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FILOSOFIA Colégio Olimpo Ensino Médio - 2º Ano Ano 2009 – 2º semestre

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FILOSOFIA

Colégio Olimpo

Ensino Médio - 2º Ano

Ano 2009 – 2º semestre

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UNIDADE I - O PERÍODO SISTÊMICO Para compreender o pensamento de Sócrates, Platão e Aristóteles (que ocuparão nosso estudo com maior profundidade) é necessário antes de mais nada, localizá-lo na grande transformação por que passou o pensamento filosófico na Grécia com o surgimento dos Sofistas, inaugurando um período comumente chamado de Sistêmico. Esse segundo período da história do pensamento grego é o chamado Período Sistemático. Com efeito, nesse período realiza-se, na Filosofia, a sua grande e lógica sistematização, culminando em Aristóteles, através de Sócrates e Platão , que fixam o conceito de ciência e de inteligível, e através também da precedente crise cética da sofística. O interesse dos fi lósofos gira, de preferência, não em torno da natureza (Physis), mas em torno do homem e do espírito; da metafísica (estudo do ser) passa-se à gnosiologia (estudo do conhecimento humano) e à moral (definição do bem e do mal, da virtude). Daí ser dado a esse segundo período do pensamento grego também o nome de antropológico, pela importância e o lugar central destinado ao homem e ao espírito no sistema do mundo, até então limitado à natureza exterior. Esse período esplêndido do pensamento grego - depois do qual começa a decadência - teve duração bastante curta. Abraça, substancialmente, o século IV a.C., e compreende um número relativamente pequeno de grandes pensadores: os sofistas e Sócrates, daí derivando as chamadas escolhas socráticas menores, sendo principais a cínica e a cirenaica, precursoras, re spectivamente, do estoicismo e do epicurismo do período seguinte; Platão e Aristóteles, deles procedendo a Academia e o Liceu, que sobreviverão também no período seguinte e além ainda, especialmente a Academia por motivos éticos e religiosos, e em seus desenvolvimentos neoplatônicos em especial - apesar de o aristotelismo ter superado logicamente o platonismo. 1. Os Sofistas Os sofistas se compunham de grupos de mestres gregos que viajavam de cidade em cidade realizando aparições públicas (discursos, palestras, aulas, etc.) para atrair estudantes, de quem cobravam taxas para oferecer-lhes educação. O foco central de seus ensinamentos concentrava-se no Logos ou discurso, com foco em estratégias de argumentação. Os mestres sofistas alegavam que, ensinando técnicas e estratégias de argumentação, podiam tornar seus alunos

pessoas “melhores”, ou seja, que seus ensinamentos possibil itavam um aprendizado moral. A tese implícita nessa alegação, que causa bastante polêmica até hoje, é a idéia de que a “virtude” pode ser ensinada. De uma maneira geral, os sofistas eram questionadores das “verdades” aceitas pelos Gregos. Foi questionado, por exemplo, a idéia de que havia uma sabedoria recebida pelos deuses e a crença na supremacia da cultura grega (uma idéia absoluta à época). Argumentavam, por exemplo, que as práticas culturais existiam não em função de desígnios divinos, mas em função de convenções ou “nomos” (normas morais impostas pelo próprio grupo), e que a moralidade ou imoralidade de um ato não poderia ser julgada fora do contexto cultural em que aquele ocorreu. Tal posição questionadora levou-os a serem perseguidos, inclusive, por aqueles que se diziam amar a sabedoria: os fi lósofos gregos. Após uma crescente influência na política grega, os sofistas passaram a ser perseguidos, ameaçados e mesmo assa ssinados. Especialmente pelos filósofos (que acreditavam em uma "verdade universal" em contraposição à visão democrata relativista dos sofistas), os sofistas encontraram forte oposição. Mesmo com o repentino "desaparecimento" dos sofistas (especula-se que tenham formado sociedades secretas, ou migrado para o oriente, onde teriam auxiliado na formação e propagação de diversas religiões), tais perseguições continuaram, mas de modo escrito, na medida em que toda e qualquer referência aos sofistas é feita de modo depreciativo. Fato que foi copiado por diversos fi lósofos modernos que, sem reflexão, continuaram a intitular os sofistas como inimigos da fi losofia. Os sofistas são os primeiros a romperem com a busca pré-socrática por uma unidade originária (a physis) iniciada com Tales de Mileto e finalizada em Demócrito de Abdera (que embora tenha falecido pouco tempo depois de Sócrates, tem seu pensamento inserido dentro da filosofia pré-socrática). O homem é a medida de todas as coisas A conhecida frase “o homem é a medida de todas as coisas” surgiu dos ensinamentos sofistas. Uma das mais famosas doutrinas sofistas é a teoria do contra-argumento. Eles ensinavam que todo e qualquer argumento poderia ser contraposto por outro argumento, e que a efetividade de um dado argumento residiria na verossimilhança (aparência de verdadeiro, mas não necessariamente verdadeiro) perante uma dada platéia.

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Os Sofistas foram os primeiros “advogados” do mundo, ao cobrar de seus clientes para efetuar suas defesas, dada sua alta capacidade de argumentação. São também considerados por muitos os guardiões da democracia na antiguidade, na medida em aceitavam a relatividade da verdade (princípio básico para se sustentar um sistema democrático). Hoje, a aceitação do "ponto de vista alheio" é a pedra fundamental da democracia moderna. Na atualidade, há uma tendência de revisão histórica dos sofistas, que passam a ser encarados como um grupo ultra-democrata numa era grega em que a democracia aplicava-se à política, mas não necessariamente às idéias. O termo “sofista” tem uma conotação pejorativa nos dias de hoje, mas, na Grécia antiga, os sofistas eram profissionais muito bem remunerados e respeitados por suas habilidades. A sofística Após as grandes vitórias gregas, atenienses, contra o império persa, houve um triunfo político da democracia, como acontece todas as vezes que o povo sente, de repente, a sua força. E visto que o domínio pessoal, em tal regime, depende da capacidade de conquistar o povo pela persuasão, compreende-se a importância que, em situação semelhante, devia ter a oratória e, por conseguinte, os mestres de eloqüência. Os sofistas, ávidos por conquistar fama e riqueza no mundo, tornaram-se mestres de eloqüência, de retórica, ensinando aos homens ávidos de poder político a maneira de consegui-lo. Diversamente dos filósofos gregos em geral, o ensinamento dos sofistas não era ideal, desinteressado, mas sobejamente retribuído. O conteúdo desse ensino abraçava todo o saber disponível à época, toda a cultura, se firmando como uma espécie de enciclopédia universal, como meio para fins práticos e empíricos, mas bastante superficial. A época de ouro da sofística foi - pode-se dizer - a segunda metade do século V a.C. O centro foi Atenas, a Atenas de Péricles (495/492-429 a.C), capital democrática de um grande império marítimo e cultural. Protágoras foi o maior de todos, chefe de escola e teórico da sofística. Relativ ismo e ceticismo Em coerência com o ceticismo teórico, destruidor da ciência, a sofística sustenta o relativismo prático, destruidor da moral. A verdade se identifica com os sentidos (o que percebo com os sentidos é verdadeiro), assim como o bem se identifica ao sentimento (se “sinto” que algo é bom, então é bom mesmo). Verdade e bondade se ligam ao impulso, à intuição, à paixão de cada um em cada momento.

A tese acima descrita é chamada de relativismo (pois relativiza a verdade e a moral) e empirismo ou sensualismo (pois toma como critério de verdade e bondade os sentidos). As teses sofistas também foram classificadas como hedonismo (o prazer sensorial constitui o fim, o objetivo da vida) e utili tarismo ético (o única regra de conduta moral é o interesse particular, ou seja, o que for útil ao indivíduo é correto do ponto de vista ético).

Górgias (480-375), sofista ateniense, declara plena indiferença para com todo moralismo: ensina ele a seus discípulos unicamente a arte de vencer os adversários; que a causa seja justa ou não, não lhe interessa. A moral, portanto, - como norma universal de conduta - é concebida pelos sofistas não como lei racional do agir humano, isto é, como a lei que potencia profundamente a natureza humana, mas como um empecilho que incomoda o homem. Desta maneira, os sofistas e stabelecem uma oposição especial entre natureza e lei, quer política, quer moral, considerando a lei como fruto arbitrário, interessado, mortificador, uma pura convenção, e entendendo por natureza, não a natureza humana racional, mas a natureza humana sensível, animal, instintiva. E tentam criticar a vaidade desta lei, na verdade tão mutável conforme os tempos e os lugares. Criticam também o fato das sociedades celebrarem a utilidade das leis: a submissão à lei nos torna mais felizes e nós protege contra a maldade. Para os sofistas, tiranos, os grandes malvados, mediante graves crimes, têm freqüentemente conseguido grande êxito no mundo e, aliás, a experiência ensina que para triunfar no mundo, não é necessário justiça e retidão moral (fazer o que é certo), mas prudência e habilidade (fazer o que é conveniente). Então a realização da humanidade perfeita, segundo o ideal dos sofistas, não está na ação ética e ascética, no domínio de si mesmo, na justiça para com os outros, mas no engrandecimento ilimitado da própria personalidade, no prazer e no domínio violento

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dos homens. Esse domínio violento é necessário para possuir e gozar os bens terrenos, visto estes bens serem limitados e ambicionados por outros homens. É esta, aliás, a única forma de vida social possível num mundo em que estão em jogo unicamente forças brutas, materiais. Seria, portanto, um prejuízo a igualdade moral entre os fortes e os fracos, pois a verdadeira justiça conforme à natureza material, exige que o forte, o poderoso, oprima o fraco em seu proveito. Protágoras de Abdera Protágoras nasceu em Abdera - pátria de Demócrito , cuja escola conheceu - pelo ano 480. Viajou por toda a Grécia, ensinando na sua cidade natal, na Magna Grécia, e especialmente em Atenas, onde teve grande êxito, sobretudo entre os jovens, e foi honrado e procurado por Péricles e Eurípedes. Acusado de ateísmo, teve de fugir de Atenas, onde foi processado e condenado por impiedade, e a sua obra sobre os deuses foi queimada em praça pública.

Dos princípios de Heráclito e das variações da sensação, conforme as disposições subjetivas dos órgãos, deduziu o relativismo do conhecimento. Esta doutrina enunciou-a com a célebre fórmula:

“O homem é a medida de todas as coisas”.

Esta máxima significava mais exatamente que de cada homem individualmente considerado dependem as coisas, não na sua realidade física, mas na sua forma conhecida. Subjetivismo, relativismo e sensualismo são as notas características do seu sistema de ceticismo parcial. Platão deu o nome de Protágoras a um dos seus diálogos, e a um outro o de Górgias. O Sofisma como figura de argumentação Sofisma (do grego antigo σόϕισµα -ατος,

derivado de σοϕίξεσϑαι "fazer raciocínios

capciosos") em Filosofia é um raciocínio aparentemente válido, mas inconclusivo, pois é contrário às suas próprias leis. Também são considerados sofismas os raciocínios que partem de premissas verdadeiras ou verossímeis, mas que são concluídos de uma forma inadmissível ou absurda. Por definição, o sofisma tem o objetivo de dissimular uma ilusão de verdade, apresentado-a sob esquemas que parecem seguir as regras da lógica. Historicamente o termo sofista, no seu primeiro e mais comum significado, é equivalente ao paralogismo matemático, que é uma demonstração aparentemente rigorosa que, todavia, conduz a um resultado nitidamente absurdo. Atualmente, no uso freqüente e do senso comum, sofisma é qualquer raciocínio capcioso ou inválido, mas que se apresenta com coerência e que tem por objetivo induzir outros indivíduos ao erro mediante ações de má-fé. Pode significar, também, a persuasão por efeito psicológico e não pela correção lógica do argumento. Sofística era originalmente o termo dado às técnicas ensinadas por um grupo altamente respeitado de professore s retóricos na Grécia antiga. O uso moderno da palavra, sugestionando um argumento inválido composto de raciocínio especioso, não é necessariamente o representante das convicções do sofistas originais, a não ser daquele que geralmente ensinaram retórica. Os sofistas só são conhecidos hoje pelas escritas de seus oponentes (mais especificamente, Platão e Aristóteles) que dificulta formular uma visão completa das convicções dos sofistas.

2. Sócrates Tudo o que sabemos sobre a vida e o pensamento de Sócrates é proveniente dos comentários dos fi lósofos (principalmente Platão) que seguiram suas idéias, pois ele, assim como o Cristo, não deixou nenhum escrito. A figura de Sócrates era, com freqüência, associada à dos sofistas; contudo, o filósofo não vendia os seus ensinamentos – até porque afirmava não possuir nenhum: “Só sei que nada sei”, dizia Sócrates – e, ao contrário dos sofistas, buscava antes de tudo a “verdade” e não a “aparência” do saber. Certo é que valorizou a descoberta do homem como referência filosófica feita pelos sofistas, mas orientou essa descoberta para os valores universais, para a verdade, segundo a via real do pensamento grego. Sócrates nasceu em Atenas, provavelmente no ano de 470 a.C., e tornou-se um dos principais pensadores da Grécia Antiga. Morreu Sócrates em 399 a.C. com 71 anos de idade, em Atenas. A cena retratada acima dramatiza o momento de sua morte, quando condenado por influenciar negativamente a

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juventude de Atenas, é sentenciado à morte por envenenamento com cicuta. Contrariando a todos, ele se submete expontanemante à sua sentença, recusando-se a fugir. O interesse fi losófico de Sócrates volta-se para o mundo humano, espiritual, com finalidades práticas, morais. Como os sofistas, ele é cético a respeito da cosmologia e, em geral, a respeito da metafísica. A única ciência possível e útil é a ciência da prática, mas dirigida para os valores universais, não particulares. Vale dizer que o agir humano - bem como o conhecer humano - se baseia em normas objetivas e transcendentes à experiência. O fim da filosofia é a moral.

Mas, se o fim da filosofia é prático, o prático depende, por sua vez, totalmente, do teorético, no sentido de que o homem tanto age quanto conhece. Para ele, só age virtuosamente o sábio; o malvado é ignorante. O moralismo socrático é equilibrado pelo mais radical intelectualismo, racionalismo, que está contra todo voluntarismo (ação baseada apenas na experiência prática), sentimentalismo (ação baseada nos sentimentos, na intuição), pragmatismo, ativismo, etc. Contudo, antes de querer persuadir os outros de suas idéias (como o faziam os sofistas), cada um deve, primeiro e antes de tudo, conhecer a si mesmo. A expressão “conhece-te a ti mesmo”, que estava gravada no pórtico do templo do deus Apolo, patrono grego da sabedoria,

tornou-se o lema de Sócrates. O perfeito conhecimento do homem é o objetivo de toda a sua fi losofia. Neste sentido, a moral (como o homem deve agir para ser Virtuoso) passa a ser o centro para o qual convergem todas as partes da filosofia. Sócrates ensina a bem pensar para bem viver. O meio único de alcançar a felicidade ou semelhança com Deus, fim supremo do homem, é a prática da virtude. A virtude adquiri-se com a sabedoria ou, antes, com ela se identifica. Esta doutrina, uma das mais características da moral socrática, é conseqüência natural do erro psicológico de não distinguir a vontade (psicológico) da inteligência (lógico). Para ele, a grandeza moral e profundidade especulativa e intelectual, a virtude e a ciência (e por outro lado, a ignorância e o vício) são sinônimos. "Se músico é o que sabe música, pedreiro o que

sabe edificar, justo será o que sabe a justiça". A fi losofia socrática, portanto, limita-se à gnosiologia (teoria do conhecimento) e à ética (teoria da moral), sem metafísica (cosmologia). O Método Socrático A parte gnosiológica da Filosofia socrática foi desenvolvida através de diálogos críticos com vários interlocutores (uns importantes figuras atenienses, outras nem tanto). Esse s diálogos eram constituídos, de modo geral, por dois momentos: a ironia e a maiêutica (que veremos detalhadamente, a seguir). Nesses diálogos, Sócrates fazia perguntas sobre as idéias (plano intelectual) e valores (plano ético) nos quais os gregos acreditavam e que julgavam conhecer. Suas perguntas deixavam os interlocutores embaraçados, surpresos, percebendo que não sabiam responder e que nunca tinham pensado com maior profundidade suas crenças, seus valores e idéias. Sócrates adotou vários procedimentos típicos dos sofistas: polemização via questionamento de valores, método fi losófico via diálogo, valorização de temas voltados à natureza espiritual e moral do ser humano e rejeição por temas cosmológicos típicos do pré-socráticos. Entretanto, insistindo no perpétuo fluxo das coisas e na variabilidade extrema das impressões sensoriais, os sofistas acreditavam na impossibilidade absoluta e objetiva do saber. Já Sócrates re stabelece-lhe a possibilidade, determinando o verdadeiro objeto da ciência. O objeto da ciência não é o sensível, o particular, o variável e mutável. É o inteligível, o conceito que se exprime pela definição (que é invariável, perfeito, imutável). Este conceito ou idéia geral obtém-se por um processo dialético por ele chamado indução e que consiste em comparar vários indivíduos da mesma espécie, eliminar-lhes as diferenças

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individuais, as qualidades mutáveis e reter-lhes o elemento comum, estável, permanente, a natureza, a essência da coisa. A Ironia Introspecção, ignorância, indução, definição. Antes de tudo, cumpre desembaraçar o espírito dos conhecimentos errados, dos preconceitos, opiniões; este é o momento da ironia, isto é, da crítica. No início do diálogo, Sócrates convida seu interlocutor a filosofar sobre determinado assunto, a buscar a verdade acerca daquilo sobre o que falam. Geralmente, o filósofo começa com uma pergunta do tipo: “O que é a justiça?”. Ao receber as primeiras respostas, Sócrates passa a analisá-las para ver se ali encontra um conceito (definição) da coisa procurada. Assumia humildemente a atitude de quem aprende e ia multiplicando as perguntas até colher o adversário presunçoso em evidente contradição e constrangê-lo à confissão humilhante de sua ignorância. Essa fase do diálogo, chamado de Ironia não pode ser entendida no sentido de humor ou descaso sarcátisco, mas apenas um discurso que visa demonstrar àquela pessoa que o que ela pensava saber sobre determinado assunto é, na verdade, aparência de saber, opiniões subjetivas, e não a definição buscada. Na ironia, Sócrates atacava de modo implacável as respo stas de seus interlocutores: com habilidade de raciocínio impressionante, procurava mostrar as contradições das afirmações e os novos problemas que surgiam como conseqüência de determinada resposta. Seu objetivo inicial era demolir o orgulho, a arrogância e a presunção gerados pela aparência do saber. A primeira virtude do sábio é adquirir consciência da própria ignorância. A ironia socrática tinha um caráter purificador, na medida em que levava os discípulos a confessarem suas próprias contradições e ignorâncias, onde antes só julgavam possuir certezas e verdades. A intenção fundamental de Sócrates, com sua ironia, não era propriamente destruir o conteúdo das resposta s dadas pelos interlocutores, mas fazê-los tomar consciência profunda de suas próprias resposta s, das con seqüências que poderiam ser tiradas de sua s reflexões, muitas vezes repletas de conceitos vagos e imprecisos. A introspecção é o característico da filosofia de Sócrates. E exprime-se no famoso lema conhece-te a ti mesmo - isto é, torna-te consciente de tua ignorância - como sendo o ápice da sabedoria, que é o desejo da ciência mediante a virtude. E alcançava em Sócrates intensidade e profundidade tais, que se concretizava, se personificava na voz interior divina do gênio ou demônio.

A Maiêutica Após ter reconhecido a deficiência de sua argumentação, os interlocutores de Sócrates estavam aptos para o segundo momento do diálogo: a maiêutica. A maiêutica, que Sócrates afirmava auxil iar os partos do espírito, como sua mãe parteira auxil iava os partos do corpo, é um termo de origem grega que significa “a arte de trazer à luz”, ou ainda “a arte de parturejar” (fazer o parto). Sócrates dizia-se um parteiro de idéias e evocava a imagem de sua mãe – que era parteira – para, numa linguagem metafórica, explicar seu papel de filósofo. Na qualidade de filho de uma parteira, Sócrates assiste ao parto dos espíritos, das idéias, dos pensamentos que eles – os espíritos ou mentes dos interlocutores – contêm sem o saber. Conta-se que certa vez, Sócrates, fazendo perguntas precisas e traçando diante de um escravo figuras matemáticas na areia, levou-o a descobrir uma proposição da geometria. O escravo, que nunca tinha aprendido Matemática, começa por responder erradamente. No entanto, com o prosseguimento do diálogo, acaba por dar respostas corretas. Sócrates interpretou isso como prova evidente de que o escravo, assim como todos nós, possui conhecimentos matemáticos sem o saber.

Para além do enorme interesse fi losófico desta demonstração, a resolução do problema proposto por Sócrates ao escravo é merecedora de atenção do ponto de vista da matemática, dando-nos uma idéia do desenvolvimento das matemáticas Gregas nos finais do século V a.C. Enfim, Sócrates, por meio de perguntas, destrói o saber constituído para reconstruí-lo na procura da definição do conceito. Esse processo aparece bem ilustrado nos diálogos de Platão, e é bom lembrar que, no final do diálogo, nem sempre Sócrates tem a resposta: ele também se põe em busca do conceito e às vezes as discussões não chegam a conclusões definitivas ou não têm uma resposta precisa ou definitiva. A Aporia Quando um diálogo não chega a uma resposta definitiva, dizemos que ele apresenta uma Aporia. Na filosofia grega antiga, tal termo servia para designar contradições entre dois juízos (o que se chamaria depois, com mais propriedade, antinomia). Contemporaneamente, pode-se definir aporia como a tensão lógico-retórica que impede que o sentido de um texto se possa fixar. Na aporia clássica de "Aquiles e a tartaruga", diz-se que o veloz Aquiles nunca conseguirá alcançar a tartaruga, porque, quando o atleta chegar ao ponto em que a tartaruga se

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encontrava no momento da partida, o animal terá tido tempo de mover-se e alcançar uma determinada distância de Aquiles. Esse, por sua, vez tentará alcançar esse novo ponto onde a

tartaruga se encontrava, mas essa já terá se movido novamente, e assim por diante. Não é possível, neste caso, com precisão lógica, em que sentido Aquiles não alcançaria a tartaruga.

Num diálogo aporético não se chega nunca a uma definição do tema central. Em alguns diálogos, apenas pela refutação (desconstrução das idéias do interlocutor) de todas as tentativas de definição, Sócrates estaria em condições de dizer alguma coisa sobre aquilo que se quer discutir. As aporias têm uma função heurística. Define-se procedimento heurístico como um método de aproximação das soluções dos problemas, que não segue um percurso claro, mas se baseia na intuição e nas circunstâncias a fim de gerar conhecimento novo. Assim, o interlocutor de Sócrates só estará em condições de aprender a verdade quando se der conta da sua ignorância. Tal reconhecimento é buscado através do uso heurístico das aporias. O método aporético de Sócrates pressupõe a purificação da falsa sophia do interlocutor. O legado de Sócrates A reforma socrática atingiu os alicerces da filosofia. A doutrina do conceito determina para sempre o verdadeiro objeto da ciência: a indução

dialética reforma o método filosófico; a ética une pela primeira vez e com laços indissolúveis a ciência dos costumes à filosofia especulativa. Não é, pois, de admirar que um homem, já aureolado pela austera grandeza moral de sua vida, tenha, pela novidade de suas idéias, exercido sobre os contemporâneos tamanha influência. Entre os seus numerosos discípulos, além de simples amadores, como Alcibíades e Eurípedes, além dos vulgarizadores da sua moral (socratici viri), como Xenofonte, havia verdadeiros fi lósofos que se formaram com os seus ensinamentos. Dentre estes, alguns, saídos das escolas anteriores não lograram assimilar toda a doutrina do mestre; desenvolveram exageradamente algumas de suas partes com detrimento do conjunto.

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3. Platão Diversamente de Sócrates, que era fi lho do povo, Platão (428/427-347 a.C) nasceu em Atenas de pais aristocráticos e abastados, de antiga e nobre família. Temperamento artístico e dialético - manifestação característica e suma do gênio grego - deu, na mocidade, livre curso ao seu talento poético, que o acompanhou durante a vida toda, manifestando-se na expressão estética de seus escritos.

Aos vinte anos, Platão travou relação com Sócrates - mais velho do que ele quarenta anos - e desfrutou por oito anos do ensinamento e da amizade do mestre. Quando discípulo de Sócrates e ainda depois, Platão estudou também os maiores pré-socráticos. Depois da morte do mestre, Platão retirou-se com outros socráticos para junto de Euclides, em Mégara. Platão, ao contrário de Sócrates, interessou-se vivamente pela política e pela filosofia política. Foi assim que o filósofo, após a morte de Dionísio o Antigo, voltou duas vezes – em 366 e em 361 a.C. – à Dion, esperando poder experimentar o seu ideal político e realizar a sua política utópica. Estas duas viagens políticas a Siracusa, porém, não tiveram melhor êxito do que a precedente: a primeira viagem terminou com a expulsão de Dion; na segunda, Platão foi preso por Dionísio, mas foi libertado por Arquitas e pelos seus amigos.

O pensamento de Platão Inspirado em Sócrates, Platão vê na filosofia um fim prático, moral: tornar o homem virtuoso. Este fim prático realiza-se, no entanto, intelectualmente, através da especulação, do conhecimento da ciência. Mas, ao contrário do mestre, que limitava a pesquisa filosófica, conceitual, ao campo antropológico e moral, Platão estende tal investigação ao campo metafísico e cosmológico, isto é, a toda a realidade. Platão como Sócrates, parte do conhecimento empírico, sensível, da opinião do senso comum e dos sofistas, para chegar ao conhecimento intelectual, conceitual, universal e imutável. A gnosiologia (teoria do conhecimento) platônica, porém, tem o caráter científico, filosófico, que falta a gnosiologia socrática, ainda que as conclusões sejam, mais ou menos, idênticas. Segundo Platão, o conhecimento humano integral fica nitidamente dividido em dois graus: a) o conhecimento sensível, particular, mutável e relativo; e b) o conhecimento intelectual, universal, imutável, absoluto, que ilumina o primeiro conhecimento, mas que dele não se pode derivar. A diferença essencial entre o conhecimento sensível, a opinião verdadeira e o conhecimento intelectual, está nisto: o conhecimento sensível, embora verdadeiro, não sabe que é verdadeiro, donde pode cair no erro sem o saber; ao passo que o segundo, além de ser um conhecimento verdadeiro, sabe que o é, não podendo de modo algum ser substituído por um conhecimento diverso, errôneo. Pode-se dizer também que o primeiro sabe que as coisas são do jeito que elas são, sem saber por que o são assim (sem conhecimento de causa), ao passo que o segundo sabe que as coisas devem ser necessariamente do jeito que são, precisamente porque é ciência, isto é, conhecimento das coisas pelas causas. Deste mundo material e contigente, portanto, não há ciência, devido à sua natureza inferior, mas apenas é possível, no máximo, um conhecimento sensível verdadeiro - opinião verdadeira - que é precisamente o conhecimento adequado à sua natureza inferior. Pode haver conhecimento apenas do mundo imaterial e racional das idéias pela sua natureza superior. Este mundo ideal, racional - no dizer de Platão - transcende inteiramente o mundo empírico, material, em que vivemos. A teoria das idéias ou formas Para Platão, o processo do conhecimento se desenvolve por meio de uma passagem progressiva do mundo sensível – da realidade

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material, corpórea – para o mundo inteligível – o mundo das idéias ou mundo das formas, mundo das essências imutáveis, imóveis, de pura perfeição. Com efeito, a realidade sensível (dos sentidos), da qual, obviamente, fazemos parte, não nos oferece a possibilidade do verdadeiro conhecimento, uma vez que a matéria de que as coisas sensíveis foram feitas tornam tais coisas imperfeitas, mutáveis, destrutíveis. O mundo material é contraditório e, por isto, dele só nos chegam as aparências das coisas e sobre eles temos tão-somente opiniões, nunca conhecimento. O mundo sensível não constitui a verdadeira realidade: é um pálido reflexo de uma realidade superior, de um mundo supra-físico, muito semelhante ao mundo dos entes matemáticos (os números, as operações e formas matemáticas). Não era mera coincidência que Platão mandou escrever, no pórtico da entrada de sua academia, os seguintes dizeres:

“Não entre aqui quem não souber Geometria”. As formas matemáticas sempre o fascinaram, por que elas eram o que mais próximo existia da sua teoria sobre o mundo das idéias.

Quando v emos uma poltrona, por exemplo, ela pode mudar de cor, de tecido, de f orma, de tamanho; contudo, a essência da poltrona permanece sempre a mesma, em qualquer época ou lugar: é sempre a “idéia” de poltrona. Por ter uma essência, podemos conhecê-la, mesmo atrav és de objetos aparentemente dif erentes.

A f orma (essência) de um triângulo não deixa de existir se todos pararem de pensar sobre ela. Ela é indestrutív el e independente da existência de objetos triangulares.

O mundo sensível só tem realidade na

medida em que participa do mundo inteligível ou das idéias. As coisas materiais que nos rodeiam são como sombras das idéias, isto é, simulacros (imitações) das suas formas primordiais e modelos eternos que habitam o supra-físico. Esses modelos eternos, segundo Platão, são incorpóreos e imutáveis. Embora Platão os chame também de “idéias”, eles não existem na mente humana. Ao contrário, existem fora do pensamento e, principalmente, fora dos objetos, num plano ou dimensão que o filósofo denomina “Hiperurânio”: uma dimensão metafísica ao qual se tem acesso apenas pelo pensamento.

Quando vemos uma mesa, por exemplo, ela pode mudar de cor, envelhecer, se estragar; contudo, a essência da mesa permanece sempre a mesma, em qualquer época ou lugar é sempre a “idéia” de mesa. Da essência da mesa temos conhecimento (episteme), mas da mesa material, uma aparência percebida sensorialmente, temos apenas opinião (doxa). Assim, todo o nosso esforço deve ser concentrado na tentativa de acessarmos o mundo das idéias para transcendermos (ultrapassarmos) esse mundo de devir, vir-a-ser (mundo perecível e imperfeito).

O conhecimento verdadeiro deve, para Platão, ultrapassar a e sfera das impressões sensoriais (mundo sensível) e penetrar na esfera racional do mundo das formas. Ora, de acordo com Platão, a dialética é, por excelência, o conhecimento verdadeiro, o método fi losófico que pode nos levar, num processo ascendente, da realidade sensível – da crença e da opinião – para o plano supra-físico – das idéias e essências.

O método dialético promove uma espécie de separação da alma inteligível do corpo físico, fazendo com que a alma capte, num plano superior, as coisas totais e perfeitas: a bondade em si, a coragem em si, a sabedoria em si, entre outros.

Todas as idéias existem num mundo separado, o mundo dos inteligíveis, situado na esfera celeste. A certeza da sua existência funda-a Platão na necessidade de salvar o valor objetivo

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dos nosso s conhecimentos e na importância de explicar os atributos do absoluto de Parmênides.

O divino platônico é representado pelo mundo das idéias e especialmente pela idéia do Bem, que está no vértice. Podemos pensar aqui numa pirâmide, onde a hierarquia platônica vai da idéias dos objetos menos abstratos (mesas, cadeiras, etc.), passando pelas idéias mais abstratas (as idéias matemáticas, os valores – justiça, virtude, etc.) e chegando ao vértice, que é a própria idéia de BEM, a mais abstrata e, por isso mesmo, aquela da qual todas as outras idéias derivam. A alegoria da Caverna Para compreender o aspecto político da teoria platônica das idéias, é necessário fazer uma analogia com o mito da caverna, segundo o qual os homens viviam, desde a infância, acorrentados no interior de uma caverna, onde só conheciam sombras do mundo real. O prisioneiro que se libertou das correntes (isto é, o fi lósofo), ao sair da caverna e contemplar a verdadeira realidade, passa do nível da opinião (doxa) ao nível da ciência (episteme).O filósofo deve retornar ao meio dos homens para orientá-los a fugir da caverna das sombras. Fazer política, para Platão, é saber influenciar os homens que não vêem a sair da escuridão. Cabe ao filósofo ensinar e governar os homens (papel do político). Portanto, para que o Estado seja bem governado, é preciso que “os fi lósofos se tornem reis, ou que os reis se tornem filósofos”. Platão propõe um modelo aristocrático de poder. No entanto, não se trata de uma aristocracia da riqueza, mas da inteligência, em que o poder é confiado aos melhores, ou seja, é uma sofocracia (governo dos sábios). Os e scritos em que Platão trata especificamente do problema da política, são a República, o Político e as Leis. Na República, a obra fundamental de Platão sobre o assunto, traça o seu estado ideal, o reino do espírito, da razão, dos fi lósofos, em chocante contraste com os estados e a política deste mundo. Segundo Platão, o estado ideal deveria ser dividido em classe s sociais. Três são, pois, estas classe s: a dos fi lósofos, a dos guerreiros, a dos produtores. À classe dos fi lósofos cabe dirigir

a república. Com efeito, contemplam eles o mundo das idéias, conhecem a realidade das coisas, a ordem ideal do mundo e, por conseguinte, a ordem da sociedade humana, e estão, portanto, à altura de orientar racionalmente o homem e a sociedade para o fim verdadeiro. Tal atividade política constitui um dever para o filósofo, não, porém, o fim supremo, pois este fim supremo é unicamente a contemplação das idéias. À classe dos guerreiros cabe a defesa interna e externa do estado, de conformidade com a ordem estabelecida pelos filósofos, dos quais e juntamente com os quais, os guerreiros receberam a educação. Os guerreiros representam a força a serviço do direito, representado pelos fi lósofos. À classe dos produtores, enfim, - agricultores e artesãos - submetida às duas precedentes, cabe a conservação econômica do estado, e, consequentemente, também das outras duas classes, inteiramente entregues à conservação moral e física do estado. Na hierarquia das classes, a dos trabalhadores ocupa o ínfimo lugar, pelo desprezo com que era considerado por Platão - e pelos gregos em geral - o trabalho material.

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Trecho do livro “A República”, de Platão O MITO DA CAVERNA

E agora, deixa-me mostrar, por meio de uma comparação, até que ponto nossa natureza humana vive banhada em luz ou mergulhada em sombras. Imagine seres humanos vivendo em um abrigo subterrâneo, uma caverna, cuja boca se abre para a luz, que a atinge em toda a extensão. Aí sempre viveram, desde crianças, tendo as pernas e o pescoço acorrentados, de modo que não podem mover-se, e apenas vêem o que está à sua frente, uma vez que as correntes os impedem de virar a cabeça. Acima e por trás deles, um fogo arde a certa distância e, entre o fogo e os prisioneiros, a uma altura mais elevada, passa um ca minho. Se olhares bem, verás uma parede baixa que se ergue ao longo desse caminho, como se fosse um anteparo que os animadores de marionetes usam para esconder-se enquanto exibem os bonecos. [...] Pois esses seres são como nós. Vêem apenas suas próprias sombras, ou as sombras uns dos outros, que o fogo projeta na parede que lhes fica à frente. Esquema dos dois mundos de Platão na Alegoria da Caverna Mundo visível

• A sua geografia limita-se ao espaço sombrio da caverna.

• Caracteriza-se pela escuridão, é um mundo de sombras, de lusco-fusco, de imagens imprecisas (ídolos).

• Nele o homem se encontra encadeado, constrangido a olhar só para a parede na sua frente, ficando com a mente embotada, preocupando-se apenas com as coisas mesquinhas do seu dia-a-dia.

• Homem dominado pelas sensações e pelos sentidos mais primários.

• Em situação de desconhecimento e ignorância (agnosis).

• Condição em que se encontra o homem comum.

Mundo Inteligível

• É todo universo fora da caverna, o espaço composto pelo ar e pela terra inteira.

• Dominado pela claridade exuberante de Hélio, o Sol que tudo ilumina com seus raios esplendorosos, permitindo a rápida identificação de tudo, alcançando-se assim a ciência (gnose) e o conhecimento (episteme).

• Plenitude do homem liberto da opressiva caverna, podendo investigar e inquirir tudo ao seu redor conhecendo enfim as formas perfeitas.

• Homem orientado pela inteligência (nous) e pela razão (logos).

• Em condições de cultivar a sabedoria e a busca pela verdade e pelo ideal da junção do bem com o belo (kalogathia).

• Condição do filósofo. Interpretação do Mito da Caverna Platão não achava que nosso mundo era o melhor dos mundos. Para ele, o mundo que chamamos de real é uma espécie de prisão, onde ficamos trancafiados na escuridão e nas sombras. Mas além dessa prisão reside um brilhante e esperançoso mundo de verdades que ele chamou de mundo das idéias ou ideais, e é por isso que chamamos essa doutrina de idealismo. Platão desenvolve suas doutrinas idealistas de forma notável na República, onde seu porta-voz, como de hábito, é seu mestre, Sócrates. (Desconhece-se até que ponto Sócrates realmente sustentava os pontos de vista de Platão.)

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Sócrates compara nosso mundo cotidiano a um "abrigo subterrâneo", uma caverna onde somos mantidos acorrentados. À nossa frente ergue-se uma parede e atrás de nós, uma fogueira. Incapazes de virar a cabeça, vemos

somente as sombras projetadas na parede pelo fogo, nada conhecendo além disso. Naturalmente acreditamos que tais sombras são a "realidade". Não existe, para nós, outra realidade além dessa. Mas se pudéssemos nos libertar das correntes, se pudéssemos ao menos nos virar para a entrada da caverna, poderíamos constatar o nosso erro. A princípio, a luz direta nos seria dolorosa e perturbadora. Elas nos cegaria por um momento. Seria preciso coragem para suportá-la (suportar a verdade). Porém, logo nos adaptaríamos e começaríamos a perceber as pessoas e objetos reais, que só conhecíamos em forma de sombras. Mesmo assim, devido ao hábito, correríamos o risco de nos agarramos às sombras, ainda acreditando que elas fossem reais, e suas fontes, apenas ilusões. Mas se fossemos tirados da caverna para a luz, cedo ou tarde chegaríamos à visão correta das coisas e lamentaríamos nossa antiga ignorância.

A analogia de Platão é um ataque aos nosso s hábitos de pensamento. Estamos acostumados, diz ele, a aceitar os objetos concretos que nos cercam como "reais". Mas, para ele, não são. Ou melhor, eles são só cópias

imperfeitas e menos "reais" das "formas" imutáveis e eternas. Essas formas, como Platão as define, são as realidades permanentes, ideais e originais a partir das quais (de alguma forma) são construídas cópias concretas imperfeitas. Por exemplo, cada cadeira em nosso familiar mundo de objetos é meramente uma imitação, ou "sombra", da Cadeira Ideal. Cada escrivaninha é uma cópia da Escrivaninha Ideal, que nunca muda, que existe pela eternidade, e na qual você nunca pode derramar café. Essas cadeiras e escrivaninhas ideais, segundo Platão, não são fantasias; elas são de fato mais "reais" que suas imitações materiais, porque são mais perfeitas e universais. Entretanto, como nosso s sentidos (visão, tato, paladar, olfato, audição) têm sido sempre enganados, nós somos cegos para o mundo dos ideais. Nossas mentes estão escravizadas a imitações que nós, desta maneira, confundimos com a realidade. Somos como os prisioneiros na caverna de Platão.

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"No mundo do conhecimento, a idéia do bem aparece por último e é percebida apenas com esforço; mas, quando percebida, torna-se claro que ela é a causa universal de tudo que é bom e belo, o criador da luz e o senhor do sol neste mundo visível." Adaptado de Paulo Ghiraldelli

O MITO DA CAVERNA (Extraído de "A República" de Platão, 6° ed. Ed.

Atena, 1956, p. 287-291) SÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só vêem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem. GLAUCO - Imagino tudo isso. SÓCRATES - Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio. GLAUCO - Similar quadro e não menos singulares cativos! SÓCRATES - Pois são nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira? GLAUCO - Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida. SÓCRATES - E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as sombras? GLAUCO - Não. SÓCRATES - Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das sombras que vêem, lhes dariam os nomes que elas representam?

GLAUCO - Sem dúvida. SÓCRATES - E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse a s palavras dos que passam, não julgariam certo que os sons fo ssem articulados pelas sombras dos objetos? GLAUCO - Claro que sim. SÓCRATES - Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das figuras que desfilaram. GLAUCO - Necessariamente. SÓCRATES - Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os objetos cuja sombra antes via. Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados? GLAUCO - Sem dúvida nenhuma. SÓCRATES - Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora mostrados? GLAUCO - Certamente. SÓCRATES - Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais? GLAUCO - A princípio nada veria. SÓCRATES - Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior. Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais

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facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia. GLAUCO - Não há dúvida. SÓCRATES - Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é. GLAUCO - Fora de dúvida. SÓCRATES - Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na caverna. GLAUCO - É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões. SÓCRATES - Recordando-se então de sua primeira morada, de seus companheiros de escravidão e da idéia que lá se tinha da sabedoria, não se daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a sorte dos que lá ficaram? GLAUCO - Evidentemente. SÓCRATES - Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição, cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às primeiras ilusões e viver a vida que antes vivia? GLAUCO - Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos de preferência a viver da maneira antiga. SÓCRATES - Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como submersos em trevas? GLAUCO - Certamente. SÓCRATES - Se, enquanto tivesse a vista confusa -- porque bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade -- tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito entrasse em discussão

com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto? GLAUCO - Por certo que o fariam. SÓCRATES - Pois agora, meu caro Glauco, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos.

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QUESTÕES Tema - SOFISTAS, SÓCRATES E PLATÃO QUESTÕES OBJETIVAS UFU-2008 Marque a alternativ a que está de acordo com a célebre frase de Cícero: “Sócrates f oi o primeiro que desceu a f ilosof ia do céu e colocou-a nas cidades, e, também, introduziu-a nas casas e obrigou-a a indagar sobre a vida, os costumes e sobre as coisas boas e más.” (Tusculanae, 5,4) A) Cícero ref ere-se ao f ato de que Sócrates f undamentou toda a filosofia grega na teoria das Idéias de Platão. B) Cícero afirma que, graças a seu método empirista, Sócrates retirou as características mitológicas da inv estigação filosófica. C) Segundo Cícero, Sócrates f oi o primeiro a alterar a temática da f ilosof ia grega, mudando o foco das inv estigações cosmológicas para o domínio das coisas humanas. D) Cícero ref ere-se à grande inovação introduzida por Sócrates em Atenas, a saber: ministrar aulas de f ilosof ia nas próprias casas de seus discípulos. UFU-2007 A passagem abaixo, do diálogo platônico Protágoras, ref ere-se ao procedimento adotado por Sócrates.

“[...] Meu objetiv o é examinar a proposição, muito embora possa acontecer que tanto eu, que pergunto, como tu, que respondes, acabemos por ser examinados.” PLATÃO. Protágoras (333c). Trad.de Carlos Alberto Nunes. Belém: Edufpa, 2002, p. 82.

Escolha a alternativa que expressa corretamente o pensamento de Sócrates. A) A Filosof ia socrática consiste no exame de proposições com o fim de demonstrar que a virtude é relativ a, pois o “homem é a medida de todas as coisas”. B) O exame socrático não é somente um exame de proposições, mas um modo de testar a v ida e o modo de v iv er dos interlocutores. C) A Filosofia socrática consiste em testar a verdade das proposições aduzidas pelos f ilósof os pré-socráticos que inv estigav am o princípio fundamental da Natureza. D) A Filosofia socrática consiste no exame das proposições da arte retórica, que possibilita a prudência na administração da casa e na direção dos negócios da cidade. UFU-2007 Leia atentamente o trecho de Aristóteles, citado abaixo, e assinale a alternativ a que o interpreta corretamenente.

“Como já v imos há duas espécies de excelência: a intelectual e a moral. Em grande parte a excelência intelectual dev e tanto o seu nascimento quanto o seu crescimento à instrução (por isto ela requer experiência e tempo); quanto à excelência moral, ela é o produto do hábito [...]”. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Nov a Cultural, 1996.

A) A excelência moral é superior à intelectual porque é resultado do nascimento. B) A excelência intelectual é positiva e a moral negativ a. C) As excelências intelectual e moral anulam-se respectivamente. D) As excelências moral e intelectual possuem, respectivamente, origem no hábito e na instrução. UFU-2007 O trecho seguinte, do diálogo platônico Górgias, refere-se ao modo de f ilosof ar de Sócrates.

“Assim, Cálicles, desmanchas o nosso conv ênio e te desqualif icas para inv estigar comigo a v erdade, se externares algo contra tua maneira de pensar.” PLATÃO. Górgias. Trad. de Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 2002, p. 198, 495a.

Marque a alternativ a que expressa corretamente o procedimento f ilosóf ico empregado por Sócrates. A) A base da filosofia socrática é a procura da perf eição da alma, mediante o exame de si mesmo e dos concidadãos, que é a condição da excelência moral. A refutação socrática é, sobretudo, um modo de testar a verdade da excelência da vida. B) A base da f ilosof ia socrática é a procura da verdade acerca do conhecimento da Natureza e da maneira de pensar sobre os princípios racionais que gov ernam o cosmos a partir do conhecimento acumulado pelos f ilósof os anteriores. C) A base da f ilosof ia socrática é a ref utação, a partir de um conv ênio em busca da verdade, de todas as proposições de seus interlocutores com o intuito de demonstrar que o conhecimento das questões morais é impossív el. D) A base da f ilosof ia socrática é a educação mediante os discursos políticos e jurídicos encenados nos tribunais atenienses. Sócrates parte das proposições dos adv ersários para encontrar um discurso oposto que seja retoricamente persuasivo. UFU-2007 O trecho a seguir, do diálogo platônico Fédon, concerne ao modo de aquisição do conhecimento.

“É preciso, portanto, que tenhamos conhecido a igualdade antes do tempo em que, v endo pela primeira v ez objetos iguais, observ amos que todos eles se esforçavam por alcançá-la, porém lhe eram inferiores.” PLATÃO. Fédon. Trad. de Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 2002, p. 275, 75a.

A partir do fragmento apresentado, marque a alternativ a que expressa corretamente o pensamento de Platão sobre o conhecimento. A) Platão distingue uma realidade inteligível de outra sensível. O conhecimento de todas as coisas só é possível porque as percepções advindas dos sentidos desencadeiam a reminiscência das Formas inteligív eis, apreendidas pela razão antes do nascimento. B) Platão não distingue a realidade inteligív el de outra sensível. O conhecimento é o produto das sensações. O conhecimento nada mais é do que a reminiscência dessas sensações. C) Platão distingue duas ordens de realidade: o mundo sensível e a alma. O conhecimento de todas as coisas

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só é possív el porque as sensações informam a alma sobre o mundo sensível e, a partir disso, formam a reminiscência. D) Platão distingue duas ordens de realidade: o mundo sensível e o mundo dos deuses. O conhecimento só é possível porque a alma recebe uma informação divina antes que tenha percebido os objetos sensív eis, pois todo conhecimento vem dos deuses. UFU-2006 Leia atentamente o trecho do diálogo platônico Apologia de Sócrates:

Como se dá, caro amigo, ...não te env ergonhes de só te preocupares com dinheiro e de como ganhar o mais possív el, e quanto à honra e à f ama, à prudência e à verdade, e à maneira de aperfeiçoar a alma, disso não cuidas nem cogitas? PLATÃO, Apologia de Sócrates. Trad. de Carlos Alberto Nunes. Belém: EDUFPA, 2001. p. 130, 29d-e.

A partir do texto acima, escolha a alternativa que melhor exprime a ética socrática. A) Sócrates define a v irtude a partir de um conjunto de ações que são ensinadas aos discípulos por meio de exemplos. Somente a ciência constitui o saber, pois não se pode conhecer a essência da virtude. O aperf eiçoamento da alma só acontece atrav és do saber técnico, que permite ao homem v oltar-se para a prática do bem. B) O exame da alma constitui, para Sócrates, simultaneamente uma inv estigação acerca da verdade e a escolha de um modo de v ida v irtuoso. Na inv estigação sobre a essência das virtudes são empregadas a refutação e a ironia, que expurgam as f alsas opiniões acerca do bem e conduzem a razão para os verdadeiros v alores. C) O objetiv o da inv estigação f ilosóf ica é o exame da natureza e da cosmologia, pelo qual são delimitados os critérios racionais que permitem o abandono dos falsos v alores e que conduzem ao aperf eiçoamento da alma pela ciência. A inv estigação socrática não se ocupa das questões éticas e políticas. D) O aperf eiçoamento da alma só ocorre pelo abandono das preocupações éticas e pela inv estigação racional do discurso lógico. O exame f ilosóf ico é propiciado pela ref utação e pela ironia, que permitem a def esa de argumentos contrários e conf iguram as regras do discurso político persuasivo. UFU-2006

“— Supõe então uma linha cortada em duas partes desiguais; corta nov amente cada um desses segmentos segundo a mesma proporção, o da espécie visív el e o da inteligív el...” PLATÃO. A República, (509e). Lisboa: Calouste

Gulbenkian, 1996. O seguinte diagrama, conhecido como “símile da linha”, representa a descrição que é feita na citação acima da

República, na qual Platão distingue o mundo inteligível do mundo visív el.

Escolha a alternativa que melhor explica o esquema da “Linha” div idida. A) O segmento ADC representa a realidade inteligív el e se div ide em opiniões f ilosóf icas e Idéias. O segmento CEB representa o mundo visív el e se div ide em

percepções e sensações. B) O segmento ADC representa a realidade e as imagens míticas. O segmento CEB representa a realidade f ilosóf ica e as matemáticas, que usam as percepções sensíveis e as Formas. C) O segmento ADC refere-se às imagens e às coisas visíveis, que geram a suposição e a opinião. O segmento CEB corresponde ao inteligível e às Formas, apreendidas pelo pensamento e intelecção. D) O segmento CEB corresponde à proporção entre coisas v isíveis e coisas inv isíveis que compõem o mundo. O segmento ADC representa as Idéias, que são imitações e imagens do mundo v isív el e compõem o mundo inteligível. UFU-2005 Leia atentamente o excerto do diálogo platônico Eutífron.

“Recorda, porém, que não te pedi para demonstrar-me uma ou duas dessas coisas, dessas que são piedosas, mas que me explicasse a natureza de todas as coisas piedosas. Porque disseste, salv o engano, que existe algo característico que f az com que todas as coisas ímpias sejam ímpias, e todas as coisas piedosas, piedosas...” PLATÃO. Eutíf ron. In: Platão. São Paulo: Abril Cultural, 1999. Col. Os Pensadores, p. 41.

A partir do texto acima, escolha a alternativ a correta quanto ao procedimento filosófico empregado por Sócrates. A) A inv estigação socrática caracteriza-se pela pesquisa das Formas inteligív eis que seriam as causas de todas as manifestações particulares de uma noção. Os seres sensív eis existem porque “imitam” um modelo imutáv el e eterno que determina a “natureza de todas as coisas”. A aporia decorre da impossibilidade de se encontrar, nos seres sensíveis, um exemplo que corresponda perfeitamente à Idéia inteligível. B) A inv estigação socrática usa a pergunta: “o que é...?”, que tipif ica a inv estigação das características gerais e das f ormas distintiv as inv ariáveis de uma noção. A pesquisa de uma def inição adequada exerce um papel regulador para as respostas aceitáveis e inaceitáv eis. A ref utação consiste em descartar, mediante contradições, definições insuficientes, e a aporia manif esta a impossibilidade de uma def inição concludente. C) A investigação socrática conf igura o exame f ilosóf ico sobre a “piedade” e a “natureza característica” da alma.

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Ao contrário dos Filósofos da Natureza, Sócrates preocupa-se com o “exame da alma” e estabelece um modelo tri-partite da psykhé: uma parte apetitiva, uma irascível e outra racional. A ref utação socrática consiste em induzir os adv ersários da Filosofia à contradição e lev á-los ao estado de aporia. D) A investigação socrática é delimitada pelo exame de noções éticas como, por exemplo, a piedade, ou a coragem. Esse gênero de pesquisa resulta na distinção de uma “realidade sensív el”, formada por todos os particulares, e uma “realidade inteligív el”, representada pelas Formas. A ref utação socrática consiste na negação do dev ir como única e v erdadeira realidade, o que resulta num estado de aporia. UFU-2005

“A v irtude é, pois, uma disposição de caráter relacionada com a escolha e consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós, a qual é determinada por um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria prática. E é um meio-termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta; pois que, enquanto os vícios ou v ão muito longe ou f icam aquém do que é conv eniente no tocante às ações e paixões, a v irtude encontra e escolhe o meio-termo.”

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, II, 6. São Paulo: Nova Cultural, 1987. Col. Os

Pensadores, p. 33. Considerando o trecho acima e a concepção aristotélica de v irtude, assinale a alternativ a correta. A) A v irtude consiste na rejeição de todo prazer, resultado do uso da razão do homem sábio e corajoso que, contendo suas paixões, escolhe v iver de modo ascético e agir sempre com piedade e compaixão, dispondo-se a sacrif icar a qualquer momento a própria vida pelo próximo, pois, pleno de audácia e entusiasmo, não teme de forma alguma a morte. B) A v irtude é a f irme e irref letida determinação para superar uma condição v iciosa, como a coragem que, por se opor totalmente à covardia, def ine-se como temeridade ou audácia. C) A v irtude consiste numa capacidade equilibrada e racional de agir, como, por exemplo, a v erificada na coragem, medianeira entre o excesso de audácia que caracteriza a temeridade e a f alta de audácia ou excesso de medo do cov arde. D) A v irtude é a capacidade ou f orça do político corajoso que usa racionalmente os seus recursos para conserv ar o seu poder. UFU-2004 O trecho abaixo f az uma ref erência ao procedimento inv estigativ o adotado por Sócrates.

“O f ato é que nunca ensinei pessoa alguma. Se alguém deseja ouv ir-me quando f alo ou me encontro no desempenho de minha missão, que se trate de moço ou velho (...) me disponho a responder a todos por igual, assim os ricos com os pobres, ou se pref erirem, a f ormular-lhes perguntas, ouv indo eles o que lhes f alo”.

PLATÃO, Apologia de Sócrates. Belém: EDUFPA, 2001. (33 a-b).

Marque a alternativ a que melhor representa o “método” socrático. A) Sócrates nada ensina porque apenas transmite aquilo que ouv e do seu daímon. Seu procedimento consiste em discursar, igualmente para qualquer ouv inte, com longos discursos demonstrativ os retirados da tradição poética ou com perguntas que lev em o interlocutor a f azer o mesmo. A ironia é o expediente utilizado contra os adversários, cujo objetivo é somente a disputa v erbal. B) A prof issão de ignorância e a ironia de Sócrates f azem parte do seu procedimento geral de refutação por meio de perguntas e respostas breves (o élenkhos), e constituem um meio de rev erter os argumentos do interlocutor para fazê-lo cair em contradição. A ref utação socrática revela a presunção de saber do adv ersário, pela insuf iciência de suas definições e pela aporia. C) Sócrates nunca ensina pessoa alguma, porque a prof issão de ignorância caracteriza o modo pelo qual encoraja seus discípulos a adquirirem sabedoria diretamente do deus do Oráculo de Delf os. A ironia socrática é uma dissimulação que, pela zombaria, rev ela as v erdadeiras disposições de pequeno número dos que se encontram aptos para a Filosof ia. D) Sócrates nunca ensina pessoa alguma sem antes testar sua aptidão f ilosóf ica por meio de perguntas e respostas. Seu procedimento consiste em destruir as def inições do adv ersário por meio da ironia. A ignorância socrática encoraja o adv ersário a rev elar suas opiniões verdadeiras que, pela refutação, dão a medida da aptidão para a vida filosófica. UFU-2004 O trecho abaixo, que descrev e o momento da origem do Kosmos, f az uma ref erência ao paradigma platônico das Formas.

“Outro ponto que precisamos deixar claro é saber qual dos dois modelos tinha em vista o arquiteto quando construiu (o Kosmos): o imutáv el e sempre igual a si mesmo ou o que está sujeito ao nascimento? Ora, se este mundo é belo e f or bom o seu construtor, sem dúv ida nenhuma este f ixará a vista no modelo eterno; e se f or o que nem se poderá mencionar, no modelo sujeito ao conhecimento”.

PLATÃO. Timeu. Belém: EDUFPA, 2001. (28c-29-a).

Marque a alternativ a que caracteriza corretamente o modelo das Formas. A) Para explicar a origem do Kosmos, Platão divide todas as coisas em duas ordens inteiramente separadas e distintas: um modelo eterno, e outro sujeito ao nascimento e às mudanças. O primeiro é somente inteligív el e constitui o alvo da atividade f ilosóf ica. O segundo é sensív el, sujeito à destruição, e não tem qualquer relação ou parentesco com o modelo eterno que serv e de base para a arquitetura do mundo. B) Platão postula as Formas, um paradigma eterno, que constitui a causa e a origem de todas as coisas sensíveis. Seres sensíveis são o ef eito das causas inteligív eis, que lhes dão a existência e os nomes. As Formas, ou Idéias, são eternamente idênticas a si mesmas, imutáveis e unas. Tudo o que é sensív el existe porque participa das Formas e se assemelha a

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elas, do mesmo modo que uma imagem em relação ao modelo original. C) Na formação do Kosmos, Platão adota dois modelos: o modelo imutáv el e o modelo sujeito ao nascimento. O modelo imutáv el é constituído pelas Formas inteligív eis e serve de base para a arquitetura do mundo porque é belo e somente pensável. O modelo sujeito ao nascimento constitui as Formas sensíveis, que dão origem às coisas mutáv eis e destrutív eis. D) Platão postula dois modelos cosmológicos na sua Filosof ia: o modelo bom e eterno, e o modelo ruim e sensível. O modelo eterno representa o plano arquitetônico do kosmos, que se identif ica unicamente com o que é inteligív el. O modelo sensív el representa tudo o que é corporal. As Formas são uma duplicação inteligív el do mundo sensível e serv em para explicar o parentesco do pensamento com o divino. Questão 3

“A substância, no sentido o mais fundamental, primeiro e principal do termo, é o que não se af irma de um sujeito, nem ocorre num sujeito; por exemplo, o homem individual ou o cav alo indiv idual”.

ARISTÓTELES. Categorias, V, 2 a, p. 11-14. André é um homem branco, tem dois metros de altura, e hoje se encontra sentado na esquina, lendo um romance que o emociona a cada página. Considerando os textos acima, é correto af irma que A) o conceito aristotélico de substância expressa uma crítica ao abstracionismo da idéia platônica e, segundo Aristóteles, podemos afirmar que o essencial na descrição de “André” é o fato de que hoje ele se emociona na sua leitura. B) o conceito aristotélico de substância é um outro nome para idéia platônica e, segundo Aristóteles, podemos afirmar que “André” participa da idéia de homem. C) o conceito aristotélico de substância expressa uma crítica à teoria das idéias de Platão e, segundo Aristóteles, podemos considerar “André” como substância, homem como sua espécie e os outros atributos da sua descrição como acidentais. D) o conceito aristotélico de substância é uma idéia cuja existência encontramos em um mundo inteligível dif erente do sensível e, segundo Aristóteles, podemos considerar “André” como uma idéia e os outros atributos da sua descrição como as imagens que o complementam. UFU-2003

“Todo aquele que ama o saber conhece por experiência que, quando a f ilosof ia toma conta de uma alma, v ai encontrá-la prisioneira do seu corpo, totalmente grudada a ele. Vê que, impelida a observ ar os seres, não em si e por si, mas por meio desse seu caráter, paira por isso na mais completa ignorância. Mas mais se dá ainda conta do absurdo de tal prisão: é que ela não tem outra razão de ser senão o desejo do próprio prisioneiro, que é assim lev ado a colaborar da maneira mais segura, no seu próprio encarceramento”.

Platão, Fédon. Trad. Maria Tereza S. de Azev edo. Brasília: UnB, 2000, p. 66.

Após analisar o texto acima, assinale a alternativa correta. A) A ignorância é fruto da observ ação do que é em si e por si. B) A f ilosof ia para Platão é inata, não sendo necessário nenhum esforço de quem a ela se dedica para obtêla. C) A alma encontra-se prisioneira do corpo por desejo do próprio homem. D) A alma do f ilósof o encontra-se desde o início liberta dos entrav es do corpo como o demonstram, claramente, a Alegoria da Caverna e o texto acima. UFU-2003

“(…) Que pensamentos então que aconteceria, disse ela, se a alguém ocorresse contemplar o próprio belo, nítido, puro, simples, e não repleto de carnes, humanas, de cores e outras muitas ninharias mortais, mas o próprio div ino belo pudesse em sua forma única contemplar? Porv entura pensas, disse, que é v ida v ã a de um homem olhar naquela direção e aquele objeto, com aquilo [a alma] com que dev e, quando o contempla e com ele conv ive? Ou não consideras, disse ela, que somente então, quando v ir o belo com aquilo com que este pode ser v isto, ocorrer-lhe-á produzir não sombras de virtude, porque não é em sombras que estará tocando, mas reais virtudes, porque é no real que estará tocando?” Platão. O Banquete. Trad. José Cav alcante de Souza. São Paulo: Abril Cultural, 1979, pp.42-43.

A partir do trecho de Platão, analise as assertiv as abaixo: I – O belo v erdadeiro para Platão encontra-se no conhecimento obtido pela observação das coisas humanas. II – A contemplação do belo puro e simples é atingida por meio da alma. III – Cores e sombras são v irtudes reais, visto que se possa, ao tocar nelas, tocar no próprio real. IV – Há, como na Alegoria da Caverna, uma relação direta para Platão entre o conhecimento e a virtude. Assinale a alternativ a que contém as assertiv as corretas. A) I e II são corretas. B) II e IV são corretas. C) III e IV são corretas. D) I, II e III são corretas.

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UFU-2003

“Substância – aquilo a que chamamos substância de modo mais próprio, primeiro e principal – é aquilo que nem é dito de algum sujeito nem existe em algum sujeito, como, por exemplo, um certo homem ou um certo cavalo. Chamam-se substâncias segundas as espécies a que as coisas primeiramente chamadas substâncias pertencem e também os gêneros dessas espécies. Por exemplo, um certo homem pertence à espécie homem, e animal é o gênero da espécie; por conseguinte, homem e animal são chamados substâncias segundas”. Aristóteles. Categorias. Trad. Ricardo Santos. Porto: Porto Editora, 1995, p. 39.

Tendo o texto acima como referência, é correto af irmar que, segundo Aristóteles, A) a substância primeira, assim como o acidente, existe em algum sujeito e é dito dele. B) as substâncias segundas assemelham-se às Formas de Platão por ambas existirem em si e por si mesmas. C) as substâncias segundas são univ ersais que não existem por si mesmos, mas que podem ser conhecidos. D) a substância primeira dif erencia-se da substância segunda por esta última englobar todos os acidentes a ela pertencentes. UFU-2002

“Mas quem f osse inteligente (…) lembrar-se-ia de que as perturbações v isuais são duplas, e por dupla causa, da passagem da luz à sombra, e da sombra à luz. Se compreendesse que o mesmo se passa com a alma, quando v isse alguma perturbada e incapaz de v er, não riria sem razão, mas reparava se ela não estaria antes ofuscada por f alta de hábito, por vir de uma v ida mais luminosa, ou se, por v ir de uma maior ignorância a uma luz mais brilhante, não estaria deslumbrada por ref lexos demasiadamente refulgentes [brilhantes]; à primeira, deveria felicitar pelas suas condições e pelo seu gênero de v ida; da segunda, ter compaixão e, se quisesse troçar dela, seria menos risív el esta zombaria do que aquela que descia do mundo luminoso.” A República, 518 a-b, trad. Maria Helena da Rocha Pereira, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987.

Sobre este trecho do liv ro VII de A República de Platão, é correto af irmar. I - A condição de quem v ive nas sombras é digna de compaixão. II - O filósofo, sendo aquele que passa da luz à sombra, não tem problemas em retornar às sombras. III - O trecho estabelece uma relação entre o mundo visível e o inteligível, fundada em uma comparação entre o olho e a alma. IV - No trecho, é afirmado que o conhecimento não necessita de educação, pois quem se encontraria nas sombras f acilmente se acostumaria à luz. Marque a alternativa que contém todas as af irmações corretas.

A) II e III B) I e IV C) I e III D) III e IV UFU-2002

“(…) enquanto tiv er ânimo e puder f azê-lo, jamais deixarei de filosof ar, de vos adv ertir, de ensinar em toda ocasião àquele de vós que eu encontrar, dizendo-lhe o que costumo: ‘Meu caro, tu, um ateniense, da cidade mais importante e mais reputada por sua sabedoria, não te env ergonhas de cuidares de adquirir o máximo de riquezas, f ama e honrarias, e de não te importares nem pensares na razão, na v erdade e em melhorar tua alma?’ E se algum de v ós responder que se importa, não irei embora, mas hei de o interrogar, examinar e ref utar e, se me parecer que afirma ter adquirido a v irtude sem a ter, hei de repreendê-lo por estimar menos o que v ale mais e mais o que v ale menos (…).” PLATÃO. Apologia de Sócrates, 29 d-e.

A partir do trecho acima de Platão, é correto af irmar que para Sócrates I - a Filosof ia é um saber que se transmite como lições morais, v isto ele conheça a verdade. II - o f ilosof ar é uma ativ idade que busca a v erdade e a melhora da alma pela ref utação de falsos saberes. III - o questionamento ao interlocutor só ocorre se este espontaneamente se dispuser a responder às questões f ormuladas por Sócrates. IV - a posse de bens materiais é para ele um valor inquestionáv el. Assinale a alternativ a que contém as afirmativ as corretas. A) Apenas II e III. B) Apenas I e II. C) Apenas I e IV. D) Apenas III e IV. UFU-2001

“Mas a f aculdade de pensar é, ao que parece, de um caráter mais divino, do que tudo o mais; nunca perde a f orça e, conf orme a volta que lhe derem, pode tornar-se vantajosa e útil, ou inútil e prejudicial. Ou ainda não te apercebeste como a deploráv el alma dos chamados perversos, mas que na verdade são espertos, tem um olhar penetrante e distingue claramente os objectos para os quais se v olta, uma v ez que não tem uma v ista fraca, mas é forçado a estar a serviço do mal, de maneira que, quanto mais aguda f or sua v isão, maior é o mal que pratica?” (Platão, A República, trad. Maria Helena Rocha Pereira, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1987, 518e-519a)

A partir da leitura do texto acima, é correto afirmar que, para Platão, A) a f aculdade de pensar necessita da educação, para que, assim, a vista mais penetrante alcance, pela luz, a visão do que deve ser conhecido.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 20

B) o conhecimento para esse filósofo só depende da capacidade visual daquele que conhece. C) a natureza, fav orecendo alguns, diferencia os mais aptos, e é unicamente por esta distinção que se dev em estabelecer os gov ernantes da cidade. D) os homens com maior capacidade de pensar jamais praticam o mal, pois descobrem, por si mesmos, a dif erença entre o justo e o injusto. UFU-2001 Sobre a teoria das quatro causas de Aristóteles é correto afirmar: I- É próprio da ciência investigá-las, pois são as causas do mov imento e do repouso, ou seja, da passagem da potência ao ato. II- A causa eficiente atua sobre a f orma, v isto ser a matéria o ato a que aspiram os seres. III- A causa final é própria daquele ser que deve atualizar as potências contidas em sua matéria para alcançar a f inalidade própria. IV- A forma é o princípio de indeterminação dos seres. Assinale a única alternativa que apresenta as assertivas corretas. A) Apenas I e III. B) I, III e IV. C) Apenas II e III. D) Apenas I e II. QUESTÕES DISCURSIVAS UFU-2007 Leia o seguinte trecho do Protágoras, escrito por Platão, e explique: 1) o objeto de investigação da Filosofia socrática; 2) o procedimento discursiv o empregado nessas inv estigações; 3) a relação entre v irtude e saber.

“– Meu único objetiv o, lhe disse, ao apresentar-te todas essas perguntas, não é outro senão o de examinar os problemas relativ os à virtude e o que v enha a ser a virtude em si mesma [...]”. PLATÃO, Protágoras (360e). Trad. de Carlos Alberto Nunes. Belém: Eduf pa, 2002. 2ª ed. p. 121.

UFU-2006

E na v erdade, o que desde os tempos antigos, assim como agora e sempre, constitui o eterno objeto de pesquisa e o eterno problema: “que é o ser”, equiv ale a este: “que é a substância”. ARISTÓTELES. Metafísica, VII, 1. Trad. de Marcelo Perine. São Paulo: Loyola, 2002. p. 289.

Considerando o assunto abordado no trecho acima, A) explique o conceito de substância. B) cite quatro outras categorias aristotélicas. UFU-2006 Em div ersos diálogos platônicos, a personagem de Sócrates é caracterizada por um procedimento inv estigativ o ref utatório que se contrapõe ao gênero de discurso empregado pelos mestres de retórica.

Tomando o seguinte extrato do Górgias como ponto de partida, explicite: A) os temas que compõem o campo de investigação da Filosof ia socrática; B) o modo como a ref utação socrática opera.

“–...Receio contestar-te para que não penses que falo menos pelo prazer de esclarecer o assunto em discussão do que por motivos pessoais. (..)E em que número me incluo? Entre as pessoas que têm prazer em ser refutadas, no caso de afirmarem alguma inverdade, e prazer também em refutar os outros, se não estiver certo, do mesmo modo, o que disserem, e que tanto se alegram com serem refutadas como em refutarem... ”. PLATÃO. Górgias. (457e-458a). Belém: EDUFPA, 2002. p. 142-143.

UFU-2004 Platão é conhecido, na história da Filosofia, como o f ilósof o que propôs a hipótese da existência de uma ordem de realidade inteligív el que é, ao mesmo tempo, distinta dos seres sensív eis e em relação com eles.

– “Logo – prosseguiu Sócrates – não compreendo nem posso admitir aquelas outras causas científ icas. Se alguém me diz por que razão um objeto é belo, e afirma que é porque tem cor ou f orma, ou dev ido a qualquer coisa desse gênero – afasto-me sem discutir, pois todos esses argumentos me causam unicamente perturbação. Quanto a mim, estou f irmemente conv encido, de um modo simples e natural, e talv ez até ingênuo, que o que faz belo um objeto é a existência daquele belo em si, de qualquer modo que se f aça a sua comunicação com este. O modo por que essa participação se ef etua, não o examino neste momento; af irmo apenas, que tudo o que é belo é belo em virtude do Belo em si”. PLATÃO, Fédon, 100 c-d. 5ª ed. São Paulo: Nov a Cultural, 1991, p. 107 (Os Pensadores).

A partir do trecho do Fédon explicite: A) a hipótese proposta por Platão; B) a relação entre essas duas ordens de realidade. UFU-2004 No liv ro V da Metafísica, Aristóteles serviu-se das seguintes palav ras para def inir acidente:

Acidente significa: (1) o que adere a uma coisa e dela pode ser af irmado com v erdade, porém não necessariamente, nem habitualmente; por exemplo, se alguém ao cavar um buraco para plantar uma árv ore, encontra um tesouro. Esse f ato – o encontro do tesouro – é um acidente para o homem que cav ou o buraco, pois nem uma coisa prov ém necessariamente da outra ou v em depois dela, nem é habitual descobrir tesouros quando se planta uma árvore. ARISTÓTELES. Metafísica [liv ro V, 30, 1025a 1-25] Trad. de Leonel Vallandro. Porto Alegre: Globo, 1969, p. 140.

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Com base na descrição de Aristóteles apresentada acima, explique qual é a causa responsáv el pelo acidente. UFU-2003

“Sendo, pois, de duas espécies a v irtude, intelectual e moral, a primeira, por v ia de regra, gera-se e cresce graças ao ensino - por isso requer experiência e tempo; enquanto a v irtude moral é adquirida em resultado do hábito, donde ter se formado o seu nome ética [êthiké] por uma pequena modif icação da palavra hábito [éthos]. Por tudo isso, ev idencia-se também que nenhuma das v irtudes morais surge em nós por natureza; com ef eito, nada do que existe naturalmente pode formar um hábito contrário à sua natureza. Por exemplo, a pedra que por natureza se mov e para baixo não se pode imprimir o hábito de ir para cima, ainda que tentemos adestrá-la jogando-a dez mil v ezes no ar; nem se pode habituar o fogo a dirigir-se para baixo, nem qualquer coisa que por natureza se comporte de certa maneira a comportar-se de outra”. Aristóteles. Ética a Nicômaco. São Paulo: Abril Cultural, 1973. Coleção “Os Pensadores”. p. 267.

A partir da análise do texto acima, estabeleça, em primeiro lugar, a distinção entre virtude intelectual e moral; mostre, a seguir, por que a v irtude moral não surge em nós por natureza. UFU-2002 Leia, abaixo, o trecho de Platão, extraído da Apologia de Sócrates.

“(…) descobrem uma multidão de pessoas que supõem saber alguma coisa, mas que na v erdade pouco ou nada sabem. (…) e af irmam que existe um tal Sócrates (…) que corrompe a juv entude. Quando se lhes pergunta por quais atos ou ensinamentos, não têm o que responder; não sabem, mas para não mostrar seu embaraço apresentam aquelas acusações que repetem contra todos os que f ilosof am: ‘as coisas do céu e o que há sob a terra; o não crer nos deuses; f azer prev alecer o discurso e a razão mais f raca’. Isso porque não querem dizer a v erdade: terem dado prov a de que f ingem saber, mas nada sabem.”

Apologia, 23 c-e. A partir do trecho apresentado acima, responda às seguintes questões. A) Para Platão, qual a v erdadeira acusação que se f az contra Sócrates? B) Quais elementos característicos da f ilosofia socrática podem ser extraídos deste trecho? C) Que acusações, tendo em v ista as características específicas da f ilosofia de Sócrates, são apresentadas como não tendo f undamento? UFU-2001

"Fica sabendo que o que transmite verdade aos objetos que podem ser conhecidos e dá ao sujeito que conhece esse poder, é a idéia do

bem. Entende que é ela a causa do saber e da v erdade, na medida em que esta é conhecida, mas, sendo ambos assim belos, o saber e a v erdade, terás razão em pensar que há algo de mais belo ainda do que eles. E, tal como se pode pensar corretamente que neste mundo a luz e a v ista são semelhantes ao sol, mas já não é certa tomá-las como pelo sol, da mesma maneira, no outro, é correto considerar a ciência e a v erdade, ambas elas semelhantes ao bem, mas não está certo tomá-las, a uma ou a outra, pelo bem, mas sim f ormar um conceito mais elev ado do que seja o bem." (Platão. A República, 5. ed, tradução de Maria Helena da Rocha Pereira. Porto: Fundação Calouste Gulbenkian, 1987. 508e – 509a).

A partir da análise do trecho acima pergunta-se: para Platão a verdade do conhecimento necessita ou não de uma norma superior? Justif ique a resposta explicando a analogia que Platão estabelece entre o inteligível e o sensível.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 22

UNIDADE II - FILOSOFIA MODERNA

1. René Descartes e o Racionalismo Moderno

“Penso, logo existo” Descartes

Os séculos XV e XVI foram marcados por

importantes mudanças e, paradoxalmente, pela manutenção de muitos aspectos da velha ordem medieval. Se por um lado o mapa político da Europa contava, então, com reinos unificados que conferiam aos reis o papel de comandantes de seu povo, por outro lado a nobreza continuava explorando uma massa de camponeses, cujo cotidiano não era muito diferente do de seus antepassados. Do mesmo modo, se as idéias renascentistas e a Reforma Religiosa haviam enfraquecido a Igreja Católica, eram as idéias da escolástica – aproximando a filosofia da religião – que ainda predominavam, mesmo nas universidades. Por esse motivo, muitos pensadores deixavam de ser atraídos por esses centros do conhecimento, que tanta importância haviam exercido no período anterior.

Para o homem comum europeu havia

outro aspecto a ser considerado: que garantia se poderia ter quanto à validade das novas verdades apresentadas, se tantas dúvidas tinham sido levantadas sobre as verdades e certezas que vigoraram durante séculos?

O Renascimento havia aberto muitas portas, mas acreditava-se que o caminho do

verdadeiro conhecimento ainda estava para ser percorrido. Já se havia instalado de maneira irreversível a crença de que a chave para se poder trilhar esse caminho era a razão. Ela asseguraria a verdade das idéias, dos princípios, das leis, do conhecimento, enfim. A partir do século XVII promoveu-se um avanço importante: essa razão articulava-se em um método.

A palav ra método v em do grego methodos ( meta, “rumo”, e hodos, “caminho”) e pode ser def inida como “o caminho para chegar a um lugar desejado” ou “o conjunto de procedimentos e regras para alcançar o resultado almejado”.

A preocupação em encontrar um caminho

seguro para o conhecimento já se expressava, como vimos, no pensamento de Bacon, que viveu as três primeiras décadas do século XVII, chamado de o século do método. Sua ênfase foi, porém, sobre a experiência, o que não acontecerá com os demais filósofos desse período. Como boa parte deles era composta de grandes matemáticos, buscarão aplicar o método matemático como instrumento da razão, conduzindo-a a um conhecimento verdadeiro.

O entusiasmo desse s fi lósofos pelas “matemáticas” ( aritmética, álgebra e geometria ) fará nascer a idéia de que o sucesso dessa ciência se deve ao método e que o método matemático poderá ser utilizado em todas as outras áreas da investigação, garantindo a exatidão e a certeza dos conhecimentos alcançados. O que se utilizaria como método não seria a matemática em si, os números, o cálculo, e sim o procedimento dedutivo da geometria, isto é, o modo próprio da matemática de encadear as razões ou afirmações segundo uma certa ordem. Isso significa dizer, no limite, que os fi lósofos do século XVII passaram a acreditar que o conhecimento do mundo poderia ser alcançado pelo uso exclusivo da razão, pois haveria uma racionalidade, uma explicação, nas coisas correspondentes à racionalidade das pessoas. Essa racionalidade se expressaria de modo geométrico, lógico, dedutivo, o que caracterizaria a visão específica do racionalismo moderno ou grande racionalismo, conforme veremos nesse capítulo.

O termo racionalismo, no sentido geral, é empregado para designar a concepção de que nada existe sem que haja uma razão para isso. Assim, uma pessoa racionalista seria alguém que procura sempre uma explicação lógica para as coisas, acredita que por meio de mecanismos racionais pode explicar tudo.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 23

Em filosofia, denominam-se racionalistas as doutrinas que buscam explicar o processo de conhecimento colocando ênfase no papel da razão. A teoria da reminiscência de Platão é um exemplo da teoria racionalista: segundo ela, já nascemos com as idéias verdadeiras, mas, como as esquecemos, a filosofia nos faz recordar dessa s verdades. O fi lósofo grego também dizia que o conhecimento obtido com os números e suas relações é mais seguro que aquele resultante dos sentidos. ( visão, audição, etc.).

De modo semelhante, o racionalismo desenvolvido pela maioria das filosofias do século XVII afirmará que todo conhecimento certo provém de princípios a priori ( anteriores à experiência ), indiscutíveis e evidentes para a razão, como, por exemplo, o princípio de não-contradição ( “A não pode ser não-A” ou “o quadrado não pode ter três lados” ). Esse racionalismo também considerava que os sentidos são uma fonte confusa, obscura e provisória de verdade, o que relegará a experiência sensível (dos sentidos) a um segundo plano, como fonte de conhecimento. Caracteriza-se, assim, um dos pólos de discussão fundamental na história da filosofia, aquela que trata das origens do conhecimento. A resposta racionalista será dada fundamentalmente por Descartes. O outro pólo, o empirista ( do grego empeiria, “experiência”), será representado pelos filósofos ingleses que estudaremos mais adiante, tendo como destaque a fi losofia de David Hume.

As idéias de Descartes

A faculdade de julgar bem e distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente

aquilo que se chama bom senso ou razão, é, naturalmente, igual em todos os homens.

Descartes

O filósofo que sintetiza o espírito do século XVII, tanto por seu racionalismo como por sua originalidade, é Descartes (1596-1650). Nascido em La Haye, região de Touraine, na França, pertencia a uma família de burgueses enobrecidos. Estudou letras no colégio jesuíta de La Fleche, na época uma das melhores instituições de ensino da Europa, onde se ensinavam latim, grego, poesia, gramática e retórica, além de fi losofia, que reunia metafísica, física, lógica, matemática e ética. Descartes, porém, não se satisfazia com o que aprendia, pois considerava que a filosofia não apresentava “ainda uma só coisa sobre a qual não se dispute”, razão pela qual as ciências não poderiam construir nada de sólido, na medida em que seus princípios são tomados na filosofia, essa base de “fundamentos tão pouco firmes”. O filósofo vivia a crise de seu tempo, em que as descobertas científicas contradiziam a física e a cosmologia aristotélica, conduzindo a uma separação entre ciência e filosofia. Essa cisão, no entanto, não era aceitável para o filósofo, que recebera em La Fleche formação aristotélico-tomista, cujo pensamento oferecia um conjunto explicativo do universo, por meio da metafísica e da física. Para Descartes, portanto, a solidez do saber dependeria sempre da coesão e do encadeamento de todas as suas partes, o que o levaria a tentar resgatar o caráter de sistema do pensamento. A insatisfação leva Descartes a deixar os estudos de letras e a iniciar, em 1619, uma série de viagens pela Europa, disposto a conhecer “o grande livro do mundo”. Durante a Guerra dos Trinta Anos, alista-se como voluntário nos exércitos de Maurício de Nassau, da Holanda, e do duque Maximiliano da Baviera (Alemanha), mas parece ter atuado mais como observador do que como combatente. Em 1628, instala-se na Holanda, onde vive por cerca de 20 anos, resolvido a estudar também “a si próprio”. Viaja para a Suécia em 1649, a convite da rainha Cristina, mas não resiste ao rigoroso inverno nórdico e morre em Estocolmo, a 11 de fevereiro de 1950, vítima de pneumonia.

Definição de Sistema Em f ilosofia, entende-se por sistema o conjunto de doutrinas básicas que v isa responder a todas as questões filosóficas fundamentais, relativas ao mundo, ao homem, à sociedade, ao comportamento humano, etc. Antes de Descartes, os grandes construtores de sistemas f ilosóf icos foram Platão e Aristóteles, na Antiguidade, e Santo Tomás, na Idade Média. Acima, na imagem, vemos o f ilósof o alemão Kant, que construiu um dos mais sólidos sistemas f ilosóf icos da história da filosofia.

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A árv ore do Saber e as regras do método

Descartes definira para si a missão de construir um sistema filosófico completo, isto é, ele pretendia unificar a filosofia, o que era quase uma redundância, pois para ele a fi losofia verificava “um perfeito conhecimento de todas as coisas que o homem pode saber, tanto para a conduta de sua vida como para a conservação de sua saúde e a invenção de todas as artes”. Em Princípios da Filosofia, o filósofo representa a unificação do conhecimento por meio da imagem da “árvore do saber”, na qual as raízes são a metafísica, o tronco é a física e os ramos são a mecânica, a medicina e a moral. A metafísica tem, portanto, papel fundamental: é ela a base sobre a qual se sustentam todas as outras ciências. Por sua vez, a posição da física na árvore do saber revela a visão mecanicista do filósofo em relação à realidade, uma vez que a física era o tronco do qual sairiam as demais ciências. Isso significa que a mecânica, moral e medicina serão explicadas tendo por base os corpos e seus movimentos. Note-se que a teologia está fora do projeto cartesiano, marcando definitivamente a separação entre ciência e religião.

A possibilidade de unificar o

conhecimento, isto é, de construir uma ciência universal, dependeria de se encontrar o fundamento comum a todas as ciências

particulares. Esse fundamento comum será a mathesis universalis, ou matemática universal. Desde cedo Descartes se aplicara intensamente ao estudo das matemáticas e, entusiasmado com os resultados que obtivera, acreditara ser possível transferir seu instrumental a outras áreas do saber. Não foi por acaso que isso aconteceu. Ele se util izou da concepção da nova física proposta por Galileu (1564-1642 ), que dizia que a natureza está escrita em linguagem matemática. Assim, Descartes construirá seu método de investigação calcado no modelo matemático de demonstração.

E por que o modelo matemático parecia tão bom? Descartes percebeu haver nas matemáticas aquilo que queria encontrar no mundo: verdades absolutas e incontestáveis. Como o filósofo justificou, em suas correspondências com intelectuais, que as demonstrações matemáticas eram evidentes ao intelecto, ou seja, livres de contradição; seu poder de persuasão “vem de uma razão tão forte que nenhuma mais forte jamais pode abalá-la”. Por exemplo, um triângulo sempre terá três lados e a soma de seus ângulos internos nunca deixará de ser 180 graus. Se alguém disser o contrário, já não estaremos mias falando de um triângulo e sim de alguma outra coisa.

Para alcançar essa certeza que só as matemáticas têm, Descartes adotou em seu método filosófico o mesmo procedimento lógico-demonstrativo da geometria analítica. Isso porque ele acreditava na existência de uma ordem natural inerente ( isto é, por natureza, inseparavelmente ligada ) à estrutura do conhecimento e que essa ordem fosse semelhante à progressão matemática, na qual “quando se têm os dois ou três primeiros termos, não é difícil encontrar os outros”. Ele recomendaria, aliás, a prática de exercícios de geometria ou de aritmética como forma de cultivar no espírito os princípios de seu método. Mas, se a matemática é o fundamento comum a todas as ciências, por que ela não faz parte da árvore do saber? Porque, sendo apenas um meio, um exercício, ela fornecerá apenas um método.

O método cartesiano (adjetivo que deriva de Cartesius, forma latina do nome Descartes) encontra-se detalhadamente apresentado em sua obra Regras para a direção do espírito, composta de 21 regras. Em Discurso do método, Descartes sintetiza esse método por meio de quatro preceitos ou regras que prescreve para si e que não devem ser jamais esquecidos na busca do conhecimento verdadeiro. Regra da Ev idência O primeiro é o de jamais acolher coisa alguma como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal; isto é, de evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção, e de nada incluir em meus juízos que não se apresentasse tão clara e tão distintamente ao

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meus espírito, que eu não tivesse nenhuma ocasião de pô-lo em dúvida. Aqui, Descartes propõe que na construção de uma teoria, de um sistema, de um argumento racional, partir sempre daquilo que se apresenta como mais evidente, ou seja, que não possa ser questionado, que não reflita meus preconceitos pessoais. Regra da Análise O segundo, o de dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las. Para Descartes, a solução de um problema seria facilitada pela divisão do problema em vários

tópicos. Quanto maior a divisão, maior a facilidade para busca de solução. Regra da Síntese O terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo u ma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros. Não confundir os conceitos de “fácil” com “simples”. A simplicidade aqui quer dizer “menor número de elementos”.

A imagem à esquerda é mais simples porque tem um número menor de elementos (não tem texturas, sombras tão complexas quanto a imagem à direita). A equação (1) abaixo é mais simples do que a equação (2) por ter menor número de elementos. (1) a + 2 = 0 (2) x2 + 2·ab + y2 = 0 Na geometria, o ponto é o elemento de maior simplicidade, pois não tem sequer dimensão. Regra da Rev isão E o último passo, o de fazer em toda parte enumerações tão completas e revisões tão gerais que eu tivesse a certeza de nada omitir.

Da dúv ida metódica ao Cogito

Munido de um método, Descartes parte para a construção de seu sistema fi losófico. A primeira regra do método cartesiano, transcrita acima, prescreve acolher como verdadeiro apenas o que se apresente ao espírito de forma clara e distinta e que não deixe nenhuma dúvida. Esse preceito implica, portanto, não apenas a atitude com que se deve conduzir a busca do conhecimento verdadeiro, mas também, e fundamentalmente, que o critério de verdade para Descartes é a evidência, ou seja, a clareza e distinção com que uma idéia se apresente à razão. Por idéia clara e distinta entende-se aquela que pode ser apreendida em sua totalidade pelo espírito atento e que não pode ser confundida com nenhuma outra. Aí surge o primeiro grande problema. Qual é essa idéia? Que idéia possui essa força? O que se pode conhecer com certeza?

A resposta não parece fácil. Descartes descobre que é possível duvidar de tudo, pela variabilidade dos costumes, das opiniões, das crenças, etc. À semelhança dos céticos, resolve levar sua vida a extremos, rejeitando “como falso

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tudo aquilo em que pudesse imaginar a menor dúvida”. Assim, em busca, como Arquimedes, de um ponto fixo para sobre ele basear o seu projeto de reconstrução do saber, descartes constrói a dúvida metódica, pois é metodicamente necessário colocar tudo em dúvida. Ela será também uma dúvida radical, já que tinge tudo sem exceção, e hiperbólica, porque exagera, chega a extremos da generalização.

Nas Meditações metafísicas, Descartes apresenta uma série de argumentos demonstrando a importância de se colocar todas as “certezas” aparentes que vão metódica e progressivamente destruindo as “falsas certezas”:

Primeiro, ele coloca em dúvida tudo aquilo que se conhece pelos sentidos, apesar desse conhecimento parecer “o mais verdadeiro e seguro”, pois se os sentidos já nos enganaram algumas vezes nada nos garante que eles não estejam nos enganando de novo. Por exemplo: um gato que, à luz do crepúsculo, vemos como pardo, durante o dia se revela de outra cor.

Depois, destrói as certezas mais difíceis de se duvidar, como as que temos sobre ser alguém (uma menina, um homem, etc.), ter algo (um livro, um cachorro, etc.), estar num lugar

fazendo alguma coisa, pois podemos estar sonhando. Quantas vezes não tivemos um sonho tão vívido que nos parecia real?

Em seguida, para destruir as certezas matemáticas, como a de que dois mais três é igual a cinco, Descartes supõe que Deus, todo-poderoso, por algum motivo queira nos enganar toda vez que realizamos essa adição ou que tenhamos ou que tenhamos qualquer outra certeza de mesma natureza.

Por último, reforçando o argumento do Deus enganador, imagina a existência de um gênio maligno e enganador, que se diverte em enganar pessoas.

Mergulhado em tantas dúvidas, descartes tem uma intuição: ele nota com clareza que duvida e, se duvida, pensa. Não importa se o que ele pensa é um pensamento verdadeiro, não importa que ele não tenha certeza; existe, porém, a consciência de que pensa. Então formula em latim, “Cogito, ergo sum”, que significa “Penso, logo existo”. Trata-se da primeira certeza, do ponto fixo procurado, momento fundamental da reflexo cartesiana. Descartes obtém o primeiro princípio da filosofia que procurava, e que ficou conhecido simplesmente como Cogito (pronuncia-se “cogito”). Ele percebeu com clareza e distinção (seu critério para saber se algo é verdadeiro) que é uma res cogitans, isto é, uma “coisa que pensa”, um ser ou substância pensante: Sou uma coisa que pensa, isto é, que duvida, que afirma, que nega, que conhece poucas coisas, que ignora muitas, que ama, que odeia, que quer, que não quer, que também imagina e que sente. Pois (...) conquanto as coisas que sinto e imagino não sejam talvez absolutamente nada fora de mim e nelas mesmas, estou, entretanto, certo de que essas maneiras de pensar (...) residem e se encontram dentro de mim.

Meditações, Descartes.

A existência de Deus e das coisas

O Cogito, então, é a primeira certeza. Poderia ele levar ao conhecimento de outras coisas? O fi lósofo já sabe com certeza que tem idéias e que, portanto, a existência de idéias é certa; só não é certa a existência das coisas das quais procederiam as idéias. Ele sabe que existe, por exemplo, a idéia de livro, mas não tem certeza se existe concretamente um objeto que causa essa idéia de livro. Em outras palavras, o

No filme Matrix (1999), dos irmãos Wachowski, o gênio enganador é um sistema de inteligência artificial.

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filósofo sabe apenas que as idéias existem, mas isso não é suficiente para fundamentar o edifício do saber que ele pretende construir, pois precisa provar que é possível conhecer as coisas do mundo e, antes disso, que elas existem.

Mas como Descartes coloca em dúvida se o mundo existe, ele supõe que poderia ser ele próprio a causa de suas idéias: as idéias de mesa, fogo, cobertor seriam criadas em sua própria mente. Procura, então, por uma idéia que não possa ter ele mesmo como causa e encontra a idéia de um ser perfeito (Deus), que não pode ter como causa um ser imperfeito (ele próprio, Descartes). O filósofo chega a essa conclusão porque entendia que o efeito de uma coisa não pode ser mais do que a causa:

Por exemplo, a pedra que ainda não foi, não pode agora começar a ser, se não for produzida por uma coisa que possui em si, formalmente ou eminentemente, tudo o que entra na composição da pedra, ou seja, que contém e m si as mesmas coisas ou outras mais excelentes do que aquelas que se encontram na pedra.

Meditações, Descartes

Em outras palavras, para o filósofo, toda causa tem de ter em si as mesmas coisas, ou mais, que seu efeito. Assim, o único ser que poderia causar a idéia de perfeito é um ser perfeito, e um ser perfeito é Deus. Isso significa que Deus existe, pois se não existisse, não poderia causar a idéia do perfeito que existe nele, Descartes. E, para Descartes, a idéia de Deus só poderia ser uma idéia inata, isto é, “ela nasceu e foi produzida comigo desde o momento em que fui criado”.

Assim, a prova da existência de Deus dá ao fi lósofo a sua segunda certeza: não só ele, Descartes, existe como ser pensante, mas também Deus existe. E uma vez que Deus, um ser sem imperfeições, não pode ser enganador, o filósofo recupera a certeza nas idéias claras e distintas. Por exemplo, a idéia de que dois mais três é igual a cinco é verdadeira, pois não existe um Deus todo-poderoso querendo enganar as pessoas o tempo todo.

E o mundo? Ele existe? Agora que Descartes recuperou a certeza das idéias claras e distintas, ele reconhece que também existem idéias claras e distintas sobre a realidade exterior: aquelas que dizem respeito à essência geométrica do mundo material, ou seja, as noções de largura, comprimento e profundidade. ( A idéia de uma mesa, por exemplo, traz implícita suas dimensões espaciais. ) Portanto, para Descartes, se o critério de verdade é clareza e distinção de uma idéia, a realidade que ele reconhece nos corpos como possível de se conhecer com certeza é a sua extensão, ou seja, as propriedades quantitativas e não as qualitativas ( cor, odor, sabor, etc. ). Isso significa

que o conhecimento certo e seguro do mundo externo será possível apenas no que diz respeito a essa s propriedades quantitativas, geométricas, matemáticas, as únicas que podem ser reconhecidas pela razão. Em outras palavras, o universo propriamente sensível, por sua certeza, isto é, por não garantir à consciência a certeza das idéias claras e distintas, não poderá ser objeto de conhecimento.

O Dualismo e o Subjetivismo Cartesiano

A separação entre res cogitans e res extensa na metafísica cartesiana inaugura uma concepção dualista da realidade, isto é, aquela que separa totalmente a realidade espiritual da realidade material. Essa noção marcou profundamente todas as áreas do conhecimento até os nosso s dias. A divisão entre essa s duas substâncias tem como conseqüência o fato de, para o filósofo, a mente e o corpo serem também duas coisas totalmente separadas e distintas.

Outra conseqüência dessa divisão é a separação entre o sujeito ( o ser que pensa) e o objeto ( o ser pensado ), na qual o sujeito assume a função ordenadora do conhecimento. Isso se explica pelo fato de que, em Descartes, conforme vimos, o pensamento encontra em si (o Cogito e as idéias claras e distintas) os fundamentos que permitirão aceitar algo como verdadeiro. Essa característica da filosofia cartesiana é denominada subjetivismo.

O subjetivismo, por sua vez, faz com que o conhecimento do mundo seja possível apenas por meio das idéias das coisas, isto é, da representação. Representação é, de modo geral todo conteúdo presente na mente. Na concepção tradicional, ou realista, representação é a conversão das coisas em idéias dessas coisas. Par a filosofia aristotélico-tomista, tudo aquilo que o espírito representa já foi alguma vez objeto de percepção, isto é, já foi uma representação sensível, pois todo o conhecimento do mundo seguiria sempre uma trajetória que vai das coisas, por meio dos sentidos, para o intelecto, onde se formam as idéias. Observe-se que Descartes faz o caminho inverso: ela vai das idéias das quais tem certeza para as coisas.

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3. O Criticismo de Immanuel Kant

Nossa época é a época da crítica, a que tudo deve se submeter.

Immanuel Kant

Kant (1724-1804), para muitos o maior filósofo da Idade Moderna, foi o primeiro pensador da Aufklärung, ou Esclarecimento, designação pela qual ficou conhecida a fi losofia das luzes na Alemanha, que na época não passava de um aglomerado de Estados independentes, unidos pela cultura e língua alemãs. O principal desses Estados era a Prússia, governada por Frederico II, o Grande (1712-1786), um monarca culto, admirador dos iluministas franceses, que concedia liberdade de pensamento e adquiriu a reputação de “rei-filósofo”.

Kant nasceu em Königsberg (hoje Kaliningrado), pequena cidade situada a oeste da Prússia (hoje território russo). Filho de um humilde artesão, estudou na universidade local, da qual se tornou professor brilhante e até reitor. Pequeno e frágil, Kant levou uma existência extremamente metódica, sem grandes acontecimentos. Nunca se casou e, apesar de tornar-se internacionalmente famoso ainda em vida, jamais saiu de sua cidade natal até o seu falecimento.

A Nova Rev olução Copernicana

Kant foi o primeiro dos grandes filósofos modernos a produzir seu pensamento dentro de

uma universidade, como acadêmico, isto é, professor universitário de filosofia. Isso não acontecia desde a Idade Média e só viria a se tornar comum a partir do século XX. Na época em que lecionava, o pensamento racionalista ainda era muito forte entre os pensadores da Aufklärung, sobretudo por influência do filósofo alemão Christian Wolff (1679-1754), herdeiro intelectual de Leibniz e igualmente professor universitário.

Kant foi um estudioso dos iluministas franceses, que desenvolveram um pensamento empirista e uma crítica incansável contra as idéias autoritárias e dogmáticas. Assim, com o mesmo espírito questionador de sua época, o filósofo se empenhou na crítica da própria razão, instaurando, como ele mesmo diz, “um tribunal que, ao mesmo tempo que assegure suas legítimas aspirações, rechace todas as que sejam infundadas”.

Desde Descartes, o s fi lósofos se dedicavam à investigação do conhecimento na tentativa de explicar como ele se dá e sobre o que é possível conhecer. Os racionalistas deram a sua resposta, baseada no poder absoluto da razão e na possibil idade de explicar tudo; os empiristas reagiram destacando a importância dos sentidos e seus limites. Kant achava que tanto os sentidos como a razão são fatores determinantes no processo de conhecimento das coisas e, portanto, não adotou nenhuma das duas posições. Para ele, ambas apresentavam acertos e erros e seria possível obter melhores resultados se elas fossem sintetizadas numa perspectiva totalmente nova de abordagem do conhecimento.

É o que faz o filósofo em sua primeira obra, Crítica da Razão Pura, publicada quando ele tinha 57 anos de idade. Nela Kant recorda o sucesso de Copérnico quando o astrônomo, percebendo que os princípios explicativos da teoria geocêntrica se fragilizavam diante de novas constatações, resolveu tirar a Terra do centro do universo e colocar o Sol em seu lugar, fazendo nosso planeta girar ao redor da estrela. O filósofo alemão propõe então fazer o mesmo com a questão do entendimento, ou seja, inverter o lugar determinante que ocupa o objeto nas abordagens tradicionais, pois, para ele, são “os objetos que têm de se regular pelo nosso conhecimento”. Isso quer dizer que quando, por exemplo, vemos um objeto qualquer, a imagem que se forma em nossa mente não é determinada por esse objeto e sim o contrário, isto é, nós, através do nosso modo próprio de perceber as coisas, é que determinamos e formamos essa imagem. É assim, com uma nova revolução copernicana, que nasce a filosofia crítica de Kant. Vejamos como tudo isso pode ficar mais claro.

As formas da sensibilidade

Immanuel Kant (1724- 1804)

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Kant entendia, como os empíricos, que todos os nosso s conhecimentos começam com a experiência, isto é, no momento em que entramos em contato sensível com as coisas. Mas ele achava que esse conhecimento não é simplesmente dado pelas coisas, como se o sujeito que conhece ficasse totalmente passivo no processo. Por isso, ele buscou saber como é o sujeito puro, a priori, isto é, o sujeito antes de qualquer experiência sensível – que se denomina, em sua filosofia, sujeito transcendental –, e chegou à conclusão de que o sujeito possui certas faculdades que possibilitam e determinam a experiência e o conhecimento.

Uma dessa s faculdades é a sensibilidade. O filósofo observou que, quando percebemos e representamos em nossa mente qualquer coisa externa, essa representação é sempre feita no tempo e no espaço. Por exemplo: quando vejo um carro andando, percebo que esse carro se desloca por um certo espaço em um determinado tempo; quando ouço um ruído, percebo esse ruído como breve ou demorado e vindo de uma determinada direção; quando assisto a uma corrida que termina empatada, percebo esse fato como a chegada de dói corredores a um mesmo lugar no mesmo instante.

Kant conclui então que tempo e espaço são condições a priori de possibilidade da experiência sensível ou intuição empírica. Em outras palavras, tempo e espaço não são abstrações ou algo que existe fora de nós: eles constituem formas da sensibilidade, isto é, são ferramentas humanas inatas e necessárias ao homem para que ele possa construir toda a sua experiência do mundo. Essa s formas da sensibil idade atuam como fi ltros ou lentes que definem como podemos perceber a realidade, ou, para usar de outra comparação, são como receptáculos ou vasilhas vazias que vão sendo preenchidas com alguma matéria, isto é, os conteúdos que compõem as sensações. Quando vejo, ouço, presencio alguma coisa – por exemplo, um avião que corta o céu –, todas as sensações que se produzem em mim trazidas pelos órgãos dos sentidos são jogadas nessas vasilhas (tempo e o espaço), que então as ordenam na minha consciência para compor a experiência desse fato.

As formas do entendimento

Kant observou também que, quando enunciamos um juízo, uma afirmação qualquer, como, por exemplo, "o calor dilata os corpos", ocorre uma síntese das representações "calor" e "dilatação dos corpos". Essa síntese, diz o filósofo, é feita por outra faculdade humana: o entendimento ou faculdade de pensar ou de julgar. Todo juízo é, portanto, uma síntese efetuada pelo entendimento, que unifica as

múltiplas representações que aparecem na sensibil idade.

Analisando os diversos juízos possíveis, Kant percebeu que todos se articulam de acordo com certos princípios lógicos ou regras, apresentando formas básicas ou puras, isto é, destituídas de qualquer conteúdo e anteriores a qualquer experiência vivida pelas pessoas. Assim, do mesmo modo que existem formas da sensibil idade (espaço e tempo), Kant diz que existem formas do entendimento. A partir delas se estabelecem conceitos puros, a priori, que existem desde sempre em nossa consciência, como os conceitos de causa, necessidade e substância, que são o que o fi lósofo denomina categorias. São as categorias que permitem pensar tudo aquilo que chega com a intuição ou experiência sensível.

Vejamos um exemplo de uma categoria muito importante para as ciências da natureza e para a nossa vida diária: o conceito de causa (ou causa e efeito). Quando entramos numa sala aquecida pelo sol da tarde, a partir apenas dessa intuição ou experiência sensível podemos dizer "O sol brilha na sala" e "A sala está quente". Se, em seguida, relacionamos essas duas intuições, subordinando uma à outra, podemos concluir: "O sol aquece a sala". Kant diz que fazer essa relação é algo inerente ao entendimento humano que não consegue deixar de empregar o princípio de que "todo efeito tem de ter uma causa". O mais importante e inovador é que a causa não está nas coisas - como pensar a maioria das pessoas -, nem tampouco uma ficção criada pelo hábito - como dissera Hume -, pois, para Kant, a noção de causalidade é algo que deriva do nosso entendimento, isto é, nós é que criamos essa relação. Isso quer dizer que entender a natureza é projetar sobre ela as nossa s formas próprias de conhecimento. A razão, assim, toma-se a grande legisladora do conhecimento da natureza, conforme ele explica em Crítica da razão pura:

A razão tem de ir à natureza-[...] não porém na qualidade de um aluno que deixa ditar tudo o que o professor quer mas na de um juiz nomeado, que obriga as testemunhas, a responder às perguntas que lhes propõe.

A crítica à metafísica

Se projetamos sobre a natureza as nossa s formas próprias de conhecer, o conhe-cimento do mundo 'se restringe, pois nunca poderemos saber com certeza como o mundo é em si, mas apenas como ele aparece para nós. Kant contribui assim para a história da fi losofia com uma importante distinção: a "coisa em si" e a "coisa para nós". Tudo o que conhecemos do mundo são as "coisas para nós", os fenômenos - aquilo que aparece para nós já filtrado pelas formas da sensibilidade. A "Coisa em si" - que

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Kant denomina númeno (do grego noumenon, "coisa pensada") - não pode ser percebida pela razão humana porque ultrapassa a experiência possível.

O processo de conhecer o mundo, para Kant, é mais ou menos como fotografar uma brincadeira de criança (vide foto abaixo). As fotos da festa registram apenas àquilo que a câmera é capaz de captar: imagens congeladas, sem sonoridade nem movimentação. Nessa analogia, a brincadeira representa a "coisa em si"; a máquina fotográfica é o sujeito com suas formas, seu aparelho próprio de conhecer; a imagem, corresponde à "coisa, para nós", o fenômeno, aquilo que aparece para nós; e a foto constitui a experiência possível, a representação do fenômeno.

A partir dos resultados dessa investigação, o fi lósofo criticará a pretensão da metafísica de querer conhecer "o ser enquanto ser", as "coisas em si" - e pretende fazer isso como ciência, como conhecimento teórico. Kant afirma que isso não é possível, que há aí um uso ilegítimo dá razão, ao se pretender conhecer aquilo que ultrapassa a experiência possível. O homem não pode provar que Deus existe, que a alma é imortal, que o universo é infinito, que o homem é livre. E, quando tenta fazer isso,

surgem as antinomias da razão pura (juízos que se contradizem em tese e antítese, sem que haja falhas lógicas de raciocínio), pois nessas questões tanto parecerá provável uma coisa como o seu contrário (por exemplo, a existência e a não-existência de Deus) e sempre será possível refutar as duas posições.

A brincadeira representa a "coisa em si"; a máquina fotográfica é o sujeito com suas formas , seu aparelho pr óprio de conhecer; a imagem, corresponde à "coisa, para nós", o fenômeno, aquilo que aparece par a nós; e a foto cons titui a experiência possível, a representação do fenômeno.

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QUESTÕES TEMA - TEORIA DO CONHECIMENTO – DESCARTES E KANT QUESTÕES OBJETIVAS UFU-2008 Leia atentamente o texto abaixo.

“Kant distinguiu duas modalidades de realidade. A realidade que se of erece a nós na experiência e a realidade que não se of erece à experiência. A primeira foi chamada por ele de fenômeno [...]. A segunda f oi chamada por ele de nôumeno [...]” [ou coisa em si].

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 1995. p. 233.

Em relação aos conceitos de f enômeno e coisa em si, conf orme formulados por Kant, marque a alternativa correta. A) Kant designa por coisa em si a parte da experiência que pode ser conhecida pelo intelecto no tempo e no espaço. B) A coisa em si designa exatamente aquilo que uma ciência deve conhecer em um objeto empírico. C) A crítica kantiana dirige-se contra as aparências. É por isso que Kant af irma ser impossível conhecer os f enômenos. D) O mundo f enomenal contém os objetos que podem ser captados pela nossa sensibilidade e ser apresentados no espaço e no tempo. UFU-2007

“Mas, logo em seguida, adv erti que, enquanto eu queria assim pensar que tudo era f also, cumpria necessariamente que eu, que pensava, f osse alguma coisa. E, notando que esta v erdade: eu penso, logo existo, era tão f irme e tão certa que todas as mais extrav agantes suposições dos céticos não seriam capazes de a abalar, julguei que podia aceitá-la, sem escrúpulo, como o primeiro princípio da Filosof ia que procurav a.” DESCARTES. R. Discurso do método. Coleção

Os Pensadores. São Paulo: Nov a Cultural, 1987, p. 46.

Considerando a citação acima, é correto af irmar que A) na tentativa de pôr tudo em dúv ida, Descartes não consegue duvidar da existência do cogito (eu penso). B) pautando-se pelo exemplo dos céticos, Descartes não pretende encontrar nenhum conhecimento, pois quer apenas pensar que tudo é falso. C) o pensamento de Descartes se restringe à constatação de que toda inf ormação sensív el e corpórea é f alsa. D) na busca do primeiro princípio da Filosof ia, Descartes põe o próprio cogito (eu penso) em dúvida. UFU-2006 Leia com atenção o texto abaixo e assinale a alternativ a correta.

“De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as

coisas, cumpre enf im concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente v erdadeira todas as v ezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito.”

DESCARTES. Meditações Metafísicas. Nova Cultural: São Paulo, 1988, p. 47.

Segundo Descartes, podemos dizer que a idéia da existência do eu ou do cogito (eu penso) A) é f ictícia ou inventada e composta. B) é inata ou congênita e composta. C) é adventícia ou empírica e simples. D) é inata ou congênita e simples. UFU-2005 Podemos afirmar que são preceitos do método cartesiano: A) a af irmação exclusiva da verdade do Cogito, a reunião de dif erentes dificuldades em um só todo e a ordenação que prescreve o trânsito das impressões sensíveis às idéias. B) a aceitação do verossímil como v erdadeiro, a div isão das dif iculdades e a ordenação que prescreve o trânsito do simples ao complexo. C) a aceitação exclusiv a do evidente como v erdadeiro, a div isão das dif iculdades e a ordenação que prescreve o trânsito do complexo ao simples. D) a aceitação exclusiva do indubitáv el como v erdadeiro, a div isão das dif iculdades e a ordenação que prescreve o trânsito do simples ao complexo. UFU-2005 Em relação ao conceito de f enômeno, conf orme f oi apresentado por I. Kant, assinale a alternativa INCORRETA. A) Este conceito refere-se ao que não pode ser dado numa experiência, e, nesse sentido, designa também o que pode ser conhecido como coisa em si. B) Este conceito designa todos os objetos que podem ser intuídos no espaço e no tempo. C) Este conceito ref ere-se a todos os objetos acerca dos quais pode ser produzido conhecimento objetiv o e v erdadeiro pelas ciências empíricas. D) Este é um conceito f undante da crítica kantiana, pois permite separar os objetos da experiência dos que não podem estar contidos em qualquer experiência possível. UFU-2004

“Até agora se supôs que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos; porém, todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer alto a priori sobre os mesmos, através do que nosso conhecimento seria ampliado, f racassaram sob esta pressuposição. Por isso, tente-se v er uma vez não progredimos melhor nas tarefas da Metafísica admitindo que os objetos têm que se regular pelo nosso conhecimento, o que assim já concorda melhor com a requerida possibilidade de um conhecimento a priori dos mesmos que dev e estabelecer algo sobre os objetos antes de nos serem dados. O mesmo aconteceu com os pensamento de Copérnico que, depois das coisas não quererem andar

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muito bem com a explicação dos movimentos celestes admitindo-se que todo exército de astros girav a em torno do espectador, tentou v er se não seria mais bem-sucedido se deixasse o espectador mover-se e, em contrapartida, os astros em repouso”. KANT, I. Crítica da Razão Pura. São Paulo: Nov a Cultural, 1987, p. 14. (Os pensadores).

Considerando a leitura do trecho acima, podemos dizer que a rev olução copernicana de Kant é A) uma rev olução f ilosóf ica e científ ica segundo a qual o espectador não pode permanecer f ixo em sua posição, aprendendo apenas os f enômenos, mas deve considerar que ele mesmo encontra-se em movimento para poder perceber as coisas em si mesmas. B) uma rev olução astronômica que pretendeu mudar o curso da Filosof ia Moderna, propondo umareav aliação da f ísica newtoniana. C) uma rev olução filosófica que estabeleceu que o conhecimento da coisa em si só pode ser atingido caso haja um cuidadoso estudo dos fenômenos. D) uma rev olução f ilosófica que af irmou a distinção entre f enômeno e coisa em si, qualif icando esta última como incognoscível. UFU-2004 No escrito publicado postumamente, Regras para a orientação do espírito, Descartes f ez o seguinte comentário:

“Mas, toda v ez que dois homens f ormulam sobre a mesma coisa juízos contrários, é certo que um ou outro, pelo menos, esteja enganado. Nenhum dos dois parece mesmo ter ciência, pois, se as razões de um homem f ossem certas e ev identes, ele as poderia expor ao outro de maneira que acabasse por lhe conv encer o entendimento.”

DESCARTES, René. Regras para a orientação do espírito.

Trad. de Maria Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 6-7.

Para alcançar a verdade das coisas, isto é, o conhecimento certo e ev idente, é necessário um método composto de regras muito simples que evitem os enganos e as opiniões prov áveis. Segundo Descartes, somente duas ciências podem auxiliar na f undamentação do método para a inv estigação da v erdade, são elas: A) teologia e f ilosof ia. B) mecânica e física. C) fisiologia e f ilologia. D) aritmética e geometria. UFU-2004

“E certamente a idéia que tenho do espírito humano, enquanto é uma coisa pensante e não extensa, em comprimento, largura e prof undidade, e que não participa de nada que pertence ao corpo, é incomparavelmente mais distinta do que a idéia de qualquer coisa corporal.” DESCARTES. Meditações metafísicas. Nov a Cultural: São Paulo, 1988, p. 47. Os pensadores.

Em relação à idéia de espírito humano, é correto af irmar: A) é um idéia inata, isto é, não nascida comigo, que não f oi posta em mim no meu nascimento e que só posso formar a partir da experiência sensív el. B) é uma idéia inata, que nasceu comigo, que só encontro em mim mesmo enquanto coisa pensante. C) é uma idéia abstrata que resulta de um longo processo de comparação da minha consciência com as dos outros homens. D) é uma idéia adventícia que resulta de um longo processo de dúvida sobre todas as coisas. UFU-2003 A respeito dos juízos analíticos e dos juízos sintéticos em Kant, é correto afirmar que: A) Juízos analíticos ou de experiência são aqueles em que a relação entre o sujeito e seu predicado é pensada sem identidade; juízos sintéticos ou af irmativos são aqueles em que há identidade entre o sujeito e seu predicado. B) Juízos analíticos ou afirmativ os, são aqueles que resultam da identidade do sujeito com seu predicado; os juízos sintéticos ou de experiência são aqueles que são pensados sem a identidade entre o sujeito e seu predicado. C) Juízo analítico é f undado sobre a experiência, porque o f undamento é sempre o testemunho da experiência; os juízos sintéticos, que são princípios de identidade, não acrescentam ao sujeito nenhum predicado nov o. D) Juízos analíticos, resultantes da identidade do sujeito com o seu predicado, podem ser denominados de juízos de ampliação; os juízos sintéticos, nos quais não há identidade, podem ser denominados de juízos de elucidação. UFU-2002 O criticismo de Kant representa a reação do pensamento do Século das Luzes à polarização decorrente do racionalismo e do empirismo do século anterior. Logo, na introdução da sua obra Crítica da razão pura, Kant def ende a realização da rev olução copernicana na f ilosofia. Sobre esta rev olução, analise as assertivas abaixo. I - A f ilosofia, até então, sempre se guiou pelos instintos, deixando sempre no plano inferior o objeto do conhecimento. II - Nas ativ idades filosóficas é preciso que o objeto seja regulado pelo conhecimento humano, o conhecimento a priori. III - O conhecimento a priori resulta da f aculdade de intuição, cuja comprov ação é alcançada com a experiência. IV - Só é v erdadeiro o conhecimento resultante da experiência, quando esta toma o objeto como a coisa em si mesma, sem o auxílio da razão. Assinale a alternativ a que contém as assertiv as v erdadeiras. A) Apenas II e IV. B) Apenas I, II e IV. C) Apenas II e III. D) Apenas I, III e IV.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 33

UFU-2001 A respeito da distinção entre o conhecimento puro e o conhecimento empírico, tal como são apresentados na Crítica da Razão Pura de I. Kant, analise as assertiv as abaixo: I) O conhecimento empírico resulta da experiência sensível e é expresso pelas impressões, portanto, trata-se de um conhecimento a priori. II) O conhecimento a priori é um conhecimento puro e independente de todas as impressões dos sentidos, portanto, liv res dos elementos empíricos. III) O conhecimento puro, a priori, é um juízo pensado com universalidade rigorosa, de modo que tal juízo não aceita nenhuma exceção. IV) O conhecimento empírico, a posteriori, é um juízo analítico, pois ele só é possív el por intermédio de um conhecimento analítico dos conceitos. Assinale a alternativ a que contém as assertiv as v erdadeiras: A) II e III B) I, II e IV C) I, III e IV D) III e IV UFU-2001 Leia com atenção a citação e, em seguida, analise as assertivas.

"E, tendo notado que nada há no eu penso, logo existo, que me assegure de que digo a verdade, exceto que v ejo muito claramente que, para pensar, é preciso existir, julguei poder tomar por regra geral que as coisas que concebemos mui clara e mui distintamente são todas v erdadeiras, hav endo apenas alguma dificuldade em notar bem quais são as que concebemos distintamente." DESCARTES, Discurso do Método. São Paulo:

Abril Cultural, 1973. p. 55. Coleção "Os Pensadores".

I- Este "eu" cartesiano é a alma e, portanto, algo mais difícil de ser conhecido do que o corpo. II- O "eu penso, logo existo" é a certeza que funda o primeiro princípio da Filosof ia de Descartes. III- O "eu", tal como está no Discurso do Método, é inteiramente distinto da natureza corporal. IV- Ao concluir com o "logo existo", f ica ev idente que o "eu penso" depende das coisas materiais. Assinale a alternativa cujas assertivas estejam corretas. A) Apenas II e IV. B) I, II, IV. C) Apenas III e IV. D) Apenas II e III. QUESTÕES DISCURSIVAS UFU-2004

“Na f ilosofia e no pensamento modernos, a dúv ida ocupa a mesma posição central que, em todos os séculos anteriores, cabia ao thaumazein (admirar-se) dos gregos, o assombro diante de tudo o que é como é. Descartes f oi o primeiro a conceituar esta forma

moderna de duvidar, que depois dele passou a ser o motor evidente e inaudível que vem mov endo todo pensamento, o eixo invisív el em torno do qual o pensamento tem girado”. ARENDT, Hannah. A Condição Humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 286.

Considere o texto acima e A) aponte as características e os momentos da dúv ida cartesiana; B) explique como Descartes obtev e o primeiro conhecimento certo. UFU-2003 Descartes afirmou no Discurso do método que a boa condução da razão na pesquisa da verdade das coisas dev e ser feita em poucas regras. Sendo assim, o primeiro dos quatro preceitos básicos do seu método diz o seguinte: jamais acolha alguma coisa como v erdadeira que não conheça evidentemente como tal. A aplicação desta primeira regra evita dois grav es def eitos. Responda: quais são e como se caracterizam os dois def eitos a que se ref ere Descartes? UFU-2002 De acordo com Descartes:

a razão (...) “é naturalmente igual em todos os homens; e, destarte, que a diversidade de nossas opiniões não provém do fato de serem uns mais racionais do que outros, mas somente de conduzirmos nossos pensamentos por v ias div ersas e não considerarmos as mesmas coisas. Pois não é suf iciente ter o espírito bom, o principal é aplicá-lo bem.”

DESCARTES. Discurso do Método, para bem conduzir a própria razão e procurar a verdade nas ciências. São Paulo: Nova Cultural, 1987,

p.29. Com relação ao f ragmento acima, responda. Quais são as v ias diversas, que prejudicam a boa aplicação da razão? UFU-2002 Leia com atenção a exposição dos preceitos f undamentais do Método, f eito por Descartes.

“O primeiro era de jamais acolher alguma coisa como v erdadeira que não conhecesse ev identemente como tal; (...). O segundo, o de div idir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las. O terceiro, o de conduzir por ordem os meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais f áceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, (...) e o último, o de f azer rev isões tão gerais, que eu tiv esse a certeza de nada omitir.”

DESCARTES. Discurso do Método. Coleção “Os Pensadores”. São Paulo: Abril Cultural,

1987. A ef etiv ação do método ocorre graças ao esforço do pensamento que objetiva descobrir a v erdade das coisas existentes. Tomando o texto de Descartes por ref erência, indique as quatro operações mentais que

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Olimpo – F ilosofia – pág. 34

cada um dev e f azer para executar o método proposto pelo f ilósofo francês. UFU-2001 O exercício da dúv ida é o procedimento identif icado com o ceticismo. Descartes, no entanto, utilizou do expediente da dúvida com outro propósito. A respeito de sua conduta e o comportamento dos céticos, Descartes manifestou-se na Terceira Parte do Discurso do Método:

“Não que imitasse, para tanto, os céticos, que duv idam apenas por duv idar e af etam ser sempre irresolutos: pois, ao contrário, todo o meu intuito tendia tão-somente a me certificar e remov er a terra mov ediça e a areia, para encontrar a rocha ou a argila.”

R. Descartes. Discurso do Método. São Paulo: Nov a Cultural, 1987. Coleção “Os Pensadores”.

Com base na citação acima, explique o uso da dúv ida e a f inalidade do seu emprego. UFU-2001 O comentário abaixo foi feito por Kant (1724-1804) para justif icar o início do nov o estágio da f ilosof ia moderna, almejado com a sua obra Crítica da Razão Pura.

"Até agora se supôs que todo nosso conhecimento tinha que se regular pelos objetos; porém, todas as tentativas de mediante conceitos estabelecer algo a priori sobre os mesmos, atrav és do que o nosso conhecimento seria ampliado, f racassaram sob esta pressuposição."

Kant. Crítica da Razão Pura. São Paulo: Nov a Cultural, 1987. p.14. Coleção "Os Pensadores".

A partir desta citação, explique em que consiste a Rev olução Copernicana realizada por Kant na filosofia.

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UNIDADE V – FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA

Jean-Paul Sartre e o Existencialismo

"Ser livre não é ter o poder de fazer não importante o quê, é poder ultrapassar o dado para um futuro aberto."

Simone de Beauvoir "O importante não é o que fazem do homem. mas o que ele faz do que fizeram dele."

Sartre Jean-Paul Charles Aymard Sartre (1905-1980) foi um filósofo existencialista francês do início do século XX. Nasceu em Paris, no dia 21 de junho de 1905. O pai faleceu dois anos depois e a mãe, Anne-Marie Schweitzer, mudou-se para Meudon, nos arredores da capital, a fim de viver na casa de Charles Schweitzer, avô materno de Sartre. Sobre a morte do pai, escreverá mais tarde: “Foi um mal, um bem? Não sei; mas subscrevo de bom grado o veredicto de um eminente psicanalista: não tenho Superego”.

Seja como for, talvez a ausência da figura paterna em sua vida possa explicar por que Sartre se tornou um homem radicalmente livre, tomada a expressão no sentido que ele lhe dará posteriormente: não existe uma natureza humana, é o próprio homem, numa escolha livre porém “situada”, quem determina sua própria existência.

Outro traço marcante na formação de Sartre foi a imaginação criativa, alimentada pela leitura precoce e intensiva: “...por ter descoberto o

mundo através da linguagem, tomei durante muito tempo a linguagem pelo mundo. Existir era possuir uma marca registrada, alguma porta nas tábuas infinitas do Verbo; escrever era gravar nela seres novos foi a minha mais tenaz ilusão , colher as coisas vivas nas armadilhas das frases...” Como conseqüência, aos dez anos de idade quis tornar-se escritor e ganhou uma máquina de escrever. Seria seu instrumento de trabalho por toda a vida.

A filosofia de JP Sartre propõe que a existência precede a existência. Na fi losofia tradicional esse ordem é invertida. Desde Platão, a preocupação da Filosofia é com o Universal (essencial, nas palavras de Platão) em detrimento do particular (o existente). Ou seja, a essência das coisas determina a sua existência. Por exemplo, o que determina a existência de uma caneta é a idéia (essência) da caneta, dirá Platão. Pensando na contramão, Satre proporá que a existência toma o lugar principal na discussão filosófica, partindo de questões cotidianas, mas caminhando em direção à universalidade.

Na nova atitude, o filósofo de "carne e osso", que se envolve com questões cotidianas, se inclui a si mesmo no pensar, que até então se propunha objetivo e distanciado da vida real.

O existencialismo sartriano sofre influências de Husserl. Heidegger, Jaspers e Max Scheler, chegando até as obras de Kierkegaard, filósofo dinamarquês que se lançou contra a filosofia especulativa, opondo-lhe a fi losofia existencial. Sua produção intelectual foi fortemente marcada pela Segunda Guerra Mundial e pela ocupação nazista da França. Podemos dizer que há um Sartre de antes da guerra e outro do pós-guerra, talo impacto da Resistência Francesa sobre sua concepção política de “engajamento”. Engajamento significa a necessidade de o pensador estar voltado para a análise da situação concreta em que vive tornando-se solidário nos acontecimentos sociais e políticos de seu tempo.

Pelo engajamento, a liberdade deixa de ser apenas imaginária e teórica e passa a e star situada e comprometida na ação. Assim, ao escrever a peça de teatro As moscas, que versa sobre o mito grego de Oreste e Electra, Sartre na verdade faz uma alegoria da ocupação alemã em Paris. Com essa obra, inaugura o chamado "teatro de situação".

Ao lado da escritora Simone de Beauvoir, também filósofa existencialista e sua companheira de toda a vida, Sartre participou da vida política não só da França, mas mundial. Apesar de marxista, nunca deixou de criticar o autoritarismo, sobretudo quando as forças soviéticas invadiram a Tchecoslováquia. Saía à rua em protestos e, com a imunidade que lhe conferia a sua figura de cidadão do mundo, vendia nas esquinas La Cause du Peuple (A Causa do Povo) jornal maoísta, sem que ninguém ousasse prendê-lo.

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Sartre pertence à ala dos filósofos existencialista ateus, entre os quais se inclui Merleau-Ponty; na ala cristã, temos Gabriel Marcel.

Existência versus Essência

Em 1945, Sartre realiza uma conferência que se torna célebre: "O existencialismo é um humanismo” (com tradução para o português na coleção Os Pensadores, da ed. Abril Cultural).

Ele procurava então defender o

existencialismo das criticas que lhe eram feitas e explicar para um público leigo alguns dos conceitos dessa fi losofia. Afinal, como ele próprio afirma, "(...) a maioria das pessoas que util iza este termo (existencialismo) ficaria bastante embaraçada se tivesse de justificá-lo (...). Na verdade, essa palavra assumiu atualmente uma amplitude tal, e uma tal extensão, que já não significa rigorosamente nada".

O existencialismo forjou uma das expressões mais conhecidas do vocabulário filosófico: "A existência precede a essência". O que ela significa?

Se pensarmos nos objetos que conhecemos, concluirmos que antes de existirem efetivamente, eles são concebidos segundo uma "receita" de como produzi-Ias, têm uma finalidade pré-estabelecida. Por exemplo, antes de se fazer um corta-papel, há uma concepção e uma técnica de como fazê-lo, e ele é feito com uma finalidade precisa que está na mente do fabricante antes que exista de fato como cortador de papel. Ou seja, antes de o corta-papel ser esse objeto que posso manipular, havia o projeto dele: sabíamos como produzi-lo e para que serviria. Nesse caso, podemos dizer que a essência (a idéia de corta-papel) precede a existência (o próprio objeto corta-papel).

Ora, para o existencialismo esse raciocínio não pode ser aplicado aos seres humanos. Para compreendermos a razão disso, é preciso saber que o existencialismo sartriano é

ateu, ou seja, pressupõe a não existência de um Deus criador onipotente. Assim, se não há um Deus criador, se não há um Deus para conceber o homem e lhe dar uma finalidade prévia (tal como o artesão faz com o corta-papel), um Deus que construiria o homem à sua imagem e semelhança, então o homem simplesmente existe, e a sua "essência" será apenas aquilo que ele fizer de si mesmo.

Por isso especifica que ao contrário das coisas e animais, no homem a existência precede a essência, e isso

(...) significa que o homem primeiramente existe, se descobre, surge no mundo; e que depois se define. O homem, tal como o concebemos existencialista, se não é definível, é porque primeiramente não é nada. Só depois será alguma coisa e tal como a si próprio se fizer. Assim, não há natureza humana, visto que não há Deus para a conceber. O homem, é não apenas como ele se concebe, mas como ele quer que seja, como ele se concebe depois da existência, como ele se deseja após este impulso para a existência; o homem não é mais que o que ele faz. Tal é o primeiro princípio do existencialismo.

J.-P. Sartre. O existencialismo é um humanismo.

A moral existencialista

Segundo Sartre, a existência precede a

essência porque o homem é antes de tudo liv re. Não há destino, vontade de Deus. Em todas as suas ações, o homem só pode contar consigo mesmo. Ora, isso implica uma nova responsabilidade. Não podemos mais aderir ao bem porque essa é a vontade de Deus e porque temos medo da punição divina. Ou seja, a moral tradicional, baseada nos valores cristãos, não serve para essa fi losofia. Assim, o existencialismo filosófico chega à necessidade de se fundar uma nova moral, uma moral laica, sem Deus.

Talvez essa perspectiva tenha ajudado a ligar o pensamento de Sartre a uma atitude de rebeldia e contribuído pura a popularização do existencialismo. Entretanto, o próprio filósofo procura lembrar que sua doutrina "não pode ajudar" aquelas pessoas ávidas de escândalo e agitação, que, ao contrário, o existencialismo é uma doutrina "austera", ainda que facilmente definível.

Qual é a diferença entre o homem e as

coisas? É que só o homem é livre. O homem nada mais é do que o seu projeto de vida. A palavra projeto significa, etimologicamente. "ser lançado adiante" (projetado), assim como o sufixo “ex”, da palavra existir, significa "fora". Ora, só o homem existe porque o existir do homem é um "para-si", ou seja, sendo consciente, o homem é

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um "ser-para-si", pois a consciência é auto-reflexiva, pensava sobre si mesma, é capaz de pôr-se "fora" de si. Neste sentido, coisas e animais não “existem”, pois não são ser-para-si, ou seja, não conseguem pensar em si mesmos, não têm autoconsciência.

Portanto, a consciência do homem o distingue das coisas e dos animais, que são "em si" (o contrário de “para si”), ou seja, como não são conscientes de si, também não são capazes de se colocar "do lado de fora" para se auto-examinarem.

O que acontece ao homem quando se percebe "para-si", aberto à possibilidade de construir ele próprio a sua existência? Descobre que, não havendo essência ou modelo para lhe orientar o caminho, seu futuro se encontra disponível e aberto, estando, portanto, irremediavelmente "condenado a ser l ivre". É o próprio Sartre que cita a frase de Dostoievski em Os irmãos Karamazov: "Se Deus não existe, então tudo é permitido", para relembrar que os valores não são dados nem por Deus nem pela tradição: só ao próprio homem cabe inventá-los.

Se o homem é livre, então ele é consequentemente responsável por tudo aquilo que escolhe e faz. A conclusão mais fi losófica dessa reflexão é o lugar que a liberdade assume na vida do homem. Antes, a liberdade era um valor abstrato, um conceito teórico que servia de orientação à ação humana, mas podia ser definido antes e independente dela. Para Sartre, a liberdade só possui significado na própria ação, na capacidade do homem de operar modificações no mundo real.

A má fé

O homem não é "em-si", ele é "para-si", que a rigor não é nada, pois se a consciência não tem conteúdo, não é nada, pois é coisa alguma. Mas esse vazio é justamente a liberdade fundamental do "para-si", que movendo-se através das possibil idades, poderá criar-lhe um conteúdo.

Eis que o homem, ao experimentar a liberdade e ao sentir-se como um vazio, vive a angústia da escolha. Muitas pessoas não suportam essa angústia, fogem dela, aninhando-se na má fé. A má fé é a atitude característica do homem que finge escolher, sem na verdade escolher imagina que seu destino está traçado, que os valores são dados; aceitando as verdades exteriores, "mente" para si mesmo, simulando ser próprio o autor dos seus próprios atos já que aceitou sem críticas os valores dados. Não se trata propriamente de uma mentira, pois esta supõe os outros para quem mentimos, enquanto a má fé se caracteriza pelo fato de o indivíduo dissimular para si mesmo com o objetivo de evitar

fazer uma escolha da qual possa se responsabilizar.

O homem que recusa a si mesmo aquilo que fundamentalmente o caracteriza como homem, ou seja, a l iberdade, torna-se "safado", "sujo" (salaud), pois nesse processo recusa a dimensão do "para-si" e torna-se "em-si", semelhante às coisas. Perde a transcendência e reduz-se à faticidade.

Sartre chama tal comportamento de espírito de seriedade. O homem sério é aquele que recusa a liberdade para viver o conformismo e a "respeitabilidade" da Ordem estabelecida e da tradição. Esse processo é exemplificado no conto A infância de um chefe.

A fim de ilustrar o comportamento de má fé, Sartre descreve o garçom cuja função exige que ele aja não como um "ser-para-si", mas como um "ser-para-outro"; comporta-se como deve se comportar um garçom, de tal forma que ele se vê com os olhos dos outros. É assim que Sartre o descreve em O ser e o nada: "Consideremos esse garçom de café. Tem um gesto vivo e apurado, preciso e rápido; dirige-se aos consumidores num passo demasiado vivo, inclina-se com demasiado zelo, sua voz e seus olhos experimentam um interesse demasiado cheio de solicitude para o pedido do freguês. (...) Ele representa, brinca. Mas representa o que? Não é preciso observá-lo muito tempo para perceber: ele representa ser garçom de café".

Outro tipo de má fé é o caso da mulher que, estando com um homem, deixa-se "seduzir" por ele, dissimulando para si mesma, desde o início, o caráter sexual do encontro.

A responsabilidade

Tais colocações a respeito do existencialismo poderiam fazer supor que se trata de um pensamento que defende o individualismo, em que cada um estaria preocupado com a própria liberdade e ação.

Contra esse mal-entendido, Sartre adverte:

"Mas se verdadeiramente a existência precede a essência, o homem é responsável por aquilo que é. Assim, o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo o homem no domínio do que ele é e lhe atribuir a total responsabilidade da sua existência. E quando dizemos que o homem é responsável por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsável pela sua restrita individualidade mas que é responsável por todos os homens. (...) com efeito, não há dos nossos atos um sequer que, ao criar o homem que desejamos ser, não crie ao mesmo tempo uma imagem do home m como julgamos que deve ser. Escolher ser

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isto ou aquilo é afirmar ao mesmo tempo valor do que escolhemos, porque nunca podemos escolher o mal, o que escolhemos é sempre o bem, e nada pode ser bom para nós sem que o seja para todos. Se a existência, por outro lado, precede a essência e se quisermos existir, ao mesmo tempo que construímos a nossa imagem, esta imagem é válida para todos e para toda a nossa época. Assim. a nossa responsabilidade é muito maior do que poderíamos supor. porque ela envolve toda a humanidade.”

SARTRE.O existencialismo é um humanismo.

O absurdo

Sartre também discute a questão da morte. Diferentemente de Heidegger, que concebe a morte como aquilo que confere significado à vida, Sartre acha que ela lhe retira qualquer sentido. A morte é a "nadificação" dos nosso s projetos, ou seja, a certeza de que um nada total nos espera. Por isso, Sartre conclui pelo absurdo da morte e, simultaneamente, da vida, que é uma "paixão inútil". "Se nós temos de morrer, a nossa vida não tem sentido, porque os seus problemas não recebem qualquer solução e porque até a significação dos problemas permanece indeterminada."

O conceito de náusea, usado no romance de mesmo nome, refere-se justamente ao sentimento experimentado diante do real, quando se toma consciência de que ele é desprovido de razão de ser, absurdo. Roquetin, a personagem principal do romance, numa célebre passagem, ao olhar as raízes de um castanheiro, tem a impressão de existir à maneira de uma coisa, de um objeto, de estar-aí, como as coisas são. Tudo lhe surge como pura contingência, gratuitamente, sem sentido.

Conclusões sobre o Existencialismo

O existencialismo é uma moral da ação, porque considera que a única coisa que define o homem é o seu ato. Ato livre por excelência, mesmo que o homem sempre esteja situado em determinado tempo ou lugar. Não importa o que as circunstâncias fazem do homem, "mas o que ele faz do que fizeram dele".

Vários problemas surgem no pensamento sartriano, desencadeados pela consciência capaz de criar valores e ao mesmo tempo, se responsabilizar por toda a humanidade, o que parece gerar uma contradição indissolúvel.

Sartre se coloca nos limites da ambigüidade, pois, se a moral é impossível porque o rigor de um principio leva à sua destruição, a realização do homem, da sua liberdade, exige o comportamento moral. Sartre

sempre prometeu escrever Um livro sobre moral, mas não realizou seu projeto. Uma tentativa nesse sentido foi levada a efeito por Simone de Beauvoir no livro Moral da ambigüidade.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 39

QUESTÕES SARTRE QUESTÕES OBJETIVAS UFU-2006 QUESTÃO 10

“(...) não encontramos, já prontos, valores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta. Assim, não teremos nem atrás de nós, nem na nossa frente, no reino luminoso dos v alores, nenhuma justificativ a e nenhuma desculpa. Estamos sós, sem desculpas. É o que posso expressar dizendo que o homem está condenado a ser livre. Condenado, porque não se criou a si mesmo, e como, no entanto, é livre, uma v ez que f oi lançado no mundo, é responsáv el por tudo o que faz”.

SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanis mo.

3ª ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 9. Tomando o texto acima como referência, assinale a alternativ a correta. A) Sartre af irma que o homem está condenado a ser liv re e que, por esta razão, deve ser responsável por tudo o que acontece ao seu redor. B) Sartre considera que o homem não é responsável por seus atos, “porque não se criou a si mesmo”, sendo, por esta razão, totalmente livre. C) Ao dizer que “(...) não encontramos, já prontos, v alores ou ordens que possam legitimar a nossa conduta”, Sartre def ende que o existencialismo não admite qualquer v alor, nem a liberdade. D) O existencialismo de Sartre def ende a tese da absoluta responsabilidade do homem em relação aos atos que pratica, porque sua moral parte do princípio de uma liberdade coerente e comprometida com o bem comum. UFU-2004

“Gostaria de defender, aqui, o existencialismo de uma série de críticas que lhe f oram f eitas. Em primeiro lugar, acusaram-no de incitar as pessoas a permanecer no imobilismo do desespero; todos os caminhos estando vetados, seria necessário concluir que a ação é totalmente impossív el neste mundo; tal consideração desembocaria, portanto, numa f ilosof ia contemplativ a”.

SARTRE, Jean-Paul. O Existencialismo é um humanis mo.

São Paulo: Nov a Cultural, 1987. Col. Os Pensadores.

Tomando o texto acima como referência, assinale a alternativ a correta. A) Sartre considera que classif icar a sua filosofia como contemplativ a é um equív oco grosseiro. Ao contrário do que pensam os marxistas, Sartre tenta definir o seu existencialismo como uma f ilosof ia da ação livre e subjetiv a. B) Sartre af irma que o existencialismo é uma filosofia contemplativ a porque o homem é, de f ato, um ser que

viv e constantemente tentando def inir a essência de sua vida antes de determinar a existência. C) A crítica mencionada acima é feita pelos pensadores de orientação cristã e, portanto, é uma crítica admitida por Sartre. D) Sartre af irma que a ação é “totalmente impossível neste mundo” porque o homem, um ser angustiado por natureza, nunca consegue agir de forma liv re e independente. UFU-2002 Liberdade, para Jean-Paul Sartre (1905-1980), seria assim def inida: A) o estar sob o jugo do todo para agir em conf ormidade consigo mesmo, instaurando leis e normas necessárias para os indivíduos. B) circunstâncias que nos determinam e nos impedem de f azer escolhas de outro modo. C) conf ormação às situações que encontramos no mundo e que nos determinam. D) escolha incondicional que o próprio homem f az de seu ser e de seu mundo. “Estamos condenados à liberdade”, segundo o autor. UFU-2001 Jean-Paul Sartre, (1905-1980), af irma que “estamos condenados à liberdade”. Sendo assim, af irma A) que a liberdade é o poder do todo para agir em conf ormidade consigo mesmo, instaurando leis e normas necessárias para os indivíduos. B) que estamos sob o poder de f orças externas mais poderosas que nossas v ontades, que nos obrigam a ser livres. C) que a liberdade é a escolha incondicional que o próprio homem f az de seu ser e de seu mundo. D) que a liberdade é resignar-se ou conf ormar-se às situações, que encontramos no mundo e que nos determina. UFU-2001 Para Sartre (1905-1980) o homem a todo momento está escolhendo o caminho a seguir em sua existência, e esta escolha tem v alor porque é f eita entre outras inúmeras possibilidades; esta situação é de angústia, mas, uma vez f eita a escolha, a angústia passa a ser a autonomia do querer. A situação existencialista da escolha, tal como foi descrita, implica A) a má f é do homem, pois a escolha é f eita somente para satisf ação de si mesmo. B) a responsabilidade do homem, pois ele é sempre o autor da escolha f eita. C) a f alsa consciência, que desconhece a autonomia e aceita aquilo que fazem de si. D) a natureza humana imutáv el do indivíduo, que é a certeza da liberdade espiritual.

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Olimpo – F ilosofia – pág. 40

QUESTÕES DISCURSSIVAS UFU-2004

“Temos que encarar as coisas como elas são. E, aliás, dizer que nós inv entamos os valores não signif ica outra coisa senão que a vida não tem sentido a priori. Antes de alguém v iver, a vida, em si mesma, não é nada; é quem a v iv e que dev e dar-lhe um sentido; e o v alor nada mais é do que esse sentido escolhido”. SARTRE, J. P. O existencialismo é um humanis mo. 3ª ed. São Paulo: Nova Cultural, 1987, p. 21.

Por que Sartre afirma que “(...) a vida, em si mesma, não é nada”? UFU-2003

“Gostaria de defender, aqui, o existencialismo de uma série de críticas que lhe foram feitas”, assim começa Sartre o seu opúsculo O existencialismo é um humanis mo. Quais f oram as principais críticas dirigidas ao existencialismo sartreano?

UFU-2003 Jean-Paul Sartre foi um dos principais f ilósof os do século XX. Ele sustentou um projeto existencialista centrado na ação da pessoa, que diante do mundo se dilacera para poder realizar sua vida como projeto de autonomia da própria existência. Eis o comentário de Sartre:

“O existencialismo não é tanto um ateísmo no sentido em que se esf orçaria por demonstrar que Deus não existe. Ele declara, mais exatamente: mesmo que Deus existisse, nada mudaria; eis nosso ponto de vista.”

SARTRE, Jean-Paulo. O existencialismo é um humanis mo.

São Paulo: Nov a Cultural, 1987. Coleção “Os Pensadores”. p. 22.

O que Sartre colocou em evidência com esta afirmação polêmica? UFU-2001

"E, quando dizemos que o homem é responsáv el por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsáv el pela sua restrita indiv idualidade, mas que é responsáv el por todos os homens." Sartre, J-P. O existencialismo é um humanis mo. São Paulo: Abril Cultural, 1978. p. 219 Coleção

"Os Pensadores". Explique a afirmação de Sartre, segundo a qual a responsabilidade de cada um, ela própria, envolv e toda a humanidade.