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Processo Penal Prof. Danilo Pereira Apostila 3. Fontes e interpretação do direito processual penal: classificação, conceito e espécies. Procedimentos interpretativos. Lacuna da lei processual. Classificação das fontes Fonte, em sentido geral, é aquilo de onde provém algo. No direito, significa tudo aquilo de onde provém um preceito jurídico, portanto, fonte nada mais é do que as formas pelas quais as regras jurídicas se exteriorizam, e se apresentam. Como em todos os ramos do direito as fontes do Direito Processual Penal podem ser classificadas em: 1. materiais (de produção): constituem, criam o direito. No Brasil, fonte de produção do processo penal é o Estado. 2. formais (conhecimento ou cognição): se referem à maneira pela qual se exterioriza o direito penal, como suas regras são evidenciadas. Dividem-se em duas: a) Fonte formal imediata (primária): é a norma penal, a Lei. A Lei é a única fonte imediata do direito penal. No Brasil, nos termos do art. 22, I da CF, cabe ao poder Legislativo Federal (competência privativa), ou seja, a União é a fonte material do direito processual penal. Além da União, os Estados membros podem legislar em matéria processual penal, desde que autorizados por lei complementar (art. 22, § único CF). Além disso, estendeu a competência dos Estados e Distrito Federal para legislar concorrentemente com a União sobre a “criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas”(art. 24, X, e 98, I) e “procedimentos em matéria processual” (art. 24, XI). Concorrentemente com a União, também cabe ao Estado e ao Distrito Federal legislar sobre “direito penitenciário” (art. 24, I, e §§ 1° e 2°). É também da competência dos Estados-membros, conforme as constituições estaduais, a legislação sobre organização judiciária no âmbito estadual, bem como sobre custas dos serviços forenses 1

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Processo PenalProf. Danilo Pereira

Apostila 3. Fontes e interpretação do direito processual penal: classificação, conceito e espécies. Procedimentos interpretativos. Lacuna da lei processual.

Classificação das fontes

Fonte, em sentido geral, é aquilo de onde provém algo. No direito, significa tudo

aquilo de onde provém um preceito jurídico, portanto, fonte nada mais é do que

as formas pelas quais as regras jurídicas se exteriorizam, e se apresentam.

Como em todos os ramos do direito as fontes do Direito Processual Penal podem

ser classificadas em:

1. materiais (de produção): constituem, criam o direito. No Brasil, fonte de

produção do processo penal é o Estado.

2. formais (conhecimento ou cognição): se referem à maneira pela qual se

exterioriza o direito penal, como suas regras são evidenciadas. Dividem-se em

duas:

a) Fonte formal imediata (primária): é a norma penal, a Lei. A Lei é a única

fonte imediata do direito penal. No Brasil, nos termos do art. 22, I da CF, cabe

ao poder Legislativo Federal (competência privativa), ou seja, a União é a fonte

material do direito processual penal. Além da União, os Estados membros

podem legislar em matéria processual penal, desde que autorizados por lei

complementar (art. 22, § único CF). Além disso, estendeu a competência dos

Estados e Distrito Federal para legislar concorrentemente com a União sobre a

“criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas”(art. 24, X, e

98, I) e “procedimentos em matéria processual” (art. 24, XI). Concorrentemente

com a União, também cabe ao Estado e ao Distrito Federal legislar sobre

“direito penitenciário” (art. 24, I, e §§ 1° e 2°). É também da competência dos

Estados-membros, conforme as constituições estaduais, a legislação sobre

organização judiciária no âmbito estadual, bem como sobre custas dos serviços

forenses (art. 24, IV, da CF). Essas autorizações constitucionais derivam da

necessidade de se adaptar o processo penal às peculiaridades locais, tão

diversas no nosso país, de dimensão continental e com problemas distintos

conforme a região do território em que se deve aplicar a lei processual.

Menciona o Código de Processo Penal, em seu artigo 1°, I, os tratados,

convenções e regras de direito internacional. Os tratados são acordos

assinados entre países em assuntos de natureza política, incluindo-se os da

repressão aos ilícitos penais. As convenções, de uma maneira geral, têm

natureza privada. Por fim, as regras de direito internacional são os princípios

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induzidos das leis internas dos Estados civilizados ou inferidos de convenções

internacionais ou afirmados na doutrina ou proclamados em congressos. Pela

Constituição Federal, compete privativamente ao Presidente da República

celebrar tratados, convenções e atos internacionais, estando eles sujeitos a

referendo do Congresso Nacional (art. 84, VIII). É da competência exclusiva do

Congresso Nacional, “resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos

internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao

patrimônio nacional” (art. 49, I). Por fim, compete à União manter relações com

Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais (art. 21, I). Nos

termos do artigo 102, do Regulamento da ONU, os tratados estão sujeitos a

registro para terem vigência. Como os tratados devem ser submetidos à

deliberação do Congresso Nacional para vigirem como norma jurídica interna, a

doutrina os tem considerado como fonte secundária do direito. O Código de

Processo Penal, porém, lhes dá o mesmo valor que a lei, afastando esta quando o

contraria. O Supremo Tribunal Federal, aliás, tem decidido que, no conflito

entre a lei e o tratado há prevalência deste. Segundo esta orientação, o tratado

é fonte direta primária do Direito Processual Penal como dos demais ramos

do direito. Com a Emenda Constitucional nº 45/2004, os tratados e convenções

internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados pelo Congresso

nos termos do quorum exigido pelo § 3º, inciso LXXVIII do art. 5º CF tem força

de lei pois o legislador equiparou-os a emenda constitucional, que aliás, tem

procedimento mais rigoroso que a lei federal.

b) Fontes formais mediatas (secundárias): aquelas que, não são normas

propriamente ditas, mas produzem-na de maneira secundária ou incidental. São

elas:

1. costumes: é o conjunto de comportamentos reiterados que as pessoas

obedecem de maneira uniforme (prática de atos de mesma espécie) e constante

(reiteração por período longo) pela convicção de sua obrigatoriedade. Não

obstante serem importantes para balizar o direito, em nosso sistema, não pode o

costume criar ou revogar leis face ao princípio da legalidade ou reserva legal

(veremos à frente), bem como pelo pelas regras contidas no art. 2º da Lei de

Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB (Dec. Lei 4.657/42, alterada

pela L. 12.376/10)), que é expressa no sentido de que “a lei terá vigor até que

outra a modifique ou revogue”. Ou seja, somente uma lei modifica ou revoga

outra. Embora não mencionado no artigo 3° do CPP, que admite a aplicação da

analogia e dos princípios gerais do direito, o costume é referido pelo artigo 4°

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da Lei de Introdução do Código Civil como uma das formas integradoras do

Direito, em especial na lacuna da lei. O contínuo descumprimento de uma norma

ou uma praxis adotada, tendem a servir de estímulo ao legislador para alteração

ou revogação da lei. Fala-se em costume secundum legem (de acordo com a

lei), extra legem (na ausência de lei) e contra legem (contra a lei).

2. Princípios gerais de direito: são as premissas éticas e sociais (relações da

vida) que inspiram a elaboração e aplicação das normas jurídicas. Não se

confundem com princípios jurídicos ou normativos, que estão positivados

(previstos) em lei. Servem à supressão de eventuais lacunas e omissões a

orientar o direito visando a adequação típica do fato praticado, que pode se

chocar com a consciência de um povo. O Direito Processual Penal está sujeito às

influências desses princípios, como os referentes à liberdade, à igualdade, ao

direito natural etc. É o que estabelece expressamente, aliás, o artigo 3° do

Código de Processo Penal, ao considerá-lo como fonte suplementar da lei

processual.

3. Ato administrativo: é aquele derivado de manifestação de vontade da

administração pública como forma de realizar sua função executiva. Ou seja,

não são atos derivados do legislativo federal, logo, não podem criar modificar

leis penais e processuais penais (art. 22, I CF). Porém, dar conteúdo a uma

norma processual ou regulá-la, como Regimentos Internos dos Tribunais, da

Câmara Federal, do Senado, das Assembléias legislativas, que contém normas

subsidiárias as da legislação processual.

4. Súmula vinculante: existe em nosso sistema as chamadas Súmulas, que são

“orientações” emitidas tanto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quanto pelo

Superior Tribunal de Justiça (STJ), que servem para que os Tribunais inferiores

(2ª instância) e juízes de 1ª instância posicionassem sua decisão “podendo”

seguir aquelas orientações sumuladas, que não são leis e tampouco obrigatórias.

Ocorre que, no ano de 2004 a Emenda Constitucional nº 45 reconheceu a

Súmula Vinculante. Segundo este instituto, “o Supremo Tribunal Federal

poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus

membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar

súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante

em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública

direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder

à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei” (CF, art. 103-A,

instituído pela Emenda Constitucional nº 45/04). O objetivo declarado da norma

é o de evitar a divergência de entendimentos entre órgãos judiciários ou

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entre estes e a Administração Pública, sempre que estiver em causa

matéria de índole constitucional já decidida e cristalizada em súmula do

Supremo Tribunal. A súmula visa à uniformização de entendimentos onde a

decisão do Supremo obrigatoriamente deve ser obedecida pelos tribunais e

juízes, assim como pelos agentes do Poder Executivo, logo, tem caráter cogente.

A crítica que se faz é que como vimos que ao Poder Legislativo (União) compete

privativamente legislar em matéria penal e processual penal, , logo, como

pretender que membros do Poder Judiciário (STF) criem súmulas que sejam de

orientação obrigatória e aplicação? Aliás, é vontade do povo uma lei, afinal,

elegemos nossos representantes, que fazem as leis, em nosso nome. Por acaso,

membro do poder Judiciário é eleito pelo povo, e tem mandato em nosso nome

para legislar? Entendemos que tal é de caráter inconstitucional, fere a

independência e tripartição de poderes (art. 2º CF), apesar do pretexto de

uniformização e celeridade ao qual se vem propalando. Ademais, a súmula

vinculante prevê claro óbice ao acesso ao Poder Judiciário, vez que limita a

discussão sobre algum assunto, fato este vedado pela CF – art. 5º, inciso XXXV

(“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a

direito”). Vejamos algumas súmulas vinculantes que tem efeito em processo

penal:

Súmula Vinculante 11: Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e

de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia,

por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito,

sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da

autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem

prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Súmula Vinculante 14: É direito do defensor, no interesse do representado,

ter acesso amplo já documentados em procedimento investigatório realizado por

órgão judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.

Súmula Vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem

tributária, previsto no art. 1o, incisos I a IV, da Lei no 8.137/90, antes do

lançamento definitivo do tributo.

Interpretação do direito processual penal

Interpretar é extrair seu exato alcance, conhecer o significado e vontade da lei

em relação à realidade. Visa desvendar o conteúdo e significado das leis, a

vontade da lei, e não do legislador.

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Na interpretação da lei, deve-se atender “aos fins sociais a que ela se dirige

e às exigências do bem comum” (art. 5° da LINDB). Deve-se, porém, ter em

vista na interpretação da lei processual penal, lei esta que, como vimos, é

instrumento que serve de aplicação do direito penal, com tutela sobre a

liberdade individual, a compreensão dos imperativos do bem comum e que o fim

da pena é promover a integração social do condenado (art. 1° da Lei 7.210/84,

Lei de Execuções Penais). A ciência ou método que se preocupa com a

interpretação da lei é denominado Hermenêutica, cujos princípios aplicam-se a

todos os ramos do direito e, portanto, à lei processual penal. Os costumes e os

princípios gerais do direito não se constituem em interpretação da lei, mas em

fontes do direito processual penal.

Espécies de interpretação

1. quanto ao sujeito que o faz: a pessoa que realiza a interpretação

a) autêntica: aquela que tem mesma origem da lei, ou seja, feita pelo próprio

legislador, chama-se lei interpretativa. Não cria uma situação nova, mas apenas

adota uma interpretação que já existia. É o caso, por exemplo, do conceito de

“flagrante delito”, estabelecido pelos artigos 302 e 303 do Código de Processo

Penal. A interpretação, porém, pode ser promovida por lei posterior, elaborada

para esclarecer o sentido duvidoso de uma lei já em vigor. Por isso afirma-se que

a lei interpretativa pode retroagir até a data do nascimento da lei ao qual

interpreta, alcançando todos os fatos praticados (salvo de houver trânsito em

julgado) uma vez que apenas esclarece uma posição que já existia e apenas vem

a confirmá-la. Agora, se surgir essa lei com uma nova interpretação, ou seja,

algo em primeira mão que antes não se havia pensado, passará a ser uma nova

lei, daí só retroage se beneficiar o réu.

b) doutrinária (científica): quando constituída da communis opinio doctorum,

ou seja, do entendimento dado aos dispositivos legais pelos escritores ou

comentadores do direito. Não tem, evidentemente, força obrigatória.

c) judicial (jurisprudencial): feita pelos juízes ou tribunais de forma reiterada

em casos concretos (julgados). Não é obrigatória, salvo:

1. para aquele caso julgado após o trânsito em julgado;

2. quando for interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal em controle

por via de ação direta de inconstitucionalidade ou constitucionalidade

declarando uma lei constitucional ou inconstitucional. Logo, todos os demais

casos devem seguir a decisão do STF;

3. quando o STF baixar uma súmula vinculante.

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2. quanto aos meios empregados:

a) gramatical (literal ou sintática): é recorrer ao que dizem as palavras, a na

análise sintática das palavras de acordo com o vernáculo. A palavra

“autoridade” utilizada no artigo 10, §§ 1°, 2° e 3°, do CPP, significa “autoridade

policial”, conforme dispõem os artigos 4°, caput, 6° etc. do mesmo Código.

b) lógica ou teleológica: investigação dos motivos que determinaram a lei, que

lhe deram origem, os objetivos da lei e a real vontade da lei. Os termos de uma

norma jurídica devem ser interpretados em função do propósito para o qual foi

emitida e sempre em relação com o sentido e o alcance dos fatos particulares,

em questão, referidos àquela finalidade da norma. É investigar o fim visado e as

circunstâncias do momento em que se originou. Se vale dos seguintes

elementos:

histórico: a realidade social, os debates que sucederam a lei, os

parlamentares etc.

sistemático: é a análise da lei em conjunto com outras leis.

direito comparado: é o estudo do direito estrangeiro, aquilo que diz a

doutrina e jurisprudência a respeito do assunto semelhante ao direito brasileiro.

extrajurídico: análise de outras ciências, como medicina, engenharia.

3. quanto ao resultado:

a) declaratória: quando o texto examinado não é ampliado nem restringido,

encontrando-se apenas o significado oculto do termo ou expressão utilizada pela

lei. Quando a lei processual se refere a “casa habitada” (art. 248) evidentemente

está se referindo a ser ela ocupada por uma ou mais pessoas, numa

interpretação meramente declarativa.

b) restritiva: quando se reduz o alcance da lei para que se possa encontrar a

sua exata vontade. Quando a lei prevê a nulidade pela falta de “intervenção do

Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos da

intentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública” (art.

564, III, d, do CPP), deve-se entender que ela só ocorrerá se for alegada no

momento oportuno, diante do que dispõe o artigo 572 do mesmo diploma.

c) extensiva: referida expressamente pelo artigo 3° do CPP, ocorre quando é

necessário ampliar o sentido ou alcance da lei para que corresponda à vontade

do texto. A lei diz menos do que pretendia dizer. O fato está previsto

implicitamente na lei, apesar de não previsto textualmente, daí, amplia-se o

texto da lei.

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d) ab-rogante: quando há contradição absoluta, irreversível entre dois

dispositivos legais, onde não é possível conciliá-los. Daí, é possível excluir um

dos dispositivos. Assim, desconsidera-se determinado preceito legal. Pode

ocorrer entre artigos de lei, ou entre artigo de lei e um princípio geral do

direito, sendo que este último deve prevalecer em relação ao artigo de lei.

e) progressiva: significa adaptar a lei à realidade atual, aos costumes vigentes

para se abarcarem no processo as novas concepções ditadas pelas

transformações sociais, científicas, jurídicas ou morais que devem permear a lei

processual estabelecida. Ora, uma lei, com o passar do tempo, pode vir a perder

o sentido e mesmo assim manter-se em vigência. Daí, a interpretação

progressiva seria a interpretação conforme as exigências atuais, os costumes

vigentes na sociedade na época de sua aplicação.

f) analógica (intra legem): quando a lei prevê uma fórmula casuística,

específica, e depois prevê uma fórmula genérica, ‘mandando’ aplicar aos

mesmos casos da fórmula casuística aqueles que previu genericamente. É a

busca da verdade através de uma semelhança reconhecida pelo próprio texto

legal. Quando a lei se refere a “quaisquer outros elementos” no artigo 6°, IX, do

CPP, está mencionando outros dados referentes à “vida pregressa do indiciado”.

g) sistemática: quando se procura a interpretação para harmonizar o texto

interpretado com o contexto da lei, elaborada, ao menos em tese, em um sistema

lógico. Verifica-se a aplicação daquele dispositivo de acordo com o sistema

jurídico vigente. Por exemplo, o art. 44 da Lei de Drogas (L. 11.343/06) previa a

proibição de liberdade provisória àqueles que eram processados por crimes

previstos nesta lei, assim reconhecendo a prisão cautelar como regra para estes

crimes. Tal é incompatível com o estado de inocência, viga mestra reconhecida

na Constituição Federal como garantia individual (art. 5º, inciso LVII).

Procedimentos interpretativos da lei processual penal

1. Equidade: é o procedimento que adapta a generalidade das normas ao caso

concreto a que são aplicadas. É o ajuste na norma geral a especificidade da

situação. A rigidez da fórmula da norma não emendaria os erros em que o

legislador porventura tivesse incorrido, gerando desigualdades e injustiças.

Assim, ajusta a norma à especificidade do caso.

2. Doutrina: conjunto de investigações e reflexões teóricas e princípios

expostos, analisados e sustentados pelos autores e tratadistas no estudo das leis.

Quando formulam princípios, idéias e aconselham, guiam a jurisprudência.

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3. Jurisprudência: é a repetição constante de decisões no mesmo sentido, em

casos idênticos. Torna-se uma orientação e presume-se que seja a mais

acertada.

Lacunas da Lei Processual

Por mais diligente que possa ser o legislador, nunca deixará de ser lacunoso

nosso sistema jurídico. Não há como se fazer previsão de tudo e ao juiz é vedado

não julgar um caso alegando a ausência de lei. Daí que a LINDB (art. 4º), deixou

acentuado a resolução de caso legalmente omisso através da analogia, costumes

e princípios gerais do direito, e o artigo 126 do Código de Processo Civil

proíbe ao juiz sentenciar ou despachar alegando a lacuna ou obscuridade da lei,

permitindo a este, expressamente que, na lacuna ou obscuridade da lei, recorra

à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito.

Especificamente, o artigo 3° do Código de Processo Penal admite a aplicação

analógica. Já vimos os costumes e os princípios gerais do direito, quando

estudamos as fontes do direito.

Analogia

Consiste em aplicar a uma hipótese não prevista em lei a disposição relativa a

um caso semelhante. Assim, na ausência da lei para situação específica, vale-se

o julgador de outra norma prevista para a situação semelhante. Não é fonte de

direito, é forma de auto-integração da norma para suprir lacunas. Parte-se do

princípio de que onde existe a mesma razão de decidir, é de aplicar-se o mesmo

dispositivo. Veja-se que na interpretação extensiva reconstrói-se uma vontade já

existente na lei, enquanto que na analogia, essa vontade não existe devido a

uma lacuna. O embasamento da aplicação da analogia é o seguinte: “para

solucionar um caso omisso aplica-se o mesmo raciocínio previsto para um caso

semelhante”. Não se confunde a interpretação analógica, que é a busca da

vontade da norma através da semelhança de fatos com fórmulas já usadas

(previstas) pelo legislador , enquanto que, na analogia, temos uma forma

de auto-integração da lei com a aplicação a um fato não regulado por lei,

usando uma norma que disciplina ocorrência semelhante. Exigíveis os

seguintes requisitos:

1. que o fato considerado não tenha sido regulado pelo legislador;

2. exista uma situação regulada que ofereça relação de coincidência e

identidade;

3. exista um ponto em comum entre as duas situações.

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