2011 · dados estatísticos do ministério do interior (home office), e dados da pesquisa...

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A Comunidade Latino-Americana em Londres Cathy McIlwaine e Juan Camilo Cock Versão em português por Yara Evans 2011

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A Comunidade Latino-Americana em LondresCathy McIlwaine e Juan Camilo CockVersão em português por Yara Evans

2011

IntroduçãoEste relatório apresenta os resultados da maisextensa e aprofundada pesquisa já realizada sobrea comunidade latino-americana em Londres,intitulada Não Mais Invisível. Apesar da crescentepresença de latino-americanos na capitalbritânica, e de sua importante contribuiçãoeconômica, social e cultural, a ausência deestudos sobre essa população e, sobretudo, a faltade dados estatísticos específicos tem contribuidopara a sua invisibilidade em registros oficiais. Issoimplica na ausência da comunidade dosprocessos de formulação e implementação depolíticas públicas, tanto ao nível da prefeitura daGrande Londres, quanto de suas 33subprefeituras1.

Não Mais Invisível foi patrocinada pelo Trust forLondon, uma das entidades filantrópicas maisimportantes de Londres, assim como pelo Serviçodos Direitos da Mulher Latino Americana, umaONG que vêm trabalhando junto à comunidade, esobretudo, prestando serviços às mulheres há 28anos. A pesquisa foi realizada pela Doutora CathyMcIlwaine, Juan Camilo Cock e Brian Linneker, doDepartamento de Geografia da Queen Mary,University of London, entre 2009 e 2010.

A pesquisa foi baseada em uma amostragem de1,014 indivíduos de diferentes nacionalidadeslatino americanas, idades e grupos socio-económicos, que participaram de umlevantamento por questionário. O levantamentoobteve 453 questionários aprofundados e 509questionários breves, aos quais se somaram 52

questionários respondidos por integrantes dasegunda geração de imigrantes2.

Os dados qualitativos foram obtidos por meio de50 entrevistas aprofundadas e de quatro gruposfocais. O trabalho de campo, e sobretudo olevantamento por questionário, foi realizado poruma equipe de latino americanos de diversospaíses que tinham acesso à comunidade latino-americana em Londres. Já as entrevistas foramrealizadas pelo Serviço dos Direitos da MulherLatino Americana.

Breve Histórico da PresençaLatino-americana em Londres A despeito da importância histórica dos laçoscomerciais entre a América Latina e o ReinoUnido, foi somente após 1970 que um númeroexpressivo de latino-americanos começou achegar a Londres. A maior parte deste fluxoimigratório era composto por colombianos eequatorianos autorizados a trabalhar em postosnão-qualificados, sobretudo no setor de serviços,em hotéis e restaurantes e na limpeza de prédiospúblicos. Nessa mesma década, outro fluxoimportante foi o de refugiados políticosprovenientes oriundos do Chile, do Uruguay, daArgentina e, em menor escala, da Colômbia.

Na década dos 80, quando já se haviamencerrados tanto o programa de assentamento derefugiados do Cone Sul e a emissão de vistos deautorização para o trabalho não-qualificado, ofluxo imigratório da américa latina estevedominado por estudantes, imigrantes para a

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reunificação familiar e os refugiados, sendo o fluxodos refugiados menor do que na década anterior.Remonta a essa década a formação deorganizações e a realização de projetos de apoio àcomunidade, alguns dos quais mantém-se ematividade até hoje.

O número de imigrantes latino-americanos noReino Unido aumentou expressivamente no finaldos anos 90, sobretudo com a chegada decolômbianos, equatorianos e bolívianos quesolicitavam asilo político e que obtiveramresidência permanente graças ao reconhecimentoda necessidade de sua proteção, assim comotambém iniciativas para a regularização como, porexemplo, a anistia familiar que ocorreu em 2003.A partir de 2000, observa-se um fluxo crescentede brasileiros, que atualmente constituem o maiorgrupo da comunidade latino-americana.

O aumento dos imigrantes latino-americanos foiacompanhado pelo desenvolvimento de umainfraestrutura de serviços e comércio orientada aoconsumo da comunidade, sendo latino-americanos os seus donos e administradores.Assim, por exemplo, há núcleos comerciaisfrequentados por brasileiros em Willesden, nonoroeste da capital, e por latino- americanos emElephant and Castle, no sul, e em Seven Sisters,no leste. Há também uma mídia diversificadadirigida à diferentes nacionalidades dacomunidade latino-americana, e também eventosde grande porte, como o Carnaval del Pueblo,considerado o maior festival latino-americano daEuropa3.

Queen Mary, University of London 3

1 Os estudos realizados anteriormente enfocavam nacionalidades específicas e não a comunidade como um todo, sendo de tamanho reduzido as amostragens das populaçõesestudadas. 2 A definição de ‘latino americano/a’ utilizada nesta pesquisa refere-se à pessoas nascidas nos países de língua castelhana e portuguesa da América do Sul e América Central etambém em Cuba e na República Dominicana. A segunda geração refere-se a latino americanos nascidos no Reino Unido cujo pai ou mãe nasceu na América Latina ou aindacrianças que chegaram ao Reino Unido com menos de sete anos de idade. 3 Em janeiro de 2010, o Latino Times e o Extra atingiram uma tiragem de 12,000 exemplares semanais. O Carnaval del Pueblo acontece desde 1999.

Carnaval em Londres, Foto ©Juan Camilo Cock

Carnaval em Londres, Foto ©Juan Camilo Cock

Qual o perfil da comunidadelatino-americana em Londres? Os latino-americanos em Londres constituem umacomunidade jovem e diversificada, na qual estãorepresentados diferentes grupos étnicos e sócio-economicos. A idade média registrada naamostragem da pesquisa foi de 36 anos, sendoque 63% dos pesquisados tinha entre 20 e 39anos de idade.

A comunidade latino-americana estabeleceu-seem diferente áreas da cidade, havendoconcentrações importantes nos bairros deSouthwark e Lambeth, e concentrações menores

em Newham, Haringey, Islington, Tower Hamlets eHackney. Assim, de modo geral, os latino-americanos residem no cinturão interno deLondres, conhecido como Inner London.

Os latino-americanos em Londres tem alto níveleducacional: 70% dos pesquisados declarou teratingido o nível superior de educação, tendoalguns obtido formação técnica, e 13% formaçãouniversitária ou pós-graduação. A grande maioriaemigrou para Londres devido a falta deoportunidades econômicas nos países de origem.

Embora o nível de emprego na comunidade sejabastante alto (85% dos pesquisados), apenasuma minoria consegue inserir-se no mercado detrabalho exercendo sua própria profissão. A faltade domínio da língua inglesa (apenas um terço daamostragem tem ou conhecimento básico ounenhum) e de oportunidades de ascençãoocupacional leva muitos a exercer atividades nosetor de serviços, em restaurantes, hotéis elimpeza de escritório ou limpeza domiciliar. Assim,em muitos casos, recebem salários baixos, nãogozam de benefício algum nem de direitostrabalhistas. Os latino americanos que chegaramrecentemente tender a ser os que estão emsituação imigratória irregular (não-documentados), e que também reportam altosniveís de exploração no local de trabalho.

Mais de um terço dos latino-americanos vem aLondres com a intenção de permanecertemporariamente ou o tempo suficiente parapoderem trabalhar e poupar. Contudo, o alto custode vida na capital leva ao adiamento, por tempoindefinido, do retorno ao país de origem. Anecessidade de se fazer remessas de dinheiro

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Elephant and Castle, Foto ©Cathy McIlwaine

frequentes para a manutenção da família exigebastante sacrifício, que se evidencia pela longajornada de trabalho, e que diminui o montantenecessário a uma subsistência digna em Londres,uma das cidades mais caras do mundo. Estesacrifício se traduz também na pouca

disponibilidade de tempo para atividades sociais elúdicas, ou para dispender no aprendizado dalíngua inglesa, sendo o conhecimento da línguaum pré-requisito à mobilidade social.

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Mapa da distribuição da população latino-americana em Londres

Quantos latino-americanosmoram e trabalham emLondres? O número dos latino-americanos que vivem emLondres tem sido um tema de grande controvérsiajá que muitos não figuram nos registros oficiais, etambém porque muitos obtiveram a cidadaniabritânica ou a de outros países da comunidadeeuropéia, enquanto uma proporção tambémsignificativa está em situação imigratória irregular4.

Com o objetivo de se obter um quadro abrangenteda comunidade latino-americana em Londres, apesquisa aqui relatada baseou-se também emtriangulação e análise detalhada de dadosproveniente de diversas fontes5. Tal exercícioproduziu as seguintes estimativas para trêssegmentos da população:

• Os nascidos na América Latina que vivem noReino Unido: 79, 300 (ano 2008)

• Latino-americanos em situação imigratóriairregular: 17,100 (excluindo-se os nascidos noReino Unido)

• geração de latino-americanos: 17,200

A soma destes três segmentos revela a presençade 186,500 latino-americanos no Reino Unido,dos quais 113,500 residem em Londres (61%).Tal número permite afirmar que a comunidadelatino-americana em Londres é de tamanho

expressivo, sendo numericamente comparável aoutros grupos de imigrantes como, por exemplo,os poloneses, que em 2009 totalizavam 122,000indivíduos.

O que motiva a emigração?“Eu trabalhava como professora seis dias nasemana, saindo de casa às 6 da manhã e voltandoàs 11 da noite, incluindo o sábado, que era um dialongo e árduo. Em todos os colégios onde eutrabalhava só me pagavam o sálariominímo…Então pensei: com minha capacidadeposso aspirar a um trabalho digno, viver bem enão ter que andar implorando por cartas derecomendação”. Viviana, colombiana, 47 anos

Mais de 40% dos pesquisados reportou a falta deoportunidades econômicas e profissionais como aprincipal razão que os levou a deixar seu país deorigem. Esse motivo foi citado por 57% dosbrasileiros. Pouco mais de um quinto daamostragem deixou a América Latina em busca deoportunidades educacionais, como aprender oinglês, ou ainda fazer cursos de nível superior.Cerca de 16% indicaram razões de cunho familiarou social para emigrar.

Muitos dos entrevistados explicaram que suaimigração resultou de uma combinação defatores. Adriana (colombiana, 58 anos), porexemplo, deixou seu trabalho como caixa naColômbia e chegou a Londres com umaautorização de trabalho. O motivo imediato da

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4 Esta definição refere-se a pessoas que não tem autorização para residir e/ou trabalhar no país, muito embora tenham entrado legalmente. 5 As fontes utilizadas foram: Pesquisa Internacional de Passageiros (International Passenger Survey), as requisições do número de seguridade social (National Insurance Number),dados estatísticos do Ministério do Interior (Home Office), e dados da Pesquisa Populacional Anual (Annual Population Survey) e da Secretaria da Estatística Nacional (Office forNational Statistics).

viagem foi superar a depressão que sofria desde amorte de seu pai, mas sua saída foi possibilitadapelo fato de ter obtido uma autorização de trabalhoe passagem aérea, que foram obtidos comempréstimo feito por sua mãe. Para Adriana, vir aLondres representou uma oportunidade deaumentar seu nível de renda. Assim, a motivaçãoeconômica, incluindo-se os casos em que ospesquisados também mencionaram outrasrazões, ficou em evidência em muitas dasentrevistas. A proporção de indivíduos queemigraram por razões politicas é a menor daamostragem (7%), compreendendo em suamaioria chilenos, colombianos e equatorianos.

Porque Londres? “Aquí não tem preconceito, as pessoas tem amente aberta, falam sobre qualquer assunto, éfácil conhecer pessoas cultas, com quem se podecomunicar, as pessoas não reparam em coisaspequenas, tipo, se voce trocou ou não de roupa,se está casado ou é gay, as pessoas não terespeitam só por ter dinheiro ou porsuperficialidades”Guilherme, Brasil, 39 anos

Cerca de 40% dos entrevistados afirmaram que aescolha de Londres como destino foi baseada napresença de amigos e familiares no Reino Unido.Esse contatos prévios são importantes comofontes de informação, acomodação e acesso atrabalho. As razões econômicas e socias quemotivaram tal escolha combinam-se, porém, aoutas razões. Assim, algumas pessoas escolheramLondres por considerá-la uma cidade tolerantecom relação às minorias ou também um centrocultural importante.

Mais de um terço dos entrevistados já tinham tidoum experiência prévia de imigração antes dechegarem ao Reino Unido e, destes, 38% haviamvivido na Espanha, compreendendo esse o paísmais citado na amostragem. Cerca de três quartosdos equatorianos e metade dos colombianos quehaviam residido em outro país reportaram teremvivido na Espanha. Já os brasileiros tendem a viverem Portugal (38%) ou Itália (18%) antes de semudarem para Londres.

De todos os que haviam residido em outro paísanteriormente, uma grande parte havia adquiridocidadania de um país da comunidade européia,obtida na maioria dos casos por meio danaturalização ou de programas de regularização.

A migração de latino-americanos da Espanha aoReino Unido tem crescido desde o início da criseeconômica global em 2008. A percepção de umamaior disponibilidade de trabalho melhorremunerado foi uma das principias razões amotivar os latino-americanos residentes naEspanha a se mudaram para Londres.

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Cali, Colombia, Foto ©Juan Camilo Cock

Como os latino-americanoschegam a Londres e como seestabelecem?Cerca de 65% dos latino-americanospesquisados entrararam no Reino Unido comosolteiros ou desacompañados, sendo que 60%das mulheres emigraram desacompanhadas,representando uma proporção muito maior do quea de mulheres de outras comunidades deimigrantes. Quatro de cada dez imigrantesreportaram terem contraído dívidas com familiaresou instituições financieras para poderem financiarsua empreitada migratória.

A esmagadora maioria dos pesquisados entrou noReino Unido com documentação válida, incluindoos dois terços que foram admitidos inicialmentecom vistos temporários. Um quinto dospesquisados foi admitido com documentação que

concedia o direito de permanência no ReinoUnido, tal como o passaporte de países dacomunidade européia. Cerca de 9% entrou noReino Unido com autorização de trabalho ou vistode dependente, o que permite a residênciapermanente após um certo período de tempo. Onúmero dos solicitantes de asilo tem diminuídoconsideravelmente, de 17% na década de 90, a6% em anos posteriores. Apenas uma pequenaminoria entrou no país sem documentação válida.

Uma alta proporção (70%) dos pesquisados temhoje um status imigratório diferente do que tinhamao serem admitidos ao Reino Unido, mas a maiorparte dos latino-americanos residentes emLondres porta documentação imigratória válida(ou seja, estão autorizados a viver e/ou trabalharno país). Assim, um quarto dos pesquisadospossui passaporte britânico, e um quinto possuepassaporte de um dos países da comunidadeeuropéia, sobretudo Espanha, Portugal e Itália.Cerca de 12% obtiveram o direito a residênciapermanente, ou por meio de permissão a estadiasem limite ou estadia excepcional.

Contudo, um quinto da amostragem,compreendendo imigrantes que chegaram ao paísmais recentemente, está em situação imigratóriairregular, embora 93% destes tenham entrado nopaís com visto de turista ou de estudante. Orestante declarou possuir um visto válido à épocada pesquisa.

Observam-se também variações no modo deadmissão ao país de acordo com o país de origem.Assim, por exemplo, três quartos dos bolivianosforam admitidos ao país com visto de estudantes,ao passo que muitos dos brasileiros e

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Agência de transferência, Foto ©Juan Camilo Cock

equatorianos haviam entrado no Reino Unido compassaporte europeu.

Os colombianos e peruanos constituem a maioriados que possuem passaporte britânico, enquantoos bolivianos tendem a possuir visto de estudante.Assim, tais resultados refletem as diferentes viasde admissão ao país, assim como o tempo deestada de acordo com a nacionalidade. Mesmoassim, observam-se algumas diferentas quanto aogênero: as mulheres, mais do que os homenstendem a estar em situação imigratória irregular.

Como se inserem os latinos-americanos no mercado detrabalho londrino?A grande maioria dos latino-americanos que vivemem Londres são economicamente ativos. A taxa deemprego dos pesquisados é bastante alta (85%),sendo muito superior à de outros grupos deimigrantes residentes na capital britânica (55%),assim como à dos londrinos como um todo (61%).

Os latino-americanos encontram-se inserido emdiversos setores de atividade econômica, porémquase a metade dos pesquisados (47%)concentra-se em atividades do setor conhecidocomo básico, compreendendo postos detrabalhos de baixa-qualificação e de baixa renda.Dentre os mais comuns destacam-se os quefazem serviços de limpeza e trabalhos domésticos,e também os assistentes de cozinha, porteiros,camareiros e garçons, e guardas de segurança.Esta concentração no setor de serviços é mais altado que a observada em outros groupos deimigrantes (17%) e também no resto dapopulação londrina (14%).

Um quinto dos latino-americanos pesquisadosreportou trabalhar em postos administrativos, oucomo profissionais em ocupações tais comobanqueiros, arquitetos, dentistas, contadores,engenheiros e professores. Contudo, há muitomenos latino-americanos exercendo essasatividades em comparação à população imigrantecomo um todo, assim como a população londrinaem geral.

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Agência de transferência, Foto ©Yara Evans

Em termos da distribuição nas atividadeseconônomicas segundo a nacinalidade, osbolivianos (57%) e os brasileiros (55%) tendem aempregarem-se em atividades básicas. De modogeral, os bolivianos são os que menos ocupampostos administrativos ou exercem atividadesprofissionais, em contraste a quase um terço dosperuanos. Cerca de 15% dos latino-americanosna amostragem exercem atividades técnicas,profissionais ou ainda cargos de gerência, mas nocaso dos argentinos, um grupo minoritário naamostragem, grande parte exerce atividadesprofissionais (60%).

Em termos de atividade econômica segundo ogênero, tanto as mulheres quanto os homenstendem a exercer atividades básicas. Contudo,quando se considera os serviços de assistênciapessoal, as mulheres tendem a predominar nosserviços de baixa-qualificação (62%), emcontraste aos homens (50%). Não há, porémdiferenças significativas entre homens e mulheresno que diz respeito aos escalões mais altos domercado de trabalho, onde proporçõesaproximadas de homens e mulheres exercematividades profissionais ou cargos de gerência.

Cerca de 10% dos pesquisados reportou seremdonos de negócio, que em sua maioria prestamserviços ou produtos à própria comunidade latino-americana. Deste grupo, cerca de 40% sãoproprietários de estabelecimento comercial depequeno porte, enquanto 11% são trabalhadoresautonômos, prestando serviços de encanamento,eletricidade ou serviços pessoais como, por exemplo,manicure. Grosso modo, os colombianos e osperuanos tendem a ser donos de negócio, enquantoos homens predominam como donos de negócios.

Que desafios enfrentam oslatino-americanos emLondres? De cada cinco latino-americanos, um não usufruede direitos trabalhistas

Cerca de 22% dos latino-americanos pesquisadostrabalham na informalidade, ou seja, sem aproteção de um contrato escrito. Isto se deve em

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Restaurante, Willesden Junction, Foto ©Yara Evans

Açougues, Brixton, Foto ©Juan Camilo Cock

parte à situação imigratória já que 60% dosimigrantes irregulares exercem atividade informal.Tal informalidade implica a negação dos direitostrabalhistas vigentes no Reino Unido, tais como olicença sáude, férias anuais remuneradas, elicença maternidade. Além disso, os que seencontram nessa situação de informalidadecorrem o risco de serem despedidos sem avisopréviso.

Cerca de 75% dos latino-americanos pesquisadospagam imposto e contribuem para a seguridadesocial. Contudo, um quarto da amostragem nãopagam nem impostos nem a seguridade socialporque recebem seu salário em dinheiro6. Destegrupo, mais de 44% são pessoas cuja situaçãoimigratória não se encontra resolvida, embora hajatambém imigrantes não-documentados que temimposto e seguridade descontados de seu sálariomas que estão impedidos de usufruir de qualquerbenefício devido à irregularidade. Este é, porexemplo, o caso de Víctor (equatoriano, 29 anos),que pagou trezentas libras para obter o número deseguridade social (Nacional Insurance Number)em seu nome e com sua data de nascimento, oque lhe permite trabalhar como faxineiro deescritório para vários empregadores quedescontam de seu sálario as contribuiçõesdevidas à seguridade social.

Na maioria dos casos, o status ocupacional doslatino-americanos sofre queda

“Não estou contente, limpar não é minhaprofissão. Eu era professor, algo muito diferente,mas vim para cá para ganhar dinheiro. Qualquercoisa serve, e mesmo que o trabalho sejadesagradável, pelo menos serve para ajudar aalcançar os objetivos ou para economizar emandar algo para a Colômbia”Pancho, colombiano, 45 anos

Mais da metade dos latino-americanos queparticiparam da pesquisa se identificou comomembro da classe trabalhadora ou classe médiabaixa (55%). Os brasileiros (46%), sobretudo,consideram-se como integrantes da classetrabalhadora. Cerca de 37% dos pesquisadosdeclararam pertencer a classe média7. Muitostambém observaram que seu status social eramais alto em seu país de origem. Mais da metadeda amostragem (52%) observou uma queda nostatus social em Londres relativo ao status quetinham no país de origem. Apenas uma minoriainexpressiva (6%) reportou ter melhorado seustatus social em Londres.

Apenas uma parcela muito pequena dospesquisados (menos de 5%) reportou exerceratividades básicas no país de origem, emcontraste com os 70% que declararam exercertais atividades em Londres, pelo menosinicialmente. Contudo, após certo período de

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6 O desconto do imposto e das contribuições à seguridade social sálario é de total responsabilidade do empregador. 7 É provavél que o conceito de classe média utilizado pelos pesquisados se baseie em definições utilizadas na América Latina, quediferem significativamente daquele utilizado no Reino Unido.

tempo, uma proporção importante conseguedeixar tais atividades. De fato, à época dapesquisa somente 40% dos pesquisados exerciaatividades básicas. Tal movimento de ascenção seobserva também nos extremo superior domercado de trabalho, visto que dos 36% quetrabalhavam em postos administrativos ouexerciam atividades profissionais no país deorigem, cerca de 17% reportaram teremascendido socialmente em Londres.

A independência econômica foi ressaltada comoum dos aspectos chaves na melhoria do nível devida das mulheres. Esse é o caso de Rosa Maria(boliviana, 48 anos), a quem o trabalho de limpezaem Londres faz sentir-se mais valorizada comopessoa, uma vez que sua renda lhe permite ajudaros filhos, o que não tinha condições de fazer naBolívia.

Embora a queda no status social afete tanto oshomens quanto as mulheres, os homens semostram mais relutantes em exercer atividadesconsideradas como femininas, tais como alimpeza e serviços em restaurantes. Assim, por

exemplo, Patricio (peruano, 44 anos) comentouque era técnico agropecuário em seu país, quedeixou em 1992 para vir a Londres. No início, faziaserviços de limpeza, e depois passou a lavarpratos em um restaurante até que, finalmente,conseguiu trabalho como taxista, que considerava‘mais adequado para um homem’.

Algumas mulheres comentaram que os homensse sentem afetados pela perda de poder nomercado de trabalho, o que está ligadodiretamente à intensificação de conflitos entrecasais que, em alguns casos, desencadeiam aviolência doméstica. Ana María (boliviana, 43anos) trabalhara como jornalista na Bolívia, aopasso que seu marido trabalhara para o governolocal. Ana explicou que seus problemas conjugaispioraram ao virem para Londres. Como ela, seumarido teve que trabalhar em limpeza, o quedetestava fazer, referindo-se a essa atividadecomo ‘para mulheres’, mas também queixava-sedo fato de sua esposa trabalhar fora.

A mobilidade ocupacional é possível, embora sejarestrita

Para algumas pessoas que no início da estada emLondres trabalharam na limpeza foi possívelmudar de ocupação. Contudo, não é comum aoslatino-americanos voltarem a exercer as atividadespara as quais se capacitaram em seu país deorigem. Luciana (brasileira, 39 anos), quetrabalhava como analista de sistemas no Brasil,chegou a Londres em 2004, após viver um ano naItália e um ano em Portugal. Porém, nãoconseguiu serviço a não ser na limpeza, estando

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Foto ©Juan Camilo Cock

insatisfeita tanto com os horários de trabalho, quese mostravam incompatíveis com uma vida social,quanto com a baixa remuneração. Após um ano,seu conhecimento do inglês melhorou o suficientepara permitir-lhe obter trabalho como garçonete,embora não fosse a atividade que exercera noBrasil, embora fosse melhor do fazer limpeza.

Alguns dos casos de sucesso profissional sedevem à transferência de profissionais a Londrespor suas companhias como é o caso, por exemplo,do colombiano promovido ao cargo de vice-presidente de um banco de prestígiointernacional. Mas o caso de Alonso (colombiano,48 anos) representa uma outra trajetória demobilidade, aberta pelo menos a uma minoria delatino-americanos. Alonso era proprietário de umpequeno negócio de venda de pinturas naColômbia. Ao vir para Londres em 1998,empregou-se na limpeza mas após seis anosnessa atividade, decidiu tornar-se autônomo,investindo sua poupança na compra de umnegócio de amigos, em Elephant and Castle. A seuentender ‘aquí, é fácil ganhar dinheiro e há muitasoportunidades que não existem em nossos países;na Colômbia, depois dos 30 anos de idade voce éconsiderado um velho’.

Os latino americanos trabalham jornadas longas efragmentadas

“Se voce quer poupar, tem que trabalhar mais de12 ou 14 horas por dia, ou até 16. Senão nãosobra nada depois de pagar o aluguel, transporte,contas, fora todo o resto!”Miriam, 37 anos, Equador

Os latino-americanos pesquisados trabalham emmédia 38 hora semanais. Dois terços daamostragem trabalham mais de 35 horassemanais, a jornada que constitue o períodointegral no Reino Unido. Quase um quartotrabalha acima de 40 horas semanais e cerca de14% trabalha mais de 48 horas semanais (ajornada máxima estebelecida pela DiretrizEuropéia do Tempo de Trabalho). Os brasileirossão os que mais trabalham acima de 48 horassemanais (17.5%). De modo geral, os homens(19%) trabalham jornadas mais longas do que asmulheres (9%).

Do mesmo modo, mais de um terço daamostragem trabalha meio periodo em diferentesatividades (menos de 35 horas semanais em cadaatividade), o que implica uma jornadafragmentada, sobretudo para os que trabalhamem serviços de assistência pessoal ou em serviçosbásicos, em sua maioria, mulheres. Os brasileirostendem mais a trabalhar meio período do quegrupos de outras nacionalidades, não por escolha,mas porque trabalham em limpeza e em

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Loja, Elephant and Castle, Foto ©Cathy McIlwaine

restaurantes, onde as horas de trabalho includemo período da madrugada, assim como o final detarde e a noite. Algo semelhante ocorre comatividades que envolvem cuidar de pessoas, quequase sempre são de meio período e de baixaremuneração. Wilson (equatoriano, 47 anos)trabalhara como policial no Equador, mudando-separa a Espanha, onde viveu 19 anos, trabalhandocomo soldador e na construção de ruas. Aomudar-se para Londres em 2008, trabalhou naúnica atividade que consegui encontrar, alimpeza. À época da entrevista, Wilson tinha trêstrabalhos de limpeza, um das 4 às 7 da manhã,outro de período integral, das 9 às 5 da tarde, eainda outro das 7 às 10 da noite, cada um comuma companhia diferente. Wilson explicou quelevava até uma hora para ir de ônibus de umtrabalho ao outro, embora aproveitasse o tempode viagem para dormir.

Os latino-americanos recebem, em média,salários acima do salário minímo embora osmesmos sejam menor do que o necessário paralevar uma vida digna em Londres

Os latino-americanos ganham em média £7,07por hora, que à época do estudo era superior aosalário mínimo britânico (£5,73 por hora).Contudo, esse valor é inferior ao salário dignovigente no período da pesquisa (£7,60 por hora),que é o valor necessário em Londres para retiraras pessoas da pobreza. Somente 44% dos latino-americanos recebem acima do salário digno. Apesquisa revelou também que há latino-

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Associação de Latino-Americanos Os Trabalhadores, Foto©Juan Camilo Cock

Restaurante Brasileiro, Foto ©Yara Evans

americanos recebendo abaixo do salário minímo.Este é o caso de Eugenia (boliviana, 29 anos), quetrabalha em uma agência de remessa de dinheiroe recebe apenas £3,80 por hora.

Embora, a mediana do salário para homens e paramulheres seja o mesmo (£7 por hora), asmulheres (11%) mais do que os homens (6%)tendem a receber salários abaixo do saláriomínimo. Comumente, os que trabalham ematividades básicas, como em vendas e serviços aoconsumidor, recebem os salários mais baixos, emmédia £6,50 por hora. Já os que trabalham empostos de alta qualificação recebem uma médiade £15 por hora. Os brasileiros e os bolivianos sãoos que recebem os salários mais baixos.

A exploração no local de trabalho é umaexperiência comum entre os latino-americanos

“…. No hotel nos ofereciam mais horas detrabalho para fazer uma faxina pesada… [umavez] quando terminei, havia trabalhado parareceber entre £1,000 e £1,500 mas quando mederam o recibo, vi que só me pagaram £600.Alarmada, fui reclamar com o gerente, umcolombiano, mas não pude recuperar a diferença.Os que não tinham documentação perderam maisde £1,000. Yaneth, Colombia, 33 anos

Cerca de dois quintos da amostragem declararamter tido problemas no local de trabalho. Destegrupo, mais da metade queixou-se de não terrecebido pagamento pelo trabalho realizado, emais de um terço sofreu abuso verbal ao exigir opagamento. Um terço também declarou estardescontente por não ter recebido pagamentopelas horas extras trabalhadas. A pesquisarevelou, ainda, exploração pelos própriosempregadores latino-americanos ou seus agentes.

As queixas por maltrato são muito comuns,observando-se uma correlação entre a situaçãoimigratória e o trato no local de trabalho, sendo osestudantes e os não-documentados os que maisreportaram terem tido problemas.

Os imigrantes sem documentação válidaenfrentam crescentes problemas, sobretudoporque as leis de imigração tem se tornado maisestritas e os empregadores estão sob grandepressão para verificar a validade dadocumentação de seus empregados. Emconsequência, muitos dos pesquisadosreportaram terem perdido o emprego.

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Carnaval em Londres, Foto ©Cathy McIlwaine

Até mesmo os latino-amerianos que exerciamatividades profissionais comentaram ter enfretadosituações de desvantagem. Assim, José(venezuelano, 37 anos), um economista que égerente de logística em uma multinacionalobservou que, a pesar de possuir passaportebritânico, sempre se sentiu excluído no local detrabalho: ‘voce nunca vai se sentir bem notrabalho porque os ingleses olham para voce deum jeito diferente. Eles te excluem de seus grupossociais, embora isso seja útil no trabalho. Talveznão seja intencional, mas voces sente… eu mesinto discriminado apesar de ser um profissionalqualificado’.

A crise financiera tem exacerbado problemaseconômicos

“A construção foi afetada assim como as firmas dearquitetura. Os investidores e os grandes projetosforam suspensos e eles deixaram de contratar.Infelizmente, terminamos um trabalho na Escócia,e com o cancelamento de outros projetos, o diretorda companhia não pode mais renovar o meucontrato’.Danilo, Colombia, 32 anos

Embora a crise financiera tenha afetado a todosem Londres, a pesquisa revelou os efeitosespecíficos sentidos por diferentes grupos deimigrantes. Apesar de haver trabalho disponível,existe a percepção entre os pesquisados de que aexploração nos setores de limpeza e restaurantevem aumentando. Não obstante, a perda doemprego também se manifesta entre osprofissionais. Essa foi a experiência de Danilo

(colombiano, 32 anos) que havia obtido o visto deimigrante altamente qualificado (Highly SkilledMigrant Programme) e trabalhava para uma firmade arquitetos, sendo posteriormente despedido.

A crise financeira afetou também a imigraçãoentre países europeus. Várias organizações latino-americanas sediadas em Londres reportaram umaumento expressivo no número de pessoas queresidiam na Espanha e que procuravam agora osserviços de orientação e aconselhamento parapoderem se estabelecer no Reino Unido, o que sedebe ao fato de que os efeitos da crise se fizeramsentir muito mais acentuadamente naquele país.Igualmente, a pesquisa revela que a remessa dedinheiro ou produtos aos países de origem vem sereduzindo, quando não suspendida por completo.Contudo, apesar das dificuldades em Londres,nenhum dos pesquisados tinha planos de voltarao país de origem, visto acreditarem que a criseafetará ainda mais a América Latina.

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Como é o dia-a-dia emLondres? Os latino-americanos tendem morar em unidadesdomiciliares extensas

A amostragem revelou uma média de 3 pessoaspor unidade domiciliar, embora em alguns casoshaja 11 pessoas por domicílio. Essa média ésuperior à média do Reino Unido, que em 2008era de 2.4.

Pouco mais de um quinto da amostragem (22%)representa domicílios composto de um casal comfilhos, enquanto outro quinto (21%) representadomicílios de casais sem filhos. E ainda outroquinto (20%) dos pesquisados declarou viver só,enquanto 11% comprendía domicílios onde umadulto toma conta dos filhos. O adulto nesseúltimo grupo é na grande maioria uma mulher,embora haja homens morando somente com seusfilhos. Apenas uma pessoa declarou estar vivendocomo casal do mesmo sexo em um domicílio, masé provavél que haja mais casos assim.

A acomodação é inadequada

Segundo a pesquisa, 45% dos latino-americanosnão estão contentes com a qualidade daacomodação onde vivem, incluindo pessoas queexercem atividades profissionais e cargos degerência, o que sugere ser a baixa qualidade daacomodação um problema generalizado.

Mais de 40% dos latino-americanos vivem emacomodação alugada, enquanto um quinto viveem acomodação sub-alugada. A acomodaçãoalugada de particular é mais comum entre osrécem-chegados ao Reino Unido. Neste grupopredominam os não-documentados, que tendema receber salários baixos. Os brasileiros são os quemais tendem a viver neste tipo de acomodação(81%), bem como os imigrantes não-documentados (93%) que são os que maistendem a viver em acomodação sub-alugada,dadas as dificuldades em alugar um imóvel emseu próprio nome.

Os latino-americanos tem acesso limitado aosistema de habitação pública (incluindo-sepropriedades da prefeitura e de associações), eapenas 16% reportaram estarem morando nessetipo de acomodação. Essa é uma proporçãomenor do que a proporção para Londres como umtodo (24%), e explica-se, em alguns casos, pelofato da situação imigratória não permitir acesso a

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Southwark, Foto ©Juan Camilo Cock

este tipo de assitência, além do que tem havidoum declínio no número de unidades disponíveisnas últimas décadas. Os grupos de latino-americanos que possuem o passaporte britâncio,como os equatorianos (25%) e os colombianos(24%), são os que mais tendem a residir emhabitação do governo. E as mulheres (22%), maisdo que os homens (8%), residem em habitação dogoverno, o que se deve ao fato de elas, em geral,serem as responsaveís pelos filhos e o estado lhesdar prioridade a ter filhos menores de idade sobseus cuidados.

A proporção dos que são proprietários de suaacomodação na amostragem é baixa, cerca de14%, proporção que é tres vezes menor que amédia para Londres. A possibilidade de serproprietário está relacionada à possessão dacidadania britânica (82%) e ao tipo de atividadeeconômica exercida. De todos os grupos latino-americanos, os peruanos são os que mais sãoproprietários.

Os latino-americanos dividem acomodação,vivenciando superlotação

Um terço dos latino-americanos pesquisadosdivide acomodação com outras famílias (emmédia, duas famílias). A superlotação constitui umdos problemas mais sérios vivenciados pelacomunidade, e embora apenas 15% daamostragem tenha identificado esse problemaexplicitamente, os dados sugerem uma proporçãomuito maior. Isto porque, apesar das pessoasafirmarem viver só por não ter obrigações comoutros no mesmo domicílio, na verdade dividem oquarto com outras pessoas, e às vezes até a salade estar é utilizada como quarto, o que indicasuperlotação.

Marisol (boliviana, 37 anos), chegou em Londresem 2003 em busca de uma vida melhor para seusfilhos. Ao separar-se do marido, foi morar emSouthwark, divindo uma casa com outras quatrofamílias. No seu domicílio não há sala, cadafamília ocupa um quarto e tem que dividir umbanheiro. Ela paga £50 por semana de alugel.

De qualquer modo, mesmo a proporção de 15% éalta para Londres, onde o índice médio desuperlotação é de 6.8%. Sem dúvida, tal situaçãoestá relacionada aos baixos salários. Dos quedividem acomodação, mais da metade tem rendainferior a £1,000 mensais. A pesquisa revelou queos bolivianos são os que mais tendem a dividiracomodação com outras famílias. Em termos degênero, os homens (60%) tendem mais a dividircom outras famílias do que as mulheres (40%),assim como esteram em condições de

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Foto ©Cathy McIlwaine

superlotação. Por exemplo, Wilson (equatoriano,47 anos) mora em um pequeno apartamento comcopa e cozinha, que divide com outras seispessoas, dividindo seu quarto com umconterrâneo. Cada um dos moradores paga £60por semana de aluguel.

Cerca de 40% dos imigrantes não-documentados,assim como as pessoas que exercem atividadesbásicas (53%), moram em acomodação deocupação múltipla, enquanto os que já estão hámais tempo no Reino Unido vivem em unidadefamiliar, compreendendo casal e filhos. Mais dametade destes chegou ao Reino Unido antes de1999.

Os equatorianos, em geral, vivem somente comsuas famílias (26.5%), assim como os quepossuem passaporte britânico ou os que tem vistode residência no Reino Unido (38%). Essesdomicílios de unidade familiar compreendemindivíduos que recebem salários mais altos, acimade £2,000 por mes. Os latino-americanos quechegaram a Londres a partir de 2000 constituem amaioria dos que dividem acomodação (81%),assim como a maioria dos que vivem só (77%).

As relações de gênero mudam, mas nem tanto

“Éle ficou pior em Londres porque trabalhava anoite toda e eu trabalhava durante o dia. Quasenão nos víamos, e ele começou a ficar com ciúmese acabou ficando violento, me batendodiariamente por causa de suas suspeitas eciúmes. Ele detestava seu trabalho e também ofato de que nós dois fazíamos o mesmo tipo detrabalho” Ana María, boliviana, 43 anos

Dois quintos dos latino-americanos naamostragem são casados, um terço é são solteiros,11% são divorciados, 7% co-habitam e 3% sãoviúvos. Há mais mulheres (43%) casadas do quehomens (38%). Um quarto dos pesquisados écasado com cônjuge de nacionalidade diferente desua própria. Mesmo quando a nacionalidade édiferente da do país de origem, dos que estãocasados com alguém de nacionalidade diferenteda própria, 22% são casados com britânicos oucom cidadãos da União Européia.

Segundo a amostragem, as relações entre homense mulheres, assim como a forma de pensar doslatino-americanos, tem mudado com aexperiência de morar fora de seu país. Alguns dospesquisados ressaltaram que os homensparticipam mais das tarefas domésticas do queantes, o que pode resultar do fato de que seustrabalhos e os de suas cônjuges são de longajornada, exigindo assim sua participação nastarefas domésticas. Conforme observa Maya(colombiana, 38 anos), “aquí os dois tem quecolaborar no lar. Ele nunca me ajudava naColombia, sequer lavava um prato, mas aqui nãotem alternativa. Mas não acho que ele tenhamudado sua forma de pensar”.

Assim, a mudança nas práticas relativas a divisãosexual do trabalho não implica necessariamenteem mudança de mentalidade. Em um grupo focal,por exemplo, uma participante afirmou “a maioriados homens é machista, não importa ondemorem; as oportunidades tem mudado e aqui asmulheres são mais independentes, as mulheresmudam e os homens também, mas os homens ofazem porque tem que fazer, não porquemudaram sua mentalidade’.

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Existem também a percepção de que as mulheresque estão em situação migratória regularizada etem acesso a serviços públios tem mais direitos noReino Unido são protegidas pelo governo. Angela(colombiana, 42 anos) comenta “na Colômbia, seo marido bate na mulher, ela não tem direitos, masaquí ela tem, e os homens tem medo de agredi-lasporque sabe que elas tem proteção”.

Contudo, muitas mulheres encontram-se em altograu de vulnerabilidade. São elas as que estão emsituação imigratória irregular, as que sãodependentes do cônjuge, as que possuem apenasum visto temporário, e ainda, as que nãodominam o idioma. Impossibilitadas de pedirsocorro à polícia ou recorrer a serviços públicos deapoio, devido ao medo ou falta de informação, elassão mais susceptíveis de serem exploradas nolocal de trabalho e sofrer violência doméstica. Defato, muitas das mulheres pesquisadas nãoestavam informadas sobre seus directos, nemsentiam-se confiantes de reportar abusos e crimesà polícia, sobretudo os relacionados à violênciadoméstica.

A remessa é uma prática generalizada entre oslatino-americanos

Os latino-americanos remetem um média de£2,000 por ano a seus países de origem. Quasedois terços (64%) envia dinheiro ou presentes àsua família. Apenas um quinto envia menos que£500 por ano, enquanto mais de um terço enviaacima de £3,000 por ano. Um de cada cinco enviamais de £5,000 anualmente.

Ainda, os latino-americanos enviam em média12% de sua renda em dinheiro. Mas tambémpoupam cerca de 23% de sua renda semanal,parte da qual será remetida posteriormente. Osbrasileiros são os que mais fazem remessas,enviando em torno de 24% de sua renda. E oshomens enviam mais dinheiro do que asmulheres: pouco mais de um quarto dos homensremete mais de £5,000 ao ano, comparado a 13%das mulheres. Por exemplo, Jacó (brasileiro, 32anos), que chegou em Londres em 2005, temuma conta bancária no Brasil, para a qual envia£200 todo mes, com o objetivo de comprar umacasa em sua terra natal.

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Agência de transferência, Foto ©Cathy McIlwaine

Em geral, os latino-americanos que chegarammais recentemente ao Reino Unido possuemconta bancária em seus países de origem,enquanto apenas um de cada cinco dos quechegaram antes de 1989 tem conta bancária emseu pais de origem. Mas o tempo de estada emgeral não condiciona o envio de dinheiro. Assim, aproporção dos que fazem remessas é um poucosó mais mais alta entre os que chegaram nos anos80 (67%) do que os que chegaram nos anos 90(64%). Há, porém, variações relacionadas aatividade econômica, os profissionais ou os queexercem cargo de gerência, por exemplo, tendema enviar uma proporção menor de seus salários.

Os latino-americanos que recebem salários baixosfazem grande sacrificios econômicos para poderenviar dinheiro para suas familias no país deorigem. Jesús (boliviano, 47 anos), por exemplo,chegou em Londres em 2003 e, desde então, suasituação imigratória tem sido irregular na maiorparte do tempo. Sua esposa, seu pai e seus cincofilhos moram todos na Bolívia e dependem delepara sobreviver. No ano anterior a pesquisa, elehavia enviado um total de £12,000 a sua família.

Cerca de 60% do montante enviado é utilizado namanuntenção da família, o que demonstra aimportâcia das remessas para muitos lugares naAmérica Latina. As remessas feitas são tambémutilizadas na educação de membros da famíliaassim como na construção de casas (um quintoda amostragem em cada caso). Os profissionais(40%) são menos propensos a enviar dinheiropara gastos familiares do que os trabalhadores ematividades básicas (67%), e tendem a enviardinheiro para construção (26%) e educação (9%).

Há pouca evidência de que exista um sistemageneralizado de remessas coletivas. São raros oscasos como o de Jaime (boliviano, 57 anos), quecriou uma organização juntamente com outrosdez colegas para arrecadar e enviar fundos para acompra de alimentos e a construção de uma igrejaem uma comunidade pobre.

A comunidade utiliza diferentes estratégias paralidar com a adversidade econômica

Embora muito dos que recebem salários baixos etem responsabilidades financeiras tanto emLondres quando no país de origem, nem todos oslatino-americanos que tem direito a benefícios doestado os requisitam.

Apenas um de cada cinco latino-americanosrecebe alguna forma de subsídio do governo, umaproporção que é bem menor do que a proporçãopara a população de Londres. Os tipos deasistencia estatal mais comuns são os que estãodisponíveis a empregados em atividades de baixa

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Agência de transferência, Foto ©Cathy McIlwaine

renda, tal como o Working Tax Crédit (subsidiopara os que trabalham mais de 16 horassemanais) e subsídio de acomodação. Osequatorianos (26%) e os colombianos (29%) sãoos que mais recebem subisidios do governo,enquanto os bolivianos e os brasileiros são os quemenos os requisitam (12% em cada caso).

Cerca de dois quintos dos latino-americanoshaviam feito empréstimo para financiar gastos dosdia-a-dia, como comprar alimentos e educação.Em outros casos, os empréstimos são utilizadospara adquirir eletrodomésticos, veículos epropriedades. Dois terços dos pesquisadoshaviam feito empréstimo com agênciasfinanceiras, e um quarto havia tomadoempréstimo com a família ou amigos.

Quase metade dos brasileiros declarou ter dívidas.Este grupo, assim como os bolivianos, figuramprominentemente entre os que não tem contabancária no Reino Unido. Cerca de 10% dospesquisados tem necessidade de recorrer a firmasque descontam cheques.

Outra medida utilizada para lidar comadversidades econômicas é a poupança. Quasedois terços dos latino-americanos pesquisadosconseguem economizar, em média, £300 pormes.

Muitos latino-maericanos não utilizam os serviçosde saúde pública

Um de cada cinco latino-americanos nunca foi aum clínico geral (Genera, GPl Practitioner) doserviço nacional de saúde (National HealthService) no Reino Unido, e a maioria dos quenunca o fizeram está no Reino Unido há menos decinco anos. Mas 63% dos brasileiros e 77% dosbolivianos haviam ido a um GP.

Os latino-americanos em situação imigratóriairregular eram as que menos haviam visitado umGP (45%). Embora muitos estejam autorizados ase registrarem com um GP, muitos não o fazempor causa de sua situação imigratória.

O uso de outros tipos de serviço de saúde é menosfrequente. Assim, por exemplo, 43% dospesquisados haviam utilizado o serviço deemergência em hospitais, 40% havia ido aodentista, 32% havia utilizado outros serviçoshospitalares, e apenas 6% havia ido a umapoliclínica. Quase um quinto das latino-americanas havia participado de programas deplanejamento familiar.

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Carnaval em Londres, Foto ©Juan Camilo Cock

Vale notar que 40% dos latino-americanos naamostragem haviam recorrido a serviçosparticulares de saúde, e que quase metadedesses serviços foram prestados por médicoslatino-americanos. E alguns dos que utilizavam osserviços de médicos particulares tambémrecorriam aos serviços de seu GP. Isto indica que aconsulta a um médico constitui, às vezes, umaescolha, mais do que uma necessidade. Ospesquisados apresentaram várias razões pararecorrerem ao setor de saúde privado: muitosdesejam obter um melhor atendimento (41%),outros o fazem ou porque estão não-documentados, ou ainda porque tem maisconfiança em um médico particular (12%), eainda outros o fazem por causa da barreira doidioma (9%). A proporção de pessoas querecorrem ao serviços de saúde privado não variade acordo com a renda, mas são os profissionaisos que mais utilizam esses serviços.

Aproximadamente um terço dos pesquisadosconsultaram médicos e profissionais de saúde emseus países de origem quando de visita. Este é ocaso, por exemplo, de Felicidade (brasileira, 44

anos): “Em seis anos, nós só estivemos no Brasilduas vezes, e quando fomos, fiz um check-upcompleto, de saúde, e odontológico”.

Alguns latino-americanos recorrem aos serviçosde organizações comunitárias

Quase um terço dos latino americanos recorreramaos serviços de alguna organização de apoio aoimigrante. Os profissionais (33%) recorrem commais frequência do que a média para aamostragem como um todo, em contraste aos quetrabalham em serviços básicos e comremuneração inferior a £500 mensais (28%).Cerca de metade das pessoas que solicitaramasilo utilizaram os serviços de alguma organizaçãocomunitária, o que demonstra a importânciadestes serviços para a comunidade.

Muitas famílias utilizam mais de umaorganização ao mesm tempo. Por exemplo,Laura

(peruana, 37 anos), recebeu ajuda do Serviçopelos Direitos da Mulher para procurar umalbergue quando ficou sem moradia, e também doMigrants Resource Centre para ajudar a resolverproblemas relativos a sua situação imigratória. Suamãe, por sua vez, recebeu ajuda da organizaçãoCarila e participa de atividades oferecidas peloProyecto de Latinoamericanos de la Tercera Edad.

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Os latino-americanos tendem a recorrer ao setorprivado para resolver questões legais

Aproximadamente 41% dos pesquisadosrecorreram, em algum momento, aos serviços deadvogados ou assesores legais particulares. Cercade dois terços dos que o fizeram, não contou comajuda financeira do governo (legal aid) para cobriros gastos, que podem variar de £10 por hora até£5,000 pelo caso. Muitos dos usuáriosprocuraram assessoria relativa a questões deimigração, assim como orientação para abriremnegócio, para ação de divórcio ou para legalizarum testamento.

As experiências dos que utilizam serviçosparticulares são variadas. Luz Marta (equatoriana,30 anos), por exemplo, pagou £1,800 a umadvogado que havia prometido obter adocumentação para regularizar sua situaçãoimigratória, mas ela havia perdido a esperançaporque seu pedido de asilo havia sido rejeitado.

As igrejas tem um papel importante na vida doslatino-americanos

A grande maioria (90%) dos latino-americanos emLondres diz se identificar com alguma religião,sendo a católica a mais citada (63%), seguidosdos que se dizem evangélicos (17%). Cerca de70% dos pesquisados frequenta a igreja, sendoque 35% destes vão à igreja uma vez por semana,e outros 31% vão com menos frequência. Dos quefrequentam a igreja, 67% frequenta a católica e28% frequenta uma igreja evangélica. A grandemaioria frequenta missas ou cultos dirigidos alatino-americanos, onde padres ou pastoresoficiam em espanhol ou português.

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Festa de natal, Elephant and Castle, Foto ©Juan Camilo Cock Westminster Abbey, Foto ©Cathy McIlwaine

As igrejas, é de se notar, tem papel importante naprovisão de apoio social e espiritual. Em algunscasos oferecem também serviços de assessoriaem questões de imigração, educação e saúde. Epara os que não professam religião alguma, aigreja atua também como um espaço desocialização, que as pessoas procuram para poderacessar redes sociais.

No geral, as pessoas de baixa renda tendem afrequentar mais a igreja. Mais da metade (56%)dos que pertencem a congregações evangélicas e

46% dos que frequentam a igreja católicaregularmente recebem salários inferiores a £1,000mensais, constituindo as mulheres a maioria dosque prestam serviços pessoais. Em todo caso,cabe ressaltar que pertencer ativamente a umaigreja pode afetar o bem-estar econômico. Osmembros de algumas igrejas evangélicas, porexemplo, devem doar o dízimo (10% do salário)para ajudar a financiar a igreja, o que representaum montante importante, sobretudo para os quetem baixa renda.

Os latino-americanos mantém fortes laços comfamiliares e amigos nos países de origem

A grande maioria dos pesquisados,independentemente de nacionalidade ou classesocial, mantém contato permanente com afamília, parentes e amigos em seus países deorigem. O contato é feito por meio de telefone delinha fixa (79%), ou ainda correio eletrônico ouchat pela internet. A comunicação é bastantefrequente: quase um quarto da amostragemmantém contato diário, um quinto se comunica acada dois ou tres dias, e um terço entra emcontato uma vez por semana. Os brasileirostendem a manter comunicação diária (40%,comparado a amostragem como um todo, 23%).

As redes sociais tanto auxiliam quanto minam obem-estar social

“Eu sempre digo que meu coracão e minha menteestão aquí, mas muita gente tem sua mente lá e ocorpo aquí… e isso não é bom”Alfonso, Paraguai, 41 anos

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St Ignatius Catholic Church, Seven Sisters, Foto © Cathy McIlwaine

Um aspecto importante das redes sociais são asamizades. Em geral os latino-americanos criamredes sociais fortes, com uma média de cincoamigos. Porém, tais redes apresentam um quadromisto no que diz respeito à questão da confiançaentre os latino-americanos. Cerca de 53% daamostragem afirmou confiar em outros latino-americanos, enquanto 27% assinalou oindividualismo e a inveja como características queprejudicam as relações. Há também tensões entre

diferentes grupos da comunidade. Uma das maismarcantes é a distância entre os latino-americanos de língua española e de línguaportuguesa. De fato, somente 44% dos brasileirosse identificam como latino-americanos,comparado a 70% dos que são de páises delíngua espanhola. Os brasileiros são também osque menos tendem a participar de atividadesculturais da comunidade latino-americana, comoevidencia o fato de apenas um terço participar docarnaval de verão.

Outra característica ressaltada, e que afeta tantoos brasileiros quanto os outros latino-americanos,é a carência de vínculos sociais com acomunidade britânica. Segundo Camilo(colombiano, 21 anos), “são necessáriasiniciativas para instigar a maior solidariedade nacomunidade latino-americana para que hajamaior integração, e a comunidade se sinta menosfechada em si mesma”.

De que maneira se alteram ascondições e oportunidades dasegunda geração deimigrantes latino-americanos?A segunda geração de latino-americanos queparticipou da pesquisa compreendeu 23 homense 29 mulheres com idade média de 21 anos. Agrande maioria era solteira, apenas dez eramcasados ou co-habitavam, e só uma pessoa eradivorciada. O país de origem mais comum dosmembros da segunda geração era a Colômbia, equase metade das mães e 19 dos pais eramprovenientes desse país.

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Marcha, Foto © Cathy McIlwaine

Torneio de futebol, Foto ©Juan Camilo Cock

A grande maioria tem nacionalidade britânica(49), enquanto 34 tem nacionalidade dupla,sendo estes colombianos em sua maioria. Apenas3 indivíduos tem nacionalidade de países delíngua espanhola. Quase todos se identificamcomo britânico-latino, os outros se denominam‘latino-americanos’, ‘mestiço’ ou ‘misto’. Uma boaparte se identifica também como britânica e latino-americana. Contudo, muitos mais se identificamcomo latino-americanos (45) do que britânicos(37). Quase todos falam o castelhanofluentemente, e apenas um dos jovens nãoentende ou fala o castelhano.

Os membros dessa segunda geração visitam oscentros e atividades frequentados pelos latino-americanos em Londres. Destes, 21 afirmaramque seus amigos eram sobretudo latino-

americanos britânicos, mas 26 mantém amizadescom jovens de diversas origens étnicas, e somentecinco tem amigos britânicos brancos. Essasegunda geração mantém contato com os país deorigem de seus pais por meio de chamadastelefônicas, conversas pela Internet ou correioeletrônico, o que fazem pelo menos uma vez pormes. De um total de 52 pessoas, 25 faziamremessas de dinheiro e presentes à AméricaLatina, e 45 haviam visitado a terra de seus paispelo menos cinco vezes.

A segunda geração atinge alto nível educacional eprofissional

“Eles sofreram muito e foi difícil para mim chegarao College. Quando seus pais são não-documentados eles tem que trabalhar até muitotarde da noite a semana toda, e voce crescesomente com seus irmãos e amigos. A vida foidifícil para eles que sempre viviam amedrontados,tivemos que mudar de casa muitas vezes porquetínhamos medo da polícia”. Darío, 18 anos, ecuatoriano de dupla nacionalidade

O fato de terem crescido em lugares onde seuspais tinham que lutar pelo sustento em situaçõesde vulnerabilidade gerou entre os jovens o desejode melhorar suas condições de vida. Nãosurpreende, por tanto, que 40 dos 52 jovenspesquisados haja afirmado aspirar a melhorestrabalhos que os que fazem seus pais.

Os níveis de educação dos que nasceram noReino Unido e que chegaram a Londres antes decompletar 7 anos de idade são altos: 41 dos 52pesquisados estavam cursando pelo menos oCollege. Outros ainda cursavam o Sixth Form,

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Latin American Youth Against Violence, Foto ©CathyMcIlwaine

preparando-se para os exames finais de admissãoà universidade (A Levels). Outros 19 dospesquisados ou estavam cursando ou haviamcompletado cursos técnicos ou universitários.

Embora seja difícil esboçar um quadro amplodessa geração baseado no tamanho daamostragem, os dados sugerem uma tendência atrabalhar em postos não qualificados (ou seja,básicos). Alguns o fazem apenastemporariamente, para ajudar nos custos daeducação, mas nenhum deles considera taistrabalhos como sua principal ocupação. Deste 52jovens, 30 estavam estudando à época dapesquisa, e 14 estavam trabalhando comoprofissionais ou em cargos de gerência.

Mesmo quando a proporção de jovens queocupavam postos administrativos ou cargos degerência é mais alta do que a da primeira geração,fica evidente em alguns casos que a ascençãoprofissional ocorre nas atividades de baixaremuneração e nas quais seus próprios pais seempregam. Por exemplo, Enrique (26 anos) é filho

de equatorianos que trabalham na limpeza.Apesar de ter feito a faculdade, Enrique decidiumontar sua própria companhia de limpeza. Cabeobservar, também, que mais da metade dosjovens pesquisados (29) recebem benefícios dogoverno, ou independentemente, ou comomembro da família.

A segunda geração também sofre a discriminação

Cerca de dois terços dos jovens pesquisadosidentificaram a discriminação como umaconstante em suas vidas. Em muitos casos, amesma se relaciona a exploração no local detrabalho, mas também discriminação no âmbitoeducacional e até por parte da polícia. Porexemplo, Carlos (20 anos, filho de colombianos)comentou que “meus amigos e eu, todos falamoso inglês, mas no College nos colocam no final dafila, nos níveis mais inferiores e não podemosprogredir. Nunca nos incentivam a continuar osestudos para chegar a universidade”. Igualmente,Juanita (17 anos) comenta “em Elephant & Castle,a polícia sempre nos detém e nos indiciam’

Que problemas enfrentam oslatino-americanos emLondres? Muitos latino-americanos se sentemdiscriminados

“Os imigrantes chegam ao país saudaveís e o paísos fazem ficar doentes, por causa de maltrato,pela discriminação e pelos problemas que temque enfrentar” Pedro, San Salvador, 57 anos

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Latin American Youth Forum, Foto ©Juan Camilo Cock

Mais de dois terços (69%) dos pesquisadosdeclararam sofrer discriminação diariamente noReino Unido. Os bolivianos reveleram ser os quemais sofrem discriminação (78%) e, sobretudo, oshomens. Os jovens também reportaram quesofrem discriminação, sobretudo os que tem entre30 e 40 anos de idade (73% destes).

Em relação a situação imigratória, os não-documentados são os que mais se sentemdiscriminados (81%). Contudo, 71% dos quepossuem passaporte britânico tambémreportaram ter sofrido discriminação, o que sugereser esse um problema bastante arraigado mas quenão está necessariamente relacionado a situaçãoimigratória.

A forma mais comum de discriminação reportadafoi a exploração no local de trabalho (70%),seguida pelo limitado acesso à acomodação(28%) e à educação (26%). A discriminaçãotambém se manifesta como hostilidade por parteda polícia (26%), abuso em lugares públicos ou notransporte público, e desvantagem no acesso aoserviço nacional de saúde. Um de cada cinco dospesquisados afirmaram ter tido problemas comserviços bancários ou na interação comfuncionários públicos.

Barreiras criadas pela situação imigratória

“Sou uma pessoa muito solitáriai.Sofri muitodesde que cheguei, mas tenho que seguir emfrente. Tenho medo de que me peguem compassaporte falso, mas eu ser uma pessoa decente,eu pago imposto”Lidia, Equador, 44 anos

Os problemas relacionados à situação imigratóriasão uma constante na comunidade latino-americana. Embora somente 19% dospesquisados não tenha documentação válida,muitos na comunidade tem tido problemas ligadosà situação imigratória. Enquanto algumas pessoasestão preocupadas por serem não-documentados, outras tem medo de possuirdocumentos falso. Esse é o caso de Lídia(ecuatoriana, 44 anos), que adquiriu umpassaporte falso na Espanha para poder conseguirtrabalho e enviar £500 todos mes para sua mãe etres filhos em Quito.

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Marcha, Foto ©Cathy McIlwaine

As pessoas não-documentadas tendem a sofrerpsicológicamente, uma vez que tem que aprendera conviver com o medo e a insegurança, e com oestigma social que acompanha essa situaçãoimigratória. Maria (boliviana, 40 anos), porexemplo, comentou: “deveriam reconhecer quenós somos pessoas trabalhadoras, honradas, enão criminosos”

A situação imigratória foi citada maisfrequentemente pelos bolivianos como um dosmaiores obstáculos a se poder viver em condiçõesmais toleraveís. Em geral, os homens (20%) semostraram mais preocupados em resolver osproblemas de imigração do que as mulheres(15%), o que não é de causar surpresa, visto quemais homens do que mulheres tendem a seremnão-documentados.

Dificuldades com o idioma

“Há muitos cursos de inglês, mas a questão dairregularidade é uma grande barreira, porquesempre pedem documentos. Seria bom queoferecessem cursos gratuitos com horários maisacessiveís”. Marcelo, brasileiro, 32 anos

A dificuldade de se expressar em inglês surgiucomo um dos maiores problemas enfretados peloslatino-americanos, sendo reportado por 38% dospequisados, dos quais a metade eramcolombianos. Mas o acesso a trabalho decente étambém uma questão importante para 14% dospequisados. A pesquisa revelou uma relaçãoestreita entre conhecimento do idioma e situaçãoimigratória, já que os não-documentados são osque menos possibilidade tem de poder financiarestudos da língua inglesa.

A pesquisa pediu a opinião dos participantessobre os projetos e iniciativas que achamnecessários para ajudar a comunidade latino-americana a enfrentar seus problemas. Váriasiniciativas foram mencionadas. A mais citadacomo urgente e prioritária foi uma anistia aos não-documentados. Em segundo lugar foi apontada anecessidade da criação de maiores oportunidadespara o aprendizado do idioma. Uma terceirainiciativa sugerida foi a oferta de melhores serviçosde assessoria quanto as assuntos de imigração.

Os latino-americanos são agora parte importanteda diversificada população de Londres,comparavél em tamanho a outros grupos deimigrantes e minorias étnicas que são maisreconhecidas e recebem maior atenção dogoverno britânico. A pesquisa aqui relatadaressalta o fato de que, embora seja esta umacomunidade que tem se consolidado nos últimosanos e apesar de alguns de seus membros jáestarem integrados social e economicamente, acomunidade como um todo ainda enfrentadesafios importantes relativos à estabilidade sociale economica assim como múltiplas barreiras à suaintegração.

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Marcha, Foto ©Cathy McIlwaine

Agradecimientos

Não resta dúvida de que os latino-americanos nãosó participam de modo vital na vida da capitalbritânica, mas requerem atenção e iniciativas quefacilitem sua integração, conforme afirma Miriam(equatoriana, 49 anos):

“O governo deve reconhecer que existimos econtribuimos…Somos uma parte importantedeste país e, por tanto, precisamos serreconhecidos. Precisamos de mais cursos deinglês, de melhores trabalhos e de muito maisapoio”.

Esperamos que este relatório contribua para que acomunidade latino-americanoa obtenha oreconhecimento que merece e que inspireiniciativas que comecem a lidar com as questõesmais preementes. Do mesmo modo, esperamosque os dados apresentados aqui sirvam paracontribuir para o trabalho das autoridades, doslíderes, das organizações e das campanhas dacomunidade.

Milne, da London Trust , assim como a FrancesCarlisle e a Tania Bronstein, da Latin AmericanWomen’s Resource Centre, pelo patrocínio eapoio. Nosso profundo agradecimento também àequipe de pesquisa: Marcela Benedetti, Luz DaryDuque Parra, Yara Evans, Claudia Forero, AnaCarla Franca, Brian Linneker, Felicia Luvumba,Azul Mertnoff, Sara Santiago Chavez, OliviaSheringham, Mayra Tipán, Yenny Tovar, VladimirVelásquez Cárdenas e Carolina Velásquez Correa.Agradecemos ainda a todas as organizações,igrejas e consulados que contribuíram para arealização deste projeto, bem como a PabloMateos e a Sarah Bradshaw, por seus comentáriose sugestões, e a Ed Oliver pelo mapa dos LatinoAmericanos em Londres. Somos agradecimostambém ao Office of National Statistics e UK DataArchive em Essex, por disponibilizar dados doAnnual Population Survey, InternationalPassenger Survey Data e Vital Statistics on Births.Os depositários os proprietários de direitosautorais e o UK Data Archive estão isentos dequalquer reponsabilidade pelas análises ouinterpretação de dados apresentadas nesserelatório. Agradecemos a Westfield Trust quefinanciou esta versão do relatório.Finalmente, todo os que participaramdessa pesquisa e cujas experiências foramregistradas nesse documento são latinoamericanos.

Queen Mary, University of London 31

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Pub7941

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