38920540 livro etica adolfo s vazquez 2004 resumo completo

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    FERNANDO COSTA FURLANI

    [Turma: 2 T]

    RESUMO DO LIVRO TICA

    de Adolfo Snchez Vzquez

    Trabalho de Graduao apresentado

    Faculdade de Direito da UniversidadePresbiteriana Mackenzie, como

    exigncia parcial para satisfazer os

    requisitos da Disciplina tica e

    Cidadania Aplicada ao Direito II

    Professor: Marcos Peixoto Mello Gonalves

    So Paulo

    2004

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    SUMRIO

    CAPTULO I - OBJETO DA TICA ............................................................... 4

    CAPTULO II - MORAL E HISTRIA .......................................................... 7

    CAPTULO III - A ESSNCIA DA MORAL................................................ 12

    CAPTULO IV - A MORAL E OUTRAS FORMAS DE

    COMPORTAMENTO HUMANO .................................................... 15

    CAPTULO V - RESPONSABILIDADE MORAL,

    DETERMINISMO E LIBERDADE ................................................. 17

    CAPTULO VI - OS VALORES ..................................................................... 20

    CAPTULO VII - A AVALIAO MORAL ................................................ 23

    CAPTULO VIII - A OBRIGATORIEDADE MORAL............................... 27

    CAPTULO IX - A REALIZAO DA MORAL......................................... 31

    CAPTULO X - FORMA E JUSTIFICAO DOS JUZOS

    MORAIS .............................................................................................. 35

    CAPTULO XI - DOUTRINAS TICAS FUNDAMENTAIS ..................... 43REFERNCIA BIBLIOGRFICA ................................................................ 52

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    CAPTULO I - OBJETO DA TICA

    1. Problemas Morais e Problemas ticosNas situaes efetivas e reais que ocorrem no dia-a-dia de todos os indivduos,

    surgem problemas quando as decises e aes deles so objeto de julgamento

    pelos demais membros do grupo social. Tais problemas no afetam apenas um

    indivduo, mas tambm outras pessoas, e pode at mesmo afetar a comunidade

    como um todo. Em tais situaes, as pessoas pautam seu comportamento por

    normas que julgam mais adequadas cumprir, e quando se pode dizer que o

    homem age moralmente, ou seja, o resultado de uma deciso refletida e no

    espontnea.

    Destarte, de um lado temos os atos das pessoas, e do outro temos o juzo dos

    demais indivduos sobre tais atos; ambos se pautam por certas normas de

    conduta.

    Desse plano prtico-moral se passa reflexo sobre os comportamentos

    prticos, surgindo ento a teoria moral ou a passagem da moral vivida para a

    moral reflexa. Tal passagem, que coincide com o incio do pensamento

    filosfico, marca a entrada na anlise dos problemas ticos.

    Os problemas prtico-morais cuidam das situaes concretas, enquanto os

    problemas ticos so de natureza genrica, de carter terico, de quem investiga

    a moral.

    O problema da essncia do ato moral remete a outro problema crucial: o da

    responsabilidade; responsabilidade por ter tomado uma deciso de agir num

    sentido e no em outro. A liberdade da vontade de escolher sempre gera uma

    responsabilidade, que pode ser um fator limitador para a total liberdade de

    escolha entre dois comportamentos.

    A teoria da moral no se pode distanciar das questes prtico-morais, posto que

    so sua prpria razo de ser.

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    2. O Campo da tica

    A tica, por ser disciplina terica que estuda a moral, deve se limitar a explicar,

    esclarecer ou investigar uma determinada realidade, pois seu valor como teoriaest naquilo que explica, e no no fato de prescrever ou recomendar com vistas

    ao em situaes concretas.

    Quando se ocupa de analisar a prtica moral de uma sociedade de determinada

    poca, a tica deve meramente esclarecer o fato de os membros daquele grupo

    social terem recorrido a prticas morais diferentes e at opostas.

    Por ser cincia que estuda a moral, a tica nem se identifica com princpios de

    moral em particular, nem fica indiferente a eles.

    A tica deve fornecer a compreenso racional de um aspecto real e efetivo do

    comportamento dos homens, pautados em fatos de valor.

    3. Definio da tica

    A tica a teoria ou cincia do comportamento moral dos homens em

    sociedade.

    A tica procura determinar a essncia da moral, e as condies objetivas e

    subjetivas do ato moral, as fontes de avaliao moral, a natureza e funo dos

    juzos morais, os critrios de justificao desses juzos e o princpio que rege a

    mudana de diferentes sistemas morais.

    Seu carter cientfico deve aspirar racionalidade e objetividade, e proporcionar

    conhecimentos comprovveis. A moral objeto da cincia tica, podendo sofrer

    influncia desta.

    Hoje em dia j h uma diferenciao clara entre a moral e a tica, que nem

    sempre ocorreu.

    4. tica e Filosofia

    Dada a sua pretenso de estudar cientificamente o comportamento humanomoral, a tica se ope concepo tradicional que a reduzia a um simples

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    captulo da filosofia. Em tempos remotos, enquanto ainda no se havia

    elaborado um saber cientfico, a filosofia se apresentava como uma espcie de

    saber total que tratava de tudo. Modernamente, porm, abre-se espao para umconhecimento cientfico verdadeiro; e a tica, como outras cincias, desprende-

    se do tronco comum da filosofia para se ocupar de um objeto especfico de

    investigao com metodologia prpria e racionalidade.

    Embora tica se desprenda do seu tronco, volta e meia se remete a ele, dada a

    sua inegvel riqueza e vitalidade.

    Considerando o comportamento moral do homem, que no algo estvel e sim

    dinmico que sofre constantes variaes ao longo do tempo, a tica tem como

    fundamento a concepo filosfica do homem, que nos d um panorama

    generalizado deste como ser social, histrico e criador.

    5. A tica e Outras Cincias

    A tica inegavelmente se relaciona com outras cincias, como por exemplo a

    psicologia, quando a tica precisa compreender as leis que regem as motivaes

    internas, subjetivas do ato moral que o comportamento do indivduo.

    Entretanto, h que se saber separar a tica das demais cincias, como da

    psicologia, por exemplo.

    Outrossim, a antropologia e a sociologia so cincias que contribuem para a

    tica, por analisar os indivduos sob a ptica de seus relacionamentos sociais.

    Mas a tica tampouco se reduz sociologia.

    Dado o processo de sucesso dos comportamentos morais na humanidade, a

    antropologia e a histria propem tica um problema fundamental: o de

    determinar se existe um progresso moral.

    A cincia jurdica tambm d suas contribuies, uma vez que trata de normas

    impostas com carter de obrigao exterior e de forma coercitiva,

    diferentemente das normas morais, que no so exteriores nem coercitivas.

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    A cincia das relaes econmicas tambm se relaciona com a tica, na medida

    em que modificam a moral dominante em dada sociedade, e tambm na medida

    em que os fenmenos econmicos colocam problemas morais no cotidiano daspessoas.

    CAPTULO II - MORAL E HISTRIA

    1. Carter Histrico da MoralHistoricamente, o conjunto de normas e regras de dada comunidade

    representadas pela moral sofre variaes ao longo do tempo. Ocorre a sucesso

    de certas morais sobre outras morais, podendo-se falar da moral da Antigidade,

    da moral feudal da Idade Mdia, da moral burguesa na sociedade moderna, etc.

    A tica considera a moral mutvel com o tempo.

    Portanto, a origem da moral se situa fora da histria ela anistrica, ou anti-histrica, e esse a-historicismo segue trs direes fundamentais:

    a) Deus como origem ou fonte da moral: quando as normas morais

    derivam de um poder sobre-humano; as razes da moral esto fora e

    acima do homem, e no nele prprio.

    b) A natureza como origem ou fonte da moral: a conduta moral do

    homem seria mero aspecto da conduta natural e biolgica. As

    qualidades morais teriam origem nos instintos, e poderiam ser

    encontradas at mesmo nos animais.

    c) O Homem como origem e fonte da moral: considera o homem como

    detentor de uma essncia eterna e imutvel inerente a todos os

    indivduos; assim, a moral constituiria um aspecto desta maneira de

    ser, que permanece atravs das mudanas histricas e sociais.

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    Nas trs concepes, h a coincidncia quanto busca da origem e da fonte da

    moral fora do homem concreto. Alm disso, acentua-se o carter histrico da

    moral, onde ocorrem as mudanas histricas na moral, que levam a questionaracerca (i) das causas ou fatores que determinam as mudanas, e (ii) do seu

    sentido ou direo se h ou no um progresso moral.

    2. Origens da Moral

    A moral surge quando o homem atinge sua natureza social, sendo membro de

    uma coletividade, onde ele sente que precisa se comportar de certo modo por ter

    uma conscincia de sua relao com os demais.

    O trabalho do homem tambm adquire um carter coletivo, e o fortalecimento

    da coletividade se torna uma necessidade vital para vencer as dificuldades de

    sobrevivncia; ento que surgem uma srie de normas no escritas que iro

    beneficiar a comunidade, e assim nasce a moral, para conciliar o comportamento

    individual com os interesses coletivos.

    Os indivduos, ento, passam a julgar o comportamento alheio como bom/til

    ou mau/nefasto para manter a coletividade. A questo do benefcio da

    comunidade a origem do que modernamente chamamos de virtudes ou vcios.

    O conceito de justia corresponde tambm ao mesmo princpio coletivista, seja

    no sentido de igualdade na distribuio, seja no de fazer a reparao de um mal

    causado a um membro da coletividade.

    Destarte, nas comunidades primitivas o aspecto coletivo absorve o individual,

    dizendo-se ser uma moral pouco desenvolvida, em contraposio com a moral

    mais elevada, baseada na responsabilidade pessoal. O progresso da moral se d

    em virtude das novas condies econmico-sociais, particularmente o

    aparecimento da propriedade privada e a diviso da sociedade em classes.

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    3. Mudanas Histrico-Sociais e Mudanas da Moral

    O aumento generalizado da produtividade de trabalho tornou possvel estocar

    quantidades excedentes de produtos, criando assim condies para que surgissea desigualdade de bens entre chefes de famlia que antes repartiam igualmente

    os frutos em razo de sua necessidade mtua. Tal situao possibilitou ainda a

    apropriao privada dos bens ou produtos de trabalho alheio, e da o

    antagonismo entre pobres e ricos. A propriedade privada acentuou a diviso

    entre os homens livres e os escravos, e fez surgir uma moral prpria de cada

    uma dessas condies de escravido ou de liberdade, sendo dominante a moral

    dos homens livres, tanto no campo prtico como no terico no s porque se

    baseava na moral dos filsofos da Antigidade, mas tambm porque a moral dos

    escravos no se conseguia alar a um nvel terico.

    Com o desaparecimento do mundo Antigo, assentado na escravido, nasce a

    sociedade feudal, cujo regime econmico-social se baseia na diviso em duas

    classes sociais fundamentais: a dos senhores feudais e a dos camponeses servos.

    Embora suas condies de vida continuassem difceis, os servos j eram

    formalmente reconhecidos como seres humanos, em vez de coisas.

    Na pirmide social de ento se inclua a Igreja, que tambm possua seus feudos;

    alm disso, devido ao seu papel preponderante, a moral da Idade Mdia estava

    impregnada de contedo religioso, mas havia tambm as morais prprias dos

    nobres e dos cavaleiros.

    Aos poucos surgiu uma nova classe social: a burguesia, com sua moral peculiar,

    que era a dos trabalhadores assalariados princpio da lei de produo de mais-

    valia econmica e que tambm exigia mo-de-obra livre. A economia passa a

    ser regida pela lei do mximo lucro, que gera uma moral prpria: uma moral

    muito individualista que d lugar ao esprito de posse e ao egosmo, tendo

    tambm mtodos brutais de explorao do trabalho humano em busca da mais-

    valia. Tal situao evolui para o capitalismo baseado em mtodos cientficos eracionalizados de produo em srie, e deste passo evolui ainda para um maior

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    respeito aos trabalhadores e preocupao com seus interesses e necessidades,

    mas tudo visando ao benefcio da empresa onde ele trabalha, visando maior

    produtividade.Ao longo de sculos, os mais diversos modos de explorao do homem pelo

    homem no capitalismo e a violncia usada por conquistadores nas colnias se

    deu sem que se levantassem problemas morais para seus executores. Esta

    situao muda nos tempos modernos, quando se comea a recorrer moral na

    tentativa de justificar as opresses. Entretanto, aos poucos os povos subjugados

    comeam a desenvolver sua prpria moral: com sua honra, a fidelidade aos seus,

    etc.

    A concluso da exposio anterior de que a moral vivida realmente na

    sociedade muda historicamente de acordo com as reviravoltas fundamentais

    verificadas no desenvolvimento social.

    Uma nova moral, autenticamente humana, implicar numa grande mudana de

    atitude, menos individualista e com mais esprito coletivista; entretanto, essa

    nova moral est longe de ser atingida, pois so necessrias vrias mudanas de

    ordem econmica, social e poltica.

    4. O Progresso Moral

    J vimos que a moral se desenvolve ao longo do tempo de acordo com o

    momento histrico e social. importante sabermos comparar as diversas morais

    j havidas para determinar qual delas se apresenta mais avanada, ou mais

    elevada. O progresso moral no pode ser concebido independentemente do

    progresso histrico-social, mas no se limita a este; destarte, mister saber

    diferenciar uma coisa da outra.

    Pode-se usar como ndice de progresso humano quando ocorre um

    desenvolvimento das foras produtivas. Porm isto no basta, posto que o

    homem produz somente em sociedade. Portanto, outro critrio de progressohumano reside no tipo de organizao social e no grau correspondente de

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    participao dos homens na sua praxis social. H ainda outro ndice: o da

    produo de bens culturais, como no campo da cincia e da arte. Todos esses

    ndices atividade produtiva, social e espiritual so usados conjuntamentepara avaliar o sujeito do progresso histrico: o homem social.

    H de se atentar para os fatos de que o progresso histrico fruto da atividade

    coletiva consciente dos homens, e tambm de que tal progresso se d em ritmos

    diferentes nos diversos povos.

    Tiram-se duas concluses das caractersticas do progresso histrico-social:

    (a) ele cria as condies necessrias para o progresso moral; e (b) ele pode afetar

    negativa ou positivamente os homens de dada sociedade sob o ponto de vista

    moral.

    O primeiro fator de medio do progresso moral a ampliao da esfera

    moral na vida social. Isto se d quando os indivduos passam a reger seus atos

    por normas internas ou de ordem ntima e subjetiva, e no mais por normas

    externas, como a coao ou estmulos materiais como maior recompensa

    econmica.

    O segundo fator a elevao do carter consciente e livre do comportamento

    dos indivduos ou dos grupos sociais, e pelo conseqente crescimento da

    responsabilidade destes indivduos ou grupos no seu comportamento moral.

    Assim, o progresso moral inseparvel do desenvolvimento da livre

    personalidade.

    O terceiro ndice de progresso moral o grau de articulao e de coordenao

    dos interesses coletivos e pessoais. A moral dita superior ocorre quando h um

    equilbrio entre os interesses da comunidade e os estritamente individuais.

    O progresso moral tambm se d na negao e na reafirmao de alguns

    elementos morais anteriores; os mais elevados como a solidariedade, por

    exemplo adquirem certa universalidade e se mantm na histria.

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    CAPTULO III - A ESSNCIA DA MORAL

    Prope-se a seguinte definio de moral como ponto de partida: a moral umconjunto de normas, aceitas livre e conscientemente, que regulam o

    comportamento individual e social dos homens.

    1. O Normativo e o Fatual

    Encontramos na moram dois planos: (a) o normativo, constitudo pelas normas

    ou regras de ao, o dever-ser; e (b) o fatual, ou plano dos fatos morais,constitudo por atos humanos concretos, e portanto independentes do dever-ser.

    Os fatos morais esto em constante interao com o normativo, posto que

    sempre adquirem um significado moral positivo ou negativo; e o normativo no

    existe independentemente do fatual, pois aponta para um comportamento

    efetivo.

    As normas existem e valem independentemente da medida em que sejamcumpridas ou violadas.

    2. Moral e Moralidade

    A distino entre moral e moralidade corresponde indicada entre normativo e

    fatual. Entretanto, o melhor empregar um nico termo: moral mas

    significando os dois planos, ou seja, o normativo e o prtico.

    3. Carter Social da Moral

    A moral possui, em sua essncia, uma qualidade social, e portanto ela se

    manifesta somente na sociedade. Essa socialidade se revela em trs aspectos

    fundamentais:

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    A) Cada pessoa, comportando-se moralmente, sujeita-se a determinados

    princpios, valores ou normas morais vlidas segundo a poca histrica, a

    sociedade e o tipo relao social dominante.B) O comportamento moral tanto de indivduos como de grupos sociais

    humanos, e tem carter livre e consciente.

    C) As idias, normas e relaes sociais surgem em decorrncia de uma

    necessidade social.

    Para cumprir certas normas sociais, o poder coercitivo do Estado no

    suficiente; busca-se que os indivduos aceitem ntima e livremente a ordem

    social estabelecida, e aqui reside a funo social da moral.

    A moral possui um carter social porque (a) os indivduos se sujeitam a normas

    social estabelecidas; (b) regula somente atos que acarretam conseqncias para

    os outros; e (c) cumpre a funo social de induzir os indivduos a aceitar livre e

    conscientemente determinados princpios, valores ou interesses.

    4. O Individual e o Coletivo na Moral

    O indivduo pode agir moralmente apenas em sociedade. No nvel da

    regulamentao moral consuetudinria, o indivduo sente sobre si a presso do

    coletivo. Entretanto, por mais fortes que sejam os elementos objetivos e

    coletivos, a deciso e o ato respectivo emanam de um indivduo que age livre e

    conscientemente, assumindo uma responsabilidade individual. Por outro lado,

    mesmo quando o indivduo pensa que age em obedincia exclusiva sua

    conscincia, a uma suposta voz interior, e portanto pensa que decide sozinho

    conforme sua conscincia, ele no deixa de acusar a influncia do mundo social

    do qual faz parte.

    A moral implica sempre uma conscincia individual que faz suas ou interioriza

    as regras de ao que se lhe apresentam com um carter normativo.

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    5. Estrutura do Ato Moral

    O ato moral h de ser analisado pelo seu motivo, e tambm pelo seufim visado.

    O motivo, como aspecto importante do ato moral, pode ser de naturezas vrias,inclusive inconscientes, e no pode ser objeto de aprovao ou desaprovao. O

    fim do ato moral (i) algo voluntrio, ou seja, houve uma deciso de realizar o

    fim escolhido, e (ii) pressupe a escolha de um nico fim em detrimento de

    outros fins possveis, por achar que o escolhido prefervel. A seguir, vem a

    escolha dos meios para a consecuo do fim escolhido, sendo que mesmo um

    fim muito elevado no justifica meios baixos para a sua consecuo. O ato

    moral, ademais, supe um sujeito real dotado de conscincia moral.

    A inteno tambm um aspecto importante do ato moral, e elas no se podem

    salvar moralmente, porque no podemos isol-las dos meios nem dos resultados

    em outras palavras: meios e resultados maus no se justificam com intenes

    boas.

    6. Singularidade do Ato Moral

    A singularidade, novidade e imprevisibilidade de cada situao real colocam o

    ato moral num contexto particular que impede a possibilidade de ditar por

    antecipao uma regra de realizao pretenso v do casusmo ou casustica,

    que por sua vez empobrece a vida moral.

    7. Concluso

    Os traos essenciais da moral so os seguintes:

    1) A moral uma forma de comportamento humano que compreende um

    aspecto normativo (regras de ao) e outro fatual (atos de natureza prtica).

    2) A moral um fato social; verifica-se somente em sociedade.

    3) Embora a moral possua carter social, o indivduo nela desempenha papel

    decisivo, dada a exigncia de interiorizao das normas e da sua adeso ntima aelas.

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    4) O ato moral uma unidade indissolvel dos seus diversos elementos: motivo,

    inteno, deciso, meios e resultados.

    5) O ato moral concreto parte de um contexto normativo em vigor em umadeterminada comunidade que lhe d sentido.

    6) O ato moral, sendo consciente e voluntrio, supe uma participao livre do

    sujeito em sua realizao.

    Definio de moral: a moral um sistema de normas, princpios e valores,

    segundo o qual so regulamentadas as relaes mtuas entre os indivduos ou

    entre estes e a comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um

    carter histrico e social, sejam acatadas livre e conscientemente, por uma

    convico ntima, e no de uma maneira mecnica, externa ou impessoal.

    CAPTULO IV - A MORAL E OUTRAS FORMAS DE

    COMPORTAMENTO HUMANO

    1. Diversidade do comportamento Humano

    As relaes do homem com o mundo exterior, diferentemente do animal, so de

    ordens muito diversas: trabalho, arte, conhecimento e religio. Alm disso, as

    relaes dos homens entre si tambm so muitas: econmicas, polticas,jurdicas, morais, etc. Cabe aqui examinar, em termos gerais, a distino entre o

    comportamento moral e outras formas do comportamento humano, a seguir.

    2. Moral e Religio

    H duas teses sobre religio e moral: (i) a religio inclui certa moral; e (ii) Deus

    como garantia da moral. Entretanto, a histria da humanidade demonstra que amoral no somente no se origina da religio como tambm anterior a ela.

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    3. Moral e Poltica

    Enquanto a moral regulamenta as relaes mtuas entre os indivduos e entreestes e a comunidade, a poltica abrange as relaes entre grupos humanos

    (classes, povos ou naes). Na poltica, o indivduo encarna uma funo

    coletiva, ao passo que agindo moralmente o elemento ntimo e subjetivo

    desempenha um papel importante.

    As relaes extremas entre poltica e moral so: (i) a do moralismo abstrato, que

    leva a reduzir a poltica moral, e (ii) do realismo poltico, que defende a busca

    de resultados a qualquer preo, sejam quais forem os meios empregados,

    desconsiderando a moral.

    4. Moral e o Direito

    De todas as formas de comportamento humano, o jurdico, ou do direito, o que

    mais intimamente se associa com a moral, pois os dois esto sujeitos a normas

    que regulam as relaes do homem. H algumas diferenas entre as duas

    formas: (i) as normas morais so cumpridas pela convico ntima dos

    indivduos, ao passo que as normas jurdicas so cumpridas por motivos formais

    ou externos; (ii) a esfera da moral mais ampla do que a do direito; (iii) a moral

    no depende necessariamente do Estado, como o direito.

    5. Moral e Trato Social

    Tambm guardam relao com a moral os atos de trato social, como por

    exemplo o cavalheirismo, a pontualidade, a galanteria, etc., que podem ou no

    variar de um grupo social para outro, e de uma poca para outra. O trato social

    procura regulamentar formal e exteriormente a convivncia dos indivduos na

    sociedade, mas sem o apoio da convico e adeso ntima do sujeito (moral) e

    sem a imposio coercitiva do cumprimento das regras (direito).

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    6. Moral e Cincia

    As relaes entre a moral e a cincia podem ser colocadas em dois planos: (a) o

    que diz respeito natureza da moral, e se cabvel falar-se em carter cientficoda moral. Esta questo foi abordada ao definir tica como a cincia da moral; e

    (b) o que diz respeito ao uso social da cincia, e aqui se fala do papel moral ou

    da atividade do cientista.

    A primeira questo enuncia o que alguma coisa , e no o que deve ser. Assim, a

    tica nos diz o que a moral , mas no estabelece normas. A moral no cincia,

    e sim ideologia que pode se relacionar com as diversas cincias.

    A segunda questo diz respeito responsabilidade moral assumida pelo cientista

    no exerccio da sua atividade e pelas conseqncias sociais. O cientista no pode

    ser indiferente diante das conseqncias sociais do seu trabalho, que pode ser

    usado pra o bem ou para o mal da sociedade. Sob este aspecto, a cincia no

    pode ser separada da moral.

    CAPTULO V - RESPONSABILIDADE MORAL, DETERMINISMO E

    LIBERDADE

    1. Condies da Responsabilidade Moral

    O enriquecimento ou progresso da vida moral acarreta o aumento daresponsabilidade pessoal, e portanto a determinao das condies dessa

    responsabilidade adquire importncia primordial.

    A chave da questo consiste em saber quais so as condies necessrias para

    poder imputar a algum uma responsabilidade moral por determinado ato, e elas

    so duas: (a) que o sujeito conhea as circunstncias e as conseqncias da sua

    ao ou seja, seu ato deve ser consciente; e (b) que a causa dos seus atos sejainterior, e no exterior, ou seja, em outro agente que o force a agir de certa

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    maneira, isto : sua conduta deve ser livre. Pelo contrrio, a ignorncia de um

    lado e a falta de liberdade do outro, permite eximir o sujeito da responsabilidade

    moral.

    2. A Ignorncia e a Responsabilidade Social

    A ignorncia das circunstncias, da natureza ou das conseqncias dos atos

    humanos autoriza a eximir um indivduo da sua responsabilidade pessoal, mas

    essa iseno ser justificada somente quando, por sua vez, o indivduo em

    questo no for responsvel pela sua ignorncia; ou seja, quando se encontra na

    impossibilidade subjetiva (por motivos pessoais) ou objetiva (por motivos

    histricos e sociais) de ser consciente do seu ato pessoal. Para ilustrar esta

    questo, cita-se o caso de Aristteles, que no poderia ser responsabilizado pela

    sua ignorncia em saber que o escravo tambm era um ser humano e no um

    simples instrumento.

    3. Coao Externa e Responsabilidade Moral

    A coao externa pode anular a vontade do agente moral e eximi-lo da sua

    responsabilidade pessoal, mas isto no pode ser tomado num sentido absoluto,

    porque h casos em que, apesar das suas formas externas, sobra-lhe certa

    margem de opo, e portanto de responsabilidade moral. Um exemplo de

    exceo o caso do processo de Nurenberg contra os principais dirigentes do

    nazismo alemo, em que eles no podiam ser absolvidos de sua responsabilidade

    moral.

    4.Coao Interna e Responsabilidade Moral

    Aqui h as hipteses de doenas mentais, em que seu portador sente uma

    vontade irresistvel de agir de certo modo, sobre o qual o agente no tem

    controle, como na cleptomania. Mas falando de pessoas normais a maioria,

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    estas sempre tm controle sobre seus atos, por mais que sintam um ou outro

    impulso.

    5. Responsabilidade Moral e Liberdade

    A responsabilidade moral pressupe a possibilidade de decidir e agir vencendo a

    coao externa ou interna. Somente haver responsabilidade moral se existir

    liberdade.

    6. Trs Posies Fundamentais no Problema da Liberdade

    1 O determinismo incompatvel com a liberdade.

    2 A liberdade incompatvel com qualquer determinao externa ao sujeito.

    3 Liberdade e necessidade se conciliam.

    7. O Determinismo Absoluto

    A tese central a seguinte: tudo causado, e portanto no existe liberdade

    humana nem responsabilidade social.

    8. O Libertarismo

    Ser livre significa decidir e operar como se bem desejar. A caracterstica desta

    posio a contraposio entre liberdade e necessidade causal. A liberdade de

    vontade, longe de excluir a causalidade no sentido de romper a conexo causal

    ou a negao total desta (indeterminismo) pressupe inevitavelmente a

    necessidade causal.

    9. Dialtica da Liberdade e da Necessidade

    As trs tentativas mais importantes de superar dialeticamente a anttese entre

    liberdade e necessidade causal foram elaboradas por Spinoza, Hegel e Marx-

    Engels. Para Spinoza, no se pode conceber a liberdade independentemente danecessidade. Hegel o complementa, afirmando que alm desse fator h de ser

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    considerado o fator do desenvolvimento histrico quando se fala da liberdade

    a historicidade. Marx e Engels aceitam as duas teorias acima, e partem do

    princpio que a liberdade a conscincia histrica da necessidade.

    10. Concluso

    O ideal a conciliao dialtica entre a necessidade e a liberdade, em

    conformidade com a soluo de Marx e Engels. A responsabilidade moral

    pressupe necessariamente certo grau de liberdade, mas esta, por sua vez,

    implica tambm inevitavelmente a necessidade causal. Responsabilidade moral,

    liberdade e necessidade esto, portanto, entrelaadas indissociavelmente no ato

    moral.

    CAPTULO VI - OS VALORES

    Todo ato moral inclui a necessidade de escolher entre vrios atos possveis. Ocomportamento moral faz parte da vida cotidiana de todos os indivduos, e as

    preferncias por um ato sobre outro tambm. As preferncias sempre envolvem

    algum juzo de valor sobre os atos.

    1. Que so os valores

    Os valores podem ser atribudos s coisas ou objetos naturais ou produzidos pelo

    homem, bem como podem ser relativos conduta humana, particularmente a

    conduta moral. O objeto valioso no pode existir sem certa relao com um

    sujeito, nem independentemente das propriedades naturais, sensveis e fsicas

    que sustentam seu valor.

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    2. Sobre o valor econmico

    O termo valor deriva da economia. Para que um objeto tenha valor de uso

    deve satisfazer uma necessidade humana, independentemente de ser natural ouproduto do trabalho humano. Quando estes objetos se transformam em

    mercadorias, adquirem duplo valor: de uso e de troca. O valor de troca

    adquirido pelo produto do trabalho humano ao ser comparado com outros

    produtos. O valor de troca da mercadoria indiferente ao seu valor de uso, ou

    seja, independente de sua capacidade de satisfazer uma necessidade humana

    determinada.

    3. Definio do valor

    O valor no propriedade dos objetos em si, mas propriedade adquirida graas

    sua relao com o homem como ser social. Mas, por sua vez, os objetos podem

    ter valor somente quando dotados realmente de certas propriedades objetivas.

    4. Objetivismo e subjetivismo axiolgicos

    O subjetivismo axiolgico pode ser considerado como psicologismo axiolgico,

    visto que reduz o valor de uma coisa a um estado psquico subjetivo. Uma

    pessoa no deseja um objeto porque vale, mas este vale porque desejado.

    De acordo com a posio subjetivista, no existem objetos de valor em si

    independentemente de qualquer relao com um sujeito. Esta tese recusa por

    completo as propriedades do objeto, sejam naturais ou criadas pelo homem.

    A tese do objetivismo axiolgico rejeita o subjetivismo axiolgico e afirma que

    h objetos valiosos em si, independentemente do sujeito. Segundo essa teoria,

    existe uma separao radical entre valor e bem (coisa valiosa) e entre valor e

    existncia humana.

    5. A objetividade dos valores

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    Os valores no existem em si e por si independentemente dos objetos reais

    (cujas propriedades objetivas se apresentam como propriedades valiosas

    humanas e sociais), nem tampouco independentemente da relao com o sujeito(o homem social). Existem com uma objetividade social. Por conseguinte, os

    valores existem unicamente em um mundo social, ou seja,pelo homem epara o

    homem.

    6. Os Valores Morais e No Morais

    Os objetos teis no encarnam valores morais, embora possam encontrar-se

    numa relao instrumental com estes valores. A bondade instrumental ou

    funcional de um objeto est alheia a qualquer qualificao moral, pois pode

    servir de meio ou instrumento para realizar um ato moralmente bom ou um ato

    moralmente mau. Os objetos devem ser excludos do reino dos objetos valiosos

    que podem ser qualificados moralmente. Quando o termo bondade se aplica a

    eles (por exemplo, faca boa) deve ser entendido no sentido axiolgico

    adequado, e no propriamente moral.

    Os valores existem unicamente em atos ou produtos humanos. To-somente o

    que tem um significado humano pode ser avaliado moralmente mas apenas os

    atos realizados livremente, ou seja, de modo consciente e voluntrio. Um

    mesmo produto humano pode assumir vrios valores, embora um deles seja o

    determinante. Por exemplo: uma obra de arte pode ter no s um valor esttico,

    como tambm poltico, moral ou religioso. No entanto, nunca se pretende

    deduzir desses valores o seu valor propriamente esttico.

    Um mesmo ato ou produto humano pode ser avaliado a partir de diversos

    ngulos, podendo realizar diferentes valores. Mas ainda que os valores se juntem

    num mesmo objeto, no devem ser confundidos. Os valores morais se encarnam

    somente em atos ou produtos humanos realizados de modo consciente evoluntrio.

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    CAPTULO VII - A AVALIAO MORAL

    1. Carter concreto da avaliao moralA avaliao moral compreende trs elementos:

    (a) o valor atribuvel

    (b) o objeto avaliado

    (c) o sujeito que avalia

    Numa caracterizao geral da avaliao moral, a avaliao, por ter atribuio de

    um valor constitudo ou criado pelo homem, possui um carter concreto,

    histrico-social. Tambm preciso considerar que se pode atribuir valor moral a

    um ato se e somente se tiver ele conseqncias que afetam a outros

    indivduos, a um grupo social ou sociedade inteira.

    A avaliao sempre atribuio de um valor por parte de um sujeito. Portanto,

    pelo valor atribudo, pelo objeto avaliado e pelo sujeito que avalia, a avaliao

    tem sempre um carter concreto, ou seja, a atribuio de um valor concreto

    numa situao determinada.

    Os itens a seguir se referem ao exame do valor moral fundamental: a bondade.

    2. O bom como valor

    O ato moral pretende ser uma realizao do bom. Comportando-se

    moralmente, os homens aspiram ao bem, isto , a realizar atos moralmente bons.

    Definir o bom implica definir o mau. De uma sociedade para outra, mudam as

    idias sobre o bom e o mau de acordo com as diferentes funes da moral

    efetiva de cada poca, e essas mudanas se refletem sob a forma de novos

    conceitos nas doutrinas ticas. Nos povos primitivos o bom , antes de tudo, a

    valentia, enquanto o mau a covardia. Com a diviso da sociedade em classes,

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    perde o seu significado universal humano. Na Idade Mdia bom o que deriva

    da vontade de Deus.

    Nos tempos modernos, o bom o que concorda com a natureza humanaconcebida de uma maneira universal e abstrata que podemos definir no

    pensamento tico como felicidade, prazer, boa vontade, utilidade. Mas tambm

    pode ser caracterizado como verdade, poder, riqueza e Deus.

    3. O bom como felicidade (eudemonismo)

    Para Aristteles, a felicidade o mais alto dos bens e est no exerccio da razo.

    Isso significa que a felicidade est no alcance somente de uma parte privilegiada

    da sociedade, da qual, refletindo a realidade de sua poca, estavam excludos os

    escravos e as mulheres.

    O pensamento tico moderno sustenta o direito dos homens de serem felizes

    neste mundo, mas concebem a felicidade num plano abstrato, ideal, fora das

    condies concretas da vida social que favorecem ou constituem obstculos para

    a consecuo.

    Ou seja, a tese de que a felicidade o nico bom resulta demasiado geral se no

    se concretiza o seu contedo. Este contedo varia de acordo com as relaes

    sociais que o determinam e a cujos interesses serve. Portanto, no se pode

    considerar como adequada natureza humana em geral a felicidade que

    hoje se reduz s tendncias egostas do indivduo ou ao seu esprito de posse.

    Numa sociedade na qual no vigore o princpio da propriedade privada nem a

    onipotncia do dinheiro, e na qual o destino pessoal no se possa conceber

    separado da comunidade, os homens tero de buscar outro tipo de felicidade.

    4. O bom como prazer (hedonismo)

    As teses bsicas do hedonismo tico, citadas abaixo, consideram prazer no

    sentido de prazeres mais duradouros e superiores, como os intelectuais e osestticos.

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    1. Todo prazer ou gozo intrinsecamente bom.

    2. Somente o prazer intrinsecamente bom.

    3.A bondade de um ato ou experincia depende do (ou proporcional quantidade de) prazer que contm.

    As teses, quantitativas e qualitativas do hedonismo tico reduzem o bom a

    reaes psquicas ou vivncias subjetivas, deduzindo o juzo de valor a partir do

    juzo de fato.

    5. O bom como boa vontade (formalismo Kantiano)

    Kant defende que o bom deve ser algo incondicionado, sem restrio alguma. A

    felicidade est sujeita a certas condies, e se essas no se verificam no se pode

    ser feliz. A boa vontade uma determinao de fazer algo, de ser bom de uma

    maneira absoluta, sem restrio alguma, em toda circunstncia e em todo

    momento, sejam quais forem os resultados ou as conseqncias da nossa ao,

    ou seja, a vontade que age no s de acordo com o dever, mas pelo dever,

    determinada, nica e exclusivamente pela razo.

    Contra esta concepo Kantiana da boa vontade , existem algumas objees

    mas em suma, por seu carter ideal, abstrato e universal, oferece-nos um

    conceito do bom totalmente inexeqvel neste mundo real e, portanto, inoperante

    para a regulamentao das relaes entre os homens concretos.

    6. O bom como til (utilitarismo)

    til para quem? O utilitarismo concebe, portanto, o bom como o til, mas no

    num sentido egosta ou altrusta, e sim no sentido geral de bom para o maior

    nmero de homens.

    Em que consiste o til? A concepo pluralista sustenta que se os bens

    intrnsecos que os nossos atos podem causar no se reduzem a um s, mas a uma

    pluralidade dos mesmos, onde o bom no s uma coisa ou o prazer ou a

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    felicidade mas vrias coisas que podem, ao mesmo tempo, considerar-se como

    boas.

    7. Concluses a respeito da natureza do bom

    Os hedonistas e os eudemonistas consideram que os homens esto dotados de

    uma natureza universal e imutvel, que nos faz procurar o prazer ou a felicidade,

    e exatamente nestes bens fazem consistir o bom. O formalismo Kantiano apela

    para um homem ideal, abstrato e situado fora da histria, cuja boa vontade

    absoluta e incondicionada seria o nico verdadeiro bom. Os utilitaristas pem o

    bom em relao com o interesse dos homens e, ao mesmo tempo, procuram

    encontr-lo em certa relao entre o particular e o geral.

    A relao entre o indivduo e a comunidade varia com o tempo e com as

    diferentes sociedades. Na sociedade moderna o bom s pode ocorrer realmente

    na superao da ciso entre o indivduo e a comunidade, ou na harmonizao

    dos interesses pessoais com os verdadeiramente comuns ou universais.

    A realizao do bom na superao do crculo estreito dos interesses

    exclusivamente pessoais, no significado social da atividade do indivduo, do

    trabalho ou do estudo e na transformao das condies sociais, acarreta uma

    peculiar relao determinada pela estrutura social. O egosmo e suas opostas

    manifestaes solidariedade, cooperao e ajuda mtua so encorajadas ou

    obstaculizadas de acordo com as condies concretas nas quais vivem os

    homens. Por isso, o problema do bom como conjuno dos interesses pessoais e

    dos interesses coletivos inseparvel do problema das bases e das condies

    sociais que tornam possvel a sua realizao.

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    CAPTULO VIII - A OBRIGATORIEDADE MORAL

    O comportamento moral um comportamento obrigatrio e devido. A

    obrigatoriedade moral impe deveres ao sujeito. Toda norma funda um dever.

    1. Necessidade, Coao e Obrigatoriedade Moral

    A obrigatoriedade moral no pode ser confundida com a simples necessidade

    causal e tampouco com a coao externa ou interna. Estas formas de

    obrigao tornam impossvel a verdadeira obrigao moral.

    2. Obrigao Moral e Liberdade

    A obrigao moral supe necessariamente uma liberdade de escolha, bem como

    na determinao do comportamento, orientando-o numa certa direo. A

    obrigao moral deve ser assumida livre e internamente pelo sujeito e no

    imposta de fora.

    3. Carter Social da Obrigao Moral

    O fator social essencial na obrigao moral, mas no algo estritamente

    individual, mas tambm social.

    4. A Conscincia Moral

    A conscincia moral acarreta uma compreenso dos nossos atos, mas sob o

    ngulo especfico da moral. Alm disso, o conceito de conscincia est

    estreitamente relacionado com o de obrigatoriedade, posto que implica em

    avaliar e julgar nosso comportamento de acordo com certas normas conhecidas e

    reconhecidas como obrigatrias. A conscincia moral dos indivduos, por ser um

    produto histrico-social, est sujeita a um processo de desenvolvimento e de

    mudana.

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    5. Teorias da Obrigao Moral

    As teorias da obrigao moral nos respondem questo de como devemos agir,

    ou que tipo de atos somos moralmente obrigados a realizar.As duas teorias predominantes so: (i) a denominada deontolgica (de don:

    dever) quando a obrigatoriedade de uma ao no depende das conseqncias

    da prpria ao ou da norma com a qual se conforma; e (ii) a chamada

    teleolgica (de telos: fim), quando a obrigatoriedade de uma ao deriva

    unicamente de suas conseqncias.

    Teorias da A) Deontolgicas a) do ato

    obrigao moral b) da norma

    B) Teleolgicas a) egosmo tico

    b) utilitarismo 1) do ato

    2) da norma

    6. Teorias Deontolgicas do Ato

    H consenso entre as teorias deontolgicas no sentido de que no se pode apelar

    para uma norma geral a fim de decidir o que devemos fazer em cada situao

    especfica.

    7. Teorias Deontolgicas da Norma (A Teoria Kantiana da Obrigao

    Moral)

    Em cada caso particular, o dever deve ser determinado por normas vlidas

    independentemente das conseqncias de sua aplicao.

    Pode-se dizer que os indivduos agem realmente por dever e no obedecendo a

    uma inclinao ou interesse por temor ou castigo, quando agem como seresracionais. A exigncia da razo assume a forma de um mandamento, ou um

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    imperativo, que Kant divide em categricos e hipotticos. Os categricos rejeita

    atos que no podem ser universalizados, e no admite exceo a favor de

    ningum. A teoria kantiana de obrigao moral inoperante e inexeqvel para ohomem real.

    8. Teorias Teleolgicas (egosmo e utilitarismo)

    Estas teorias tm em comum o relacionar a nossa obrigao moral com as

    conseqncias da nossa ao, ou seja, com o benefcio que podem trazer, para

    ns ou para os demais. A tese fundamental do egosmo tico, defendida por

    Thomas Hobbes e outros, a seguinte: cada um deve agir de acordo com o seu

    interesse pessoal, promovendo o que bom ou vantajoso para si. Entretanto, as

    observaes empricas fazem com que esta teoria no se sustente, posto que no

    explica os atos praticados a favor do prximo em detrimento de si prprio. Ao

    contrrio, o utilitarismo se baseia em que devemos visar, acima de tudo, o

    benefcio dos outros. O utilitarismo se divide em utilitarismo do ato e da norma.

    9. Utilitarismo do Ato e Utilitarismo da Norma.

    Esta doutrina defende que devemos fazer aquilo que traz melhores resultados

    para o maior nmero. Para aplicar esta tese aos casos concretos, em certo ponto

    ter de ser feita a opo entre: fazer o maior bem para menor nmero de pessoas,

    ou menor bem para um maior nmero de pessoas. Entretanto, h muitas

    objees de vrias naturezas ao utilitarismo da norma, que o obrigam a passar do

    geral ao particular e deste quele numa espcie de crculo vicioso. O utilitarismo

    da norma acaba coincidindo com a teoria deontolgica kantiana da obrigao

    moral.

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    10. Concluses relativas Obrigatoriedade Moral

    1) O defeito comum das teorias da obrigao moral consiste em partirem elas

    de uma concepo abstrata do homem, fazendo com que a concepo daobrigatoriedade moral tambm seja abstrata, alheia sociedade e histria.

    2) A obrigao moral deve ser concebida como prpria de um homem concreto

    que, na sua prtica moral real, vai modificando o contedo de suas obrigaes

    morais de acordo com as mudanas que se verificam no modo como a moral

    cumpre a sua especfica funo social.

    3) A obrigatoriedade moral exige, em maior ou menor grau, uma adeso ntima,

    voluntria e livre dos indivduos s normas que regulam as suas relaes numa

    determinada comunidade. Por isto, o conceito de obrigatoriedade moral s tem

    sentido no contexto da vida social, no seio de uma comunidade.

    4) O sistema de normas, e com isto, o contedo da obrigao moral muda,

    historicamente, de uma sociedade para outra e, inclusive, no seio de uma mesma

    comunidade. O permitido hoje foi proibido ontem. O que atualmente se probe,

    talvez seja permitido amanh. Contudo, seja qual for a poca ou a sociedade de

    que se trate, os homens sempre admitiram uma obrigatoriedade moral. Sempre

    existiu um sistema de normas que define os limites do obrigatrio e do no

    obrigatrio.

    5) No somente o contedo da obrigao moral que se modifica histrica e

    socialmente e, com ele, as normas que prescrevem determinada forma de

    comportamento , mas se modifica tambm o modo de interiorizar ou de

    assumir as normas em forma de deveres.

    6) Nenhuma teoria e ainda menos aquela que no conceba a obrigatoriedade

    moral em funo de necessidades sociais pode indicar o que o homem deve

    fazer em todos os tempos e em todas as sociedades. E, quando uma teoria faz

    semelhante tentativa, fica-se diante do formalismo ou universalismo abstrato, no

    qual caem no somente as doutrinas deontolgicas (kantiana) mas tambm asteleolgicas (como a do utilitarismo da norma).

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    CAPTULO IX - A REALIZAO DA MORAL

    Por realizao da moral, h que se entender a encarnao dos princpios, valores

    e normas de comportamento de uma dada sociedade, no mbito coletivo e no s

    no individual, ou seja, como processo social.

    1. Os Princpios Morais Bsicos

    Em cada poca a realizao da moral inseparvel de alguns princpios bsicos

    ou regras bsicas de comportamento cuja elaborao se d na atividade

    prtica social e que regem efetivamente o comportamento das pessoas.

    Tais princpios tm duas caractersticas: de um lado, respondem a uma

    determinada necessidade social, e do outro, por serem propriamente

    fundamentais, servem de fundamento para as normas que regulamentam o

    comportamento em certo sentido em uma sociedade.

    Embora o aspecto pragmtico seja primordial nos referidos princpios morais,

    estes tambm podem ser objeto de uma elaborao terica, cuja finalidade

    fundamentar sua validade.

    Em tempos de crise social, certos princpios morais bsicos tambm podem

    entrar em crise, que solucionada quando tais princpios so substitudos por

    outros mais adequados s novas exigncias sociais. Entretanto, enquanto tal

    substituio no ocorre, pode reinar durante algum tempo uma situao de

    confuso e incerteza como se pode observar em nossa sociedade atualmente.

    Como a realizao da moral a concretizao de certos princpios, estes

    guardam relao com as condies sociais s quais se referem, e mudam de

    tempos a tempos para atender s aspiraes e interesses que os inspiram.

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    2. A Moralizao do Indivduo

    O ato moral implica conscincia e liberdade. O verdadeiro agente moral o

    indivduo, mas enquanto ser social, e no considerado na sua individualidade.A realizao da moral uma tarefa individual, mas, dada a natureza social do

    indivduo, no um assunto meramente individual. O conjunto de formas

    caractersticas de comportamento peculiares de cada indivduo, que formam uma

    unidade indissolvel, constituem o carter de uma pessoa; o carter algo

    adquirido, modificvel e dinmico. O indivduo pode adquirir uma srie de

    qualidade morais sob o influxo da educao e da prpria vida social e tais

    qualidades morais, quando realizadas numa situao concreta, so designadas

    virtudes.

    3. As Virtudes Morais

    A virtude supe uma disposio estvel ou uniforme de comportar-se

    moralmente de maneira positiva; isto , de querer o bem. O seu oposto o vcio,

    enquanto disposio tambm uniforme de querer o mal. Vale lembrar o

    ensinamento de Aristteles, segundo o qual a virtude um hbito.

    4. A Realizao Moral como Empreendimento Coletivo

    H trs tipos de fatores sociais que contribuem de forma diversa para a

    realizao da moral:

    a) Relaes econmicas, ou vida econmica da sociedade.

    b) Estrutura ou organizao social e poltica da sociedade.

    c) Estrutura ideolgica, ou vida espiritual da sociedade.

    5. A Vida Econmica e a Realizao da Moral.

    A Vida Econmica da sociedade compreende a produo material de bens

    destinados a satisfazerem as necessidades humanas: alimentar-se, vestir-se,morar, etc. Compreendem-se tambm como as relaes sociais que os homens

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    contraem nas relaes de produo, por exemplo, na medida em que o

    trabalhador uma fora produtiva e na medida em que a produo satisfaz suas

    necessidades vitais.

    Dentro das foras produtivas surgem problemas morais que no podem ser

    descuidados. Como o homem afetado pelo seu trabalho? Eleva-o como ser

    humano ou o degrada? De que forma o uso dos meios ou instrumentos de

    produo afetam o trabalhador em sua verdadeira natureza? Os problemas

    morais da vida econmica surgem quando o homem tratado como uma pea de

    um sistema econmico, o homem econmico; tal fato conflitante, j que no

    se pode desprezar o ser humano concreto.

    Significao Moral do trabalho humano o trabalho como expresso exclusiva

    da atitude humana tem em si um sentido moral, dado o fato de que o homem

    deve trabalhar para ser verdadeiramente homem. Quem trabalha possui uma

    humanidade que no lhe pertence, pois no contribui para conquistar e

    enriquecer. Este um caso onde o valor mudou com o passar do tempo: na

    Grcia Antiga, o valioso era o cio fsico, e o trabalho era tido como de menor

    categoria; exaltavam-se o estudo e a pesquisa.

    Na Modernidade h o problema do trabalho alienado, pois o operrio no v no

    seu trabalho uma atividade realmente sua mas sim um empobrecimento material

    e espiritual. Neste caso o trabalho perde o seu contedo vital e criador,

    propriamente humano, e com isso se atenua tambm a significao moral.

    Moral e Consumo observa-se ainda a alienao do consumidor, o homem

    econmico no somente produtor, mas tambm o consumidor, que,

    pressionado pela propaganda, cria em si necessidades que no so propriamentesuas e adquire produtos que realmente no lhe so queridos. Assim como no

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    trabalho alienado o homem real no pertence a si mesmo, mas queles que o

    manipulam ou o persuadem de modo sutil, podemos apontar duas graves

    conseqncias: primeiramente, o homem como consumidor rebaixado condio de coisa ou objeto manipulvel; em segundo lugar, impedido de suas

    escolhas livre e conscientemente, minam-se as bases do ato moral, restringindo-

    lhe seu domnio moral.

    Avaliao Moral da Vida Econmica numa sociedade na qual o trabalho

    antes de tudo um meio para subsistir e no uma necessidade humana vital, na

    qual domina o culto ao dinheiro e na qual um sujeito avaliado pelo que possui

    privadamente, tendo portanto a economia a sua moral apropriada.

    6. A Estrutura Social e Poltica e a Vida Moral

    A Famlia chamada clula social, nela em que se inicia o processo de

    educao e formao da personalidade, e por isso tem grande importncia do

    ponto de vista moral. A famlia conservar um elevado valor moral para si e

    para a sociedade se for uma comunidade livre, no egosta, amorosa e racional.

    As Classes Sociais os indivduos tm interesses e aspiraes comuns como

    membros de uma mesma classe social, e isso se d de forma independente da

    conscincia do indivduo. O fato de uma classe social se relacionar com uma

    moral determinada no descaracteriza o comportamento individual livre,

    consciente e responsvel. Porm, mesmo com as escolhas prprias e livres, o

    meio social no qual um indivduo vive tem grande influncia, j que cria

    obstculos ou favorece a realizao da moral numa determinada sociedade.

    O Estado como instituio social, exerce poder efetivo sobre os membros da

    sociedade. Nenhum Estado renuncia a vestir com um manto moral a sua ordem

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    jurdica, poltica e social, no excluindo a possibilidade de o prprio Estado

    entrar em contradio com a moral devido s suas finalidades polticas.

    Conclui-se, portanto, que seja favorecendo uma moral que lhe garante um apoio

    mais profundo e sincero do que o meramente externo ou formal, seja

    fomentando a privatizao da mesma, o Estado sempre influencia, em um

    sentido ou em outro, a realizao da moral.

    7. A Vida Espiritual da Sociedade e a realizao da Moral

    Nem s a produo material e as relaes aqui implicadas esgotam a realizao

    da Moral. Em toda comunidade existem idias dominantes de diversas ordens e

    uma srie de instituies que as difundem e realizam. So idias polticas,

    estticas, jurdicas, instituies culturais e educativas, meios de comunicao de

    massa. Mas, embora o indivduo viva nesta atmosfera moral apresentada, legada

    pela tradio e costumes, no significa que esteja privado por completo da

    capacidade de decidir por si s. Atualmente tal fato tem crescido de maneira

    acentuada, visto que a mdia massifica padres de moral no visando o

    desenvolvimento humano, e sim o lucro.

    CAPTULO X - FORMA E JUSTIFICAO DOS JUZOS MORAIS

    1. A Forma Lgica dos Juzos Morais

    A conformidade do comportamento com normas e regras, se expressam sob a

    forma de juzos e estes podem assumir formas lgicas denominadas:

    a) Enunciativas : x y;

    b) Preferenciais : x preferencial a y ; ec) Imperativas : Deves fazer x

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    2. Formas Enunciativas, Preferenciais e Imperativas

    a) formas enunciativasPode ser um juzo factual, por exemplo: Pedro alto ou um juzo de valor,

    p.ex.: Pedro justo, pois ser justo no uma qualidade natural, como sua

    altura, mas decorre da relao com uma necessidade ou finalidade.

    b) formas preferenciais

    uma forma particular do juzo de valor, sob a forma de comparao, pela qual

    se estabelece a valorao de x em relao a y, podendo se tratar de juzo de

    contedo moral, p.e.: prefervel enganar um doente a dizer-lhe a verdade e

    no moral, p.e.: Este trabalho prefervel quele outro.

    A preferibilidade evidencia o ser mais valioso de x em relao a y, sendo,

    portanto, inseparvel do valor, pois no so considerados entre si, mas em

    relao a certa necessidade ou finalidade humana, considerando determinadas

    condies ou circunstncias concretas.

    c) formas imperativas

    Inicialmente cabe observar que para a forma imperativa ou normativa, diferente

    das anteriores, que podem se referir a atos j realizados ou objetos existentes ou

    a atos que se realizam ou objetos inexistentes, h uma exigncia de realizao:

    algo que no ou no existe deve ser realizado. Assim, o juzo assume a forma

    de um mandamento ou exortao a que se faa alguma coisa.

    Os juzos imperativos tambm so inseparveis dos juzos de valor, pois aquilo

    que se julga que deve ser realizado sempre considerado valioso. Assim, os

    juzos que tm esta forma (lgica normativa ou imperativa), destinam-se a

    regular as relaes entre os homens em uma sociedade e esta forma no

    exclusiva de normas morais. Tm a mesma forma lgica (exortativa ou

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    imperativa), mas um contedo diferente. No poderamos distinguir os juzos

    morais dos que no o so, apenas por sua forma lgica,

    Assim, pela sua forma lgica, os juzos morais podem ser enunciativos,preferenciais ou normativos. Mas, para distinguir o que h neles de especfico,

    ou seja, o que os distingue daqueles que tm a mesma forma lgica, necessrio

    examinar seu significado e sua natureza ou funo.

    3. Significado do Juzo Moral

    necessrio verificar se a avaliao dos atos e normas morais que assumem,

    respectivamente, a forma de juzos de valor ou de juzos normativos

    desempenha funo cognoscitiva, corresponde a fatos objetivos e se pode ser

    verificada.

    No entanto, necessrio que passemos pela justificao do significado dos

    juzos morais, isto , o das razes da sua validade, mesmo porque, sem

    justificao para a variedade e diversidade de juzos morais entre pocas, entre

    sociedades e at mesmo dentro de uma mesma sociedade, fica-se sujeito a

    ameaa de um inimigo implacvel no terreno moral: o relativismo.

    Por isso, examinaremos primeiro os problemas do significado ou da natureza

    dos juzos morais e dos seu possveis critrios de justificao, para em seguida

    tratar no problema crucial do relativismo tico.

    4. A Teoria Emotivista

    A teoria emotivista afirma que nos juzos morais no se afirma sobre fatos,

    propriedades ou qualidades, mas se expressa uma atitude emocional subjetiva

    (Ayer) ou se procura provocar em outros determinado efeito emotivo

    (Stevenson).

    Assim, os juzos morais no podem surgir de um estado emocional do sujeito,mas responde a necessidades e finalidades sociais, sem as quais no teria

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    sentido. Portanto, no poderia existir o juzo normativo respeita os bens dos

    outros numa comunidade primitiva, baseada na propriedade coletiva ou social

    dos bens.Se tudo igualmente vlido e tem a mesma justificao do ponto de vista moral,

    a conseqncia lgica no pode ser seno essa: tudo permitido. Encontrar-

    nos-amos, assim, em pleno amoralismo.

    5. O Intuicionismo tico

    Diferentemente dos emotivistas, os intuicionistas ticos admitem que os juzos

    morais, que incluem o termo bom, ou que determinam deveres, atribuem

    propriedades e atos, pessoas ou coisas e que, neste sentido, dizem algo que pode

    ser considerado verdadeiro ou falso. Em contraposio aos naturalistas ticos, os

    intuicionistas sustentam que a bondade e a obrigatoriedade no podem ser

    observadas empiricamente. O bom indefinvel e os deveres fundamentais nos

    so impostos sem necessidade de prova, como algo evidente por si, isto , so

    captados de maneira direta e imediata: por meio da intuio. Portanto, os juzos

    morais so intuitivos, logo, podemos consider-los verdadeiros, estando acima

    da necessidade de provas emprica ou racional. Entretanto, esta justificao

    enfrenta vrias objees.

    Assim, o intuicionismo, ao sustentar que os juzos morais se referem a

    propriedades no naturais apreendidas direta e imediatamente, no admite a

    possibilidade de que eles possam ser justificados racional e objetivamente, ou

    seja, que possam apresentar razes em favor de sua validade.

    6. A Justificao Racional dos Juzos Morais

    A prpria natureza da moral, tanto mais quanto mais se eleva e enriquece no

    decurso do seu desenvolvimento histrico, exige uma justificao racional e

    objetiva dos juzos morais. Nas primeiras fases do desenvolvimento social, ounas sociedades primitivas, que possuem uma moral tambm primitiva,

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    encontramos indivduos com reduzida capacidade de interiorizao: acomodam-

    se s normas mais pela fora da tradio, do que por convico ntima. O

    cdigo moral aceito, em geral, sem necessidade de justificao.A medida, porm, que se percorre o desenvolvimento histrico-social da

    humanidade, sua moral se torna cada vez mais necessria, para que possa

    cumprir mis firmemente sua funo social reguladora. A passagem da moral dos

    costumes e tradies, para uma moral reflexiva, autnoma e humanista, fica

    evidente na crescente necessidade de uma justificao racional das normas e

    atos morais.

    O verdadeiro comportamento mora, portanto, no termina no reconhecimento de

    uma norma, mas exige a justificativa racional das mesmas. E aqui que a tica,

    como teoria, ajuda a abrir caminho para uma moral mais elevada e, sobretudo,

    identificando a possvel justificao racional da moral, dos seus juzos de

    valores e das suas normas, bem como solucionando o problema de quais seriam

    as razes ou os critrios justificativos que se poderiam aduzir.

    Assim, rejeitas as respostas do emotivismo e do intuicionismo, continua a

    necessidade de justificar-se racionalmente os juzos morais.

    7. A Guilhotina de Hume

    A propsito de se obter uma justificao racional dos juzos, deduzindo-se algo

    que de algo que deve ser, morais, o que h tempo se proclama caminho

    fechado, costuma-se citar a seguinte passagem de Hume (do seu Tratado do

    entendimento humano):Em todos os sistemas de moralidade que examinamos at agora se ter notado sempre que o autor, porcerto tempo, exprime-se de uma maneira habitual, e estabelece a existncia de Deus, ou faz comentriossobre os assuntos humanos; mas de repente surpreende deparar com o fato de que em lugar dos verboscopulativos ser e no ser entre as proposies no h mais nenhuma proposio que no estejaligada por um devia ou no devia. Esta mudana imperceptvel; contudo, de grande importncia.Porque, dado que esse devia ou no devia expressa uma nova relao ou afirmao, necessrio quese analise e se explique; e, ao mesmo tempo que se d alguma razo de algo que parece inconcebvel, serpreciso que nos expliquem como esta nova relao pode ser uma deduo de outras que so totalmentediferentes.

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    Este argumento considerado to demolidor que chamado por Max Black de

    a guilhotina de Hume. Tudo que pretende passar de um para um deve ser,

    ter que cair sob esta guilhotina. E o que cai sob ela a tentativa de deduziruma concluso que inclua algo no contido na premissa (um deve serde um ),

    o que ilegtimo do ponto de vista lgico, mas que no significa que o reino do

    dever ser no tenha nenhuma relao com o mundo do ser.

    Pode-se aceitar que a norma moral no pode ser identificada com o mero

    registro de um fato, e portanto no podem justificar-se pelo comportamento dos

    membros da comunidade. Pode acontecer que tal comportamento no se

    verifique na realidade, e que os indivduos atuem em contradio com elas, o

    que no as invalida.

    Assim, a impossibilidade lgica de que um juzo moral normativo (um dever

    ser) seja deduzido de um juzo factual (um ), no quer dizer que fique

    suspensa no ar como se nada tivesse a ver com os fatos. Embora as normas no

    derivem logicamente dos fatos, recorre-se a eles para compreender sua

    existncia.

    8. Critrios de Justificao Moral

    Os cinco critrios de justificao moral (social, prtica, lgica, cientfica e

    dialtica), no consideram a norma moral absoluta, sobre-humana ou atemporal,

    mas sim como produto humano que existe, vale e se justifica como nexo de

    relaes.

    I) A Justificao Social: Toda norma corresponde a interesses e necessidades

    sociais. A validade de uma norma inseparvel de sua necessidade social,

    sendo inoperante, caso entre em contradio com ela, no se justificando no

    mbito da comunidade. Logo, numa comunidade em que se verifica a

    necessidade x ou o interesse y, justifica-se a norma que exige o comportamentoadequado.

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    II) A Justificao Prtica: Toda norma implica numa exigncia de realizao,

    sendo, portanto, o guia de uma ao. A norma moral, por sua vez, exige certascondies reais para o seu cumprimento, e s pode ser justificada se se verificam

    as condies reais para que a sua aplicao no se oponha s necessidades da

    comunidade. Logo, numa determinada comunidade na qual se verificam as

    condies necessrias, justifica-se a norma que corresponde a tais condies.

    III) A Justificao Lgica: As normas no existem isoladas, mas formam parte

    de um conjunto articulado ou sistema, que constituem o que se chama de

    cdigo moral da comunidade, que deve apresentar coerncia interna e,

    portanto, sem contraditoriedade. Logo, uma norma se justifica logicamente se

    demonstra a sua coerncia e no-contraditoriedade com respeito s demais

    normas do cdigo moral do qual faz parte.

    IV) A Justificao Cientfica: Uma norma se justifica cientificamente quanto se

    adapta aos conhecimentos cientficos estabelecidos, ou pelo menos no entrem

    em contradio com aqueles j comprovados.

    Logo, dado o nvel de conhecimento alcanado pela sociedade, uma norma

    moral se justifica cientificamente somente se baseada nesses conhecimentos ou

    compatveis com os mesmos.

    V) A Justificao Dialtica: A histria moral tem um sentido ascensional,

    portanto, uma norma ou cdigo moral se justificam pelo lugar que ocupam

    dentro deste movimento progressivo. Na medida em que uma norma se

    apresenta como um degrau ou uma fase do progresso de universalizao da

    moral, e no como algo esttico e imutvel, possvel falar de uma justificao

    dialtica. Logo, uma norma moral se justifica dialeticamente quando contm

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    aspectos ou elementos que, no processo ascensional moral, se integram em um

    novo nvel numa moral superior.

    9. A Superao do Relativismo tico

    O relativismo tico parte do princpio de que diferentes comunidades julgam de

    maneira diferente o mesmo tipo de atos, proclamando, portanto, que os juzos

    morais, relativos a diferentes grupos sociais, justificam-se pelo contexto social.

    Alm disto, considera-os corretos, mesmo que diferentes ou opostos, porque

    correspondem a necessidades e interesses de suas respectivas comunidades.

    Assim, cada juzo moral ficaria justificado por esta referncia e, portanto, todos

    seriam igualmente vlidos. possvel superar esta idia?

    Existe um progresso rumo a uma moral universal e humanista, a partir das

    morais primitiva, passando pelas morais de classe, com suas limitaes. Fala-se

    de elevao a nveis morais mais altos na medida em que se afirmam os aspectos

    morais: domnio de si mesmo, deciso livre e consciente, responsabilidade

    pessoal, harmonizao do indivduo e do coletivo, etc.

    Estes aspectos do comportamento moral define o lugar ocupado por uma norma

    dentro do processo histrico-moral, e permite compreender se sua validade

    caducou ou se conserva no processo. Permite, ainda, justificar dialeticamente a

    validade de uma norma diante de outra que postulem atos humanos

    diametralmente opostos. Tal justificao dialtica nos impede de situar normas

    diversas, relativas a diferentes comunidades ou a diversas pocas, no mesmo

    plano, considerando-as igualmente vlidas.

    Conclui-se que a relatividade da moral no acarreta necessariamente um

    relativismo, dado que nem todas as morais se encontram no mesmo plano,

    porque nem todas tm a mesma validade.

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    CAPTULO XI - DOUTRINAS TICAS FUNDAMENTAIS

    1. tica e HistriaAs doutrinas ticas fundamentais nascem e se desenvolvem em diferentes

    pocas e sociedades com respostas aos problemas bsicos apresentados pelas

    relaes entre os homens, e particularmente pelo seu comportamento moral

    efetivo. Por isso, as doutrinas ticas devem ser consideradas dentro de um

    processo histrico de mudana e sucesso. Quando muda radicalmente a vida

    social, muda tambm a vida moral e os princpios, valores ou normas acabamsendo substitudos por outros.

    2. tica Grega

    A tica, analisada quer sob um aspecto descritivo-cientfico quer sob um aspecto

    prescritivo-normativo, no pode ser desvinculada do contexto social em que

    pensada e praticada. Destarte, a cada momento histrico corresponde umacorrente filosfica que traz em si uma concepo peculiar do que seja a tica e a

    moral. No s isso, lembra Vzquez, mas as doutrinas, para alm da

    correspondncia que possuem com seu contexto histrico, poltico e econmico,

    correlacionam-se entre si, negando-se e confirmando-se umas s outras.

    Os primeiros estudos sistematizados da tica e da moral no Ocidente datam da

    antiga civilizao grega. Uma particularidade comum s diversas correntes que

    ali tiveram o seu nascimento certamente o vis poltico dado aos conceitos de

    tica e moral. De fato, o surgimento e o apogeu das chamadas cidades-estados

    influenciaram sobremaneira o pensamento dos principais pensadores da poca.

    Os sofistas, corrente filosfica anterior a grande reviravolta realizada pelo

    pensamento socrtico, deram o primeiro passo dos gregos naquela direo do

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    pensamento ocidental que teve seu nascimento oficial com Scrates, qual seja, a

    de um abandono de uma abordagem naturalista do conhecimento e a busca de

    um conhecimento que tem no homem a sua origem.Assim, os sofistas trocaram a preocupao de se tentar entender o mundo, o

    universo e seu funcionamento e passaram a concentrar esforos na compreenso

    e no estudo do homem. Tratava-se, contudo, da busca de um saber prtico, que

    pudesse ser utilizado na prtica. Chegaram, neste sentido, a desenvolver a arte

    da retrica, ferramenta discursiva disposio dos homens que participavam do

    campo poltico.

    Scrates retomar a abordagem antropolgica (centrada no homem) dos sofistas

    e desenvolvera sua prpria corrente. No campo da tica e da moral, as idias

    bsicas de seu pensamento so as de que a felicidade constitui o fim ltimo do

    homem, esta somente alcanada atravs da prtica do bem e, finalmente,

    somente o homem que ignora o bem pratica o mal.

    J Plato, discpulo de Aristteles, introduz um vis poltico claro em suas

    concepes de tica e moral. Seu pensamento caracteriza-se por uma concepo

    dualstica do mundo, que estaria dividido no mundo perfeito das idias e no

    mundo imperfeito das sensaes, e tripartida da alma, que seria composta pela

    razo, vontade e apetite. Segundo Plato, o aperfeioamento da alma estaria em

    certas virtudes cuja prtica teriam relao com o desenvolvimento de cada uma

    destas partes da alma.

    Neste sentido, a prudncia desenvolveria a razo, a fortaleza desenvolveria a

    vontade e, finalmente, a temperana desenvolveria o apetite.

    Aristteles, discpulo de Plato, desenvolveu a teoria do ato e da potncia. Todo

    ser ato de si mas potncia de algo vindouro. Destarte, uma semente ato de si,

    mas potncia de uma futura rvore. O homem, nesta concepo, ato de simas potncia de algo superior, algo que o fim ltimo de sua existncia. Para

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    Aristteles, este fim seria um estado de plena felicidade, alcanvel somente

    atravs da meditao terica e da prtica de virtudes. importante ressaltar que

    o filsofo de Estagira concebia as virtudes como sendo o meio-termo deextremos absolutos. Assim, por exemplo, a virtude justia o meio termo entre

    o egosmo e o esquecimento.

    Tanto Plato quanto Aristteles postulavam que a vida moral s poderia ganhar

    efetividade no espao e no cotidiano das cidades-estados, da, portanto, o forte

    vis poltico de suas teorias ticas.

    3. tica Crist Medieval

    Aps uma longa luta, o cristianismo transforma-se na religio oficial de Roma

    (sc. IV), impondo seu domnio durante dez sculos.

    Com a runa do mundo antigo, o regime de escravido d espao para o de

    servido, organizando-se, com base neste, a sociedade medieval como um todo.

    Tal sociedade era caracterizada por sua estratificao e hierarquizao, bem

    como uma profunda fragmentao econmica e poltica.

    Neste contexto, a religio crist garante a unidade social desta sociedade, uma

    vez que a Igreja comanda a vida intelectual e espiritual de todos. Todos os

    aspectos da vida medieval so carregados de contedo religioso.

    A tica Religiosa

    A filosofia crist parte de um conjunto de verdades a respeito de Deus, que

    concebido como um ser bom, onisciente e todo-poderoso, criador do mundo e do

    homem. Assim, tudo o que o homem define-se no em relao comunidade

    humana, ou ao universo, mas, antes de tudo, em relao a Deus. A essncia da

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    felicidade a contemplao de Deus; o amor humano subordinado ao divino, e

    a ordem sobrenatural tem a primazia sobre a ordem natural humana.

    O cristianismo pretende elevar o homem de uma ordem terrestre para uma

    ordem sobrenatural, na qual possa viver uma vida plena, feliz e verdadeira, sem

    as desigualdades e injustias terrenas.

    Segundo a tica crist, todos os homens so iguais perante Deus. Esta mensagem

    de igualdade confrontava-se com a realidade de um mundo social em que os

    homens conviviam com a mais espantosa desigualdade: escravos e homens

    livres, servos e senhores feudais, etc. A igualdade prometida, porm, deve ser

    concebida em um plano espiritual. Na Idade Mdia, a igualdade s podia ser

    espiritual, por isso ela coexistia com a mais profunda desigualdade social,

    enquanto no fossem criadas as condies sociais para uma igualdade efetiva.

    Ou seja, quando era completamente ilusrio e utpico propor-se a realizao de

    uma igualdade real entre os homens, a mensagem crist tinha um profundo

    contedo moral, lanando os objetivos da vida terrena para alcanar umasociedade justa no mundo espiritual.

    O fim supremo da tica crist regular o comportamento dos homens visando

    ordem sobrenatural. Assim, o fim ou valor supremo colocado fora do homem,

    isto , em Deus.

    A religio crist oferece aos homens certos princpios supremos morais que, por

    virem de Deus, tm para ele o carter de imperativos absolutos eincondicionados.

    A tica Crist Filosfica

    O cristianismo no filosofia, mas religio. Apesar disto, faz-se filosfica na

    Idade Mdia para justificar, atravs da razo, o domnio das verdades reveladas.

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    Naquele tempo, dizia-se que a filosofia serva da teologia. Assim, subordinava-

    se, tambm, a tica teologia.

    Na elaborao conceitual dos problemas filosficos em geral, e morais em

    particular, aproveita-se a herana da Antigidade (particularmente de Plato e

    Aristteles), submetendo-a a um processo de cristianizao.

    Santo Agostinho incorpora as idias de Plato de purificao da alma e sua

    ascenso libertadora at eleva-se contemplao das idias, mas transforma-as

    na elevao ctica at Deus, culminando no xtase de felicidade que no pode

    ser alcanada neste mundo. A tica agostiniana se contrape ao racionalismo

    tico dos gregos ao sublinhar o valor da experincia pessoal, da interioridade, da

    vontade e do amor.

    So Toms de Aquino sustenta uma tica baseada na de Aristteles, porm

    tambm cristianizando sua moral e sua filosofia. Deus o bem objetivo ou fim

    supremo, cuja posse causa felicidade, que um bem subjetivo. E nesse ponto

    que ele se afasta de Aristteles, pois para este a felicidade o bem ltimo. Mas,assim como Aristteles, a contemplao, o conhecimento (como viso de Deus),

    o meio mais adequado para alcanar o fim ltimo. Atm-se tese do homem

    como ser social ou poltico e inclina-se para uma monarquia moderada, ainda

    que considere que todo o poder derive de Deus e o poder supremo caiba Igreja.

    4. A tica Moderna a tica dominante desde o sculo XVI at princpios do sculo XIX, com

    tendncia antropocntrica, e que atinge seu ponto culminante na tica de Kant.

    I.A tica Antropocntrica no Mundo Moderno

    A tica moderna cultivada na nova sociedade que sucede sociedade feudal da

    Idade Mdia, a qual se caracteriza por mudanas econmicas (desenvolvimentodas relaes capitalistas de produo); sociais (fortalecimento da burguesia, que

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    se preocupa com a extenso de seu poder econmico e luta para impor a sua

    hegemonia poltica atravs de uma srie de revolues); estatais (criao de

    grandes Estados modernos, nicos e centralizados); e religiosas (a religio deixade ser a forma ideolgica dominante).

    Nessa nova sociedade o homem adquire um valor pessoal, no s como ser

    espiritual, mas tambm como ser corpreo, sensvel; e no s como ser dotado

    de razo, mas tambm de vontade.

    O homem aparece no centro da poltica, da cincia, da arte e da moral. H a

    transferncia do centro de Deus para o homem, que se apresenta como o

    absoluto.

    II.A tica de Kant

    a mais perfeita expresso da tica moderna. O ponto de partida da tica de

    Kant ofactum (o fato) da moralidade. O problema da moralidade exige que se

    proponha a questo do fundamento da bondade dos atos, ou em que consiste o

    bom. Para Kant, o nico bom em si mesmo a boa vontade. A bondade de uma

    ao no se deve procurar em si mesma, mas na vontade com que se fez. boa a

    vontade que age por puro respeito ao dever.

    Se o homem age por puro respeito ao dever e no obedece a outra lei a no ser a

    que lhe dita a sua conscincia moral, legislador de si mesmo (como pessoa

    moral). Sendo assim, para Kant, parece profundamente imoral tomar o homem

    como o meio, porque todos os homens so fins em si mesmos e, como tais,

    fazem parte do mundo da liberdade ou do reino dos fins.

    Por conceber o comportamento moral como pertencente a um sujeito autnomo

    e livre, ativo e criador, Kant o ponto de partida de uma filosofia e de uma tica

    na qual o homem se define antes de tudo como ser ativo, produtor ou criador.

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    5. A tica Contempornea

    Incluem-se aqui no apenas as ticas atuais, mas as que continuam tendo

    influncia desde seu surgimento no sculo XIX como as de Kierkegaard,Stirner ou Marx.

    A tica contempornea surge numa poca de contnuos progressos cientficos e

    tcnicos e de um imenso desenvolvimento das foras produtoras, que acabam

    por questionar a prpria existncia da humanidade, e conhece um novo sistema

    social o socialismo. No plano filosfico, a tica contempornea se apresenta

    como reao contra o formalismo e o racionalismo abstrato kantiano,

    principalmente ao absolutismo de Hegel.

    Os rumos principais nos quais se orientam as doutrinas fundamentais

    contemporneas no campo da tica so os seguintes:

    I. De Kierkegaard ao Existencialismo: Kierkegaard considerado o pai do

    existencialismo, sendo tido como anti-Hegel. Ao contrrio de Hegel, para

    Kierkegaard o que vale o homem concreto, a sua subjetividade e no seu

    carter abstrato e universal, contrapondo a Hegel seu irracionalismo absoluto e o

    seu individualismo radical. Kierkegaard distingue trs estgios na existncia

    individual, na seguinte ordem hierrquica: religioso, tico e esttico. Max

    Stirner segue no mesmo sentido, e at d um passo alm: a moral praticamente

    impossvel na individualidade. O existencialismo de Jean-Paul Sartre renova nos

    dias contemporneos a orientao individualista e irracionalista de Kierkegaard,

    mas com algumas diferenas, por exemplo: para Sartre, Deus no existe;

    portanto, resta somente o homem como fundamento sem fundamento dos

    valores. Para Sartre, o homem liberdade, e esta a nica fonte de valor, e o

    valor supremo.

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    II. O Pragmatismo. Como filosofia e doutrina tica, o Pragmatismo surge e se

    difunde nos EUA, com S. Pierce, W. James e J. Dewey. O progresso cientfico e

    tcnico desse pas criaram as condies para esta filosofia antiespeculativa eatenta s questes prticas, ao pragmatismo, que por sua vez consiste em uma

    variante utilitarista marcada pelo egosmo, e como mais uma verso do

    subjetivismo e do irracionalismo.

    III. Psicanlise e tica. Fundada por Freud, as teses da psicanlise foram

    submetidas a um processo de reviso pelos seus outros ramos, seguidos por

    Adler, Jung, Sullivan e Fromm. A psicanlise clssica, de Freud, tem uma

    concepo naturalista do homem, e Fromm vem complet-la integrando-lhe os

    fatores sociais. A base da psicanlise o inconsciente do homem, onde se

    armazenam recordaes, desejos ou impulsos reprimidos, que lutam coma a

    conscincia para escapar de sua represso. Para Freud, a energia que se

    manifesta no inconsciente de natureza sexual e se chama libido, que quando

    reprimida acarreta perturbaes psquicas. Freud ainda distingue trs zonas da

    personalidade: o id, o ego e o superego. A contribuio de Freud tica se d no

    seguinte sentido: se o ato moral o praticado de forma consciente e livre, os atos

    praticados por uma motivao inconsciente esto excludos do campo moral.

    Entretanto, a verso de Fromm da psicanlise, por considerar seu aspecto social,

    oferece maiores contribuies tica do que a psicanlise clssica de Freud.

    IV.O Marxismo

    O marxismo critica as morais do passado e evidencia as bases tericas e prticas

    de uma nova moral. Marx tenta mostrar que o homem prxis; um ser

    produtor, transformador, criador. Alm disso, o homem um ser social, e

    tambm um ser histrico. Chega ele tese entre o desenvolvimento das foras

    produtivas e das relaes de produo. Ao mudar a base econmica, mudatambm a moral.

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    Marx acredita no carter histrico-social da moral. Aprofunda-se ele na nova

    moral, com que ele est entusiasmado, indo em busca dos aspectos das classes

    sociais e suas implicaes, e das foras de produo; concluindo, Marx acreditaque o homem tem o dever de interferir na transformao da sociedade, pois h a

    possibilidade de se voltar barbrie e de o homem no consiga subsistir.

    V. Neopositivismo e Filosofia Analtica

    Aqui esto as correntes ticas contemporneas que acabam por concentrar sua

    ateno na anlise da linguagem moral, comeando com G.E. Moore. Moore

    afirma que o bom indefinvel, e existe como propriedade no natural, e conclui

    que ele s pode ser captado por meio da intuio. Seus seguidores os

    intuicionistas contribuem para endossar suas teses. O prximo passo depois do

    intuicionismo foi o dado pelos positivistas lgicos. Em seguida se abre espao

    para o emotivismo tico, cuja concluso de que os termos ticos tm somente

    um significado emotivo, e as proposies morais carecem de valor cientfico.

    Embora sejam inegveis as contribuies dadas pelos filsofos analticos na

    investigao da linguagem moral, no se pode esquecer de que a linguagem

    moral o meio pelo qual as relaes efetivas se manifestam no mundo real. No

    se pode reduzir a tarefa da tica anlise da linguagem moral, sob pena de

    abstrair dela o seu aspecto ideal de seus juzos e termos morais, sendo a

    investigao analtica insuficiente. Entretanto, todas estas contribuies parecem

    fazer parte da incessante dinmica histrico-social da moral.

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