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1 DIREITO CIVIL – PARTE GERAL PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS FUNDAÇÃO CONCEITO Fundação é um patrimônio ao qual a lei atribui personalidade jurídica, em atenção ao fim a que se destina. ELEMENTOS São dois os elementos da fundação: a) Patrimônio; b) fim específico. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência, conforme preceitua o parágrafo único do art. 62 do CC. Percebe-se que esses quatro fins são de interesse geral. O legislador especificou esses fins, ao contrário do Código de 1916, para evitar fundações com finalidades fúteis ou caprichosas. É, no entanto, exemplificativo esse rol dos fins da fundação. O Enunciado nº 8 do CJF reza que “a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio ambiente está compreendido no CC, art.62, parágrafo único”. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência. E o Enunciado 9 complementa: “O art.62, parágrafo único, deve ser interpretado de modo a excluir apenas as fundações de fins lucrativos”. Na fundação, o patrimônio se transfigura, transformando-se em pessoa jurídica para poder atingir o fim a que se destina. A finalidade da fundação não é lucrativa, mas social, de modo que o eventual lucro obtido deve ser aplicado na concretização de seus fins. FORMA DE INSTITUIÇÃO Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la (art. 62 do CC). Vê-se, portanto, que a instituição da fundação é um ato solene, pois depende de escritura pública ou testamento. A escritura pública ou testamento deverão conter: a) a dotação de bens alodiais, isto é, livres e desembaraçados, que não sejam prejudiciais aos credores ou à legítima dos herdeiros necessários. Assim, o fundador deve ser solvente, sob pena de o ato configurar fraude contra credores. b) o fim a que se destina. Anote-se que a maneira de administrá-la pode ou não ser especificada no ato constitutivo, a critério do fundador. Após a lavratura da escritura pública, ou, então, após a morte do fundador, quando esta for instituída por testamento, o próximo passo é a elaboração do estatuto. Nesse aspecto, a fundação pode ser direta e indireta. Na fundação direta, o estatuto é elaborado pelo próprio fundador, ao passo que na fundação

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DIREITO CIVIL – PARTE GERAL PROF. FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS

FUNDAÇÃO CONCEITO Fundação é um patrimônio ao qual a lei atribui personalidade jurídica, em atenção ao fim a

que se destina. ELEMENTOS São dois os elementos da fundação: a) Patrimônio; b) fim específico. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais,

culturais ou de assistência, conforme preceitua o parágrafo único do art. 62 do CC. Percebe-se que esses quatro fins são de interesse geral. O legislador especificou esses fins, ao contrário do Código de 1916, para evitar fundações com finalidades fúteis ou caprichosas. É, no entanto, exemplificativo esse rol dos fins da fundação. O Enunciado nº 8 do CJF reza que “a constituição de fundação para fins científicos, educacionais ou de promoção do meio ambiente está compreendido no CC, art.62, parágrafo único”. A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência. E o Enunciado 9 complementa: “O art.62, parágrafo único, deve ser interpretado de modo a excluir apenas as fundações de fins lucrativos”.

Na fundação, o patrimônio se transfigura, transformando-se em pessoa jurídica para poder

atingir o fim a que se destina. A finalidade da fundação não é lucrativa, mas social, de modo que o eventual lucro obtido deve

ser aplicado na concretização de seus fins. FORMA DE INSTITUIÇÃO Para criar uma fundação, o seu instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação

especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la (art. 62 do CC).

Vê-se, portanto, que a instituição da fundação é um ato solene, pois depende de escritura pública ou testamento.

A escritura pública ou testamento deverão conter: a) a dotação de bens alodiais, isto é, livres e desembaraçados, que não sejam prejudiciais aos

credores ou à legítima dos herdeiros necessários. Assim, o fundador deve ser solvente, sob pena de o ato configurar fraude contra credores.

b) o fim a que se destina. Anote-se que a maneira de administrá-la pode ou não ser especificada no ato constitutivo, a

critério do fundador. Após a lavratura da escritura pública, ou, então, após a morte do fundador, quando esta for

instituída por testamento, o próximo passo é a elaboração do estatuto. Nesse aspecto, a fundação pode ser direta e indireta.

Na fundação direta, o estatuto é elaborado pelo próprio fundador, ao passo que na fundação

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indireta ou fiduciária, o estatuto é elaborado por uma terceira pessoa a quem o fundador atribui esse encargo.

Elaborado o estatuto, urge que este seja levado à aprovação do Ministério Público. E, depois dessa aprovação, o estatuto é registrado no Cartório das Pessoas Jurídicas, constituindo-se, a partir de então, a personalidade jurídica da fundação.

REVOGAÇÃO DO ATO INSTITUCIONAL A fundação instituída por testamento pode ser revogada a qualquer tempo pelo testador.

Todavia, após a morte deste, o ato se torna irrevogável. A fundação instituída por escritura pública é irrevogável, de modo que, uma vez lavrada a dita

escritura, o instituidor é obrigado à transferir à fundação a propriedade dos bens dotados ou outro direito real sobre os bens dotados, sob pena de ação de adjudicação compulsória, quando, então, o registro dos bens em nome da fundação será feito por mandado judicial (art. 64 do CC).

APROVAÇÃO DO ESTATUTO Vimos que o estatuto é aprovado pelo Ministério Público. Este, antes de aprová-lo, verificará

dois aspectos: a) se foram observadas as bases da fundação; b) se os bens são suficientes aos fins da fundação. Caso sejam insuficientes, serão

incorporados em outra fundação de fins iguais ou semelhantes, se outro destino não lhe houver dado o fundador.

O prazo para a deliberação do Ministério é de quinze dias. Se for aprovado, não haverá

intervenção judicial, devendo o estatuto ser levado a registro. Pode ocorrer de o Ministério Público indicar as modificações no estatuto ou então denegar a

aprovação deste. Nesses dois casos, o interessado poderá requerer ao Poder Judiciário o suprimento da aprovação do Ministério Público, podendo o Juiz aprová-lo ou mandar fazer no estatuto as modificações a fim de adaptá-lo à finalidade da fundação.

FISCALIZAÇÃO DA FUNDAÇÃO Velará pelas fundações o Ministério Público do Estado onde situadas (art. 66 do CC). Se

estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público (§2º do art. 66 do CC). A expressão por mais de um Estado abrange também o Distrito Federal e os Territórios (Enunciado 147 do CJF).

A fundação que se situar no Distrito Federal, ou em Território, será fiscalizada pelo Ministério Público Federal, conforme preceitua o § 1º do art.66 do CC. A nosso ver, o legislador se equivocou, pois as fundações do Distrito Federal devem ser fiscalizadas pelo Ministério Público do Distrito Federal, e não pelo Ministério Público Federal, que é um órgão da União. A intromissão da União nas fundações do Distrito Federal implica em flagrante violação ao princípio federativo, desse modo, o § 1º do art. 66 reveste-se de inconstitucionalidade. Aliás, o STF declarou a inconstitucionalidade do §1º do art.66 do CC, reconhecendo a prevalência da autonomia do Distrito Federal, que deve zelar pelas fundações localizadas em seu território (ADIN nº 2.794/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 14.12.2007).

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ELABORAÇÃO DO ESTATUTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO Em duas situações, o Ministério Público deverá elaborar o estatuto da fundação. A primeira ocorre quando o instituidor não elaborar nem nomear pessoa para elaborá-lo. A segunda, quando a pessoa nomeada não elabora o estatuto no prazo que lhe foi fixado pelo

fundador, ou, não havendo prazo, em cento e oitenta dias. Nessas hipóteses em que o estatuto é elaborado pelo Ministério Público, a sua aprovação

competirá à autoridade judiciária. ALTERAÇÃO DO ESTATUTO A alteração do estatuto depende:

da deliberação de dois terços dos componentes para gerir e representar a fundação; que não contrarie o fim da fundação; que seja aprovada pelo órgão do Ministério Público, mas, caso este a denegue, poderá o Juiz

supri-la, a requerimento do interessado. A minoria vencida na modificação pode recorrer ao Poder Judiciário. Aliás, quando a alteração

não houver sido unânime, o Ministério Público, antes de pronunciar-se, dará ciência à essa minoria para se manifestar, em dez dias (art. 68 do CC).

Frise-se, ainda, que a finalidade da fundação é inalterável. EXTINÇÃO DA FUNDAÇÃO A extinção da fundação depende de sentença judicial. Qualquer interessado ou o órgão do Ministério Público poderá requerer a extinção quando: I) se tornar ilícito o seu objeto. Tal ocorre quando sobrevém uma lei proibindo a atividade

exercida pela fundação. II) for impossível a sua manutenção; III) se vencer o prazo de sua existência. Decretada por sentença o fim da fundação, o seu patrimônio será incorporado, em primeiro

lugar, à entidade designada na escritura pública ou testamento; em segundo lugar, à entidade designada no estatuto. Se o ato constitutivo e o estatuto forem omissos, o juiz determinará a incorporação do patrimônio a outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante. Inexistindo estas, aplica-se por analogia o disposto no § 2º do art. 61 do CC, que cuida das associações, revertendo-se o patrimônio à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União. A devolução à União se dará no caso de a fundação se localizar em território não constituído em Estado.

DISTINÇÃO ENTRE FUNDAÇÃO DE DIREITO PÚBLICO E FUNDAÇÃO DE DIREITO PRIVADO O Poder Público quando cria uma fundação pública, mediante lei, tem liberdade para fixar-lhe

a natureza jurídica, podendo atribuir-lhe o caráter de pessoa jurídica de direito privado ou de direito público. Se optar pelo direito privado, é preciso o registro no Registro das Pessoas Jurídicas para a aquisição da personalidade, submetendo-se ao regime das fundações de direito privado. Se optar pelo direito público será regida pelo regime jurídico de direito público.

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Assim, as fundações públicas podem ser de direito público e de direito privado. As fundações de direito público, também chamadas autarquias fundacionais, são

aquelas instituídas, por lei, pelo Poder Público, ao passo que as fundações de direito privado são instituídas por um particular.

A personalidade jurídica da fundação de direito público emana diretamente da lei que a criou; a personalidade da fundação de direito privado só se perfaz a partir do registro do seu ato constitutivo no Cartório competente.

Na fundação de direito público, o processo de execução é feito por precatórios, nos moldes do art. 730 do CPC; na fundação de direito privado, o processo de execução é o comum, isto é, mediante penhora de bens.

Na fundação de direito público, os servidores estão sujeitos a regime jurídico único e desfrutam de estabilidade; na fundação privada, o regime é o da CLT, sendo certo que não há estabilidade.

As fundações de direito público devem observar as normas de licitação (art. 22, XXVII, da CF), as fundações privadas, não.

As fundações de direito privado sofrem a fiscalização do Ministério Público, nas fundações de direito público, não há essa fiscalização.

Finalmente, cumpre acrescentar que as fundações de direito público, segundo Celso Antonio Bandeira de Mello, são pessoas jurídicas de direito público.

SOCIEDADES CONCEITO Sociedade é a união dos esforços de duas ou mais pessoas para a obtenção de um fim

comum. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com

bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados (art.981 e parágrafo único do CC). Assim, nada obsta a sociedade temporária, constituída para realização de um ou mais negócios determinados.

ESPÉCIES As sociedades classificam-se em: empresárias e não empresárias. Estas últimas podem ser:

simples, cooperativas e de advogados. As sociedades empresárias são aquelas que visam a exploração de atividade econômica

organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços (art. 966 do CC), isto é, tem por objeto, o exercício da atividade própria de empresário (art. 982 do CC). Os elementos caracterizadores da atividade empresarial são: capital, mão-de-obra, insumo e tecnologia. Exemplos: banco, supermercado, hospital, lojas etc.

As sociedades simples, ao revés, são as demais. Exemplo: sociedade de médicos e outras de natureza intelectual, científica, literária ou artística.

As sociedades de advogados e as cooperativas têm uma disciplina especial, mas são também sociedades simples.

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DISTINÇÃO ENTRE SOCIEDADES EMPRESÁRIAS E SOCIEDADES SIMPLES Ambas visam lucro. As sociedades empresárias são de tipologia fechada, pois só podem adotar uma das formas

previstas em lei. Esses modelos societários são os seguintes:

sociedade em nome coletivo; sociedade em comandita simples; sociedade limitada; sociedade anônima; sociedade em comandita por ações; sociedade em conta de participação.

As sociedades simples, ao revés, podem adotar, além desses tipos acima, formas infinitas,

pois são de tipologia aberta. Com efeito, dispõe o art.983 do CC: “A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1.039 a 1.092; a sociedade simples pode constituir-se de conformidade com um desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias. Parágrafo único: Ressalvam-se as disposições concernentes à sociedade em conta de participação e à cooperativa, bem como as constantes de leis especiais que, para o exercício de certas atividades, imponham a constituição da sociedade segundo determinado tipo”.

As sociedades empresárias são registradas nas Juntas Comerciais, as sociedades simples, no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas. Quanto às sociedades cooperativas, não são empresárias, embora seu registro seja na Junta Comercial (art. 1.093 do CC).

O Enunciado 69 do CJF dispõe que: “As sociedades cooperativas são sociedades simples sujeitas a inscrição nas Juntas Comerciais”.

As sociedades empresárias estão sujeitas à falência; as sociedades simples, à insolvência civil. Anote-se que a sociedade anônima e a sociedade em comandita por ações são sempre

empresárias, por força de lei, ainda que o seu objeto seja civil, ao passo que as sociedades cooperativas, independentemente de seu objeto, são sempre simples (parágrafo único do art.982 do CC).

Quanto às sociedades que tenham por objeto a atividade rural, o que define a natureza jurídica é o registro. Se for registrada na Junta Comercial, será sociedade empresária. Se registrada no Registro Civil das Pessoas Jurídicas será sociedade simples. Sobre o assunto reza o art.984 do CC: “A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural e seja constituída, ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade empresária pode, com as formalidades do art.968, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada, para todos os efeitos, à sociedade empresária. Parágrafo único: Embora já constituída a sociedade segundo um daqueles tipos, o pedido de inscrição se subordinará, no que for aplicável, às normas que regem a transformação”.

INÍCIO DA PERSONALIDADE JURÍDICA A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da

lei, dos seus atos constitutivos (arts. 45 e 1.150). A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de

cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará: I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos

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sócios, se jurídicas; II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade; III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária; IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la; V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços; VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições; VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas; VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais. Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato (Art. 997).

Nos trinta dias subsequentes à sua constituição, a sociedade deverá requerer a inscrição do contrato social no Registro Civil das Pessoas Jurídicas do local de sua sede. § 1º O pedido de inscrição será acompanhado do instrumento autenticado do contrato, e, se algum sócio nele houver sido representado por procurador, o da respectiva procuração, bem como, se for o caso, da prova de autorização da autoridade competente. § 2º Com todas as indicações enumeradas no artigo antecedente, será a inscrição tomada por termo no livro de registro próprio, e obedecerá a número de ordem contínua para todas as sociedades inscritas (Art. 998).

SOCIEDADE EM COMUM Sociedade em comum é a destituída de personalidade jurídica, porque seus atos

constitutivos não estão registrados no cartório competente. São de três espécies: a) sociedade irregular: existe o contrato escrito, mas não foi levado a registro; b) sociedade de fato: o contrato é apenas verbal; c) sociedade tácita ou presumida: não há sequer contrato verbal, mas as pessoas se

comportam como sócios, praticando atos próprios de sociedade. Nas relações entre os sócios ou entre estes e terceiro, a sociedade em comum só se provará

por escrito. Assim, um sócio não pode demandar o outro ou terceiro sem a apresentação do contrato escrito de constituição da sociedade. O sócio não pode exigir, por exemplo, que o outro sócio complete a sua quota social, a não ser mediante apresentação do contrato escrito.

Em contrapartida, os terceiros podem demandar contra a sociedade em comum, provando a sua existência por qualquer modo (art. 987 do C.C.). Se não conseguirem comprovar a existência da sociedade, ainda assim poderão demandar contra os sócios individualmente.

Convém salientar que a sociedade em comum pode figurar em juízo ativa e passivamente contra os sócios ou terceiros, desde que comprovada a sua existência.

A sociedade em comum não tem personalidade jurídica, logo os bens e dívidas sociais pertencem aos sócios, e não à sociedade (art.988 do CC).

Os bens sociais respondem pelos atos de gestão praticados por qualquer dos sócios, salvo pacto expresso limitativo de poderes, que somente terá eficácia contra o terceiro que o conheça ou deva conhecer (art.989 do CC).

Os sócios respondem subsidiariamente, isto é, somente após exaurir os bens sociais, salvo o sócio que contratou pela sociedade, que então terá responsabilidade direta. De fato, reza o art.990 do CC: “Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024, aquele que contratou pela sociedade”.

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SOCIEDADE EM COMUM E COMUNHÃO Dá-se a comunhão ou condomínio quando um ou mais bens pertencem a mais de uma

pessoa. Pois bem, na sociedade em comum, os bens sociais também pertencem aos sócios, e não à sociedade, pois esta não tem personalidade jurídica.

Não obstante essa característica comum, distinguem-se nitidamente, pois na sociedade há a affectio societatis, isto é, o vínculo de cooperação para desenvolver uma atividade comum; na comunhão não há esse investimento comum. Assim, se duas pessoas são proprietárias de uma fazenda, mas nesta não se desenvolve qualquer atividade, haverá tão-somente comunhão. Se, ao revés, realizam um investimento comum em que há o risco de perder ou ganhar alguma coisa, como, por exemplo, plantação de café, ter-se-á uma sociedade.

CLÁUSULA LEONINA Cláusula leonina é a que exclui um dos sócios da participação nos lucros. Aludida cláusula é

nula (art. 1.008 do C.C.). No silêncio, o lucro é proporcional à quota de cada sócio. Quanto ao sócio cuja contribuição consiste apenas em serviços, participará dos lucros na proporção da média do valor das quotas (art.1.007 do CC).

PERDAS SOCIAIS É nula a cláusula que exclua qualquer dos sócios de participar das perdas, isto é, dos prejuízos

experimentados pela sociedade (art. 1.008 do C.C.), salvo na sociedade em que o sócio contribui apenas com serviços, este sócio não participa das perdas sociais (art. 1.007). O sócio, cuja contribuição consista em serviços, não pode, salvo convenção em contrário, empregar-se em atividade estranha à sociedade, sob pena de ser privado de seus lucros e dela excluído (art.1.006 do CC).

Convém esclarecer que nas sociedades empresárias todo sócio responde subsidiariamente pelas perdas sociais.

SÓCIO REMISSO Sócio remisso é o que não cumpriu a obrigação de contribuir para a formação do capital

social. O capital social subscrito compreende as quantias prometidas por cada um dos sócios.

Quando os sócios efetuam o pagamento dessas quantias à sociedade, fala-se em capital integralizado.

O sócio remisso é o que não integralizou o que subscreveu. A sociedade, após notificar o remisso, para, em trinta dias, adimplir a obrigação, poderá

tomar umas das seguintes posturas:

mover-lhe ação de cobrança; expulsá-lo da sociedade; reduzir o valor da quota social ao montante já realizado pelo remisso.

Nessas duas últimas hipóteses, o sócio remisso não responde pelo dano emergente da mora

(parágrafo único do art. 1.004 do C.C.).

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SOCIEDADE DE CAPITAL E SOCIEDADE DE PESSOA Sociedade de capital é aquela em que o sócio pode alienar a sua quota sem a anuência dos

demais. Sociedade de pessoa é aquela em que a alienação da quota depende da anuência dos demais

sócios. As sociedades de pessoas são as seguintes: a) nome coletivo; b) comandita simples. As sociedades de capital são: a) sociedade por ações; b) comandita por ações. Quanto à sociedade limitada, no silêncio do contrato, será de capital, pois o sócio pode ceder sua

quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente da anuência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social (art. 1.057 do C.C).

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS SÓCIOS Preceitua o art. 1.024 do CC: “Os bens particulares dos sócios não podem ser executados por

dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais”. Vê-se, portanto, que a responsabilidade dos sócios é subsidiária, pois a execução só pode

recair sobre os seus bens após o exaurimento do patrimônio da sociedade. A responsabilidade subsidiária dos sócios pode ser: a) Ilimitada: ocorre quando todos os sócios respondem ilimitada e solidariamente pelas

obrigações sociais. É o caso da sociedade em nome coletivo. b) Limitada: ocorre quando todos os sócios respondem até um certo valor pelas obrigações

sociais. É o caso da sociedade limitada, em que todos os sócios respondem pelo total do capital social subscrito, mas ainda não integralizado (art. 1.052 do C.C.).

c) Mista: ocorre quando alguns sócios respondem ilimitadamente e outros limitadamente. É o caso da sociedade em comandita simples, pois o sócio comanditado tem responsabilidade solidária e ilimitada pelas dívidas da sociedade, ao passo que o sócio comanditário responde somente pelo valor de sua quota. Outros exemplos: sociedade anônima e sociedade em comandita por ações.

RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS Em certas hipóteses, o sócio responde diretamente pelas dívidas sociais, não se exigindo que

primeiro seja exaurido o patrimônio da sociedade. Tal ocorre nos seguintes casos: a) Sociedade em comum: os sócios que se apresentaram como representantes da sociedade

respondem de forma direta, solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais. Quanto aos demais sócios, respondem de forma subsidiária, solidária e ilimitadamente. Com efeito, dispõe o art.990 do CC: “Todos os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais, excluído do benefício de ordem, previsto no art. 1.024, aquele que contratou pela sociedade”.

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b) Dívidas oriundas de ato ilícito. Exemplos: não pagamento de tributo e contribuições sociais; não pagamento de direitos trabalhistas; teoria da desconsideração da personalidade jurídica etc.

REGIME JURÍDICO Aplica-se às sociedades simples, nos termos do §2º do art.44 do CC, exceto à sociedade

limitada, os arts. 57 e 60, conforme Enunciado 280 do CJF. Assim, em havendo previsão contratual, é possível aos sócios deliberar a exclusão de sócio por justa causa, pela via extrajudicial, cabendo ao contrato disciplinar o procedimento de exclusão, assegurado o direito de defesa, por aplicação analógica do art.1.085 do CC. Outrossim, as deliberações sociais poderão ser convocadas pela iniciativa de sócios que representam 1/5 (um quinto) do capital social, na omissão do contrato. A mesma regra aplica-se na hipótese de criação, pelo contrato, de outros órgãos de deliberação colegiada.

EMPRESÁRIO INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA É a pessoa jurídica de direito privado que exerce atividade empresarial constituída por uma

única pessoa natural. É prevista na Lei nº 12.441/2011. Só é possível a constituição dessa pessoa jurídica se o capital destinado à empresa estiver totalmente integralizado. O valor desse capital não pode ser inferior a 100 (cem) salários mínimos. Pode ser constituída desde o início por pessoa natural ou então resultar da concentração de quotas da sociedade num único sócio, quando então em vez da extinção da sociedade é possível convertê-la em empresa individual de responsabilidade limitada. O nome empresarial deverá ser formado pela inclusão da expressão “EIRELI” após a firma ou denominação social. Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para a sociedade limitada. A pessoa natural que constituir esse tipo de pessoa jurídica só poderá figurar numa única empresa individual dessa modalidade, mas nada obsta que seja sócio de sociedade ou que constitua outra empresa individual de responsabilidade ilimitada. O empresário individual de responsabilidade ilimitada é uma pessoa física. O empresário individual de responsabilidade limitada é uma pessoa jurídica. Alguns a consideram uma sociedade, mas o entendimento mais correto é que se trata de uma pessoa jurídica unipessoal, pois é estranho designar de sociedade uma instituição que não têm sócios.

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PERGUNTAS:

1) O que é fundação e quais são os seus elementos? 2) Qual a forma de instituir fundação? 3) Qual a diferença entre fundação direta e indireta? 4) Quem aprova o estatuto da fundação? 5) A instituição da fundação pode ser revogada? 6) O juiz pode aprovar estatuto da fundação? 7) O Ministério Público pode aprovar estatuto da fundação? 8) Quando o Ministério Público elabora o estatuto da fundação? 9) Quais os requisitos para alterar o estatuto da fundação? 10) Todas as cláusulas do estatuto podem ser alteradas? 11) Como se extingue a fundação? 12) Qual a distinção entre fundação de direito público e fundação de direito privado? 13) O que é sociedade? 14) Quais as espécies de sociedade? 15) Qual a diferença entre sociedades empresárias e sociedades simples? Exemplifique. 16) O que é sociedade comum e quais suas espécies? 17) A sociedade comum pode figurar em relação processual? 18) Qual a distinção entre sociedade em comum e comunhão? 19) O que é cláusula leonina? 20) O que é sócio remisso? E quais as suas consequências? 21) Qual a distinção entre sociedade de capital e sociedade de pessoa? 22) A sociedade limitada é de capital ou de pessoa? 23) A responsabilidade dos sócios pelas perdas sociais é direta ou subsidiária? 24) O empresário individual tem responsabilidade limitada ou ilimitada? 25) O empresário individual é pessoa física ou pessoa jurídica? 26) Quais os requisitos da empresa individual de responsabilidade limitada? Qual o nome que

ela pode adotar? É possível constituir mais de uma empresa individual de responsabilidade limitada?