOXI-INFECCIOSOS Bacillus cereus Clostridium perfringens CAUSADORES DE INTOXICAO Staphylococcus aureus

Dose mnima (ufc)1 1-10 > 103 > 106 > 107 > 106 > 106 > 106/ga

Fontes: FDA/CSAN, 1992; Forsythe, 2002.; Notermans, 2002. aContvel vivel capaz de produzir toxina suficiente para causar resposta fisiolgica.

2.2.2.2. Potenciais pontos de controlo crticosNa restaurao, os produtos com maior nvel de risco para os consumidores so aqueles prontos a comer ou capazes de suportar o crescimento de patognios. Vrios so destrudos por via de tratamentos trmicos, e muitos podem ser controlados por prticas adequadas de manipulao e armazenamento, boas prticas de higiene e de fabrico e controlo do tempo e temperatura dos processos. O armazenamento ou a manipulao incorrecta desses alimentos contribuem para a propagao de microrganismos, aumentando o risco de se obter um alimento perigoso caso ocorra alguma falha no processo (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). Por conseguinte, os pontos crticos a controlar na restaurao so, sobretudo, as etapas ou procedimentos em que os alimentos so manipulados ou armazenados aps a cozedura, como sejam as operaes de manipulao de alimentos j confeccionados, a manuteno a quente, os arrefecimentos e os reaquecimentos. Deste modo, as medidas de vigilncia assentam, fundamentalmente, na inspeco visual e no controlo da temperatura (Novais et al., 2004). Potenciais pontos de controlo crtico so descritos a seguir. (a) Armazenagem em refrigerao Os produtos alimentares perecveis, como carnes, pescado, lacticnios e alimentos confeccionados, que no so para consumo imediato, devero ser armazenados a temperaturas inferiores a 5C, em frigorficos, cmaras frigorficas ou outro equipamento de frio. Esta etapa constitui um limite crtico de controlo, visto que patognios como Salmonella spp., Escherichia coli, Campylobacter spp., Clostridium perfringens e Bacillus cereus no crescem a este nvel de temperaturas baixas (Forsythe, 2002; Maunsell,23

I. INTRODUO

2003; Bolton e Maunsell, 2004). No entanto, bactrias como a Listeria monocytogenes e Yersinia enterocolitica tm temperaturas de crescimento mnimas de prximas dos 0C, pelo que o tempo de armazenamento deve ser limitado para alimentos que no sofrem tratamento trmico posterior (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). (b) Armazenagem em Congelao Os alimentos perecveis devem igualmente ser mantidos a temperaturas inferiores a -12C. A congelao e a armazenagem em congeladores podem ser consideradas um PCC, pois tambm evitam o desenvolvimento, multiplicao e produo de toxinas por contaminantes bacteriolgicos (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). (c) Descongelao Os alimentos congelados devem ser descongelados em equipamentos de frio, ou se necessrio, utilizando programas de descongelao em equipamentos micro-ondas. A descongelao nunca dever ser realizada temperatura ambiente, evitando que bactrias patognicas se desenvolvam, multipliquem e produzam de toxinas na superfcie dos alimentos. Para alm disso, deve-se garantir a descongelao total do interior dos alimentos, para que, nas operaes culinrias seguintes, recebam o aquecimento adequado destruio de patognios perigosos. Os alimentos descongelados devem ser subsequentemente confeccionados ou consumidos num perodo mximo de 24 horas (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). (d) Confeco A confeco constitui o principal mtodo seguro para garantir a segurana dos alimentos na restaurao. A etapa de cozedura um PCC bvio para o qual os limites crticos de temperatura e de tempo podem ser estipulados, monitorizados e corrigidos (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). A literatura cientfica sugere que se devem confeccionar os alimentos de modo a que atinjam no seu centro trmico (interior) 70C durante 2 minutos, ou que atinjam pelo menos 75C, condies que so suficientes para que sejam eliminadas bactrias como a Salmonella spp., Campylobacter spp., L. monocytogenes e Y. enterocolitica, StaphylococcusTABELA I-10. Regimes de tempo e temperatura da cozedura. Temperatura60C 65C 70C 75C 80CFonte: Forsythe, 2002.

Tempo45 min 10 min 2 min 30 seg 6 seg

aureus, assim como as clulas vegetativas de Bacillus spp. e Clostridium spp. (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). Uma lista de equivalncias de tempo e temperatura fornecida na tabela I-10. No entanto, temperaturas inferiores de confeco so admissveis para pratos gourmet (Bolton e Maunsell, 2004). Contudo, as combinaes tempo-temperatura utilizadas devero ser validadas, para garantir a destruio das bactrias patognicas. Normalmente esses pratos devero ser consumidos num perodo mximo de 30 minutos aps confeco, a no ser que sejam mantidos a temperaturas superiores a 63C (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004).24

I. INTRODUO

(e) Arrefecimento Os alimentos cozinhados devero ser arrefecidos rapidamente, utilizando equipamento de arrefecimento rpido. Na ausncia deste, os alimentos cozinhados devero ser guardados em equipamento de frio, dentro de 90 minutos, aps a confeco. Os equipamentos de arrefecimento ou congelao devero ser capazes de reduzir a temperatura no centro trmico (interior) dos alimentos para 10C, num perodo de 2 h 30 min. A incapacidade de atingir essa temperatura no perodo indicado, possibilitar que bactrias como Salmonella spp. e Staphylococcus aureus se multipliquem, e, no caso da ltima, produzam toxina (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). Os procedimentos de cozedura no matam os esporos, sendo necessrio monitorizar o tempo de arrefecimento do alimento at a uma temperatura segura no intuito de prevenir a sua germinao. O perodo de arrefecimento deve ser curto o suficiente para prevenir o crescimento e germinao de esporos mesfilos de Bacillus spp. e Clostridium spp. O arrefecimento rpido de 55C para 15C reduz a probabilidade de sobrevivncia e posterior germinao dos esporos de Clostridium spp., portanto o arrefecimento deve minimizar o tempo em que o alimento esteja entre essas temperaturas. Um limite inferior de 20C normalmente adoptado, j que Clostridium spp. cresce lentamente abaixo desse valor (Forsythe, 2002; Jouve, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). (f) Manter a quente A manuteno a quente constitui um aquecimento temporrio, pelo que deve ser aplicada no menor perodo de tempo possvel. Os alimentos devem ser colocados no banho-maria, ou noutro equipamento adequado, quando a temperatura se situar nos 63C e ser mantidos a essa temperatura ou superior. O incumprimento deste limite crtico de temperatura poder facilitar o crescimento e produo de toxinas de bactrias como Staphylococcus aureus, Clostridium perfringens e Bacillus cereus (Forsythe, 2002; Bolton e Maunsell, 2004). (g) Reaquecimento Os alimentos pr-confeccionados que no so servidos a temperaturas de refrigerao devem ser reaquecidos imediatamente aps armazenagem em refrigerao, a temperaturas nunca inferiores a 70C. No devem ser reaquecidos mais do uma vez e devem ser servidos num perodo mximo de 30 minutos. Enquanto que o reaquecimento destri a maioria das bactrias, as toxinas pr-formadas podero permanecer. Deste modo, este PCC dever ser tratado em conjunto com outros PCC, tais como arrefecimento e manter a quente (Forsythe, 2002; Maunsell, 2003; Bolton e Maunsell, 2004).

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I. INTRODUO

2.3. Avaliao de Risco MicrobiolgicoAs mudanas nas tcnicas de processamento e distribuio dos alimentos, assim como a emergncia de novos patognios, alteram a epidemiologia de doenas de origem alimentar (Jouve et al., 1998; Forsythe, 2002). Assim, so necessrias novas estratgias para a avaliao e gesto dos riscos para a segurana alimentar associadas com os perigos microbiolgicos. A Avaliao de Risco Microbiolgico (ARM) constitui um dos componentes de uma abordagem estruturada e formalizada que visa compreender e, quando necessrio, reduzir o risco, conhecida como Anlise de Risco (CAC, 1999; Forsythe, 2002; Gaze et al., 2002). A Avaliao de Risco, como definida pela Comisso do Codex Alimentarius, consiste numa abordagem cientfica para estimar um risco e entender os factores que o influenciam, sendo o processo composto pelos seguintes elementos (CAC, 1999; Forsythe, 2002; Gaze et al., 2002): 1. identificao dos perigos, 2. caracterizao dos perigos, 3. avaliao da exposio, 4. caracterizao do risco.

2.3.1. Identificao de perigosA identificao dos perigos consiste na identificao dos agentes biolgicos (microrganismos e toxinas) e/ou, dependendo do objectivo, qumicos e fsicos que possam causar efeitos adversos sade do consumidor, devido sua presena num alimento em particular (CAC, 1999). A disponibilidade de dados de sade pblica e uma estimativa preliminar das fontes, frequncia e quantidade do agente sob considerao nos alimentos so consideradas essenciais para a identificao de perigos. A informao reunida mais tarde utilizada na avaliao de exposio na qual o efeito do processamento, armazenamento e distribuio do alimento sobre o nmero de microrganismos avaliado (CAC, 1999; Forsythe, 2002; Gaze et al., 2002).

2.3.2. Avaliao da exposioA avaliao da exposio consiste na avaliao qualitativa e/ou quantitativa da ingesto provvel de agentes biolgicos, qumicos e fsicos atravs do alimento, assim como a exposio a outras fontes relevantes (CAC, 1999). Esta etapa envolve a considerao da frequncia ou probabilidade de ocorrncia dos patognios nos alimentos, e a sua prevalncia no alimento ao longo do tempo. O objectivo principal da avaliao de exposio de estimar o nvel de microrganismos ou toxinas microbianas no alimento no momento do consumo, sendo tambm considerados os padres ou hbitos de consumo (CAC, 1999; Forsythe, 2002; Gaze et al., 2002).26

I. INTRODUO

2.3.3. Caracterizao do perigoEste passo consiste na avaliao qualitativa e/ou quantitativa da natureza dos efeitos adversos associados a agentes biolgicos, qumicos ou fsicos que podem estar presentes num alimento (Jouve et al., 1998; CAC, 1999; Forsythe, 2002). Para agentes biolgicos, os factores importantes a considerar relacionam-se com a fisiologia e virulncia ou patogenecidade dos microrganismos, a dinmica da infeco e a susceptibilidade do hospedeiro. Pode incluir uma avaliao de dose-resposta se os dados estiverem disponveis. O objectivo fornecer uma estimativa da natureza, gravidade e durao dos efeitos adversos associados com agentes perigosos no alimento (CAC, 1999; Forsythe, 2002; Gaze et al., 2002).

2.3.4. Caracterizao do riscoA caracterizao do risco a estimativa quantitativa e/ou qualitativa, incluindo as incertezas relacionadas, da probabilidade de ocorrncia e gravidade dos efeitos adversos sade numa dada populao com base na identificao do perigo, na caracterizao do risco e na avaliao da exposio (CAC, 1999). Ou seja, envolve a integrao da informao recolhida nas etapas anteriores para estimar o risco para uma populao ou para um tipo particular de consumidor. O grau de confiana na estimativa final de risco depende da variabilidade, da incerteza e das suposies identificadas nas etapas prvias. A caracterizao do risco constitui a ltima etapa na avaliao do risco da qual uma estratgia de gesto de risco pode ser formulada (Jouve et al., 1998; CAC, 1999; Forsythe, 2002). O conhecimento de cada