30652716 o que e leitura maria helena martins

Upload: nedineia

Post on 08-Jul-2015

72 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

iNDICE - Falandoemleitura ........ , . . . . . . . . . .7 - Como e quando comec;amo'S a ler. . . . . . ..11 - Ampliando a n o ~ odeleitura . . . . . . . . ...22 - 0atodeler e ossentidos,asemoc;:oese a razao... . . .. .. . . .. . . . . . . . . . . . . . . . ..36 - Aleitura aojeito de cadaleitor . . . . . . . . ..82 - Indicac;:oes paraleitura......... .".....88 - Bibliografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..92 o mais diffcil, mesmo, e a arte de desler MarioQuintana FALANDO EMLElTURA ... Falandoemleitura,podemosteremmente alguamlendojornal,revista,folheto,mas0mais comumapensarmos em 'Ieitura de livros.E quando sedizqueumapessoagostadeler,"vivelendo", talvezsejaratadebibliotecaouconsumidor deromances,hist6rias emquadrinhos, fotonovelas. Spassaemcimadoslivros",viaderegraestuda muito.Semduvida,0atedelerausual mente relacionadocomaescrita,e0leitorvistocomo decodificadordaletra.Bastardporamdecifrar palavrasparaaconteceraleitura?Comoexpli-. car(amosasexpress5esdeusocorrente"fazer deurngesto,deumasitu8(:ao;"Ier0 olhardealguam";"Ier0tempo","Ier 0espaco", indicandoque0atedelervaialamdaescrita? . Sealguamnaruamedciurnencontrao,minha podeserdemeredesagrado,diantede Maria Helena Martins batida- casual,oudefrancadefesa,diante deempurrioproposital.Minharespostaa esse- ernerevelameumododele-Io_Outra asvezespassamosanosvendaobjetos ..urnvasa,umcinzeiro,semjamaiste-Ios tamenxergado;Iimitamo-Iosa suadecol 'ilfouut il itaria.Umdia,pormotivos - diversos,nosencontramosdiantedeum comosefossealgototal mentenovo.0 &.0,...,...,........ ,acor,afiguraquerepresenta,seu passamatersentido,melhor,afazer senit.ido para065. 56entiioseestabeleceu . umaefetiva nelseesseobjeto.E consideramos sua beleza -. ra ..0rid(culoou aoambiente 'seencontra,0materialeaspartesque COI1'lJ)Oem.Podemosmesmopensar asua ascircunstanciasdesua as doautoroufabricanteaofaze-Io,0 desua aspessoasque0 aJaillt'-!U1aramnodecorrerde.sua e, Qie[1015 - depronto,aquelasligadasaelee .asque ""'onr.:unouaquem Perguntamo-nos enaoHnhamosenxergadoissoantes; essaquestaonosocorreporumsegundo, nnl rtT::ac ,etae duradoura,mas dificilmente voltamos , -10damesmarnaneira,naoimportacom e intensidade. oque . aconteceu?Ateaquelemomenta0 -etaeraapenasalgomaisnaparafernaliade o que eLeitura coisasaonossoredor,comasquaistemosfami-liaridadesemdarporquenaodizem nadaemparticular,oudasquaistemosuma visaopreconcebida.Derepentesedescobreum sentido,nao0sentido,masapenasumamaneira deserdesseobjetoquenosprovocoudeterminada ummodoespecialdeve-Io,enxerga-Io, percebe-Ioenfim.Podemosdizerqueafinallemos ovasoou0cinzeiro.Tudoocorreutalvezde modocasual,sem consciente, masporque houveuma defatorespessoaiscom omomentoe 0lugar, com as circunstancias. ISSpodeacontecertambemcoma pessoascomquemconvivemos,ambientese cotidianas,causandournimpacto,uma surpresa,ateumaNadade sobrenatural. Apenasnossossentidos,nossapsique,nossarazao responderamaalgopara0quejaestavampoten-cialmenteaptos e s6.entao se tornaram dispon(veis. Seraassimtambemqueacontececomaleitura de um textoescrito ? Comfrequencianos contentamos, por economia ou emlersuperficialmente,"passar ' os olhos",comosediz.Naoacrescentamosaoate deleralgomaisden6salemdogestomecanico dedecifrarossinais.Sobretudoseessessinaisnao seligamdeimediatoaumaexperiencia,urna fantasia,umanecessidadenossa.Reagimosassim aoquenaonosinteressanomomento.Um discLirsopol (tico,urnaconversa,umaI (ngua 9 r toMaria Helena Martins estrangeira,umaaulaexpositiva,urnquadra,uma musical,urnlivro.Sentimo-nosisolados doprocessodecomunicac;:aoqueessasmensagens instauram- desligados.Eatendencianaturale ignora-Iasourejeita-Iascomonadatendoaver comagente.Se0textoevisual,ficarnoscegos aele,aindaquenossosolhoscontinuemafixar ossinaisgraficos,as imagens.Se esonoro,surdos. Querdizer:nao0lemos,nao0compreendemos, imposs(veldar-Ihesentidoporqueeledizmuito pouco ounadaparan6s. Poressasrazoes,aocomec;:armosapensara questaodaleitura,ficaurnmotequeagradec;:o aPauloFreire:. "aleituradomundoprecedesemprealeitura dapalavraealeituradestaimplicaacontinuidade daleitu radaquele".. COMOE QUANDO ALER Desdeosnossosprimeiroscontatoscom0 mundo,percebemos0calore0aconchegode urnberc;:odiferentementedasmesmassensac;:CSes provocadaspelos, brac;:oscarinhososquenos enlac;:am.Aluzexcessivanosirrita,enquantoa penumbratranquiliza.0somestridenteouurn gritonosassustam,masacanc;:aodenlnarembafa nossosono.Umasuperf(cieasperadesagrada,no entanto,0toquemaciodemaosou deurnpano comoque - seintegrama nossapele.E0chei ro dopeitoeapulsac;:aodequemnosamamenta ouabrac;:apodemserconvitesa satisfac;:aoou aorechac;:o.Comec;:amosassimacompreender,a darsentidoaoqueeaquemnoscerca.Esses tambemsaoosprimeirospassosparaaprendera ler. Trata-sepoisdeurnaprendizadomaisnatural Maria Helena Martins pensar,mastaoexigentee exocomoapr6priavida.Fragmentado mesmotempo,constantecomonossas deconfrontocomn6smesrnose odo. ronovamentePauloFreire:"ninguem ninguem,comotampouconinguemse a,simesrno:oshornensseeducamem - ,mediatizadospelomundo".Paro-.....h..netambemousandodivergirnestecaso, sepoderiadizer:ninguemensinaninguemaler; """"',,-,"'izadoa,emultimainstancia,solitario, rasedesencadeieesedesenvolvanaconvi-- - comosoutrosecom0mundo.Exagero? tanto. estudosdalinguagemvemrevelando,cada commaiorenfase,queaprendemosaler . dosprofessores;que,paraaprenderaler . reender0processodaleitura,naoestamos s,temosdefazeralgumas sozi nhosenecessitamosdealgumaorien-masumavezpropostas unifor-miz:ac:ias,etasnaorarocausammaisconfusiodo auxiliam. bemasinterdisciplinaresvem erideflCiando,rnesmonaleituradotextoescrito, serapenas0conhecimentodaI (nguaque ,esimtodoum . sistemade inter- eentre'asvariasareasdoconhecimento eda expressaodohomem e das suas circunstancias o que eLeitura Mas"0 que inois 0intrigava eram as jigurinhizs desenhizdas ' embaixo das imagens,e que provavelmente deveriam ser insetos. 13 MariaHelena Martins - _ Enfim,dizemospesquisadoresdalingua-crescenteconvicc;:ao:aprendemosaler Ediria vivendo. ,fazpensarque0aprendizadodeTarzan - Siejapuraobradaimaginac;:aodeEdgarRice OFrrI.... .....hc.Aosdezanos,remexendonosescom-da cabana de seu falecido pai, 0garoto-macaco comalgunslivros,eteveseusprimeiros ......nt:ltnc::coma palavraimpressa,atravesdeuma it_ Tentoudeinlciopegarasimagensque iustravam,percebendoentaoseremapenas representaf;Oesdas . figurasreais.Mas"0quemais _ .eramasfigurinhasdesenhadasembaixo gens,equeprovavelmentedeveriamser desconhecidos . ..Variostinhampernas, lemnenhumdescobriabocaseolhos".Nao - aginarqueessessinaisfossemasletras atfabeto.Observandoerefletindo,percebeu poucosarelac;:aoentreos"insetozinhos"e gensqueosacompanhavam;elesnaoeram nume rosos,repetiam-sevariasvezes.Assim, Utarefaextraordinaria",aprendeualer - sempossuiramenornoc;:aodasletras,nemda agemescrita,semmesmosaberqueessas coisas existiam". Fasci nante!Imposslvel,diriamosmaisceticos. efato,numacrianc;:adesdeurnanadeidade semoontatocomacivilizac;:aotalfac;:anhaparece apenascoisade ficc;:ao.Masosinumeros escritores queremrecriadoaaprendizagemdaleituraquase o que eLeitura sempreapresentam-naintencionalmente como alga magico,senaoenquantoato,enquantoprocesso dedescobertadeurnuniversodesconhecidoe maravilhoso. Certamenteaprendemosalerapartir donosso contextopessoal.Etemosquevaloriza-Iopara poderiralemdele.EsseorecadodeSartreem seurelatoautobiografico,noqualapresenta'uma perspectivamais realista,mas naomenos fascinante dainiciac;:aoa leitura: "Apossei-medeurnlivrointitulado'deumchinesna ' Chinae0transporteiparaurn quarto de despejo; aI,empoleirado sobre umacama dearmar,fizdecontaqueestavalendo:seguia comosolhos aslinhasnegras semsaltar umaunica emecontavaumahist6riaem vozalta,tomando ode. pronunciartodasassnabas.Surpre-enderam-'me- oumelhor,fizcomqueme surpreendessem-, gritaramadmirados e decidiram quetempodemeensinar0alfabeto.Fui zelosocomourncatecumeno;iaapontodedar amimmesmoaulasparticulares:eumontavana minhacamadearmarcom0SemFamlliade HectorMalot,queconheciadecore,emrecitando,empartedecifrando, . percorri-Ihe todasaspaginas,umaap6soutra: quando a ultima foivirada, eu sabialer. "Fiqueiloucodealegria:eramminhasaquelas vozessecasemseuspequenosherbarios,aquelas vozesquemeuavoreanimavacom 0olhar, que ele 15 Maria Helena Martins eeunao!Euiriaescuta-Ias,encher-me-ia discu rsosceri moniososesaberiaOeixa-vagabundearpelabibliotecaeeudava a sabedor iahumana.Foielaquemmefez ncaesgaravateiaterranemfarejeininhos, - herborizeinemjogueipedrasnospassarinhos. oslivrosforammeuspassarinhosemeus ....., ..tvIOC.meusanimaisdomesticos,meuestabuloe abibliotecaera0mundocolhido espelho;t inhaasuaespessurainfinita,asua - eea suaimprevisibilidade.EumeiYe's aventuras: erapreciso escalar as cadeiras, ne;ascom0riscodeprovocaravalanchesque sepultado.Asobrasdaprateleira ............ . ...ficarampermuitotempoforadomeu outras,maleuasdescobri,meforam anmaudasdasmaos;outras,ainda,escondiam-se: as apanharaumdia, come.;ara aIe-las, acreditava repostonolugar,maslevavauma reencontra-Ias.TiveencontroshOrrlvels: umalbum,topavacomuma.prancha. em insetoshorr(veispulavamsobmmha rDeitadosobre0tapete,empreendiaridas at ravesdeFontenelle,Arist6fanes, ais:asfrasesresistiam-meamaneiradas coisas;cumpria obsenia-Ias,rodea-Ias, fingirque me atastavaeretornarsubitamenteaelasdemodoa reende-l asdesprevenidas:namaioriadas vezes, amseusegredo." Ait emesduassintesesliterariasdoprocesso o que eLeitura deaprendizagemdaleitura;umaaltamente ficcio-nal,outraautobiografica.Ambasevidenciama curiosidadesetransformandoemnecessidadee esfor.;oparaalimentar0imaginario,desvendar ossegredosdomundoedaraconhecer0leitora simesmoat ravesdoqueIeecomoIe.Emboraos exemplosserefiramaotextoescrito,tanto BurroughsquantoSartreindicamque0conhe-cimentodaI(nguanaoe suficienteparaaleitura seefetivar.Naverdade0leitorpre-existea descobertadosignificadodaspalavrasescritas; foi-seconfigurandonodecorrerdasexperiencias devida,descleasmaiselementareseindividuais asoriundasdointercambiodeseumundopessoal eo universo sociale cultural circundante . Quandocome.;amosaorganizarosconheci-mentosadquiridos,apartirdassitua.;oesquea realidadeimpoeedanossaatua.;aonela;quando aestabelecerrela.;oesentreasexpe-rienciaseatentarresolverosproblemasquese nosapresentam- a (entaoestamosprocedendo leituras,asquaisnoshabilitambasicamentealer tudoequalquercoisa.Esseseria,digamos,0lade otimistaeprazerosodoaprendiiadodaleitura. Oa-nosaimpressaode0mundoestaraonosso alcance;naos6podemos compreende-Io,conviver comele,masatemodifica-Ioa medidaqueincor-poramos experiencias deleitura. Naoobstante,emnossatrajet6riaexistencial, interpoem-seinumerasbarreirasaoatedeler. . 17 MariaHelena Martins .... o, desdecedo,veem-secarentesdeconv(vio. ooucom sociaisrestritas,quando condic;:Oesdesobrevivenciamateriale cult.ural saoprecarias,refreandotambemsuas expectatlvas, pessoastendematersuaaptidaoparaler menteconstrangida.Naoquesejamincapazes. pessoascomgravesdisturbiosdecarater AquestaoafestaJigadaas IQi5es de vida, an(velpessoale socIal. E981,realizou-seumapesquisasobre "Tele-,eComunicac;:aoPublicitarianoMeioRural". ns dosdepoimentoscolhidos entremoradores ' ordoEstadodeSaoPauloforam divulga-peIaRevistaIsto.Umamulher(37anos, casadadoisfil hos,trabalhadorana moradora dissearespeitodatelevisao:UPara televisaotem q ue...saberler.Eunaosei errtao nao en tendo Essaaparentementesemsentido, - transpareceruma16gica,revelando .um ' pn Jt2SS0dereflexaoacercadaleitura.Eisso,em .-........,.".,il'lS't3ncia, demonstra tratar-se de alguem que pr.ibI;a'0atodelernoseucotidiano: temcondi-emboraprecarias,de dar sentido as coisas,no ."..,.ih:a1Ih0navidadomestica,nas humanas. ""n____aocondicionaraleituradaTValeitura escrito,assemelhandoalinguagemdas adossignoslingiHsticos,rompecoma ........1"I'V"I.nrtamentousualqueveambasaslinguagens irvtArloAndentesetambemexigindocapacidades o que eLeitura diferentesparacompreende-Ias.Sua nessesentido,seaproximadadaleitura propostaaqui.Outrainferenciadoraciodnio expressoestanaimpormnciadadaaleiturada escritacomoponteparaoutroentendimento,0 que e comum amaio riadaspessaas. Seriadeseperguntar-emquemedida . essa mulhervesuacapacidade dedarsentidoascoisas bloqueadapelo seu analfabetismo equala extensao desua diantedisso.Comoteriaacres centadoque"quandocompreende,esquecelogo", tem-sea(umdado elucidativo: 0que seIhe oferece paralernatelevisaopoucoounadasignifica Raraela,issonaochegaafixarnamemoria; seuuniversodeinteressese outro,outrasassuas necessidades reais ou de fantasia. Apsicanaliseenfatizaquetudoquantodefate impressionouanossamentejamaise esquecido, mesmoque muitotemponaobscuri -dadedoinconsciente.Essaevidencia a importanciadamem6riatantoparaavidaquante paraaleitura.Principal menteadapalavraescrita - da(adosaberlereescrever-, ja quesetratadeumsignoarbitrario,nao disponivel nsnatureza,criadocomoinstrumentodecomu- registrodas humanas,das e doshomens;transformadocom frequenciaeminstrumentodepoderpelosdomi-nadores,mas que pode tambem vir a ser a dos dominados. 19 MariaHelena Martins ' tedisso,tambempoderfamosperceber0 ecimentocomournmecanismodedefesa. comoaaprendizagememgeraledaleitura particularsignificaumaconquistadeauto-- , permite a ampliac;:aodos horizontes,implica menteurncomprometimento,acarretaalguns Estesul t imos,emgeral,estabelecema c1eSlXl,nTlJanc;a.Inco nscientementeaquelaIeitora achemel hornementender(ler),porque - ITlCari aparaelanovasexigencias,ruptura a passividade, enfrentamento de umasituac;:ao, causar-Ihemaioresfrustrac;:oesemface idade.Eesta,possivelmente,elaconsidere r.....n f':!ivPLoucujasperspectivasdemodificac;:ao ,-""2ri,,,rn,aseuver,muitoalemdeseualcance p:!!iSOaJou de seugrupo social. Esseti poderesposta,adenaoquererler,vern ntrodosinteressesdasminoriasdominan-orcerto,naoestimuladaabertamente;ao ,-0os"sabedoresdascoisas",naaparencia, prontosaensinaraler.Soquea o.Essedesafioosindivfduoseassocie-carentes-comoanossaprecisamaprendera ..rnh1Plm,comec;:andoalerporcontapropria, aduraspenas; exercitando sua , sedeixandoiludirpelaaparentegratUidade pequenascoisasdavida,porque 'elas,em ,-rnainstancia, fazema nossahist6ria. Comexemplosdeleitorestaodiferenciados - naprimeirainfancia,Tarzan,Sartre, o que eLeitura mulherdaroc;:a- 0prop6sitofoienfatizaralgo sempreinfluentenoatedeler:ainterac;:ao , das condic;:5esinteriores(subjetivas)edasexteriores (objetivas).Elassaofundamentaisparadesen-cadearedesenvolveraleitura.Sejaquemfor0 leitor,0atedelersempreestaraligadoaessas condic;:oes,precarias ouideals. 21 AMPLIANDO A DELEITURA conceitodeleituraestageralmente restrito daescrita,suaaprendizagem,no _-=m"",,,Hga-seportradil;aoaoprocessode ..globaldoindiv(duo,a suacapacital;ao oonv(vi oeatual;oessocial,pol (tica,econo-ecultural .Saberlereescrever,jaentre ,...,..",.,.."...,eromimos,significavapossuirasbasesde I adequadaparaavida,educal;ao visavanaos6aodesenvolvimentodas a:;a:i-idadesintelectuaiseespirituais,comodas fisicas,possibilitandoao cidadaointegrar-entea sociedade,nocasoa classedos res,dos homenslivres. -m,sesaberlertextosescritoseescrever ojeealgoaquenaoseternacessonatu- (0analfabetismopersistemesmoem isesdesenvolvidos),entreosantigosera o que e Leitura depouqulsslmos.E0aprendizadose baseavaemdisciplinar(gida,pormeiodemetoda anallticocaracterizadopeloprogressopassea . passe: primeiro, decorar 0alfabeto; depois,soletrar; porfim,decodificarpalavrasisoladas,frases,ate chegaratextoscontinuos.0mesmometodo sendo aplicadopara a escrita.. Apesardeseculosdecivilizal;ao,ascoisashoje naosaomuitodiferentes.Muitoseducadoresnao conseguiramsuperarapraticaformalistae meciinica,enquantoparaamaioriadoseducandos aprenderalerseresumea decorebadesignos Iing(Hsticos,pormaisquesedoureap(lulacom metodossofisticados e supostamente desalienantes. Prevaleceapedagogiadosacriflcio,doaprender poraprender,semsecolocar0porque,comoe paraque,impossibilitandocompreenderverda-deiramenteafunl;aOdaleitura, 0seupapelnavida do indiv(duo e da sociedade. Tambemesabidoquenenhumametodologia dealfabetizal;ao,ounao,levaporsis6 a existenciadeleitoresefetivos.Umavezalfabe-tizada,amaioriadaspessoasselimitaa leitura comfinseminentementepragmaticos,mesmo suspeitandoquelersignificainteirar-sedomundo, sendotambemumaformadeconqiJistarauto no-mia, de deixar de "ler pelos olhos de outrem". Oa(0habitodelerlivros,emespecial,ser mistificado;considerarem-seosletradososunicos capazes,sejadecriarecompreenderalinguagem 23 MariaHelena Martins istica,sejadeditarleis;estabelecernormase ressociaiseculturais.Issodefatodetermina ........ rlivasdif(ceisdeseabrirmao,poissao .rrt",,",onI'iiadoras,indfciosdequesepertenceauma Cabendoaessaminoria0"direito"dedar aomundo,enquantoaosdemC!isrestaa issaoaosditames dos que "sabem das coisas". ndo0intelectualsedebruc;:asabre 0iletrado auxilia-Ioaaprender,inevitavelmenteemerge patemal ismo.Poremnaoensina0pulodogato, eat eafseuaitrulsmonaochega. do .,essepulo,tudoindica,naose ensinamesmo. e-se,istosim,limpar0terrenoou,nahip6tese quiavelica, reforc;:arseus acidentes. Dequalquerformaprevalecea"culturado -1 - cio" :"se0educadore 0quesabe,seos edcandossaoosquenadasabem,cabeaquele da ,entregar,levar,transmitir0seusaberaos ndos" .E,aodenunciarisso,PauloFreire amaaatenc;:ao"dosverdadeiroshumanistas para0fatodequeelesnaopodem;nabuscada servir-sedaconcepc;:ao'bancaria'[a edcac;:aoe'doac;:ao','favor']'sobpenadese contrad izerememsuabusca".Nessecasopredo-mi naa visao de cultura dointelectualouda cultura queIheparec;:aconvenientetransmitiraoiletrado, desrespeitando-ofrontalousub-repticiamente. estaultimahip6teseseinsereumadasquestoes maisdiscut idasecontrovertidasdenossotempo: aculturademassa,suamanipulac;:aoecon-o que e Leitura sumo. \ *** Paraabrirperspectivasquemmlmlzemesses problemas,muitoseducadoresapregoamanecessi-dadedaconstituic;:aodohabitodeler.Aleitura seriaaponte para 0processo educacional eficiente, proporcionandoaformac;:aointegraldoindiv(duo. Todavia,ospr6prioseducadoresconstatamsua impotenciadiantedoquedenominama"crisede leitura".Masque"crise"eessa?Pareeles,em maioria,ela .significaaausenciadeleitura de texto escrito,principal mentelivros,jaquealeitura' num sentidoabrangenteesta , maisoumenosforade cogitac;:ao. Seriapreciso,assim,investigarosinumeros fatoresdeterminantesdessasituac;:ao,entreos quaisressalta0dealeitura,comoemregraa entendem,estarlimitadaa escola,comautili-zac;:aopreponderantedoschamadoslivrosdida-ticos.Como,principalmente no contextebrasileiro, aescolae 0lugarondeamaioriaaprendealere escrever,emuitostemsuatalvez(micaoportu-nidadedecontatocomos livros,estes passam aser identificadoscomoslivrosdidaticos. Essestextoscondensados,supostamentedige-r(veis,daoailusaodetornarseususuariosaptos aconhecer, apreciar eate ensinar asmais diferentes disciplinas.Naverdaderesultamemmanuaisda 2S Maria Helena Martins -ncia;maisinibemdoqueestimulam0gosto _ Elaboradosdemodoati-ansmitir uma visao . do conservadora,repressiva, tais livros estao etosdefa lsasverdades,aservic;:odeideologias = rrn'''I'1"':> rl as,mesmoquandomascaradospor rsosformaisoutematicosatuaisenaoconser-. res_Subjazaintenc;:aodemanipularaleitura, pontodeseusorganizadoresdeturparemos transcritos,numfrancodesrespeitoaos ' reseleitores,sob0pretextoderesguardar . (piosditosinabalaveis,masquearealidade inconsistentes. justificativamaiordosorganizadoresdos didaticos,entretanto,serevestedeesplrito - -ernlfico":anecessidadedeviabilizar0desen--mentodecapacidadesespeclficas,desimplifi-assuntosdemasiadocomplexos.Quantoa o ~ educadores,muitosconsideramtaislivrosum Inecessario"diantedeevidentesproblemas caratereconomico,deficiencianaforma9ao professores,napr6priaestruturadoensi'no rasileiro.E,enquantoaeducac;:aoformalvai .raguaabaixo,a"mafiadolivrodidatico", comoacaracterizaOsmanLinsr prosperafranca-e.Resultadode polltica educacionale sistema s6cio-economico,nomlnimo, desastrosos. Encobre-se,dessemodo,0receiode urndialogo , espontaneoecr(ticoentre0professore' 0alunoe deamboscomseumaterialde trabalho,bloquean-dooportunidadesrarasderealizarem-seleituras o que e Leitura efetivas,consequentes;desedesenvolveremverda-deirosleitores.Ha,portanto,urnequ (voco debasequandoeducadoresfalamem"crisede leitura";algodesfocadoemrelac;:aoanossa realidade. o Brasil,emtermosde publicac;:5es,distribuic;:ao evendadematerialimpresso,principal mente livros,deixamuitoadesejar.Quanto abibliotecas, nemsefala.Masaofertavemaumentando,inclu-siveaprec;:osacesslveisacamadasmaisamp las dapopulac;:ao.0volumedeexemplaresvendidos emedic;:5espopularescresce,revelandoque, mesmoemterm osdeleituradelivros,a"crise" naosedatantodevidoa faltadoqueler,aos' prec;:osaltos,a poucaqualidadedomaterial,ou mesmopelainexistencia de leitores. Aquestaoe maisamplaecomplexa:vemda precariedadedecondic;:5ess6cio-economicasese espraianaineficienciadainstituic;:aoescolar, determinandoelimitandoopc;:5es.Semduvida,a concepc;:aoqueliga0habitodeleituraapenasaos livrosdeve~ m u i t oainfluencia,persistenteno nossosistemaeducacional,deumaformac;:ao eminentementelivrescaedefasadaemrelac;:ao arealidade,aindafomentadapelaescolastica cristaqueorientouosjesu (tas,osprimeiros educadoresnoBrasil.Ademais,devemuitoa ideologiaburguesa,quebuscanaelitizac;:aoda culturameiosdeperpetuarseudomlniosocial, pol (tico, economico. 27 MariaHelena Martins oqueeconsideradomateriadeleitura,na esco,estalongedepropiciaraprendizadotao - eduradouro(sejadequeespeciefor)como 0 desencadeadopelo cotidiano familiar,pelos colegas :9Os,pelas diversoes e atribuic;;oes diarias,pelas r ca.;:oesdecanherpopular,pelosdiversos decomunicac;:aodemassa,enfim,pelo ntextogeralemqueosleitoresseinserem. extoessepermanentemente aberto ainumeras ras.Naoedeadmirar,pois,apreferenciapela radecoisasbemdiferentesdaquelasimpostas saladeaula,semacobranc;;ainevitavel,em Ipormeiodasexecraveis"fichasdeleitura". esconsiderandoessarealidade,aescolacorre 0 de estarpreparando crianc;;ase jovens(mesmo I egiadospor conseguiremchegare permanecer que vaoenvelhecersemcrescer,casocontarem .comela.E,obviamente,esseprocessoocorre comindiv(duosquantocominstituic;oes. outraspalavras,0tiropodesairpelaculatra. A emdomais,seriacontra-sensoinsistirna - portanciadohabitodelerrestringindo-oaos , ou,quandomuito, a textos escritos em geral. ssoimplicaalijardaexperienciadeleituraos il5esdeanalfabetosespalhadospelopaisou il etradosquenaocostumamternaescritasua ferenciacotidiana.Sobretudoquandosesabe 'lousedeveriasaber)que,paramodificaresse quadro,saonecessariasreformulac;;oesexpressivas sistema es6Cio-cultural, o que eLeitura demodoapermitiremmelhoriaefetivade condic;;oesde vida daimensamaioria desfavorecida. Soluc;;oessimplificadorasoudemag6gicaspara questoestaocomplexasresultaminoperantes. Fundamentaleque,conhecendooslimitesdesua ac;;ao,oseducadoresrepensemsuapraticapro-fissionalepassemaagirobjetivaecoerentemente emfacedosdesequil (briosedesafiosqueareali-dade apresenta. Temos,entao,maisummotiveparaampliara nOC;;aodeleitura.Vistanumsentidoamplo,inde-pendentedocontexteescolar,eparaalemdo textoescrito,permitecompreenderevalorizar melhorcadapassodoaprendizadodas coisas, cad a experiencia.Incorpora-se,assim,aocotidianode muitos0quegeralmenteficalimitadoaumapar-celaminimadasociedade: ao ambito dos gabinetes ousalasdeaulaebibliotecas, amomentos de lazer oudebuscadeinformac;;aoespecializada.Enfim, essaperspectivapara0atedelerpermitea ' descobertadecaracter(sticascomunsediferenc;;as entreosindiv(duos,grupossociais,asvariascultu-ras;incentivatantoafantasiacomoaconsciencia darealidadeobjetiva,proporcionandoelementos paraumaposturacr(tica,apontandoalternativas. Mas ampliara noc;;aode leitura pressupoe transfor-mac;;oesnavisao de mundo em geralenade cultura emparticular.Issoporqueestamospresosaum conceitodeculturamuitoligadoa produc;;aoescri-ta,geralmenteprovindadotrabalhodeletrados. 29 MariaHelena Martins realidade,entretanto,nosapresentainumeras .- culturaisoriginariasdascamadas - .norantesdopovoecujafort;:asignificativa ,feitoperdurarseculos.Da(anecessi-desecompreendertantoaquestao daleitura ". .""menadaculturaparaalemdoslimitesqueas ""OU UUI , t;: Oesimpuseram. Seriapreciso,entao,consideraraleituracomo processode compreensao de expressoesformais e- M/icas,naoimportandopormeiodeque lUJyu..r:Igt'lJAssim,0atedelersereferetantoa escritoquantoaoutros tiposdeexpressao do humano,caracterizando-setambemcomo ntecimentohist6ricoeestabelecendouma _ ::w-.:-in. igualmentehist6ricaentre0leitore0que Sugerindoumavisaomaisampladanot;:aode - ra',abroquestoescujasrespostasnaotenho, pretendoencontraraqui.Elassaocolocadas comourndesafio,porqueestamosinapela-ntecondicionadosa perspectivadacultura a relat;:aoleitura-escrita.Masessadelimi-doatodelerimpededeseeng lobarno. processoumaseriedeaspectosquearealidade .ia,assimcomoelitizaaleituraeaescrita, enquantoprivilegio:"eaconquista privilegio,comsuasubsequentedemocrati-za,;:3oenegat;:aoenquantoprivilegio,eumaneces-imperiosaparaasclassessubalternas", meobservouFlavioAguiar.Ele,como I o que e Leitura certamentemuitosoutros,simpatizacomminha proposta,emborafiquepoucoa vontadeemseu "contra-forte deletrado".. Da(serprecisenaos6revelarainsatisfat;:ao quantoaoslimitesdenOt;:oesestratificadaspelos seculos,comotambemousarquestiomi-Ias, aventando alternativas . *** Asinumerasconcept;:oesvigentesdeleitura, grossomodo,podemsersi ntetizadasemduas caracterizat;:oes: 1)comoumadecodificat;:aomecanicadesignos lingu(sticos,pormeiodeaprendizada estabelecido apartirdocondicionamentoestlmulo-resposta (perspectivabehaviorista-skinneriana); 2) comournprocessodecompreensaoabran-gente,cujadinamicaenvolvecompohentessenso-ria is,. emocionais,intelectuais,fisiol6gicos, neurol6gicos,berncomoculturais,economicose pol (ticos(perspectiva cognitivo-socioI6gica). Conformeasinvestigat;:oesinterdisciplinares vern apontando,estaultimaconcept;:aodacondit;:oes deumaabordagemmaisamplaemesmomais aprofundadadoassunto.Porcertocadaareado conhecimentoenfatizaurnaspectomas,naose propondodelimitat;:oesestanques,estaabertaao intercambiodeinformat;:oeseexperiencias.Alem disso, 0debate "decodificat;:aoversus compreensao" 31 = Maria Helena Martins pareceestarseesvaziando.Ambassao e'ra.Decodificarsemcompreendera!nutll; ' copreendersemdecodificar,imposslvel.Ha e sepensar aquestao dialeticamente. despeitodetodasastentativas deumavisao emet6dica,senosperguntarmos0 e, 0quesignificaaleituraparan6smesmos, certamentecadaurnchegaraaurnaresposta enciada.1550porquesetrata,antesdemais a,deumaexperienciaindividual,cujoslimites estaodemarcadospelotempoemquenos emosnossinaisoupeloespaf;oocupadopor es..Acentue-seque,porsinais,entende-seaqui aJquertipodeexpressaoformalousimb6lica, configuradapelasmais diversas linguagens.. FrankSmith,psicolinguista estudandoaleitura,mostraquegradativamenteos pesquisadoresdalinguagempassam - urnprocesso,noqual0leltorpartlclpa coumaaptidaoquenaodependebasicamente esua capacidade de decifrar sinais,mas sim de sua capacidadededarsentidoaeles,compreende-Ios. esmoemsetratandodaescrita,0procedimento estamaisligadoa experienciapessoal,a vivencia decadaurn,doqueaoconhecimentosistematico daI(ngua.. Aleituravai,portanto,alamdotexto(sejaele alfor)ecomef;aantesdocontatocomele. oleitorassumeurnpapelatuante,deixadeser decodificadoroureceptorpassivo.E0 o que eLeitura contextogeralemqueeleatua,aspessoascom quemconvivepassama . terinfluenciaapreciavel emdesempenhonaleitura.Isso porque0dar sent/do a um textoimplica sempre levar em conta a situaf;aodessetextoedeseuleitor.EanOf;aode texto.aquitambernaampliada,naomaisfica restritaaoqueestaescrito,masabre-separa englobar diferentes linguagens. . Considerandoascolocaf;oesacima,aleitura. se' realizaapartirdodi;i/ogodoleitorcom0objeto - sejaescrito,sonoro,sejaumgesto,uma umacontecimento.Essedialogoarefe-rencladopor urntempo e urnespaf;O,uma situa(fao; desenvolvidodeacordocomosdesafioseas respostasque0objetoapresenta,emfunf;aode expectativasenecessidades,doprazerdas descobertasedo : reconhecimentodevivencias doleitor.Tambem0sustentaaintermediaf;aode outro(s)leitor(es).Alias,0papeldoeducador nainterrnediaf;Bodoobjetolidocom0leitora cadavezmaisrepensado;se, da posturaprofessoral lendoparae/oupe/oeducando,elepassaraler com,certamenteocorrerao intercambiodas leituras,favorecendoaambos,trazendonovos elementos paraurne outro. 33 Adinamicadoprocessoe pois de talordem que consideraraleituraapenascomoresultadoda texto-Ieitorseriarequzi-lci : considera-velmente,apontodesearriscarequ(vococomo pensarqueurnmesmoleitorlendoum MariaHelena Martins tex:to,naoimporta quantas vezes,sempre realizaria rnamesmaleitura.Naoprecisaserespecialistano assuntoparasaber0quantoaspessoaisounao(uma dor de cabec;:a,umarecomen-m.;:aoacatadaouimposic;:ao,urnconflitosocial) podeminfluir nanossaleitura. Emfacedisso,aprenderalersignificatambem aprenderaler0mundo,darsentidoaeleean6s roprios,0que,maloubern,fazemosmesmo sem set'ensinados.Afunc;:aodoeducadornaoseria eci samenteadeensinaraler,masadecriar codic;:oespara0educandorealizarasuapr6pria arendizagem,conformeseuspr6priosinteresses, necessidades,fantasias,segundoasduvidase exigenciasquearealidadeIheapresenta.Assim, jarcondic;:oes '\. deleituranaoimplicaapenas aJfabet izaroupropiciaracessoaoslivros.Trata-se, es,dedialogarcom0leitorsobreasualeitura, e,sabre ' osentidoqueeleda,repito,aalgo escrito,urnquadro, umapaisagem,a sons,imagens, coisas,ideias,situac;:oesreaisouimaginarias. Enquantopermanecermosisoladosnacultura . etrada,naopoderemosencararaleiturasenao comoinstrumentodepoder,dominac;:aodosque sabemlereescreversobreosanalfabetosou iletrados.Essareal idadeprecisaseralterada.Nao eseproponha0menosprezopelaescrita- isso , ser-iatolice-,ela,emultimainstancia,.nos oportunizacondic;:oesdemaiorabstrac;:ao,de reflexao.Importa,antes,comec;:armosavera .0que e.Leitura leituracomoinstrumentoliberadoreposslvelde serusufru Idoportoqos,nao apenas pelos letrados. Se0papeL, doeducadorpareceuaquiem ' evidencia,elefol trazidoa bailaparasercolocado emseudevidolugarecompreendidonaoneces-sariamentecomo0 'doespecialistaemeducac;:ao 01..1doprofessor,mascomo0deurnindiv(dLJo letradoquesabealgoesepropoeaensina-Ioa alguem.Importamuitoseterbernpresentea ideiadequeissodele'r,elerbern,dependemuito den6smesmos,dasnossascondic;:oesreaisde existencia,maisdoquepodem(ouquerem)nos fazercreros"sabedoresdascoisas".Alias,essas condic;:oesvaoinclusiveorientarpreferenciase privi legiarurndeterminadon(veldeleitura,como se veraa seguir. .,. 35 o ATODELER EOSSENTIDOS, ASEMO(;OESEARAZAO Como afirmeide inicio, estou apenas pensando e geri ndoreflexoesace rcadaquestaodaleitura. - pretendochegaradefini90es,aconceitua90es . mit ivas,tampoucoapresentarregras oureceitas. prop6sitoecompreenderaleitura,tentando it ifica-Ia,pormeiode umaabordagem despre-iosamasquepermitaavaliaraspectosbasicos processo,dandomargemaseconhecermais oroprio ate de ler. E.ssesaspectosserelacionama pr6priaexistencia omem,incitandoafantasia,0conhecimento e areflexaoacercadarealidade.0leitor, entretanto, sedetemnofuncionamentodoato deler, int:ri ncadatramadeinter-rela90esqueseesta-ecem.Todavia,propondo-seapensa-Io,perce-,aconfigura9aodetresn(veisbasicosde o que eLeitura leitura,osquaissaoposs(veisdevisualizarcomo nlveissensorial,emocionaleracional.Cadaurn dessestresn(veiscorrespondeaurnmodode aproxima9aoaoobjetolido.Comoaleiturae dinamicaecircunstanciada,essestresnfveissao inter-relacionados,senaosimultaneos,mesmo sendoumououtroprivi/egiado,segundoaexpe-riencia,expectativas,necessidadeseinteressesdo leitoredascondi90esdocontextegeralemque seinsere. Percorrendoumafeira,urnbricabraque,urn . museuouurnantiquario,certamenteassaltam-nos asmais variadas sensa90es, em090es e pensamentos. Talvezpeloins61itodoconjuntodeobjetos observados,dolugaremqueseencontram,nos detenhamosmaisaolha-Ios.Cadaindividuo reagiraaelesdeurnmodo;iraIe-losaseumodo. Eu,par exemplo,as vezesnaoresisto a tenta9ao de toea-los,cheira-Ios, faze-los funcionar.Emcertas ocasioesmedeprimem,comonummercadode quinquilhariasounum brique, onde cada coisa teve suahist6riaparticulareacabounavalacomum, nasmaosdequempossivelmenteignorapor completosuatrajet6ria.Noutroscasos,assume umaposturadereverenciaeencantamentodiante deurnobjetoconsagrado:ummanuscrito de autor notavel,umacadeiraquepertenceuaalguem famoso,urnoriginaldequadrohamuito admirado apenasat ravesdereprodu90es.Ocorremtambem osmomentosemquemedescubrop ~ n s a n d o0 37 MariaHelena Martins porquedaexistenciadetaisobjetos,quaisas ie ~ e sdesuacriac;:ao,suc!finalidade,0quede osignificaramparaseuscriadores epossuidores, rornoserelacionamcom0momentahist6rico-'ale0lugaremqueforamcriados,qualseu seidoparamimepara0mundoemquevivo. Emcadaurndessescasos,como emmuitlssimos os,est ourealizandoleituras,dandosentido coisas,aspessoasligadasaelas;aotempoe espac;:oqueocuparameocupameaminharelac;:ao issot udo.Estoutendocommeussentidos, .hasemoc;:oes,meuintelecto.5erecorroaqui mexamplot aopessoale paranaogeneralizar .ocadamentequantoapreferencias.De aJquermodo,tem-seatumaideiainicialdos iisdeleitura.Alemdisso,ficaeyidenciado algo ameuverfundamental:sealeituratemmais -steriosesutilezasdoqueameradecodificac;ao palavrasescritas,temtambemumladede plicidadequeosletradosnaosepreocupam .' 0emrevelar.. intem;:aoaquie deumaaproximac;:aopor esseangu lodosn(veisbasicosdoprocesso.Ha - merasmaneirasdecaracteriza-Ioseestuda-Ios. eipelosaspect osquemeparecemmais .ent es,longedequereresgotar aspossibilidades abordagemdotema.Pelocontrario,trata-se wnainiciac;: aoaele.Alias,cabeobservar:par-destaparaoutrasreflexoes,encontrar-se-ao concepc;:5esarespeitoden/veisdeleitura. o que eLeitura Cada coisateve sua hist6ria particular e acabouna vala comum, nas maos de quem possivelmente ignora por completo suatrajet6ria. 39 40MariaHelena Martins ,Praticamentecada estudiosoternumaVI sao diferenciada,talvez parserquestaocadavezrna is repensadaeacrescidadenovas- perspectivas,0 quesempreaumentaaspossibilidadesdecom-preende-Ia. Leitura sensorial Avisao,0'tato,aaudic;ao,0olfatoe0gosto podemserapontadoscomoosreferenciaismais . elementaresdoatedeler.0exemplo,visto anteriormente,dosmomentosiniciaisdarelac;ao d13crianc;acom0mundoilustraaleitura sensorial. Decertaformacaracterizaadescobertado universoadultonoqualtodosn6sprecisamos aprenderaviverparasobreviver.Naosetratade umaleituraelaborada;eantesumarespostaime-diataasexigenciaseofertasqueessemundo apresenta;relaciona-secomasprimeirasescolhas emot ivaasprimeirasrevelac;oes.Talvez,porisso mesmo , Rlarcantes. .Essaleiturasensorialcomec;a,pois,muitocedo enosacompanhaportodaavida.Naoimporta semaisoumenosminuciosaesimultaneaa leitura emocionaleracional.Emboraaaparentegratui-d a d ~deseuaspectoludico,0jogocomedas imagensecores,dosmateria is,dossons,dos cheirosedosgostosincita 0prazer,a busca do que o que eLeitura. agradaeadescobertaerejeic;aododesagradavel aossentidos.Eatravesdessaleituravamo-nos revelando tambem paran6smesmos. Emsuasmem6rias,EricoVerfssimociamais vidaesignificac;aoaessascoisasdequeestamos falando:"Estouconvencidodequemeuprimeiro contatocomamusica,0canto,0contoea mhologiaseprocessOuat ravesdapiimeiracantiga de acalanto que me entroupelos ouvidos, sem fazer sentidoemmeucerebro,e6bvio,poisaprinc(p' o aqueleconjuntoritmadodesonsnaopassavadum narc6ticoparameinduziraosono.Essacanc;ao deninarfalavadoBichoTutu,queestavano telhadoeque desceriaparapegar0menino se este aindanaoestivessedormindo.Masseelejaesti-vessepiscando,comaareiadosononosolhos,a letradacantilenaeradiferente:umaadvertencia aoBichoTutuparaquenaoousassedescerdo telhado,poisnessecaso0paido menino mandaria mata-Io.Ea(temossemduvidauma.efabulac;ao ou est6ria, umamelodia eumelemento mitol6gico. Amasecriadasencarregaram-sedeenriquecera galeriamitol6gicadacrianc;a,contando-Ihe est6rias fantasticas,de carater francamente sadomasoquista, comoaqueladamadrastaquemandouenterrar vivasastresenteadas.(Ouc;oumavozremota exclamar:'Xo,xo,passarinho!.. . ')Dessahist6ria dasmeninasenterradasCapineirode meupai/naomecortesoscabelos /minhamae mepenteou /minhamadrastameenterrou. . . Mtiria Helena Martins - guardomais0terrorque elameinspirou do que oseu enredo.Poressa epoca a crianc;:ajacaminhava, earitamagneticadesuamem6riaestavaainda praticamentevirgem,prontapararegistraras impressoesdomundocomsuaspessoas,animais, coisas e misterios". Aleiturasensorialvai,portanto, dando a conhe-ceraoleitor 0que ele gosta ounao,mesmoincons-cient emente,semanecessidadederacionalizac;:oes, justif icativas,apenasporqueimpressionaavista,0 ouvido,0tato,0olfatoou0paladar.Porcerto algunsestaraoapensarquelersensorial mente rnaest6riacontada,urnquadro,umacanc;:ao,ate rnacom idaefacil.Mascomolerassimurnlivro, per exemplo? *** Antesdeserumtextoescrito,umlivroeum obj eto;temforma,cor,textura,volume,cheiro. Pode-seateouvi -Iosefolhearmossuaspaginas. Paramuitosadultoseespecialmentecrianc;:asnao alfabet izadosessaealeituraqueconta.Quemja eveoportunidadedevivencia-Iaedeobservara suareali zac;:aosabe 0quanto elapode render. acrianc;:aessaleituraatravesdossentidos revelaumprazersingular,relacionadocomiiisua dponibilidade(maiorqueadoadulto)ecurio--dade(maisespontaneamenteexpressa).0livro, esseobjetoinerte,contendoestranhossinais, o que e Leitura quemsabeimagenscoloridas,atraipeloforma to epelafacilidadedemanuseio;pelapossibi li dade deabri -I o,decifrarseumisterioeelerevelar - atravesdacombinac;:aor(tmica,sonoraevisual dossinais- umahist6riadeencantamento,de imprevistos,dealegriaseapreensoes.Eessejogo com0universeescondidonumlivrovaiest imu-landonacrianc;:aadescobertaeaprimorament o dalinguagem,desenvolvendosuacapacidadede comunicac;:aocom0mundo.Surgemasprimeiras escolhas:0livrocomilustrac;:oescoloridasagrada rna is;senaocontemimagEms,Cltraimenos.Es6 () fatode folhea-Io, abrindo-oe fechando o, provoca umasensac;:aodepossibilidadesdeconhece-Io; sejaparadomina-Io,rasgando-onumgesto onipotente,sejaparaadmira-Io, conservando-oa fimde voltar repetidamente aele. Essesprimeiroscontatospropiciama crianc;:a adescobertadolivrocomoumobjetoespecial , diferentedosoutrosbrinquedos,mastambem fontedeprazer.Motivam-naparaaconcretizac;:ao maiordo atedeler0textoescrito,apartirdo processodealfabetizac;ao,gerandoapromessa deautonomiaparasaciaracuriosidade pelo desco-nhecido epararenovar emoc;:oes vividas. Melhordoquequalquertentativadeexplicar issoebuscarnova mente0relatodeSartre:"Eu naosabiaaindaler,masjaerabastanteesnobe paraexigir os meus livros... Peguei os dois volume-zinhos, cherei-os,apalpei-os,abri-osnegligentemen-43 Maria Helena Martins tena' pagina certa', fazendo-os estalar.Oebalde: eu naoti nhaasensaaodepossu(-Ios.Tenteisem iorexitotrata-Ioscomobonecas,acalenta-Ios, ja-los,surra-los.Quaseemlagrimas,acabeipor dep6-.lossobreosjoelhosdeminhamae.Ela ntouosolhosdeseutrabalho:'0quequeres eeuteleia,querido?AsFadas?'Perguntei, Iulo: AsFadas estao a( dentro?" Jaosadultos tendem a umaposturamaisinibida ntedoobjetolivro.Issoporqueha, sem duvida, tradic;:aodecultoaele.Mesmoquandonao maformapelaqualhojeosconhecemos,os - oseramvistoscomoescriturasagrada,porta-doradaverdade,enigm.3ticaouperigosa.Ee inegavelaseriedadequeumabibliotecasugere. Acasaondeseencontraumaestante com livros 51s6jaconotacertorefinamentodeesp(rito, igencia,culturadeseusmoradores.Quanto .livrosmelhor.Naoe a toaquesecompra asvezespormetro)belosexemplaresencaderna-eseospoebema mostra,alardeandoaos - nantes0statusletrado.Mesmoqueesseslivros - sejammanuseados,suasimplespresenc;:a jcabastaparaindiciarsabedoria.Osfetichistas ram-nosindiscriminadamente,maisem rw;:aodeseuaspectodoquepelasuarepresenta-devidoaoseuvalorintr(nseco,porseu mfiteUdoouautor.Haaindaumtipo de fetichista - suti l:0bibl iofilo,colecionadorderaridades, asquaismuitasvezessequerterncondic;:oesde o que e Leitura . avaliar,masexibe-ascomtalorgulhocomosea merapossedosexemplaresjaIhefacultasse0 reconhecimentoefetivodeimportanciacultural esocial,quandonaoaexclusividadede manuseio, deixandoaosdemais leitores apenas apossibilidade de lermediados umavitrina.. Oiante detalpoder- asimples posse do objeto livropodesignificarerudic;:ao;sualeituralevara salvac;:aoosincredulos,comoquandorepositorio daspalavrasdeCristonosEvangelhos,ou construir aloucura,comoa do cavaleiro andante Quixote -, aatitudedohomemcomumehistoricamente de respeito. Mesmo0adventodaeraeletronica,com0 radioeatelevisao,antesdearrefecer0cultoaos meiosimpressoseespecial menteaolivro,acabou enfatizandosuaimportancia.Asuspeita- amea-c;:adoraparauns(Ietrados)e alentadora para outros (iletrados)- dequeaescritanaoseriamais "indispensavelpara saber das coisas"nao se concre-tizou.Pelocontrasteentre0facilitariodacomu-nicac;:aoeletronicaoudacomunicac;:aooralecomplexidadedaescrita,acabamaindasendomais valorizadosostextosimpressos,oslivros,particular,eseusleitores.Estesoptampelomais "diflcil" e,por ser aescrita mais dif(cilde entender, seriapossivelmentemaisimportantequeosoutros meios.Essetipoderacioc(nio,comumentrea 1 populac;:aoiletrada ,e,semduvida, estimulado pelos ! intelectuais,resultaserurndosfatoresmaiores I 4S Maria Helena Martins de do culto daletra e dos livros. Ospossuidoresdopoderdapalavraescritase encarregamdesublinharealargaraauramistifi-eadoraqueaenvolve,certosdeestarem,eles tamoom,sobaprotec;:aodosdeuses,enquantoao it or emgeralcabe a submissao: 0que estaescrito, ressoe,principalmente,publicadoemforma elivroeinquestionavel;significasabedoria, 'encia,arteaque0comumdosmortaiss6 atinge mmoreceptor passivo.Naoera de grac;:aque Catulo PaixaoCearense,quandomostravaaalguem seusmanuscritos,advertiapara0fatodeque, is de impressos, ficariammelhores e,aosa(rem li vro, est ariamexcelentes. Corolariodessepoder eaameac;:aqueostextos escritospod eminspirar.Da(asqueimasedestrui-c;Oes,asproibic;:oes daqueles considerados perigosos osseusconcorrentesnaforc;:adepersuasaoe ressoresdopensamentoeexpressaolivres. exemplomaisacabadoencontramosnoIndex ;broromProibitorum(f ndicedosLivrosProibi-),umalistadetituloselaboradapelaIgreja Caroli caRomana"paraimpediracontaminac;:ao i.eouacorrupc;:aomoral".Demead osdo securoXVIate1966,quandofoisuspenso, inume-ediyoesdoIndexforampublicadase,conse-- entemente,mil haresde punic;:oes executadas, em - dadesobedienciaasproibic;:oes.Haquem rezadomuitasAve-Mariasdepenitenciapor algumdoslivrosmalditos,quandonaq o que eLeitura apenasporpossu (-losaumanusea-Ios.Ehaquem literalmenteperdeua cabec;apor te-Ios escrito.Mas naosao apenasreligiosos ospretextos de proibic;:ao. Osgovernosautoritariostemsideosmaiores censores.E disson6s sabemos muitobem. Mesmocercadodetalfama,0objetolivronem sempreconvenceporsis6.Suaaparenciatambem impressiona,bernoumar.Quem den6snao rechac;:ouum deles por ser impresso em tipos muito miudos,porsermuitogrosso,oudevido amancha graticacompacta mentedistribuidanapagina,ao papelasperoeabrochuraouencadernac;:aonao seacomodarem asnossasmaos? Osracionalistasdirao:mas0importantee0 queestaescrito!Naosetrataderacionalizar:a questaoaquienvolveossentidos.Docontrario, comoexplicar 0prazerquepodedespertaraos olhose aotate um bela exemplar, em papelsedoso, comilustrac;:oescoloridaseplanejamentogratico cuidadoso,mesmo0textoescritosendopiegas, cheiodefalsasverdadesouaindaabsolutamente indecifravel?Earevistainescrutavel,envoltapor urnplastico,deixandoamostraapenasacapa atraente e estimu lante? Numprimeiromomenta0quecontaeanossa res postaf(sicaaoquenoscerca,aimpressaoem nossossentidos.Estes,entretanto,estandoligados asemoc;:oesearazao,asvezespregampec;:as, surpreendendo,perturbando,mudando0percurso denossaleitura. 47 MariaHelena Martins Quantosjasedirigiramaalguemefusivamente descobrindologo tratar-se de pessoa desconhecida? Eaquelaalmofadamaciae quentinhaquevirou mgatonosarranhando?Hatambem0casodo li meembrancoepreto,emc6piavelha,que resul t ainesperadamenteborn.Umarevistavisual-menteagradchielque,derepente,deixadeter alquerinteresseparan6s.Ouurnlivrecode sebo,meiorasgadoesujo,'compessimoplaneja-ment o grMico,que acabanos agarrando. Assi m,quandoumaleitura- sejadoquefor-nosfazficaralegresoudeprimidos,despertaa riosidade,estimulaafantasia,provocadescober-tas,lembran