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EXTRA! EXTRA! EXTRA! EXTRA! Jornal da ABI Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa A IMPRENSA VISTA NA TELA Desde os seus primórdios, no longínquo ano de 1900, o cinema lançou os olhos sobre a imprensa, um dos temas mais explorados nas telas por Hollywood. 316 JANEIRO 2007 EDIÇÃO ESPECIAL

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EXTRA! EXTRA! EXTRA!EXTRA!

Jornal da ABIÓrgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

A IMPRENSA VISTA NA TELADesde os seusprimórdios,

no longínquoano de 1900,

o cinema lançouos olhos sobre

a imprensa,um dos temas

mais exploradosnas telas porHollywood.

316JANEIRO2007

EDIÇÃOESPECIAL

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2 Jornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABI I I I I 316 Janeiro de 2007

EditorialEditorial

O jornalismo no cinema, por Dejean Magno Pellegrin 3Intrépidos jornalistas, por Luiz Carlos Merten 16

Dejean: desde moço, um cinemaníaco, por Rodrigo Caixeta 19Merten: um gaúcho com visão universal 19

Heróis jornalistas, por Otacílio d’Assunção (Ota) 20

Jornal da ABI

Associação Brasileira de Imprensa

Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andarTelefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012Rio de Janeiro - RJ ([email protected])Editores: Francisco Ucha, Joseti Marques e Maurício AzêdoProjeto gráfico, diagramaçãoe editoração eletrônica: Francisco UchaApoio à produção editorial: Ana Paula Aguiar,Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme Povill Vianna,José Ubiratan Solino, Maria Ilka Azêdo e Solange Noronha.Diretor responsável: Maurício AzêdoImpressão: Gráfica LanceRua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletemnecessariamente a opinião do Jornal da ABI.

DIRETORIA – MANDATO 2004/2007Presidente: Maurício AzêdoVice-Presidente: Audálio DantasDiretor Administrativo: –Diretor Econômico-Financeiro: Domingos MeirellesDiretor de Cultura e Lazer: Jesus ChediakDiretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Souza (Pajê)Diretora de Jornalismo: Joseti Marques

CONSELHO CONSULTIVOChico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira,Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura

CONSELHO FISCALJesus Antunes, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento, Secretário;Adriano do Nascimento Barbosa, Arthur Auto Nery Cabral, GeraldoPereira dos Santos, Jorge Saldanha e Luiz Carlos de Oliveira Chester.

CONSELHO DELIBERATIVO (2006-2007)Presidente: Fernando Segismundo1º Secretário: Estanislau Alves de Oliveira2º Secretário: Maurílio Cândido Ferreira

Conselheiros efetivos (2006-2009)Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob,Arthur Cantalice, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Augusto Xistoda Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo, Glória SuelyAlvarez Campos, Heloneida Studart, Jorge Miranda Jordão,Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif Elias Hidd Sobrinhoe Pery de Araújo Cotta.

Conselheiros efetivos (2005-2008)Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile,Araquém Moura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas,Carlos Arthur Pitombeira, Conrado Pereira (in memoriam),Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata,Maurício Azêdo, Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho

Conselheiros efetivos (2004-2007)Antonieta Vieira dos Santos, Arthur da Távola, Cid Benjamin,Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Héris Arnt, Irene Cristina Gurgel do Amaral,Ivan Cavalcanti Proença, José Gomes Talarico, José Rezende,Marceu Vieira, Paulo Jerônimo, Roberto M. Moura (in memoriam),Sérgio Cabral e Teresinha Santos

Conselheiros suplentes (2006-2009)Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilode Athayde, Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup,Estanislau Alves de Oliveira, Hildeberto Lopes Aleluia, Jorge Freitas,Luiz Carlos Bittencourt, Marco Aurélio Barrandon Guimarães,Marcus Miranda, Mauro dos Santos Viana, Oséas de Carvalho,Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza.

Conselheiros suplentes (2005-2008)Anísio Félix dos Santos, Edgard Catoira, Francisco de Paula Freitas,Geraldo Lopes (in memoriam), Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz,José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone, ManoloEpelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedro do Coutto,Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J. Magalhães

Conselheiros suplentes (2004-2007)Adalberto Diniz, Aluísio Maranhão, Ancelmo Gois, André Louzeiro,Jesus Chediak, José Silvestre Gorgulho, José Louzeiro, Lílian Nabuco,Luarlindo Ernesto, Marcos de Castro, Mário Augusto Jakobskind,Marlene Custódio, Maurílio Cândido Ferreira e Yaci Nunes

COMISSÃO DE SINDICÂNCIAEly Moreira, Presidente, Jarbas Domingos Vaz, José Ernesto Vianna,Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio Cândido Ferreira

COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃOAlberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filhoe Paulo Totti

COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOSAudálio Dantas, Presidente; Arthur Cantalice, Secretário; Arthur NeryCabral, Daniel de Castro, Germando Oliveira Gonçalves, GilbertoMagalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, MárioAugusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles,Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

Uma edição para ler e guardar

Nesta EdiçãoNesta Edição

FOI UM DOS TEÓRICOS E CHEFES DA MAIORrevolução a que o mundo assistiu no século 20,Vladimir Ilitch Lênin, quem percebeu com acui-dade a importância que o cinema teria na vida social.O cinema é a arte revolucionária do século, dis-se o líder da Revolução Bolchevique, antes mes-mo que o cinema russo produzisse uma das mai-ores obras-primas do cinema, O Encouraçado Po-

temkin, que Serguei Eisenstein dirigiu em 1925,e a criação cinematográfica pudesse contar coma maravilha do som, que entrou nas telas so-mente no ano seguinte, quando Hollywood pro-duziu O Cantor de Jazz, estrelado por Al Jolson.Genial em muitas de suas análises e premoni-

ções, Lênin teve extraordinária percepção quantoà relevância que o cinema adquiriria, embora nãose confirmasse sua previsão de que essa nova for-ma de arte exerceria uma função revolucionária.Deu-se o contrário: transformado em indústriapelos norte-americanos, o cinema revelou-se ins-trumento de conservação das estruturas sociaise de dominação das consciências; atuou como agen-te de difusão da produção capitalista, como reco-nheceu, em outra demonstração de acuidade, emi-nente estadista norte-americano, o PresidenteFranklin Delano Roosevelt, que assinalou semtibieza o papel que a produção de Hollywood exer-cia para a expansão dos negócios de seu pais: “Ondevão nossos filmes, vão nossos produtos”.Qualquer que tenha sido o papel que cumpriu

e ainda cumpre, o cinema norte-americano tevea sensibilidade de lançar seus olhos sobre um dos

aspectos mais fascinantes da vida social: o mun-do do jornalismo, da imprensa e da comunicaçãoem geral, que desde o ano 1900, quando se pro-duziu o primeiro filme sobre o tema, tem ofere-cido copiosa riqueza de temas para a produção deobras que assumiram forte teor dramático, ain-da que, em número expressivo de casos, este nãosacrificasse a possibilidade de momentos de hu-mor, de indução ao riso. A essa temática perten-ce aquele que é considerado um dos maiores fil-mes de todos os tempos, rivalizando com o cita-do O Encouraçado Potemkin na avaliação e na pre-ferência dos críticos: Cidadão Kane, a celebradacriação em que o jovem realizador Orson Wellesexpôs as vísceras do magnata da imprensa Willi-am Randolph Hearst.É a esse filão da produção cinematográfica nor-

te-americana que o JORNAL DA ABI dedica estaedição especial, que reproduz minucioso trabalhode paciente pesquisador, Dejean Magno Pellegrin,ardoroso fã e emérito estudioso do cinema queinclui em seu currículo e em sua trajetória de in-telectual a forte participação em destacados mo-mentos da atividade cultural relacionada com aprodução cinematográfica, como a criação da Ci-nemateca do Museu de Arte Moderna do Rio deJaneiro. Ao trabalho de Dejean agregam-se cola-borações especiais de qualificados especialistas,como Luiz Carlos Merten e Otacílio D’Assunção(Ota), que alargam o espectro da pesquisa de Dejean.Tal como outras oferecidas aos leitores pelo JOR-NAL DA ABI, esta é uma edição para ler e guardar.

FOTOS DA CAPA: Sobre o logotipo do Jornal da ABI, Jack Lemmon e Walter Matthau no filme A Primeira Página, de Billy Wilder;na foto maior, cena de uma das mais importantes produções do cinema norte-americano, Cidadão Kane; embaixo, à esquerda,J. K. Simmons na pele de J. Jonah Jameson, o inescrupuloso editor de O Homem Aranha 2 e, à direita, Dustin Hoffman e RobertRedford como os dois jornalistas do The Washington Post, na premiada produção Todos os Homens do Presidente. Os pôsteresda esquerda são dos filmes Correspondente Estrangeiro, de Alfred Hitchcock; No Silêncio de uma Cidade, de Fritz Lang; eAconteceu Naquela Noite, de Frank Capra.

No filme Boa Noite, e Boa Sorte, David Strathairn é ojornalista Edward R. Murrow, que desafiou o SenadorJoseph MacCarthy em seu programa jornalístico na CBS.

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3Jornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABI I I I I 316 Janeiro de 2007

POR DEJEAN MAGNO PELLEGRIN

O JORNALISMONO CINEMA

s filmes americanosque abordam ojornalismo nuncaforam tão popularescomo os filmes de

caubói, os filmes policiais,ou outros gêneros, porémcontribuíram para a históriae o desenvolvimento docinema, alcançando seuápice nos anos 1930 comum ciclo de filmes realistascom diálogos fortes,especialmente nos anosque se seguiram logo apósa era do cinema silencioso.

Mesmo depois de umasérie de filmes com muitosclichês, o gênero ganhouuma certa distinção graçasa várias comédiasexcepcionais, tais comoJejum de amor/His Girl Friday(1940), de Howard Hawks,uma das melhores, e suasinfluências em importantesdramas como, por exemplo,Cidadão Kane/Citizen Kane,1941, de Orson Welles. Ofilme abordando ojornalismo foi ressuscitadonos anos 1970 com obrasprovocativas como A Trama/The Parallax View (1974),de Alan J. Pakula, e Todos osHomens do Presidente/All thePresident´s Men (1975),igualmente de Pakula,continuando até hojemas nos filmes feitospara a televisão.

Um inventárioda presençada imprensana criação

cinematográficanorte-americana

desde osprimórdios.

OOOOOOrson Welles emCidadão Kane

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4 Jornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABI I I I I 316 Janeiro de 2007

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O filme jornalístico adapta-se perfei-tamente bem a outros gêneros, inclusi-ve comédias e musicais. O filme de Ar-chie Mayo Oh! Sailor Behave, de 1930,que conta a história de um repórteramericano correspondente em Paris, foiuma das primeiras comédias dramáticas,baseada numa peça popular sobre repór-teres e o mundo jornalístico. Última Hora/The Front Page, de Lewis Milestone, doano seguinte (1931), tinha tambémmuito humor. Aconteceu Naquela Noite/It Happened One Night, de 1934, reali-zado por Frank Capra, com Clark Ga-ble, como um repórter frustrado e re-centemente despedido de seu jornal porcausa da bebida, e Claudette Colbert,foi uma das primeiras screwball come-dies. Já Nada é Sagrado/Nothing Sacred,é uma comédia de humor-negro que temum olhar satírico sobre a imprensa. Di-rigido por William Wellman, com Fre-dric March e Carole Lombard, este fil-me de 1937 mostra-nos um jornalistade Nova York que chega a uma cidade-zinha americana para cobrir a históriade uma jovem que foi vítima de enve-nenamento por radium, e quer realizarseu último desejo.

O newspaper film, como dizem osamericanos, até abordou o filme de cau-bói. Em 1900, na fita Horsewhipping anEditor, produção da Biograph, talvez aprimeira vez que o jornalismo é aborda-do no cinema: um rude caubói entra numaredação de um jornal para punir o editordo órgão. E em 1916, William S. Hart,ator e realizador americano (1870-1946),dirigia e atuava em Truthful Tulliver, fitaproduzida pela companhia cinematográ-fica Triangle, na qual ele interpreta umjornalista de uma cidadezinha do wildwest. Em Red Courage, de 1921, HootGibson é um simplório vaqueiro que quer

limpar uma cidade do Oeste perseguin-do o jornalista local. Em Grinning Guns,realizado em 1927, um caubói vagabundousa o poder da imprensa (e de seu revól-ver) para restaurar a lei e a ordem numapequena cidade da fronteira. Já o repór-ter nova-iorquino, interpretado por RexBell no filme The Diamond Trail (1933),derrota uma gangue de ladrões de jóiasno Oeste selvagem.

Esta lista de bangue-bangues tendocomo tela de fundo o jornalismo conti-nua com muito sucesso até a era do ci-nema sonoro. O caubói-cantor Roy Rogers(1911-1998) atuou em vários westernsque abordam o mundo do jornalismo,tais como Bad Man of Deadwood, de 1941,

realizado por Joseph Kane (1897-1975),e In Old Cheyenne, igualmente de 1941e de Kane, e Don´t Fence Me (1945) eHome in Oklahoma (1946), direção de Wi-lliam Witney, ambos com Dale Evans eGeorge Gabby Hayers (1885-1969). Ou-tros caubóis populares continuam a sé-rie, incluindo Bill Elliott, que interpre-tou Wild Bill Hickok em Beyond the Sa-cramento, realizado por Lambert Hillyerem 1941; Charles Starrett derrota umdiretor de jornal picareta em Down RioGrande Way (1943), de William Berke;Allan Rocky Lane em Navajo Trail Rai-ders, de 1949 e realizado por R. G. Sprin-gsteen, expulsa da cidade um jornalistadesonesto e líder fora-da-lei, e Randol-ph Scott (1903-1987) em Ouro da Dis-córdia/Carson City (1952), realização deAndre De Toth, é contratado para cons-truir uma ferrovia e acaba vingando amorte de um corajoso e idealista jorna-lista de uma cidadezinha do Oeste ame-ricano. Histórias de jornal aparecem emmuitos filmes de gêneros diversos.

Nos filmes os repórteres são, muitasvezes, heróis. No filme The Lost House, pro-dução da Mutual de 1915, realizado porWilliam Christy Cabanne (1888-1950),por exemplo, o repórter, interpretado porWallace Reid, salva a mocinha (Lillian Gish,1893-1993) internada em um asilo peloseu tio inescrupuloso.

O jornalista veterano,modelo para os focas

Nesse mesmo ano de 1915 viu-se umdos primeiros filmes apresentando umrepórter americano num país estrangei-ro: Fire and Sword, realizado por Tho-mas Hayes Hunter (1896-1944). Aindaem 1915, na fita The House of Tears, deEdwin Carewe (1883-1940), a atriz Emily

O caubói-cantorRoy Rogers (na fotoao lado de George

Gabby Hayers)atuou em vários

westerns queabordam o mundo

do jornalismo.

Walter Connollyinterpreta o editor(ao centro), Fredric

March, o jornalista eCarole Lombard, ajovem com poucosdias de vida: um

dilema tratado commuito humor-negroem Nada é Sagrado.

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ras da Lei/Special Agent, de 1935, dirigi-do por William Keighley (1893-1984),no qual o repórter (George Brent, 1904-1979) infiltra-se na gangue de um ban-didão para encontrar provas para pren-dê-lo e condená-lo.

É interessante assinalar que há mui-tos filmes em que o herói é o repórterde um jornal, que admira e busca imitarum jornalista veterano e companheirode trabalho. Uma das primeiras vezesem que vemos num filme a figura dofoca, ocorreu em 1914 em A Prince ofIndia, realizado por Leopold Wharton,no qual um jovem e honesto foca se meteem complicações com o desaparecimentode um famoso diamante. Nesse mes-mo ano, em um filme mudo – The WarExtra –, vemos um foca pedir ao seu chefeque o mande para o México cobrir umarevolução naquele país, onde é presoao chegar por ser suspeito de espiona-gem. O repórter foca volta a ser apre-sentado num papel mais familiar de heróiem The Magic Cup (1921), filme dirigi-do por John Stuart Robertson (1878-1964), no qual uma camareira de umhotel é vítima de dois desonestos do-nos de uma casa de penhores e salvapelo jovem repórter. Num outro filme,The Cub Repórter, realizado pelo diretoramericano John Jack Francis Dillon (1887-1934), no ano de 1922, produzido pelaCompanhia Cinematográfica Goldstone,o ator Richard Tamadge no papel-títu-lo, um jovem e destemido foca resgataa heroína das garras de alguns vilõeschineses. Em 1922, William K. Howard(1899-1954) roda Extra! Extra! para aFox, em que um jovem foca, interpre-tado pelo ator Johnnie Walker, mostrasua ingenuidade se passando por víti-ma para conseguir sua reportagem.

Os jornalistas que começam suas car-reiras sempre têm um profissional jáveterano como ídolo ou mentor maisexperiente. Alguns desses veteranosbebem até demais, segundo certos fil-mes, não conseguindo então por causado vício manter-se no emprego, até quesão ativados pelo seu jovem colega queos auxilia numa grande reportagem.Como é o caso no filme Paris Interlude(1934), da MGM e realizado por EdwinMarin (1901-1951), onde vemos o foca,interpretado pelo ator Robert Young(1907-1998), admirar o jornalista ve-terano em dificuldades, ajudando-o emsua reabilitação; o papel do velho jor-nalista coube a Otto Kruger (1885-1974). Na película Behind the News, queJoseph Santley (1890-1971) realizou em1940 para a Republic, um veteranorepórter demitido por causa do alcoo-lismo é reabilitado por um jornalistaneófito. Mais recentemente, em 1994,em Adoro Problemas/I Love Trouble, deCharles Shyer, produção da Buena Vis-ta, uma jornalista foca (Julia Roberts)admira o rival colunista veterano dojornal em que trabalha; Nick Nolteencarna o jornalista.

Stevens tem um papel duplo como a mãee a filha muito tempo desaparecida. Essamesma história foi usada novamente numseriado, Double Adventure, realizado em1921 por W. S. Van Dyke, com o atorCharles Hutchison no papel do jorna-lista e, também, com dois personagens.

De vez em quando alguns filmesmostram jornalistas como corresponden-tes estrangeiros, sendo um dos melho-res exemplos Correspondente Estrangei-ro/Foreign Correspondent, realizado por Al-fred Hitchcock em 1940, tendo Joel Mc-Crea (1905-1990) como o dito corres-pondente de um jornal americano na Eu-ropa no início da II Guerra Mundial. Es-ses jornalistas globe-trotting aparece-ram já no tempo do cinema silencioso,em comédias como The Cub (1915), deMaurice Torneur (1876-1961, francês),

em screwball comedies (AffectionatelyYours, 1941, Lloyd Bacon - 1890-1955),em dramas da II Guerra Mundial (Ber-lim Correspondente, 1942, Eugene Forde),em dramas biográficos (Jack London/JackLondon, Alfred Santell - 1895-1981) eem dramas políticos (Sob Fogo Cruzado/Under Fire, 1983, Roger Spottiswoode).Os filmes podem ser alegres e excitan-tes, e – porque mostram o jornalismo notrabalho no exterior interagindo com di-plomatas e outros funcionários oficiais –às vezes até mesmo educativos. Talvezaté por ser muito importantes, esses fil-mes serviram como propaganda, mostran-do o ponto de vista do roteirista, do di-retor, do estúdio ou até do país.

Às vezes repórteres trabalham para ogoverno como agentes infiltrados em qua-drilhas de bandidos, como em Nas Gar-

Os destinos de umajovem mimada

(Claudette Colbert)e de um repórter

desempregado (ClarkGable) se cruzam emAconteceu Naquela

Noite, filme de FrankCapra premiado com

cinco Oscars,incluindo MelhorFilme e Diretor.

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A mulher repórter,uma discriminada

A mulher repórter, freqüentementedescrita como uma sob sister ou news hen,pelos seus colegas ou outros, enfrentagrandes desigualdades por causa da faltade cooperação ou entusiasmo de seu colegamasculino, da polícia e do público, masela sempre tem sucesso ao voltar com suahistória sentimental ou a solução de umcrime. Ela pode até trocar insultos e pi-adas com o melhor dos jornalistas ou seueditor. Ela já aparecia na tela em 1911em The Reform Candidate, da CompanhiaCinematográfica Edison, no qual a repór-ter, interpretada por Miriam Nesbitt, der-rota uma tentativa de um financista fer-roviário para subornar um prefeito. Em1914 a mulher jornalista aparece em doisfilmes: The Adventures of a Girl Reporter,apresentando Ethel Grandin no papel-tí-tulo, e The Reporter on the Case, de EdwardJ. Le Saint, tendo a atriz Stella Razetono papel principal. Nos anos que se se-guiram, a mulher repórter tornou-se umpersonagem admitido no gênero em fil-mes como How Molly Malone Made Good,de 1915, com Marguerite Galé, e TheDaring of Diana (1916), realizado porRakin Drew, com a estrela Anita Stewartcomo a repórter que ajuda seu editor-chefea preservar a integridade do jornal. Aju-dar um jornalista parece que emergiu comouma característica do trabalho de umamulher repórter, pelo menos se conside-rarmos o que mostram certos filmes comoWhat Love Can Do, direção de Jey Hunte realizado em 1916 para a Universal, noqual uma jovem repórter salva a vida deum rico jornalista. Igualmente em Overthe Hill, produção da Pathé de 1917 e re-alizado pro William Parke, uma repórter,papel defendido pela atriz Glodys Hu-lette, ajuda a salvar seu jornal para nãoperder os anunciantes por causa de suapolítica sensacionalista.

Não demorou muito para que as jor-nalistas fossem confrontadas com as com-plicações de seus colegas masculinos emdiferentes histórias melodramáticas. EmBondage (1917), de Ida May Park, umajovem repórter (Dorothy Phillips), re-cém-chegada a Nova York, vinda de uma

pequena cidade, torna-se vítima da noite bo-êmia de Grenwich Vi-llage. Ainda mais assus-tador é a história deuma repórter que nofilme The Co-Respon-dent, rodado em 1917por Ralph W. Ince, édesignada pelo seu na-morado e editor-chefepara investigar um casode divórcio, com resul-tados inesperados. Assob sister não eram sem-pre ingênuas ou expos-tas às flutuações davida, como vemos nacomédia The Floor Be-low (1918), que Claren-ce G. Badger realizoupara a Companhia Gol-dwyn, no qual MabelNormand (1894-1930)interpreta uma copy

girl que é despedida do jornal por causade suas travessuras, inclusive jogando da-dos com suas colegas na sala do chefe.

Lá pelo final da década a mulher jor-nalista não estava só cooperando comas reportagens usuais de seus colegas mas-culinos, mas estava também cobrindo e

Correspondente Estrangeiro (Foreign Correspondent), deAlfred Hitchcock, e Sob Fogo Cruzado (Under Fire), de

Roger Spottiswoode, mostram o trabalho dos jornalistasque se aventuram em outros países.

Joel McCrea eAlbert Bassermanem CorrespondenteEstrangeiro

Um obstinado jornalista (Richard Webb) e sua assistente(Lucille Norman) acompanham a chegada da estrada deferro à sua cidade, em Ouro da Discórdia (Carson City),filme de Andre De Toth, estrelado por Randolph Scott.

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solucionando crimes. É o que vemos, porexemplo, na película The Woman UnderCover, de 1919 e dirigida por GeorgeSiegmann, em que uma repórter se vê,ela própria, envolvida num crime.

Entre melodramas e assassinatos, amulher jornalista ocasionalmente é co-locada diante de problemas conjugais.Num filme de 1921, The Foolish Matrons,uma jovem repórter (Wiildred Manning)gasta mais tempo se dedicando à sua car-reira do que ao marido, que em razão desua negligência cai nas garras do álcool.No drama Vítima de Uma Paixão/Anothertime, Another Place (1958), de Lewis Al-len (1905-1986), uma correspondenteamericana (Lana Turner, 1920-1995) se-diada em Londres durante a II GuerraMundial envolve-se num caso amorosocom um homem casado (Sean Connery),que é dado como morto em ação. Essefilme foi realizado sobretudo para ex-plorar o envolvimento da atriz num sen-sacional processo criminal. Big News, re-alizado em 1929 por Gregory La Cava(1982-1952), com Carole Lonbard(1908-1942), foi o primeiro filme sonoroa mostrar uma mulher repórter. Nos anos30 a mulher jornalista teve até uma sérieconsagrada a ela: a atriz Glenda Farrelinterpretou muitas vezes a fogosa Tor-chy Blane, uma repórter que ajudou seucolega inspetor da polícia (Barton Ma-clane, 1900-1969) a resolver alguns cri-mes. Talvez ela resuma a coragem e aauto-segurança da mulher repórter, es-pecialmente exemplificada em TorchyBlane in Chinatown (1939), dirigido porWilliam Beaudine (1892-1970).

Tristemente, a mulher jornalista dei-xou de ser a principal protagonista porvolta de 1940, um retrocesso que conti-nuou durante várias décadas. Ela freqüen-temente aparecia como uma ajudante domais sabido, hábil e bravo repórter queteve um furo de reportagem, solucionouum crime e ajudou a libertar um conde-nado errado. Algumas vezes o herói queela ajudava era alguém que não era jor-nalista, como, por exemplo, vemos nofilme Borrowed Hero, de 1941, produçãodo Monogram e dirigida por Lewis Co-lins, em que uma conhecidíssima repór-ter (Florence Rice) ajuda um jovem pro-motor de justiça (Alan Baxter) a esma-gar uma grande gangue de malfeitores.Em 1947, na fita Big Town After Dark, pro-dução da Paramount dirigida por Willi-am C. Thomas, uma repórter policial (Hi-llary Brooke) dá uma mão ao seu editorpara destruir uma quadrilha de rackete-ers. Uma repórter (Lucille Bremer), emBehind Locked Doors (1948), realização deBudd Roetticher para a produção Eagle-Lion, colabora com um detetive particu-lar (Richard Carlson, 1912-1977), que seinterna num asilo de loucos onde ele acre-dita que um político desonesto está es-condido. Num drama que se passa du-rante a guerra fria, Intriga em Paris/Assig-nment Paris (1952), realizado por RobertParrish, um repórter americano (Dana An-

(1916-1989), em que uma repórter de SanFrancisco (Bárbara Stanwyck, 1907-1990)abandona sua carreira para se casar comum tira de Los Angeles (Sterling Hayden,1916-1986).

Um alvo permanente:os políticos corruptos

Os jornalistas combatentes – verda-deiros cruzados – da tela têm dois ti-pos: o editor e o redator. O editor bem-intencionado ou motivado politicamentecertamente tem meios financeiros e opoder de assumir influências e força. Poroutro lado, o redator tem simplesmen-te o apoio de seu empregador. Além domais, o redator é descrito como ummentor de consciências. Esses idealis-tas apareceram já em 1914, por exem-plo, em The Truth Wagon, de Max Gig-man, no qual um alegre apaixonadoplayboy (o mesmo Max Figman) anun-cia que pretende comprar um jornalquebrado e empreender um batalhacontra políticos locais corruptos. A ri-queza dos jornalistas combativos é fre-qüentemente mostrada no início do fil-me, como em The Gentleman from Indi-ana (1915), filme dirigido por FrankLloyd (1887-1960), no qual a estrelade futebol universitário (Dustin Farnun),perto de se graduar, compra um jornalmoribundo que ele pensa usar para de-nunciar a corrupção política. Ainda emThe White Terror, realização de Suart Pa-ton, naquele mesmo ano, um jovem ricocompra um jornal para denunciar as de-ploráveis condições de trabalho nas ofi-cinas e nas fábricas. Tais dramas des-crevem um formidável rito de passagemà juventude idealista.

Na película The Clarion, realização de1916, um jovem e idealista jornalistacompra um jornal para poder melhoraras condições sociais locais e logo desco-bre que as pessoas que estão mais pertodele são alguns dos piores infratores.

O caminho de um jornalista comba-tivo nem sempre é muito fácil, pois àsvezes pode criar desavenças nas relaçõesfamiliares, como, por exemplo, em TheLittle Wanderer (1920), em que o filhoidealista de um dono de jornal acusa oseu pai de fazer sensacionalismo com asnotícias e de explorar os pobres. Final-mente, ele consegue tomar o jornal deseu pai e aplicar sua própria políticaeditorial. Em outras vezes, o jornalistacombativo tem que fazer sacrifíciospessoais, como nos mostra a fita Free-dom of the Press, realizada por GeorgeMelford em 1928, numa produção daUniversal: o filho de um jornalista com-bativo pega a direção de um jornal dafamília depois de seu pai ser brutalmen-te assassinado e, seguindo os passos deseu pai, luta para mostrar nas páginasdo jornal a corrupção política.

drews), correspondente em Paris, tentadenunciar um complô dos países do blo-co oriental contra o ocidental, com a amigarepórter (Marta Toren, 1925-1957) ser-vindo apenas aos interesses românticosdo jornalista. Às vezes, a jornalista podeaté mesmo sacrificar sua carreira, comono drama Da Ambição ao Crime/Crime ofPassion, de 1957, direção de Gerd Oswald

Em Cimarron,dirigido por Wesley

Ruggles, jovemjornalista se muda

para o Oeste depoisque o governo abreassentamentos na

região de Oklahoma.

Da Ambição ao Crime(Crime of Passion),de Gerd Oswald,conta o drama de

uma jornalista(Bárbara Stanwyck)

que abandonasua carreira parase casar com umpolicial (Sterling

Hayden).

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O espírito comba-tivo dos filmes sobrejornalismo continuana era do cinema so-noro. O ator RichardKix (1894-1949) nopapel de Yancey Cra-vat, um apaixonadoeditor de um jornal nooscarizado filme Ci-marron (1931), dirigi-do por Wesley Ru-ggles (1889-1972),baseado no romancepopular de Edna Fer-ber, luta contra a in-justiça e os abusoscontra os índios ame-ricanos. Porém mui-tos desses dramasatacavam os princi-pais vilões – políticoscorruptos, gangsterse outros fora-da-lei.Em Night Alarm, de1934, realizado porSpencer Gordon Bennet (1893-1987),produção da Majestic, um ás da repor-tagem (Bruce Cabot, 1904-1972) tra-balha para um jornalista combativo in-teressado em destruir um big boss dacidade. E, como nos primeiros filmes,os anos 1930 também tiveram jorna-listas combativos/cruzados que tiveramum fim trágico, como em Star Reporter,de 1939 e realizado por Howard Bre-therton (1896-1969), numa produçãode Monogran, em que o filho de um edi-tor de um jornal, cujo pai foi assassina-do por uma quadrilha de bandidões, estádeterminado em continuar o bom com-bate contra a corrupção local.

Os filmes descobremo jornalismo rural

Os filmes sobre os jornalistas com-bativos tiveram seu auge nos anos 1930;no entanto a tela ocasionalmente vol-tou a esse assunto, abordando váriosoutros gêneros e histórias. Por exem-plo, no drama social Jigsaw (1949), daFletcher Markls, um colunista é assas-sinado tentando mostrar provas con-tra um odioso grupo fascista de NovaYork. O venerável bangue-bangue mos-trou novamente, com The Rushwkackers(1951), de Rodney Amateau, a histó-ria de um editor de um jornal que dásua vida para estabelecer lei e ordemna fronteira. No drama histórico Peca-dores de San Francisco/The San FranciscoStory, realizado por Robert Parrish em1952, situado em 1850, um combati-vo jornalista persuade um próspero mi-neiro (Joel MacCrea, 1905-1990) a jun-tar-se a ele para combater as forças cor-ruptas de San Francisco. Em Suplício deuma Alma/Beyond a Reasonable Doubt,

realização de Fritz Lang (1890-1976)rodada em 1956, um combativo editorde um jornal está determinado a pro-var os perigos das evidências circuns-tanciais a um cético procurador.

A partir de 1970 as companhias ma-jor voltaram a fazer filmes sérios e opor-tunos sobre jornalistas combativos. Doisexcelentes exemplos tiveram grande su-cesso: o já citado Todos os Homens doPresidente/All the President's Men (1976),de Alan J. Pakula, com Robert Redforde Dustin Hoffman, e Síndrome da China/The China Syndrome, realizado em 1979por James Bridges (1928-1993), com JaneFonda, Jack Lemmon e Michael Douglas.

O ano de 1913 introduziu a impor-tância dos jornais rurais com filmes comoA Campaign Manageress, de Carl Gre-gory, com Muriel Ostrich, uma popularatriz daquela época. Ela toma posse dojornal de seu pai doente e ataca o xerife,que está empenhado em se reeleger apoi-ado por políticos corruptos da cidadezi-nha. Hollywood mostrou para todo opaís que os Estados Unidos rural não es-tavam imunes ao crime em filmes comoThe Black Circle, de Frank Reicher (1875-1965), rodado em 1919, que nos mos-tra criminosos de toda espécie, incluin-do trapaceiros, falsários, contrabandis-tas e um promotor desonesto. Vemosnesse filme um jovem e idealista casalde jornalistas lutando contra esses ban-didos da pequena cidade. Já em Contra-band (1925), dirigido por Alan Crosland(1894-19360, uma senhorita jornalista,interpretada pela atriz lois Wilson, queherdou um jornal de uma cidadezinha,descobre logo após sua chegada que umaquadrilha de bootleggers – fabricantesde whisky falsificado – está operandoum florescente negócio. Finalmente, nofilme Jazzland (1928), realização de DallasFitzgerald, um jornalista que tenta frus-trar a instalação em sua comunidade deum nightclub fajuto é assassinado. Es-ses filmes silenciosos abriram caminhopara os sonoros que gradualmente acres-centaram profundidade aos seus plotsfamiliares.

Na comédia realizada em 1934 porRichard Thorpe (1896-1991), The Quit-ters, o dono de um jornal de uma peque-na cidade deixa sua esposa para dirigi-lo, enquanto, ao mesmo tempo, acabaocupando sua vida vagabunda. Em Jo-hnny Come Lately (1943), de William K.Howard (1899-1954), um veterano re-pórter de uma grande cidade (James Cag-ney, 1899-1986), ajuda uma decididasenhora de meia-idade (Grace George)a combater a corrupção política em suacidadezinha. Richard Conte (1910-1975),no papel de um jornalista de uma pe-quena cidade, é vítima de um mesqui-nho bandido em The Big Tip Off, de 1955e realizado por Frank McDonald.

Mais recentemente, com assuntosimportantes como ecologia, que forammatérias de primeira página dos perió-dicos, Hollywood não ficou atrás, pro-

Jornalistas combativos aparecem em filmes recheados desuspense, como Síndrome da China (The China

Syndrome), de James Bridge, e Suplício de uma Alma(Beyond a Reasonable Doubt), de Fritz Lang.

Michael Douglas, JackLemmon e Jane Fondaem Síndrome da China

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duzindo particularmente dois bons fil-mes. Em A Flash of Green, de 1984 e di-rigido por Victor Nunez, um valenterepórter (Ed Harris) de uma pequeninacidade consegue, com suas crônicas po-líticas, vencer uma controvertida ques-tão ambiental. Na fábula-comédia dra-mática Rebelião em Milagro - The Mila-gro Beanfield War, de 1988 e com direçãodo ator-realizador Robert Redford, umpobre fazendeiro mexicano decide lu-tar contra poderosos latifundiários queprocuram explorar os fazendeiros locais– com a ajuda de um dono de jornal eoutras pessoas. Assinalamos que nessefilme a nossa Sônia Braga interpreta umagaragista temperamental que incita o edi-tor do jornal a juntar-se a ela na adesãoaos fazendeiros.

A exaltação da vidasimples do campo

A cidadezinha, no entanto, pode tam-bém ser um lugar de opressão, precon-ceito e hipocrisia, muitas vezes habita-da por pessoas tacanhas e de espíritohumilde. O jornalismo marrom como opraticado por um jornal de uma peque-na cidade, mostrado no filme The Fa-mous Ferguson Case, de 1932, realizaçãode Lloyd Bacon (1890-1956), tem con-seqüências trágicas, como a fita expõe:o sensacionalismo da história de um crimeque usualmente é apresentado na pri-meira página. A fugitiva de colégio in-terno (Ida Lupino) na fita Ready for Love,realizado em 1934 por Marion Gering(1901-1977), enfrenta a hipocrisia de umacidadezinha quando os esnobes da lo-calidade tratam sua tia, uma ex-atriz,com escárnio, e então voltam-se contraa sobrinha, montando um julgamentocontra feitiçaria. Um jornalista chega nacidade para fazer a cobertura do acon-tecimento, apaixonando-se logo em se-guida pela jovem vítima. Na película OFugitivo de Santa Maria/The Lawless(1950), de Joseph Losey (1909-1984),o editor de um jornal (Macdonald Ca-rey) combate a intolerância contra me-xicanos em uma cidade da Califórnia pron-ta para linchar um chicano.

De maior significação é o tema ho-llywoodiano recorrente que sugere quea vida rural, com seus poderes restaura-dores, é superior à vida urbana, que éinfestada de crimes, violência e corrup-ção. Isso é muito evidente em filmes sobrejornal com background rural, tal comoem The Joilbird, película realizada em1920 e dirigida por Lloyd Ingraham (1885-1956), em que vemos um presidiário fu-gitivo herdar um jornal de uma peque-na cidade e um lote de uma proprieda-de. Incidentes locais fazem com que eletome a decisão de se regenerar e voltarà prisão para cumprir o restante de suasentença. Outra vez, em The Man Un-

der Cover (1922), de Tod Browning (1882-1962), um antigo ladrão volta para suacidade natal com a intenção de se rege-nerar. Após comprar um jornal local elesalva a comunidade de ser explorada poralguns bandidões da cidade.

A América rural foi celebrada de novodepois da II Guerra Mundial em filmescomo Cidade Mágica/Magic Town, deWilliam A. Wellman (1896-1975), co-média romântica da RKO com JamesStewart e Jane Wyman no papel de umajovem editora de um jornal de uma cida-dezinha do interior dos Estados Unidos;Stewart é um jovem ambicioso que es-colhe a pequena cidade para dar algunsgolpes, mas é eventualmente seduzidopelo seu charme e pelos seus habitan-tes, sobretudo pela jovem jornalista.

Anos 30, a era de ourodo filme sobre jornais

O filme jornalístico, enfim, que foca-liza jornais ou jornalistas, tem uma sim-biótica conexão com o drama criminal,datando desde os primórdios do perío-do silencioso. Os temas principais des-ses filmes abordavam corrupção, assas-sinato e outras transgressões anti-soci-ais. Vimos corrupção e suborno em TheBig Boss (1913), de Frederck Sullivan, noqual um repórter (Irving Cummings) usaum gravador para incriminar um políti-co corrupto. Corrupção também era otema dominante no filme jornalísticoLiving Lies, realizado pelo francês radi-cado nos EUA Emile Chautard (1881-

A imprensa expõe escândalos políticos e dramas sociaisem Todos os Homens do Presidente (All the President's

Men) e Rebelião em Milagro (The Beanfield War).

Robert Redford e Dustin Hoffmanem Todos os Homens doPresidente, de Alan J. Pakula

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1934) no ano de 1922, em que um re-pórter incorruptível denuncia a conspi-ração de financistas inescrupulosos quetentam suborná-lo.

Diretores e roteiristas começaram autilizar os filmes que tratam de jornalis-mo para mostrar outros tipos de crimes.O assunto tornou-se popular por voltade 1915 com filmes tais como BuckshotJohn, dirigido por Hobart Bosworth, emque um jovem repórter ajuda a desmas-carar um espiritualista mistificador. Oseriado The Hole in the Wall, produzidopela Metro e dirigido em 1921 por Ma-xwell Karger, abordou o mesmo assun-to, ou seja, o mundo mistificador dosmédiuns. Já num outro filme, um repór-ter, o ator Tom Gallery, em The Heart ofTwenty (1920), realizado por HenryKolker, trabalhando incognitamente con-segue suficientes evidências para denun-ciar o chefão de uma quadrilha de roubode carros. Em Million Dollar Mystery, filmeem série realizado em 1914 por HowardHansell, cujo plot focaliza uma socieda-de secreta de russos milionários, espi-ões estrangeiros e uma heroína que,quando criança, tinha sido abandonadana porta de uma escola. Note-se que opapel do jovem jornalista que investigao caso coube a James Cruze (1884-1942),que a partir de 1918 se tornou um im-portante diretor, realizando em 1923 owestern Os Bandeirantes/Coverd Wagon,um dos primeiros filmes de caubói dahistória do cinema.

Nos anos 1930, uma década que podemuito bem ser chamada a era de ouro defilmes jornalísticos, os dois gêneros, jor-

nal e crime, foram bastante entrelaçados.Até mesmo seriados como os filmes deTorchy Blane tiveram sempre retratadosjornal-crime. Filmes clássicos como Últi-ma Hora/The Front Page, de L. Milestone,obra de 1931 e que já abordamos, e Sedede Escândalo/Five Star Final, realizadonaquele mesmo ano por Mervyn LeRoy,continham elementos criminais, incluindocorrupção, sentenças de morte e assassi-nato. O filme de LeRoy é um forte dra-ma que ataca os aspectos sensacionalis-tas dos tablóides, cuja estória mostracomo os executivos de um jornal de NovaYork, determinados a aumentar a circu-lação do periódico, destroem sem dó nem

piedade a vida de várias pessoas inocen-tes. Edward G. Robinson (1893-1973) éo editor basicamente decente do tablói-de, que, no entanto, cede às pressões deseus superiores e ressuscita um caso an-tigo de mais de vinte anos sobre uma jovemgrávida que matou seu amante quandoele recusou casar com ela.

Tudo Pode Acontecer/After Office Hours(1935), produzido pela MGM e dirigidopor Robert Z. Leonard (1889-1968),mostra o estilo de vida dos ricos, comdireito ao assassinato de uma riquíssi-ma mulher casada pelo seu amante pa-rasita. Todo o caso é explorado por umaimprensa voyeuriste; o repórter voyeuré interpretado por Clark Gable (1901-1960). Uma repórter confidente (JoanBlondell, 1909-1979) no filme Silêncioque Condena/Back in Circulation, realiza-do em 1937 por Ray Enright (1866-1965)para a Warner Bros., colabora na prisãoe na culpabilidade de um suspeito de umassassinato, sabendo depois que ela co-meteu um engano horrível. O newspa-per-crime film continuou com muitosucesso nas décadas seguintes. Por exem-plo, em Caminhos Sem Fim/Chicago De-adline (1949), produzido pela Paramounte dirigido por Lewis Allen (1905-1986),um repórter chereteiro de Chicago (AllanLadd, 1913-1964) investiga a vida infe-liz de uma jovem mulher (Donna Reed)de virtude fácil, cuja vida sórdida foi do-minada por sua associação com ganguesde criminosos, mulheres de gangsters,call girls e outros habitantes do submundo.

O drama jornalístico-criminal foiexplorado pelos pequenos estúdios eproduções baratas dos grandes estúdi-os, muitas vezes retratando atores me-nos conhecidos em histórias simplistas.Um repórter (Stuart Erwin) na fita JogoPerigoso/Exclusive Story (1936), produzi-do pela MGM e dirigido por George H.Seitz (1880-1944), por exemplo, junta-se à sua namorada (Madge Evans) paradenunciar um bandidão-chefe de umaquadrilha envolvido em um assassina-

Filmes como Sedede Escândalo (Five

Star Final), deMervyn LeRoy, e

Caminhos Sem Fim(Chicago Deadline),de Lewis Allen, têmelementos criminais

como corrupção,chantagem,

sentenças de mortee assassinato

protagonizados porpersonagens do

submundo.

Edward G. Robinsonem Sede de Escândalo

Allan Ladd e Donna Reedem Caminhos sem Fim

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to. Já na película The Cobra Strykes, re-alizada em 1948 por Charles F. Reisner(1887-1962), o colunista de um jornal(Richard Fraser) soluciona diversos cri-mes e um roubo de jóias.

O jornalismo-denúnciae o jornalismo éticoDramas sociais apareceram no cine-

ma com o sucesso dos filmes como umaforma popular de entretenimento damassa. Os dramas jornalísticos em bre-ve começaram a incorporar fatos sociaisem suas histórias. The Power of the Press,de 1914, com Lionel Barrymore (1878-1954), filme com um título mais fortedo que sua história, descreve como umjornal pode influenciar a opinião públi-ca. Outro filme, The Conspiracy, realiza-do por Allan Dwan (1885-1981) em 1914para a Paramount, baseado numa peçateatral de 1912, explorava o assuntograve e importante da escravidão bran-ca. O mesmo assunto foi abordado emTrapped in the Grat Metropolis (1914), noqual uma jornalista se passa por umacompradora de escravo. Em The WhiteTerror, produção de 1915 da Universal,outro social conscience drama, um jo-vem rico adquire um jornal para mos-trar as horríveis condições de trabalhoexistentes em fábricas e em pequenasempresas. Deadline at Eleven, realizadoem 1920 por George Fawcett para a Vi-tagraph, apresenta-nos uma repórter(Corine Griffith, 1899-1983) que ajudaum amigo jornalista alcoólico a aban-donar o vício. No filme The Little Wan-drer, de 1920, era atacada a imprensa sen-sacionalista e a exploração dos pobres.Na comédia dramática com fundo soci-al The Tomboy, dirigida por Carl Harbau-gh e rodada em 1921, uma jovem repór-ter (Eileen Percy) também ataca pelo seujornal o alcoolismo.

Vários filmes exploram as terríveischantagens que de algum modo atrai-am os instintos perversos de muitos lei-

tores. Um filme assim é The Fear Mar-ket, de 1920 e dirigido por Kenneth Weeb,que mostrava o proprietário de um des-ses jornais chantageando suas vítimas.E em Whispers (1920), realizado por Wi-lliam P. S. Earle e produzido por Selzni-ck, uma chantagem quase destrói a re-putação de uma jovem mulher inocen-te. O filme antecipou muitos dramasmais fortes tais como Five Star Final, de1931, estrelado por Edward G. Robin-son. O assunto apareceu anos mais tar-de em filmes como Scandal for Sale, de1932 e dirigido por Russel Mack para aUniversal, Scandal Sheet (1939) e Escân-dalo/Scandal Sheet (1952), realizados res-pectivamente por Nick Grinde (1894-1979) e Phil Karlson (1908-1985), am-bos filmes produzidos pela Columbia, eScandal Incorporated (1956), com dire-ção de Edwar Mann, a maioria retratandoredatores e editores desagradáveis dis-postos a arruinar carreiras para aumen-tar a circulação de seus jornais ou ga-nhar dinheiro às custas de chantagens.

Outros filmes assinalaram os efeitosdeletérios das drogas. Em The Lying Tru-th, realizado em 1922 por Marion Fair-fax, por exemplo, um velho jornalista pro-prietário de um periódico de uma cida-dezinha descobre que seu enteado, quedeverá herdar seu jornal, é um dependentede drogas. Na fita americana Big News,realizada em 1929 por Gregory La Cava(1892-1952) e produzida pela Pathé, umrepórter (Robert Armstrong) investiga umtráfico de drogas e é falsamente acusadode ter assassinado o dono de um jornal.Uma brilhante jovem repórter no filmeAssassin of Youth (1937), realizado por LeoJ. McCarthy, passando-se por uma ven-dedora de refrigerantes, investiga o usode marijuana entre adolescentes. Pode-mos citar outros filmes com histórias si-milares: The Pace That Kills, de 1936, Ma-rihuana, rodado em 1937, e The BurningQuestion (também conhecido como TellYour Children), de 1939. Esses primitivosfilmes dramáticos denunciadores eramcom freqüência sensacionalistas e semintenção de humor mais do que aborda-gens sérias de um problema social.

A comédia passa aintegrar o roteiro

Comédias dramáticas sobre jornalis-mo generalizaram-se com The CountryBoy, de 1915, realizado por FrederickTompson para a Paramount, baseadanuma peça teatral de 1910 escrita porEdward Selwin, na qual um jornalistapersuade um desanimado jovem a fun-dar um jornal em sua cidade natal. Essesfilmes estavam no mesmo nível das gran-des produções feitas de baixo orçamen-to. Um repórter no filme Angel´s Holi-day (1937), direção de James Tinling(1889-1955), ajuda uma jovem e travessagarota, sobrinha do dono de um jornallocal, a resgatar uma estrela de cinemaraptada por uma gangue que pede umagrana pela sua liberação. Na produçãoCairo/Cairo, realizada em 1942 por W.S. Van Dyke (1889-1943), a MGM tirousua estrela-cantora Jeannette MacDonald(1901-1965) das comédias musicais paracolocá-la numa comédia dramática im-plausível (com várias canções patrióti-cas) passada na Inglaterra e no Egitodurante a II Guerra Mundial. Um jovemrevisor (Leo Gorcey) e sua turma conhe-cida como os East Side Kids na fita Bo-wery Champs, realizada em 1944 porWiliam Beaudine para a Monogram,tornam-se repórteres para provar a ino-cência de uma jovem (Evelyn Brent, 1889-1975) acusada de assassinato.

Ocasionalmente o crime tinha vezcomo comédia nesses filmes. Em Expo-sed, de Harold Schuster (1902-1986),produção da Universal rodada em 1938,a fotógrafa de uma revista (Glenda Far-rell) auxilia a polícia para a captura deuma quadrilha de bandidos. Na películaA Mortalha de Seda/The Corpse CameC.O.D. (1974), realização de Henry Levin(1909-1980) para a Columbia, dois re-pórteres rivais (George Brent, 1904-1979, e Joan Blondell, 1909-1979) es-tão determinados em resolver o misté-rio por que um cadáver foi enviado denavio para uma atriz de cinema (AdeleJergens). Na produção O Jornal/The Pa-per, dirigida por Ron Howard em 1994para a Universal, uma comédia dramáti-ca frenética sobre um dia na vida de umjornal tablóide de Nova York, dois afro-americanos são falsamente acusados dematarem dois homens brancos. O inci-dente acaba como uma rivalidade entreos dois jornalistas, interpretados porMichael Keaton e Glenn Close.

A II Guerra Mundial não acabou como fluxo de filmes sobre o jornalismo. NumCorpo de Mulher/The Lady Has Plans,realizado em 1942 por Sidney Lanfield(1900-1972), filme sobre espionagem emLisboa, temos Ray Milland (1905-1986)como um americano correspondente deguerra e Paulette Goddard (1911-1989)como sua assistente, ajudando o servi-

Com um roteiro levee personagens

marcantes, O Jornalmostra os bastidores

da redação de umtablóide de Nova

York às vésperas depublicar a notícia

sobre dois rapazesnegros acusados de

assassinato.Robert Duvall eGlenn Close em O Jornal

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ço de inteligência britânico a descobrirum grupo de espiões nazistas. Era UmaVez Uma Lua-de Mel/Once Upon a Ho-neymoon, também realizado em 1942 edirigido por Leo McCarey (1898-1986),estrelada por Ginger Rogers como umaanimadora burlesca e Cary Grant (1904-1986) como um repórter americano, dealgum modo misturava a devastação daTheco-Eslováquia, Polônia e França comos frívolos desejos e travessuras da jo-vem Ginger.

Rivalidade foi freqüentemente utili-zada nas histórias desses filmes. Porexemplo, em Miss Repórter/Front PageWoman (1935), de Michael Curtiz (1888-1962) e produzido pela Warner Bros.,dois repórteres rivais (Bette Devis, 1908-1989, e George Brent, 1904-1979) dejornais concorrentes seguem a pista deassassinos suspeitos até seu esconderi-jo e descobrem uma arma incriminado-ra. Já em Jovem Destemido/The DaringYoung Man, também de 1935 e realiza-do por William A. Seiter (1896-1964),dois repórteres de jornais rivais, JamesDunn e Mãe Clarke, competem muitasvezes a mesma história. E em I Love trou-ble (1994), de Charles Shyer, uma repór-ter foca (Julia Roberts) compete com umcolunista veterano (Nick Note) na his-tória de um desastre de trem.

Um espaço pouco visto:a redação do jornalFilmes sobre jornalistas ou jornal

continuaram muito em voga durante osanos 1930. Como prova de seu suces-so, o jornalismo tornou-se a mais po-pular profissão dos heróis da tela dosanos 30. Muitos desses filmes, comoos filmes de gangsters daquela época,abordavam crimes e criminosos. Os ro-teiristas sempre apresentavam novas his-tórias que envolviam repórteres e ban-didos, repórteres e polícia ou repórte-res e políticos. No entanto, raramentese viam na tela repórteres em suas re-dações escrevendo uma matéria. Elesse sentiam muito mais em casa nos ni-ghtclubs ou investigando em volta dolocal do crime esperando conseguir umgrande furo, mas quase sempre se en-volvendo em confusões.

O popular filme sobre jornalismo al-cançou seu auge nos anos 1930, ocasi-onalmente expandindo o gênero paraincluir repórteres radiofônicos, jorna-listas de revistas, colunistas e câmerasde jornais cinematográficos. Porém taispersonalidades da tela, como Lee Tra-cy, James Cagney e Pat O'Brien, todosfamosos atores americanos, interpre-tavam jornalistas muito sabichões, ma-ravilhosos radialistas persuasivos, e umamultidão de atrizes interpretandoemperdenidas colunistas sentimentaisda grande cidade.

acima, ao omitir notícias desfavoráveisàs quadrilhas de criminosos, recebendoUS$ 100.000 para abafar o assunto. EmHonor of the Press (1932), direção de BresyEason (1886-1956), um jornalista agres-sivo descobre que o editor de um jornalrival é o chefe de uma gangue de ladrões.Behind Jury Doors, realizado pelo mesmoEason em 1933, descreve como um jo-vem repórter ao investigar o assassina-to de uma enfermeira descobre que umeditor subornou um jurado. Lloyd No-lan (1902-1985), como um político cor-rupto inocentado de acusações de su-borno no filme Reportagem de Sangue/Exclusive (1937), de Alexander Hall(1895-1968), compra um jornal que eleutiliza para chantagear homens de ne-gócios da cidade. Na película HeadlineCrasher, realizada em 1937 por LeslieGoodmins (1899-1969), criminosos e umjornal inescrupuloso tramam um esque-ma pra destruir um veterano e honradosenador. E em The Witness Vanishes, ro-dado em 1939 por Otis Garrett (1895-1941), quatro editores corruptos de Lon-dres internam o proprietário do jornalnum hospício, tomando assim posse doperiódico. Alguns desses filmes sugeri-am bastante que os repórteres do jornalcorriam perigosamente o risco de cruzara linha entre fazer as notícias e reportaras notícias.

Os estúdios continuaram rodandoessas comédias e dramas durante váriasdécadas, sempre mostrando principal-mente jornalistas cínicos, no estilo ho-llywoodiano, denunciando corrupção, so-lucionando crimes, romanceando a vida

O mundo do jornalismo certamenteteve lado escuro. David M. White eRichard Aveson dão-nos a seguinte acu-rada descrição daquela época em seuensaio The Celluloid Veapon, escrito em1972: "Os anos 30 foram um períodobrilhante, sensacional, assim chamadode jornalismo amarelo, e um grande nú-mero de filmes mostrava repórteres queestavam acima da ética para obter umaboa história".

Richard Barthelmess (1895-1963),como um repórter em The Finger Points,realizado em 1931 por John Francis Dillon(1887-1934), confirma o que foi dito

A partir da décadade 70, a imprensa

televisiva começou aganhar as telas decinema com maisdestaque. Filmescomo Troca de

Maridos, TestemunhaFatal e até um filme

de lobisomenschamado Grito deHorror mostramnovos ângulos

desses profissionais.

Burt Reynolds,Kathleen Turnere ChristopherReeve em Trocade Maridos.

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de belas socialites e freqüentando ni-ghtclubs, mas raramente mostrando-ossentados em frente a uma máquina deescrever transcrevendo suas histórias. Al-gumas mais recentes produções do gê-nero mostram redações cavernosas commesas de computadores, porém os jor-nalistas estão freqüentemente longedesses computadores e em lugares maisinteressantes. Além disso, o jornalistade tv tomou o lugar do antiquado re-pórter de jornal que freqüentava o dis-trito policial ou o bar local – indubita-velmente o resultado de um declínio nonegócio jornalístico.

O jornalismo da tvjá aparecia em 1937A televisão teve um grande papel nos

filmes sobre jornalismo já muito cedo apartir de 1937, como por exemplo, emExiled to Shanghai, dirigido por Nick Grin-de (1894-1979) para a Republic, no qualvemos um câmera (Wallace Ford) de umjornal cinematográfico ter a idéia de usara televisão para transmitir novos acon-tecimentos. Contudo, a nossa mídiatornou-se rapidamente um domíniomasculino, e o gênero teve que esperarpacientemente até os anos 70 antes queHollywood reconhecesse a notícia tele-visiva e a repórter com seriedade. Ascorajosas jornalistas imediatamente trans-formaram-se em atrevidas repórteres detv, muitas vezes num papel importante.O citado e tenso thriller Síndrome daChina/The China Syndrome, 1979, dire-ção de James Brides (1928-1993), estre-lado por Jane Fonda como uma repórterde tv que, enquanto fazia uma reporta-gem numa usina nuclear, testemunha umdesastre potencial em razão de um maufuncionamento com implicações globais.Naquele mesmo ano vemos outra repór-

ter de tv, no filme The Dark, de John BudCardos, ficar envolvida em uma série deassassinatos horrorosos.

Essa linha de filmes continuou a flo-rescer pelas duas décadas seguintes,tendo apenas em 1981 visto três dessasrealizações. Em Testemunha Fatal/Eyewi-tness, do diretor inglês Peter Yates, umajornalista da tv (Sigourney Weaver) é en-volvida numa rede de intrigas pelo na-morado (William Hurt). Dois filmes deterror realizados em 1981, Grito de Hor-ror/The Howling, de Joe Dante, e The Se-duction, de David Sehmoeller, focalizamrepórteres televisivos. No primeiro, umrepórter consulta um psiquiatra na Ca-lifórnia por causa de seu próprio trau-ma sexual; já no segundo, uma jornalis-ta da tv é perseguida por um insistentee perturbado voyeurista fotógrafo queestuda seu desprevenido assunto atra-vés das potentes lentes de sua câmera,enquanto monta uma galeria de fotosda moça numa parede de seu apartamento.Em 1988, mais uma vez a peça teatralThe Front Page, dos Charles MacArthure Ben Hecht, foi revivida, dessa vez in-titulada Troca de Maridos/Switching Chan-nels, realizada por Ted Kotcheff, com Ka-thleen Turner como uma repórter de tvque vai a qualquer lugar por uma boahistória, sob as ordens de seu editor, seuex-marido (Burt Reynolds). Devemoslembrar que a peça de MacArthur e Hechtfoi levada à tela antes por duas vezes;primeiramente em 1931, com ÚltimaHora, de Lewis Milestone, e depois em1976, com A Primeira Página, de BillyWilder, tendo nos papéis principais WalterMatthau (1923-2000) e Jack Lemmon

(1925-2005). As décadas seguintes ofe-receram uma variedade de gêneros, dopolítico para a comédia de terror, apre-sentando mulheres jornalistas da tv. EmAssassinato Sob Duas Bandeiras - A Showof Force, realizado para a Paramount pelobrasileiro Bruno Barreto, em 1990, porexemplo, era um drama político situa-do em Porto Rico, com uma repórter datv, interpretada por Amy Irving (ex-mu-lher do realizador), que investiga as mortessuspeitas de dois ativistas que foram en-contrados terrivelmente torturados e as-sassinados. Assim como as mulheres jor-nalistas dos anos 1930, as repórteres con-temporâneas demonstram um persisten-te sentimento de propósitos, uma fortepersonalidade, e uma firme independên-cia que ocasionalmente parece ameaçarseu concorrente masculino.

Para as minorias,só papéis irrisóriosDepois de quase um século de dramas

e comédias sobre jornalismo, poucosfilmes mostram membros das minorida-des trabalhando como jornalistas; defato, alguns retrataram afro-americanose outras minorias em papéis irrisórios.Poucos discutiram assuntos sobre a na-tureza do jornalismo, tal como a influ-ência da imprensa, a força da corrupção,a manipulação das massas, a nunca aca-bada procura da objetividade. Muitosfilmes mostram irrealisticamente o tra-balho diário de um jornalista. Outros

A peça teatral deBen Hecht e

Charles MacArthur,A Primeira Página,foi refilmada porBilly Wilder e teve

nos papéis principaisWalter Matthau e

Jack Lemmon.

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apresentam membros da imprensa comestereótipos. O jornalismo público apa-receu como um assunto recente que le-vanta as questões da responsabilidade daimprensa para ajudar o desenvolvimen-to de comunidades. E alguns filmes re-centes mostram repórteres de tv e ânco-ras como personagens dos dramas. Algunscríticos acreditam que essa prática de mis-turar fato e ficção pode afetar a credibi-lidade do jornalista junto ao público.

De qualquer modo, qualquer um podefazer apologia a favor desses filmes so-bre o mundo do jornalismo, como seu focosobre o cenário contemporâneo ameri-cano. Esses filmes, como os de outrosgêneros, foram basicamente tachadoscomo escapistas, não obstante terem ata-cado temas importantes. Eles descreve-ram a imprensa sensacionalista e os jor-nais escandalosos como profundos ma-les sociais. Ao mesmo tempo, eles ataca-vam a corrupção na política, nos negóci-os e na execução das leis. Ocasionalmen-te denunciavam o preconceito e a into-lerância nos Estados Unidos. Exaltarama imagem das mulheres, mostrando-aseducadas, inteligentes e auto-suficien-tes – durante décadas foram relegadasquase inteiramente ao papel de lourasprostitutas, brincadeiras românticas ousímbolo sexual. Em outras palavras, to-dos esses filmes sobre jornal, jornalismoe jornalistas mostraram como num es-pelho como nós somos e a nossa socie-dade, lembrando-nos nossas forças enossos defeitos. Talvez sem intenção, es-ses filmes tenham repetidamente insinu-ado a importância de uma imprensa livree independente. Com freqüência nos lem-braram as legiões de homens e mulheresque deram as notícias e as publicaram.Realmente, esses filmes tiveram umimpacto profundo, e geralmente positi-vo, em todos nós espectadores.

Muitos desses filmes foram esqueci-dos no meio do caminho, porém outros

permanecem no nosso subconsciente, emnossa memória de espectador: Ausênciade Malícia/Absence of malice, de SydneyPollack, realizado em 1981, com SallyField e Paul Newman nos papéis princi-pais e que nos mostra uma repórter am-biciosa (S. Field) que é incitada engano-samente a escrever uma série de gravesartigos sobre um honesto homem denegócios (P. Newman) sem, no entanto,violando a ética jornalística, averiguaros fatos numa outra fonte; A Montanhados Sete Abutres/Ace in the hole ou The bigcarvinal, com Kirk Douglas e Jan Ster-ling, de 1951, dirigido por Billy Wilder,é sem dúvida um dos mais importantesfilmes realizados sobre o jornalismo. Nelevemos um jornalista falido (K. Douglas)que, enquanto está procurando um em-prego no Novo México, encontra poracaso um grande história: quando o cí-nico jornalista sabe que um mineiro estápreso numa mina, planeja explorar o in-cidente num acontecimento nacional deprimeira página, com a esperança de umretorno sensacional. Ele inunda os jor-nais com matérias de interesse humanosobre a tragédia da vítima, enquanto sub-repticiamente impede um resgate rápi-do para cada vez mais explorar o assun-to, arriscando a vida do mineiro (RichardBenedct). O cúpido e insensível repórterentra na mina para entrevistar o operá-rio, que começa a gostar da publicidadeem torno dele. No final, já é muito tardepara resgatá-lo com vida, Em Suplício deUma Alma/Beyond a reasonable doubt, re-alizado em 1956 por Fritz Lang, com DanaAndrews e Joan Fontaine, um escritor (An-drews) tenta mostrar as falhas do siste-ma judiciário nos casos de evidência cir-cunstancial, acusando-se ele próprio fal-samente de um crime. O editor de umjornal, seu futuro sogro e cúmplice no es-quema, é a única pessoa que pode provarsua inocência e que está determinado aprovar também os perigos da evidência

A ética jornalística em questão: filmes como Ausência deMalícia (Absence of Malice), de Sydney Pollack, A Montanha

dos Sete Abutres (Ace in the Hole), de Billy Wilder, eA Embriaguez do Sucesso (Sweet Smell of Success), de

Alexander Mackendrick, mostram jornalistas semescrúpulos, sempre prontos para agir em proveito próprio.

Burt Lancastere Tony Curtis emA Embriaguezdo Sucesso

Kirk Douglas eJan Sterlingem AMontanha dosSete Abutres

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circunstancial a um promotor que fez todasua carreira nesse aspecto do direito. In-felizmente, o jornalista morre num aci-dente de carro, criando um dilema peri-goso para o escritor.

Sem dúvida nenhuma, o mais famo-so filme sobre jornalismo é o imbatívelCidadão Kane/Citizen Kane, de 1941, di-rigido e escrito magistralmente porOrson Welles e co-roteirizado com Her-man J. Mankiewicz, tendo no cast opróprio Welles, Joseph Cotten e Eve-rest Sloane. Esse notável drama foi oprimeiro filme dirigido pelo jovem e ico-noclasta Orson Welles, que antes tinhatido um grande sucesso no palco e norádio. Mas ninguém esperava que esseboy wonder fizesse um significativo econtroverso filme que foi importantepor seu admirável e inteligente uso denumerosas técnicas visuais e sonoras,incluindo profundidade de foco, ângu-los incomuns de câmera, excelente ilu-minação, contundente e expressivamúsica de Bernard Herrmann, notáveisefeitos sonoros, e diálogo passando deuma seqüência para a outra seguinte.A controvérsia começa com o plot bá-sico – a notória vida pública e privadado editor americano Charles Foster Kane– que sugere muitos incidentes da vidade William Randolph Hearst. Tanto Kanequanto Hearst usaram o poder da im-prensa para influenciar a opinião pú-blica. Como resultado, a rede de jor-nais de Hearst evitou qualquer men-ção do audacioso filme e várias redesde cinema recusaram distribuí-lo ou exi-bi-lo. Cidadão Kane continua até hojedepois de mais de 60 anos a marcar suaforte influência nos novos cineastas.

Reds, realização de Warren Beatty, de1981, focalizou o repórter ativista JohnReed em vários momentos de sua vida,entre outros, sua estada na Rússia, ondeele presencia o nascimento da Revolu-ção. De volta aos Estados Unidos pu-blica seu livro Dez Dias que Abalaram oMundo, contando suas experiências. Ofilme ganhou vários Oscar, inclusive ode melhor diretor.

Outro bom filme sobre jornalismo é AEmbriaguez do Sucesso / Sweet smell of suc-

cess, realização de Alexan-dre MacKendrick, rodadoem 1957, com Burt Lancas-ter e Tony Curtis. Um co-lunista nova-iorquino degossips (B. Lancaster) rei-na supremo chegando a ma-nipular jovens mulheresambiciosas, políticos cor-ruptos e insaciáveis agen-tes do mundo publicitáriode Nova York. Curtis inter-preta o papel de um dessesfamintos, lisonjeadores e re-pulsivos agentes que ras-tejam na presença do colu-nista com o intuito de con-seguir a citação de um deseus poucos clientes na suacoluna. A maquinação des-ses dois repugnantes abu-tres urbanos termina numatragédia para um inocentejovem casal.

Fritz Lang em 1956 fil-mava No Silêncio de Uma Ci-dade/While the City Sleeps,tendo no seu elenco Geor-ge Sanders, Vincent Price,Ida Lupino e Thomas Mi-tchell, no qual um psico-

pata que assassinou várias mulheres é omotivo de competição de jornalistas paradescobrir sua identidade. O proprietá-rio do jornal (Price) promete um postoimportante para aquele de seus jornalis-tas que descobrir a identidade do assas-sino. Sua proposta incita uma feroz com-petição entre seus repórteres, tendo cadaum deles seu próprio motivo. Alguns, maisinsensíveis do que outros, usam suas na-moradas como chamariz para agarrar ofrio criminoso, que se descobre ser umjovem entregador (John Drew Barrymo-re) oprimido por sua mãe dominadora.Além desse plot criminal, o filme atacafortemente as práticas desonestas des-ses jornalistas que aceitam cruzar a linhada moralidade e da ética para alimentarsua própria ambição.

Para finalizarmos este apaixonantetema – jornalismo no cinema, especifi-camente no cinema americano, pois énele que encontramos um número es-magador de películas que abordam o as-sunto - citamos uma fita dirigida em 1956por Mark Robson (um dos montadores,juntamente com Robert Wise, de Cida-dão Kane): A Trágica Farsa/The harder theyfall, com Humphrey Bogart, Rod Stei-ger e Jan Sterling. Bogart interpreta umjornalista esportivo desiludido pela cor-rupção no meio do boxe nesse dramarealista e forte baseado numa novela deBudd Schulberg.

Num dos melhores filmes de John Ford,O Homem Que Matou o Facínora/The ManWho Shot Liberty Valance, realizado em1961, com John Wayne e James Stewart,há o personagem de um diretor de umjornal, o The Shinbone Star, que pronun-cia uma das mais belas frases já ditas numfilme: Quando os fatos se transformamem lendas, publique a lenda.

Baseado no livro DezDias Que Abalaram oMundo, do jornalista

John Reed, Reds,dirigido e estreladopor Warren Beatty,mostra a cobertura

da RevoluçãoBolchevique de 1917na Rússia por esse

repórter norte-americano.

Diane Keatone Warren Beattyem Reds

“Quando os fatos setransformam em

lendas, publique alenda”, disse o editor

do The ShinboneStar, no filme

O Homem que Matouo Facínora (The man

who shot LibertyValance).

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Em seu mais recente filme lançado noBrasil, Woody Allen realiza o sonho detodo repórter digno de exercer a função.Em Scoop, que no Brasil recebeu o sub-título de O Grande Furo, um repórterengana Creonte em sua barca da mortee volta do além para fornecer a uma focaambiciosa (Scarlett Johansson) a chavede um segredo ou de uma suspeita. Umherdeiro – e um aristocrata, ainda porcima - pode ser o responsável por crimesem série que estão abalando Londres.Para prová-lo, Scarlett arrisca sua vida,mas ganha ajuda de um mágico atrapa-lhado (o próprio Woody Allen). No fi-nal, o autor dá a marcha a ré e constróium filme na contracorrente de MatchPoint. Lá, Jonathan Rhys Meyers mata-va a grávida Scarlett Johansson para fi-car com o caminho livre e se casar comherdeira milionária, realizando o sonhode ascender socialmente. Seu crimepermanecia impune e é contra a impu-nidade que se insurge o Woody Allen de

Scoop, acreditando na força da imprensacontra o crime.

Mal comparando, Scarlett Johanssoné mais uma soldada da notícia, na ver-dadeira guerra pela informação que seconstitui num dos avatares das socie-dades ditas democráticas. É verdade quea guerra de Woody Allen se desenrolaem ambientes sofisticados da abastadanobreza da Inglaterra, que o diretor,ultimamente, transformou em objetocentral de interesse de seu cinema. AtéMatch Point, Woody Allen fez a maioria(quase todos) dos seus filmes em tornoda neurótica intelectualidade que habi-ta Manhattan. A falta de investidoresamericanos interessados em seu filmeslevou-o à Inglaterra e, em breve, à Espa-nha, onde se passa o próximo projeto.

A imprensa não é só o chamado quar-to poder (quando, ou se, livre). Ela tam-bém vem sendo, ao longo do tempo,objeto de particular interesse do cine-ma. Em Hollywood, contam-se dezenas

de clássicos entre os filmes que abordama atividade jornalística ou a figura dorepórter. Billy Wilder fez dois grandesfilmes - no começo dos anos 50, sua visãosombria da imprensa marrom, sensaci-onalista por natureza, desconcertou opúblico e A Montanha dos Sete Abutres/Ace in the Hole foi um dos raros fracassosde público do cineasta. Com o tempo,virou objeto de um verdadeiro culto, mas,na época, a falta de ética do jornalistainterpretado por Kirk Douglas caiu comoum flagelo sobre as platéias. Após per-der seu emprego, o cara vai parar numacidadezinha do interior, onde descobreque um infeliz ficou soterrado numa mina.Sem o menor escrúpulo, ele arma umgrande carnaval em torno do assunto,transformando a tragédia num eventomidiático capaz de lhe devolver o postoperdido. E também não se vexa de seenvolver sexualmente com a quase viú-va, que também não é flor que se cheire.

Wilder sempre cultivou o cinismo, mas

O filme Boa Noite, eBoa Sorte, mostra acorajosa oposição

que o jornalistaEdward R. Murrow

fez ao poderososenador Joseph

MacCarthy e suaimplacável caça aoscomunistas. O fatoatentava contra a

liberdade deexpressão doscidadãos norte-

americanos.

David Strathairn emBoa Noite, e Boa Sorte

POR LUIZ CARLOS MERTEN

ÉINTREPIDOS JORNALISTAS

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poucas vezes foi tão cínico como aqui.O ano representa muita coisa. Em 1951,quando ele fez este filme, a Comissãode Atividades Antiamericanas do Sena-do dos EUA, presidida pelo célebre Se-nador Joseph MacCarthy, estava caçandocomunistas e atentando contra a Emendanº 1, que garante a liberdade de expres-são como direito inalienável dos cida-dãos na democracia da América – e elefazia isso com a conivência da impren-sa, amordaçada em nome do patriotis-mo. Há dois anos, num belo filme inti-tulado Boa-Noite, e Boa Sorte - Good Ni-ght, And Good Luck, o ator e diretor Ge-orge Clooney voltou àquela época, con-tando a história do jornalista de tv quepeitou MacCarthy, como forma de re-fletir sobre essa outra manipulação damídia que caracteriza a presidência im-perial de George W. Bush, projeto con-solidado pelo clima de paranóia instala-do após o fatídico ataque do terrorismoem 11 de setembro de 2001. A reação aomacarthismo, não por meio da impren-sa, mas do próprio cinema, já fora o temade Testa de Ferro por Acaso-The Front, deMartin Ritt, de 1976, curiosamente comWoody Allen, em seu melhor papel comoator dramático, na pele do sujeito queemprestava seu nome a um roteiristaincluído na lista-negra – e que, no final,também peita a comissão que comandaa caça às bruxas de MacCarthy.

Quase no mesmo ano de Ritt, BillyWilder voltou ao tema da imprensa eem sua adaptação da peça de Ben Hechte Charles MacArthur, The Front Page (APrimeira Página), debateu, em 1975,outro assunto da maior gravidade - atéonde podem ir um editor, um jornal, umanação, em defesa de princípios que muitasvezes mascaram vis interesses pecuniá-rios? O ano, claro, não era menos im-portante do que quando Wilder fez AMontanha, mas o quadro agora era ou-tro e os EUA viviam a crise de confiançanas instituições que caracterizou o som-brio período do escândalo de Waterga-te. Justamente Watergate. Há 32 anos,a campanha do jornal The Washington Postpelo impeachment do Presidente RichardNixon, envolvido no arrombamento (eroubo de importantes documentos) nasede do Partido Democrata, na capitalamericana, representou um momentoparticularmente importante na históriada guerra das notícias (e na consolida-ção do quarto poder). Wilder insistia emsua tese de que a imprensa não age sóem defesa da democracia. Outros filmestambém trataram, até de forma maisdireta, do caso - sendo o mais famosoTodos os Homens do Presidente-All thePresident’s Men, de Alan J. Pakula, adap-tado do livro em que os repórteres BobWoodward e Carl Bernstein relatam suaexperiência. O tema, como sempre naobra deste diretor, era a quebra de con-fiança, nas relações interpessoais e/oupolíticas, mas seu filme não ia tão fun-do na discussão sobre o poder como outro

filme da mesma época, Um Lance noEscuro-Night Moves, de Arthur Penn, que,sem imprensa nem qualquer referênciaostensiva a Watergate – é uma históriade detetive –, refletiu ainda mais sobrea quebra de confiança que ameaçava mi-nar as bases da democracia americana.

Passaram-se três décadas de guerras,de manipulação da opinião pública e deinteresses econômicos e/ou políticos queameaçaram a atividade jornalística e ocinema estave sempre a postos paradenunciar o fato, ou os fatos. Em 1984,logo em sua estréia na direção, RolandJoffé usou a figura real de um jornalista(Sidney Schanberg, do The New York Ti-mes) em Os Gritos do Silêncio - The KillingFields para investir, com realismo, contrao horror dos massacres cometidos peloKhmer Vermelho no Camboja. Enquan-to Schanberg era premiado por seu tra-balho em Nova York, o cambojano quefora seu guia e grande apoio na investi-gação dos crimes vivia sua estação noinferno nos campos de prisioneiros daditadura de Pol Pot. Apenas um ano antes,Roger Spottiswoode transformara NickNolte num fotógrafo capaz de clicar o queos americanos negavam, o envolvimen-to da CIA na guerra ao sandinismo, queresultaria na queda da ditadura de Anas-tásio Somoza, na Nicarágua retratada emSob Fogo Cruzado-Under Fire.

Nenhum desses filmes desenvolvia seutema sob o enfoque romântico que, nosanos 50, Henry King imprimira a O Su-plício de Uma Saudade-Love Is a Many-Splendored Thing, em que o repórter Wi-lliam Holden amava a médica eurasianaJennifer Jones e seu avião era abatidodurante a Guerra da Coréia, deixando aheroína sozinha no monte no qual mar-cara encontro com ele, ao som de LoveIs a Many Splendored Thing, que a Aca-demia de Hollywood considerou a me-lhor canção de 1955. Mas o fato de nãoserem dramas românticos não significaque não fossem ingênuos e um tantotendenciosos, ideologicamente, ao de-

bater a liberdade de imprensa de manei-ra genérica, sem as nuances de análisesespecíficas dos quadros na Nicarágua eno Camboja. A questão da liberdade deimprensa também se superpõe ao mui-to mais espinhoso tema da pornografiaem O Povo Contra Larry Flint-The Peoplevs. Larry Flynt, de Milos Forman, de 1996,sobre o lendário criador da Hustler. Hásempre, ou quase sempre, uma roman-tização da ação do jornalista. MichaelMann se insurge contra isso no maior -pelo menos um dos maiores - filmes atratar da guerra entre liberdade de im-prensa e poder econômico em O Infor-mante, de 1999.

O Informante-The Insider foi o melhorfilme daquele ano, mas a Academia deHollywood preferiu atribuir seu Oscara Beleza Americana, de Sam Mendes,deixando de premiar também RussellCrowe, que nunca esteve melhor do quecomo o executivo da indústria tabagista

Da fantasia deWoody Allen, onde

um jornalista enganaCreonte em sua

barca da morte evolta do além para

dar a uma focaambiciosa uma pistaque poderá renderum grande furo, àrealidade cruel da

guerra em Os Gritosdo Silêncio, deRoland Joffé.

Hugh Jackman,Scarlett Johanssone Woody Allen emScoop - O Grande Furo

Sam Waterston eHaing S. Ngor emOs Gritos do Silêncio

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que revela informações secretas sobre ci-garro ao produtor do programa de tv 60Minutos. O cara é demitido, o jornalistase compromete com ele, mas, na hora Hde o programa ir ao ar, o anunciante usaseu poder para arquivar a grande maté-ria. Talvez a verdadeira guerra seja esta,entre a romantização do jornalista e aspressões que ele sofre dentro da Reda-ção. Ignoradas as últimas, o assunto ficareduzido a uma questão de foro íntimoe cria situações como a da repórter Bár-bara Stanwyck, que, em Adorável Vaga-bundo/Meet John Doe, de Frank Capra, de1941, transforma o homem comum GaryCooper num paladino da justiça para ven-der jornais e termina por acreditar neletanto quanto seus leitores.

O que se passa nos bastidores da notí-cia (Broadcast News) pode ser muito maiscomplexo do que mostra o triânguloamoroso apresentador de tv-editora-repórter ambicioso na comédia dramá-tica que leva este título, de James L.Brooks, no fim dos anos 80, depois queo diretor havia recebido o Oscar por Laçosde Ternura-Terms of Endearment, em 1983.Nem o cinema brasileiro escapa à sim-plificação, por mais interessante quepossa ser a abordagem do cotidiano deuma sucursal em Brasília, no filme Do-ces Poderes, da talentosa diretora LúciaMurat. Em 1990, depois do Plano Co-llor, Lúcia viajou muito com seu filmeQue Bom Te Ver Viva, que mostra depo-imentos de mulheres torturadas duranteo regime militar. Ela foi à Itália, à Ale-manha (após a queda do Muro de Ber-lim) e, ao regressar, descobriu que vá-rios amigos jornalistas, gente de esquer-da, estavam fazendo campanhas elei-torais, a maioria por absoluta falta deopções no mercado de trabalho. Lúciaachou que dava filme – e fez Doces Po-deres, sobre o envolvimento de jorna-listas em eleições de políticos. Em vezde denunciar, os caras viram marque-

teiros de políticos muitas vezes corrup-tos. Onde fica a ética?

Era atrás dela que também corria oMarco Bellocchio de O Monstro da Pri-meira Página-Sbatti il mostro in primapagina, longa de 1972 que nunca estreounos cinemas brasileiros (tendo sido res-gatado na tv, pela Cultura). O filme contaa história do editor de um grande jornalque tem cara de independente, mas éfinanciado pela direita italiana. Em ple-no processo eleitoral, o editor (Gian-Ma-ria Volontè), instruído por seus empre-gasdores, busca uma forma de incrimi-nar a esquerda, manipulando (mais queinfluenciando) a opinião pública. A his-tória é sórdida. Ele usa um tolo militan-te comunista como bode expiatório e otransforma em bode expiatório num casoque sacudiu a crônica policial – o estu-pro, seguido de assassinato, de uma jo-vem. Com Bellocchio, não é de hoje que,dizem os críticos, ele faz do protesto umaforma superior de arte cinematográfica.Já que a ética continua em discussão, jápensaram em quantos filmes se poderi-am fazer sobre os bastidores do impea-chment do ex-presidente Fernando Co-

llor de Mello? Só o livro Notícias do Pla-nalto, de Mário Sérgio Conti, fornece umacentena de roteiros – e nenhum seria maisimpressionante que o do contínuo quepassou informações à imprensa e termi-nou passando fome enquanto o jorna-lista (exatamente como em Gritos do Si-lêncio) ganhava exposição nacional e atéinternacional por sua série de reporta-gens em Veja.

Virar fotógrafo de jornal, de qualquermaneira, é o que salva o garoto de Ci-dade de Deus, de Fernando Meireles, devirar traficante como seu amigo de in-fância. O Brasil dos excluídos sociais eda violência urbana, infelizmente, é pró-digo em pautas – e roteiros. Bruno Bar-reto prepara-se, neste momento, parainiciar a filmagem de sua ficção sobre oepisódio do Ônibus 174, que já originouum famoso documentário de José Padi-lha. Em geral, o que interessa ao cine-ma é a denúncia e a dimensão social dotrabalho da imprensa. Mas existem ou-tros enfoques possíveis. O crítico deteatro obcecado pela perfeição de Cri-me Delicado, de Beto Brant, se envolvecom uma mulher imperfeita, a quem faltauma perna, mas que invade sua priva-cidade e subverte as normas de quemvivia a vida com distanciamento, comose fosse um dos espetáculos que criti-cava no jornal. Na mesma linha da im-prensa dos segundos cadernos, ou dasrevistas especializadas, houve há pou-co a Meryl Streep, ditadora da moda,de O Diabo Veste Prada-The Devil WearsPrada. Grande sucesso de público, ofilme, adaptado de um best seller, di-verte com seu retrato de uma mulherque é uma peste com suas subordina-das, mas é fera no que faz – e a cena emque ela faz a análise econômica e soci-ológica da moda é exemplar de sua acui-dade profissional.

Meryl, porém, por mais brilhante queseja, não foi a primeira ditadora de modado cinema. Em 1957, num musical quevirou clássico, Cinderela em Paris, Stan-ley Donen contou a história de uma bi-bliotecária sem graça que um fotógrafo,baseado em Richard Avedon e interpre-tado pelo lendário Fred Astaire, trans-forma numa estrela e ela topa a paradaporque seu desejo sempre foi ir à capitalfrancesa para conhecer as caves dos exis-tencialistas, no Quartier Latin. Cinde-rela em Paris-Funny Face é uma versão dis-farçada de Pigmalião, com Audrey Hep-burn no papel da criatura que se rebelacontra seu criador, ao qual ela voltaria,anos mais tarde, em outro musical, estesem imprensa – My Fair Lady, de Geor-ge Cukor, que, no Brasil, se chamou MinhaBela Dama. Cinderela em Paris já tinhasua Meryl Streep, só que ela, embora jáfosse uma diaba, não vestia Prada. KayThompson era quem interpretava o papel,inspirado na célebre Diane Vreeland, edi-tora de moda de Bazaar que um dia foifisgada pela concorrência, indo parar, maispoderosa ainda, em Vogue.

O enfoque românticode Henry King emO Suplício de Uma

Saudade fez opúblico suspirar pelocasal William Holden

e Jennifer Jones.Recentemente

O Diabo Veste Pradadivertiu mostrandouma editora que é

o terror de seussubordinados.O Brasil dos

excluídos sociais éretratado pela lente

do fotógrafo emCidade de Deus.

AlexandreRodriguesem Cidadede Deus

William Holdene Jennifer Jonesem Suplício deuma Saudade

Meryl Streep éMiranda Priestlyem O DiaboVeste Prada

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19Jornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABJornal da ABI I I I I 316 Janeiro de 2007

O interesse de Dejean MagnoPellegrin por cinema começoubastante cedo. Aos cinco anos, jáfreqüentava as salas de exibiçãode Campo Grande, bairro em quemorava na Zona Oeste do Rio, eonde ia, às quintas-feiras, àmatinê do Cinema Progresso, em1935. Também freqüentou o CineTeatro Campo Grande, o segundocriado naquele bairro e inauguradoem 1937.

Aos 13 anos, mudou-se paraVila Isabel e continuou com ohobby que se tornaria suaprofissão. À época, ganhou depresente o livro O cinema: suaarte, sua técnica, sua economia, deGeorges Sadoul, que muitos anosdepois, em 1959, foi seuprofessor no curso de Filmologiafeito na Sorbonne, graças a umabolsa de estudos concedida peloGoverno francês. Era, naquelemomento, colega de MaurícioAzêdo, Presidente da ABI, naFaculdade de Direito da atualUniversidade do Estado do Riode Janeiro-Uerj que teve queabandonar – mas não searrependeu. A leitura do livroabriu sua mente e mostrou-lheque cinema não era só diversão,mas também arte e indústria.Começou, então, a saber quaiseram os filmes importantes,marcos do cinema, criadoresde escolas como o neo-realismoe o expressionismo. E,conseqüentemente, passoua conhecer os bons diretores,os filmes sérios e procurou oscineclubes. Descobriu que na ABIhavia o Círculo de EstudosCinematográficos, fundado portrês jornalistas: Luís Alípio deBarros, que era crítico de cinemado Diário Carioca; Alex Viany,também cineasta, que traduziu parao português o livro de Sadoul e,Antônio Moniz Viana, conhecidocomo um dos melhores críticos decinema do Rio de Janeiro.

Mas Dejean foi ainda maislonge. Em 1956, fundou o própriocineclube, o Museu de ArteCinematográfica, que fez asprimeiras exibições na ABI edurou seis meses. Em seguida,

Dejean: desde moço,um cinemaníaco

fundou o Grupo de EstudosCinematográficos da UniãoMetropolitana dos Estudantes-Ume, que também começou naABI e depois foi para uma sala doMinistério da Educação. Foi aindamembro fundador da Cinematecado Mam, quando esta era aindachamado Cinema do Museu deArte Moderna, em 1954.

Durante o curso de Filmologia,Dejean trabalhou na CinematecaFrancesa, em Paris. Paralelamente,foi jornalista da Radiodifusão eTelevisão Francesas (RTF) elocutor e tradutor do jornalcinematográfico Les ActualitésFrançaises. Durante a temporadaparisiense, conheceu, entre outroscineastas, Jean Rouch (1917-2004), documentarista francês,criador do cinema etnográfico,de quem se tornou grande amigo.Depois, morou no Egito, ondepromoveu uma semana deexibição do cinema brasileirono Cairo e ainda uma semana decinema cubano também naquelepaís. Como funcionário doItamarati, trabalhou naEmbaixada do Brasil na UniãoSoviética e promoveu a primeirasemana do cinema brasileiro emMoscou, Alma-Ata e Baku. Devolta ao Brasil, em 1976, foi chefedo setor de difusão eplanejamento do Departamentodo Filme Cultural, da Embrafilme.

Dejean é também um dos

PERFIL

POR RODRIGO CAIXETA

fundadores da AssociaçãoBrasileira de Documentaristas edo Centro dos Pesquisadores doCinema Brasileiro. Apesar de suaposição de esquerda, diz queprefere o cinema norte-americano,mas afirma que o cinema nacionalestá muito bom tecnicamente. Oproblema, diz, é que o brasileironão está acostumado a ver o queé feito aqui.

Outra observação do jornalistae cineasta é com relação aotrabalho dos críticos de cinema.Ele – que já foi crítico de O Globoe da Tribuna da Imprensa – ficahorrorizado com as coisas que lê,pois percebe que "os colunistasnão conhecem cinema e dizemmuitas bobagens". Para Dejean,cinema não se aprende na escola,mas vendo muito filme ecultivando sabedoria, por meioda leitura de grandes teóricos e doacúmulo de conhecimentos gerais.

Grande amigo de GláuberRocha, Dejean foi quem lheentregou sua primeira medalhainternacional, pela vitória dolonga Barravento no FestivalInternacional de Cinema deKarlovy Vary, na antiga Tcheco-Eslováquia. Gláuber, que haviaido ao evento, mas não ficaraaté o fim, foi premiado semsaber, e só veio a receber seuprêmio alguns dias mais tarde,das mãos de Dejean, numencontro num bistrô em Paris.

Espectadorprecoce decinema, poiscom cinco anosjá freqüentavaas sessões dosubúrbio do Rioonde morava,Dejean fundouquando jovemmuitos núcleosde exibição defilmes. Elefigura entre oscriadores daCinemateca doMuseu de ArteModerna do Riode Janeiro.

Luiz Carlos Merten égaúcho, de Porto Alegre,onde nasceu em 12 desetembro de 1945. Formadopela UFRGS, exerceu ojornalismo em empresasgaúchas e desde 1989 estáno Caderno 2 do jornal OEstado de S.Paulo, assinandoa coluna filmes na TV efazendo reportagens decinema e críticas de filmes.Enviado do jornal a váriosfestivais nacionais einternacionais – entre eles,os de Cannes, Berlim,Veneza, Brasília, Gramadoe Recife –, conhece osbastidores do cinemabrasileiro como os doeuropeu e o hollywoodiano.Também faz crítica detelevisão e acompanha omercado de dvd. É autor doslivros Cinema - Um Zappingde Lumière a Tarantino,Cinema - Entre a Realidade e oArtifício e Cinema Gaúcho -Uma Breve História. No PortalEstadão(www.estadao.com.br),mantém um blog sob o títuloUma Geléia Geral a Partir doCinema, em que fala de tudoe todos: críticas,informações, novidades, comvárias atualizações diáriaspara manter o internauta apar do que se passa noplaneta Cinema.

Merten,um gaúchocom visãouniversal

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Coincidência ou não os dois principais super-heróis dos quadrinhos, Super-Homem e Homem-Aranha (cada um já ganhou várias versões cine-matográficas), quando assumem suas identida-des secretas são jornalistas. Um é repórter e o outroé fotógrafo, e trabalham para veículos diferentes.

Clark Kent, o Super-Homem, é um dos princi-pais jornalistas do tradicional Planeta Diário,exemplo do jornal digno e imparcal. Peter Parker,o Homem-Aranha, trabalha para o Clarim Diário,este um veículo tendencioso e sensacionalista.

Um verdadeiro jornalista sabe que a profissãoé incompatível com a de super-herói. É o tipo dotrabalho que não dá para acumular. Quem traba-lha em jornal sabe que tem hora para chegar masnão tem para sair, fora os inevitáveis pescoçõesde quinta e sexta-feira quando se preparam as edi-ções do fim de semana. Imagine que ocorra umainvasão de alienígenas ou um ataque terroristana cidade. Clark vai ter que ficar na Redação apu-rando os acontecimentos, ou mesmo que vá comorepórter apurar o fato terá que entregar a matériano prazo. Mesmo com todas as facilidades de hojeem dia, de mandar matérias por celulares e redewi-fi, vai ser difícil ele combater os perigos comoSuperman e fazer a cobertura como Clark simul-taneamente. Acabaria perdendo o emprego, por-que aliás algumas de suas aventuras duram maisde um dia. O que faria ele para explicar seu sumi-ço ao editor Perry White?

Com o Homem-Aranha é a mesma coisa. Ele éum fotógrafo free-lancer que faz exclusivamentefotos os combates de seu alter-ego com malucosde toda espécie. Deixa a câmara pendurada numateia filmando a pancadaria. E os enquadramentos,como ficam? Ele não está do outro lado da câmeraescolhendo o melhor ângulo. E por que ele só fo-tografa cenas de luta entre super-heróis e supervi-lões, e ainda por cima quando ele é um dos quefazem parte da luta? Por que nunca é incumbido defotografar um desfile de modas, por exemplo?

Deixa pra lá. Se formos ficar procurando lógicanão chegaremos a parte alguma. Vamos fingir quea rotina de um jornalista é um mar de rosas e elepode tranqüilamente sair deixar seu paletó nacadeira e "voar" sem que ninguém perceba. Diga-mos que, na vida real, desse para acumular asfunções.

Originalmente, Clark escolheu o Planeta Diá-rio para trabalhar porque na redação do jornal temacesso imediato a tudo o que está acontecendo,podendo saber dos problemas antes do resto domundo. Ao mesmo tempo, esse jornal é o símbo-

POR OTACÍLIO D' ASSUNÇÃO (OTA)

lo de tudo o que ele acredita: honestidade, de-cência, correção. O Planeta é o "bom jornal" porexcelência. Não está vinculado a nenhum grupopolítico e mantém a independência. Sua missãoé informar. Claro que uma manchete mostrandoo Super-Homem combatendo uma superameaçaajuda a vender mais edições, mas o jornal não sedobra ao que quer que seja.

Essa correção do Planeta remonta ao tempo emque o personagem Superman foi criado, em mea-dos dos anos 30. Naquela época mais inocente ojornalismo era visto dessa forma. Mesmo tendo sepassado setenta anos e havendo algumas moder-nidades, o Planeta continua continua fiel ao espí-rito da época em que a série foi criada. E seu editor,Perry White, exemplo a seguir. Já o Clarim Diárioé outra história. Seu editor, J. Jonah Jameson, étambém o dono. E usa o jornal de acordo com seusinteresses, semi-escusos na maior parte do tempo.Jonah não chega a ser um vilão, mas como algunsdonos de jornais da atualidade usa a informaçãocomo forma de manipulação.

O Homem-Aranha foi criado em 1962. Os jor-nais da época já haviam mudado um pouco emrelação aos de um quarto de século antes. O Cla-rim é um jornal na base do sensacionalismo. Notíciaé apenas para encher lingüiça, o que importa évender mais jornal. Assim, o diabólico Jonah Ja-meson aproveita para distorcer um pouquinho arealidade e transformar o Homem-Aranhanum elemento perigoso. Enquanto o Pla-neta endeusa os feitos do Super-Homem, oClarim coloca o Homem-Aranha como umaameaça. à sociedade.

O mais estranho ainda é que oAranha trabalha para lá. Desem-pregado, Peter Parker só tem comoopção vender as fotos que tira desi próprio enquanto está em avi-vidade super-heróica para fatu-rar uns trocados. Sem que alguémquestione a coincidência, ele

EPÍLOGO

sempre envia para a Re-dação, poucos minutosapós o fim da contenda,fotos fresquinhas do emba-te. Que sempre vão servirpara ilustrar as manchetescontra ele próprio. Agora já dá pra mandar foto atépor celular, mas na época antiga ele ainda arruma-va tempo para se recuperar da luta, revelar o filmee mandar para o jornal a tempo.

Se, em vez de terem sido criados setenta ouquarenta e cinco anos atrás, esses personagenssurgissem hoje, em que jornal trabalhariam? Clarkpossivelmente estaria num tablóide de 50 centa-vos desses que fariam o próprio Jonah Jameson corarde vergonha. Peter em vez de repórter seria umpaparazzo flagrando a Daniela Cicarelli pelada napraia ou outra famosa da vez aprontando alguma,ou, quem sabe, alguma presepada de um BBB.

Bons tempos em que todos os jornais eram maisparecidos com o Planeta Diário.

Otacílio d’Assunção é jornalista especializadoem quadrinhos, cartunista e co-autor dolivro Literatura em Quadrinhos no Brasil.

Acima, o crachá do repórter-fotográfico Peter Parker e seualter ego, Homem Aranha, em ação emseu segundo filme. Ao lado, ChristopherReeve veste o uniforme de Super-Homem, em Superman - O Filme.