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22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 14 a 19 de Setembro 2003 - Joinville - Santa Catarina I-010 – ESTUDO DA INCORPORAÇÃO DO LODO CENTRÍFUGADO DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA PASSAÚNA EM MATRIZ DE CONCRETO COM DOSAGEM DE 3%* Cinthya Hoppen(1) Engenheira Química pela PUC -PR (2000), Especialista em MBA em Sistema de Gestão Ambiental pela PUC -PR (2002), Mestranda em Engenharia de Recursos Hídricos e Ambiental pela UFPR, Bolsista CAPES. Kleber Franke Portella Bacharel em Química, Mestre em Ciências pelo ITA, Doutor em Ciências pela USP, Pesquisador do LACTEC. Cleverson Vitório Andreoli Eng. Agrônomo, Mestre em Solos e Doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UFPR), Professor da UFPR, PUCPR e FAE Business School, Engenheiro da SANEPAR e Coordenador Técnico do Programa de Reciclagem Agrícola do Lodo de Esgoto e do Programa Interdisciplinar de Pesquisa de Gerenciamento de Mananciais. Almir Sales Engenheiro Civil, Doutor em Engenharia Civil (Escola Politécnica da USP). Professor da UFSCar na Graduação e Pós-Graduação, Professor na Pós-Graduação da Universidade de São Paulo/São Carlos. Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Madeiras e Estruturas de Madeira, Pesquisador do LACTEC. Alex Joukoski

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22º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental 14 a 19 de Setembro 2003 - Joinville - Santa Catarina I-010 – ESTUDO DA INCORPORAÇÃO DO LODO CENTRÍFUGADO DA ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA PASSAÚNA EM MATRIZ DE CONCRETO COM DOSAGEM DE 3%* Cinthya Hoppen(1) Engenheira Química pela PUC-PR (2000), Especialista em MBA em Sistema de Gestão Ambiental pela PUC-PR (2002), Mestranda em Engenharia de Recursos Hídricos e Ambiental pela UFPR, Bolsista CAPES. Kleber Franke Portella Bacharel em Química, Mestre em Ciências pelo ITA, Doutor em Ciências pela USP, Pesquisador do LACTEC. Cleverson Vitório Andreoli Eng. Agrônomo, Mestre em Solos e Doutor em Meio Ambiente e Desenvolvimento (UFPR), Professor da UFPR, PUCPR e FAE Business School, Engenheiro da SANEPAR e Coordenador Técnico do Programa de Reciclagem Agrícola do Lodo de Esgoto e do Programa Interdisciplinar de Pesquisa de Gerenciamento de Mananciais. Almir Sales Engenheiro Civil, Doutor em Engenharia Civil (Escola Politécnica da USP). Professor da UFSCar na Graduação e Pós-Graduação, Professor na Pós-Graduação da Universidade de São Paulo/São Carlos. Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Madeiras e Estruturas de Madeira, Pesquisador do LACTEC. Alex Joukoski

Engenheiro Civil pela UFPR, Engenheiro Especilista (UFPR), Mestrando do Programa de Pós Graduação em Engenharia (PIPE) pela UFPR, Pesquisador do LACTEC. Endereço(1): Rua Engenheiros Rebouças, 1376 – Curitiba - PR - CEP: 80215-900 - Brasil - Tel: (41) 330-3238 – Fax: (041) 333-9952 - e-mail: [email protected] RESUMO Há tempo, os destino dos resíduos gerados nos decantadores, denominados de lodo de ETA, vinha sendo os cursos d’água próximo as Estações de Tratamento de Água, no entanto, os órgãos ambientais estão restringindo ou proibindo este tipo de prática devido a riscos à saúde e ao meio ambiente. Desta maneira, a incorporação deste lodo centrifugado de ETA em matriz de concreto pode ser uma alternativa para minimizar estes impactos oriundos da sua disposição inadequada. Este estudo analisou a caracterização do lodo da ETA Passaúna em matriz de concreto com dosagem de 3% do lodo em relação ao peso seco da areia, comparada com um concreto referência, sem a adição. Para a caracterização do lodo da ETA Passaúna foram coletadas amostras diárias em um período de um mês por dois meses, julho (amostra 1) e agosto (amostra 2), com a finalidade de avaliar a variabilidade físico-química deste lodo. Foi também realizada a caracterização dos aglomerantes e agregados com o objetivo de controlar o estudo de dosagem e análises posteriores pertinentes ao concreto produzido com estes. Para o concreto fabricado com e sem a adição do lodo foram avaliadas as propriedades do concreto fresco, como abatimento do tronco de cone e do concreto endurecido como resistência a compressão aos 7 e 28 dias. Alguns dos componentes do concreto não atenderam as normas, mas não comprometeram as propriedades do concreto confeccionado. O lodo da ETA Passaúna apresentou grande presença de sílica e alumínio em torno de 13,42% e 22,21%, respectivamente, e teor de umidade em torno de 87%. Nos ensaios de resistência à compressão, tanto o concreto referência como o com traço de 3% de lodo, apresentaram valores acima de 25 MPa para os 7 e 28 dias. A análise conjunta destes dados permite concluir que a mistura de 3% de lodo no concreto pode ser utilizada em fabricação de artefatos, estruturas pré-moldadas e construção de pavimentos em concreto, no entanto, estas devem ser acompanhadas por ensaios específicos. PALAVRAS-CHAVE: Lodo de ETA, reciclagem, resíduo em concreto, tratamento de água. INTRODUÇÃO Nos centros urbanos, o abastecimento de água torna-se cada vez mais centrado na qualidade do produto a ser distribuído à população. Em contrapartida, a qualidade da água bruta está piorando e exige uma maior concentração de produtos químicos aplicados no seu tratamento. Como conseqüência, há um significativo aumento nos rejeitos ou lodo, provenientes das Estações de Tratamento de Água (ETA), os quais são gerados principalmente nos decantadores.

Estes resíduos gerados nos decantadores da Estação de Tratamento de Água são denominados lodo de ETA ou lodo de água. Pela NBR 10.004 estes lodos são classificados como "resíduos sólidos", portanto devem ser tratados e dispostos conforme exigência dos órgãos reguladores. Desde muito tempo, o destino destes resíduos vinha sendo os cursos d’água próximos às estações, no entanto, a crescente preocupação e a regulamentação têm restringindo ou proibido esta disposição. Esta prática tem sido questionada por órgãos ambientais devido aos riscos à saúde e ao meio ambiente, pois a disposição inadequada pode gerar contaminação nos mananciais urbanos. Os métodos de tratamento e a disposição final de lodo geralmente não têm sido adotados nas ETAs brasileiras, principalmente pelo alto custo envolvido, de modo que grande parte do lodo produzido tem sido descartado em corpos d’água. No entanto, as principais alternativas de disposição final existentes usualmente utilizadas em países desenvolvidos são: aplicação no solo, aterro sanitário, incineração e utilização como matéria prima na produção de cerâmica. No entanto, a busca de soluções economicamente viáveis e ambientalmente vantajosas para o tratamento e disposição final do lodo de ETA continua sendo um desafio, principalmente para o Brasil, pois sua adequação ambiental e a viabilidade econômica exigem soluções adaptadas as condições locais. Desta maneira, o estudo da incorporação direta e sem tratamento prévio do lodo centrifugado de ETA em matriz de concreto poderá minimizar de maneira significativa os impactos ao meio ambiente advindos da disposição final destes resíduos e reduzir custos. Neste estudo analisou-se a caracterização do lodo da ETA Passaúna em matriz de concreto com dosagem de 3% do lodo de ETA em relação ao peso seco da areia comparado com um concreto referência, sem a adição. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA De acordo com RICHTER (2001), o lodo de ETA pode ser considerado um resíduo de água e sólidos suspensos contidos na fonte de água acrescidos dos produtos químicos aplicados à água durante seu processo de tratamento. SILVA E ISAAC (2002) caracterizam este lodo como um fluído não-newtoniano, volumoso e tixotrópico, apresentando-se em estado gel quando em repouso e relativamente líquido quando agitado. Segundo GRADIN, ALÉM SOBRINHO e GARCIA JR (1993) o lodo de ETA é constituído de resíduos sólidos orgânicos e inorgânicos provenientes da água bruta, tais como: algas, bactérias, vírus, partículas orgânicas em suspensão, colóides, areias, argila, siltes, cálcio, magnésio, ferro, manganês, etc. SILVA, BIDONE E MARQUES (2000) complementam a composição dos lodos com hidróxidos de alumínio, em grande quantidade, proveniente da adição de produtos químicos e em alguns casos polímeros condicionantes utilizados no processo. RICHTER (2001) acredita que a qualidade do lodo depende da qualidade físico-química da água in natura, qualidade final desejada desta, coagulantes e produtos utilizados durante o processo de tratamento, devido a isto, o volume torna-se diretamente proporcional à

dosagem deste coagulante utilizado. Este volume pode variar entre 0,2% a 5% do volume total de água tratada pela ETA, já LUCIANO (1998), acredita que este valor representa apenas de 0,3 a 1% da água tratada. O teor de sólidos totais varia entre 1.000 a 40.000 mg/L (0,1 a 4%), sendo deste: de 75 a 90% sólidos suspensos; e 20 a 35% compostos voláteis, apresentando, portanto uma pequena porção biodegradável, mas o qual pode ser prontamente oxidável (RICHTER, 2001). Segundo RICHTER (2001) o lodo de sulfato de alumínio apresenta uma pequena proporção de biodegradabilidade e suas principais características estão apresentadas na Tabela 1. Tabela 1. Características típicas de lodos de sulfato de alumínio. Sólidos Totais (%) Al2O3.5H2O (%) Inorgânicos (%) Matéria Orgânica (%) pH DBO (mg/L) DQO (mg/L) 0,1 – 4 15 - 40 35 - 70 15 – 25 6 - 8 30 - 300 30 – 5.000 FONTE: RICHTER (2001) De acordo com REALI (1999), este lodo de sulfato de alumínio apresenta coloração marrom, com viscosidade e consistência que lembram um chocolate líquido, além de possuírem uma difícil sedimentação ou flotação em seu estado natural.

CORDEIRO (2001) analisou o lodo de três ETAs: São Carlos, Araraquara e Rio Claro, podendo observar que os valores obtidos representam dados pontuais e existe uma variabilidade quanto à remoção de limpeza dos decantadores, pois na ETA Araraquara o lodo é removido 3 vezes ao dia e nas demais acontece o acumulo em tanques. Os parâmetros analisados nestas ETAs e sua variabilidade podem ser observados na Tabela 2. Tabela 2. Parâmetros Físico-químicos para o Lodo das ETAs São Carlos, Araraquara e Rio Claro. Parâmetros ETA – São Carlos ETA – Araraquara ETA – Rio Claro Conc. de Sólidos (%) 4,68 0,14 5,49 pH 7,2 8,93 7,35 Cor (U.C.) 4.300.000 10.650 250.000 Turbidez (U.T.)

800.000 924 36.000 DQO (mg/L) 4.800 140 5.450 Sólidos Totais (mg/L) 58.630 1.620 57.400 Sólidos Suspensos (mg/L) 23.520 775 15.330 Sólidos Dissolvidos (mg/L) 32.110 845 42.070 Alumínio (mg/L) 11.100 2,16 30 Zinco (mg/L)

4,25 0,10 48,53 Chumbo (mg/L) 1,60 0,00 1,06 Cádmio (mg/L) 0,02 0,00 0,27 Níquel (mg/L) 1,80 0,00 1,16 Ferro (mg/L) 5.000 214 4.200 Manganês (mg/L) 60,00 3,33 30

Cobre (mg/L) 2,06 1,70 0,091 Cromo (mg/L) 1,58 0,19 086 FONTE: (CORDEIRO, 2000). Em estudos realizados por BARBOSA et. al. (2000) com lodo de ETAs situadas nas cidades de Araraquara e São Carlos, analisando pH, condutividade, OD, dureza, turbidez, DQO, série de sólidos, metais (Al, Cr, Fe, Ni, Pb, Cd, Zn, Mn, Cu) e nutrientes (N e P), nos períodos chuvoso e seco, observa-se que os parâmetros que expressaram a influência do período chuvoso, foram: pH, turbidez, sólidos totais, sólidos suspensos, DQO, nitrogênio e fósforo. No caso dos metais entre os que apresentaram concentrações elevadas, destacam-se: o alumínio, ferro e manganês, justificados pelo aumento da dosagem de coagulantes utilizados devido à água apresentar maiores concentrações de contaminantes e materiais provenientes de lavagem dos solos. Segundo RICHTER (2001) o destino final do lodo de ETA é uma das tarefas mais difíceis no tratamento de água, pois envolve transporte e algumas restrições ao meio ambiente. Entre as alternativas mais utilizadas, são destacados: lançamento em curso d’água; lançamento no mar; lançamento na rede de esgoto sanitário; lagoa; aplicação ao solo; aterro sanitário; fabricação de tijolo; e fabricação de cimento. No entanto, um dos grandes desafios atualmente é a busca de alternativas economicamente e tecnicamente viáveis, além de ambientalmente vantajosas de destinação final do lodo de ETA. A utilização benéfica do lodo de ETA pode ser considerada uma oportunidade de aumentar a receita das empresas de saneamento, mas, principalmente, a redução de custos e impactos ambientais associados a este resíduo (TSUTIYA; HIRATA, 2001). CORDEIRO (2000), complementa que a utilização do lodo de ETA como matéria – prima reduz a

quantidade de recursos naturais utilizados, além de deixar de ocupar espaços em aterro sanitário. Segundo CORDEIRO (2000), a incorporação do lodo em matriz de concreto pode ser uma alternativa viável, pois não prejudica o meio ambiente e ainda pode trazer benefícios para estas estruturas. Em estudos com lodo de ETA substituindo parte do agregado miúdo na fabricação do concreto, SALES e CORDEIRO (2001) observaram que, pelos valores obtidos para estes, nos ensaios de resistência à compressão axial e absorção, pode-se sugerir o concreto em aplicações não-estruturais, permitindo o atendimento mínimo inerente ao desempenho mecânico e à durabilidade. Estes acreditam, também, na redução de matérias-primas naturais, como areia e pedra brita, cuja extração produz impacto ambiental em rios e mananciais. CORDEIRO (2000) cita como aplicações do concreto contendo lodo de ETA, como: produção de contrapiso, argamassas para assentamento de componentes e confecção de blocos de concreto não-estrutural, além de outras aplicações que não exijam resistências elevadas. MATERIAIS E MÉTODOS CARACTERIZAÇÃO DO LODO DE ETA Para a caracterização do lodo de ETA foram coletadas amostras diárias, compondo um mês, do lodo na Estação de Tratamento de Água Passaúna, com o objetivo de se obter um material representativo do resíduo gerado na ETA durante aquele período. Esta coleta se realizou nos meses de julho e agosto de 2002, Amostra1 e Amostra2, com a finalidade de avaliar a variabilidade físico-química do lodo. Para a caracterização das amostras de lodo de ETA foram determinadas a umidade pelo método gravimétrico, o qual consiste em pesar a amostra úmida em uma balança e seca- lá com o auxílio de uma lâmpada de infravermelho até obter peso constante, e o pH com auxílio de um pHmetro segundo a norma ASTM 4980-89. Detalhes da metodologia adotada e parâmetros analisados no lodo da ETA Passaúna estão descritos na literatura Portella, Hoppen, Sales e Baron (2002). Também foi realizada a análise de perda ao fogo das amostras em equipamento de análise térmica, com cadinho de platina aberto sob atmosfera de O2 e N2 e taxa de aquecimento do forno de 10ºC por minuto até temperatura de 1000ºC. Para a difração de raios-X (DRX) das amostras, estas foram realizadas com o material in natura após secagem em estufa a 110ºC por 12 horas e depois calcinadas à temperatura de 700ºC, por aproximadamente 3 horas, sendo posteriormente analisadas, utilizando radiação Cu Kµ l =1,54184 A , tensão = 40 kV, corrente = 40 mA, varredura 2q =5 a 90º - tamanho

do passo: 0,020 - tempo do passo 1,00s - velocidade de varredura: 0,020º /s. Já para a análise química foram confeccionadas pastilhas de vidro contendo as amostras, sendo estas analisadas pelo equipamento de fluorescência de raio X. As análises dos elementos Fe, Si, e Al foram efetuadas por espectrofotometria de absorção atômica com atomização em chama em um espectrofotômetro de absorção atômica. CARACTERIZAÇÃO DOS AGLOMERANTES E AGREGADOS A caracterização dos agregados e aglomerantes, foi determinada com o objetivo de controlar e balizar o estudo de dosagem e análises posteriores pertinentes aos concretos produzidos. Esta caracterização foi realizada pelos ensaios: caracterização do agregado miúdo (areia); caracterização do agregado graúdo (brita 1 – 19mm) e análises físicas, químicas e mecânicas do cimento utilizado (cimento Portland CPII - F 32). Para a caracterização do agregado miúdo foram determinados: diâmetro máximo, módulo de finura, teor de argila em torrões, massa unitária solta, material pulverulento, massa específica seca, massa específica SSS, absorção de água, impurezas orgânicas. Já para o agregado graúdo foram determinados: diâmetro máximo, módulo de finura, material pulverulento, massa unitária solta, massa unitária compactada, absorção e massa específica seca SSS. Para o aglomerante foram realizados a caracterização do cimento utilizado CPII-F 32 (mais comumente encontrado no mercado curitibano) por meio de análises físico-químicas, ensaios mecânicos e fluorescência de raios-X com o objetivo de identificar os principais compostos químicos presentes. ESTUDO DE DOSAGEM E PRORIEDADES DO CONCRETO Com o estudo de dosagem foi possível obter as proporções adequadas para a adição do lodo no concreto, de maneira a se obter um material com características compatíveis com alguma aplicação na construção civil. Para este estudo, foi confeccionado um concreto referência sem a adição do lodo de ETA, com fator a/c de 0.5 (valor adotado com base em literatura referente ao assunto) e definição do traço padrão em função de informações encontradas em literatura técnica. Estes mesmos parâmetros do concreto referência, foram adotados para a confecção do concreto com a adição do lodo de ETA, para que se possa obter uma correlação entre as propriedades dos traços dosados. Para este concreto incorporando o lodo de ETA, foi utilizado o teor de 3% do peso de agregado miúdo, em substituição a este, sendo a quantidade total de água de amassamento foi corrigida em função do peso e do teor de umidade do lodo acrescentado. O amassamento do concreto foi efetuado em 3 etapas to talizando um tempo total de 8 minutos (3min de mistura inicial – 3 min de pausa – 2 min de mistura final), ao término os concretos foram retirados e submetidos a ensaios para verificação de suas propriedades as quais: abatimento do tronco de cone (slump-test), massa unitária e teor de ar incorporado.

Para as duas dosagens (0 e 3%) de concreto foram confeccionados corpos-de-prova (CP) cilíndricos de 10 cm de diâmetro por 20 cm de altura com seis CPs para cada traço, os quais foram mantidos em câmara úmida até a data dos ensaios, 7 e 28 dias. Nas idades previstas, os CPs de cada dosagem foram capeados com enxofre e levados à ruptura por compressão axial simples, utilizando-se de uma máquina de ensaio universal com capacidade de 100 toneladas. Dos CPs rompidos aos 28 dias foram extraídas amostras para determinação de absorção de água por imersão, massa específica e índice de vazios, seguindo a norma NBR 9778/87. RESULTADOS E DISCUSSÃO CARACTERIZAÇÃO DO LODO DE ETA Para a dosagem do concreto, foi adotado um teor de umidade de 83%, no entanto, na caracterização esta umidade foi de 87,5% e 86,4%, para as amostras 1 e 2, respectivamente, esta diferença utilizada teve a finalidade de compensar a perda de umidade do lodo durante seu manuseio. Estas amostras também obtiveram um pH de 7,02 e 6,42. Os principais elementos detectados pela análise química, tanto na amostra 1 e 2, foram Al2O3, SiO2 e Fe2O3. Na amostra 1, as quantidades encontradas foram: 23,62%, 14,10% e 8,39%, respectivamente. Já para a amostra 2, estes valores foram um pouco menores, 20,80% para Al2O3, 12,75% para SiO2 e 7,58% para Fe2O3, conforme observado na Tabela 03. Na perda ao fogo, as duas amostras ficaram em torno de 50%: a amostra 1 obteve 49,01% e a amostra 2, 51,12%. Tabela 3: Análise química por fluorescência de raios-X e espectrofotometria de absorção atômica.] Elementos (%) Lodo 01 Lodo 02 SiO2 * 14,10 12,75 Al2O3*

23,62 20,80 TiO2 0,35 0,68 Fe2O3* 8,39 7,58 MgO 0,15 0,42 CaO 0,33 0,36 Na2O <0,02 0,10 K2O 0,11 0,27 P2O5 0,34 0,69 Outros elem. não detectados

3,60 5,23 * Elementos analisados por espectrofotometria de absorção atômica com atomização em chama CARACTERIZAÇÃO DOS AGLOMERANTES E AGREGADOS Os resultados dos ensaios físicos realizados nos aglomerantes estão apresentados na Tabela 4. Tabela 4: Ensaios físicos para agregados miúdos e graúdos. Análise Areia Brita Absorção (%) 0,8 0,4 Massa específica seca (g/cm3) 2,60 2,60 Massa específica SSS (g/cm3) 2,61 2,61 Massa específica solta (kg/cm3) 1,43

1,43 Massa unitária compactada (kg/dm3) NA 1,50 Módulo de finura 2,83 6,60 Diâmetro máximo (mm) 4,8 19,0 Teor de material pulverulento (%) 3,2 0,5 Teor de argila em torrões (%) 0,1 NA Teor de impurezas orgânicas (ppm) > 300 NA NA: não aplicável Para a análise química do agregado miúdo foram encontrados SiO2 com 90,24% e Al2O3 com 4, 34%, como os materiais em maior quantidade, pois os demais elementos ficaram abaixo de 1,50%. Para o agregado graúdo os mesmos elementos foram encontrados nas maiores quantidades, com 71,54% de SiO2 e 14,91% de Al2O3, no entanto, também foi encontrado Na2O com 5,27%.

Os ensaios físicos – químicos e mecânicos realizados pelo aglomerante (cimento) estão demonstrados na Tabela 5. Tabela 5. Ensaios físicos – químicos e mecânicos do cimento. Análises Resultados / Cimento Ensaios físicos Massa específica (g/cm3) 3,10 Resíduo da peneira #200 (%) 3,0 Resíduo da peneira #325 (%) 11,2 Ensaios químicos (%) Óxido de alumínio (Al2O3) 4,1 Dióxido de silício (SiO2) 18,4 Óxido férrico (Fe2O3) 2,55 Óxido de cálcio (CaO)

60,2 Óxido de Magnésio (MgO) 4,89 Trióxido de enxofre (SO3) 2,64 Óxido de sódio (Na2O) 0,13 Óxido de potássio (K2O) 1,03 Perda ao fogo 5,56 Resistência à compressão (MPa) 3 dias 21,1 7 dias 23,6 28 dias 29,5 A maior parte destes resultados de caracterização dos agregados e aglomerantes atenderam aos limites estabelecidos pelas normas correspondentes, exceto os referentes aos teores de material pulverulento e impurezas orgânicas na areia, os quais não comprometem a qualidade do concreto fabricado. PROPRIEDADES DO CONCRETO

A elevação da temperatura observada no concreto após a adição do lodo, foi de apenas 1ºC, considerada baixa na influência do aumento de fissuras do concreto. Para o consumo de cimento, aumentando-se de 0 a 3% a dosagem do lodo, ocorre uma diminuição deste consumo, cerca de 2% pela substituição de parte dos materiais. A consistência do concreto, denotada pela medida do abatimento do tronco de cone, apresentou uma variação expressiva comparada ao concreto referência, sendo de 17 mm para a mistura com o lodo, na Tabela 6 são demonstradas as demais propriedades obtidas do concreto fresco. Na Figura 1, são demonstrados os ensaios de abatimento do tronco de cone (slump-test) e resistência à compressão. Tabela 6. Propriedades do concreto fresco. Teor de lodo de ETA (% em peso seco) 0% 3% Temperatura do concreto (ºC) 18,3 19 Consumos (kg/m3) Cimento 364 356 Areia média 736 698

Brita 1 1085 1061 Água 183 178 Lodo de ETA 0 22 Abatimento do tronco de cone (mm) 65 17 Massa unitária (kg/m3) Teórica 2373 2345 Real 2366 2319 Ar incorporado (%)

Teórico 0,3 1,1 Real - 2,0 Figura 1. Abatimento do tronco de cone e ensaio de resistência à compressão. Na resistência mecânica, o traço de 3% apresentou valores de rupturas superiores a 26 MPa, tanto aos 7 como aos 28 dias de idade a partir da moldagem. Na Tabela 7, são apresentados os valores médios obtidos pelas três rupturas dos CPs. Tabela 7. Resistência à compressão. Teor de lodo de ETA (% peso da areia) 0% 3% Resistência aos 7 dias (MPa) 27,3 26,1 Resistência aos 28 dias (MPa) 38,7 34,0 Comparando-se as tensões de ruptura do traço contendo lodo com a do concreto referência, como mostrado na Figura 2, observa-se que aos 7 dias ambas estão próximas, já atingindo

valores superiores a 26 MPa. Pode-se observar que aos 28 dias ocorreu uma redução de aproximadamente 12% na resistência, no entanto esta ficou acima de 30 MPa. Figura 2: Resistência à compressão em função da idade. Os valores obtidos para absorção, massa específica e índice de vazios estão disponíveis na Tabela 8 e pode-se observar que ocorre um aumento no teor de absorção de água no concreto com 3% de lodo, o que não é bom no caso de durabilidade frente a ambientes agressivos, pois poderá propiciar o ingresso de elementos prejudiciais ao concreto. Para concreto armado, a norma NBR 8452/98 limita a absorção do concreto a 6%, o valor determinado para o concreto com o lodo de ETA foi aproximadamente 8%, superior ao valor mínimo exigido pela norma. Tabela 8. Ensaios físicos do concreto endurecido. Teor do lodo de ETA (% em peso areia) 0% 3% Absorção (%) Após imersão em água 7,14 7,76 Após imersão e fervura 7,44 7,87

Massa específica (kg/dm3) Real 2,70 2,54 Seca 2,25 2,12 Após saturação 2,41 2,28 Após saturação e fervura 2,42 2,28 Índice de vazios (%) Após saturação 16,13 16,40 Após saturação e fervura 16,72 17,62

CONCLUSÕES Verificou-se que os componentes do concreto (agregados e aglomerantes) apresentaram qualidade satisfatória, e os parâmetros que não atenderam as normas não comprometeram as propriedades do concreto confeccionado. Na caracterização do lodo da ETA Passaúna utilizado observou-se um material com grande presença de sílica e alumínio, materiais já esperados devido aos produtos químicos utilizados (sulfato de alumínio) no processo de tratamento de água e do próprio material sedimentado no tratamento da água como materiais argilosos e siltosos, além de apresentar um teor de umidade em torno de 87%, mesmo após passagem por centrífuga. Com a adição do lodo de ETA no concreto foi proporcionada uma redução, pequena, no consumo de aglomerante, conseguindo-se uma economia no preço do concreto e preservação de recursos naturais. No caso da resistência mecânica, os valores encontrados foram acima de 25 MPa, tanto para 7 como para 28 dias de idades, sendo sugerida, em cima de tais critérios analisados, mas com necessidade de se validar toda e qualquer dosagem a ser realizada, a utilização em aplicações tais como indicadas por CORDEIRO (2000), além de outras, sendo importante a caracterização do traço e da durabilidade. Constatou-se, também, que esta adição no lodo na matriz de concreto foi viável tecnicamente, além de ser ambientalmente correta, uma vez que reduziu a quantidade deste material a ser disposta na natureza. No entanto, recomenda-se que sejam feitos testes com concentrações maiores do lodo incorporado no concreto, para que possa analisar qual a melhor mistura a ser utilizada. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, R. M. et. al. A Toxicidade de Despejos (lodos) de Estações de Tratamento de Água à daphnia similis (ceadocera, crustacea). In: CONGRESSO INTERAMERICANO DE ENGENHARIA SANITÁRIA, XXVII., 2000, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: AIDIS, 2000. 1 CD-ROM. CORDEIRO, J. S. Gerenciamento de Lodo de ETAs – Remoção de água, através de leitos de secagem e codisposição da fase sólida em matrizes de cimento e resíduos da construção civil. São Carlos: UFSCar / FINEP: 2000. 145 p. Relatório Técnico PROSAB 2. CORDEIRO, J. S. Processamento de Lodos de Estação de Tratamento de Água (ETA). In: ANDREOLI, C.V. (coord.) Resíduos Sólidos do Saneamento: Processamento, Reciclagem e Disposição Final. Rio de Janeiro: RiMa / ABES / PROSAB, 2001. p. 121 – 142.

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