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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental ABES – Trabalhos Técnicos 1 III-017 – SANTO ANDRÉ: UMA NOVA GESTÃO PARA OS RESÍDUOS SÓLIDOS Cheila Aparecida Gomes Bailão (1) Arquiteta e Urbanista; Especialista em Planejamento Urbano pela UnB; Mestre em Ciências da Construção e Arquitetura para países tropicais pelo ISPJAE – Havana, Cuba – e Diretora do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André - SP. Silvia Helena Passarelli (2) Arquiteta e Urbanista; Mestre em Estruturas Ambientais e Urbanas pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP; Doutoranda na mesma Instituição; Ex-Assistente de Diretor do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André - SP. William Gomes Gripp (3) Eng. Civil pela EESC-USP; Mestre em Hidráulica e Saneamento pela EESC-USP; Doutorando em Ciências da Engenharia Ambiental pelo CRHEA - USP; Ex-Diretor do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André - SP; Consultor em Resíduos Sólidos; Diretor Geral do Departamento de Água e Esgoto de Rondonópolis - MT. Marcelo Bispo da Conceição (4) Designer - Habilitação Projeto do Produto pela Faculdade de Desenho Industrial de Mauá; Técnico em Plásticos pelo Senai Mario Amato; Desenhista de Arquitetura pela ETE Júlio de Mesquita; Coordenador de Programas do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André - SP. Endereço (1) : Rua Oswaldo Cruz nº 99 – Bairro Paraíso – Santo André – São Paulo – CEP 09185-440 – Brasil – Tel: +55 (11) 4433-9904 – e-mail: [email protected] RESUMO Desde o ano de 1997, o Município de Santo André implementa a Política Integrada de Gestão de Resíduos Sólidos, que envolve a redução, reaproveitamento e reciclagem de resíduos sólidos, bem como o tratamento e a disposição final de resíduos de forma qualificada, minimizando os impactos no ambiente aumentando as perspectivas de inclusão social e desenvolvimento econômico no mercado de resíduos sólidos. Este trabalho tem por finalidade explicitar as atividades desenvolvidas pela Administração Municipal de modo a envolver a população em um programa onde o munícipe responsável pela geração de resíduos sólidos, participa de forma co-responsável junto ao poder público no encaminhamento das soluções. A participação do cidadão nesse processo de co-gestão viabiliza a separação dos resíduos na fonte e a geração de renda a trabalhadores que se encontravam fora do mercado formal de trabalho, além de outros benefícios para a população e a cidade. PALAVRAS-CHAVE: Coleta Seletiva, Geração de Renda, Cidade Agradável, Gestão Pública e Cidadania, Educação Ambiental, Conservação do Ambiente. INTRODUÇÃO: SANTO ANDRÉ RECICLA: uma nova gestão para os resíduos sólidos Aceitando o desafio de melhoria da qualidade ambiental a partir da gestão integrada dos resíduos sólidos, a Prefeitura de Santo André, inicialmente por meio da Secretaria de Serviços Municipais e posteriormente pelo Serviço Municipal de Saneamento Ambiental – SEMASA – implantou o Programa de Coleta Seletiva e Reciclagem, chamado Reciprocidade Agradável, que, além de estabelecer uma proposta de adesão voluntária da população e o apoio de diversos atores sociais, atinge a totalidade do município com um serviço de coleta porta a porta. O programa tem forte apelo à promoção da qualidade ambiental e à conservação do ambiente e qualidade de vida. Propõe, também, a ampliação da geração de renda para inúmeros desempregados a partir do apoio na formação de cooperativas de triagem, organização de trabalhadores autônomos, envolvimento de adolescentes

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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

ABES – Trabalhos Técnicos 1

III-017 – SANTO ANDRÉ: UMA NOVA GESTÃO PARA OS RESÍDUOSSÓLIDOS

Cheila Aparecida Gomes Bailão (1)

Arquiteta e Urbanista; Especialista em Planejamento Urbano pela UnB; Mestre emCiências da Construção e Arquitetura para países tropicais pelo ISPJAE – Havana, Cuba –e Diretora do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal deSaneamento Ambiental de Santo André - SP.Silvia Helena Passarelli(2)

Arquiteta e Urbanista; Mestre em Estruturas Ambientais e Urbanas pela Faculdade deArquitetura e Urbanismo da USP; Doutoranda na mesma Instituição; Ex-Assistente deDiretor do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental deSanto André - SP.William Gomes Gripp(3)

Eng. Civil pela EESC-USP; Mestre em Hidráulica e Saneamento pela EESC-USP; Doutorando em Ciências daEngenharia Ambiental pelo CRHEA - USP; Ex-Diretor do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa -Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André - SP; Consultor em Resíduos Sólidos; DiretorGeral do Departamento de Água e Esgoto de Rondonópolis - MT.Marcelo Bispo da Conceição(4)

Designer - Habilitação Projeto do Produto pela Faculdade de Desenho Industrial de Mauá; Técnico emPlásticos pelo Senai Mario Amato; Desenhista de Arquitetura pela ETE Júlio de Mesquita; Coordenador deProgramas do Departamento de Resíduos Sólidos do Semasa - Serviço Municipal de Saneamento Ambiental deSanto André - SP.

Endereço(1): Rua Oswaldo Cruz nº 99 – Bairro Paraíso – Santo André – São Paulo – CEP 09185-440 – Brasil– Tel: +55 (11) 4433-9904 – e-mail: [email protected]

RESUMO

Desde o ano de 1997, o Município de Santo André implementa a Política Integrada de Gestão de ResíduosSólidos, que envolve a redução, reaproveitamento e reciclagem de resíduos sólidos, bem como o tratamento e adisposição final de resíduos de forma qualificada, minimizando os impactos no ambiente aumentando asperspectivas de inclusão social e desenvolvimento econômico no mercado de resíduos sólidos.Este trabalho tem por finalidade explicitar as atividades desenvolvidas pela Administração Municipal de modo aenvolver a população em um programa onde o munícipe responsável pela geração de resíduos sólidos, participade forma co-responsável junto ao poder público no encaminhamento das soluções. A participação do cidadãonesse processo de co-gestão viabiliza a separação dos resíduos na fonte e a geração de renda a trabalhadores quese encontravam fora do mercado formal de trabalho, além de outros benefícios para a população e a cidade.

PALAVRAS-CHAVE: Coleta Seletiva, Geração de Renda, Cidade Agradável, Gestão Pública e Cidadania,Educação Ambiental, Conservação do Ambiente.

INTRODUÇÃO: SANTO ANDRÉ RECICLA: uma nova gestão para os resíduos sólidos

Aceitando o desafio de melhoria da qualidade ambiental a partir da gestão integrada dos resíduos sólidos, aPrefeitura de Santo André, inicialmente por meio da Secretaria de Serviços Municipais e posteriormente peloServiço Municipal de Saneamento Ambiental – SEMASA – implantou o Programa de Coleta Seletiva eReciclagem, chamado Reciprocidade Agradável, que, além de estabelecer uma proposta de adesão voluntária dapopulação e o apoio de diversos atores sociais, atinge a totalidade do município com um serviço de coleta portaa porta.

O programa tem forte apelo à promoção da qualidade ambiental e à conservação do ambiente e qualidade devida. Propõe, também, a ampliação da geração de renda para inúmeros desempregados a partir do apoio naformação de cooperativas de triagem, organização de trabalhadores autônomos, envolvimento de adolescentes

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em aprendizado. A partir da coleta de resíduos sólidos, com estímulo à maior eficiência e produtividadeeconômica e a inclusão social estabelece-se o compromisso social entre diferentes atores.

SANTO ANDRÉ, O MUNICÍPIO

Localizado na Região Metropolitana de São Paulo, Santo André é um dos Municípios que compõe a RegiãoABC, ou ainda, a Sub-Região Sudeste da Região Metropolitana. Sua área territorial se estende por 174 km2,sendo que mais de 50% desta área (108 km2) se encontra em área ambientalmente protegida, parte integrante daÁrea de Proteção aos Mananciais na Bacia Hidrográfica da Represa Billings (96 km2) e da vertente da Serra doMar (12 km2), área envoltória do tombamento do Parque Estadual da Serra do Mar. Os demais 66 km2

pertencem à Bacia Hidrográfica do Rio Tamanduateí, área onde se concentram as principais atividades urbanase industriais do município. (fig.01)

A ocupação urbana do Município também se apresenta em duas caracterizações distintas: de um lado, na BaciaHidrográfica do Rio Tamanduateí, a área apresenta uma ocupação urbana densa, com raros lotes vazios etotalmente conurbado com os municípios vizinhos – São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, São Pauloe Mauá.

Fig.01 – Região Metropolitana de São Paulo – em destaque cidade de Santo André

De outro lado, a ocupação da área de mananciais apresenta loteamentos descontínuos e distantes uns dosoutros, com grandes manchas vazias dificultando a prestação de serviços públicos às populações que aliresidem em virtude das longas distâncias a percorrer: a vila de Paranapiacaba, por exemplo, no extremo sul doMunicípio, encontra-se a 35 km da sede dificultando a acessibilidade. Parte da área de mananciais não temcontinuidade territorial com a sede do município, uma vez que é secionada por um dos braços da RepresaBillings.

O Município conta com uma população de 648.443 mil habitantes (IBGE 2000), dos quais, 2,6% (cerca de 16mil habitantes) residem na área de proteção aos mananciais. O número de moradias no município totaliza cercade 163 mil, sendo 159 mil em área urbana, dos quais, cerca de 20 mil habitações em núcleos de assentamentoinformal (favelas), a grande maioria deles, áreas de difícil acesso para a coleta regular de resíduos sólidos.

Outra característica marcante de Santo André está na ocupação do vale do rio Tamanduateí: desde o início doséculo a área é ocupada por indústrias de grande porte, muitas delas multinacionais, como Rhodia, Pirelli,Firestone, Alcan, Alcoa, Gerdau, Pólo Petroquímico de Capuava, uma indústria diversificada, voltada para asindústrias têxtil, química, automobilística, pneus, plásticos, metais, muitas delas receptoras de matéria primapara reciclagem.

A partir da década de 80, os vazios industriais ou mesmo antigas fábricas que deixaram a cidade tiveram seuuso transformado para terciário avançado com grandes equipamentos para o comércio e prestação de serviços:shoppings, hipermercados, oficinas e revendas de veículos vêm ocupando a área tradicionalmente destinada àindústria. Também os centros comerciais se expandiram e ganharam força na diversidade de produtos eserviços oferecidos, caracterizando-se como uma cidade policêntrica e marcando, deste final de século, mais

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fortemente, a vocação de centro regional de comércio e serviços de Santo André em relação a toda a RegiãoABC e Zona Leste da cidade de São Paulo, a região é considerada o 3º maior pólo consumidor do país.

No que se refere à gestão dos resíduos sólidos, o Município já há muito tempo contava com um sistema regularde coleta domiciliar, com coleta três vezes por semana nas áreas residenciais e coleta diária nas áreas deconcentração comercial e de serviços, e com um aterro sanitário (fig.02) classificado pela Companhia deTecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB) como um dos melhores do país, sendo que a partir de 2000passou a ser o melhor da Região Metropolitana de São Paulo com ISO 9002.

Fig.02 – Aterro Sanitário Municipal de Santo André, 1999.

A ORIGEM DO PROGRAMA DE COLETA SELETIVA

A questão da coleta seletiva para a cidade foi apontada como um dos compromissos do Plano de Governo1997/2000, priorizando:

w A busca de parcerias para a solução do problema de destinação final dos resíduos sólidos;w Estímulo à redução voluntária do volume de resíduos gerados, através de programas educativos, da

implantação da coleta;w Desenvolvimento do programa de coleta seletiva em três linhas: educativa, lixo domiciliar e lixo industrial;w Implantação, de forma progressiva, da coleta seletiva domiciliar;w Estímulo da ampliação do mercado de reciclagem, através de um enfoque regional e extra-regional do

problema.

“Somam-se a estes, as questões diretamente relacionadas com a construção de uma cidade agradável – com aadoção de práticas de redução, reaproveitamento e reciclagem dos resíduos –, a necessidade de dar tratamento edestinação final apropriados aos resíduos domiciliares, industriais e da construção civil, dentro de um enfoqueque envolva toda a Região do ABC.

O eixo condutor de nossas ações contempla a dupla tarefa de mudar os hábitos, comportamentos e cultura nasociedade com relação aos resíduos gerados e, ao mesmo tempo, entender o mercado de produtos recicláveis,procurando estabelecer parcerias e incentivos para a criação de uma rede integrada de reutilização de produtosrecicláveis.

Neste sentido, Santo André cada vez mais se insere na problemática das grandes cidades diante da perspectiva darealização de medidas para redução de resíduos, num trabalho junto à população buscando a conscientizaçãodiante das questões de redução, reciclagem e reaproveitamento, e para o aprimoramento das formas detratamento e destinação final numa perspectiva de melhoria ambiental.” ( Klinger Luiz de Oliveira Sousa-Secretário de Serviços Municipais – PMSA)

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A IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA DE COLETA SELETIVA

A fase inicial de implantação do programa se deu com o resgate de projetos anteriores da AdministraçãoMunicipal, o Salva Papel, implantado em parceria com as demais prefeituras componentes do ConsórcioIntermunicipal do ABC no período de 1989 à 1992; a implantação das estações de entulho no mesmo período,agora denominadas Estações de Coleta Seletiva e Reciclagem. As Estações têm a finalidade de receber resíduossecos e limpos, utensílios domésticos, inservíveis, podas de jardim e quintais e entulho da construção civil esão operadas por trabalhadores autônomos e grupos organizados da população. Sistematicamente, o PoderPúblico Municipal realiza a limpeza destas áreas, recolhendo os resíduos que não são comercializados – osinservíveis. Trinta e uma estações de coleta seletiva e reciclagem foram implantadas na cidade no período de1997 a 2000, atendendo atualmente a uma demanda reprimida de setenta estações.

A implantação das Estações de Coleta Seletiva e Reciclagem já demonstrou o potencial de geração de renda quehá na separação dos resíduos sólidos: cerca de 20 pessoas, trabalhadores autônomos ou cooperativados,passaram a cuidar de algumas estações e passaram a tirar seus rendimentos da venda de material reaproveitável,desde móveis ou materiais de construção, até os tradicionais papel, alumínio, vidro e plástico, alem deequipamentos eletrônicos, eletrodomésticos e outros.

Além da geração de renda, as Estações de Coleta Seletiva e Reciclagem estão intimamente ligadas à construçãode uma cidade agradável a partir da qualificação de espaços urbanos até então não tratados pelo Poder Público eque eram objetos do descarte clandestino de pneus, entulhos, podas de árvores e outros materiais de maneirainadequada, com difícil manutenção da limpeza urbana. (fig.03)

Fig.03 – Estação de Coleta Seletiva – situação anterior e após a implantação do serviço.

Nos órgãos da administração municipal deu-se início à coleta seletiva de papel dentro da premissa que permitiuo funcionamento a Usina de Triagem e Reciclagem de Papel (fig.04), que reúne adolescentes em situação devulnerabilidade social, agora, aprendizes na arte de reutilizar e reciclar o papel descartado por diversos tipos degeradores. A participação de oficinas com arte-educadores na Usina de Reciclagem de Papel (fig.05) absorveparte do Programa Andrezinho Cidadão que busca a inserção social de meninos e meninas, a partir doaprendizado de um ofício, de práticas artísticas e ecológicas e do trabalho em grupo. A produção da Usina deTriagem de Papel é vendida para lojas, designers e empresas, gerando renda para os que trabalham com o papel,seja como aprendizes, seja como educadores. O apoio de empresas do setor privado e o trabalho voluntário dearte-recicladores e artistas plásticos da região consolidam e ampliam a perspectiva do programa.

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Fig.04 – Usina de Triagem e Reciclagem de Papel, 1999.

Fig.05 – Cenas do trabalho do arte-reciclador Roberto Gyarf, 2000.

A inserção das práticas de separação de resíduos no cotidiano da população teve início com a implantação doPrograma de Coleta Seletiva nas escolas a partir do envolvimento da comunidade das escolas municipais naseparação de resíduos e reaproveitamento para brinquedos, por meio do Projeto Brincarte (fig.06). Cada EscolaMunicipal de Educação Infantil e Fundamental recebeu contêineres para a deposição de resíduos secos e limpose passou a ser um ponto receptor de recicláveis no bairro, estimulando ainda mais a participação cidadã.

Fig.06 – Atividades do Projeto Brincarte, 1999.

Junto ao trabalho educativo nas escolas municipais (fig.07), foi possível iniciar alguns pilotos de coleta seletivaem condomínios residenciais, restaurantes, hospitais e nos órgãos públicos municipais e estaduais, adesõesespontâneas que se incorporaram ao processo e serviram de exemplo para outras iniciativas.

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Fig.07 – Coleta Seletiva – Escola Municipal de Educação Infantil, 2000.

A educação ambiental se apresenta como uma das ferramentas fundamentais para sensibilizar o cidadão e criaruma nova prática da população no que se refere à redução, reaproveitamento, separação, reciclagem dosresíduos sólidos e, principalmente, inserir no cotidiano e no comportamento do cidadão o conceito destinarseus resíduos sólidos de forma ambientalmente correta, responsável e participativa.

A partir da adesão de outros parceiros e dos excedentes das estações de reciclagem e das escolas, iniciou-se umprocesso de organização social dos trabalhadores autônomos para triagem, reaproveitamento e comercializaçãodos materiais recicláveis. A reunião destes trabalhadores que passaram a realizar a separação e venda dosresíduos é parte integrante de um programa de geração de renda da Secretaria Municipal de DesenvolvimentoEconômico e Geração de Renda – a Incubadora de Cooperativas, apoiado posteriormente pelo Banco do Povo,um programa da mesma secretaria. Este grupo inicial de trabalhadores autônomos deu origem à Cooperativa deReciclagem de Santo André – COOPCICLA. (fig.08)

Fig.08 – Assembléia de fundação da CoopCicla - 1999

A COLETA SELETIVA ATINGE OS BAIRROS

Em maio de 1998, foi dado início ao programa de coleta seletiva porta a porta no bairro Vila Pires. Projetopiloto que permitiu aferir a adesão da população perante a proposta de separar os resíduos gerados. Asensibilização dos moradores foi feita de casa em casa por equipes de monitores, trabalho este que resultou naparticipação da população do bairro considerada até hoje a melhor dentre os diversos bairros da cidade. Pouco apouco, outros bairros foram sendo incorporados ao programa, atingindo cerca de 7% dos domicílios da cidadeaté junho de 1999. A sistemática de coleta de resíduos domiciliares nestes bairros se deu a partir da substituiçãode um dia da coleta regular, que ocorria três vezes por semana, por um dia de coleta de resíduos seletivos. Destaforma a área passou a ter dois dias de coleta de resíduos úmidos e um dia de coleta de resíduos secos. As duascoletas foram realizadas com caminhões compactadores, comumente utilizados nos sistemas de coletatradicionais. Assim, inovou-se na implantação da coleta seletiva na cidade ao integrá-la à coleta regular dando

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suporte aos pontos de entrega voluntária – as estações de coleta seletiva. Este sistema foi apoiado por umacoleta especial feita por um caminhão baú em locais da cidade, não atendidos pelo projeto piloto, onde ocidadão já encontrava-se sensibilizado para a adesão ao programa. Escolas municipais, condomínios, órgãospúblicos, restaurantes e outros estabelecimentos potencializaram a consolidação da proposta.

Os resultados positivos destes pilotos permitiram a ampliação do programa de coleta seletiva porta a porta paratoda a cidade, desta vez, com um aumento da freqüência de coleta, com coleta diária de resíduos úmidos ecoleta de materiais secos duas vezes por semana em horário diverso da coleta de resíduos úmidos criando acoleta diferenciada.

A expansão da coleta foi proposta, então, para ser implementada em duas etapas: a primeira, atingindo cerca de100 mil domicílios da cidade, ou seja, 60% do total dos domicílios, teve início no dia 6 de outubro de 1999.Fundamental para o sucesso do programa foi a campanha de divulgação e conscientização, realizada em grandeescala, em veículos da mídia.

A operação da coleta diferenciada trouxe como novidade a coleta noturna de resíduos úmidos para toda a áreaatendida pelo programa. A coleta de resíduos úmidos passou a ser realizada de segunda a sábado a partir das 18horas e a coleta de resíduos secos – vidros, plásticos, alumínio, papel e outros – duas vezes por semana duranteo dia nos bairros. Na área central, área que tradicionalmente concentra o comércio diversificado da cidade e queatende toda a Região ABC e parte da Zona Leste de São Paulo, a coleta diferenciada passou a ser realizada emdois horários, diariamente no período noturno.

Para atingir este universo foi necessário criar uma estrutura para divulgação, desta vez, uma campanha demassa, que não pôde contar com o tratamento porta-a-porta de campanhas educativas tradicionais. Para tanto,diversos os meios de divulgação foram adotados: de faixa de rua a telemarketing, de distribuição de folhetos àpropaganda em horário nobre na televisão. Todos os recursos usados visaram atingir o maior número possívelde pessoas.

Duas informações precisaram ser transmitidas: a orientação da separação dos resíduos e os novos horários dacoleta. E para atingir cerca de 100 mil domicílios (cerca de 350 mil moradores) lançou-se mão de todos osmeios de divulgação disponíveis e, após uma entrevista coletiva na imprensa, cerca de 200 mil folhetos foramdistribuídos nos bairros. Trinta mil residências receberam ligação de telemarketing com a mensagem dacampanha veiculada com locução da atriz andreense Lucélia Santos. Alem disso out-doors e faixas foramdistribuídos nos principais pontos da cidade. Na semana da implantação, propagandas em rádios e TVs foramlevadas ao ar, chamando a atenção de todos para a novidade. Entrevistas, matérias sobre coleta seletiva ereciclagem e propagandas em jornais e revistas locais foram veiculadas durante todo o mês de outubro de 1999.

Ao mesmo tempo, foi colocada à disposição da população para esclarecimento de dúvidas a Central deInformações do SEMASA, através do telefone gratuito 195, que recebeu cerca de 6.000 solicitações deinformação sobre coleta de resíduos nos últimos três meses de 1999. Os atendentes da Central de Informaçõesdo SEMASA foram preparados para orientar os munícipes sobre procedimentos, dias e horários da coleta deresíduos na cidade.Em abril de 2000, a totalidade dos domicílios foram atingidos pelo programa de coleta seletiva porta a porta,ampliando a abrangência do serviço e possibilitando o acesso de toda a população ao programa. (fig.09)

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Fig.09 – Coleta diferenciada porta a porta (secos e úmidos) com caminhão compactador.

O PROGRAMA DE COLETA COMUNITÁRIA

A coleta diferenciada porta a porta atingiu também os assentamentos habitacionais informais, áreastradicionalmente de difícil acesso para a coleta regular tendo em vista as ruas estreitas e por vezes íngremesdestes núcleos. Para tanto, foi implantado o programa de coleta comunitária, onde moradores dos núcleos,desempregados, foram selecionados para o serviço de coleta porta a porta e triagem do material reciclável paraa venda, dando origem à Cooperativa de Coleta e Limpeza Urbana – a COOPLIMPA.

Um grande desafio para a Administração Municipal é a coleta de resíduos em núcleos habitacionais de difícilacesso (fig.10), particularmente favelas e loteamentos irregulares, onde ruas estreitas e sem saída dificultam oacesso do caminhão de coleta. Em geral, inúmeros pontos e acúmulo de resíduos são encontrados nestesnúcleos habitacionais atraindo insetos, ratos e, conseqüentemente, doenças.

Fig.10 – Núcleo habitacional de difícil acesso.

Realizar a coleta de resíduos domiciliares durante a noite gera sem dúvida, um complicador para a realização dacoleta nos moldes tradicionais: as vielas estreitas e escuras impossibilitam o livre acesso do caminhão pois oscarros dos moradores dos núcleos estão estacionados nas vias durante a noite.

O programa de coleta comunitária veio com o objetivo de facilitar a coleta nestes núcleos, aproveitando otrabalho do morador do núcleo, na coleta diferenciada de resíduos secos(recicláveis) e úmidos. Estes resíduossão levados para caçambas colocadas no exterior do núcleo e coletados por um sistema especial com caminhõescompactadores munidos de guindaste para basculamento das mesmas. Criou-se assim mais uma oportunidadede geração de renda para parcela da população sem acesso ao mercado de trabalho. (fig.12)

Desde os primeiros contatos para a inscrição e seleção dos coletores comunitários nos núcleos, se discutiu opapel do coletor como um agente multiplicador do programa de coleta seletiva dentro de seu núcleo. Suaatuação segue os princípios do trabalho cooperativado, uma vez que os coletores passaram a ser membros deuma nova cooperativa, a COOP CIDADE LIMPA. (fig.11)

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Fig.11 – Curso de formação de cooperados, 1999.

Preliminarmente vinte e oito coletores comunitários foram selecionados para a atuação no programa em suaprimeira fase, atingindo 8 núcleos habitacionais totalizando cerca de 6.300 moradias. Junto com a ampliaçãodo programa de coleta seletiva, o programa de coleta comunitária atingiu outros 16 núcleos, com 8500domicílios, a partir do envolvimento de 74 coletores comunitários, atendendo, assim, cerca de 70% dos núcleoshabitacionais que apresentam problemas com a coleta regular de resíduos.

A coleta no interior do núcleo ocorre sistematicamente e os resíduos depositados em caçambas diferenciadaspara resíduos úmidos e para os secos, promove no interior dos núcleos a melhoria da qualidade ambiental. ACOOPLIMPA ao apropriar-se do material reciclável coletado nos núcleos, possibilita uma maior renda para ostrabalhadores da cooperativa, uma vez que o serviço de coleta é remunerado pela empresa contratada eresponsável pela prestação do serviço.Atualmente, a COOPLIMPA reúne 80 cooperados trabalhando na coleta de resíduos sólidos nos núcleos e 25na triagem e venda de resíduos recicláveis em um galpão cedido pelo SEMASA junto ao Aterro Sanitário deSanto André.

Fig.12 – Coleta Comunitária no Núcleo São Jorge – Santo André, 2000

RESULTADOS DO PROGRAMA

w Reintegração social de menores em situação de vulnerabilidade social, de trabalhadores autônomos emestações de coleta seletiva e 200 trabalhadores autônomos organizados em duas cooperativas;

w Adesão voluntária da população que mensalmente realiza a separação na fonte de cerca de 700 toneladasde resíduos recicláveis por mês encaminhados para as cooperativas em fase de incubação;

w Geração de renda para desempregados, tanto no trabalho das cooperativas como no trabalho informal juntoas estações e nas ruas;

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w Aumento da vida útil do Aterro Sanitário Municipal em 20% (em volume) a partir da remoção de 6% (empeso) de materiais recicláveis que eram destinados ao mesmo;

w Redução de pontos de acumulo de descarte voluntário de resíduos sólidos inservíveis, que em geralocorriam em terrenos abandonados e margens de córregos, a partir da implantação das estações de coletaseletiva e do programa de coleta comunitária, garantindo uma melhoria da qualidade ambiental em toda acidade e redução dos fatores que contribuem para a ocorrência de problemas com as enchentes.

w Melhoria sócio-ambiental em núcleos de favelas com a implantação do programa de coleta comunitária.

w Reconhecimento público do programa a partir de premiações por várias instituições nacionais einternacionais, tais como:

ú Classificado entre as 100 Melhores Práticas do mundo pela ONU/Habitat, em 1998;ú Menção Honrosa no Prêmio Mercocidades na área de Ciência e Tecnologia, em 1998;ú Classificado entre as 20 melhores iniciativas brasileiras pelo Programa Gestão Pública e Cidadania,

promovido pela Fundação Getúlio Vargas e Fundação Ford, no ano de 2000.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. BAILÃO, Cheila Aparecida Gomes. Gestão e Educação Ambiental – Reflexões sobre a questão ambiental esugestões de atividades pedagógicas. Santo André: Ed. Bartira, 1998.

2. CEMPRE, Compromisso Empresarial para a Reciclagem. Cadernos de Reciclagem: 1995,1996,1997.3. FGV, Fundação Getúlio Vargas. Histórias de um Brasil que funciona – Governos locais agudando a

construir um país mais justo. São Paulo: Ed. Imagix, 2000.4. PT, Partido dos Trabalhadores. Diretório Municipal de Santo André. Santo André Programa de Governo

1997/2000, 1996.5. SOUSA, Klinger Luiz de Oliveira – Secretário de Serviços Municipais da PMSA. Pronunciamento na

abertura do Seminário “Santo André Recicla com as Empresas”. 19986. www.santoandre.sp.gov.br/serviços/dados7. www.semasa.sp.gov.br