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Quinta da Confusão – O nascimento de um império 304 Margem Sul, colocada no começo da N2. As picaretas dos animais logo arrancaram as primeiras lajes de pedra das rochas próximas, que por sua vez foram colocadas a seguir a uma abertura feita no centro exacto do lado sul da cerca da Quinta da Perfeição, o começo da N2. A tinta também cedo entrou em acção, cobrindo de preto as lajes de pedra e deixando traços brancos nas bermas e no centro da via de 4 metros de largura. Os animais podiam ser menos do que os da equipa que trabalhava no Túnel do Monte, ainda com escassos metros de comprimento, mas estavam a avançar muito mais depressa do que eles. A N2 seria acabada ainda no Dia 10, enquanto que o Túnel do Monte, com o mesmo comprimento, não seria acabado senão dois dias depois. O esgotamento da Mina de Ouro da Quinta da Perfeição, ocorrido às 19:00 do Dia 8, em nada afectou o império. A única utilização prática do ouro na Quinta da Confusão era no ramo da tinturaria, a utilização do metal fundido como tinta amarela, que nem sequer era a tinta mais usada na Quinta da Confusão. A posição era ocupada pela tinta roxa, obtida do sumo de uva. Mas agora, 11:00 do Dia 10, as outras minas do império começavam também a entrar em dificuldades. A única excepção era a Mina de Carvão da Quinta da Perfeição, cujos mineiros continuavam a encontrar minério sem dificuldade. Mas nas outras minas a produção começava a descer, o que já acarretava consequências para a economia nacional. O ferro era o elemento essencial para o fabrico de instrumentos, que tinham alguma procura no império porque os animais, mesmo já os tendo, continuavam a comprar versões maiores. A falta de ferro não traria grandes consequências para a população em geral, mas o mesmo não se poderia dizer em relação ao carvão. Combustível primordial nas fogueiras que aqueciam os animais e ingrediente insubstituível da pólvora, que por sua vez era parte das velas que iluminavam as noites, o carvão era um minério essencial na vida dos animais do império, logo a sua falta iria ser bastante notada pelos habitantes do império. A solução seria regressar aos métodos antigos: queimar madeira em vez de carvão e usar tochas para a iluminação… e esperar que as coisas melhorassem. Mas era ainda cedo para se dizer se as minas iriam ou não ficar esgotadas. 11:30 Apenas meia hora depois da abertura do prolongamento da Linha Azul até à Quinta da Confusão, os animais que fizeram o prolongamento decidiram continuar a construir para este. Era consensual entre os animais que a Linha Azul deveria terminar na Herdade dos Ovos, a mais oriental das 3 quintas do império a norte do Douro. Mas o que já causava polémica entre os trabalhadores, tanto cientistas como outros animais, era a forma

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Margem Sul, colocada no começo da N2. As picaretas dos animais logo arrancaram as primeiras lajes de pedra das rochas próximas, que por sua vez foram colocadas a seguir a uma abertura feita no centro exacto do lado sul da cerca da Quinta da Perfeição, o começo da N2. A tinta também cedo entrou em acção, cobrindo de preto as lajes de pedra e deixando traços brancos nas bermas e no centro da via de 4 metros de largura. Os animais podiam ser menos do que os da equipa que trabalhava no Túnel do Monte, ainda com escassos metros de comprimento, mas estavam a avançar muito mais depressa do que eles. A N2 seria acabada ainda no Dia 10, enquanto que o Túnel do Monte, com o mesmo comprimento, não seria acabado senão dois dias depois.

O esgotamento da Mina de Ouro da Quinta da Perfeição, ocorrido às 19:00 do Dia 8, em nada afectou o império. A única utilização prática do ouro na Quinta da Confusão era no ramo da tinturaria, a utilização do metal fundido como tinta amarela, que nem sequer era a tinta mais usada na Quinta da Confusão. A posição era ocupada pela tinta roxa, obtida do sumo de uva. Mas agora, 11:00 do Dia 10, as outras minas do império começavam também a entrar em dificuldades. A única excepção era a Mina de Carvão da Quinta da Perfeição, cujos mineiros continuavam a encontrar minério sem dificuldade. Mas nas outras minas a produção começava a descer, o que já acarretava consequências para a economia nacional. O ferro era o elemento essencial para o fabrico de instrumentos, que tinham alguma procura no império porque os animais, mesmo já os tendo, continuavam a comprar versões maiores. A falta de ferro não traria grandes consequências para a população em geral, mas o mesmo não se poderia dizer em relação ao carvão. Combustível primordial nas fogueiras que aqueciam os animais e ingrediente insubstituível da pólvora, que por sua vez era parte das velas que iluminavam as noites, o carvão era um minério essencial na vida dos animais do império, logo a sua falta iria ser bastante notada pelos habitantes do império. A solução seria regressar aos métodos antigos: queimar madeira em vez de carvão e usar tochas para a iluminação… e esperar que as coisas melhorassem. Mas era ainda cedo para se dizer se as minas iriam ou não ficar esgotadas.

11:30

Apenas meia hora depois da abertura do prolongamento da Linha Azul até à Quinta da Confusão, os animais que fizeram o prolongamento decidiram continuar a construir para este. Era consensual entre os animais que a Linha Azul deveria terminar na Herdade dos Ovos, a mais oriental das 3 quintas do império a norte do Douro. Mas o que já causava polémica entre os trabalhadores, tanto cientistas como outros animais, era a forma

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como se faria o trajecto que cruzava a Quinta da Confusão. Alguns animais tinham aproveitado o seu tempo de descanso para projectarem o troço seguinte da Linha Azul, e todos os projectos mostravam 3 estações na Quinta da Confusão: Quinta da Confusão – Oeste (a actual Estação da Quinta da Confusão); Quinta da Confusão – Mina de Ferro (no centro da capital, ao km 3,5) e Quinta da Confusão – Este (junto ao limite este da quinta, ao km 4). Mas estes diferiam no tipo de trajecto: alguns projectos sugeriam uma rota pela superfície, outros uma rota subterrânea e outros ainda um viaduto que passasse por cima da Quinta da Confusão. Literalmente, os animais dividiram-se em três grupos, cada qual a defender um tipo de projecto. Os animais que defendiam a rota pela superfície alegavam que assim seria mais rápido e barato, os que defendiam o túnel diziam que este não deixaria quaisquer vestígios na superfície e os que defendiam o viaduto afirmavam que com pilares espaçados entre si não incomodariam ninguém, mesmo se passassem por terrenos agrícolas. Após alguns minutos de debate, os animais perceberam que se continuassem assim não iriam longe, porque nenhum dos lados cedia perante os outros. Assim, um dos animais decidiu escrever num papel as vantagens e as desvantagens de cada projecto, para que se tivesse uma ideia clara daquilo que traria cada tipo de traçado. Ao analisarem o papel, os animais chegaram à conclusão de que o viaduto era a melhor opção. Isso porque, de entre as opções que não bloqueavam a passagem dos animais, o viaduto era a mais económica, a mais rápida e a menos arriscada opção, no sentido em que tinha menor hipótese de ruir face ao túnel.

Os projectos que tinham escolhido o viaduto como forma de passar pela Quinta da Confusão eram mais ou menos idênticos, sendo que todos propunham construir uma ponte em arco, com pilares de 50 em 50 metros, distância suficiente para não afectar a circulação de animais entre o norte e o sul da Quinta da Confusão. Mas os trabalhadores não tiveram tempo de seleccionar o projecto que realmente seguiriam, pois apareceram dois fabricantes de instrumentos no local segurando uma placa de ferro. Estes então disseram «Estivemos a ouvir a vossa conversa, e se vão realmente fazer um viaduto, por onde passem comboios pesados carregados de mercadorias e animais, não podem confiar no ferro fundido. Precisam de algo que descobrimos há pouco tempo, ainda hoje, o ferro forjado26. É mais resistente, logo ideal para usarem no viaduto». Testes efectuados pelos fabricantes de instrumentos tinham confirmado a maior resistência do ferro forjado, e os animais não tiveram que ouvir muito mais para perceberem

26

O ferro fundido consiste na fundição total do ferro, que depois é despejado para um

molde que lhe dá a forma desejada. Já o ferro forjado consiste no seu aquecimento e

moldagem a quente, sem fusão.

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que o viaduto correria menos risco de ruir se fosse feito em ferro forjado. Assim, estes começaram a fazer placas e barras em metal forjado para o viaduto. A obra teria uma altura máxima de 10 metros, partindo das estações de Quinta da Confusão – Oeste e Quinta da Confusão – Este, e alcançando essa altura ao fim de 50 metros de caminho. Esta seria composta por duas filas de arcos de 50 metros de comprimento separadas por 5 metros, ligadas entre si por barras de ferro forjado. Os arcos teriam, ao nível do tabuleiro do viaduto, outras barras de metal com orientação este-oeste, igual à dos arcos, e que formavam os limites do tabuleiro, estando ligadas aos arcos por mais barras de metal, verticais. As barras, onde também seriam colocadas protecções laterais, tinham, de 2 em 2 metros, pequenos arcos soldados em baixo para que neles pudesse ser colocado um tronco de madeira, que seria empurrado até entrar no arco em frente, do outro lado do tabuleiro. Por cima dos troncos seria feito então o chão de madeira, onde por sua vez se colocariam os carris. Dessa forma, eliminando o ferro do tabuleiro, conseguia-se fazer o viaduto com menos minério, cada vez mais escasso na Quinta da Confusão. Ao fim de alguns minutos, as primeiras peças do viaduto de 900 metros de comprimento (os restantes 100 metros de comprimento da Quinta da Confusão estavam ocupados, ou estariam, pelas estações dos limites da quinta e pelos espaços para os comboios mudarem de linha) foram colocadas, e outras estavam a caminho do seu sítio. O viaduto estava no bom caminho.

Uma hora após o começo da construção do Túnel do Monte, os animais conseguiram concluir 9 metros de estrada. Mas, ainda com 491 metros pela frente, os animais sabiam que a empreitada levaria muitos dias a ser acabada. A um ritmo de 9 metros por hora, seriam precisas cerca de 55 horas e meia de trabalho para terminar o Túnel do Monte, o equivalente a datar o fim das obras por volta das 10:00 do Dia 14 caso estas decorressem sempre entre as 8 e as 22 horas. Mas, mesmo com a certeza da longa duração das obras, os animais continuaram a trabalhar com vigor. Ainda faltava muito tempo até ao Dia 14, e decerto se inventaria algo que apressasse as obras do Túnel do Monte até lá…

Meia hora depois do fim da Guerra contra a Quinta do Douro, os estragos causados pelas batalhas tinham desaparecido por completo. As estufas danificadas e destruídas tinham sido substituídas pelo modelo de estufa criado pelo império no Dia 8, após a 4ª Batalha da Quinta da Confusão. A feira da Quinta da Perfeição reparara as paredes alvejadas na 3ª Batalha da Quinta da Perfeição, e contratara mais trabalhadores para substituir os que tinham sido mortos na batalha (ironicamente, os novos empregados eram animais da Quinta do Douro). Os mortos também já tinham sido enterrados, anonimamente e muitas vezes no próprio local em que tinham sido encontrados. Mas as Forças Armadas da Quinta da

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Confusão ainda não se tinham recomposto da guerra… Com a Cavalaria e a Infantaria quase dizimadas, reduzidas respectivamente a 10 e 5 animais, os soldados regressaram aos quartéis para descansar depois de terem travado três batalhas em 45 minutos. Antes disso, porém, as tropas do Exército e da Marinha reuniram-se no exterior para então os comandantes fazerem um pequeno discurso, em que elogiaram as vitórias obtidas. Depois, sugeriram que os soldados investigassem as espingardas da Quinta do Douro capturadas, para por sua vez tentarem também produzi-las. Se conseguissem seria excelente, uma vez que as armas da Quinta do Douro eram muito superiores às da Quinta da Confusão: tinham um cano estriado em vez de liso, logo a sua precisão era maior; carregavam-se pela culatra e não pela boca; comportavam 10 balas em simultâneo em cada cano; juntavam o projéctil e a pólvora num único cartucho e, entre disparar e carregar, podiam disparar 30 balas por minuto, dez vezes o valor das espingardas da Quinta da Confusão. Os militares aceitaram logo com entusiasmo investigarem as espingardas, e assim se ocuparam nos minutos seguintes. Das armas capturadas poucas ainda tinham balas, mas as que estavam na posse das Forças Armadas eram suficientes. Alguns soldados logo abriram as espingardas à força de golpes de machado, para poderem ver o seu interior, e rapidamente se fizeram os primeiros esboços sobre a constituição das armas. Para se as distinguirem, deu-se o nome de «espingarda da Quinta da Confusão» às armas criadas pelo império no Dia 9 e «espingarda da Quinta do Douro» às armas criadas pelo antigo país, que em breve seriam as armas padrão das Forças Armadas. De resto, os nomes já estavam interiorizados, antes mesmo de serem criados.

14:00

Apenas 3 horas após o começo da queda da produção das minas do império, todas declararam o esgotamento. A única excepção era a Mina de Carvão da Quinta da Perfeição, que inexplicavelmente continuava com a produção tão alta como antes. Era certo que a produção das minas era muito inferior ao seu máximo, para equilibrar a oferta e a procura, mas aparentemente isso não evitara o seu esgotamento. Os mineiros das minas afectadas deixaram então os seus locais de trabalho, após terem inutilmente escavado ao máximo com as picaretas na tentativa de encontrarem mais minério. Às placas que indicavam o nome das minas foram pregadas outras a dizer «Mina esgotada», e com isso os mineiros afastaram-se definitivamente. A falta de ferro afectaria sobretudo as obras em decurso, o Túnel do Monte e o viaduto da Linha Azul. Já o carvão mantinha-se como antes, porque os mineiros da Mina de Carvão da Quinta da Perfeição

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aumentaram a sua produção para que a oferta se mantivesse como antes. O carvão não faltaria na Quinta da Confusão.

Os 3 cartógrafos, que entre os Dias 7 e 9 tinham explorado o sul do distrito de Bragança, decidiram fazer outra viagem de exploração. Visto que no Dia 7 tinham partido para este, agora decidiram partir para oeste, seguindo o curso do Rio Douro. Mas, ao contrário da viagem feita em finais da Dezena de 0, o objectivo da nova jornada dos 3 cartógrafos era simplesmente descobrir o que havia para lá da cascata que bloqueava o Rio Douro a oeste. Assim, usando a mesma carruagem que os acompanhara na jornada de 400 km que lhes dera fama no império, o grupo originário da República da Quinta da Perfeição, extinta em finais do Dia 6, dirigiu-se à Quinta do Douro. Uma vez lá chegados, os 3 cartógrafos viraram para oeste e prosseguiram o seu caminho. A sua carruagem estava equipada com um velocímetro, que por sua vez tinha um odómetro, inventado pelos 3 cartógrafos nesse mesmo dia.

Índice de Tecnologia:

Militar -6 (cinto de ferro, bainha de couro, bicicleta de guerra, peitoral, pólvora, espingarda) Transportes-15 (Aéreos-0) (Marítimos -3) (barco a remos de Modelo 1 e de Modelo 2, navio a vapor) (Terrestres-12) (carroça de 2 rodas, carroça de 4 rodas, carruagem, bicicleta, estrada de terra batida, ponte, comboio hipomóvel, linha ferroviária, travões, velocímetro, túnel, odómetro) Civil -42 (arado, foice, madeira, caixa de madeira, ferro, pregos, balde, escada, botijas de ar, machado, banheira, canalizações, corda, argola de couro, vidro, janela, tapete rolante, engrenagens, ouro, papel de couro, mapa, ponteiro, tinteiro, fogão, espátula, prato, garfo, faca, régua, compasso, transferidor, esquadro, relógios, picareta, máquina a vapor, carimbo, candeeiro, vela, cerca, mesas, cadeiras, pá) Construções-8 (estufas, abrigo nocturno, Casa da Moeda, feira, altos-fornos, indústria, quartel, estação ferroviária)

Meio km a oeste da Quinta do Douro, os 3 cartógrafos alcançaram a cascata. O Rio Douro, de 50 metros de largura, precipitava-se pela cascata também com 50 metros de altura, e depois prosseguia o seu caminho rumo à costa. As margens do rio permaneciam à mesma altitude para lá da cascata, a 50 metros da água, caindo quase na vertical até ao curso de água. Os cartógrafos continuaram a andar, colocando o odómetro no zero. A distância percorrida ia aumentando aos poucos: 0,5, 2, 3, 4,5, 6 km… As margens continuavam à mesma altitude, até que a 7 km a oeste da Quinta

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do Douro começaram a descer em direcção ao rio. Meio km mais tarde, as águas e as margens estavam ao mesmo nível. Os 3 cartógrafos depararam-se aí com um bom sítio para se fazer um porto. Era deserto, não se via ninguém ou nenhuma construção à volta, apenas árvores e rochas. O correr das águas e o chilrear dos pássaros da área produzia um relaxante ruído de fundo numa área também relaxante por si só, verde da relva que cobria as terras, mas também um pouco branca devido à escassa neve que caíra nessa noite. Desde o Dia 6 que os animais do império não viam neve na área, desde a grande chuvada que causara inundações na Quinta da Confusão. Os 3 cartógrafos pararam então a carruagem, e desceram para apreciarem a paisagem que tinham encontrado. Durante a jornada que tinham feito na dezena anterior não tinham prestado muita atenção à paisagem, por estarem concentrados em cartografar as terras, mas naquele caso os seus objectivos estavam cumpridos, tinham descoberto o que havia para lá da cascata. Um dos 3 cartógrafos comentou «Aproveitemos este momento aqui, neste sítio relaxante. Amanhã poderemos morrer numa guerra, e ninguém trará os nossos cadáveres para aqui». Ninguém poderia garantir aos animais que estariam vivos no dia seguinte, sobretudo num país que entrava em conflitos militares constantemente. Assim, os 3 cartógrafos foram explorar, lentamente, as terras em redor. Não tencionavam ir muito longe, ficariam na área logo a oeste da Quinta da Perfeição e da Quinta do Douro.

A falta de ferro afectara um pouco a construção do Túnel do Monte, tanto que ao fim de 3 horas e meia de trabalho a obra ainda só tinha 16 metros de extensão. De um ritmo de 9 metros por hora nos primeiros 60 minutos de trabalho, os animais tinham caído para apenas 3 por hora. Para tal também contribuíra o facto de já se estar no interior do monte, em vez de na sua encosta, o que obrigara a escavar mais terra por metro de túnel. Uma placa à entrada do Túnel do Monte informava os animais vindos da Quinta da Perfeição de que se tinham de desviar para o monte (dizendo simplesmente «Desvio», seguido de duas setas, cada uma para um lado). Uma vez na elevação, os animais podiam seguir pela antiga estrada de terra batida, destruída pelas chuvas na noite do Dia 8 para o Dia 9 e que continuava praticamente no mesmo estado, até à Quinta da Confusão. Mas um dos condutores foi incapaz de respeitar o aviso… Uma carruagem que circulava a 60 km\h, com os cavalos a todo o galope, alcançou a entrada ocidental do Túnel do Monte, por enquanto a única existente. O condutor do veículo, sozinho a bordo, já conhecia a N1, e sabia que naquele ponto tinha de se desviar para o cume do monte. Mas a neve, aliada às rodas com cobertura de ferro lisa, diminuiu substancialmente o atrito das rodas à estrada. Os cavalos viraram para a esquerda, tal como ordenara o condutor da carruagem, mas esta ao virar começou a deslizar de lado, mesmo na direcção da entrada do Túnel do Monte. Ao perceber que o desastre era

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inevitável, o animal atirou-se da carruagem e aterrou na estrada com uma cambalhota. Logo a seguir, o inevitável aconteceu: a carruagem, o maior veículo rodoviário criado pela Quinta da Confusão, embateu a mais de 30 km\h, não obstante o abrandamento causado pela mudança de direcção, na parede do Túnel do Monte, junto ao seu começo.

A roda traseira do lado direito separou-se do eixo na pancada, e o canto formado pela intercepção da terra do monte com as placas de metal do túnel partiu as tábuas de madeira da carruagem que nele embateram. Quando o animal que conduzia o veículo agora acidentado se levantou e olhou para trás, a carruagem estava caída sobre o seu lado direito, no monte, e a roda partida jazia caída na entrada do túnel. Os cavalos tinham-se mantido de pé, pelo que as cordas que os prendiam se tinham rompido quando a carroça caiu para o lado. A carruagem não parecia estar muito mal, pelo que o animal entrou no túnel para se certificar de que todos os trabalhadores estavam bem. Estes agradeceram a preocupação, e garantiram que «só apanhámos um susto quando vimos a carruagem bater na entrada do túnel, mais um pouco e entrava cá dentro. Mas de resto estamos bem». O animal dirigiu-se então à carruagem, e usando o que restava das cordas que prendiam os cavalos atrelou-os à lateral do veículo, e estalando as suas rédeas fê-los avançarem e endireitarem a carruagem. O canto do túnel ficara nitidamente marcado na parte lateral direita da carruagem, através de um corte que atravessava a lateral e que a dividira em duas partes. As janelas tinham-se partido no acidente e a porta estava partida ao meio, abrindo-se quando os cavalos endireitaram a carruagem. Com uma das rodas também partida no acidente, o animal viu-se forçado a levar a carruagem só com três rodas até à Quinta da Confusão, onde comprou materiais para reparar o veículo. Para trás, ficava a história que demonstrava os efeitos da condução a alta velocidade em estradas com neve, uma história que acabara bem mas que podia muito bem correr pior. Bastaria o animal ter abrandado ao fazer a curva para nada ter acontecido.

Duas horas e meia depois do começo da pesquisa das espingardas da Quinta do Douro, os primeiros soldados apresentaram ao cavalo 3 e ao porco 30 a primeira espingarda da Quinta do Douro criada pela Quinta da Confusão. A arma estava carregada com 10 balas, também obtidas pelos soldados, sendo que estas logo foram disparadas contra tábuas de madeira de uma distância de 100 metros, para se testar a eficácia da arma. Os comandantes supremos das Forças Armadas aprovaram então a espingarda, cujas 10 balas tinham todas trespassado a tábua de madeira. Com o modo de fabrico da espingarda da Quinta do Douro obtida, era agora altura de se procurarem animais dispostos a entrarem para as Forças Armadas, para substituírem os militares mortos na Guerra contra a Quinta do Douro. Os comandantes supremos não queriam apenas repor as perdas em combate,

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pretendiam também aumentar o número de soldados das Forças Armadas, e tal deveria ser relativamente fácil atendendo a que o império tinha 750 habitantes. Assim, os soldados deixaram os quartéis, onde tinham feito os estudos sobre a espingarda da Quinta do Douro, e espalharam-se pelo império em busca de recrutas. Ao fim de alguns minutos tinham conseguido 200 candidatos, o que permitia repor as perdas e ainda elevar o número de militares das Forças Armadas de 250 para 350. Os soldados regressavam aos quartéis quando conseguiam um bom número de candidatos a soldados, e em apenas 10 minutos agrupavam-se já à entrada dos quartéis todos os 200 futuros soldados da Quinta da Confusão. Os comandantes militares não perderam tempo. Pediram-lhes que entrassem, e depois em conjunto com os soldados os novos animais começaram a fazer as suas espingardas da Quinta do Douro. Fundindo-se o metal das velhas espingardas da Quinta da Confusão e das respectivas balas, agora obsoletas, conseguiu-se arranjar uma grande quantidade de metal, e a feira da Quinta da Confusão não hesitou em fornecer gratuitamente o que faltava para que todos os 350 animais tivessem o seu equipamento. As espingardas da Quinta do Douro deveriam levar 1 hora a serem feitas e a recruta outras 4, mas esta seria para todos: era preciso que todos os soldados, novos e velhos, soubessem manejar as novas armas. Às 19:00, todos estariam prontos para o combate.

Duas horas e meia após o começo da construção do viaduto da Linha Azul, com apenas 50 metros construídos, as obras tiveram que parar. A falta de ferro cedo afectou as obras, e os animais viram-se forçados a reduzir o ritmo de trabalho para darem tempo de acumularem mais ferro. Mas o metal que obtinham era cada vez menos, e ao fim de algum tempo era preciso correr todas as feiras do império em busca de mais metal. Não que as feiras não tivessem ferro à disposição, mas as obras do viaduto precisavam de grandes quantidades de metal, quantidades essas que as feiras já não tinham. Por isso, após duas horas e meia de trabalho, os animais tiveram de. O director da TFQC admitiu a derrota, dizendo «Fizemos um bom esforço, mas não podemos ir mais longe. O império não tem o ferro de que precisamos, e fazer esta obra em madeira está fora de questão. Por isso temos de parar até haver ferro». Os trabalhadores da obra deixaram então a área, e voltaram para as suas antigas ocupações. A obra, que cedo apareceu em papéis afixados nas estações da Linha Azul identificada como «Troço Elevado da Quinta da Confusão», descrita como «a maior e mais arrojada empreitada alguma vez levada a cabo por este império, 900 metros de carril a 10 metros de altura, incluindo uma estação inteira», fora vencida pela falta de ferro.

16:00