20070320 01c 07 fo

1
7 FORTALEZA-CE, TERÇA-FEIRA, 20 de março de 2007 FORTALEZA O capitão Daniel Gomes está preso no BPChoque, no bairro José Bonifácio. A “cela” do oficial não possui grades e possui certo conforto. “É como uma sala. Possui cama, tevê e um banheiro. Se não fosse pela gravidade da acusação, ele estaria circulando tranqüilamente pelas dependências do quartel”, revelou um policial militar, ao O POVO. De acordo com o policial, o capitão poderia ficar no alojamento dos oficiais, mas houve um certo “desconforto” dos colegas. Se condenado pela morte dos irmãos, o capitão será encaminhado ao Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPO), em Itaitinga. “Mas ele não ficaria junto aos presos comuns. Ficaria em uma ala conhecida como Vila Rica, destinada somente a policiais que cumprem penas”, informou o policial. O capitão foi preso por duas medidas, uma judicial, e outra de caráter normativo da PM. Na tarde do último domingo, o juiz de Direito de Acopiara, Zanilton Medeiros, que estava de plantão no fim de semana, solicitou a prisão preventiva do capitão, que já confessou o duplo assassinato. O pedido de preventiva foi solicitado pelo delegado regional de Iguatu, Marcos André da Silva, que está investigando o caso. No parecer do magistrado, a afirmativa no pedido de prisão preventiva do oficial foi para assegurar a garantia da ordem pública. Antes da solicitação da Justiça, o capitão já havia sido transferido para Fortaleza no sábado, depois que se apresentou em Jaguaribe, onde prestou depoimento na delegacia. Segundo o coronel Sérgio Magalhães, do Comando de Policiamento do Interior, o capitão, que é comandante do destacamento de Mombaça, confessou estar de posse de uma pistola ponto 40 (.40), que pertence à PM. Como estava de folga, ele não poderia estar portando uma arma da corporação, apesar de ter o direito de transitar com uma arma particular. No depoimento, o capitão disse que a pistola estaria dentro de seu carro, e não chegou a dispará-la. (NA/MC) Há quase quatro anos, o motorista de ônibus Paulo Sérgio Barros de Freitas também foi morto por um policial militar, por um motivo banal. Após uma discussão de trânsito, o na época subtenente Wily de Oliveira Monteiro, que era lotado na Casa Militar, teria atirado na cabeça do motorista. O crime, ocorrido no dia 16 de agosto de 2003, aconteceu em frente à garagem da empresa Via Urbana, no bairro Lagoa Redonda, e foi presenciado por dois seguranças da empresa. Na época, o policial militar afirmou que o tiro teria sido acidental. Apesar disso, em abril de 2004, ele foi considerado culpado pelo Conselho de Sentença do 3° Tribunal do Júri e condenado a 12 anos e seis meses de reclusão. No mesmo ano, o então soldado da PM Francisco Ferreira Menezes foi condenado pelo Tribunal do Júri de Mulungu a 19 anos e seis meses de prisão pela morte do comerciante Aluísio Lopes de Queiroz. O crime ocorreu em outubro de 2000 e teria sido motivado por uma discussão de bar. Vítima e acusado bebiam juntos e, após uma discussão, o policial, que estava de folga, teria sacado a arma e atingido o comerciante com três disparos. (Carlos Henrique Camelo) Delegado de Iguatu diz que médicos foram executados DEPOIMENTOS ] Delegado conclui que irmãos, recém-formados em Medicina, foram executados pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra. Testemunhas detalham assassinatos e dizem que arma seria do militar, provavelmente um revólver 38, cano curto. Capitão deve depor em Iguatu até a próxima sexta-feira Nicolau Araújo da Redação O delegado regional de Iguatu, Marcos An- dré, disse ontem ao O POVO que os irmãos Marcelo Moreno Teixeira, 26, e Leonardo Moreno Teixeira, 24, foram executados pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra. O crime aconteceu na madrugada do último sábado, em frente a uma churrascaria, em Iguatu, a 377 quilômetros de Fortaleza. O oficial se encontra detido no quartel do BPChoque, no bairro José Bonifácio, em Fortaleza. A conclusão do delegado tem como base os depoimentos de sete testemunhas que presen- ciaram quando o capitão teria atirado contra os irmãos. “Dois depoimentos contam com deta- lhes como tudo aconteceu e até a arma que foi usada pelo capitão. Investigamos a possibilidade de ser um revólver de cano curto e preto, provavelmente um 38”, disse o delegado ao O POVO, ontem à tarde. Segundo o delegado, duas testemunhas contaram que Da- niel teria dado uma rasteira em Marcelo Moreno e passou a es- pancá-lo. Inicialmente, o capitão teria procurado uma arma em sua cintura, mas ela estaria no carro. “Então ele teria puxado o revólver, que chegou a cair no chão. Foi nesse momento que as testemunhas visualizaram a arma. Ele (capitão) então colheu a arma, empurrou uma das tes- temunhas e efetuou o disparo. O rapaz (Marcelo Moreno) caiu aos pés da testemunha, que cor- reu. O irmão da vítima chegou por trás do capitão, o agarrou e, ao contrário da versão da agres- são, ficou pedindo para que o capitão não matasse Marcelo. Mas Daniel conseguiu encostar a arma em seu (Leonardo Moreno) abdome e efetuou outro disparo na arma”, disse o delegado. Para o delegado Marcos An- dré, o depoimento do capitão Daniel na delegacia de Jaguari- be, quatro horas após os crimes, apresenta muitos pontos falhos. “O capitão tentou dar uma ver- são de legítima defesa e chegou a dizer que a arma seria de um dos rapazes. Mas ele entrou várias vezes em contradição. Se a arma pertencia às vítimas, por que o capitão não se lembra onde a colocou?”, observo u o titular da regional do Iguatu, que deverá tomar o depoimento do capitão até a próxima sexta-feira. Ainda segundo o depoimento do oficial, Leonardo teria dado uma gravata em seu pescoço, por isso ele teria atirado no rapaz. Os irmãos Marcelo e Leonar- do Moreno foram mortos quando já estariam se preparando para deixar a churrascaria onde es- tavam em companhia de um tio, Weimar Moreno, por volta das duas horas da madrugada. Se- gundo testemunhas, como o es- tabelecimento estava fechando, Marcelo Moreno decidiu urinar atrás do veículo que pertencia ao capitão. A filha da namorada do oficial estaria dormindo no interior do carro. A mãe da ga- rota viu a cena e teria chamado o capitão, que teria começado a espancar Marcelo, dando início ao crime (em depoimento, o capitão teria dito que a menina estava chorando, o que foi des- mentido pelas testemunhas). CAPITÃO DA PM Daniel Gomes Bezerra está preso no BPChoque, no bairro José Bonifácio FCO FONTENELE Oficial está preso no BPChoque Motorista assassinado em 2003 Segundo o delegado, duas testemunhas contaram que Daniel Gomes teria dado uma rasteira em Marcelo Moreno e passou a espancá-lo Médicos passaram o dia trabalhando Sonhos desfeitos. Assim definiu Weimar Moreno sobre a morte dos sobrinhos Marcelo, 26, e Leonardo Teixeira Moreno, 24, médicos recém-formados, assassinados na madrugada do último sábado pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra. “Fazia tempo que não os via, desde o Natal. No dia do crime, eles me disseram que haviam trabalhado 48 horas direto nos hospitais. Queriam juntar dinheiro para comprar um notebook moderno”, recorda- se Weimar, que estava com os rapazes na churrascaria Vilson Grill, estrada perimetral, em Iguatu. De acordo com Weimar, os três já estavam se preparando para deixar o estabelecimento. Ele e Leonardo dirigiram-se ao caixa para pagar a conta, enquanto Marcelo teria ficado na mesa. “Eu quis pagar em dinheiro, mas o Leozinho disse que fazia questão de deixar a conta com ele, pois tinha sido um prazer me rever. Mas deu um problema na máquina de cartão e fomos tentar resolver”, recorda-se. Ele diz não precisar quando o capitão começou a agredir Marcelo, pois estava com Leonardo no caixa. “Só ouvimos a confusão e fomos para lá. Quando chegamos, encontramos os garçons e o seresteiro tentando afastar o capitão, que estava chutando meu sobrinho, caído no chão”, ressalta. Weimar intercedeu pelo rapaz, pedindo para que o oficial se acalmasse, que ele não precisava ter feito aquilo com o garoto. O tio disse que não saiu da distância de um metro e meio do policial. Ele estaria tentando acalmá-lo, mas o oficial se abaixou e pegou a arma da perna. “Foi rápido. Vi a arma na mão dele, era pequenina e não tinha tambor, como os revólveres. Então ele atira no Marcelinho, que cai. O Leozinho se segura ao capitão e pede para ele não matar o irmão. Mas o oficial agarra o Leozinho e atira na barriga dele. Depois, sai correndo”, lamenta-se. Weimar disse que o capitão ainda teria ameaçado atirar nele também. “Fiquei de costas para ele, perto do Marcelinho”, completa. Além de trabalhar no sábado, o fim de semana dos irmãos seria do lado da família, em Mombaça, onde moram seus pais. Leonardo era noivo de Clarissa Cavalcante, estudante de Medicina. Os dois iriam se casar em 2008. “O Leozinho era muito metódico. Os dois sempre foram bons meninos e eram exemplo para muitos jovens em Mombaça. Sempre estudiosos, não eram muito de sair. Eles estudaram no exterior, na Bolívia, e depois foram transferidos para Tocantins. Agora essa cara, que eu nunca tinha visto antes, acaba com a vida deles e toda a família”, diz Weimar, sem esconder a indignação. A missa de sétimo dia está prevista para acontecer na próxima sexta-feira, na igreja matriz de Mombaça, em horário a confirmar. (Marcos Cavalcante) Psicóloga afirma que é preciso acompanhamento Falta de equilíbrio emocional e de acompanhamento psicológico intenso foram os motivos apontados pela psicoterapeuta Virgínia Moreira para a atitude do capitão Daniel Gomes Bezerra. “Ele foi contra à expectativa. Em vez de oferecer segurança, provocou a violência”. Segundo ela, o policial não tinha capacidade emocional para ocupar o cargo que recebeu. “O acompanhamento psicológico é fundamental. Não só pela saúde dos policiais, como pelo bem estar da população”. Outra questão levantada pela psicóloga é que haja uma maior exigência na seleção dos profissionais de segurança. Virgínia ressalta que o porte de arma é uma responsabilidade grande e só deve ser dada a quem tem equilíbrio sob suas reações. “Às vezes o profissional não vive bem, trabalha demais e acaba usando o pouco poder que tem para ter o mínimo de felicidade. No caso do capitão, ele não conseguiu lidar com a raiva do momento e se aproveitou do poder que tinha”. Participante de uma pesquisa sobre depressão que envolveu as cidades de Fortaleza, Boston (EUA) e Santiago (Chile), ela relata que apenas os fortalezenses apontaram como causa de doenças psicológicas a violência urbana. “As pessoas acabam convivendo com isso como se fosse uma coisa natural, mas a violência repercute a níveis emocionais enormes. A gente não se dá conta do desgaste de ter medo de ações básicas como parar no sinal”. Conforme Virgínia, isso indica que situações de violência banal, como a que ocorreu com os irmãos médicos, estão vinculadas diretamente com o aumento das doenças mentais. Segundo o comandante- geral da Polícia Militar, coronel Adail Bessa Queiroz, existem hoje duas maneiras de se chegar ao posto de capitão. A primeira é por meio de concurso e somente para policiais com pelo menos 16 anos de carreira. Depois de passar por uma série de provas, um curso de seis meses e estágio de um mês, os oficiais podem compor o quadro administrativo da polícia. “Mas só podem ocupar funções administrativas”, destaca o coronel. A outra forma de um policial chegar ao cargo de capitão é por meio de um concurso público realizado pela Universidade Estadual do Ceará (Uece), como ocorreu com o capitão Daniel. “É um vestibular como qualquer outro”, explica Bessa. Depois disso, os policiais são submetidos aos exames psicotécnico, físico e médico para ingressar na Academia de Polícia Militar. “Eles se tornam bacharéis em segurança pública, mas antes passam por uma série de exames e entrevistas realizados pela Junta Militar de Saúde”. Bessa destaca que o Centro Psíquico-Social da PM, que foi criado em 1999, está em processo de institucionalização. Foi lançado um edital para a contratação de 30 profissionais de saúde. “O sistema está defasado, a quantidade de médicos já não atende à demanda. Mas estamos tentando reverter esta situação”. (Yanna Guimarães) Outra questão levantada pela psicóloga é que haja uma maior exigência na seleção dos profissionais de segurança. Virgínia ressalta que o porte de arma é uma responsabilidade grande

Upload: o-povo-online

Post on 08-Jul-2015

127 views

Category:

Documents


11 download

TRANSCRIPT

Page 1: 20070320 01c 07 fo

7FORTALEZA-CE, TERçA-FEiRA, 20 de março de 2007

FORTALEZA

O capitão Daniel Gomes está preso no BPChoque, no bairro José Bonifácio. A “cela” do oficial não possui grades e possui certo conforto. “É como uma sala. Possui cama, tevê e um banheiro. Se não fosse pela gravidade da acusação, ele estaria circulando tranqüilamente pelas dependências do quartel”, revelou um policial militar, ao O POVO.

De acordo com o policial, o capitão poderia ficar no alojamento dos oficiais, mas houve um certo “desconforto” dos colegas. Se condenado pela morte dos irmãos, o capitão será encaminhado ao Instituto Penal Paulo Sarasate (IPPO), em Itaitinga. “Mas ele não ficaria junto aos presos comuns. Ficaria em uma ala conhecida como Vila Rica, destinada somente a policiais que cumprem penas”, informou o policial.

O capitão foi preso por duas medidas, uma judicial, e outra de caráter normativo da PM. Na tarde do último domingo, o juiz de Direito de Acopiara, Zanilton Medeiros, que estava de plantão no fim de semana, solicitou a prisão preventiva do capitão, que já confessou o duplo assassinato. O pedido de preventiva foi solicitado pelo delegado regional de Iguatu, Marcos André da Silva, que está investigando o caso. No parecer do magistrado, a afirmativa no pedido de prisão preventiva do oficial foi para assegurar a garantia da ordem pública.

Antes da solicitação da Justiça, o capitão já havia sido transferido para Fortaleza no sábado, depois que se apresentou em Jaguaribe, onde prestou depoimento na delegacia. Segundo o coronel Sérgio Magalhães, do Comando de Policiamento do Interior, o capitão, que é comandante do destacamento de Mombaça, confessou estar de posse de uma pistola ponto 40 (.40), que pertence à PM. Como estava de folga, ele não poderia estar portando uma arma da corporação, apesar de ter o direito de transitar com uma arma particular. No depoimento, o capitão disse que a pistola estaria dentro de seu carro, e não chegou a dispará-la. (NA/MC)

Há quase quatro anos, o motorista de ônibus Paulo Sérgio Barros de Freitas também foi morto por um policial militar, por um motivo banal. Após uma discussão de trânsito, o na época subtenente Wily de Oliveira Monteiro, que era lotado na Casa Militar, teria atirado na cabeça do motorista. O crime, ocorrido no dia 16 de agosto de 2003, aconteceu em frente à garagem da empresa Via Urbana, no bairro Lagoa Redonda, e foi presenciado por dois seguranças da empresa.

Na época, o policial militar afirmou que o tiro teria sido acidental. Apesar disso, em abril de 2004, ele foi considerado culpado pelo Conselho de Sentença do 3° Tribunal do Júri e condenado a 12 anos e seis meses de reclusão.

No mesmo ano, o então soldado da PM Francisco Ferreira Menezes foi condenado pelo Tribunal do Júri de Mulungu a 19 anos e seis meses de prisão pela morte do comerciante Aluísio Lopes de Queiroz. O crime ocorreu em outubro de 2000 e teria sido motivado por uma discussão de bar. Vítima e acusado bebiam juntos e, após uma discussão, o policial, que estava de folga, teria sacado a arma e atingido o comerciante com três disparos. (Carlos Henrique Camelo)

Delegado de Iguatu diz que médicos foram executadosDEPOIMENTOS ] Delegado conclui que irmãos, recém-formados em Medicina, foram executados pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra.

Testemunhas detalham assassinatos e dizem que arma seria do militar, provavelmente um revólver 38, cano curto. Capitão deve depor em Iguatu até a próxima sexta-feira

Nicolau Araújoda Redação

O delegado regional de Iguatu, Marcos An-dré, disse ontem ao O POVO que os irmãos

Marcelo Moreno Teixeira, 26, e Leonardo Moreno Teixeira, 24, foram executados pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra. O crime aconteceu na madrugada do último sábado, em frente a uma churrascaria, em Iguatu, a 377 quilômetros de Fortaleza. O oficial se encontra detido no quartel do BPChoque, no bairro José Bonifácio, em Fortaleza.

A conclusão do delegado tem como base os depoimentos de sete testemunhas que presen-ciaram quando o capitão teria atirado contra os irmãos. “Dois depoimentos contam com deta-lhes como tudo aconteceu e até a arma que foi usada pelo capitão. Investigamos a possibilidade de ser um revólver de cano curto e preto, provavelmente um 38”, disse o delegado ao O POVO, ontem à tarde.

Segundo o delegado, duas testemunhas contaram que Da-niel teria dado uma rasteira em Marcelo Moreno e passou a es-pancá-lo. Inicialmente, o capitão teria procurado uma arma em sua cintura, mas ela estaria no carro. “Então ele teria puxado o revólver, que chegou a cair no chão. Foi nesse momento que as testemunhas visualizaram a arma. Ele (capitão) então colheu a arma, empurrou uma das tes-temunhas e efetuou o disparo. O rapaz (Marcelo Moreno) caiu aos pés da testemunha, que cor-reu. O irmão da vítima chegou por trás do capitão, o agarrou e, ao contrário da versão da agres-são, ficou pedindo para que o capitão não matasse Marcelo. Mas Daniel conseguiu encostar a arma em seu (Leonardo Moreno)

abdome e efetuou outro disparo na arma”, disse o delegado.

Para o delegado Marcos An-dré, o depoimento do capitão Daniel na delegacia de Jaguari-be, quatro horas após os crimes, apresenta muitos pontos falhos. “O capitão tentou dar uma ver-são de legítima defesa e chegou a dizer que a arma seria de um dos rapazes. Mas ele entrou várias vezes em contradição. Se a arma pertencia às vítimas, por que o capitão não se lembra onde a colocou?”, observo u o titular da regional do Iguatu, que deverá tomar o depoimento do capitão até a próxima sexta-feira. Ainda segundo o depoimento do oficial, Leonardo teria dado uma gravata em seu pescoço, por isso ele teria atirado no rapaz.

Os irmãos Marcelo e Leonar-do Moreno foram mortos quando já estariam se preparando para deixar a churrascaria onde es-tavam em companhia de um tio, Weimar Moreno, por volta das duas horas da madrugada. Se-gundo testemunhas, como o es-tabelecimento estava fechando, Marcelo Moreno decidiu urinar atrás do veículo que pertencia ao capitão. A filha da namorada do oficial estaria dormindo no interior do carro. A mãe da ga-rota viu a cena e teria chamado o capitão, que teria começado a espancar Marcelo, dando início ao crime (em depoimento, o capitão teria dito que a menina estava chorando, o que foi des-mentido pelas testemunhas). CAPITÃO DA PM Daniel Gomes Bezerra está preso no BPChoque, no bairro José Bonifácio

FCO FONTENELE

Oficial está preso no BPChoque

Motorista assassinado em 2003

Segundo o delegado, duas testemunhas contaram que Daniel Gomes teria dado uma rasteira em Marcelo Moreno e passou a espancá-lo

Médicos passaram o dia trabalhando

Sonhos desfeitos. Assim definiu Weimar Moreno sobre a morte dos sobrinhos Marcelo, 26, e Leonardo Teixeira Moreno, 24, médicos recém-formados, assassinados na madrugada do último sábado pelo capitão da Polícia Militar Daniel Gomes Bezerra. “Fazia tempo que não os via, desde o Natal. No dia do crime, eles me disseram que haviam trabalhado 48 horas direto nos hospitais. Queriam juntar dinheiro para comprar um notebook moderno”, recorda- se Weimar, que estava com os rapazes na churrascaria Vilson Grill, estrada perimetral, em Iguatu.

De acordo com Weimar, os três já estavam se preparando para deixar o estabelecimento. Ele e Leonardo dirigiram-se ao caixa para pagar a conta, enquanto Marcelo teria ficado na mesa. “Eu quis pagar em dinheiro, mas o Leozinho disse que fazia questão de deixar a conta com ele, pois tinha sido um prazer me rever. Mas deu um problema na máquina de cartão e fomos tentar resolver”, recorda-se.

Ele diz não precisar quando o capitão começou a agredir Marcelo, pois estava com Leonardo no caixa. “Só ouvimos a confusão e fomos para lá. Quando chegamos, encontramos os garçons e o seresteiro tentando afastar o capitão, que estava chutando meu sobrinho, caído no chão”, ressalta. Weimar intercedeu pelo rapaz, pedindo para que o oficial se acalmasse, que ele não precisava ter feito

aquilo com o garoto. O tio disse que não saiu da

distância de um metro e meio do policial. Ele estaria tentando acalmá-lo, mas o oficial se abaixou e pegou a arma da perna. “Foi rápido. Vi a arma na mão dele, era pequenina e não tinha tambor, como os revólveres. Então ele atira no Marcelinho, que cai. O Leozinho se segura ao capitão e pede para ele não matar o irmão. Mas o oficial agarra o Leozinho e atira na barriga dele. Depois, sai correndo”, lamenta-se. Weimar disse que o capitão ainda teria ameaçado atirar nele também. “Fiquei de costas para ele, perto do Marcelinho”, completa.

Além de trabalhar no sábado, o fim de semana dos irmãos seria do lado da família, em Mombaça, onde moram seus pais. Leonardo era noivo de Clarissa Cavalcante, estudante de Medicina. Os dois iriam se casar em 2008. “O Leozinho era muito metódico. Os dois sempre foram bons meninos e eram exemplo para muitos jovens em Mombaça. Sempre estudiosos, não eram muito de sair. Eles estudaram no exterior, na Bolívia, e depois foram transferidos para Tocantins. Agora essa cara, que eu nunca tinha visto antes, acaba com a vida deles e toda a família”, diz Weimar, sem esconder a indignação. A missa de sétimo dia está prevista para acontecer na próxima sexta-feira, na igreja matriz de Mombaça, em horário a confirmar. (Marcos Cavalcante)

Psicóloga afirma que é preciso acompanhamento

Falta de equilíbrio emocional e de acompanhamento psicológico intenso foram os motivos apontados pela psicoterapeuta Virgínia Moreira para a atitude do capitão Daniel Gomes Bezerra. “Ele foi contra à expectativa. Em vez de oferecer segurança, provocou a violência”. Segundo ela, o policial não tinha capacidade emocional para ocupar o cargo que recebeu. “O acompanhamento psicológico é fundamental. Não só pela saúde dos policiais, como pelo bem estar da população”.

Outra questão levantada pela psicóloga é que haja uma maior exigência na seleção dos profissionais de segurança. Virgínia ressalta que o porte de arma é uma responsabilidade grande e só deve ser dada a quem tem equilíbrio sob suas reações. “Às vezes o profissional não vive bem, trabalha demais e acaba usando o pouco poder que tem para ter o mínimo de felicidade. No caso do capitão, ele não conseguiu lidar com a raiva do momento e se aproveitou do poder que tinha”.

Participante de uma pesquisa sobre depressão que envolveu as cidades de Fortaleza, Boston (EUA) e Santiago (Chile), ela relata que apenas os fortalezenses

apontaram como causa de doenças psicológicas a violência urbana. “As pessoas acabam convivendo com isso como se fosse uma coisa natural, mas a violência repercute a níveis emocionais enormes. A gente não se dá conta do desgaste de ter medo de ações básicas como parar no sinal”. Conforme Virgínia, isso indica que situações de violência banal, como a que ocorreu com os irmãos médicos, estão vinculadas diretamente com o aumento das doenças mentais.

Segundo o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Adail Bessa Queiroz, existem hoje duas maneiras de se chegar ao posto de capitão. A primeira é por meio de concurso e somente para

policiais com pelo menos 16 anos de carreira. Depois de passar por uma série de provas, um curso de seis meses e estágio de um mês, os oficiais podem compor o quadro administrativo da polícia. “Mas só podem ocupar funções administrativas”, destaca o coronel.

A outra forma de um policial chegar ao cargo de capitão é por meio de um concurso público realizado pela Universidade Estadual do Ceará (Uece), como ocorreu com o capitão Daniel. “É um vestibular como qualquer outro”, explica Bessa. Depois disso, os policiais são submetidos aos exames psicotécnico, físico e médico para ingressar na Academia de Polícia Militar. “Eles se tornam bacharéis em segurança pública, mas antes passam por uma série de exames e entrevistas realizados pela Junta Militar de Saúde”.

Bessa destaca que o Centro Psíquico-Social da PM, que foi criado em 1999, está em processo de institucionalização. Foi lançado um edital para a contratação de 30 profissionais de saúde. “O sistema está defasado, a quantidade de médicos já não atende à demanda. Mas estamos tentando reverter esta situação”. (Yanna Guimarães)

Outra questão levantada pela psicóloga é que haja uma maior exigência na seleção dos profissionaisde segurança. Virgínia ressalta que o porte de arma é uma responsabilidade grande

BD
Cabeçalho
#Data: 070320 #Clichê: Primeiro #Editoria: Fortaleza
BD
Marcadores
#Autor: Nicolau Araújo #Crédito: Fco Fontenele <DEPOIMENTO> <ASSASSINATO> <MÉDICO> <POLICIAL> <POLÍCIA MILITAR> <IGUATU /CE/>
BD
Erramos
ERRAMOS Na matéria, a sigla correta do Instituto Penal Paulo Sarasate é IPPS e não IPPO como foi publicado. Na mesma matéria, o correto é dizer que o juiz de Direito de Acopiara, Zanilton Medeiros, determinou a prisão preventiva do capitão. Ainda na matéria, a frase correta é "Antes da solicitação do delegado "e não Antes da solicitação da Justiça.