2ª edição mundo contemporâneo

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Número 2 Abril de 2009 Mensal TALENTOS PORTU GUESE S À CONQUISTA DO MUNDO Gonçalo M. Tavares, Rita Redshoes, Buraka Som Sistema, valter hugo mãe, José Luís Peixoto e M. Tiago Paixão são alguns dos nomes de aventureiros que se lançaram pelo mundo fora. Cultura Dramaturga Ana Cristina Oliveira brilha com “Segredos do Levante”. Portugal 35 anos depois, o país não esqueceu o dia da Liberdade, 25 de Abril. Especial Escapar à morte quase certa e ser um sobrevivente de uma catástrofe

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2ª Edição da revista Mundo Contemporâneo

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Page 1: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

Número 2 Abril de 2009 Mensal

TALENTOS PORTUGUESES À CONQUISTA DO MUNDO

Gonçalo M. Tavares, Rita Redshoes, Buraka Som Sistema, valter hugo mãe,

José Luís Peixoto e M. Tiago Paixão são alguns dos nomes de aventureiros que se

lançaram pelo mundo fora.

Cultura

Dramaturga Ana CristinaOliveira brilha com“Segredos do Levante”.

Portugal

35 anos depois, o país nãoesqueceu o dia da Liberdade,25 de Abril.

Especial

Escapar à morte quase certae ser um sobreviventede uma catástrofe

Page 2: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

sistiu ao escândalo político protagonizado por Fátima Felgueiras, na sequência do pro-cesso “Saco Azul”, que viria a revelar-se no mínimo caricato. Recorde-se que a autarca foi acusada de corrupção e financiamento da secção local do Partido Socialista, chegan-do mesmo a ter sido emitida uma ordem de prisão preventiva em seu nome. De facto, a verdade é que com mestria e algum engen-ho Fátima Felgueiras acabou por “fintar” a justiça portuguesa, refugiando-se no seu país Natal. Regressou meses depois com o estatuto de “heroína”, voltando a ocupar o cargo de Presidente do Município, depois de ter sido indiciada por 23 crimes e con-denada por três deles, com pena suspensa.

Seis anos depois, por entre casos pen-dentes e investigações intermináveis, o fantasma da corrupção volta a asso-lar o país. Desta feita o palco português

Numa altura em que a justiça por-tuguesa revela cada vez maior incapacidade na resolução de

processos polémicos, vale sempre a pena recordar casos como os de Isaltino Mo-rais, Pinto da Costa, Fátima Felgueiras, Avelino Ferreira Torres ou até mesmo Val-entim Loureiro, que pela sua especificidade e consequente desfecho se afirmam hoje como provas cabais da inércia dos tribunais.

Que justiça temos afinal? Uma justiça que indicia mas nunca pune? Uma justiça que investiga e se revela incapaz de con-cluir? Uma justiça que cobre a corrupção e deixa a nu as suas próprias fragilidades?

Essa mesma justiça que em 2003 as-

Uma justiça que investiga e se revela incapaz de concluir? Uma justiça que cobre a corrupção e deixa a nu as suas próprias fragilidades?

EDITORIAL

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apresenta Isaltino Morais como actor principal de uma peça sem fim à vista.

Indiciado pelos crimes de corrupção, branqueamento de capitais, fraude fis-cal e abuso de poder, o Presidente da Câ-

mara Municipal de Oeiras, continua a exercer as suas funções, indiferente a to-das as polémicas associadas ao seu nome.

Em patamar de igualdade encontram-se Pinto da Costa e Valentim Loureiro, arguidos do caso Apito Dourado, que em 2004 envolveu o futebol português numa nuvem de incerteza e ambiguidade.

O Presidente do Futebol Clube do Porto é acusado pelos crimes de falsifi-cação de documentos e corrupção e trá-fico de influências no futebol português, enquanto que o ex-presidente da Liga de Clubes, Valentim Loureiro foi sentenciado a três anos de prisão com pena suspensa.

Assim se faz a história da corrupção em Portugal, uma história que se resume a sen-tenças adiadas e penas suspensas, a relógios atrasados numa justiça cada vez menos certa.

ISA MESTRE

ARQUIVO MORTO

Page 3: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

INDICE

Portugal4 35 anos de Liberdade7 Polémica com o Provedor da Justiça8 Curiosidades

MUNDO9 Bento XVI em África10 Joseph Fritzl: «O Monstro»12 Sismo devasta Norte de Itália14 10 anos do Massacre de Columbine15 Gravidez no masculino

CULTURA16 “Segredos do Levante” por Ana Oliveira17 Teatro

OPINIÃO23 “O Cabo das Tormentas”

ESPECIAL24 Portugueses à conquista do Mundo26 Sobreviventes de Tragédias

DESPORTO28 Ayrton Senna: 15 anos depois31 MotoGp entre Rossi e Stoner34 A extinção da III Divisão

36 A FECHAR

FICHA TECNICA

Propietária: Profª Doutora Aurízia AnicaDirectora: Isa MestreSub-Director: Fábio LimaRedactores Principais: Adriano Narcisoe David MarquesDirector de Arte: Fábio Lima

INDICE

Pág. 24 Há portu-gueses a apostar no mercado internacio-nal e a vencer essa aposta. Saiba quem são os talentos lusos com mais sucesso lá fora.

Pág. 26 Conheça quatro casos de pessoas que estiver-am entre a vida e a morte e so-breviveram a acidentes terríveis.

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Portugal e Mundo: Adriano Narciso, Isa Mestre, Marta Miranda, Raquel Rodrigues e Rita CaeiroCultura: Grethel Ceballos, Inês Samina e João MarujoDesporto: Fábio Lima e David Marques

Pág. 4 Há 35 anos gritou-se “Liberdade!” em Por-tugal. Histórias e Estórias da época e testemunhos de quem viveu este período de enorme valor histórico para o nosso país.

Page 4: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

PORTUGAL

O novo Ferrari F-60

“De m o c r a t i z a r, Descolonizar e Desenvolver”.

Eram estes os fundamentos básicos de actuação preconizados pelo embrionário Movimento das Forças Armadas (MFA) quando foi formado em Setembro de 1973. Até meados de Março do ano seguinte, a meticulosa estratégia para derrubar a vigente “Velha Senhora” foi concluída.

As tentativas falhadas

Desde a Ditadura Militar (1926-28), passando pela Nacional (1928-32) e pelo Estado Novo, que governou o país durante 41 anos, muitas foram as tentativas para derrubar o Poder. A 4 de Julho de 1937, um grupo de anarquistas ensaiou, em vão, uma tentativa para assassinar Salazar. Este foi o último acontecimento de uma primeira fase de oposição ao Governo que se caracterizou por ser fraca e desorganizada.

A partir dos anos 40 surgiram novos grupos organizados, onde se faziam representar importantes vultos que se destacaram nas décadas seguintes. Foi criado o MUNAF (Movimento de Unidade Nacional Anti-Fascista), que viria a ser rebaptizado de MUD (Movimento de Unidade

Democrática) e a oposição ganhava força e consenso popular para um eventual braço-de-ferro com os governantes em eleições presidenciais a exemplo de Norton de Matos, que em 1949 se candidatou às eleições presidenciais.

Os órgãos de censura e a polícia política continham e reprimiam a propagação de ideias anti-fascistas e as manifestações em massa contra o Estado. Porém, em 1958 o General Humberto Delgado resolveu enfrentar o Salazar. Questionado em vésperas eleitorais sobre o que faria ao ditador se fosse eleito para o cargo de Presidente da República, o “General Sem Medo”, respondeu “Obviamente demito-o”. Pese embora todo o apoio das massas populares, o militar acabou derrotado devido a fraude eleitoral.

Tudo foi tentado para mudar a situação de um país que o regime continuava a anestesiar usando uma compilação de estratégias, desde o sequestro de navios (Santa Maria, em 1961), revoltas estudantis, como a que se verificou em 1962 na Universidade de Lisboa e uma tentativa silenciada de golpe de Estado – também no ano de 62. Entretanto, com o avançar de uma guerra colonial que se perpetuava sem fim à vista, o regime entrou definitivamente em colapso ideológico.

A guerra, a emigração e as relações internacionais

Há muito que o Estado português dava sinais de estar enfraquecido. A guerra civil, com início em 1961, mobilizou mais de 800 mil combatentes provenientes da metrópole. Raras eram as famílias portuguesas que, directa ou indirectamente, não eram afectadas pelo flagelo de uma guerra que tirou a vida a

Foi há 35 anos que a voz do povo falou mais alto

Por David Marques

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Page 5: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

ultramarinas, eram cada vez mais intensas. Porém, durante a crise dos mísseis de Cuba, em 1962, o Governo nacional aproveitou-se da importância geoestratégica dos Açores. Os Estados Unidos, cientes de que a disponibilidade de Portugal poderia ser vital para as suas operações atlânticas, abstiveram-se de condenar a política colonial nacional, seguindo-se França, Grã-Bretanha e muitos outros países membros da NATO.

destinado ao ultramar foi de 5 milhões de contos, contudo os gastos finais bateram no tecto dos 11 milhões.

As relações diplomáticas e económicas com outros países europeus, nomeadamente os pertencentes ao bloco comunista, eram praticamente inexistentes. As pressões dos países membros da ONU, para que Portugal se desvinculasse das suas agora intituladas províncias

mais de 9 mil combatentes, causou mais de 14 mil deficientes físicos – 1800 amputados – e estima-se que aproximadamente 140 mil pessoas tenham regressado à pátria com traumas de guerra.

Mais de um terço do orçamento anual do Estado era desviado para o Ultramar. Anualmente, os custos da guerra eram sempre muito superiores aos orçamentos disponíveis: no último ano de guerra, o orçamento extraordinário

Foi há 35 anos que a voz do povo falou mais alto

Foto: Ana Gatinho

PORTUGAL

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Page 6: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

PORTUGAL

O novo Ferrari F-606

Internamente, aos poucos a situação tornava-se insustentável e, como consequência, verificou-se um aumento repentino da emigração legal e clandestina a partir dos anos 60. Em 1970, o número de portugueses a sair do país foi superior a 170 mil.

Pese embora algum alívio da pressão internacional, durante uma visita a Londres em Julho de 1973, Caetano foi fortemente contestado. Este acontecimento vincou definitivamente o que há muito se temia: Portugal encontrava-se isolado do resto do mundo, mas o Estado, “orgulhosamente só”, dava continuidade à sua gritante política despótica e anacrónica.

A Independência

O ano de 1968 foi marcado pelo adeus forçado de Salazar ao poder. O ditador caiu da cadeira e não mais se levantou, sendo prontamente substituído por Marcello Caetano. Porém, com o antigo reitor da Universidade de Lisboa a situação nacional pouco se alterou. A somar à pobreza, ao atraso cultural, à iliteracia e à repressão, o Estado recusava-se a aceitar uma solução política para a guerra.

Foi no dia 24 de Abril que se iniciou a mobilização final que culminaria com o cerco ao quartel do Carmo. Já na madrugada de 25 e ainda com

muita noite pela frente, as forças revoltosas iniciaram a ocupação de alguns pontos estratégicos de Lisboa. No norte do país a actuação foi semelhante. Depois de vários apelos à sua rendição, Caetano afirma estar disposto a render-se, pedindo, no entanto, uma reunião prévia com o General Spínola, a quem entrega o poder às 19:30, hora em que deixou o quartel sob a tutela do MFA.

Terminada a resistência política, alguns elementos da polícia política disparam sobre manifestantes que tentavam entrar na sede da DGS. Quatro pessoas morreram e 45 ficaram feridas.

Durante quase cinco décadas foram muitos os políticos e bravos guerreiros que ousaram fazer frente a um Estado que não raras vezes hesitou em eliminar qualquer entidade que lhe fizesse frente. Por mais armas que sejam empunhadas, por mais esforços que sejam empregues, é na vontade comum dos cidadãos que reside a esperança e o poder de mudar. Porque sempre assim o foi e sempre assim será, onde “o povo é quem mais ordena”.

«Foram dias foram anos a esperar por um só dia. Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia na esperança de um só dia.»

Manuel Alegre

“Estava no oeste de Moçam-bique, junto à fronteira com a an-tiga Rodésia [Zimbabué] quando se deu a revolução. A população desconhecia que estava planeada, mas alguns militares já tinham conhecimento de que algo iria acontecer. Ouvimos numa rádio da África do Sul que tinha havido uma revolução em Portugal. Sen-ti que o que estava a acontecer nunca poderia piorar a situação vivida no país.”

José Marques, antigocombatente em Moçambique

entre 1972 e 74

“Estava de serviço em reforço no quartel da Pontinha, em Lisboa. Senti medo porque desconhecia o que estava a acontecer.”

Venâncio Filipe Anastácio,antigo militar e combatente

no Ultramar

“Estava em Benguela, Angola, a frequentar o 6º ano de liceu. A notícia do 25 de Abril só che-gou ao meu conhecimento no dia seguinte, mas trouxe-me uma grande esperança na pos-sibilidade de mudança política e cultural, quer em Portugal conti-nental quer nas províncias ultra-marinas.”

Aurízia Anica, professora da Universidade do Algarve

Foto: SAPO

General Humberto Delgado

Page 7: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

A escolha de um novo prove-dor da justiça pode es-tar para breve. Durante

uma conferência de líderes dos principais partidos portugueses chegou-se a um consenso e 15 de Maio é a data limite para eleição do cargo. As candidaturas devem ser apresentadas até 24 de Abril.

Embora a decisão tenha sido chegada por unanimidade, o CDS-PP considerou como solução para este problema o facto de o Presi-dente da Assembleia da Republica começar a funcionar como media-dor deste processo, sendo impre-scindível que se efectue alguma alteração no processo de escolha do provedor. Jaime Gama prefere não interferir na escolha do cargo, deixando isso a cargo dos partidos, que se têm reunido com frequência.

Apesar de a imposição desta data tenha sido, segundo os co-munistas e bloquistas, bastante benéfica para pôr pressão sobre o processo, a um pouco mais de um mês da data estipulada, parece ser muito difícil cumprir o prazo acordado se as candidaturas forem relegadas para o ultimo dia, uma vez que o Regimento da Assembleia da Repúbli-ca impõe que o candidato a provedor de Justiça deverá ser apresentado “perante o presidente da Assembleia até 30 dias antes da data da eleição” e deverá também ser ouvido previamente pelo Parlamento entre a data da apresentação e a da eleição.

Outro dos possíveis cenários é o de não se chegar a um nome durante as vota-ções, que deverá ter uma maioria de pelo menos dois

terços dos 230 deputados. Neste caso será preciso recorrer-se a uma segunda volta de forma a con-seguir esta marca. Esta situação pode vir a ser difícil para o PS, que precisa de conseguir votos de 154 deputados, que representam os votos de toda a oposição, ex-cepto o PSD, conseguirá eleger o provedor pela margem de um voto.

O Provedor da Justiça, Nasci-mento Rodrigues, actualmente de baixa médica entrou em funções em 2000, tendo sido reeleito em 2004 para continuar a exercer fun-ções. A primeira eleição para um sucessor de Nascimento Rodrigues esteve já marcada para Julho pas-sado, altura em que chegavam ao fim os quatro anos de mandato do actual provedor, mas os desenten-dimentos entre o PS e o PSD le-varam a um adiamento da escolha para 10 de Outubro. A verdade é que também nessa data não havia acordo entre os dois partidos.

Nascimento Rodrigues afir-mou: “Não estou satisfeito e acomodo-me mal por me ver obrigado a permanecer no exer-

Escolha de novo provedor pode estar para breve

cício de um mandato cujo prazo legal está longamente excedido” mas não considera toda esta situa-ção uma tragédia grega, apelidan-do-a de ‘comédia à portuguesa’.

Durante todo este processo foram várias as afirmações que Nascimento Rodrigues teceu em relação a esta situação que o secre-tário-geral do PSD, Luís Marques Guedes, considerou que seria “de muito mau tom” . Uma delas cen-trou-se no ‘apetite’ que o partido do governo nutre por este cargo. O provedor da Justiça afirmou que ‘percebo mal o apetite do PS pelo lugar do Provedor de Justiça’ acrescentando que o partido so-cialista, que ocupa já todos os altos cargos públicos, faz lembrar o Zeca Afonso:’eles comem tudo’. Estas afirmações foram mal recebidas pelo PS e o porta-voz do partido, Vitalino Canas, considerou-as ‘in-felizes’, dizendo também que não lhe ‘parece bem que uma pessoa que exerce um determinado cargo se pronuncie e procure condicio-nar a escolha do seu sucessor’.

PORTUGAL

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Foto: Visão

15 de Maio é a data imposta para eleição do sucessor de Nascimento Rodrigues.

Page 8: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

PORTUGAL

Ariana Ferreira Loff, in-vestigadora na área da Dislexia da Universidade

de Trás-os-Montes e Alto Douro, foi considerada a melhor entre centenas, o que a levou à vitória do concurso “Marie Curie Early Stage Researcher”, que é atribuído anualmente pela Fundação Ma-rie Curie, em Clermond-Ferrand, ao melhor projecto desenvolvido na área da dislexia de crianças.

Ariana Loff mudou-se para York, Inglaterra, onde passará os próximos três anos a trabalhar num posto de investigação da Universi-dade da cidade e a usufruir do seu prémio, uma bolsa de doutoramento.

Através de um inevitável sen-timento de orgulho, Ariana dedica este prémio aos seus pais, em es-pecial ao seu progenitor pela ajuda e compreensão que sempre lhe ofereceu nos seus primeiros passos

como inves-tigadora, que c o m e ç a r a m antes de acabar o curso para se tornar pro-fessora do 1º ciclo do Ensi-no Básico com um projecto da Unidade de Dislexia da UTAD so-bre questões específicas do Português, finan-ciado pela Fundação para a Ciên-cia e Tecnologia e sob a orienta-ção da docente Ana Paula Vale. Seguiu-se o mestrado mas, se-gundo Ariana Loff, a sua vontade maior era o doutoramento e foi isso que a levou a participar neste concurso e concorrer para o posto mais prestigiado, o de York, co-

ordenado por Margaret Snowling.Classificando como excelente

o serviço da Unidade de Dislexia de Vila Real, Ariana não esconde o entusiasmo da mudança para um centro de investigação de ex-celência mundial, mas revela a vontade de voltar para Portugal e aplicar o seu conhecimento.

RITA CAEIRO

Projecto de dislexia dá o primeirolugar a investigadora da UTAD

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A Ministra da Saúde decla-rou que o Serviço Na-cional de Saúde não irá

pagar às farmácias as compar-ticipações dos medicamentos que forem substituídos pelos genéri-cos sem autorização do médico.

No fim da cerimónia do dia mundial da saúde, Ana Jorge foi questionada sobre a guerra entre médicos e farmacêuticos, devido à iniciativa da Associação Nacional de Farmácias (ANF) em substituir medicamentos pelos genéricos cor-respondentes mais baratos, mesmo com a oposição do médico. A min-istra referiu não ter conhecimento sobre tal medida, clarificando só sa-ber que as farmácias iriam realizar uma campanha de informação so-

bre os preços dos medicamentos.A legislação deste assunto de-

termina que a alteração dos medi-camentos prescritos no momento da dispensa só pode acontecer me-diante o pedido do utente e com autorização indicada do médi-co prescritor. Contudo, desde o primeiro dia do mês de Abril que as farmácias iniciaram a substitu-ição dos medicamentos receitados pelos médicos por genéricos mais baratos, uma medida que o Minis-tério da Saúde considerou “ilegíti-mo”, ao que a ANF responde não haver qualquer tipo de ilegalidade, uma vez que estas não estão sujei-tas a aplicar a mesma metodolo-gia que é seguida nos hospitais.

Já Ana Jorge afirma que são

processos completamente distin-tos, que compreendem formulários específicos nos meios hospitalares e que são elaborados por uma eq-uipa multidisciplinar. Acrescenta ainda que as receitas modificadas que seguem para as Administra-ções Regionais de Saúde (ARS) até ao dia 10 de cada mês vão ser de-volvidas às farmácias, pois é neste dia que as farmácias entregam as receitas para receberem o valor da comparticipação que o Serviço Nacional de Saúde dá a cada fár-maco determinado pelo médico. Deste modo, as farmácias não re-cebem o pagamento das compar-ticipações alegadamente falsas.

RITA CAEIRO

Genéricos e Medicamentos:Guerra económica ou legalidade?

Foto: SAPO

Investigadora da UTAD premiada internacionalmente

Page 9: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

MUNDO

O novo Ferrari F-60

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Bento XVI visita Áfricae alimenta polémica

A primeira visita oficial marcada pelo apoio de milhares de crentes epor declarações polémicas sobre o uso do preservativo.

No dia 17 de Março, o Papa Bento XVI, ini-ciou um périplo de sete

dias pelo continente africano. Com passagem pelos Camarões e Angola, neste último país foi recebido por uma multidão fes-tiva que o esperava ansiosamente.

Começou nos Camarões a visita do Papa em África, e mes-mo antes de aterrar no aeroporto de Yaounde, a polémica já estava instalada em consequência das declarações prestadas a bordo do avião, onde Bento XVI defendeu que a solução para o problema da Sida não passava pela distribuição de preservativos, acusando os seus utilizadores de agravarem o problema. O papa apelou à ab-stinência para combater a doença.

Num continente em que a Sida tem um impacto devastador, com cerca de 22 milhões de pessoas infectadas, tais declarações tor-naram-se um pouco escandalosas, especialmente porque vinham de uma pessoa que deveria zelar pelo bem-estar da população mundial e que alguns esperavam que al-terasse as teses da Igreja Católica.

Polémicas à parte, a visita do Papa por terras africanas contin-uou. No dia 20 de Março, Bento XVI, chegou a Luanda onde foi recebido pelo chefe de Estado an-golano, José Eduardo dos Santos, e pelo primeiro-ministro, Paulo Kas-soma. Mas, além destes, milhares de pessoas concentraram-se nas ruas que dão acesso ao aeroporto 4 de Fevereiro, na tentativa de con-seguirem ver de perto a passagem do Sumo Pontífice. Esperaram-no, também, 30 mil jovens. A reunião no Estádio dos Coqueiros ficou mar-cada pela morte de duas pessoas, esmagadas pela população sedenta de ver o Papa Bento XVI ao vivo. No dia seguinte, o Papa relembrou as duas vítimas nas missas que cel-ebrou, dizendo-se profundamente abalado com tal acontecimento.

O grande dia do Papa em Áfri-ca foi o 22 de Março. Era Domingo e o espaço da Esplanada da Ciman-gola, um terreno de 20 hectares, a 14 km de Luanda, foi invadido por uma multidão de crentes, entre um milhão e uma milhão e meio, e que rapidamente fizeram esquec-er os problemas do Catolicismo

em Angola, onde este sempre foi ensombrado por igrejas alterna-tivas, de inspiração evangélica, e onde os cultos locais e práticas de feitiçaria são muito populares e bastante condenadas pelo Papa.

Bento XVI procurou chamar o povo à “verdadeira” fé, não se esquecendo de alertar os líderes africanos para respeitarem os dire-itos humanos, a democracia e a justiça. O Santo Padre não esque-ceu também a corrupção, as guer-ras e as mulheres africanas, que tanto sofreram de abusos e maus tratos ao longo de tantos anos.

No dia 23 de Março este périp-lo de Bento XVI chegou ao fim, da visita fica um balanço positivo para a Igreja Africana. Apesar da polémica do preservativo que mar-cou o início desta viagem, esta foi rapidamente ultrapassada, quando o Papa centrou as suas atenções na pobreza africana e no apelo da co-munidade internacional para aju-dar este continente, apelando ainda ao fim da corrupção numa tenta-tiva de manter a tão desejada paz.

RAQUEL RODRIGUES

Foto: AFP

Page 10: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

MUNDO

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O monstro de Amstetten

Joseph Fritzl, violou a sua filha mais velha, durante 24 anos. Uma cave, sem luz.

Um mundo de mentiras e sufoco a que Elisabeth teve de se submeter desde os 18 anos. 7 filhos, 1 mor-to. 3 adoptados pelos avós, num plano delineado por Fritzl para fazer a mulher crer no poço de fal-sidades a que submeteu a família.

1984, 24 de Agosto. O iní-cio da longa viagem de Elisabeth Fritzl. O dia em que o seu pai a prendeu no porão da sua casa, no sul da Áustria. Drogá-la, algemá-la e mantê-la prisioneira eram os planos de Joseph Fritzl. Um abuso que se manteve até Abril de 2008.

Actualmente, pai e avô de 7 cri-anças, uma delas morreu pouco de-pois de ter nascido, foi descoberto pelas autoridades enquanto levava a filha ao hospital por problemas de saúde. Soube-se então que Fritzl violava Elisabeth em frente às cri-anças e que, três destas tinham sem-pre vivido na prisão subterrânea, sem nunca terem visto a luz do dia.

Quando sequestrou o seu re-bento, em 1984, explicou à polí-cia que ela tinha sido levada por uma seita e, como evidência, fez com que Elisabeth escrevesse uma carta, dirigida aos pais, ped-indo que parassem de procurá-la. Como pai autoritário que era, proi-biu todos de visitarem o porão, alegando tratar-se do seu atelier.

Todas as noites, levava comida para a filha e para três dos seus fil-hos, enquanto que para os outros três preparou um plano para reve-lar a sua existência e adoptá-los como avô. Os três foram coloca-dos, com poucos meses de vida, à porta da sua casa, com cartas an-exadas escritas por Elisabeth. Uma delas, de 1993, dizia: «O bebé tem nove meses, terá uma vida mel-hor com os avós do que comigo.»

Entre as cartas falsas de Elis-abeth, supostamente desapare-cida desde que tinha 18 anos de idade, a mulher de Fritzl acredi-tou na história encenada e viveu, durante os 24 anos do desapare-cimento da filha, angustiada e a

cuidar dos seus netos suposta-mente abandonados, longe de pen-sar que esta vivia sob o mesmo chão que pisara todos os dias.

Elisabeth, que agora tem 42 anos, declarou que o pai a vio-lava desde os 11 anos e que, em 1984, a trancou no porão e que, durante os 24 anos de cat-iveiro, foi sistematicamente alvo de agressões e violações.

Josefh Fritzl, nascido a 9 de Abril de 1935 na Áustria, já tinha sido acusado de vários crimes sex-uais no ano de 1967, os quais já tin-ham prescrito e cujos registos foram apagados quando ele solicitou e obteve a adopção dos filhos-netos. Uma descoberta feita pelo jornal austríaco «Oberösterreichischen Nachrichten», em Maio de 2008.

«Eu sabia que a Elisabeth não queria que eu fizesse o que estava a fazer. Sabia que a estava a magoar. Aquilo era como um vício. Na ver-dade, eu desejava ter filhos com ela», assumiu Fritzl no julgamento que o condenou a prisão perpétua.

O julgamento de Josef Fritzl

Foto: timesonline.co.uk

Page 11: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

MUNDO

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teve início no dia 16 de Março de 2009. Fritzl entrou no tribunal ro-deado de seis polícias e a segurar uma pasta azul em ambas as mãos para evitar que o fotografassem.

«É culpado do crime de in-cesto?» perguntou a presidente do tribunal. «Sim.», respondeu Fritzl. «É culpado do crime de se-questro? Sim. É culpado do crime de violação? Sim, em parte.»

Inicialmente, confessou-se cul-pado por incesto e sequestro, mas negou a acusação de assassinato no caso da morte de um dos recém-nascidos no cativeiro e, em parte das violações. No dia seguinte, após ter assistido às 11 horas de depoimento da sua filha Elisabeth, gravado em vídeo e exibido numa sessão de portas fechadas, decidiu declarar-se culpado. «Assumo a culpa de todas as acusações», disse.

Contudo, a psiquiatra Adel-heid Kastner, afirma que Fritzl não sofre de uma necessidade forçosa-mente ligada ao impulso sexual. «Ele tem de se sentir saciado, seja sexualmente seja de outro modo», explicou. «Enquanto tiver pulsões sexuais, manifestará a sua necessi-dade de poder, mas esta não irá desaparecer com o fim das pulsões

sexuais», disse Kastner, sublin-hando que Fritzl tinha consciên-cia de «ter nascido para violar».

Nas entrevistas com a psiquia-tria, o acusado também revelou ter sido vítima de maus-tratos por parte da sua mãe, durante a infância.

A explicação para o facto de Fritzl ter engravidado tantas vezes a filha reside naquela necessidade de poder. «Quantas mais crianças houver, mais ele sente que con-trola a situação e pode exercer o poder», referiu a psiquiatra.

Citando o facto de Fritzl ter tido uma infância difícil, Adel-heid Kastner citou uma frase do austríaco que sintetiza toda a sua personalidade: «Escolhi Elisabeth porque era a mais parecida comigo, a mais forte. Quanto mais forte a oposição, maior o sabor da vitória.»

No dia 19 de Março de 2009, após 4 dias de julgamento, Fritzl foi julgado culpado e condenado a prisão perpétua pelos crimes de incesto, violação, homicí-dio, sequestro e escravidão.

A filha de Fritzl e os seus seis filhos, três dos quais en-carcerados desde o nascimen-to, vivem agora numa casa cuja morada é desconhecida.

Os últimos dados do estudo do caso revelam que os planos de Fritzl para a construção do cativeiro podem ter sido inicia-dos em 1978, desde que Elisa-beth tinha apenas 12 anos.

Segundo a equipa de investiga-ção oito portas separavam Elisa-beth do mundo. Ausência da luz do dia, de pessoas, de ar puro. Men-tiras e cativeiro. Foi a vida que Joseph Fritzl proporcionou à filha desde os 18 anos de idade. Segun-do os estudos, Fritzl terá pensado em tudo para que a cave da casa onde sempre viveu, em Amstetten, a oeste de Viena, fosse uma es-pécie de prisão de alta segurança.

O responsável da cadeia onde Joseph Fritzl está preso afirmou que o homem está bem. O advoga-do, Rudolf Mayer, defendeu que, apesar da premeditação com que Fritzl levou a cabo os seus planos, estes foram motivados por insani-dade mental «Na minha opinião trata-se de um homem doente, que não é responsável pelos seus actos e que não deve estar numa prisão mas numa instituição psiquiátrica».

MARTA MIRANDA

Infografismo: A

FP e Sapo

Joseph Fritzl e a sua “Casa dos Horrores”

Page 12: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

MUNDO

Itália volta a tremerDoze anos depois do último sismo significativo, Itália voltou a

sentir que a terra lhe fugiu debaixo dos pés.

O pesadelo das 3.32h

O anoitecer revelava-se si-lencioso e a grande “bota” dormia sob o escudo pro-

tector de César quando subitamente sentiu a terra tremer durante trinta segundos. Trinta segundos de caos, medo e incerteza que ficarão para sempre guardados na memória de quem os viveu. Depois disso, nada poderia ser igual. Áquila, cidade no centro de Itália, foi a mais atingida, sendo que o epicentro da tragé-dia se deu a apenas 10 km, numa localidade medieval próxima.

O sismo que sacudiu a região assombrou não apenas Itália mas também o mundo com os seus impressionantes 5,8 de magni-tude na Escala de Richter, co-locando-o no topo dos maiores abalos sísmicos vividos no país.

Roma, Pettino, Scoppito ou Pescara foram apenas algu-mas das cidades que acordaram com o “abanão” que a 6 de Abril de 2009 alertou o mundo para

a necessidade de criar infra-es-truturas devidamente prepara-das para as catástrofes naturais.

Áquila, à semelhança de mui-tas outras cidades no país e no mundo foi apanhada completa-mente em contrapé e viu ruir em segundos o património que pres-ervou durante anos. Os balanços provisórios dão-nos conta de 15 mil edifícios destruídos, numa cidade que procura desesperada-mente o regresso à tranquilidade.

Todavia, e acima de tudo, Áquila procura ainda tempo para chorar os seus 260 mortos (núme-ro aproximado), lutar contra os es-combros por 250 desaparecidos e amparar os 1500 feridos e os 100 mil desalojados, fruto da tragédia.

Recorde-se que desde a madru-gada de segunda-feira que a terra continua a tremer, sendo que já se fizeram sentir 430 réplicas até ao momento, registando uma delas o valor de 5.6 na Escala de Richter e fazendo com que o pânico se instalasse novamente

por entre a população italiana. Entretanto, o Governo Ital-

iano já garantiu que no decorrer da próxima semana os sobrevi-ventes serão provisoriamente re-alojados, após terem sido ergui-dos 14 hospitais de campanha, 31 campos de tendas e 24 cozinhas.

Os avisos

Giampaolo Giuliani é o nome do homem que diz ter previsto com semanas de antecedência a tragédia. Segundo relatos, o sis-mologista pegou num megafone e visitou Áquila com o objectivo de evacuar a cidade, informando os seus habitantes de que estava imi-nente a ocorrência de um sismo.

No entanto, a teoria de Giu-liani, baseada na concentração de gás rádon nas zonas sísmicas activas, acabou por ser completa-mente menosprezada pela popu-lação e pelo próprio Presidente da Câmara que denunciou o cientista às autoridades, acusando-o de es-

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Foto: AFP

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MUNDO

palhar o pânico entre a população. Contudo, as autoridades

acusaram o “toque” e no dia 31 de Março a Protecção Civil itali-ana decidiu reunir-se com o objec-tivo de avaliar os riscos de ocor-rência de um sismo de grandes dimensões. As conclusões da reunião sossegaram a popula-ção e asseguraram que não havia, na altura, motivos para alarme.

Segundo os entendidos, ape-sar dos pequenos abalos que vin-ham assolando a região desde há algum tempo, tudo fazia parte de “uma sequência normal”, tendo em conta que a área em questão se tratava de uma zona sísmica.

Acrescente-se que a própria Protecção Civil italiana des-valorizou as previsões de Giu-liani, afirmando que “sempre que há um sismo há pessoas que dizem ter previsto o incidente”.

O que é certo é que na madru-gada de 6 de Abril de 2009, após um violento abalo sísmico, Itália viria a confirmar da pior forma as previsões do cientista.

Portugueses no centroda tragédia

Liliana Ferronha e Marta Bento, estudantes portuguesas em Áquila, ao abrigo do Programa Erasmus não poderiam começaram de pior forma o semestre académico e a experiência de estudar fora do país. Perceber-am-no na madrugada da tragédia quando a terra tremeu e o coração quis regressar ao país natal.

Liliana Ferronha recor-da atemorizada o momen-to em que se apercebeu do que acontecia: “Foi hor-rível, acordei assustada, eram três e tal da manhã e as minhas colegas sal-

taram todas das camas, mas eu não me conseguia mexer, porque estava tudo a tremer, não sabia o que fazer”.

O sismo ocorrido deixou marcas profundas nas duas por-tuguesas que, dois dias depois, e já em terras lusas, confessam que “o barulho, o alvoroço e o caos” não lhes saem da cabeça.

Contudo, e para além destas duas alunas, havia mais 5 portugueses no centro da tragédia: Gustavo Bo-telho, Sílvia Fernandes, Isabel Fer-reira, Rita Fouga e Paula Gomes.

De entre os sete que testemun-haram na passada segunda-feira o terramoto, apenas Gustavo Botelho continuará por terras transalpinas, sendo que os restantes regressarão a Portugal para retomar os estudos nas suas universidades de origem.

Itália de Luto

As marcas da tragédia não ficaram apenas no coração de todos os portugueses presentes no local, mas também nos de todos aque-les que em diferentes regiões de Itália ou até mesmo noutras partes do mundo tomaram conhecimento do sucedido através da televisão.

De forma a atenuar o luto de todos aqueles que sofrem, Sílvio Berlusconi, Primeiro - Ministro Italiano confirmou que será cel-ebrado, na Sexta-feira da Paixão, um funeral colectivo solene.

A cerimónia será conduzida pelo bispo de Áquila, monsen-hor Giuseppe Molinari, e o dia será considerado de luto nacio-nal. Assim se cumpre o desejo das autoridades religiosas locais de que os funerais das vítimas se-jam realizados na época pascal.

Num outro âmbito, também o Papa Bento XVI anunciou que visi-taria nas próximas semanas a região afectada, compartilhando da dor e preocupação de todos os envolvidos.

Concluindo a sua interven-ção o Sumo Pontífice elogiou o esforço dos socorristas, das au-toridades e dos voluntários, bem como a solidariedade demon-strada para ultrapassar o flagelo.

Enquanto os funerais não se realizam, as famílias continuam a velar os seus mortos no centro de coordenação de resgates, in-stalado pela protecção civil a seis quilómetros do local da tragédia.

ISA MESTRE

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Foto: EPA

Primeiro ministro, Silvio Berlusconi, visitou a zona mais afectada

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O massacre que a América não esquece

20 de Abril de 2009. Volvidos dez anos desde o Massacre de Columbine, no Condado de

Jefferson, Colorado, nos Estados Unidos, muitos são aqueles que se revelam incapazes de esquecer o fatídico dia em que dois estu-dantes, Eric Harris e Dylan Kle-bold, foram protagonistas da morte de doze alunos e uma professora na escola Secundária do Colorado.

Eric e Dylan, com 18 e 17 anos, respectivamente, eram aparente-mente jovens normais. Criados no seio de famílias de classe média-alta e usufruindo de todos os con-fortos, nada faria prever a tragédia.

No entanto, a 20 de Abril de 1999, o Instituto Columbine, que não registrara até então qualquer caso de violência, deixaria de ser conhecido como espaço de re-alização pessoal de milhares de alunos e ficaria inevitavelmente manchado pelo sangue derra-mado pelos jovens estudantes.

Eric Harris e Dylan Klebold, ambos adeptos das novas tecno-logias, já haviam indiciado no seu website pessoal os planos de vin-gança, extravasando na internet o seu ódio através de atitudes tão

bizarras como: coleccionar cru-zes suásticas, slogans neonazis e até mesmo fornecer instruções para a confecção de bombas.

Auto-retratando-se, um dos jovens afirmara convicta-mente: “Mato aqueles de quem não gosto, jogo fora o que não quero e destruo o que odeio”.

Foi seguindo este lema, que a 20 de Abril de 1999, data do an-iversário da morte de Adolf Hit-ler, os dois jovens entraram no Instituto Columbine armados com duas pistolas e algumas bombas caseiras, para matar 12 pessoas e marcar o dia 20 de Abril como o inicio de uma triste camin-hada de violência e crime no in-terior das escolas americanas.

No entanto, o historial de crim-inalidade não remonta apenas aos últimos acontecimentos, sendo que já em 1997-98 o mundo registara 42 homicídios em escolas americanas.

Que triste realidade a que vive-mos? A realidade de jovens soli-tários que se refugiam na internet? Ou a realidade de jovens de classe média, rodeados de conforto, aos quais falta apenas atenção? Não seriam Eric Harris e Dylan Kle-

bold apenas “meninos invisíveis”? Daqueles que, esquecidos durante tanto tempo, precisam de se mostrar ao mundo, seja de que forma for?

Os media especularam que o ex-cesso de tempo em frente ao com-putador e as perigosas ligações à internet pudessem estar na origem do despoletar da tragédia, mas ja-mais foram capazes de questionar-se por que motivo Eric e Dylan se refugiavam na “teia” da internet.

Para combater a solidão? Para se acreditarem mais humanos e se mascararem tantas vezes sob a face obscura do desconhecido? Para se reverem em tantos outros que buscaram o mesmo camin-ho para fazer frente à tristeza?

Não sabemos, nunca poder-emos saber. Aquilo que o mundo nos mostrou foi apenas o der-radeiro final de uma história da qual desconhecemos o início.

O final da manhã de 20 de Abril de 1999, o final da vida de doze inocentes, o final de Eric Harris e Dylan Klebold e o inicio do pesadelo para aqueles a quem a dor da perda retirou quase tudo.

ISA MESTRE

MUNDO

Foto: Wiki Commons

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MUNDO

Nos tempos que correm já podemos dizer que os rapazes já podem partil-

har experiências que só as mul-heres podiam ter. Engravidar.

São casos raros, mas que po-dem acontecer. Rúben nasceu uma rapariga. Fany nunca foi sentida como uma mulher. Actualmente, por fora rapaz e rapariga por den-tro. «Sinto-me como um homem, mas biologicamente sou mulher e engravidei.», Afirma Ruben.

Passados oito anos de viv-er como uma mulher percebeu que queria ser homem e ini-ciou o tratamento hormonal para ter aparência masculina.

O que não fez foi a mudança dos órgãos sexuais e, por isso, pode ter filhos. Hoje, com 25 anos, é técnico de som e imagem e vive em Barcelona com a sua mulher, Esperanza, de 42 anos. Foi graças a um tratamento de fertilização que conseguiu engravidar, com um óvulo seu e esperma de um dador.

Ruben não tentou só agora en-gravidar. A sua primeira tentativa não correu pelo melhor e sofreu um aborto espontâneo. Agora, já de 9 semanas, está a espera de gémeos.

Setembro será o mês em que

dará à luz os seus rebentos, mas como sofre de epilepsia e neuropatia, tem uma gravi-dez de risco que o pode ati-rar para uma cadeira de rodas.

Ruben é o primeiro transexu-al grávido de gémeos e, por isso, a mediatização está a gerar uma onde de censura, de tal modo que até os transexuais criticam a ambiguidade da sua identidade.

Com uma infância difícil, o futuro pai decidiu dar uma reviravolta à sua vida e fazer aquilo que realmente o faria feliz e com que se sentia bem. Aos setes anos descobriu que fora adoptado e durante a ado-lescência foi rejeitado pelos colegas de escola pelos manei-rismos masculinos que exibia.

Foi em Agosto de 2001 que percebeu que não podia contin-uar preso a um corpo de mulher se tudo o que sentia era de um homem. O momento de vira-gem aconteceu quando um em-pregado de mesa o tratou como se fosse um homem e ele se sen-tiu confortável com a situação. Saiu do café e foi comprar roupa de homem. Nesse dia, Fany foi enterrada e nasceu Ruben Noé.

Até os pais recusaram aceitar a nova identidade do filho. Ru-ben teve de mudar de localidade e, ainda hoje, o pai não atende os seus telefonemas. «Diz que quer a menina que adoptou, não eu», contou Ruben ao jornal “El País”.

Confortável com a identidade que adoptou, vive feliz com a sua compan-heira, mãe de duas crianças, mas que já não pode engravidar novamente. A família da sua mulher também não aceita o facto de a sua filha viver com um transexual, o que impede o casal de fazer planos de casar brevemente.

No registo de identificação, onde já existem cerca de mil transexuais que mudaram de identidade, Ruben continua a ser mulher, mas tenciona completar o processo de mudança de sexo logo que os filhos nasçam. «Penso, ajo e sinto com um homem», afirmou ao jornal “El Mundo”. O fac-to de querer passar pela experiência da maternidade não constitui, na sua opinião, uma contradição. «Estou no meu direito de ter filhos. Vamos ser um pai, uma mãe e dois filhos. Não vejo qual é o problema», acrescenta.

Das mais de 160 clínicas de fer-tilidade de Espanha, só uma aceitou fazer-lhe o tratamento e está a ser fortemente contestada. Mas este pode ser apenas o primeiro caso, já que Ruben garante que outros 16 transexuais já lhe pediram in-formações sobre como engravidar.

Nascido como mulher mas a viver como um homem, Ruben en-gravidou e vai ter o seu filho. Não á nenhuma aberração da natureza dado que, o seu corpo biológico é o de uma mulher, portanto o bebé não poderá nascer com deficiência devida a esse facto. Só o aspecto exterior de Ruben é que mudou.

Exterior às acusações e às críti-cas de todos os que o rodeiam, Ru-ben Noé vai ter os seus rebentos no mês de Setembro e viver a vida como um pai feliz, com a diferença de que foi ele que as teve e não a mãe.

RAQUEL RODRIGUES

A Gravidez já não éexclusiva das Mulheres!

Foto: fotografias.net

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CULTURA

Dizem que escreve sobre “a perplexidade de um mun-do dissolvido nas brisas le-

vantinas”, dramatizando “fantasias alheias” e deixando-se encantar pelo universo que um dia deslum-brou Manuel Teixeira Gomes. O universo situado a Sul que um dia viria a conquistá-la também a si.

De seu nome Ana Cristina Oliveira, esta é a mulher que “borda palavras no fio de tempos cruzados”, a mulher que em cri-ança coleccionava imagens de grandes escritoras, ambicionan-do um dia poder ser como elas, poder fazer frente ao mundo com a maior arma de todas: a caneta.

Nascida no ano de 1963, em Lisboa, a escritora e dramaturga Ana Cristina Oliveira estaria longe de imaginar que um dia o Algarve viesse a acolher o seu talento e ser porto de partida para um universo de descoberta e ambição. No en-tanto, em 1993 e na condição de professora colocada numa pequena vila algarvia para ensinar Filosofia, a autora do livro “Segredos do Le-vante”, deparou-se com a necessi-dade urgente “de vozes famintas de um texto” que desse cor ao viver das gentes e lugares e, sobretudo ao património cultural algarvio.

Foi com este desejo no bolso que Ana Cristina Oliveira, li-cenciada em Filosofia pela Uni-

versidade Nova de Lisboa, de-cidiu avançar para a sua primeira aventura dramatúrgica: o Me-morial do Moleiro ou Evocação das Mouras no Sítio das Fontes.

A esta obra seguiram-se o Auto da Muy Formosa Madale-na, Maria Adelaide e Queren-ças e Virtudes, entre outras obras que galvanizaram a professora Ana Cristina Oliveira no pan-orama teatral algarvio e nacional.

A dramaturga confessa hoje que deve muita da sua evolução à província: “ O vento do Levante ensinou-me a confiar, a arriscar e a escrever textos”, no entanto, não esquece a que confessa ser a sua maior inspiração: os seus alunos. Ana Cristina Oliveira, desenvolve a par do seu trabalho como professo-ra na Escola Secundária de Pinheiro e Rosa, a direcção do grupo teatral desta escola: o Tapete Mágico.

Sem reservas e com toda a sin-ceridade, Ana Oliveira admite que são os alunos que lhe dão ânimo para continuar a escrever peças de teatro que muitas vezes são interpretadas por eles mesmos.

Exemplo disso são peças como Andanças e Errâncias do Amor e da Discórdia (1996), Do Trágico ao Sublime (2003), Três Versões da Vida (2005), Qual a distân-cia que vai do meu coração ao teu? (2006) e mais recentemente

A Sombra do Tempo (2008). Desde 1993 até então muitos

têm sido os palcos, muitas as ex-periências vividas, mas na mente de Ana Cristina Oliveira apenas uma certeza, a de que “o teatro pode nascer em qualquer sítio e mostrar-se em qualquer lugar”.

Assim, nasceu este ano mais um rebento do talento e irreverên-cia da professora, com a edição de Segredos do Levante, um livro que nos mostra “o percurso de descoberta, o deslumbramento e a compreensão da mundividência e identidade das gentes algarvias”, compilando nesta obra quatro peças de teatro que prometem encantar o público e revelar-lhe os mais profundos segredos do Levante.

Todavia, o lançamento do liv-ro não esconde apenas segredos e é com toda a franqueza e os ol-hos a brilhar que Ana Cristina Ol-iveira confessa: “ Este livro que acabei de publicar é um tributo a todos os alunos que ao longo destes anos acreditaram em mim”.

Nas suas palavras e auto-carac-terizando-se Ana Cristina Oliveira assume-se como “distraída mas exigente, naive e apaixonada” e promete continuar a conquistar o Algarve com o doce sabor das suas palavras, as palavras do Levante.

ISA MESTRE

Talento de Ana CristinaOliveira ilumina

palcos do Levante

Segredos do Levante é a mais recente obra da

mulher que revolucionouo teatro algarvio

Foto: clubedeteatrotapetemagico.blogspot.com

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CULTURA

Uma mulher de armas. Um ex-marinheiro interesseiro e apaixonado. Um alemão

disposto a qualquer situação em troca de remuneração. O inespera-do. São estas as componentes para um serão agradável na companhia da ACTA (A Companhia de Teatro do Algarve), que levará ao palco do Teatro Lethes (Faro), entre 23 e 25 de Abril, a sua 47º produção – a ópera cómica “Efeito Imediato”.

Guiomar Bravo (interpretada pela soprano Ana Barros), dona do bar onde trabalha, vive na mira de Bino Mota (interpretado pelo tenor João Cipriano Mar-tins). O ex-marinheiro desem-pregado tenta a sua sorte entre várias manobras de sedução, com vista a juntar o útil ao agradável, casando-se e tornando-se patrão. Mas todos os esforços de con-quista falham consecutivamente.

Um dia, entre cervejas e pia-das, acaba por conhecer o alemão Edmund Tavares (interpretado por Nuno Dias), gabador das suas proezas enquanto tropa especial. Ansioso por casar-se com Gui-omar e sempre atento a toda e qualquer oportunidade de se exi-bir perante a jovem, Bino propõe a Edmund o plano disparatado de fingir um assalto ao bar da protag-onista, sendo o alemão convidado a desempenhar o papel de ladrão, em troca de uma boa remune-ração. O objectivo é assustar Gui-omar e, no momento certo, Mota entrar em cena como um verda-deiro herói, salvando-a de perigo.

Um acto mirabolante com vista ao casamento. Um plano que tem tudo para… dar errado. Precavida por viver sozinha, Gui-

omar tem em sua posse uma pistola e não se coíbe de usá-la. A protagonista, uma mulher emancipada, imobiliza o falso ladrão e “vira o feitiço contra o feiticeiro”. No final, é Bino Mota quem acaba por con-fundir ilusão com realidade.

Ao invés do pub inglês do século XIX referido no texto original imaginado pela compositora e activista femi-nina Ethel Smyth, a ACTA coloca em palco uma colorida caravana de campismo. Igualmente im-prováveis, os diálogos surgem não só em português, como em inglês e alemão, de uma forma natural e compreensível. “Es-sencialmente, o que quisemos fazer foi um espectáculo de cariz humorístico”, revela José Lou-renço, um veterano da comédia.

De acordo com o encenador, um dos aspectos mais sedutores da ópera «The Boatswain’s Mate» as-senta no desejo de articular teatro, música e humor. Três das armas uti-lizadas por Ethel Smyth na luta pelo direito de voto das mulheres na In-glaterra do princípio do século XX. «Empunhar hoje as mesmas armas pareceu fazer sentido se apontadas para comportamentos sexistas que ainda subsistem e, portanto, actu-alizando personagens, acções e lu-gares. Fazendo eco deste “ângulo de ataque” dramatúrgico, a encena-ção, ora ignorando a quarta parede, ora enfatizando a teatralidade ou, pelo contrário, camuflando-a, cul-tivou a partilha do mesmo espaço-tempo por parte de espectadores e intérpretes», salienta a ACTA.

José Lourenço regressará à

ACTA para estrear a 27 de Maio, em Faro, «Ensaio Aberto, Elenco Incer-to», um projecto de teatro e música, a partir de Jean-François Sivadier.

Até lá, resta-nos não fal-tar a este “Efeito Imediato” re-cheado de humor, música e te-atro, acompanhado ao vivo pela pianista Paula Conceição.

INÊS SAMINA

«EFEITO IMEDIATO»Emancipação. Interesse. Machismo.

Imprevisto.

Sugestões«Os Dias Felizes»

Local: Teatro Garcia deResende, ÉvoraDias: Até 12 de Abril de 2009Horários: Quarta, Quinta, Sexta e Sábado - 21h30 | Domingo - 16h00Preço: 8€ Autor: Samuel Beckett Encenador: Júlio Castronuovo Actores: Isabel Bilou e Rui Nuno

«The Cachorro Manco Show»

Local: Teatro Nacional D. Maria II, LisboaDias: De 8 a 19 de Abril de 2009Horários: Quarta, Quinta, Sexta e Sábado - 21h45 | Domingo - 16h15Autor: Fábio Mendes Encenador: Moacir Chaves Actor: Leandro Daniel Colombo

Foto: anadebarros.blogspot.com

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CULTURA

O novo Ferrari F-60

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Foi no âmbito da comemo-ração do Dia Mundial do Teatro (27 de Março) que

Albufeira acolheu aquela que foi a segunda edição do Fes-tival Internacional de Teatro.

Mapeado como capital do tur-ismo em Portugal, o Município de Albufeira prima cada vez mais pela promoção de eventos de índole cultural, marcando assim o pan-orama artístico-cultural nacional. Albufeira brinda os seus muníci-pes e visitantes com novas opções de entretenimento de qualidade.

Foi no editorial da agenda cultural do município, do passa-do mês de Março, que Desidério Silva, Presidente da Câmara Mu-nicipal de Albufeira (CMA), afir-mou que «a aposta na dinamiza-ção de um concelho passa também pela disponibilidade em criarmos soluções que nos posicionem lado a lado com os agentes económi-cos e sociais locais. Em Albufeira, procurámos seguir esse caminho de forma sustentada, numa lógica de valorização desportiva, cultural e social e económica.» O Presi-dente acrescentou, ainda, que ao olhar para a agenda verificava-se que os objectivos de trabalhar

de uma forma transversal a toda a sociedade foram atingidos.

Quisemos comprovar isso, e ao examinar a agenda deparamo-nos com o evento em destaque: O Festival Internacional de Te-atro de Albufeira (Festival T).

Não quisemos deixar pas-sar o evento em branco e fo-mos até ao município algarvio para conhece-lo de perto, e as-sim apresentar aos nossos leitores deste mundo contemporâneo um distinto Festival de Teatro.

A maratona do Teatro

No dia 27 de Março foi assinal-ado o Dia Internacional do Teatro. A CMA comemorou a data com uma maratona de teatro, que deco-rreu durante uma semana. Actores nacionais, dramaturgos algarvios e um coreógrafo italiano foram alguns dos que intervieram neste evento, transformando Albufeira no palco de uma grande festa do teatro.

“Vocês sabem o que é o amor, o verdadeiro amor?” Foi com esta interrogação que se iniciou Mo-digliani), a peça de abertura do Festival (no dia 21 de Março), pela Companhia de Teatro Con-

Houve Teatro em Albufeira!temporâneo (CTC). Sem dúvida que amor à arte foi um dos ingre-dientes que confluiu no sucesso alcançado. O auditório encheu e os aplausos denotaram o recon-hecimento do público a um teatro autêntico. A trama baseava-se na vida de Modigliani, talentoso pin-tor italiano, assim como a rivali-dade entre este e Picasso. Dois ar-tistas “marcados pela genialidade, pela arrogância e pelas paixões”.

“Os pequeninos” não foram esquecidos, e nos dias seguintes as peças infantis Dinis no Jardim Encantado - O Segredo de Choné (C.T.C) e Peter Pan (Companhia Magia e Fantasia) levaram a este público tão especial duas histórias divertidas, onde o respeito pela Natureza, a aventura e a desco-berta de sonhos foram aportados.

A maratona avançou, e no dia 25, Memórias de Branca Dias (pelo CENDREV) entrou em cena. A peça trata-se de um monólogo que retratou o povo português no Novo Mundo do século XVI.

No dia seguinte uma história de amor proibido, Loucos por Amor (pela companhia Cia.Paulo Lage), tratou a temática do incesto. Reve-lando que “o amor é mais frio que

Foto: Vanessa Costa

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CULTURA

a morte quando estamos loucos por amor”. A escolha desta peça (pela organização) deveu-se “ao interesse em trabalhar os conflitos do ser humano e a dificuldade e agressividade que existem nas suas relações, numa época onde tudo é tão rápido que não damos conta do quão rápida é uma relação”.

O Turno da Padecida (por Os Guizos) foi a última peça apresen-tada. Uma comédia reflexiva onde a protagonista, Padecida, decide acabar com as injustiças e com as discriminações. Puseram-se em causa as aparências do quotidiano e as situações inesperadas que surgem quando comunicamos com outrem (que julgamos conhecer).

O Festival T incluiu, ain-da, um workshop denomi-nado Bailes e Mouriscas do Renascimento, por Mau-rízio Padovan (um dos co-laboradores da CTC, musi-co, professor e investigador, sendo um dos mais qualifi-cados historiadores de dança do panorama internacional). O workshop decorreu ao longo da semana do festival e culminou num espectáculo peculiar no dia 28. Foi uma notável ocasião para revivesc-er a atmosfera das festas e dos espectáculos renascentistas.

Outra das novidades desta se-gunda edição foi a tertúlia: Noite da Dramaturgia. A conversa girou em torno de textos teatrais, onde os autores Paulo Moreira, Ana Cris-tina Oliveira e Sandro Junqueira e os seus actores expuseram as suas obras. Durante a noite foram discutidas múltiplas questões rela-cionadas com o mundo teatral.

Iniciativa exemplar

Embora exista uma ideia quase generalizada de que Albufeira fun-ciona exclusivamente em prol da indústria turística, em detrimento de outras áreas, como a Cultura por

exemplo, é notável que a CMA se tem empenhado cada vez mais em mudar este estigma. Como é que o Festival T contribui para esse feito?

Sem dúvida que este foi um evento exemplar que possibili-tou, de uma forma totalmente gratuita, ao público de Albu-feira usufruir da arte teatral.

Tal como a primeira edição do Festival T, esta segunda foi um sucesso. Esperamos que para o próximo ano, nos sejam da-das as boas vindas da seguinte forma: “Senhores e senhoras se-jam bem-vindos ao Teatro!”.

GRETHEL CEBALLOS

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Oriunda de Vila Nova de Famalicão, cidade que a viu nascer a doze de Jun-

ho de 1968, Luísa Augusta Mon-teiro Araújo de Sá reside no Al-garve desde 1998. Licenciada em Ciências da Comunicação (pela Universidade Fernando Pessoa), pós-graduada em Comunicação e Marketing Político e em Literatu-ras Românicas – Modernas e Con-temporâneas, é ainda doutorada em Literatura Comparada com a tese: O mito de Édipo na obra ficcional de João Gaspar Simões (Universi-dade Nova). Actualmente prepara o mestrado em Encenação-Teatro.

Durante 17 anos dedicou-se ao jornalismo e publicou artigos literários em variadas revistas. Tem 23 obras de ficção publi-cadas, entre romance, novela e conto, assim como ensaio e bi-ografia. Algumas destas obras ob-tiveram prémios literários, como o Prémio Florbela Espanca e o Lions Internacional, entre outros.

Encenou mais de duas deze-nas de trabalhos cénicos e ac-tualmente dirige a Compan-hia de Teatro Contemporâneo e é encenadora residente da Companhia Guizos – Teatro.

Mundo Contemporâneo - Como surgiu o Festival Internacional de Teatro de Albufeira?

Luísa Araújo de Sá - Surgiu da necessidade de criar em Albufeira um momento onde se celebrasse a arte do palco, de modo a oferecer ao público a possibilidade de es-colha entre um variado leque de ofertas.

M.C. - Quais foram os principais objectivos desta segunda edição? Foram atingidos?

L.A.S. - Melhorar em termos logísticos e abarcar todo o tipo de públicos. Sim, foram.

M.C. - De que forma decorreu o processo de escolha das peças, e os demais eventos que integraram este festival?

L.A.S. - Geralmente, vejo muito teatro, aqui e sempre que me desloco para fora do país, às vez-es em viagens de fim-de-semana. A escolha recaiu sobre duas vari-antes: preço e qualidade.

M.C. - Qual foi o feedback do público? Como acolheu esta ini-ciativa?

L.A.S. - Superou as expectati-vas nesta segunda edição. Casa cheia quase todas as noites. Tive-mos ainda uma tertúlia em torno da dramaturgia contemporânea e um curso de Dança Renascentista com Maurizio Padovan, um dos mais ilustres mestres da área, no qual participaram 46 pessoas.

M.C. - Poderia apontar as princi-pais dificuldades na organização de um evento desta envergadura?

L.A.S. - Gostaríamos de ter mais recursos financeiros e uma maior envolvência por parte de agentes que apoiassem o evento.

M.C. - Para além de organiza-dora é encenadora e guionista de três das peças que integraram o Festival: O turno da Padecida e Dinis no Jardim - O segredo de Choné (peça infantil) e Modigli-ani (nesta última deu voz a Mãe de Modigliani). Poderia descrev-

Entrevista

Luísa AugustaMonteiro Araújo de Sá

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er essa experiência e a reacção do auditório em particular à es-tas peças?

L.A.S. - A reacção foi excelente. Para mim, não é uma experiência pioneira. Faço teatro desde os 14 anos de idade e com o tempo, ha-bituámo-nos a trabalhar em todas as áreas, em várias peças em si-multâneo. Seduz-me a velocidade dos corpos e das mentes. Também se cria na velocidade que imprim-imos ao tempo.

M.C. - Como organizadora, en-cenadora, e guionista de que for-ma vê o panorama artístico - tea-tral no Algarve e, também, a nível nacional?

L.A.S. - Faz-se mais e melhor, há mais público, mas as condições continuam muito precárias para a maioria das companhias. E isso, passa-se aqui e em quase todas os municípios – o de Lisboa incluí-do, porque também trabalho lá, e as dificuldades não são menores.

M.C. - Existe uma ideia quase generalizada de que Albufeira é uma cidade exclusivamente de bares e praias, que só “funciona” no Verão. Nota-se que a Câmara de Albufeira tem-se empenhado cada vez mais em mudar o estig-ma de que esta localidade dá pri-mazia ao Turismo, em detrimento de outras áreas, como a Cultura por exemplo. Como é que o Festi-val T contribui para esse feito?

L.A.S. - Isso é verdade. O Mu-nicípio de Albufeira tem trabalha-do arduamente para alterar alguns aspectos quase míticos do nome Albufeira, nomeadamente, de que aqui só há bares, praias, muita cerveja e pessoas em biquini. Não, aqui há massa cinzenta, há muito trabalho e sério, e um empenho extraordinário por parte do Presi-dente, Desidério Silva, assim por parte dos vereadores, em fazer-se um trabalho estrutural e edificante em diversas frentes da sociedade. A Cultura deu um salto notável desde que Desidério Silva se colo-cou à frente do Município. Claro que ainda há muitíssimo a fazer nesta área; há, na minha opinião, questões a aprofundar, a necessi-tarem de um outro olhar, mas sei que está a ser planeado um grande futuro cultural para esta cidade. E isto não é discurso encomendado, é a realidade, reporto-me aos fac-tos. Com o Festival T pretende-se lançar sementes para uma refer-ência teatral, não só aqui, como lá fora. Já temos esse feed-back. Fui contactada por várias companhias daqui, do Brasil, de Espanha e Itália para poderem vir a este Fes-tival. Mas tratava-se de grandes elencos, grandes distâncias, es-pectáculos muito caros e a verba não chegava. Devagar, para um caminho mais sólido. De resto, ao nível teatral, as coisas estão a mudar um pouco, começa a haver um espírito cultural. É curioso verificar que quando entro com grupos em cafés da cidade, já vou

ouvindo, “olha, aqueles são os do teatro” e, regra geral, perguntam sempre de como decorrem os tra-balhos cénicos.

M.C. - Quais são os próximos projectos para o Festival T?

L.A.S. - Fazer a festa em todo o município, inundarmos de teatro, a toda a hora, todos os espaços públicos, ao longo de uma sema-na inteirinha; um pouco como se faz em alguns estados do Brasil, e que é fabuloso. Para Albufeira, anseio algumas novidades, daqui a uns anos, como por exemplo, teatro ao domicílio para aqueles que estão impedidos por razões físicas ou financeiras, de saírem de casa.

M.C. - Qual é o balanço deste curto, mas bem sucedido percur-so do Festival T?

L.A.S. - Muito positivo. Anseio repetir.

GRETHEL CEBALLOS

Page 22: 2ª Edição Mundo Contemporâneo

CULTURA

‘Dançarte 2009’Na senda do talento

Centenas de Bailarinos voltaram a encantar um Teatro das Figuras com lotação esgotada

Cor, movimento, magia e muito talento. Estas são, sem sombra de dúvida

as palavras que melhor caracter-izam mais uma edição do Con-curso Internacional de Dança do Algarve - mais conhecido por - Dançarte, que passou pelo Te-atro das Figuras, em Faro, nos passados dias 3, 4 e 5 de Abril.

Porque de dança se faz muitas vezes a vida, a capital algarvia rece-beu, mais uma vez de braços aber-tos, a iniciativa destinada a jovens bailarinos de escolas nacionais e estrangeiras que têm nesta com-petição uma oportunidade única para mostrar o seu talento ao grande público e conquistar a tão prestigia-da presença na Dance World Cup.

Perante tamanha oportunidade todos quiseram marcar presença e mostrar o seu talento diante de um Teatro das Figuras com lotação máxima que assistiu durante três dias à prestação de 17 compan-hias de Dança, entre elas: Com-panhia de Dança do Algarve, Es-cola de Dança do Conservatório Nacional, Colégio Rainha Santa Isabel, Dutch National Ballet Academy (Amsterdão), Colégio de Artes de Saratov (Rússia) e

Aquarela Companhia de Dança. Os primeiros a dar mostras

de talento foram os solistas femi-ninos e masculinos que no dia 3 de Abril abriram o concurso e voltaram a iluminar uma plateia repleta de amantes desta arte.

Por entre passos meticulosa-mente ensaiados e movimentos de pura mestria, Débora Casimiro (Companhia de Dança do Algarve) acabou por revelar o seu brilho, dançando e encantando para con-quistar um lugar no pódio. Con-siderada a melhor solista do con-curso, Débora Casimiro mostrou desde cedo a razão pela qual tra-balhou arduamente durante anos e provou a todos os presentes ter qualidade mais que suficiente para conquistar um lugar ao sol na Dance World Cup, em Jersey.

Também Mafalda Fideles e Ri-cardina Gaspar, vindas do Colégio Rainha Santa Isabel, em Coimbra, provaram estar à altura de grandes palcos conquistando a prestigiada menção de melhor dueto em prova.

Por sua vez, e numa noite re-pleta de sucesso para a Companhia de Dança do Algarve, os bailarinos viram ser-lhes atribuído por duas vezes o prémio de Melhor Grupo,

com Caminho e Três Tempos. Contudo o engenho dos al-

garvios não se ficaria por aqui, sendo que de entre os 44 prémios atribuídos, a Companhia de Dança do Algarve conquistou 20 deles, mostrando uma vez mais por que razão se afirma como uma das melhores escolas de dança do país.

Bailarinos como Débora Casi-miro, João Martins, Inês Ferrer, Sávio Gontijo e Isis Sá começam já a ser conhecidos do grande público, afirmando-se como pe-dras preciosas saídas da cantera de Evgueni Beliaev, director da Companhia de Dança do Algarve.

Num espectáculo em que muitos venceram, triunfou sobretu-do a arte de quem dança e faz o mundo dançar, a arte de quem solta talento e agarra sonhos, a arte de quem pisa o palco como se pudesse segurar cada instante de magia.

Finda a demonstração de habil-idade e engenho, resta aos grandes amantes da arte, e da dança em par-ticular, esperar pelo Dançarte 2010, que promete confirmar e revelar novos bailarinos no panorama musical nacional e internacional.

ISA MESTRE

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Foto: cm-portim

ao.pt

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OPINIÃO

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É oficial! Vamos a caminho do Cabo das Tormentas! O grande problema é que a

Caravela já está velha e mete água e o Homem do Leme não se rege pelos elementos. Os instrumentos que usa já estão obsoletos. A es-perança que guiou os Homens das Sete Partidas é ínfima. Já não par-tem na ansiedade da descoberta de novas oportunidades e horizontes, mas qual condenado a caminho do calabouço. Crise? Qual crise? Mas alguma vez, nos últimos anos, não vivemos em crise?

Senão vejamos:

Os mais novos quando termi-nam o secundário ou estudos supe-riores têm emprego?

Os mais velhos podem usufruir de uma reforma condigna?

E na doença? Recebemos cui-dados de saúde com qualidade?

A justiça é célere? E os seus custos são acessíveis a todos?

E a Educação?...O Ministério em guerra aberta com os profes-sores e vice-versa. E os nossos fil-hos – os alunos – quem os protege, quem garante a desejada qualidade no ensino?

Na Saúde, as ditas reformas obrigaram mais mães a dar à luz em ambulâncias, mais casos de morte por falta de assistência atem-pada, mais cidadãos sem médico de família e as lista de espera in-findáveis.

Nas escolas, os jovens “ata-fulhados” de disciplinas para po-derem estar ocupados todo o dia; os professores “atafulhados” em burocracia; livros com preços ex-orbitantes; propinas cada vez mais elevadas. E as bolsas de estudo são para os alunos mais carentes (entenda-se carente igual a miser-ável), os bons alunos não merecem qualquer prémio por parte das au-tarquias em que vivem e estudam, pese embora o esforço das escolas em premiar os que mais se esfor-çam.

Que dizer da Economia? Quem não está desempregado enfrenta o terror de poder vir a ficar. O crédito sem regras e o incentivo ao con-sumismo endividou o país. Mas socorrem-se os banqueiros agiotas e gananciosos porque esses é que precisam de ajuda do estado. Na-cionaliza-se um banco mas deix-am-se falir centenas de empresas. Quem produz, quem cria a riqueza de um país que vá para o desem-prego, emigre ou passe fome. Que viva do subsídio de desemprego, que até já há quem ache que é de-mais. Conjecturas por parte daque-les que governam o nosso país com rendimentos à altura do cargo mas que desconhecem o valor do sa-lário mínimo...

E os políticos? Essa casta de seres pensantes e iluminados que confundem a nobre missão de ser-vir o país com a missão de servir o partido. E se a tempestade precede a bonança, na política desafia-se a

lógica e facilmente se avista a bo-nança antes da tempestade – falo das eleições, claro! É hora de fazer promessas, de inaugurar obras e dos discursos velhos e gastos.

E é vê-los num corrupio de ac-tividades sociais, num incessante beija-mão e lisonja que desafia o estômago mais forte.

Lá fora, a crise aperta. Nos EUA ameaça tornar-se uma ca-tástrofe mas procura-se a mudança e acende-se a vontade de renascer. Por cá também se deseja a mudan-ça mas falta-nos a inspiração.

Por cá, a já alastrou às mentali-dades e aos valores, deixando-nos prostrados e sem vontade. Já nos habituámos a viver com pouco, a ter pouco, a sonhar menos. Tudo pouco... menos a miséria, a inve-ja e o pessimismo. Depois vem a Culpa! A culpa é sempre dos out-ros. E vem por aí um rol de descul-pas que terminam sempre em casa, no trabalho e no jogo de futebol. E já não há Fado onde caiba tanta desilusão.

Mas nem tudo está perdido! Enquanto existirem homens e mul-heres de boa vontade, gente que ainda não sucumbiu às vaidades e ao poder, gente que se recusa a que lhe ponham a albarda em cima, talvez se faça a diferença entre um país sem rumo e um país à procura de um rumo. São poucos, talvez, mas os necessários para desas-sossegar.

O CABO DAS TORMENTASpor DINA LAPA DE CAMPOS

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ESPECIAL

Artistas PortuguesesConquistam o Estrangeiro

Muitos são os artistas por-tugueses que têm sido reconhecidos pelo seu

trabalho em países onde não se fala a língua de Camões. Gonçalo M. Tavares na escrita, Rita Redshoes na música e Miguel Gomes no cin-ema são alguns dos nomes que se têm feito ouvir no estrangeiro.

Na Turquia, a partir de Fever-eiro, pode-se ler o melhor que se faz em Portugal no que respeita à poesia. Através de várias parcerias nasceu Cümle Frase, uma Folha Mensal de Poesia em Língua Por-tuguesa, projecto que visa mostrar aos leitores turcos os poetas portu-gueses que formam a já apelidada novíssima poesia portuguesa. En-tre eles destacam-se valter hugo mãe, José Luís Peixoto e M. Tiago Paixão. Mensalmente, cada edição com uma tiragem de 1.000 exem-plares (500 em Ankara e 500 em Izmir) agregará vários trabalhos de cada um dos poetas deste projecto com uma tradução para turco le-vada a cabo por nomes sonantes do país do ‘nobelizado’ Orhan Pamuk. M. Tiago Paixão está com grandes

expectativas em relação a esta ini-ciativa e em declarações ao site Rascunho, afirmou que pretende que daqui a três anos se faça uma antologia destes textos de forma a mostrar-se o que de melhor há na actual poesia lusitana.

Há, de facto, uma recente in-cursão da poesia portuguesa por terras do Próximo e Médio-Ori-ente. José Mário Silva, crítico literário e escritor português tem alguns dos seus contos publicados no suplemento literário do jornal marroquino Almonataf.

Gonçalo M. Tavares é outro dos nomes cimeiros da literatura portuguesa contemporânea. Com 39 anos, o escritor natural de Lu-anda conta com um total de 21 obras publicadas em vários países nos últimos seis anos. As obras vão desde a poesia até às tabelas literárias, um estilo bastante difer-ente do habitual onde o autor junta informações e frases de vários es-critores dispersas por colunas. Je-rusalém, o seu livro mais aclamado, que venceu o prémio Saramago em 2005 e é visto como um marco da

literatura europeia, foi incluído na edição de “1001 livros para ler an-tes de morrer”. Vila-Matas, crítico literário da revista francesa Maga-zine Littéraire considerou-o um “narrador de raça e génio de um imenso futuro” e José Saramago, durante a atribuição do prémio com o seu nome, afirmou que “Gonçalo M. Tavares não tem o direito de es-crever tão bem apenas aos 35 anos: dá vontade de lhe bater!”. A fór-mula deste sucesso prende-se so-bretudo ao afastamento da escrita de Gonçalo M. Tavares em relação ao resto da cena literária portugue-sa. O escritor usa-se de uma escrita precisa, quase cirúrgica, decom-pondo a realidade em personagens muito complexas, preterindo as já recorrentes descrições românticas das relações entre pessoas.

Nas últimas décadas a música portuguesa tem sido caracterizada como uma amálgama de mágoa, tristeza, luto, morte: fado. Mariza, Mafalda Arnault e Ana Moura e são as grandes embaixatrizes do género musical mais característico do nosso país, tornando-o mais

por Adriano Narciso

Foto: wordpress.com

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ARTISTAS LUSOS CONQUISTAM MUNDO

‘comerciável’ além-fronteiras com mis-turas de instrumentos que levam a compara-ções com o jazz, por exemplo.

Com a mediatiza-ção de novos estilos musicais cada vez mais apreciados pelo público jovem, como é o caso do electro clash, funk e electro, têm surgido bandas que juntam à cultura musical lusa elemen-tos que resultam so-bretudo da grande diversidade étnica que existe no nosso país. Os Buraka Som Sistema são um exemplo desse ecletismo que se faz notar na músi-ca portuguesa do século XXI.

A banda originária da Amadora e criada em 2005 foi buscar a Áfri-ca as suas grandes influências, mis-turando Kuduro com vários estilos cada vez mais em voga, como o

funk. Numa incursão a um dos mais importantes festivais ingleses (Glastonbury), os Buraka Som Sistema, banda desconhecida pelo público britânico, foram os mais aplaudidos e este ano um jornal es-panhol considerou o conjunto uma lufada de ar fresco na música

portuguesa. A cantora lisboeta

Rita Redshoes, que foi buscar a inspiração para o seu apelido ao tema ‘Let’s dance’ de Bowie e ao filme ‘O Feiticeiro de Oz’. Começou a dar nas vistas quando em-prestou a sua voz à can-ção ‘Hold still’ de Da-vid Fonseca e em 2008, a antiga vocalista dos Atomic Bees lançou o seu primeiro álbum a solo – Golden Era - já comparado aos tra-balhos de Fiona Apple, Cat Power e Goldfrapp. Ainda este ano, Rita expandiu os seus hori-zontes, realizando uma

digressão pelos EUA.O filme português ‘Aquele

querido mês de Agosto’ é um caso atípico na história do cinema por-tuguês, sendo reconhecido pela crítica internacional através de vários galardões. No Festival In-ternacional de Cinema de Buenos Aires, tal como em muitos outros festivais espalhados pela América Latina, foi agraciado com o pré-mio de melhor filme e foi um dos nomes apontados para figurar a lis-ta de melhor filme estrangeiro na edição dos Óscares deste ano. Fun-cionando como uma fusão entre documentário e ficção, a película realizada por Miguel Gomes tem como tema principal as festas de verão no interior de Portugal e foi nos últimos dias seleccionada para o Festival de São Francisco, espe-rando-a um novo fôlego agora na indústria norte-americana

Fernando Pessoa tinha razão. O nevoeiro que encobre o nosso país não é crónico. A crise económica mantém-se mas a bruma cultural que insiste em negar uma identi-dade a Portugal está a dissipar-se.

Foto: Fo

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Gonçalo M. Tavares é considerado uma das maiores promessas da literatura europeia

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ESPECIAL

SobreviventesHistórias de quem fintou

a morte e abraçou o destino

Resistiram às maiores tra-gédias, fintaram um des-tino cruel e, por ironia

do destino, continuam a espalhar vida perto dos que os rodeiam. São estas as histórias daqueles que escaparam ilesos às mãos da fatalidade, as histórias de Tadeu Bernardo de Araújo, Geralda Silva do Nascimento, Antonia Martínez, Rafael Vidal e Wanderley Ferreira da Silva.

A sobrevivência que a uns se deve à pura coincidência do acaso é para outros a recordação de uma luta constante no momento da tra-gédia.

Tadeu Bernardo de Araújo, en-genheiro químico brasileiro que perdeu a mulher e dois filhos na tragédia do desabamento do edifico Éricka, em Olinda (Brasil), viu a sua vida poupada pelas obrigações laborais, quando na madrugada de 12 de Novembro de 1999 se dep-arou perante a necessidade de fazer plantão na noite do acidente. Con-

tudo, e apesar de ter escapado ileso ao desastre, o engenheiro químico releva a dificuldade em conviver com a dor da perda e assume que se questiona muita vezes pela razão da sua vida ter sido poupada.

A mesma pergunta paira na mente de Geralda Silva do Nas-cimento, que com 61 anos perdeu seis parentes num desabamento de terras, em Abril de 1996.

Volvidos treze anos, Geralda continua a transportar consigo o calvário da morte dos seus famil-iares e o sentimento de culpa por ter sobrevivido. Na noite da tra-gédia, Geralda decidira ir visitar a irmã, e, por ocasião dessa visita pernoitar fora de casa. O acaso da saída poupou-lhe a própria vida, roubando-lhe para sempre a filha Maria Betânia e o neto Saulo, am-bos vítimas da tragédia.

Não menos diferente é a história de Antonia Martínez, assistente de bordo no fatídico voo MD-82 da Spanair, que se incendiou a 20 de

Agosto de 2008, ao levantar voo do aeroporto de Barajas, em Ma-drid.

Recorde-se que a bordo viaja-vam 172 passageiros, dos quais ap-enas 19 conseguiram salvar-se.

Entre o nome dos dezanove sobreviventes figura o nome da as-sistente de bordo, que, por ironia do destino e contrariamente ao habitual, se encontrava sentada na parte da frente do avião, facto que lhe poupou a vida.

Contudo, ultrapassado o flage-lo, Antonia continua a recordar nitidamente o momento do em-bate, revivendo o instante em que foi projectada para fora do avião, acabando por cair ao rio.

Jamais poderia esquecer o tocar das sirenes, a certeza de que seria salva, a tranquilidade que por mo-mentos se apoderou do seu corpo e lhe deu forças para continuar a lutar pela vida.

Consciente e já no interior da ambulância, a sobrevivente do aci-

Foto: spiegel.de

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OS SOBREVIVENTES

dente com o voo da Spanair relem-bra as primeiras palavras proferi-das: “Mãe, não se preocupe, eu estou bem”.

Na verdade, a ideia de sobre-vivência representa, desde logo, estar bem, mas para muitos dos sobreviventes as sequelas corpo-rais continuam a manifestar-se du-rante meses e até mesmo anos. O acidente que poupou a vida a An-tonia Martinez deixou-lhe como “cartão de visita” um braço enges-sado, uma vértebra fracturada, um traumatismo craniano e algumas nódoas negras.

A Rafael Vidal, engenheiro de telecomunicações, a sobrevivência custou-lhe duas vértebras fractura-das, um ferimento nos pulmões e nódoas negras em todo o corpo, mas jamais poderia retirar-lhe a alegria e tranquilidade do senti-mento de ter “voltado a nascer”.

Rafael Vidal, 30 anos de idade, viajava na manhã de 20 de Ago-sto de 2008 com destino à ilha das Canárias onde tencionava passar férias durante três dias, contudo, ao chegar ao aeroporto foi pron-

tamente informado de que o voo onde deveria seguir se encontrava cheio, tendo o passageiro de ingr-essar naquele que se viria a confir-mar num voo fatídico.

Contudo, o acaso que protegeu Bernardo de Araújo, Geralda Silva do Nascimento e Antónia Martínez foi também o que colocou Wan-derley Ferreira da Silva no terceiro andar do prédio da TAM, atingido pelo airbus A-320.

Wanderley encontrava-se em reunião no terceiro andar do pré-dio, quando, subitamente se viu surpreendido pela fúria do estron-do do embate e pelo clarão provo-

cado pelo choque da aeronave. Na altura, recorda Wanderley,

“cada um começou a correr para um lado”, e foi então que o brasil-eiro de 33 anos decidiu correr em direcção das escadas, na tentativa de chegar a um laboratório com janelas, para que dessa forma pudesse respirar.

Conseguiu a custo alcançar o laboratório e hoje recorda com mágoa o momento em que “olhava para aquele céu e só queria ter um pouco de oxigénio para respirar”.

De recordações dolorosas e momentos dramáticos se faz a vida destes cinco sobreviventes, destes

cinco “eleitos” para con-tinuar a caminhada, para contar a sua história, para passar o testemu-nho da experiência em momentos de pânico.

A recordação traz-lhes a dor, a certeza de que nem todas as vidas puderam ser poupadas, a eterna dúvida de ter-em sobrevivido quando a morte bateu á porta e pediu para entrar.

ISA MESTRE

Foto: spiegel.deFo

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O eterno número 1

Ayrton Senna desapareceu há 15 anos no fim-de-semanamais negro da História da Fórmula 1

Aos nove anos já condu-zia jipes nas propriedades da sua família e aos 13

iniciou-se nos karts. Depressa foi apontado como um jovem prom-issor, acabando por chegar aos campeonatos europeus de Kart-ing em 1979, ano em que esteve a competir no “Velho Continente” durante 5 meses. De feitio com-plicado, desde cedo assumiu uma total obsessão pela vitória e, como tal, não olhava a meios para atin-gir os fins. Exigia muito dos out-ros, mas ainda mais (muito mais) de si.

A caminho do auge

Firmado o seu talento nos karts, posteriormente, entre os anos de 81 e 83 ganhou todos os campeonatos em que esteve envolvido e foi sem estranheza que em 1984 chegou à categoria máxima do desporto automóvel.

Começou por correr na pouco mediática Toleman, assinando pela Lotus para a época de 1985, equipa com a qual, nesse mesmo ano, venceu o primeiro Grande Prémio da carreira na Fórmula 1, no Estoril. Por lá permaneceu por mais duas épocas, transferindo-se em 1988 para a McLaren-Honda, onde iria fazer dupla com Alain Prost, conhecido como “profes-sor”. Nesse ano, o brasileiro ven-ceria o primeiro de três campeona-tos do mundo.

Em 1989, os problemas com o seu colega e rival francês intensifi-caram-se. Prost e Senna colidiram no Japão e o brasileiro, que pre-cisava da vitória para continuar a lutar pelo campeonato, foi des-classificado, comprometendo as suas hipóteses. No ano seguinte, novamente no Japão, Senna não se coibiu de sair de pista com Alain Prost e, com vantagem pontual

sobre o então piloto da Ferrari, recuperou o título perdido no ano anterior.

Em 1991 revalidou o título, que conquistaria pela derradeira vez. Seguiu-se um modesto quar-to lugar em 1992, concluindo o campeonato seguinte no segundo posto, atrás de Prost.

Procurando um carro com-petitivo que lhe permitisse vol-tar aos títulos, assinou pela Wil-liams-Renault para a temporada de 94, equipa que havia vencido as duas últimas edições. Apesar de ter conquistado duas poles em igual número de corridas logo no início da temporada, não marcou qualquer ponto. Era imperativo vencer a prova seguinte, a dispu-tar no dia 1 de Maio, pois o jovem alemão Michael Schumacher já contava com 20 pontos de vanta-gem, fruto de duas vitórias.

Foto: Wiki C

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O trágico fim-de-semana

Tudo começou na tarde de sexta-feira, durante os treinos-livres para o Grande Prémio de San Marino, quando Rubens Barrichel-lo, na altura um novato nas andanças das velocidades vertiginosas da Fórmula 1, sofreu um violento acidente após ter perdido o controlo do seu carro numa das curvas do circuito de Imola. Apesar de se ter temido o pior, o jo-vem protegido de Senna saiu do acidente apenas com algumas escoriações, embora indisponível para a corrida de domingo.

No dia seguinte, na sessão di-urna dos treinos, o impensável aconteceu: o austríaco Roland Ratzenberger ia a mais de 300 km/h quando perto da curva Vil-leneuve embateu contra um muro sem protecção. Seria dado como morto alguns minutos depois de chegar ao Hospital de Bolonha, embora se suspeite que quando deixou o autódromo já estaria morto. Foi a primeira morte num Grande Prémio de Fórmula 1 em quase 12 anos.

As últimas horas

No dia da corrida era possível observar os rostos consternados que eram exibidos ao longo de toda a grelha de partida. Mas um deles parecia estar mais apreensi-vo. Aquele que vivia obcecado em ganhar sempre e que afirmava que “ser o segundo é o mesmo que ser o primeiro dos perdedores” con-templava o seu capacete como os olhos vidrados, mas desta vez sem a determinação que lhe era comum em todas as partidas. Estaria Ay-

rton Senna, pela primeira vez na sua carreira, desconfortável por estar prestes a iniciar aquilo que ele próprio considerava que fazia parte do seu sangue?

Adriana Galisteu, namorada do tricampeão na época, confir-mou que Senna se sentia apreensi-vo: “Ele visitou os locais dos aci-dentes e disse que não estava com muita vontade de correr em Imo-la”. O seu rival de sempre, Alain Prost, com quem o brasileiro falou momentos antes da corrida, rev-elou que o piloto estava “frágil” e “deprimido”. “Não era o Ayrton que eu conhecia. Ele estava muito preocupado”, acrescentou.

Às 14 horas locais, todos os pi-lotos estavam ordenados na grelha à espera que as luzes vermelhas se apagassem. Ayrton Senna, que largaria da primeira posição pela 65ª vez na sua carreira, teria ao seu lado Michael Schumacher. Logo na primeira volta, o safety car entrou em pista depois de Pe-dro Lamy ter tido um aparatoso acidente. Quatro voltas depois, os chassis voltavam a rodar à máxima velocidade, com Senna e Schu-macher a distanciarem-se rapida-

mente do resto do pelotão. À sexta passagem pela curva Tamburello, a mesma onde anos antes Piquet e Berger tiveram graves acidentes, o piloto brasileiro perde o controlo do seu Williams-Renault e bate violentamente no muro de betão. O choque foi tão violento que, an-tes de se imobilizar, o carro voltou para a pista.

De pescoço tombado, Senna estava inconsciente. Prontamente chegaram o stewards e, pouco de-pois, a equipa de assistência médi-ca que retirou o corpo prostrado do piloto. Sid Watkins, médico que o assistiu no local, depressa conclu-iu que o estado de Senna era muito grave. “Quando lhe tirei o capac-ete, as suas pupilas estavam com-pletamente dilatadas e ele estava sem reflexos. Era um mau sinal”. E era mesmo. Depois de 17 longos minutos a ser assistido na pista, o brasileiro foi transferido de heli-cóptero para o Hospital Maggiore, em Bolonha – o mesmo para onde foi Roland Ratzenberger um dia antes – contudo, às 18:05 o pior foi confirmado. Ayrton Senna não resistiu aos múltiplos traumatis-mos cranianos sofridos. Se tivesse

Foto: Wiki Commons

Primeira vitória na Fórmula 1, no Grande Prémio do Estoril em 1985

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sobrevivido, dificilmente voltaria a ter uma vida normal, pois a au-tópsia concluiu que o cérebro se liquefez quase por completo no momento do embate.

A 4 de Maio, o corpo de Senna chegou a São Paulo para, final-mente, poder descansar em paz. O povo saiu à rua para prestar uma última homenagem ao ídolo que fazia sonhar o Brasil quase todos os domingos. O trânsito esteve

congestionado numa extensão de 108 quilómetros e centenas de mil-hares de pessoas contemplaram o cortejo de 30 quilómetros até à As-sembleia Legislativa.

Em entrevista dada quatro meses antes, Senna disse que não seria capaz de viver com limitações causadas por um eventual acidente. “Se eu sofrer um acidente que custe a minha vida, que seja de

uma vez”, confessou. No dia 1 de Maio do ano de 1994 o seu desejo foi concretizado e, da forma mais trágica, partiu. Mais rápido do que qualquer outro.

DAVID MARQUES

‘Se eu sofrer um acidente que custe a minha vida, que seja de uma vez

Números de Senna

Presenças em Grandes Prémios: 162Campeonatos: 3 (1988, 1990, 1991)Vitórias: 41Pole positions: 65Voltas mais rápidas: 19Pódios: 80Pontos: 610

Foto: Wiki Commons

Sepultura de Ayrton Senna, no Cemitério do Morumbi

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Campeonatoa dois...

Valentino Rossi, Casey Stoner, Dani Pedrosa ou Jorge Lorenzo… São es-

tes quatro pilotos os principais favoritos à conquista do ceptro mundial de MotoGp. Valentino Rossi procurará revalidar o título e alcançar a impressionante soma de 7 conquistas na categoria rainha do motociclismo, ficando a apenas uma do recordista Giacomo Ago-stini. Stoner tentará recuperar o campeonato perdido na temporada passada. Pedrosa e Lorenzo pro-curam o primeiro título na catego-ria rainha. O campeonato passará por Portugal em Outubro, no cir-cuito do Estoril.

Valentino Rossi ouCasey Stoner?

A luta pelo campeonato parece centrar-se em dois nomes, os dois últimos campeões, Rossi e Stoner.

A experiência, os títulos, o medi-atismo e a condução irrepreensível do italiano, face à tranquilidade, juventude e espectacularidade do australiano. A julgar pelos resul-tados dos testes, Stoner leva van-tagem, tendo sido mais rápido em três dos quatro efectuados, apenas sendo batido por Rossi no teste inicial em Jerez, por escassos 18 milésimos. Mas os testes valem o que valem, são as voltas rápidas que contam, o mesmo quer diz-er que ficar na pole position não significa vitória assegurada. Até porque as diferenças entre os dois foram escassas.

Na temporada passada, Rossi foi campeão a quatro corridas do fim, num campeonato que ficou praticamente decidido em Laguna Seca. A prova americana foi do mais vivo que se viu nos últimos anos, com toques entre os dois can-didatos e muitas ultrapassagens,

mas no final, Stoner acabou por fraquejar. Na ressaca desta “der-rota”, Stoner caiu nos dois GP’s seguintes e hipotecou o título.

A história está do lado de Rossi, que procura deixar mais um marco nos livros de recordes, aproximan-do-se do máximo absoluto de títu-los na categoria rainha do motoci-clismo. Resta saber até que ponto a Yamaha do “Doutor” será fiável. De facto, na temporada passada foi e nesta promete-se 10km/h a mais de velocidade de ponta, mas a Ducati não esteve parada e Stoner estará à espreita.

A dupla espanhola composta por Pedrosa e Lorenzo estará sem-pre à procura de uma “escorregad-ela” dos candidatos principais. Dovizioso sai da equipa “satélite” da Honda e passa para a equipa da fábrica, prometendo muito serviço. O norte-americano Nicky Hayden terminou a temporada passada a

Começa a 12 de Abril mais uma edição do MotoGp. FIM promovemudanças para dar novo ânimo à competição

Foto: MotoGp.com

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dar boas indicações e com uma Ducati de topo pode muito bem dar que falar. Da mesma forma que, a outra equipa de fábrica, a Rizla Suzuki MotoGp tem prometido muito nos treinos, com o veterano Capirossi a dar nas vistas.

E os outros?

Nos últimos tempos tem-se assistido a uma hegemonia de tal ordem nas vitórias das equipas de fábrica, que já nem se fala nas “sa-télite” como equipas para vencer, mas sim para conquistar pódios e pontuar. O actual campeão do mundo, Valentino Rossi, tem-se mostrado muito crítico face a esta realidade, afirmando que «até 2006 um privado como Melandri podia lutar pelo título. Mas desde 2007, com as motos de 800cc, a distân-cia entre as equipas de fábrica e as privadas ficou enorme. O MotoGP tornou-se muito elitista e isso não é bom.»

Nomes como Edwards, Ver-meulen, Melandri ou Gibernau serão sempre capazes de bons desempenhos, mas vencer está noutra “galáxia” e em condições normais a vitória é para as quatro equipas de fábrica.

Adeus Michelin!

O inicio do fim da Michelin deu-se em Brno, na República Checa. Num dos Grande Prémios mais atípicos de que há memória. Rossi venceu, nada de anormal, mas o que não é muito normal é ter que se descer até ao nono posto para encontrar o primeiro piloto a equipar com Michelin, Dovizioso a 38 segundos do transalpino. Mas mais estranho e surpreendente foi mesmo a prestação de Pedrosa, 15º posto a mais de 2 minutos de Rossi. Aliás, antes da corrida os pilotos que equipavam a marca francesa ameaçaram não competir, alegando questões de segurança.

Porém, a machadada final foi dada em San Marino, quando Ped-rosa anunciou que iria trocar a mar-ca gaulesa pela Bridgestone, depois de em testes ter sido oito décimos mais rápido com os pneumáticos japoneses. Um mês depois, em Motegi, a GP Comission anuncia que por questões de “custos e se-gurança” o MotoGp passaria a re-ceber apenas pneus de uma marca. No Grande Prémio seguinte, a Mi-chelin assume em comunicado que não pretendia continuar, abrindo caminho à hegemonia da Bridge-stone, que equipará as motas desta temporada.

Crise, a quanto obrigas

Ao que parece, nenhuma activi-dade é imune à tão falada crise. E o MotoGp acaba por não fugir à con-juntura global. A primeira decisão com o intuito de cortar custos foi a introdução de pneus “monomar-ca”, fornecidos pela Bridgestone.

Por outro lado, a FIM proibiu os compos-tos de cerâmica nos discos e pastilhas de travão, a utilização de sistemas de potência hidráulica à pressão, o controlo electrónico de suspensão e a re-circulação dos gases de escape, enquanto o óleo lubrificante do motor não pode ser usado para outro fim.

Mas a verdadeira revolução é a limi-tação do número de motores usados por piloto na temporada. A FIM definiu um limite máximo de

Foto

: Mot

oGp.

com

Valentino Rossi e Jorge Lorenzo, companheiros de equipa na Yamaha

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cinco, sendo que os mesmos terão de ser selados antes das corridas, treinos e/ou voltas de qualificação. Um novo motor é considerado como “utilizado” quando a moto sair das boxes. Quem não cumprir o estabelecido será punido com 10 pontos na classificação do campe-onato.

125cc e 250cc, que futuro?

Nas categorias inferiores, já ficou estipulada a mudança de nome das “quarto de litro” em 2011, passando a ser MotoGp2. Nesta categoria muito será mu-dado, começando desde logo pela cilindrada, passando a ser de 600cc, o motor deixa de ser de dois tempos, para servir de protótipo das MotoGp ao evoluir para qua-tro tempos. A nova categoria tem como objectivo implícito atrair as marcas europeias, terminando as-sim com a hegemonia nipónica. Quanto às especificações técnicas, não será permiti-da a utilização de travões de carbono, nem qualquer com-posto deste tipo nos pneus. Estes serão livres em marca, mas limitados em largura e diâmetro. O número de pneus slick disponíveis por piloto para cada Grande Prémio será limitado.

Por fim, há a possibilidade de uma equipa adquirir o motor à sua rival. No final de cada prova, a organiza-

ção dá 60 minutos para qualquer equipa adquirir o motor a outra eq-uipa rival, mediante o pagamento

de uma verba fixa (20.000 euros) e esta está obrigada a vendê-lo.

FÀBIO LIMA

Infografismo: MotoGp.com

Foto: MotoG

p.com

Em 2008, Lorenzo bateu Rossi no Estoril, veremos como será nesta época

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III Divisão em vias de extinção por Fábio Lima

Nos últimos anos, muitas têm sido as mudanças no futebol português, mas os

amantes do desporto rei estariam longe de imaginar que já na próx-ima temporada 2010/2011 deix-arão de contar com a célebre III Divisão. A decisão foi tomada em finais de Janeiro pela Assembleia Geral da Federação Portuguesa de Futebol, estando, no entanto, longe de ser unânime e contando com forte oposição, sobretudo, por parte da Associação de Fute-bol mais representada no referido campeonato: a AF Braga, que não se disponibilizou para dar quais-quer declarações. Na referida AG da FPF, foram a votos duas moções, uma apresentada pela AF Algarve, que contou com 312 votos a favor e 123 votos contra. No geral, a ex-tinção da III Divisão terá efeitos após a próxima temporada, com as equipas que não garantirem subi-da nessa época, a desceram para os campeonatos Distritais. Por sua vez, os campeões distritais terão acesso directo à II Divisão.

O que muda?

Com a extinção da III Divisão Nacional muitas serão as mudan-ças no actual quadro competitivo futebolístico a nível de campe-onatos amadores (incluindo a II Divisão). De acordo com a pro-posta inicial, a II Divisão passará a ser disputada por 48 clubes, di-vididos por 3 séries de 16 equipas, disputada a duas voltas. Os três primeiros classificados de cada série irão disputar uma fase final, e os dois melhores sobem à Liga Vitalis. Mas até no que diz respeito à Liga Vitalis se fala em mudança, visto que o Presidente da Liga Por-tuguesa de Futebol Profissional, Hermínio Loureiro, afirma que está aberta uma janela para que desça mais um clube da Liga Vi-talis, o que permitiria que cada um dos vencedores de séries subisse directamente.

No que aos campeonatos dis-tritais diz respeito, será mais rápida a ascensão à II Divisão, “bastando”

vencer o campeonato distrital para assegurar a ascensão. Crê-se que a decisão fará com que os clubes se aproximem, criem mais liga-ções, ou em contrapartida venham mesmo a acabar, posição assumida firmemente pelo Presidente da AF Braga.

Campeonatos distritaismais emotivos

Uma das justificações para a mudança no quadro competitivo da “terceira” centra-se na necessi-dade de recuperar a vivacidade dos campeonatos distritais. «Basta analisar a média de assistência de um Farense – Louletano e a com-pararmos com um outro qualquer jogo contra uma equipa de Beja, Évora, Setúbal ou Santarém para se ter uma ideia de como os Distritais poderão ficar mais vivos», defende o Dr. Alves Caetano, Presidente da Associação de Futebol do Algarve. Opinião também partilhada por Costa Lima, Presidente da Asso-

Foto: wordpress.com

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ciação Desportiva «Os Limianos», clube da Série A da III Divisão.

Mais rivalidades, mais adeptos, mais dinheiro em caixa devido a bilheteiras, mas como será o mer-cado dos patrocínios? Para Alves Caetano «um clube não tem mais ou menos mercado publicitário ap-enas porque está um escalão acima ou um escalão abaixo», concluin-do que «o principal problema são alguns dos chamados patrocínios que prevêem atribuições de verbas discriminatórias em função da di-visão em que milita o clube.»

Porquê tanta polémica?

A decisão tomada em AG da FPF fará com que a Associação de Futebol de Braga perca 10 clubes a alinhar nos campeonatos nacionais, os quais faziam da mesma a mais representada em todos os campe-onatos de âmbito nacional. Para Costa Lima, «aceita-se a posição dos clubes sediados em zonas de grandes aglomerados (Lisboa, Porto ou Braga), que têm muitas equipas da mesma região e podem

continuar a ter boas assistências e pequenas deslocações» porém «no nosso caso, defendemos a extinção da III Divisão Nacional», reitera o Presidente do 6º classificado da Fase de Promoção da Série A da III Divisão. No caso do clube de Pon-te de Lima, a viagem mais longa a fazer-se ao alinhar na III Divisão seriam o 520 km (ida e volta) para jogar contra o Bragança, quando a alinhar no Campeonato Distrital de Viana do Castelo seriam no máxi-mo 200 km, mais 300 km que sig-nificam invariavelmente mais cus-tos para cumprir os jogos. Segundo declarações do próprio Presidente «a principal diferença em termos económicos da extinção da III Di-visão para nós será a diminuição de deslocações.

Carlos Coutada, Presidente da AG Braga reitera que «as alterações são redutoras e levarão à extinção de um grande número de pequenos clubes», afirmando que a questão económica é «uma falsa questão» visto que «os clubes têm mais apoios se alinharem numa com-petição nacional». Para Amândio

de Carvalho, Vice-Presidente da FPF, a proposta «procura aproxi-mar os clubes uns dos outros, em termos geográficos».

E haverá melhor futebol?

Alves Caetano afirma que a «AF Algarve não apoia a extin-ção da III Divisão porque está traria menos despesas, apoiamo-la porque acreditamos que esta trará melhorias significativas para os nossos associados».

Para Costa Lima os campe-onatos distritais devem «obriga-

toriamente ser jogados em relvados (naturais ou sin-téticos) e com condições impostas iguais à III Di-visão», o que acarretaria melhoria das condições de jogo e melhoria de futebol praticado, que por sua vez levaria mais gente aos es-tádios e cobriria qualquer redução de lucro adjacente à descida de divisão.

Resta ver até que pon-to esta medida terá suc-esso. Se for para o bem do futebol, os adeptos do Desporto-Rei agradecem!

Foto: FPF

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A Taça de Campeão da IIIDivisão ficará “arrumada”

A direcção da Associação de Futebol do Algarve apoia a extinção da III Divisão

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A FECHAR

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‘Yes, we can!’. Dois Obamas, o sonho da humanidade

“É preciso encarar isto como um fim-de-semana de campismo”Silvio Berlusconi após o sismo que assolou Itália

“O PS (...) faz lembrar o Zeca Afonso «eles comem tudo»”Nascimento Rodrigues, Provedor de Justiça

“Nem queria vir embora, é um local tão relaxante, tão calmo e tão lindo”Miss Universo, Dayana Mendoza, depois da visita a Guantanamo

Chama-se Nano e foi apresen-tado na Índia a 23 de Março, onde vai custar 100 mil rupias (cerca de 1500 euros). Sem ar condicionado, direcção assistida ou vidros eléc-tricos, o Nano já é apelidado de “carro do povo”.

Estima-se que possa começar a ser comercializado na Europa em meados de 2010 ou 2011.

Sabia que:

* Depois de ter investido mais de 250 milhões de euros na in-stalação de uma nova fábrica em Bengala, a Tata foi expulsa por um grupo de camponeses que, apoia-dos por alguns partidos políticos regionais, se manifestaram contra

Um Sonho Indiano

a expropriação de ter-ras para a edificação de uma nova zona in-dustrial?

* O “Nano eu-ropeu” não será ex-actamente igual ao produzido na Índia. O objectivo é assemelhar-se aos modelos comercializados no “Velho Continente” e cumprir os requisitos de segurança impostos pelas autoridades europeias.

* A Tata tem o único sistema de crash test do país.

* Na Índia morrem anual-mente 20 mil pessoas vítimas de acidentes automobilísticos, o que corresponde a 8% do total em todo o mundo. D.M.

Características técnicas

Velocidade máxima: 110 km/hMotor: tracção traseira, 0,6 Litros, 33 Cavalos, 2 Válvulas por cilindro, 33hp/24Kw, 5500 rpmTransmissão: 4 velocidadesConsumo: 5 litros aos 100 kmEmissões de gases: menos de 100 gramas de CO2 por quilómetroComprimento: 3 metrosGarantia: 18 meses ou 24 mil quilómetros