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Instituto Superior Técnico TERMODINÂMICA MACROSCÓPICA Princípios e Conceitos José J. Delgado Domingos José J. Delgado Domingos José J. Delgado Domingos José J. Delgado Domingos Tiago Morais Delgado Domingos Tiago Morais Delgado Domingos Tiago Morais Delgado Domingos Tiago Morais Delgado Domingos Tânia Costa e Sousa Tânia Costa e Sousa Tânia Costa e Sousa Tânia Costa e Sousa Aceite para Publicação na IST Press 2010

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Instituto Superior Técnico

TERMODINÂMICA MACROSCÓPICA Princípios e Conceitos

José J. Delgado DomingosJosé J. Delgado DomingosJosé J. Delgado DomingosJosé J. Delgado Domingos

Tiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado DomingosTiago Morais Delgado Domingos

Tânia Costa e SousaTânia Costa e SousaTânia Costa e SousaTânia Costa e Sousa

Aceite para Publicação na IST Press

2010

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Índice Geral

ÍNDICE GERAL 3

ÍNDICE DE FIGURAS 7

PREFÁCIO DA 1ª EDIÇÃO 9

PREFÁCIO DA 2ª EDIÇÃO 17

AGRADECIMENTOS 19

1. FÍSICA PERFEITA E TERMODINÂMICA MACROSCÓPICA 21

1.1. Física Perfeita: Reversibilidade 21

1.2. Termodinâmica Macroscópica: Irreversibilidade 23

1.3. Termodinâmica Macroscópica e Física Estatística: Reversibilidade Microscópica e Irreversibilidade Macroscópica 24

2. PRINCÍPIOS DA TERMODINÂMICA 28

2.1. Definições e Convenções 28

2.2. 1º Princípio da Termodinâmica 33

2.3. 2º Princípio da Termodinâmica 36

3. FORMALISMO TERMODINÂMICO 53

3.1. Do Postulado da Dissipação ao Formalismo Termodinâmico 53

3.2. Axiomática de Tisza-Callen 54

3.3. Primeiras Derivadas da Equação Fundamental: Variáveis Intensivas 61

3.4. Equilíbrio Termodinâmico 65

3.5. Equações de Euler e de Gibbs-Duhem 70

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Termodinâmica Macroscópica 4

Índice Geral

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3.6. Equações Molares 72

3.7. Expressões para o Trabalho e para o Calor 76

3.8. Relações de Maxwell 77

3.9. Segundas Derivadas da Equação Fundamental: Coeficientes Termodinâmicos 81

3.10. Estabilidade Intrínseca dos Sistemas Termodinâmicos 86

4. SISTEMAS TERMODINÂMICOS SIMPLES 97

4.1. Recomendações para a Obtenção de Equações Fundamentais 97

4.2. Gases Perfeitos 97

4.3. Gás de van der Waals 102

4.4. Radiação Electromagnética 103

4.5. Elástico de Borracha Linear 105

5. CICLOS TERMODINÂMICOS 107

5.1. Ciclo de Carnot 107

5.2. Teorema de Carnot 110

5.3. Outras Formulações da Segunda Lei da Termodinâmica 117

6. POTENCIAIS TERMODINÂMICOS 121

6.1. Teorema do Mínimo de Energia 121

6.2. Estrutura do Espaço Termodinâmico 122

6.3. Transformação de Legendre 123

6.4. Potenciais Termodinâmicos 127

6.5. Teoremas de Mínimo para os Potenciais Termodinâmicos 134

7. MUDANÇA DE FASE 141

7.1. Dimensionalidade do Espaço de Representação 141

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Termodinâmica Macroscópica 5

Índice Geral

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7.2. Equação de Clapeyron 150

7.3. Mudança de Fase com a Equação de van der Waals 154

7.4. O Caso da Água 159

7.5. Diagramas Termodinâmicos 162

7.6. Sistemas com Múltiplos Componentes: Regra das Fases de Gibbs 167

8. SISTEMAS ABERTOS SEM DIFUSÃO 171

8.1. Introdução 171

8.2. Balanços de Massa e de Energia para Sistemas Abertos 172

8.3. Regime Estacionário 176

8.4. Aplicações 178

8.5. Balanço de Entropia para Sistemas Abertos 180

9. TERMODINÂMICA DA ATMOSFERA 183

9.1. Extensão do formalismo para o campo gravítico 183

9.2. Sistema Termodinâmico – Ar Seco 185

9.3. Sistema Termodinâmico – Ar Húmido 197

9.4. Tefigrama 203

9.5. Nível de Condensação 205

9.6. Gradiente de Temperatura Adiabático Saturado 207

10. BIBLIOGRAFIA 212

ANEXO - FERRAMENTAS MATEMÁTICAS 215

10.1. Formas Diferenciais 215

10.2. Maximização 219

10.3. Pontos de Equilíbrio e Estabilidade 221

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Termodinâmica Macroscópica 6

Índice Geral

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11. ÍNDICE REMISSIVO 225

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Índice de Figuras

Figura 1 - Sistema isolado, com dois subsistemas. ........................................................... 38

Figura 2 – Compressão de um gás..................................................................................... 40

Figura 3 – Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie (exemplo). .............................. 42

Figura 4 – Evolução adiabática reversível......................................................................... 43

Figura 5 – Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática. .................................................................................................................. 44

Figura 6 – Experiência Fundamental de Joule .................................................................. 45

Figura 7 – Sistemas termodinâmicos separados por uma parede diatérmica, fixa e impermeável ................................................................................................ 66

Figura 8 – Divisão arbitrária de um sistema homogéneo em dois. ................................... 86

Figura 9 – Representação esquemática de uma cavidade electromagnética ................... 104

Figura 10 – Elástico de borracha ..................................................................................... 105

Figura 11 – Ciclo de Carnot ............................................................................................ 109

Figura 12 – Equilíbrio de fases........................................................................................ 143

Figura 13 – Variação da Energia de Gibbs molar (igual ao potencial químico) com a temperatura, para pressão e número de moles constantes (sistema com um componente químico), para diferentes fases. .................................................................................................................... 146

Figura 14 – Exemplo de diagrama de fases..................................................................... 147

Figura 15 – Comportamento típico de uma isotérmica do fluido de van der Waals ................................................................................................................... 154

Figura 16 – Isotérmica da equação da van der Waals, no plano (v, P). .......................... 156

Figura 17 – Energia de Gibbs molar em função da pressão, para temperatura constante, para um fluido de van der Waals........................................................ 156

Figura 18 – Evolução na mudança de fase, para um fluido de van der Waals................ 157

Figura 19 – Isotérmica com mudança de fase, no plano P – v. ....................................... 158

Figura 20 – Representação da zona a duas fases no diagrama (P, v). ............................. 159

Figura 21 - Fases da água num diagrama P-T. ................................................................ 160

Figura 22 - Superfície P – V – T para a água (a contracção na passagem de sólido para líquido não é normal em fluidos simples)......................................... 161

Figura 23 - Diagrama P, θ (temperatura) para a água líquida e o vapor de água. .................................................................................................................... 162

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Termodinâmica Macroscópica 8

Índice de Figuras

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Figura 24 - Diagrama (T,s). A área tracejada representa a quantidade de calor recebida pelo sistema na evolução isobárica de a a d. No diagrama estão também representadas as linhas de título x constante. ............... 163

Figura 25 - Diagrama T-s. Linha de volume constante (isócora). ................................... 165

Figura 26 - Diagrama T-s para a água. Isobáricas (a cheio), isócoras (a tracejado), isentálpicas (traço-ponto). ................................................................. 166

Figura 27 - Diagrama de Mollier (h, s) para uma substância simples. Apresentam-se também as linhas de volume constante (note-se que, neste diagrama, o ponto triplo corresponde a uma área). .................................... 167

Figura 28 – Sistema com um êmbolo adiabático e móvel, (a – b). ................................. 173

Figura 29 – Deslocamento para a direita, numa distância dl, do êmbolo no sistema da Figura 28, passando para a posição a’ – b’........................................ 173

Figura 30 – Definição do sistema A, no contexto da Figura 29. ..................................... 174

Figura 31 – Tubo de secção constante, horizontal, com um escoamento em regime estacionário.............................................................................................. 178

Figura 32 – Linha a vermelho: gradiente de temperatura adiabático. Linhass 1, 2 e 3: gradientes de temperatura da atmosfera. ............................................... 193

Figura 33 – Equação de Clausius-Clapeyron (azul). Caracterização da mistura (linha a vermelho) de duas massas de ar não saturadas (extremos da linha a vermelho). .......................................................................... 200

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Prefácio da 1ª Edição

Deep down, most scientists feel insecure about their background in Thermodynamics. (And most of those who do not probably should!). But from where does this anxiety issue? Certainly, the fundamental laws of Thermodynamics are not that difficult to comprehend.

Ulanowicz (1986)

Embora fundamental numa formação científica, a Termodinâmica é uma disciplina que habitualmente se remete para um subcapítulo da Física, para a introdução a outras disciplinas, ou para o conjunto de formulários, tabelas e diagramas, de que as aplicações correntes precisam.

Existem ainda as Termodinâmicas para Químicos, para Mecânicos, para Biólogos..., ou ainda as disciplinas científicas especializadas que têm na Termodinâmica a sua raiz e fundamento.

Salvo raras excepções, a unidade global da Termodinâmica não é sublinhada, tal como não é explorado o valor pedagógico e metodológico da sua estrutura conceptual, sobretudo quando se trata da Termodinâmica Macroscópica.

Esta situação, creio eu, deve-se a alguns equívocos e a erros de perspectiva consagrados como normalidade pela sua proliferação em manuais universitários.

Entre os equívocos, encontra-se o próprio nome de Termodinâmica. Na esmagadora maioria dos casos, os textos de Termodinâmica tratam de TERMOESTÁTICA, ou seja, de situações que a nível macroscópico são de equilíbrio estático e a nível microscópico são de equilíbrio dinâmico.

Sendo um equívoco histórico, fruto da confusão entre desejos e realidades, a Termodinâmica que não é Termoestática passou a chamar-se Termodinâmica de Não Equilíbrio ou Termodinâmica dos Processos Irreversíveis.

De mais profundas consequências, pelas falsas perspectivas que origina, é a generalizada meia-verdade de que nas equações de Boltzman da Mecânica Estatística se encontra toda a fundamentação da Termodinâmica Macroscópica.

Esta questão ultrapassou, largamente, o estrito âmbito em que inicialmente se formulou e procurava conciliar a evidência experimental da Termodinâmica Macroscópica com uma visão cultural do mundo em que

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Termodinâmica Macroscópica 10

Prefácio da 1ª Edição

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dominava o determinismo newtoniano e a cosmologia de Laplace1. De certo modo, era uma visão do mundo decorrente da sua descrição por equações lineares ou que poderiam linearizar-se para que a sua solução fosse redutível aos métodos matemáticos conhecidos.

A descoberta recente do «caos determinístico», consequência directa da capacidade de tratar numericamente situações descritas por equações diferenciais (ou em derivadas parciais) não lineares, bem como a possibilidade de auto-organização em sistemas dissipativos muito afastados do equilíbrio veio pôr novamente em relevo a importância conceptual da perspectiva macroscópica e o renovado interesse pelo paradigma que sob esse aspecto a Termodinâmica Macroscópica constitui2.

Os grandes afastamentos do equilíbrio, em que nascem os fenómenos conhecidos de auto-organização dissipativos, são de natureza macroscópica e podem descrever-se no âmbito da Termodinâmica Macroscópica dos Processos Irreversíveis, ela própria resultante duma extensão quase trivial da Termodinâmica Clássica, a que chamamos Termoestática.

Extensão quase trivial, porque ela decorre da redução da escala espacial e temporal em que na Termoestática se mede o equilíbrio. Trata-se, em rigor, de admitir que a Termoestática permanece válida ao nível do volume infinitesimal (princípio do estado local) e de extrair desse axioma todas as consequências matemáticas que nele se contêm. Esta é, aliás, a hipótese fundamental subjacente a toda a Mecânica dos Meios Contínuos, quer ela se formule como decorrente de axiomas matemáticos abstractos, quer se motive por considerações de ordem física.

Esta unidade, formal e conceptual, de tratamento da Mecânica e da Termodinâmica dos Meios Contínuos não encontra expressão corrente nos manuais universitários e a estrutura curricular dos nossos cursos de engenharia também não a favorece ao separar a Mecânica dos Sólidos, a Mecânica dos Fluidos, a Hidráulica, a Transmissão (ou Transferência...) de Calor e Massa, os Fenómenos de Transporte, etc., do que resultam

1 A Mecânica Quântica e a Teoria da Relatividade vieram profundamente alterar esta visão cultural do

Universo e o modo de encarar a Termodinâmica Estatística. Todavia, permanecem válidas as observações aqui feitas.

2 O caos determinístico é essencialmente macroscópico e a sua descoberta não se limitou a fazer reviver o interesse pela Termodinâmica macroscópica mas sim por muitos fenómenos e observações correntes de que a Física se desinteressara, como é, por exemplo, o caso do pêndulo que tinha ficado «congelado» nas situações redutíveis a soluções matemáticas conhecidas.

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Termodinâmica Macroscópica 11

Prefácio da 1ª Edição

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consequências significativas no relacionamento interdisciplinar e na investigação mais avançada3.

Recordada a importância intrínseca da Termodinâmica Macroscópica e a impossibilidade, face ao estado actual do conhecimento, de a reduzir à Física Microscópica, não deve, todavia, minimizar-se a importância (e imprescindibilidade) da sua complementaridade4. Não é essa, porém, a questão que aqui se põe, mas sim a de identificar e ultrapassar as causas que subalternizaram a Termodinâmica Macroscópica no âmbito das ciências básicas. Essas causas têm muito a ver com o modo como a Termodinâmica é habitualmente formulada e apresentada, a que não é estranho o carácter atribulado de que se revestiu a sua evolução5.

O nascimento da Termodinâmica como ciência está intimamente associada a Clausius que introduziu o conceito de entropia (1850), mas a fonte motivadora foram os trabalhos de Carnot6, que revelaram a possibilidade de estabelecer um limite intransponível para o rendimento de qualquer máquina térmica, independentemente da sua natureza ou do fluído utilizado para obter a conversão do calor em trabalho. Este rendimento só dependia das temperaturas extremas.

3 A esta situação não é certamente estranho o facto de a teoria matemática da Mecânica dos Meios

Contínuos ter sido formulada utilizando apenas os princípios da Mecânica de Newton e uma relação fenomenológica (relação constituitiva) entre as forças e as deformações (tipicamente linear) baseada na observação experimental. A lei de Hooke para a Elasticidade, ou uma relação empírica ligando a pressão e a massa específica foram suficientes para criar a teoria matemática da elasticidade ou para Euler fundar a Mecânica dos Fluidos Perfeitos, sem necessidade de invocar qualquer modelo microscópico.

Significativamente, na Lei de Fourier, para a Condução do Calor (1822) está implícita a teoria do calórico e uma difusa interpretação dos fluxos de calor e dos calores específicos. A Termodinâmica Macroscópica, que daria a visão unitária ao conjunto e fundamentaria o tratamento quando existe dissipação, ainda não tinha surgido. Sob este aspecto, refira-se que os trabalhos de Carnot são de 1824 e a publicação fundamental de Clausius, considerada o início da Termodinâmica, é de 1850.

4 Toda a argumentação anterior se sintetiza na observação de que o microscópico e o macroscópico são apenas níveis diferentes de abordagem da mesma realidade, ambos fundamentais para uma compreensão do mundo real onde habitamos. Este facto tende porem a ser esquecido, tanto pelos físicos (que privilegiam o microscópico), como pelos engenheiros, que assumem a atitude oposta e tendem a reduzir a Termodinâmica Macroscópica a regras operacionais ou ciclos térmicos, sem se aperceber das potencialidades unificadoras que ela contém e lhes evitaria alguns paradoxos.

5 Ver Truesdell (1980). Truesdell preocupa-se, sobretudo, com aspectos matemáticos da formulação, apresentando uma exaustiva bibliografia de trabalhos relevantes desde 1779 a 1979.

6 A publicação fundamental de Sadi Carnot, “ Réflexions sur la Puissance Motrice du Feu et sur les Machines Propres à développer cette Puissance”, Paris, Bachelier, 1824, foi integralmente republicada quase 50 anos depois, com as suas notas manuscritas entre 1824 e 1832 nos Annales Scientifiques de l´École Normale Superieur (1872).

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Termodinâmica Macroscópica 12

Prefácio da 1ª Edição

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É importante situar no seu contexto histórico esta evolução e sobretudo sublinhar o papel determinante que teve o aparecimento da máquina a vapor. A primeira, da autoria de Savery foi demonstrada em 1698, muito embora se devam a Newcomen as formas construtivas que estiveram na origem dos desenvolvimentos posteriores de Watt.

Contrariamente às descobertas fundamentais que tinham feito da Física uma paradigma da Ciência, a máquina a vapor não nasceu num laboratório mas na realidade externa que a revolução industrial criara e para cujo desenvolvimento era crucial uma nova forma de energia, pois as únicas formas de energia aproveitáveis até aí eram o vento e as quedas de água, em instalações que raramente ultrapassavam os 10 kW de potência máxima.

O que a máquina a vapor vinha por em evidência era a possibilidade de conversão da energia do fogo em energia mecânica, facto esse que para os cientistas da época trazia um desafio comparável ao que posteriormente trouxe, por exemplo, a descoberta da radioactividade.

A teoria da máquina a vapor não era dedutível de concepções microscópicas e as reflexões de Carnot trouxeram, como contributo essencial, o conceito de ciclo. O mérito fundamental do conceito de ciclo é abstrair do que se passa a nível microscópico, pois sejam quais forem as transformações sofridas o objecto em estudo (o sistema) regressa ao ponto de partida, ou seja, à situação em que estava antes de ter sofrido qualquer transformação.

Nas reflexões de Carnot está implícito o conceito de calórico como um fluido imaterial, conservado e indestrutível, que produz trabalho ao descer de nível térmico, em total analogia com o que se passa com a água numa roda hidráulica. Sabemos hoje que não é o calórico mas a entropia que pode usar-se nesta analogia7, mas na altura, nem o princípio da conservação da energia tinha sido estabelecido como um pilar fundamental, nem o conceito de entropia tinha surgido como elo imprescindível na ligação do microscópico ao macroscópico.

Quando existem fenómenos térmicos, a dialéctica microscópico-macroscópico8 foi e é de tal modo importante, que a tendência foi, e ainda é,

7 A analogia fracassava quando o calórico passava de uma temperatura mais elevada para uma mais

baixa como sucede por exemplo na condução do calor em sólidos.

8 O sistema fechado continua sendo o domínio privilegiado da Física fundamental e é para ele que a Mecânica Quântica e os modelos microscópicos se formulam, dadas as simplificações formais que tal permite e a forma “natural” como se postula e se realiza o equilíbrio macroscópico em tal situação. Mas o mundo real, onde os seres vivos existem e as máquinas funcionam, são quase sempre sistemas abertos. Trata-se, novamente, de níveis diferentes mas complementares de abordagem, que ao não serem tidos adequadamente em conta apenas contribuem para a visão estreita e compartimentada do mundo que permeia todo o nosso ensino.

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Termodinâmica Macroscópica 13

Prefácio da 1ª Edição

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para reduzir a Termodinâmica aos sistemas fechados, deixando habitualmente para os textos das aplicações à engenharia o tratamento dos sistemas abertos, nos quais a ênfase é na conservação da energia, secundarizando ou omitindo mesmo as lacunas conceptuais e lógicas que podem existir nessa extensão.

A existência da vida é incompatível com a hipótese do sistema fechado e esse facto deu origem à convicção generalizada, até meados deste século, de que a Termodinâmica se não aplicaria aos fenómenos da vida, o que é falso. Aliás, está intimamente associado à ultrapassagem deste erro de perspectiva o aparecimento da primeira teoria científica dos Ecossistemas, devida a R. Lindemann (Lindemann, 1942), depois aprofundada e difundida por Odum (1953).

A evolução histórica que deu origem à Termodinâmica justifica, naturalmente, o modo sinuoso como se desenvolveu. O passo decisivo inicial foi o conceito de entropia e o enunciado do segundo princípio para sistemas isolados. Mas este enunciado, feito por Clausius (1850), antecede a aceitação generalizada do princípio da conservação da energia que se seguiu aos trabalhos fundamentais de Joule (1850).

Se os trabalhos de Joule foram muito importantes, o aspecto crucial não foram os seus novos dados experimentais mas o novo paradigma interpretativo que os seus trabalhos provocaram, ou seja, o princípio da conservação da energia.

O enunciado do princípio da conservação da energia implicou, como é óbvio, a elaboração prévia do conceito de energia e a identificação do calor como uma dessas formas de energia. Por isso o princípio da conservação da energia se identifica com a Primeira Lei da Termodinâmica.

O aparecimento e evolução de uma teoria física nunca é linear, sem círculos viciosos e algumas tautologias. A Termodinâmica é disso um exemplo que perdura nos livros de texto correntes que directamente se inspiram de alguns clássicos famosos, atraiçoando algumas vezes as restrições e considerandos que permeiam os seus textos9.

Nesta corrente, ainda largamente dominante, o ciclo de Carnot tem um papel central bem como a teoria dos pfafianos, ou das diferenciais não exactas. Pretendendo ser intuitivas, as demonstrações são artificiosas e sobretudo a origem de dificuldades formais e conceptuais logo que nos aproximamos do mundo macroscópico e real em que se passam os fenómenos macroscópicos directamente observáveis.

9 É esclarecedor ler Planck e os prefácios das suas várias edições. A 1ªedição é de 1897 e a 7ª de

1922.

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Termodinâmica Macroscópica 14

Prefácio da 1ª Edição

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Ora, se tal tipo de formulação foi inteiramente justificada (e possivelmente sem alternativa) antes de o princípio da conservação da energia se ter transformado no pilar fundamental da Física moderna, é difícil entender que se continue a proceder como se tal princípio fosse demonstrável com base na argumentação aduzida ou nas experiências históricas que inspiraram a sua formulação.

Se a perspectiva histórica é pedagogicamente importante numa introdução à Termodinâmica, a redução da Termodinâmica a essa perspectiva é dramaticamente empobrecedora da sua capacidade para integrar uma vasta área do conhecimento científico e cultural do presente.

A finalidade destas notas é sublinhar que a aceitação do princípio da conservação da energia como pilar fundamental e já adquirido, permite reduzir a Segunda Lei da Termodinâmica à formalização, quase trivial, da evidência mais palpável da nossa existência, que é o escoar do tempo em sentido único ou a existência, intransponível, da «dissipação» da «energia». Essa formalização é bem mais acessível e natural do que a tortuosa descoberta da entropia como o factor integrante de uma diferencial inexacta que emerge depois de laboriosos exercícios mentais em torno de ciclos motores irrealisáveis. Dir-se-ia que o conceito de irreversibilidade, que é o facto mais constante e permanente da nossa existência humana, só poderia ser acessível a quem fosse capaz de reduzir o que observa a imaginários ciclos de Carnot. Como esse dom é privilégio de poucos, a maioria reduz a Termodinâmica a conceitos esotéricos e regras empíricas para ultrapassar exames, uns e outros destinados ao limbo do esquecimento acelerado, como ganga inútil.

Ora, o próprio termo “dissipação”, que o uso corrente consagrou, põe em evidência que algo desapareceu.10

O que desapareceu, ou se dissipou, foram as formas de energia que a Física Perfeita descobriu e estão no cerne da visão do mundo que a Física nos trouxe e o reduz a partículas cada vez mais elementares.11

10 Planck adopta o princípio da conservação da energia como um facto “testado por séculos de

experiência humana e repetidamente verificado de que o movimento perpétuo é impossível, sejam quais forem os meios utilizados, mecânicos, térmicos, químicos ou outros”, mas discorda da interpretação da segunda lei como uma dissipação de energia, invocando o exemplo da irreversibilidade associada à difusão de gases perfeitos ou à diluição adicional de uma solução já diluída, na medida em que nesses fenómenos não existe nenhuma perceptível transferência de calor, de trabalho externo ou de transformação de energia. Esta observação é imediatamente contestável atendendo a que a diferença de potencial químico existente antes da mistura poderia ter sido utilizada na produção de trabalho, como imediatamente decorre da formulação de Gibbs e o próprio Planck teria certamente notado se não tivesse construído a sua Termodinâmica, como quase todos os clássicos, a partir das equações de estado de um gás perfeito.

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Termodinâmica Macroscópica 15

Prefácio da 1ª Edição

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As formas de energia da Física Perfeita são «personalizadas e aristocráticas», convertíveis integralmente entre si, e directamente mensuráveis, macroscopicamente.

Para elas, o tempo pode fluir por igual em ambos os sentidos e a eternidade é o seu universo natural.

Nesse mundo perfeito, a degradação não existe. A degradação é o preço da realidade no mundo real e macroscópica em que existimos.

Nesse mundo, as formas macroscópicas de energia «personalizadas e aristocráticas», degradam-se no anonimato microscópico da agitação térmica, sem possibilidade de recuperação integral, porque tal recuperação exigiria outra perfeição inatingível que seria a existência de uma fonte infinita a zero Kelvin.

Conciliar a conservação da energia total com a degradação macroscópica das formas «personalizadas e aristocráticas» de energia, levou directamente à concepção da existência de tais formas ao nível microscópico.

O mesmo conceito de perfeição e eternidade persiste assim, e a imperfeição que constatamos ao nível macroscópico passou a ser o resultado de apenas nos ser perceptível o colectivo!

O texto que se segue, destina-se a alunos que já tiveram uma primeira abordagem da Termodinâmica num curso Geral de Física e assimilaram já os conceitos fundamentais da Álgebra e da Análise Matemática.

Numa forma próxima da actual, foi objecto das minhas aulas teóricas de Termodinâmica I para o curso de Engenharia Mecânica quando voltei a reger esta disciplina em 1990/91 e 1991/92.

A sua origem encontra-se na minha actividade de assistente do Prof. Gouvêa Portela quando em 1960/61 iniciou a regência de Termodinâmica para Engenharia Mecânica.

A minha preocupação de unidade formal e de coerência com a Mecânica e a Termodinâmica dos Meios Contínuos, com particular relevância para a Transmissão de Calor e Massa e a Mecânica dos Fluidos remonta à minha Tese de Concurso para Catedrático publicada em 1965.

Os desenvolvimentos posteriores no âmbito da Termodinâmica dos Processos Irreversíveis, a vulgarização do caos determinístico e da auto-organização em processos dissipativos, bem como o estímulo cultural que a cosmologia moderna, o ambiente e a economia actualmente suscitam,

11 Note-se como a justificação de Planck para o primeiro princípio exclui, implicitamente, todos os

modelos microscópicos como sendo deste mundo, pois eles traduzem, todos, um conceito de movimento perpétuo.

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Termodinâmica Macroscópica 16

Prefácio da 1ª Edição

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levaram-me a pensar que teria interesse reintroduzir este modo de encarar a Termodinâmica num âmbito mais alargado.

Valorizando a estrutura conceptual sobre as aplicações imediatas, perde-se em utilitarismo mas ganha-se em amplitude. Se o tempo o propiciar, as aplicações surgirão para demonstrar que a melhor prática é sempre a que se inspira numa sólida teoria12. E em Física, uma sólida teoria é sempre a que resiste a uma formulação matemática rigorosa e sem artifícios dedutivos.

Pessoalmente, sempre entendi a Termodinâmica Macroscópica como uma modelo de simplicidade formal e dedutiva.

Pedagogicamente, o seu valor formativo decorre disso mesmo, ou seja, da capacidade de construir algumas certezas a partir de um conjunto reduzido de factos evidentes e de alguns conceitos e definições suficientemente assimilados para nunca mais serem esquecidos.

Como nota final, devo novamente sublinhar que esta ênfase na Termodinâmica Macroscópica não só não visa minimizar a Termodinâmica Estatística como constitui a base lógica para a sua introdução e desenvolvimento a partir dos conceitos fundamentais da Mecânica Quântica.

A perspectiva microscópica da entropia aparece então, com toda a clareza, associada ao processo de inferência Bayesiana e à Teoria da Informação de Shannon. Alias, foi esse o ponto de vista adoptado quando assumi a regência da disciplina em 1966, motivado pela preocupação de introduzir o conceito de entropia de modo não axiomático, como sucedia no curso do Prof. Gouvêa Portela, directamente inspirado da formulação de Tisza-Callen. Aquele modo de apresentar a Termodinâmica, na sequência de alguns trabalhos notáveis de Jaynes, encontra-se exemplarmente tratado por Tribus13, que era adoptado como um dos livros de texto fundamentais.

JJDD

1995

12 O texto “Prática de Termodinâmica”, reeditado pela AEIST em 1991, responde parcialmente às

necessidades de ilustração da teoria e exemplifica a utilização nos casos habituais da engenharia. A sua profunda revisão aguarda, porém, melhor oportunidade.

13 Tribus (1961).

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Prefácio da 2ª Edição

A primeira edição desta Termodinâmica foi proposta à IST Press para publicação em 1995 e submetida ao processo de revisão habitual nesta editora. O parecer elaborado pelo revisor, invulgarmente cuidadoso, minucioso e extenso, concluía pela qualidade e originalidade da obra e recomendava a publicação, desde que corrigidas algumas questões. O contributo deste revisor, que para nós continua anónimo e a quem sinceramente agradecemos, foi muito estimulante e suscitou a decisão de não só atender às sugestões como ainda a de aprofundar e clarificar outros aspectos aconselhados pela experiência da sua utilização pelos estudantes.

Quando o parecer do revisor foi recebido, em 1998, o autor da 1ª edição, embora responsável, não estava já directamente envolvido na regência da disciplina de Termodinâmica I para a Licenciatura em Engenharia Mecânica no IST, e assumira entretanto a responsabilidade pela disciplina de Termodinâmica na Licenciatura em Engenharia do Ambiente. Este facto veio sublinhar a importância da reflexão já expressa no prefácio da primeira edição do livro acerca da unidade global da Termodinâmica Macroscópica e do valor pedagógico e metodológico da sua estrutura conceptual e dedutiva, facilmente perdida quando reduzida às aplicações (expeditas) das várias engenharias. De facto, para além da fundamentação rigorosa das equações fundamentais dos meios contínuos, em particular da Mecânica dos Fluidos e da Transmissão de Calor iniciada há muitos anos (ver, por exemplo, Domingos, 1964, 1966) havia a extensão aos organismos vivos (Sousa et al., 2004) e à Economia (Domingos e Sousa, 2004), que o formalismo matemático e/ou o conteúdo físico permitiam unificar sob múltiplos aspectos, como tem vindo a ser demonstrado pelo Prof. Tiago M. D. Domingos e sua equipa.

Posteriormente, foi confiada ao Prof. Tiago M. D. Domingos a regência da disciplina de Termodinâmica para a Licenciatura em Engenharia do Ambiente, tendo utilizado e testado o texto revisto que ora se apresenta, e a que foi naturalmente associado como segundo autor.

Em verdade, tudo o que nesta segunda edição difere da primeira é da autoria do Prof. Tiago M. D. Domingos (o que justifica também que ele surja agora como um dos autores do texto), o qual, além de ter considerado as sugestões e corrigido as gralhas assinaladas pelo revisor, incorporou a experiência adquirida com a utilização do texto pelos alunos. Para além destas evidentes melhorias, são sobretudo relevantes os contributos de natureza científica que trouxe a esta edição, e de entre os quais se destacam:

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Termodinâmica Macroscópica

Prefácio da 2ª Edição

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1) Aprofundamento da distinção entre os conceitos de energia interna e de calor que estão na origem de contradições e incoerências em muitos livros de texto, sobretudo quando existe transferência de massa.

2) Reformulação da apresentação feita por H. B. Callen, no seu consagrado livro Thermodynamics and an Introduction to Thermostatistics, do formalismo de Tisza. Como se mostra nesta edição, as componentes do formalismo de Tisza que não foram considerados por Callen são essenciais para a coerência do conjunto.

3) Introdução do formalismo das formas diferenciais, eliminando a necessidade de utilizar o método dos jacobianos e substituindo o método das áreas para a manipulação das derivadas parciais.

4) Utilização sistemática do formalismo das formas diferenciais ao longo de todo o curso:

a) Dedução das expressões para as variáveis intensivas nas formas diferenciais da equação fundamental.

b) Dedução dos princípios de extremo para a energia interna e para os potenciais termodinâmicos.

c) Obtenção das relações de Maxwell. d) Introdução de um algoritmo para a redução de derivadas parciais a

coeficientes termodinâmicos.

5) Distinção clara entre princípios de extremo, que se aplicam só a sistemas compostos, e características de convexidade e concavidade das equações fundamentais nas diferentes representações, que se aplicam a sistemas simples.

Posteriormente a estes desenvolvimentos no texto, associou-se à equipa de autores a Prof.ª Tânia Costa e Sousa, de cuja autoria é o capítulo sobre Termodinâmica da Atmosfera, tendo também contribuído com uma revisão geral do texto.

Tal como se refere no título, trata-se de um livro sobre Princípios e Conceitos de Termodinâmica Macroscópica. Acrescente-se que se destina sobretudo a estudantes universitários de Engenharia e de Física. As aplicações da Termodinâmica Macroscópica a áreas especializadas de engenharia decorrem dedutivamente e com toda a naturalidade deste tronco comum.

JJDD

2010

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Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer ao revisor deste livro, cuja revisão extremamente cuidadosa o permitiu melhorar substancialmente.

Gostaríamos também de agradecer aos alunos cujos comentários durante as aulas de Termodinâmica da Licenciatura em Engenharia do Ambiente do Instituto Superior Técnico enriqueceram diversos pontos do texto, em particular o Nuno Cegonho, o Tiago Veiga e o Pedro Antunes.

Gostaríamos em particular de agradecer à aluna Alexandra Nogal, cujo estudo extremamente cuidadoso deste texto permitiu detectar e eliminar um elevado número de gralhas.

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1. Física Perfeita e Termodinâmica Macroscópica

Theoretical Physics is the science of successful approximations

Stauffer e Stanley (1991)

1.1. Física Perfeita: Reversibilidade Designamos por Física Perfeita a Física onde não existe atrito nem dissipação e em que a expressão matemática das suas leis é invariante para as transformações de t em (- t), sendo t a variável tempo. Em termos formais diremos que são simétricas para inversões no tempo.

As leis de Newton, bem como as equações de Maxwell para o electromagnetismo e as equações da mecânica quântica gozam da mesma propriedade.

A simetria para as inversões no tempo significa que todos os fenómenos descritos por essas equações são reversíveis no tempo. Num universo descrito, totalmente, por equações com simetria no tempo, é impossível para um observador distinguir se os fenómenos que observa se desenrolam a caminho do futuro ou a caminho do passado.

Nesse Universo, os conceitos de passado e de futuro (que estão ligados ao fluir do tempo num único sentido) não se distinguiriam dos de espaço. Passado e Futuro seriam um pouco como os equivalentes de Norte e Sul ou Este e Oeste. Neste espaço-tempo, todos os pontos seriam igualmente acessíveis, podendo caminhar-se no tempo, como se caminha no espaço, em qualquer sentido.

O conceito de causalidade está intimamente ligado ao sentido único do fluir do tempo. De facto, quando afirmamos que a causa A provocou o efeito B, está implícito que A antecedeu B. Esta clarificação do conceito de causalidade, permite esclarecer melhor o conceito de determinismo em Física e mostrar que o determinismo não implica a causalidade.

Por exemplo, o movimento da Terra e dos planetas à volta do Sol é determinístico no sentido em que as equações da mecânica nos permitem prever, com todo o rigor, as suas posições relativas em qualquer instante desde que ela seja conhecida num instante dado. Essa previsão, tanto pode fazer-se em relação ao passado como em relação ao futuro. O movimento é

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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determinístico. Todavia, não existe relação de causalidade no sentido referido porque não podemos afirmar (no âmbito das mesmas leis da mecânica que estabelecem o determinismo das posições relativas) que a causa do movimento de um dos planetas foi o sol, ou outro planeta, etc., uma vez que a inversa também seria igualmente aceitável.

As simples considerações anteriores mostram como é importante e fundamental a existência de uma variável tempo que flui num só sentido e as implicações filosóficas e metafísicas que teria a sua reversibilidade. Mesmo nos inúmeros filmes e romances de ficção científica em que a “máquina do tempo” permite saltos para o passado ou para o futuro, nunca se vai além de translações descontínuas na origem da coordenada tempo. Salta-se para o futuro ou o passado, mas logo que se “aterra” o tempo retoma o seu fluir em sentido único para que as relações de causalidade que formam a trama do enredo sejam inteligíveis. Isto é, na ficção podem-se fazer “aterrar” os heróis de hoje com as espingardas de hoje no tempo do Império Romano. Todavia, as balas que essas espingardas disparam vão da espingarda para o inimigo e não do corpo do inimigo para dentro da espingarda.

Se, no mundo real, o tempo flui em sentido único, a questão que imediatamente se põe é se o tempo teve uma origem absoluta. Isto é, se existe no passado algo que corresponda à origem do tempo, ao seu nascimento. Esse seria também o nascimento do próprio Universo. Esta questão é hoje uma questão central activamente discutida em cosmologia e em astrofísica. A tendência actual é a de pensar que houve essa origem e de, inclusivamente, a quantificar relativamente ao presente, utilizando para tal as equações e teorias fundamentais da física moderna, nomeadamente a relatividade geral e a mecânica quântica.

Todavia, e por mais surpreendente que pareça, a Física Moderna, tal como a conhecemos, é essencialmente uma Física Perfeita e os modelos microscópicos da matéria que actualmente possuímos baseiam-se inteiramente no pressuposto de simetria temporal das equações e da inerente reversibilidade temporal que tal simetria implica. Isto é, nessa Física Perfeita, a flecha do tempo (como lhe chamou Eddington) não tem um sentido único.

O mundo real que macroscopicamente observamos não se comporta de acordo com a Física Perfeita. Todavia, e em muitos casos, as previsões que ela permite fazer possuem um extraordinário rigor experimental de que é exemplo marcante e fundamental a previsão do movimento dos planetas e seus satélites em torno do Sol. O carácter quase divino que a previsão do movimento dos astros representou foi um factor decisivo na evolução do pensamento moderno e na generalização dos modelos de

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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raciocínio determinista aos mais variados domínios da actividade humana, nomeadamente à economia.

1.2. Termodinâmica Macroscópica: Irreversibilidade

No mundo real, macroscopicamente observável, não existe reversibilidade no tempo. Nas equações da mecânica e nas outras equações fundamentais da Física Perfeita introduziram-se por isso termos correctivos, para que as previsões dadas pelas equações se ajustem à realidade observável.

Se for a queda de um papel na atmosfera, introduz-se a resistência do ar. No movimento de um pêndulo, será o atrito no fulcro, a resistência do ar, etc. Estes termos quebram a simetria temporal das equações.

Um pêndulo posto em movimento e entregue a si próprio acabará por parar, mesmo se suspenso no interior de um recipiente onde se fez o vácuo. Uma onda electromagnética que transmite um sinal de rádio atenua-se à medida que se propaga.

Com a quebra da simetria, desaparece a conservação da energia nas formas contempladas pela Física Perfeita. O atrito mecânico faz desaparecer energia mecânica, isto é, dissipa energia mecânica, tal como uma resistência eléctrica faz desaparecer energia eléctrica, isto é, dissipa energia eléctrica, etc.

Seja qual for a forma macroscópica de energia considerada na Física Perfeita (mecânica, electromagnética, química, etc.), existe sempre uma dissipação, que se associa ao equivalente a um atrito. Quando falamos de dissipação de energia, está sempre implícito que essa dissipação se refere a uma das formas de energia contempladas na Física Perfeita.

Atrito (em sentido mecânico restrito ou em sentido generalizado), dissipação de energia, irreversibilidade, quebra de simetria temporal, estão sempre associados, pois têm como raiz comum a “imperfeição” do mundo onde existimos.

A dicotomia aqui introduzida e realçada entre o que designamos por Física Perfeita e o que chamamos Termodinâmica Macroscópica, destina-se a acentuar a importância que tal dicotomia tem para a compreensão e assimilação da estrutura conceptual da Termodinâmica Macroscópica, a qual pressupõe a prévia familiarização com os conceitos e métodos da Física Perfeita.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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À Termodinâmica Macroscópica compete integrar as “imperfeições” em que radica o fluir do tempo em sentido único e negam ao Homem a intemporalidade divina da eternidade.

Podemos assim dizer que:

Termodinâmica Macroscópica = Física Perfeita + Imperfeições

1.3. Termodinâmica Macroscópica e Física Estatística: Reversibilidade Microscópica e Irreversibilidade Macroscópica

Como ponto de partida da Física Teórica tivemos a Mecânica de Newton que nasceu e ganhou validade universal com a capacidade de previsão do movimento dos astros. Tratar os astros como pontos materiais que se movem sem atrito é uma aproximação praticamente perfeita quando se trata de prever as suas trajectórias e movimentos relativos. Neste movimento há conservação de energia e estamos no domínio por excelência da Física Perfeita.14 É ao mesmo tipo de idealização que se recorre quando se começa a abordar a constituição da matéria ao nível microscópico. É assim como se a “perfeição” existisse nos extremos do muito grande e do muito pequeno, mas não existisse à nossa escala do observável.

Note-se porém uma diferença fundamental entre os dois extremos no que à observação e validação experimental da teoria se refere. No caso dos astros, as nossas observações e medidas não afectam praticamente o resultado da observação, enquanto que ao nível microscópico a observação interfere directamente e de modo significativo com o observado e nunca pode assumir por esse facto um carácter absoluto. O princípio da incerteza de Heisenberg foi o primeiro reconhecimento formal desta incapacidade intrínseca do ser humano em poder vir a conhecer na sua totalidade a constituição íntima da matéria. Esta constatação tem implicações de natureza filosófica e cultural para os que buscam uma explicação do universo em torno de princípios ou axiomas cada vez mais universais.

As observações anteriores, ditadas pelo desenvolvimento recente da Física Microscópica, em nada alteram a natureza puramente macroscópica de

14 Em rigor, as interacções Sol-Lua que provocam as marés dão origem a uma dissipação de energia

(nos oceanos) que se reflectem na redução do período de rotação da Terra. Todavia, o valor estimado para esta redução do período é tão pequeno (1-2 milisegundos por século) que pode de facto desprezar-se.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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conceitos como os de calor e temperatura, os quais têm necessariamente de entender-se (quando se busca a sua interpretação ao nível microscópico) como o resultado da interacção mútua de um número muito grande de agregados elementares para que a observação macroscópica dessas interacções tenha o sentido de uma média estável (e repetitiva) na escala de tempo adequada. A forma de que se reveste a energia ao nível microscópico, ou de que forma interaccionam os agregados ou partículas elementares, é irrelevante para a Termodinâmica Macroscópica.

Fica no entanto de pé uma questão recorrente e que é a da coerência da transição microscópico-macroscópico e que é:

Como é que uma concepção microscópica da matéria assente na Física Perfeita e no seu determinismo (mesmo tendo em conta o princípio da incerteza de Heisenberg e outras aquisições mais recentes como o caos determinístico), em que não existe flecha do tempo, é susceptível de explicar um facto tão fundamental e intransponível como é o fluir do tempo em sentido único, facto a que a própria irreversibilidade de todos os fenómenos naturais dá conteúdo e sentido?

É habitual afirmar-se que a resposta a esta questão se encontra na Física Estatística iniciada por Boltzman, o que não é verdade em sentido lato. A verdade (tornada evidente pelo estudo teórico e experimental dos sistemas termodinâmicos muito afastados do equilíbrio) é que continua a não existir uma resposta satisfatória e convincente para essa questão central, não só da Física Moderna como do pensamento filosófico contemporâneo.

Esta perspectiva, necessariamente sumária, deve ter-se em conta ao abordar a posição e o papel da Termodinâmica Macroscópica no âmbito da Física e do pensamento filosófico contemporâneos. Espera-se evitar assim a fácil tentação de pensar que existe já toda uma teoria consistente e completa levando sem contradições nem falhas das partículas elementares aos observáveis macroscópicos e à cosmologia. Quando tal teoria existir, a Termodinâmica Macroscópica continuará a ser o elo fundamental que dá ao fluir do tempo o sentido radical e inultrapassável que os humanos lhe conhecem.

O modo como surgiram e evoluíram os conceitos que deram origem à Termodinâmica é importante para situar na perspectiva adequada muitas das contradições e inconsistências que ainda permeiam muitos dos textos e cursos de física. Nestes, a sedução pela elegância formal da física perfeita contrasta com os raciocínios obscuros, tortuosos e muitas vezes artificiais com que a Termodinâmica é apresentada. Esta dicotomia remonta ao século XIX.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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Velha como o fogo, a Termodinâmica é por vezes acusada de ser o único ramo da física que nasceu com os engenheiros e de ter sido construída por Carnot para explicar factos observáveis (e economicamente importantes da máquina a vapor) contrariamente ao electromagnetismo, por exemplo, em que as equações de Maxwell anteciparam a existência de fenómenos só posteriormente observados, ou das equações de Newton que permitiram prever a existência de satélites desconhecidos em planetas há muito observados.

A verdade porém é que a Termodinâmica Macroscópica teve um papel central no desenvolvimento da Física Moderna e surgiu como corpo de doutrina e método de análise tornado exemplar na medida em que, dispondo de um conjunto restrito e imperfeito de observações, conseguiu, por pura dedução lógica a partir de conceitos fundamentais, estabelecer relações de validade universal e incontroversa sem recurso a qualquer modelo microscópico da constituição da matéria.

Surgida numa época de crise e de descrença nos modelos microscópicos da matéria, a força e generalidade da Termodinâmica Macroscópica como doutrina científica e estrutura conceptual provém do facto de ser independente de qualquer pré-conceito ou modelo do que se passa quanto à estrutura íntima da matéria.

É certo que esta generalidade e independência lhe confina o âmbito da aplicabilidade imediata a situações concretas. Por exemplo, a relação entre os calores específicos de qualquer substância é do seu âmbito, mas o valor concreto assumido pelo calor específico de uma substância particular não lhe é acessível pelo cálculo directo a partir dos seus princípios fundamentais. Tal valor concreto terá de ser obtido experimentalmente ou, eventualmente, por cálculo a partir de modelos e hipóteses quanto à estrutura íntima da matéria que constitui tal substância particular.

A Física Estatística, que estuda os observáveis macroscópicos que resultam do comportamento colectivo de agregados de muitas partículas microscópicas, pode permitir o cálculo directo de muitas propriedades termodinâmicas de substâncias particulares sem ter que recorrer à experimentação.

A Física Estatística complementa assim a Termodinâmica Macroscópica. Mas complementar não é substituir. Contrariamente ao que se afirma com frequência, a Termodinâmica Estatística não só não substitui como, sobretudo, não fundamenta completamente a Termodinâmica Macroscópica.

O que sucede, e não deixará de continuar a suceder, é o facto de a Termodinâmica Macroscópica ser um teste fundamental (porventura indirecto) da Física Estatística, na medida em que os observáveis

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Termodinâmica Macroscópica

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macroscópicos que esta for susceptível de prever não podem contradizer as relações fundamentais que a Termodinâmica Macroscópica estabelece a partir dos seus princípios fundamentais. E estes, como já sublinhámos, são independentes de qualquer modelo ou hipótese sobre a constituição microscópica da matéria.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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2. Princípios da Termodinâmica

A introdução precedente situa o fio condutor deste curso de Termodinâmica.

Partindo do Princípio da Conservação da Energia como um dado adquirido e indiscutível, trata-se agora de integrar na teoria o facto incontroverso e indiscutível da dissipação da energia e do sentido único da flecha do tempo que lhe está associada, ou seja, da irreversibilidade.

Para isso precisamos de exprimir com todo o rigor formal possível essa constatação do trivial, que é a existência de um passado e de um futuro ou a da dissipação das formas nobres da energia.

Constatar e aceitar que a dissipação de energia é macroscopicamente inevitável, ou que o fluir do tempo se faz em sentido único, constitui na sua radical essência, esse princípio, famoso e universal, que é a segunda lei da Termodinâmica.

2.1. Definições e Convenções A capacidade de comunicar depende da existência de símbolos, vocábulos, imagens, sons, etc, igualmente inteligíveis por ambos os interlocutores e com significado equivalente. A partir desse conjunto, é possível elaborar conceitos e alargar a base comum que permite ampliar e facilitar a comunicação.

Em Física, os conceitos fundamentais formam-se, habitualmente, a partir de factos da vida corrente que vão sendo sucessivamente elaborados até assumirem a forma rigorosa e sem ambiguidades que lhes confere a sua expressão matemática. Esta atitude assume a sua expressão mais abstracta na física moderna e em particular na mecânica quântica, em que o conceito se condensa na própria equação matemática ou nas propriedades de uma solução particular. A expressão do conceito pode então nem sequer ser susceptível de tradução sensorial rigorosa, porque tal expressão rigorosa existe apenas na própria linguagem matemática que o traduz.

Conceitos correntes como calor, temperatura, quente, frio, etc. existem na linguagem corrente mas sem o rigor adequado. Nestes casos, procederemos à sua discussão e reelaboração até assumirem a forma rigorosa que utilizaremos em Termodinâmica.

A partir destes conceitos o corpo da teoria obtém-se então por dedução lógica a partir de um número mínimo de axiomas ou princípios fundamentais (que também designaremos por leis ou princípios).

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Termodinâmica Macroscópica

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Como já se referiu, a Termodinâmica Macroscópica (TM) foi construída sem recurso a qualquer modelo microscópico, partindo de um número muito reduzido de conceitos e princípios fundamentais.

Basicamente, a Termodinâmica Macroscópica estabelece relações funcionais entre grandezas aplicáveis à generalidade dos sistemas.

A particularização para substâncias particulares exige o recurso à experimentação que pode, eventualmente, ser substituída por cálculo a partir de modelos microscópicos adequadamente validados.

É muito importante haver um entendimento claro dos termos e conceitos que iremos utilizar.

Muitas das dificuldades encontradas na apreensão da Termodinâmica radicam na pouca atenção prestada às definições e ao significado estrito dos termos utilizados.

Sistema termodinâmico: É a região do espaço, contida numa superfície geométrica fechada, sobre a qual incide o nosso estudo. Este espaço pode ser dividido em sub-regiões fechadas e disjuntas a que chamamos subsistema.

Ao espaço, para que constitua um sistema termodinâmico, apenas se exige que contenha energia. Mesmo num espaço onde exista o vácuo perfeito teremos um sistema termodinâmico desde que a superfície material que o confina não esteja a 0 K. Esta condição verifica-se sempre no Universo conhecido (a radiação de fundo no espaço exterior corresponde a uma temperatura de 3-4 K).

2.1.1. Variáveis As variáveis termodinâmicas são grandezas físicas que permitem caracterizar o sistema quanto ao modo como acumula e troca energia.

As variáveis extensivas são variáveis escalares somáveis (volume, V, massa, m, quantidades dos componentes químicos independentes, Ni). No caso geral de a variável ser um tensor, consideram-se como variáveis termodinâmicas as suas componentes independentes.

As variáveis intensivas são variáveis escalares não somáveis (pressão, P, temperatura, T, potenciais químicos dos componentes químicos independentes, µi).

A aditividade ou não aditividade que distingue as variáveis extensivas das variáveis intensivas é considerada no seu sentido físico, isto é, quando juntamos um sistema com massa m1 a um sistema com massa m2, o sistema conjunto fica a possuir a massa 1 2m m m= + . Tal não sucederia se em vez

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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da massa (ou do volume, por exemplo) se tratasse de pressões ou temperaturas15.

A Termodinâmica Macroscópica trata apenas das situações em que o sistema pode ser dividido em subsistemas no interior dos quais as variáveis intensivas são macroscopicamente uniformes.16

É ainda importante definir as variáveis molares. Para isso comecemos por definir N, o número total de moles de todos os componentes químicos existentes no sistema:

1

r

ii

N N=

≡ ∑ , (0.1)

sendo r o número de componentes químicos existentes no sistema. As variáveis molares são então definidas como o quociente de cada variável extensiva por N:

S

sN

= , (0.2)

U

uN

= , (0.3)

Vv

N= , (0.4)

15 A definição das variáveis extensivas e intensivas em termos da aditividade é susceptível de

alguma ambiguidade ou mesmo contradição, quando se trata de grandezas não escalares. A origem da designação de propriedade extensiva encontra-se no facto de a "extensão" do sistema ser directamente proporcional ao seu valor, o que é óbvio quando se trata, por exemplo, do volume, da massa, ou das quantidades dos componentes químicos, pois nesse caso é a "extensão" do sistema, no sentido de "tamanho", "dimensão", “massa” que está em causa. Há porém variáveis extensivas em que a sua associação à "extensão" física do sistema não é óbvia. Nesses casos, a ambiguidade desaparece se a sua definição se fizer a partir da expressão do fluxo infinitesimal de energia que o sistema pode trocar, pois este fluxo se exprime sempre como o produto escalar de uma diferencial por uma quantidade finita. A diferencial é sempre a diferencial do deslocamento generalizado, que, para os tipos de trocas de energia consideradas neste texto, é uma variável extensiva. O factor finito é sempre a força generalizada, que, para os tipos de trocas de energia consideradas neste texto, é uma variável intensiva. Notar-se-á que falamos de produto escalar e não de produto vectorial.

16 No caso limite da Termodinâmica Macroscópica dos Meios Contínuos o subsistema reduz-se a um volume infinitesimal e as variáveis intensivas passam a ser função do ponto. A hipótese fundamental é então que no subsistema infinitesimal se verificam, a cada instante, as mesmas relações termodinâmicas que existiriam num sistema de dimensão finita em que as propriedades intensivas seriam uniformes e de igual valor ao que se verifica no ponto. Este é o ponto de partida para a Termodinâmica dos Processos Irreversíveis.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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31

, 1, ,jj

Nx j r

N= = K . (0.5)

Estas variáveis são respectivamente designadas como entropia molar, energia interna molar, volume molar, e fracção molar do componente i. As variáveis molares são sempre designadas com letras minúsculas. Dada a definição (0.1), temos que

1

1r

jj

x=

=∑ . (0.6)

As variáveis externas são variáveis que podem ser fisicamente medidas do exterior do sistema termodinâmico. São, por exemplo, o volume, a massa, o campo eléctrico, o campo magnético. A identificação destas variáveis é fundamental para o desenvolvimento da teoria pois é através delas que podemos medir os fluxos de energia perfeita entre o sistema termodinâmico e o seu exterior, independentemente de qualquer hipótese sobre o que no seu interior se passa.

As variáveis internas não são directamente mensuráveis e o seu valor apenas pode obter-se por cálculo a partir do valor de variáveis externas. A energia interna e a entropia são variáveis internas.

2.1.2. Paredes À superfície que contém o sistema termodinâmico chamamos parede. As paredes (que constituem idealizações) correspondem a casos limite de realização prática e são caracterizadas pelas propriedades físicas que as definem.

A parede impermeável ao componente k não permite a passagem através dela de moléculas do componente químico k. A parede impermeável não permite a passagem de moléculas de qualquer componente químico.

A parede adiabática não permite através dela a passagem de calor. A parede adiabática corresponde a um conceito particularmente importante em termodinâmica macroscópica e corresponde ao caso limite de um isolamento térmico perfeito, o qual se obtém com um material isolante de espessura infinita. Na prática, corresponde ao limite assimptótico dos resultados que se obtêm aumentando progressivamente o isolamento17. Uma parede adiabática é necessariamente uma parede impermeável.

17 A possibilidade de, assimptoticamente, se poder realizar uma parede adiabática foi crucial para o

estabelecimento da base fenomenológica da Termodinâmica. A calorimetria, que levou à formulação da teoria do calórico, começou com essa possibilidade experimental. Em termos puramente lógicos, seria absurdo procurar estudar o que era o calor se não fosse possível, sequer,

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Princípios da Termodinâmica

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A parede adienergética não permite através dela qualquer passagem de energia. Uma parede adienergética é necessariamente uma parede adiabática.

Os sistemas que não estão contidos em nenhuma parede ou que se encontram contidos por paredes (fixas ou não) permeáveis a pelo menos um dos componentes são designados como sistemas abertos. Os sistemas contidos por paredes impermeáveis são designados como sistemas fechados.18 Os sistemas contidos por paredes adiabáticas são designados como sistemas adiabáticos (e portanto, são necessariamente sistemas fechados).19 Os sistemas contidos por paredes adienergéticas são designados como sistemas isolados (e, portanto, são necessariamente sistemas adiabáticos).

2.1.3. Convenção de Sinais O sinal dos fluxos de energia e massa permutados pelo sistema com o exterior podem ser arbitrários desde que sejam consistentes entre si e na escrita das equações.

Deste facto resultou o longo (e infeliz) hábito de muitos autores darem sinais diferentes à energia que entra ou sai do sistema consoante se trata de energia interna ou das formas macroscópicas da Física Perfeita.

Neste curso, as quantidades recebidas pelo sistema20 são

sempre positivas. As cedidas são sempre negativas.

Esta convenção de sinais é frequente nos cursos modernos de Física, mas não o é na maioria da literatura anglo-saxónica de engenharia, sobretudo quando a ênfase é na aplicação a motores. Nessa convenção, o calor recebido é positivo mas o trabalho recebido é negativo, correspondendo à noção de que se a finalidade do motor é fornecer trabalho à custa de calor,

impedir a sua passagem ou circunscrevê-lo, de modo a tornar os seus efeitos acessíveis à experimentação.

18 A confusão entre sistema fechado e sistema isolado é frequente, sobretudo em textos de biologia e de ecologia. O planeta Terra é um sistema termodinâmico praticamente fechado, mas não é isolado. A característica fundamental de um ser vivo é ser um sistema aberto.

19 Dada a importância na Termodinâmica de separar os efeitos de trocas de calor dos efeitos das restantes trocas de energia, isto explica a importância que têm os sistemas fechados no desenvolvimento da teoria termodinâmica.

20 Energia, seja qual for a sua forma, massa, etc.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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o trabalho deve ser tomado como positivo se o motor o cede. Como é óbvio, se se trata de um frigorífico, a noção fica invertida!21

2.2. 1º Princípio da Termodinâmica Sempre que em Física Perfeita há dissipação de energia, constata-se que existe uma alteração de temperatura ou uma mudança de estado. Os conceitos de quente e frio são velhos como a humanidade, sendo, a febre, que corresponde a um aumento de temperatura do corpo acima do normal, considerada como um dos primeiros sintomas de doença. Certamente por isso, os primeiros termómetros e as primeiras observações consistentes sobre os fenómenos térmicos partiram de médicos (a que se chamavam físicos...) e de químicos (... alquimistas).

A sistematização dos conhecimentos nesta área (a teoria do calórico, a calorimetria, etc.) com a mecânica, a electricidade, etc., só se concretizou quando Joule estabeleceu a equivalência entre trabalho e calor.

Existindo já a equivalência entre as várias formas de energia da Física Perfeita, a identificação do calor com a forma de energia que surgia quando as outras se dissipavam surge como um facto central e o princípio da conservação da energia transforma-se no pilar mais importante em que assenta toda a Física.

O 1º Princípio da Termodinâmica, ou princípio da conservação

da energia, não se demonstra. A sua validade aceita-se como

universal pois nenhum facto até hoje observado o contradiz.

2.2.1. Formulação do Princípio Sendo o conceito de energia um conceito primitivo, e sistema isolado o que não troca energia com o exterior, o primeiro princípio da termodinâmica traduz-se por:

Num sistema isolado, a energia (que inclui a massa) permanece

constante.

Deve notar-se, neste enunciado, que na energia está a implícita a relação de Einstein para a equivalência entre massa e energia.

21 Exemplos desta convenção encontram-se, por exemplo, em Moran e Shapiro (1988, pp. 32 e 46) e

em Deus et al. (1992).

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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Não existindo reacções nucleares, a energia e a massa são

separadamente conservadas.

A conservação da energia (não considerando a energia interna) era já uma constatação da Mecânica clássica obtida impondo a simetria no tempo. Outras leis de conservação incluem a conservação do momento obtida impondo a simetria na translacção no espaço e a conservação do momento angular impondo a simetria na rotação no espaço. A colisão elástica entre corpos conserva a quantidade de movimento e a energia cinética. Isto é, se

mi for a massa em repouso e iur

a velocidade do corpo i, as quantidades

iii

m u∑r

e 2

iii

m u∑r

,

correspondentes, respectivamente, à soma das momentos lineares e à soma das energias cinéticas, são independentemente conservadas. Se a colisão não for elástica e conduzir à perda de identidade dos corpos que colidem, como na "reacção" nuclear

7 1 4 4Li H He He+ → +

estudada por Cockroft e Walton, continua a existir a conservação da quantidade de movimento, mas nem a massa total nem a energia cinética se conservam. Todavia, como os mesmos autores confirmaram experimentalmente, verifica-se a relação

∆∆∆∆ ∆∆∆∆E c mcinética∑ ∑+ =2 0,

onde c é a velocidade da luz no vazio. Neste caso, definimos a energia interna de cada um dos corpos que colidem como

E mcinterna = 2

Para que a relação anterior se possa escrever como:

∆ ( )E Ecinética interna∑ + = 0

a qual exprime a conservação da energia total, ou seja, da energia interna mais cinética. A relação anterior entre a massa e a energia interna é a mesma que Einstein previu em 1905, no mesmo ano mas não no mesmo artigo, em que enunciou a teoria da relatividade restrita. Como a relação

2internaE mc=

é independente da velocidade, não é necessária a Teoria da Relatividade para a justificar, podendo assumir-se como um facto experimental a equivalência da massa à energia interna.

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Princípios da Termodinâmica

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Todavia, a menos que ∆∆∆∆Einterna seja muito grande, como nos processos nucleares, a variação de massa é tão pequena que não é detectável. Nestes casos procedemos como se massa e energia fossem separadamente conservadas22.

Na situação actual, poderíamos quase dizer que o princípio da conservação da energia se transformou no princípio da conservação do próprio princípio, na medida em que, se surgirem contradições, a teoria será mudada para que o princípio da conservação da energia permaneça válido.

A energia e a conservação da energia tornaram-se em

pilares fundamentais do conhecimento científico .

Tendo sido uma aquisição fundamental da Termodinâmica Clássica, o primeiro princípio da Termodinâmica, ou princípio da conservação da energia, está hoje implícito em toda a nossa concepção do universo como um dado fundamental que não só não se questiona como se aceita como ponto de partida.

2.2.2. Forma Generalizada do Fluxo de Energia na Física Perfeita O conceito de energia surgiu em mecânica ligado ao trabalho de uma força. Por definição:

δW=F.dL 23

= ∑ F dLi

ii

.

em que F é a força aplicada (de componentes Fi) e dL (de componentes

dLi) o deslocamento elementar do seu ponto de aplicação.

O conceito de força em mecânica deu origem ao conceito de força generalizada bem como o de deslocamento originou o de deslocamento generalizado. O conceito de deslocamento generalizado corresponde ao de uma variação da coordenada generalizada a que se refere. Por sua vez, as coordenadas generalizadas (que correspondem aos graus de liberdade do sistema) constituem o número mínimo de variáveis com que é possível

22 Este exemplo permite sublinhar como o princípio da conservação da energia, enunciado no século

anterior, foi preservado e levou à identificação da massa com a energia. Mostra também como aquela identificação reconciliou todo o conhecimento anteriormente existente e foi consistente com todas as descobertas posteriores.

23 Utilizaremos os símbolos em negrito itálico para designar vectores. F e dL são por isso vectores e o ponto (.) exprime o seu produto interno.

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Princípios da Termodinâmica

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descrever completamente a evolução do sistema. Por definição, é possível variar independentemente cada uma das variáveis generalizadas.

Nessa generalização, a característica comum e fundamental é o

facto de um fluxo de energia (ou de uma troca de energia) se

poder sempre exprimir como o produto de uma força

(generalizada) por um deslocamento (generalizado).

Aliás, na expressão de qualquer troca elementar de energia, os dois termos são sempre identificáveis, correspondendo quase sempre o deslocamento generalizado a uma variável extensiva e a força generalizada a uma variável intensiva (no sentido termodinâmico anteriormente referido). Por exemplo, 1) no fluxo de energia transferido sob a forma de calor, a força generalizada é a temperatura, T, e o deslocamento generalizado é a variação de entropia, dS e 2) no fluxo de energia transferido sob a forma de trabalho de expansão, a força generalizada é a pressão, -P, e o deslocamento generalizado é a variação de volume, dV.

2.3. 2º Princípio da Termodinâmica

2.3.1. Calor Não existindo dissipação na Física Perfeita, mas sendo o mundo macroscopicamente observável caracterizado pela dissipação e pela irreversibilidade, o princípio da conservação da energia em sentido lato, isto é, no sentido da Termodinâmica Macroscópica, conduz necessariamente a transformar o conceito de calor num como que resto, ou “caixote de lixo”, no qual se transformam as energias nobres (formas de energia da Física Perfeita) quando se degradam.

Que modelo microscópico podemos nós associar àquilo a que chamamos calor para que ele próprio não se degrade também? No caso de se “degradar”, em que observável macroscópico se traduziria essa “degradação”? A esta questão central a Física responde (no estado actual do conhecimento) identificando aquilo a que chamamos calor com as formas de energia perfeitas, mas agora ao nível microscópico

Passamos a admitir que a Física Perfeita é a única que existe ao nível microscópico, pelo que continua a existir a esse nível a conservação das suas formas de energia.

A dissipação de energia a nível macroscópico traduz-se no aumento da energia interna a nível macroscópico. A energia interna traduz-se nas

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Princípios da Termodinâmica

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formas de energias perfeita a nível microscópico. O calor é um fluxo de energia que permuta energia interna entre sistemas24,25.

O facto fundamental é que a passagem de energia do nível

macroscópico para o nível microscópico nunca é

completamente invertível, isto é, enquanto que a passagem de

energia do nível macroscópico para o nível microscópico

(dissipação) acontece em todos os fenómenos naturais, a

conversão de energia do nível microscópico para o nível

macroscópico obedece a condicionantes suplementares e nunca

se realiza completamente (no mundo real).

Para a Termodinâmica Macroscópica Clássica é irrelevante a forma ou formas, conhecidas ou desconhecidas, que a energia assume enquanto energia interna. Para a elaboração da sua estrutura conceptual bastam os pressupostos de que tal energia existe e de que, globalmente, a energia se conserva. Este conceito base, associado ao da existência de irreversibilidade que a dissipação traduz (2º princípio), é quanto basta para deduzir um número muito importante de propriedades e relações fundamentais. A pura visão macroscópica do sistema termodinâmico fica porém enriquecida quando a perspectiva microscópica lhe é associada.

Por outro lado, o dado central a ter em conta em qualquer modelo microscópico da matéria é de que nesse modelo a energia não se dissipe. Na sua forma mais elementar, a questão que surge então é: como e porque se conserva a energia num sistema isolado de tal modo que ela possa permanecer indefinidamente constante?

A resposta surge inspirada nos modelos mecânicos macroscópicos. Se imaginarmos a matéria formada por pontos materiais em movimento, realizando entre si choques perfeitos, a energia cinética do conjunto mantém-se. O choque elástico destes pontos materiais com a parede do sistema (se o número de pontos for muito grande e o período de observação suficientemente longo) manifesta-se exteriormente como uma pressão. O modelo de gás perfeito monoatómico corresponde a esta idealização.

24 O termo calor deve usar-se em sentido análogo ao da chuva. Uma nuvem não é chuva acumulada,

tal como a água que resulta de ter chovido não é chuva, mas sim água. O calor, tal como a chuva, só existe como trânsito ou passagem de energia interna de um sistema para outro.

25 No entanto, o calor não é o único tipo de permuta de energia interna. Por exemplo, é também possível permutar energia interna através da difusão de massa.

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Princípios da Termodinâmica

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Será então possível admitir que os choques entre os pontos materiais co m que idealizamos o gás perfeito não seja perfeitamente elástico?

É evidente que não, porque se o choque fosse inelástico haveria dissipação de energia mecânica (a nível microscópico) pelo que teríamos de admitir que o ponto material que representava o átomo teria de possuir uma estrutura mais complicada do que um ponto material, estrutura essa que teria novamente de comportar um nível em que voltasse a admitir-se a conservação da energia numa das formas contempladas pela Física Perfeita.

Este exemplo simples e clássico do gás perfeito monoatómico ilustra a questão central que desejamos sublinhar: nos modelos microscópicos de constituição da matéria, há sempre um nível último em que as únicas formas de energia concebíveis são as da Física Perfeita pois elas são as únicas que comportam a exigência formal imposta pela conservação de energia. Ao nível microscópico fundamental não pode pois haver dissipação, o que implica a reversibilidade no tempo, ou ainda a indistinguibilidade do passado e do futuro.

2.3.2. Postulado da Dissipação Consideremos um sistema isolado, separado em dois subsistemas que trocam energia entre si (Figura 1).

Figura 1 - Sistema isolado, com dois subsistemas.

Parede adienergética

Parede adiabática Admitamos que a energia contida em A é U(A) e em B, U(B). A energia do sistema conjunto (A + B), U(A+B) é dada por

( ) ( ) ( )A B A BU U U+ = + . (0.7)

Por simplicidade, admitamos que A é fisicamente homogéneo, e vai ser a partir de agora o objecto de estudo. Neste entendimento, ao subsistema A chamaremos simplesmente sistema, e a B chamaremos exterior. Pressupomos que em B se encontra o observador que vai procurar inferir o que se passa no interior de A a partir do que pode observar e medir em B.

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Supomos também que no interior de B não há dissipação de energia. Nesta situação idealizada, no sistema B, o universo é completamente descrito pelas leis da Física Perfeita.

Suponhamos agora que a parede que separa A de B é adiabática.26Assim, as permutas de energia entre A e B só podem assumir as formas conhecidas da Física Perfeita. Por esse facto, o observador que se encontra em B pode medir exteriormente a A todos os fluxos de energia perfeita que nele entram ou que dele saiam.

Sejam então ( )1, , nx xK as variáveis externas generalizadas através das

quais se processa a transferência de energia com A, e sejam ( )1, , nΠ ΠK as forças generalizadas que lhes estão associadas. Por definição, tanto as forças generalizadas como as variáveis externas se podem medir em B (exterior de A) sem restrições.

O fluxo elementar de energia que A troca com o seu exterior pode assim exprimir-se, em cada instante, por:

( )1 1

1

nA

n n i ii

dU dx dx dx=

= Π + +Π = Π∑L (0.8)

Tendo em conta que a configuração externa do sistema é dada a cada instante pelo valor das coordenadas externas extensivas xi (a cuja variação está associado o trabalho generalizado realizado por Πi), quando as

variáveis externas descrevem um ciclo, o sistema voltou ao ponto de partida tal como descrito pelas coordenadas externas que descrevem totalmente a sua configuração ou estado no âmbito da Física Perfeita.

Durante a descrição do ciclo, houve apenas trocas de energia perfeita, e apenas desta, porque a parede é adiabática.

Matematicamente, o saldo de toda a energia (nas formas macroscópicas da Física Perfeita) permutada ao longo do ciclo é dado por:

( )

1

nA

i ii

dx U=

Π = ∆∑∫ (0.9)

Se houver conservação da energia perfeita27, ( ) 0AU∆ = , e o estado final é

rigorosamente igual ao estado inicial.

26 Atente-se no papel crucial que desempenha na dedução o conceito de parede adiabática e a

importância que este conceito tem para todos os desenvolvimentos posteriores.

27 Energia perfeita, como facilmente se infere, é o vocábulo que utilizamos para designar as formas macroscópicas da Física Perfeita. São as formas de energia não associadas a energia interna ou

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Princípios da Termodinâmica

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Neste caso, nada distingue, fisicamente, o instante em que o ciclo começou do instante em que o ciclo terminou, nem o sentido em que o ciclo foi descrito. Fisicamente, seria como se não tivesse havido ciclo algum, pois dessa evolução temporal não ficaria vestígio fisicamente detectável.

Essa não é, porém, a realidade macroscópica do mundo em que vivemos, devido à existência de dissipação das formas macroscópicas da energia perfeita, sempre que as mesmas se permutam ou convertem entre si.

O reconhecimento desta realidade fundamental é expresso sob a forma do Postulado da Dissipação, que podemos exprimir como :

0i ii

U dx∆ = Π ≥∑∫ (0.10)

ou seja,

Num processo adiabático em que as variáveis externas

extensivas descrevem um ciclo, a energia interna nunca

diminui.

Este postulado é equivalente ao 2º Princípio da Termodinâmica.

Exemplo. Para que o experimentador possa alterar algum dos xi, e obrigar assim o sistema a evoluir, terá de actuar sobre a força generalizada que lhe está associada (tal como sucede na mecânica, é necessária uma força para que se altere o estado de equilíbrio). Por exemplo, se quisermos variar o volume ocupado por um gás no interior de um cilindro com um êmbolo móvel, actuamos sobre (modificamos) a força generalizada ΠΠΠΠ (Figura 2).

Figura 2 – Compressão de um gás

movimentos microscópicos, isto é, são todas as formas de energia que podem ser permutadas através de uma parede adiabática (e portanto, impermeável).

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Nas situações reais, as forças generalizadas ΠΠΠΠ não são, em geral, univocamente determinadas pelos xi28. Se o fossem, o integral curvilíneo que exprime o postulado da dissipação seria nulo29. Nesse caso ideal, que corresponderia à ausência de dissipação, teríamos uma evolução reversível de primeira espécie. Isto é, seria:

0i ii

dxΠ =∑∫ (0.11)

No caso geral, que o postulado da dissipação exprime, o não anulamento do integral curvilíneo resulta de, para um mesmo deslocamento generalizado dxi , o valor de ΠΠΠΠi não ser igual para dxi>0 e para dxi<0.

De facto, o valor de ΠΠΠΠi depende, em geral, da velocidade a que o

deslocamento se faz, isto é, de dxi/dt. Daí que se tenha generalizado a ideia de que num processo de evolução tão lento que se possa considerar quase-

estático, a relação (0.11) se verifica sempre, o que corresponderia ao limite:

0idx

dt→

Resultaria assim que, de entre todos os ciclos (0.10), existiria o caso limite (0.11), correspondente à reversibilidade de primeira espécie e para a qual as forças generalizadas ΠΠΠΠi assumiriam o valor particular Fi, isto é30

0limi

i idx dt

F→

= Π ,

Supondo que os Fi existem, o Postulado da Dissipação exprime-se

também por:

( ) 0i i iF dxΠ − ≥ (0.12)

ou seja,

28 Não esquecer que a parede do sistema é adiabática.

29 O integral curvilíneo ao longo de um ciclo fechado é necessariamente nulo se as forças forem funções unívocas do ponto. No caso vertente, é nulo porque, por hipótese, não há dissipação de energia no sistema B, onde os campos de forças são conservativos e, por consequência, derivam de potenciais.

30 Em rigor, é desnecessário que esta relação se verifique no limite. O sentido rigoroso que deve ser dado ao de uma evolução quase-estática não é ser arbitrariamente lenta mas o ser nula a variação de energia interna num ciclo adiabático, que é o significado de (0.11).

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Princípios da Termodinâmica

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numa evolução adiabática real o sistema recebe sempre mais energia do que a que cede para igual valor de | |dx

i

Para interpretar a expressão (0.12), note-se que as forças Πi e Fi são exercidas no sentido do deslocamento dxi, isto é, têm o mesmo sinal. Assim, as três grandezas envolvidas na expressão (0.12) ou são todas positivas ou são todas negativas. Caso sejam positivas, concluímos que

i iFΠ > . Caso sejam negativas, concluímos que i iFΠ < . Ambos os casos

significam que i iFΠ > .

Deve notar-se que (devido às hipóteses feitas) as grandezas envolvidas são sempre directamente mensuráveis no exterior do sistema em estudo, dispensando assim qualquer hipótese sobre a sua constituição ou sobre o que se passa no seu interior. De facto, apenas foram tidas em conta as reacções que o sistema manifestou às interacções com as forças que foram aplicadas do exterior, cujo trabalho realizado pode ser medido (e como tal os fluxos de energia com o sistema) pois os deslocamentos também o puderam ser, univocamente. Deste modo, é possível descrever sempre a evolução do sistema nas coordenadas (U, x1, x2 , ..., xn), em que U representa as variações de energia interna a partir de um estado de referência.

Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie Na Figura 3, o sistema da Figura 2 descreve um ciclo fechado na coordenada externa x, compreendendo três passos. Convenciona-se que a coordenada x aumenta na direcção da direita.

Figura 3 – Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie (exemplo).

A→B O sistema é submetido a uma força exterior constante, isto é,

0 0Π = Π < (devido a orientação do eixo dos xx), que o

comprime. A variação de energia interna é dada por

( )0 0B

A

x

B A B AxU U dx x x− = Π =Π − >∫ 31. Assim, a energia interna

varia linearmente com a posição.

B→C O sistema deixa de estar submetido a qualquer força, isto é, 0Π = . A esta deslocação não corresponde qualquer trabalho, e

31 O integral que define o trabalho não está precedido de um sinal negativo porque estamos a medir

o trabalho com variáveis no exterior do sistema. Fisicamente, não há dúvidas: o gás está a ser comprimido, portanto a receber trabalho, que deverá ser positivo.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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43

0C BU U− = .

C→A A parede que limita o sistema é bloqueada, não permitindo qualquer deslocamento e portanto qualquer variação na coordenada x. Assim, o sistema só pode trocar energia por calor, cedendo a quantidade de calor, Q, necessária para que

A CU U Q− = .

Este sistema só pode descrever um ciclo se transferir calor no passo C→A e portanto se deixar de ser adiabático.

Evolução adiabática reversível Na Figura 4, o sistema descreve um ciclo fechado nas coordenadas externas xi mas a energia interna não aumenta. Este corresponde ao caso limite em que a velocidade dos processos tende para zero e portanto o sistema cede a mesma energia na expansão que recebeu na compressão e volta ao estado inicial sem ter de transferir energia sob a forma de calor.

Figura 4 – Evolução adiabática reversível.

Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática. Na Figura 5, partindo do estado inicial A, o gás expande-se para o vácuo (ΠΠΠΠ=0) até B. Entre A e B não há variação de energia interna porque o sistema é adiabático e não é aplicada nenhuma força ao sistema. Para recomprimir o gás é necessário aplicar ao êmbolo a força ΠΠΠΠ. O trabalho realizado por esta força faz aumentar a energia interna. A evolução A→ B não seria representável em coordenadas (P,V) em que P é a pressão no interior do êmbolo, pois P não é definido numa situação de não equilíbrio interno. Mas é representável em (ΠΠΠΠ, V).

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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Figura 5 – Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática.

U

Experiência de Joule Na Figura 6, a descida do peso realiza trabalho que as pás dissipam por atrito viscoso no fluido que enche o calorímetro, cuja parede (adiabática) não deixa passar calor. O trabalho fornecido é medido pelo deslocamento do peso e corresponde à diminuição da sua energia mecânica potencial. Entregue a si próprio, o peso desce. Espontaneamente, a energia que foi transferida para o sistema adiabático (calorímetro) nunca volta a fluir para o exterior, fazendo o peso subir. O processo é puramente dissipativo pois o calorímetro apenas é susceptível de receber energia. A entropia do sistema adiabático aumentou devido a uma irreversibilidade de primeira espécie ou seja devido ao atrito entre as pás e o ar. O efeito final da dissipação de energia mecânica é totalmente equivalente ao de um fornecimento de calor. A única forma de o sistema (calorímetro adiabático) poder voltar ao estado inicial (retomando a entropia que tinha) é cedendo energia interna, sob a forma de calor, ao exterior, deixando portanto de ser adiabático. A experiência mostra como todas as medidas calorimétricas se podem reduzir à medida de outras formas de energia. A experiência de Joule ilustra, de modo exemplar, o primeiro e o segundo princípios da Termodinâmica.

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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45

Figura 6 – Experiência Fundamental de Joule

Peso

Calorímetro:parede adiabática

Pás

2.3.3. Evolução Adiabática Reversível Para a evolução adiabática reversível é

∫∑i

ii dxF

Considerando F1 ... Fn como as componentes de um vector, a relação

anterior é equivalente à afirmação de que rot F=0 ou ainda que F=grad Φ, o que significa que F deriva do potencial escalar Φ.

Mas aquela relação implica também que o sistema opõe sempre uma força igual e oposta à que o exterior exerce sobre ele. Daqui resulta que

dU dx

dxi

i

i= − = −∑Φ Φ∂∂

e portanto U=U(x1 ... xn,ξ) , sendo ξ uma constante de integração independente das coordenadas x.

Se, por exemplo, a constituição do sistema for tal que todas as suas permutas de energia com o exterior numa evolução adiabática reversível se puderem exprimir pela variação da coordenada externa V (volume), como sucede com um gás, será

U=U(V,ξ)

e a força generalizada associada a essa coordenada será:

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Termodinâmica Macroscópica

Princípios da Termodinâmica

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− =PUV

∂∂

ou seja a Pressão32 que o sistema exerce sobre a parede que o confina.

Deve notar-se que esta pressão iguala a que o exterior exerce sobre o sistema pois estamos a supor que se trata de uma evolução reversível. Se a evolução não fosse reversível, a pressão exercida pelo exterior sobre o sistema estaria sempre definida mas a pressão do sistema não estaria.

Na situação representada na Figura 2, e na Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática. , a pressão exterior seria dada por p=Π/A , sendo A a área do êmbolo (suposto rígido e deslocando-se sem atrito) e p=-P.

No caso da Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática. , em que ΠΠΠΠ=0 durante a expansão para o vácuo, dU=0, pois o sistema não fornece qualquer energia ao exterior. A pressão que o sistema (gás) exerce sobre o êmbolo (suposto sem inércia) é então nula.

Para distinguir a pressão que o sistema exerce sobre a parede que o confina, da pressão que sobre ela o exterior exerce, usaremos, respectivamente, os símbolos P e p. A igualdade de P e p só se verifica nas situações de reversibilidade de 1ª espécie.

2.3.4. Evolução Adiabática Irreversível Consideremos de novo a situação representada esquematicamente na Figura 4, correspondente a um ciclo fechado nas coordenadas externas quando o sistema é adiabático e a evolução reversível.

Por hipótese, as variáveis externas em que o ciclo foi descrito contemplam todas as formas macroscópicas de energia perfeita que o sistema pode permutar com o exterior, e estas variáveis são suficientes para determinar univocamente a energia interna que o sistema possui e as reacções (como p.ex. a pressão) que ele opõe à interacção com o exterior se essa interacção for reversível. Isto é, o comportamento do sistema é previsível se os processos que sofre forem adiabáticos reversíveis.

32 O sinal de P resulta da convenção de sinais adoptada. Sendo dU=-PdV, dU é positivo quando

dV<0, o que exige que dP<0.

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Se os processos não forem reversíveis, como esquematicamente se representa na Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie , torna-se evidente que o espaço definido pelas variáveis externas x é insuficiente para determinar a energia interna, U , de modo unívoco.

Tendo em conta que as coordenadas ou variáveis externas x esgotam os graus de liberdade através dos quais se pode permutar energia através de uma parede adiabática, teremos de concluir que é necessário ter em conta variáveis adicionais e que essas variáveis têm de ser internas, se quisermos descrever de modo unívoco as evoluções da energia interna do sistema termodinâmico num sistema de coordenadas generalizadas que lhe seja intrínseco.33

Posto de outro modo, trata-se de constatar que, tendo havido dissipação de energia das formas perfeitas, e havendo conservação de energia total, é imprescindível a introdução de variáveis adicionais que quantifiquem a energia que passou às formas microscópicas. Essas novas variáveis, impossíveis de medir directamente, serão necessariamente variáveis internas.

Por outro lado, e tendo em conta o Postulado da Dissipação, conclui-se que, se a energia interna nunca pode diminuir num processo adiabático em que as coordenadas externas descrevem um ciclo, então é necessário que a parede deixe de ser adiabática para que a energia (interna) do sistema possa regressar ao estado inicial no fim do ciclo.

Para que a quantidade (Uf - Ui) possa ser extraída, não só será necessário que a parede deixe de ser adiabática mas também que essa transferência se faça pelas coordenadas ou variáveis internas34. Isto é, nas condições deste problema, essa energia só pode ser transferida sob a forma de calor.

Concluímos assim pela rigorosa definição do conceito de calor:

33 Intrínseco no sentido em que permita conhecer a energia interna sem necessidade de recurso a

medidas no seu exterior. Esta é, aliás, a finalidade da termodinâmica.

34 Como as coordenadas externas voltaram ao seu valor inicial, só restam as variáveis internas para extrair a energia interna que resultou da dissipação.

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Calor é a única forma de energia que pode ser permutada pelo

sistema com o exterior através de uma parede impermeável,

quando as variáveis externas permanecem constantes.

Por outro lado, resulta da própria definição de energia interna, que para a sua variação é irrelevante a forma de energia macroscópica que lhe deu origem pois esta, ao dissipar-se, perdeu toda a identidade macroscópica que possuía.

2.3.5. Da irreversibilidade à entropia Consideremos de novo as trocas de energia entre os sistemas A e B, tal como anteriormente, mas admitindo agora que a parede que os separa não permite a variação de qualquer das coordenadas externas xi, além de ser diatérmica. Isto é, a única permuta possível de energia entre os sistemas A e B é a de energia interna (ou seja, dado que a parede é impermeável, os fluxos de energia podem apenas assumir a forma de calor).

Ora, pela própria definição de calor, nesta transferência de energia as coordenadas ou variáveis externas permanecem constantes e por isso tal fluxo não é directamente mensurável recorrendo a elas.

Por outro lado, se um sistema cede ou recebe energia interna, e tal apenas pode ser feito através das coordenadas internas, a possibilidade de medir a variação dessas coordenadas internas e das forças generalizadas que lhe estão associadas tornou-se uma questão fundamental.

Para a resolver, é imprescindível conhecer pelo menos um sistema em que o cálculo dessa variação seja possível. Sabido para um, basta fazê-lo interaccionar com qualquer outro para que saibamos calcular os seus fluxos de energia interna, tal como fizemos anteriormente para o sistema A a partir da capacidade de calcular ou medir para B todos os seus fluxos de energia. Para isso, voltemos ao caso genérico representado na Evolução adiabática irreversível de 1ª espécie

, ou à situação descrita na Expansão de um gás real para o vácuo e recompressão quase-estática.

.

Em ambos os casos podemos aumentar a energia interna do sistema repondo as coordenadas externas no seu valor. De facto, tanto podemos ir do estado inicial para o estado final através de um processo irreversível em que as variáveis externas descrevem um ciclo voltando ao ponto de partida mantendo a parede adiabática, como podemos ir directamente do estado inicial ao estado final mantendo constantes as variáveis externas e fornecendo calor ao sistema. Esta possibilidade é de crucial importância

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pois permite-nos sempre quantificar as variações de energia interna recorrendo às formas macroscópicas de energia da Física Perfeita.

Designando por S a coordenada interna, podemos sempre escrever, supondo constantes as variáveis externas xi, que

constantesi

i

xx

UdU dS

S

∂ = ∂ (0.13)

Esta situação idealizada permite dar um imediato significado físico à derivada parcial:

TUS xi

= ( )∂∂

cujo papel é idêntico ao de uma força generalizada. O significado físico de T é a temperatura absoluta. A coordenada interna é a Entropia.

Considerando que dU=δQ=TdS, quando as coordenadas externas se mantêm constantes, conclui-se que se dU>0, terá de ser TdS>0. O sinal a adoptar para T ou para dS é arbitrário na condição de ser TdS>0 para dU>0.

A variável S é uma variável extensiva, como resulta da própria definição. Por consistência com o seu aparecimento histórico, considera-se que S aumenta quando U aumenta, pelo que será T>0.

Com a introdução da coordenada interna (Entropia), a energia interna passa a ser univocamente determinada, a menos de uma constante arbitrária, pela relação:

U = U(S, x1,... ,xn)

designada por equação fundamental do sistema termodinâmico, pois contém toda a informação que o caracteriza.

Note-se que, embora seja evidente a necessidade de existirem variáveis internas no modo como se tem vindo a desenvolver a teoria, já o facto de apenas se considerar uma (para além da energia interna) carece de justificação. A justificação mais simples decorre do facto de uma variável ser o bastante para descrever o comportamento dos sistemas termodinâmicos pouco afastados do equilíbrio. Supor inicialmente mais do que uma, permite demonstrar que uma é o suficiente (não havendo constrangimentos internos) para situações próximas do equilíbrio.35

35 Ver Domingos (1973).

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Princípios da Termodinâmica

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2.3.6. O aumento da Entropia nos Processos Naturais Recapitulemos. As variáveis externas foram introduzidas por referência à Física Perfeita. A questão porém não é definir o que se passa no sistema por referência ao exterior, mas por referência a algo que lhe seja intrínseco, como é a energia interna.

A consideração da evolução adiabática reversível permitiu explicitar, não só a razão de ser das variáveis x como, e sobretudo, o sentido físico das derivadas parciais de U = U(S, x1,... ,xn), isto é, das forças generalizadas internas36 associadas às variações de x.

Mas se U = U(S, x1,... ,xn) tem sentido, qual o significado das forças generalizadas internas quando o processo for irreversível? Esta questão, que já foi qualitativamente tratada, pode ser um pouco mais aprofundada tendo em conta o que se segue.

Como as variáveis (x1,... ,xn) podem ser sempre determinadas do exterior do sistema, sem ambiguidades, podem calcular-se todos os fluxos de energia perfeita trocados com o sistema se as forças generalizadas ΠΠΠΠi que

lhe estão associadas também forem conhecidas. Daqui resulta que num processo adiabático elementar será sempre:

adiabáticoirreversível 1

n

i ii

dU dx=

= Π∑ (0.14)

Se por outro lado, para os mesmos deslocamentos generalizados, a evolução for reversível (o que é possível, pois existe uma variável adicional, a entropia), teríamos:

adiabáticoreversível 1

n

i ii

dU F dx=

=∑ (0.15)

Admitindo que a evolução real é irreversível, calcular a variação de energia interna pela expressão (0.14) dá um valor por defeito se 0dU > e um valor por excesso se (devido ao postulado da dissipação). Todavia, se em vez de (0.15) utilizarmos a expressão mais geral

36 Notar-se-á que, enquanto os xi se podem medir do exterior e são independentes do tipo de

evolução ou do estado de equilíbrio do sistema termodinâmico, o mesmo não se passa com as derivadas parciais de U, razão porque as apelidamos de forças generalizadas internas.

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adiabáticoirreversível 1

n

i ii

dU F dx TdS=

= +∑ , (0.16)

que se obtém da derivada da equação fundamental

∑ +∂∂

=i

ii

TdSdxx

UdU ,

obteremos, igualando (0.14) e (0.16)

( )1

n

i i ii

TdS F dx=

= Π −∑ (0.17)

Pelo Postulado da Dissipação, na forma da equação (0.12), sabemos que o membro direito da equação (0.17) é não-negativo num processo adiabático, logo

0TdS ≥ . (0.18)

Falta ainda demonstrar que o postulado da dissipação implica que em todos os processos adiabáticos a entropia do sistema só pode aumentar (ou permanecer constante, se o processo for reversível).

Como 0T > , concluímos da equação (0.18) que, em processos adiabáticos,

0dS ≥ . (0.19)

Esta conclusão, que se extrai do postulado da dissipação, corresponde ao enunciado habitual da Segunda Lei da Termodinâmica, ou do aumento de entropia.37

Assim, a variação de entropia é sempre maior que zero nos processos adiabáticos reais (isto é, nas evoluções irreversíveis), pelo que a entropia só pode aumentar. Assim sendo, o sistema só atinge o equilíbrio quando a entropia atingir o seu máximo, compatível com os constrangimentos impostos. O máximo de entropia corresponde necessariamente a um estado de equilíbrio, pois o sistema nesse estado não pode sofrer nenhum processo. De facto, qualquer processo teria que aumentar a entropia, o que é incompatível com o sistema estar no máximo da entropia.

37 Surge frequentemente a noção de entropia como uma medida da desordem do sistema termodinâmico. No entanto, esta noção, além de não ser necessariamente intuitiva, pode levar a situações de aparente maior desordem, mas que não correspondem aos estados de equilíbrio. Deste modo, os processos que levam ao aumento de entropia devem ser entendidos como passagens a estados mais prováveis do sistema e não necessariamente ao aumento da desordem.

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Princípios da Termodinâmica

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Na formulação habitual, a afirmação é a de que a entropia num sistema isolado nunca diminui. Como se verifica, não é necessário que o sistema seja isolado mas apenas que seja adiabático.

Tendo em conta o modo como se deduziu a segunda lei a partir do postulado da dissipação, dir-se-ia que a conclusão se aplica apenas ao subsistema que designamos por A. De facto, foi a A que demos as características de um sistema real, pois B foi idealizado como um universo onde, por hipótese, não havia dissipação. Por outro lado, a entropia foi introduzida como uma característica intrínseca do sistema A e de modo tão genérico que as conclusões que se lhe aplicam são válidas para todos os sistemas termodinâmicos.

O sistema A foi considerado como um sistema homogéneo, por simplicidade. Se não for fisicamente homogéneo, pode ser dividido em subsistemas que o sejam e aplicam-se então a cada um as conclusões obtidas.

Notar-se-á também que entre A e B não tivemos ainda em conta as trocas de energia sob a forma de energia interna (calor). Para o enunciado da segunda lei, tal como foi deduzida, é desnecessário, pois tal tipo de fluxo surge naturalmente ao considerar-se a interacção entre dois sistemas reais, como se verá seguidamente.

Como num sistema adiabático a entropia só pode aumentar (ou permanecer constante se o processo for reversível), conclui-se que a entropia de um sistema termodinâmico fechado só pode diminuir quando o sistema cede energia interna sob a forma de calor. Inversamente, a entropia aumenta quando o calor é recebido pelo sistema.

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3. Formalismo Termodinâmico

3.1. Do Postulado da Dissipação ao Formalismo Termodinâmico

Do postulado da dissipação resulta que num sistema adiabático todos os processos reais fazem aumentar a sua entropia. Quando a entropia do sistema não pode aumentar mais, o sistema já não pode evoluir e atinge portanto o seu equilíbrio natural. Por outras palavras, o sistema atinge o equilíbrio quando a sua entropia é máxima sujeita aos constrangimentos impostos. A partir deste instante, o sistema deixou de distinguir o fluir do tempo.

Sucede também que, sendo S a única variável interna (para além de U), também é só quando se atinge o equilíbrio que S fica bem determinado. Por isso, a própria definição de equilíbrio é feita, formalmente, a partir da validade da própria da equação fundamental.

Assim, o sistema encontra-se em equilíbrio termodinâmico (dados os constrangimentos impostos) se a energia interna de cada um dos subsistemas que o constitui for univocamente determinada (a menos de uma constante aditiva) pelo conjunto de coordenadas S, N1, ... ,Nr que o identificam.

Ora, tanto a energia interna como a entropia são variáveis internas extensivas e não são directamente mensuráveis. Apenas as suas variações são calculáveis. O seu valor depende de uma constante arbitrária correspondente ao estado de referência.

Todavia, e relativamente ao seu cálculo, existe uma diferença fundamental entre S e U, pois as variações de energia interna, U, podem ser instantaneamente conhecidas se medirmos instantaneamente no exterior os fluxos de energia para o sistema, o que não sucede com S, pois a entropia só se pode conhecer depois de o sistema ter atingido a homogeneidade interna das variáveis intensivas em cada subsistema, ou seja o equilíbrio.38

38 Em termos puramente abstractos, tal não seria necessário, porque o conhecimento da equação

fundamental e de todas as variáveis externas, juntamente com a variação instantânea de U permitiria conhecer S. Em termos experimentais, tal é impossível porque as forças que do exterior se aplicam para provocar uma evolução do sistema dependem da situação de não-homogeneidade interna em que o mesmo se encontra. No âmbito da TME esta questão não pode ser adequadamente tratada.

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

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Deste modo, só quando se atinge o equilíbrio interno do sistema (ou subsistema) é que é válida a expressão funcional da equação fundamental.

3.2. Axiomática de Tisza-Callen Na sequência dos trabalhos de Laszo Tisza39, Herbert Callen (1985) iniciou a exposição da Termodinâmica a partir de um conjunto de axiomas ou postulados em que a entropia é apresentada como um conceito a priori e os postulados se justificam a posteriori pela conformidade dos resultados que permitem prever com as observações experimentais.

Inicialmente contestada devido à sua forma axiomática40, a formulação de Tisza-Callen encontra-se hoje consagrada e é ponto de referência obrigatório em todos os bons textos e artigos que tratam da Termodinâmica Macroscópica41.

A objecção que pode fazer-se à formulação de Tisza-Callen não é, certamente, o seu carácter dedutivo e matematicamente rigoroso mas sim o facto de incluir nos axiomas (ou postulados), o equilíbrio, a entropia e a equação fundamental do sistema termodinâmico e justificar a posteriori tais postulados com o facto de os resultados que deles se deduzem, matematicamente, serem validados pela sua verificação experimental.

Neste curso, o ponto de partida foi a constatação universal de que existe dissipação e/ou a de que o tempo flui em sentido único. Quanto ao princípio da conservação da energia (energia+massa) ele é de tal modo fundamental e indemonstrável que, mais do que discuti-lo, importa extrair dele todas as consequências. Partindo, assim, da formalização do que se pode considerar evidente, a equação fundamental e a entropia surgem como consequências lógicas dos postulados tendo em conta as definições. Acresce que este modo de tratar o assunto permite entender melhor a essência fenomenológica da irreversibilidade e situar a Termodinâmica Macroscópica de Equilíbrio no seu natural enquadramento e limitações.

39L.Tisza é professor emérito do MIT. Os seus trabalhos mais importantes foram recolhidos em

livro (Tisza, 1966).

40 A maior parte das críticas não tem qualquer consistência e é mero fruto de longos (e maus!) hábitos adquiridos, pois baseavam-se na afirmação de que a Termodinâmica, sendo uma teoria física, não devia ser apresentada a partir de axiomas, como uma teoria matemática. É evidente que tal tipo de afirmação esquece que os princípios da Termodinâmica, tal como os axiomas na Matemática, também não se demonstram.

41A primeira edição do livro de Herbert Callen foi publicada em 1959. Este tipo de abordagem da Termodinâmica foi iniciada no I.S.T. em 1960 pelo Prof. António Gouvêa Portela.

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

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A Termodinâmica Macroscópica de Equilíbrio (TME) ocupa-se dos sistemas que se encontram em equilíbrio interno e susceptíveis, por isso, de completa caracterização através de uma única coordenada interna (a entropia). Quando dois ou mais sistemas termodinâmicos interaccionam, durante a interacção não se encontram em equilíbrio e por isso a TME não pode descrever o que se passa a cada instante em cada sistema, a menos que cada um deles seja suposto em equilíbrio interno e se transfiram para as paredes que os separam todas as descontinuidades nas forças generalizadas e todas as irreversibilidades.

Todavia, englobando todos os sistemas que interactuam num sistema global, a situação final de equilíbrio do conjunto pode ser determinada pelo facto de o sistema total ser isolado e de a posição final de equilíbrio ser a que corresponde à máxima entropia do conjunto.

Agrupar os sistemas que interactuam de modo a que no seu conjunto formem sempre um sistema isolado, foi sistematicamente utilizado por Tisza na construção rigorosa da TME e na clarificação da sua estrutura fundamental, mostrando simultaneamente a importância de que se podem revestir certos pormenores, aparentemente triviais.

3.2.1. Os Postulados de Tisza-Callen Callen (1985) considera um subconjunto dos postulados de Tisza. No entanto, este subconjunto é demasiado pequeno. Apresentamos aqui um subconjunto mais amplo. A apresentação é também reorganizada (tornado-se mais próxima da formulação de Tisza), incluindo uma distinção clara entre os postulados que se aplicam a sistemas simples (SS) e os postulados que se aplicam a sistemas compostos (SC).

Definição de Sistema Simples42. Um sistema simples é definido como sendo macroscopicamente homogéneo, isotrópico e sem cargas eléctricas, suficientemente grande para que os efeitos superficiais possam ser desprezados e sem influência de campos eléctricos, magnéticos ou gravíticos. O sistema simples é completamente caracterizado pela energia interna, U, pelo volume, V, e pelo número de moles de cada componente químico, N1, ..., Nr. Para um sistema simples, é ainda possível definir uma variável de estado adicional, a entropia, S. (SS)

Definição de Sistema Composto. É um conjunto de k sistemas simples espacialmente disjuntos, caracterizados pelas variáveis

( ) ( ) ( ) ( )1, , ,...,i i i i

rU V N N , com 1, ,i k= K . (SC)

42 Inclui o Postulado I e parte do Postulado II de Callen (1985).

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

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Postulado da Aditividade43. Para um sistema composto,

( )

1

( )

1

( )1 1

1

( )

1

( )

1

ki

i

ki

i

ki

i

ki

r ri

ki

i

U U

V V

N N

N N

S S

=

=

=

=

=

=

=

=

=

=

M M M

onde as variáveis sem índice superior correspondem ao sistema composto.

Note-se, contudo, que nem sempre a energia interna do sistema composto corresponde à soma das energias internas dos sistemas simples que o

constituem. De facto, ( )

1

k i

iU U

=≠∑ quando se consideram as forças à

distância, uma vez que não se conseguem atribuir as energias potenciais a nenhum dos sistemas simples em particular. Veja-se o exemplo de um sistema composto constituídos pelos sistemas simples “Sol” e “Terra”. Neste caso, não existe nenhum motivo para incluir a energia potencial gravítica entre estes dois sistemas em nenhum deles em particular. Deste modo, a energia interna do sistema composto será superior à soma das energias internas de cada um dos sistemas simples, uma vez que deve acrescer a energia potencial gravítica verificada. (SC)

Postulado da Equação Fundamental44. A entropia de um sistema simples é uma função das variáveis que o caracterizam, através de uma

expressão designada como equação fundamental ( )(1), , , , rS S U V N N= K ,

sendo que esta função é: continuamente diferenciável; uma função

crescente da energia interna, ou seja 1, ,...,

0rV N N

S

U

∂ > ∂ ; homogénea de

grau 1, isto é, ( ) ( )rr NNVUSNNVUS ,,,,,,,, 11 KK λλλλλ = , para 0λ > . (SS)

43 Inclui parte do Postulado III de Callen (1985).

44 Inclui parte do Postulado III de Callen (1985).

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

_________________________________________________________________

57

A monotonia e diferenciabilidade da entropia em relação à energia interna implicam que é possível inverter a equação fundamental, permitindo escrever:

( )1, , ,..., rU U S V N N= .

As duas formas da equação fundamental são equivalentes. No primeiro caso, dizemos que estamos na representação entrópica, no segundo caso dizemos que estamos na representação energética. Por exemplo, se tivermos

( )( ) 310

2 NVUvRS θ= ,

resolvendo em ordem a U obtemos a equação fundamental na representação energética:

330

2

vSU

NV R

θ =

.

Postulado do Máximo da Entropia45. Quando é libertado um constrangimento num sistema composto isolado, o estado atingido corresponde à máxima entropia compatível com os constrangimentos restantes.

Verificamos assim que só podemos aplicar a maximização de entropia a sistemas isolados, isto é, sistemas em que a energia total, o volume total e o número de moles total de cada componente químico são constantes. Quando quisermos considerar sistemas que não estão nestas condições, teremos que acrescentar ao sistema que nos interessa um sistema que o envolve, de tal forma que o sistema conjunto que obtemos seja isolado.

Postulado de Nernst46. A entropia de qualquer sistema anula-se para o estado em que

0S

,...,, 1

=

rNNV

U

∂∂

ou ainda,

0lim 0T

S→

= .

Tendo em conta os postulados, toda a Termodinâmica (Termoestática) se reduz ao que constitui o

45 Inclui o Postulado II e parte do Postulado III de Callen (1985).

46 Postulado IV de Callen (1985).

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

_________________________________________________________________

58

Problema Central da Termodinâmica Macroscópica de

Equilíbrio47: Determinar o estado final de equilíbrio que resulta

da supressão de constrangimentos internos num sistema

composto e globalmente isolado.

Notas Quando o sistema global não se encontra em equilíbrio, o mesmo é analisado como um sistema composto, dividido em subsistemas em equilíbrio.

Os subsistemas não estão inicialmente em equilíbrio entre si porque são impedidos de interactuar pelas paredes que os separam (e através das quais se formalizam os constrangimentos). O sistema composto encontra-se por isso numa situação de equilíbrio constrangido.

O processo de interacção dos subsistemas não é em si mesmo descrito no âmbito da TME. Mas o resultado final da sua interacção, isto é, o estado final de equilíbrio, fica univocamente48 determinado por ser o que torna máxima a entropia final.

3.2.2. Compatibilidade com os Postulados As equações fundamentais podem ser obtidas a partir de medições experimentais ou a partir de cálculos de mecânica estatística. Em qualquer dos casos, elas devem obedecer aos postulados. Torna-se assim importante verificar quais as restrições que os postulados impõem sobre as equações fundamentais, isto é, determinar o domínio dos valores de U, V, N1, ..., Nr em que a equação fundamental obedece aos postulados. A priori este domínio é ]- ∞,+∞[ para U, ]0,+∞[ para V e [0,+∞[ para os Ni. Para esta verificação são, em primeiro lugar, relevantes os postulados relativos a sistemas simples. Num capítulo posterior, veremos que o postulado relativo ao máximo de entropia também impõe restrições sobre a equação fundamental, restrições essas designadas como “condições de estabilidade”.

A verificação do Postulado da Equação Fundamental corresponde à verificação da propriedade de homogeneidade de grau 1,

47 V. Callen (1985) e Tisza (1966).

48Em situações muito particulares a posição de equilíbrio pode ser indeterminada. Tal sucede quando dois subsistemas interaccionam através duma parede adiabática, caso em que é necessária uma hipótese suplementar acerca da irreversibilidade de 2ª espécie no interior de cada subsistema. Trata-se porém duma situação irreal correspondente a uma experiência conceptual.

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

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59

( ) ( ), , , ,S U V N S U V Nλ λ λ λ= ,

( ) ( )rr NNVUSNNVUS ,,,,,,,, 11 KK λλλλλ =

e a verificar a diferenciabilidade e continuidade. Para verificar a monotonia, a forma mais directa consiste no cálculo da derivada parcial

( )1, ,..., rV N N

S U∂ ∂ e na determinação do domínio em que é estritamente

positiva.

Existem duas formas de verificar o Postulado de Nernst. Se a equação for apresentada na forma energética, é possível calcular imediatamente

( )1, ,..., rV N N

U S∂ ∂ . A expressão resultante terá que ser zero para 0S = .

Se a equação for apresentada na forma entrópica e for explicitamente invertível, pode-se seguir o mesmo processo que no caso anterior. Caso contrário, calcula-se ( )

1, ,..., rV N NS U∂ ∂ e determina-se os valores da energia

interna que tornam infinito esta expressão ou zero a sua inversa.

Pode-se também procurar os valores de U para os quais a equação fundamental se anula.

Exemplo Vamos determinar a compatibilidade com os postulados para sistemas simples da seguinte equação fundamental:

( ) 31

0

2

NVUv

RS

=

θ, com 0≥U ,

e em que R, v0 e θ são constantes positivas.

A expressão para a verificação da homogeneidade é:

( ) ( )( )( )( ) ( ) ( )NVUSNVUv

RUVN

v

RNVUS ,,,, 31

0

231

0

2

λθ

λλλλθ

λλλ =

=

=

A verificação da monotonia é feita com

( ) 03

1 3231

0

2

,

>

=

∂∂ −UNV

v

R

U

S

NV θ.

A solução da equação

( ) ∞=

=

∂∂ − 3231

0

2

, 3

1UNV

v

R

U

S

NV θ

é 0=U . Substituindo este valor na equação fundamental, temos 0=S , portanto o Postulado de Nernst verifica-se.

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Termodinâmica Macroscópica

Formalismo Termodinâmico

_________________________________________________________________

60

Note-se que neste exemplo apenas se concluiu ,

0V N

S

U

∂ > ∂ , porque se

considerou U ≥ 0. No entanto, nem sempre se verifica a positividade da energia interna. Como exemplo deste facto veja-se a variação da energia potencial interatómica (U) entre 2 átomos em função da distância (r) entre eles.

Neste caso, a força repulsiva entre os átomos corresponderia adU

Fdr

= − .

Note-se que se se efectuasse uma translação vertical à energia potencial, por exemplo de modo a que todos os seus valores fossem positivos, os valores obtidos para a força repulsiva não se alterariam, uma vez que para

'U U C= + ter-se-ia

( )'' 0

d U CdU dUF F

dr dr dr

+= − = − = − + = . Deste modo se mostra que não

tem interesse físico o sinal da energia, mas sim a sua derivada. Os valores referenciais atribuídos à energia interna são assim arbitrários.

Exercícios

1) (Callen, 1.10-1, adaptado). Determine a compatibilidade das seguintes equações fundamentais com as propriedades de homogeneidade, positividade da temperatura e Postulado de Nernst e com a consistência dimensional. As quantidades v0, θ, e R são constantes positivas e, sempre que aparecem expoentes fraccionários, deve ser considerada a raíz real positiva. As unidades de v0, θ, e R são respectivamente m3 mol-1, K, e J K-1 mol-1.

a) ( )1 32

1 3

0

RS NVU

v θ

=

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Formalismo Termodinâmico

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61

b) 1 3 2 32

2

R NUS

Vθ =

c)

1 21 2 2

20

R R VS NU

v

θθ

= +

d)

1 32 3

30

R VS

v NU

θ =

e) ( )1 53

1 52 22

0

RS N VU

v θ

=

f) 2

0

1ln

UVS NR

R v Nθ

=

g) ( )1 2 2

1 2

2 20

exp2

R VS NU

N vθ = −

h) ( )1 2

1 2

0

expR UV

S NUNR vθ θ

= −

i) 2

0 expv S S

UR V NR

θ =

j) 0

1 expR S S

U NVv NR NR

θ = + −

2) Considere a equação fundamental rmn NVAUS = , com 0>A e 0≥U .

Determine as condições sobre os parâmetros n, m e r para que esta equação obedeça à homogeneidade, à positividade da temperatura e ao Postulado de Nernst.

3.3. Primeiras Derivadas da Equação Fundamental: Variáveis Intensivas

Dado que estamos interessados em processos, e nas variações das variáveis extensivas que lhes estão associadas, iremos estar interessados na forma

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Formalismo Termodinâmico

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62

diferencial da equação fundamental. Escrevemos a equação fundamental na forma

( )1, , ,..., rU U S V N N= ,

e aplicamos a derivada exterior (tal como definida em 10.1.3 - Derivação Exterior) a ambos os membros:

1 1 2 1 1

1, ,..., , ,..., 1 , , ,..., , , ,...,

...r r r r

rV N N S N N rS V N N S V N N

U U U UdU dS dV dN dN

S V N N−

∂ ∂ ∂ ∂ = + + + + ∂ ∂ ∂ ∂ Esta expressão vai-nos dar a variação elementar de energia interna num processo elementar. As derivadas parciais que ocorrem nesta equação são designadas por variáveis intensivas, considerando-se as seguintes definições:

1, ,..., rV N N

UT

S

∂ ≡ ∂ , (0.20)

1, ,..., rS N N

UP

V

∂ − ≡ ∂ , (0.21)

1 1 1, , ,..., , ,j j r

jj S V N N N N

U

− +

∂≡ ∂

. 1, ,j r= K (0.22)

A forma diferencial da equação fundamental fica então

1 1 ... r rdU TdS PdV dN dNµ µ= − + + + . (0.23)

A temperatura, a pressão e os potenciais químicos são derivadas parciais de funções de S, V, N1, ..., Nr, e portanto são também, em geral, funções de S, V, N1, ..., Nr. Temos assim um conjunto de relações funcionais:

( )( )( )

( )

1

1

1 1 1

1

, , ,...,

, , ,...,

, , ,...,

, , ,...,

r

r

r

r r r

T T S V N N

P P S V N N

S V N N

S V N N

µ µ

µ µ

=

=

=

=

M

Estas relações, que expressam as variáveis intensivas em termos das variáveis extensivas independentes, são designadas equações de estado. Em geral, o conhecimento de uma única equação de estado não constitui

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63

conhecimento completo das propriedades49. No entanto, o conhecimento de todas as equações de estado de um sistema é equivalente ao conhecimento da equação fundamental e, portanto, é termodinamicamente completo. De facto, tal como veremos mais à frente, a equação de Euler permite recuperar a equação fundamental a partir do conjunto das equações de estado. Adicionalmente, o conhecimento de todas as equações de estado menos uma, permite obter ainda equação fundamental a menos de uma constante.

Note-se que dois sistemas em contacto, com diferentes valores de T, P ou , 1,..., ,j j rµ = geram trocas de energia. Deste modo, estas grandezas são

forças generalizadas (Π ). Do mesmo modo, de acordo com(0.24), como as trocas de energia provocadas por diferenças de T, P ou , 1,..., ,j j rµ =

provocam variações de S, V e , 1,..., ,jN j r= respectivamente, ds, dV e

, 1,..., ,jdN j r= são considerados deslocamentos generalizados (dx).

Assim, e como expresso em(0.25), constata-se que uma troca de energia corresponde sempre ao produto de uma força generalizada por um deslocamento generalizado ( dU dx= Π ⋅ ).

Podemos também partir da equação fundamental na forma entrópica:

( )rNNVUSS ,...,,, 1= .

Aplicando derivadas exteriores, temos

r

NNVrNNVUNNUNNV

dNN

SdN

N

SdV

V

SdU

U

SdS

rrrr 11211 ,...,,

1

,...,,,1,...,,,...,,−

∂∂

++

∂∂

+

∂∂

+

∂∂

= L

Resolvendo a equação (0.23) em ordem a dS, temos

rr dN

TdN

TdV

T

PdU

TdS

µµ−+−+= L1

11. (0.26)

Esta é a forma diferencial da equação fundamental na representação entrópica. Comparando as duas equações anteriores concluímos que

1, ,...,

1

rV N N

S

T U

∂ = ∂ , (0.27)

1, ,..., rU N N

P S

T V

∂ = ∂ , (0.28)

49 Em certas situações, o conhecimento de uma única equação de estado poderá ser suficiente. Isto

são casos particulares, dos quais veremos um exemplo mais à frente.

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Formalismo Termodinâmico

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64

2

1

1 , , ,..., rU V N N

S

T N

µ ∂= − ∂

,

..., (0.29)

1 1, , ,..., r

r

r U V N N

S

T N

µ

∂= − ∂

.

O facto da equação fundamental ser homogénea de grau um tem consequências relativamente à homogeneidade das equações de estado. Para determinar essas consequências, partimos da expressão para a homogeneidade de grau 1 na representação energética, equação (0.43). Derivando o membro direito de (0.43) em ordem a S, temos

( ) ( ) ( )11 1

, , ,...,, , ,..., , , ,...,r

r r

U S V N N SU S V N N T S V N N

S S S

λ λ λ λ λλ λ λ λ λ λ λ λ λ

λ

∂∂ ∂= =

∂ ∂ ∂Derivando o membro esquerdo de (0.43) em ordem a S, temos

( ) ( ) ( )1 1 1, , ,..., , , ,..., , , ,...,r r rU S V N N U S V N N T S V N NS S

λ λ λ∂ ∂

= =∂ ∂

.

Igualando as duas, temos

( ) ( )1 1, , ,..., , , ,...,r rT S V N N T S V N Nλ λ λ λ = .

Conclui-se assim que a temperatura de um subsistema de um sistema simples é igual à temperatura do sistema do qual faz parte. A mesma propriedade aplica-se para a pressão e para os potenciais químicos.

Exemplo

Com base na equação fundamental ( )2

1/3

0

RS NVU

v θ

=

, a variável

intensiva 1

T vem

1/32

2, 0

1 1

3V N

S R NV

T U v Uθ ∂ = = ∂

.

Exercícios

1) (Callen, 2.3-5, adaptado) Considere um sistema com a seguinte equação fundamental

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32

00

1 UV NS R v

v N UVθ

θ= − .

a) Determine as três equações de estado.

b) Mostre que as três equações de estado são funções homogéneas de grau zero das variáveis extensivas.

c) Mostre que a temperatura é intrinsecamente positiva.

d) Determine a “equação de estado mecânica”, ( ),P P T v= .

e) Determine a forma das linhas adiabáticas no plano P-v. (Uma adiabática é caracterizada por ser uma linha de entropia constante, isto é, uma isentrópica).

2) (Callen, 2.2-1). Determine as três equações de estado para um sistema com a equação fundamental

30

2

v SU

R NV

θ =

.

Confirme que as equações de estado são homogéneas de grau zero (isto é, que T, P e µ são variáveis intensivas).

3) (Callen, 2.2-2, adaptado). Para o sistema do problema anterior, obtenha µ como uma função de T, V, e N. Mostre que µ é uma função homogénea de grau zero das variáveis extensivas (isto é, é independente do tamanho do sistema).

4) (Callen, 2.2-3). Esboce um diagrama com a relação entre a pressão e o volume, com temperatura e número de moles constantes, para o sistema do problema 2), desenhando duas destas isotérmicas, e indicando qual corresponde a uma temperatura mais alta.

3.4. Equilíbrio Termodinâmico Sejam A e B dois sistemas termodinâmicos que só podem trocar calor entre si (Figura 7).

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Figura 7 – Sistemas termodinâmicos separados por uma parede diatérmica, fixa e impermeável

Como o sistema (1) + (2) é isolado resulta que:

(1) (2) .U U U const= + =

Neste caso, a equação fundamental na representação entrópica será

( )S S U= para cada um dos subsistemas em vez de ( ), ,S S U V N= , uma

vez que se considera que a parede que separa (1) de (2) é fixa e impermeável.

O equilíbrio termodinâmico corresponde à resolução do seguinte problema de maximização constrangida:

( ) ( )(1) ( 2 )

(1) (1) (2) (2)

,max

U US S U S U= + (0.30)

sujeito a

(1) (2)U U U= + (0.31)

Substituindo (0.31) em (0.30), obtém-se o seguinte problema de maximização não constrangida:

( ) ( )(1)

(1) (1) (2) (1)maxU

S S U S U U = + − (0.32)

A solução deste problema é dada por

(1)

0dS

dU= ou

(1) (2)

(1) (1)0

dS dS

dU dU+ = (0.33)

Utilizando a regra da função composta,

(1) (2) (1) (2) (2)

(1) (1) (1) (2) (1)0

dS dS dS dS dU

dU dU dU dU dU+ = + = . (0.34)

Como (2)

(1)1

dU

dU= − , obtemos

(1) (2)

(1) (2)

dS dS

dU dU= (0.35)

(1)

T(1)

(2)

T(2)

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Recorrendo a (0.27), verifica-se que a condição de equilíbrio é dada por:

(1) (2)

1 1

T T= (0.36)

Suponhamos agora que os dois sistemas podem trocar calor e trabalho entre si, isto é a parede entre (1) e (2) passa a ser móvel. O equilíbrio termodinâmico é agora dado como a solução do seguinte problema de maximização constrangida:

( ) ( )(1) (1) (2 ) ( 2 )

(1) (1) (1) (2) (2) (2)

, , ,max , ,

U V U VS S U V S U V= + (0.37)

sujeito a

(1) (2)

(1) (2)

U U U

V V V

+ =

+ = (0.38)

Onde U e V são constantes, dado que o sistema é isolado50. Este problema pode ser transformado no seguinte problema de maximização não constrangida:

( ) ( )(1) (1)

(1) (1) (1) (2) (1) (1)

,max , ,

U VS S U V S U U V V= + − − (0.39)

A solução deste problema é dada pelo sistema de equações

(1)

(1)

0

0

S

US

V

∂ =∂

∂ =∂

ou

(1) (2)

(1) (1)

(1) (2)

(1) (1)

0

0

S S

U U

S S

V V

∂ ∂+ =∂ ∂

∂ ∂ + =

∂ ∂

(0.40)

Torna-se agora necessário calcular o segundo termo dos membros esquerdos de cada equação. Para isso, utilizamos a regra da função composta:

(1) (2) (2)

(1) (2) (1)

(1) (2) (2)

(1) (2) (1)

S S dU

U U dU

S S dV

V V dV

∂ ∂=∂ ∂

∂ ∂ =

∂ ∂

As derivadas ordinárias nesta equação podem ser calculadas utilizando as equações (0.38), sendo ambas iguais a -1. Assim, o sistema (0.40) fica

50 Note-se ainda que a entropia dos sistemas (1) e (2) depende também do número de moles de cada

componente químico, mas omitimos estas variáveis dado que são constantes.

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(1) (2)

(1) (2)

(1) (2)

(1) (2)

S S

U U

S S

V V

∂ ∂=∂ ∂

∂ ∂ =

∂ ∂

(0.41)

Recorrendo às definições das variáveis intensivas na representação entrópica, equações (0.27) e (0.28), obtemos

(1) (2)

(1) (2)

(1) (2)

1 1

T T

P P

T T

= =

(0.42)

Exemplo

(Callen, 1985, 2.6-3). Dois sistemas têm as seguintes equações de estado:

(1)

(1) (1)

(2)

(2) (2)

1 3

2

1 5

2

NR

T U

NR

T U

=

=

,

onde R é a constante dos gases perfeitos (R = 8,3145 J K-1 mol-1). O número de moles no sistema 1 é (1) 2,0 molN = e no sistema 2 é

(2) 3,0 molN = . Os dois sistemas estão separados por uma parede diatérmica, fixa e impermeável, e a energia total do sistema composto é

32,5 10 J× . O conjunto dos dois sistemas é isolado. Qual é a energia interna de cada sistema no equilíbrio?

A resolução do problema corresponde à resolução do seguinte sistema que expressa a condição de equilíbrio e a restrição da conservação de energia:

(1) (2)

(1) (2)

1 1

U U U

T T

= +

=

Substituindo as equações de estado e resolvendo o sistema, obtém-se

(1) 2

(2) 3

27,1 10 J

75

1,8 10 J7

U U

U U

= = × = = ×

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Exercícios

1) (Callen, 1985, 2.6-4). Considere agora que os dois sistemas do exemplo anterior estão inicialmente separados por uma parede adiabática, fixa e impermeável, com o mesmo número de moles em cada um que no problema anterior. As temperaturas em cada sistema são (1) 250T K= e (2) 350T K= . De seguida, a parede adiabática passa para diatérmica. Quais são os valores de U(1) e de U(2) depois de se estabelecer o novo equilíbrio? Qual é o valor de equilíbrio da temperatura?

2) (Callen, 1985, 2.7-2). Dois sistemas têm as seguintes equações de estado:

(1) (1) (1)

(1) (1) (1) (1)

1 3,

2

N P NR R

T U T V= = ,

(2) (2) (2)

(2) (2) (2) (2)

1 3,

2

N P NR R

T U T V= = ,

com R = 8,3145 J K-1 mol-1. Inicialmente, os dois sistemas estão contidos num cilindro isolado, separados por um pistão fixo, adiabático e impermeável. As temperaturas iniciais são (1) 200T K= e

(2) 300T K= , o volume total é 20 L e o número de moles em cada

sistema é (1) 0,50 molN = e (2) 0,75 molN = . O pistão passa então a ser móvel, diatérmico e impermeável. Quais são os valores da energia interna, volume, pressão e temperatura de cada sistema quando se estabelece um novo equilíbrio?

3) (Exame de Termodinâmica de 20/01/2003). Três substâncias, 1, 2 e 3, estão distribuídas pelos três compartimentos apresentados no seguinte esquema.

O conjunto dos três compartimentos é isolado. A separação entre os compartimentos (1) e (2) é diatérmica, móvel, permeável ao componente 1 e impermeável aos componentes 2 e 3. A separação entre os compartimentos (2) e (3) (constituída por duas paredes unidas por um eixo fixo) é diatérmica, móvel e impermeável a todos os componentes.

(1) (2) )3(

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70

No compartimento (1), existem moléculas dos componentes 1 e 2, no compartimento (2) existem moléculas dos componentes 1 e 3 e no compartimento (3) existem moléculas do componente 1.

As relações entre as áreas das paredes que separam os compartimentos são 123 kAkAA == , onde k é uma constante positiva.

a) Determine as condições de equilíbrio, para quaisquer substâncias em cada compartimento.

b) Assumindo que as substâncias dentro dos compartimentos são gases perfeitos simples, calcule )1(

1N em função das quantidades conservadas do problema.

c) Interprete fisicamente a situação quando 03 =N .

3.5. Equações de Euler e de Gibbs-Duhem Como a energia e a entropia são variáveis extensivas, a Equação Fundamental é uma função homogénea de grau 1, ou seja

( ) ( )1 1, , , , , , , ,r rU S V N N U S V N Nλ λ λ λ λ=K K (0.43)

Derivando em relação a λ, obtém-se:

( ) ( ) ( )( )1

1

, , , ,r

i ri i

U U US V N U S V N N

S V Nλ λ λ=

∂ ∂ ∂+ + =

∂ ∂ ∂∑ K

Como a relação é válida para qualquer λ , é válida para λ = 1 e resulta:

( )11

, , , ,r

i ri i

U U US V N U S V N N

S V N=

∂ ∂ ∂+ + =

∂ ∂ ∂∑ K .

Dadas as definições nas equações (0.20), (0.21) e (0.22), temos então

1

r

i ii

U TS PV Nµ=

= − +∑ (0.44)

Aplicando o mesmo raciocínio à Equação Fundamental na forma entrópica virá

1

1 ri

ii

PS U V N

T T T

µ

=

= + −∑ (0.45)

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71

expressão que também se poderia ter obtido directamente de (0.44). Esta expressão é conhecida como Equação de Euler, e mostra como se obtém a equação fundamental se forem conhecidas todas as funções de estado51.

Aplicando a derivada exterior a ambos os membros da equação de Euler (0.44), obtemos

1 1

r r

i i i ii i

dU TdS SdT PdV VdP dN N dµ µ= =

= + − − + +∑ ∑ (0.46)

Subtraindo a esta equação a equação (0.23), obtemos

1

0r

i ii

SdT VdP N dµ=

− + =∑ (0.47)

Repetindo o raciocínio a partir da forma entrópica seria

1

10

ri

ii

PUd Vd N d

T T T

µ

=

+ − =

∑ (0.48)

As equações (0.47) e (0.48) constituem as equações de Gibbs-Duhem, respectivamente na forma energética e entrópica. As relações de Gibbs-Duhem são importantes porque mostram que as variáveis intensivas não são todas independentes. Deste modo, se existirem r+2 variáveis extensivas independentes (S, V, N1, ... , Nr) , só há r+1 variáveis intensivas independentes. Este resultado é uma consequência da equação fundamental ser homogénea de grau 1.

A Tabela 1 sintetiza os resultados desta secção.

Tabela 1 – Síntese das equações de Euler e Gibbs-Duhem

REPRESENTAÇÃO ENERGÉTICA REPRESENTAÇÃO ENTRÓPICA

EULER U TS PV Nµ= − + 1 P

S U V NT T T

µ= + −

GIBBS-DUHEM

0 SdT VdP Ndµ= − + 1

0P

Ud Vd NdT T T

µ = + −

51 Note-se que as equações ou funções de estado devem estar expressas em variáveis extensivas, o

que não é habitualmente o caso das equações empíricas, como, por exemplo,. a dos gases perfeitos, PV NRT= .

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72

Exemplo

Vamos obter a equação de Gibbs-Duhem na forma energética a partir da forma entrópica.

Desenvolvendo as formas diferenciais, obtemos

2 2 2

1 10

P V PV N NUd Vd Nd U dT dP dT d dT

T T T T T T T T

µ µµ

− = + − = + − − +

Como T>0, dividindo o 1º e o último membros por T,

0U PV N

dT VdP NdT T T

µµ

− = − + + −

Substituindo a equação de Euler na forma entrópica, obtém-se a equação de Gibbs-Duhem na forma energética:

0 SdT VdP Ndµ= − + .

3.6. Equações Molares A homogeneidade de grau um da equação fundamental permite fazer um re-escalamento das propriedades de um sistema com número de moles igual a N para um sistema com 1 mol. De facto, dada a propriedade de homogeneidade, podemos escrever

( ) 11

1, , ,..., , , ,..., r

r

U V N NS U V N N S

N N N N N =

,

onde tomámos como factor de escala 1/ Nλ = . Em particular, para um sistema só com um componente, temos

( )1, , , ,1

U VS U V N S

N N N =

.

Substituindo as definições de entropia, energia interna e volume molares, respectivamente (0.2) e (0.3) na equação acima, temos

( )1, , ( / , / ,1)S U V N S U N V N

N= .

Podemos interpretar esta equação como querendo dizer que S/N é uma função que só depende de u e v. Esta equação sugere que definamos entropia molar, por analogia com as definições de energia e volume molares, como

( ) ( ), , ,1s u v S u v= .

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73

Ficamos assim com a seguinte expressão:

( )1, , ( , )S U V N s u v

N= .

Analogamente, temos

( , )u u s v= .

Vamos agora determinar uma expressão para o diferencial da energia interna molar. Para tal, considere-se a equação (0.23) onde se substituem as variáveis extensivas não molares em função das molares:

( ) ( ) ( )d uN Td sN Pd vN dNµ= − + .

Resolvendo as derivadas exteriores de produtos:

N du udN T N ds T sdN PN dv PvdN dNµ+ = + − − + .

Utilizando a equação molar de Euler na representação energética e substituindo-a na anterior, obtemos

du Tds Pdv= − . (0.49)

Veja-se ainda a seguinte dedução alternativa do diferencial da energia interna molar. Aplicando a derivada exterior a ambos os membros de

( , )u u s v= :

v s

u udu ds dv

s v

∂ ∂ = + ∂ ∂ .

Vamos agora determinar a relação das derivadas parciais que aparecem nesta equação com as variáveis intensivas. Para isso, começamos por provar a igualdade

,v V N

u u

s s

∂ ∂ = ∂ ∂ .

Temos que

,V N

u du dV dN

s ds dV dN

∂ ∧ ∧ = ∂ ∧ ∧ e

∂∂

FHG

IKJ=

∧∧

⇔∂∂

FHG

IKJ ∧ = ∧ ⇒

∂∂

FHG

IKJ ∧ ∧ = ∧ ∧ ⇔

∂∂

FHG

IKJ=

∧ ∧∧ ∧

u

s

du dv

ds dv

u

sds dv du dv

u

sds dv dN du dv dN

u

s

du dv dN

ds dv dN

v v v

v

Por outro lado, temos

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74

dvN

dVV

NdN= −

12

.

(note-se que dv d V N= b g). Fazendo o produto exterior à direita por dN de

ambos os membros desta equação, obtemos

1dv dN dV dN

N∧ = ∧ .

Substituindo esta expressão na equação (0.20), obtemos

v

u du dv du dV dN

s ds dv ds dV dN

∂ ∧ ∧ ∧ = = ∂ ∧ ∧ ∧ .

Temos agora que

( )( ), ,,

/

/v V N V NV N

U Nu u UT

s s S N S

∂∂ ∂ ∂ = = = = ∂ ∂ ∂ ∂ .

Analogamente, obtemos

,s N

uP

v

∂ − = ∂ .

Podemos assim escrever

du Tds Pdv= − . (0.50)

É importante distinguir o domínio de aplicação desta expressão do domínio de aplicação da expressão dU TdS PdV= − . A primeira expressão é válida para sistemas em que só um dos componentes químicos pode variar (dado que é só um componente, só pode variar devido a entrada ou saídas de massa); a segunda expressão só é válida para sistemas em que nenhum dos componentes químicos pode variar (isto é, não existem entradas nem saídas de massa).

A Tabela 2 sintetiza os resultados desta secção e acrescenta alguns outros.

Tabela 2 – Síntese das equações fundamentais na forma diferencial

REPRESENTAÇÃO ENTRÓPICA REPRESENTAÇÃO

ENERGÉTICA

NÃO MOLAR

1 PdS dU dV dN

T T T

µ= + − dU TdS PdV dNµ= − +

MOLAR 1 P

ds du dvT T

= + du Tds Pdv= −

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75

Aplicando o conceito de equações molares às equações de Euler e Gibbs-Duhem, obtemos o sintetizado na Tabela 3.

Tabela 3 – Síntese das equações de Gibbs-Duhem molares.

REPRESENTAÇÃO ENERGÉTICA REPRESENTAÇÃO ENTRÓPICA

EULER u Ts Pv µ= − + 1 P

s u vT T T

µ= + −

GIBBS-DUHEM

0 sdT vdP dµ= − + 1

0P

ud vd dT T T

µ = + −

Exemplo Vamos determinar a forma molar da equação fundamental

( ) 31

0

2

NVUv

RS

=

θ.

( )1/32 2

1/3 3

0 0

R R V US NVU N

v v N Nθ θ = =

Resolvendo em ordem a S/N: 1/32

0

S R V U

N v N Nθ =

ou seja,

( )2

1/3

0

Rs vu

v θ

=

.

Exercícios

1) (Callen, 2.3-1) Determine as três equações de estado na representação entrópica para um sistema com a equação fundamental

1 2 5 20

3 2 1 2

v su

R v

θ =

.

2) (Callen, 2.2-4). Determine as três equações de estado para um sistema com a equação fundamental

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76

2 220

Ru s v

R v

θ θ = −

,

e mostre que, para este sistema, uµ = − .

3) (Callen, 2.2-7, adaptado). Um dado sistema obedece à equação fundamental

( )2 expu Av s R−= .

Uma quantidade N desta substância, inicialmente à temperatura T0 e à pressão P0, é expandida isentropicamente e sem troca de massa (isto é, com S e N constantes), até que a temperatura é metade. Qual é a pressão final?

3.7. Expressões para o Trabalho e para o Calor

Chamamos irreversibilidade de 2ª espécie ao aumento de entropia devido à permuta de calor entre subsistemas a temperaturas diferentes.

Esta designação destina-se, entre outras razões, a sublinhar o facto de a troca de energia interna (calor) entre sistemas a temperatura diferente originar sempre um aumento de entropia, por mais lenta ou quase-estática que essa transferência seja.

Para uma evolução reversível (de 2ª espécie),

δQ = T dS

sendo T a temperatura absoluta (suposta uniforme) do sistema e δQ a quantidade de calor que recebe ou cede. Esta relação é válida desde que T seja uniforme e δQ e dS se refiram ao mesmo sistema (ou subsistema). Mas T dS pode ser diferente de δQ, se o sistema foi sede de irreversibilidades de primeira espécie. T e S referem-se então ao estado final de equilíbrio.

Mostraremos abaixo como esta definição formal de temperatura está de acordo com o nosso conceito qualitativo intuitivo, baseado em sensações fisiológicas de “quente” e “frio”. Também mostraremos abaixo que esta definição de pressão está de acordo com a definição de pressão proveniente da mecânica.

Impondo volume constante (dV=0) e fecho do sistema (dN1,...,dNr = 0), temos

dU TdS= .

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77

Nestas condições, o sistema só pode trocar calor, isto é,

dU dQ= .

Concluímos assim que TdS é o fluxo quase-estático de calor:

dQ TdS= .52

Num processo genérico, não podemos integrar a expressão infinitesimal para a energia interna, pois em geral as variáveis intensivas não vão ser função das variáveis de estado (as equações de estado não são aplicáveis a todos os pontos do processo, pois a equação fundamental também não é) e portanto não é possível fazer o integral.

No entanto, dado qualquer estado inicial e final especificado pelas variáveis extensivas, é sempre possível obter a energia interna por integração. Na realidade, estamos a considerar hipotéticos processos quase-estáticos para ir de um estado para outro. Aqui podemos utilizar o facto adicional de que estamos a lidar com o gradiente de um potencial, e portanto podemos de uma só vez fazer a integração para qualquer processo quase-estático entre os dois estados.

Notámos acima que só identificámos a expressão quase-estática para o calor no caso de sistemas fechados. Na realidade, as outras expressões quase-estáticas de trabalho só podem ser identificadas porque temos informação de Física Perfeita para as identificar. Assim, torna-se impossível distinguir trabalho químico de calor, na ausência de um mecanismo específico para estas transferências de energia.

Note-se que a partir do momento em que existem modelos específicos para transferência de calor por condução, radiação, etc. já será possível calcular separadamente estas transferências, perdendo-se no entanto a generalidade da Termodinâmica.

3.8. Relações de Maxwell As relações de Maxwell exprimem a igualdade entre diferentes derivadas parciais de funções termodinâmicas. Normalmente, a sua derivação exige o recurso às diferentes expressões para os potenciais termodinâmicos abaixo apresentadas, traduzindo-se nas seguintes quatro derivadas parciais:

52 Na verdade, isto não demonstra que TdS seja ainda o fluxo de calor quando varia o número de

moles.

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v s P s

v T P T

P T v T

s v s P

P s v s

T v T P

∂ ∂ ∂ ∂ = − = ∂ ∂ ∂ ∂

∂ ∂ ∂ ∂ = = − ∂ ∂ ∂ ∂

(0.51)

Utilizando o formalismo das formas diferenciais, é possível reduzir as relações de Maxwell a uma única, obtidas a partir da aplicação da derivada exterior a ambos os membros da equação (0.50):

( ) ( ) ( ) 0d du d Tds d Pdv dT ds dP dv= − ⇒ = ∧ − ∧

Rearrajando, temos

dT ds dP dv∧ = ∧ (0.52)

A equação (0.52) é equivalente às habituais relações de Maxwell (0.51). De facto, dividindo ambos os membros da equação (0.52) pelos produtos exteriores de duas formas-1 que permitem construir derivadas parciais, isto é, todos os produtos de uma das formas-1 no membro esquerdo por uma das formas-1 no membro direito, obtemos as equações (0.51) na linguagem das formas diferenciais:

dP dv dT ds dP dv dT ds

ds dv ds dv dP ds dP dsdP dv dT ds dP dv dT ds

dT dv dT dv dP dT dP dT

∧ ∧ ∧ ∧= =

∧ ∧ ∧ ∧∧ ∧ ∧ ∧

= =∧ ∧ ∧ ∧

(0.53)

A operação de aplicação da derivada exterior pode ser feita de uma forma mais intuitiva. Consideremos a aplicação de um integral cíclico a ambos os membros da expressão diferencial:

∫∫∫ −= PdvTdsdu

Dado que u é uma variável de estado, 0=∫ du (a soma das variações de

uma variável de estado ao longo de um ciclo fechado é nula). Os integrais no membro direito representam áreas respectivamente nos planos T-s e P-v, mais especificamente as áreas no interior do ciclo. Se o ciclo for infinitesimal, estas áreas são também infinitesimais, e podem denotar-se (levando em conta que o produto exterior de dois diferenciais é uma área) respectivamente dsdT ∧ e dvdP ∧ . Obtemos assim a relação acima.

Mostra-se assim que as relações de Maxwell fundamentalmente exprimem o princípio da conservação da energia.

Podemos aplicar o mesmo raciocínio à expressão

rr dNdNPdVTdSdU µµ +++−= L11 ,

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79

obtendo

011 =∧++∧+∧−∧ rr dNddNddVdPdSdT µµ L

Esta é a relação geral de Maxwell. Para obtermos relações entre derivadas parciais a partir destas equações, é necessário dividir a equação por um produto adequado de dois diferenciais. No entanto, na forma em que está, seja qual for o par pelo qual se divida, haverá vários termos que não corresponderão a derivadas parciais. Na realidade, é necessário eliminar todos menos dois dos pares. Consideremos o caso particular de um só componente químico, r=1:

0=∧+∧−∧ dNddVdPdSdT µ .

Esta equação pode ser multiplicada à direita por um qualquer dos seis diferenciais dT, dS, dP, dV, dµ, dN, produzindo seis equações diferentes:

0

0

0

0

0

0

=∧∧−∧∧

=∧∧−∧∧

=∧∧+∧∧

=∧∧+∧∧

=∧∧+∧∧−

=∧∧+∧∧−

dNdVdPdNdSdT

ddVdPddSdT

dVdNddVdSdT

dPdNddPdSdT

dSdNddSdVdP

dTdNddTdVdP

µµµµ

µ

µ

De forma a obter relações entre derivadas parciais, cada uma destas equações pode ser dividida em ambos os membros por um de quatro produtos exteriores de três formas-1. Estes produtos têm que ser tais que só difiram numa única forma-1 dos produtos já existentes na equação. Por exemplo, consideremos a primeira equação:

dTdNddTdVdP ∧∧=∧∧ µ

Para que o membro esquerdo dê uma derivada parcial, é preciso que o dividamos por um produto que só difira numa forma-1. Assim, poderíamos retirar dP, e substituir por dµ ou dN (não pode ser substituído por dT ou dV porque ficariam diferenciais repetidos). Analogamente, poderíamos substituir dV por dµ ou dN ou dT por dµ ou dN. Teríamos assim as seguintes possibilidades:

dNdVdPdTdNdPdTdVdN

ddVdPdTddPdTdVd

∧∧∧∧∧∧

∧∧∧∧∧∧ µµµ

No entanto, as duas possibilidades da última coluna, quando divididas pelo membro direito não produzem uma derivada parcial, pois diferem em mais que uma forma-1. Assim, só existem as seguintes quatro possibilidades:

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dTdNdP

dTdNd

dTdNdP

dTdVdP

dTddP

dTdNd

dTddP

dTdVdPdTdVdN

dTdNd

dTdVdN

dTdVdP

dTdVd

dTdNd

dTdVd

dTdVdP

∧∧

∧∧=

∧∧∧∧

∧∧

∧∧=

∧∧∧∧

∧∧

∧∧=

∧∧∧∧

∧∧

∧∧=

∧∧∧∧

µµ

µµ

µµµ

µ

que correspondem às seguintes relações entre derivadas parciais:

,,

, ,

,,

, ,

TV T

V T N T

TP T

P T N T

P N

V

P

N V

V N

P

V

N P

µ

µ

µ

µ

µ

µ

∂ ∂ = ∂ ∂

∂ ∂ = − ∂ ∂

∂ ∂ = − ∂ ∂

∂ ∂ = ∂ ∂

Assim, existirão um total de 6 x 4 = 24 relações destas. Consideremos agora o problema em termos inversos. Temos uma certa derivada parcial, e queremos encontrar todas as equações que a envolvem. Por exemplo, temos

dPdNd

dPdNdSS

PN∧∧

∧∧=

µµ,

Procuramos onde é que o numerador e denominador aparecem nas seis equações iniciais. O numerador nunca aparece. O denominador aparece na terceira. Utilizamos essa para fazer a substituição, obtendo

PSPNT

N

dPdSdT

dPdNdSS

,,

∂=

∧∧

∧∧−=

µ.

Voltamos agora ao caso geral, com r > 1. Para eliminarmos todos menos dois dos pares, é necessário escolher r dos pares (dT, dS), (dP, dV), (dµ1, dN1), ..., (dµr, dNr), e multiplicar à direita. Cada uma destas escolhas corresponde a escolher dois dos pares para ficar de fora, isto são as combinações de r + 2, dois a dois, e a escolher um elemento de cada um dos r pares restantes. Assim, o número total de equações é

rr2

2

2

+.

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3.9. Segundas Derivadas da Equação Fundamental: Coeficientes Termodinâmicos

As primeiras derivadas da equação fundamental correspondem às forças generalizadas ou variáveis intensivas. As segundas derivadas da equação fundamental expressam propriedades específicas do sistema. Por isso a sua determinação experimental é importante e utilizam-se habitualmente para caracterizar o sistema.

No caso de um sistema simples, essa determinação das segundas derivadas da equação fundamental é feita habitualmente através dos valores de três coeficientes, a partir dos quais todas as restantes propriedades termodinâmicas se podem obter utilizando relações fundamentais deduzidas das propriedades da equação fundamental. Para sistemas de um só componente, alguns desses coeficientes são apresentados de seguida.

O coeficiente de expansão (dilatação) térmica isobárica é definido por:

,

1 1

P N P

V v

V T v Tα

∂ ∂ = = ∂ ∂

Este coeficiente exprime a variação do volume, por unidade de volume, quando a temperatura aumenta de uma unidade mantendo a pressão constante (a massa mantém-se constante pois o sistema é fechado).

O coeficiente de compressibilidade isotérmica é definido por

,

1 1T

T N T

V v

V P v Pκ

∂ ∂ = − = − ∂ ∂

e exprime a variação do volume, por unidade de volume, quando a pressão aumenta de uma unidade, mantendo a temperatura constante.

A capacidade calorífica molar a pressão constante define-se por:

, ,

1P

P N P N P

Q T S sC T

N dT N T T

δ ∂ ∂ = = = ∂ ∂

A capacidade calorífica molar a pressão constante é igual à energia necessária para aumentar a temperatura do sistema formado por 1 mol de uma unidade mantendo a pressão constante. Habitualmente esta energia é fornecida através de um fluxo de calor.

A capacidade calorífica molar a volume constante é definida por:

, ,

1v

V N V N v

Q T S sC T

N dT N T T

δ ∂ ∂ = = = ∂ ∂

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82

A capacidade calorífica molar a volume constante é igual à energia necessária para aumentar a temperatura do sistema formado por 1 mol de uma unidade mantendo o volume constante.

O coeficiente de compressibilidade adiabática define-se como:

,

1 1S

S N s

V v

V P v Pκ

∂ ∂ = − = − ∂ ∂

Na Tabela 4 sintetizam-se estas definições.

Tabela 4 – Síntese dos coeficientes termodinâmicos.

RELAÇÃO DE MAXWELL

dT ds dP dv∧ = ∧

CAPACIDADE CALORÍFICA MOLAR A PRESSÃO

CONSTANTE

,

1P

P N P

Q s ds dPC T T

N dT T dT dP

δ ∂ ∧ = = = ∂ ∧

COMPRESSIBILIDADE ISOTÉRMICA

1 1T

T

v dv dT

v P v dP dT

∂ ∧ Κ = − = − ∂ ∧

CAPACIDADE CALORÍFICA MOLAR A VOLUME

CONSTANTE

,

1v

V N v

Q s ds dvC T T

N dT T dT dv

δ ∂ ∧ = = = ∂ ∧

COMPRESSIBILIDADE ISENTRÓPICA

1 1s

s

v dv ds

v P v dP ds

∂ ∧ Κ = − = − ∂ ∧

EXPANSIBILIDADE ISOBÁRICA

1 1

P

v dv dP

v T v dT dPα

∂ ∧ = = ∂ ∧

Os coeficientes anteriormente definidos não são todos independentes. Para isso mostar, partimos, por exemplo, de α, e vamos determinar a equação que dá a sua dependência em relação às outras variáveis. Queremos exprimir esta derivada parcial em termos das derivadas parciais associadas a cv, cP, κT e κs. Olhando para a Tabela 4, verificamos que α tem um produto dv dP∧ que não aparece em mais nenhum coeficiente, portanto à partida não é possível fazer a redução pretendida.

Para podermos avançar, precisamos de exprimir a derivada parcial que define α em termos de outras derivadas parciais, esperando que essas derivadas já só tenham produtos de formas-1 que aparecem nas definições

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Formalismo Termodinâmico

_________________________________________________________________

83

dos restantes coeficientes. Para isso, usamos a equação (deduzida no apêndice)

yz z x

f f x f

y x y y

∂ ∂ ∂ ∂ = + ∂ ∂ ∂ ∂ .

Temos então

α =dPdT

dPds

dTds

dTdv

vdsdT

dsdv

vT

s

s

v

vT

v

v PTs ∧∧

∧∧

+∧∧

=

∂∂

∂∂

+

∂∂ 1111

Aplicando o algoritmo para simplificação de derivadas parciais (apresentado abaixo), esta equação fica

v T P Tc c

vT vT

κ κα

α α= − + ,

que pode ser re-escrita como

2

P vT

vTc c

ακ

= + (0.54)

Analogamente, demonstra-se que

K K

TV

NCT S

P

= +α2

(0.55)

A partir das equações anteriores é possível obter

s v

T P

C

C

Κ=

Κ.

Note-se que todas estas equações têm nelas implícita a relação de Maxwell.

Exemplo É possível determinar coeficientes termodinâmicos na representação entrópica que sejam análogos aos da representação energética definidos anteriormente.

Consideremos a equação 1 P

ds du dvT T

= + onde se definem as variáveis

extensivas e intensivas na representação entrópica para sistemas fechados.

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84

Assim, analogamente ao coeficiente ( )P

s T∂ ∂ ter-se-á ( )1

P T

u

T

∂ ∂

.

Repetindo o raciocínio, obtemos:

( )1P T

u

T

∂ ∂

( )

1 T

v

P T

∂ ∂

( )1v

u

T

∂ ∂

( )

u

v

P T

∂ ∂

Estes coeficientes não são normalmente usados, porque a sua interpretação física é bastante menos intuitiva que aquela que se obtém através dos coeficientes definidos na representação energética.

Problemas

1) De que altura devem cair 10 g de água para que a sua temperatura aumente de 1ºC? (admita que toda a energia potencial da água é transformada em energia interna quando a água choca com o chão). E 100 g de água? (calor específico da água = 1 cal g-1 ºC-1) (Deus et al., 1992)

2) O comprimento da ponte sobre o Tejo é de cerca de 2 km. Se a amplitude térmica anual média for de 40ºC (por exemplo, com um valor mínimo de -1ºC e um valor máximo de 39ºC), qual é a variação de comprimento sofrida pelas vigas de aço que sustentam as faixas de rodagem? (coeficiente de dilatação linear do aço, α =1,27 x 10-5 K-1. (Deus et al., 1992)

3) Um bloco de metal de 50 g é mantido durante algum tempo em água a ferver. Seguidamente, o bloco é mergulhado num calorímetro de cobre de mass 100 g, e que contém 200 g de água a 20 ºC. A temperatura de equilíbrio é 22ºC. Qual o calor específico do metal? (calor específico do cobre Cp = 0,39 J g-1 K-1).

4) Obtenha os coeficientes κT e α para um gás perfeito.

3.9.1. Algoritmo para Simplificação de Derivadas Parciais Este algoritmo permite reduzir expressões com derivadas parciais em sistemas fechados com uma componente, a expressões algébricas nos parâmetros termodinâmicos α, κT e CP. Apresentam-se os passos sucessi-

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85

vos do algoritmo e a sua explicação, que demonstra que qualquer ex-pressão será simplificada pelo algoritmo.

1. Eliminar as derivadas parciais utilizando a relação dYdX

dYdZ

X

Z

Y ∧∧

=

∂∂

.

Nesta fase, temos uma fracção em que o numerador e o denominador têm pares de produtos dos seguintes

diferenciais: du, df, dh, dg, dT, ds, dP, dv.

2. Eliminar os diferenciais de potenciais, utilizando as expressões

PdvTdsdu −= , PdvsdTdf −−= , vdPTdsdh += , vdPsdTdg +−=

O numerador e o denominador da fracção ficam com quatro diferenciais: dT, ds, dP, dv.

3. Aplicar a propriedade distributiva, obtendo uma soma de produtos de dois termos no numerador e no denominador. Se possível, simplificar

0=∧ dxdx . O numerador e o denominador são somas dos seguintes seis termos:

dT ∧ dS, dT ∧ dP, dv ∧ dP, dT ∧ dv, ds ∧ dP, ds ∧ dv (combinações de quatro formas-1, duas a duas).

4. Eliminar dT ∧ dS utilizando dT ∧ dS = dP ∧ dV. O numerador e o denominador têm agora só cinco produtos distintos.

5. Introduzir os coeficientes termodinâmicos, recorrendo se necessário a dxdydydx ∧−=∧ , utilizando (repetidamente, se necessário) as

expressões

dv dP v dT dPα∧ = ∧ , TdT dv vdT dPκ∧ = − ∧ ,

dPdTT

CdPds P ∧=∧ , dvdT

T

Cdvds V ∧=∧

Eliminar os pares dT ∧ dP.

As relações acima transformam os quadro produtos existentes diferentes de dT ∧ dP em termos com dT ∧

dP . Assim, todos os termos ficam com o produto dT ∧ dP, que se pode assim eliminar.

6. Se se pretende eliminar Cv, usar a relação 2

v PT

TvC C

α= −

Κ.

7. Simplificar a expressão algébrica obtida.

Exemplo Simplificar a expressão ( )hvT ∂∂ .

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86

dhdv

dhdT

∧∧

→ )(

)(

vdPTdsdv

vdPTdsdT

+∧+∧

→ dPvdvdsTdv

dPvdTdsTdT

∧+∧∧+∧

dPvdvdsTdv

dPvdTdvTdP

∧+∧∧+∧

→ ( )

( )VT

T v dT dP vdT dPC

T v dT dP v dT dPT

α

κ α

− ∧ + ∧

− ∧ + ∧ →

( )1

1P T

T

C v T

ακ α α

−+ −

3.10. Estabilidade Intrínseca dos Sistemas Termodinâmicos

A situação de equilíbrio de um sistema isolado corresponde ao máximo de entropia do sistema compatível com os constrangimentos impostos. Nesta secção vamos considerar as implicações de se tratar de um extremo no que se refere à estabilidade do equilíbrio relativamente a pequenas perturbações.

Até agora considerámos sempre a evolução para o equilíbrio que resultava de ser removido um constrangimento que impedia a interacção entre dois sistemas A e B. Esse constrangimento era conceptualmente representado por uma parede.

Consideremos agora um só sistema, homogéneo, que dividimos arbitrariamente em dois subsistemas por uma parede fictícia (Figura 8).

Figura 8 – Divisão arbitrária de um sistema homogéneo em dois.

Para cada subsistema teremos

( )(1) (1) (1) (1) (1), ,S S U V N=, ( )(2) (2) (2) (2) (2), ,S S U V N= (0.56)

e para o sistema conjunto, como a expressão funcional da Equação Fundamental é a mesma:

( )(1) (2) (1) (2) (1) (2) (1) (2), ,S S S S U U V V N N= + = + + + (0.57)

com

(1) (2)

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87

(1) (2) (1) (2) (1) (2), ,U U U V V V N N N= + = + = + .

Como (1) e (2) são supostos em equilíbrio entre si, isto significa que S é máximo. Isto é, se entre (1) e (2) houver trocas de energia ∆U, de volume, ∆V, ou de massa, ∆N, deve-se verificar

( )( )

( )

(1) (1) (1) (1)

(2) (2) (2) (2)

, ,

, ,

, ,

S S U U V V N N

S U U V V N N

S U V N

= −∆ −∆ −∆ +

+ + ∆ + ∆ + ∆ <

<

(0.58)

Consideremos o caso particular de uma divisão ao meio do sistema original, isto é,

(1) (2) (1) (2) (1) (2), ,U U V V N N= = = .

A expressão (0.58) pode então escrever-se

( )

, ,2 2 2

, ,2 2 2

, , .

U V NS S U V N

U V NS U V N

S U V N

= − ∆ − ∆ − ∆ +

+ + ∆ + ∆ + ∆ <

<

(0.59)

Dada a homogeneidade de grau 1 da equação fundamental, a equação (0.59) pode escrever-se

( ) ( )

( ), , , ,

2 , ,

S U U V V N N S U U V V N N

S U V N

− ∆ −∆ −∆ + + ∆ + ∆ + ∆ <

<,(0.60)

que é a definição de função côncava se os ∆ forem arbitrários. Por simplicidade de notação, na sequência vamos denotar as variáveis U, V, N por X1, ..., X3. A equação (0.60) fica então

( ) ( ) ( )1 1 2 2 3 3 1 1 2 2 3 3 1 2 3, , , , 2 , ,S X X X X X X S X X X X X X S X X X−∆ −∆ −∆ + + ∆ + ∆ + ∆ <

(0.61)

Desenvolvendo em série de Taylor os dois termos do membro esquerdo da desigualdade (0.61) e retendo os três primeiros termos, temos

( )

( ) ( ) ( )

1 1 2 2 3 3

23 3 3

1 2 3 1 2 3 1 2 31 1 1

, ,

, , , , , ,i i ji i ji i j

S X X X X X X

S SS X X X X X X X X X X X X

X X X= = =

−∆ −∆ −∆ =

∂ ∂− ∆ + ∆ ∆

∂ ∂ ∂∑ ∑∑ (0.62)

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88

( )

( ) ( ) ( )

1 1 2 2 3 3

23 3 3

1 2 3 1 2 3 1 2 31 1 1

, ,

, , , , , ,i i ji i ji i j

S X X X X X X

S SS X X X X X X X X X X X X

X X X= = =

+ ∆ + ∆ + ∆ =

∂ ∂+ ∆ + ∆ ∆

∂ ∂ ∂∑ ∑∑(0.63)

Substituindo (0.62) e (0.63) em (0.61) e simplificando, obtém-se:

( )23 3

1 2 31 1

, , 0i ji j i j

SX X X X X

X X= =

∂∆ ∆ <

∂ ∂∑∑ (0.64)

Em termos matriciais, o significado desta equação é que a matriz Hessiana de S é definida negativa. Para analisarmos as consequências deste facto, podemos olhar para uma condição para que uma matriz seja definida negativa: os seus menores principais de ordem ímpar têm que ser negativos e os menores principais de ordem par têm que que ser positivos.

Por simplicidade, vamos considerar só a análise de um sistema fechado, em que temos como variáveis independentes U e V. A matriz hessiana é agora

2 2

2

2 2

2

S S

U U V

S S

V U V

∂ ∂ ∂ ∂ ∂

∂ ∂ ∂ ∂ ∂

(0.65)

Para identificarmos estas derivadas parciais, devemos analisar sucessivamente cada derivada, por exemplo,

( )

2

2

11 1

V U

U

S S

U V V U

d T dU dT dU

V T dV dU T dV dU

∂ ∂ ∂ = = ∂ ∂ ∂ ∂

∧∂ ∧ = = = − = ∂ ∧ ∧

(0.66)

2

1

v T

P TT c

ακ

= − −

onde na última igualdade se utilizou o algoritmo para simplificação de derivadas parciais e se dividiu o numerador e o denominador por N (com as transformações que são possíveis por N ser constante).

Repetindo o cálculo para os diferentes elementos da matriz hessiana, obtemos então os termos para todas as entradas na matriz:

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89

22

11

2

T

Pv

T T T

P T

c TT cP T PT P

v

ακ

α ακ κ κ

− − − − +

. (0.67)

A condição de que o primeiro menor principal seja negativo implica imediatamente que

0vc > . (0.68)

O segundo menor principal é o determinante da matriz (0.67). Com o objectivo de simplificar os cálculos, constatamos que a entrada do elemento (2,2) é semelhante ao produto dos elementos (1,2) e (2,1), se lhe somarmos e subtrairmos um termo adicional:

2 22 2 2

2 22P

T T T T

c TT T PT P

v

α α ακ κ κ κ

− + − + =

22

2P

T T T

c TT P T

v

α ακ κ κ

− + −

Assim, a condição sobre o determinante vai ficar:

2

0P

T T

c TT

v

ακ κ

− >

Usando 2P v Tc c vTα κ= + , esta expressão fica

0v

T

c T

v κ>

.

Dada a equação (0.68), e dado que T e v são positivos, concluímos que

0Tκ > . (0.69)

Usando mais uma vez 2P v Tc c vTα κ= + , concluímos que

0P vc c> > . (0.70)

Considerando agora que v P s Tc c κ κ= , concluímos que

0T sκ κ> > . (0.71)

As equações (0.70) e (0.71) são designadas como critérios de estabilidade. Em geral, para determinarmos se uma equação fundamental obedece aos critérios de estabilidade, poderá bastar determinar que dois dos

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90

coeficientes são positivos, desde que seja depois possível provar, através das outras equações que relacionam os coeficientes, que outros coeficientes também são positivos.

É também de notar que não determinámos nada sobre o sinal de α. De facto, este coeficiente tanto poderá ser positivo como negativo. Por exemplo, em água líquida a pressão atmosférica, α é negativo para temperaturas superiores a 0 ºC e inferiores a 4 ºC.

De igual modo, se tivéssemos utilizado a equação fundamental na forma energética, teríamos obtido:

( )23 3

1 2 31 1

, , 0i ji j i j

UX X X X X

X X= =

∂∆ ∆ <

∂ ∂∑∑ (0.72)

Com a definição

2

iji j

UU

X X

∂≡

∂ ∂, (0.73)

a equação (0.72) pode escrever-se em forma matricial:

[ ]11 13 1

1 3

31 33 3

0

U U X

X X

U U X

∆ ∆ ∆ > ∆

L

L M O M M

L

(0.74)

A expressão (0.74) é equivalente, em teoria de matrizes, à condição de a matriz U ser definida positiva.

Para demonstrar que U é definida positiva existem vários métodos, nomeadamente a sua redução, por rotação adequada do sistema de eixos, à forma diagonal. Se a matriz for definida positiva, todos os seus valores próprios são não negativos.

Consideremos o caso de sistemas fechados com um componente, que têm só duas variáveis independentes. A equação fundamental pode-se escrever como ( )vsuu ,= .53 Neste caso, dada a pequena dimensão da matriz, a forma mais expedita de verificar se é definida positiva é verificar se todos os seus menores principais são positivos. Teremos então

vvs

T

s

uu

=

=

∂∂

∂2

2

11

53 Para que a equação fundamental se possa escrever assim, basta que o sistema tenha só um

componente, não é preciso que seja fechado. A condição de que o sistema seja fechado é necessário para que só seja preciso considerar duas variáveis para o estudo da estabilidade.

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91

sv v

Tu

s

P

vs

uu

==

−==

∂∂

∂∂

∂∂∂

21

2

12

ssv

P

v

uu

−=

=

∂∂

∂2

2

22

Pelo que, para existir estabilidade, terá de ser:

0v

T

s

∂ > ∂ (0.75)

e

2

0s v v

P T P

v s s

∂ ∂ ∂ − − > ∂ ∂ ∂ . (0.76)

Em alternativa, a condição (0.75) pode ser substituída por

0s

P

v

∂ − > ∂ .54 (0.77)

Temos agora que

v v

T T

s C

∂ = ∂ (0.78)

e

1

s S

P

v vκ∂ − = ∂

. (0.79)

Temos assim que as condições (0.75) e (0.77) ficam

0vc > (0.80)

e

0Sκ > . (0.81)

Para a condição (0.76) falta-nos só identificar

54 Esta condição é intuitiva e significa apenas que quando a pressão aumenta o volume deve

diminuir e inversamente. Se assim não sucedesse, qualquer pequena redução de volume faria diminuir a pressão do sistema que por sua vez iria provocar uma redução de volume, etc. Ter em atenção a convenção de sinais aplicada à pressão, que levou a exprimir o trabalho elementar recebido pelo sistema por –P dV.

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92

1 1P P

s T v v T

P dP ds dP ds dP dT dv dT C T C

v dv ds dP dT dv dT dv ds T v C C vκ κ ∂ ∧ ∧ ∧ ∧ = = = − = − ∂ ∧ ∧ ∧ ∧

(0.82)

ou

( ) 1

s T v T v

T dT ds dP dv dP dT dv dT T Tv

v dv ds dP dT dv dT dv ds v C C

αα

κ κ ∂ ∧ ∧ ∧ ∧ = = = − = − ∂ ∧ ∧ ∧ ∧

. (0.83)

Substituindo as relações acima na condição de estabilidade, obtemos que

2

0P

T

C T

v

ακ

− > . (0.84)

Como55

2

P vT

TvC C

ακ

− = (0.85)

e

S v

T P

C

C

κκ

= 56 (0.86)

conclui-se que a estabilidade intrínseca exige que:

0P vC C≥ > (0.87)

e

0T Sκ κ≥ > . (0.88)

Exemplo

Consideremos o ciclo representado pelo diagrama abaixo, em que o passo B-C é isotérmico. Vamos representar qualitativamente este ciclo no diagrama T-s.

55 Ver 3.8 - Relações de Maxwell.

56 A descoberta experimental destas relações teve um papel fundamental no nascimento da Termodinâmica. O facto de as termos deduzido a partir dos axiomas iniciais é uma prova indirecta da correcção dos axiomas e das deduções matemáticas que se seguiram.

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93

Comecemos pela análise do troço A→B. Para a representação deste troço no diagrama T-s necessitamos de conhecer a direcção e o sentido desta linha.

A direcção da linha que constitui este troço no diagrama T-S é dada por

( )P

T s∂ ∂ . Sabe-se que ( ) PPT s T c∂ ∂ = . Como T>0 e cP>0, tem-se

( ) 0P

T s∂ ∂ > .

Relativamente ao sentido desta linha, uma vez que para este troço apenas se conhece a variação qualitativa de v, será necessário determinar o sinal da derivada de uma das coordenadas do novo diagrama em ordem a v. Escolha-se, por exemplo, ( ) 1

PT v vα∂ ∂ = (note-se que alternativamente

poder-se-ia ter escolhido ( )P

s v∂ ∂ ). Como neste troço 0v∆ > e v>0 então

0, 0

0, 0

se T

se T

αα

> ∆ >

< ∆ <.

Note-se que como o sinal de α é desconhecido, será necessário definir um diagrama T-s para α >0 e para α<0. Repetindo o mesmo procedimento para os restantes troços do ciclo obtemos

v

P

A

C

B

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94

Exercícios 1) Determine as condições de estabilidade para a equação fundamental

dos gases perfeitos.

2) Determine as condições de estabilidade para a equação fundamental do fluido de van der Waals.

3) Determine as condições de estabilidade para a equação fundamental da radiação.

4) Determine as condições de estabilidade para a fita de elástico.

5) Determine as condições de estabilidade para o líquido incompressível.

6) (Exame de Termodinâmica de 09.09.2001). Sempre que se fornece calor a um sistema, este aumenta a sua temperatura?

7) (Exame de Termodinâmica de 09.09.2001). Num processo a volume constante a variação de energia interna é sempre igual à troca de calor?

8) No diagrama P-v, considere uma adiabática e uma isotérmica. Para um dado ponto, determine qual das curvas é mais inclinada.

9) (Exame de Termodinâmica de 20.09.2003). Determine se a equação fundamental

1aV U b N S− =

a) obedece à homogeneidade e à positividade da temperatura;

b) obedece ao Postulado de Nernst;

c) obedece aos critérios de estabilidade.

10) (Exame de Termodinâmica de 17.09.2004). Considere um sistema que obedece à equação 1 2 1/3u Av T= e ao Postulado de Nernst.

s

T

s

α>0

C B

A C

A

B

T α<0

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95

a) Determine a equação fundamental.

b) A equação é compatível com os critérios de estabilidade?

1) Exprima a variação de energia interna de uma substância simples em função das variações de temperatura e volume (utilizando os coeficientes termodinâmicos). Aplique ao caso do gás perfeito.

2) Exprima, utilizando os quocientes dos produtos de formas diferenciais, a variação de entropia de uma substância simples em função das variações de temperatura e pressão (utilizando os coeficientes termodinâmicos). Aplique a expressão resultante a um gás perfeito.

3) (Exame de 21 de Janeiro de 2005). O ciclo de Joule é descrito pelo diagrama abaixo. Represente qualitativamente o ciclo no diagrama T-S.

4) (Exame de 14 de Setembro de 2005). Considere o ciclo representado abaixo, percorrido na sequência A-B-C-D, e em que o passo B-C é isentrópico. Represente qualitativamente o ciclo no diagrama T-S.

h

P

C

A B

D

P

S

D C

A B

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4. Sistemas Termodinâmicos Simples

4.1. Recomendações para a Obtenção de Equações Fundamentais

Aplicar os seguintes passos iterativamente.

1)

a) Integrar as derivadas parciais que aparecem no enunciado (considerar variáveis intensivas quer na representação energética, quer na representação entrópica).

b) Se foram integradas duas derivadas parciais com as mesmas variáveis independentes, igualar as expressões obtidas e assim obter as funções desconhecidas resultantes das integrações de derivadas parciais.

c) Caso contrário, derivar as expressões obtidas em ordem à variável que era constante na derivada parcial de que se partiu. Transformar esta derivada parcial noutra expressão (possivelmente usando as formas diferenciais e a relação de Maxwell).

2) Para as equações do enunciado que não envolvam coeficientes termodinâmicos, experimentar fazer diferentes derivadas parciais, transformando depois estas derivadas parciais noutras.

3) Para as equações que envolvam coeficientes termodinâmicos, conjugá-las com as seguintes equações

2

P vT

vTc c

ακ

= + , 2

T sP

vT

c

ακ κ= + , P T

v s

c

c

κκ

=

(note-se que, destas três equações, só duas é que são independentes) determinando expressões para outros coeficientes termodinâmicos.

4.2. Gases Perfeitos

4.2.1. Um Gás Perfeito O gás perfeito simples com um componente define-se pelas equações

PV NRT= (0.89)

U cNRT= (0.90)

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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98

em que:

• R é a constante dos gases (8,3145 J mol-1 K-1);

• c é uma constante tal que vC cR= (para gases monoatómicos,

c = 3/2; para outros gases, como O2 ou NO, c ≈5/2 a 7/2, consoante a temperatura.)

Consideramos as equações (0.89) e (0.90) como definindo um modelo que designamos gás perfeito. Este modelo descreve bem os gases reais quando P → 0.57

Estas equações permitem-nos determinar a equação fundamental. O aparecimento explícito de U numa das equações sugere que utilizemos a representação entrópica, ficando as equações (0.89) e (0.90), respectivamente, iguais a:

P NR

T V=

ou

P R

T v= (0.91)

1 cNR

T U=

ou

1 vC

T u= (0.92)

Para obter a terceira equação de estado, passamos as equações (0.91) e (0.92)para a forma molar e substituímos na equação de Gibbs-Duhem molar na representação entrópica:

v vC CR Rd ud vd du dv

T u v u v

µ = + = − −

Simplificando o membro direito e integrando ambos os membros entre um estado de referência e um estado arbitrário (indicando as variáveis de integração com uma pelica), temos

( ) 0 00

'1 1

' '' '

T u v

T u vd cR du R dv

T u v

µ

µ

µ = − − ∫ ∫ ∫ (0.93)

Efectuando os integrais em (0.93), obtemos:

0

0 0 0

ln lnu v

cR RT T u v

µµ− = − −

57 Fisicamente, o modelo de gás perfeito simples corresponde a considerar que o gás é constituído por

moléculas (1) com volume nulo e (2) sem interacção entre elas. Assim, a energia interna só pode depender da energia cinética de translação das moléculas, pois, devido a (1), não existe energia de rotação ou de vibração, e, devido a (2), não existe energia de interacção. Nestas condições, a temperatura está relacionada com a energia cinética das moléculas, e assim se justifica a equação (0.90).

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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99

Substituindo estas expressões na equação de Euler molar, temos:

0 0

0 0 0 0 0 0

ln ln ln lncR R u v u v

s u v cR R cR R cR Ru v T u v T u v

µ µ= + − + + = + − + +

Considerando esta equação no estado de referência s0, u0 e v058

, determinamos

00

0

s cR RT

µ= + − .

Obtemos assim a equação fundamental para um gás perfeito:

00 0

ln lnu v

s s cR Ru v

= + + (0.94)

Integração Directa da Forma Molar

A equação fundamental também se pode obter directamente da forma diferencial da equação fundamental na representação entrópica. Substituindo 1/T e P/T, obtém-se

cR R

ds du dvu v

= + . (0.95)

Integrando, obtemos a equação (0.94). Como se poderá verificar, a Equação Fundamental deduzida não satisfaz o postulado

0lim0

=→

ST

pois da equação (0.96) obtém-se que T = 0 exige u = 0 o que implica, pela equação (0.94), S → ∞ . Esta aparente contradição resulta do facto de as equações de estado de que partimos não serem válidas em todo o espaço termodinâmico e em particular a temperaturas muito baixas.

De facto, (0.89) e (0.90) são válidas no domínio de P e T em que foram inicialmente estabelecidas e dentro do limite de precisão consentido pelos aparelhos disponíveis. Em termos práticos, estas equações continuam a ser utilizáveis em regiões afastadas do ponto crítico.

Se quisermos, porém, ser rigorosos, diremos que o gás descrito por aquelas equações de estado não existe. A tradição termodinâmica chama-lhe gás perfeito ou ideal.

Nenhum dos termos é muito feliz, pois do que se trata é de um modelo matemático que se aproxima do comportamento dos gases reais em certo

58 A apresentação destas equações leva em conta contributos dos alunos Tiago Veiga e Nuno

Cegonho.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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100

domínio do espaço termodinâmico. Todavia, devemos salientar que a teoria que temos vindo a construir revela desde já a capacidade para apontar a existência de limitações no próprio modelo, ao revelar a sua inconsistência com as propriedades que caracterizam a equação fundamental.

Posto isto, e ficando claro que ao falar de gás perfeito ou gás ideal nos estamos a referir a um domínio restrito de P e T, continuaremos a falar de gás perfeito por se prestar tão bem a exemplificar os conceitos, sem excessivas manipulações algébricas. Esta equação desempenhará assim o papel de modelo ilustrativo de um sistema termodinâmico simples.

Problemas

1) (Callen, 1985, 3.4-2). Mostre que a relação entre o volume e a pressão de um gás perfeito monoatómico ( 3 2c = ), durante uma expansão adiabática reversível (isto é, com entropia constante), é dada por

( )02 35 3 5 3 2 30 0 constantes R s RPv P v e e−= = .

Esboce uma família destas curvas “adiabáticas” no plano P – v.

2) (Exame de Termodinâmica de 21.01.2005). A temperatura da atmosfera diminui com a altitude. O ar mais quente expande-se quando se eleva do nível do mar para as regiões superiores onde a pressão é mais baixa. Como o ar é mau condutor de calor, a expansão é aproximadamente adiabática e a temperatura diminui quando o ar sobe. Que variação de volume terá de sofrer uma massa de ar para que a sua temperatura passe de 20 ºC para 0 ºC devido a uma expansão adiabática (o ar comporta-se nestas condições como um gás perfeito diatómico, com 7 5P vc c = ).

3) (Exame de Termodinâmica de 14/02/2003). Considere um cilindro onde se encontram Ni moles de um gás perfeito simples, ocupando um volume Vi. O sistema está em contacto com o reservatório térmico, que o mantém à temperatura constante T.

a) É injectada neste cilindro uma quantidade adicional de moles do mesmo gás, passando o número de moles no interior do cilindro para Nf. Calcule o trabalho químico necessário para realizar este processo.

b) De seguida, o gás é comprimido, passando de um volume Vi para um volume Vf.

i) Calcule o trabalho realizado neste processo.

ii) Calcule o calor trocado entre o sistema e o reservatório térmico.

iii) Interprete fisicamente o valor do trabalho quando Vf = 0.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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4) (Exame de Termodinâmica de 17/09/2004). Um recipiente cilíndrico isolado está dividido em duas partes (1) e (2) por um pistão perfeitamente condutor. O lado (1) contém 1 mol de um gás perfeito monoatómico à pressão p(1) = 1,0 MPa, e temperatura T(1) = 300 K. O lado (2) contém 1 mol do mesmo gás, com p(2) = 0,10 MPa, e temperatura T(2) = 300 K. Inicialmente, o pistão está preso. O pistão é de seguida libertado, e o sistema atinge um estado de equilíbrio.

a) Qual é o volume final de cada lado do recipiente?

b) Qual é a temperatura e a pressão do gás?

c) Qual é a variação de entropia do sistema conjunto?

d) O processo é reversível?

5) (Exame de Termodinâmica de 26.01.2004) Um cilindro rígido isolado com um volume total de 0,015 m3 está dividido em dois compar-timentos, (1) e (2), cada um contendo uma mistura dos mesmos dois gases perfeitos monoatómicos, 1 e 2. O volume de (1) é o dobro do volume de (2). Os compartimentos estão separados por uma membrana diatérmica, rígida, permeável ao gás 1 e impermeável ao gás 2.

a) Determine os valores de T e N1 em cada compartimento, depois de se ter estabelecido o equilíbrio, em função dos valores iniciais do número de moles e de temperatura em cada compartimento, isto é,

)1(,1 iN , )1(

,2 iN , )1(

iT , )2(,1 iN , )2(

,2 iN , )2(iT (para simplificar a apresentação dos

resultados, pode definir grandezas auxiliares que dependem só destes valores e dos parâmetros).

b) Considere agora que os valores iniciais são molN 60,0)1(1 = ,

molN 80,0)1(2 = , KT 400)1( = , molN 2,1)2(

1 = , molN 60,0)2(2 = ,

KT 300)2( = . Calcule os valores finais de T e N1 em cada compartimento. Descreva os processos que ocorrem à medida que o sistema tende para o equilíbrio, relacionando os valores iniciais de temperatura e número de moles com os valores finais.

6) (Exame de Termodinâmica de 13.02.2004). Considere uma mole de um gás perfeito monoatómico inicialmente a 51,00 10 Pa × e 298 K. Calcule

Q, W, e ∆U para cada processo da seguinte sequência (que forma um ciclo fechado):

a) um aquecimento a volume constante até uma temperatura igual ao dobro da temperatura inicial.

b) uma expansão adiabática e quase-estática para 298 K.

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Termodinâmica Macroscópica

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c) uma compressão isotérmica até 51,00 10 Pa × .

7) (Exame de Termodinâmica 21.01.2005). Considere um sistema composto, com dois subsistemas, (1) e (2), respectivamente com volumes V(1) e V(2). No lado (1) está uma mistura de gases perfeitos, que contém o gás k. Do lado (2), está o gás k sozinho. A membrana que separa os dois compartimentos é diatérmica, fixa, permeável ao gás k e impermeável a todos os restantes gases. Relembrando que o potencial químico de um dado componente j numa mistura de gases perfeitos é dado por

( )0ln jj

N vRT T

Vµ φ

= +

,

determine, em equilíbrio, o número de moles do gás k em cada subsistema.

8) (Exame de Termodinâmica de 26-01-2004) Uma expressão geralmente utilizada para a capacidade calorífica molar a pressão constante é:

Cp = aT + b.

a) Determine a expressão geral para a quantidade de calor necessária para levar de Ti a Tf, a pressão constante, uma substância descrita por esta expressão.

b) Para o caso específico do cobre, a expressão acima escreve-se

Cp/J K-1 mol-1 = 6,28 10-3T/K + 22,59.

Calcule a quantidade de calor necessária para levar, a pressão constante, 1,00 mol de cobre de 300 K para 1300 K. Para este processo e esta substância, teria sido uma boa aproximação considerar a = 0?

4.3. Gás de van der Waals59 Para descrever melhor o comportamento de gases reais, J. D. van der Waals propôs em 1873 a seguinte equação de estado:

2

RT aP

v b v= −

− (0.97)

em que a e b são duas constantes que variam com o gás considerado e se podem encontrar em tabelas obtidas de valores experimentais. Esta equação

59 Tal como chamamos perfeito ao gás descrito pela equação dos gases perfeitos, também chamamos

gás de van der Waals ao modelo descrito pela equação de van der Waals.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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103

foi obtida por van der Waals com base nos seguintes argumentos físicos, partindo do modelo do gás perfeito:

1. Em vez de serem pontuais, as moléculas são esferas rígidas, com um certo volume não nulo. O volume de uma mole de moléculas é igual a b. Assim, as moléculas não dispõem de todo o volume, subtraindo-se ao volume total por mole, v, o volume ocupado por mole, b.

2. Existem interacções atractivas entre as moléculas, o que, ao atrair as moléculas para o centro do gás, reduz a pressão. As interacções atractivas são tanto mais fortes quanto mais denso for o gás. Como as interacções ocorrem entre pares de moléculas, aumentam proporcionalmente com o quadrado da densidade, isto é, com o quadrado do inverso do volume molar. Este é o termo a/v2, que reduz a pressão.

Nos exercícios desta secção, mostra-se que a partir da equação (0.97) e da condição de que as equações de qualquer gás devem reduzir as equações do gás perfeito nos limites v → ∞ ou 0P → , obtém-se

( )0 lnc

as s R v b u

v

= + − +

(0.98)

Esta equação também não satisfaz a equação fundamental no limite de T → 0 e, portanto, também não é aplicável a muito baixas temperaturas. Todavia, a sua gama de aplicação é muito maior que a dos gases perfeitos e permite, contrariamente a esta, ilustrar aspectos fundamentais do comportamento dos gases reais como a mudança de fase.

4.3.1. Exercícios 1) Calcule o potencial químico para um fluido de van der Waals.

2) Calcule os coeficientes termodinâmicos para um fluido de van der Waals. Interprete fisicamente, através do efeito de a e b face à expressão para o gás perfeito.

4.4. Radiação Electromagnética Sob o ponto de vista termodinâmico, a radiação electromagnética ilustra o caso simples mas importante de um sistema que não possui massa mas apenas energia. Seja pois um sistema onde existe o vácuo e cuja parede se encontra à temperatura T (Figura 9).

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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Figura 9 – Representação esquemática de uma cavidade electromagnética

T

V

O interior da cavidade possui a energia electromagnética expressa pela lei de Stefan-Boltzman,

4U bVT= , (0.99)

e uma pressão dada por

3

UP

V= , (0.100)

sendo b uma constante com valor b = 7,56 10-16 J m-3 K-4. As relações (0.99) e (0.100) serão por nós consideradas relações empíricas60 correspondentes a duas equações de estado. As duas equações de estado (0.99) e (0.100) podem também escrever-se na forma:

1 4 1 4 1 41b V U

T−= , (0.101)

1 4 3 4 3 41

3

Pb V U

T−= (0.102)

Substituindo as equações (0.101) e (0.102) na equação de Euler (neste caso só com duas variáveis extensivas independentes), obtém-se a equação fundamental

1 4 3 4 1 44

3S b U V= . (0.103)

Considere-se como exemplo o balanço de energia à Terra. O planeta apenas troca energia por radiação, recebendo radiação solar e emitindo radiação terrestre.

60 Em verdade podem deduzir-se do electromagnetismo e da mecânica quântica.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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105

À escala dos anos é legítimo considerar que o balanço de energia se processa em estado estacionário, logo a energia recebida pela Terra tem de ser igual à emitida. Deste modo tem-se

Terra SolU U= . (0.104)

Substituindo a equação (0.99), obtemos

Note-se que os volumes constantes da equação anterior representam os volumes associados s à emissão de radiação electromagnética e não os volumes dos corpos em causa. Uma vez que a temperatura do Sol é superior à da Terra, conclui-se que

Terra SolV V> . (0.105)

De facto, a um menor volume efectivo está associada a geração de radiação com menores comprimentos de onda (radiação visível vs radiação infra-vermelha).

Considerando agora a equação fundamental (0.103), e levando em conta a igualdade das energias expressa em (0.104), conclui-se que , isto é a radiação irradiada pela Terra apresenta uma maior entropia que a radiação recebida do Sol.

4.5. Elástico de Borracha Linear O vulgar elástico de borracha tem as seguintes propriedades, em primeira aproximação (Figura 10):

• a força é proporcional à deformação;

• a força aumenta com a temperatura, a deformação constante.

Figura 10 – Elástico de borracha

L0

F

Estas propriedades podem-se exprimir formalmente como:

Π =−−

bTL L

L L

n 0

1 0

, com L L L0 1< < ,

em que:

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Termodinâmicos Simples

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106

Π -força associada à deformação do elástico

L0 - comprimento em repouso;

L1 - limite elástico;

b - constante;

n - expoente de que ainda não sabemos o valor .

Além disso, pode admitir-se em primeira aproximação que a energia interna é independente do comprimento, ou seja:

U = c0 L0 T

Como dispomos de uma equação de estado em U e outra em L61, a equação fundamental na forma entrópica será da forma

S = S(U, L)

com

L U

S SdS dU dL

U L

∂ ∂ = + ∂ ∂ (0.106)

Como dS é uma forma-1 exacta, para que a força generalizada Π corresponda à força F que se verifica numa evolução reversível de 1ª espécie terá62 de ser

1

U LL T U T

∂ ∂ Π = − ∂ ∂ (0.107)

o que apenas sucede para n = 1. Para n = 1, vem

0 0

1 0

cL L LdS dU b dL

U L L

−= −

− (0.108)

Como o primeiro termo só depende de U e o segundo só depende de L, a equação (0.108) pode integrar-se termo a termo, obtendo-se como equação fundamental63:

( )2

00 0

0 1 0

ln2

L LU bS S cL

U L L

−= + −

− (0.109)

61L é a única variável externa através da qual é possível a permuta de energia.

62A força correspondente à evolução reversível será igual à derivada parcial de S em relação a L. Mas sendo dS uma forma-1 exacta, as derivadas cruzadas são iguais.

63 A integração é feita a partir do estado de referência dado po S0, U0 e L0.

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5. Ciclos Termodinâmicos

5.1. Ciclo de Carnot Os trabalhos de Sadi Carnot64 tiveram uma importância histórica fundamental e as suas “Reflexões Sobre a Potência Motriz do Fogo”, apesar de utilizarem o conceito de calórico, conduziram ao famoso rendimento do ciclo de Carnot, o rendimento inultrapassável por qualquer máquina térmica independentemente do modo como é constituída ou da substância que descreve o ciclo.

Foram a generalidade e pertinência dos seus argumentos que levaram, posteriormente, Clausius ao conceito de entropia e ao enunciado clássico da Segunda Lei da Termodinâmica.

Nos textos clássicos de Termodinâmica, o ciclo de Carnot é a pedra angular no desenvolvimento da teoria. Neste curso, o rendimento do ciclo de Carnot e o limite superior que o mesmo representa para qualquer máquina térmica são uma consequência quase trivial dos conceitos até agora introduzidos e das deduções a que os postulados nos conduziram.

Em particular, para a demonstração do teorema de Carnot basta ter em conta a existência da equação fundamental para qualquer sistema termodinâmico e o princípio da conservação da energia.

Por outro lado, o ciclo de Carnot permite-nos uma abordagem directa à questão da conversão do calor em trabalho e ao significado prático das irreversibilidades de 2ª espécie.

O conceito de ciclo desempenha na construção da Termodinâmica Clássica (Clássica≡Histórica) um papel fundamental, pois constitui o modo de evitar qualquer referência ou hipótese explícita relativamente ao que se passa no interior do sistema.

Dizer que o sistema descreve um ciclo é o mesmo que afirmar ser possível identificar de modo absoluto e sem ambiguidades a configuração macroscópica do sistema pelo menos num ponto de partida, que é o ponto

64 Nicolas Léonard Sadi Carnot viveu entre 1796 e 1832 e foi engenheiro militar. O seu pai, Lazare

Nicolas Marguerite Carnot (1753-1823), engenheiro militar e general, foi um dos líderes da Revolução Francesa e ficou conhecido como o Grande Carnot e organizador da vitória. Foi o primeiro ministro da guerra de Napoleão e demitiu-se passados 5 meses (1800). Um seu neto, sobrinho de Sadi Carnot e que tinha o mesmo nome, foi Presidente da 3ª República Francesa, desde 1887 até ao seu assassinato em 1894.

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Termodinâmica Macroscópica

Ciclos Termodinâmicos

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108

ao qual o sistema tem de regressar para que o conjunto de processos que sofreu formem um ciclo.

Este ciclo designa-se habitualmente por ciclo fechado. Mas um ciclo que não é fechado não é um ciclo, pelo que afirmar que é fechado se torna redundante.

5.1.1. Fontes Reversíveis Na discussão clássica do ciclo de Carnot e na construção clássica da Termodinâmica, os conceitos de fonte de calor e de fonte de trabalho reversível desempenham um papel fundamental. A sua formulação é por isso apresentada de acordo com a terminologia e conceitos que temos vindo a utilizar.

As fontes de calor reversíveis são sistemas termodinâmicos fechados que podem permutar energia mantendo constantes as coordenadas externas e em que a temperatura no seu interior tem um valor uniforme, embora possa variar ao longo do tempo.

Pela definição, a energia permutada só pode ser energia interna (calor). O sistema termodinâmico (no âmbito da Termodinâmica de Equilíbrio) está sempre em equilíbrio interno, o que se traduz pela uniformidade das variáveis intensivas, nomeadamente a temperatura.

Também podíamos definir as fontes de calor reversíveis como sistemas termodinâmicos que estando sempre em equilíbrio interno só podem trocar energia através da coordenada interna entropia.

No ciclo de Carnot há apenas duas fontes. Chama-se por isso fonte quente à fonte a temperatura mais elevada e fonte fria à outra.

As fontes de trabalho reversíveis são sistemas termodinâmicos fechados, em equilíbrio interno (e que portanto não são sede de irreversibilidades de primeira espécie) cujas paredes são adiabáticas.

A Termodinâmica Clássica teve de inventar estes conceitos extrapolando para um limite prático a idealização experimental.

Destas idealizações, a mais difícil de intuitivamente assimilar é a de fonte de calor associada ao processo de transferência reversível de calor. O motivo porque introduzimos o conceito de irreversibilidade de 2ª espécie, resulta, entre outros, deste facto.

Por outro lado, os conceitos de fontes de calor e trabalho reversível desempenham um papel fundamental porque é através delas que na Termodinâmica Clássica se vão inferir as propriedades do sistema.

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Termodinâmica Macroscópica

Ciclos Termodinâmicos

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109

5.1.2. Descrição do Ciclo O ciclo de Carnot é o ciclo descrito por um sistema termodinâmico em contacto exclusivo com fontes de trabalho e fontes de calor reversíveis. O ciclo é constituído pelos seguintes processos (Figura 11).

Processo A →→→→ B. O sistema recebe reversivelmente65 a quantidade de calor QAB à temperatura q A BT T T= = de uma fonte de calor reversível.

Processo B →→→→ C. O sistema sofre uma evolução adiabática e reversível (logo isentrópica) fornecendo o trabalho WBC a uma fonte de trabalho reversível.66

Processo C →→→→ D. O sistema cede reversivelmente a quantidade de calor QCD, à temperatura constante f C DT T T= = a uma segunda fonte de calor

reversível.

Processo D →→→→ A. O sistema sofre uma evolução adiabática e reversível (logo isentrópica) recebendo o trabalho WDA de uma fonte de trabalho reversível.

Figura 11 – Ciclo de Carnot

Em nenhum dos processos há irreversibilidades de 1ª ou de 2ª espécie, tanto na permuta de energia com as fontes como no interior do sistema.

O ciclo descrito é o chamado ciclo directo. O ciclo inverso é inteiramente idêntico, mas percorrido em sentido inverso. Neste caso, onde no ciclo directo recebia calor (ou cedia trabalho), passou a ceder calor (ou a receber

65 Tal significa que, no sistema conjunto compreendendo o sistema que descreve o ciclo e a fonte,

não há aumento global de entropia durante a transferência de calor. Isto é, no sistema conjunto não há irreversibilidades de 2ª espécie.

66 Ver nota anterior. No sistema conjunto não há irreversibilidades de 1ªespécie.

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Ciclos Termodinâmicos

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trabalho). Ao ciclo directo chama-se ciclo motor. Ao ciclo inverso chama-se ciclo frigorífico.

O sistema que sofre a evolução é absolutamente geral, pois não especifica nenhuma substância particular a descrever o ciclo.

5.2. Teorema de Carnot O Teorema de Carnot desempenha um papel especial porque trata das conversões de calor em trabalho e exprime a realidade fundamental da natureza ou mundo em que vivemos de que todo o trabalho é convertível em calor mas de que nem todo o calor é convertível em trabalho num processo cíclico.

Sublinhamos cíclico, porque há processos, de que é exemplo a expansão isotérmica de um gás perfeito, em que todo o calor recebido é cedido pelo sistema sob a forma de trabalho. Todavia, o sistema não regressa ao estado inicial.

Enunciado

O rendimento do ciclo de Carnot depende apenas das temperaturas extremas e é dado por67:

1 f

q

TW

Q Tη = = −

O rendimento é máximo se todos os processos forem reversíveis, tanto de 1ª como de 2ª espécie.

Demonstração Para aplicar a teoria que já construímos à demonstração do Teorema de Carnot, comecemos por notar que o (sub)sistema A e as fontes formam um sistema total isolado enquanto se desenrola o processo correspondente ao contacto com as fontes.

Notemos ainda que tanto cada uma das fontes como o sistema que descreve o ciclo possuem uma Equação Fundamental que é específica da substância que os forma, isto é, teremos:

U = U (S, X1, ... , Xn) para o sistema que descreve o ciclo

Ucq = Ucq (Scq, X1q, ... , Xnq) para a fonte de calor à temperatura Tq = TA = TB

67 Temperaturas absolutas.

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Ucf = Ucf (Scf, X1f, ... , Xnf) para a fonte de calor à temperatura Tf = TD = TC

Ut = Ut (X1t, ... , Xnt) para a fonte de trabalho reversível

Note-se que escrevemos a Equação Fundamental da fonte de trabalho reversível independente de S para sublinhar que, por definição, numa fonte de trabalho reversível, a entropia se mantém sempre constante pelo que é desnecessária para a descrição das suas permutas de energia ou das suas evoluções.

Por outro lado, será sempre:68

δQq = Tq dSq - para a fonte quente

δQf = Tf dSf - para a fonte fria

e será também para o sistema A, sempre

δQA = TA dSA

Consideremos agora, individualmente, cada um dos quatro processos que formam o ciclo.

Processo A →→→→ B

No estado inicial A, o sistema encontra-se na configuração

UA = U (SA, X1A, ... , XnA)

No processo A → B, a fonte quente cedeu ao sistema

δQq = Tq dSq

e a entropia do sistema aumentou de

cq

AB

QdS

T

δ=

Se o processo não for infinitesimal obter-se-á, dado que a evolução é isotérmica,

Qq = Tq (SqA - SqB)

e para o sistema

S SQ

TQTB A

cq

AB

AB

AB

− = = 69

68 Pelo índice c referimo-nos à fonte. Notar-se-á que distinguimos a temperatura do sistema da

temperatura da fonte, mantendo apenas a exigência de não haver irreversibilidades internas, tanto na fonte como no sistema. Assim, a relação δQ=TdS é sempre válida, pois T e dS referem-se ao mesmo sistema termodinâmico.

69 Porque o calor recebido pelo sistema é igual ao cedido pela fonte.

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Durante o processo A → B, o sistema recebeu calor (entropia) da fonte quente e cedeu trabalho, pelo que a sua coordenada externa se alterou para VB.

A variação total de energia interna do sistema, entre A e B, foi portanto,

UB - UA = WAB + QAB = U (SB, VB) - U (SA, VA)

Processo B →→→→ C

Como o processo é adiabático e reversível a entropia do sistema não se altera, pelo que SC = SB. O sistema apenas cede trabalho à fonte de trabalho (reversível) no valor de

UC - UB = U (SB, VC) - U (SB, VB)

Processo C →→→→ D

Se notarmos que no processo A → B a entropia do sistema aumentou de SA

para SB, e que o processo C → D é adiabático, conclui-se imediatamente

que o sistema só pode voltar ao estado inicial se ceder no processo C → D toda a entropia que recebeu desde o estado inicial70. O sistema terá, portanto, de ceder à fonte fria a quantidade de calor

QS S

TCD

A B

CD

= −.

Durante o processo, trocou também o trabalho correspondente à passagem da configuração (VC) à configuração (VD).

Processo D →→→→ A

O sistema regressa adiabática e reversivelmente ao estado inicial para o que apenas pode ceder trabalho à fonte de trabalho (não pode trocar calor, e portanto entropia, porque o processo é adiabático).

Como o sistema regressa ao estado inicial, a sua energia interna é a mesma que tinha quando iniciou o ciclo. Pelo princípio da conservação da energia, resulta que o saldo dos trabalhos trocados pelo sistema com as fontes de trabalho reversível só pode provir do saldo das suas trocas de calor com as fontes de calor. Ora o sistema recebe da fonte quente a energia

Qq = Tq ∆Sq

e com ela a entropia

∆Sq = (SB - SA).

70 Pois a única forma que um sistema termodinâmico tem de reduzir a sua entropia é cedendo calor e

nos troços do ciclo em que permutou trabalho isso é impossível porque esses processos são adiabáticos.

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Para o sistema voltar ao estado inicial teve de ceder à fonte fria a entropia ∆Sq que recebeu e para isso teve que lhe ceder a quantidade de calor

Qf = Tf∆Sq.

A quantidade de calor convertido em trabalho foi portanto:

W= Qq - Qf = (Tq - Tf) ∆S

em que

∆S = SA - SB = SC - SD

Como o rendimento do ciclo é definido pelo quociente do trabalho cedido pela quantidade de calor recebida, isto é:

( )q f q f

q q q

T T S T TW

Q T S Tη

− ∆ −= = =

ou seja

1 f

q

T

Tη = −

como desejávamos demonstrar.

Notas Como se constata, a demonstração é quase trivial quando o princípio da conservação da energia e a existência de uma Equação Fundamental são dados adquiridos.

O Teorema de Carnot, tal como deduzido, aproxima-se da concepção inicial de Carnot, que via numa diferença de temperaturas o análogo de uma diferença de cotas numa queda de água (diferença de energia potencial), que poderia ser aproveitada para a produção de trabalho mecânico (o análogo da água que desce é a entropia e o da altura da queda a diferença de temperatura).

Todavia, Carnot utilizou o conceito de calórico e este não permite a dedução do teorema se o calórico for entendido como o era na época.

Se Carnot tivesse feito a destrinça conceptual entre δQ, T e dS (isto é, do que está contido em δQ = T dS), o princípio tal como o “tentou” exprimir estaria correcto. Todavia, e contrariamente ao que é corrente afirmar-se, não há nenhuma prova histórica de que Sadi Carnot tivesse feito essa reelaboração conceptual que teria criado o conceito de entropia.71

71 Que o rendimento de qualquer conversor de energia deve ser máximo para um processo reversível

foi extensamente defendido por Lazare Carnot (pai de Sadi Carnot). Lazare Carnot tratou das

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5.2.1. Reversibilidades Interna, Externa e Total Tal como enunciado e demonstrado, o Teorema de Carnot (princípio de Carnot nos textos históricos) exige a reversibilidade total no universo formado pelo sistema e pelas fontes, universo esse que é isolado. A reversibilidade total exige que todos os processos (no interior do sistema e das fontes bem como na sua interacção) sejam reversíveis (de 1ª e 2ª espécie). A reversibilidade total permite que a realização do ciclo inverso anule completamente todos os efeitos do ciclo directo, e inversamente.

A reversibilidade total é uma abstracção fundamental na construção da Termodinâmica Clássica (Clausius, Kelvin, Planck, etc.) onde o primeiro princípio consiste na afirmação de que o calor é a forma de energia que é preciso ter em conta para que a energia total se conserve num sistema isolado.

Por outro lado, através dos conceitos de reversibilidade total e através dos conceitos fulcrais de fontes, de trocas de calor e de trabalho reversível, procura-se demonstrar, com a utilização de ciclos de Carnot, (muitas vezes artificiosa), que

0Q

T

δ≥∫

em que δQ se refere à fonte de calor e T à sua temperatura. A situação

0Q

T

δ=∫

mostra que existe uma função de estado tal que dS = δQ/T72, a que Clausius chamou entropia. Clausius designou também como calor não compensado a diferença

( ) 0B

A BA

QS S

T

δ− − ≥∫

no processo A → B. Este modo de proceder transfere para as fontes o cálculo de todos os fluxos de energia e transforma-se facilmente em ratoeira se as temperaturas do sistema e das fontes não são iguais.

A maior dificuldade conceptual reside no facto da reversibilidade total exigir permutas de calor entre corpos a igual temperatura, o que é contrário

conversões de energia no âmbito da "Física Perfeita" (máquinas hidráulicas, etc.) e designava o caso limite da reversibilidade (correspondente ao que definimos como reversibilidade de 1ª espécie) como movimento geométrico.

72 1/T é o factor integrante que multiplicado por δQ transforma o conjunto num diferencial exacto, isto é, no diferencial da função de estado que é a entropia.

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ao senso comum. Tal facto leva muitos estudantes a terem sérias dificuldades na aplicação da Termodinâmica a situações reais conduzindo-os a mecanizar (sem dominar) as aplicações.

Ora, nas situações reais, é desnecessário exigir a reversibilidade total. Para que o formalismo já deduzido seja utilizável nas situações reais, basta que exista reversibilidade interna, a qual é sinónimo de validade "instantânea" da Equação Fundamental.

Diremos, analogamente, que existe reversibilidade externa se as fontes com as quais o sistema troca calor e trabalho também têm reversibilidade interna (note-se que o próprio conceito de fontes reversíveis o exige), isto é, estão a cada instante em equilíbrio interno.

Resta a interacção entre o sistema e as fontes, e a esta não é necessário exigir que seja reversível de acordo com o formalismo exposto, porque sabemos calcular facilmente o aumento de entropia total que resulta dessa irreversibilidade.

Sucede ainda que a irreversibilidade mais corrente e impossível de evitar em termos práticos é a irreversibilidade de 2ª espécie porque a transferência de calor exige uma diferença de temperaturas não infinitesimal se a quantidade a transferir é finita e tiver de ser efectuada em tempo finito como sucede em qualquer motor térmico.

Tendo em atenção as observações anteriores, verifica-se que, seja qual for o ciclo descrito pelo sistema, se ele tem de voltar ao estado inicial, a entropia tem de voltar ao valor que tinha no início.

Segue-se que toda a entropia que o sistema recebeu (seja a proveniente de sistemas de temperatura mais elevada, seja a proveniente de dissipações associadas ao trabalho permutado) tem de ser cedida, o que exige a existência de sistema (ou sistemas) a temperatura mais baixa.73

Tendo em conta este facto, a quantidade de calor que pode ser convertida em trabalho é tanto menor quanto maior for o calor que o sistema é obrigado a ceder para que a sua entropia regresse ao valor inicial, e possa assim fechar-se o ciclo.

Voltando ao ciclo de Carnot e admitindo agora apenas a reversibilidade interna do sistema e das fontes, será, para o calor recebido da fonte quente

Qq = Tq dSq para a fonte

mas para o sistema é

73 Pelo que a conversão de "calor" em trabalho exige pelo menos duas fontes de calor a temperaturas

diferentes.

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q q

B A qA A

Q TS S S

T T− = = ∆

pelo que,

se TA < Tq é B A qS S S− > ∆ .

Isto é, devido à irreversibilidade de 2ª espécie na interacção entre o sistema e a fonte, o sistema recebeu, com a mesma quantidade de calor, mais entropia. Esta entropia vai o sistema ter que a ceder à fonte fria. Para tal, tem de lhe ceder a quantidade de calor dada por (supondo que tudo o mais foi reversível)

Qf = Tf (SB-SA).

Para que esta transferência se faça num processo real, terá de ser

T Tf f fonte(sistema) fria)> (

O que significa que, quanto maior for a diferença de temperaturas entre o sistema e a fonte fria, maior será Qf , porque ∆Sq é imposto.

Como o saldo dos trabalhos trocados pelo sistema é o trabalho útil obtido da conversão de calor em trabalho, será

W = Qq - Qf

= TA dSAB - TC dSAB

= (TA - TC) dSAB

e ainda

η* = − = −T TT

TT

AB CD

AB

CD

AB

1

em que TCD e TAB são, agora, as temperaturas do sistema (e não das fontes). Como se vê

η η* ≤

η * será o rendimento do ciclo quando existe apenas reversibilidade interna.

Como é óbvio, se houver no sistema irreversibilidades internas, mais entropia é necessário ceder às fontes frias e portanto maior o valor de Qf, diminuindo assim o rendimento.

Do anteriormente exposto conclui-se também que:

o rendimento de qualquer ciclo na conversão de calor em trabalho é máximo existindo reversibilidade total.

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a que poderemos acrescentar, para qualquer ciclo real74:

o rendimento máximo de um ciclo real verifica-se quando existe reversibilidade interna e aumenta quando diminuem as irreversibilidades na interacção com as fontes.

Chamamos ciclos endoreversíveis aos ciclos em que apenas existem irreversibilidades de 2ª espécie nas trocas de calor com as fontes.

5.3. Outras Formulações da Segunda Lei da Termodinâmica

Existem diversas formulações alternativas da Segunda Lei da Termodinâmica:

Postulado de Kelvin75:

Uma transformação, cujo único resultado final, fosse transformar em trabalho o calor extraído de uma fonte que tem todos os seus pontos à mesma temperatura, é impossível.

Postulado de Clausius76:

Uma transformação cujo único resultado final fosse transferir calor de um corpo a dada temperatura para outro corpo a temperatura mais elevada, é impossível.

Postulado de Planck77:

É impossível construir um motor que, trabalhando num ciclo completo, tenha como único efeito levantar um peso e arrefecer um reservatório de calor.

Como facilmente se constata, os postulados ou axiomas de Kelvin e Planck reduzem-se à afirmação de que é impossível converter calor em trabalho, num processo cíclico, utilizando uma só fonte de calor, a temperatura uniforme.

Embora o postulado de Clausius não refira explicitamente um ciclo, a afirmação equivalente está implicitamente contida na condição "único resultado".

74 Pois para estes a reversibilidade total é impossível.

75 Tal como citado Fermi (1973, p. 29).

76 Tal como citado Fermi (1973, p. 29).

77 Planck (p. 89).

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Por exemplo, na conversão de calor em trabalho durante a expansão isotérmica de um gás, o efeito não foi só o fornecimento de trabalho mas também o aumento de volume.

Que uma só fonte de calor não é bastante para converter calor em trabalho é uma consequência de a entropia final do sistema ter de ser igual à inicial para que o ciclo se feche. Não havendo um sistema a temperatura mais baixa ao qual se cede a entropia recebida, não se pode voltar ao estado inicial. Se a entropia é cedida à temperatura a que foi recebida, o saldo do calor trocado é nulo e portanto também o é o saldo dos trabalhos.

O postulado de Clausius está contido no raciocínio anterior se em vez de um ciclo motor, considerássemos um ciclo inverso.

As observações anteriores mostram como a formulação aqui apresentada contém as outras, como aplicações particulares. Notar-se-á, por outro lado, que enquanto as formulações clássicas apresentadas o fazem, referindo explicitamente o calor, na formulação aqui apresentada é à dissipação, no sentido genérico, das formas macroscópicas de energia da Física Perfeita, que se faz referência.

Qualquer das formulações parte de axiomas e tem de obter resultados consistentes entre si. Todavia, formulações diferentes permitem interpretações e, sobretudo, desenvolvimentos diferentes.

A Mecânica de Lagrange e Hamilton está inteiramente contida na Mecânica de Newton. Mas foram estas reformulações que permitiram os mais notáveis desenvolvimentos posteriores da Física e o nascimento da Mecânica Quântica, por exemplo.

O conceito de Equação Fundamental aqui utilizado foi inicialmente introduzido por Gibbs.

Postular directamente a existência da Equação Fundamental e as suas propriedades foi iniciado por Callen, que divulgou e consagrou um tipo de reflexão iniciado por Tisza.

Começando directamente pelos axiomas da existência de U como função de estado e da entropia e suas propriedades, Gibbs-Tisza-Callen desejaram evitar justificações artificiosas a partir de axiomas pouco claros ou desnecessariamente restritivos, para demonstrar a existência de uma Equação Fundamental que, uma vez provada, permite extrair inúmeras conclusões.

Como, tanto num como noutro caso, é a previsão dos resultados experimentais o teste último da Teoria, o que o desenvolvimento da Termodinâmica Macroscópica a partir da Equação Fundamental oferece são consideráveis vantagens de generalidade, de concisão e de rigor, para além de tornar clara a ligação com a Termodinâmica Estatística.

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Neste curso, o ponto de partida (para além do Princípio de Conservação da Energia comum a todos os textos de Termodinâmica) foi o postulado ou princípio da dissipação, porque é a dissipação e a irreversibilidade de 1ª espécie que separa os fenómenos reais dos da Física Perfeita. Este postulado, ou princípio, que a experiência de todos os dias nos mostra existir, conjugado com o princípio (implícita ou explicitamente admitido em todas as formulações) de a Energia Interna ser uma função do ponto no espaço Termodinâmico obriga à existência de coordenadas internas. Usar apenas uma coordenada interna (Entropia) como suficiente é equivalente à afirmação (ou hipótese) de existir equilíbrio ou uniformidade interna. Obtivemos assim, dedutivamente, a Equação Fundamental e os axiomas de Callen como um resultado deduzido. Feita a comparação com os axiomas ou postulados de outras formulações verificamos também que eles estão contidos na formulação que adoptamos.

Deve ainda referir-se, como modo de formular a Termodinâmica (Termoestática) a sugerida por Max Born78 a Carathéodory, da qual resultou um teorema puramente matemático devido a Carathéodory e que afirma:79

Na vizinhança do ponto P de um campo vectorial associado a um pfaffiano integrável há pontos que não podem ligar-se a P por uma curva ergomédica.80

O axioma de Carathéodory, a partir do qual a Termodinâmica se formula, é: Na vizinhança de qualquer estado de um sistema fechado, há estados que são inacessíveis ao sistema através de uma evolução adiabática, seja ela reversível ou irreversível.

Este axioma, utilizando o teorema de Carathéodory, permite a dedução formal da Termodinâmica.

O nosso postulado da dissipação é o equivalente ao axioma de Carathéodory. O teorema de Carathéodory permite a dedução matemática rigorosa, que apresentamos de modo fisicamente necessário e intuitivo, da necessidade de existência da variável interna entropia.

Finalmente, deve assinalar-se o que é específico deste curso tal como vem sendo apresentado:

78 Born (1964).

79 Kestin (1966).

80 A vizinhança do ponto P pode ser arbitrariamente pequena. Se o pfaffiano for i ii

Q dxδ = Π∑ , o mesmo diz-se integrável se existir um factor integrante λ tal que λ δQ é uma diferencial exacta. Uma curva ergomédica é uma curva tal que constantei i

i

dxΠ =∑ .

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• A definição do calor por exclusão (como Max. Born sugeriu...) a partir da Física Perfeita.

• A exclusiva utilização de coordenadas externas, o que permitiu evitar qualquer conceito prévio de reversibilidade ou equilíbrio interno.

Deve notar-se que qualquer formulação que utilize variáveis intensivas exige a prévia definição de equilíbrio, reversibilidade, etc , o que gera um ciclo vicioso formal se se procura manter a coerência lógica da exposição.

A importância que a equação de estado dos gases perfeitos assume na Termodinâmica Clássica e também na de Born-Carathéodory é uma consequência directa da utilização de variáveis intensivas, ou de uma mistura de variáveis extensivas e intensivas, como ponto de partida.

Nesse tipo de abordagem, a ausência de uma definição rigorosa de transferência de energia sob a forma de calor origina também dificuldades e distorções, que seriam evitáveis.

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6. Potenciais Termodinâmicos

Na análise de um sistema termodinâmico que não seja isolado, é sempre possível integrá-lo num sistema mais amplo, que esse sim seja isolado. A esse sistema mais amplo podemos aplicar o princípio do máximo da entropia.

No presente capítulo, vamos mostrar que esta aplicação permite inferir condições de extremo para o sistema termodinâmica inicial, mas agora sobre outras variáveis termodinâmicas. Uma destas é a energia interna, mas podem também ser os potenciais termodinâmicos, que iremos definir e estudar neste capítulo.

6.1. Teorema do Mínimo de Energia

O valor no equilíbrio de qualquer variável não constrangida é o

que minimiza a energia interna dado que a entropia total se

mantém constante.

Para tornar a demonstração mais legível, vamos considerar um sistema composto fechado, só com dois subsistemas. Assim, o sistema composto é descrito pelas variáveis extensivas U(1), U(2), V(1), V(2). Já sabemos que podemos equivalentemente considerar o sistema descrito pelas variáveis U(1), U, V(1), V. A condição de máximo de entropia significa que

( )( )

( )( )1 1

1 1, , , ,

0 e 0V V U V U U

S S

U V

∂ ∂ = = ∂ ∂

. (0.110)

Passando as condições (0.110) para a linguagem de formas diferenciais, ficam

( )1 0dS dV dV dU∧ ∧ ∧ = (0.111)

( )1 0dS dV dU dU∧ ∧ ∧ = (0.112)

As condições para que a energia interna seja um extremo são:

( )( )

( )

( ) ( )1

1

1 1 1, ,

0V V S

U dU dV dV dS

S dS dV dV dS

∂ ∧ ∧ ∧ = = ∂ ∧ ∧ ∧

(0.113)

( )( )

( )

( ) ( )1

1

1 1 1, ,

0S S V

U dU dS dS dV

V dV dS dS dV

∂ ∧ ∧ ∧ = = ∂ ∧ ∧ ∧

(0.114)

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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A condição (0.111) é equivalente à condição (0.113). Dado que (1) (1) (1)dU TdS PdV= − , a condição (0.112) pode-se reescrever como

( ) ( )1 1 0TdS dV dS dU PdS dV dV dU∧ ∧ ∧ − ∧ ∧ ∧ = .(0.115)

Usando a condição (0.111), fica demonstrado que

( )1 0dS dV dS dU∧ ∧ ∧ = , (0.116)

que é equivalente à condição (0.114). Ficando assim provado que se o ponto em causa for um extremo da entropia, é também um extremo da energia interna.

Dada a completa dualidade existente entre o Mínimo da

Energia e o Máximo da Entropia, a estrutura formal da

Termodinâmica pode construir-se tanto a partir do princípio do

máximo de entropia como do mínimo da energia.

Aliás, tomando como postulado o mínimo de energia na posição de equilíbrio, a existência de um máximo para a entropia constitui um teorema que se demonstra de modo inteiramente análogo ao usado.

Utilizar uma ou outra formulação é equivalente em termos formais, muito embora seja vantajoso escolher a formulação consoante o tipo de problema a analisar.

6.2. Estrutura do Espaço Termodinâmico O espaço termodinâmico fundamental, que temos vindo a considerar, é um espaço afim, isto é, um espaço em que a distância entre dois pontos não tem sentido físico (como tem na Geometria Euclidiana ou na de Riemann). A este espaço, em que as coordenadas são propriedades extensivas, chamamos espaço de Gibbs.

Neste espaço, a utilização de eixos de coordenadas ortogonais não tem nenhum significado particular, e a generalização do seu uso apenas se deve ao hábito e à comodidade que por vezes representa.

No espaço de Gibbs há todavia invariantes fundamentais que o caracterizam, como adiante veremos (elemento de volume).

Todavia, apesar da sua fundamental importância, na estrutura conceptual e na geometrização da Termoestática, a utilização das coordenadas extensivas base é pouco prática nas aplicações e é sobretudo limitativa na construção prática da Equação Fundamental de sistemas particulares pois estes requerem a obtenção de dados experimentais, mesmo quando, como

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

_________________________________________________________________

123

actualmente sucede, muitas das propriedades são obtidas por cálculo a partir de modelos atómicos ou moleculares.

Sob o ponto de vista da TME (Termodinâmica Macroscópica de Equilíbrio) as variáveis internas (U e S) não são directamente mensuráveis e têm que se obter por cálculo a partir dos valores conhecidos de outras grandezas.

Como a Equação Fundamental, tanto na forma entrópica como na energética, se exprime em termos das variáveis extensivas, a questão fundamental que se põe é a de saber se é possível exprimir o conteúdo fundamental e toda a informação sobre o sistema que a Equação Fundamental possui utilizando como variáveis independentes não as variáveis extensivas mas sim as intensivas.

Tendo em conta que as variáveis intensivas que desejamos tomar como variáveis independentes são derivadas parciais de primeira ordem da Equação Fundamental, tal como dadas pelas equações (0.20), (0.21) e (0.22), constata-se imediatamente que a mera eliminação de S, U, V, Ni, ...na

Equação Fundamental a partir de T, P, µi, não seria invertível. De facto, ao querermos passar da Equação Fundamental expressa em T, P, µi, aos valores iniciais teríamos de efectuar integrações as quais iriam introduzir funções e constantes de integração arbitrárias, com o que se teria perdido informação que existia na Equação Fundamental original.

Verifica-se, assim, que a transformação a efectuar só será possível se, de um modo único, pudermos definir a Equação Fundamental pelas suas coordenadas (S, V, N1 , ... Nr) ou como a envolvente dos planos tangentes à superfície U = U (S, V, N1 , ... Nr) no espaço de Gibbs.

Referem-se os planos tangentes à hipersuperfície porque os planos tangentes se definem a partir das derivadas parciais no ponto e as derivadas parciais (variáveis intensivas) são o que desejamos para novas variáveis independentes.

Esta questão foi estudada por Legendre e é análoga à que se põe em mecânica quando se procura no estudo do movimento fazer a sua descrição tomando as velocidades como as novas coordenadas independentes e construir a lagrangeana.

6.3. Transformação de Legendre

Seja dada uma função ( )1, , nX Xϕ ϕ= K , com derivadas parciais

continuamente diferenciáveis, e tal que o determinante da matriz Hesseana,

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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124

2

, 1, ,i j i j nX X

ϕ

=

∂ ∂ ∂ K

(0.117)

é não nulo em todo o domínio.

Chama-se transformada parcial de Legendre da função F relativamente a um subconjunto das suas variáveis, Xk, com , 1, ,k K K n∈ ⊂ K , à função Φ

obtida de φ pela relação:

kk K k

XX

ϕϕ

∂Φ = −

∂∑ . (0.118)

Com a definição

,kk

P k KX

ϕ∂≡ ∈

∂, (0.119)

A equação (0.118) fica

k kk K

P Xϕ∈

Φ = −∑ . (0.120)

Se o número de termos é igual a n, a transformada diz-se total e é identicamente nula, pela equação de Euler, se a função φ for homogénea de grau 181.

Se na transformada parcial Φ eliminarmos os Xi envolvidos na transformada

pelas relações (0.119), obtemos Φ em função dos Xi não transformados e das derivadas (variáveis intensivas) relativamente aos Xi que entraram na transformação.

Diferenciando (0.120) teremos:

( )k k k kk K

d d P dX X dPϕ∈

Φ = − +∑ . (0.121)

Por outro lado, com as definições (0.119), temos

1

n

i ii

d PdXϕ=

= ∑ . (0.122)

Substituindo a equação (0.122) na equação (0.121) e simplificando, obtemos

k k k kk K k K

d P dX X dP∉ ∈

Φ = −∑ ∑ , (0.123)

pelo que

81 Note-se que se a função φ for uma equação fundamental escrita na forma molar, então não é, em

geral, homogénea de grau 1, e portanto a transformação total não será identicamente nula.

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

_________________________________________________________________

125

,kk

X k KP

∂Φ= − ∈

∂ (0.124)

relação que é simétrica de (0.119). Obtida a transformada de φ, isto é Φ, pode também obter-se a transformada parcial de Φ (a que chamaremos Ψ) relativamente aos Pk utilizando o mesmo tipo de transformação:

kk K k

PP∈

∂ΦΨ = Φ −

∂∑ . (0.125)

Esta transformação é possível desde que o determinante da seguinte matriz Hesseana,

2

,i j i j KP P

∂ Φ ∂ ∂

, (0.126)

seja não nulo em todo o domínio.

Dada a equação (0.124), a equação (0.125) escreve-se

k kk K

X P∈

Ψ = Φ + ∑ , (0.127)

ou seja

k kk K

X P∈

Φ = Ψ −∑ , (0.128)

Comparando esta expressão com a de Φ obtida da transformada de φ verifica-se que ϕ ≡ Ψ , pelo que se conclui que a transformada da transformada de φ é a própria função Φ.

Como a passagem de φ à sua transformada é unívoca, e como da transformada de φ se passa a φ pelo mesmo processo, conclui-se que φ e Φ possuem a mesma informação, pois conhecendo uma se obtém univocamente a outra.

A diferença entre φ e Φ é que, em Φ, algumas das variáveis independentes passaram a ser as variáveis intensivas que escolhemos para intervir na transformada.

Como se verá abaixo, o não anulamento do determinante da Hesseana de φ (dada pela expressão (0.117)) é uma condição imposta pela estabilidade intrínseca do sistema termodinâmico, pelo que, se φ for a Equação Fundamental do sistema, aquela condição se verifica sempre.

Geometricamente, o não anulamento do determinante da Hesseana significa que a curvatura da hipersuperfície que representa a equação fundamental no espaço de Gibbs nunca se anula e portanto nunca muda de sinal. Assim, em cada ponto da superfície existe um só plano tangente que é distinto do plano

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Potenciais Termodinâmicos

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126

tangente em qualquer outro ponto. É esta propriedade que permite uma correspondência biunívoca completa entre um ponto na superfície e o seu plano tangente.82

Por este motivo, representar a superfície que representa a Equação Fundamental no espaço de Gibbs dando as suas coordenadas (as variáveis extensivas) ou dando o plano que é tangente no ponto e de que a superfície Φ é a envolvente, torna-se equivalente.

Dando os planos tangentes estamos a considerar como independentes as variáveis intensivas.

É importante ainda referir que a forma geométrica da superfície pode ser acentuadamente diferente se a representarmos num espaço cujos eixos coordenados são X1, ... Xn, ou se são , , ,k kP k K X k K∈ ∉ .

82 Desta propriedade também resulta que a hipersuperfície que representa a equação fundamental não

é planificável.

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Potenciais Termodinâmicos

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6.4. Potenciais Termodinâmicos A cada transformada parcial de Legendre da Equação Fundamental (seja na forma energética seja na forma entrópica), corresponde uma nova equação, com a mesma informação que a Equação Fundamental possuía, mas tendo agora como variáveis independentes algumas das variáveis intensivas.

Como a transformada total de Legendre é identicamente nula (como resulta da equação de Euler), na função transformada pelo menos uma das variáveis é uma variável extensiva.

Às transformadas de Legendre da equação fundamental correspondem aos chamados Potenciais Termodinâmicos. Estes tiveram um papel histórico importante no desenvolvimento da Termodinâmica e as relações entre eles só muito posteriormente à sua introdução foram clarificadas. A transformada de Legendre teve esse papel, ao mostrar que os vários potenciais exprimem essencialmente o mesmo, embora de forma diferente, porque diferentes são as variáveis termodinâmicas tomadas como independentes.

Destes potenciais termodinâmicos, alguns têm nomes "consagrados" devido ao uso generalizado que os seus autores deles fizeram e aos resultados novos que por essa via obtiveram.

Os potenciais termodinâmicos mais conhecidos e importantes são a Energia de Helmholtz, a Entalpia e a Energia de Gibbs, que correspondem às transformadas parciais da equação fundamental na forma energética relativamente à entropia, ao volume, e simultaneamente à entropia e ao volume, respectivamente, e no caso de sistemas simples.

As transformadas parciais de Legendre da equação fundamental na forma entrópica correspondem às chamadas funções de Massieu.

Os potenciais termodinâmicos obtidos por transformadas parciais da equação fundamental na forma energética foram introduzidos por Gibbs em 1875 e são posteriores aos que se deduzem a partir da forma entrópica e se devem a Massieu, que os publicou em 1869.

6.4.1. Energia de Helmholtz, F A energia de Helmholtz corresponde à transformada parcial de Legendre relativa à entropia da equação fundamental na forma energética. A sua finalidade é substituir a entropia pela temperatura, como variável independente. A energia de Helmholtz define-se por:

F U TS= − (0.129)

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Potenciais Termodinâmicos

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128

Aplicando a derivada exterior à equação (0.129) e usando a expressão para a derivada exterior da energia interna, temos

1

r

i ii

dF SdT PdV dNµ=

= − − +∑ , (0.130)

donde

1, , , rV N N

FS

T

∂ = − ∂ K

. (0.131)

Eliminando S entre a equação fundamental na forma energética e (0.129), obtém-se a equação fundamental na representação de Helmholtz:

F = F (T,V, N1, ..., Nr)

A utilização da Energia de Helmholtz é indicada sempre que o sistema descreve um processo termodinâmico caracterizado por uma temperatura constante.

Exemplo Vamos neste exemplo determinar a Energia de Helmholtz molar para um gás perfeito simples. A Energia de Helmholtz molar é igual a

f u Ts= − .

As variáveis naturais da Energia de Helmholtz molar são T e v. Precisamos portanto de exprimir u e s em termos de T e v. Dado que já dispomos de s(u,v), basta obtermos u em função de T e v. Esta relação obtemos a partir de uma das equações de estado, obtida por derivação da equação fundamental:

1

v

s cR

T u u

∂ = = ∂ .

Substituindo na equação da entropia, temos

0

0 0

ln lnT v

s s cR RT v

= + +

.

Substituindo na expressão para a Energia de Helmholtz, temos

0

0 0

ln lnT v

f cRT T s cR RT v

= − + +

. (0.132)

É mais natural ter nesta expressão a energia de Helmholtz no estado de referência, f0, em vez da entropia no estado de referência, s0. Para eliminar esta última, aplicamos a equação (0.132) ao estado de referência:

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Potenciais Termodinâmicos

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129

0 00 0 0 0

0 0

ln lnT v

f cRT T s cR RT v

= − + +

. (0.133)

Simplificamos e resolvemos em ordem a s0 e substituímos em (0.132), obtendo

0

0 0

ln lnT v

f f cRT RTT v

= + − . (0.134)

6.4.2. Entalpia, H A entalpia corresponde à transformada parcial de Legendre relativamente ao volume (para tornar a pressão variável independente) da equação fundamental na forma energética:

H = U + P V.

A forma-1 correspondente é

dH TdS VdP dNk k

k

= + +∑ µ

Desta expressão conclui-se que

, ,...,k rS N N

HV

P

∂ = ∂

Eliminando U da expressão de definição da entalpia, obtém-se:

H H S P N N r= ( , , ,..., )1

A entalpia é o potencial termodinâmico cuja utilização tem vantagens nos processos caracterizados por a pressão se manter constante.

6.4.3. Energia de Gibbs, G A Energia de Gibbs corresponde à transformada parcial de Legendre relativamente à entropia e ao volume, de modo a substituir S e V por T e P, como variáveis independentes.

A transformada de Legendre que define a Energia de Gibbs é dada por:

G = U - TS + PV

e

dG SdT VdP dNj jj

r

= − + +=∑ µ

1

Eliminando U da Equação Fundamental obtém-se:

G = G (T, P, N1, ... Nr)

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Potenciais Termodinâmicos

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130

A Energia de Gibbs é muito utilizada no estudo das reacções químicas e em todas as situações em que o sistema termodinâmico evolui a pressão e temperatura constantes. Nestas circunstâncias, a descrição dos processos fica simplificada utilizando G, pois P e T são duas das suas variáveis independentes.

Exemplo 1 Vamos determinar a Energia de Gibbs molar para o gás perfeito simples.

A Energia de Gibbs molar é

g u Ts Pv f Pv= − + = + .

As variáveis naturais da Energia de Gibbs são T e P. Precisamos portanto de exprimir f e v em função de T e P. Dado que já temos f em função de T e v, precisamos só de exprimir v em função de T e P. Para isso, precisamos da segunda equação de estado:

u

P s R

T v v

∂ = = ∂ .

Substituindo na equação da Energia de Gibbs:

( ) ( )00 0

0 0 0 0

ln ln 1 1 ln lnT RT P RT T P

f T cR s cR R P T c R s c R RT P RT P T P

= − − − + = + − + − +

6.4.4. Funções de Massieu Generalizadas Efectuando as transformações parciais de Legendre a partir da Equação Fundamental na forma entrópica S = S(U, V, N1, ..., Nr), obtêm-se as

funções de Massieu generalizadas, cuja descoberta o seu autor divulgou em 1869. As funções de Massieu têm grande importância em Mecânica Estatística.

As três funções de Massieu mais representativas são:

1 1

S S UT T

= − , (0.135)

P P

S S VT T

= − , (0.136)

1 1

,P P

S S U VT T T T

= − − , (0.137)

em que se utilizou o símbolo [...] para indicar as variáveis intensivas que passaram a ser variáveis independentes.

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Potenciais Termodinâmicos

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A unidade formal de todas estas funções e potenciais era desconhecida quando foram inventadas. A unidade formal aqui apresentada resulta da Equação Fundamental introduzida por Gibbs em 1875 e da transformação de Legendre que já era conhecida na Mecânica Racional.

Deve acentuar-se que, embora as transformadas contenham exactamente a mesma informação que a Equação Fundamental, elas permitem clarificar aspectos fundamentais da estrutura da Termodinâmica ou são particularmente bem adaptadas a certas situações. O melhor exemplo de uma situação análoga é o da Mecânica Racional com os formalismos Lagrangeano e Hamiltoniano que, possuindo exactamente o mesmo conteúdo formal que a Mecânica de Newton, permitiram, todavia, generalizações e desenvolvimentos praticamente impossíveis de obter directamente da formulação newtoniana original.

Apresentada a unidade dos potenciais e o modo de os construir, a dedução de outros potenciais, porventura mais adequados para a situação particular a estudar, transformou-se numa tarefa simples.

6.4.5. Exercícios 1) (Exame de Termodinâmica de 14.09.2005). Considere o ciclo de um

sistema fechado representado pelo diagrama abaixo, percorrido na sequência A-B-C-D, e em que o passo B-C é isentrópico. Represente qualitativamente o ciclo no diagrama T-s.

2) (Exame de Termodinâmica de 13/02/2004). Para que sistemas é que a equação PdvsdTdf −−= é aplicável?

3) (Exame de Termodinâmica de 13/02/2004). Das quatro figuras abaixo, escolha, justificando, a que ilustra correctamente a dependência da energia molar de Gibbs em relação à pressão, com temperatura constante, para um sistema com um único componente.

h

P

C

A B

D

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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4) (Exame de 21/01/2005). Das quatro figuras abaixo, escolha, justificando, a(s) que pode(m) ilustrar correctamente a dependência da entalpia em relação à pressão, com entropia constante, para um sistema com um único componente.

5) (Exame de Termodinâmica de 20.09.2003). Exprima ( )P

h T∂ ∂ em

função de cP, cv, κT e β.

6) (Exame de Termodinâmica de 14.09.2005). Um gás tem as seguintes equações de estado:

UP

V= e

1 32

3U

T BNV

=

,

onde B é uma constante positiva. O sistema obedece ao Postulado de Nernst. O gás, à temperatura inicial Ti e à pressão inicial Pi é submetido a um processo de laminagem, em que a entalpia final é igual à entalpia inicial. A pressão final é Pf. Calcule a temperatura final Tf.

7) (Exame de Termodinâmica de 13.02.2004). Mostre que 2T

h

T

g

T P

−=

∂∂

8) (Exame de Termodinâmica de 20.01.2002). Mostre que a Energia de Gibbs de um sistema composto é igual à soma das energias de Gibbs dos subsistemas que o compõem, desde que todos tenham a mesma temperatura e pressão. [exercício resolvido]

9) (Exame de Termodinâmica de 14.02.2003). Definamos o potencial φ da seguinte forma:

h h h h

g g g g

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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133

vT

Ps −=ϕ .

O potencial φ tem na representação entrópica o mesmo papel que a entalpia na representação energética.

a) Quais são as variáveis naturais do potencial φ?

b) Para uma substância arbitrária, obtenha dφ em função dos diferenciais das suas variáveis naturais.

c) Exprima ( ) TPu∂∂ϕ em função de v, P, T, cv, κT e α (a expressão a

obter não tem necessariamente que envolver todas estas variáveis).

d) Obtenha o potencial φ, em termos das suas variáveis naturais, para um gás perfeito simples.

[exercício resolvido]

10) (Exame de Termodinâmica de 14.02.2003). Considere uma substância que obedece às equações kPf = , onde f é potencial de Helmholtz molar

e k é uma constante, e acv = , onde a é uma constante.

a) Obtenha a equação fundamental na representação de Helmholtz, isto é, ( )NVTff ,,= .

b) Determine a compatibilidade da equação obtida com os axiomas da homogeneidade e de Nernst e com os critérios de estabilidade. [exercício resolvido]

11) (Exame de Termodinâmica de 20/09/2002). Seja um sistema caracterizado por

T

2=α ,

PT

1=κ , ( )02 VVKTfcv = ,

onde K e V0 são constantes e ( )0VVf é uma função a determinar.

a) Obtenha a equação fundamental para este sistema.

b) Determine as condições de compatibilidade desta equação com a homogeneidade, a positividade da temperatura, os critérios de estabilidade e o Postulado de Nernst.

c) Obtenha a equação fundamental na representação de Helmholtz.

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Potenciais Termodinâmicos

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134

6.5. Teoremas de Mínimo para os Potenciais Termodinâmicos

Com a demonstração do teorema do mínimo de energia mostrámos a dualidade das formulações da Termodinâmica a partir da expressão da Equação Fundamental na forma entrópica ou na energética, e como existe para cada uma das formulações um princípio de extremo.

Contendo as transformadas parciais de Legendre da Equação Fundamental a mesma informação que esta possui, trata-se agora de verificar se a essas transformadas parciais, ou potenciais termodinâmicos, correspondem também princípios de extremo a partir dos quais possamos igualmente deduzir as novas posições de equilíbrio do sistema quando algum dos constrangimentos é removido.

6.5.1. Teorema do Mínimo da Energia de Helmholtz Considere-se, como caso particular, que um sistema composto está em contacto com um reservatório térmico, que mantém uma temperatura constante Tr e atingiu o equilíbrio compatível com os constrangimentos impostos. Iremos denotar as variáveis referentes à fonte com o índice r em expoente e as variáveis referentes ao sistema composto com os índices (i), como temos feito. Também como habitual, S será a entropia do sistema composto e U será a energia do sistema composto. Designaremos por sistema conjunto o conjunto do sistema composto mais o reservatório térmico.

Por definição, uma fonte de calor é um sistema com duas características: (1) só permuta calor; (2) essa permuta de calor não provoca uma alteração de temperatura, isto é, a temperatura da fonte é constante e igual a Tr. Assim, a

equação fundamental de uma fonte de calor é ( )r r rU U S= , pela primeira

condição, com 0r rdT dS = , (isto é, com capacidade calorífica infinita) pela

segunda condição. Pela equação de Euler, concluímos que r r rU T S= . Assim, dado que r r r rF U T S= − , temos que

0rF = . (0.138)

Se o sistema conjunto (sistema composto + reservatório) atingiu o equilíbrio, a temperatura de cada subsistema do sistema composto é necessariamente igual à temperatura imposta da fonte de calor, Tr.

Além disso, e pelo teorema do mínimo de energia, o sistema conjunto possui a energia mínima para o seu valor de entropia, o que implica as condições

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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135

( ) 0rd S S+ = (0.139)

( ) 0rd U U+ = (0.140)

A existência de uma temperatura comum a todos os subsistemas do sistema conjunto permite definir uma Energia de Helmholtz para o sistema conjunto (o que não seria possível se não existisse essa temperatura comum), igual à soma das energias de Helmholtz dos subsistemas que o constituem:

r r r r rF F U T S U T S+ = − + − (0.141)

Considerando que Tr é constante, aplicando a derivada exterior a ambos os membros da equação (0.141) temos

( )r r r r rd F F dU T dS dU T dS+ = − + − . (0.142)

Utilizando as equações (0.146) e (0.139), concluímos que

rdF dU dU= + . (0.143)

Concluímos então que

0dF = (0.144)

Vamos agora mostrar que este extremo é um mínimo.

O equilíbrio termodinâmico corresponde à minimização da energia interna para o valor de entropia em equilibrio:

)(),(),(min )()()2()2()2()1()1()1(

,,,, )()2()2()1()1(

rr

SVSVSSUVSUVSUU

r++=

sujeito a

)2()1( VVV +=

)()2()1( rSSSS ++= .

O Lagrangiano é então (ver anexo):

( ) ( ))()2()1(2

)2()1(1

)()()2()2()2()1()1()1(21

)()2()2()1()1( )(),(),(),,,,,,(r

rrr

SSSSVVV

SUVSUVSUSVSVSL

−−−+−−+

+++=

λλ

λλ

As condições de primeira ordem são agora que todas as derivadas parciais têm que ser nulas no óptimo. Obtemos como condições de equilibrio que

)2()1( PP = e )()2()1( rTTT == .

Para provarmos que o extremo da energia interna era um mínimo constrangido recorremos ao anexo 10.3, que nos diz que a condição suficiente para que um óptimo constrangindo seja um mínimo é que os menores principais da matriz Hessiana do Lagrangeano avaliada no ponto extremo sejam todos negativos. Provamos que o extremo da Energia de

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

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136

Helmholtz é também um extremo constrangido provando que as matrizes hessianas do lagrangeano da minimização da energia interna e do lagrangeano da minimização da energia de Helmholtz são iguais.

Se a temperatura é constante então a energia de Helmholtz para cada sistema pode ser escrita como V)F(S, porque TS- V)U(S, V)F(S, = . A formulação lagrangeana do problema de optimização da energia de Helmholtz a temperatura constante fica então dado por:

)(),(),(min )()()2()2()2()1()1()1(

,,,, )()2()2()1()1(

rr

SVSVSSFVSFVSFF

r++=

sujeito a

)()2()1( rSSSS ++=

)2()1( VVV += .

Temos que

.)(),(),(

)(),(),()()2()()1()2()2()2()1()1()1()1(

)()()2()2()2()1()1()1(

rr

rr

TSSUTSVSUTSVSU

SFVSFVSFF

−+−+−=

=++=

Os termos iTS podem agrupar-se porque a temperatura é homogénea ( ) TS)()2()1( =++ rSSST e portanto:

( )TSU

SSSTSUVSUVSUF rr

−=

++−++= )()2()1()2()()2()2()2()1()1()1( )(),(),(.

Como o termo TS é constante as segundas derivadas da energia de Helmholtz são iguais às segundas derivadas da energia interna ou seja a matriz hessiana dos dois lagrangeanos são iguais e portanto se a função original (a energia interna) é minimizado então a energia de Helmholtz também.

Temos assim o Teorema do Mínimo da Energia de Helmholtz:

O valor no equilíbrio de qualquer variável não constrangida de um sistema composto em contacto diatérmico com uma fonte de calor à temperatura Tr constante é o que minimiza a Energia de Helmholtz do sistema composto, com T = Tr.

6.5.2. Teorema do Mínimo de Entalpia Considere-se, que um sistema composto está em contacto com uma fonte de trabalho a pressão constante Pr e atingiu o equilíbrio compatível com os constrangimentos impostos. Designaremos por sistema conjunto o conjunto do sistema composto mais a fonte de trabalho.

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

_________________________________________________________________

137

Por definição, um reservatório de pressão é um sistema com três características: (1) só permuta trabalho; (2) essa permuta de trabalho não provoca uma alteração de pressão, isto é, a pressão do reservatório é constante e igual a Pr. Assim, a equação fundamental de um reservatório de

pressão é ( )r r rU U V= , Note-se como as duas condições impostas sobre o

reservatório implicam que todos os processos no reservatório são reversíveis: dado que a pressão é constante, é sempre verdade que

r rW P dVδ = − ; dado que só existe troca de trabalho, então dU Wδ= , logo

a energia interna só depende do volume, ( )r r rU U V= e a entropia do

reservatório é constante, isto é

0rdS = (0.145).

Por outro lado, a pressão ser constante significa que 0r rdP dV = , isto é, que o reservatório tem compressibilidade infinita.

Pela equação de Euler, concluímos que r r rU P V= . Assim, dado que r r r rH U P V= − , temos que

0rH = . (0.146)

Se o sistema conjunto (sistema composto + reservatório) atingiu o equilíbrio, a pressão de cada subsistema do sistema composto é necessariamente igual à pressão imposta pelo reservatório de pressão, Pr. Além disso, e pelo teorema do mínimo de energia, o sistema conjunto possui a energia mínima para o seu valor de volume83, isto é:

( ) 0rd V V+ = (0.147)

( ) 0rd U U+ = (0.148)

( )2 0rd U U+ > (0.149)

Por outro lado, a existência de uma temperatura comum a todos os subsistemas do sistema conjunto permite definir uma Entalpia para o sistema conjunto (o que não seria possível se não existisse essa temperatura comum). Temos assim

r r r r rH H U P V U P V+ = + + + (0.150)

Considerando que Pr é constante, aplicando a derivada exterior à ambos os membros da equação (0.141) temos

83 Além da sua entropia e do número de moles de cada componente químico, mas esses

constrangimentos não serão relevantes aqui.

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

_________________________________________________________________

138

( )r r r r rd H H dU P dV dU P dV+ = + + + . (0.151)

Utilizando as equações (0.146) e (0.147), concluímos que

rdH dU dU= + . (0.152)

Utilizando agora as equações (0.148) e (0.149), concluímos que

0dH = (0.153)

e

2 0d H > . (0.154)

Fica assim demonstrado o Teorema do Mínimo da Entalpia:

O valor no equilíbrio de qualquer variável não constrangida de um sistema composto em contacto com um reservatorio de pressão com a pressão constante Pr é o que minimiza a Entalpia do sistema composto, com P = Pr.

6.5.3. Teorema do Mínimo da Energia de Gibbs

O valor no equilíbrio, de qualquer variável não constrangida de

um sistema composto em contacto com uma fonte de calor a

temperatura constante, e uma fonte a pressão constante, é o que

minimiza a Energia de Gibbs para os valores de temperatura e

de pressão iguais aos das correspondentes fontes.

A demonstração é análoga às anteriores, tendo em conta que o sistema se encontra agora em interacção simultânea com uma fonte de calor e uma fonte a pressão constante.

Os teoremas anteriores generalizam-se "mutatis mutandis" para todas as transformadas parciais de Legendre (potenciais termodinâmicos).

Deve ainda sublinhar-se o facto de os princípios de extremo para os potenciais termodinâmicos corresponderem a casos particulares do teorema do mínimo de energia, e de a sua utilidade estar estritamente ligada às situações em que os contrangimentos externos impõem um valor constante a uma ou mais variáveis intensivas.

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Termodinâmica Macroscópica

Potenciais Termodinâmicos

_________________________________________________________________

139

6.5.4. Síntese dos Princípios de Extremo

POTENCIAL EXTREMO VARIÁVEIS DO SISTEMA

COMPOSTO CONSTANTES

ENTROPIA MÁXIMO U, V, N1, ...

ENERGIA INTERNA MÍNIMO S, V, N1, ...

ENERGIA DE HELMHOLTZ MÍNIMO T, V, N1, ...

ENTALPIA MÍNIMO S, -P, N1, ...

ENERGIA DE GIBBS MÍNIMO T, -P, N1, ...

6.5.5. Exercícios 1) (Exame de Termodinâmica de 13.02.2004). Comente a seguinte frase:

“Se um sistema não tem mais nenhum constrangimento além de estar em equilíbrio com reservatórios de pressão e temperatura, então o sistema está em equilíbrio se qualquer processo aumentar a sua Energia de Gibbs”.

12) (Exame de Termodinâmica de 20.09.2003). Considere um sistema constituído por um cilindro com volume V, dividido em dois partes desiguais por uma parede fixa, em contacto com um reservatório térmico à temperatura Tr. No interior da metade (1) está 1 mol de um gás monoatómico perfeito e no interior da metade (2) estão 2 mol do mesmo gás.

a) Escreva a expressão para a a energia de Helmholtz do conjunto do gás nas duas partes do cilindro, em função do volume V(1).

b) Usando a expressão da alínea anterior, determine qual o volume que se atingiria em equilíbrio, se a parede passasse a ser móvel.

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7. Mudança de Fase

7.1. Dimensionalidade do Espaço de Representação

Quando o sistema perde a estabilidade intrínseca, qualquer parte do sistema que se afaste infinitesimalmente do equilíbrio com o restante verá esse afastamento aumentar até que o conjunto encontre uma nova situação em que a entropia é máxima (se o sistema total for fechado e adiabático) ou em que a energia interna é mínima (se a entropia se mantiver constante). Nesta nova situação, o sistema deixou necessariamente de ser homogéneo, embora se possa ter desdobrado em regiões homogéneas.

Cada uma das regiões homogéneas em que o sistema se

desdobra constitui uma fase.

A questão da perda de estabilidade pode ainda encarar-se do seguinte modo: se a Equação Fundamental do sistema perde num certo domínio a propriedade de ser côncava (na representação entrópica) ou a de ser convexa (na representação da energia) ela não pode, nesse domínio das variáveis, representar o sistema. Assim, a Equação Fundamental indica, ela própria, que deixou de poder ser a equação fundamental do sistema.

Quando a expressão analítica da Equação Fundamental deixou de ser válida em certo domínio do espaço termodinâmico, tal não significa que o sistema tenha deixado de possuir uma Equação Fundamental. O que significa, isso sim, é que a representação funcional que estávamos a utilizar precisa de ser substituída.

Esta situação corresponde, habitualmente, a uma falta de dimensionalidade no espaço termodinâmico que adoptamos para representar o sistema.

O caso mais simples em que tal facto pode ser posto em evidência corresponde ao caso de sistemas de um só componente e homogéneos, situação em que existe uma só fase.

Consideremos, por exemplo, o caso da água. A água pode apresentar-se sob a forma de sólido (gelo), de líquido e de vapor. Em qualquer destes estados, a sua composição química é a mesma, mas isso não impede que o gelo e o vapor de água correspondam a situações muito distintas, nomeadamente quanto a volumes molares, calores específicos etc.

Tendo este facto em conta, é óbvio que uma Equação Fundamental da forma

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

142

S = S (U, V, N) ou U = U (S, V, N)

é incapaz de representar o sistema "água" em todo o espaço termodinâmico.

Para que o fosse, teríamos de introduzir as variáveis adicionais

N1 - número de moles de água no estado gasoso

N2 - número de moles no estado líquido

N3 - número de moles sob a forma de gelo I

N4 - número de moles sob a forma de gelo II

Nk - ...

em que N3, N4, ... correspondem a formas diferentes de gelo que se distinguem pela sua estrutura cristalina, compressibilidade, etc.

Por outro lado, como a Equação Fundamental tem de ser obtida de valores experimentais (ou, quando se deduz de um modelo microscópico, tem de ser experimentalmente validada) é a própria extrapolação analítica desses valores experimentais que revela a existência da perda de estabilidade intrínseca, indicando que é necessário explorar em mais pormenor e com experimentação física adequada o que se passa nesse domínio das variáveis termodinâmicas. Por este facto, a prática habitual não é a de procurar as formas gerais que representem a substancia em todas as situações, mas sim a de procurar a que melhor se ajusta em cada um dos domínios em que existe cada uma das fases.

Posto de outro modo, em vez de procurarmos a expressão

U = U (S, V, N1, N2, ... , Nr)

que seja válida em todo o espaço termodinâmico, o que procuramos, se se tratar de um só componente químico que pode apresentar-se em fases diferentes, é a equação fundamental que seja válida para cada uma das fases em presença. Isto é procuramos:

( ) ( )

( ) ( ))()()()()(

)(

)(

)()()()()()()()(

)1()1()1()1()1(

)1(

)1(

)1()1()1()1()1()1()1()1(

,,,,

,,,,

kkkkk

k

k

kkkkkkkk vsuN

N

V

N

SuNNVSUU

vsuNN

V

N

SuNNVSUU

=

==

=

==

M

para cada fase, e passamos a tratar o sistema conjunto como formado por tantos subsistemas quantas as fases em presença. Esquematicamente corresponde a ter a situação da Figura 12, em que constantei

i

N N= =∑ ,

pois o sistema total é fechado.

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

143

Figura 12 – Equilíbrio de fases.

Supomos, além disso, que as paredes que separam as fases umas das outras não são restritivas a nenhuma propriedade, o que significa, nomeadamente, que as fases podem trocar massa entre si (chamam-se por isso fases abertas, porque o subsistema com que se identificam é aberto).

Como as paredes que separam as fases permitem a passagem de entropia (calor) e de volume, em equilíbrio a pressão e a temperatura são iguais em todas as fases, porque assim o exige o máximo da entropia no sistema total.

No esquema anterior, ao sistema formado pelo conjunto das fases juntou-se uma fonte de trabalho reversível a pressão constante (fonte de volume) e uma fonte de calor a temperatura constante T. Para a exposição que se segue estas fontes não são essenciais mas simplificam as deduções84.

Uma vez que o sistema é mantido a T e a P constantes, o equilíbrio é dado pelo valor das variáveis que minimizam a Energia de Gibbs do sistema composto85, dada por

84 O equilíbrio entre os subsistemas (fases), uma vez que as paredes que os separam não impõem

restrições, obrigará sempre à igualdade da pressão e da temperatura entre eles. Um modo simples de exprimir este facto é supôr o seu contacto com fontes a T e P constantes. Por outro lado, se o sistema total não é isolado, o mais simples é supor que o mesmo se encontra em contacto com a atmosfera a qual se comporta, nas aproximações práticas, como fonte a T e P constantes.

85 Note-se que a energia de Gibbs do sistema composto só está definida precisamente porque o sistema tem uma temperatura e uma pressão bem definidas, impostas pelas fontes. Por outro lado, dado que estamos na representação de Gibbs, as variáveis naturais para considerar para cada sistema simples pertencente ao sistema composto são a temperatura, a pressão e o número de moles.

Fase 1

N1

Fase 2

N2

Fase 3

N3

Fonte de calor a T

Fonte de Pressão

PFase i

Ni

N(1) N(i)

N(3)

N(2)

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

144

( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( )(1) ( )

1 1

, , , , , , ,k k

i i i ik

i i

G T P N N G T P N N T Pµ= =

= =∑ ∑K (0.155)

onde o índice i corresponde à fase i. Note-se que nesta expressão levamos em conta que o potencial químico pode ser escrito só em função das variáveis intensivas.86 Consideramos também que o potencial químico pode ser diferente em cada fase, exactamente porque cada fase será descrita por uma equação fundamental diferente.

Quando se atinge o equilíbrio, a Energia de Gibbs dada pela equação (0.155)é mínima, isto é, o estado de equilíbrio do sistema é dado pela solução do seguinte problema de optimização constrangida:

( ) ( ) ( )

( )

1

1

min ,

sujeito a

i

ki i

Ni

ki

i

N T P

N N

µ=

=

=

(0.156)

onde N, constante, é o número total de moles no sistema. Podemos usar a restrição para obter um problema de optimização livre:

( ) ( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )1

1

min , , ,i

ki i k k

Ni

N T P T P N T Pµ µ µ−

=

− +∑ (0.157)

Derivando em ordem às k-1 variáveis livres e igualando a zero, concluímos que

( ) ( ) ( ) ( )1 , ,kT P T Pµ µ µ= = ≡L . (0.158)

Para cada par T e P, existem agora duas possibilidades: (1) os potenciais químicos são diferentes, e o sistema de equações (0.158) é impossível; (2) os potenciais químicos são iguais, e o problema de optimização tem uma solução indeterminada.

O caso (1) significa que o problema de optimização (0.157) não tem o que se designa como solução interior, isto é, uma solução no interior do domínio de optimização, dada pelo valor nulo da derivada. Quando um problema de optimização não tem solução interior, tem que ter uma solução de canto, isto é, o ponto óptimo está no extremo do domínio da variável de optimização.

86 Matematicamente, isto deve-se à equação de Gibb-Duhem. Fisicamente, deve-se ao facto de uma

variável intensiva não poder depender do tamanho do sistema e portanto não pode depender só de uma variável extensiva.

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

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145

Para simplificar a análise, consideremos a situação em que só existem duas fases. Depois de eliminada a restrição, temos só uma variável de optimização, N(1) (ou N(2)), cujo domínio é [ ]0, N . As soluções de canto são

então

( )1 0N = ou ( )1N N= .

Fisicamente, a primeira solução corresponde a só existir a fase (2) e a segunda solução corresponde a só existir a fase (1). Para determinarmos qual das soluções se verifica, temos que determinar directamente qual é que dá um valor de energia de Gibbs mais baixo. Será a que tiver o potencial químico mais baixo.

No caso (2), vamos ter a coexistência das duas fases. No entanto, como referido acima, o estado do sistema não está bem definido, pois o sistema de equações é indeterminado.

De facto, o estado de cada fase é determinado pela temperatura, a pressão e o número de moles. É este último que está indeterminado, sabendo nós só que (1) (2)N N N+ = , com N, o número total de moles, constante. Temos assim um grau de liberdade no sistema, correspondente à proporção em que a substância se divide entre as duas fases.

Se chamarmos x à fracção do número de moles da fase 1 que num dado instante existe no sistema heterogéneo, a fracção da fase 2 será dada por 1 x− .87

Como o volume é aditivo, temos:

( ) ( )1 2V V V= + , (0.159)

onde ( )1V e ( )2V são os volumes ocupados, respectivamente, pela fase 1 e pela fase 2. Para um estado qualquer na região de duas fases, o volume molar é dado pela equação Error! Reference source not found.. Temos então

( ) ( )

(1) (1) (1)

2 2 (2)

V N v

V N v

=

=. (0.160)

Substituindo (0.160) em (0.159), fica

( ) ( ) ( ) ( )1 1 2 2V N v N v= + . (0.161)

87 A variável x é um número adimensional cujo valor seria o mesmo se em vez do número de moles

tivéssemos tomado a massa de cada componente. Quando se toma a fracção em massa é habitual chamar título a x, correspondendo x à fracção de gás (ou vapor) na mistura de fases.

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

146

Dividindo ambos os membros de (0.161) por N, fica

( ) ( ) ( )1 21v xv x v= + − . (0.162)

Notando agora que

P

gs

T

∂ = − ∂ , (0.163)

verificamos que, pelo Postulado de Nernst, esta derivada é negativa. Podemos assim representar a energia de Gibbs molar (igual ao potencial químico, num sistema só com um componente) para cada fase, em função da temperatura, com pressão constante, obtendo, por exemplo, a Figura 13. Como vimos acima, para cada valor de T e P, a energia de Gibbs terá que ser mínima, tendo como consequência que o sistema escolhe a fase que tenha menor energia de Gibbs molar. Assim, o estado fisicamente observado corresponde à linha A-B-C-D, em que os pontos B e C correspondem, respectivamente, a coexistência de fase sólido-líquido e líquido-gás.

Figura 13 – Variação da Energia de Gibbs molar (igual ao potencial químico) com a temperatura, para pressão e número de moles constantes (sistema com um componente químico), para diferentes fases.

T

Sólido

T

Sólido

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

147

Figura 14 – Exemplo de diagrama de fases.

P

Ponto triplo

Pt

Tt

P

Ponto triplo

Pt

Tt

P

Ponto triplo

Pt

Tt

Todavia, o sistema pode evoluir do domínio correspondente a uma fase para o domínio correspondente a outra sem que se verifique qualquer descontinuidade, quando a mudança de fase se dá acima do ponto crítico (ponto D na Figura 14, que apresenta uma substância diferente da que está apresentada na Figura 13).

Este facto mostra que há estados em que uma fase e outra são indistinguíveis pelo que a designação de se tratar de uma ou de outra é puramente arbitrária.

O ponto crítico corresponde a uma situação especial, que para ser formalmente tratada exige o recurso a um formalismo mais elaborado e a resultados da Termodinâmica Estatística. Acrescente-se apenas que a teoria da vizinhança dos pontos críticos só muito recentemente (década de 70) foi elaborada e que nela a estrutura que até agora apresentámos para a Termoestática teve um papel relevante.

Para além da peculiaridade termodinâmica do ponto crítico, o outro ponto notável é o da coexistência de fases, o ponto (Pt, Tt) que, no caso de sistemas de um só componente químico, é um ponto triplo.

Como imediatamente se conclui da análise da Figura 13, em B e em C existem pontos angulosos, significando que o valor de ( ) NPTG ,∂∂ é diferente

à esquerda e à direita do ponto. Usando a equação (0.163), conclui-se que a entropia molar do sistema tem uma descontinuidade, com

B BT T

s s− +< (0.164)

Esta variação de entropia corresponde a uma troca de calor dada por Q=N T ∆s. Obtemos assim o calor latente de mudança de fase, l:

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

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148

( )(2) (1)l T s s= − , (0.165)

sendo T a temperatura, a que corresponde a pressão P, a que se dá a mudança de fase.

• Se s(1) corresponde ao estado sólido e s(2) ao estado líquido, l é o calor (molar) latente de fusão.

• Se s(1) corresponde ao estado líquido e s(2) ao estado gasoso, l será o calor latente (molar) de vaporização.

• Se s(1) corresponde ao estado sólido e s(2) ao gasoso, l é o calor latente de sublimação.

Para ilustração considere-se gelo à pressão de 1 atmosfera e T < 273,15 K. Fornecendo calor, a temperatura do gelo sobe na relação de aproximadamente 1 K por cada 2,1 kJ kg-1 que forem fornecidos. Quando se atinge a temperatura de fusão, o fornecimento de calor não faz subir a temperatura mas sim aumentar a quantidade de gelo fundido, na relação aproximada de 335 kJ kg-1 de gelo fundido.

O fornecimento desta quantidade de calor altera, obviamente, a entropia total do sistema. Como da própria descrição se infere, a variação de entropia é contínua com o número de moles da nova fase (água líquida) e a redução do número de moles na fase existente (gelo). A descontinuidade de que falamos refere-se à passagem total do sistema de uma fase para outra, mantendo constante (e no seu valor mínimo) a Energia de Gibbs.

Uma representação equivalente à da Figura 13, mas agora com T e P variável, permite-nos constatar que na mudança de fase existe também uma descontinuidade no volume, análoga à descontinuidade na entropia.

Para a energia interna teremos, utilizando o índice 1 para uma das fases e 2 para a outra e utilizando a equação de Euler na forma molar:

(1) (1) (1) (1)u Ts Pv µ= − + , (0.166)

(2) (2) (2) (2)u Ts Pv µ= − + . (0.167)

Como µ1 = µ2 devido ao equilíbrio entre as fases:

( ) ( )(2) (1) (2) (1) (2) (1)u u T s s P v v− = − − − . (0.168)

Para a entalpia obtém-se analogamente:

(1) (1) (1)h Ts µ= + , (0.169)

(2) (2) (2)h Ts µ= + . (0.170)

donde

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

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149

( )(2) (1) (2) (1)h h T s s l− = − = , (0.171)

mostrando que o calor latente é igual à descontinuidade da entalpia.

Exercícios 1) Mostre que, num sistema com um componente, G Nµ= ou g µ= .

2) (Exame de Termodinâmica 04.02.2005).

a) Qual o calor libertado por uma mole de vapor de água quando a sua temperatura baixa de 180 ºC para 100 ºC? (considere que o arrefecimento ocorre à pressão atmosférica).

b) Qual é o calor libertado por essa mesma quantidade de água se se condensar totalmente, mantendo-se à temperatura de 100 ºC e à pressão atmosférica?

c) Qual é a quantidade de energia que se liberta se a temperatura da água baixar de 100 ºC para 30 ºC?

d) Com base nos cálculos que efectuou (considerando 30 ºC como a temperatura aproximada da pele) explique porque é que uma queimadura com vapor de água a 100 ºC é mais grave que uma queimadura com água líquida a ferver a 100 ºC.

Notas: O calor latente de vaporização da água é 3 -12,25 10 Jgl = × . Considere o vapor de água como um gás perfeito, com cv = 3 R.

3) (Exame de 14 de Setembro de 2005). Considere os seguintes gráficos de variação da energia de Gibbs molar com a pressão, a temperatura constante, para duas temperaturas diferentes (com T1 < T2), em que as três linhas em cada gráfico representam as fases sólida (s), líquida (l) e gasosa (g). Assuma que g l sv v v> > e que g l ss s s> > .

g

P

T1g

P

T2

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

_________________________________________________________________

150

a) Para cada um dos gráficos, identifique as curvas referentes a cada

fase.

b) Represente qualitativamente a coexistência de fases, num diagrama

P-T.

4) Comente a seguinte frase: “Se a energia de Gibbs de duas fases é igual a pressão e temperatura constante, então as duas fases estão em equilíbrio uma com a outra.”

5) Suponha que é apresentado o seguinte diagrama de fase no plano P – T, para uma certa substância, com a curva de coexistência líquido-vapor.

T

P

Considere que o vapor tem um volume maior que o líquido, e que os critérios de estabilidade intrínseca se aplicam em todos os pontos do plano, incluindo as linhas de coexistência de fase. Esboce curvas que representem a variação da energia de Gibbs molar com a temperatura, para os valores de pressão P1 e P2 assinalados no gráfico. Justifique cuidadosamente o esboço feito.

7.2. Equação de Clapeyron Consideremos de novo o diagrama da Figura 14. Vamos agora obter uma equação que caracterize as linhas de coexistência de fases. Estas linhas são caracterizadas por µ1 = µ2. Assim, são casos particulares do conjunto de linhas com µ1 - µ2 constante. Para determinarmos a sua forma no plano (T, P), podemos estudar a seguinte expressão:

( )( )

1 2

1 2 1 2

1 2 1 2

dP d dP d dP dP

T dT d dT d dT dµ µ

µ µ µ µµ µ µ µ−

∧ − ∧ − ∧∂ = = ∂ ∧ − ∧ − ∧ (0.172)

O nosso objectivo é caracterizarmos as linhas no plano (T, P), portanto interessa-nos obter esta expressão em termos de pressão e temperatura. Utilizamos a equação de Gibbs-Duhem que explicita a dependência entre a variação de pressão, a variação de temperatura e a variação de volume, para

vapor

líquido P1

P2

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Termodinâmica Macroscópica

Mudança de Fase

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151

eliminar os diferenciais dos potenciais químicos. Para cada fase a equação de Gibbs-Duhem Equation é:

1 1 1

2 2 2

d s dT v dP

d s dT v dP

µ

µ

= − +

= − +

Simplificando, obtemos

( )

1 2

2 1

2 1 2 1

s sP l

T v v T v vµ µ−

−∂ = = ∂ − − , (0.173)

onde na última expressão se aplicou a expressão(0.165). A equação (0.173) que descreve a relação entre a temperatura e a pressão em mudança de fase é a equação de Clapeyron.88

A equação de Clapeyron é um caso particular da situação em que a Equação Fundamental, os potenciais ou, genericamente, qualquer função de estado têm um conjunto numerável de pontos de descontinuidade de primeira espécie (Domingos, 1962).

Exercícios 1) (Exame de Termodinâmica de 13.02.2004). Suponha que é apresentado

o seguinte diagrama de fase no plano P – T, para uma certa substância, com a curva de coexistência líquido-vapor.

T

P

Considere que o vapor tem um volume maior que o líquido, e que os critérios de estabilidade intrínseca se aplicam em todos os pontos do plano, incluindo as linhas de coexistência de fase. Pode existir alguma substância representada por este diagrama?

2) (Exame de Termodinâmica de 26.01.2004). Suponha que é apresentado o seguinte diagrama de fase no plano P – T, para uma certa substância, com a curva de coexistência líquido-vapor.

88 Esta dedução da equação de Clapeyron foi originalmente obtida por Sousa et al. (2004).

vapor

líquido

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Mudança de Fase

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3) (Exame de Termodinâmica de 13/02/1998). “Curiosamente, existem muitas equações empíricas para a pressão de vapor que têm a forma

”. Comente.

4) (Exame de Termodinâmica de 17/09/2004). O calor latente de vaporização da água é dado aproximadamente, no domínio de 20ºC a 200ºC, por

3328,4 2,9vapl T= − ,

com lvap em kJ/kg e T em kelvin.

A variação de volume de vaporização no domínio de 0,01ºC e 100ºC é dada aproximadamente pela relação

0,46151vap

Tv

P∆ =

para ∆v em m3/kg, P em kPa e T em kelvin.

a) Converta estas duas expressões para que forneçam, respectivamente, lvap em kJ/mol e ∆v em m3/mol.

b) Usando estas aproximações, e o facto de que o ponto com pressão igual a 101,3 kPa (pressão atmosférica) e temperatura igual a 100ºC é um ponto de coexistência entre água líquida e vapor, mostre que a relação de equilíbrio entre água líquida e vapor é aproximada pela relação (com P em kPa)

7212101,3exp 56,54 6,284 lnP T

T = − −

5) Considere o seguinte diagrama de fases:

T

P

Assuma que o vapor tem um volume maior que o líquido, e que os critérios de estabilidade intrínseca se aplicam em todos os pontos do plano, incluindo as linhas de coexistência de fase.

a) Qual é a zona de líquido e qual é a zona de vapor? Justifique.

b) Para esta substância, a condensação é sempre um processo exotérmico?

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Mudança de Fase

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6) Suponha uma substância em que a curva de coexistência entre vapor (que pode ser considerado como gás perfeito) e líquido é

( )0ln P P A B T= −

a) Diga, justificando, qual das fases tem a entropia mais alta.

b) Esboce o diagrama P-T (por simplicidade, pode representar

( )0ln P P ), identificando, com justificação, qual a zona do vapor e

qual a zona do líquido.

c) Determine o calor latente de vaporização.

d) Determine a entropia do líquido na transição de fase, em função de de T.

7) (Exame de Termodinâmica de 21.01.2005). Considere uma substância com o seguinte diagrama de fases:

P

T

líquido vapor

Qual é a relação entre os volumes do líquido e do vapor na transição de fase?

8) Suponha que se varia a temperatura de uma substância, mantendo a temperatura constante. É possível que a entalpia varie da forma representada no seguinte gráfico?

h

T

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Mudança de Fase

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7.3. Mudança de Fase com a Equação de van der Waals

Por ser um caso típico, vamos considerar, no âmbito da teoria anterior, o fenómeno da mudança de fase num gás utilizando a equação de van der Waals, equação (0.97). A base desta equação é essencialmente empírica, mas verifica-se que correlaciona relativamente bem o comportamento de um gás, quer antes quer depois da mudança de fase.

Uma isotérmica típica, na zona onde se processa a mudança de fase, tem um andamento análogo ao apresentado na Figura 15.

Figura 15 – Comportamento típico de uma isotérmica do fluido de van der Waals

O troço AB da curva não pode ter realidade física uma vez que aí não é satisfeito o critério de estabilidade intrínseca

0T

P

v

∂ < ∂ (0.174)

A curva representada carece, pois, de sentido nessa zona. Todavia, como a equação de van der Waals constitui uma boa aproximação dos resultados experimentais quando o sistema é homogéneo, e se encontra na fase gasosa, vamos admitir que a equação pode ser extrapolada para fora daquela região, o que permite salientar algumas características importantes da mudança de fase.

Se o sistema for evoluindo no sentido indicado na figura, atingir-se-á um estado A para o qual o sistema perde necessariamente a homogeneidade pois se torna intrinsecamente instável. A partir deste ponto aparece uma nova fase, e o sistema é forçosamente heterogéneo.

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Mudança de Fase

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Todavia, embora em A o sistema tenha perdido a estabilidade intrínseca, sucede que ele muda de fase antes de atingir esse ponto porque a energia de Gibbs correspondente à nova fase se tornou inferior à energia de Gibbs da fase em que se encontrava.

Admitamos que a mudança de fase se inicia no estado XI, para o qual a

pressão é PMF e a temperatura é a da isotérmica que estamos a considerar.

O sistema será inicialmente homogéneo (fase 1), à pressão PMF e

temperatura T1, e encontra-se em equilíbrio. Mantendo o sistema nestas

condições formar-se-á no seu interior um núcleo da fase 2 se o núcleo assim formado não contribuir para aumentar a Energia de Gibbs do sistema total. Segue-se que, enquanto as duas fases coexistem terá de ser

I IIX Xg g= (0.175)

verificando-se ainda para cada fase que

dg = - s dT + v dP.

Considerando a evolução isotérmica (dT = 0) a partir do estado 0, a Energia de Gibbs molar (g) será para um estado qualquer sobre a isotérmica dada por

0

0 'P

Pg g vdP− = ∫ . (0.176)

O integral pode ser obtido a partir da equação de van der Waals mas é mais fácil fazer a integração a partir da curva da isotérmica em (v, P), referida a eixos invertidos relativamente aos considerados anteriormente (ver Figura 16). Obter-se-á, então, para g = g(P) uma curva do tipo representada na Figura 17.

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Mudança de Fase

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Figura 16 – Isotérmica da equação da van der Waals, no plano (v, P).

Considere-se, por exemplo, o estado 3. É evidente que, a essa pressão, não se poderá formar um núcleo de fase 2, que estaria no estado 6, pelo facto de esse processo conduzir a um aumento de g do sistema total. Quando o sistema atinge o estado XI processa-se a mudança de fase e o sistema não

evoluirá pelo ramo XI → A, uma vez que os estados ao longo de XI → 10

têm menor Energia de Gibbs g que os estados anteriores. A mudança de fase processou-se à pressão constante PMF e a evolução do sistema foi (0,

1,2, 3, XI , XII ,4, 8, 9, 10). Para um sistema de coordenadas (P, V) a

evolução é representada na Figura 18.

Figura 17 – Energia de Gibbs molar em função da pressão, para temperatura constante, para um fluido de van der Waals.

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Mudança de Fase

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Figura 18 – Evolução na mudança de fase, para um fluido de van der Waals

No diagrama da Figura 18, representa-se a traço interrompido a evolução XI → XII, para indicar que nessa região o sistema é heterogéneo, e não pode

ser tratado como um sistema simples.

Atendendo às equações (0.176) e (0.175), obtém-se para as áreas tracejadas da Figura 18

5

5

0II

I

XA B

X A B

vdP vdP vdP vdP+ + + =∫ ∫ ∫ ∫ (0.177)

ou

5 5

II

I

XA A B

X B

vdP vdP vdP vdP− = − −∫ ∫ ∫ ∫ , (0.178)

o que significa que as áreas (XII, B, 5) e (5, A, XI) são iguais no espaço

(P, v).

Como já assinalámos, o ramo AB da curva representada no diagrama (g,P), não tem realidade física. Todavia, o ramo XIA pode ter, visto aí não haver

conflito com as condições de estabilidade intrínseca.

Na realidade o sistema poderá seguir o ramo XIA (o mesmo poderá

acontecer com o ramo XIIB, no caso da evolução se realizar no sentido

inverso ao considerado).

Diz-se então que os estados de equilíbrio do sistema são metaestáveis; no sentido em que, embora se encontrem transitoriamente em equilíbrio, esse equilíbrio não é estável muito embora possa, em termos práticos, permanecer muito tempo neles, devido à transição para o equilíbrio estável ser muito lenta.

A explicação do fenómeno é a seguinte: um núcleo da fase 2 necessita de um certo intervalo de tempo para se formar e há casos em que esse intervalo

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Mudança de Fase

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de tempo é tão longo que praticamente nunca se forma quando o sistema está à temperatura T1 e à pressão PMF.

Quando o sistema evolui isotermicamente até atingir o estado XI com um

volume VI, verifica-se nesse estado o aparecimento dum núcleo de fase 2

que corresponde ao estado XII com o volume VII (Figura 19). A pressão

mantém-se constante durante a formação de novos núcleos de fase 2 e do respectivo crescimento, só voltando a alterar-se quando todo o sistema tiver passado à fase 2.

Figura 19 – Isotérmica com mudança de fase, no plano P – v.

Verifica-se, portanto, que à temperatura T1 e à pressão PMF o volume

molar sofre uma descontinuidade. Esta descontinuidade nas variáveis extensivas molares, é uma das características mais importantes do processo de mudança de fase.

Com a representação da Figura 19, a equação (0.162) pode-se escrever na seguinte forma, conhecida como regra da alavanca:

( )

( )

1

2

1y x v v

x x v v

− −= =

−, (0.179)

ou seja:

"A fracção da fase 2 no estado y está para a fracção da fase 1 no mesmo estado, assim como o comprimento y-XI está para o comprimento y-

XII".

7.3.1. Representação da Zona a Duas Fases Se no diagrama (P, v) representarmos as várias isotérmicas obteremos o diagrama na Figura 20.

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Figura 20 – Representação da zona a duas fases no diagrama (P, v).

Para melhor compreensão pode pensar-se que a fase 2 é a fase líquida e I a fase gasosa.

À linha (L1, L2, L3, PC), lugar geométrico dos estados onde se inicia a

mudança de fase 2 → 1 para evoluções isotérmicas no sentido das pressões decrescentes, chama-se curva de fase 2 saturada ou curva de saturação.

À linha (G1, G2, G3, PC) chama-se curva de fase 1 saturada e corresponde

ao lugar geométrico dos estados onde se inicia a mudança de fase para evoluções isotérmicas no sentido das pressões crescentes.

O estado representado pelo ponto PC chama-se ponto crítico e à isotérmica

Tc que por ele passa chama-se isotérmica do ponto crítico ou isotérmica

crítica.

A temperatura Tc é caracterizada pelo facto de para T>Tc não ocorrer, no sistema, mudança de fase, enquanto que para T<Tc essa mudança de fase se verifica.

À pressão Pc do ponto crítico chama-se pressão crítica.

A zona compreendida entre as duas curvas de saturação (L1, L2, L3, PC) e

(G1, G2, G3, PC) representa o lugar geométrico dos estados onde o sistema

se encontra heterogéneo.

7.4. O Caso da Água A água, como sistema termodinâmico, apresenta um interesse particular, não só pela sua importância social e económica como também pelo facto de ser, sob múltiplos aspectos, um fluido anómalo, cujo comportamento em termos de estrutura molecular apresenta ainda muitos aspectos obscuros. Entre as anomalias mais significativas encontra-se a redução do volume específico

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Mudança de Fase

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com o aumento de temperatura, entre 0 ºC e 4 ºC, anomalia que é vital, por exemplo, para a existência de vida aquática nas regiões frias do globo. As Figura 21, Figura 22 e Figura 23 representam as diferentes fases da água.

Figura 21 - Fases da água num diagrama P-T.

Tcr = 374,14 ºC

Pcr = 22,09 MPa

Pressão (102 MPa)

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Figura 22 - Superfície P – V – T para a água (a contracção na passagem de sólido para líquido não é normal em fluidos simples).

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Figura 23 - Diagrama P, θθθθ (temperatura) para a água líquida e o vapor de água.

7.5. Diagramas Termodinâmicos Como as figuras anteriores ilustram, a escolha das variáveis independentes é importante para a compreensão do comportamento do sistema, sobretudo quando existe mudança de fase.

Por outro lado, a escolha do diagrama adequado, permite pôr em evidência as grandezas termodinâmicas mais relevantes no processo em causa.

Tipicamente, uma representação nas coordenadas (T, s) põe em relevo as quantidades de calor trocadas pelo sistema, pois um elemento de área dA = Tds = δQ, como se mostra na Figura 24.

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Figura 24 - Diagrama (T,s). A área tracejada representa a quantidade de calor recebida pelo sistema na evolução isobárica de a a d. No diagrama estão também representadas as linhas de título x constante.

Escolhidas as variáveis independentes, constam também do diagrama as linhas correspondentes aos valores constantes das outras variáveis necessárias ao cálculo, como as isobáricas, as isócoras, as linhas de título constante nas zonas de duas fases, etc. (ver Figura 25 e Figura 26).

A equação daquelas linhas, que são as linhas notáveis em qualquer diagrama, obtém-se facilmente utilizando o método dos produtos exteriores

s / J K-1 kg-1

T / ºC1

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de diferenciais, desde que os coeficientes de compressibilidade e os calores específicos sejam conhecidos.

A título de exemplo, suponhamos que as variáveis independentes escolhidas foram (T,s), e se pretende estabelecer a equação das isobáricas.

Ora, nas variáveis (T, s), a equação diferencial de uma isobárica é dada por:

P P

T dT dP TdT ds ds ds

s ds dP C

∂ ∧ = = = ∂ ∧ . (0.180)

Integrando (0.180), temos

0

0

TP

T

Cs s dT

T− = ∫ , (0.181)

que, no caso geral, se pode integrar numericamente89.

89A expressão é válida nas zonas de uma só fase. Na zona a duas fases, dP = 0 e dT = 0.

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Figura 25 - Diagrama T-s. Linha de volume constante (isócora).

s / kJ K-1 kg-1

T / K1

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Figura 26 - Diagrama T-s para a água. Isobáricas (a cheio), isócoras (a tracejado), isentálpicas (traço-ponto).

kgf

cm-2

kgf

cm-2

kgf

cm-2

kgf

cm-2

7.5.1. Diagrama de Mollier No diagrama de Mollier as coordenadas independentes são a entropia e a entalpia (Figura 27). A grande vantagem do diagrama de Mollier decorre da equação geral dos sistemas abertos (deduzida no capítulo 7.6), pois o trabalho realizado pelo sistema é dado pela diferença de entalpias que podem ser lidas directamente do diagrama. Na Figura 27, apresenta-se, esquematicamente, o diagrama de Mollier para uma substância simples.

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Figura 27 - Diagrama de Mollier (h, s) para uma substância simples. Apresentam-se também as linhas de volume constante (note-se que, neste diagrama, o ponto triplo corresponde a uma área).

7.6. Sistemas com Múltiplos Componentes: Regra das Fases de Gibbs

No caso de sistemas com vários componentes químicos a teoria é inteiramente análoga à anterior mas mais complexa, porque a dimensão mínima de espaço de representação aumenta. Tal como nos sistemas de um só componente, quando num sistema multicomponente se perde a estabilidade intrínseca aparece(m) nova(s) fase(s) e a condição para a coexistência das fases em equilíbrio é inteiramente idêntica à anterior, isto é, G tem de ser mínimo.

Sendo P e T comuns a todas as fases, as condições de equilíbrio termodinâmico são então:

(1) (2) ( )1 1 1

(1) (2) ( )2 2 2

(1) (2) ( )

M

M

Mr r r

µ µ µµ µ µ

µ µ µ

= = =

= = =

= = =

K

K

M M M M O M M

K

(0.182)

Assim, o número total de equações será

r (M - 1).

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Mudança de Fase

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168

Existindo M fases, existirão M (r - 1) fracções molares independentes. Existem ainda as variáveis independentes, T e P. Resumindo, temos:

M (r - 1) + 2 variáveis independentes

r (M - 1) condições de igualdade dos potenciais químicos

O número de graus de liberdade, f, ou seja, de variáveis intensivas (P e T) e específicas, que podem ser arbitrariamente fixadas será portanto:

f = M (r- 1) + 2 - r (M - 1)

ou

f = r - M + 2

Regra das fases de Gibbs90

Para que o equilíbrio possa existir é, obviamente, f≥0.

Para o caso simples de 1 só componente, r =1.

Se houver 2 fases, resulta que é f =1, o que significa que apenas P ou T podem variar independentemente, continuando a manter-se o equilíbrio entre as fases.

Se existirem 3 fases, f = 0, o que significa que em sistemas de um só componente, a coexistência de 3 fases só é possível para um valor bem determinado de P e de T.

No caso da água, o ponto triplo existe para T=273,16 K e P=611 Pa. Dado o facto de só poder haver a coexistência de 3 fases para um valor fixo de P e de T:

Se o sistema possuir 2 componentes, o número máximo possível de fases coexistentes será dado por

0 = 2 - M + 2 ⇔ M = 4,

e as mesmas só podem coexistir para um par bem determinado de P e T.

Exercícios 1) (Exame de Termodinâmica de 13.02.1998). Num dado sistema, o soluto

A e o soluto B estão dissolvidos no solvente C. Qual é a dimensionalidade da região em que coexistem duas fases? Qual o número máximo de fases que podem coexistir neste sistema?

2) (Moran e Shapiro, 2000, 14.83). Determine o número de graus de liberdade para sistemas compostos por:

90 Tratando-se de uma dedução a partir de outros resultados, a designação mais correcta seria

teorema de Gibbs. Mantém-se, todavia, a designação habitual.

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Mudança de Fase

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a) gelo e água líquida;

b) gelo, água líquida e vapor de água;

c) água líquida e vapor de água;

d) só vapor de água;

e) vapor de água e ar seco (ar atmosférico, sem vapor de água);

f) gelo, vapor de água e ar seco;

g) N2 e O2 a 20 ºC, 1 atm;

h) uma fase líquida e uma fase de vapor, cada uma das quais contém amónia e água;

i) mercúrio líquido, água líquida, e uma fase de vapor de mercúrio e água;

j) acetona líquida e uma fase de vapor com com acetona e N2.

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8. Sistemas Abertos Sem Difusão

8.1. Introdução Até agora, apenas considerámos sistemas fechados, isto é, sistemas que não permutam massa com o exterior. Essa restrição não retira generalidade aos resultados já obtidos, pois o estudo de um sistema aberto pode sempre reduzir-se ao de um sistema fechado, bastando para tal que o sistema se considere como um subsistema num sistema mais geral que o envolve a si próprio e a todos os outros com os quais há permutas de massa.

Recapitulando os passos fundamentais que foram dados, verificamos que começamos por considerar um sistema isolado (e por isso também fechado) para que, sem qualquer ambiguidade, pudéssemos aplicar o princípio da conservação da energia. Seguidamente, considerámos a interacção entre sistemas que, no seu conjunto, formavam um sistema isolado, por exemplo A + B:

T TA B

A B

Tendo sempre subjacente o sistema total, fechado e isolado, pudemos enunciar a Segunda Lei da Termodinâmica para qualquer subsistema, ao qual já não se exigiu que fosse isolado mas apenas que fosse adiabático.

A Segunda Lei permitiu estabelecer, seguidamente, as condições de equilíbrio entre os subsistemas que formam o sistema total e o sentido da evolução para o equilíbrio quando esses subsistemas interaccionam entre si.

Todavia, em todos os casos anteriores, continuou a exigir-se a todos os subsistemas que interacionavam que não houvesse permuta de massa entre si.

Neste capítulo iremos fazer a primeira generalização dos resultados anteriores aos sistemas que permutam massa com o seu exterior.

Chamamos-lhe primeira generalização porque não envolve ainda todas as situações e, em particular, a de existir difusão no seio da massa que o sistema permuta com o exterior. Esta restrição é pouco importante nas aplicações correntes de engenharia mecânica e por isso a maioria dos textos a omite. As situações em que a difusão é importante serão tratadas no âmbito da Termodinâmica dos Processos Irreversíveis.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Abertos Sem Difusão

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Mantendo-nos por agora no âmbito dos princípios gerais e da estrutura conceptual da Termodinâmica Macroscópica, a primeira finalidade deste capítulo é mostrar como, sem qualquer dificuldade conceptual ou formal, se deduz a chamada equação geral de balanço para sistemas abertos.

Em geral, um sistema fechado tem não só energia interna, mas também energia cinética e energia potencial. Assim, sendo E a energia do sistema, temos:

c pE U E E= + + , (0.183)

onde Ec é a energia cinética e Ep é a energia potencial. Por outro lado, o princípio da conservação da energia garante que

E Q W∆ = + . (0.184)

Juntando as equações (0.183) e (0.184) e passando para a forma diferencial, temos assim

c pdE dE dE dU Q Wδ δ= + + = + . (0.185)

Dividindo por dt, temos

pcdEdE dU Q W

dt dt dt dt dt

δ δ+ + = + . (0.186)

Com as definições

. Q

Qdt

δ≡ (0.187)

e

. W

Wdt

δ≡ , (0.188)

a equação (0.186) fica

. .

pcdEdE dU

Q Wdt dt dt

+ + = + . (0.189)

8.2. Balanços de Massa e de Energia para Sistemas Abertos

Consideremos um sistema genérico, fechado, e sintetizemos toda a energia trocada com o exterior por δQ e δW (Figura 28). O balanço de energia do sistema é dado pela equação (0.185). Consideremos agora que o sistema tem uma pequena parte da sua fronteira que se pode deslocar, a qual

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Sistemas Abertos Sem Difusão

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173

representamos por um êmbolo adiabático, e portanto impermeável (a - b), de espessura infinitesimal e secção dA, em equilíbrio com o fluido à sua esquerda, sendo esse fluido igual ao do interior91.

Figura 28 – Sistema com um êmbolo adiabático e móvel, (a – b).

Suponhamos agora que o êmbolo (a - b) se desloca de dl no sentido do interior do sistema (Figura 29). O sistema terá uma variação de volume dV dl dA= .

Figura 29 – Deslocamento para a direita, numa distância dl, do êmbolo no sistema da Figura 28, passando para a posição a’ – b’.

A energia recebida pelo sistema devido a este processo é igual a ep dV ,

sendo pe a pressão exterior que o fluido exerce sobre o êmbolo. Se v for o volume específico do fluido, é também

dV v dm= , (0.190)

sendo dm a massa contida em dV. A variação de energia do sistema B foi, com o deslocamento do êmbolo para a´ - b´,

91 Note-se que a parede global do sistema só é adiabática nas zonas da superfície onde vier a haver

permuta de massa. Apenas nessas zonas se terá de verificar também a igualdade das forças generalizadas entre o sistema e o exterior.

a

b

Sistema B

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Sistemas Abertos Sem Difusão

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174

B edE p v dm= . (0.191)

O volume deixado livre pelo movimento do êmbolo passou a ser ocupado pelo fluido que estava à sua esquerda. Chamemos A a esse sistema, compreendido entre (a´ - b´) e (a - b), (Figura 30).

Figura 30 – Definição do sistema A, no contexto da Figura 29.

Considerando agora o sistema conjunto (A + B), verificamos que tem a sua fronteira na posição em que B se encontrava antes de se iniciar o processo. Por outro lado, como existe equilíbrio das forças generalizadas através da fronteira que separa A de B, concluímos que nada se altera se a mesma for removida, pelo que podemos tratar o conjunto (A + B) como um único sistema mas agora com massa

B Am m m= + (0.192)

e energia

A BE E E= + . (0.193)

Para calcular E notamos que o subsistema B é um sistema fechado, pelo que a variação da sua energia é dada por (0.191)92. Para obter EA deve ter-se em conta que:

• a massa de A é dm;

• a energia interna específica de A é u93;

92 Note-se que apenas é invocado o primeiro princípio e que se considera a pressão exterior, medida

no exterior (pe) para que a relação seja válida independentemente da existência de equilíbrio no interior de B.

93 Pois os fluidos em em A e em B são idênticos.

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175

• a energia cinética de A associada à sua velocidade w é dada por ( ) 21 2 w dm , onde w é igual á norma de w;

• a energia potencial de A, com a distância vertical a uma cota de referência dada por z, é dada por g z dm .

Assim, a energia total do sistema elementar A é dada por

21

2AE u gz w dm = + +

. (0.194)

Tendo em consideração o conjunto de operações efectuadas sobre o sistema verificamos que, se o mesmo for aberto, a equação de variação da sua energia total é dada por:

21

2 edE u g z w p v dm = + + +

. (0.195)

Dado que a entalpia específica94 do fluido é dada por h u pv= + , a equação

(0.195) também se pode escrever:

21

2dE h g z w dm = + +

. (0.196)

As relações estabelecidas até aqui são válidas para um elemento de superfície. Consideremos agora que o sistema pode trocar massa em qualquer ponto da sua superfície. Adicionalmente, pode também trocar calor ou trabalho em qualquer ponto da sua superfície.

Se designarmos por

• ρ a massa específica do fluido,

• n a normal a dΩ dirigida para o interior do sistema,

• w a velocidade com que o fluido está a entrar no sistema,

( )dmd

dtρ

Ω

= ⋅ Ω∫∫ w n , (0.197)

expressão designada como balanço de massa dos sistemas abertos.

Designando como

• q a quantidade de calor que atravessa a unidade de área por unidade de tempo (grandeza vectorial),

94 Entalpia por unidade de massa.

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176

• ττττ o trabalho que as forças generalizadas (com excepção da pressão) realizam na sua própria direcção, sobre a superfície do sistema por unidade de área e por unidade de tempo (grandeza vectorial),

o balanço de energia de sistemas abertos fica

21

2

dEd d h g z w d

dtρ

Ω Ω Ω

= ⋅ Ω + ⋅ Ω + + + ⋅ Ω ∫∫ ∫∫ ∫∫q n τ n w n , (0.198)

Na forma apresentada a equação é absolutamente geral desde que não haja difusão de massa através da superfície.

Definimos agora o saldo de todas as trocas de calor com o sistema por unidade de tempo como

.

Q dΩ

≡ ⋅ Ω∫∫q n . (0.199)

Definimos o saldo de todas as trocas de energia com o sistema no intervalo de tempo, excluindo a energia sob a forma de calor ou fluxos de massa:

.

W dΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ τ n . (0.200)

Com as definições (0.199) e (0.200), a equação geral de balanço de energia para um sistema aberto, (0.198), escreve-se

( ). .

21

2

dEQ W h g z w d

dtρ

Ω

= + + + + ⋅ Ω ∫∫ w n . (0.201)

8.3. Regime Estacionário Se o regime for estacionário, a energia total do sistema não varia no tempo, isto é,

0dE

dt= . (0.202)

A massa total contida no sistema também se mantém constante, pelo que:

0dm

ddt

ρΩ

= ⋅ Ω =∫∫ w n , (0.203)

significando que o fluxo de massa que entra iguala o fluxo da massa que sai, e se mantêm constantes no tempo as propriedades associadas as esses

fluxos. A essa quantidade comum chamamos caudal mássico .

m :

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177

. 1

2m dρ

Ω

= ⋅ Ω∫∫ w n ,95 (0.204)

Suponhamos que, além do regime ser estacionário, existe apenas uma zona (simplesmente conexa) da superfície por onde entra todo o fluido (secção de entrada), denotada Ωi, e uma zona por onde todo o fluido sai (secção de saída), denotada Ωe. Temos então que o caudal que entra pela secção Ωi é igual (em módulo) ao caudal que sai pela secção Ωe:

.

i e

m d dρ ρΩ Ω

= ⋅ Ω = ⋅ Ω∫∫ ∫∫w n w n . (0.205)

Definimos

1

e

eh h dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

, 1

i

ih h dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

, (0.206)

2 21

e

ew w dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

, 2 21

i

iw w dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

, (0.207)

1

e

ez z dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

, 1

i

iz z dm

ρΩ

≡ ⋅ Ω∫∫ w n&

. (0.208)

Podemos então escrever a equação (0.201) como

. . .

2 21 10

2 2e e e i i iQ W h g z w h g z w m + + + + − + + =

. (0.209)

Como se verifica, a dedução da equação geral para os sistemas abertos apenas invocou, no essencial, o princípio da conservação da energia e nada mais requer, desde que se tenha desprezado a difusão de massa.

Devido a esta generalidade, a equação é geralmente deduzida sem qualquer referência ao postulado da dissipação ou à Segunda Lei da Termodinâmica, admitindo como implícitas as restrições, geralmente pouco importantes, acima referidas.

A dedução envolveu apenas valores globais tal como podem ser observados e medidos por um observador colocado no exterior do sistema. Como tal, ignora-se o que se passa no seu interior, limitando-se o observador a contabilizar o que entra e o que sai, isto é, a fazer um balanço das

95 Tendo considerado os fluxos em módulo, e sendo iguais as quantidades entradas e as quantidades

saídas, cada uma delas será metade do total.

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quantidades de energia que atravessam a fronteira do sistema na unidade de tempo. Trata-se portanto de uma equação geral de balanço.

Como imediatamente se infere, a clara identificação da fronteira é crucial porque é nela que todas as quantidades são medidas. Para acentuar estas características, chamamos ao volume contido no interior da fronteira volume de controlo.

A equação geral limitou-se, assim, a exprimir que no interior do volume de controlo a energia e a massa se conservam (isto é, não se criam nem se destroem).

Deve notar-se o modo natural como a entalpia aparece como variável do sistema e não a energia interna. Isso deve-se ao facto de U e P V andarem sempre associados na forma H U PV= + devido à realização de trabalho associado à entrada e à saída de fluido no sistema. A entalpia é, por isso, a variável natural característica dos sistemas abertos.

8.4. Aplicações A utilidade da equação geral, uma vez deduzida, não é a de verificar e continuar a verificar o princípio da conservação da energia, mas sim a de nos permitir, pelo cálculo, inferir o valor de algumas das variáveis sabidas as restantes. Para isso é necessário em geral fazer hipóteses adicionais quanto à evolução do que se passa no interior do sistema.

Para ilustrar este ponto, consideramos o mais simples possível dos sistemas abertos: um tubo de secção constante, horizontal no qual se escoa um fluido em regime estacionário e que não troca calor nem trabalho com o exterior, salvo, naturalmente, o associado à entrada e saída de fluido do volume de controlo (Figura 31).

Figura 31 – Tubo de secção constante, horizontal, com um escoamento em regime estacionário.

1 2

De acordo com estas hipóteses,

.

0Q = , .

0W = , 1 2z z= ,

pelo que a equação geral para o regime estacionário (0.209) se reduz a

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Sistemas Abertos Sem Difusão

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179

2 22 2 1 1

1 10

2 2h w h w

+ − + =

. (0.210)

Se as secções 1 e 2 forem muito próximas, também podemos escrever

210

2dh d w + =

. (0.211)

"Entrando" agora no interior do sistema96, podemos exprimir a entalpia nas outras variáveis termodinâmicas estudadas para os sistemas fechados e teremos dh Tds vdP= + , a qual é ainda uma relação geral e apenas pressupõe que no sistema elementar de volume dV delimitado pelas secções 1 e 2 são válidas as relações da Termoestática, o que é correcto na maioria dos casos. Substituindo na equação (0.211), teremos

( )21

2Tds vdP d w+ = − . (0.212)

Verifica-se que o número de incógnitas aumentou. Para prosseguirmos torna-se necessário introduzir uma hipótese suplementar. Suponhamos que essa hipótese era a de uma evolução reversível, isto é 0ds = . Substituindo em (0.212), teríamos

( )21

2vdP d w= − . (0.213)

Se se tratar de um fluído incompressível o volume específico será constante. Assim, devido à conservação da massa, como a secção do tubo é constante, resulta que

w1 = w2

e portanto

dw2=0.

Substituindo em (0.213), concluímos que

0dP = , (0.214)

o que significa que a pressão no interior do fluido não varia entre a entrada e a saída. Ora, e como a experiência demonstra, o resultado é falso (e seria de esperar, pois o movimento de um fluido corresponde a um fluxo de energia, e a um fluxo de energia está sempre associada uma dissipação).

96 O que significa ser necessária a exigência suplementar de as variáveis intensivas serem uniformes

no seu interior, ou ainda de que o sistema é suposto estar a cada instante em equilíbrio interno.

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Abertos Sem Difusão

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180

Não sendo admissível a hipótese 0ds = por implicar, neste caso, uma evolução reversível, vejamos a hipótese de não haver variação de entalpia,

0dh = . Teremos então

0Tds vdP+ = (0.215)

Como v e T são positivos e 0ds > pela Segunda Lei da Termodinâmica, concluímos que terá de ser 0dP < ,ou seja:

P1 > P2

que é o comportamento que experimentalmente se verifica. Esta perda de pressão por irreversibilidade é tida em conta, habitualmente (sobretudo em hidráulica e para fluidos incompressíveis em geral), sob a forma de um termo correctivo determinado experimentalmente.

Dividindo ambos membros da equação (0.215) por dL, o comprimento do tubo, considerando que o volume específico, v, é igual ao inverso da massa específica, ρ, e rearranjando, temos

1 dP ds

TdL dLρ

= − . (0.216)

Assim é possível escrever

( ), , ,dP

f wdL

ρ µ ε= , (0.217)

em que f é empírico, µ a viscosidade do fluido e ε é a rugosidade do tubo. As formas que f assume serão dadas em Mecânica dos Fluidos e Transmissão de Calor. A sua determinação teórica está fora do âmbito da Termoestática, mas cai no da Termodinâmica dos Processos Irreversíveis.

Como facilmente se infere, esta irreversibilidade provoca um aumento da entropia que arrasta o da temperatura, se não houver mudança de fase.

8.5. Balanço de Entropia para Sistemas Abertos

O balanço de entropia para sistemas fechados encontra-se contido na Equação Fundamental na forma entrópica.

No caso de sistemas que deixaram de estar em equilíbrio interno por ter sido removido um constrangimento que impedia a interacção entre subsistemas, a nova situação de equilíbrio é dada pelo máximo de entropia do conjunto, que forma um sistema isolado ou é a ele redutível.

Enquanto propriedade (extensiva) do sistema, uma característica fundamental da entropia é não ser uma propriedade conservada, (salvo

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Abertos Sem Difusão

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nos casos limite de evoluções totalmente reversíveis) contrariamente ao que sucede com a energia e a massa.

A característica fundamental da irreversibilidade é o aumento de entropia, e o aumento de entropia é o facto mais comum e saliente nas evoluções reais.

Todavia, a entropia, para além de ser criada num processo irreversível também pode ser permutada, e isso sucede sempre que existe um fluxo de calor. Efectivamente, e como já por várias vezes foi sublinhado, é sempre:

δQ = T dS

desde que T e S se refiram ao sistema que recebe δQ e que T esteja definida para este sistema. Por este facto, podemos sempre escrever para o sistema fechado contido pela superfície fechada ΩΩΩΩ o balanço de entropia como

int

1

V

dSd s dV

dt Tρ

Ω

= ⋅ Ω +∫∫ ∫∫∫q n , (0.218)

em que .

ints é o aumento de entropia por unidade de tempo e de massa no interior do sistema devido a irreversibilidades internas de 1ª e 2ª espécie. Tratando-se de um sistema aberto, a equação de balanço da entropia generaliza-se imediatamente, bastando para tal ter em conta que, associado à unidade de massa que entra (ou sai do volume de controlo) vem associada não só uma energia, como todas as propriedades associadas à unidade de massa, nomeadamente a entropia.

Aliás, na equação de balanço energético para um sistema aberto, a entrada de entropia já foi implicitamente considerada na energia interna. A equação geral do balanço de entropia para um sistema aberto é portanto:

.

int1

V

dSd s d s dV

dt Tρ ρ

Ω Ω

= ⋅ Ω + ⋅ Ω+∫∫ ∫∫ ∫∫∫q n w n , (0.219)

O primeiro integral de superfície representa o fluxo de entropia ligado ao fluxo de calor. O segundo integral de superfície representa o fluxo de entropia associado ao fluxo de massa. Ambos podem ser positivos ou negativos. O integral de volume representa a produção de entropia por unidade de tempo devido às irreversibilidades no interior do sistema. Pela Segunda Lei da Termodinâmica, este termo é intrinsecamente positivo.

Tal como anteriormente, se a superfície Ω que define o volume de controlo puder ser dividida em j troços nos quais as temperaturas, as velocidades e as massas específicas são uniformes, os integrais anteriores podem substituir-se por um número finito de parcelas, obtendo-se

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Termodinâmica Macroscópica

Sistemas Abertos Sem Difusão

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182

1

kj

j j vj j

QdSm s

dt Tσ

=

= + +

, (0.220)

em que

jQ dΩ

= ⋅ Ω∫∫q n& , (0.221)

jm dρΩ

= ⋅ Ω∫∫ w n& , (0.222)

.

intv

V

s dVσ ρ= ∫∫∫& , (0.223)

onde vσ& é a produção total de entropia por unidade de tempo devida a

irreversibilidades no interior do volume de controlo. O cálculo de vσ& é feito

na termodinâmica dos processos irreversíveis. Todavia, da Segunda Lei da Termodinâmica (ou do postulado da dissipação), sabemos já que

int 0s ≥& ,

pelo que

int 0σ ≥& ,

verificando-se apenas o sinal de igualdade se no interior do volume de controlo todos os processos forem reversíveis.

É fundamental ter em atenção, no cálculo do fluxo de entropia associado ao fluxo de calor, que a temperatura que se considera é a da fronteira do sistema. Neste caso, é a temperatura a que se encontra o elemento de superfície dΩ do volume de controlo, por onde o fluxo de calor em causa entra (ou sai) trazendo (ou levando) entropia para o sistema.

Como nos processos reais um fluxo de calor requer sempre uma diferença de temperatura, se a fronteira do volume de controlo não é definida com rigor, a temperatura a que o mesmo se encontra também deixa de o ser, arrastando em consequência imprecisões nos fluxos de entropia permutados.

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9. Termodinâmica da Atmosfera

Neste capítulo o sistema termodinâmico em estudo é uma mistura de ar seco e de vapor de água. Analisamos a equação fundamental e derivamos as equações de estado e as propriedades termodinâmicas. Estabelecemos a equação de Poisson de uma maneira coerente e obtemos o gradiente adiabático seco. Introduzimos algumas variáveis meteorológicas correntes como temperatura virtual e temperatura potencial. Apresentamos a estabilidade estática em termos de gradientes de temperatura e de temperatura potencial e salientamos a sua importância usando um exemplo de poluição atmosférica. Desenhamos e exploramos o tefigrama - um diagrama atmosférico.

9.1. Extensão do formalismo para o campo gravítico

A atmosfera não é um sistema simples porque está sob o efeito do campo gravitico. A energia associada ao campo gravítico – energia potencial de um dada massa m à cota z (β do campo gravítico) é

pE mgz= ,

em que g é a aceleração gravitica.

Considerando então que a energia total do sistema é dada por

pEUE += ,

temos que

( ) ( ) ( )1 1

1 1

, , , , , , , , , ,n n p

n n

dE S V m m z dU S V m m dE m z

TdS pdV dm dm mgdz gzdmµ µ

= + =

= − + + + + +

K K

K. (0.224)

As funções de entropia e de energia para um sistema que está sob o efeito de campos externos são dadas de uma forma geral por

( )1 1 2, , , , , ,nS S E V m m β β= K K (0.225)

( )1 1 2, , , , , ,nE E S V m m β β= K K (0.226)

em que os βi determinam a posição nos vários campos (Hatsopoulos e Keenan, 1965). Na forma diferencial temos que:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

184

1 1 21 1 2

nn

S S S S S SdS dE dV dm dm d d

E V m mβ β

β β∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂

= + + + + + + +∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂

L K

(0.227)

1 1 21 1 2

nn

E E E E E EdE dS dV dm dm d d

S V m mβ β

β β∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂

= + + + + + + +∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂

L K

(0.228)

No caso do campo gravítico a equação (0.228) é dada por:

( )

1 1 2

11 1

1

1, , , , , , , , 1 , , , , ,

, , , ,, , , , ,

, , , , ,

n n n

nn

n

V m m z S m m z S V m m z

nS V m mn S V m m z

dE S V m m z

E E EdS dV dm

S V m

E Edm dz

m z−

=

∂ ∂ ∂ = + + + ∂ ∂ ∂

∂ ∂ + + ∂ ∂

K K K

KK

K

K (0.229)

Comparando esta expressão com a expressão (0.224) concluímos que:

1 1

1 1

1

1

, , , , , , ,

, , , , , , ,

, , , , , , ,

, , , ,

n n

n n

j i n

n

V m m z V m m

S m m z S m m

i ii iS V m z S V m m

S V m m

E UT

S S

E UP

V V

E Ugz gz

m m

Emg

z

µ µ≠

∂ ∂ = = ∂ ∂

∂ ∂ = = − ∂ ∂

∂ ∂= + = + ≡ ∂ ∂

∂ = ∂

K K

K K

K

K

%

em que iµ~ é o potencial total ou químico-gravítico de uma dada substância i

com mi. Podemos portanto escrever que a função diferencial da energia com campos externos para uma massa de ar sob o efeito do campo gravítico é:

( )1 1 1, , , , ,n n ndE S V m m z TdS PdV dm dm mgdzµ µ= − + + + +% %K K . (0.230)

Exercícios 1. Escreva a equação de Euler para um sistema sob a acção de um campo

gravítico.

2. Escreva a equação de Gibbs-Duhem para um sistema sob a acção de um campo gravítico.

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

185

9.2. Sistema Termodinâmico – Ar Seco Na atmosfera o sistema termodinâmico em análise é uma mistura de ar seco com vapor de água. Tipicamente considera-se que o sistema é constítuido por uma massa homogénea de ar com uma fronteira adiabática e não restritiva em termos de volume. Esta massa de ar pode referir-se a um dos seguintes conceitos: 1) uma massa de ar extensa (escala de cerca de 1000 km) situada na baixa atmosfera onde os gradientes das diferentes propriedades sejam muito pequenos e 2) uma bolsa de ar (escala de cerca de 1 km). As propriedades que caracterizam a massa de ar são determinadas pela região de origem e pelas superfícies por onde passou. Estas massas de ar são responsáveis por vários dias com uma caracterização meteorológica semelhante. Consideramos que a fronteira é adiabática porque por um lado a escala temporal dos processos analisados é tipicamente de um dia e por outro o ar é mau condutor de calor. Esta simplificação é válida se os processos adiabáticos contribuirem duma forma muito mais significativa para alterações da energia interna do que os processos diatérmicos que podem estar por exemplo relacionados com a radiação recebida da Terra. As frentes são as superfícies de fronteira que separam estas massas de ar onde ocorre alguma mistura entre as massas de ar e que podem ter 15 a 200 km de largura.

9.2.1. Equação Fundamental, Equações de Estado e Propriedades Termodinâmicas A equação fundamental para uma mistura de gases ideais é dada por (Callen, 1985):

00

0 0

ln ln ln jj j j j j

j j j

mm U VS m s m c R mR R m

mU mv m

= + + −

∑ ∑ ∑ .

O ar às pressões e temperaturas atmosféricas comporta-se tipicamente como uma mistura de gases ideais sob acção do campo gravítico. Neste caso U E mgz= − .

Exercícios 1. Escreva a equação fundamental em função da energia E tendo em conta

que esta mistura de gases perfeitos está sob o efeito do campo gravítico.

2. Obtenha as equações de estado.

As equações de estado são dadas por:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

186

1 1, ,...., , ,...., ,

1

r r

j jj

V m m V m m z

m c RS S

U E T U

∂ ∂ = ≡ = ∂ ∂

∑ (0.231)

1 1, ,..., , ,..., ,r rU m m E m m z

S S P mR

V V T V

∂ ∂ = ≡ = ∂ ∂ (0.232)

00

0 0, ,

ln ln lni k

k kk k j j

jk U V m

m U mS R Vs R c R R m c R

m T mU m m mv

µ

∂≡ − = − + − − + ∂

(0.233)

( ), , ,

1

i k

k kj j k

jk E V m z

S R mgzm c gz

m T T m U T

µ µµ

∂≡ − = − − = − +

∂ ∑

% (0.234)

1, , ,...., r

j jj

E V m m

m c RS mg

mgz U T

∂ = − ≡ − ∂

∑ (0.235)

Exercícios 1. Obtenha a relação entre os calores específicos cp e cv para a atmosfera. 2. Qual a relação entre o cp e o cv do ar e os calores específicos dos

vários componentes do ar?

Os coeficientes termodinâmicos são dados por:

, j

j jv j vj

j jV m

m mT Sc R c c

m T m m

∂ ≡ = = ∂ ∑ ∑ (0.236)

, j

j jP j pj v

j jP m

m mT Sc R c R c c R

m T m m

∂ ≡ = + = = + ∂ ∑ ∑ (0.237)

PP

V

Vk

TT

11=

∂∂

−≡

Pc

c

P

V

Vk

P

v

SS

11=

∂∂

−≡

TT

V

V P

11−=

∂∂

−≡α

A razão entre o cp e o cv é designada por γ. O calor específico a pressão constante do vapor de àgua a 0ºC é de 1850 J.kg-1K-1 e o calor específico do

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

187

ar seco a 0ºC é de 1005 J.kg-1K-1. Portanto o calor específico no ar varia entre 1005 J.kg-1K-1 (ar seco) e 1058 J.kg-1K-1 (ar húmido com 4% de massa de vapor) variando por um factor de 5% no máximo. O aumento da capacidade caloríofica a pressão constante não representa uma alteração significativa no comportamento termodinâmico (Bohren, 1998).

Exercício Suponha que num dia limpo a previsão para as temperaturas máximas de duas cidades à mesma latitude são de 30º e 38ºC. A cidade com a previsão de 30ºC situa-se no litoral sendo mais húmida do que a outra cidade que se situa no interior. Acha que a diferença entre as temperaturas máximas previstas se pode dever ao facto de ser necessário fornecer diferentes quantidades de calor às duas cidades para obter mesmo aumento de temperatura. Qual a importância de estarem à mesma latitude e de o céu estar limpo?

9.2.2. Gradiente de Pressão na Atmosfera Uma coluna de ar sujeita ao campo gravítico é um sistema heterogéneo porque as propriedades intensivas não são constantes. Suponhamos então que temos uma coluna de ar constítuida por sub-parcelas homogéneas. Cada sub-parcela tem volume constante e fronteiras permeáveis. O equilíbrio termodinâmico é agora dado como a solução do seguinte problema de maximização constrangida:

( )

( )

(1)(1) (1) (1) (1)1

( )( ) ( ) ( ) ( )1

(1) (1) (1) (1) (1) (1)1 2

, , , , , ,,

, , , , ,

( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )1 2

max , , , , ,

, , , , ,

z

nn n n nz

E V m m z

E V m m z

n n n n n n

S S E V m m z

S E V m m z

= + +

+

KK

K

K K

K

sujeito a

(1) ( )

(1) ( )1 1 1

(1) ( )2 2 2

...

...

...

n

n

n

E E E

m m m

m m m

+ + =

+ + =

+ + =

K

Onde U e V e mi são constantes, dado que o sistema é isolado. A solução deste problema é dada pelo sistema de equações

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

188

(1) ( )

(1) ( )

(1) ( )

(1) ( )1 1

(1) ( )

(1) ( )2 2

...

...

...

...

n

n

n

n

n

n

S S

E E

S S

m m

S S

m m

∂ ∂= = ∂ ∂

∂ ∂= =∂ ∂

∂ ∂ = =∂ ∂

Recorrendo às definições das variáveis intensivas na representação entrópica, obtemos

(1) ( )

(1) ( )1 1 1(1) ( )

(1) ( )2 2 2(1) ( )

1 1 1...

...

...

n

n

n

n

n

T T T

T T T

T T T

µ µ µ

µ µ µ

= = ≡ = = ≡ = = ≡

% % %

% % %

K

As condições de equilíbrio impõe que a temperatura e o potencial quimico-gravitico de cada componente do ar sejam constantes ao longo da coluna de

ar. Como ( )1kk gz

T T

µµ− = − +

% as condições de equilíbrio impõe que:

(1) (1) ( ) ( )1 1

(1) (1) ( ) ( )2 2

...

...

n n

n n

gz gz

gz gz

µ µ

µ µ

+ = = +

+ = = +

Recorrendo às equações (0.231), (0.232), (0.233) e (0.236) temos que:

( )00 0

ln ln lnk kk vk v

mT Ps R c R R c R

T T m P

µ− = − + + − − − .

Se considerarmos que, a fracção mássica de cada componente do ar é constante ao longo da coluna, as condições de equilíbrio em conjunto com o modelo da mistura de gases perfeitos, impõe que

(1) (1) ( ) ( )

(1) ( )0 0

ln ... lnn n

n

P gz P gzR R

P T P T+ + = = + +

e portanto

0

ln 0d P gz

Rdz P T

+ =

ou seja

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

189

dP gPg

dz RTρ=− = − . (0.238)

Numa atmosfera em equilíbrio hidroestático, a aceleração vertical é nula, e portanto a variação de pressão entre dois pontos a altitudes diferentes é só devido ao peso da coluna de ar.

Integrando a equação (0.238) obtemos

0

gz

RTP P e−

= , (0.239)

onde P0 é a pressão à altitude z0=0.

9.2.3. Processos Adiabáticos e Reversíveis Existem fenómenos meteorológicos importantes caracterizados por uma ascensão de uma massa de ar: ascensão convectiva devido ao aquecimento heterogéneo da superfície; ascensão orográfica e ascensão de uma massa de ar quente devido à colisão com uma massa de ar frio (Lutgens e Tarbuck, 1998). Outro fenómeno importante descrito aproximadamente por um processo adiabático e reversível é a dispersão de poluentes atmosféricos de chaminés.

Equação de Poisson A equação de Poisson descreve a relação entre a pressão, P, e o volume, V, numa massa de ar com um número constante de moles que passa por um processo quase-estático, Q TdS= e adiabático 0Q = . Esta equação é aplicável a processos onde a transferência de calor é negligível devido à reduzida escala temporal do processo ou a processos onde a variação de temperatura devido a processos diabáticos é muito inferior a variação devido a outros processos, como por exemplo a expansão de uma massa de ar durante a ascensão.

Sendo um processo quase-estático e adiabático a entropia mantem-se constante. A relação entre a pressão e o volume a entropia constante é dada por:

1, ,...,

1

n

P

S m m s V

cP PdP dV dV dV

V K V c V

∂ = = − = − ∂ .

Integrando esta equação obtemos a Equação de Poisson:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

190

γγ00VPPV = , (0.240)

que pode ser reescrita usando a equação de estado (0.232)

γγ

γγ

−− = 100

1 TPPT . (0.241)

Esta equação diz-nos que para um processo adiabático temos uma relação constante entre quaisquer duas das variáveis T, P e V.

Exercício Sabendo que o gradiente de temperatura ambiental médio é de -6.5ºC na troposfera estime a temperatura ambiente à altitude de 12km. Porque é que um avião a voar a esta altitude tem permutadores de calor para arrefecer o ar que é retirado do exterior? Assuma que 1.4γ = .

Gradiente de Temperatura Adiabático Seco À medida que uma massa de ar se move na atmosfera adiabática e reversivelmente a sua temperatura altera-se como resultado da alteração de pressão.

1

T T P

S P P

P

P P

S S VT T

T P P TdT dP dP dP dP

SP Nc NcT

TVdP dP

Nc c

αρ

∂ ∂ ∂ − − ∂ ∂ ∂ ∂ = = = = = ∂∂ ∂

= − =

(0.242)

As paredes são móveis e portanto a variação de pressão na particula é igual à variação de pressão na atmosfera. Para obtermos um valor para o gradiente de temperatura adiabático seco (GTAS) vamos usar a equação (0.238) para substituir dP e reescrever a equação (0.242) como

kmCc

g

c

g

dz

dTdz

c

gdT

PP

atmd

P

atm /º10≈≈=−≡Γ⇔−=ρ

ρρρ

. (0.243)

O gradiente de temperatura de uma massa de ar que sofre um processo adiabático, reversível e seco é de –10ºC por km e é independente do gradiente de temperatura do ambiente. O Γd tem este valor se a atmosfera estiver em equilíbrio hidroestático e a diferença de temperatura entre a parcela e o ambiente não for muito grande.

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

191

Exercício Obtenha o gradiente de temperatura adiabático seco derivando a equação de Poisson.

Exercício Porque é que no EUA se usam ventoinhas gigantes em culturas sensíveis ao gelo em noites frias de céu limpo? \\ 1

Exercício Numa manhã de Primavera o gradiente de temperatura na Covilhã que fica em média a cerca de 600 metros de altitude é de -6ºC/km. Suponha que o ar sobre a Serra da Estrela (2000 metros) começa a descer sobre a Covilhã. Espera que a temperatura na Covilhã suba, desce ou se mantenha. Qual a variação?

9.2.4. Estabilidade Estática A estabilidade estática está relacionada com o tipo de equilíbrio que caracteriza a atmosfera quando existe um deslocamento vertical de uma massa de ar. Existem 3 tipos de equilíbrio: equilíbrio estável, equilíbrio instável e equilíbrio neutro. No caso do equilíbrio estável a atmosfera tende a eliminar os deslocamentos verticais, no equilíbrio instável tende a ampliá-los e no equilíbrio neutro ignora-os.

Se a posição inicial de uma massa de ar está em equilíbrio então a soma das forces e torques aplicados no sistema é nulo. Para determinarmos o tipo de equilíbrio temos que avaliar o somatório das forças na nova posição de equilíbrio. As forças a actuar na massa de ar são o gradiente de pressão e o seu peso; portanto a sua aceleração, az, é:

gdz

dP

dt

dva z

z −−==ρ1

Se a atmosfera está em equilíbrio hidroestático a variação de pressão na particula é igual à variação de pressão na atmosfera e portanto a direcção da aceleração vertical é dada pela diferença de densidades entre a atmosfera e a partícula:

( )

<⇒<

=⇒=

>⇒>

⇒−==

0

0

01

zatm

zatm

zatm

atmz

z

a

a

a

gdt

dva

ρρ

ρρ

ρρ

ρρρ

(0.244)

Os resultados anteriores podem ser reescritos em função dos gradientes de temperatura: o gradiente da massa de ar é o gradiente adiabático seco e o

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

192

gradiente da atmosfera é o gradiente da temperatura ambiente. Usando a equação (0.232) temos que

dd

d d

N P m PM PM PR M RV TR V TR M T T

M M M

ρ= ⇔ = = = =

Definindo que dd

RR

M≡ e d

v

MT T

M≡ temos que

v d

P

T Rρ = .

Onde Md is a massa molar do ar seco, e Tv é a temperatura virtual, ou seja, a temperatura que a massa de ar seco (sem vapor de água) teria que ter para ter a mesma pressão e densidade que o ar húmido. Podemos então reescrever a aceleração como

( ) 1 1 1 1z atm

d d dd atmatm d

atm atm

g gP gPa

M M MR T TT T RM M M

ρ ρρ ρ ρ

= − = − ≈ −

,

considerando que a variação na percentagem da massa de vapor de água na atmosfera é desprezável para o deslocamento vertical considerado. A aceleração vertical é então dada por:

T T a

T T a

T T a

atm z

atm z

atm z

< ⇒ >

= ⇒ =

> ⇒ <

0

0

0

.

A temperatura de uma particula deslocada verticalmente da sua posição de equilíbrio varia de acordo com o gradiente de temperatura adiabático seco; a temperatura da atmosfera varia de acordo com o gradiente de temperatura ambiente. Na Figura 32 é apresentado o gradiente de temperatura adiabático seco a vermelho e três gradientes de temperatura da atmosfera qualitativamente diferentes (atmosferas 1,2 e 3).

Na atmosfera 1 a aceleração é positiva num deslocamento vertical para cima e negativa num deslocamento vertical para baixo. Portanto o deslocamento provoca um afastamento da posição inicial ou seja o equilíbrio é instável classificando-se a atmosfera como uma Atmosfera Instável.

Nas atmosferas 2 e 3 a aceleração é positiva num deslocamento vertical para baixo e negativa num deslocamento vertical para cima. Portanto o

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

193

deslocamento provoca o retorno à posição inicial ou seja o equilíbrio é estável classificando-se a atmosfera como uma Atmosfera Estável.

Numa atmosfera que tenha o gradiente de temperatura igual a a Γd: nos deslocamentos verticais para cima e para baixo da posição de equilíbrio a aceleração é nula ou seja o equilíbrio é neutro classificando-se a atmosfera como Atmosfera Neutra.

Figura 32 – Linha a

vermelho: gradiente de temperatura adiabático. Linhass 1, 2 e 3: gradientes de temperatura da atmosfera.

Resumindo:

Cima 0

Atmosfera 1

Baixo 0

Cima 0

Atmosfera 2 and 3

Baixo 0

atm z

atm z

atm z

atm z

T T a

T T a

T T a

T T a

< ⇒ > > ⇒ <

> ⇒ < < ⇒ >

Traduzindo o critério de estabilidade em função dos gradientes de temperatura temos que:

Z

T

Equilibrium

1 3

2dz

dT

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

194

Atmosfera Instável

Atmosfera Neutra

Atmosfera Estável

datm

datm

datm

dT

dz

dT

dz

dT

dz

< −Γ

= −Γ

> −Γ

(0.245)

O gradiente de temperatura ambiental médio é de -6.5ºC na troposfera. É controlado pela absorção do fluxo radiativo do sol e pelas trocas de calor radiativo entre a troposfera e o solo. A atmosfera é quase transparente à radiação solar e quase opaca à radiação do solo e portanto a radiação emitida pelo solo e a advecção de ar com uma temperatura diferente controlam o gradiente de temperatura ambiente. Processos que contribuem para uma atmosfera estável incluem: arrefecimento radiativo em noites calmas de céu limpo, a advecção de ar frio à superfície e de ar quente em cima, passagem de uma massa de ar frio sob uma superfície fria e descida de ar em larga escala (ciclone). Processos que promovem uma atmosfera instável incluem aquecimento radiativo do solo em tardes de céu limpo, advecção de ar quente à superfície e de ar frio lá em cima, mistura de massa de ar e a subida de ar em larga escala (anti-ciclone).

Exercício Faça corresponder a cada um dos gráficos uma das plumas.

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

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195

Descreva exemplos de condições meterológicas a que correspondam cada um dos gráficos.

Em que situação é que temos as concentrações mais elevadas no solo perto da chaminé e longe da chaminé?

A estabilidade estática da atmosfera é muito importante para algumas aplicações, como é o caso da dispersão de poluentes. Exemplificando com um exemplo de Pasquill F. (1974). A atmosfera instável corresponde a uma dispersão vigorosa de poluentes atmosféricos enquanto que uma atmosfera muito estável (inversão de temperatura) corresponde a uma dispersão muito pequena. No primeiro caso as concentrações mais elevadas de poluentes no solo é perto da chaminé enquanto que no segundo caso as concentrações mais elevadas encontram-se longe da chaminé.

9.2.5. Temperatura Potencial - θθθθ A temperatura potencial, θ, é a temperatura que uma massa de ar à temperatura T e pressão P teria se fosse levada por um processo adiabático e quase-estático à pressão dos 1000mbar. A temperatura potencial é conservada para uma mistura de gases perfeitos que só sofre processos adiabáticos e quase estáticos sendo portanto uma boa maneira de identificar uma massa de ar

TP

P γγ

θ

=

1

0

. (0.246)

Estabilidade Estática e Temperatura Potencial O critério de estabilidade é mais simples se for enunciado em função da temperatura potencial, θ. Começamos por reescrever o perfil vertical de temperatura em função da temperatura potencial derivando θ em relação a z,

γγθθθ γ

γ

−+=

=

11

0 dz

dP

Pdz

dT

TT

P

P

dz

d

dz

d

atm

,

em seguida usamos as equações (0.238) e (0.243) para obtermos

Γ+

=+=

d

atmpatm dz

dT

Tc

g

Tdz

dT

Tdz

d θθθθ. (0.247)

Aplicando os critérios de estabilidade (equação (0.245)) à equação (0.247) obtemos:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

196

0 0 Atmosfera Instável

0 0 Atmosfera Neutra

0 0 Atmosfera Estável

atm atm

atm atm

atm atm

d d

dz dP

d d

dz dP

d d

dz dP

θ θ

θ θ

θ θ

< ⇔ >

= ⇔ =

> ⇔ <

Exercício Calcular a relação entre dθ/dz e dθ/dP. Use a relação dθ/dP=(dθ/dz)*(dz/dp).

Gradiente de temperatura potencial numa atmosfera em equilíbrio termodinâmico O perfil vertical de temperatura é o perfil que maximiza a entropia para um dado valor da energia interna. A maximização da entropia é dada por:

0P

ddS c cte

θθ

θ= = ⇒ = ,

o que implica que o perfil vertical da temperatura potencial é constante e portanto o gradiente de temperatura numa atmosfera em equilíbrio é dado pelo Gradiente de Temperatura Adiabático Seco. Esta atmosfera corresponde a uma atmosfera bem misturada de modo a que outros processos como a radiação e a advecção desempenham um papel pouco relevante na determinação do gradiente de temperatura (Bohren, 1998).

Entropia e a Temperatura Potencial Num processo adiabático e reversível a temperatura potencial e a entropia mantêm-se constantes. Em qualquer outro processo existe uma relação entre estas duas variáveis que vamos derivar em seguida. Vamos começar por escrever a entropia em função da temperatura e da pressão considerando uma pressão de referência, P0, de 1000 mbar.

0

0 0

1

00 0

00

ln ln ln

ln ln

ln ln

jj j V j

j j

jj j P j

j j

jj j P j

j j

mT RTS m s mc mR R m

T Pv m

mT PS m s mc R m

T P m

mS m s mc R m

T m

γγ

θ

= + + −

= + −

= + −

∑ ∑

∑ ∑

∑ ∑

(0.248)

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

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197

Se no processo a composição e o número de moles forem constantes então a seguinte relação é obtida,

00

0

lnP

S Ss s c

m T

θ−= − = ,

onde a temperatura potencial é a do estado actual.

9.3. Sistema Termodinâmico – Ar Húmido

9.3.1. Medidas do Vapor de Água O vapor de água é só um dos muitos componentes do ar. A sua importância é devida ao facto de ser o único componente que pode condensar às temperaturas atmosféricas.

Medidas dimensionais: pressão de vapor e humidade absoluta. Partindo da equação (0.232) podemos escrever a pressão total da mistura como sendo a soma das pressões parciais ou seja das pressões que cada componente exerciria se estivesse sozinho no volume total:

∑∑ ≡==i

ii

i PV

RTN

V

NRTP .

Designando a pressão parcial do vapor de água por e e a pressão parcial do ar seco por Pd temos que:

ePPP di

i +== ∑ .

A primeira medida do vapor de água é a sua pressão parcial designada por pressão de vapor, e.

Outra medida do vapor de água no ar é a humidade absoluta ou densidade do vapor de água, v vm Vρ ≡ cuja relação com a pressão de vapor é dada

por:

TRTM

R

VM

RTm

V

RTNe vv

vv

v

vv ρρ ≡=== . (0.249)

Também para o ar seco podemos definir a densidade, d dm Vρ ≡ ,

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

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198

TRP ddd ρ= (0.250)

Medidas adimensionais: humidade específica e razão de mistura Num processo termodinâmico em que não há condensação a massa total de ar seco e de vapor de água mantêm-se constantes mas o mesmo já não se pode afirmar da pressão de vapor e da humidade absoluta. Nesta secção são introduzidas duas variáveis adimensionais que traduzem esta constância: a humidade específica, q, e a razão de mistura, ω:

vmq

m= (0.251)

v v

d d d

m Me e

m P M P eω = = ≡ ∈

− (0.252)

Medidas em equilíbrio de fases Na atmosfera o vapor de água não está em equilíbrio com a água líquida com excepção de nuvens em estado estacionário e uma camada muito fina de ar em contacto com a água. Se o vapor de água estivesse em equilíbrio então os fluxos de condensação e evaporação compensavam-se e não existia evaporação, o que não corresponde, à nossa experiência do dia a dia. O vapor de água na atmosfera é tipicamente inferior ao valor de equilíbrio.

Podemos então definir para uma dada pressão e temperatura, a pressão de vapor de saturação, es, e a razão de mistura de saturação, ωs, ou seja o valor que a pressão de vapor e a razão de mistura teriam se a massa de vapor no ar estivesse em equilíbrio com uma camada de água líquida.

Medidas do afastamento em relação ao equilíbrio de fases A humidade relativa, r, dá-nos a relação entre a razão de mistura e a razão de mistura de saturação e dá-nos uma medida da distânica ao equilíbrio:

−==

eP

eP

e

er s

ssωω

. (0.253)

A humidade relativa é que é responsável pela nossa sensação de conforto ou desconforto num dado dia.

9.3.2. Clausius - Clapeyron A Equação de Clapeyron é dada por:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

199

( )L V

v l

v l v l

s sP l

T v v T v vµ µ−

−∂ = = ∂ − −

Esta equação pode ser simplificada tendo em conta que o volume molar da água liquida é muito inferior ao volume molar do vapor de água e que o vapor de água se comporta como um gás perfeito, obtendo-se:

2RT

lP

T

P

VL

=

∂∂

−µµ

.

Para o vapor de água temos

2

L V

s se le

T RTµ µ−

∂ = ∂ , (0.254)

considerando que o calor latente é independente da temperatura, esta equação pode ser integrada obtendo-se

−=

0

11exp

TTR

lee sos . (0.255)

Usando como estado de referência os 273 K simplifica-se para:

54176.11exp 19.83se

T = −

, (0.256)

onde a pressão de saturação está em mbar e a temperatura em Kelvin. A equação (0.256) diz-nos que a pressão de vapor de saturação aumenta com a temperatura ou seja a a massa de vapor em equilíbrio na atmosfera aumenta com a temperatura.

Exercício Considere um sistema composto com uma fronteira exterior adiabática, impermeável e móvel. Considere que inicialmente existe uma parede interna adiabática, móvel e impermeável que separa duas massas de ar de características: P, T1 e e1 e P, T2 e e2. Calcule T e e no equilíbrio quando é retirada a fronteira interna considerando que o processo é quase estático e que não existe condensação de vapor de água. É possível a mistura adiabática e isobárica de duas massas de ar ‘não saturadas’ formar uma massa de ar ‘saturada’? Considerando que o ar expirado por um cão é mais húmido e mais frio do que o de um ser humano em que caso é mais provável que se forme uma nuvem?

Sugestão: Com 1a ax m m≡ prove que

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

200

( )( )

1 2

1 2

1

1

e xe x e

T xT x T

= + −

= + −

Figura 33 – Equação de Clausius-Clapeyron (azul). Caracterização da mistura (linha a vermelho) de duas massas de ar não saturadas (extremos da linha a vermelho).

Exercício A equação de Clausius-Clapeyron diz-nos que a pressão de vapor em equilíbrio é só função da temperatura. Obtenha a razão de mistura de saturação para as temperaturas de: -40ºC, -20ºC, 0ºC, 10ºC, 20ºC, 30ºC e 40ºC e discuta porque é que os climas mais frios são muito mais secos que os climas mais quentes.

9.3.3. Temperatura de Orvalho A equação de Clausius-Clapeyron também introduz a temperatura de orvalho. A temperatura de orvalho, é a temperatura de equilíbrio entre as duas fases para a mesma razão de mistura e portanto para a mesma pressão de vapor , ( ) ( )s dewe T e T= . De acordo com Bohren (1998) a temperatura de

orvalho do fim da tarde é uma boa estimativa da temperatura mínima da noite num dia limpo sem vento. O facto de ser um dia de céu limpo implica que o arrefecimento nocturno será devido a perdas de calor por radiação e o facto de não haver vento implica que a massa de ar não será substituída por outra.

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

200

200 220 240 260 280 300 320 340

T

Press

ão de va

por de sa

turaçã

o

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

201

Exercício Explique em que casos é que o orvalho se pode formar no lado interior das janelas de uma casa quando a temperatura exterior é mais baixa que a temperatura interior.

9.3.4. Temperatura do termómetro molhado e a Equação Psicrométrica A temperatura do termómetro molhado é a temperatura que uma massa de ar teria se se evaporasse água suficiente, de uma superfície de água com a qual a massa de ar estivesse em contacto, para que a massa de ar ficasse em equilíbrio. Durante este processo 1) a temperatura do ar arrefece devido ao fluxo de calor necessário para evaporar, 2) a pressão de vapor aumenta e 3) a pressão de vapor de saturação diminui até igualar a pressão de vapor.

De seguida vamos agora obter uma expressão para a temperatura do termómetro molhado. Consideramos que o processo de evaporação da superfície de água para a massa de ar é adiabático e quase-estático e portanto o processo é isentrópico a pressão constante com um número de moles total de água (vapor de água e água liquida) constante. Neste caso a variação de entalpia é dada por:

0dH dU PdV VdP TdS PdV PdV VdP= + + = − + + = .

Ou seja

initial finalH H= ,

sendo que

, , , , ,v i w i v f w f w Tm m m m m+ = + ≡ (0.257)

e

( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( )

, , , , , , , , , ,

, , , , , , , , , , , ,

, , , , , , , , , , ,

final initial d d f v f v f w f w f d d i v i v i w i w i

d d f d i v f v f v i v i w T v f w f w T v i w i

d d f d i v f v f w f v i v i w i w T w f w i

H H m h m h m h m h m h m h

m h h m h m h m m h m m h

m h h m h h m h h m h h

− = + + − − −

= − + − + − − −

= − + − − − + −

(0.258)

A diferença entre as entalpias dos estados inicial e final do ar seco e da água liquida são dadas por:

( )( )

, , ,

, , ,

d f d i p d f i

w f w i p w f i

h h c T T

h h c T T

− = −

− = −.

Porque a pressão constante dH dU PdV VdP TdS dQ= + + = = e portanto

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

202

,p

P m

dS T SdH dQ TdS T dT m dT mc dT

dT m T

∂ = = = = = ∂

A diferença entre as entalpias do vapor e da água líquida é obtida usando a Equação de Euler:

( )

i ii

v v v w w w

v w v w v w v w

H U PV U TS PV N

h Ts h Ts

h h T s s l

µ

µ µ

µ µ µ µ

= + ∧ = − +

= + = + ⇒

− = − + − = + −

∑.

A eq. (0.258) pode ser reescrita usando as equações anteriores:

( ) ( ) ( ), , , , ,final initial d p d f i v f v i w T p w f iH H m c T T l m m m c T T− = − + − + −

Como 0dH = temos que:

( ) ( ), , ,, ,

v f v i w Tp d p w f i

d d

m m ml c c T T

m m

− = + − ⇔

,

usando a definição de razão de mistura obtemos:

( ) ( ),, ,

w Tf i p d p w f i

d

ml w w c c T T

m

− = + −

em que a razão de mistura final é a razão de mistura de saturação:

( ) ( ),, ,( ) w T

s f i p d p w f i

d

ml w T w c c T T

m

− = + −

.

Considerando que a pressão de vapor é muito inferior à pressão, i.e., e

wP

≈∈

e que a razão entre a massa total de água e a massa de ar seco é

nula obtemos

( ) ( )

( ) ( ) ( )

,

,

( )

.

s w i p d w i

p ds w i w i

l w T w c T T

Pce T e T T T

l

− = − ⇔

∈− = −

Sendo a temperatura final a temperatura do termómetro molhado. Reescrevendo a equação anterior,

( ) ( ) ( ),

0.65 /

p di s w w i

mbar k

Pce T e T T T

l≈

∈= − −

14243. (0.259)

obtemos a equação psicrométrica.

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

203

Exercício Qual a temperatura mínima a que o ar pode ser arrefecido por evaporação num dia quente e húmido em que a temperatura máxima é de 38ºC e a temperatura de orvalho é de 30ºC?

9.4. Tefigrama O Tefigrama é um diagrama termodinâmico. A abscissa é a temperatura, T, e a ordenada é a entropia, s. As linhas verticais são isotérmicas e as linhas horizontais são isentrópicas, isto é, adiabáticas e quase-estáticas, ou seja, linhas a temperatura potencial constante. Neste diagrama o estado termodinâmico da atmosfera é representado por duas linhas. Uma das linhas caracteriza o ar independentemente da sua humidade e a outra caracteriza a humidade.

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

204

Exercício Represente qualitativamente as linhas isobáricas.

Exercício Represente qualitativamente as linhas de razão de mistura de saturação constante, ωs, num tefigrama.

Sugestão: Utilize a equação fundamental duma mistura de gases perfeitos.

Exercício As medidas seguintes foram feitas por uma radiosonda em Liverpool no mês de Junho:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

205

P (mbar) T(ºC) Tdew(ºC)

1000 13 11

940 9.5 8

900 7 5

780 0 -3

700 -5 -11

600 -11 -17

500 -20 -28

400 -32 -42

300 -47

200 -49

150 -50

100 -40

a) Representar a atmosfera no tefigrama. Una os pontos de temperatura e os pontos de temperatura de orvalho e obtenha duas curvas eulerianas que caracterizam instantaneamente a atmosfera. Onde é que se situa a tropopausa?

b) O que representa o maior ou menor distanciamento entre a curva das temperaturas de orvalho e a curva traçada com as temperaturas?

c) Calcular a temperatura potencial da atmosfera para as pressões de 1000mbar e 780mbar.

d) Como faria se quisessem ler a temperatura potencial no tefigrama no eixo das abcissas?

e) Classifique a estabilidade estática em função do gradiente da temperatura potencial dθ/dP9.

f) Determine graficamente a razão de mistura, ω, da atmosfera às diferentes pressões. Calcule a humidade relativa, r.

9.5. Nível de Condensação O nível de condensação é atingido quando o vapor de água que está na massa de ar fica em equilíbrio com a água líquida. Tipicamente uma massa de ar perto do solo não está está em equilíbrio porque a pressão de vapor, e, é inferior à pressão de equilíbrio de saturação, es. Quando a massa de ar ascende por um processo adiabático e reversível a relação entre a pressão de vapor e a pressão de vapor de saturação vai-se alterando. Combinado as equações (0.252) e (0.241) podemos escrever

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

206

γγ−

∈+

=1

00 T

TP

w

we .

Portanto a relação entre a pressão de vapor e a pressão de vapor de saturação para uma massa que ascende adiabática e reversivelmente é dada por:

( )

110 1

0 0 0

1 10 0

5417 54176.11exp 19.83 6.11exp 19.83 6.11exp

54176.11 exp 19.83

s

s

Tw wP PT Te w T we

T T

e wPT T

e w T

γγ γγγ γ

γ γγ γ

−−−

− −

+∈ +∈= = ⇔

− −

= − +∈

Como a fronteira é impermeável a razão de mistura é constante e a equação anterior pode ser simplificada:

1 5417exp 19.83 com 0

s

ecT c

e T

γγ − = − >

. (0.260)

A equação (0.260) permite-nos concluir que se T diminui o rácio

se e aumenta. À medida que a parcela vai ascendendo a temperatura diminui

aproximadamente 10ºC/km e portanto se e vais aumentando até a parcela

de ar estar saturada e as nuvens se formarem. O nível a que a parcela tem que ascender para ficar saturada é o nível de condensação. Este é o nível a que as nuvens que resultam de movimentos convectivos ascendentes se formam. Estas nuvens estão habitualmente associadas a atmosferas instáveis e a bom tempo. Os outros processos associados a uma ascensão adiabática de ar seco referidos anteriormente estão tipicamente associados a mau tempo: chuva e nuvens em frentes e depressões e tempo chuvoso no lado exposto ao vento de uma cadeia montanhosa.

Exercício Represente no tefigrama o nível de condensação de uma massa de ar que ascenda a partir dos 1000 mbar. Considere que a atmosfera é caracterizada com os dados do exercício da página 203. Seria provável que nesse dia houvesse formação de nuvens devido à ascensão adiabática de uma massa de ar do solo?

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

207

9.6. Gradiente de Temperatura Adiabático Saturado

Quando uma parcela de ar está saturada o vapor de água está em equilíbrio com a água liquida. À medida que a parcela de ar saturada vai ascendendo na atmosfera a pressão parcial de vapor de saturação vai diminuindo e portanto algum vapor de água vai condensando. As propriedades termodinâmicas da massa de ar alteram-se devido ao calor latente que é libertado durante a condensação. Ou seja, uma massa de ar em ascensão tem um gradiente de temperatura adiabático seco até estar saturada e depois as suas propriedades termodinâmicas alteram-se. Existem dois processos que podem ocorrer: o adiabático saturado e o pseudo-adiabático. No primeiro caso a água liquida mantem-se dentro da parcela e portanto o processo é considerado reversível ou seja se a massa de ar descer a água liquida evapora mantendo a parcela saturada até atingir o nível de condensação inicial. No segundo caso a água liquida sai da parcela, por exemplo, sob a forma de precipitação, e portanto se a parcela descer segue um processo adiabático seco.

O gradiente de temperatura do processo adiabático saturado (GTASR) é menor que o gradiente de temperatura do processo adiabático seco (GTAS) por causa do calor latente libertado.

A parcela de ar saturado comporta-se como tendo a componente do ar húmido que é uma mistura de gases perfeitos e a componente da água liquida. Podemos considerar a seguinte equação de estado para a água liquida (Kondepudi, 1998)

0

0

TP

w

cS S N dT

T= + ∫ . (0.261)

Portanto a entropia total da parcela de ar saturado é dada por:

( )

0

0

00

0

1 1ln ln ln

Tw

w

jd v j j p j

j jd v d d v d v

cS N dT s

T

NPTN N N s c R R N

N N T P N N N N

= + +

+ + + − +

+ + +

∑ ∑

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

208

O 2º termo da equação pode separar-se em dois termos porque a entropia da mistura de gases ideais é igual à soma das entropias que cada gás teria se ocupasse sózinho o volume V à temperatura T e portanto:

, 0

0

00 ,

0

0, 0 ,

0

1 1ln ln ln

ln ln

Tw

w w d d v s v w w

jd j j p d j

j jd d d d

v s v p vs

cS N s N s N s N dT s

T

NPTN N s c R R N

N T P N N

PTN s c R

T e

= + + = + +

+ + − +

+ +

∑ ∑ (0.262)

Considerando que o número total de moles de água é constante,

,w T w vN N N= + e usando as equações (0.252) e (0.165) podemos escrever:

,, ,

v s s dw T w d d w T w d d

N l w N lS N s N s N s N s

T T= + + = + +

∈ (0.263)

Usando as equações (0.262) e (0.263) podemos calcular o gradiente de temperatura a entropia constante numa massa de ar saturado:

, ,

1 1

s

d d

d

T T

S s

P dw T w d p d

P

w lN N RT

P PS

T PdT dP dP dP

SP w lT N T

N c N cT T T

∂ −

∈ ∂∂ ∂ ∂ = = − = − ∂∂ ∂ ∂ + +

∈ ∂

Rearranjando a equação anterior e usando a eq. (0.270) para a derivada exterior de uma função obtemos:

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Termodinâmica Macroscópica

Termodinâmica da Atmosfera

_________________________________________________________________

209

( ) 2

1

1 10

s s

pd

P T

ss p

d

w l w lRT T

dT c dT dP dPT T P P

w l Rd w l dT c dT dP

T T T P

∂ ∂ ∈ +∈ = − +∂ ∂

∈− +∈ − =

.

Se a atmosfera estiver em equilíbrio estático a variação de pressão é dada pela eq. (0.238)

( ) 2

1 10.s d

s p sd d d

w l PR Rd w l dT c dT g dz de

T T T P R T P

∈ ∈− +∈ − − − =

Derivando a equação de Clausius-Clapeyron, eq.(0.255), e usando a relação entre razão de mistura e pressão de vapor, eq. (0.252), obtemos:

2 2,s s s d

l lde e dT w P dT

RT RT= − = −

que pode ser substituído na equação anterior:

( ) 0s pd

Rd w l c dT g

R

∈+∈ + = .

O gradiente de temperatura de uma parcela saturada que ascende é então dado por:

( )

10

' '

1' 0

' '

sp v P

sp P

l gdT d w

c M c

gdT d w l

c c

= − − =

= − − =

.

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

_________________________________________________________________

212

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

_________________________________________________________________

214

Tribus, M. (1961). Thermostatics and Thermodynamics. Van Nostrand, Princeton, NJ.

Truesdell, C. (1980). The Tragicocomical History of Thermodynamics 1822-1854. Springer Verlag, Berlin.

Ulanowicz, R. E. (1986). Growth and Development. Springer Verlag, Berlin.

Wallace M. John, Hobbs Peter (1997). Atmospheric Science – An Introductory Survey. Academic Press.

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

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215

Anexo - Ferramentas Matemáticas

10.1.Formas Diferenciais O único conceito matemático novo que a Termodinâmica utiliza é o de diferenciais: dU, dS, ... Em Matemática, estes objectos denominam-se formas diferenciais.

Existem dois caminhos para obter as regras de manipulação de formas diferenciais. Uma é com recurso ao jacobiano de transformações de coordenadas. Este é o percurso seguido em Domingos (1995). Outro é partir do significado de uma derivada parcial e derivar o significado das operações com formas diferenciais a partir daí. Esse é o caminho seguido no presente trabalho, que fornece assim uma justificação intuitiva para a utilização de formas diferenciais.

Suponhamos uma função z = z(x). Intuitivamente, uma derivada é o quociente entre variações infinitesimais de duas variáveis, z e x:

dz

dx (0.264)

No entanto, z pode ser função de mais variáveis: z = z(x,y). Neste caso, é necessário introduzir o conceito de derivada parcial, em que se faz a derivada da variável dependente tomando uma das variáveis independentes como constante. Para garantir que quer o diferencial da variável independente, quer o diferencial da variável dependente mantém y constante, o que precisamos é de uma forma de, para uma dada variação da variável independente, “retirar-lhe” a variação segundo y. Trata-se de um produto, o produto exterior, que, num certo sentido, é o oposto do produto interno: o produto interno dá o produto da projecção de uma variável segundo a direcção da outra (dá a componente de uma variável que é “interna” a outra) por essa outra; o produto exterior dá o produto da projecção ortogonal da variável (dá a componente de uma variável que é “externa” a outra) por essa outra. Assim, torna-se natural denotar uma derivada parcial da seguinte forma:

dz dy

dx dy

∧∧

(0.265)

Para tornar a argumentação anterior mais rigorosa, é necessário olhar para a verdadeira definição de formas diferenciais: uma forma-k é uma função real de k vectores. Uma forma-0 é simplesmente uma função. Uma forma-1 é

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

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uma função de um vector. As formas-1 dx, dy e dz, são funções que retornam a componente de um vector segundo uma certa direcção. Para o vector v = (x, y, z) temos

( )dx x=v , ( )dy y=v , ( )dz z=v .

10.1.1. Produto Exterior de Formas Diferenciais No caso geral das formas-k, com k ≥ 2, impõe-se uma restrição adicional: têm que ser funções alternantes. Isto significa que se trocarmos a ordem de duas variáveis, a função troca de sinal. Isto impõe uma forma especial para o produto de formas diferencias. Assim, para uma forma-2, temos

( ) ( ) ( ) ( ) ( )1 2 1 2 2 1 1 2 2 1,dx dy dx dy dx dy x y x y∧ = − = −v v v v v v , (0.266)

com v1 = (x1, y1) e v2 = (x2, y2).

Podemos agora interpretar rigorosamente o argumento apresentado acima para a passagem de derivadas parciais para quocientes de formas diferenciais. Consideremos outra vez a derivada parcial ( )yxz ∂∂ . Podemos

decompor dois vectores arbitrários v1 e v2 na soma de um vector perpendicular à direcção y e num vector paralelo a esta direcção. Temos assim

12111 vvv += 22212 vvv += , com ( ) 012 =vdy e ( ) 022 =vdy Dado que é uma função multi-linear, podemos escrever

( )( )( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( )

2

2

11 21 12 21 11 22 12 22

11 21 12 21 12 21 12 21

,

,

, , , ,

, , , ,

dz dy

dx dy

dz dy dz dy dz dy dz dy

dx dy dx dy dx dy dx dy

∧=

∧ + ∧ + ∧ + ∧

∧ + ∧ + ∧ + ∧

1

1

v v

v v

v v v v v v v v

v v v v v v v v

Aplicando nesta expressão a (0.57)

expressão geral para uma forma-2

aplicada a dois vectores, apresentada acima, e considerando os termos que

são nulos, dada a decomposição feita dos vectores v1 e v2, obtemos:

( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )

11 21 21 11 12 21 22 11

11 21 21 11 12 21 22 11

dz dy dz dy dz dy dz dy

dx dy dx dy dx dy dx dy

− + −

− + −

v v v v v v v v

v v v v v v v v

A definição acima apresentada para o produto de formas diferenciais mostra que o produto de formas diferenciais é associativo. Não é comutativo, mas sim anticomutativo, pois

( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )dx dy dx dy dx dy dy dx dy dx dy dx∧ = − = − + = − ∧v v v v v v v v v v v v1 2 1 2 2 1 1 2 2 1 1 2, ,

Isto é,

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dxdydydx ∧−=∧

Isto mostra também que 0=∧ dxdx .

Recorrendo ao mesmo tipo de derivação, é possível mostrar que o produto exterior é distributivo.

Síntese de Propriedades do Produto Exterior Em síntese, o produto exterior tem as seguintes propriedades:

( ) ( )

( )

Associatividade

Anticomutatividade

0

Distributividade do produto em relação à soma

dx dy dz dx dy dz

dx dy dy dx

dx dx

dx dy dz dx dy dx dz

fdx dy dx fdy

∧ ∧ = ∧ ∧

∧ = − ∧

∧ =

∧ + = ∧ + ∧

∧ = ∧

10.1.2. Expressões para Derivadas Parciais Consideremos a derivada exterior de uma função ( ),f x y :

y x

f fdf dx dy

x y

∂ ∂ = + ∂ ∂ (0.267)

.

Fazendo o produto exterior à direita por dy, obtemos

y

fdf dy dx dy

x

∂ ∧ = ∧ ∂ ou

y

f df dy

x dx dy

∂ ∧ = ∂ ∧ .

Temos assim a expressão que nos permite relacionar derivadas parciais com quocientes de produtos externos de diferenciais, transformando os problemas de manipulação de derivadas parciais em problemas algébricos.

Consideremos agora a expressão geral para a derivada exterior de uma função de k variáveis, ( )1,..., kf x x :

2 1 1

11 ,..., ,...,

...k k

kkx x x x

f fdf dx dx

x x−

∂ ∂= + + ∂ ∂

. (0.268)

Se multiplicarmos à direita ambos os membros da equação (0.268) por

2 ... kdx dx∧ ∧ , obtemos

2

2

1 2 1 ,...,

...

...k

k

k x x

df dx dx f

dx dx dx x

∧ ∧ ∧ ∂= ∧ ∧ ∧ ∂

. (0.269)

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Temos assim uma expressão sob a forma de um quociente de produto exterior de diferenciais para derivadas parciais com um número arbitrário de variáveis constantes.

Podemos também multiplicar a equação (0.267) por dz:

y x

f fdf dz dx dz dy dz

x y

∂ ∂ ∧ = ∧ + ∧ ∂ ∂ .

Dividindo ambos os membros desta equação por dy dz∧ , obtemos

y x

df dz f dx dz f

dy dz x dy dz y

∧ ∂ ∧ ∂ = + ∧ ∂ ∧ ∂ ou

yz z x

f f x f

y x y y

∂ ∂ ∂ ∂ = + ∂ ∂ ∂ ∂ .

10.1.3. Derivação Exterior Seja z uma forma-0, isto é, uma função. A sua derivada exterior (normalmente designada como diferencial) é a forma-1

y x

z zdz dx dy

x y

∂ ∂∂ ∂

= +

(0.270)

Multiplicando à direita a equação por dy, e utilizando a propriedade 0=∧ dydy , obtemos por outro caminho a relação

dydx

dydz

x

z

y ∧∧

=

∂∂

(0.271)

Esta definição mostra que se a for uma constante então ( ) 0=ad . Como outro exemplo, tomemos a pressão dada pela equação dos gases perfeitos:

NRTP

V=

Aplicando a relação anterior, temos

2

NR NRTdP dT dV

V V= −

Seja agora ϕ uma forma-k. A sua derivada exterior dϕ é a forma (k+1) obtida de ϕ através da aplicação de d a cada uma das funções que definem ϕ.

No exemplo anterior obtivemos uma forma-1. Podemos esse resultado para ilustrar a obtenção de uma forma-2.

( ) 2 2 2 3

20

NR NRT NR NR NRTd dP d dT d dV dV dT dT dV dV

V V V V V = ∧ − ∧ = − ∧ − − ∧ =

Este exemplo ilustra também uma regra geral: ( ) 0=dzd . Por simplicidade,

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demonstraremos esta relação só para o caso em que z é uma função, de duas variáveis. Temos assim:

( )d dz dz

xdx

z

ydy

z

xdx

z

xydy dx

z

ydy

z

xydx dy

y x

=

+

= +

∧ + +

∧ =

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

∂∂

2

2

2 2

2

2

0

Da definição acima é possível obter trivialmente ( ) dydxyxd +=+ .

10.2.Maximização

10.2.1. Livre Consideremos uma função ( )1,..., nf x x . Para que um ponto ( )* *

1 ,..., nx x

desta função seja máximo, têm que se verificar as seguintes condições:

( )

( )

* *1

1

* *1

,..., 0

,..., 0

n

nn

fx x

x

fx x

x

∂ = ∂ ∂ =∂

M M M

Isto é o mesmo que escrever

11

... 0nn

f fdf dx dx

x x

∂ ∂= + + =

∂ ∂,

dado que as variações dxi são independentes.

10.2.2. Constrangida Quando queremos maximizar uma função, temos que obedecer em primeiro lugar a restrições de primeira ordem, relacionadas com a primeira derivada.

No entanto, vamos também encontrar muitas situações em que temos que maximizar uma função sujeita a certos constrangimentos.

O método de Lagrange provém de uma questão simples. Como é que podemos utilizar aquilo que já sabemos sobre optimização não constrangida para resolver problemas de optimização constrangida?

Consideremos a maximização de uma função de duas variáveis, com um constrangimento:

( )1 2

1 2,

max ,x x

f x x , sujeito a ( )1 2, 0g x x = .

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Anexo - Ferramentas Matemáticas

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A ideia do método de Lagrange consiste em transformar o problema de optimização constrangida num problema de optimização não constrangida. Definimos o Lagrangiano:

( ) ( ) ( )1 2 1 2 1 2, , , ,L x x f x x g x xλ λ= +

A maximização desta função corresponde a determinar a solução do sistema de equações:

( ) ( )

( ) ( )

( )

1 2 1 21 1 1

1 2 1 22 2 2

1 2

, , 0

, , 0

, 0

L f gx x x x

x x x

L f gx x x x

x x x

Lg x x

λ

λ

λ

∂ ∂ ∂= + =

∂ ∂ ∂

∂ ∂ ∂= + =

∂ ∂ ∂

∂= =

Isto é um sistema de três equações com três incógnitas, x1, x2, λ. Note-se que neste sistema recuperamos o constrangimento. De acordo com o método dos multiplicadores, o óptimo é dado pela solução destas equações.

Vamos agora tentar perceber porque é que a solução deste sistema de equações é igual ao óptimo constrangido. Começamos por calcular a derivada exterior de L:

1 22 1

1 2,1 2, , x xx x

L L LdL dx dx d

x xλ λ

λλ

∂ ∂ ∂ = + + ∂ ∂ ∂ .

Esta forma-1 obedece às condições acima. Substituindo-as, obtemos

1 2 1 2 1 21 2 1 2

( , )f f g g

dL dx dx dx dx g x x dx x x x

λ λ ∂ ∂ ∂ ∂

= + + + + ∂ ∂ ∂ ∂ ..

Dadas as condições, o quarto termo do membro direito é nulo. O óptimo de que estamos à procura é um óptimo que deverá obedecer a dL=0, para variações dx1, dx2 que respeitem o constrangimento. Para saber quais são essas variações, aplicamos a derivada exterior à equação de constrangimento:

1 21 2

0g g

dg dx dxx x

∂ ∂= + =

∂ ∂.

Substituindo esta expressão na equação acima, temos

1 21 2

0f f

dx dxx x

∂ ∂+ =

∂ ∂,

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

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para variações dx1, dx2 que respeitem o constrangimento. Era esta a condição que procurávamos.

Para o caso geral, temos

( )1 2

1,

max ,..., nx x

f x x ,

sujeito a

( )

( )

1 1

1

,..., 0

,..., 0

n

m n

g x x

g x x

=

=

M M M , com m n< .

Para resolver isto, construímos o Lagrangiano através da multiplicação de cada equação de constrangimento por um multiplicador diferente, λi, e somámo-los todos à função f. O Lagrangiano é então:

( ) ( ) ( )1 1 1 11

,..., , ,..., ,..., ,...,m

n m n j j nj

L x x f x x g x xλ λ λ=

= +∑

As condições de primeira ordem são agora que todas as derivadas parciais têm que ser nulas no óptimo. Dado que L tem n + m variáveis, teremos um sistema de n + m equações para as variáveis 1 1,..., , ,...,n mx x λ λ :

( ) ( )

( )

1 11

1

,..., ,..., 0, 1,...,

,..., 0 1,...,

mj

n j nji i i

j nj

gL fx x x x i n

x x x

Lg x x j m

λ

λ

=

∂∂ ∂= + = =

∂ ∂ ∂

∂= = =

10.3. Pontos de Equilíbrio e Estabilidade A condição suficiente para que um ponto extremo seja um máximo constrangido é que os menores principais da matriz Hessiana do Lagerangeano avaliada no ponto extremo alternem em sinal começando pelo sinal positivo. A condição suficiente para que um ponto extremo seja um mínimo constrangido é que os menores principais da matriz Hessiana do Lagerangeano avaliada no ponto extremo sejam todos negativos. Quando as variáveis intensivas de uma tranformada de Legendre são constantes então se a função original é maximizada o mesmo ocorre com a transformada de Legendre; se a função original é minimizada o mesmo ocorre com a transformada de Legendre. Isto corre porque a matriz hessiana do

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Termodinâmica Macroscópica

Anexo - Ferramentas Matemáticas

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Lagrangeano da função original é igual à matriz Hessiana do Lagrangeano da transformada de Legendre.

Considerando que ij

ij xx

LL

∂∂∂

=2

e j

iij x

gg

∂∂

= então a matriz Hessiana do

Lagrangeano é dada por:

00

00

1

111

11

111111

KK

MOMMOM

KK

KL

MOMMOM

KK

mnn

m

mnnnnn

mn

gg

gg

ggLL

ggLL

.

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Anexo - Ferramentas Matemáticas

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Índice Remissivo

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11. Índice Remissivo

A Água, 159

C Callen, 16, 54, 55, 56, 57, 58, 118, 119, 212, 213 Carnot, 12, 13, 14, 26, 107, 108, 109, 110, 113, 114, 115

D Dissipação, 38, 40, 41, 47, 51, 53

E Elástico de borracha, 105 Energia de Gibbs, 127, 129, 130, 138, 143, 144, 146, 155, 156 Energia de Helmholtz, 127, 128, 134, 135, 136 Entalpia, 127, 129, 136, 137, 138, 175 Entropia, 49, 50, 57, 119, 122, 180 Equação de Euler, 71

G Gás Perfeito, 97

K Kelvin, 114, 117

M Mínimo da Energia de Gibbs, 138 Mínimo da Energia de Helmholtz, 134 Mínimo da Entalpia, 138

P Paredes, 31 Postulado da Dissipação, 38, 40, 41, 47, 51, 53

T Tisza, 16, 54, 55, 58, 118, 213 Transformada de Legendre, 123

V van der Waals, 102, 154, 155, 156, 157

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Índice Remissivo

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