2009 - cadeia produtiva do peixe ornamental (panorama da aquicultura)

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1 Panorama da AQÜICULTURA, março/abril, 2009

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Por:Felipe de Azevedo Silva Ribeiro

professor de nutrição de organismos aquáticos e formulação de rações da UFERSA

e-mail: [email protected]

Jaime Ribeiro Carvalho Júnior responsável pelo Centro Jovem de Aquarismo

e pesquisador do Laboratório de Biologia de Organismos Aquáticos da UFPA

e-mail: [email protected]

João Batista Kochenborger Fernandes professor responsável pelo Laboratório de

Peixes Ornamentais do CAUNESP e-mail: [email protected]

Luiza Nakayama professora responsável pelo Laboratório de Biologia de Organismos Aquáticos da UFPA

e-mail: [email protected]

CADEIA PRODUTIVA DO PEIXE ORNAMENTAL

N as últimas décadas, o conceito de cadeia produtiva tem sido um dos temas de grande importância no

meio acadêmico e empresarial, podendo ser definido como um conjunto de etapas consecutivas, ao longo das quais os diversos agentes econômicos interagem com o objetivo de atender as necessidades dos consumidores em adquirir um produto, que, no caso, são os peixes ornamentais. O estudo dessa cadeia facilita a compreensão dos problemas, bem como auxilia na identificação de oportunidades e poten-cialidade de negócios. Em alguns países, como o Brasil a produção de orna-mentais é baseada principalmente na pesca. Já em outros, e isso inclui os maiores exportadores e produtores, a produção é basicamente feita pela aquicultura. Neste artigo procura-mos descrever a cadeia de produção do peixe ornamental no país, com enfoque tanto no extrativismo como no cultivo, indicando ainda os elos mais críticos e as possíveis soluções para o seu fortalecimento.

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Piscicultura ornamental

CADEIA PRODUTIVA DO PEIXE ORNAMENTAL

Aqüicultura de ornamentais

A produção de peixes ornamentais por aquicultura é uma atividade antiga. Podemos dizer, inclusive, que a piscicultura se originou da vontade do homem de manter peixes coloridos para ornamentação. Os primeiros peixes produzidos pela aquicultura foram os kinguios (ou japonês) e as carpas koi (ou carpa japonesa) e, de acordo com Botelho (1990), o primeiro livro a descrever técnicas de criação de carpas, data de 1596.

A produção em cativeiro de peixes ornamentais surgiu por dois motivos principais: 1) a necessidade de manutenção de espécies exóticas, mais especificamente as de clima tropical em países de clima temperado e 2) o desenvolvimento de variedades mais coloridas e chamativas. As primeiras fazendas de produção comercial de peixes ornamentais do Ocidente datam do final do século IX, na Flórida - EUA, as quais foram se aperfeiçoando ao longo do século passado. Atualmente encontramos aquicultores conseguindo manter em cativeiro e até reproduzir uma infinidade de espécies de peixes ornamentais com comportamento, cores, formas e tamanhos variados.

Em todo o mundo é possível observar o crescimento da aquicultura ornamental, que conta com uma presença marcante de espécies brasileiras (RIBEIRO et al., 2008). Nas últimas dé-cadas os países importadores, principalmente os asiáticos, vêm conseguindo reproduzir em escala comercial, várias espécies amazônicas, tais como: acará-disco e acará-bandeira (Cichlidae), neon-tetra (Characidae, Figura 1), arraia (Potamotrigonidae), cor-redora (Callichytidae) e vários tipos de Loricariidae dentre eles, o acari-zebra ameaçado e endêmico do médio rio Xingu.

Insumos

O primeiro segmento da cadeia produtiva de pei-xes ornamentais envolve o suprimento de bens e insumos necessários ao desenvolvimento da atividade, que são:

- Ração: são utilizadas as comerciais para peixe de corte (amplamente difundida), as produzidas na propriedade e as de aquarismo, que são raramente usadas, por serem extremamente caras. O ideal seria a utilização de rações direcionadas ao peixe ornamental, entretanto, devido ao pouco volume de venda e à falta de conhecimento dos requerimentos nutricionais, ainda não existe uma produção específica em larga escala para este segmento.

- Alimento vivo: possui alto valor nutricional e baixo custo, sendo fundamental nas fases de larva e de alevino de peixes ornamentais. De acordo com a fase de desenvolvimento, pode-se usar náuplios ou adulto do crustáceo artêmia (Figura 2) pulga d’água (cladóceros Daphnia e Moina); microalgas (Ankis-trodesmus); rotíferos (Brachionus); tubiflex (pequeno anelídeo, do grupo das minhocas, que pode ser encontrado em ambientes lamacentos e esgotos); larvas de mosquitos; drosófilas (mosca de fruta); enquitréia (pequenos vermes brancos que alcançam até 2cm e têm altos valores nutritivos); tenébrio (besouro da espécie Tenebrio molitor), além de infusório, um caldo com diversos protozoários, dentre eles o Paramecium. Esses organismos uni-celulares podem ser facilmente encontrados em águas paradas ou serem criados, colocando-se folhas sem lavar de alface e couve em um recipiente com água e deixadas 48h no escuro. Como regra, o bom produtor de peixes ornamentais deve manter uma cultura do alimento vivo em sua propriedade.

Figura 1. Exemplar de acará-disco Symphysodon aequifasciatus variedade Blue Diamond desenvolvida no exterior e importada por atacadista para distribuição no mercado interno Foto: Felipe Ribeiro

As autoridades ambientais (estadual e federal) responsáveis pela regulamentação da atividade consideraram a Hypancistrus zebra ameaçada de extinção. A partir da portaria IN.MMA-5 de 21 de maio de 2005, a captura e comercialização dessa espécie de Loricariidade foi proibida.

Figura 2. Artêmia adulta viva: insumo destinado ao produtor e ao aquarista No Brasil, entretanto, o cultivo em escala comercial desses, e de outros peixes nativos, está longe de acompanhar o sucesso da produção realizada em outros países, e as razões que levam a isso podem ser melhor entendidas se analisarmos cada um dos vários elos da cadeia produtiva do peixe ornamental em nosso país, o que passaremos a fazer a seguir.

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- Adubos: são usados os orgânicos e os químicos. O adubo orgânico, se bem controlado, produz peixe de qua-lidade a baixo custo. O adubo químico apresenta resposta mais rápida, mas tem um custo mais alto.

- Água: é o insumo mais importante, podendo ser de poço, de nascente, de rios, de represas ou mesmo de abas-tecimento urbano. O ideal seria que o produtor adaptasse a espécie a ser criada, de acordo com a qualidade da água da propriedade. Algumas vezes, porém, essa medida não é possível devido a outros fatores como exigência do mercado, clima, etc..

- Energia elétrica: usada especialmente em sistemas intensivos, tanto em recirculação, quanto em tanques in-dividuais. A energia elétrica empregada para aquecimento da água ou do ambiente onde estão alojados os aquários, em sistemas de produção intensivos, corresponde a uma grande parcela das despesas mensais. Além do aqueci-mento, o bombeamento e a iluminação são os principais componentes da conta de luz.

- Aquecimento alternativo: na maioria dos casos, o aquecimento artificial escolhido é o GLP (gás de cozinha), mas também são utilizados aquecimento a lenha (prove-nientes de resíduo de madeireira) e solar.

- Mão-de-obra: esse item é o que mais encarece as despesas operacionais de uma produção de peixes orna-mentais. Desconhecemos atividade rural que empregue mais por área que a produção de ornamentais, chegando a mais de 10 funcionários por hectare, devido ao intenso e delicado manejo diário que esses peixes exigem. Mas é interessante notar que mesmo demandando tamanha mão-de-obra, continua sendo uma atividade lucrativa.

Produtor

A produção de ornamentais é a atividade aquícola com maior variedade nos sistemas produtivos. A grande diversidade de espécies e de ambientes produtivos, as-sociados à falta de pacotes tecnológicos pré definidos, fazem com que praticamente cada aquicultor seja único. Entretanto, para facilitar o entendimento, podemos dividi-los de uma maneira mais simples: aquicultores urbanos e aquicultores rurais (grandes e pequenos).

Os aquicultores urbanos se caracterizam por criar espécies raras, exóticas e de alto valor em área urbana (Figura 3), com a vantagem de seus peixes serem vendidos diretamente ao consumidor final, em alguns casos pela in-ternet, ou para lojistas próximos. A maioria é especializada em uma espécie ou grupo de peixes. Há os criadores de guppies, ciclídeos anões, killifishes e variedades de acarás discos, só para exemplificar alguns. As maiores restrições a esse tipo de aquicultor são: clima, espaço e água.

Os produtores rurais, por outro lado, têm a vantagem de possuírem espaço suficiente para a produção em larga escala, porém, a distância dos mercados e a falta da informação são fatores limi-tantes. A venda pode ser feita a atacadistas e a atravessadores. Os pequenos produtores brasileiros se concentram em algumas regiões e se associam em cooperativas para facilitar a comercialização dos peixes e a compra de insumos. A maioria produz poucas espécies, mas os produtores ao se associarem têm a possibilidade de ampliar a diversidade de espécies fornecidas.

Já os grandes produtores rurais de peixes ornamentais brasileiros são poucos, e se dedicam a produzir tanto as espécies mais comuns quanto as mais sensíveis, chegando, alguns, a produzir mais de 100 espécies em sua propriedade. A logística de distribuição destes produtores é bem mais elaborada e conseguem atender os atacadistas e lojistas. Alguns deles também fazem papel de distri-buidores, comprando peixes de pequenos produtores e revendendo. Para manter esse comércio, o grande produtor busca informações e novas variedades ou espécies de peixes ornamentais para serem produzidas; inclusive muitos deles estão entrando no mercado de peixes marinhos.

Piscicultura ornamental

Figura 3. Estrutura de venda de um produtor urbano: oportunidade de vender a lojistas e aquaristas. Foto: Felipe Ribeiro

ProdutoresPontos críticosO acesso a insumos e informações referente à tecnologia de produção e comercio é restrito.O acesso a financiamento é praticamente inexistente.

Alternativa

Formação de cooperativas entre os aquicultores para facilitar o acesso a informações, bem como a equipamentos e insumos fa-cilitado, especialmente aqueles produtores/pescadores de baixo poder aquisitivo. As cooperativas também podem buscar credito junto às agências de fomento rural.

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Pesca

No Brasil, a produção de peixes ornamentais é basea-da, principalmente, na pesca ornamental de caráter artesanal (RIBEIRO et al., 2008), voltada ao hobby de aquarismo. É uma modalidade de pesca desenvolvida a partir do profundo conhecimento empírico de pessoas, que na região Norte são denominados de piabeiros (Estado do Amazonas) ou acarizeiros (nos rios de corredeiras do Pará).

A explotação destes peixes é realizada em diferentes habitats, desde pequenos igarapés e igapós, como em pe-drais, corredeiras, rios e lagos. Na pesca utilizam pequenas embarcações (canoas e rabetas) para se deslocarem entre os

habitats, e outros tipos (Figura 4), de médio a grande porte, para transportarem aos “patrões”, como são conhecidos os donos das embarcações. Os principais apetrechos da pesca ornamental são redes (malhadeiras, de arrasto e tarrafas), puçá (peneira grande), cacuri (armadilha) e compressores para capturar os locarídeos, nas corredeiras (Figura 5). Essa base da cadeia produtiva é o segmento que mais absorve mão-de-obra, sendo, também, responsável pela exploração dos estoques pesqueiros.

Figura 4. Barco usado na pesca de peixes ornamentais na região do Rio Xingu. Foto: Jaime Carvalho

Figura 5. Pescador de peixes ornamentais com equipamento de mergulho. As caixas brancas são usadas para estocar os peixes coletados. Foto: Jaime Carvalho

O problema da sobrepesca

São muitas as evidências dos impactos causados pela sobrepesca. Crampton (1999a, b) identificou alguns impactos do comércio de peixes ornamentais nas áreas de lagos da reserva ecológica Mamirauá, Tefé-AM, com redução de alguns peixes, como os estoques do acará disco (Symphysodon aequifasciatus - Cichlidae), afirmando a necessidade urgente de um plano de manejo para o uso sustentável desta atividade na reserva. No Pará, entrevistas com pescadores do município de Altamira identificou a diminuição da abundância dos ornamentais, como o acari-zebra (Seabra-Carvalho, 2004).

Compartilhando desta mesma preocupação a Secreta-ria de Estado do Meio Ambiente do Pará (SECTAM, 2007) elaborou a lista vermelha da biota aquática do Pará, com 13 espécies de peixes ameaçadas de extinção, sendo seis ósseos e sete cartilaginosos com destaque para a espécie Hypancis-trus zebra (acari-zebra). Já o IBAMA (2006), no período de 2004 a 2006, protocolou 2.211 Guias de Trânsito de Aquáti-cos Vivos, referente a peixes ornamentais representando mais de 3,7 milhões de indivíduos exportados, principalmente para países asiáticos, conforme determina a legislação ambiental vigente e, no mesmo período, as apreensões somaram 11.035 peixes ornamentais de diversas espécies.

Olivier (2001), analisando o estado do mercado mundial de peixes ornamentais, encontrou situações alarman-tes devido à exploração desordenada. O pesquisador conclui que a redução drástica dos estoques genéticos é acompanhada do perigo iminente da perda dessa indústria extrativista e dos prejuízos na estrutura socioeconômica da região. A cada ano, o comércio de peixes ornamentais extrai cerca de 100 milhões de indivíduos de aproximadamente 400 espécies de peixes de água doce da América do Sul (Traffic, 2006). O manejo deste extrativismo é uma grande missão para os países desta região, o qual requer um compromisso efetivo do governo, indústria, comunidade extrativista e universidades. No Brasil, a fiscalização da pesca de espécies proibidas ou que possuem cotas ainda é ineficiente e há carência de serviço de extensão ou assistência técnica direcionado ao pescador e aos responsáveis pela fiscalização.

Como proposta para minimizar essas lacunas, sugeri-mos que as instituições que atuam na regulação e fiscalização do setor - IBAMA, SEAP, Capitania dos Portos, envolvendo também a polícia ambiental e secretarias estaduais e muni-cipais de Pesca e/ou de Meio Ambiente e/ou Fazenda dos estados brasileiros produtores - deveriam ampliar o escopo de suas atuações, inclusive com ações compartilhadas com prefeituras, colônias e associações de pescadores de peixes ornamentais, para combater de forma incisiva as práticas de pesca predatória e sobrepesca.

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Atravessador

Os agentes intermediários que atuam no atacado assumem formas variadas na cadeia de comercialização. No caso da pesca, as figuras mais presentes são o patrão aviador e os atravessadores. O patrão aviador é o agente que financia o esforço de pesca, sendo, de modo geral, o dono da embarcação. Neste tipo de relação o patrão fica com a metade da renda obtida na pesca, depois de descontado o custeio, sendo a outra parte dividida entre os participantes do esforço de pesca. Já os atravessadores podem adquirir os peixes ornamentais diretamente dos pescadores e de aviadores para posterior comercia-lização com agentes varejistas (Figura 6).

Pesca silvestrePontos críticosA fiscalização da pesca de espécies proibidas ou que possuem cotas ainda é ineficiente e não há um serviço de extensão ou assistência técnica direcionado ao pescador.

AlternativaAs instituições que atuam na regulação e fiscalização do setor como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Re-nováveis (IBAMA), Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca (SEAP) e Capitania dos Portos deveriam ampliar o escopo de suas atuações, inclusive com ações compartilhadas com prefeituras, colônias e associações de pescadores de peixes ornamentais, para combater de forma incisiva as práticas de pesca predatória e sobrepesca.

apenas um veículo com o qual visitam as propriedades coletando os sacos de peixes e levando-os até o desti-no. O produtor que vende seus peixes ao atravessador recebe menos do que receberia do atacadista ou lojista e, por conhecer os produtores e atacadistas, o atraves-sador consegue controlar os preços, pagando, muitas vezes, muito pouco ao produtor. De modo geral os produtores não possuem uma estrutura de venda direta ao atacadista e vendem aos atravessadores por falta de opção, em decorrência, principalmente, do fato de estarem isolados do mercado e desconhecerem a realidade fora da porteira.

A complexa rede de atravessadores é consi-derada um dos elos mais críticos de qualquer cadeia produtiva: quanto maior o número de intermediários maior será a diferença entre o preço do produto ao comprador final, ou seja, a diferença de preço pago ao produtor/pescador é inversamente proporcional; dependendo da espécie de peixe ornamental che-ga a ser 100 vezes maior para o aquarista. Assim, consideramos uma das alternativas, que a figura do atravessador deve ser substituída por associações ou cooperativas de produtores/pescadores. Essas, sim, poderiam manter uma estrutura de venda e teriam poder de negociação de preços com os atacadistas, até mesmo ao aquarista.

Figura 6. Desembarque de peixes ornamentais no atravessador. Foto: Jaime Carvalho.

No caso da aquicultura, o atravessador é a pessoa que compra o peixe ornamental do produtor e vende ao atacadista ou ao lojista. Em geral, não possui estrutura física para manutenção dos peixes,

AtravessadoresPontos críticos

A existência das diversas formas de atravessadores é polêmica e é considerada um dos elos mais críticos de qualquer cadeia produtiva. Quanto maior o número de atravessadores, maior a diferença entre o preço pago ao produtor/pescador e o preço de venda ao aquarista.

Alternativa

A figura do atravessador pode ser substituída por as-sociações ou cooperativas de produtores/pescadores, com uma estrutura de venda e poder de negociação de preços com os atacadistas.

Atacadista ou Distribuidor

Os atacadistas ou distribuidores são empresas com boa estrutura física e número razoável de funcionários. Seu papel dentro da cadeia do peixe ornamental é concentrar grande variedade de espécies provenientes da pesca e da aquicultura, e equipamentos e insumos para o aquarismo (Fi-gura 7). Alguns atacadistas ainda atuam como exportadores e importadores de peixes ornamentais, e a maioria das novas espécies ou variedades chega ao mercado por esta via.

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O atacadista ainda é o principal controlador do preço dos peixes e produtos no mercado, além de ter as informações sobre a demanda de espécies pelo consumi-dor. Além disso, é uma figura estratégica ao facilitar que o varejista encontre grande variedade de peixes em um mesmo local, não necessitando ter muitos fornecedores. Atualmente há diversas empresas atuando neste ponto da cadeia, inclusive algumas mais especializadas em equipamentos e outras em peixes. O que diferencia um bom atacadista, além da variedade de produtos e preço competitivo, é o investimento em mão-de-obra qualifi-cada tanto para vendas quanto para manejo dos animais, e os investimentos feitos em treinamento de lojistas e aquaristas.

Transporte

Por se tratar de carga viva, o escoamento do peixe ornamental deve ser feito da maneira mais rápida e se-gura possível e, para tanto, o transporte fluvial, terrestre e aéreo são usados. Os peixes pescados na região ama-zônica são transportados de barcos até o distribuidor. O transporte terrestre é feito em curtas e médias distâncias, especialmente na ligação aquicultor-atacadista, e dentro dos grandes centros urbanos no eixo atacadista-lojista-aquarista.

As linhas aéreas são utilizadas no comércio in-ternacional de exportação e importação, e no transporte nacional, principalmente dos estados do Norte-Nordeste para o Sul-Sudeste. Elas são imprescindíveis no comércio de ornamentais, porque a melhor qualidade do transporte reflete na melhor qualidade final do peixe. Entretanto, os custos do frete representam muitas vezes mais que a metade do valor, chegando, às vezes, a dois terços do preço para o importador.

O transporte de longa distância de peixe ornamen-tal se tornou um negócio importante e altamente lucrativo, para as companhias aéreas. Criou-se, assim, um vínculo vital no ciclo da cadeia produtiva, o qual não pode ser controlado pelas outras categorias envolvidas, mas que são extremamente dependentes. Um bom exemplo a ser

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Figura 7. Grande Atacadista em São

Paulo: fornece animais, plantas, equipamentos e

insumos para lojistas. Foto: Felipe Ribeiro

lembrado aconteceu no período que ficou conhecido no Brasil como “caos aéreo”. Os transtornos levaram muitas companhias aéreas a serem multadas por perdas e danos, e muitos carregamentos de peixes foram perdidos. Portanto, consideramos que uma solução seria criar associações de transporte para animais vivos, as quais organizariam e administrariam todo o transporte aéreo de espécies vivas, como ocorre nos principais continentes importadores de peixes ornamentais. Outra alternativa seria envolver as com-panhias aéreas nas discussões sobre o setor produtivo.

Consumidores

O extremo da cadeia produtiva de peixes orna-mentais é o consumidor do qual emana todo o estímulo de mercado. Nesse segmento, podemos incluir vários atores, dentre eles: os lojistas, aquaristas e instituições (públicas e privadas).

Lojista

Um elo essencial à cadeia é o mercado varejista (feiras-livres) (Figura 8) e lojas de aquarismo. As lojas, tanto as especializadas quanto as generalistas, são o principal local de compra de equipamentos/insumos e de animais e plantas para aquário. As lojas generalistas, em geral são mais antigas (do tipo pet shop), e que vendem artigos para diversos tipos de animais de estimação. Grande parte das vendas é composta de peixes baratos e comuns, o que é refletido também em aquários pequenos e em insumos simples. A maioria das lojas especialmente em cidades pequenas é deste tipo.

TransportePontos críticos

O transporte de longa distância de peixe ornamental se tornou um negócio importante e altamente lucrativo para as companhias aéreas. Criou-se assim um vínculo vital no ciclo que não pode ser controlado pelas outras partes envolvidas, mas que são extremamente dependentes. Um bom exemplo a ser lembrado aconteceu no período que ficou conhecido no Brasil como “caos aéreo”. Os transtornos levaram muitas companhias aéreas a serem multadas por perdas, e muitos carregamentos de peixes foram perdidos.

Alternativa

Criar associações de transporte para animais vivos, as quais organizariam e administrariam todo o transporte aéreo de peixes ornamentais vivos e/ou envolver as companhias aéreas na discussões sobre o setor produtivo.

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As especializadas são lojas dedicadas exclu-sivamente à venda de grande variedade de peixes ornamentais (Figura 9), desde os mais comuns aos mais raros. Nelas podemos encontrar também produtos e acessórios para aquarismo. Nestas lo-jas, o atendimento é mais especializado e algumas realizam projetos de instalação de aquários de grande porte em conjunto com empresas de ar-quitetura, e grande parte dessas empresas também presta serviços de montagem e de manutenção de aquários. Algumas lojas chegam ainda a ministrar cursos complementares para diferentes categorias de aquaristas.

Figura 8. Ferinha em Guarulhos: ocorre toda segunda a tarde. Oportunidade para o produtor vender diretamente aos lojistas e aquaristas. Foto: Felipe Ribeiro

Figura 9. Loja com exposições de animais, plantas e produtos para o aquarista. Foto: Marcelo Shei

De alguns anos para cá, lojas virtuais tam-bém foram abertas e há um mercado crescente de aquarismo on-line. É possível comprar equipa-mentos e produtos, animais e plantas pela inter-net, que são enviados com segurança e garantia. Por essa via, o aquarista residente em locais mais afastados passou a ter acesso a esses produtos, contribuindo, dessa forma, para o crescimento do mercado.

LojistaPonto crítico

Falta de treinamento da mão-de-obra.

Alternativa

Cursos de formação visando preparar lojistas e seus funcionários com orientações básicas de fatores abi-óticos e bióticos que podem afetar a boa manutenção dos organismos aquáticos.

Aquarista

São várias as razões que levam o consumidor a adquirir peixes ornamentais: hobby (passa tempo), relaxa-mento, motivações místicas; decoração de recinto; educa-ção; pesquisa e pequeno negócio. Os aquaristas podem ser classificados conforme seu nível de conhecimento em:

Em países considerados mais desenvolvidos os aquaristas são mais exigentes, possuindo maior conhe-cimento acerca dos seres vivos que possuem. Entre-tanto, na última década, com o efeito da globalização, o aquarismo brasileiro tem tido maior contato com as tendências mundiais e se tornado mais exigente. Inclu-sive podemos observar modalidades de aquarismo espe-cializados como aquários plantados, ciclídeos africanos e de recifes de corais, já bastante difundidas em nosso país. A verdade, entretanto, é que o aquarista ainda en-contra no lojista a sua fonte de conhecimento técnico, e enquanto a maior parte dos lojistas se mantiver como “amadores”, nossos aquaristas também o serão.

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Instituições públicas e privadas

Há instituições, como universidades e empresas, onde profissionais desenvolvem atividades de pesquisa relacionadas a peixes ornamentais. Devido aos altos custos em logística, ao tempo para a obtenção de licença junto ao IBAMA e até mesmo à falta de conhecimentos básicos, os pesquisadores preferem adquirir exemplares de outras fontes, sejam de apreensões nos aeroportos ou de interme-diários (distribuidores, lojas e/ou aquaristas experientes). Também há instituições e/ou empresas (tais como: museus e parques) que utilizam exposição de organismos aquáticos para visitação turística e divulgam aos visitantes particu-laridades sobre a biodiversidade de peixes ornamentais e o seu meio ambiente. O Brasil, entretanto, ainda não possui grandes aquários, voltados para a visitação pública, que utilizam tecnologia de ponta, nos moldes dos que já existem na América do Norte, Europa e Ásia.

Considerações finais

O Brasil apresenta um grande potencial para o desenvolvimento do setor de peixes ornamentais, que tem capacidade para se tornar uma importante fonte de geração de mão-de-obra e de renda para um grande contingente da população no meio rural e urbano.

A cadeia produtiva de peixes ornamentais em nosso país está nitidamente direcionada ao extrativismo. Em virtude do impacto ambiental desta atividade, associada ao desmatamento das matas ciliares, e o consequente assore-amento dos rios e perda de áreas de reprodução e alimen-tação, a produção de peixes ornamentais via aquicultura torna-se cada vez mais competitiva, apesar de demandar mais insumos.

É imprescindível, portanto, buscar alternativas para o cenário atual, e as alternativas aqui apresentadas são ape-nas indicações na busca dos caminhos para solucionar os muitos gargalos. Independentemente disso, o fortalecimento da organização e a integração social, apoiada por um bom serviço de assistência e extensão e linhas de crédito parecem ser elementos fundamentais para ampliar o desempenho da cadeia produtiva como um todo, visto que contribuem para o fortalecimento dos agentes produtivos.

No aspecto científico o apoio de órgãos de fomento à pesquisa é de fundamental importância para alavancar linhas de pesquisa de modo a contribuir para a independência do Brasil nesta atividade. Por enquanto apenas alguns grupos de pesquisadores, preocupados com o cenário do peixe or-namental no Brasil, têm direcionado esforços para estudos e investigação nesta área da produção animal.

Nesse sentido, sugerimos que os principais agentes públicos envolvidos no setor, SEAP e IBAMA, juntamente

com representantes da iniciativa privada (de todos os elos da cadeia) e instituições de pesquisa e extensão elaborem um plano de desenvolvimento específico para o setor. Somente assim nosso país poderá de-senvolver todo seu potencial e se tornar um grande ator no cenário mundial de peixes ornamentais.

Piscicultura ornamental

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Referências Bibliográficas