2 (qvlqr sru $wlylgdghv ([shulphqwdlv
TRANSCRIPT
O Ensino porAtividades Experimentais
ISSN 1980-3141 e-ISSN DOI 10.37084 2675-1909ano 15n. 35Set. - Dez.| | | | |
Revista de Matemática, Ensino e Cultura
REMATEC Revista de Matemática, Ensino e Cultura
O Ensino por Atividades Experimentais
Editores deste Número
Pedro Franco de Sá
Thiago Beirigo Lopes
Conselho Editorial
Amílcar Manuel do Rosário Oliveira, Universidade Aberta de Portugal, Portugal
Amílcar Pinto Martins, Universidade Aberta de Portugal, Portugal
Arthur Powell, Rutgers University de Newark, USA
Carlos Aldemir Farias da Silva, Universidade Federal do Pará, Brasil
Cláudia Lisete Oliveira Groenwald, Universidade Luterana do Brasil, Brasil
Cláudia Regina Flores, Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Edivania Santos Alves, Universidade Federal do Pará, Brasil
Claudianny Amorim Noronha, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Elisabete Zardo Búrigo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil
Emmánuel Lizcano Fernandez, Universidad Nacional de Educación a Distancia - Madrid, España
Fredy Enrique González, Universidad Pedagógica Experimental Libertador - Maracay, Venezuela
Iran Abreu Mendes, Universidade Federal do Pará, Brasil
Isabel Cristina Rodrigues de Lucena, Universidade Federal do Pará, Brasil
Jesus Victoria Flores Salazar, Pontificia Universidad Católica de Lima, Perú
John A. Fossa, Universidade Estadual da Paraíba, Brasil
José Manuel Leonardo Matos, Universidade Nova de Lisboa, Portugal
Kaled Sulaiman Khidir, Universidade Federal do Tocantins, Brasil
Luis Carlos Arboleda, Universidad del Valle - Cali, Colombia
Luis Radford, Université Laurentienne, Canadá
Marcelo de Carvalho Borba, Universidade Estadual Paulista - Rio Claro, Brasil
Márcia Maria Alves de Assis, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Brasil
Maria Auxiliadora Lisboa Moreno Pires, Universidade Estadual de Feira de Santana, Brasil
Maria Célia Leme da Silva, Universidade Federal de São Paulo, Brasil
Maria da Conceição Xavier de Almeida, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Maria Cristina Araujo de Oliveira, Universidade Federal de Juiz de Fora, Brasil
Miguel Chaquiam, Universidade do Estado do Pará, Brasil
Pedro Franco de Sá, Universidade do Estado do Pará, Brasil
Rafael José Alves do Rêgo Barros, Instituto Federal da Paraiba, Brasil
Teresa Paula Costa Azinheira Oliveira, Universidade Aberta de Portugal, Portugal
Teresa Vergani, Universidade Aberta de Portugal, Portugal
Kaled Sulaiman Khidir, Universidade Federal do Tocantins, Brasil
Ubiratan D’Ambrosio, Universidade Anhanguera de São Paulo, Brasil
Wagner Rodrigues Valente, Universidade Federal de São Paulo, Brasil
Editores
Iran Abreu Mendes
Carlos Aldemir Farias da Silva
Projeto gráficocapa
Luis Andrés Castillo Bracho
Capa
Akademia di Atenas dor di Raphael (1509–1510)
fresco na e Palacio Apostoliko, Suidad Vaticano (Dominio publico)
Fonte: http://bit.ly/2Y0Japg
Instituição Editora
Grupo de Pesquisa sobre Práticas Socioculturais e Educação Matemática
(GPSEM/UFPA) Brasil
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura
Grupo de Pesquisas sobre Praticas Socioculturais e Educação Matemática - GPSEM
Ano 15 | n. 35 | set. - dez. 2020
ISSN: 1980-3141
e-ISSN: 2675-1909
Prefixo DOI: 10.37084
Endereço para envio de artigos, resenhas, sugestões e críticas:
http://www.rematec.net.br/index.php/rematec
Contato:
Editorial
Pedro Franco de Sá Thiago Beirigo Lopes
Artigos
Algumas considerações teóricas sobre o ensino de matemática por atividades..............................
John A. Fossa
10-26
Habilidades na resolução de problemas fundamentada na teoria da atividade em estudantes da
licenciatura em matemática..............................................................................................................
Naralina Viana Soares Silva Oliveira
Héctor José García Mendoza
27-45
Ensino dos números racionais a partir de materiais manipuláveis e objetos de aprendizagens.......
José Ronaldo Melo
Elisabeth Machado Bastos
46-62
Atividade de modelagem matemática com o uso do Geogebra para o ensino de curva senoidal.......
Roberta Modesto Braga
63-78
O ensino de matemática por atividades: uma interface entre recursos tecnológicos e o pensamento
computacional.................................................................................................................................
Gilson Pedroso Santos
José Ricardo Souza Mafra
79-99
Um estudo acerca da potencialidade significativa de um material de ensino sobre circunferência
e círculo............................................................................................................................................
Maria Aparecida Silva Rufino
José Roberto Silva
100-121
Atividades investigativas no ensino de função afim: desafios e possibilidades...............................
Ivan Bezerra Sousa
José Joelson Pimentel Almeida
122-142
As atividades experimentais no ensino de matemática.....................................................................
Pedro Franco Sá
143-162
Resolução de problemas e expressões numéricas: o quadro dos quatro quatros e o nunca dois e números binários..............................................................................................................................
Narciso das Neves Soares
Nelson Antonio Pirola
163-177
Narrativas de professores ao desenvolver atividades sobre fração: contribuições de um curso de
formação continuada........................................................................................................................
Idemar Vizolli
Ritianne de Fátima Silva de Oliveira
178-193
O corpo do indivíduo como meio semiótico e centro do sistema referência no processo de
objetivação da orientação espacial....................................................................................................
Jussara Patrícia Andrade Alves Paiva
Claudianny Amorim Noronha
194-208
Critérios de divisibilidade à luz do ensino por atividades................................................................. Sandro Benício Goulart Castro
São João Pirabas, Ana Kelly Martins Silva
209-227
Um Estudo sobre o Ensino de Poliedros por Atividades.................................................................
João Nazareno Pantoja Corrêa
Ducival Carvalho Pereira
228-244
Índice
O ser humano tem em sua natureza a curiosidade, que o faz querer entender o
ambiente em que está inserido, em que é capaz de realizar reflexões sobre e intervenções
nesse ambiente. Desse modo, a investigação torna-se uma característica inerente a esse ser.
Enquanto esse espirito investigador, que pode ser claramente observado nas crianças na fase
dos “porquês”, permanecer na fase estudantil, conduzirá o estudante a um amadurecimento
matemático e científico que o tornará cada vez mais autônomo e consciente da sua capacidade
de amparar-se na curiosidade e na possibilidade de buscar o conhecimento por meio da
investigação.
De acordo com Dockweiler (1994, p. 7-8)1 “as atividades de desenvolvimento são
atividades que permitem às crianças (ou qualquer estudante) experimentarem um conceito
matemático e familiarizar-se com os termos adequados para descrever esse conceito”.
Posteriormente ao estudante ter uma experiência adequada com as atividades de
desenvolvimento, devem ser realizadas as atividades de conexão. Assim, “essas atividades
são elaboradas para conectar os entendimentos conceituais matemáticos iniciais
representados pela modelagem empírica e a representação oral para a linguagem
matemática”2. A terceira maneira é caracterizada por não apresentar modelos empíricos, “são
incorporados meios orais e simbólicos para a representação durante as atividades de
abstração”3.
Sá (2019) indica que a preocupação com o modo de desenvolver o processo de ensino,
de aprendizagem e de avaliação no ambiente escolar passou por vários momentos de
transição. E o processo de ensino, de aprendizagem e de avaliação da matemática não foi
diferente.
O Ensino por Atividades Experimentais tem sido foco de estudos por vários
pesquisadores afiliados em várias instituições de pesquisa e ensino. Nesse número da
REMATEC, há diversidade em instituições de filiação dos pesquisadores e também
diversidade regional onde estão localizadas essas instituições. Foram 17 instituições de
ensino e pesquisa localizadas em 7 estados do território nacional.
No primeiro texto apresentado, John A. Fossa traz um artigo intitulado “Algumas
considerações teóricas sobre o ensino de matemática por atividades” que investiga 7 das
principais tendências da Educação Matemática a partir do conceito unificador de ensino por
atividades. O pesquisador analisa o referido sob a óptica teórico do construtivismo radical,
complementado e corrigido pelo construtivismo social. Por fim, o pesquisador destaca com
1 Texto original: Developmental activities are those activities which permit children (or any learner) to
experience a mathematical concept and to become familiar with the proper terms to describe that concept. 2 Texto original: These activities are designed to connect the early mathematical conceptual understandings as
represented by physical modeling and the oral representation to their mathematical symbols. 3 Texto original: Oral and symbolic means of representation are incorporated into Abstract Activities.
Editorial
7
conclusão que existem há duas grandes vertentes de abordagens para o ensino de matemática,
uma em que o estudante é um agente ativo na construção do conhecimento e outra em que o
estudante é um receptor passivo na suposta transferência de conhecimento do professor.
Naralina Viana Soares da Silva Oliveira e Héctor José García Mendoza trazem os
resultados do estudo denominado “Habilidades na resolução de problemas fundamentada na
teoria da atividade em estudantes da licenciatura em matemática” cujo objetivo foi
caracterizar a base orientadora das ações relacionadas às habilidades em resolução de
problemas, fundamenta na Teoria da Atividade, na disciplina de Cálculo I em estudantes da
licenciatura em matemática da UFPE. Os pesquisadores utilizaram uma Prova Pedagógica
para realizar a obtenção de dados para a pesquisa. Como resultado, foi constatado que os
acadêmicos apresentaram uma orientação da ação de resolver problemas docentes em função
de forma fragmentada e incompleta.
José Ronaldo Melo e Elisabeth Machado Bastos apresentam o artigo “Ensino dos
números racionais a partir de materiais manipuláveis e objetos de aprendizagens” cujo
objetivo foi investigar em qual perspectiva se desenvolve o ensino dos números fracionários.
Os pesquisadores utilizaram dois modelos de questionários que resultaram num mapa
conceitual e sete atividades que se deram com o uso de materiais manipuláveis e digitais.
Indicam que os resultados revelaram apropriação do algoritmo comum, apresentados nos
livros didáticos, assim como a não compreensão do conceito de equivalência, o que
caracteriza a aprendizagem como mecânica.
Roberta Modesto Braga traz a pesquisa com título “Atividade de modelagem
matemática para o ensino de curva senoidal” que o objetivou discutir o desenvolvimento de
uma atividade de Modelagem Matemática desenvolvida com GeoGebra para estudantes de
Licenciatura em Matemática. Foram realizados observação e registros dos sujeitos
envolvidos em um minicurso de Modelagem Matemática. Conforme os pesquisadores, a
pesquisa mostrou que uma atividade de Modelagem Matemática bem pensada pode provocar
impressões positivas nos envolvidos, ao mesmo tempo em que permite refletir sobre a
matemática desenvolvida no ambiente de sala de aula.
Gilson Pedroso dos Santos e José Ricardo e Souza Mafra mostram o artigo intitulado
“O ensino de matemática por atividades: uma interface entre recursos tecnológicos e o
pensamento computacional” que faz referência a uma pesquisa em que o objetivo foi
investigar as relações entre o Pensamento Computacional (PC), as Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC) e o Ensino de Matemática por Atividades, na busca de
saber como professores podem ordenar ações e cenários para o desenvolvimento de suas
práticas pedagógicas. A investigação foi desenvolvida a partir de uma proposta metodológica
desenvolvida em cinco etapas e os resultados obtidos indicam que atividades com PC e TIC
podem ser aplicadas no ensino de matemática e também foi comprovado que as TIC
permitem um nível de auxílio significativo no ensino da matemática e que o PC pode ser
estimulado ao longo das atividades.
Maria Aparecida da Silva Rufino e José Roberto da Silva, no artigo intitulado “Um
estudo acerca da potencialidade significativa de um material de ensino sobre circunferência
8
e círculo”, apresentam sua pesquisa que teve como objetivo caracterizar a potencialidade
significativa de um material aplicado em uma turma de ensino fundamental. Nesse material
de ensino, há a reconstrução de algumas ideias da base histórica de objetos e seus cálculos,
estimulando os processos cognitivos ausubelianos da diferenciação progressiva e da
reconciliação integradora. Utilizando um questionário diagnóstico e avaliativo, os
pesquisadores concluíram que parte dos estudantes evoluíram conceitualmente sobre as
ideias de círculo e de circunferência, e sobre o processo de aquisição e aplicação das fórmulas
do comprimento da circunferência e da área do círculo.
Ivan Bezerra de Sousa e José Joelson Pimentel de Almeida, trazem em seu artigo
“Atividades investigativas no ensino de função afim: desafios e possibilidades” a exposição
de algumas reflexões sobre atividades investigativas em sala de aula, com destaque para uma
sobre função afim. Foi discutido sobre o potencial de aulas investigativas como metodologia
a ser adotada no ensino de Matemática. Foi constatado uma maior interação entre os alunos,
raciocínios diferentes para o mesmo fim e uma ótima oportunidade para discutirmos
situações tão presentes em nosso dia a dia, como o empreendedorismo e o capitalismo que
estão tão presentes em nosso cotidiano e na sociedade em que estamos inseridos.
Pedro Franco de Sá, em seu artigo “As atividades experimentais no ensino de
matemática”, traz os resultados de uma pesquisa bibliográfica sobre o ensino de matemática
por meio de atividades tendo como base a Teoria da Atividade que objetivou distinguir as
atividades utilizadas no ensino de matemática no Brasil. Em seus resultados, o autor indica
que as atuais Tendências em Educação Matemática realizam procedimentos que podem ser
caracterizados como atividades no sentido da Teoria da Atividade e que é a organização do
trabalho didático, o produto obtido e a forma de participação discente/docente de cada
tendência que legitima cada uma delas.
Narciso das Neves Soares e Nelson Antonio Pirola em seu artigo “Resolução de
problemas e expressões numéricas: o quadro dos quatro quatros e o nunca dois e números
binários” apresentam os recursos didáticos: O Quadro dos Quatro Quatros, Nunca Dois. e
Números Binários. Esses recursos são caracterizados como de manipulativos e inclusivos.
Como resultados, os pesquisadores observaram que estas atividades de ensino se mostram
como importantes aliadas para o estímulo do raciocínio lógico e desenvolvimento de
estratégias, apreensão e direcionamento para o uso correto dos sinais de operação e sinais de
associação, e da mudança de base entre números binários e decimais.
Idemar Vizolli e Ritianne de Fátima Silva de Oliveira no artigo “Narrativas de
professores ao desenvolver atividades sobre fração: contribuições de um curso de formação
continuada” trazem um estudo cujo objetivo foi deslindar contribuições do desenvolvimento
de uma Sequência Didática (SD) sobre fração em um curso de formação continuada para
professore. O estudo fez uso de narrativas orais e textuais de participantes desse curso. Os
resultados indicaram que os professores ampliaram sua compreensão em relação ao conceito
de fração e ao uso de SD e isso reverbera em seu fazer de sala de aula.
Jussara Patrícia Andrade Alves Paiva e Claudianny Amorim Noronha, com o artigo
“O corpo do indivíduo como meio semiótico e centro do sistema referência no processo de
9
objetivação da orientação espacial”, mostram seu estudo que teve como objetivo evidenciar
como o corpo atua como sistema de referência central para o desenvolvimento da orientação
espacial. Os dados apresentados foram coletados durante uma pesquisa de intervenção
desenvolvida em sala de aula, com estudantes do 6º ano do Ensino Fundamental, em que
foram realizadas tarefas que abordam a orientação espacial. As pesquisadoras concluem que
foi mostrada a importância da tomada de consciência dos saberes matemáticos mobilizados
em torno do conceito de lateralidade e a importância do corpo do indivíduo como meio
semiótico e sistema de referência central para o desenvolvimento da orientação espacial.
Sandro Benício Goulart Castro e Ana Kelly Martins da Silva realizaram um estudo,
apresentado no artigo “Critérios de divisibilidade à luz do ensino por atividades”, que teve
como objetivo analisar a validade de conclusões produzidas por estudantes sobre critérios de
divisibilidade a partir de atividades de redescoberta. Dentre os principais resultados obtidos,
os pesquisadores destacam o bom desempenho dos estudantes no que diz respeito às
observações e conclusões que foram apresentadas no final de cada atividade. Assim,
concluem que as atividades ocasionaram aprimoramento na aprendizagem dos estudantes,
ajudando-os na descoberta de regras referentes às divisibilidades por dois, dez, cinco, quatro
e oito.
João Nazareno Pantoja Corrêa e Ducival Carvalho Pereira apresentam o artigo “Um
estudo sobre o ensino de poliedros por atividades” que teve por objetivo analisar a validade
de conclusões elaboradas por estudantes sobre aspectos de poliedros a partir da realização de
atividades experimentais sem que o professor tivesse apresentado o assunto anteriormente.
O experimento foi realizado em 4 etapas e os resultados obtidos indicam que o ensino por
atividade, juntamente com uso de materiais manipuláveis, possibilitou que os discentes
enunciassem conclusões válidas sobre propriedades dos Poliedros.
Por fim, o Ensino de Matemática por Atividades pressupõe colaboração recíproca
entre professor e estudante nesse processo de desenvolvimento. Pois a essência nesse tipo de
abordagem metodológica de ensino está no fato de que os tópicos a serem aprendidos serão
descobertos pelo próprio estudante durante o processo de busca, que é conduzido pelo
professor até que ele seja incorporado em sua estrutura cognitiva. Ou seja, o professor não
define ou estabelece teorias prontas e acabadas, mas o estudante formula seus conceitos e
gera suas próprias teorias que serão testadas e aceitas ou repensadas. Assim, concebe seu
aprendizado por meio de uma concepção dinâmica, participativa e construtiva.
Pedro Franco de Sá – UEPA
Thiago Beirigo Lopes – IFMT
Referências
DOCKWEILER, Clarence J. Children's attainment of mathematical concepts: a model
under development. College Station: Texas A&M University, 1994. Disponível em:
https://files.eric.ed.gov/fulltext/ED375008.pdf. Acesso em: 03 mar. 2018.
SÁ, Pedro Franco de. Possibilidades do Ensino de Matemática por Atividades. Belém:
SINAPEM, 2019.
10
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 04 de agosto de 2020. DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p10-26.id283 Aprovado em: 19 de novembro de 2020.
Algumas considerações teóricas
sobre o ensino de matemática por atividades
Some theoretical considerations
on activities-based mathematics teaching
John A. Fossa
PPGECM - UEPB
RESUMO
Investiga-se sete das principais tendências da Educação Matemática a partir do conceito unificador
de ensino por atividades. O referido conceito é então considerado do ponto de vista teórico do
construtivismo radical, complementado e corrigido pelo construtivismo social. Desta forma, depois
de desmentir alguns mitos sobre as atividades, obtêm-se o delineamento das principais fases de
atividades, a identificação de importantes características cognitivas e não-cognitivas delas e a
constatação de importantes consequências para a sua implementação na sala de aula. Conclui-se que
há duas principais abordagens para o ensino de matemática, uma em que o aluno é um agente ativo
na construção do conhecimento através da sua participação em atividades e uma em que o aluno é
um recipiente passivo na suposta transferência de conhecimento do professor.
Palavras-chave: Teorias de Educação Matemática; ensino por atividades; construtivismo;
características de atividades.
ABSTRACT
Seven of the principal tendencies of Mathematics Education are investigated using the unifying
concept of activity-based teaching. This concept is then considered from the theoretical viewpoint of
radical constructivism, complemented and corrected by social constructivism. After clearing up some
myths about the use of activities, a delimitation of their principal phases is obtained, as well as the
identification of their most important cognitive and non-cognitive characteristics and the main
consequences for their application in the classroom. It is concluded that there are two core approaches
to the teaching of mathematics, one in which the student is an active agent in the construction of
knowledge through participation in activities and one in which the student is a passive receptacle in
the supposed transfer of knowledge from the professor.
Keywords: Theories of Mathematics Education; activity-based teaching; constructivism;
characteristics of activities.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
11
Nos últimos anos, a Educação Matemática tem se desenvolvida de forma
extraordinária. Há, de fato, um número considerável de tendências que poderá até deixar o
professor de matemática confuso sobre qual tendência ele deveria adotar na sala de aula para
abordar tal ou qual assunto. Só para indicar o tamanho do problema, mencionamos que
Mendes e Fossa (1998) lista as seguintes oito tendências:
1. uso de jogos
2. uso de materiais concretos
3. uso de etnomatemática
4. resolução de problemas
5. modelagem
6. uso de história
7. uso de computadores
8. estratégias psicológicas.
Em alguns casos, há certa aproximação entre as tendências assinaladas. O uso de
jogos e o uso de materiais concretos – pelo menos quando este é feito dentro de um contexto
de atividades estruturadas, sejam, ou não, elas de caráter de redescoberta – se assemelham
bastante, a diferença sendo apenas a ênfase dada aos elementos lúdicos contemplados nas
interações com os alunos. Em outros casos, há uma mesclagem de duas ou mais dessas
tendências que faz surgir um novo tipo de intervenção com características inovadoras
devidas à reciprocidade das características das tendências componentes. Um exemplo
simples é o desenvolvimento de um modelo de ensino baseado em atividades construtivistas
informadas pela história da matemática, iniciado pelo presente autor no início dos anos 90
(ver, e.g., Fossa (1998)) e desenvolvido num estudo científico pela primeira vez por Mendes
(1997).
Para complicar ainda mais a escolha do professor, ele deve ainda optar entre diversos
suportes teóricos para a tendência que quer adotar. Por um lado, visto que as tendências
foram elaboradas dentro de certos posicionamentos teóricos, há uma associação natural ente
as tendências e seus suportes teóricos. Assim, os jogos e os materiais concretos se associam
naturalmente ao construtivismo, enquanto as estratégias psicológicas são embasadas na
psicologia cognitiva. Por outro lado, aspectos de cada tendência são frequentemente
incorporados a tendências diversas como elementos de apoio (sem a devida mesclagem
mencionada no parágrafo anterior), o que certamente poderá causar conflitos no professor
que está tentando planejar as suas aulas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
12
A Teoria da Atividade
Um dos primeiros passos na elaboração de uma visão mais organizada dessas várias
tendências foi indicado por Sá (2019). Nessa obra encontramos uma descrição do que é o
ensino de matemática por atividades e uma discussão da compatibilidade do uso de
atividades com as outras tendências da Educação Matemática. Numa conversa particular
com esse autor, ele ainda propôs a possibilidade de considerar as diversas tendências dentro
da Teoria da Atividade, em particular como possibilidades da Atividade de Estudo. Com
isto, concordo plenamente. Ainda mais, observo que, ao caracterizar as distintas tendências
(com a possível exceção do ensino tradicional em que o professor leciona com o propósito
de “transferir o conhecimento” de ele próprio para o aluno) como atividades, faz-se uma
unificação dos múltiplos aspectos da Educação Matemática e proporciona ao professor um
ponto de vista coerente, da qual ele pode fazer seu planejamento com mais desenvoltura.
A unificação proposta ficará ainda mais notável se olharmos ao que as tendências
tenham em comum como propostas de ensino de matemática de um ponto de vista
construtivista. Não será necessário, porém, fazer uma exegese pormenorizada do
construtivismo (para isto, ver Fossa (2014) ou Fossa (2019)). Para nossos propósitos, basta
indicar que o posicionamento que adotaremos é o do construtivismo radical, devidamente
modificado pelo construtivismo social. Em síntese, essa posição mantém que o aluno não
aprende através da transferência do conhecimento proposto pelo ensino tradicional, mas
através da construção de esquemas mentais. Para tanto, o próprio aluno precisa ser um agente
ativo no processo educativo, pois é somente a partir das suas próprias iniciativas que as
referidas estruturas mentais podem ser edificadas na mente do aluno. As construções,
embora feitas pelo indivíduo, são, porém, sempre feitas num contexto social e isto, visto que
as atividades têm um forte caráter social, faz com que o ensino por atividades é tão
apropriado ao construtivismo.
Faremos agora um pequeno elenco de considerações para mostrar que é factível
considerar quase todas as tendências da Educação Matemática como atividades com o
suporte do construtivismo. Esperamos que, num futuro publicação, o Prof. Pedro Sá faça
uma análise mais detalhada dessas tendências a partir da Teoria da Atividade.
Atividades e as Tendências
Os jogos pedagógicos são, de fato, atividades com um componente lúdico. Estão mais
comuns no currículo dos primeiros anos da escola, pois a criança pequena tem pouca
habilidade de concentração sem o acompanhamento do divertimento. Sendo assim, os jogos
se enquadram ao conceito de atividades por sua própria natureza.
O mesmo acontece com os materiais concretos. De fato, o uso de materiais concretos
consiste na incorporação desses materiais em atividades estruturadas que levam o aluno a
fazer as construções mentais apropriadas. Como é o caso dos jogos, o aluno desenvolve essas
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
13
atividades conjuntamente com seus colegas, incentivado e orientado pelo professor, mas
exercendo seu próprio pensamento e sua própria criatividade. Quando essa modalidade de
ensino ficou mais popularizada, era comum ver o professor usar o material como uma forma
de demonstrativo, ou seja, ele faria a atividade e os alunos apenas o assistiriam. Isto, no
entanto, é um desvirtuamento do uso desse material, que deveria sempre ser manipulado pelo
próprio aluno. Desta forma, é claro que o uso de materiais concretos é, por sua própria
natureza, um tipo de atividade.
A etnomatemática é o estudo das práticas matemáticas desenvolvidas por diferentes
grupos sociais para resolver problemas do dia a dia. Geralmente as referidas práticas têm um
caráter nitidamente não acadêmico e carece de uma preocupação maior com o rigor
matemático. Mesmo assim, a análise dessas práticas pode proporcionar ao aluno uma
compreensão intuitiva dos conceitos e procedimentos matemáticos inerentes nelas. Assim, o
uso da etnomatemática como uma estratégia de ensino consiste em analisar criticamente
práticas sociais para extrair delas seu conteúdo matemático e a consequente descoberta e
desenvolvimento desse conteúdo pelo aluno. Desta forma, ao participar na análise
etnomatemática, o aluno está ativamente construindo seus próprios esquemas mentais sobre
a matemática e, visto que a investigação das referidas práticas é tipicamente feita
conjuntamente por pequenos grupos de alunos, esta forma de ensino se enquadra
perfeitamente no conceito de ensino por atividades.
O uso da resolução de problemas como uma estratégia de ensino visa o
desenvolvimento das habilidades metacognitivas do aluno para que ele puder enfrentar, com
sucesso, novos problemas e não apenas se limitar a resolver problemas para os quais ele tem
decorado um determinado procedimento. Central ao método, então, é o monitoramento pelo
aluno do seu próprio pensamento, a formação e testagem de suas próprias conjecturas e a
investigação de assuntos por ele desconhecidos. De novo, o método é tipicamente
empreendido pelo aluno em conjunção com seus pares, o que ressalta a natureza
investigativa e cooperativa da construção do conhecimento e, visto que faz com que o aluno
se torna o agente ativo no processo da referida construção, a resolução de problemas também
deve ser visto como um tipo de ensino por atividades.
Em contraste à resolução de problemas que parte de situações problemas num
contexto matemático, a modelagem matemática começa com uma situação problemática
num contexto não matemático e busca desenvolver uma matemática que possa dar conta da
situação. A palavra chave nesta descrição é desenvolver, pois não compete ao aluno
simplesmente aplicar alguma estrutura matemática por ele já conhecida à situação, mas
precisa sim desenvolver conceitos e procedimentos que são para ele novos. Sendo assim, a
modelagem matemática compartilha as mesmas características da resolução de problemas,
no sentido de ser investigativa e cooperativa e em que o aluno é um agente ativo na
construção de seu próprio conhecimento. Em consequência, a modelagem também deve ser
considerada um tipo de ensino por atividades.
A história da matemática pode ser usada de várias formas para promover a
aprendizagem da matemática. De fato, a história tem marcado presença em textos
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
14
matemáticos desde há muito tempo para incentivar e motivar o aluno. Nesse sentido, inclui-
se retratos de matemáticos famosos, pequenas biografias dos mesmos ou fatos curiosos (mais
ou menos!) relacionados ao conteúdo sendo abordado no texto. O que tem elevado a história
a uma tendência em Educação Matemática, no entanto, são estratégias mais inusitadas. Mas,
o que é comum a essas estratégias inovadoras é a análise de produtos históricos, sejam estes
documentos ou artefatos, visando a explicitação e a crítica dos conceitos e procedimentos
matemáticos neles contidos. Ao fazer as explanações e críticas, o aluno precisa desenvolver
as habilidades hermenêuticas associadas com a interpretação de textos, relacionar conceitos,
fazer e testar conjecturas e construir novos esquemas mentais que frequentemente vão além
das estruturas achadas do texto analisado. De novo, a análise é tipicamente feita em
conjunção com seus pares e é exposta à apreciação do grupo maior (incluindo o professor).
Assim, os dois fatores de construção ativa e construção social que são característicos do
ensino por atividades são presentes no uso de história da matemática para o ensino da
matemática e, portanto, o uso da história da matemática também se enquadra perfeitamente
no conceito de ensino por atividades.
Como acontece com a história, o uso da computação eletrônica para o ensino da
matemática procede de várias maneiras. Mas, o que há em comum a essas variedades de
procedimentos é a valoração do pensamento ativo do aluno. Ao deixar para a máquina
cálculos que seriam difíceis e monótonos, o aluno fica mais livre de fazer as suas próprias
conjecturas e receber feedback instantânea sobre a consequências destes. Isto, por sua vez,
lhe permite estar mais ciente dos seus propósitos e lhe proporciona oportunidade de
desenvolver suas habilidades metacognitivas. Mais uma vez, o ensino utilizando a
computação eletrônica é tipicamente feito em pequenos grupos, ou pelo menos tem um
momento em que o trabalho de cada aluno é apreciado pelo grupo maior. Visto, então, que
essa tendência também promove a construção ativa do conhecimento, ela deve ser
considerada um tipo de atividade.
A oitava tendência em Educação Matemática é o uso da psicologia cognitiva para
garantir as condições que promovem a suposta transmissão de conhecimento do professor
ao aluno. Nessa tendência, o aluno é visto como um recipiente passivo e, portanto, seria
quase oximorônico afirmar que as referidas estratégias psicológicas são atividades.
Observamos que isto não significa, do ponto de vista do construtivismo, que a aprendizagem
é impossível quando essa tendência é utilizada; no entanto, não é facilitada. Mesmo assim,
é digno de ser notado que uma das grandes preocupações das estratégias da psicologia
cognitiva é aguçar o interesse e a atenção do aluno. Isto é, mesmo dentro de um paradigma
que postula a passividade do aluno, há espaço para o aluno ficar mais ativo e,
consequentemente, aprender melhor. A brecha encontrada, contudo, não é o suficiente para
considerar essa tendência uma atividade.
Em resumo, nas sete primeiras tendências assinaladas, vemos que há um teor alto de
redescoberta e, mais importante, vemos que o aluno age como um agente na construção do
seu próprio conhecimento. Ainda mais, essas tendências inserem o aluno num contexto
social que incentiva e reforça o processo da construção de esquemas mentais. Desta forma,
todas essas sete tendências se enquadram naturalmente no conceito de ensino por atividades.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
15
Dois Mitos Referentes a Atividades
Antes de considerar mais algumas características de atividades para o ensino de
matemática, será proveitoso expor – e dirimir – dois mitos referentes ao uso de atividades.
O segundo consiste de duas partes, que podem ser tomadas independentemente. Assim,
podemos os sistematizar da seguinte forma:
1. O professor é responsável para a formulação de atividades
2. a. Uma só tendência deve ser adotada pelo professor
b. Cada atividade só precisa ser desenvolvida uma única vez.
Esses mitos nem sempre são explicitados no pensamento do professor, mas são
frequentemente presentes de forma oculta e se manifestam na sua atuação na sala de aula e,
portanto, podem ser considerados como pressupostos da postura do professor. Consideramos
cada um por sua vez.
O primeiro mito, ou pressuposição, então, é o de que é o professor que é o responsável
para a elaboração de todas as atividades que ele vai usar na sua sala de aula. Semelhante
ideia é até aterrorizante para o professor, pois ele geralmente não tem as condições
necessárias de inventar atividades apropriadas para os vários assuntos que aborda nas suas
disciplinas. De fato, o professor é geralmente sobrecarregado devido, parcialmente, a
minúscula compensação financeira que recebe para exercer o seu ofício e o grande número
de turmas que ele é consequentemente forçado a assumir. Desta forma, nem sobra para ele
as condições primordiais de tempo e esforço humano que seriam necessários para a
elaboração das várias atividades que iria precisar para serem usadas todo dia.
Há, no entanto, uma consideração ainda mais importante, a saber, mesmo se tivesse
o tempo necessário para elaborar suas próprias atividades, o professor, principalmente o
iniciante, não tem, em geral, o conhecimento especializado requisito para a elaboração
dessas atividades. O desenvolvimento de uma atividade requer a adequação dos seus
componentes a uma determinada finalidade através de cuidadoras análises teóricas. O
material elaborado ainda precisa ser sequenciado corretamente em relação às outras
atividades a serem usadas na mesma unidade de ensino e a sua eficácia precisa ser examinada
por testes pilotos usando métodos qualitativos e/ou quantitativos de validação. Isto é
claramente tarefa para um especialista.
O que é necessário para o professor de matemática é que ele seja treinado no uso de
cada uma das tendências em Educação Matemática. O treinamento deve, na verdade,
começar no curso de licenciatura que o futuro professor cursará antes de assumir uma
posição no magistério. Visto, porém, que o referido curso de licenciatura contempla várias
outras finalidades importantes, o treinamento do professor deverá ser complementado por
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
16
outros mecanismos, incluindo treinamento em serviço e/ou cursos de pós-graduação. A
estrutura institucional de educação brasileira poderia colaborar imensamente para o
aperfeiçoamento do professor se o mestrado profissional fosse pautado no treinamento
intensivo (e quase exclusivo) na utilização dessas tendências. A elaboração e primeira
testagem de atividades aconteceriam nos mestrados e doutorados acadêmicos.
O segundo mito tem a ver com a maneira em que as atividades são usadas com o
aluno. No primeiro subcaso, se alega que o professor deveria adotar uma só tendência e a
utiliza exclusivamente nas suas aulas. De fato, isto faz um certo sentido, pois desta forma
haverá uma consistência no modo de trabalhar na sala de aula e o aluno terá certa
uniformidade de expectativas que o ajudará a melhorar seu desempenho acadêmico.
O argumento poderia ter alguma força se as diversas tendências fossem ações
radicalmente diferentes. Mostramos na seção anterior, no entanto, que sete das oito
tendências na Educação Matemática são, de fato, exemplares de um único modo de ensino,
ou seja, de ensino por atividades. Isto significa que há uma unidade metodológica subjacente
a todas as referidas tendências que proporcionará ao aluno a desejada uniformidade de
expectativas, mesmo na troca de tendências. Ainda mais, há duas vantagens na utilização de
abordagens diversificadas. Em primeiro lugar, nenhuma abordagem é cem por cento eficaz
com todos os alunos e, portanto, apresentações diversificadas ajudam a garantir o sucesso de
todos os alunos. Também, em segundo lugar, apresentações diversificadas da mesma matéria
fortalecem o desenvolvimento de esquemas mentais robustos e ricos em interconexões entre
vários assuntos, o que, por sua vez, é fundamental para a elaboração de conhecimento
profundo e o desenvolvimento de potentes habilidades metacognitivas.
O segundo subcaso do segundo mito pressupõe que basta fazer uma atividade uma
só vez para extrair dela seu conteúdo matemático. Que essa noção é redondamente errada
torna se patente a partir de uma consideração de jogos, pois essas atividades são obviamente
repetidas várias vezes. A repetição, contudo, não é feita em função do seu conteúdo lúdico
– antes o conteúdo lúdico é uma forma de evitar o cansaço que poderá acompanhar a
repetição que é necessária para a extração do conteúdo matemático. “Extrair o conteúdo
matemático” significa, entre outras coisas, observar regularidades, fazer e testar conjecturas
e abstrair. Para tanto, é claro que a repetição é necessária, embora varia com a idade e o nível
de engajamento do aluno. Considerações semelhantes cabem às outras tendências
consideradas como atividades, embora na ausência de um forte componente lúdico a
repetição é frequentemente alcançada através do uso de atividades ostensivamente
diferentes, mas com a mesma estrutura matemática.
Um Roteiro para Sequências de Atividades
Já deve ter ficado claro pelo precedente que uma atividade apropriada para ser usada
no ensino de matemática não deve ser compreendida como uma unidade, completa em si
mesma, e isolada das outras atividades a serem usadas na sala de aula. Muito pelo contrário,
cada atividade deve ser concebida como um elemento concatenado com várias outras
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
17
atividades relacionadas ao ensino do mesmo assunto. Isto implica numa sequenciação das
atividades a serem apresentadas ao aluno e, embora a sequência não seja algo rígido, ela
deve contemplar uma ordem de apresentação em que pré-requisitos matemáticos do assunto
em tela são abordados antes ou, pelo menos, destacados como requisitos. (A segunda opção
é frequentemente usada como fator de motivação.)
Fossa (2000) apresenta as seguintes propriedades, ou fases, de atividades que, quando
presentes, ajudam na concatenação de várias atividades num ciclo de procedimentos
relacionados ao mesmo assunto:
1. provocação
2. participação
3. precipitação
4. publicação
5. perturbação.
Passaremos agora a tecer algumas rápidas reflexões sobre cada uma dessas
propriedades.
Visto que o propósito do ensino por atividades é fazer com que o aluno se torne um
agente ativo na construção dos seus esquemas mentais, é oportuno que o mesmo seja
motivado a fazer a atividade. Assim, uma boa atividade conterá alguma provocação que visa
capturar a imaginação do aluno, pois um aluno interessado será muito mais ativo e
desempenhará a atividade com melhores resultados.
Nesse sentido, a atividade deve ser desafiante, mas não frustrante. Para tanto, é
necessário levar em conta a base cognitiva do aluno, ou seja, precisa avaliar o esquema
mental já construído pelo aluno para determinar se o aluno detém os pré-requisitos
matemáticos necessários para a realização da tarefa proposta. Em termos vigotskianos,
precisamos determinar se a provocação está dentro da zona do desenvolvimento proximal
do grupo, ou, pelo menos, dentro da zona do desenvolvimento potencial do mesmo. No
segundo caso, o grupo precisará de um nível mais alto de orientação pelo professor.
Carências maiores devem ser resolvidas através de atividades complementares que supririam
os referidos pré-requisitos.
Uma vez provocado, o aluno desenvolverá a atividade proposta e, visto que
atividades são desenvolvidos pelo agente em conjunto com o outro, o referido
desenvolvimento é geralmente empreendido em pequenos grupos que trabalham de forma
cooperativa para desvendar a provocação feita. Às vezes, o interesse na atividade é
estimulado ainda mais pela competição entre grupos, embora a competição não é bem-vista
por muitas autoridades. Devemos lembrar, contudo, que a competição faz parte da nossa
sociedade e, portanto, dosagens ocasionais de competição poderão ajudar o aluno a lidar com
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
18
esse aspecto na nossa cultura. Não obstante, precisa-se garantir, na medida do possível, que
a competição seja entre grupos razoavelmente paritários, o que pode ser feito pela
composição cuidadosa dos grupos. Ainda mais, se houver indivíduos que destacam demais
dos outros, esses podem compor uma espécie de painel de juízes; isto faz com que esses
indivíduos não desestabilizam o equilíbrio entre os grupos, enquanto, ao mesmo tempo, não
os afastam da atividade. Em qualquer caso, a competição dentro de cada grupo deve ser
desestimulada, pois a atividade visa a construção social do conhecimento de todos os seus
membros, o que é alcançado de forma melhor através da cooperação.
A precipitação, como um sólido resultante de uma reação química num ambiente
líquido, é o resultado alcançado pelo grupo ao fazer a atividade. Em síntese, é um novo
elemento de conhecimento que o grupo propõe. Visto que a atividade acontece nas fronteiras
do conhecimento do grupo, seu propósito é avançar além dessas fronteiras através da
(re)descoberta de novidades. Essas novidades precisam ser registradas, geralmente por
escrito, numa linguagem apropriada ao grupo; isto é, a formulação deve ser significativa para
todos os membros do grupo, conter um nível de rigor compatível com a compreensão do
grupo e ser adequada para que o resultado seja disseminado na turma como um todo.
A disseminação do resultado do grupo, que foi mencionada no parágrafo anterior, é
a publicação do resultado. A publicação contém dois componentes essenciais. A primeira é
a comunicação do resultado do grupo à turma inteira e ao professor. Essa comunicação não
deve se limitar à formulação escrita do resultado, mas deve incluir descrições orais que visam
a explicação e justificação do pensamento do grupo.
O segundo elemento essencial da publicação é a comparação do resultado do grupo
com os resultados dos outros grupos e a consequente avaliação crítica de todos esses
resultados. A discussão feita nesse momento geralmente, devido à própria realização da
atividade, acontece num patamar superior àquela que teria sido o caso antes da realização da
mesma. De fato, a turma, guiada pelo professor quando apropriado, poderá alcançar
resultados além dos alcançados individualmente pelos diversos grupos.
Finalmente, uma boa atividade poderá incluir uma perturbação, ou seja, uma nova
provocação que iniciará um novo ciclo investigatório de atividades visando um maior
desenvolvimento do assunto proposto pela disciplina. A perturbação poderá acontecer de
várias formas. Talvez a forma melhor seja quando os próprios alunos não ficam satisfeitos
com algum aspecto do seu resultado ou percebem que seu resultado não parece “combinar”
com outros “fatos” que conhecem. Se isto não acontecer, o professor poderá tentar instigar
uma perturbação através de questionamentos apropriados, ou, se for necessário,
simplesmente fazendo uma nova provocação. Quando a perturbação nasce do próprio
resultado da atividade, porém, há uma continuidade maior no desenvolvimento da teoria
matemática sendo investigada.
Modalidades de Apresentação
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
19
Do que foi visto na seção anterior, fica evidente que há três modalidades de
apresentação que podem estar presentes em qualquer atividade de ensino. São sintetizadas,
em relação a atividades contendo material manipulativo, por Dockweiler (1996) da seguinte
forma:
A estrutura matemática a ser construída pelo aluno é exemplificada no material
concreto usado na atividade. Esse conceito é apropriado para atividades lúdicas e atividades
usando material concreto. Não obstante, precisa ser generalizado para refletir o nosso
conceito mais geral de atividade. No uso de computação eletrônica, poderemos ter uma
representação visual do objeto matemático na tela do computador e, na modelagem,
podemos confrontar uma situação física in natura ou através de desenhos. Nos outros tipos
de atividades, contudo, encontramos mais frequentemente o objeto matemático já codificado
linguisticamente. Assim, parece que a representação física não faz parte necessária de uma
atividade. Quando está presente, ele faz parte da provocação e ajuda a guiar a participação,
ou seja, o desenvolvimento da atividade pelo aluno. Desta forma, atividades desse tipo são
apropriadas para crianças menores porque têm um roteiro inerente bem definido. Na medida
em que a criança ficar mais autônomo, porém, tais roteiros podem ser dispensados e outros
tipos de atividades são mais apropriados.
Além das considerações discutidas no parágrafo anterior, devemos lembrar que o
propósito de uma atividade é a construção de novas estruturas mentais. Isto pode ser feito
por os extrair de uma exemplificação física; nesse caso, como já vimos, o material concreto
faz parte da provocação. A referida construção, porém, também pode ser alcançada como
uma resposta a uma situação problemática e, de fato, esse caso é característico da
aprendizagem mais avançada. O importante, portanto, é que a atividade tenha uma
provocação, material/concreto ou não, que captura a imaginação do aluno e o convide a
participar no desenvolvimento da atividade.
A representação oral acontece durante a fase da participação da atividade em qual
várias conjecturas são investigadas e durante a fase de precipitação em que a formulação do
resultado é feita. Segundo Dockweiler, é só quando o resultado final for alcançado que a
representação escrita deve ser adotada, pois, sempre segundo o referido pesquisador, a
representação escrita tende a pôr um ponto final à discussão, impedindo assim maiores
investigações. De novo, isto pode acontecer com crianças menores, mas, na medida em que
o aluno desenvolva suas habilidades metacognitivas, isto se torna mais e mais improvável.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
20
Ainda mais, em raciocínios mais complexos, a representação escrita frequentemente
promove pensamentos mais claros e contundentes.
Concluímos, portanto, que o modelo de Dockweiler (1996) não é muito útil na
descrição geral do ensino por atividades, mas é apropriado, especificamente, apenas para
jogos e o uso de materiais concretos, ou atividades desenvolvidas para crianças menores e,
de fato, o modelo foi desenvolvido nesse contexto.
Devemos ainda observar que, como resultado de uma atividade, um grupo poderá
desenvolver sua própria terminologia e/ou formalismo. Não há nada mal nisto, pois reflete a
criatividade do grupo. Mesmo assim, o professor precisará determinar se a terminologia
inventada contenha obstáculos ocultos que poderão afetar negativamente futuras
construções. Quando ocorrem, porém, a investigação desses obstáculos pode ser o foco da
perturbação que dá início a novas atividades. Em qualquer caso, terá um momento em que o
professor deve fazer uma transição para a formalização padrão para que o aluno tenha acesso
a literatura sobre o assunto em tela. No entanto, uma vez que o conceito for construído, a
referida transição não será problemática.
Características Cognitivas e Não-Cognitivas
Até agora temos discutido os seguintes três aspectos de atividades relacionados à
cognição, ou seja, a teoria de conhecimento, incluindo a natureza do conhecimento e as
principais maneiras em que o conhecimento acontece:
1. construção individual e social de esquemas
2. metacognição
3. cooperação.
Isto é, estávamos ocupados na descrição do ensino por atividades em relação à constituição
da cognição na sala de aula. Nesse sentido, vimos que o conhecimento é uma construção de
esquemas mentais pelo indivíduo e que essa construção sempre ocorre em um contexto
social. Assim, descrevemos os aspectos do ensino por atividades que favorecem a referida
constituição da cognição.
Fundamental ao desenvolvimento de qualquer conhecimento mais elaborado é a
cultivação de habilidades referentes ao controle consciente do pensamento e, portanto,
mencionamos como o ensino por atividades proporciona ao aluno o desenvolvimento dessas
habilidades metacognitivas. É, de fato, a metacognição que caracteriza um indivíduo como
um “perito” no assunto, como oposto a um “principiante”. Nesse sentido, entendemos por
“perito” um aluno que não depende da memorização de roteiros e/ou procedimentos ditados
pelo outro (o professor), mas um aluno que tem pensamento independente e que pode se
orientar de forma autônoma diante de empreitadas educativas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
21
Em relação à cooperação, pode ser surpreendente, de certo modo, que a incluímos
como um dos aspectos cognitivos das atividades, pois ela é geralmente concebida como um
valor positivo social, associado à, mas distinto da, cognição propriamente dita; e a
cooperação tem, sem dúvida, tonalidades que permitem que seja trata dessa forma. Mesmo
assim, nos parece que a construção do conhecimento é tão essencialmente um
empreendimento social que a cooperação é uma parte indissociável à constituição da
cognição e, portanto, optamos a concebê-la, apesar do seu inegável conteúdo valorativo,
como um aspecto cognitivo das atividades.
Resta, então, tecer algumas considerações sobre alguns aspectos não-cognitivos das
atividades usadas no ensino da matemática, ou seja, aspectos de atividades que encerram
valores socialmente desejáveis. Ao fazer isto, porém, absteremos dos valores mais gerais,
como os relacionados ao desenvolvimento de atitudes da boa cidadania, pois tais valores são
impregnados com juízos ideológicos e uma apreciação justa deles nos levaria longe do centro
da nossa discussão, a saber, as atividades. Desta forma, nos limitaremos a discutir alguns
valores que, enquanto não sejam constitutivos da cognição, promovem a construção do
conhecimento na sala de aula.
Características Não-Cognitivas de Atividades
Por “características não-cognitivas de atividades”, entenderemos tanto não somente
valores que qualificam as atividades per se, mas também valores associados à
implementação das atividades na sala de aula. Estes têm menos a ver com as próprias
propriedades das atividades e mais com a maneira em que as atividades se desenrolam na
escola e, portanto, são análogos às condições de aprendizagem que caracterizam a tendência
embasada na psicologia cognitiva. Visto, porém, que podemos considerar a atividade e a sua
implementação como uma situação pedagógica integrada, a distinção não será importante
para os nossos propósitos.
Entre os principais valores não-cognitivos das atividades (entendidos no sentido lato
do parágrafo anterior), destacamos os seguintes:
1. autonomia
2. criatividade
3. autoconfiança
4. diálogo
5. respeito mútuo.
Passaremos agora a explanar brevemente cada um desses valores.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
22
A autonomia é considerada o mais importante valor pedagógico do construtivismo
radical e, de fato, mais geralmente, é essencial para a realização de qualquer atividade na
sala de aula. Um aluno autônomo é um indivíduo independente no sentido de que ele pensa
por si mesmo e não é restringido a seguir as diretrizes do outro, seja o outro o professor, os
colegas de turma ou o livro texto. Assim, uma pessoa autônomo pode iniciar novas
abordagens para a resolução do problema sob investigação, questionar possíveis
pressupostos, fazer e testar conjecturas e avaliar criticamente o posicionamento dos colegas,
do professor, do livro texto (incluindo, hoje em dia, informações oriundas do internet) e até
o proferido por si mesmo. O desenvolvimento de todas essas características é, de fato,
promovido pelo ensino por atividades, pois ser ativo significa proceder da forma indicada.
Visto de outro ponto de vista, então, a autonomia é uma condição necessária para a
realização de atividades e, portanto, temos uma situação circular. Não é, contudo, um círculo
vicioso – embora o professor ocasionalmente precisa dar atenção especial a alunos com
níveis muito baixos de autonomia –, mas um círculo em que cada fase reforça a outra. Isto
é, ao participar numa atividade, o aluno adquire a autonomia que o ajudará fazer futuras
atividades com mais desenvoltura, o que, por sua vez, aumenta seu nível de autonomia, e
assim por diante. Essa consideração implica na importância de usar atividades como uma
metodologia de ensino e não apenas como episódios avulsos na experiência educativa do
aluno.
Pode parecer que haja, no mínimo, alguma tensão entre o valor da autonomia e a
natureza social da construção do conhecimento, pois, pode-se alegar, como é possível ser
um pensador independente do outro e, ao mesmo tempo, depender do outro na constituição
do conhecimento? Não há, no entanto, contradição no estabelecimento de associações sociais
de indivíduos independentes que trabalham cooperativamente na construção do
conhecimento. Isto acontece quando cada indivíduo do grupo é independente da dominação
dos outros, embora o desenvolvimento do grupo depende das suas interações sociais para
efetuar a constituição da cognição. A interdependência dos membros do grupo, porém,
ressalta uma consequência interessante, a saber, a diversidade poderá favorecer uma maior
aprendizagem. Isto acontece porque a base cognitiva do grupo será mais rica, possibilitando
assim construções mais interessantes. Desta forma, grupos multiculturais que conseguem
expor e esclarecer seus diversos pressupostos e assim trabalham cooperativamente têm mais
condições do que grupos homogêneos a progredir com sucesso.
A criatividade é outro valor muito apreciado por quase todos. Isto é visto não somente
na homenagem prestada aos grandes criadores de teorias científicas ou obras artísticas, mas
também nas pequenas inovações contidas na resolução de problemas do dia a dia ou até na
apreciação dos inusitados relacionamentos contidos em certas piadas. Nesse sentido, a
criatividade está sempre presente no fazer de atividades porque fazer atividades visa a
construção de novidades, ou seja, novas estruturas mentais são edificadas pelo aluno. Isto
continua a ser verdadeiro quando, como geralmente é o caso, a construção é uma
reconstrução e a novidade é apenas nova para os participantes.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
23
Observamos ainda que, como no caso da autonomia, temos uma situação circular,
pois, embora a criatividade é inerente ao homem, é fortalecida pela sua prática. Assim,
podemos dizer que, analogamente a base cognitiva do indivíduo, cada pessoa tem uma base
criativa em um determinado momento (embora, como a base cognitiva, ela pode variar
dependendo do conteúdo sob consideração). Isto permite ao aluno fazer as inovações
requeridas por atividades apropriadas, o que, por sua vez, aumenta a sua criatividade,
tornando-o apto para fazer atividades mais avançados.
Fazer atividades com sucesso também aumenta a autoconfiança do aluno nas suas
próprias capacidades como um pensador independente. De fato, a autoconfiança é crucial no
fazer de atividades, visto que o aluno precisa externalizar o seu pensamento para participar
na construção social do conhecimento. Nesse sentido, o ensino da matemática tem sido
assolado pelo fenômeno do “medo” da matemática, em que o aluno é tão descrente das suas
capacidades que é incapacitada de participar em atividades. Assim, compete ao professor
criar uma atmosfera em qual o aluno pode “se expõe” sem correr o risco de ser visto como
ridículo. Para tanto, deve mostrar ao aluno, através da sua postura na sala de aula, que é
possível errar de maneira inteligente e que, na verdade, o erro e a sua correção fazem parte
da busca de um caminho certo. Também é muito útil não exigir do aluno, ou de um grupo, a
resolução perfeita de qualquer problema, valorizando encaminhamentos incompletos.
Deve ser claro, visto que a construção do conhecimento é sempre uma construção
social, que o diálogo faz parte de todas as atividades. Na verdade, o diálogo acontece em
vários níveis nas atividades, sendo, talvez, o entre o aluno e seus pares, bem como o entre o
aluno e o professor os mais primordiais. Devemos observar, contudo, que um diálogo não
consiste apenas em duas ou mais pessoas proferindo palavreados uma para a outra, mas
requer que cada interlocutor seja tomado a sério. Isto, por sua vez, implica que as
recomendações do parágrafo anterior não são suficientes. Não basta lidar apenas com os
erros inteligentes, pois toda afirmação feita com o intuito de contribuir à participação da
atividade, por mais esdrúxula que possa aparecer, merece a atenção dos colegas e do
professor. É só através dessa postura que o grupo pode progredir como um grupo,
investigando caminhos divergentes, corrigindo erros, fortalecendo a construção social sólida
do conhecimento e aproveitando da crítica construtiva.
Quando a atividade é realizada de acordo com os valores que acabamos de abordar,
ela engendra um respeito mútuo de todos os participantes, um para o outro, como
colaboradores na tarefa conjunta da constituição da cognição. Isto tende a se generalizar,
fazendo com que o aluno desenvolve uma apreciação das qualidades humanas inerentes ao
outro e a valorizar o outro como um ser humano, independente das múltiplas conotações
ideológicas contidas nos diversos sistemas de crenças prevalentes no mundo.
Consequências para a Sala de Aula
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
24
O ensino por atividades ainda implica em certas mudanças nos procedimentos e
diretrizes operantes na sala de aula. Mencionamos, em especial, as seguintes quatro
mudanças:
1. matemática verdadeira na sala de aula
2. aulas centradas no aluno
3. diminuição do professor como figura de autoridade
4. mudanças relacionadas à avaliação.
Referente ao primeiro item, Skemp (1989) assinala que na sala de aula construtivista
se faz “matemática verdadeira” (real mathematics). Para entender o que Skemp quis dizer
com a mencionada frase, será instrutivo ver ao que ela se opõe. Não se opõe à “matemática
prática” e muito menos à “matemática falsa”, mas à “matemática artificial”. A matemática
artificial é algo inventado especificamente para a escola, tem pouca significância para o
aluno e gera pouco interesse. A matemática verdadeira, em contraste, seja ela voltada para
questões aplicadas do dia a dia ou para questões mais teóricas, é a matemática emergente no
pensamento do aluno. Ao fazer matemática verdadeira o aluno está engajado na construção
de conceitos e procedimentos que constituirão seu conhecimento matemático.
Todo ensino de matemática por atividades compartilha esse tipo de comportamento
na sala de aula, exatamente porque as atividades visam que o aluno seja um agente ativo da
constituição da cognição. Nesse sentido, o aluno está sendo ativo mentalmente, pois ele está
desenvolvendo seus esquemas mentais. A própria dinâmica das atividades como uma
instituição social, no entanto, implica que haja muita movimentação da parte do aluno
durante a aula. Isto é, o aluno estará conversando com seus pares, manipulando material
concreto, investigando objetos matemáticos encontrados em textos, problemas, simulações
na tela do computador ou outras situações, comparando e testando conjecturas, etc., etc. Dito
de outra forma, a aula será centrada no aluno como um agente ativo, em contraste à aula
centrado no professor, na qual o aluno é concebido como um recipiente passivo.
Isto, por sua vez, implica que haverá muito menos necessidade para o professor
assumir uma postura de autoridade na sala de aula. Sem dúvida, o professor ainda estará
organizando, orientando, monitorando e, acima de tudo, encorajando a turma. Mesmo assim,
se projetar como uma autoridade científica será contraproducente à meta manifesta da
atividade, a saber, a construção do conhecimento pelo aluno, e o exercício duma suprema
autoridade comportamental será desnecessário, pois não há mais obrigação de garantir as
famosas “condições de aprendizagem” características da psicologia cognitiva.
Finalmente, observamos que os modos e finalidades da avaliação serão modificados.
De fato, a avaliação tenderá a ser contínua, através da interação professor/aluno durante o
desenvolvimento das atividades e através de relatórios orais e/ou escritos feitos por cada
grupo. Nesse sentido, o intuito da avaliação não será tanto o de verificar (e quantificar) a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
25
suposta transferência de conhecimento, mas o de (i) identificar contradições ou obstáculos
na estruturação de esquemas na fase da participação da atividade, (ii) consolidar, sistematizar
e garantir a consistência dos resultados das fases de precipitação e publicação e (iii) apontar
elementos que poderão levar a novas perturbações.
Conclusão
Ao enquadrar sete das oito principais tendências da Educação Matemática à teoria de
ensino por atividades, conseguimos reduzir a desconcertante multiplicidade de metodologias
de ensino para apenas duas, a saber, uma centrada em atividades, na qual o aluno é visto
como um agente ativo na construção social do conhecimento e outra centrada no conceito
da transferência de conhecimento, na qual o aluno é concebido como um recipiente passivo.
A resultante unificação da teoria em que a Educação Matemática se embasa tem
consequências teóricas, algumas das quais foram exploradas no presente artigo, e
consequências práticas para o professor na sala de aula, pois o ponto de vista unificado
permite o professor a mesclar e/ou misturar abordagens aparentemente diversas sem perder
a continuidade do seu planejamento.
A referida teoria de ensino por atividades tem seu próprio desenvolvimento
conceitual e justificação filosófica. Optamos a não seguir esse rumo de pensamento, devido
ao fato de que os elementos da teoria poderão ser dados interpretações interessantes do ponto
de vista teórico do construtivismo radical, complementado e corrigido pelo construtivismo
social. Neste sentido conseguimos identificar as principais fases e importantes características
cognitivas e não-cognitivas de atividades em geral, independente da tendência a que são
associadas, bem como algumas consequências basilares da sua implementação na sala de
aula. Com isto, esperamos alimentar meditações mais profundos sobre as atividades e
contribuir ao fortalecimento do uso de atividades na escola.
Referências
DOCKWEILER, Clarence J. Children´s Attainment of Mathematical Concepts. 1996
(Mimeógrafo.)
FOSSA, John A. Intuitionist theory of mathematics education. E-book at <
www.researchgate.net/publication/331438081_Intuitionist_Theory_of_Mathematics_Educ
ation>, 2019.
FOSSA, John A. Teoria intuicionista da educação matemática. Trad. Alberta M. R. B.
Ladchumananandasivam. São Paulo: Livraria da Física, 2014. [Segunda edição.]
FOSSA, John A. Características de atividades para o ensino de matemática. In:
FERNANDES, George Pimentel (Org.). Educação Básica. Crato: URCA, 2000.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.10-26 ISSN: 2675-1909
26
FOSSA, John A. A história da matemática como uma fonte de atividades matemáticas. In:
NETO, Fernando Raul (Ed.). Anais do seminário nacional de história da matemática. Recife:
UFRPE, 1998.
MENDES, Iran Abreu. Ensino de trigonometria através de atividades históricas. Dissertação
de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação. UFRN. Natal: UFRN, 1997.
MENDES, Iran Abreu, & FOSSA, John A. Tendências atuais na educação matemática:
experiências e perspectivas. In: FOSSA, John A. (Org.). Educação Matemática [Volume 19
da Coleção EPEN]. Natal: EDUFRN, 1998.
SÁ, Pedro Franco de. Possibilidades do ensino de matemática por atividades. Belém:
SINEPEM 2019. Disponível em http://sinepem.sbempara.com.br/file/V7.pdf.
SKEMP, Richard R. Structured activities for primary mathematics. London: Routledge,
1989.
John A. Fossa
Instituição: PPGECM - UEPB
E-mail: [email protected]
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-7957-6656
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 15 de agosto de 2020. DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p27-45.id284 Aprovado em: 11 de novembro de 2020.
Habilidades na resolução de problemas fundamentada na teoria da atividade
em estudantes da licenciatura em matemática
Problem solving skills based on theory of activity in students degree in mathematics
Naralina Viana Soares da Silva Oliveira
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Héctor José García Mendoza
Universidade Federal de Roraima (UFRR)
RESUMO
O presente artigo mostra resultados de um estudo cujo objetivo foi caracterizar a base orientadora
das ações relacionadas às habilidades em resolução de problemas, fundamenta na Teoria da
Atividade, na disciplina de Cálculo I em estudantes da licenciatura em matemática da Universidade
Federal de Pernambuco. Cada estudante possui uma base que orienta suas novas ações. Assim, é
fundamental que esta base seja identificada, mapeada e caracterizada, pois durante o processo, o
estudante mobilizará elementos de sua base orientadora para agir na assimilação de conceitos e
formação/atualização de habilidades. Para isso, utilizou-se uma Prova Pedagógica. As respostas dos
acadêmicos foram analisadas e comparadas com o sistema de operações que compõe o Esquema da
Base de Orientação Completa da Ação estabelecida pelo professor. Nos resultados foi constatado
que os acadêmicos apresentaram uma orientação da ação de resolver problemas discentes em função
de forma fragmentada e incompleta. Dentre os entraves, destacam-se o de representar a função em
sua forma gráfica, algébrica e na forma verbal. Além disso, ficou bem evidente a dificuldade em
converter a função de um tipo de representação para outro. Conclui-se que os licenciandos
apresentam habilidades em resolução de problema no conteúdo de funções de forma fragmentada e
incompleta, portanto, se faz necessário reelaborar a Base Orientadora da Ação.
Palavras-chaves: Resolução de Problema. Teoria da Atividade. Base Orientadora da Ação.
Atividade de Situação Problema. Teoria de Galperin.
ABSTRACT
This article Demonstrates the results of a study whose objective it is to charactize the orienting base
of the action realiting to the skills in resolution of problems, grounded on the activity theory in the
Calculation I subject of students degree in mathematics from Federal University of Pernambuco.
Each student has a base that orienting their new actions. Thus, it is essential that this base is identified,
mapped and characterized, during the process, the student mobilizes elements of his orienting base
to carry out the assimilation of concepts and formation / update of skills. For this, a Pedagogical Test
was used. The students' responses were analyzed and compared with the operations system that
makes up the Scheme of Base Orienting Complete of Action established by the professor. In the
results, it was found that the academics discovered an orientation of the action to solve documented
problems in functions in a fragmented and incomplete way. Among the obstacles, stand out that of
representing the function in its graphic, algebraic and verbal form. In addition, the difficulty in
converting the function from one type of representation to another was very evident. It is concluded
that the undergraduate students do not have adequate problem solving skills in the content of
functions, therefore, it is necessary to rework the Action Orientation Base
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
28
Keywords: Solving problems. Activity Theory. Base Orienting of Action. Activity Problem
Situations. Galperin's theory.
Introdução
Este artigo é um recorte do resultado parcial de uma pesquisa de doutorado na qual
o primeiro objetivo específico é realizar um diagnóstico inicial dos participantes com relação
às habilidades em resolução de problemas na matemática para, em seguida, ter base para
direcionar o processo de formação e desenvolvimento das habilidades referidas por meio de
Atividades de Situações Problema Discente – ASPD. Nesta perspectiva, faz-se necessário
um esclarecimento sobre o termo resolução de problemas e sobre o que é Atividades de
Situações Problema Discente – ASPD, fundamenta na teoria da atividade.
No âmbito do ensino de matemática, o termo resolução de problema pode ter
diferentes sentidos e significados, uma vez que há situações onde é utilizado como
metodologia, há contexto em que é tido como habilidade, além das situações em que é visto
como procedimentos.
Pesquisas e trabalhos voltados para a Resolução de Problemas tiveram uma grande
relevância com as recomendações do National Council of Teacher of Mathematics-NCTM.
Neste percurso, pesquisadores começaram a perceber discordâncias entre as concepções.
Dentre as diferentes concepções é possível agrupá-las em três categorias, as quais Galvão e
Nacarato (2013) classificam-na em processo, habilidade básica e meta. Estas mesmas
categorias são chamadas por Chandia et al (2016) de processo, método de ensino e objetivo
curricular, respectivamente. Além de Sousa e Justulin (2013) que também classificam tais
concepções em Ensinar sobre Resolução de Problemas; Ensinar para Resolução de
Problemas e Ensinar através de Resolução de Problemas de forma correspondente.
Sob a influência do método de Polya (1977), apresentado em seu livro A Arte de
Resolver Problemas no qual ele propõe quatro fases a serem percorridas pelo aluno, durante
a resolução de um problema, o foco inicial das abordagens com Resolução de Problemas
está nos processos, nas estratégias, nas heurísticas utilizadas pelos acadêmicos. Nesta
concepção ensina-se sobre a resolução de problema, há uma ênfase dada ao processo em si.
Contudo, com o avanço das pesquisas surgiram inquietações referentes à capacidade
de resolver problemas e começou-se a identificar fatores que influenciam no êxito da
resolução de problemas. Chandia et al (2016) apresenta algumas habilidades básicas que
interferem positivamente no êxito na resolução de problemas, que são conhecimentos,
heurísticas e controle (autoavaliação). Neste tipo de concepção, o ensino da matemática está
voltado para as aplicações. Embora a aquisição do conhecimento matemático seja de suma
importância, o propósito inicial para aprender matemática é o de ser capaz de usá-la para
resolver problemas.
Para Onuchic e Allevato (2011), a resolução de problemas é concebida como uma
metodologia de ensino e aprendizagem. Nessa concepção, o problema é visto como ponto
de partida para a construção de novos conceitos e novos conteúdos; os licenciandos sendo
co-construtores de seu próprio conhecimento e, os professores, os responsáveis por conduzir
esse processo.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
29
Embora tenha-se ligeiramente apresentado três concepções diferentes do termo
resolução de problemas, não há um consenso absoluto quanto a estas classificações. Além
disso, tais concepções não são excludentes, elas se completam e se entrelaçam durante o
processo de ensino e aprendizagem. No presente trabalho o termo resolução de problema
será concebido como uma habilidade que pode ser desenvolvida e/ou formada por meio de
atividades orientadas.
Na dimensão do enfoque histórico-cultural, a qual assumimos neste trabalho,
habilidade é um tipo de atividade cognoscitiva, prática e valorativa que coloca o
conhecimento teórico em ação. Para Núñez, Ramalho e Oliveira (2016) habilidade é o
conteúdo das ações realizadas e dominadas pelo indivíduo.
Rodriguez e Bermúdez (1999) apontam que habilidades são ações que o sujeito já
domina. A ação, uma vez dominada pelo indivíduo, por meio do processo de aprendizagem,
transforma-se em habilidade. Nesta proposta, pretende-se lançar luz a quatro habilidades em
resolução de problemas: a habilidade de formular o problema, a habilidade de construir o
núcleo conceitual e procedimental, a habilidade de solucionar o problema e a de interpretar
o problema.
Considerando a habilidade como um tipo de atividade, faz se necessário uma reflexão
sobre a categoria atividade a partir das ideias da Teoria da Atividade desenvolvida por
Leontiev e utilizada mais a frente por Galperin e Talízina.
Pressupostos Teóricos
De acordo com a Teoria da Atividade, o estudante se relaciona ativamente com o
objeto de estudo, com a realidade, com o conhecimento por meio da atividade. Ou seja, é
por meio da atividade que o homem internaliza novos conhecimentos e habilidades,
transformando a atividade externa em atividade interna.
O teórico se dedicou ao estudo da estrutura da atividade, a qual é composta por ações,
que por sua vez é subdividida em operações, ou seja, um sistema de operações forma uma
ação e um sistema de ações forma uma atividade. Os principais elementos da atividade são
o motivo e o objetivo. O motivo da atividade é concebido como uma necessidade objetivada
e o objetivo da atividade como algo que move o sujeito à ação. Talízina (1988) enfatiza que
um critério importante, apresentado por ele, para diferenciar a atividade da ação está
relacionado com o objetivo e o motivo, pois se o objetivo coincidir com o motivo tem-se
uma atividade; caso não coincidam, tem-se uma ação.
Neste aspecto, a formação de habilidades em resolução de problemas em cálculo
diferencial e integral, requer um sistema de ações e cada ação deve ser composta por um
sistema de operações a serem realizadas e dominadas pelos estudantes com o intuito de
transformar a atividade em habilidade.
No processo de assimilação de uma atividade externa em atividade interna há três
momentos funcionais que devem ser contemplados: a orientação, a execução e o controle
(avaliação), não necessariamente nesta ordem, mas de forma cíclica e dialética. Galperin
apresenta no que consiste a atividade com relação a essas três funções:
La actividad orientadora consiste en que el sujeto realiza un examen de la situación
nueva, confirma o no el significado racional o funcional de los objetos , prueba y
modifica la acción, traza un nuevo caminho y más adelante, durante el processo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
30
de la realización, lleva a cabo un control de la acción de acuerdo a las
modificaciones previamente estabelecidas. (GALPERIN, 1976, 81)
O esquema da Figura 1 representa a dinâmica do processo de assimilação com as
funções de uma atividade, segundo a Teoria da Atividade.
Figura 1 – Momentos funcionais da estrutura da atividade
Fonte: Autores
Estes momentos funcionais ocorrem durante a mediação do professor e durante
participação ativa do estudante. O momento funcional não é necessariamente o mesmo para
estudante e professor em um dado instante.
Neste sentido Talízina defende em seu livro Psicologia de la Enseñanza de 1988 que
para que o desenvolvimento do processo de assimilação promova uma aprendizagem de
qualidade, faz-se necessário que o professor considere os seguintes aspectos: 1º defina os
objetivos do ensino, 2º identifique o nível de partida dos estudantes, 3º promova o processo
de assimilação, 4º obtenha a retroalimentação, que significa o feedback dos estudantes e 5º
promova a correção do processo redirecionando-o. Cada um destes cinco aspectos tem uma
função específica no processo conforme os momentos funcionais representados no esquema
abaixo.
Figura 2 – Dinâmica do processo de assimilação
Fonte: Adaptado de Mendoza, 2009
Este esquema representa as funções do professor referente ao processo de ensino e
aprendizagem. O presente artigo se deteve apenas a explanar o nível de partida dos
estudantes que se refere ao segundo momento (D2), o qual está relacionado com a função de
orientação. Neste segundo momento o professor deve identificar a base que orienta as ações
dos alunos no início do processo para poder (re)direcioná-lo de forma adequada. Essa
Execução Controle
Orientação
Orientação D2:Partida
Orientação D1-Objetivo
Execução D3:Processo
Execução D5: Correção
Controle D4: Retroalimetação
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
31
identificação também pode ser chamada de caracterização da base orientadora da ação
(BOA) dos estudantes.
Como já foi dito anteriormente, o processo de assimilação envolve a participação
ativa dos estudantes, ou seja, ele precisa se relacionar ativamente com o objeto de estudo
transformando a atividade externa em interna. A partir das significativas contribuições de
Leontiev sobre a atividade, P. Ya. Galperin avançou nas pesquisas, estudando como se dá
essa transformação. Esta conversão segue um percurso, podendo ser caracterizado como uma
combinação de mudanças qualitativas, constituindo uma série de etapas; as quais o sujeito
precisa enfrentá-las, passando por um processo gradativo de substituição lógica que favorece
a transformação ou conversão da atividade externa em atividade psíquica.
As ações que depois se convertem em “mentais” primeiro foram externas,
materiais. As ações mentais são os reflexos, derivados destas ações materiais,
externas. Durante a formação da ação interna, sobre a base da ação exterior,
se distinguem quatro etapas fundamentais: 1ª. A formação da base
orientadora da nova ação; 2ª. A formação do aspecto material dessa ação; 3ª.
A formação de seu aspecto linguístico e, 4ª. A formação dessa ação como um
ato mental. (GALPERIN, 2013, p.441)
Na primeira etapa negociam-se os significados sobre o objetivo da ação, seu objeto,
sistema de pontos de referências com os estudantes. É a etapa de conhecimento prévio da
ação e das condições para seu cumprimento. Etapa de elaboração da base orientadora da
nova ação.
Esta etapa tem grande importância na formação da ação, pois nela se entra em acordo
com os estudantes sobre o conteúdo da base orientadora da nova ação. Neste momento se
mostra aos acadêmicos como e em que ordem está composta a estrutura funcional das
habilidades que serão formadas: a orientadora, a executora e a de controle.
Galperin enfatiza a diferença entre saber como fazer e o fazer em si, ou seja, existe
uma distância entre compreender como se vai realizar a ação e executar a ação de fato.
Na segunda etapa, denominada de etapa de formação da ação em forma material (ou
materializada), os estudantes realizam a ação em forma material (ou materializada) externa,
com a execução de todas as operações que compõem esta etapa. Assim se realizam as partes
orientadora, executora e controladora da ação. Esta etapa permite que o acadêmico assimile
o conteúdo da ação e que o professor realize um controle objetivo do cumprimento de cada
operação que compõe esta ação. Ou seja, nesta etapa o aluno assimila a ação como material
(ou materializada), detalhada, generalizada, dentro dos limites dos principais tipos de
material e executada conscientemente com toda a composição das operações.
Então, depois que todo o conteúdo da ação é assimilado, pode se realizar a transição
para a terceira etapa, que é a etapa de formação da ação verbal externa. Nesta etapa todos os
elementos da ação são representados na forma verbal externa, a ação passa pela
generalização, mas sem atingir ainda a forma automatizada nem a reduzida.
Nesta etapa a fala começa a cumprir uma nova função, na primeira e na segunda
etapa a fala servia principalmente de sistema de indicações que se descobriam diretamente
na percepção. A tarefa do acadêmico consistia não em compreender as palavras, mas sim
compreender e dominar os fenômenos. Mas na terceira etapa, a fala se torna portadora
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
32
independente de todo o processo: tanto da tarefa quanto da ação. A ação verbal deve ser
obrigatoriamente assimilada em forma detalhada, todas as operações que a integram devem
ser verbalizadas e assimiladas.
A quarta etapa, é a etapa da formação da ação da linguagem externa “pra si”. Esta se
diferencia da anterior. Nesta a realização acontece em silêncio, sem escrevê-la: como
interpretação para si. A princípio, pelas características (o caráter detalhado, consciente,
generalizado) não difere da etapa anterior, mas ao adquirir a forma mental, a ação começa a
reduzir-se e automatizar-se muito rapidamente, adquirindo a forma da ação segundo a
fórmula.
Desde este momento a ação passa para a etapa final, a quinta etapa, chamada de etapa
da formação da ação em linguagem interna. Nesta etapa a ação adquire muito rapidamente
um desenvolvimento automático, se faz inacessível a auto-observação. Agora se trata do
pensamento onde o processo está oculto, sendo revelado apenas o produto deste processo.
Nesta perspectiva, Galperin defende uma proposta metodológica para promover a
internalização de conceitos e habilidades, mostrando que é possível se planejar atividades
tais que estimulem nos estudantes o desenvolvimento de processos psíquicos que contribuam
para formação de representações mentais por meio da realização consciente das atividades
passando pela sequência de etapas citadas anteriormente. Esta metodologia está
fundamentada na Teoria de formação por etapas das ações mentais de Galperin.
A importância da orientação na aprendizagem e no desenvolvimento.
Como já foi dito anteriormente, toda ação possui uma estrutura funcional invariante
que contempla orientação, execução e controle. A realização da ação com qualidade, bem
como seu acompanhamento e seu controle dependem da orientação que o estudante possui.
Assim sendo, compreende-se a orientação da ação como um direcionamento para
guiar o processo de aprendizagem e de formação de habilidades e conceitos ou guiar o
processo de incorporação de novas qualidades a habilidades ou conhecimentos já
dominados. Pode ser concebido também como uma conexão entre a teoria e a prática, onde
o estudante mobiliza seus conhecimentos teóricos conceituais e procedimentais para utilizá-
los na prática ao resolver um novo problema.
Para executar uma ação o acadêmico precisa primeiramente pensar na ação, ou seja,
precisa ter a representação dela, bem como das condições para sua execução. Esses
elementos, que são imprescindíveis para se pensar na futura ação, compõem a base
orientadora da ação –BOA. Galperin define a BOA como sendo:
A representação antecipada da tarefa, assim como o sistema de orientadores, que
são necessários para seu cumprimento, formam o plano da futura ação, a base para
dirigir a ação. A este plano denominamos “base orientadora da ação”.
(GALPERIN, 2013, p.442)
Talízina (1988) afirma que a orientação da ação de um sujeito se apoia em um sistema
de condições necessárias para cumpri-la e defende que é imprescindível que o professor
identifique a base que orienta as ações dos estudantes antes de iniciar o processo de
aprendizagem, a qual chama de nível de partida. Contudo para que essa identificação seja
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
33
realizada faz necessário que o professor estruture um esquema com uma base orientadora
completa da ação referente aos conceitos e habilidades que se deseja identificar o nível de
domínio dos estudantes.
O sistema invariante das habilidades para resolver problemas e o esquema da base
orientadora completa das referidas habilidades.
A habilidade é concebida como um meio pelo qual se adquire conhecimento, uma
via pela qual se aplica o conhecimento e se adquire novas habilidades. Pode-se dizer ainda
que a habilidade está relacionada com o conhecimento procedimental, ou seja, com o saber-
fazer, e o conhecimento conceitual está relacionado com o saber em si. Para Petrovsky
(1980) a habilidade consiste no domínio de um sistema de ações e operações decorrentes de
uma atividade psíquica consciente e racional.
Nesta perspectiva, as habilidades em resolução de problemas, mais especificamente,
as habilidades de “formular o problema”, de “construir o núcleo conceitual da solução”, de
“solucionar o problema” e de “interpretar o problema” podem ser estruturadas por um
sistema invariante de operações contemplando o conhecimento procedimental que está
sempre associado ao conhecimento conceitual. Assim sendo, as referidas habilidades podem
ter um esquema da base orientadora completa da ação com seus elementos estruturais e
funcionais que podem servir de referência tanto para o estudante quanto para o professor.
Galperin chama este esquema de mapa de atividade defendendo a sua utilização pelo
estudante, a qual traz contribuições significativas, uma vez que o acadêmico participa
ativamente do processo tendo consciência das ações e operações que devem dominar. Sem
o uso do mapa de atividade o estudante executa passivamente as operações, necessitando
continuamente de orientação externa.
Para Núñez e Ramalho (2018) o EBOCA é um modelo mental materializado da ação,
contendo a estrutura racional e invariante do sistema de operações da ação, chamada de
invariante operacional.
O EBOCA fornece aos estudantes uma ferramenta cultural para a
generalização teórica, que permite a compreensão de um conjunto de
situações ou de um dado domínio do conhecimento que define seus limites
de aplicação ou o grau de generalização. Essa é uma condição essencial
para a formação de ações mentais e dos conceitos com alta possibilidade
de transferência às novas situações-problema. (NÚÑEZ e RAMALHO,
2018, p.422)
A materialização do EBOCA é composta por três elementos: o modelo do objeto (a
definição do conhecimento conceitual e procedimental da ação); o modelo da ação (sistema
de operações invariantes necessárias e suficientes para a realização da ação) e o modelo de
controle (um conjunto de critérios para avaliar a execução). Com este esquema definido, o
estudante tem consciência do que deve ser formado e dominado por ele, nisto reside a
importância da orientação.
No âmbito da formação de conceitos e habilidades em resolução de problemas,
Mendoza e Delgado (2018) estudaram, pesquisaram e estruturaram um tipo de atividade
orientadora denominada de Atividade de Situações Problema Discente -ASPD-
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
34
fundamentada no Sistema Didático Galperin-Talízina e nos princípios do Ensino
Problematizador de Majmutov, o qual faz um estudo epistemológico sobre o processo de
ensino e aprendizagem a partir de proposições e resoluções de problemas.
A Atividade de Situações Problema Discente é uma Atividade de Estudo orientada
pelo objetivo de resolver problemas discentes, na zona de desenvolvimento
proximal, em um contexto de ensino aprendizagem, no qual exista uma interação
entre o professor, o estudante e a tarefa com caráter problematizador; com o uso
da tecnologia disponível e de outros recursos didáticos, para transitar pelos
diferentes estados do processo de assimilação de formação por etapas das ações
metais (MENDOZA e DELGADO, 2018, p. 13).
Com relação ao conceito de problema, Majmutov (1983) considera tanto o aspecto
didático quanto o aspecto psicológico do problema, ele afirma que os elementos
fundamentais de um problema são o conjunto de conhecimentos já conhecido pelo aluno
(neste conjunto são consideradas os dados da tarefa, todo conhecimento anterior e as
experiencias pessoais do indivíduo), o conjunto de conhecimentos desconhecidos (composto
pela incógnita, o que se pede e o procedimento para alcançar o objetivo) e suas respectivas
relações. Fazendo um paralelo com a ZDP de Vygotsky, é possível dizer que o desconhecido
equivale à zona de desenvolvimento potencial e o conhecido à zona de desenvolvimento
real.
O objetivo da ASPD é de desenvolver habilidades em resolver problemas
matemáticos, então a proposta é que se vá gradativamente aumentando-se o grau de
complexidade das tarefas passando pelas etapas materializada, verbal externa, verbal para si
até a mental, onde os estudantes conseguem transferir os conceitos e procedimentos para
novas situações.
Majmutov (1983) afirma que a tarefa pode se converter em problema somente
quando o aluno assimila a contradição e se motiva para buscar o que se pede na tarefa. Para
ele a tarefa é a representação linguística do problema, sua expressão externa. Assim sendo,
nem toda tarefa pode se converter em problema.
Neste contexto, com relação a regularidades presentes nas ações em resolução de
problemas, Majmutov (1983, p. 209-210) afirma que a resolução de problemas deve estar
relacionada ao conhecimento. Ele defende que existem dois procedimentos o analítico-
lógico e/ou heurístico. O procedimento analítico - lógico da atividade mental se relaciona
com a resolução de problema por meio de algoritmo de solução. Os procedimentos de
análises e sínteses, generalização, abstração e concretização são operações mentais que
sucedem uma atrás da outra em ordem determinada, como etapas, elevando-se cada vez em
busca da solução do problema. O pensamento heurístico está relacionado com o pensamento
intuitivo, a busca dos procedimentos de solução é através da formulação de hipóteses,
geralmente usando a intuição, como resultado de uma conjectura repentina.
Assim sendo, o Ensino Problematizador apresenta uma sequência de ações que
devem ser consideradas e desenvolvidas pelo aluno para alcançar a independência cognitiva,
o pensamento criativo e formar a habilidade de resolver problemas. Com isto, a Atividade
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
35
de Situações Problema Discente -ASPD é estruturada a partir de quatro ações com suas
respectivas operações inspiradas em Majmutov.
Considerando essa estrutura invariante da ASPD, consente-se dizer que capacidade
de resolver problemas no contexto da matemática pode ser desenvolvida a partir da formação
de um sistema invariante de quatro habilidades: a de formular o problema, de construir o
núcleo conceitual da resolução, de solucionar o problema e a de interpretar a solução do
problema. Dessa forma, estabeleceu-se um núcleo invariante de habilidades composto por
um sistema invariante de operações que permite estruturar o EBOCA para cada uma das
habilidades para resolução de problemas no âmbito da matemática (Ver quadro 1).
Quadro 1: EBOCA para as habilidades em Resolução de Problemas
Modelo do objeto Modelo da Ação
Ações/habilidades Operações das ações
Analisar a situação-problema
detalhadamente, tomando
consciência das dificuldades em
relacionar o conhecido e o
desconhecido em busca de
resolver o que o problema solicita
H1-Formular
problema discente
O1. Determinar os elementos conhecidos a partir dos
dados e/ou condições e/ou conceitos e/ou procedimentos
da tarefa.
O2. Definir os elementos desconhecido a partir dos
dados e/ou condições e/ou conceitos e/ou procedimentos
da tarefa.
O3. Reconhecer o buscado
Mobilizar os conhecimentos
(conceituais e procedimentais)
conhecidos inerentes ao
problema, conectando-os com os
conhecimentos desconhecidos
usando o procedimento analítico-
lógico e/ou heurístico em busca de
uma estratégia de resolução.
H2-Construir o
núcleo conceitual e
procedimental
O4. Selecionar os conceitos e procedimentos
conhecidos necessários para a solução do problema
discente
O5. Atualizar outros conceitos e procedimentos
conhecidos que possam estar vinculados com os
desconhecidos
O6. Encontrar estratégia(s) de conexão entre os
conceitos e procedimentos conhecidos e desconhecidos
Executar a estratégia elaborada
anteriormente, utilizando os
procedimentos adequados tais
como análise, síntese,
generalização, abstração,
concretização ou com pensamento
intuitivo em busca da solução
H3-Solucionar o
problema discente
O7. Aplicar a(s) estratégia(s) para relacionar os
procedimentos conhecidos e desconhecidos
O8. Utilizar recursos adequados em busca da solução
O9. Determinar o buscado e/ou objetivo
Mobilizar argumentos para
justificar de forma consciente as
causas da utilização dos
procedimentos adotados na
solução do problema com o
objetivo da assimilação de novos
conhecimentos
H4-Interpretar a
solução
O10. Verificar se a solução corresponde com objetivo e as
condições do problema discente
O11. Verificar se existem outras maneiras de resolver o
problema discente a partir do conhecido atualizado
com o desconhecido.
O12. Verificar se solução é coerente com dados e condições
do problema
Fonte: Autores
Uma vez estruturado o EBOCA, com seus respectivos modelos para o
desenvolvimento das habilidades, este será tomado como parâmetro de referência para
realizar o mapeamento e análise das respostas dos licenciandos participantes da pesquisa
Procedimentos Metodológicos
O estudo é um recorte de uma pesquisa realizada com 29 acadêmicos do curso de
Matemática-Licenciatura do Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
36
Pernambuco durante a disciplina de Cálculo 1, cujo objetivo é realizar o diagnóstico inicial
dos participantes no que tange o nível do desempenho das habilidades em resolução de
problemas envolvendo conhecimentos sobre Função.
Para coleta de dados foi utilizado uma prova pedagógica composta por quatro
tarefas, onde cada participante respondeu individualmente em sala de aula as tarefas
propostas neste instrumento. Em seguida, os dados coletados foram analisados tendo como
parâmetro de referência o modelo da ação do EBOCA, em primeiro lugar, quantitativamente
e, a partir dos resultados desta análise, os referidos dados foram analisados qualitativamente.
Por motivo de limitação de espaço serão apresentados neste artigo as análises e resultados
relacionados apenas à tarefa 4 da prova pedagógica.
Tarefa 4: Desde o início do mês, o reservatório de água de um condomínio vem
perdendo água uma taxa constante. No dia 12, o reservatório está com 36 litros d’água; no dia
21, está apenas com 18 litros.
a) Expresse a quantidade de água no reservatório em função do tempo.
b) Quantos litros de água havia no reservatório no dia 4?
c) Em quantos dias ficarão sem água, a partir do dia 21? Justifique.
Esta tarefa teve como objetivo coletar dados referentes ao domínio das ações de
formular o problema, de construir o núcleo conceitual e procedimental, de solucionar e de
interpretar os resultados. Nesta tarefa o estudante deve apresentar a habilidade de relacionar
dois tipos diferentes de representação de uma função, a representação por meio de palavras
e a representação algébrica.
Com relação ao EBOCA, cada habilidade possui um sistema estruturante de
operações que precisam ser dominados para o desenvolvimento desta habilidade. Contudo,
para cada habilidade foi elencada uma operação essencial, de forma a facilitar a
caracterização da BOA de cada estudante. A operação essencial da habilidade de formular
o problema é a operação 3-O3- que é identificar o que o enunciado da tarefa está
solicitando. A da habilidade de construir o núcleo conceitual e procedimental é a operação
6-O6- que é elaborar uma estratégia de conexão entre o conhecido e o desconhecido. A da
ação de solucionar o problema é a operação 9-O9- que é de determinar o que foi solicitado
no enunciado. E a operação essencial da ação de interpretar a solução é a O12 que é verificar
se a solução corresponde ao que é solicitado e às condições do problema.
A partir do mapeamento de desempenho correto e incorreto de cada operação,
conforme o modelo da ação do EBOCA, foi possível realizar agrupamentos por tipos
desempenhos em nível de orientação para cada habilidade de acordo com o Quadro 2.
Quadro 2 - Critérios de caracterização dos níveis do modelo da ação
Nível Características do nível (operações executadas corretamente)
N1 Nenhuma operação executada corretamente ou não realizada
N2 Uma ou duas operações não essenciais executada(s) corretamente
N3 Apenas a operação essencial executada corretamente
N4 A operação essencial e uma operação não essencial executadas corretamente
N5 Todas as operações executadas corretamente
Fonte: Autores, 2020
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
37
Dessa forma, foi feita primeiramente uma análise quantitativa, na qual as habilidades
converteram-se em variáveis e as operações foram converidas em indicadores para
identificação do nível de orientação, variando de 1 a 5. E em seguida foi realizada uma
análise qualitativa dos desempenhos de acordo com os níveis de orientação apresentados na
análise quantitativa, na qual as habilidades torram-se categorias e as operações
converteram-se em subcategorias que foram analisadas detalhadamente.
Para a realização da análise quantitativa os dados foram organizados em uma
planilha no EXCEL, informando acertos e erros da realização de cada operação. De acordo
com as características do quadro acima, foi possível se programar a planilha para calcular
as pontuações de cada variável, indicando o nível da orientação do desempenho de cada
ação. Além disso, a planilha também foi programada para gerar medidas estatísticas, tais
como média, mediana, moda e desvio padrão, bem como gráficos que puderam facilitar as
análises.
Para realização da análise qualitativa foram identificadas características comuns
pertencente a cada nível evidenciadas na execução das operações de cada habilidade ao
resolver o problema proposto. Dessa forma, identificou-se o nível de cada estudante para
cada habilidade, as características específicas de cada nível de desempenho, bem como as
ações e operações que os participantes apresentam um baixo nível de orientação.
Caracterização da BOA dos estudantes com relação a habilidades em resolução de
problemas em função.
As respostas dos acadêmicos foram analisadas e mapeadas de acordo com o
desempenho de cada operação em cada habilidade elencada no modelo da ação do EBOCA.
Logo após, foram agrupadas em níveis de orientação como mostram as Tabelas 1, 2, 3 e 4
seguintes.
Tabela 1 - Níveis da base orientadora da ação de formular o problema discente Níveis Frequência % Características do nível(execução correta da operação)
N1 3 10,3 Nenhuma operação
N2 0 0 O1 ou O2 ou O1 e O2
N3 0 0 O3
N4 5 17,2 O1 e O3 ou O2 e O3
N5 21 72,5 O1, O2 e O3
Fonte: Autores
Observando a Tabela 1, é possível verificar que na habilidade de formular o
problema, 21 estudantes realizaram corretamente todas as operações, ou seja, identificaram
os elementos que se associam, identificaram as propriedades da relação entre estes elementos
e identificaram o que está sendo solicitado. Cinco estudantes identificaram os elementos que
se associam, identificaram o que está sendo solicitado, mas apresentaram deficiência em
reconhecer as propriedades da referida função. E três acadêmicos não responderam ou
apresentaram dificuldades nas três operações relativas a primeira ação.
Mostrando um recorte da análise das características das respostas apresentadas pelos
estudantes do nível 4, o participante A19 identificou o que o problema está solicitando, pois
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
38
está explícito na resposta da letra c da questão 4, conforme a Figura 3. Contudo ele
apresentou dificuldades ao identificar os elementos da função, reconhecendo parcialmente
as propriedades da função, como está registrado na resposta da letra a da questão 4.
Figura 3 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A19
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
Já o participante A22 que está no nível 5, apresentou uma excelente base orientadora
ao identificar os elementos da função, ao reconhecer as propriedades da função e ao
identificar o que o problema está solicitando, como pode ser observado na Figura 4.
Acredita-se que o referido estudante concebe o problema sem dificuldades no que tange o
núcleo conceitual e procedimental de função linear.
Figura 4 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A22
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
39
Agora analisando o desempenho de construir o núcleo conceitual e procedimental
em função linear, vale lembrar que esta ação foi a que apresentou um relativo índice de
dificuldade na atividade diagnóstica. Segue abaixo a Tabela 2 com o quantitativo de
acadêmicos referente a cada nível da base orientadora da 2ª ação para guiar a análise
qualitativa.
Tabela 2 – Níveis da base orientadora da ação de construir o núcleo conceitual e procedimental Níveis Frequência % Características do nível (execução correta da operação)
N1 0 0 Nenhuma operação
N2 12 41,5 O4 ou O5 ou O4 e O5
N3 3 10,3 O6
N4 3 10,3 O4 e O6 ou O5 e O6
N5 11 37,9 O4, O5 e O6
Fonte: Autores.
Com relação a segunda habilidade, 11 estudantes não apresentaram erros na
realização das operações desta ação, ou seja, conseguiram estabelecer corretamente uma
relação entre os elementos da função, considerando suas propriedades. Três acadêmicos
conseguiram estabelecer uma relação parcialmente correta entre os elementos, pois as
propriedades foram identificadas parcialmente. Três estudantes estabeleceram uma relação
entre os elementos da função, mas não identificaram as propriedades da função. E os outros
doze não conseguiram estabelecer uma relação correta entre os diferentes elementos da
função.
O estudante A03, pertencente ao nível 2 de orientação, ao tentar expressar a
quantidade de água no reservatório em função do tempo, como pede a letra a da questão 4,
escreve apenas “-2x”, observável na ilustração da Figura 5. Ou seja, ele compreende que a
cada dia perde-se 2 litros de água, contudo ele não conseguiu representar nesta expressão a
quantidade inicial de água do reservatório. Para construir o núcleo conceitual e
procedimental que envolvem funções lineares, requer que o aluno identifique as coordenadas
de dois pontos, associando estas às informações dadas no problema, o que não foi feito.
Figura 5 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A03
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
40
É interessante como a subcategoria/operação de encontrar a inclinação da reta(m ou
a), que representa graficamente uma função linear ou a expressão y=ax + b, foi realizada e
calculada corretamente pela maioria, que encontrou a inclinação igual à “-2”, representando
o modelo como “-2x”. Contudo a expressão que representa a reta, a qual representa
algebricamente o problema não foi encontrada corretamente, sendo apresentado para a
variável b vários valores equivocados.
Dentre os participantes que se encontram nível 5 de orientação, observou-se que
alguns deles se apoiaram em bases orientadoras com diferentes núcleos conceituais e
procedimentais para representar algebricamente a função. Como mostra a Figura 6, o
estudante A26, por exemplo, tomou como elementos conhecidos a expressão que representa
uma função linear e construíram um sistema com duas equações com os dados do problema,
resolveram-no e encontraram os valores de a e b, conseguindo encontrar a representação
algébrica da função.
Figura 6 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A26
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
Já o estudante A04 se apoiou na base orientadora com núcleo conceitual e
procedimental em cálculo para o coeficiente angular. É possível observar na Figura 7 que o
referido estudante utilizou a razão entre ∆y e ∆x, com os dados fornecidos no enunciado do
problema encontrou a, e por substituição de a encontrou b, conseguindo, assim, a
representação algébrica da função solicitada na tarefa.
Enquanto que o participante A25 apresentou como elementos conhecidos o núcleo
conceitual e procedimental sobre progressão aritmética. A Figura 8 mostra que ele encontrou
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
41
o primeiro termo e a razão. Dessa forma, expressou algebricamente a função com a mesma
exatidão que os demais do nível 5.
Figura 7 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A04
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
Figura 8 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A25
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
Seguiremos com os resultados da análise do desempenho da habilidade de solucionar
o problema discente em função. De forma análoga, a análise qualitativa do referido
desempenho foi guiada pela a análise quantitativa da terceira ação. Como resultado da
análise quantitativa obteve-se a Tabela 3.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
42
Tabela 3 – Níveis da base orientadora da ação de solucionar o problema Níveis Frequência % Características do nível(execução correta da operação)
N1 3 10,3 Nenhuma operação
N2 8 27,6 O7 ou O8 ou O7 e O8
N3 0 0 O9
N4 8 27,6 O7 e O9 ou O8 e O9
N5 10 34,5 O7, O8 e O9
Fonte: Autores
Com relação ao mapeamento apresentado na Tabela 3, os estudantes do nível 5
conseguiram realizar as operações sem dificuldades, encontrando a representação algébrica
da função e calculando o valor de x usando o valor de f(x) dado no enunciado. Os estudantes
do nível 4 conseguiram calcular o valor de x dado f(x), mas utilizaram a estratégia da tabela,
apresentando dificuldades em encontrar a representação algébrica da função. Já os
acadêmicos do nível 2 encontraram uma representação algébrica parcialmente correta e
consequentemente, não encontraram o valor de x corretamente. E os três estudantes do nível
1 não conseguiram realizar as operações referentes a terceira ação ou realizaram
erroneamente.
Dentre os estudantes que se encontram no nível 5 na habilidade de construir o núcleo
conceitual, ou seja, elaboraram uma estratégia de resolução corretamente, apenas um não
conseguiu executar a estratégia estabelecida, chegando a um resultado errado. Contudo, uma
das características comuns evidentes na resolução dos participantes do nível 4 da Tabela 3
se refere à dificuldade em representar a função algebricamente, como foi solicitado na letra
a da tarefa, mas conseguiram elaborar outras estratégias para chegar à resposta correta, como
mostra a resposta do acadêmico A28 na Figura 9.
Figura 9 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A28
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
Seguindo com a análise do desempenho dos estudantes no que tange a formação da
habilidade de interpretar a solução, foi utilizado o mesmo procedimento das análises
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
43
anteriores. A análise qualitativa do referido desempenho foi guiada pela a análise
quantitativa da quarta ação. Como resultado da análise quantitativa obteve-se a Tabela 4.
Tabela 4 – Níveis da base orientadora da ação de interpretar o problema
Níveis Frequência % Características do nível(execução correta da operação)
N1 3 10,3 Nenhuma operação
N2 5 17,2 O10 ou O11 ou O10 e O11
N3 4 13,8 O12
N4 7 24,2 O10 e O12 ou O11 e O12
N5 10 34,5 O10, O11 e O12 Fontes: Autores
Com relação a quarta habilidade que é de interpretar a solução, 10 estudantes do nível
5 realizaram as operações sem dificuldades, ou seja, verificaram se a resposta correspondia
ao que foi solicitado, detalhando a resolução realizada e utilizando as unidades de medidas
corretamente. Sete acadêmicos do nível 4 verificaram se a resposta estava de acordo com o
que foi solicitado, explicando a resolução, mas apresentou dificuldades ao determinar as
unidades de medidas. Quatro estudantes do nível 3 verificaram se a solução estava de acordo
com o solicitado, mas não detalharam e nem utilizaram as unidades de medidas nas
respostas. Cinco acadêmicos do nível 2 justificaram detalhadamente como desenvolveram a
solução, contudo não verificaram se a resposta estava de acordo com o solicitado, nem
utilizaram as unidades de medidas. E três acadêmicos do nível 1 não apresentaram nenhuma
operação da quarta ação ou desenvolveram as referidas operações de forma errônea.
Além disso, foi possível perceber que, dentre os participantes que executaram
corretamente a solução, dois não analisaram comparativamente as respostas das letras a, b e
c , as quais apresentavam incongruência. Os dados coletados do acadêmico A09, na Figura
10, ilustram bem este fato, onde as respostas das letras b e c estão corretas, mas a da letra a
está errada.
Figura 10 - Resposta da tarefa 4 do acadêmico A09
Fonte: Pesquisa de campo, 2019
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
44
Uma das formas de se ter acesso à BOA do estudante é por meio da observação e
análise da execução da ação. Desta forma, pode-se ter evidências de sua base orientadora
individual. Ao se comparar os desempenhos apresentados nas diferentes ações por estudante,
verificou-se que 10 estudantes se encontram no nível 5 de desempenho em todas as ações.
O que confirma a premissa de que uma boa orientação é fundamental para uma execução de
qualidade e um controle mais criterioso. Enquanto os que se encontram em níveis inferiores
na primeira e segunda habilidade apresentaram uma execução e um controle de forma
errônea.
Conclusão
Um dos princípios que guia o processo de ensino e aprendizagem é a Direção de
Estudo de Talízina, a qual tem início com a delimitação do objetivo de ensino, seguida do
diagnóstico do nível dos estudantes para, a partir diagnóstico, se definir o plano de ensino
para iniciar o processo de assimilação.
Cada estudante possui uma base que orienta suas novas ações. É fundamental que
esta base seja identificada, mapeada e caracterizada, pois durante o processo, o estudante
mobilizará elementos de sua base orientadora para agir na assimilação de conceitos e
formação/atualização de habilidades. Se esta base orientadora estiver incompleta ou for
deficitária, o estudante enfrentará obstáculos no desenvolvimento do processo de
aprendizagem, no qual o professor precisa identificar os erros para retroalimentar e corrigir
o processo, fazendo as devidas mediações.
Na primeira fase deste estudo foi realizado um diagnóstico com a identificação e a
caracterização da base orientadora das ações envolvendo o conteúdo de função dos
estudantes participantes desta pesquisa. Nas análises foi constatado que os acadêmicos
apresentaram uma orientação da ação de resolver problemas discentes em função de forma
fragmentada e incompleta, que se revela nas dificuldades apresentadas na realização das
operações que compõem a ASPD em funções.
Dentre os entraves, destacam-se o de representar a função em sua forma gráfica,
algébrica e na forma verbal. Além disso, ficou bem evidente a dificuldade em converter a
função de um tipo de representação para outro. Fato que pode impedir que o estudante avance
no desenvolvimento de habilidades envolvendo resolução de problemas em limite. A partir
deste diagnóstico e com o plano de ensino por meio da ASPD em função será feita a
atualização do núcleo conceitual e procedimental de função na expectativa que o estudante
consiga (re)elaborar uma BOA ideal tendo como referência o EBOCA da ASPD em função.
Referência
CHANDIA, E.; ROJAS, D.; ROJAS, F.; HOWARD, S. Creencias de formadores de profesores de
matemática sobre resolución de problema. Bolema, São Paulo, vol.30, n.55, p.605-624, 2016.
Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/1980-4415v30n55a15. Acesso em: 02 set. 2018.
GALPERIN, P. Ya. Introducción a la psicología. Moscou: Editorial Progreso, 1976.
GALPERIN. A direção do processo de aprendizagem. Revista AMAzônica, Manaus, ano 6, vol.11,
n.2, p.478-484, 2013.
MAJMUTOV, M. J. La Enseñanza Problémica. Habana: Pueblo y Revolución, 1983
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.27-45 ISSN: 2675-1909
45
MENDOZA, H. J. G. Estudio del Efecto del Sistema de Acciones en el Procesos de Aprendizaje
en los Alumnos en la Actividad de Situaciones Problema en Matemática, en la Asignatura de
Álgebra Lineal, en el Contexto de la Facultad Actual de la Amazonia. 343 p. Tese (Doutorado
em Ciências da Educação) – Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, Universidad de
Jaén, Jaén, Espanha , 2009.
MENDOZA, H.J.G.; DELGADO, O.T. A contribuição do ensino problematizador de Majmutov na
formação por etapas das ações mentais de Galperin. Obutchénie: Revista de Didática e Psicologia
Pedagógica, v. 2, p. 166-192, 2018.
NACARATO, A. M.; GALVÃO, E. S. O Letramento Matemático e a Resolução de Problemas na
Provinha Brasil. Revista Eletrônica de Educação, v.7, n.3, p. 81-96, 2013
NCTM. An Agenda for Action: Recommendations for School Mathematics in the 1980’s.
Reston, VA: National Council of Teachers of Mathematics, 1980.
NCTM. Principles and Standards for School Mathematics. Reston, VA: National Council of
Teachers of Mathematics, 2000.
NÚÑEZ, I. B.; RAMALHO, B. L.; OLIVEIRA, M.V. F. A Formação de Habilidades Gerais no
Contexto Escolar: contribuições da teoria de P. Ya. Galperin. In: NÙÑEZ, I. B.; RAMALHO, B. L.
(org.). P. Ya. Galperin e a Teoria da Assimilação Mental por Etapas: pesquisas e experiências
para um ensino inovador. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2016
NÚÑEZ, I. B.; RAMALHO, B. L. Diagnóstico do nível de desenvolvimento da orientação de uma
ação, em Química Geral, com futuros professores: contribuições da Teoria de P. Ya. Galperin.
Obutchénie: Revista de Didática e Psicologia Pedagógica, v.2, n.2 p.412-439, 2018.
ONUCHIC, L. R.; ALLEVATO, N. S. G. Pesquisa em Resolução de Problemas: caminhos, avanços
e novas perspectivas. Boletim de Educação Matemática, Rio Claro, v. 25, n. 41, p. 73-98, 2011
POLYA, G. A Arte de Resolver Problemas: um novo aspecto do método matemático. Rio de
Janeiro: Interciência, 1977
RODRÍGUEZ, M. e BERMÚDEZ, R. Psicología del Pensamiento Científico. La Habana: Editorial
Pueblo y Educación, 1999
SOUZA, D. D.; JUSTULIN, A.M. A Resolução de Problemas e suas Diversas Abordagens e Livros
Didáticos de Matemática do 7º Ano do Ensino Fundamental. In: XI Encontro Nacional De
Educação Matemática, Curitiba-PR, 2013
TALÍZINA, N. F. Psicología de la Enseñanza. Moscou: Editorial Progreso, 1988.
Naralina Viana Soares da Silva Oliveira
Instituição: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9952-4941
Héctor José García Mendoza
Instituição: Universidade Federal de Roraima (UFRR)
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0346-8464
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
Submetido em: : 15 de agosto de 2020. DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p46-62.id285 Aprovado em: : 15 de novembro de 2020.
Ensino dos números racionais a partir de materiais manipuláveis e
objetos de aprendizagens
Teaching rational numbers from manipulable materials and learning
objects
José Ronaldo Melo
Universidade Federal do Acre (UFAC)
Elisabeth Machado Bastos
Secretaria de Estado da Educação do Amazonas (SEEA)
RESUMO Esta pesquisa teve por escopo investigar na sala aula de Matemática, do 6° ano do Ensino
Fundamental, em qual perspectiva se desenvolve o ensino dos números fracionários. Para a
produção dos dados foram aplicados dois questionários, que resultaram num mapa conceitual, bem
como sete atividades que se deram com o uso de materiais manipuláveis e digitais. Os resultados
obtidos através desses recursos revelaram apropriação do algoritmo comum, apresentados nos
livros didáticos, assim como a não compreensão do conceito de equivalência, o que caracteriza a
aprendizagem como mecânica, em que o aprendiz não vincula os conceitos prévios aos conceitos
presentes em sua estrutura cognitiva. Considerando que o mapeador desenha as proposições de
acordo com o objetivo focal proposto pelo professor e o seu conhecimento prévio, foi possível
estabelecer a comparação dos dois mapas e, assim, verificar um avanço considerável na abstração
dos conceitos de equivalência, potencializados mediante o uso do material desenvolvido para esse
fim. Sabe-se que a aprendizagem significativa é dependente da estrutura cognitiva idiossincrática
do indivíduo e requer a associação de um conceito a outro dentro de um sistema hierarquicamente
organizado, uma vez a aprendizagem sendo formal depende de mecanismo para a apresentação dos
conceitos e da retenção pelo indivíduo. Nessa perspectiva, é emergente a mudança na prática
docente, no sentido do uso de uma variedade maior de recursos que fomentem a assimilação de
informações.
Palavras-chave: Frações. Geogebra. Mapas conceituais. Materiais manipuláveis.
ABSTRACT
The purpose of this research was to investigate in the Mathematics classroom, the 6th year
of elementary school, in which perspective the teaching of fractional numbers develops.
For the production of the data, two questionnaires were applied, which resulted in a
conceptual map, as well as seven activities that occurred with the use of handling and
digital materials. The results obtained through these resources revealed appropriation of the
common algorithm presented in the textbooks, as well as the lack of understanding of the
concept of equivalence, which characterizes learning as mechanics, in which the learner
doesn’t link the previous concepts to the concepts present in their structure cognitive.
Considering that the mapper draws the propositions according to the focal objective
proposed by the teacher and his previous knowledge, it was possible to establish the
comparison of the two maps and, thus, to verify a considerable advance in the abstraction
of the concepts of equivalence, potentialized through the use of the material developed for
this purpose. It is known that meaningful learning is dependent on the individual's
idiosyncratic cognitive structure and requires the association of one concept with another
within a hierarchically organized system, since learning being formal depends on the
mechanism for the presentation of concepts and retention by the individual. In this
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
47
perspective, the change in the teaching practice, in the sense of the use of a greater variety
of resources that foment the assimilation of information, is emerging.
Keywords: Fractions. Geogebra. Conceptual maps. Handling materials.
Introdução
Certamente o professor comprometido com uma aprendizagem significativa terá a
sensibilidade de fazer com que suas aulas abram horizontes. Dessa forma, em seus
planejamentos terá como prioridade mobilizar situações de aprendizagens que envolva uma
relação intrínseca em busca do conhecimento.
Conforme Ausubel (2000), o fator isolado mais importante capaz de influenciar a
aprendizagem é tomar o conhecimento prévio do aprendiz como ponto de partida.
Descobrindo o que ele já conhece, o professor poderá repensar a sua prática pedagógica
fazendo a diferença para que o estudante se mostre capaz de estabelecer relações e vínculos
em sua estrutura cognitiva com conhecimentos adquiridos, ocorrendo assim, a
aprendizagem significativa. É nessa perspectiva de investigação que foi desenvolvido este
estudo, fundamentado especialmente na experiência em sala de aula, que se deu por cinco
anos consecutivos, na prática de sala de aula.
Nessa experiencia, observou-se que os alunos ao resolverem problemas relacionados
com semelhança de polígonos, potenciação, racionalização, construções de gráficos e
equações que exigiam cálculos, sobretudo com os números racionais apresentavam
dificuldades. Essas dificuldades transpassava a sala de aula refletindo nas avaliações
externas – Prova Brasil e SADEAM (Sistema de Avaliação do Desempenho Educacional
do Amazonas), onde as Matrizes de referências para avaliação em Matemática têm como
foco a habilidade de resolver problemas contextualizados.
Uma análise das planilhas do 9° ano, das duas escolas investigadas, revelaram
índices de baixos rendimentos nas habilidades de efetuar cálculos que envolvam operações
com números racionais e habilidade de resolver problemas envolvendo as operações
(adição, subtração, multiplicação, divisão e potenciação). A partir dessas informações
refletiu-se sobre o motivo pelo qual o aluno estava chegando ao 9° ano sem saber operar
com os números racionais, indagando-se sobre quais seriam as causas dessa situação? E
como intervir para que a aprendizagem dos alunos fosse efetiva?
Deste modo, com o objetivo de investigar em qual perspectiva se desenvolve o
ensino dos números fracionários no 6° ano do Ensino Fundamental, foi proposto verificar
se uma das causas, da não abstração dos conceitos de fração, refere-se a obstáculos
epistemológicos ou à aprendizagem mecânica dos conceitos, que exige somente a
memorização dos algoritmos e, por isso, são esquecidos com o passar do tempo. Também
foi especulado se com o uso de materiais didáticos os alunos poderiam se apropriar desses
conceitos.
A partir daí, foi elaborado um estudo à luz da Teoria da Assimilação, que foi pensada
para um contexto de sala de aula no aprendizado por receptividade, sobre a origem e os
conceitos fundamentais dos números fracionários, apresentados por Roque (2012) e Caraça
(1970), além de se refletir sobre os obstáculos epistemológicos e os aspectos de um
número fracionário discutidos por Mandarino (2010), Barbosa (1966) e em Toledo e
Toledo (2010). E para a construção de materiais que abordam frações com esquemas
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
48
geométricos utilizados na investigação das questões de pesquisa, buscou-se orientações em
Lorenzato (2009).
Materias e Metodos
Para produção de dados foi utilizado Mapa Conceitual que é uma estrutura
esquemática para representar um conjunto de conceitos imersos numa rede de proposições
e que pode ser entendido como uma representação visual utilizada para partilhar
significados, que segundo Novak e Gowin (1984) “envolve a assimilação de conceitos e de
proposições novas em estruturas cognitivas preexistentes através do uso de diagramas
(mapas) especiais para estimular e organizar a geração e a comunicação de ideias
complexas”. Exemplo de um Mapa Conceitual, ver Figura abaixo:
De acordo com Correia (2015), com esse organizador gráfico pode-se representar um
conhecimento de forma sistematizada, sendo que as proposições mapeadas os diferenciam
de outros organizadores gráficos, tais como mapas mentais, infográficos, fluxogramas, etc.
As proposições são o conjunto formado pelo conceito inicial, um termo ou frase de ligação
e um conceito final. A frase de ligação por sua vez a rigor precisa conter um verbo
formando uma oração, pois externaliza a relação conceitual entre o conceito inicial e o
conceito final, por isso, é importante colocar setas para indicar o sentido de leitura.
Em síntese, os elementos que constituem um mapa conceitual são os seguintes: o
Conceito: representado graficamente por um círculo, oval ou retângulo; frase de ligação:
que forma as unidades semânticas (unidades de significado) e as setas ou linhas: que
direcionam o sentido da leitura. “As proposições constituem uma declaração significante.
Às vezes podem ser chamadas de unidades semânticas ou unidades de significado.”
(OLIVEIRA e PACHECO, 2010, p. 36).
Como na figura abaixo:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
49
Segundo Correia (2015), o grau de clareza semântica das proposições é garantido
pela frase de ligação quando esta apresenta um verbo, explicitando as relações entre os
conceitos. Cada proposição carrega um conteúdo semântico, claro e preciso, passível de
um julgamento. Podendo ser avaliado se está certo ou errado, e, se um conteúdo revelado é
conveniente ou não ao tema que está em debate. Por isso é importante definir uma questão
focal que vai orientar a construção do mapa conceitual. O conteúdo é revelado de acordo
com o verbo do termo de ligação.
Para construir mapas conceituais espera-se do aluno produção individual, no qual,
deverá descrever e relacionar os conceitos hierarquicamente internalizados por ele. Nesse
momento, de acordo com Novak e Gowin (1984), o aluno busca dentro de sua estrutura
mental tudo o que está relacionado com o tema investigado, exteriorizando seus
conhecimentos. Conjectura-se que com mapeamento de uma questão, o professor terá
informações sobre como está se desenvolvendo a aprendizagem do aprendiz do ponto de
vista conceitual, possibilitando interferência e esclarecimentos dos conceitos ou
proposições que não estão esclarecidos ou adequadamente apresentados nas construções.
Oliveira e Pacheco (2010) dizem que ao fazer a leitura de um mapa conceitual estamos
frente ao desenho cognitivo dos conceitos que o aprendiz possui.
Produção de Dados
A produção de dados ocorreu através da proposta do mapeamento na resolução de
dois questionários A e B e no desenvolvimento de sete atividades realizadas pelos sujeitos
da pesquisa. A aplicação do questionário ocorreu em dois momentos: o questionário A, foi
aplicado no primeiro encontro com os participantes, na perspectiva de descobrir os
conceitos prévios que os sujeitos tinham sobre os números fracionários e o questionário B,
teve por objetivo verificar se houve avanços na aprendizagem dos números fracionários
após o desenvolvimento das atividades.
Questionário A:
1. Um terreno terá 2
15 de sua área ocupada por um jardim,
6
15 por uma praça e
7
15 por um
estacionamento1.
a) Que fração corresponde à área do terreno destinada: à praça e o jardim? à praça e o
estacionamento? ao jardim e ao estacionamento?
b) Que fração corresponde à diferença entre as áreas destinadas ao: estacionamento e a
praça? estacionamento e jardim? jardim e praça?
2. Pela manhã uma balsa percorreu 2
3 de uma distância e a tarde,
1
4. Que fração da distância
ela percorreu nos dois períodos? 2
1 Questão retirada do livro Vontade de Saber Matemática, 6° ano, pág.144 – 2017. Ed. FTD.
2 Questão retirada do livro Projeto Teláris, 6° ano, pág.178 – 2016. Ed. Ática.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
50
Questionário B
1. A figura A mostra duas barras idênticas de chocolate que foram divididas, cada uma
delas em partes iguais, sendo que a área destacada representa a quantidade de chocolate
consumido por uma pessoa.
1. Júlia comeu a parte destacada da primeira barra e Matheus comeu a parte destacada da
segunda barra. 3 a) Quem comeu mais, Júlia ou Matheus? Por quê? b) Qual a fração que
representa a quantia que os dois comeram juntos?
2. Pela manhã uma balsa percorreu 2
3 de uma distância e à tarde,
1
4. Que fração da distância
ela percorreu nos dois períodos? 4
No primeiro encontro com os participantes, foram fornecidas informações verbais,
impressas sobre o que é um mapa conceitual e um exemplo de como construir o
mapeamento de uma questão através do software cmaptools. Com exposição visual em
projetor foi mostrado como se estrutura um mapa conceitual. Com informações necessárias
sobre como fazer um mapa conceitual, os participantes mapearam por fim a resolução do
questionário A, como mostra o mapa de dos participantes:
No segundo encontro, foram aplicadas sete atividades, sucessivas, com os materiais
manipuláveis e digitais. Cada atividade com o foco em um ou mais conceitos dos números
fracionários que de acordo com o objetivo foram se externalizando. E com a conclusão das
3 Questão formulada pela pesquisadora.
4 Questão retirada do livro Projeto Teláris, 6° ano, pág.178 – 2016. Ed. Ática.
Figura A
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
51
atividades, os participantes foram desafiados novamente ao mapeamento da resolução do
questionário B, finalizando os encontros.
Para apresentação dos resultados, foram analisados e comparados os mapeamentos
dos questionários e observados os conceitos que iam se externalizando de acordo com as
sete atividades sugeridas. Analisou-se também a relevância de uso de mapa conceitual
como instrumento para investigação e dos materiais manipuláveis digitais para o ensino e
aprendizagem de frações.
Resultados e Discussões
Com o propósito de investigar as habilidades de representar e identificar frações
equivalentes através de dobraduras utilizou-se papéis sulfites para representar meio, um
terço, e as frações equivalentes a elas, dobrando a folha ora em um lado ora outro. Esta
atividade possibilitou a realização das primeiras operações com frações, abstração dos
primeiros conceitos e a noção de equivalência através das áreas, além da construção de
significados aos termos das frações, conforme Toledo e Toledo (2010).
Foram distribuídas folhas de sulfites aos participantes solicitando que dobrassem a
folha ao meio, tracejassem uma parte e escrevessem a fração que representa a parte
tracejada em relação à folha toda. Em seguida dobrasse do outro lado ao meio e fizessem
novamente a escrita da fração que representa a parte tracejada.
Com uma nova folha, foi solicitado o mesmo procedimento, utilizando-se de três
partes iguais. Alguns alunos precisaram de ajuda para dobrar a folha em três partes iguais,
ocasião em foram orientados que dobrassem ao meio, abrissem a folha e fizessem coincidir
as laterais da folha com o centro, vinculando as dobras, abrissem e retirasse uma das
partes. Observou-se que o todo por vez ficaria de tamanho menor, porém não influenciou
na compreensão do reconhecimento das frações. Esta atividade apresentou-se familiar para
a maioria dos participantes, pois relataram que já haviam participado de uma atividade
similar, em outras ocasiões. Os participantes identificaram as frações pedidas como 1
2,
2
4,
1
3 e
2
6, porém, pareceu não ser perceptível a relação de equivalência com o processo de
dobradura.
Na sequência aplicou-se a outra atividade com objetivo de investigar as habilidades
de comparar frações de uma grandeza contínua através de esquemas geométricos,
principalmente a equivalência. Distribuiu-se, portanto, retângulos de mesmo tamanho com
partes coloridas nos quais os participantes foram desafiados a representar as frações, a
partir da observação das partes coloridas mais acentuada, e relacionar com suas
equivalentes.
Esperava-se a representação numérica das frações e a comparação pelo algoritmo
comum ou visualmente pelo esquema geométrico, através da contagem dos retângulos das
partes coloridas relacionando com o numerador e a quantia total de retângulos
relacionando com o denominador. Para visualmente concluir que as frações são
equivalentes observou-se a ocorrência de duas situações: se a quantias de retângulos dos
esquemas que representam os denominadores e as quantias de partes coloridas têm a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
52
mesma quantia, ou se é o dobro, triplo, quádruplo, etc., como por exemplo 3
6 e
6
12 nos
registros abaixo:
Notou-se com esta atividade que todos os sujeitos representaram corretamente as
frações, porém a minoria (8) relacionou-as com as equivalentes, dentre esses apenas um
recorreu à leitura da imagem e dos cálculos de simplificação para relacionar as frações
equivalentes, os demais se ativeram às cores das figuras ou aos critérios dos naturais para
definir equivalência. Certamente porque os conteúdos, geralmente, sejam culturalmente
tratados em sala de aula de forma isolada, pois “de modo geral, parece não se levar em
conta que, para o aluno consolidar e ampliar um conceito, é fundamental que ele o veja em
novas extensões, representações ou conexões com outros conceitos” (PCN, p. 22).
Ao ser apresentadas aos sujeitos as frações 1
3 e
2
5, com as perguntas: Qual delas é a
maior? Não hesitaram em responder que 2
5 era maior, com a justificativa de que 2 é maior
que 1, e de que 5 é maior que 3, relacionando os numeradores e denominadores como
números naturais, o que está de acordo com Pires (2010) e Toledo e Toledo (2010), que em
suas pesquisas notaram que os alunos estariam acostumadas com a relação 5 > 3, assim
acabam achando que frações com numeradores ou denominadores maiores serão maiores.
Com mais uma atividade investigou-se as habilidades em identificar os termos das
frações relacionando a parte colorida com o numerador e a divisão com o denominador.
Para isso foram distribuídas aos sujeitos seis impressões quadrangulares, com divisões
iguais, possíveis para representar frações de 1
2 até
7
7 de forma geométrica. Propôs-se que
colorissem partes dos quadrados representando as frações 1
2,
2
3,
2
4,
2
5,
3
6 e
1
7, .
No desenvolvimento desta atividade não houve obstáculos para representarem as
frações, os participantes justificaram adequadamente a escolha do quadrado fracionário
para colorir e representar as frações e relacionaram a divisão dos quadrados com o
denominador, indicando que a utilização de figuras geométricas divididas em partes para a
criança hachurar ou colorir as partes indicadas favorece a formação do conceito de fração,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
53
significado de seus termos e denominação, uma vez que possibilitou o aluno intuitivamente
compreender a necessidade de dois números inteiros para expressar um número
fracionário, estando de acordo com conclusões de Barbosa (1966, p. 150).
A quarta atividade investigou habilidades em operar com adição de frações através
de observação dos esquemas geométricos, pediu-se que considerassem dois dentre os
quadrados fracionários que os participantes haviam colorido na terceira atividade,
identificassem os termos das frações, representassem numericamente em uma folha e
executassem os seguintes procedimentos: Como exemplos as frações 𝑟 =𝑚
𝑛=
1
3 e s =
𝑝
𝑞=
2
5. 1° - Segure dois quadrados fracionários coloridos, frente ao olhar, com as divisões no
sentido vertical; 2° - Rotacione (90°) uma delas, deixando as divisões no sentido
horizontal, nesse caso 2
5; 3° - Sobreponha uma figura a outra, alternando, como na figura
abaixo:
Figura – Fração 2/5 rotacionada
Figura – Frações equivalentes a r e s.
Neste passo, foram reforçadas as observações das subdivisões que ocorrem nas
figuras com o efeito da sobreposição. As áreas totais, das duas figuras, ficaram
subdivididas em retângulos de mesmos tamanhos, cujas quantias representam o ‘novo’
denominador e as partes coloridas os ‘novos’ numeradores, que representam frações
equivalentes às primeiras com denominadores iguais. De forma geral, pode-se relacionar a
subdivisão, que ocorre pela sobreposição das imagens, com o processo de encontrar
frações equivalentes com os mesmos denominadores.
Com esta atividade, buscou-se verificar se os sujeitos compreendem a necessidade
de troca de um número por outro para operar com a adição de frações com denominadores
diferentes, através da percepção de subdivisão das áreas.
Segundo Barbosa (1966, p. 151), através de esquemas geométricos é possível
“compreender que a multiplicação do denominador aumenta o número de divisões
efetuadas sobre o inteiro, e a multiplicação do numerador aumenta o número de partes
consideradas”. O despertar com a coincidência dos resultados poderá levar o aluno à
aquisição da aprendizagem das frações equivalentes e das propriedades correspondentes.
Além da possibilidade de levá-los a entender a obrigatoriedade da troca de um par de
números por novo par para fazer a adição, dificuldade que Barbosa (1966) aponta como
um dos fatores de suas dúvidas.
Os alunos realizaram todos os procedimentos, conforme iam sendo orientados,
corretamente. Porém, observou-se que houve percepção dos conceitos de equivalências
somente por dois participantes, como visto no mapa abaixo, que foi utilizado pelos alunos
para dar explicações de como procederam citando frações equivalentes que surgiam com a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
54
sobreposição dos dois quadrados fracionários. Os demais, não relacionaram as subdivisões
com os conceitos de equivalência.
Considera-se o que diz Lorenzato (2009, p. 26), toda pessoa ao ter contato pela
primeira vez com um material tende a observar suas características, são essas percepções
que possibilitarão “com ou sem o auxílio do professor, a procura e a descoberta de novos
conhecimentos”. Com bases nas experiências, como argumenta Toledo e Toledo (2010, p.
179), o aluno poderá descobrir as regras para somar frações: “somam-se (ou subtraem-se)
frações de denominadores iguais, conservando-se o denominador e somando-se os
numeradores”.
Na quinta atividade foi analisado as possibilidades e aceitação por parte do aluno ao
utilizar-se de outras ferramentas como auxiliador na aprendizagem. Foi disponibilizado aos
sujeitos, material impresso da apresentação do GeoGebra e do tutorial de construção de um
cubo. Esta atividade permitiu a exploração do GeoGebra, possibilitando a formação de
conceitos de geometria plana e de frações discretas, através de representações de pontos,
segmentos, polígonos (quadrado), os elementos de um polígono (vértices, lados,
diagonais), cubo e seus elementos (faces, arestas) e sua planificação, levando os alunos “a
construir seu próprio conhecimento na realização do ciclo descrição – execução – reflexão
– depuração – descrição.” (CUNHA e SANTOS, 2008, p. 28). Isso indicou que os recursos
visuais colaboram para compreensão, aumentando o interesse do alunos, melhorando a
capacidade de retenção e permitindo o esclarecimento dos conceitos, confirmado o que
estabelece a teoria ao considerar que “o uso de figuras elaboradas em aplicativos
(software) de geometria dinâmica pode auxiliar o aluno a entender as figuras geométricas
como classes, diferenciando-as do simples desenho de uma figura.” (GITIRANA e
CARVALHO, 2010, p. 49).
Na sexta atividade investigou-se as habilidades de reconhecer frações equivalentes
através das áreas subdivididas. Utilizou-se um material digital, com as características
similares ao da segunda atividade, construído através do GeoGebra, usando controles
deslizantes para m, n, p e q, representando frações contínuas de forma geométrica,
fracionária e decimal. Marcando a opção Frações Equivalentes, pode-se representar com a
movimentação dos controles deslizantes r e s, até dez frações equivalentes às primeiras.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
55
A possibilidade prática desse material permitiu comparar frações (ordenação)
diretamente. Pode-se formar as frações e analisar os esquemas geométricos. Exemplo
observando 1
4 e
2
5, visualmente chega-se a conclusão que
2
5>
1
4. Ao marcar a opção
Frações com o mesmo denominador, pode-se verificar que as áreas ficam subdivididas em
retângulos o número de vezes que apresentam os denominadores das frações opostas.
Exemplo: 1
4 foi subdividido em 5, e
2
5 foi subdividido em 4, isto é
1
4×
5
5=
5
20 e
2
5×
4
4=
8
20.
Esse processo visou a compreensão da troca de uma fração por outras de denominadores
iguais para fazer a soma de frações com denominadores diferentes.
De acordo com Barbosa (1966, p. 160), na representação por esquemas gráficos,
“há o reforço na visualização”, uma vez que o aluno poderá observar a parte considerada e
notar que não temos três partes (retângulos) grandes, nem três partes pequenas, têm-se uma
grande e duas pequenas, são simplesmente três partes. Representam partes de tamanhos
diferentes que deverão ser subdivididas em partes de mesmo tamanho, para assim
efetuarem a soma das partes que agora serão iguais. Evidentemente é necessário ressaltar a
substituição das duas frações, mais convenientes, apenas para conseguir a soma. Mas, para
tanto é necessário que haja o teste, a observação e a verbalização dos pensamentos, isto é, a
comunicação das ideias, raciocínios e conclusões deles. Então o professor poderá avaliar o
que os alunos aprenderam, e assim, segundo Lorenzato (2009, p. 27) “após a verbalização,
é recomendável que cada aluno tente registrar em seu caderno, conforme suas
possibilidades, as novas conquistas decorrentes das atividades, concretas e abstratas, por
eles realizadas”.
A sétima atividade teve por objetivo investigar as habilidades de somar frações
geometricamente, apresentou-se ainda produzido com as funções do software GeoGebra
um material digital similar ao da quarta atividade, agora de forma dinâmica. Assim,
movendo os controles deslizantes nota-se que as duas frações formadas aparecem também
uma sobreposta à outra. Com a ocorrência de subdivisão das partes coloridas, que
representam os numeradores, e do ‘todo’ que representam os denominadores, poderá ser
executada a leitura e a escrita das frações equivalentes com o mesmo denominador,
contando os retângulos e efetuando a soma.
Este objeto de aprendizagem pode favorecer o processo de formação do conceito de
número racional, a partir do dinamismo de sua representação geométrica, numérica e em
número decimal. Conforme Gitirana e Carvalho (2010, p. 51), “uma imagem vale mais que
mil palavras”, e neste contexto o suporte dado aos conceitos pelas imagens é essencial.
Porém, deve-se ter o cuidado para que as representações não atrapalhem o aprendizado do
aluno e nem se desvie do foco pretendido.
Análises dos mapeamentos dos questionários A e B
Com a leitura das proposições apresentadas nos mapeamentos dos 20 participantes
do questionário A, foi possível identificar e representar os termos de uma fração em 18
participantes; operar com adição e subtração de frações com denominadores iguais (12)
participantes; operar com adição de frações com denominadores diferentes (6)
participantes. Neste último quesito um dos participantes apresentou o seguinte mapa:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
56
Ao analisar as formas que se apresentam os conceitos de frações em alguns livros
didáticos do Ensino Fundamental e no livro utilizado pelos sujeitos da pesquisa, verifica-se
que tanto os primeiros conceitos, quanto a adição de frações com denominadores iguais é
bastante explorada por esquemas gráficos, o que, talvez, justifique a porcentagem de
acertos em relação à representação de fração e adição com denominadores iguais, porém as
frações equivalentes e a adição de frações com denominadores diferentes são apresentados
somente pelo algoritmo comum de resolução.
Como citados acima, observou-se também, que os autores apresentam um mesmo
esquema para representar as frações com denominadores iguais, e trazem sempre
grandezas homogêneas como exemplos.
Utilizar só o raciocínio com grandezas homogêneas, não é recomendado; assim,
só se adicionam grandezas homogêneas, poderá trazer confusão; 5 petecas com 2
petecas, mas também é possível reunir, juntar (adicionar no sentido comum)
grandezas não homogêneas aparentemente, como 5 petecas com 2 bolas são 7
brinquedos (BARBOSA, 1966, p. 159).
Estas observações levam à reflexão de que, ao abordar os conceitos de equivalência
através do algoritmo comum, não terá significado para o aluno, então não abstrairá o
conceito, assim não representarão as diferentes escritas fracionárias de um número
racional, restando aos de fácil memorização, as regras, que possivelmente esquecem com o
passar do tempo.
Lorenzato (2010, p. 122) lembra que, ao comparar frações os alunos provavelmente
descobrirão com a vida “que 3
5 pode ser menor, igual ou maior que
5
7, dependendo do
contexto, do referencial de comparação (por exemplo, a metade do salário de algumas
pessoas é maior que o salário inteiro de outras)”. No entanto ao invés de ensinar regras aos
alunos, deve-se manter uma postura metodológica facilitadora de aprendizagem oferecendo
referenciais concretos na abordagem dos conceitos.
Indagou-se os seis participantes que conseguiram operar a adição de frações com
denominadores diferentes sobre os porquês de usar o algoritmo comum para a resolução do
questionário, a resposta foi de “que tinham aprendido daquela maneira e que não sabiam
resolver de outro jeito”.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
57
Gitirina e Carvalho (2010, p. 32) dizem que, “uma escolha metodológica bem
distinta é a que se pauta, essencialmente, na participação do aluno nas resoluções de
problemas, os quais devem ser planejados e organizados de forma a favorecer que os
conhecimentos visados aflorem”. Mandarino (2010, p. 116), acrescenta que é importante
“não restringir a compreensão da equivalência a apenas alguns exemplos típicos, seguidos
da apresentação de regras sem significados, e que parecem não ser validas para outras
ideias associadas a frações”. Assim a formulação de situações problemas que envolvam os
conceitos de comparação de frações com estratégias diversificadas poderão aproximar o
aluno ao pensamento adequado sobre equivalência.
Ainda, fez-se uma observação diante da fala de um sujeito da pesquisa que nos
pergunta: resolvo primeiro a divisão ou a multiplicação depois que achar o mmc? Esta
dúvida remete a uma reflexão sobre os passos para resolução de expressões numéricas,
conteúdo ensinado anteriormente as operações com frações, em que o professor enfatizou
que para resolvê-las devem seguir a ordens das operações, que segundo Dante (2015, p.
61), “efetuamos as multiplicações e divisões, na ordem em que aparecem”. Ou seja, ora a
multiplicação se resolverá primeiro, ora a divisão.
De acordo com Carvalho e Lima (2010, p. 25), “a memorização de conceitos e
procedimentos é importante, mas deve ser conquistada pela via da compreensão e da
sistematização”. No caso de resolver adição de frações pelo algoritmo comum, diz que:
acha-se o mmc por fatoração ou pelos múltiplos comuns dos dois denominadores e, divide-
se o mmc pelos denominadores e multiplica-se pelos numeradores. Comparando com a
regra da expressão numérica causa estranheza e confusão na hora da resolução
confrontando com os conceitos por ele internalizados.
A manifestação desse tipo de obstáculo está intimamente relacionada ao
aparecimento de erros recorrentes, e não aleatórios, cometidos pelos alunos na
construção de um novo conhecimento, sendo assim, o erro é visto como algo
necessário, parte constituinte de processo ensino e de aprendizagem
(BROSSEAU, 1983, apud PIRES, 2010, p. 53).
Como se ver no mapa abaixo o aluno faz a interpretação do problema, quando diz:
essa fração é o tanto que ela percorreu nos dois períodos. Mas ele cita que: devem-se
somar os numeradores e os denominadores, onde se conclui que não foi construído o
conceito de equivalência.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
58
Provavelmente ele visualiza a fração como dois números inteiros separados por um
tracinho, sem relação alguma, conforme afirma Barbosa (1966), e não compreende que
esses dois números representam um único número fracionário.
Pires (2010) ressalta que para ter a habilidade de operar com adição de frações, é
necessário realizar rupturas com as ideias construídas para os números naturais, além de
aceitar ideias mais complexas. Uma das causas desses obstáculos afirma Barbosa (1966, p.
147), que “visto, não raras vezes, o professor se limita a dar regrinhas sem as necessárias
explicações”. Toledo e Toledo (2010, p. 163) dizem que, “é fundamental oferecer aos
alunos a oportunidade de manipular materiais variados, que permitam a construção dos
conceitos por meio da experimentação, da verificação de hipóteses, levantadas diante de
situações-problema convenientemente apresentadas.”
Após a apresentação das atividades, foi aplico o questionário B com o objetivo de
fazer um paralelo com o questionário A e investigou-se se houve formação de conceitos ou
mudança na estrutura cognitiva dos sujeitos referente ao objeto de estudo.
Considerando que não foi possível o aprofundamento das atividades nem a
exploração de forma mais intensiva ou contextualizada com os materiais aqui utilizados,
pode-se observar com o uso desses materiais avanços em relação aos conceitos de
equivalência, como mostra os mapas baixo:
No mapeamento do questionário A, o participantes utilizam-se das regras para
resolver a questão, fatora para achar o mínimo múltiplo comum entre os denominadores 3
e 4, portanto, não prossegue até o fim com o algoritmo e conclui erroneamente que 2
3+
1
4=
3
12. O que significa que não memorizou todo o processo necessário para utilizar-se das
regras.
No entanto, na resolução do questionário B, ele faz a interpretação do problema
colocando como questão focal “duas barras” e como frase de ligação usa a palavra “da” e
“do” dando a entender que destas duas barras uma é “da Julia” e a outra “do Matheus” e
reforçando que Julia comeu 1
3 e Matheus comeu
2
7, chegando à conclusão que
1
3 de 21 são 7
pedaços e 2
7 de 21 são 6 pedaços e, concluindo que Júlia comeu mais que Matheus, o que
está correto.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
59
Ao fornecer esquemas gráficos no questionário B percebeu-se que o aluno se
apropriou da imagem, subdividindo-a chegando a esse entendimento, o esquema gráfico
possibilitou a interpretação e resolução do problema, porém é visto que o sujeito ainda não
abstraiu o conceito de equivalência nem memorizou as regras.
Os materiais utilizados nas atividades foram manipulados de maneira rápida e
experimental, mesmo assim, pode-se concluir que são relevantes como auxiliadores, uma
vez que agregando combinação de texto e imagem, poderá instigar maiores significados
aos conceitos de frações. Reforça-se ainda que, satisfaz o que diz Reys (1971, apud
Mendes, 2008, p. 11), que os materiais devem ser “apropriados para serem usados em
diferentes níveis de escolaridade e em níveis diversos de formação de um mesmo conceito,
favorecendo a abstração matemática através da manipulação individual ou em grupo”.
Convém que dispuséssemos de mais tempo para investigar sua eficácia como
auxiliadores na formação de conceitos, no qual se pretendeu deixar como algo a investigar
em momentos oportunos. Sendo o objetivo desta pesquisa, verificar quais as causas
possíveis que levariam o aluno a não abstrair os conceitos de frações, conclui-se que:
O conceito de equivalência, assim como a construção de procedimentos para a
obtenção de frações equivalentes são fundamentais, para resolver problemas que
envolvem a comparação de números racionais expressos sob a forma fracionária
e efetuar cálculos com esses números (PCN, 1991, p. 103).
Diante dos resultados da pesquisa, verificou-se a necessidade de formação dos
conceitos de equivalências. Somente com a abstração desse conceito é possível o aprendiz
compreender a necessidade de troca de um número por outro para somar frações com
denominadores diferentes. Entende-se que o conceito de equivalência é um subsunçor para
a ancoragem dos procedimentos de adição de frações, que serão subsunçores de outros.
Fica o desafio aos professores em alterar as práticas pedagógicas, dar mais ênfases à
formação de conceitos para que esta dificuldade não provoque rejeições com a Matemática
em possíveis resoluções de problemas futuros.
Considerações Finais
É comum a responsabilização aos docentes no que diz respeito ao fracasso escolar e
inadequações dos discentes na disciplina de Matemática. Nesse sentido, é possível
observar vários fatores contribuintes para tais dados, de modo que se torna injusto o peso
dessa responsabilidade ser atribuído praticamente, exclusivamente à figura do professor.
Ocorre que, mesmo que o professor acredite no potencial dos alunos, oferecendo-lhe
condições de aprendizagem, os índices de notas baixas na disciplina de Matemática,
infelizmente, nem sempre se reduzem como resposta à prática docente.
Buscou-se, assim, na presente pesquisa, de forma sistemática, saber os motivos
pelos quais os estudantes chegam nas séries posteriores sem dominarem o conceito básico
de fração, conteúdo este preferencialmente ensinado no 6º ano de Ensino Fundamental.
Em análises aos resultados, percebe-se que os alunos compreendem o conceito de fração,
identificam e representam os termos, numerador e denominador, porém não construíram o
conceito de equivalência. E quando desafiados aos cálculos, raciocinam sobre frações
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
60
como se fossem números inteiros. Ressalta-se que a investigação ocorreu no final do ano
letivo e somente uma pequena parte dos sujeitos pesquisados mostraram habilidade de
calcular com adição de frações com denominadores diferentes, assim prosseguem para
séries seguintes com essas dificuldades.
Nota-se também que esses conteúdos são abordados em sala de aula de acordo com
a proposta da escola e somente como apresentado no livro didático, pelas regras que
exigem memorização, e, nessa perspectiva, tem se mostrado ineficaz a aprendizagem
significativa.
Sabe-se que a aprendizagem significativa é dependente da estrutura cognitiva
idiossincrática do indivíduo e requer da associação de um conceito a outro dentro de um
sistema hierarquicamente organizado, uma vez a aprendizagem sendo formal depende de
mecanismo para a apresentação dos conceitos e da retenção pelo indivíduo.
Nessa perspectiva, é emergente mudança na prática docente, uma delas é em avaliar
constantemente seu método de ensino, repensar suas práticas procurando sempre
potencializar as condições ideais de aprendizagem.
Os conceitos matemáticos precisam ser preservados, porém precisam ser
apresentados de tal forma a serem assimilados pelos alunos. Para isso é necessária a ação
didática criativa do professor de forma a transformar um saber científico a um saber
ensinado. Nesse cenário, o professor deverá concentrar suas energias no ensino e planejar
suas aulas calcadas em atividades que envolva o aprendiz, condições necessárias para que
ocorra uma aprendizagem significativa. De uma forma geral espera-se que essas ideias
possam contribuir para novas investigações, e reflexões sobre o processo ensino e
aprendizagem, considerando que não deve existir limites, para quem pode e quer ir além.
Referências
AMAZONAS. Secretaria de Estado de Educação e Qualidade do Ensino. Sadeam, 2015/
Universidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Educação, CAEd. vol. 3 (jan./dez.
2015), Juiz de Fora, 2015 – Anual. Conteúdo: Revista do Sistema de Avaliação. Estadual
ISSN 2238-0264.
AUSUBEL, D. P. Aquisição e retenção de conhecimentos: Uma perspectiva cognitiva, 1
ed. Lisboa: Plátano, 2000.
BARBOSA, R. M. Matemática, Metodologia e Complementos para Professores
Primários. vol. 2. Editora: L.P.M, 1966.
BRASIL. Ministério da Educação. PDE: Plano de Desenvolvimento da Educação: SAEB:
ensino médio: matrizes de referência, tópicos e descritores. Brasília: MEC, SEB; Inep,
2011.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
Matemática / Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC / SEF, 1998.
BROUSSEAU, Guy. Os obstáculos epistemológicos e os problemas em matemática.
hal.archives-ouvertes.fr/.../Brousseau_1976_obstacles_et_problemes.pdf. Acesso em 06
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
61
junho 2011.
CARAÇA, B. J. Conceitos Fundamentais da Matemática. 5 ed. Lisboa: Lda, 1970.
CORREIA, P. R. M. Psicologia da Aprendizagem – Vídeo Aula 13 - O que são mapas
conceituais. Publicado em 24 de ago de 2015. Curso de Licenciatura - Univesp -
Universidade Virtual do Estado de São Paulo- Disciplina: Psicologia da Aprendizagem
(RPA-001). Disponível em: < https://youtu.be/aF0UbIdN1Eg> Acesso em: Fev. 2017.
CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: PITOMBEIRA, J.
B. (coord.) e CARVALHO, F. Coleção Explorando o Ensino. vol. 17. Brasília: Ministério
da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. pp.15-30.
CUNHA, V.V.; SANTOS, P. R. P. Computador: ferramenta para a construção do
conhecimento. In: OLIVEIRA. D.R.; SANTOS, P.R.P.; PACHECO, S.B.; CUNHA, V.V.
Informática na Educação 2. vol. 2. mód. 1 e 2. Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2008.
DANTE, L. R. Projeto Teláris: Matemática 6. 2. ed. São Paulo: Ática, 2015.
GITIRANA, V.; CARVALHO, J.B.P. A metodologia de ensino e aprendizagem nos livros
didáticos de Matemática. In: PITOMBEIRA, J. B. (coord.) e CARVALHO, F. Coleção
Explorando o Ensino. vol. 17. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação
Básica, 2010. pp.31-50.
LORENZATO, S. Laboratório de ensino de matemática e materiais didáticos
manipuláveis. In: LORENZATO, S. (Org.). O Laboratório de Ensino de Matemática na
Formação de Professores. 2. ed. rev. Campinas, SP: Autores Associados, 2009. (Coleção
Formação de Professores). pp. 1-37.
MANDARINO, M. C. F. Números e Operações. In: CARVALHO, João Bosco
Pitombeira Fernandes de. (Coord.). Coleção Explorando o Ensino. vol. 17. Brasília:
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010. pp. 97-134.
MENDES, I. A. Tendências Metodológica no Ensino de Matemática. Coleção Formação
Continuada de Professores. vol. 41. Belém, PA: EdFPA, 2008.
NOVAK J. D. e GOWIN D. B. Aprender a aprender. 1.ed., Lisboa: Codex Plátano
Edições Técnicas, 1984.
OLIVEIRA, D. R.; PACHECO, S.B. Informática na educação 2. vol. 3, Rio de Janeiro:
Fundação CECIERJ, 2010.
PIRES, C. M. C. Números Racionais. In: PIRES, Célia Maria Carolino. Textos
Formativos: Coletânea para formação de professores dos cincos anos iniciais, em Educação
Matemática. mód. III. 1. ed. – São Paulo: Zapt Editora, 2010. pp. 50-71.
REYS, R. (1971) Considerations for teaching using manipulative materials. Arithmetic
Teacher. In: Matos, J.M., Serrazina, M. (1996). Didática da Matemática. Lisboa: Didáctica
da Matemática. Lisboa: Universidade Aberta.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.46-62 ISSN: 2675-1909
62
ROQUE, T. História da Matemática – Uma visão crítica, desfazendo mitos e lendas. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Editor Ltda, 2012.
SADEAM - Sistema de Avaliação do Estado do Amazonas - Matrizes de Referência,
2015. Disponível em: <http://www.sadeam.caedufjf.net/matrizes-de-referencia/>. Acesso
em: 10 Dez. 2016.
TOLEDO, M. B. A.; TOLEDO, M. A. Teoria e prática de matemática: Como dois e
dois. 1. ed. São Paulo: FTD, 2009.
José Ronaldo Melo
Universidade Federal do Acre
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6379-589X
Elisabeth Machado Bastos
Secretária de Estado e Educação do Amazonas (SEDUC)
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3480-6817
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 22 de agosto de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p63-78.id286 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
Atividade de modelagem matemática com o uso do Geogebra para o
ensino de curva senoidal
Mathematical modeling activity with the use of GeoGebra for teaching
the senoidal curve
Roberta Modesto Braga
Universidade Federal do Pará - UFPA
RESUMO
O presente estudo objetivou discutir o desenvolvimento de uma atividade de Modelagem Matemática
desenvolvida com estudantes de Licenciatura em Matemática. Do objetivo destaco a natureza
qualitativa do estudo, fazendo uso de observação e registros dos sujeitos envolvidos em um minicurso
de Modelagem Matemática, no âmbito do Encontro Paraense de Modelagem Matemática, realizado
na Universidade Federal do Pará, no Instituto de Educação Matemática e Científica. Os elementos
sujeitos, objeto, artefatos mediadores, regras, divisão do trabalho e comunidade estabeleceram entre
si um sistema de atividade engestroniana, colocando a Modelagem Matemática nessa perspectiva
permitiu a colaboração de artefatos como o uso do GeoGebra para compreensão dos parâmetros de
uma curva senoidal. A pesquisa mostrou que uma atividade de Modelagem Matemática bem pensada
pode provocar nos envolvidos impressões positivas, ao mesmo tempo em que permite refletir sobre
a matemática desenvolvida no ambiente de sala de aula.
Palavras-chave: Atividade engestroniana. Modelagem Matemática. GeoGebra. Curva senoidal.
ABSTRACT
The present article objected to discuss the development activity of Mathematical Modeling
developed with of graduate students in mathematics. From the objective, I highlight the qualitative
nature of the study, making use of observation and records of the subjects involved in a short course
of Mathematical Modeling, within the scope of the Paraense Meeting of Mathematical Modeling,
held at the Federal University of Pará, at the Institute of Mathematical and Scientific Education. The
elements, subject, object and community, artifacts mediators, rules and division of labor established
a system of the engestronian activity. Placing Mathematical Modeling in this perspective allowed the
collaboration of artifacts such as the use of GeoGebra to understand the parameters of a sine curve.
The research showed that a activity of Mathematical Modeling provoke positive impressions in the
involved while allowing to reflect on the mathematics developed in the classroom environment.
Keywords: Engestronian activity. Mathematical Modeling. Geogebra. Sine curve.
Introdução
Resgatar o interesse dos alunos pelo estudo da Matemática nos diferentes níveis de
ensino, ainda é um desafio. Nesse contexto a Modelagem Matemática assume o papel
desafiador de realizar essa recuperação, na medida em que convida os alunos para investigar
situações, nas quais os conteúdos matemáticos estão associados a problemas relacionados à
realidade e ao cotidiano.
A exemplo dessa associação podemos citar o caso do vai e vem das marés, que pode
ser explorado como tema de investigação, que envolve fenômenos periódicos, e que
contempla uma vasta fonte de dados aqui na região amazônica, dado a quantidade de chuvas
em períodos específicos, a temperatura durante o dia, dentre outros fatores.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
64
Assim, as funções trigonométricas naturalmente constituem-se ferramentas
necessárias para modelagem de fenômenos periódicos, como é o caso do vai e vem das marés
que pode ser representada por uma curva senoidal, por descrever uma oscilação repetida,
contínua. Fenômeno que foi destacado em um minicurso intitulado “O desafio de fazer
Modelagem Matemática em sala de aula”. Isto, como forma de discutir que um fenômeno
ligado ao meio ambiente pode ser trabalhado em sala de aula como forma de aproximar o
aluno a questões outras e da própria matemática, bem como a utilização de tecnologia
computacional de acesso livre, como é o caso do GeoGebra, mostrar que é possível fazer
Modelagem Matemática em sala de aula por atividade.
Tal atividade de Modelagem Matemática configura-se um sistema de atividade na
perspectiva engestroniana, por envolver elementos como os sujeitos de diferentes
instituições que constituem a comunidade envolvida com um objeto de investigação, que por
via de regras dividem um trabalho escolar e fazem uso de diferentes artefatos para alcançar
um resultado.
Dito isto, entendo que ainda há necessidade de um espaço no ensino, para atividades
em que os alunos possam interagir com materiais ou situações capazes de favorecer a
compressão de relações matemáticas como fuga para uma Matemática como conteúdo
estático e acabado. Desse modo, objetivei com esta pesquisa discutir o desenvolvimento de
uma atividade de Modelagem Matemática desenvolvida com estudantes de Licenciatura em
Matemática oriundos de diversas instituições de ensino, dentre elas destaco diversos campus
da própria Universidade Federal do Pará, campus da Universidade do Estado do Pará e de
Institutos Federais do Pará.
Para alcançar esse objetivo fiz uso de observação e registros dos sujeitos envolvidos
em um minicurso de Modelagem Matemática, no âmbito do VI Encontro Paraense de
Modelagem Matemática, realizado na Universidade Federal do Pará, no Instituto de
Educação Matemática e Científica.
O texto em questão está estruturado em seções. A primeira seção trata sobre
Modelagem Matemática e sua configuração como atividade engestroniana foi discutida na
segunda seção. A terceira seção discutiu sobre a colaboração em atividade de Modelagem
Matemática, inserindo nesse contexto o uso do GeoGebra como artefato mediador
potencialmente favorável para discussão de conceitos matemáticos. Os encaminhamentos
tomados na pesquisa são descritos na seção Metodologia, seguido da quinta seção que
descreve a atividade de Modelagem Matemática “o movimento das marés”. A sexta seção
trata de uma perspectiva de Modelagem Matemática e posterior considerações sobre este
trabalho.
Modelagem Matemática
A Matemática Aplicada enquanto campo de conhecimento preocupa-se em resolver
problemas das mais diversas áreas e é nesse sentido que a Modelagem Matemática se
manifesta enquanto método, que cria modelos matemáticos capazes de representar,
diagnosticar, prever e solucionar problemas. No entanto, a Modelagem não é tão recente, e
apesar de não sabermos precisar suas raízes, é possível perceber que ao longo da história
filósofos e matemáticos elaboraram e determinaram modelos para serem utilizados em
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
65
situações diversas. Povos como os egípcios, babilônios e gregos foram os que mais
modelaram situações da realidade prática, desenvolvendo modelos muito conhecidos até
hoje (MIORIM, 1998).
Especialmente na Educação Matemática a Modelagem ganha destaque como forma
de motivar os alunos a fazer matemática e aprender matemática com significado. A dinâmica
desenvolvida nesse contexto inclui algumas etapas como forma de conduzir os estudantes
na busca de modelos matemáticos de um tema de investigação previamente combinado, seja
entre estudantes, entre estudantes e professor(a), ou mesmo proposto pelo(a) professor(a).
Essa busca proporciona aos estudantes uma imersão aos conhecimentos matemáticos ou não
que se relacionam com um tema, e que para além de construir/elaborar um modelo
matemático, estimulam os estudantes a desenvolver autonomia, apropriar-se da própria
matemática etc.
Essa dinâmica ou encaminhamento didático é sempre sugerido por etapas,
procedimentos, fases, momentos, ações. Mas de um modo geral, uma Modelagem pode ser
conduzida por etapas conforme Bassanezi (2012), a saber: a) Escolha do tema, considerada
o início de processo de Modelagem, a partir de um levantamento de possíveis situações de
estudo, podendo ser uma escolha dos estudantes, ou em conjunto com o(a) professor(a); b)
Coleta de dados, que contempla a fase de busca de informações sobre o tema escolhido,
podendo esta ser realizada através de entrevistas, pesquisa bibliográfica ou mesmo
experiências executadas pelos alunos; c) Análise de dados e formulação de modelos,
corresponde a etapa de busca por modelos matemáticos que se adequem às variáveis
identificadas na análise dos dados coletados; d)Validação, que define a aceitação ou não do
modelo matemático encontrado, podendo o processo ser retomado em qualquer etapa, caso
o modelo encontrado seja rejeitado.
De modo sucinto, um modelo matemático tem o papel de descrever um fenômeno ou
representá-lo, de diagnosticar ou de solucionar um problema, de prever ou de evitar
fenômenos etc. Esse entendimento de modelo matemático também é assumido no âmbito da
Educação Matemática. Os modelos matemáticos são resultado de um processo de
Modelagem Matemática utilizado como uma forma de extrair características de um objeto
ou situação e que apoiado em teorias, hipóteses, realiza-se aproximações que se constituem
em estruturas matemáticas, no caso os modelos.
Para Cifuentes e Negrelli (2011) o modelo matemático é uma “teoria que pode estar
dada por uma coleção de equações de diversos tipos (...) ou por uma coleção de sentenças
que podem ser consideradas conjecturas (axiomas) sobre a realidade em estudo” (p. 131).
Bassanezi (2004) concebe o modelo como “um conjunto de símbolos e relações matemáticas
que representam de alguma forma o objeto estudado” (p.20) e que “[...] em determinadas
situações é muito complicado ou mesmo impossível obter uma base de valores numéricos,
mesmo assim se pode formular modelos matemáticos coerentes desta realidade ainda que,
neste caso, não se possa validá-los.” (BASSANEZI, 2012, p.11)
Assim, entendo que colocar estudantes diante de temáticas que favoreçam um caráter
problemático, de investigação, que sejam capazes de estimulá-los ao levantamento de
questões, ao planejamento de experimentos simples, visando à coleta de dados e testagem
de hipóteses, a observar, a discutir ideias e refletir sobre os passos tomados como decisão de
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
66
grupo, não se constituem ações triviais, mas ações coordenadas que envolvem o saber fazer,
enquanto ação para envolver, sobretudo o pensar enquanto reflexão.
Dessa conclusão é que no processo reflexão sobre a porção da realidade selecionamos
argumentos considerados essenciais e procuramos uma formalização artificial (modelo
matemático), que contemple as relações que envolvem tais argumentos (BASSANEZI,
2012). Ao mesmo tempo que por meio de atividades de Modelagem Matemática os
estudantes são convidados “a construir/reconstruir, indagar/investigar, acertar/errar,
interagir/dialogar, motivados por situações no ato de modelar/aprender” (BRAGA, 2009,
p.153).
Configuração de uma atividade de Modelagem Matemática
Os elementos sujeitos, objeto, artefatos mediadores, regras, divisão do trabalho e
comunidade estabelecem entre si um sistema de atividade1 a partir da Teoria da Atividade,
no modelo proposto por Engeström (1987). Podem ser evidenciados em atividades de ensino,
pois as discussões que envolvem o contexto de sala de aula, seus artefatos, os sujeitos e as
relações por eles estabelecidas correspondem a aspectos da Teoria da Atividade.
Atividades de ensino podem ser conduzidas e motivadas de modos diferentes, assim
os diferentes planejamentos de atividades de ensino podem gerar diferentes ambientes de
aprendizagem. A exemplo, atividades orientadas pelas tendências em Educação Matemática
que são planejadas intencionalmente, levando em consideração os sentidos atribuídos às
ações, ao conteúdo e objetivo.
Ao participar de uma atividade escolar o aluno realiza ações e interage com os
elementos constituintes em um ambiente escolar, em que as necessidades que levam esse
aluno a participar de uma atividade escolar estão relacionadas aos elementos: sentido
atribuído por ele às ações, ao conteúdo e objetivo. São esses elementos que geram diferentes
ambientes de aprendizagem. Um desses ambientes é o de Modelagem Matemática, que ao
buscar solução para uma situação problema advinda de temas de investigação, fazendo uso
de modelos matemáticos, promove um ambiente de aprendizagem que como tal envolve
alunos e professores no processo.
Desse modo a Modelagem Matemática é uma atividade de ensino intencional, que
envolve ações externas “manifestadas por movimentos do corpo, são mediadas em geral, por
instrumentos e ferramentas” (OLIVEIRA, 2001 apud ALMEIDA e VERTUAN, 2014, p. 2)
e ações internas envolvendo instrumentos simbólicos. As interações nesse processo são
mediadas por elementos da atividade engestroniana, a saber: sujeitos, objeto, artefatos
mediadores, regras, divisão do trabalho e comunidade.
Colaboração em atividades de Modelagem Matemática
As argumentações em torno das potencialidades do uso de tecnologias para o ensino
da Matemática são notadamente descritas em resultados de pesquisas, comunicações
científicas e relatos de experiências em periódicos e eventos da área. Em geral, tais
argumentações baseiam-se na interação do estudante com as tecnologias, na visualização
1 O termo atividade utilizado no texto é baseado na teoria da atividade de Engeström.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
67
dos objetos matemáticos de forma prática e dinâmica, entre outros (CLÁUDIO e CUNHA,
2001; JAHN e ALLEVATO, 2010; BORBA e PENTEADO, 2010; BORBA e CHIARI,
2013).
Tais argumentações favorecem a dinâmica em atividades de Modelagem Matemática
no sentido de potencializar o processo, com destaque para o fato de que “o uso das novas
tecnologias propicia trabalhar em sala de aula com investigação e experimentação na
Matemática, considerando que permite ao aprendiz vivenciar experiências, interferir,
fomentar e construir o próprio conhecimento” (AGUIAR, 2008, 63).
Nesse sentido é que a atividade de Modelagem Matemática pensada no âmbito do
estudo se deram no sentido de provocar os estudantes envolvidos para experimentar a
matemática fazendo uso de tecnologias digitais, especificamente o uso do software livre
GeoGebra, para que pudesse também gerar experiências diferentes da prática tradicional de
sala de aula. Por software livre entende-se aquele que garante ao usuário a liberdade de
execução e colaboração entre entres os usuários, melhorar e divulgar alterações, por
exemplo. (GNU, 2016).
O Geogebra “é um software de matemática dinâmica para todos os níveis de ensino
que reúne Geometria, Álgebra, Planilha de Cálculo, Gráficos, Probabilidade, Estatística e
Cálculos simbólicos em um único pacote fácil de usar” (GEOGEBRA, 2017). Por esse
motivo, no sentido de otimizar os resultados alterados no decorrer do processo de
Modelagem Matemática é que o GeoGebra é providencial, pois permite instantaneamente o
movimento de parâmetros de uma função e permite uma visualização dinâmica dos
resultados. Além disso o o GeoGebra usa uma linguagem de programação acessível para
qualquer nível de ensino e proporciona a exploração de conteúdos de matemáticos.
O uso do GeoGebra fica então caracterizado como um artefato mediador para
discussão de conceitos matemáticos, que pode ser potencialmente pedagógico na
implementação de atividade de Modelagem Matemática.
Metodologia
O ambiente de ensino e aprendizagem provocado por uma atividade de Modelagem
Matemática envolve uma expectativa prática de como se faz Modelagem Matemática
enquanto processo de obtenção de modelo, ou de como usá-la na condição da prática de sala
de aula. Ambos os casos constituem anseio dos sujeitos que participaram deste estudo. Esse
mesmo ambiente é mote para discutir no âmbito da pesquisa qualitativa “microprocessos,
por meio de ações sociais individuais e coletivas” (SILVA, 2008, p.27)
A implementação da atividade de Modelagem Matemática motivada pelo fenômeno
das marés, ocorreu em formato de minicurso intitulado “O desafio de fazer Modelagem
Matemática em sala de aula”, ofertado pelo VI Encontro Paraense de Modelagem
Matemática, realizado no Laboratório de Informática do Instituto de Educação Matemática
e Científica da Universidade Federal do Pará, em outubro de 2016.
Para o alcance do objetivo foi utilizado como instrumento de coleta de dados o
questionário aplicado, na intenção de verificar respostas dos participantes em relação ao
minicurso, os registros produzidos, bem como observação do envolvimento dos estudantes
na atividade de Modelagem Matemática. A escolha de participantes de um encontro
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
68
científico sobre Modelagem Matemática se deu pelo fato de que eles estão em processo de
formação e/ou estão atuando em sala de aula e buscam o saber fazer, discutido no parágrafo
introdutório deste tópico, além de garantir que a comunidade do sistema seja variada, com
experiências de instituições distintas.
A atividade foi desenvolvida em um esquema de pequenos grupos para que fosse
possível tratar dados de diferentes praias do estado do Pará. Antes, porém, algumas
discussões sobre o fenômeno foram levantadas por ocasião da interação do processo de
Modelagem Matemática, bem como com o software GeoGebra. Os grupos, então, foram
conduzidos a modelar matematicamente o movimento das marés a partir dos seguintes
questionamentos: O que sabemos sobre o movimento das marés?; Onde encontramos dados
sobre o movimento das marés?; É possível estabelecer uma relação matemática para o
movimento das marés?; Essa relação matemática satisfaz o fenômeno (ou porção) estudado?
O encaminhamento da atividade de Modelagem Matemática se deu a partir das etapas
sugeridas por Bassanezi (2012): escolha de temas, nesse caso foi pré-definido por conta da
exequibilidade do tema para um minicurso de 4h; coleta de dados, nesse caso por pesquisas
bibliográficas; análise de dados e formulação de modelos; validação do modelo.
Para a análise das informações, levei em consideração a atividade de Modelagem
Matemática configurada como um sistema de atividade engestroniana, que a partir da sua
constituição foi possível discutir trechos significativos alinhados ao objetivo da pesquisa.
A atividade de Modelagem Matemática: o movimento das marés
O minicurso propôs uma prática de Modelagem Matemática, usando para isso o tema
O movimento das Marés, em colaboração com o uso do GeoGebra e foi organizado em
quatro momentos.
No primeiro momento discutimos sobre fenômenos periódicos, e em especial “o
movimento das Marés”. Considerando que o cosseno é o seno do complemento, ou seja,
𝐶𝑜𝑠(𝑥) = 𝑆𝑒𝑛(90 − 𝑥), nos proporciona explorar apenas uma das funções trigonométricas.
Nesse caso específico, fizemos uso da função 𝑆𝑒𝑛(𝑥), na forma 𝑦 = 𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷,
com A, B, C e D, parâmetros que interferem diretamente no comportamento da função, seja
na amplitude, na frequência, no deslocamento horizontal ou vertical, respectivamente.
No segundo momento, foi estudado graficamente com auxílio do software de acesso
livre, o GeoGebra, o comportamento dos parâmetros A, B, C e D da função 𝑦 =
𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷, resumidamente dispostos nos gráficos: 1, 2, 3 e 4.
Gráfico 1: Variação do parâmetro A (Amplitude) da função 𝑦 = 𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
69
Fonte: Autora
Para evidenciar a variação da amplitude (A) foi utilizado inicialmente no gráfico os
parâmetros A = 1, B = 1, C = 0 e D = 0 e depois sugerido a variação de A = 1 para A = 2,
resultando em um gráfico com maior variação, ou seja, para f(x) = 1.Senx, a amplitude é 1,
varia de -1 a 1 no eixo das ordenadas, para g(x) = 2.Senx, a amplitude varia de -2 a 2.
Gráfico 2: Variação do parâmetro B (Frequência) da função 𝑦 = 𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷
Fonte: Autora
Para evidenciar a variação da frequência (B), foi utilizado inicialmente no gráfico os
parâmetros A = 1, B = 1, C = 0 e D = 0 e depois sugeri a variação de B = 1 para B = 2,
resultando na mudança de oscilações no mesmo intervalo, ou seja, o parâmetro B controla
a frequência da função.
Gráfico 3: Variação do parâmetro C (deslocamento horizontal) da função 𝑦 =
𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
70
Fonte: Autora
O gráfico 3 mostra um deslocamento horizontal ou de fase, em que o comportamento
f(x) e g(x) são exatamente os mesmos, apenas estão deslocados por uma constante, nesse
caso específico variamos os parâmetros A = 1, B = 1, C = 0, D = 0 para A = 1, B = 1 , C =
2, D = 0.
Gráfico 4: Variação do parâmetro D (deslocamento vertical) da função 𝑦 =
𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷
Fonte: Autora
Para evidenciar o deslocamento vertical usei inicialmente os parâmetros A = 1, B =
1, C = 0, D = 0 e sugeri alterar para A = 1, B = 1, C = 0, D = 1. Com essa alteração é possível
perceber que o gráfico deslocou-se verticalmente 1 unidade.
Após as mudanças de parâmetros, os alunos foram conduzidos a desenvolver o
processo de Modelagem Matemática com o tema “Movimento das Marés”, no terceiro
momento do minicurso. Para tal fizeram levantamento bibliográfico de tábuas de marés via
internet, para coleta de dados, de uma praia de sua escolha, para anotações de marés baixas
e altas e seus respectivos horários de ocorrência.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
71
Nesse texto optei pelo movimento das marés do primeiro dia do mês de novembro
de 2016, de uma das praias paradisíacas e mais visitada do estado do Pará, em
Salinópolis/PA, escolha de um dos grupos. Cada grupo com os dados da localidade
selecionada estudou o comportamento da altura da maré em relação ao tempo no decorrer
de um dia. A opção por um dia se deu pelo fato de o minicurso ocorrer com apenas quatro
horas de duração, não inviabilizando o objetivo do estudo. A tabela 1 e gráfico 5 mostram
as decisões iniciais, tabulação de um dia referente a baixas e altas das marés e dispersão
respectivamente.
Tabela1: Comportamento das marés no dia 1/11/2016 em Salinópolis
Dia Hora Altura (m)
Terça 1/11/2016 3:30 0,3
9:15 4,8
15:40 0,5
21:25 4,8
Fonte: Disponível em: < http://www.tabuademares.com/br/para/salinopolis>. Acesso em 3/11/2016
Gráfico 5: Dispersão da hora e altura das marés do dia 1/11/2016
Fonte: Autora.
Com os dados da tabela 1, assumiram o movimento das marés como um fenômeno
periódico, podendo ser comparado a uma curva senoidal e, para tal, modelaram a função 𝑦 =
𝐴𝑆𝑒𝑛(𝐵𝑥 + 𝐶) + 𝐷. Ao considerar que os valores referentes às alturas da maré corresponde
ao mínimo de 0,4m (média das marés baixas) e um máximo de 4,8m, a imagem da função
está contida no intervalo [0,4 ; 4,8], possibilitando calcular o parâmetro A (Amplitude), ou
seja 𝐴 =4,8−(0,4)
2=
4,4
2= 2,2 e obtemos, a princípio a função ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 𝑡.
Notadamente a função obtida não contempla a imagem [0,4 ; 4,8]. Assim, outras
alterações foram realizadas nos outros parâmetros, como o caso do parâmetro D em ℎ(𝑡) =
2,2𝑠𝑒𝑛 𝑡 + 𝐷, determinando um deslocamento vertical de modo que a imagem corresponde
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
72
a [-2,2 + D; 2,2 + D] = [0,4 ; 4,8]. Assim -2,2+ D = 0,4 e 2,2 + D = 4,8, resultando em D =
2,6 o que resulta na função ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 𝑡 + 2,6.
Em sequência, o parâmetro B (frequência) não altera a imagem da função, mas
influencia no período da função, podendo ser encontrado considerando uma função f(x) =
senBx, levando a expressão do período 𝑝 =2𝜋
|𝐵|. No caso das marés, o tempo entre duas marés
baixas ou duas marés altas em sequência equivale a 12, 08 horas, corresponde ao período da
função seno. Realizando os devidos cálculos tem-se que 12,08 =2𝜋
|𝐵| resulta em 𝐵 =
𝜋
6,04 , o
que permitiu escrever a função ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 𝑡) + 2,6.
Como forma de adequar a função aos dados, ainda foi preciso trabalhar com o
parâmetro C (deslocamento horizontal) que para tal foi usado um ponto (par ordenado)
conhecido arbitrário, no caso (9h15min;4,8m) = (9,25h;4,8m) para resolver a equação
ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 𝑡 + 𝐶) + 2,6, como segue:
4,8 = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 .9,25 + 𝐶) + 2,6
2,2 = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 .9,25 + 𝐶)
1 = 1𝑠𝑒𝑛 (9,25. 𝜋
6,04+ 𝐶)
𝑠𝑒𝑛𝜋
2= 𝑠𝑒𝑛 (
9,25. 𝜋
6,04+ 𝐶)
𝜋
2= (
9,25. 𝜋
6,04+ 𝐶)
𝐶 =𝜋
2−
9,25. 𝜋
6,04
𝐶 ≅ −3,24
Figura 1: Síntese da determinação dos parâmetros da função ℎ(𝑡) = 𝐴𝑠𝑒𝑛 (𝐵𝑡 − 𝐶) + 𝐷
Fonte: Autora
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
73
A compreensão dos parâmetros a partir dos dados da maré selecionada, foi o estopim
para uma série de dúvidas e questionamentos entre os vários grupos. Era necessário entender
as variações para a determinação dos parâmetros A, B, C e D, mas que foi fundamental para
compreensão de todos as variáveis envolvidas numa curva senoidal (Figura 1). Daí,
considerando todos os parâmetros encontrados, o modelo matemático que representou a
altura das marés em relação ao primeiro dia do mês de novembro de 2016, de Salinópolis-
PA, foi dado por ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 𝑡 − 3,24) + 2,6, para t horas no intervalo de 24h,
conforme comparação gráfica do modelo após determinação dos parâmetros, gráfico 6.
Gráfico 6: Função ℎ(𝑡) = 2,2𝑠𝑒𝑛 (𝜋
6,04 𝑡 − 3,24) + 2,6 com t no intervalo 0 ≤ 𝑡 ≤ 24ℎ.
Fonte: Autora
Tal modelo restringiu-se ao estudo das marés no intervalo de 24 horas, podendo ser
discutido uma dispersão de dados bem maior que a tomada para o minicurso. Foi
determinada uma curva senoidal para todas as localidades selecionadas (Ilha de Mosqueiro,
Vigia, Belém etc.), com exceção de dois grupos que tiveram dificuldades com a
determinação do parâmetro C da função e com o período dos dados. A questão da validação
matemática do modelo se deu pelo desvio entre os dados pontuais de um dia associado à
curva senoidal. Ficou claro, no entanto, que a quantidade de dados não foi suficiente para
garantir um modelo aceitável para a vida real, mas em termos didáticos foi fundamental para
fazê-los perceber uma modelagem na prática.
Sobre a validação de modelos em ambiente de sala de aula Bassanezi (2012, p.08)
pontua que “se vamos utilizar o processo de Modelagem Matemática para motivação de
certos conteúdos matemáticos ou a valorização da própria matemática, muitas vezes a
validação dos modelos não é um critério fundamental para sua qualificação”, indicando para
esse caso que o foco está no próprio aprendizado da matemática. Nesse sentido é que a
discussão de uma implementação prática do modelo encontrado pelos grupos na vida real,
merece uma disposição maior de dados.
Destaco da atividade, a manipulação de parâmetros na função trigonométrica 𝑆𝑒𝑛𝑥
para o entendimento do fenômeno periódico “Movimento das Marés” como estopim para
reflexão sobre o desafio de se fazer Modelagem Matemática em sala de aula.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
74
O quarto momento, foi dedicado à reflexão teórica associada à atividade prática
realizada, bem como discussão sobre o desafio de fazer Modelagem Matemática em sala de
aula, que a partir da experiência efêmera, mais concluída neste minicurso, os participantes
foram capazes de destacar suas impressões com relação à Modelagem Matemática.
Perspectiva de uma atividade de Modelagem Matemática
Ao levar em consideração que dos 27 participantes do minicurso, 17 registraram
tratar-se de seu primeiro contato com Modelagem Matemática foi necessário transitar sobre
o que caracteriza esse processo. Para tanto o esquema da figura 2, foi discutido com a
comunidade, definindo assim as regras envolvidas na atividade, a saber: diálogos, decisões
e relações matemáticas (figura 3). Tais regras implicam na recondução do processo de
Modelagem Matemática, seja pela não validação do modelo, seja pelas relações matemáticas
utilizadas, pelos dados coletados ou ainda pela insipiência sobre o tema investigado.
Figura 2: Síntese processo de Modelagem Matemática
Fonte: Adaptação Bassanezi, 2012.
Ao configurar a Modelagem como um sistema de Atividade reconheço-a como uma
atividade humana potencialmente colaborativa, por envolver sujeitos como motivações e
experiências diferentes, seja para cumprir a divisão de tarefas ou por decidir sobre as regras
que envolve a comunidade.
2 Coleta de dados
Os participantes fizeram pesquisa bibliográfica em tábuas de marés.
3 Análise de dados eformulação de modelos
Reconhecimento do modelosenoidal existente e determinaçãodos parámetros pelos dados reaisde um dia de maré.
1 Escolha de temas
Movimento da Maré
(previamente determinado)
4 Validação do
Modelo: desvio e
incipiência de
dados; motivação
de conteúdos.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
75
Figura 3: Modelagem Matemática configurada como atividade engestroniana.
Fonte: Autora.
Esse sistema (figura 3) demonstra o fluxo que um processo (figura 2) é capaz de
proporcionar ao ambiente de sala de aula, ou seja, sujeitos que fazem uso de uma série de
artefatos de mediação, cuja interação com o objeto da atividade envolve uma comunidade a
partir de regras e divisão do trabalho um motivo para alcançar o resultado. Nesse caso, os
motivos dos participantes do minicurso estavam associados ao fazer ou ao saber sobre
Modelagem Matemática, o que favoreceu o interesse pelo modelo enquanto resultado da
atividade. Quando Engeström (1978) propõe uma estrutura para atividade, para além do
processo de mediação entre sujeito e objeto, envolve outros elementos como artefatos, regras
e divisão do trabalho, caracterizam essa estrutura como uma unidade básica de análise. Tais
elementos são evidenciados em uma atividade de Modelagem Matemática a partir da
interação dos mesmos, no sentido de alcançar um resultado, seja o modelo para o tema
investigado ou mesmo a reflexão do processo.
Uma vez determinado o modelo, os estudantes perceberam que apesar das tomadas
de dados em diferentes localidades, todos os grupos fizeram uso da curva senoidal, ou seja,
todos os grupos utilizaram das mesmas ferramentas matemáticas, o que favoreceu uma
compreensão de modelos predeterminados para uma variedade de fenômenos, situações.
Esse episódio favoreceu a desmistificação de que Modelagem Matemática na educação não
necessariamente determina novos modelos matemáticos, mas se apropria dos variados
modelos existentes para discutir fenômenos, e a partir de parâmetros reais representa-os.
Daí em diante, com foco no desafio de fazer Modelagem Matemática, três pontos
foram focados: 1 impressões sobre a atividade “Movimento das marés” realizada no
minicurso; 2 Modelagem Matemática como estratégia para o entendimento de conceitos
matemáticos; e 3 Viabilidade de utilizar Modelagem Matemática nas aulas de matemática
na educação básica.
Com relação a impressões sobre a atividade “Movimento das marés” realizada no
minicurso, mesmo aqueles que tiveram dificuldades em algum momento do processo
reconheceram-na como significativa para a formação e consequentemente para compreensão
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
76
de conceitos matemáticos pelos alunos. Nesse contexto entendo que “a utilização da
modelagem na educação matemática valoriza o ‘saber fazer’ do cursista, desenvolvendo sua
capacidade de avaliar o processo de construção de modelos matemáticos nos diferentes
contextos de aplicações dos mesmos” (BASSANEZI, 2012, p. 10) ao mesmo tempo em que
se preocupa com o fazer Modelagem Matemática em sala de aula.
Tal assertiva alinha-se à fala de um participante quando destaca que considerou
“muito produtivo e interessante, pois articula várias abordagens como o emprego
computacional, processos investigativos, mediação dialógica, dentre outros” (P5). Ou seja,
além de determinar um modelo, compreender o processo com percepção de questões da
prática de sala de aula e possíveis colaborações advindas de interações entre os elementos
constituintes da atividade culminam no resultado demonstrado na figura 3.
Dessa maneira, o conceito de atividade tem sua concepção no processo social
orientado para uma meta, que está diretamente relacionada às experiências de cada
indivíduo. O que culmina no tratamento dado pelos participantes à Modelagem Matemática
como estratégia de ensino. Das experiências de estudantes, estes percebem o conteúdo
matemático envolvido ou situações de cotidiano:
usamos nossos conhecimentos básicos para chegarmos a uma parte
mais elaborada da matemática, no caso estudado usamos as funções
trigonométricas como ferramenta para determinar parâmetros
(P17)
a partir do conhecimento básico e da coleta de dados, para elaborar
o gráfico desejado, foi mais fácil, já que foi envolvido situações do
cotidiano (P23)
Das experiências de participantes que já desenvolvem atividades de ensino a
percepção passa pelas preocupações com a aprendizagem, como descrito no seguinte trecho:
A aprendizagem tem caráter subjetivo, particular, depende de
processos pessoais de estabelecimento de relações próprias com o
tema e instrumentos propostos, isto é, chegamos com experiências
distintas sobre o tema e saímos com níveis também distintos. Porém
sempre haverá aprendizagem em qualquer interação social, neste
caso específico o tamanho foi soberbo na riqueza de situações que
possibilitaram aprendizados (P5).
Desse modo, a perspectiva de atividade engestroniana contempla a Modelagem
Matemática como atividade de ensino capaz de articular diferentes artefatos de medicação,
sujeitos com objetivos distintos para uma mesma atividade. Isso pôde ser evidenciado na
fala do participante P5 quando da compreensão social que a atividade promoveu em
consonância com possibilidades de aprendizado.
Sobre a viabilidade de utilizar Modelagem Matemática nas aulas de matemática na
educação básica, os argumentos giram em torno da fuga de uma rotina escolar
tradicionalmente imposta para o ambiente escolar, relacionando-se reflexivamente com a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
77
zona de conforto que tanto estudantes como professores estão habituados, bem como sobre
professores superarem suas limitações. Nesse contexto, os estudantes optaram por relacionar
essa viabilidade baseada em uma matemática mais interessante, aplicável, o trabalho em
equipe, interação entre a comunidade envolvida, sem perder de vista questões estruturais da
escola e compromisso do(a) professor (a) em desenvolver atividades de Modelagem
Matemática.
Considerações
É recorrente nos estudos sobre o uso de Modelagem Matemática para o ensino a
indicação de que a mesma seja desenvolvida por grupos de alunos, o que a torna um processo
cooperativo. Bassanezi (2012) corrobora com essa questão, o que não exclui um ou outro
estudante querer desenvolver uma modelagem solo. Mesmo quando incialmente pretende
desenvolver uma modelagem solo, o estudante acaba envolvendo-se nas discussões de outros
grupos e “corrompido” pelas relações e interações proporcionadas pelo trabalho
colaborativo. Justamente as experiências dos sujeitos envolvidos é que determinam as regras
de um sistema para a tomada de decisões.
Assumir a Modelagem como atividade colaborativa permitiu que a atividade “o
movimento das marés” fosse configurada como um sistema engestroniano, pois envolveu
sujeitos, objeto, artefatos mediadores, regras, divisão do trabalho e comunidade que
estabeleceram entre si interações que culminaram no alcance do resultado esperado, o
modelo e reflexões do próprio processo. A colaboração de artefatos mediadores foi
fortemente representada pelo uso do GeoGebra para compreensão dos parâmetros de uma
função seno.
Além disso a pesquisa mostrou que uma atividade de Modelagem Matemática bem
pensada pode provocar nos envolvidos impressões positivas ao mesmo tempo em que
permite refletir sobre a matemática desenvolvida no ambiente de sala de aula, mas sobretudo
levantou questionamentos sobre o desafio de fazer Modelagem Matemática em sala de aula.
Desafio que envolve tanto o fazer modelagem quanto o saber sobre Modelagem Matemática
para prática de sala de aula.
Referências
AGUIAR, Eliane Vigneron Barreto. As novas tecnologias e o ensino-aprendizagem.
Vértices. Campos dos Goytacazes, RJ, v. 10, n. 1/3, p. 63-72, jan./dez., 2008.
ALMEIDA, Lourdes Maria Werle de; VERTUAN, Rodolfo Eduardo. Modelagem
Matemática na Educação Matemática. In: ALMEIDA, L. W. de; SILVA, K. P. da S.
Modelagem Matemática em Foco. Rio de Janeiro: Ciência Moderna, 2014.
BASSANEZI, Rodney Carlos. Ensino-aprendizagem com modelagem matemática. São
Paulo: Contexto, 2004.
BASSANEZI, Rodney Carlos. Temas e modelos. 1ª ed. Campinas: Edição do autor
UFABC, 2012.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.63-78 ISSN: 2675-1909
78
BORBA, Marcelo de Carvalho & PENTEADO, Miriam Godoy. Informática e Educação
Matemática. Coleção tendências em Educação Matemática. 4ª ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2010.
BORBA, Marcelo de Carvalho Borba; CHIARI, Aparecida (org.) Tecnologias digitais e
educação matemática. São Paulo: Livraria da Física, 2013.
BRAGA, R. M. Modelagem Matemática e tratamento do erro no processo de ensino-
aprendizagem das equações diferenciais ordinárias. 2009. 180f. Dissertação (Mestrado
em Educação em Ciências e Matemáticas) – Instituto de Educação Científica e
Matemática, Universidade Federal do Pará, 2009.
CIFUENTES, José Carlos; NEGRELLI, Leônia Gabardo. O processo de matemática e
discretização de modelos contínuos como recursos de criação didática. In: ALMEIDA, L.
M. W; ARAÚJO, J. de L.; BISOGNIN, E. Práticas de modelagem matemática na
educação matemática. Londrina: Eduel, 2011.
CLÁUDIO, D. M.; CUNHA, M. L. da. As novas tecnologias na formação de professores
de matemática. In: CURY, Helena Noronha (org.). Formação de professores de
matemática: uma visão multifacetada. Porto 16 Alegre: EDIPUCRS, 2001.
ENGESTRÖM, Yrjö. Learning by expanding: an activity-theoretical approach to
developmental research. Helsinki, Orienta-Konsultit, 1987.
GEOGEBRA, Site, 2017. Disponível em http//www.geogebra.org> acessado em 16 de
março de 2018 às 00: 18.
JAHN, Ana Paula; ALLEVATO, Norma Suely Gomes. Tecnologias e educação
matemática. Recife: SEBEM, 2010.
MIORIM, M. A. Introdução à história da educação Matemática. São Paulo: Atual,
1998.
SILVA, Otto Henrique Martins. Professor – Pesquisador no Ensino de Física. Curitiba:
Ibepex, 2008.
Roberta Modesto Braga
Professora Adjunta da Faculdade de Matemática, Campus Castanhal da Universidade
Federal do Pará.
e-mail: [email protected]
ORCID: http://orcid.org/0000-0003-3747-5862
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 08 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p79-99.id287 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
O ensino de matemática por atividades: uma interface entre recursos
tecnológicos e o pensamento computacional
Teaching mathematics by activities: an interface between technological
resources and computational thinking
Enseñanza de matemáticas por actividades: una interfaz entre recursos
tecnológicos y pensamiento computacional
Gilson Pedroso dos Santos
Universidade Federal do Oeste do Pará
José Ricardo e Souza Mafra
Universidade Federal do Oeste do Pará
RESUMO Este trabalho trata sobre o ensino de matemática através de recursos tecnológicos e do Pensamento
Computacional (PC). Procurou-se investigar as relações entre o PC, as TIC e o Ensino de
Matemática por Atividades, na busca de saber como professores podem ordenar ações e cenários
para o desenvolvimento de suas práticas pedagógicas, usando estes princípios de forma a auxiliar
os alunos a desenvolverem habilidades e competências tão necessárias no século XXI. A pesquisa
foi realizada em 2017 numa escola pública do município de Santarém-Pará, nas dependências do
laboratório de informática que contava com quatorze computadores. A turma participante foi a do
sexto ano, com vinte e dois alunos na faixa etária de dez a onze anos. Esta investigação foi
desenvolvida a partir de uma proposta metodológica desenvolvida em cinco etapas: a) 1ª etapa -
Pesquisa Bibliográfica; b) 2ª etapa – Desenvolvimento e planejamento das atividades; c) 3ª etapa -
Aplicação das oficinas; d) 4ª etapa - Avaliação final das oficinas; e) 5ª etapa - Análise e discussão
dos resultados. Os resultados obtidos convergem para a discussão sobre como elaborar atividades,
envolvendo o PC e as TIC, que possam ser aplicadas no ensino de matemática. Percebeu-se um
nível de motivação significativo em aprender matemática através dos recursos computacionais. Foi
comprovado também que as TIC permitem um nível de auxílio significativo no ensino da
matemática e que o PC pode ser estimulado ao longo das atividades, tornando-se assim uma
possível abordagem que possa trazer grandes benefícios para o processo de ensino-aprendizagem
na matemática.
Palavras-chaves: Ensino de Matemática. Ensino por Atividades. Recursos Tecnológicos.
Pensamento Computacional.
ABSTRACT
This work deals with the teaching of mathematics through technological resources and
Computational Thinking (PC). We sought to investigate the relationships between the PC, ICT and
the Teaching of Mathematics by Activities, in search of how teachers can order actions and
scenarios for the development of their pedagogical practices, using these principles in order to help
students to develop skills and competences so necessary in the 21st century. The research was
carried out in 2017 in a public school in the municipality of Santarém-Pará, on the premises of the
computer lab, which had fourteen computers. The participating class was the sixth year, with
twenty-two students in the age group of ten to eleven years. This investigation was developed from
a methodological proposal developed in five stages: a) 1st stage - Bibliographic Research; b) 2nd
stage - Development and planning of activities; c) 3rd stage - Application of the workshops; d) 4th
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
80
stage - Final evaluation of the workshops; e) 5th stage - Analysis and discussion of results. The
results obtained converge to the discussion on how to develop activities, involving PC and ICT,
that can be applied in the teaching of mathematics. There was a significant level of motivation in
learning mathematics through computational resources. It has also been proven that ICT allows a
significant level of support in the teaching of mathematics and that the CP can be stimulated
throughout the activities, thus becoming a possible approach that can bring great benefits to the
teaching-learning process in mathematics.
Keywords: Teaching of Mathematics. Teaching by Activities. Technological Resources.
Computational Thinking.
RESUMEN
Este trabajo aborda la enseñanza de las matemáticas a través de recursos tecnológicos y el
pensamiento computacional (PC). Intentamos investigar las relaciones entre la PC, las TIC y la
enseñanza de las matemáticas por actividades, en busca de cómo los maestros pueden ordenar
acciones y escenarios para el desarrollo de sus prácticas pedagógicas, utilizando estos principios
para ayudar a los estudiantes a desarrollarse habilidades y competencias tan necesarias en el siglo
XXI. La investigación se llevó a cabo en 2017 en una escuela pública en el municipio de Santarém-
Pará, en las instalaciones del laboratorio de computación, que tenía catorce computadoras. La clase
participante fue el sexto año, con veintidós estudiantes en el grupo de edad de diez a once años.
Esta investigación se desarrolló a partir de una propuesta metodológica desarrollada en cinco
etapas: a) 1ra etapa - Investigación bibliográfica; b) 2da etapa - Desarrollo y planificación de
actividades; c) 3ra etapa - Aplicación de los talleres; d) 4ta etapa - Evaluación final de los talleres;
e) 5ta etapa - Análisis y discusión de resultados. Los resultados obtenidos convergen a la discusión
sobre cómo desarrollar actividades, que involucren PC y TIC, que puedan aplicarse en la enseñanza
de las matemáticas. Hubo un nivel significativo de motivación en el aprendizaje de las matemáticas
a través de recursos computacionales. También se ha demostrado que las TIC permiten un nivel
significativo de apoyo en la enseñanza de las matemáticas y que el PC puede ser estimulado a lo
largo de las actividades, convirtiéndose así en un posible enfoque que puede aportar grandes
beneficios al proceso de enseñanza-aprendizaje en matemáticas.
Palabras clave: Enseñanza de las Matemáticas. Enseñanza por Actividades. Recursos
Tecnológicos. Pensamiento Computacional.
Introdução
As primeiras décadas do século XXI apresentam uma nova dinâmica social,
marcada pela utilização das novas tecnologias que transformam diariamente o
comportamento das pessoas e sua maneira de ser, tanto a nível local ou regional, quanto a
nível global. As novas tecnologias estão presentes em vários aspectos das nossas vidas,
exigindo assim, uma especial abordagem na educação.
A maneira como deve ocorrer o processo educativo de hoje não deve ser igual
como ocorria no século XX. Houve profundas transformações no âmbito político,
econômico, cultural, tecnológico, dentre outros. Não se pode considerar a escola como algo
isolado da sociedade, sem discutir, refletir e praticar, dentro do ambiente de ensino, as
mudanças que ocorreram ao longo dos anos. Dessa forma, deve haver a preocupação de
como a escola e os professores lidam com os novos desafios desse século. É preciso que se
faça a reflexão de como deve ser a sala de aula, de como a escola deve se preparar para a
utilização dos recursos computacionais e de qual será o papel do professor nesse novo
contexto.
Como exemplo dessas mudanças, pode-se citar a popularização da internet que
atinge hoje, em sua maioria, desde as classes mais privilegiadas aos menos favorecidos. A
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
81
televisão se tornou um aparelho eletrônico cada vez mais presente na vida dos brasileiros e
a telefonia móvel abrange todas as faixas etárias. E o computador? O computador do novo
século possui novo design e é talvez o maior representante das transformações que as
novas tecnologias proporcionaram às pessoas.
Tais discussões embasam este trabalho, pautado em uma experiência realizada, na
cidade de Santarém/PA, no ano de 2017, em que procurou-se investigar, dentre outros
objetivos propostos, as relações entre o Pensamento Computacional (PC), as Tecnologias
da Informação e Comunicação (TIC) e o Ensino de Matemática por Atividades.
A utilização das TIC nos ambientes escolares torna-se cada vez mais essencial, uma
vez que - através de seu uso - há a possibilidade de professores e alunos utilizarem as
mesmas para enriquecer o processo de ensino, visando aprendizagens matemáticas e
mobilizando saberes matemáticos, com base em atividades propostas. Consequentemente,
é de se esperar a elaboração de mecanismos de representações de elementos
computacionais e matemáticos, relevantes para o desenvolvimento cognitivo dos
estudantes. Nesse sentido, a inserção das TIC na educação, pode ser realizada, através de
algo extremamente relevante, com base no Pensamento Computacional, cujos pressupostos
subjazem competências tão necessárias, quanto saber ler e escrever e que, entendemos ser
essencial para o indivíduo desenvolver diversas habilidades.
Com base nestas considerações, e traçando os objetivos apresentados e elencados
nesta proposta, é de nosso interesse investigar as possíveis relações entre o Pensamento
Computacional, as Tecnologias da Informação e Comunicação e o Ensino de Matemática
por Atividades, na busca de, como professores da educação básica podem ordenar ações e
cenários para o desenvolvimento de suas práticas pedagógicas, usando estes princípios de
forma a auxiliar os alunos a desenvolverem habilidades e competências tão necessárias no
século XXI.
A Educação Matemática e as Tecnologias da Informação e Educação
O ensino da matemática no Brasil ainda apresenta grandes desafios que precisam
ser vencidos. A ausência de fundamentos didáticos, a necessidade de se utilizar a
matemática para o exercício da cidadania, conteúdos apresentados sem que o aluno consiga
refletir e entender a forma como poderá utilizar aquele conhecimento na sua vida diária,
são alguns dos problemas que os educadores matemáticos se defrontam. Assim, a escola,
família e governo precisam buscar alternativas de superação, pois “o grande desafio é
desenvolver um programa dinâmico, apresentando a ciência de hoje relacionada a
problemas de hoje e aos interesses dos alunos” (D’AMBROSIO, 1996, pp. 32-33).
Nestes termos, é imprescindível destacar a importância da matemática para a
formação do indivíduo, sobretudo para sua cidadania. Para cumprir esse objetivo
formativo, o ensino da matemática enfrenta diversos desafios e dificuldades. Não basta
apenas atribuir toda a responsabilidade pela melhoria do ensino ao professor, é preciso que
se tenha a preocupação com a boa formação de professores. Essa formação envolve desde
os alunos dos cursos de graduação de matemática até aqueles que já possuem muitos anos
de exercício da docência. Deve ser significativa, de forma que diversas habilidades e
competências possam preparar o educador matemático para que ele seja bem-sucedido ao
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
82
ensinar a matemática e que busque a reflexão da sua própria prática, para que assim possa
sempre ser um educador melhor.
Vale destacar que além do papel e da responsabilidade do professor ser primordial
para se alcançar uma educação de qualidade, a escola em geral, o Estado e a família devem
participar do processo educativo. Além da formação do professor, é importante também a
preocupação sobre como deve ocorrer o processo de ensino-aprendizagem da matemática.
Para tanto, D'Ambrósio (1996, p. 30) tece algumas considerações:
Conhecer, historicamente, pontos altos da matemática de ontem
poderá, na melhor das hipóteses, e de fato faz isso, orientar no
aprendizado e no desenvolvimento da matemática de hoje. Mas o
conhecer as teorias e práticas que ontem foram criadas e que
serviram para resolver os problemas de ontem pouco ajuda nos
problemas de hoje. Por que ensiná-las?
Assim, com base nestas considerações, podemos elencar, entre outros aspectos, as TIC e o
Pensamento Computacional como fortes aliados para que as transformações no ensino da
matemática sejam positivas.
As TIC podem ser instrumentos bastante úteis para se ensinar matemática, por
serem inovadoras, atrativas, lúdicas e interativas, despertando o interesse do aluno e sendo
para o professor uma forma diferente de atuação no processo de construção do
conhecimento. Já o PC pode ser um grande suporte para a Educação Matemática, porque é
uma abordagem que pressupõe o desenvolvimento da cognição, inventividade, da lógica,
dentre outros. Silva (2015, p. 8), adverte que “a utilização das TIC no processo de ensino-
aprendizagem se destacam no tocante a transformação econômica e social que pode
propiciar à educação de um país. É necessário que os governantes invistam, visando
melhorar o acesso da população às TIC”. Assim, a escola pode utilizar as tecnologias na
produção do conhecimento de modo satisfatório e bem-sucedido. Silva (2015), afirma que
a escola é o local mais adequado para o acesso das pessoas às TIC e que para isso são
necessárias, dentre outras coisas, a aquisição de computadores em número suficiente para
atender uma turma, disponibilizar servidor com a responsabilidade de realizar a
manutenção do laboratório, oferecer internet de qualidade e capacitar os professores e
outros profissionais da educação para a utilização das TIC.
A utilização das TIC se apresenta de múltiplas formas e a apropriação delas pelas
escolas ocorre de forma muito irregular. No entanto, elas podem gerar estímulos à
produção dos alunos, pelo fascínio despertado ou pelo potencial que elas realmente têm.
Computador e softwares podem viabilizar a experimentação por alunos e professores, por
meio de uma simulação, uma situação que, sem os recursos computacionais, seria
impossível vivenciar. (KUIN, 2005).
Embora pesquisas mostrem os benefícios do uso das TIC1, bem como a inserção
delas nas instituições de ensino, percebe-se que ainda são necessários muitos esforços,
1 Ver, por exemplos, os trabalhos desenvolvidos por Kuin (2005), Ramos (2014), Costa (2015), Almeida
(2015), Pereira e Siqueira (2016), Bozolan (2016), Araújo Et al. (2017), Stella (2016), Geraldes (2017),
Santos e Mafra (2018).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
83
devido aos obstáculos e dificuldades diversas. Lorenzato (2006, p. 33), destaca o desafio
de se conseguir professores preparados para o uso dos recursos computacionais:
É preciso lembrar que infelizmente o computador não chegou à
grande maioria das escolas brasileiras; e isso é mais sério do que
parece, porque muitas escolas que já se equiparam com
computadores não sabem bem o que fazer com eles. Tudo indica
que comprar o equipamento e conseguir o espaço físico para ele é o
mais fácil: o mais difícil é conseguir software (programa) adequado
e principalmente professor preparado para elaborar, desenvolver e
avaliar um processo de ensinar e aprender diferente dos que
tivemos até hoje.
Silva (2015, p. 24), discorre sobre a necessidade dos profissionais da educação
saberem utilizar as tecnologias: “é de fundamental importância, pois evidenciam diversos
caminhos e possibilidades. O professor precisa conhecer as tecnologias para ter segurança
ao levar essas tecnologias para a sala de aula e assim possibilitar uma aprendizagem
significativa para o aluno”.
Além da discussão de como se desenvolve a apropriação das tecnologias pela
escola e pelos profissionais da educação, é muito importante que se reflita sobre as
influências delas no processo de ensino-aprendizagem. As TIC têm características
relevantes para auxiliar na construção da consciência sobre o processo de aprender e, dessa
forma, há a necessidade que o nosso sistema educacional produza ações que possam ajudar
tanto o aluno na identificação de suas limitações de aprendizagem, quanto preparar os
educadores para saberem fazer a leitura dessas limitações. Assim, esse conhecimento
tornaria menos difícil a vida dos aprendizes, que saberiam escolher estratégias, materiais
de apoio, circunstâncias de aprendizagem condizentes com as suas preferências, tornando a
aprendizagem algo mais efetivo e prazeroso (VALENTE, 2005).
Nesse sentido, a articulação proposta entre a educação matemática e as tecnologias
da informação e comunicação, permitem uma reflexão sobre os atores essenciais na
construção do conhecimento. O caminho mais adequado para auxiliar o aluno nesse
processo, vai depender de vários fatores, muitos dos quais já citados anteriormente.
Videoconferências, câmeras digitais, TV digital, dentre outros mecanismos e
equipamentos, demonstram que as TIC, como recursos educacionais, desenvolveram ao
longo dos anos, muito fortemente, ações de incorporação cultural e social, possibilitando o
indivíduo se expressar cognitivamente, emocionalmente e socialmente. Todas essas
mudanças provocadas pelas tecnologias como, por exemplo, a formação de redes de
pessoas que interagem por meio da internet, exige que seja revisto de forma constante o
papel do aprendiz e do professor ou agente de aprendizagem (VALENTE, 2005).
O Ensino de Matemática por Atividades e as Tecnologias Educacionais
A Informática e a Matemática são duas ciências que parecem estar naturalmente
integradas, pois a Informática depende dos algoritmos e dos programas, sendo esses
alimentados pela linguagem de símbolos e códigos que a Matemática sempre produziu e
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
84
forneceu para a Informática. As perspectivas a essas duas ciências são muitas e estão
relacionados à eliminação de trabalhos árduos e repetitivos, produção de novas
tecnologias, qualificações, anseios e desafios sociais a serem encontrados e solucionados.
Apesar de tão natural associação, percebemos que no âmbito da escola, isso ainda
não se concretizou, devido a existência de alguns fatores pertinentes à utilização da
Informática e do uso de computadores para a aprendizagem da Matemática, tais como: a)
falta de políticas educacionais efetivas e contínuas que possam permitir a implementação e
democratização da informática nas escolas; b) a formação do profissional da educação que
urge por uma reformulação na grade curricular dos seus cursos de graduação, visando
fornecer subsídios ao futuro professor.
Devemos deixar bem claro e divulgar aqui, que os diversos estudos realizados
sobre o assunto da utilização dos computadores e da informática no ensino de Matemática
em todo o país e no mundo, evidenciam uma melhora significativa nos processos de ensino
e aprendizagem mediados por computador, bem como influenciam positivamente na
leitura, escrita, visualização e criação de objetos matemáticos pelos alunos.
Existem dois aspectos de fundamental importância para sabermos identificar os
efeitos que o uso dos computadores possam trazer para o ensino da Matemática: A
influência da tecnologia permitindo trabalhar os conceitos matemáticos de forma otimizada
e diversificada, e, a influência dos conceitos mais gerais de informática, que depende quase
que exclusivamente da linguagem algorítmica. Assim, entendemos que o uso do
computador contribui também para que a aprendizagem matemática se torne uma atividade
experimental mais rica, no sentido de incentivar o melhor desenvolvimento dos processos
cognitivos e das faculdades mentais dos alunos.
Olhando para a Matemática, como uma área de conhecimento e aspectos
característicos de seu ensino, podemos pensar em ações planejadas, com base em diretrizes
voltadas para subsidiar elementos significativos para o trabalho planejado do docente que
ensina matemática. Tais encaminhamentos são muito relevantes em se tratando do
desenvolvimento de competências e habilidades, a partir de situações que tragam
elementos de significados para os alunos, conforme Mendes e Sá (2006) apresentam.
Os modernos recursos tecnológicos disponíveis e acessíveis à educação, como a
computação gráfica, constituem recursos importantes na visualização e na leitura de
informações gráficas para o ensino de Matemática, podendo ser adaptadas e configuradas,
conforme ações pedagógicas de significado. Mendes e Sá (2006), também projetam
cenários de como tais ações, pautadas na técnica da redescoberta, podem ser
potencializadas a partir de diretrizes e elementos de compreensão potencial, configurados,
por exemplo, no auxílio a interpretação, a compreensão e o desenvolvimento de
habilidades e capacidades de expressão gráfica. Nessa perspectiva, é possível realizarmos a
construção de cenários de aprendizagem experimentais, tanto individual como em grupo,
que possam fornecer e despertar iniciativas de aprendizagem, com base no
desenvolvimento de atividades de observação, colaboração e levantamento de informações,
com vistas a inferências e conclusões. Assim, é possível pensarmos na visualização,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
85
experimentação, simulação e demonstração de atividades matemáticas, como fatores
potenciais de favorecimento na formação e o refinamento de hipóteses, em uma
perspectiva de ensino da matemática, de base tecnológica, como uma necessidade de
ensinar os alunos a utilizar os recursos informáticos.
Sabemos que os algoritmos estão cada vez mais desempenhando um papel
importante na sociedade, pois estão inseridos nos processos organizacionais e
administrativos de empresas e comércios, além de aparecerem também integrados em
processos tecnológicos e de automação. Os procedimentos matemáticos surgem assim, em
um domínio bem diversificado, pois os algoritmos exercem uma aplicabilidade crescente e
de grande influência como ferramentas de demonstração em cálculo. Além disso, o
desenvolvimento de softwares educacionais que priorizem o ensino de matemática
centrado na construção do conhecimento, e não na simples instrução é necessário,
possibilitando assim a integração das habilidades matemáticas que se espera obter, com
nossos estudantes, em relação ao domínio de conceitos matemáticos e suas estruturas
operacionais.
Sá (2009), fornece elementos para pensarmos na elaboração de atividades
matemáticas, articuladas com diretrizes tecnológicas e de que forma podem estar
correlacionadas com os ensinamentos matemáticos. Fornece indicadores, a partir da
condução destas atividades e de que maneira possam pressupor a possibilidade de
condução do aprendiz a uma elaboração constante das noções matemáticas inerentes as
estruturas tecnológicas.
Apresenta assim, sugestões de elementos essenciais, no momento da elaboração das
atividades de ensino (SÁ, 2009, p. 18):
As atividades devem apresentar-se de maneira auto-
orientadas para que os alunos consigam conduzir-se durante
a construção de sua aprendizagem;
Toda atividade deve procurar conduzir o aluno à construção
das noções matemáticas através de três fases: a experiência, a
comunicação oral das ideias apreendidas e a representação
simbólica das noções construídas;
As atividades devem prever um momento de socialização das
informações entre alunos, pois isso é fundamental para o
crescimento intelectual do grupo. Para que isso ocorra, o
professor deve criar um ambiente adequado e de respeito
mútuo entre os alunos e adotar a postura de um membro mais
experiente do grupo e que possa colaborar na aprendizagem
deles;
As atividades devem ter características de continuidade, visto
que precisam conduzir o aluno ao nível de representação
abstrata das ideias matemáticas construídas a partir das
experiências concretas vivenciadas por ele;
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
86
De acordo com o modelo proposto por Dockwiller (1996)2,
as atividades propostas pelo professor podem se apresentar
de três maneiras: desenvolvimento, conexão e abstração, de
modo que sejam sequencialmente apresentadas e possam
contribuir para a construção gradual dos conceitos
matemáticos.
A união dessas habilidades sugestivas é muito importante pela característica
integradora que possuem, pois estaremos diante de uma nova perspectiva de cultura
educacional. Essa articulação envolvendo os pressupostos do ensino de matemática por
atividades, poderá proporcionará a transição do trabalho individual, para o trabalho
coletivo de desenvolvimento de conceitos e objetos matemáticos podendo render bons
frutos no futuro3. Além disso, importa para todos nós o ganho conceitual e de compreensão
dos nossos alunos, com base nestas diretrizes e de que forma as mesmas podem ajudar no
aumento da capacidade de cada um tem de estabelecer conexões entre o pensamento
matemático e o pensamento abstrato mais relacionado com a pensamento computacional, o
qual discutiremos na próxima seção.
O Pensamento Computacional e suas possíveis interfaces com o ensino
No século XXI notam-se profundas mudanças na forma como as pessoas vivem e
se relacionam. Dentre essas transformações, pode-se citar o uso maciço das novas
tecnologias em vários setores da sociedade, tais como economia, saúde, lazer, educação,
dentre outros. Nessa nova dinâmica social, surge o Pensamento Computacional (PC). Para
Wing (2006, 2016), o Pensamento Computacional é uma habilidade fundamental para
todas as pessoas, não apenas para os cientistas da computação. É uma habilidade tão
importante quanto a leitura, escrita e aritmética. Wing (2006, p. 33), complementa o
conceito de Pensamento Computacional:
[...] Constrói o poder e os limites dos processos computacionais se
forem executados por humanos ou por máquinas. Métodos e
modelos computacionais nos encorajam a resolver problemas e
desenhar sistemas que nenhum de nós seria capaz de desenvolver
sozinho.
Para França, Silva e Amaral (2012, p. 1), “Pensamento Computacional é saber usar
o computador como um instrumento de aumento do poder cognitivo e operacional humano,
aumentando a nossa produtividade, inventividade, e criatividade”. Os autores informam
que o PC se refere ao uso de conceitos e ferramentas da computação para o
2 Uma versão do texto original de Dockwiller, encontra-se disponível em: https://eric.ed.gov/?id=ED375008
3 Para um aprofundamento sobre a perspectiva do ensino de matemática por atividades e a técnica da
redescoberta ver, por exemplo, os trabalhos de Sá (2019), Salgado e Sá (2016), Sá e Jucá (2014), Sá (1999),
Noronha e Sá (2002) e Mendes (1996).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
87
desenvolvimento de determinadas habilidades no ser humano, tornando este, um indivíduo
que interage e participa da vida em sociedade.
O Pensamento Computacional além de propor uma maior criatividade, uma melhor
cognição e inventividade, pressupõe a utilização de conceitos da ciência da computação. A
habilidade de transformar teorias e hipóteses em modelos e programas computacionais,
além de executá-los, depurá-los, e utilizá-los para redesenhar processos produtivos, realizar
pesquisas científicas ou mesmo aperfeiçoar rotinas pessoais, é uma das mais primordiais
habilidades para os cidadãos do século XXI (BLIKSTEIN, 2008).
Apesar do pioneirismo de Wing, um trabalho desenvolvido por Brackmann (2017),
aponta as contribuições de Seymour Papert4 como uma influência significativa no
desenvolvimento do Pensamento Computacional. O trabalho de Papert sobre o
Construcionismo e a linguagem de programação LOGO foi fundamental para o
desenvolvimento do Pensamento Computacional, uma vez que nele foi apresentado o
computador como instrumento capaz de apoiar a construção do conhecimento.
Furber (2012), preconiza o Pensamento Computacional como o processo de
reconhecimento dos aspectos computacionais no mundo que nos cerca, além da aplicação
de ferramentas e técnicas da Ciência da Computação para compreender e raciocinar sobre
os sistemas e processos naturais e artificiais. Assim, o Pensamento Computacional não
deve ter necessariamente como resultado final a produção de software e hardware e
reconhece que os conceitos fundamentais da Computação estarão presentes para resolver
problemas em vários contextos do cotidiano (BARCELOS E SILVEIRA, 2012)5.
Segundo Barr e Stephenson (2011), compõe a parte central do Pensamento
Computacional, a percepção da existência de nove conceitos que são: Coleta de dados;
Análise de dados; Representação de dados; Decomposição de problemas; Abstração;
Algoritmos e Procedimentos; Automação; Paralelização e Simulação. Os mesmos autores
também pontuam o que significa cada um desses nove conceitos: Coleta de dados:
pressupõe um processo de coleta de dados ou informações sobre determinado problema de
forma adequada; Análise de dados: é um processo onde se atribui significação aos dados,
obtêm-se padrões, além de se tirar conclusões; Representação de dados: se representa e se
organiza dados, através de gráficos, tabelas, imagens, textos ou figuras; Decomposição de
problemas: processo no qual se decompõe certo problema complexo em tarefas menores e
mais facilmente gerenciáveis; Abstração: processo necessário para reduzir a complexidade
do problema e para definir ideias principais; Algoritmos e Procedimentos: sequência de
passos necessários para resolução de um problema ou para se atingir determinado objetivo;
Automação: processo que indica a utilização de computadores ou máquinas para realizar
tarefas repetitivas; Paralelização: refere-se à organização de recursos para realizar tarefas,
simultaneamente, para alcançar um objetivo; Simulação: representação ou modelo de um
processo. A simulação também envolve experimentos sendo executados usando modelos6.
4 Ver, por exemplo, Nunes e Santos (2013) e Papert (2008, 1986).
5 Para uma discussão aprofundada sobre o PC ver os anais do Workshop on The Scope and Nature of
Computational Thinking, publicado pelo National Research Council (2011, 2010).
6 Para outras classificações alternativas de procedimentos e natureza operacional envolvendo o PC, consultar
os trabalhos de Brennan e Resnick (2012) e Phillips (2009).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
88
Assim o Pensamento Computacional é uma forma de pensar qualitativamente,
distinto da fluência e emergente em uma ampla gama de disciplinas. A natureza ubíqua7
das ferramentas computacionais influencia todos os aspectos da vida moderna e exige que
as pessoas adotem novos modos de pensar para usar essas ferramentas de forma
eficaz. Esses modos de pensar estão emergindo não apenas na ciência da computação, mas
em diversas áreas do conhecimento.
Farias, Andrade e Alencar (2015) nos informam que a comunidade acadêmica
aponta cada vez mais para a supra importância da ampliação do ensino de conceitos
relacionados à ciência da computação, contemplando alunos desde a tenra idade, passando
a ser, dessa forma, uma ciência basilar para a formação de habilidades primárias para o
bom desempenho de qualquer profissão. No entanto, incorporar o PC na educação básica
exige uma abordagem prática, fundamentada em uma definição operacional. Isso
pressupõe que sejam debatidos e refletidos um conjunto de perguntas focadas
especificamente na implementação do PC na educação básica: O que seria o Pensamento
Computacional na sala de aula? Quais são as habilidades que os alunos demonstrariam? O
que um professor precisaria para pôr em prática o Pensamento Computacional? O que os
professores já estão fazendo que possam ser modificados e estendidos? (BARR E
STEPHENSON, 2011).
Em muitas das escolas brasileiras, sobretudo as públicas, é muito comum a
realização do “adestramento digital8”, onde a tecnologia é utilizada apenas pra recombinar
informações e não para produzir conhecimento. Com essa prática ineficiente foram gastos
milhões de reais. Todavia, um problema mais alarmante é que se ensina aos alunos que a
tecnologia serve para muitas coisas, mas não se discute e nem é mostrado como criar
conhecimento novo9. E diante de toda a complexidade atual, envolvendo a sociedade,
ciência e a indústria, quem não souber viver em simbiose cognitiva com as máquinas (e
suas redes) não terá muita chance de sobreviver (BLIKSTEIN, 2008).
Além disso, não se deve esperar até que os alunos estejam na faculdade para
apresentar os conceitos que envolvem o “pensar computacional”. Todos os alunos de hoje
continuarão a viver uma vida fortemente influenciada pela computação, e muitos irão
trabalhar em profissões que envolvam ou são influenciados pela computação. Dessa forma,
os alunos devem começar a trabalhar com resolução de problemas algorítmicos, métodos e
ferramentas computacionais já na educação básica (BARR E STEPHENSON, 2011).
No Brasil ainda há muito o que ser feito pois, em nosso pais, as políticas
educacionais relacionadas à tecnologia estão restritas à abordagem de letramento e
inclusão digital. Nenhum documento oficial menciona a introdução do ensino de
fundamentos de computação na Educação Básica, entretanto há muitas motivações para
7 Refere-se a computação ubíqua que, segundo Loureiro et al. (2009, p. 100), “é caracterizada pela presença
de dispositivos portáteis, cada vez mais comuns devido aos avanços na fabricação de componentes
eletrônicos. Esses dispositivos possuem uma considerável capacidade de processamento, com recursos para
comunicação sem fio e armazenamento de dados”.
8 Para Blikstein (2008), o adestramento digital configura uma forma de uso dos recursos computacionais sem
considerar o potencial dessas ferramentas para estimular a cognição, criatividade e inventividade.
9 Ver, por exemplo, os dados apresentados no trabalho desenvolvido por Rodrigues Et al. (2015).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
89
que isso ocorra. Diversas pesquisas e projetos, envolvendo o ensino de computação na
educação básica, são realizados no Brasil há bastante tempo, todavia, apesar de serem
bastante diversificadas, em se tratando de tempos atuais, carecem de maior legitimidade,
especialmente pelos formuladores de políticas educacionais10.
Descrição do Ambiente da Pesquisa
A pesquisa foi realizada entre os dias 26 de maio a 11 de agosto de 2017 e ocorreu
no município de Santarém, estado do Pará. A investigação foi desenvolvida, a partir de
uma proposta metodológica desenvolvida nas seguintes etapas: a) 1ª etapa - Pesquisa
Bibliográfica (onde foi feito o levantamento, a seleção, o fichamento e o arquivamento de
informações relacionadas à pesquisa) e revisão crítica da literatura sobre o tema (baseada
em critérios metodológicos, a fim de separar os textos que têm validade daqueles que não
têm); b) 2ª etapa – Desenvolvimento e planejamento de uma oficina (sequência de
atividades), a partir de conteúdos matemáticos (frações, aritmética, lógica, dentre outros),
utilizando, como suporte, o programa OpenOffice Calc11. A opção pela utilização do
software deu-se por conta de suas características como usabilidade12 e interoperabilidade13
e por serem recursos bastante significativos para o processo educativo, tendo em vista seu
potencial de abstração e multiplicidade de possibilidades de atividades matemáticas; c) 3ª
etapa - Aplicação das oficinas com a turma do sexto ano, em três momentos, em que, ao
final de cada momento, foi utilizado o Relatório-Avaliação proposto por D’Ambrósio
(1996). Foi recomendado que os alunos incluíssem no documento, as suas impressões, o
que fizeram durante as atividades, o que acharam importante, o que gostaram e o que não
gostaram; d) 4ª etapa - Avaliação final dos alunos e pelo professor, sobre as oficinas,
através da aplicação de questionários e entrevistas, durante o desenvolvimento das
atividades, conforme Gil (2002); e) 5ª etapa - Análise e discussão dos resultados, a partir
da correlação entre os dados obtidos, o referencial teórico utilizado neste estudo e os
procedimentos metodológicos empregados.
Para auxiliar no desenvolvimento das atividades, foi elaborado um Tutorial
Interativo Calc14, na qual apresenta informações básicas para utilização do programa. O
tutorial foi elaborado com o objetivo de ser um material de apoio nas oficinas, onde os
alunos pudessem utilizar, permitindo assim, um auxilio no desenvolvimento das atividades.
10 Uma iniciativa tardia, se comparada a outros países, é fornecida pela Base Nacional Curricular Comum -
BNCC (BRASIL, 2017), apesar do termo aparecer apenas de forma discreta e relacionado a conteúdos de
matemática, pode-se considerar um passo importante sobre a discussão da inserção do Pensamento
Computacional no currículo escolar das nossas crianças e jovens.
11 É uma planilha eletrônica, de uso livre, e que permite ao usuário trabalhar diversos conteúdos matemáticos
como equações, funções, aritmética álgebra, dentre outros. Disponível em: <https://openoffice.org>. Acesso
em: 05 mar. 2017. 12 Para Pressman (2011) e Donahue, Weinschenk e Nowicki (1999) a usabilidade é uma medida utilizada
para verificar o quanto um sistema computacional pode facilitar o aprendizado; auxilia os aprendizes a
lembrar do que aprenderam; a probabilidade de erros é reduzida, dentre outras características.
13 Pressman (2011) entende interoperabilidade como a capacidade de um sistema computacional se integrar a
outro.
14 O referido tutorial está disponível para download em: < https://goo.gl/7PXbPs>.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
90
Durante as oficinas e entrevistas foram feitas gravações de áudio com a finalidade
de registrar o que ocorreu em cada uma delas. As fotografias mostram os alunos
desenvolvendo as tarefas e o ambiente onde foi realizada a pesquisa. Os vídeos mostram os
alunos desenvolvendo as atividades com os programas. Todos os registros foram realizados
com as devidas permissões necessárias dos participantes e pais responsáveis dos
participantes da pesquisa, através da assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE).
Descrevendo as atividades desenvolvidas
Apresentam-se, a seguir, as descrições das atividades realizadas e as considerações
presentes nos Relatórios-Avaliação redigidos pelos alunos nas oficinas. Para não divulgar
os nomes dos alunos que fizeram parte da investigação, utilizou o código formado pela
palavra participante mais um número corresponde ao aluno, por exemplo, Participante 00.
Foram realizados 3 encontros, onde cada um correspondeu a uma atividade, envolvendo
duas aulas de quarenta minutos. Esses encontros ocorreram no horário das aulas de
matemáticas, às segundas-feiras, quintas-feiras e sextas-feiras no laboratório de
informática da escola.
Na Atividade 1, primeiramente, houve a apresentação dos alunos, do professor e do
pesquisador. Foram informados aos alunos os objetivos da pesquisa, das atividades e como
estas iriam ocorrer. Em seguida, foi entregue aos alunos o Relatório-Avaliação. Foi
informado da finalidade desse instrumento e como os alunos deveriam preenchê-lo,
fazendo suas considerações sobre o que eles aprenderam e o que foi desenvolvido nas
oficinas. Na Figura 1, mostra-se o momento onde os alunos tem o primeiro contato com a
ferramenta Calc.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
91
Figura 1 - Primeiro contato dos alunos com o Calc.
Fonte: O Autor (2018).
O objetivo desta atividade foi o de desenvolver atividades, com auxílio do Calc,
relacionado com conteúdos matemáticos sobre aritmética e conhecer conceitos básicos e
relacionados ao PC. Os encaminhamentos referentes ao trabalho informatizado foi
realizado após a apresentação desses conceitos, de forma a conduzir as atividades no
laboratório, de forma a possibilitar uma interação entre os procedimentos metodológicos
utilizados, os conteúdos desenvolvidos e a concretização das habilidades e características
envolvidas, na proposta.
Os discentes conseguiram utilizar o Calc, apesar de ser algo totalmente novo para
eles. Para isso, o Tutorial Interativo Calc foi um material de grande ajuda, uma vez que
através deste puderam saber as principais funcionalidades desse recurso. Nessa atividade
percebeu-se o quanto os alunos conseguem manusear o computador. Observou-se ainda o
entusiasmo dos alunos ao chegar ao laboratório e ter o contato com o computador. Alguns
tentaram acessar a internet ou jogar, mas através de uma conversa, eles se concentraram na
oficina.
Na Atividade 1 houve as seguintes anotações no Relatório-Avaliação15:
i) Eu aprendi muita coisa, aprendi a somar, dividir,
diminuir, etc. Muitas coisas que eu não sabia, aprendi [...] Quando
entrei nem sabia o que fazer, mas prestei atenção na explicação e
comecei a aprender. (Participante 08);
ii) Aprendi as barras de fórmulas, de ferramentas, a coluna,
a linha. Também o que é pensamento computacional e TICS. A aula
está interessante e legal. Aprendi a usar as colunas do open office
fazendo planilha. (Participante 09);
15 Em nossa concepção, o relatório-avaliação se mostrou um potente instrumento de recolha de informações e
registros proporcionados pelos alunos. Devido a limitação do número de páginas para este artigo, elencamos
aqui apenas alguns fragmentos, dentre a quantidade de depoimentos recolhidos com os participantes da
pesquisa.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
92
iii) Nesse primeiro dia a gente aprendeu a usar a planilha. E
fizemos os nomes das matérias e colocamos nossas notas aleatórias
de 0 a 10. (Participante 10).
De acordo com esses registros, constatou-se que os discentes gostaram de
desenvolver as atividades iniciais, sobretudo, de poderem utilizar e manipular os recursos
computacionais do laboratório de informática de forma a poderem abstrair conhecimentos
e habilidades iniciais sobre o reconhecimentos dos números e suas operações.
Na Atividade 2, o objetivo da oficina foi utilizar o programa Calc como auxílio no
processo de aprendizagem do conteúdo matemático sobre aritmética. Os conceitos
desenvolvidos foram os relacionados à aritmética. Primeiramente a cada aluno foi entregue
o Relatório-Avaliação e, para a execução dessa oficina, levou-se em consideração os
registros feitos pelos discentes no relatório referente ao encontro anterior.
O professor de matemática explicou sobre aritmética para os alunos. Em seguida,
passou-se para a apresentação do tutorial. No Tutorial Interativo Calc há uma parte
denominada “Criando uma Folha de Cálculo”, onde é apresentada uma sequência de
quatorze passos necessários para se criar uma planilha. A partir desses encaminhamentos,
foi proposto a criação de uma planilha que simula a elaboração de um boletim, onde são
inseridos dados como bimestre (primeiro, segundo, terceiro e quarto), disciplina
(português, matemática, história e geografia) e as notas.
Estas etapas foram elaboradas livremente pelos alunos, com a devida orientação do
professor e dos pesquisadores, conforme mostra a Figura 2. Depois, os alunos foram
desafiados a criar a média final de cada uma das disciplinas e de acordo com esse cálculo,
informar se o aluno foi aprovado ou reprovado.
Figura 2 - Alunos criando um modelo de boletim, no Calc.
Fonte: O Autor (2018).
Nesse encontro, buscou-se desenvolver atividades sobre conteúdos matemáticos
relacionados com a aritmética. Percebeu-se que os alunos conseguiram ter um bom
desempenho, tanto no manuseio da ferramenta, quanto na assimilação dos conteúdos,
conforme depoimentos a seguir:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
93
i) Aprendi principalmente mexer em computador.
Executamos o comando ((B4+C4+D4+E4)/4). (Participante 03);
ii) Aprendi que Open Office pode ser instalado em vários
computadores. O open office contem barra de títulos, barra de
menus, barra de ferramentas, barra de fórmulas, coluna, linha,
caixa de nome. Fizemos a planilha Boletim e aprendemos a fórmula
((B4+C4+D4+E4)/4). (Participante 06);
iii) A gente aprendeu a mexer no open office calc. Os
professores são muito legais. Aprendemos muitas coisas legais.
Aprendemos a fazer coisas divertidas e bacanas. Aprendemos a
fazer fórmulas. A aula é top. Aprendemos muitas coisas.
(Participante 2).
Constatou-se através dessas informações que os alunos conseguiram entender como
funciona o programa, suas funcionalidades e aprenderam a criar fórmulas matemáticas para
resolver operações como adição e divisão. Foi percebido também que dado o problema (a
criação do boletim), os alunos precisaram refletir como iriam resolvê-lo.
Para o desenvolvimento e planejamento da Atividade 3, foi trabalhado os conceitos
desenvolvidos e relacionados à aritmética (adição, subtração, multiplicação e divisão). Já
em relação às competências ou habilidades requeridas, mencionam-se as capacidades de
manuseio do programa Calc e conhecimentos básicos sobre adição, divisão, subtração e
multiplicação. Os alunos foram convidados a resolver situações problemas, envolvendo
cinco questões sobre aritmética, objetivando o trabalho tanto na planilha eletrônica quanto
no próprio papel, conforme mostrado na Figura 3. Alguns deles optaram por fazer a tarefa
em duplas ou em trios.
Figura 3 - Alunos resolvendo situações problemas da Atividade 3.
Fonte: O Autor (2018).
Na Atividade 3, algumas das considerações foram:
i) Eu fiz um exercício na folha de papel e depois passei para
o computador. (Participante 09);
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
94
ii) Aprendi a mexer mais na planilha. Eu fiz um exercício e
também mexi no computador. Foi bem legal isso e tenho certeza que
vou aprender mais com esses maravilhosos professores. Eu também
aprendi a fazer cálculos, fórmulas e aprendi a editar. (Participante
12);
iii) Na aula aprendi muita coisa. Aprendi a fazer contas, etc.
Gosto muito de fazer informática e matemática. Tenho dificuldades,
mas consigo fazer. (Participante 16).
Através dessas observações, percebeu-se que os alunos aprenderam a utilizá-la e
também tiveram a oportunidade de aprender conteúdos matemáticos através de um recurso
computacional. Essa experiência foi significativa porque mostrou aos alunos e ao professor
da disciplina que há outras formas inovadoras e atrativas de ensinar e aprender matemática.
Habilidades como abstração e representação de dados, dentre outras, foram exercitadas
nessa oficina. A abstração foi necessária para entender as questões do exercício e se
verificar quais os pontos chaves delas para depois resolvê-las. Já a representação de dados
foi abstraída na resolução do exercício através do computador, no qual as planilhas foram
alimentadas com as informações das questões. Após essa fase, os alunos podiam verificar
como os dados estavam organizados e em seguida resolver as questões.
Avaliando resultados e projetando perspectivas de articulação
Em nossa investigação, percebemos que a maioria dos alunos conseguiu, de certa
forma, aprender a manusear o programa Calc, além de aprenderem os conteúdos, conforme
os depoimentos: i) A mudança foi que a gente aprendeu matemática no computador.
(Participante 18); ii) Melhorou o ensinamento e nosso conhecimento. (Participante 10).
Nas informações registradas, os discentes perceberam mudanças na forma como
aprendem matemática e, principalmente, destacaram que essas transformações foram
positivas, conforme extratos de falas a seguir: i) Fui aprendendo sozinha, prestando
atenção na aula e na explicação. (Participante 07); ii) Fiz com o professor explicando e
ajudando. (Participante 10); iii) Minha amiga ajudava [...] Aparecia na projeção e a
gente fazia. (Participante 14).
A forma como cada um desenvolveu as tarefas solicitadas em cada oficina foram as
mais variadas possíveis, de acordo com os registros colhidos na entrevista. Isso mostra que
diferentes indivíduos, através do uso do computador, são capazes de adquirir e produzir
conhecimento, mas necessitam da ajuda de outros indivíduos mais capazes. Tais
considerações coincidem com o que Mendes e Sá (2006) fornecem ao propor situações e
cenários com base no ensino por atividades, de forma que possa contemplar aspectos
experimentais, análise e uma perspectiva de um trabalho colaborativo ou de socialização
entre os alunos (SÁ, 2009).
Em relação ao PC, as oficinas ministradas apresentaram elementos relacionais com
o que Brackmamm (2017) aponta, em relação as habilidades susceptíveis de ativação: a
decomposição, o reconhecimento de padrões estruturais, o desenvolvimento da abstração e
a capacidade de resolução de problemas, conforme a organização de etapas algorítmicas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
95
Certamente a capacidade de organização e representação de dados foram habilidades que
puderam ser desenvolvidas através do Calc. Isso ocorreu na elaboração do Boletim onde os
alunos puderam inserir disciplinas e notas, além da média. Esses dados organizados numa
planilha, possibilitaram mais facilmente gerar informações que serão utilizadas, por
exemplo, para o aluno verificar qual disciplina tem melhor desempenho, qual tem pior
desempenho.
Os resultados encontrados, também encontram ressonância, com as discussões
propostas por Barr e Stephenson (2011) e Sá (2009), vistas anteriormente, como a
decomposição, simulação, reconhecimento de padrões, representação de dados, abstração e
algoritmos, como elementos potenciais desenvolvidos, durante as atividades. Os
algoritmos, sequência de passos para criação ou resolução de problemas, pode ser
observado no desenvolvimento das ações e quando da elaboração das etapas de formulação
das atividades solicitadas. Foram utilizados diversos comandos de várias categorias como
aparência, movimento, controle, dentre outros, que possibilitaram a criação de um caminho
ou sintaxe, necessária para a ordenação de uma sequência lógica.
Durante a realização da pesquisa foi verificado que as atividades, acima de tudo,
foram atrativas e interativas para os alunos. Foram atrativas devido o ambiente de ensino
ser um laboratório de informática e não mais uma sala de aula tradicional. Foi interativa
porque ao manipular os recursos computacionais, puderam experimentar os programas e
aprender matemática através de uma forma diferente, isto é, por meio das TIC e com base
em uma perspectiva do ensino por atividades. Quanto ao uso da TIC no ensino da
matemática, isto se mostrou uma poderosa forma de ensinar, devido ser atrativa e interativa
para os alunos, além de possibilitar a visualização dos conteúdos de uma maneira dinâmica
e mais significativa.
Vale lembrar que o próprio professor de matemática pode comandar sozinho (sem
ajuda de um facilitador) esse conjunto de atividades, desde que o mesmo possua
conhecimento para tal. Outros fatores importantes que devem ser destacados são: as
necessidades dos alunos, como dificuldades de aprendizado em relação aos conteúdos da
matemática e também ao manuseio dos recursos computacionais. Em relação as
contribuições ao campo de pesquisa em educação matemática, o desenvolvimento desta
proposta visa a discussão de como o PC e as TIC podem auxiliar no processo de ensino e
aprendizagem da matemática, a medida em que a proposição de situações e problemas são
difundidos em ambientes de aprendizagem.
Assim, as ações serviram para apresentar uma perspectiva de trabalho com base no
ensino por atividades e relacionados com o ensino de conteúdos matemáticos. Além disso,
esta iniciativa metodológica, permitiu o desenvolvimento de habilidades relacionadas ao
PC, de forma a contribuir na preparação dos alunos para a vida numa sociedade cada vez
mais marcada pela utilização das tecnologias. Por fim, concluímos que as Tecnologias da
Informação e Comunicação e os pressupostos relacionados ao Pensamento Computacional
podem ser grandes aliados nas aprendizagens dos alunos, relacionados a Matemática, ao
articular as possibilidades de incrementos de conhecimento à perspectiva do Ensino por
Atividades, visando ambientes e cenários educacionais mais atuais e compatíveis com as
demandas e necessidades eminentes de nossa sociedade.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
96
Referências
ALMEIDA, Carlos Manuel dos Santos. A importância da aprendizagem da robótica no
desenvolvimento do Pensamento Computacional: um estudo com alunos do 4º ano.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Lisboa, Lisboa, 2015.
ARAÚJO, Carlos Alberto; SANTOS, Juliana da Ponte; MEIRELES, Juliane Conceição de.
Uma proposta de investigação tecnológica na Educação Básica: aliando o ensino de
Matemática e a Robótica Educacional. Revista Exitus, v. 7, n. 2, 2017. Disponível em:
http://www.ufopa.edu.br/portaldeperiodicos/index.php/revistaexitus/article/view/304
Acesso em 12 de mar. 2019.
BARCELOS, Thiago Schumacher; SILVEIRA, Ismar Frango. Pensamento Computacional
e educação matemática: Relações para o ensino de computação na educação básica. In: XX
Workshop sobre Educação em Computação, Curitiba/Paraná. Anais do XXXII
CSBC. 2012. p. 23.
BARR, Valerie; STEPHENSON, Chris. Bringing computational thinking to K-12: what is
Involved and what is the role of the computer science education community? Acm
Inroads, v. 2, n. 1, p. 48-54, 2011.
BRACKMANN, Chistian Puhlmann. Desenvolvimento do Pensamento Computacional
Através de Atividades Desplugadas na Educação Básica. Tese (Doutorado em
Informática na Educação) - Programa de Pós-Graduação em Informática na Educação,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Proposta
preliminar. Terceira versão. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: <http://
basenacionalcomum.mec.gov.br/images/BNCC_publicacao.pdf>. Acesso em: 25 jul. 2017.
BRENNAN, Karen; RESNICK, Mitchel. New frameworks for studying and assessing the
development of computational thinking. In: Proceedings of the 2012 annual meeting of
the American Educational Research Association, Vancouver, Canada. 2012. p. 1-25.
BLIKSTEIN, Paulo. O Pensamento Computacional e a reinvenção do computador na
educação. 2008. Disponível em <http://www.blikstein.com/paulo/documents/online/Ol_
pensamento_Computacional.hml>. Acesso em: 05 set. 2017.
BOZOLAN, Sandra Muniz. O pensamento computacional: ensino e aprendizagem
através do software processing. 2016. Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. Programa de Estudos Pós-Graduados em Tecnologia da Inteligência
e Design Digital, São Paulo, 2016.
COSTA, Brunno Vilas Boa. Pensamento computacional na Educação de Jovens e
Adultos: um estudo de caso utilizando dispositivos móveis. Monografia (Graduação).
Universidade de Brasília, Brasília. Licenciatura em Ciência da Computação, 2015.
DONAHUE, George; WEINSCHENK, Susan; NOWICKI, Julie. Usability is good
business. Compuware Corp., julio, 1999.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
97
D'AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus
Editora, 1996.
FARIAS, Adelito; ANDRADE, Wilkerson; ALENCAR, Rayana. Pensamento
computacional em sala de aula: Desafios, possibilidades e a formação docente. In: Anais
dos Workshops do Congresso Brasileiro de Informática na Educação. 2015. p. 1226.
FIORENTINI, Dario; LORENZATO, Sergio. Investigação em educação matemática:
percursos teóricos e metodológicos. Campinas, SP: Autores Associados, 2006.
FRANÇA, Rozelma Soares; SILVA, Waldir Cosmo; AMARAL, Haroldo José Costa.
Ensino de Ciência da Computação na Educação Básica: Experiências, Desafios e
Possibilidades. In: XX Workshop sobre Educação em Computação, Curitiba. Anais do
XXXII CSBC, 2012.
GERALDES, Wendell Bento. O Pensamento Computacional no ensino profissional e
tecnológico. 2017. Dissertação (Mestrado). Universidade Católica de Brasília. Pós-
Graduação Stricto Sensu em Gestão do Conhecimento e Tecnologia da Informação,
Brasília, 2017.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, v. 5, p. 61,
2002.
KUIN, Silene. Condições favoráveis para a apropriação de tecnologias de informação
e comunicação na escola. Dissertação (Mestrado em Educação). Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, São Paulo. 2005.
LOUREIRO, Antonio Alfredo Ferreira; OLIVEIRA , Ricardo Augusto Rabelo; SILVA,
Thais Regina de Moura Braga; PIRES JÚNIOR, Waldir Ribeiro; OLIVEIRA, Lillian
Brandão Rezende de; MOREIRA, Rande Arievilo; SIQUEIRA, Rafael Guimarães;
ROCHA, Bruno Pontes Soares; RUIZ, Linnyer Beatrys. Computação ubíqua ciente de
contexto: Desafios e tendências. 27º Simpósio Brasileiro de Redes de Computadores e
Sistemas Distribuídos. 2009. pp. 99-149.
LORENZATO, Sérgio. Laboratório de ensino de matemática e materiais didáticos
manipulativos. O Laboratório de Ensino de Matemática na Formação de Professores.
Campinas, SP: Autores Associados, 2006.
NATIONAL RESEARCH COUNCIL (NRC). Report of a workshop on the scope and
nature of computational thinking. National Academies Press, 2010.
NATIONAL RESEARCH COUNCIL (NRC). Report of a workshop on the pedagogical
aspects of computational thinking. National Academies Press, 2011.
NUNES, Sergio da Costa; SANTOS, Renato Pires dos. O Construcionismo de Papert na
criação de um objeto de aprendizagem e sua avaliação segundo a taxionomia Bloom. In:
Encontro Nacional de Pesquisa em Educação de Ciências, 9, 2013, Águas de Lindóia, SP.
Anais... Belo Horizonte, MG: ABRAPEC – Associação Brasileira de Pesquisa em
Educação em Ciências, 2013.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
98
MENDES, Iran Abreu; SÁ, Pedro Franco de. Matemática por atividades: sugestões para
a sala de aula. Natal: Flecha do Tempo, 2006.
MENDES, Iran Abreu. O ensino de matemática por atividades: o quê, porquê e para quê
aprender. Natal/RN: impresso, 1996.
NORONHA, Claudianny Amorim; SÁ Pedro Franco de. A calculadora em sala de aula:
Porque. In: CUNHA, Emmanuel R.; SÁ, Pedro F. (Orgs.). Ensino e formação docente:
propostas, reflexões e práticas. Belém: [s.e.], 2002.
PAPERT, Seymour. A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática.
Tradução de Sandra Costa. Porto Alegre: Artes Médicas, 2008.
PAPERT, Seymour. LOGO: Computadores e Educação. São Paulo: Brasiliense, 1986.
PEREIRA, Lívia Costa; SIQUEIRA, Sean Wolfgand Matsui. Programe-se: O
Pensamento Computacional na Educação Básica. 2016. Disponível em:<
http://www.ituiutaba.uemg.br/
seminario/siteoriginal/index2.html>. Acesso em: 15 ago. 2017.
PHILLIPS, Pat. Computational thinking: A problem-solving tool for every
classroom. Communications of the CSTA, v. 3, n. 6, p. 12-16, 2009.
PRESSMAN, Roger. Engenharia de software: uma abordagem profissional. 7ª
Edição. Ed: McGraw Hill, 2011.
RAMOS, Henrique de Almeida. Pensamento computacional na educação básica: uma
proposta de aplicação pedagógica para alunos do quinto ano do ensino fundamental
do Distrito Federal. 2014. Monografia (Graduação). Universidade de Brasília.
Licenciatura em Ciência da Computação, Brasília, 2014.
RODRIGUES, Rivanilson da Silva; ANDRADE, Wilkerson de Lucena; GUERRERO,
Dalton Dario Serey; CAMPOS, Livia Maria Rodrigues Sampaio. Análise dos efeitos do
Pensamento Computacional nas habilidades de estudantes no ensino básico: um estudo sob
a perspectiva da programação de computadores. In: Brazilian Symposium on Computers
in Education (Simpósio Brasileiro de Informática na Educação-SBIE). 2015. pp. 121-
130.
SÁ, Pedro Franco de; JUCÁ, Rosineide de Sousa. Matemática por atividades:
experiências didáticas bem-sucedidas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
SÁ, Pedro Franco de. Possibilidades do Ensino de Matemática por Atividades. Belém:
SINEPEM, 2019. (Coleção I)
SÁ, Pedro Franco de. Atividades para o ensino de Matemática no nível fundamental.
Belém: EDUEPA, 2009.
SÁ, Pedro Franco de. Ensinando matemática através da redescoberta. In: Traços. V. 2,
n. 3. Ago. 1999. Belém.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.79-99 ISSN: 2675-1909
99
SALGADO, Rosangela Cruz da Silva; SÀ, Pedro Franco de. O uso didático da calculadora
no ensino das regras operacionais para a multiplicação de números inteiros. In: CUNHA,
Emmanuel Ribeiro Et al. (Orgs.) Formação de Professor: teorias e práticas cotidiandas.
Belém: EDUEPA, 2016.
SANTOS Gilson Pedroso dos; MAFRA José Ricardo. Educação e tecnologia no interior da
Amazônia: o pensamento computacional e as tecnologias da informação e comunicação
como auxílio em processos de ensino-aprendizagem. Anais... Congresso Brasileiro de
Informática na Educação - CBIE 2018.
SILVA, Michele Cristina. As tecnologias da informação e comunicação como
ferramentas motivadoras para o ensino - aprendizagem de matemática. Dissertação
(Mestrado). Universidade Federal de Goiás, Mestrado Profissional em Matemática em
Rede Nacional - PROFMAT, Catalão, 2015.
STELLA, Ana Lucia. Utilizando o Pensamento Computacional e a computação
criativa no ensino da linguagem de programação Scratch para alunos do ensino
fundamental. Dissertação (Mestrado). Universidade Estadual de Campinas, Pós-
graduação em Tecnologia, Limeira, 2016.
VALENTE, José Armando. A espiral da espiral de aprendizagem: o processo de
compreensão do papel das tecnologias de informação e comunicação na educação. 238
p. Tese (Livre-docência) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes,
Campinas/SP, 2005.
WING, Jeanette Marie. PENSAMENTO COMPUTACIONAL – Um conjunto de atitudes
e habilidades que todos, não só cientistas da computação, ficaram ansiosos para aprender e
usar. Revista Brasileira de Ensino de Ciência e Tecnologia, v. 9, n. 2, 2016.
WING, Jeanette Marie. Computacional Thinking. Communications of the ACM, v. 39, n.
3, 2006.
Gilson Pedroso dos Santos
Universidade Federal do Oeste do Pará
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6186-7060
José Ricardo e Souza Mafra
Universidade Federal do Oeste do Pará
E-mail: [email protected] ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3629-8959
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 14 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p100-121.id288 Aprovado em: 21 de novembro de 2020
Um estudo acerca da potencialidade significativa de um material de
ensino sobre circunferência e círculo
A study about the meaningful potentiality of a teaching material on
circumference and circle
Maria Aparecida da Silva Rufino
Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Mata Norte – Brasil; Secretaria Estadual de
Educação–PE – Brasil
José Roberto da Silva
Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Mata Norte – Brasil
RESUMO
Apesar das reformulações por que passou o ensino de matemática, ainda há diversas barreiras a
serem superadas, a exemplo do que ocorre na difusão das ideias de circunferência e de círculo,
explorando-se excessivamente o manuseio mecânico das fórmulas, sem considerar o raciocínio
matemático que lhes dão sustentação. Dessa forma, investe-se na aplicação de um material de
ensino, sobre a forma de oficina, na qual se reconstrói algumas ideias da base histórica desses
objetos e seus cálculos, estimulando os processos cognitivos ausubelianos da diferenciação
progressiva e da reconciliação integradora. A fim de caracterizar a potencialidade significativa
desse material, a oficina foi aplicada em uma turma de 42 alunos do 9º ano do EF, de uma escola
do município de Lagoa de Itaenga – PE/Br. Trata-se de um estudo de caso educativo, cujas
respostas a um questionário diagnóstico, reaplicado como questionário avaliativo, dão conta de que
parte dos alunos evoluíram conceitualmente sobre as ideias de círculo e de circunferência e sobre o
processo de aquisição e aplicação das fórmulas do comprimento da circunferência e da área do
círculo. Isso foi possível a partir da aplicação da oficina quando vivenciaram algumas tentativas
históricas para a obtenção desses modelos, como o uso do método da exaustão arquimediano.
Mediante estes dados caracteriza-se o material como potencialmente significativo.
Palavras-chave: Aprendizagem Significativa. História da Matemática. Circunferência e Círculo.
ABSTRACT
Despite the reformulations that the teaching of mathematics went through, there are still difficulties
to be overcome, such as the teaching of concepts of circle and circumference. Teachers explore
mechanically formulas without meaning or supported by mathematical reasoning. To this study, we
developed teaching materials in which some historical ideas of circle, circumference, and calculus
(such as Archimedes’ exhaustion method) were discussed in a workshop in order to stimulate the
Ausubelian cognitive processes of progressive differentiation and integrative reconciliation. To
characterize the meaningful potentiality of these materials, we offered a workshop to a class of 42
students in the 9th grade at a public middle school, in Lagoa de Itaenga, Pernambuco, Brazil. This
is a case study whose answers to a diagnostic questionnaire reapplied as an evaluative
questionnaire showed that some students developed conceptually their ideas of circle and
circumference as well as their process of acquiring and applying formulas related to circumference
length and circle area.
Keywords: Potentially meaningful material. History of mathematics. Circle and circumference.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
101
Introdução
Algumas reformulações pela qual vem passando o ensino de matemática, tanto no
âmbito dos conteúdos quanto na forma de ensinar, é proposta como tentativa de tentar
responder às dificuldades daqueles que lidam com o ensino, como também referentes às
dificuldades de aprendizagem por parte daqueles que aprendem. Basta observar alguns
documentos oficiais (estadual e nacional), a exemplo do que propôs os Parâmetros
Curriculares de Matemática – PCN (BRASIL, 1997) e o que está publicado na Base
Nacional Comum Curricular – BNCC (BRASIL, 2017).
Entretanto, ainda é bastante comum escutar-se dos professores comentários acerca
de suas dificuldades em ensinar matemática, assim como da insatisfação dos seus alunos,
que seguem encarando a matemática como uma grande “vilã” do seu fracasso escolar.
Também adiciona-se a isso um formato de gestão escolar conduzido por uma política de
resultados, que desconsidera, dentre muitos aspectos, a incompatibilidade temporal entre o
tempo didático e o tempo de aprendizagem.
Ao que parece, esse é um tipo de impasse cuja explicação continua aberta com
certos pontos que permanecem provocando controvérsias e com diversas barreiras ainda
por serem superadas pelos professores, pois são eles quem de fato fazem educação
matemática na sala de aula. Além disso, questões básicas como o grau de presença da
formalização e do rigor matemáticos nos conteúdos curriculares e a maneira mais adequada
de apresentar e aplicar os seus métodos provocam longas e desgastantes discussões.
Assim, práticas docentes que exploram excessivamente o manuseio mecânico das
fórmulas, restringindo-se a substituição de valores com preocupação exclusiva no resultado
final, sem considerar o raciocínio matemático que há por trás dessas fórmulas, acabam
ocultando, por conseguinte, as origens práticas e informais desse conhecimento,
especialmente no âmbito do ensino da geometria.
Esses aspectos por si só justificam o interesse de vários pesquisadores, dentre eles
Fonseca (2005), Sena e Dorneles (2013), Silva, Souza e Rufino (2018), Medeiros e Basso
(2020), apenas para citar alguns, com o ensino de geometria, considerando que práticas
como as que foram destacadas seguem sendo bastante utilizadas pelos professores.
No caso específico dos conceitos de circunferência e de círculo, ao invés de
explorar adequadamente seus aspectos sensoriais, continuam insistindo na memorização
das fórmulas e no seu manuseio mecânico, ainda que, as bases de construção histórica
desses objetos encontrem-se fortemente influenciadas pelas questões práticas, na busca de
satisfazer algumas necessidades humanas ou pelas observações das inúmeras formas e
figuras que se assemelham a eles, presentes na natureza.
Ressalta-se que este fato não chega a ser algo novo, nem tão pouco exclusivo
desses objetos geométricos, pois desde o início da década de noventa pesquisadores como
Peres (1991) e Pavanelo (1993) já indicavam que mesmo boa parte da geometria básica,
estando presente no mundo sensorial, esses aspectos não têm tido a relevância merecida no
ensino.
Sobre isso, Martinez e Novello (2013, p. 9) afirmam que “a partir da
representação das formas geométricas e vivenciando-as na prática, o estudante desenvolve
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
102
a compreensão do mundo em que se vive, aprendendo a descrevê-lo e a localizar-se nele.”,
ou seja, é necessário criar uma ponte de via dupla entre os conceitos geométricos e suas
respectivas representações no mundo sensorial, para assim melhorar o processo de ensino-
aprendizagem.
No que se refere ao uso da história da matemática nas aulas de matemática Pereira
e Pereira (2015), destacam as duas maneiras trazidas por Esteve et al. (2011), ou seja,
como um recurso educacional integral e/ou como um recurso didático para a compreensão
matemática. Nesta ordem a primeira intenta proporcionar aos estudantes uma visão da
matemática enquanto instrumento útil e dinâmico a ser empregado nas ciências humana,
interdisciplinar e heurística; na segunda opção há o propósito de fornecer um instrumental
teórico com potencialidade para viabilizar aos estudantes a compreensão de conceitos
matemáticos na expectativa de que os estudantes alcancem um melhor desempenho na
aprendizagem matemática.
Sobre isso, os achados de Quartieri e Rehfeldt (2007) de que estudantes do Ensino
Fundamental (anos finais) apresentam dificuldades para conceituar circunferência, uma vez
que muitos deles não reconhecerem suas diferenças com o círculo aponta necessidade de
mudança. Neste estudo a compreensão de círculos e seus elementos vai investir
epistemologicamente no uso da história da matemática no âmbito dessa segunda maneira
apresentada anteriormente.
Por outro lado, os alunos chegam à escola com os seus conhecimentos prévios, no
sentido tratado por Ausubel (2002), ou seja, conceitos previamente formados pelas
crianças em sua vida cotidiana, os quais dificilmente encontram significado em discursos
demasiadamente formais semelhantes ao que geralmente ocorre no Ensino Fundamental
(EF), quando abordam os conceitos de circunferência, de círculo e seus respectivos
cálculos.
Para embasar a caracterização anterior basta trazer o comentário de Masini e
Moreira (2017) sobre a escola contemporânea ainda se focar na aprendizagem mecânica,
portanto, na perspectiva de um contínuo, situa-se em um extremo oposto a aprendizagem
significativa, pois os conhecimentos adquiridos são decorados e servem a curto prazo, em
situações conhecidas.
Em acréscimo, assinalam que para essa escola o significado não entra em questão,
o que importa é preparar (treinar) os alunos para dar respostas corretas. As respostas
apresentadas são aprendidas mecanicamente para as provas locais, nacionais e
internacionais, pois as “melhores escolas” são as que mais aprovam nessas provas.
Além disso, apesar dos documentos oficiais que prescrevem o currículo de
matemática descreverem referenciais didáticos, defende-se a ideia de que os professores
precisam conhecer as teorias de aprendizagem para assim planejarem sequencias didáticas
adequadas com intenções de aprendizagem pretendidas.
No caso em pauta, optou-se pela Teoria da Aprendizagem Significativa (TAS)
como norte estruturante para organizar as atividades de ensino propostas. Tal escolha tem
várias razões, mas, principalmente, por ser uma teoria bastante abrangente e,
consequentemente, conseguir atender a muitas inquietudes por falar diretamente para
professores.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
103
Mediante o que foi colocado e seguindo na contramão desse ensino “treinador”,
considera-se o argumento de Moreira (2006) de que certos materiais podem ter maior valor
significativo e, dependendo de como são usados em situação de ensino, podem promover a
aprendizagem significativa.
Desta forma, busca-se investigar a potencialidade significativa de uma oficina
sobre circunferência e círculo e seus cálculos, aplicada a uma turma de 9º ano do EF de
uma escola pública do município de Lagoa de Itaenga-PE/BR, explorando-se alguns
aspectos históricos, com o uso de materiais manipuláveis, cujas atividades foram
intencionalmente propostas numa perspectiva de promover os dois processos cognitivos
ausubelianos da diferenciação progressiva e da reconciliação integradora entre antigos e
novos conceitos.
Enfoques da Teoria da Aprendizagem Significativa que embasam este estudo
Tem sido uma questão bastante antiga, porém de grande importância, a preocupação
em discutir os processos de aquisição, de desenvolvimento e de armazenamento de
informações na mente humana, e, no âmbito pedagógico, entender como se dá a
aprendizagem dos estudantes. Isso de certa forma explica o fato de existirem tantas
abordagens teóricas, na busca de explicar tais processos. Como exemplo de algumas
Teorias Cognitivistas-Constutivistas mais famosas, citam-se a Teoria Desenvolvimentista
de Piaget, a Teoria da Mediação de Vygotsky e a Teoria da Aprendizagem Significativa
(TAS) de Ausubel.
Para Pozo (1998), dentre as teorias cognitivistas elaboradas a partir de posições
organicistas, a TAS é interessante por estar centrada na aprendizagem produzida num
contexto educativo. Reportando-se a terminologia de Vygotsky, acrescenta que Ausubel
desenvolve uma teoria a respeito da interiorização ou assimilação, através da instrução, dos
conceitos verdadeiros, que são construídos a partir de conceitos previamente formados ou
“descobertos” pela criança em seu meio, ou seja, os seus “conhecimentos prévios”.
Assim, para Ausubel (2002), podemos inter-relacionar uma nova informação com
um conhecimento prévio, existente na estrutura cognitiva, chamado de subsunçor, sendo
esse o fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem significativa. Daí
porque ele aconselha que os professores devem criar situações didáticas para descobrir
esses conhecimentos e, ao identificá-los, organizar seus ensinamentos e utilizar recursos e
princípios que possibilite acioná-los com vistas a facilitar a aprendizagem significativa.
Para caracterizar melhor o que vem a ser um subsunçor, Moreira (2011), esclarece
que não é qualquer ideia prévia, mas algum conhecimento especificamente relevante à
nova aprendizagem, já existente na estrutura cognitiva do sujeito e que permite dar
significado a um novo conhecimento. Explica ainda que os subsunçores podem ser
proposições, modelos mentais, construtos pessoais, concepções, ideias, invariantes
operatórios, representações sociais e, é claro, conceitos já existentes na estrutura cognitiva
de quem aprende.
Isso significa que a nova informação se integra à estrutura cognitiva de maneira não
arbitrária e não literal, contribuindo para a diferenciação, elaboração e estabilidade dos
subsunçores e, consequentemente, da própria estrutura cognitiva. Sobre isso, Novak (1981,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
104
p. 56) coloca que “uma nova aprendizagem significativa resulta em crescimento e
modificação adicionais de um subsunçor já existente”. E “dependendo da experiência
prévia do indivíduo, os subsunçores podem ser relativamente grandes e bem
desenvolvidos, ou podem ser limitados na variedade e quantidade de elementos (conjuntos
celulares) que contêm”.
Conforme se observa, essa teoria procura explicar, de uma forma científica e
objetiva, a importância e a influência dos conhecimentos prévios para a aprendizagem
significativa e, embora essa seja uma ideia bastante defensável, Moreira (2011) alerta que
não se trata de uma tarefa simples, porque requer esforço e disponibilidade tanto do
ensinante quanto do aprendiz.
Esse aspecto fica bem caracterizado quando Ausubel conforme (MASINI e
MOREIRA, 2017, p. 22) argumenta que além da existência prévia de subsunçores na
estrutura cognitiva a “aprendizagem significativa como um processo pressupõe tanto que o
aprendiz apresente uma atitude de aprendizagem significativa como que o material a ser
aprendido seja potencialmente significativo para ele/ela”.
Adverte ainda que não importa o quanto um material possa ser potencialmente
significativo, se a intenção do aprendiz é memoriza-lo literalmente, como uma serie de
palavras arbitrariamente relacionadas, tanto o processo de aprendizagem quanto o seu
resultado são mecânicos, sem significado.
Isso significa que, apesar dos seres humanos serem capazes de aprender de forma
significativa, a aprendizagem mecânica ocorre ou porque não existem elementos relevantes
na área da nova informação ou porque esses estejam pouco elaborados na estrutura
cognitiva e possam servir de subsunçores ou porque não há disponibilidade (predisposição)
por parte do aprendiz em aprender de forma significativa.
Por outro lado, Moreira (2011) tem feito referência a uma zona cinza intermediária
localizada entre o contínuo, “aprendizagem significativa x aprendizagem mecânica”,
sugerindo que, na prática, grande parte da aprendizagem ocorre nessa zona e um ensino
potencialmente significativo poderá facilitar “a caminhada do aluno nessa zona cinza”.
Adverte, também, que a passagem da aprendizagem mecânica para a aprendizagem
significativa não é natural, nem automática, sendo uma ilusão pensar que o aluno pode
inicialmente aprender de forma mecânica, e depois, ao final do processo, a aprendizagem
acabar sendo significativa, isto pode até ocorrer, mas depende dos três condicionantes
ausubelianos: a existência de subsunçores, a potencialidade do material de aprendizagem e
a disponibilidade para aprendizagem significativa, além da mediação do professor.
Sobre essa mediação, faz-se necessário que o professor compreenda na
perspectiva ausubeliana segundo Moreira e Massini (2012), que cada componente
curricular possui uma estrutura articulada e hierarquicamente organizada de conceitos que
constitui seu sistema de informação, devendo ser identificado pelos professores e ensinado
aos alunos.
Entretanto, no âmbito escolar, o que se observa é que os conteúdos são abordados
seguindo uma perspectiva, por vezes linear, onde todos os conteúdos são vistos perante o
mesmo nível de importância, sem o estabelecimento de idas e voltas, conexões,
interligações conceituais a outros conhecimentos, culminado, em algumas situações, a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
105
promover uma aprendizagem mecânica, que de forma sucinta, pode ser compreendida
como uma aprendizagem meramente, memorística.
No que se refere à potencialidade significativa do material, visto que esse é o foco
do trabalho em tela, Moreira (2006) explica que esse deve ter “significado lógico”, ou seja,
deve ser suficientemente não arbitrário e não aleatório, sendo, portanto relacionável à
estrutura cognitiva de forma substantiva e não literal. Assim, o que se pretende é que o
aluno atribua aos novos conhecimentos, veiculados pelos materiais de aprendizagem, os
significados aceitos no contexto da matéria de ensino, a partir dos subsunçores que
possuem.
Nesse contexto, vale destacar que para Ausubel (2002) a estrutura cognitiva é
considerada uma estrutura dinâmica de subçuncores iter-relacionados e hierarquicamente
organizados, caracterizada por dois processos principais: a diferenciação progressiva e
reconciliação integradora.
A diferenciação progressiva é um processo de interação em um subsunçor, que
também se modifica, adquirindo novos significados, ou seja, vão progressivamente sendo
diferenciado em termos de detalhe e especificidade. Por usa vez, a reconciliação
integradora significa que no curso de novas aprendizagens, antigas ideias podem se
relacionar, se reorganizar e adquirir novos significados, explorando-se relações de
similaridades, diferenças e reconciliando discrepâncias reais ou aparentes.
Isso significa, conforme Moreira (2011), que à proporção que aprendemos de forma
significativa, temos de progressivamente diferenciar significados dos novos adquiridos a
fim de reconhecer diferenças entre eles, mas é preciso também se proceder à reconciliação,
pois, se apenas diferenciamos, acabamos por perceber tudo diferente e se apenas
reconciliamos, terminamos por perceber tudo igual.
Assim, Moreira (op. cit.) argumenta que sendo esses dois processos fundamentais
na aprendizagem, nada mais óbvio do que usá-los como princípios programáticos no
ensino, iniciando com um mapeamento conceitual, de maneira a identificar as ideias mais
gerais, mais inclusivas, os conceitos estruturantes, as proposições-chave do que vai ser
ensinado, de maneira a identificar o que é secundário, supérfluo do conteúdo e ao longo do
ensino, e intencionalmente, trabalha-los numa perspectiva de diferenciação e integração,
ou seja, descer e subir várias vezes , nas hierarquias conceituais.
Aspectos histórico sobre o cálculo da área do círculo e do comprimento da
circunferência
Algumas considerações históricas sobre circunferência e círculo apontam que o
grande número de objetos existentes na natureza, com formas circulares como, por
exemplo, o contorno do sol, da lua, o arco-íris, as ondas formadas na superfície da água ao
atira-se uma pedra, podem ter despertado no homem, um interesse especial por essas
formas.
Segundo Goldstein (1998) o círculo é uma figura singular e perfeita na sua
simplicidade e, por ser idêntico a si mesmo, têm inspirado ao longo dos tempos vários
artistas, poetas, místicos, além de ter despertado o interesse de astrônomos, filósofos,
geógrafos, que o estudaram, mediram e descreveram. Neste contexto, ele cita o matemático
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
106
Euclides que há vinte e três séculos atrás já descrevia vinte e três definições no Livro I,
sobre o círculo como uma figura plana e não como uma simples linha de maneira que para
conhecê-lo e calcular sua área era preciso definir seus elementos de base: o centro, a
circunferência e o diâmetro:
... 15. Círculo es una figura plana delimitada por una línea –
llamada circunferencia – respecto de la cual, a partir de un punto
entre los situados en el interior de la figura, todas las rectas que la
inciden son – hasta la circunferencia del círculo – iguales entre sí.
16. Se llama a este punto centro del círculo.
17. Diámetro del círculo es cualquier recta que atraviesa el centro
que esté limitada por la circunferencia del círculo en sus dos
extremos, y que divida el círculo en dos. (GOLDSTEIN, 1998, p.
157)
Por outro lado, Vázquez e Ramos (1972, p. 40) apresentam o conceito de círculo a
partir de ideias mais gerais, mas não menos corretas, expressando que “a união da
circunferência e dos pontos de seu interior é uma região circular fechada que chamamos
círculo.”(Tradução do autor)1. Entretanto, registra-se que por trás dessa enganosa
simplicidade o círculo e o cálculo de sua área ocultam uma complexidade que marca
contextualmente a própria história da matemática.
Para entender melhor esse percurso histórico, chama-se a atenção para um aspecto
trazido por Eves (1997) e outros historiadores, sobre a passagem de uma geometria
subconsciente, vinculada a inúmeras circunstâncias da vida, para a chamada geometria
científica, ao extraírem-se, a partir de um certo número de observações relativas a forma,
tamanho e relações espaciais de objetos físicos específicos, propriedades gerais e relações
necessárias até que se chega a obtenção de generalizações (fórmulas).
Mediante esse contexto, Goldstein (op. cit.) explica que alguns métodos e
resultados para obtenção do cálculo da área do círculo em algumas civilizações antigas, era
proposto a partir do quadrado de seu raio. O interesse era, então, determinar a relação entre
a superfície do círculo e o quadrado de seu raio que é também a mesma relação entre o
comprimento da circunferência e o seu diâmetro, a qual recebe o nome específico de (pi).
Com efeito, frente aos milênios anos de aventura do círculo o número , pode-se por
assim dizer, é o mais evidenciado dos números da história da matemática. De acordo com
Lima (2011, p. 54) “Euclides determinou a relação entre o comprimento da circunferência
e o seu diâmetro como uma razão constante, independente da circunferência tomada, mas
não tratou nos Elementos de estimar esse valor”.
Como não existe um numérico exato que corresponde ao valor da medida de e que
independentemente do tamanho da circunferência essa relação permanece constante, pode-
se chegar a uma expressão para representar o cálculo da circunferência. Sobre essa
expressão, Vázquez e Ramos (1972) explicam que se trata de uma comparação, por
1 “La unión de la circunferencia y de los puntos de su interior es una región circular cerrada que
llamamos círculo.”
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
107
divisão, entre o comprimento da circunferência ( C ) e do seu diâmetro ( d ). Conforme
ilustra a figura 01.
Figura 01 – obtenção da expressão para o cálculo do comprimento da circunferência
Fonte: os autores
Contudo, foi somente quando se começou a suspeitar que poderia ser um número
irracional que os cálculos para a obtenção da área do círculo mudam de direção, no aspecto
matemático. Sobre esse fato, Bagazgoitia et al., (1997, p. 3) lembra que “Em 1882, F.
Lindemann demonstrou que p não é solução de nenhum polinômio de coeficientes inteiros,
provando assim a impossibilidade da quadratura do círculo.” 2. (Tradução do autor).
Sobre esse problema, Joseph (1996, p. 261) coloca que “Somente no século
dezenove demonstrou-se que, posto que quadrar um círculo equivale a construir um
segmento linear cujo comprimento seja igual ao produto da raiz quadrada de p (que não é
uma quantidade construível) e o raio do círculo dado, isso não se pode fazer.” 3 (Tradução
do autor).
Os fatos e aspectos levantados até aqui vêm a corroborar com o que foi trazido
anteriormente sobre a grande dificuldade de compreensão que esta subjacente aos
conceitos de circunferência e de círculo e consequentemente ao entendimento do cálculo
de seu comprimento e da sua área devido dentre outras coisas à incomensurabilidade do
número pi.
Destaca-se, que ainda que a solução do problema da quadratura do círculo é a prova
de sua impossibilidade, os métodos empregados em sua investigação foram importantes
para a idealização e desenvolvimento de técnicas de procedimentos de demonstrações que
têm servido até hoje para compreender melhor diversas outras estruturas matemáticas.
Vale registrar, que muitas das estratégias que predominaram nas civilizações
antigas para o cálculo da área do círculo resultaram em tentativas de transformá-la em
áreas retilíneas. Esse aspecto parece ser bastante compreensível, pois estando diante de
uma figura de padrões tão específicos sem que houvesse referência anterior para o cálculo
de sua área, era natural que se buscassem aproximações com modelos matemáticos de
áreas que lhes eram familiares.
Um exemplo disso fica bem demarcado por Sirera (2000) sobre os trabalhos de
Arquimedes, referindo-se ao seu intento em determinar a área de superfícies curvas e
volumes de sólidos, obtidas através da comparação com áreas e volumes de triângulos,
retângulos e cubos. Nessa busca a técnica demonstrativa mais poderosa é a combinação de
2 “En 1882 F. Lindemann demostró que no es solución de ningún polinomio de coeficientes enteros,
probando así la imposibilidad de la cuadratura del círculo”. 3 “Sólo en el siglo diecinueve se demostró que, puesto que cuadrar un círculo equivale a construir un
segmento lineal cuya longitud sea igual al producto de la raíz cuadrada de p (que no es una cantidad
construible) y el radio de l círculo dado, esto no podía hacerse”.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
108
um procedimento de demonstração por redução ao absurdo com o chamado método de
exaustão.
Uma dessas aproximações, conforme explica Sirera (op. cit.) é obter a área do
círculo inscrevendo-se uma sucessão de polígonos regulares numa dada região circular,
onde se estabelece que a diferença de áreas entre a figura curva e os polígonos é menor que
a quantidade dada para um número suficientemente grande de lados do polígono regular.
Normalmente cada polígono se obtém do anterior dobrando o número de seus lados.
Inspirados por essa estratégia, Vázquez e Ramos (1972) sugerem que com para
calcular a área de um polígono regular qualquer basta utilizar a fórmula2
)()()(
abnApr ,
se o polígono regular inscrito aumenta seu número de lados ( n ), pode acontecer duas
ocorrências:
I- O apótema ( a ), se aproxima cada vez mais do valor do raio ( r ).
II- O produto ( nb ) se aproxima cada vez mais do valor do comprimento ( r2 ).
Figura 02 – aproximações entre os elementos do polígono regular e os elementos
do círculo
Fonte: os autores
Então, diante da importante produção científica arquimediana na tentativa de
calcular a área de uma região circular, pode-se ainda registrar como coloca Goldstein
(1998) que segundo Eutocio de Ascalón, autor de um comentário sobre os trabalhos de
Arquimedes no século V d. C., Arquimedes queria demonstrar a que área retilínea equivale
o círculo, problema que desde longo tempo os célebres filósofos anteriores tentavam
resolver.
Em complemento a isso, acrescenta que dentre essas tentativas Arquimedes mostra
que todo círculo é equivalente a um triângulo retângulo, em que um dos lados do ângulo
reto é igual ao semidiâmetro do círculo, ou seja, a medida do seu raio e, a base é igual ao
perímetro do círculo. Algo próximo ao que se tentou ilustrar na figura 03, abaixo.
Figura 03 – Cálculo da área do círculo com equivalência à área do triângulo retângulo
Fonte: os autores
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
109
Utilizando um raciocínio análogo ao anterior, Lima (2011) sugere decompor o
círculo em um número par, suficiente de setores, de maneira que ao rearranjar esses setores
se aproxime de um paralelogramo, cuja base equivale ao semiperímetro do círculo e a
altura ao seu raio, conforme se ilustra na figura 04.
Figura 04: Cálculo da área do círculo com equivalência à área do paralelogramo
Fonte: os autores
Metodologia
A pesquisa em pauta tem enfoque qualitativo com características de um estudo de
caso educativo, nos moldes proposto por André (2005). A aplicação da oficina elaborada
para esse estudo foi realizada em uma turma de 42 alunos do 9º ano do EF, de uma escola
pública, situada em Lagoa de Itaenga, município de Pernambuco-Brasil, cujo objetivo visa
avaliar a potencialidade significativa desse material de aprendizagem.
Como instrumento de coleta de dados foi elaborado um questionário diagnóstico,
apresentado na sequência, o qual foi reaplicado como questionário avaliativo, no intento de
identificar as evoluções conceituais dos participantes, acerca dos temas abordados, cujas
perguntas foram organizadas a partir dos objetivos que se almeja atingir com cada uma
delas.
Questionário Diagnóstico/Avaliativo
1- Você saberia dizer o que é um círculo?
2- Na sua opinião existe alguma diferença entre círculo e circunferência. Justifique.
3- Nomeie as figuras abaixo:
4- Determine quais relações se pode estabelecer entre os segmentos abaixo e os nomeie:
5- Para medir o contorno das figuras que seguem foi utilizada a seguinte estratégia: se
colocou um fio coincidindo com cada um dos contornos e depois os estendendo para medir
os segmentos que os representam, em seguida se utilizou como unidades padrão de medida
os seus respectivos diâmetros. Com relação a estratégia utilizada responda:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
110
a) o que se pode observar?
b) que expressão se pode estabelecer entre o contorno e o diâmetro dessas figuras?
c) identifique qual é a grandeza geométrica que se determina a partir dessa relação?
6- Sabe-se que dividindo a figura 1 em vários setores pode-se montar a figura 2 que se
aproxima de um “paralelogramo” (conforme ilustração abaixo). Dessa informação
determine:
a) Quais expressões correspondem ao comprimento e a altura do paralelogramo?
b) Se a figura 1 tivesse um diâmetro de 2 cm qual seria a área da figura 2? (admita
π=3,14)
Acredita-se que vivenciando com os alunos alguns aspectos da base de construção
histórica sobre circunferência e círculo, com o uso de materiais manipuláveis, podemos
ajuda-los a atribuir sentido para a aplicação dos modelos geométricos das fórmulas do
comprimento da circunferência e da área do círculo e potencializar a aprendizagem
significativa.
A organização das atividades de ensino, na forma de uma oficina, expressa no
quadro 01, foram estruturadas no viés da TAS, considerando os subsunçores dos alunos e
adotando como princípios programáticos a diferenciação progressiva e a reconciliação
integradora.
Quadro 01: Caracterização Sintética das Atividades propostas na Oficina
Etapa
s Objetivos Atividades
Recursos/Procediment
os
I
Levantar os subsunçores
dos alunos sobre as ideias
de circunferência e de
Aplicação do Questionário
Diagnóstico.
Questionário impresso
contendo seis questões.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
111
círculo.
II
Compreender o conceito
de circunferência a partir
da ideia geral de uma
curva fechada simples, na
qual todos os seus pontos
se mantêm a mesma
distância de um ponto
central.
Traçar uma curva fechada
usando um compasso
construído com um lápis e
barbante, em volta de um
ponto O (chamado centro da
circunferência) definido na
cartolina.
Cartolina, lápis,
barbante e tesoura.
III
Conceituar os elementos
da circunferência (raio,
diâmetro e corda),
chamando a atenção para
as suas diferenças, mas ao
mesmo tempo para certas
semelhanças de forma a
obter algumas relações,
dentre as quais que rd 2 .
Através de algumas
medições usando o barbante,
constatar que a distância
entre qualquer ponto da
circunferência e o centro é a
mesma que corresponde ao
raio (r). Esticando este
barbante, na mesma
proporção até atingir um
ponto do lado oposto, obtém-
se uma corda, chamada de
diâmetro ( d ).
Circunferência
construída na Etapa
anterior e barbante.
IV
Obter a fórmula para o
cálculo do comprimento da
circunferência,
compreendendo a relação
de incomensurabilidade
entre as medidas do
comprimento da
circunferência e seu
diâmetro, de forma a
chegar na expressão:
rC 2
Sobrepor com o barbante o
comprimento da
circunferência e comparar
(por divisão) com a medida
do seu diâmetro. Observar
que esta comparação resulta
em três medidas do diâmetro
mais uma pequena sobra,
conhecida por ,
independente do
comprimento do raio da
circunferência.
Circunferência da Etapa
I e barbante.
V
Construir o conceito de
círculo como uma figura
completa, formada pela
união do conjunto de
pontos da circunferência e
todos os outros pontos
interiores a ela.
Pintar o interior da figura, de
forma a visualizar que a
região colorida, incluindo o
seu contorno, é chamada de
região circular ou
simplesmente de círculo.
Circunferência
construída na Etapa II,
lápis de cera.
VI
Obter a fórmula da área do
círculo ( 2rA ),
vivenciando uma das
Cobrir o disco circular com
barbante e ao cortá-lo até o
centro, reorganizar os
Cartolina, lápis,
barbante e tesoura.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
112
aplicações do método da
exaustão arquimediano
fazendo-se uma
aproximação com a área
do triângulo retângulo (
2
baA
).
pedaços de forma a obter
uma área triangular. Perceber
que o cateto menor
corresponde à medida do
raio e o maior, à medida do
comprimento da
circunferência. Adotar essas
medidas na fórmula da área
do triângulo de maneira a
obter a fórmula da área do
círculo.
VII
Obter a fórmula da área do
círculo ( 2rA ), a partir
da aproximação com a área
do paralelogramo (
hbA ).
Dividir a região circular em
um número par de setores
iguais. Recortá-los e
remontá-los de forma que se
aproxime de um
paralelogramo, cujos lados
paralelos equivalem às
medidas do raio e do
semiperímetro. Aplicar essas
medidas na fórmula da área
do paralelogramo e obter a
fórmula da área do círculo.
Círculo obtido na Etapa
V, tesoura, cola e papel.
VIII
Identificar as evoluções
dos alunos sobre as ideias
e cálculos da
circunferência e do círculo.
Aplicação do Questionário
Avaliativo.
Reaplicar o questionário
diagnóstico, como
questionário avaliativo.
Fonte: os autores
Para explicitar uma visão panorâmica integrando, por um lado os aspectos
epistemológicos aportados na história da matemática como recurso educacional integral
e/ou como um recurso didático segundo o destaque apontado por Pereira e Pereira (2015),
apresenta-se em um mapa conceitual, conforme figura 05, que caracterizou as atividades da
oficina realizada sobre circunferência e círculo, na perspectiva da aprendizagem
significativa.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
113
Figura 05 – O uso da História da Matemática alinhada aos pressupostos da TAS como
caracterização de um material potencialmente significativo sobre o cálculo da
circunferência e da área do círculo
Fonte: os autores
Apresentação e Discussão dos Dados
Para análise das respostas obtidas com a aplicação dos questionários,
estabeleceram-se critérios, relacionados com os objetivos almejados. As respostas foram
agrupadas em categorias, considerando a base teórica desse estudo, na perspectiva da
aprendizagem significativa. Os dados encontram-se organizados em forma de gráficos.
Gráfico 01 – Compreensão sobre o conceito de Círculo (Questão 1)
Legenda: Não Respondeu (NR), Resposta Inadequada (RI), Resposta Parcialmente
Adequada (RPA) e Resposta Adequada (RA).
8%
75%
17%0%8%
33%
58%
0%0%
50%
100%
NR RI RPA RA
Questionário
Diagnóstico
Questionário
Avaliativo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
114
Fonte: os autores
Embora os alunos não tenham estabelecido relações com os elementos de base
(centro, circunferência e diâmetro) ao conceituarem o círculo, parte deles passa a
reconhecê-lo como uma figura completa, composta por uma região que compreende os
pontos da circunferência e os pontos internos. Assim, pode-se dizer que houve evolução
conceitual considerando os subsunçores exibidos antes da Oficina.
Protocolos de respostas do Aluno (A6)
Questionário Diagnóstico:
Questionário Avaliativo:
Gráfico 02 – Distinção entre Círculo e Circunferência (Questão 2)
Legenda: Não Respondeu (NR), Resposta Inadequada (RI), Resposta Parcialmente
Adequada (RPA) e Resposta Adequada (RA).
Fonte: os autores
Metade dos alunos passou a reconhecer distinções que figuram entre a ideia de
curva e de região; pontos de fronteira e pontos internos e de fronteira, aludindo
respectivamente ao conceito de circunferência e de círculo. A mais citada foi a que os
caracteriza a partir do conjunto de pontos, elaborando o processo cognitivo da
diferenciação progressiva
Protocolos de respostas do Aluno (A17)
Questionário Diagnóstico:
Não respondeu.
17%
58%
17%8%
17%33%
42%
8%
0%
50%
100%
NR RI RPA RA
Questionário
Diagnóstico
Questionário
Avaliativo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
115
Questionário Avaliativo:
Gráfico 03 – Compreensão visual acerca do Círculo e Circunferência (Questão 3)
Legenda: Não Respondeu (NR), Resposta Inadequada (RI) e Resposta Adequada (RA).
Fonte: os autores
Com essa questão, foi possível observar que os participantes tiveram mais
facilidade em visualizar qual das figuras representava o círculo e qual representava a
circunferência do que a conceituar, considerando os dados apresentados nas questões
anteriores. Porém, um erro habitual foi trocar o nome das figuras ou mesmo nomeá-las
como se fossem a mesma forma.
Protocolos de respostas do Aluno (A12)
Questionário Diagnóstico:
Questionário Avaliativo:
17%25%
58%
8%25%
67%
0%
20%
40%
60%
80%
NR RI RA
Questionário
Diagnóstico
Questionário
Avaliativo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
116
Gráfico 04 – Nomeação e Relação entre raio, corda e diâmetro (Questão 4)
Legenda: Resposta Inadequada (RI), Resposta Parcialmente Adequada (RPA) e Resposta
Adequada (RA).
Fonte: os autores
Pode-se considerar que metade da turma passou a nomear e/ou estabelecer relações
entre os seguimentos traçados na circunferência (raio, corda e diâmetro), principalmente na
direção da nomeação, sinalizando um reconhecimento de suas características, fato que
inicialmente quase não existiu, indicando que houve uma evolução conceitual sobre esses
segmentos.
Protocolos de respostas do Aluno (A25)
Questionário Diagnóstico:
Questionário Avaliativo:
Gráfico 05 – Obtenção da expressão da circunferência (Questão 5)
Legenda: Não Respondeu (NR), Resposta Inadequada (RI), Resposta Parcialmente
Adequada (RPA) e Resposta Adequada (RA).
Fonte: os autores
83%
17%0%
50%42%
8%
0%
50%
100%
RI RPA RA
QuestionárioDiagnóstico
QuestionárioAvaliativo
92%
8% 0% 0%8%
33% 25% 33%
0%
50%
100%
NR RI RPA RA
Questionário
Diagnóstico
Questionário
Avaliativo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
117
Um grupo considerável dos alunos obteve a expressão para o cálculo da
circunferência, a partir da relação entre as medidas do comprimento da circunferência e seu
diâmetro, reconstruindo o caminho que os antigos matemáticos fizeram. Percebeu-se que,
conforme esperado, a não compreensão da incomensurabilidade entre essas medidas, e
consequentemente do significado de , foi um obstáculo para a obtenção dessa fórmula.
Protocolos de respostas do Aluno (A15)
Questionário Diagnóstico:
Não respondeu.
Questionário Avaliativo:
Gráfico 06 – Relação entre a área do círculo e a do paralelogramo (Questão 6)
Legenda: Não Respondeu (NR), Resposta Inadequada (RI), Resposta Parcialmente
Adequada (RPA) e Resposta Adequada (RA).
Fonte: os autores
De acordo com os dados apresentados, registra-se que após a intervenção, houve
uma evolução conceitual considerável por parte dos alunos, ao conseguirem entender que
para solucionar a questão proposta seria necessário relacionar, por aproximação, a área do
círculo e a do paralelogramo, elaborando o processo cognitivo da reconciliação
integradora.
Protocolos de respostas do Aluno (A15)
Questionário Diagnóstico:
Não respondeu.
75%
25%
0% 0%
42%
8%17%
33%
0%
50%
100%
NR RI RPA RA
QuestionárioDiagnóstico
QuestionárioAvaliativo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
118
Questionário Avaliativo:
Considerações Finais
Conforme colocado, as preocupações que impulsionaram o interesse em propor
uma prática diferente das que usualmente são aplicadas no cálculo do comprimento da
circunferência e da área do círculo, levou-nos a apostar num material de ensino, no formato
de uma oficina, cuja organização lógica foi estruturada em alguns aspectos históricos da
base de construção desses objetos e de seus cálculos e os princípios programáticos da
diferenciação progressiva e da reconciliação integradora, na perspectiva de que esse
material possa se configurar em um material potencialmente significativo.
Nesse sentido, buscou-se caracterizar o fazer matemático a partir da generalização
para obtenção e aplicação dos modelos geométricos das fórmulas do comprimento da
circunferência e da área do círculo, reconstruindo estratégias que predominaram nas
civilizações antigas, a exemplo da aplicação do método da exaustão arquimediano, para
aquisição da área do círculo por aproximações com áreas de figuras retilíneas.
Inicialmente exploraram-se conceitos mais gerais sobre esses objetos tais como as
ideias de curva fechada, região circular, conjunto de pontos de fronteira, conjunto de
pontos internos, dentro outras, na perspectiva de possibilitar diferenciações e
reconciliações ao interagirem com conceitos específicos, como os conceitos de raio,
diâmetro e circunferência.
A partir das evoluções conceituais identificadas, comparando-se as respostas
obtidas antes e após a intervenção, com a aplicação dos questionários, foi possível
encontrar indícios de aprendizagem significativa, tanto no que concerne o conceito de
círculo, quanto a estabelecer distinções importantes entre as ideias de círculo e de
circunferência.
Destaca-se ainda, a evolução ocorrida na compreensão dos significados de raio,
corda e diâmetro, assim como na obtenção da fórmula do cálculo da circunferência, a partir
da comparação, por divisão, entre as medidas do comprimento da circunferência e do seu
diâmetro ser constante e medir três quantidades do diâmetro mais uma parte sobrante.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
119
Registra-se também que houve uma melhora na compreensão dos alunos sobre a
obtenção e aplicação da fórmula da área do círculo, ao conseguirem fazer uma
equivalência entre essa área e a do paralelogramo, de forma a solucionar a questão
proposta. Isso foi bastante interessante, pois perceberam a relação desse procedimento com
o método da exaustão arquimediano, trabalhado na oficina.
Por tudo que foi registrado, pode-se responder a pergunta geradora desse estudo,
colocando que o material tem potencialidade significativa importante. Contudo, há
necessidade de realizar outras aplicações que possam corroborar ou não com esta
potencialidade.
Referências
ANDRÉ, M. E. D. A. Estudo de Caso em Pesquisa e avaliação educacional. Brasília:
Líber Livro Editora, 2005.
AUSUBEL, D. P. Adquisición y retención del conocimiento: Una perspectiva cognitiva.
Barcelona: Paidós, 2002.
BAGAZGOITIA, A., CASTAÑEDA, F., FERNÁNDEZ S. & PERAL, J. C. La
Resolución de Problemas en las Matemáticas del Nuevo Bachillerato: Libro del
Profesor. País Vasco: Universidad del País Vasco, 1997.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base Nacional
Comum Curricular. Brasília, DF, 2016. Disponível em: <
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/#/site /inicio>. Acesso em: jan. 2019.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais:
Matemática (1º e 2º ciclos do Ensino Fundamental). Secretaria de Educação Fundamental.
Brasília: MEC/SEF, 1997.
EVES, H. Geometria: Tópicos de História da Matemática para uso em sala de aula.
Geometria Tradução Higino H. Domingues. São Paulo: Atual, 1997.
FONSECA, M da C F. R. et al. O ensino da geometria na escola fundamental: três
questões para a formação do professor dos ciclos iniciais. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica,
2005
GOLDSTEIN, C. El uno es el outro: una historia del círculo. Em: SERRES, S. Historia de
las Ciencias. 2. ed. Madrid: Editora Catedra, 1998. p. 151-173.
JOSEPH, G. La Cresta Del Pavo Real: Las Matemáticas y sus Raíces no Europeas.
Madrid: Pirámide, 1996.
LIMA, E. Medidas e Formas em Geometria, comprimento, Área, volume e
semelhança. 4. ed. Rio de Janeiro: SBM, 2011.
MARTINEZ, M. L. S.; NOVELLO, T. P. Uma proposta para o ensino de geometria na
educação básica. 2013. In: Congresso Internacional de Ensino da Matemática, 6., 2013,
Canoas, Rio Grande do Sul/Brasil. Anais .... Canoas: ULBRA, 2013 Disponível em:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
120
<http://www. conferencias.ulbra.br/index.php/ ciem/vi/paper/viewFile/710/166>. Acesso
em: set. 2019.
MASINI, E. F. S., MOREIRA, M. A. Aprendizagem significativa na escola. 1. ed.
Curitiba, PR: CVR, 2017.
MEDEIROS, M. F.; BASSO, M. V. A. A tecnologia digital como estruturadora do
pensamento geométrico, Educ. Matem. Pesq., v. 22, n. 1, p. 444-461, 2020. Disponível
em: <https:// revistas.pucsp.br/emp/article/view/44122/pdf>. Acesso em: dez. 2019.
MOREIRA, M. A. Aprendizagem significativa: a teoria e textos complementares. São
Paulo: Editora Livraria da Física, 2011.
MOREIRA, M. A. A teoria da aprendizagem significativa e sua implementação em
sala de aula. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2006.
MOREIRA, M. A.; MASINI, E. F. S. Aprendizagem significativa: a teoria de David
Ausubel. 3ª reimpressão. São Paulo: Centauro, 2011.
NOVAK, J. Uma teoria de educação. São Paulo: Pioneira, 1981.
PAVANELO, R. M. O abandono do ensino da geometria no brasil: causas e
consequências, Zetetiké, v.1, n. 1, p. 7-17, 1993. Disponível em:
<https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index. php/zetetike/article/view/8646822/13724>.
Acesso em: out. 2019.
PEREIRA, A. C. C.; PEREIRA, D. E. Ensaio sobre o uso de fontes históricas no ensino de
matemática, REMATEC, v. 10, n. 18, p. 65-78, 2015. Disponível em: <
http://www.rematec .net.br/index.php/rematec/issue/view/19>. Acesso em: jul. 2019.
PERES, G. Pressupostos e reflexões teóricas e metodológicas da pesquisa participante
no ensino da geometria para as camadas populares. 1991. 374 f. Tese (Doutorado).
Universidade Estadual de Campinas – Faculdade de Educação/Campinas, 1991. Disponível
em: <http://www. repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/252275>. Acesso em: ago.
2019.
POZO, J. I. (1998). Aprendizagem e o ensino de conceitos. In: COLL, C.; POZO, J. I;
SARABIA, B.; VALLS, E. Os conteúdos na Reforma. Ensino e aprendizagem de
conceitos, procedimentos e atitudes. (Neves, B. A., Trad.). (pp. 17-72). Porto Alegre:
Artes Médicas.
QUARTIERI, M. T.; REHFELDT, M. J. H. Investigando conceitos no ensino de
geometria. 2007. In: IX Encontro Nacional de Educação Matemática, 2007, Belo
Horizonte. Anais eletrônicos. Disponível em:
<http://sbem.iuri0094.hospedagemdesites.ws/anais/ix_enem/Html
/comunicacaoCientifica.html>. Acesso em: 17 abr. 2019.
SENA, R. M.; DORNELES, B. V. Ensino de Geometria: Rumos da Pesquisa (1991-2011),
REVEMAT, v. 08, n. 1, p. 138-155, 2013. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index. php/revemat/article/view/1981-
1322.2013v8n1p138/25095> Acesso em: jul. 2019.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.100-121 ISSN: 2675-1909
121
SILVA, J. R.; SOUZA, E. C.; RUFINO, M. A. S. O ritual do toré como organizador prévio
para o conceito de círculo, Zetetiké, v.1, n.1, p.75-93, 2018. Disponível em:
<https://periodicos. sbu.unicamp.br/ojs/index.php/zetetike/article/view/8650471/17984>.
Acesso em: dez. 2019.
SIRERA, J. Historia de las Matemáticas em la Enseñanza Secundaria. Madrid:
Editorial Síntesis S.A., 2000.
VAZQUEZ, R. & CRUZ, R. Matemática Moderna. México: Trillas, 1972.
Maria Aparecida da Silva Rufino
Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Mata Norte; Secretaria Estadual de
Educação – PE
E-mail: [email protected]
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-4850-7228
José Roberto da Silva
Universidade de Pernambuco – UPE, Campus Mata Norte
E-mail: [email protected]
ORCID: http://orcid.org/0000-0003-2970-9702
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 21 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p122-142.id289 Aprovado em: 25 de novembro de 2020
Atividades investigativas no ensino de função afim: desafios e
possibilidades
Investigative activities when teaching affine function: challenges and
possibilities
Ivan Bezerra de Sousa
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
José Joelson Pimentel de Almeida
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
RESUMO
As atividades elaboradas por professores para suas aulas de Matemática apresentam diferentes
ramificações, todas com um mesmo propósito, a aprendizagem dos alunos sobre os assuntos
requeridos no currículo. No presente artigo expomos algumas reflexões sobre atividades
investigativas em sala de aula, destacando uma que envolve o ensino de função afim, mostrando
desde sua elaboração, até a aplicação e análise dos resultados obtidos. Trata-se de uma atividade
investigativa desenvolvida no ano de 2017, envolvendo uma turma de primeiro ano do Ensino
Médio. Considerando o contexto de aplicação, discutimos sobre o potencial de aulas investigativas
como metodologia a ser adotada no ensino de Matemática, considerando que a produção de
significados pode ocorrer de forma mais dinâmica a partir dos conhecimentos prévios e estratégias
pessoais de resolução de problemas, ou seja, considerando o repertório de conhecimentos e de
estratégias pessoais dos próprios alunos, podendo, inclusive, levar a diferentes resultados para uma
mesma situação. A atividade foi elaborada com ênfase na venda de geladinhos e foi dividida em
três etapas. Na primeira, foi discutido sobre isto como uma possibilidade de empreendedorismo; na
segunda, foi explorado um quadro com os ingredientes de nove sabores de geladinhos; e, na
terceira etapa, cada equipe trabalhou com um único sabor, com o objetivo de criar estratégias para
as vendas desse produto, descobrir o valor do custo de produção, do preço de venda e do lucro
obtido com dois geladinhos de tamanhos diferentes. A partir da investigação proposta e que era
particular para cada equipe, pediu-se que os alunos determinassem as funções que representavam o
preço de custo, de venda e de lucro de cada sabor de geladinho, os gráficos dessas funções e o
ponto de vista de cada uma delas sobre a atividade que estava em pauta. Foi constatado uma maior
interação entre os alunos, raciocínios diferentes para o mesmo fim e uma ótima oportunidade para
discutirmos situações tão presentes em nosso dia a dia, como o empreendedorismo e o capitalismo
que estão tão presentes em nosso cotidiano e na sociedade em que estamos inseridos.
Palavras-chave: Investigação matemática. Função afim. Produção e venda de geladinhos.
Produção de significados.
ABSTRACT
The activities developed by teachers for their Mathematics classes have different ramifications, all
with the same purpose, the students' learning about the subjects required in the curriculum. In the
present paper, we present some reflections on investigative activities in the classroom, highlighting
one that involves teaching affine function, showing since its elaboration, to the application and
analysis of the results obtained. This is an investigative activity developed in the year 2017,
involving a first-year high school class. Considering the context in which this strategy is applied,
we discuss the potential of investigative classes as a methodology to be adopted in the teaching of
Mathematics, considering that the production of meanings can occur more dynamically from
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
123
previous knowledge and personal problem solving strategies, that is, considering the repertoire of
knowledge and personal strategies of the students themselves, which can even lead to different
results for the same situation. The activity was designed with an emphasis on the sale of ice cups
(geladinhos) and was divided into three stages. At first, it was discussed about this as a possibility
of entrepreneurship; in the second, a table with the ingredients of nine flavors of ice cream was
explored; and, in the third stage, each team worked with a single flavor, aiming to create strategies
for selling this product, discovering the value of the production cost, the selling price and the profit
obtained with two different sized ice creams. Based on the proposed investigation, which was
specific to each team, students were asked to determine the affine functions that represented the
cost, sales and profit prices of each flavor of ice cream, the graphics of these functions and the
point of view of each of them about the activity that was on the agenda. It was found a greater
interaction between students, different reasoning for the same purpose and a great opportunity to
discuss situations that are so present in our daily lives, such as entrepreneurship and capitalism that
are so present in our daily lives and in the society in which we are inserted.
Keywords: Mathematical research. Affine function. Production and sale of ice cups (geladinhos).
Production of meanings.
Introdução
Aos professores de Matemática cabem preocupações sobre o planejamento de
atividades a serem desenvolvidas em sala de aula, principalmente porque, de um lado, há
alguns alunos que se identificam com a disciplina e se sentem satisfeitos com quaisquer
atividades e, por outro lado, há aqueles, a maioria, que tendem a rejeitar mesmo as
tentativas mais inovadoras, dificultando o trabalho do professor. A pergunta que os
professores costumam fazer é: De que maneira chamar a atenção dos alunos para a
execução de uma atividade? É uma boa pergunta, porém resposta definitiva não
encontramos.
Não é apenas hoje que a Educação Matemática e os professores engajados com o
fazer Matemática na sala de aula buscam respostas e alternativas para vencer esta pergunta.
Na busca por isto, apontamos alternativas metodológicas que, dependendo das
circunstâncias, podem incentivar os alunos a uma maior aproximação com o que é
ensinado no cenário escolar. Neste sentido é que apontamos uma possibilidade por meio de
investigações matemáticas na sala de aula, foco deste artigo.
Podemos afirmar que uma investigação matemática corresponde a uma
possibilidade metodológica de exercício da docência em que o professor utiliza atividades
que podem ser discutidas de forma individual ou em grupos, cujo objetivo envolve instigar
os alunos a buscarem resoluções com base no seu repertório de conhecimentos abordados
na escola e também nas suas vivências exteriores à sala de aula, aproximando, assim, os
discentes com o seu cotidiano. Assim desenvolvida, a atividade investigativa possibilita
uma aproximação entre os problemas propostos e os alunos, uma vez que estes são
desafiados à investigação e busca de caminhos e resoluções genuínas para a atividade
proposta.
Em numerosas experiências já empreendidas com trabalho investigativo,
os alunos têm mostrado realizar aprendizagens de grande alcance e
desenvolver um grande entusiasmo pela Matemática. Apesar disso, não
encaramos as investigações matemáticas como a chave que permite por si
só resolver todos os problemas do ensino da Matemática. Há muitas
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
124
outras atividades a realizar na sala de aula. (PONTE; BROCARDO;
OLIVEIRA, 2016, p. 10-11)
É neste sentido que apresentamos uma experiência envolvendo investigação
matemática desenvolvida em uma turma de 1º ano do Ensino Médio, na qual utilizamos a
temática de produção e venda de geladinhos, em uma proposta que envolve
empreendedorismo e reflexão sobre este tipo de atividade. Em termos de conteúdo
matemático, a proposta envolve função afim.
Investigações matemáticas na sala de aula
O desenvolvimento de investigações matemáticas em sala de aula, segundo Ponte,
Brocardo e Oliveira (2016), favorecem a produção de significados por parte dos
estudantes, além de seu potencial de levá-los ao entusiasmo para o estudo de Matemática.
Diante disto, essa metodologia pode contribuir para que os alunos compreendam os
conteúdos e procedimentos matemáticos abordados ao longo das aulas.
Diferentemente do que alguém possa julgar, investigações matemáticas em sala de
aula não são propostas a partir de atividades de difícil solução, que exigem malabarismos
do professor para poder explicar e resolver, são, na verdade, atividades sofisticadas no
sentido de exigir dos alunos um esforço cognitivo e organizacional para traçar caminhos
que possam levar à solução. Isto envolve os seus conhecimentos prévios e as estratégias
pessoais de resolução, além, é claro, dos conhecimentos (conteúdos e procedimentos) que
estão em discussão naquele contexto em sala de aula.
Em contextos de ensino e aprendizagem, investigar não significa
necessariamente lidar com problemas muito sofisticados na fronteira do
conhecimento. Significa, tão só, que formulamos questões que nos
interessam, para as quais não temos resposta pronta, e procuramos essa
resposta de modo tanto quanto possível fundamentado e rigoroso. Desse
modo, investigar não representa obrigatoriamente trabalhar em problemas
muito difíceis. Significa, pelo contrário, trabalhar com questões que nos
interpelam e que se apresentam no início de modo confuso, mas que
procuramos clarificar e estudar de modo organizado (PONTE;
BROCARDO; OLIVEIRA, 2016, p. 9)
Assim, percebemos que uma investigação em matemática possui em seu cerne a
capacidade de lidar com situações bem planejadas, que levem os alunos à busca de
estratégias a partir de seu repertório de conhecimentos. Ao professor, essa metodologia
permite perceber as capacidades cognitivas dos alunos e a gestão da resolução dos
problemas por parte dos indivíduos reunidos em grupos, algo que é dificultado em
atividades rotineiras.
Nesse sentido, uma atividade investigativa abordada na sala de aula, caracteriza-se
em um momento desafiador, mas cheio de significados, pois possibilita os discentes a
mobilizar suas ideias e conhecimentos prévios em diversos momentos durante a exploração
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
125
da atividade. Um problema desse tipo dá aos alunos a chance de descobertas fabulosas.
Nesse sentido, Polya (2006, p. 5) afirma o seguinte:
Uma grande descoberta resolve um grande problema, mas há sempre uma
pitada de descoberta na resolução de qualquer problema. O problema
pode ser modesto, mas se ele desafiar a curiosidade e puser em jogo as
faculdades inventivas, quem o resolver pelos seus próprios meios
experimentará a tensão e gozará o triunfo da descoberta. Experiências
tais, numa idade susceptível, poderão gerar o gosto pelo trabalho mental e
deixar, para toda a vida, a sua marca na mente e no caráter.
Estar envolvido em uma atividade de investigação pode implicar, para alunos e
professores, no envolvimento em altos níveis de pensamento matemático, uma vez que se
requer o comprometimento com processos matemáticos, como a busca por resultados
usando recursos diversos, como elaboração e teste de conjecturas, generalização e registros
(KWANG, 2002).
Tal qual previsto por Kwang (2002), como percebemos ao longo de nossa
investigação – e isto está detalhado mais adiante neste artigo –, os alunos se concentram e
entram em profunda discussão quando submetidos a atividades de cunho investigativo. Até
alunos que no início se mostram pouco motivados para a aprendizagem de tal conteúdo
matemático, acabam por participar ativamente da investigação.
Bird (1991) argumenta que há ganhos cognitivos e afetivos quando os professores
ensinam e são produzidos significados por meio de atividades desta natureza.
Um ponto importante a acrescentar a essa discussão é aquilo que concebemos como
estudar Matemática. Como discutimos em Almeida (2016), isto envolve toda uma
comunidade de investigadores e professores de Matemática, mas deve envolver também os
alunos dos diversos níveis de ensino, da escola básica à formação superior, inclusive em
cursos de formação inicial e contínua de professores de Matemática. Com esse
compromisso firmado em cada ambiente onde se desenvolve uma atividade matemática, de
ensino, a partir do repertório de conhecimentos e de estratégias de abordagem do problema
é que cada um dos envolvidos produz significados para as novidades com as quais se
defronta. Podemos dizer mesmo que essa produção de significados se dá na relação
dialógica entre o que já se sabe e as novidades com as quais nos defrontamos (ALMEIDA,
2016).
Dessa forma, como em Almeida (2016), propomos atividades envolvendo
investigação matemática, levando os alunos à corresponsabilização nas atividades
propostas em sala de aula, explorando significados. É dessa forma que entendemos e
propomos o verbo estudar, de Chevallard, Bosch e Gascón (2000), o que inclui os
pesquisadores, professores, os alunos e os pais dos alunos, estes que devem assumir o
compromisso de participar ativamente da vida escolar de seus filhos.
Assim, na resolução de um problema investigativo, os alunos têm a oportunidade
de organizar e desenvolver os seus modos de pensar, expressá-los aos seus colegas e
registrá-los de maneira adequada e, tais procedimentos levam os alunos a ganharem
confiança na sua capacidade cognitiva, pois aprendem a pensar e a chegar a resultados
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
126
interessantes com o seu repertório de conhecimentos advindos de outros momentos ao
longo de sua trajetória de estudante e de sujeito que vive imerso no meio social.
Uma investigação matemática, quando bem planejada e executada, favorece a
produção de significados de acordo com o contexto em que se desenvolve a atividade. Os
alunos, partindo dos seus próprios saberes, formulam conjecturas, que devem ser
negociadas e testadas, podendo ser confirmadas ou refutadas. A partir desta negociação
linguística, retórica, do confronto de ideias tão diferentes quanto os grupos e o professor
permitirem, os alunos devem alcançar um resultado que ainda pode ser contestado. Desta
forma, desde o princípio desse processo há produção de significados, nesse confronto entre
o que se sabe (o repertório dos alunos) e o que se vislumbra aprender.
Em suma, é possível perceber em uma investigação matemática na sala de aula uma
metodologia que ajuda no desenvolvimento da aprendizagem, favorecendo uma rica fonte
de exploração de conhecimentos, que permite novos direcionamentos tanto ao professor
quanto aos alunos nas aulas.
Aos professores, o trabalho com investigação matemática, permite quatro etapas
importantes: 1. desafiar os alunos; 2. avaliar o progresso dos alunos; 3. raciocinar
matematicamente com os alunos; 4. apoiar o trabalho dos alunos. Durante a execução
dessas etapas, o professor consegue perceber como os discentes trabalham
matematicamente; permite observar as dificuldades individuais de cada um, suas tentativas
e sua forma de pensar; ajuda a perceber como os alunos formulam suas conjecturas e como
procuram testá-las e prová-las; permite uma visão melhor dos processos de ensino e
aprendizagem em Matemática que se estabelecem na sala de aula, o que transforma a sala
de aula em um ambiente de comunicação, investigação, formulação, demonstração e
discussão de conhecimentos, fugindo à ótica da comum transmissão de saberes.
Já aos alunos, o trabalho com a investigação matemática permite que estes
apresentem maior entusiasmo pela Matemática ensinada na sala de aula, uma vez que, ao
agir como investigadores, estes começam com a formulação de questões e caminhem até as
discussões finais, tendo nesse intervalo a discussão de vários conhecimentos tanto do
conteúdo quanto de outros contextos. Uma aula investigativa também é capaz de dar voz
ao aluno, pois, ao final de toda a investigação, os alunos são chamados para discutirem os
seus resultados com todos os seus colegas, o que permite que a sua participação favoreça
também o envolvimento na sua própria aprendizagem e na aprendizagem dos demais.
Permite, por fim, que o aluno seja capaz de produzir significados de acordo com as
circunstâncias do momento da exploração das atividades investigativas.
Diante do exposto, uma investigação matemática através de atividades pode
favorecer um melhor desenvolvimento das capacidades cognitivas de uma turma, levando-
a a agir como detetives em busca do saber matemático.
Em síntese:
Aprender Matemática não é simplesmente compreender a Matemática já
feita, mas ser capaz de fazer investigação de natureza matemática (ao
nível adequado a cada grau de ensino). Só assim se pode verdadeiramente
perceber o que é a Matemática e a sua utilidade na compreensão do
mundo e na intervenção sobre o mundo. Só assim se pode realmente
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
127
dominar os conhecimentos adquiridos. Só assim se pode ser inundado
pela paixão “detetivesca” indispensável à verdadeira fruição da
Matemática. Aprender Matemática sem forte intervenção da sua faceta
investigativa é como tentar aprender a andar de bicicleta vendo os outros
andar e recebendo informação sobre como o conseguem. Isso não chega.
Para verdadeiramente aprender é preciso montar a bicicleta e andar,
fazendo erros e aprendendo com eles. (BRAUMANN, 2002, p. 5 apud
PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA, 2016, p. 19)
Dependendo da forma como for desenvolvida em sala de aula, a investigação
matemática pode trazer muitos benefícios, tanto para o professor quanto para os alunos,
favorecendo uma consolidação adequada dos conhecimentos matemáticos propostos.
Etapas de uma atividade investigativa
Envolvido no principal objetivo de uma aula investigativa está a busca pelo
conhecimento daquilo que ainda não se sabe. A partir de uma atividade ou de um conjunto
de atividades, o professor identifica as estratégias que os alunos utilizam para resolver os
problemas propostos, de tal forma que, do início ao final da atividade, é possível ao
docente perceber momentos de suma importância para que a investigação matemática seja
exitosa.
Uma atividade investigativa, de fato, necessita que seja desenvolvida em algumas
etapas, as quais podem ser denominadas momentos na realização de uma investigação,
conforme sintetizadas no quadro a seguir.
Quadro 1: Momentos na realização de uma investigação
Exploração e formulação de questões Reconhecer uma situação problemática
Explorar a situação problemática
Formular questões
Conjecturas Organizar dados
Formular conjecturas (e fazer afirmações
sobre uma conjectura)
Testes e reformulação Realizar testes
Refinar uma conjectura
Justificação e avaliação Justificar uma conjectura
Avaliar o raciocínio ou o resultado do
raciocínio
Fonte: Ponte, Brocardo e Oliveira (2016, p. 21)
Para estes autores,
[...] a realização de uma investigação matemática envolve quatro
momentos principais. O primeiro abrange o reconhecimento da situação,
a sua exploração preliminar e a formulação de questões. O segundo
momento refere-se ao processo de formulação de conjecturas. O terceiro
inclui a realização de testes e o eventual refinamento das conjecturas. E,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
128
finalmente, o último diz respeito à argumentação, à demonstração e
avaliação do trabalho realizado (PONTE; BROCARDO; OLIVEIRA,
2016, p. 20).
No decorrer do acontecimento de cada uma dessas etapas, o professor é capaz de
perceber a mobilização dos recursos cognitivos e afetivos dos seus alunos, pois os
discentes são convidados a agirem como matemáticos, não como meros resolvedores de
problemas e exercícios, como é costume ocorrer em boa parte das aulas de Matemática.
Um cenário de aula investigativa requer um maior engajamento dos alunos, como
afirmam Ponte, Brocardo e Oliveira (2006, p. 23):
Na disciplina de Matemática, como em qualquer outra disciplina escolar,
o envolvimento ativo do aluno é uma condição fundamental da
aprendizagem. O aluno aprende quando mobiliza os seus recursos
cognitivos e afetivos com vista a atingir um objetivo. Esse é,
precisamente, um dos aspectos fortes das investigações. Ao requerer a
participação do aluno na formulação das questões a estudar, essa
atividade tende a favorecer o seu envolvimento na aprendizagem.
Em uma aula de investigação, além de explorarem a fundo as situações propostas
que lhes são apresentadas, os discentes também argumentam, demonstram o porquê de
seus resultados e passam a ter voz dentro da sala de aula. Quanto aos professores, estes
passam a ter o papel de observadores do que ocorre ao longo da investigação, minimizando
o seu papel de resolvedor de problemas, passando assim a interrogar muito mais do que
tirar dúvidas dos alunos durante a investigação.
O professor, ao planejar suas aulas, programa o percurso, assim tendo um controle
sobre o modo como a aula deve se iniciar, porém não pode saber como vai terminar.
Durante o desenvolvimento da atividade, há três fases que precisam ser levadas em
consideração:
(i) introdução da tarefa, em que o professor faz a proposta à
turma, oralmente ou por escrito, (ii) realização da investigação,
individualmente, aos pares, em pequenos grupos ou com toda a
turma, e (iii) discussão dos resultados, em que os alunos
relatam aos colegas o trabalho realizado (PONTE;
BROCARDO; OLIVEIRA, 2016, p. 25)
Em resumo, podemos dizer que uma investigação matemática na sala de aula
dispõe de três fases, que são: I) o arranque da aula; II) o desenvolvimento do trabalho; e
III) a discussão da investigação, sendo cada uma dessas fases de suma importância para a
concretização da investigação posta, ocorrendo em consonância com os momentos
descritos no Quadro 1.
A primeira fase, o arranque da aula, diz respeito à introdução do trabalho, em que
o professor vai anunciar os objetivos, apresentar o que se espera dos discentes. Este é o
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
129
momento inicial, aquele momento em que o professor precisa esclarecer os alunos sobre o
sentido da atividade proposta. É nessa fase que ocorre a exploração e formulação de
questões sobre a atividade a ser investigada.
Nessa primeira fase os alunos podem fazer perguntas sobre o que devem fazer a
partir daquele momento, devendo se sentir acolhidos e livres para discutirem entre si e
desenvolverem autonomia para o percurso de toda a investigação. A fase introdutória deve
ser breve, para que o aluno não perca o seu interesse pela atividade.
Na segunda fase, o desenvolvimento do trabalho, distribuídos em pequenos ou
grandes grupos, os alunos partem para a realização da tarefa, seguindo as etapas descritas
anteriormente. Nessa fase os discentes começam a formular conjecturas e, a partir da
elaboração destas, começam os testes e a reformulação das mesmas. Essa segunda fase
abrange o segundo e o terceiro momentos de uma investigação.
Durante essa fase o professor observa o trabalho dos alunos na atividade
em andamento, presta apoio aos discentes sempre que necessário durante
a execução da tarefa, mas nunca lhe dando as respostas, porém apontando
o caminho para que os alunos raciocinem matematicamente e consigam
se encontrar na investigação. (SOUSA, 2018, p. 90)
A terceira fase corresponde à discussão da investigação, momento em que se
intensifica a partilha de conhecimentos, quando as principais ideias são colocadas em
pauta. Cabe ao professor estimular questionamentos entre os membros das equipes.
Quando a turma passa à justificação e avaliação como fatores preponderantes, os alunos
devem ser incitados à exposição de suas reflexões e ideias.
Segundo Ponte, Brocardo e Oliveira (2016, p. 41):
A fase de discussão é, pois, fundamental para que os alunos, por um lado,
ganhem um entendimento mais rico do que significa investigar, e por
outro lado, desenvolvam a capacidade de comunicar matematicamente e
de refletir sobre o seu trabalho e o seu poder de argumentação. Podemos
mesmo afirmar que, sem a discussão final, se corre o risco de perder o
sentido da investigação.
Vale salientar que essa metodologia tende ao sucesso quando o professor fica atento
ao que ocorre em cada grupo, uma vez que é necessário saber sobre o comportamento de
cada aluno diante dos enunciados estabelecidos.
O conceito de investigação matemática, como atividade de ensino-
aprendizagem, ajuda a trazer para a sala de aula o espírito da atividade
matemática genuína, constituindo, por isso, uma poderosa metáfora
educativa. O aluno é chamado a agir como um matemático, não só na
formulação de questões e conjecturas e na realização de provas e
refutações, mas também na apresentação de resultados e na discussão e
argumentação com os seus colegas e o professor. (PONTE;
BROCARDO; OLIVEIRA, 2016, p. 23)
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
130
A partir de atividades e sua gestão da forma como ora discutimos, por meio da
investigação, há uma correlação intensa entre o enunciado posto e os conhecimentos
prévios dos alunos, suas estratégias pessoais de resolução, que, no decorrer da discussão,
são compartilhadas com todos os envolvidos. Estabelece-se, também, uma relação entre os
conhecimentos requeridos e aqueles que estão como objetivos conceituais e
procedimentais. Desta forma, permite-se que alunos e professores possam produzir
significados acerca de conhecimentos matemáticos envolvidos nas atividades em
discussão. Por isto, consideramos as aulas investigativas como algo que pode se mostrar
eficaz para produção de significados.
Atividade investigativa: produção de geladinhos
A atividade que ora apresentamos foi elaborada para a pesquisa de campo do nosso
estudo (SOUSA, 2018). Em Sousa e Almeida (2018) há uma proposição completa dessa
atividade, na forma de produto educacional, intitulado Empreendedorismo e função afim:
contextos cotidianos e aulas investigativas. Nesse espaço, destacamos, resumidamente,
como aconteceu cada uma das três etapas de nossa investigação:
Etapa I: apresentação do texto Vender geladinho dá dinheiro? Tínhamos por
objetivo introduzir ideias sobre empreendedorismo;
Etapa II: apresentação de um quadro com nove sabores de geladinhos, com seus
respectivos ingredientes, para porções de 115 ml e de 180 ml;
Etapa III: apresentação da atividade a partir da qual os alunos teriam que montar
estratégias para a venda hipotética de 500 geladinhos por dia e, a partir disso,
apresentar custos de produção, de venda e lucro, modelando as situações com a
utilização da função afim, em suas formas algébrica e gráfica.
Etapa I: Leitura do texto
VENDER GELADINHO DÁ DINHEIRO?1
Vender geladinho pode não ser um grande negócio para se montar e nem tão
pouco será algo que poderá render rios de dinheiro, mas dá para ganhar uma boa grana
extra com isso.
Eu sinceramente não conheço ninguém que ficou rico vendendo geladinho, mas
conheço pessoas que conseguem um bom dinheiro para gastar no final de semana, pagar
suas contas no final do mês e até mesmo dar uma arrumada na vida, apenas fazendo e
vendendo geladinho das mais variadas formas.
Como vender geladinho?
O processo para começar a vender geladinho é muito simples e não requer toda a
estrutura usada para montar um negócio grande. Digo isso, porque a venda de geladinho
1Publicado em 26 de março de 2012, por José Neto. Disponível em
https://www.montarumnegocio.com/vender-geladinho-da-dinheiro/. Acessado em 11 mai 2017.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
131
é algo a se comparar com a venda de bijuterias ou de doces, pois é algo com um
investimento inicial extremamente baixo.
A minha principal dica é que você foque em locais onde exista uma grande
circulação de pessoas, como na porta de escolas, em parques de diversão e em locais onde
as pessoas praticam esportes, pois assim será mais fácil vender geladinho. Existem
pessoas que vendem também no semáforo, enquanto os carros estão parados, e pode ser
uma alternativa interessante.
Para começar, você precisa apenas dos ingredientes para fabricar seus
geladinhos, de um isopor ou de um carrinho para sair vendendo e de uma estratégia para
vender. O investimento inicial pode ser muito baixo, dependendo das suas pretensões, e o
lucro poderá vir de forma rápida, se você conseguir vender bastante todos os dias.
E aí, será que vender geladinho dá dinheiro?
Como eu disse no início, esse é aquele tipo de produto que não gera muito dinheiro
para todas as pessoas, mas se o seu objetivo for ganhar uma grana extra, então essa pode
ser uma ótima opção. A verdade é que tudo dependerá do seu desempenho nesse trabalho,
pois quanto mais pessoas conseguir impactar com seus produtos, mais dinheiro
conseguirá ganhar.
E você, o que acha desse tipo de empreendedorismo? Se você fosse um vendedor
de geladinhos como você faria para vender e lucrar cada vez mais?
Etapa II: Apresentação de possíveis sabores e seus ingredientes
Após a leitura do texto, passamos a discutir possíveis sabores e os ingredientes
relacionados a partir de um quadro que dispomos aos grupos. O quadro foi entregue com
algumas lacunas a serem preenchidas pelos alunos. Havia a possibilidade de composição
de geladinhos com porções de 115 ml ou 180 ml. Os geladinhos poderiam, então, variar no
sabor, no tamanho da embalagem utilizada e no preço de venda.
Quadro 2: Sabores, ingredientes e porções de geladinhos (Etapa II)
Sabor Ingredientes
Preço
dos
ingredientes,
em reais
Geladinho de leite
condensado
(12 porções de 115 ml)
(__ porções de 180 ml)
1 litro de leite;
3 colheres de chá de açúcar (50g);
1 caixa de leite condensado;
3 colheres de sopa de leite em pó (100g).
Geladinho de chocolate
econômico
(__ porções de 115 ml)
1 litro de leite;
1 caixa de leite condensado;
1 lata de creme de leite;
6 colheres de sopa de achocolatado (180g);
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
132
(08 porções de 180 ml) 4 colheres de sopa de açúcar (66g).
Geladinho azul
(15 porções de 115 ml)
(__ porções de 180 ml)
1 litro de leite;
2 colheres de sopa cheias de pó azul para
sorvete (100g);
5 colheres de sopa de açúcar (82g).
Geladinho de
mousse de maracujá
(__ porções de 115 ml)
(10 porções de 180
ml)
1 caixa de leite condensado;
1 lata de creme de leite;
3 colheres de chá de açúcar (50g);
½ litro de suco de maracujá (ou 02
maracujás, aproximadamente 400g);
½ litro de leite.
Geladinho de
amendoim
(20 porções de 115 ml)
(__ porções de 180
ml)
1 litro de leite;
3 colheres de açúcar (50g);
1 caixa de leite condensado;
400 g de amendoim torrado e moído.
Geladinho de
biscoito
(__ porções de 115 ml)
(10 porções de 180
ml)
1 litro de leite;
1 saquinho de suco artificial de sua
preferência;
3 colheres de açúcar (50g);
100 g de bolacha Maisena ou Maria.
Geladinho de coco
(06 porções de 115 ml)
(__ porções de 180
ml)
300 ml de leite;
2 colheres de açúcar (32g);
1 caixa de leite condensado;
1 pacote de 100 g de coco ralado.
Geladinho de
manga
(__ porções de 115 ml)
(13 porções de 180
ml)
4 mangas grandes sem fiapo
(aproximadamente 2 unidades por kg);
1 litro de leite;
1 caixa de leite condensado;
3 colheres de açúcar (50 g).
Geladinho de
goiaba
(15 porções de 115 ml)
(__ porções de 180
½ litro de leite;
3 colheres de açúcar (50g);
4 goiabas cortadas ao meio (aproximadamente
1 Kg);
1 caixa de leite condensado.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
133
ml)
Fonte: Receita da Hora2.
Etapa III: Investigação e modelagem da situação
Após a leitura do texto e análise do quadro, os alunos discutiram o seguinte
enunciado:
Depois da leitura do texto e da análise feita do quadro, imagine que vocês se
tornarão empreendedores da venda de geladinhos, sendo que na sua produção haja a venda
de 500 geladinhos, que variam em dois tamanhos: uns de 115 ml e outros de 180 ml.
Escolha uma das receitas do quadro da Etapa II e discutam em grupo de 4 pessoas,
estratégias para que as suas vendas sejam bem-sucedidas. Coloque todas as suas ideias no
papel, incluindo a escrita delas, as expressões matemáticas formuladas e os gráficos que
vocês conseguirem elaborar. Use o conteúdo de função afim para a discussão de suas
ideias. No final de tudo, elabore um cartaz para a divulgação de suas vendas.
Aspectos metodológicos
A atividade investigativa envolvendo a venda de geladinhos foi abordada em uma
turma do primeiro ano do Ensino Médio durante os meses de agosto e setembro do ano de
2017 em uma escola localizada na cidade de Sousa, sertão da Paraíba. No momento em
que essa investigação aconteceu, os alunos estavam estudando sobre função afim.
Importante assinalar que primeiro o professor da turma apresentou o conteúdo de função
afim, depois damos início à pesquisa envolvendo essa temática.
Por buscarmos compreender como uma investigação matemática na sala de aula
acontece, optamos por usar nesse estudo uma abordagem metodológica qualitativa, uma
vez que estivemos frente à frente com o objeto de pesquisa e com os seus participantes.
Nesta perspectiva, Lüdke e André (1987) afirmam que a pesquisa qualitativa apresenta o
ambiente natural como fonte direta dos dados e o pesquisador como o seu principal
instrumento.
A pesquisa qualitativa permite ao pesquisador uma análise mais profunda da
obtenção de dados descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos, por isso,
nossa escolha, pois estivemos o tempo todo em contato direto com a situação estudada, o
que nos ajudou a compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos da
situação em estudo.
Dentre as inúmeras modalidades de pesquisa qualitativa em Educação, a nossa
pesquisa se enquadra em uma modalidade denominada pesquisa exploratória. Seu caráter
exploratório está no fato dela explorar um determinado problema de estudo com vista a
compreendê-lo com mais detalhes, pois a pesquisa exploratória permite uma maior
aproximação entre o pesquisador e o assunto pesquisado, no qual, a partir do
2 http://receitatodahora.com.br/7-receitas-de-geladinho-imperdiveis-para-fazer-e-vender/. Acessado em mai
2017.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
134
aprofundamento na investigação posta, é possível encontrar as reais causas para os
objetivos em estudo.
Para a realização dessa pesquisa algumas etapas foram seguidas, baseando-se nos
princípios que regem as investigações matemáticas na sala de aula. Essas etapas foram
regidas pela aplicação de questionários (sendo dois deles com questões objetivas e os
outros dois com questões discursivas) e pelo desenvolvimento das etapas que precisam ser
seguidas em uma atividade investigativa. Essa pesquisa contou com oito encontros e
dezenove aulas.
Os dados obtidos no trabalho de campo foram levantados por meio dos registros
dos alunos em cada etapa da atividade aplicada. Nessas observações utilizamos como
instrumentos o diário de bordo, gravações de áudio e uma câmera fotográfica. No
momento em que os sujeitos da pesquisa apresentavam alguma estratégia para a resolução
da atividade em andamento fazíamos as observações necessárias, utilizando fotografias e
anotações pertinentes àquele momento.
O processo avaliativo aconteceu continuamente durante toda a atividade através da
participação dos alunos, dos questionamentos, da realização da investigação e nas
reflexões feitas na sala de aula sobre o tema proposto.
Resultados e discussão da atividade investigativa
As discussões que ora apresentamos sobre a execução da atividade investigativa
proposta têm por objetivo problematizar os resultados que encontramos em nossa pesquisa,
a qual contou com a participação de 35 discentes, organizados em oito equipes.
No primeiro encontro, desenvolvemos a Etapa I da atividade, o que correspondeu a
três aulas; a Etapa II durou três encontros, totalizando seis aulas; e a Etapa III durou três
encontros, em um total de sete aulas. O último encontro foi dedicado à discussão da
investigação, durando três aulas.
Percebemos no decorrer desses encontros diferentes atitudes e ações para uma
mesma atividade. Percebemos caminhos diferentes, percursos diferenciados para uma
mesma atividade. Percebemos que o repertório de leitura e a busca por estratégias já
conhecidas e reconhecidas para abordagem do problema são diferentes para cada equipe e,
no interior de cada uma delas, diferentes entre os membros. Como vimos em Almeida
(2016), a negociação discursiva ocorrida no interior das equipes leva à percepção de que há
produções de significados amplos a partir de uma mesma atividade. Percebíamos entre as
equipes bastante empenho em resolver a atividade, pois os alunos em sua grande maioria,
como previa Bird (1991), se sentiam motivados para a investigação.
Na Etapa I começamos com o texto Vender geladinho dá dinheiro? E, a partir dessa
leitura, os alunos deram a sua primeira ideia sobre o que achavam da venda de geladinhos
e que estratégias eles adotariam, caso fossem um empreendedor desse ramo de negócio.
Algumas equipes comentaram que vender geladinhos era um bom negócio para gerar uma
renda extra e duas equipes mencionaram que não achavam esse tipo de venda um bom
negócio. Essa atividade inicial foi bem simples e muito importante porque foi o arranque
inicial da pesquisa, em que precisávamos ouvir as ideias dos alunos sobre o que estávamos
propondo em nossa proposta de intervenção.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
135
Em seguida, na Etapa II, ao receber o quadro com diferentes sabores de geladinhos,
os alunos deveriam preencher as lacunas, inclusive adotando um preço para cada
ingrediente presente, segundo o que tinham de conhecimento acerca do comércio local. No
decorrer dessa etapa, notamos uma grande preocupação de cada membro para colocar o
valor mais próximo do valor real, tanto é que até panfletos de supermercados uma equipe
trouxe durante dois encontros, sem nada mencionarmos enquanto estávamos no trabalho
em campo. Nessa etapa estavam presentes os ingredientes para porções de 115 ml e 180
ml. O primeiro passo deles era descobrir, por meio de estratégias pessoais, inclusive regra
de três simples, as porções de um dos tamanhos, conhecendo-se o rendimento da outra
porção.
Também pedimos que, a partir do valor que eles atribuíram para os ingredientes de
cada sabor, calculassem o preço de custo de cada geladinho, de acordo com o seu tamanho,
e atribuíssem um valor para o preço de venda e, finalmente, calculassem o preço do lucro
que cada porção renderia.
Como eram muitos sabores diferentes, optamos por fazer um sorteio entre as
equipes para que cada uma delas abordasse as suas ideias apenas para um único sabor. Ao
término da Etapa II os alunos apresentaram os valores atribuídos aos ingredientes, o total
de porções de 115 ml e de 180 ml de cada um e os gastos gerais de cada sabor.
Apresentamos no quadro a seguir apenas os gastos com ingredientes do sabor que foi
sorteado para eles desenvolverem as estratégias na Etapa III. Além dos gastos gerais,
apresentamos também o total de porções encontrados para a produção dos geladinhos de
115 ml e 180 ml.
Quadro 3: Alguns resultados da Etapa II
EQUIPE SABOR DO
GELADINHO
GASTOS
TOTAIS COM
CADA SABOR
TOTAL DE
PORÇÕES DE
115 ml
TOTAL DE
PORÇÕES DE
180 ml
01 LEITE CONDENSADO R$ 9,15 12 07
02 CHOCOLATE
ECONÔMICO R$ 10,10 12 08
03 AZUL
R$ 3,86 15 09
04 MOUSSE DE
MARACUJÁ R$ 9,30 16 10
05 BISCOITO
R$ 4,60 16 10
06 COCO
R$ 6,66 06 04
07 MANGA
R$ 9,60 20 13
08 GOIABA
R$ 7,60 15 09
Fonte: Sousa (2018, p. 183-185).
Ao final da Etapa II os alunos também mostraram os valores de produção obtidos,
os valores de vendas que eles atribuíram e os valores correspondentes ao lucro de cada
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
136
unidade para os geladinhos de 115 ml e para os de 180 ml, respectivamente, conforme
mostramos no Quadro a seguir.
Quadro 4: Valor do custo de produção, do preço de venda e do lucro dos geladinhos
Equipes
Geladinho de 115 ml (01 porção)
(Valor em reais)
Geladinho de 180 ml (01 porção)
(Valor em reais)
Custo de
produção
Preço de
venda Lucro
Custo de
produção
Preço de
venda Lucro
01 R$ 0,76 R$ 1,25 R$ 0,49 R$ 1,30 R$ 2,00 R$ 0,70
02 R$ 0,84 R$ 1,00 R$ 0,16 R$ 1,26 R$ 1,50 R$ 0,24
03 R$ 0,25 R$ 0,75 R$ 0,50 R$ 0,42 R$ 1,00 R$ 0,58
04 R$ 0,60 R$ 1,00 R$ 0,40 R$ 1,00 R$ 1,50 R$ 0,50
05 R$ 0,30 R$ 1,00 R$ 0,70 R$ 0,46 R$ 1,25 R$ 0,79
06 R$ 1,11 R$ 1,50 R$ 0,39 R$ 1,66 R$ 2,00 R$ 0,34
07 R$ 0,48 R$ 0,75 R$ 0,27 R$ 0,73 R$ 1,00 R$ 0,27
08 R$ 0,50 R$ 1,50 R$ 1,00 R$ 0,84 R$ 2,00 R$ 1,16
Fonte: Sousa (2018, p. 187).
Diante dos resultados encontrados percebemos, no Quadro 4, que dependendo do
sabor do geladinho algumas equipes chegaram à conclusão que uns gastariam mais com
ingredientes do que outros. As equipes observaram que as porções de 115 ml gerariam um
lucro maior do que aqueles relativos às porções de 180 ml, o que não foi bem assim no
começo da atividade, sendo outras conjecturas formuladas ao longo da investigação.
Com esses dados, o próximo passo de cada equipe seria estabelecer uma estratégia
de venda para 500 unidades diárias, conforme foi anunciado na atividade da Etapa III.
Cada equipe iria fazer uma distribuição das 500 unidades, com os sabores escolhidos (por
sorteio) na Etapa II. Nessa nova etapa o grupo tinha a missão de fazer a divisão dessas 500
unidades entre os dois tamanhos de embalagens fornecidos. Cada uma das equipes iria
fazer isso conforme o consenso do grupo, em que usariam ideias para que as vendas
pudessem sempre render mais lucro.
Nessa Etapa, a ideia foi abordar o conteúdo de função afim para o que eles tinham
feito, sendo que cada equipe se responsabilizaria pela modelagem dessas funções, relativos
ao custo, à venda e ao lucro, referentes à cada sabor. Essas funções tinham x como variável
independente, representando a quantidade de geladinhos, e, como variável dependente, y =
f(x), representando ora o custo de produção, ora o preço de venda, ora o lucro. Também
atribuímos a responsabilidade de criação de estratégias de venda à cada equipe, incluindo a
criação de marketing para promoção do produto.
A seguir, apresentamos o Quadro 5 com as respectivas funções para ambos os
tamanhos dos geladinhos, conforme modeladas pelas equipes.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
137
Quadro 5: Funções que modelam o custo de produção, o preço de venda e o lucro dos
geladinhos
Equipes Geladinho de 115 ml
(01 porção)
(função afim)
Geladinho de 180 ml
(01 porção)
(função afim)
Custo de
produção
Preço de
venda
Lucro Custo de
produção
Preço de
venda
Lucro
01 𝑓(𝑥) = 0,76𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,25𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,49𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,30𝑥
𝑓(𝑥)
= 2,00𝑥
𝑓(𝑥) = 0,70𝑥
02 𝑓(𝑥) = 0,84𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,16𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,26𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,50𝑥
𝑓(𝑥) = 0,24𝑥
03 𝑓(𝑥) = 0,25𝑥 𝑓(𝑥)
= 0,75𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,50𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,42𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥) = 0,58𝑥
04 𝑓(𝑥) = 0,60𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,40𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,50𝑥
𝑓(𝑥) = 0,50𝑥
05 𝑓(𝑥) = 0,30𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,70𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,46𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,25𝑥
𝑓(𝑥) = 0,79𝑥
06 𝑓(𝑥) = 1,11𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,50𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,39𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,66𝑥
𝑓(𝑥)
= 2,00𝑥
𝑓(𝑥) = 0,34𝑥
07 𝑓(𝑥) = 0,48𝑥 𝑓(𝑥)
= 0,75𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,27𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,73𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥) = 0,27𝑥
08 𝑓(𝑥) = 0,50𝑥 𝑓(𝑥)
= 1,50𝑥
𝑓(𝑥)
= 1,00𝑥
𝑓(𝑥)
= 0,84𝑥
𝑓(𝑥)
= 2,00𝑥
𝑓(𝑥) = 1,16𝑥
Fonte: Sousa (2018, p. 189).
Pela análise do Quadro 5 é possível perceber diversos significados que as equipes
obtiveram com a atividade ao longo das etapas, sendo possível observar uma grande
coerência de uma etapa para outra. Ficamos contentes também por atingir a meta da
atividade que consistia na elaboração das funções de cada sabor para o custo, a venda e o
lucro de cada um dos tamanhos dos geladinhos.
Durante a discussão da investigação, as equipes também apresentaram os gráficos
dessas funções e os cartazes de divulgação, em que cada equipe ficou responsável por dar
um nome ao seu empreendimento e apresentar as opções de geladinhos, bem como outros
detalhes que ficaram a critério de cada equipe. A seguir mostramos duas imagens, uma
correspondendo aos gráficos das funções encontradas pelos alunos e a outra
correspondendo ao cartaz de divulgação de uma das equipes.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
138
Figura 01: Gráficos das funções do geladinho de 115 e 180 ml da Equipe 07
Fonte: Sousa (2018, p. 201).
Figura 02: Fotografia do cartaz elaborado pela Equipe 05
Fonte: Sousa (2018, p. 196).
Diante das imagens apresentadas e das funções encontradas pelas equipes,
percebemos que uma profunda investigação foi feita durante a execução da atividade,
sendo perceptível a interação de todos em cada etapa e o compromisso que assumiram
diante da tarefa posta. Essa interação também foi bem visível durante a fase final, que
constituiu na discussão final da investigação, quando os alunos apresentaram um alto grau
de interação entre si, principalmente defendendo o seu ponto de vista sobre o desenrolar de
toda a investigação.
Na atividade que aplicamos percebemos que a contextualização, envolvendo
empreendedorismo em aulas investigativas, nos fez refletir ao perceber melhor o
desenvolvimento do pensamento e conhecimento matemático do aluno. Ou seja, os alunos
utilizaram Matemática no levantamento de ideias, nas tomadas de decisões sobre o preço
dos ingredientes, na elaboração das funções do custo, da venda e do lucro, na elaboração
dos gráficos dessas funções e na preparação do material de marketing dos produtos, tudo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
139
isto tendo surgido de ideias oriundas de cada equipe, gerando muitos conhecimentos para a
turma.
Considerações finais
A pergunta de Bird (1991) permanece viva e era também a nossa: como podemos
abordar um assunto previsto no currículo, por meio de um plano de estudos, envolver os
estudantes na execução de seu próprio pensamento matemático? Imbuídos desta indagação,
percebemos que a atividade proposta, segundo a abordagem posta, trouxe resultados
significativos.
Diante das ideias desenvolvidas, dos dados coletados e dos resultados obtidos,
pudemos perceber que o uso de contextos cotidianos na sala de aula pode contribuir para
uma formação humana a partir da Educação Matemática, de forma significativa. Como
apresentamos em Sousa (2018), o mais importante dessas aulas é que os alunos não têm
uma resposta pronta, são desafiados a lapidarem suas ideias na busca por resultados. O
mais interessante é que, de início, pode parecer complicado para os alunos e complexo para
os professores, mas, de repente, nos surpreendemos com os resultados.
Ao longo de nossas discussões foi possível perceber que uma atividade de um
contexto cotidiano sendo articulada com a metodologia das investigações matemáticas na
sala de aula favoreceu a compreensão dos discentes para várias outras ideias.
Essa investigação possibilitou um desafio tanto aos pesquisadores quanto aos
alunos envolvidos, e esse desafio proporcionou uma situação de equilíbrio entre o
conhecimento matemático discutido e a autonomia da turma para serem autores de sua
própria investigação. Como nos faz refletir Paulo Freire (2016, p. 25) ao afirmar:
O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não
um favor que podemos ou não conceder uns aos outros. Precisamente porque
éticos podemos desrespeitar a rigorosidade da ética e resvalar para a sua
negação, por isso é imprescindível deixar claro que a possibilidade do desvio
ético não pode receber outra designação senão a de transgressão. O professor que
desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético, a sua inquietude, a
sua linguagem, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que ironiza o aluno,
que minimiza, que manda que “ele se ponha em seu lugar” ao mais tênue sinal de
sua rebeldia legítima, tanto quanto o professor que se exime do cumprimento do
seu dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à experiência formadora
do educando, transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa
existência.
Nas palavras de Freire podemos perceber que o professor nunca deve achar que ele
é o dono de todo o conhecimento dentro da sala de aula. É preciso buscar o equilíbrio entre
o que ele sabe e o que os alunos têm a acrescentar aos conhecimentos abordados no
ambiente escolar. É preciso que o professor possa interagir com os seus alunos na sua
prática pedagógica, e o trabalho com aulas investigativas desempenha muito bem esse
papel.
Como comentamos na introdução, essa não é uma fórmula mágica, mas uma
metodologia que pode contribuir para as aulas de um professor de Matemática que procura
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
140
incorporar ideias inovadoras nesse componente curricular e, conforme percebemos ao
longo da pesquisa, uma aula investigativa propõe vários aprendizados aos alunos e também
ao professor, pois o docente consegue enxergar potencialidades nos seus alunos que em
outros momentos não conseguira, favorecendo assim novas descobertas para ambas as
partes.
Em uma simples atividade sobre a venda de geladinhos foi possível destacar que,
além da exploração matemática, em que os alunos partiram de uma ideia inicial até a
chegada da função afim, outras ideias poderiam ser exploradas, como as questões voltadas
para o empreendedorismo no século XXI, sobre as dificuldades de ser um pequeno
empreendedor no mercado regido pelas políticas neoliberais, entre tantas outras indagações
que podiam ir muito além da exploração puramente matemática e aprimorar a criticidade
de cada aluno para outros detalhes, que são de suma importância para o nosso cotidiano.
Neste sentido, vale a pena ressaltar que atividades envolvendo empreendedorismo,
como a que apresentamos, carecem de reflexões aprofundadas sobre aspectos de outra
natureza, como de apropriação de capital, sob pena de se cair em uma formação com
ditames neoliberais, o que não contribuiria para uma formação adequada aos dias atuais,
em que deve se buscar uma formação humana em que o social e o comum devem se
sobrepor ao que rege os produtores do capital. Como propõe Paulo Freire, é preciso
transgredir essa forma cada mais exposta de controle do comportamento dos alunos e dos
professores. Mas isto já é outra história, tema para outro artigo, que se encontra em ritmo
de elaboração.
Diante disso percebemos que ao propor atividades investigativas, é importante que
o professor fique atento a detalhes que partem de cada equipe ou de cada aluno, pois o
conjunto de cada ideia favorece discussões riquíssimas ao final de toda investigação.
Em nossa pesquisa, ao longo dos oito encontros, muitos significados foram
produzidos pelos alunos e a fase final da investigação favoreceu um momento de muito
aprendizado, pois as equipes discutiram entre si, explicitando às demais os seus
pensamentos, desafios e as suas descobertas, compartilhando conhecimentos.
Após essa experiência, que achamos exitosa pelos significados que ela trouxe aos
alunos para compreender o conceito de função afim na prática, defendemos um ensino que
mostre ao aluno que ele também é capaz de pensar matematicamente, que partindo de uma
ideia é possível explorar diversas outras ideias e que o cotidiano é recheado de ideias
puramente matemáticas, que precisam ser vislumbradas com outros olhares. Sendo assim, a
metodologia com aulas investigativas pode ser a aliada para que o encontro entre cotidiano,
matemática e sala de aula possam se efetivar.
Em suma, as ideias discutidas ao longo da construção desse artigo nos ajudou a
compreender que uma investigação matemática na sala de aula, dependendo do contexto
circunstanciado dos discentes, pode melhorar a forma como o professor consegue captar os
conhecimentos dos seus alunos, no quesito de conhecimentos matemáticos, assim como
pode ajudar aos discentes a perceberem que eles ao usarem as suas próprias ideias podem
chegar a resultados surpreendentes.
Logo, é preciso que o professor de Matemática explore mais a capacidade
intelectual dos seus alunos, que acredite no potencial de cada um, e que este possa
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
141
perceber, ao longo de sua prática, que ensinar Matemática vai muito além de pedir aos
alunos que decorem fórmulas e mais fórmulas e resolvam exercícios e mais exercícios,
pois é preciso que este dê a oportunidade do seu aluno perceber a beleza da Matemática,
que motive-os a enxergarem ideias naquilo que parece obscuro. Dessa forma, aulas
investigativas se constituem em uma grande oportunidade para que o aluno se torne um
sujeito ativo em se processo de aprendizagem e nos processos de ensino que vigoram em
sala de aula.
Portanto, partindo desta e de outras experiências com aulas investigativas, podemos
afirmar que para os docentes de Matemática que almejam o melhor para os seus alunos,
que visam a criticidade como ponto importante para o desenvolvimento dos discentes, esta
metodologia pode ajudar bastante para que os alunos tenham autonomia e sejam
protagonistas do seu próprio aprendizado.
Referências
ALMEIDA, José Joelson P. Gêneros do discurso como forma de produção de
significados para aulas de matemática. São Paulo/ Campina Grande: Livraria da Física/
Eduepb, 2016.
BIRD, Marion H. Mathematics for young children: An active thinking approach.
London: Routledge, 1991.
CHEVALLARD, Yves; BOSCH, Marianna; e GASCÓN, Josep. Estudiar matemáticas:
el eslabón perdido entre enseñanza y aprendizaje. 2. ed. Barcelona: Horsori Editorial,
2000.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 53ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2016.
KWANG, Teong Su. An Investigative Approach to Mathematics Teaching and Learning.
The mathematics educator. 2002. v. 6, n. 2, 32-46.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: EPU, 1987.
POLYA, George. A arte de resolver problemas. Tradução de Heitor Lisboa de Araújo. 2ª
ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2006.
PONTE, João P.; BROCARDO, Joana; OLIVEIRA, Hélia. Investigações matemáticas na
sala de aula. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016.
SOUSA, Ivan B. Produção de significados a partir de investigações matemáticas:
função afim e contextos cotidianos. 2018. 250f. Dissertação (Mestrado) – Universidade
Estadual da Paraíba – UEPB, Campina Grande, 2018.
SOUSA, Ivan B.; ALMEIDA, José Joelson P. Empreendedorismo e função afim:
contextos cotidianos e aulas investigativas. Campina Grande, PB: PPGECEM-UEPB,
2018. Disponível em http://pos-graduacao.uepb.edu.br/ppgecm/produtos-educacionais/.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.122-142 ISSN: 2675-1909
142
Ivan Bezerra de Sousa
Secretaria da Educação e da Ciência e Tecnologia – PB
E-mail: [email protected]
ORCID: 0000-0001-8668-7111
José Joelson Pimentel de Almeida
Universidade Estadual da Paraíba – UEPB
E-mail: [email protected]
ORCID: 0000-0001-8210-584X
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 26 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p143-162.id290 Aprovado em: 21 de novembro de 2020
As atividades experimentais no ensino de matemática
Experimental activities in the teaching of mathematics
Pedro Franco de Sá
DMEI, GCEM, PPGED, PMPEM-UEPA e REAMEC
RESUMO
Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa sobre o ensino de matemática por meio de
atividades tendo como base a Teoria da Atividade que objetivou distinguir as atividades utilizadas
no ensino de matemática no Brasil. Os resultados indicam que as atuais Tendências em Educação
Matemática: Resolução de Problemas, Etnomatemática, Modelagem, Uso de Jogos, Uso de
Tecnologias, Uso da História e Investigação Matemática, realizam procedimentos que podem ser
caracterizados como atividades no sentido da Teoria da Atividade e que é a organização do trabalho
didático, o produto obtido e a forma de participação discente/docente de cada tendência que legitima
cada uma delas. Foi também possível concluir a existência de uma outra tendência ainda não
registrada na literatura, apesar de já praticada em muitas situações, que foi denominada de Ensino de
Matemática por Atividades Experimentais. Além disso, foi possível concluir a existência de oito
tipos de gerais de atividade para o ensino de matemática, cada uma com a possibilidade de subtipos.
Palavras-chave: Teoria da Atividade. Tendências da Educação Matemática. Ensino de Matemática
por Atividades Experimentais.
ABSTRACT
This work presents the results of a research on teaching of mathematics through activities based on
the Activity Theory which aimed to distinguish the activities used in the teaching of mathematics in
Brazil. The results indicate that the current Trends in Mathematics Education: Problem Solving,
Ethnomathematics, Modeling, Use of Games, Use of Technologies, Use of History and Mathematical
Research, perform procedures that can be characterized as activities in the sense of Activity Theory
and which is the organization of didactic work, the product obtained and the form of student / teacher
participation of each trend that legitimizes each of them. It was also possible to conclude the
existence of another trend not yet registered in the literature, although already practiced in many
situations, which was called Teaching of Mathematics by Experimental Activities. In addition, it was
possible to conclude the existence of eight types of general activities for teaching mathematics, each
with the possibility of subtypes.
Keywords: Activity Theory. Mathematics Education Trends. Teaching of Mathematics by
Experimental Activities
Introdução
O ensino de matemática escolar, que ocorre nos níveis fundamental e médio
brasileiro, tem recebido críticas já faz bastante tempo. Essas críticas tiveram como
consequências o surgimento de alternativas metodológicas para o trabalho pedagógico da
disciplina matemática.
Essas alternativas têm características próprias e organização de seu funcionamento
também. Essas alternativas metodológicas receberam a denominação de Tendências em
Educação Matemática e são denominadas como: Modelagem, Uso de jogos, Uso da História
da Matemática, Etnomatemática, Uso Tecnologias de Comunicação, Investigação
Matemática e Resolução de Problemas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
144
Essas Tendências usam com frequência a palavra atividade de um modo pouco
preciso, muitas vezes como sinônimo de ação, movimento ou realização, do que vem a ser
uma Atividade em cada Tendência. Apesar da existência de uma Teoria da Atividade que
foi desenvolvida por diversos pesquisadores desde o século dezenove.
Em muitos trabalhos brasileiros sobre o ensino de matemática a
palavra atividade é mencionada com frequência.
No contexto da Educação para Barichello e Guimaraes (2017, p. 186)
“a palavra atividade [pode ser considerada] como termo genérico
que se refere a qualquer solicitação, em geral vinda do docente, feita
em sala de aula e que resulte em ações por parte dos estudantes.”
Em Educação Matemática a palavra atividade já teve os seus adjetivos investigados
pelo menos por dois países: Inglaterra e Brasil.
Na Inglaterra os resultados do estudo foram publicados em Foster e Inglis ( 2017)
com a seguinte motivação “a percepção da existência de um grande número de adjetivos
utilizados em documentos oficiais, publicações de cunho acadêmico e materiais voltados
para docentes sem nenhum cuidado com [a] definição e [a] exemplificação do que cada um
deles significa.”
Com relação ao estudo realizado no Brasil os resultados foram publicados em
Barrichello e Guimarães (2017).
Neste trabalho apresentamos os resultados de uma pesquisa bibliográfica sobre o
ensino de matemática por meio de atividades tendo como base a Teoria da Atividade (TA)
que objetivou distinguir as atividades utilizadas no ensino de matemática no Brasil.
Origens da Teoria da Atividade
Até o fim do século XIX essa palavra atividade ainda não possuía um significado
técnico associado a mesma. Com o desenvolvimento da Teoria da Atividade no século XX
foi produzida, entre outros resultados, a distinção entre atividade e ação.
Segundo Nuñez e Pacheco (1997) a Teoria da Atividade teve seu início com as
investigações de Vigotski na então União Soviética da década de 30 do século XX. Esta
posição é referendada por Libâneo (2004), entre outros autores.
Segundo Franco (2009, p.198)
“... a teoria da atividade [.........] procura estabelecer a diferença entre
atividade e ação, entre atividade animal e atividade humana e sua
vinculação com a atividade psíquica, sua base material, suas
necessidades, seus motivos e finalidades.”
Deste modo a Teoria da Atividade buscou estabelecer os elementos estruturantes
compõe uma atividade de modo geral.
De acordo com Franco (2009, p.198)
“a base material da teoria da atividade está na diferença da relação do
ser humano e os demais animais com a natureza. Na busca pela
satisfação de suas necessidades os animais se apropriam da natureza,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
145
mas não a transformam. Já os seres humanos também se apropriam da
natureza, a transformam e são transformados neste processo.”
Como consequência da diferença entre a relação do ser humano e os animais com
natureza, podemos concluir que na vida humana a Atividade é determinante sobre o
desenvolvimento das pessoas.
De acordo com Picoloo (2012) e Querol, Cassandre e Bulgacov (2014) a Teoria da
Atividade foi desenvolvida por pesquisadores tendo começado por Hegel, continuado com
Marx, seguido com Vygotsky, Luria, Rubinstein, Leontiev, Galperin, Dayvidov, Talizina e
Engestrom, entre outros pesquisadores.
Sobre o desenvolvimento histórico da Teoria da Atividade não há consenso. Para
mais detalhes historiográficos da Teoria da Atividade sugerimos a leitura de Piccolo (2012).
Segundo Engestrom (1987) e Sannino (2011) (apud Querol, Cassandre e Bulgacov,
2014, p. 408) “o conceito de atividade foi introduzido pelo filosofo alemão [...] Hegel que
reconheceu o papel da atividade produtiva e os instrumentos do trabalho no desenvolvimento
do conhecimento.”.
Ainda segundo Querol, Cassandre e Bulgacov (2014, p. 408) “As opiniões de Hegel
foram desenvolvidas por Marx, que considera o homem não apenas como um produto da
história e da cultura, mas também como transformador da natureza e um criador.”.
Para Querol, Cassandre e Bulgacov (2014, p. 408) “baseado no conceito de atividade
de Marx, Vygotsky criou a ideia de mediação cultural da ação humana, que tornou-se central
na Teoria da Atividade”.
Segundo Rolindo (2007) o trabalho de Vygotsky resultou em cinco teses que estão
expressas no Quadro 1 a seguir.
Quadro 1: Teses de Vygotsky
Teses Afirmação
Primeira
As características tipicamente humanas não estão presentes desde o
nascimento do indivíduo, nem são mero resultados das pressões do meio
externo.
Segunda
O desenvolvimento humano não é dado a priori, não é mutável e
universal, não é passivo nem tampouco independente do desenvolvimento
histórico e das formas sociais da vida humana.
Terceira O cérebro pode servir a novas funções, criadas na história do homem, sem
que sejam necessárias transformações no órgão físico.
Quarta
São instrumentos técnicos e sistemas de signos, construídos
historicamente, que fazem a mediação dos seres humanos entre si e deles
com o mundo.
Quinta A análise psicológica deve ser capaz de conservar as características
básicas dos processos psicológicos, exclusivamente humanos.
Fonte: Rolindo (2007, p. 52)
Com estas teses a contribuição de Vigotsky sobre a Atividade ficou fortemente
marcada pelo conceito de mediação.
A contribuição de Leontiev veio como continuação do trabalho de Vygotsky por meio
da expansão da unidade de análise que em Vygotsky era focada nos indivíduos e que
Leontiev estendeu por meio da distinção entre ação individual e ação coletiva. Outra
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
146
contribuição importante de Leontiev foi a distinção entre ação e atividade (QUEROL,
CASSANDRE e BULGACOV,2014).
A ação é um componente da atividade, mas não a própria atividade. Além disso, uma
mesma ação pode compor várias atividades distintas.
Mais detalhes sobre a relação ação e atividade podem ser encontrados em Leontiev
(1984).
Outra contribuição de Leontiev foi a tipificação de Atividade Principal, Atividade
Guia ou Atividade Predominante. Segundo Leontiev (1988, apud Lima Sekkel, 2018, p.405)
“A atividade principal é a atividade que promove as principais
mudanças psicológicas na personalidade do sujeito em
determinado período de sua vida sendo, portanto, a atividade por
meio da qual os processos psíquicos tomam forma e são
reorganizados”.
Assim a Atividade Principal vai variar ao longo da vida do indivíduo, desde sua
infância até a idade adulta.
Segundo Lima e Sekkel (2018) Elkonin propôs a seguinte periodização da Atividade
Principal: comunicação emocional direta, atividade objetal-manipulatória, brincadeira de
papeis, atividade de estudo, comunicação íntima pessoal e atividade de estudo e profissional.
Além disso, segundo Nuñez e Pacheco (1997), Leontiev mostrou a indissociabilidade
entre a psique e atividade externa e também que a atividade interna psíquica é uma atividade
externa transformada.
Finalmente Engeström desenvolveu um outro modelo de sistema de atividade que
representa os relacionamentos básicos em sistemas de mediação da atividade humana. Para
Engeström a compreensão das ações individuais só é possível se houver a concepção de que
o objeto da atividade está em constante relacionamento com sujeito, objeto e instrumento,
assim como com os mediadores sociais (QUEROL, CASSANDRE e BULGACOV, 2014).
Segundo Eidt e Duarte (2007) para a teoria da atividade a função da escola é a de
socialização do conhecimento científico, filosófico e artístico produzido pela humanidade
através dos tempos, em suas formas mais elevadas.
Segundo Ferreira (2009), Lisboa (2009) e Pontelo (2009 apud Moreira, Pedrosa e
Pontelo (2011, p. 17)
“a Teoria da Atividade apresenta-se com um referencial capaz de
descrever e analisar práticas educativas constitutivas de ambientes de
aprendizagem diversos, na complexidade de seus elementos e da
relação entre eles”.
Em concordância com a última citação buscaremos na próxima seção deste trabalho
apresentar, com base na Teoria da Atividade, as características gerais de uma Atividade.
Características gerais de uma atividade
Os estudos sobre atividade que foram produzidos por Leontiev foram relatados em
Leontiev (1984).
Segundo Leontiev (1984) a estrutura geral da atividade apresenta o objeto como o
principal elemento e é composta também pela necessidade, pelo motivo – interno ou externo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
147
- e ação. Para Leontiev, a atividade direcionada a um objetivo é consequência das relações
sociais, que englobam a divisão do trabalho, sendo essa atividade estimulada por seu
produto, o qual, por sua vez, corresponde às necessidades de cada indivíduo envolvido no
trabalho.
Assim, para Leontiev (1984) uma Atividade tem os seguintes elementos: sujeito(s),
objeto, necessidade, motivo, objetivo, ação e produto.
A Teoria da Atividade que também foi estudada por Vasily Davydov. Em Davydov
(1999), em concordância com Rubinstien é apresentada uma abordagem diferenciada da
realizada por Leontiev, seja do ponto de vista da estrutura, seja do ponto de vista da natureza.
Davydov (1999) acrescenta o desejo aos elementos elencados por Leontiev e propõe uma
natureza interdisciplinar.
Assim podemos afirmar que uma Atividade, segundo Davydov (1999) é composta
de: sujeito(s), uma necessidade, um desejo, um objeto, um motivo, um objetivo, ações e um
produto.
Para Nuñez e Pacheco (1997), Leontiev propôs como elementos da estrutura
funcional da Atividade o que segue: a) um sujeito da atividade, b) um objeto da atividade,
c) motivos d) um objetivo, e) sistema de operações, f) a base orientadora da ação g) os meios
h) as condições i) o produto.
O sujeito da Atividade é quem realiza a atividade podendo ser um sujeito ou um
coletivo de sujeitos que participam da realização da mesma.
O objeto da Atividade é a matéria prima com a qual o(s) sujeito(s) da Atividade
começa(m) a atuar para obter um determinado produto. Este objeto pode ser material ou
ideal.
Os motivos da Atividade correspondem as motivações que levam o(s) sujeito(s) a
realizar(em) as ações relacionadas a Atividade.
O objetivo da Atividade é a representação imaginaria dos resultados possíveis de se
alcançar com a realização de uma ação concreta.
O sistema de operações da Atividade consiste dos procedimentos para realizar a
ação para transformar o objeto no produto desejado.
A base orientadora da ação se constitui pela imagem que o sujeito tem da ação que
vai realizar, bem como também da imagem do produto a obter.
Os meios da Atividade são os instrumentos adequados de que se vale o sujeito para
organização e realização da Atividade.
O produto da Atividade é o resultado obtido das transformações sobre o objeto da
Atividade que deve coincidir com objetivo da Atividade.
Agora que já temos conhecimento das características gerais de uma Atividade
analisaremos a Atividade Didática em particular.
Atividades Didáticas
O trabalho docente é percebido por meio da realização de diversas tarefas que
possuem características didáticas. Essas tarefas, de modo simplificado, podem ser vistas
como as seguintes: Planejamento, Organização, Execução do ensino, Aprofundamento,
Revisão, Avaliação e Feedback.
Cada uma dessas tarefas contém sujeito, objeto, motivos, objetivo, sistema de
operações, base orientadora da ação, meios, condições e produto, que são os elementos
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
148
funcionais de uma Atividade segundo Nuñez e Pacheco (1997) e todas estão relacionadas ao
trabalho didático por este motivo podem ser vistas como Atividades didáticas.
Em virtude do espaço para este trabalho não apresentaremos mais detalhes sobre cada
uma das Atividades Didáticas supra mencionadas. Nos concentraremos na Atividade de
Estudo proposta pelos estudos de Davydov.
A Atividade de Estudo
Os estudos de Davydov, que segundo Sforni (2004) foi orientando de doutorado de
Galperin, relativos à Teoria da Atividade focaram na atividade de estudo. A atividade de
estudo, segundo Querol, Cassandre e Bulgacov, (2014), era considerada por Leontiev como
a Atividade predominante das crianças em idade escolar.
Segundo Reis, Nehring e Breunig (2018), Davydov desenvolveu experimentos
formativos nas áreas de língua russa, matemática e artes por mais de 40 anos. Durante este
tempo as investigações foram centradas na Atividade de Estudo. Para Davydov (1988, p.165)
“O pensamento dos estudantes, no processo da atividade de estudo, de
certa forma, se assemelha ao raciocínio dos cientistas, que expõem os
resultados de suas investigações por meio das abstrações,
generalizações, e conceitos teóricos substantivas, que exercem um
papel no processo de ascensão do abstrato ao concreto.”
Esta posição de Davydov aponta para a necessidade de um trabalho pedagógico que
favoreça a realização de abstração, generalização e conceituação.
Essa interpretação é reforçada quando ainda segundo Davydov(1988, p.166)
“Embora o pensamento das crianças tenha alguns traços em comum
com o pensamento dos cientistas, artistas, filósofos da moral e teóricos
do direito, os dois não são idênticos. As crianças em idade escolar não
criam conceitos, imagens, valores e normas de moralidade social, mas
apropriam-se deles no processo da atividade de estudo. Mas, ao realizar
esta atividade, as crianças executam ações mentais semelhantes às
ações pelas quais estes produtos da cultura espiritual foram
historicamente construídos.”
Esta posição fortalece que a Atividade de Estudo não é uma reprodução do trabalho
dos cientistas, artistas ou filósofos, mas que deve proporcionar momentos de realizações de
ações mentais que contribuem para a realização do trabalho de pesquisadores do ramo do
conhecimento que está sendo trabalhado pedagogicamente.
Ainda segundo o autor em questão temos a seguinte recomendação para a Atividade
de Estudo, no que diz respeito as tarefas/ações realizadas durante a mesma: “[...] a tarefa de aprendizagem é produzida pelos escolares
mediante o cumprimento de determinadas ações, que passamos a enumerar:
transformação dos dados da tarefa a fim de revelar a relação
universal do objeto estudado;
modelação da relação diferenciada em forma objetivada, gráfica ou
por meio de letras;
transformação do modelo da relação para estudar suas propriedades
em “forma pura”;
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
149
construção do sistema de tarefas particulares que podem ser
resolvidas por um procedimento geral;
controle da realização das ações anteriores;
avaliação da assimilação do procedimento geral como resultado da
solução da tarefa de aprendizagem dada.” Davydov (1988, p.173)
Estas recomendações de Davydov indicam claramente a necessidade de um ensino
que tenha o protagonismo do estudante com a mediação do docente para que o processo de
ensino, aprendizagem e avaliação de um assunto seja bem sucedido.
Sobre as características da Atividade de Estudo, Davydov (1988) destaca que elas
devem solicitar do estudante: análise, dedução e domínio.
Essas solicitações são explicitadas da seguinte maneira:
“A tarefa de aprendizagem que o docente propõe aos escolares
exige deles: 1) a análise do material factual a fim de descobrir nele
alguma relação geral que apresente uma vinculação governada por
uma lei com as diversas manifestações deste material, ou seja, a
construção da generalização e da abstração substantivas; 2) a
dedução, baseada na abstração e generalização, das relações
particulares do material dado e sua união (síntese) em algum
objeto integral, ou seja, a construção de seu “núcleo” e do objeto
mental concreto; e 3) o domínio, neste processo de análise e
síntese, do procedimento geral (“modo geral”) de construção do
objeto estudado.” (Davydov, 1988, p. 170), Grifos nossos.
Davydov (1988) deixa claro que no momento da publicação de seu trabalho não havia
encontrado uma diferenciação precisa entre tarefa e problema. Também afirmou que a Teoria
da Atividade Estudo e a Teoria de Ensino baseada na resolução de problemas tinham muitas
semelhanças, mas que isso não excluía importantes divergências na interpretação do
conteúdo de vários conceitos. Logo o autor não admitia a correspondência entre a Teoria da
Atividade de Estudo e a Teoria de Ensino baseada na resolução de problemas.
Para mais detalhes sobre tarefa e resolução de problemas recomendamos a leitura de
Ponte (2017).
Atividades do Ensino de Matemática
O ensino de matemática pode ocorrer de diversas maneiras. Entretanto, essas maneiras
podem ser divididas em duas grandes categorias:
1) Com o protagonismo exclusivo do docente;
2) Com o protagonismo compartilhado por docente e os estudantes.
Quando o protagonismo é do docente normalmente se dá da seguinte forma:
apresentação de conceito/resultado/regra, seguida de exemplos, propriedades e questões para
serem resolvidas.
Nestes casos não é possível afirmar que está ocorrendo uma Atividade no sentido da
Teoria da Atividade por alguns motivos, entre temos os seguintes:
Não há ação em grupo;
Não há protagonismo de todos os participantes;
Não há um produto como final das ações;
As ações não são mediadas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
150
Quando o ensino acontece com o protagonismo compartilhado entre docente e
estudantes a literatura de Educação Matemática tem registrado diversas possibilidades de
Atividades de Ensino em função dos objetivos ou da participação dos envolvidos todas com
organizações próprias para o seu desenvolvimento.
As maneiras de realizar o ensino de matemática com protagonismo dos estudantes
são denominadas atualmente de Tendências da Educação Matemática. As Tendências em
Educação Matemática no momento registradas em Brasil (1998) são as seguintes: Uso de
Jogos, Resolução de Problemas, Uso da História da Matemática, Uso de Tecnologias e a
Etnomatemática.
A seguir analisaremos a relação entre as Tendências em Educação Matemática a
Teoria da Atividade.
As tendências em Educação Matemática como Atividades
Como já nos referimos anteriormente as atuais Tendências da Educação matemática
são: Modelagem, Uso de Jogos, Etnomatemática, Resolução de Problemas, História da
matemática, Investigação Matemática e Uso de novas tecnologias.
Neste momento apresentaremos quadros relativos à aula dentro de cada tendência da
Educação Matemática no Brasil em comparação com os elementos os elementos funcionais
de uma Atividade segundo Nuñez e Pacheco (1997).
O registro da mediação em cada quadro será omitido devido em todas Tendências
em Educação Matemática o docente explicitamente atua como mediador.
Quadro 2: Elementos da Atividade numa aula de matemática por meio de modelagem
Elemento funcional da
Atividade
Elemento da Atividade na aula com modelagem
matemática
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes
O objeto da atividade Conhecimento matemático/ problema ou situação
motivadora.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos ou
resposta para a situação explorada.
O objetivo Produzir/ analisar um modelo que permita analisar a
situação.
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das
características do fenômeno/ problema motivador.
A base orientadora da ação As informações prévias a respeito do
fenômeno/problema motivador.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização da modelagem.
As condições As relações que regem as informações referentes ao
fenômeno/problema em estudo.
O produto O modelo produzido/ análise do modelo
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 2 mostra que todos os elementos funcionais de uma Atividade
são encontrados na modelagem matemática em Educação Matemática. Isto permite
considerar que as aulas de matemática que usam a modelagem matemática como opção
metodológica atendem a todas as condições de uma Atividade de um modo geral e em
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
151
particular de uma Atividade de Estudo. Como consequência pode receber a justa
denominação de Atividade de modelagem. Deste modo podemos de maneira coerente
afirmar que durante uma aula em que se utiliza a modelagem matemática está se realizando
uma Atividade de Modelagem, como realizado por Braga (2015).
O Quadro 3 a seguir é relativo ao uso de Investigação Matemática nas aulas de
matemática.
Quadro 3: Elementos da Atividade numa aula de matemática por meio de Investigação
Elemento funcional da
Atividade
Elemento da Atividade na aula de matemática por
investigação matemática
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos.
O objetivo Produzir/analisar/validar conjecturas
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das
características da situação analisada.
A base orientadora da ação As informações prévias a respeito da situação.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização da investigação.
As condições As relações que regem as informações referentes a
situação.
O produto Conjectura/Conclusões válidas produzidas por meio da
investigação.
Habilidades desenvolvidas durante a investigação.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 3 permite perceber que todos os elementos funcionais da
Atividade são encontrados nas aulas de matemática com uso de Investigação matemática,
por este motivo é acertado denominar esse processo pedagógico de ensinar de Atividade de
Investigação com foi denominado por Varandas e Nunes (1999).
O Quadro 4 a seguir é relativo ao uso de jogos nas aulas de matemática e os elementos
funcionais da Atividade.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
152
Quadro 4: Elementos da Atividade numa aula de matemática por meio de jogos
Elemento funcional da teoria da
atividade
Elemento da Atividade na aula de matemática
com jogos
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático.
O motivo Necessidade de obter ou aprofundar aspectos/
habilidade relacionadas ao conhecimento
matemático.
O objetivo Participar de jogo com conteúdo matemático
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das regras
do jogo utilizado.
A base orientadora da ação As informações oriundas das regras do jogo.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização do jogo.
As condições As relações que regem as informações e os materiais
referentes ao jogo.
O produto Desenvolvimento de uma habilidade matemática.
Conhecimento matemático obtido.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 4 permite perceber que todos os elementos funcionais da
Atividade são encontrados nas aulas de matemática com uso de jogos. Os jogos são muito
comumente denominados de Atividade Lúdica, o que é também uma maneira adequada de
denominar tal tipo de Atividade no âmbito da Educação Matemática.
Vejamos agora o Quadro 5 relativo ao uso da História da Matemática nas aulas de
matemática.
Quadro 5: Elementos da Atividade numa aula de matemática com uso da História
Elemento funcional da
teoria da atividade
Elemento da Atividade na aula de matemática com
uso da história da matemática
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático/ problema ou situação
motivadora.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos.
O objetivo Oportunizar acesso a conhecimento matemático
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das
características do fenômeno/ problema motivador.
A base orientadora da ação As informações prévias a respeito da situação
apresentada.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização da atividade.
As condições As relações que regem as informações referentes a
situação apresentada.
O produto Conclusões produzidas durante a realização da atividade.
Habilidades desenvolvidas durante a realização da
atividade
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
153
A análise do Quadro 5 permite perceber que todos os elementos funcionais da
Atividade são encontrados nas aulas de matemática com uso da História da matemática, por
este motivo é acertado denominar esse processo pedagógico de ensinar matemática de
Atividade Histórica como fez Mendes (2001).
A literatura registra diversos trabalhos que abordam os possíveis usos da resolução
de problemas (objetivo, processo e ponto de partida) durante o processo de ensino e
aprendizagem de matemática, entre eles Sá (2005, 2006, 2008 e 2009) e Allevato e Onuchic
(2009). O Quadro 6 a seguir serve para todas abordagens da Resolução de Problemas no
ensino de matemática.
Quadro 6: Elementos da Atividade em aula de matemática por meio da Resolução de
Problemas
Elemento Funcional da
Atividade
Elemento da Atividade em aulas de matemática por
Resolução de Problemas
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático/ problema ou situação
motivadora.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos.
O objetivo Resolver problema(s), desenvolver habilidade especifica ou
introduzir conteúdo.
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar as informações oriundas
do(s) problema(s).
A base orientadora da ação As informações a respeito das informações e elementos do(s)
problema(s).
Os meios Os recursos disponíveis para a realização da resolução do(s)
problema(s).
As condições As relações que regem as informações referentes ao
fenômeno/problema em estudo.
O produto A solução do problema;
Domínio de uma técnica de resolução de problema ou
formalização de conteúdo especifico.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 6 mostra que todos os elementos funcionais de uma Atividade
são encontrados na aula realizada com uso da Resolução de Problemas como alternativa
metodológica do processo de ensino e aprendizagem. Isto permite considerar que quando se
usa a Resolução de Problemas em aula de matemática todos os elementos funcionais da
Atividade de Estudo estão presentes o que caracteriza essas aulas com tal tipo de Atividade.
Vejamos agora o Quadro 7 relativo ao uso da Etnomatemática nas aulas de
matemática.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
154
Quadro 7: Elementos da Atividade numa aula de matemática por meio da Etnomatemática
Elemento Funcional da
Atividade
Elemento da Atividade na aula por meio da
Etnomatemática
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos.
O objetivo Oportunizar o acesso a conhecimento matemático a partir das
práticas sociais de uma comunidade.
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das características da
prática social analisada.
A base orientadora da
ação
As informações prévias a respeito da prática social em análise
e do conteúdo matemático envolvido.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização das ações.
As condições As maneiras possíveis de realizar ações dentro dos limites da
prática social envolvida no estudo.
O produto Resultados obtidos como consequência do estudo da prática
social.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 7 mostra que todos os elementos funcionais de uma Atividade
são encontrados na aula realizada com uso da Etnomatemática como abordagem
metodológica do processo de ensino e aprendizagem. Isto permite considerar que quando se
usa a Etnomatemática em aula de matemática todos os elementos funcionais da Atividade
de Estudo estão presentes o que caracteriza que essas aulas são desenvolvidas por meio de
uma Atividade Etnomatemática.
Vejamos agora o Quadro 8 relativo ao uso da tecnologia nas aulas de matemática.
Quadro 8: Elementos da Atividade numa aula de matemática com uso de Tecnologia
Elemento funcional da
Atividade
Elemento da Atividade na aula da matemática com uso de
tecnologia
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático.
O motivo Necessidade de obter conhecimentos matemáticos.
O objetivo Oportunizar o acesso a conhecimento matemático por meio
do auxílio de ferramentas tecnológicas.
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir das características
da ferramenta tecnológica que está sendo utilizada.
A base orientadora da
ação
As informações prévias a respeito da ferramenta(s)
tecnológica(s) e do conteúdo matemático envolvido.
Os meios Os recursos tecnológicos disponíveis para a realização das
ações.
As condições As maneiras possíveis de realizar ações com a ferramenta
tecnológica/recurso tecnológico disponível.
O produto Resultados obtidos com o uso da ferramenta.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
A análise do Quadro 8 mostra que todos os elementos funcionais de uma Atividade
são encontrados na aula realizada com uso de Tecnologia. Isto permite considerar que a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
155
Tendência em Educação Matemática do uso Tecnologia em aula de matemática pode ser
considerada como uma genuína Atividade no sentido da Teoria da Atividade de um modo
geral e da Teoria da Atividade de Estudo.
Como podemos observar as aulas baseadas nas Tendências da Educação Matemática
Brasileira satisfazem os requisitos funcionais de uma Atividade de Estudo. O que mostra
que quando saímos do modo expositivo de ministrar aulas de matemática e utilizamos uma
das Tendências atuais da Educação Matemática estamos fazendo uso dos elementos
funcionais da Atividade de Ensino, em concordância com os estudos de Davydov e seus
seguidores.
As Atividades Experimentais
A literatura sobre Educação Matemática registra um tipo de aula com protagonismo
compartilhado por docentes e estudantes que não se caracteriza como nenhuma das
Tendências supra mencionadas, mas que também possui os elementos funcionais de uma
Atividade. Essa estratégia metodológica tem como característica ser a aula desenvolvida por
meio da realização de tarefas experimentais, elaboradas e acompanhadas pelo docente, com
o objetivo de levar o estudante ao encontro com um conhecimento matemático específico
após a execução de tarefas, registro de resultados, análise e reflexões sobre os resultados
obtidos culminando com a sistematização do conteúdo.
Em Sá (2019) esse processo de ensino de matemática foi denominado somente de
Ensino de Matemática por Atividade. Entretanto, com base nas considerações apresentadas
no presente texto julgamos mais adequado denominar a referida alternativa metodológica de
Ensino de Matemática por Atividades Experimentais, para assim diferenciar das demais
Atividades realizadas pelas outras Tendências em Educação Matemática consideradas neste
trabalho.
Desse modo podemos afirmar que o ensino de matemática por atividade
experimental é um processo didático desenvolvido por meio da realização de tarefas,
envolvendo material concreto ou ideias, elaboradas pelo professor com objetivo de levar
estudantes ao encontro com um conhecimento/conteúdo matemático especifico após a
realização da tarefa, do registro de resultados, análise e elaboração de reflexões sobre os
resultados obtidos que culmina com a sistematização ou institucionalização de um conteúdo
matemático.
A partir das considerações anteriores podemos admitir que as Atividades
Experimentais para o ensino de matemática podem ser classificadas sob diversos aspectos
que podem ser desde a natureza da participação do estudante até o objetivo da mesma. Em
suma o que Sá (1999 e 2019) denominou somente de Atividade doravante denominaremos
de Atividade Experimental.
Segundo Sá (1999) quanto a participação a atividade pode ser realizada por meio da
ação ou por meio da observação, principalmente quando houver manipulação de objetos
frágeis ou perigosos durante a realização das tarefas da atividade.
Em Sá (2019) encontramos a classificação das Atividades Experimentais em função
do objetivo da mesma gerando duas possibilidades de Atividades Experimentais: as de
conceituação e as de redescoberta.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
156
Devido a Atividade Experimental no ensino de matemática não ter sido discutida na
literatura, achamos procedente apresentar uma explicação mais minuciosa de como uma
Atividade Experimental é realizada.
Segundo Sá (2019) uma aula de matemática por meio de Atividade Experimental de
conceituação ou de redescoberta tem os seguintes momentos: organização, apresentação,
execução, registro, análise e institucionalização.
No momento da organização a turma deve ser, preferencialmente, organizada em
equipes com no máximo 4 estudantes e no mínimo 2, tal quantidade é fruto da nossa
experiencia com o ensino por Atividades Experimentais que indica uma tendência a
dispersão quando o número de participantes é superior a quatro. Mas pode também ocorrer
de forma individual o que não é recomendável por não estimular a troca de ideias que é
fundamental para o processo de aprendizagem. Esta organização deve ser preferencialmente
espontânea
O docente deve dirigir as ações, orientar a formação das equipes sem imposições,
demonstrar segurança e que planejou com cuidado as tarefas da Atividade Experimental e
evitar que os estudantes desperdicem tempo com ações alheias a organização da turma.
Durante o momento da apresentação da Atividade Experimental compete ao docente
distribuir o material necessário para a realização das tarefas da Atividade Experimental
incluindo o roteiro da mesma. O roteiro pode ser impresso ou disponibilizado no quadro o
que vai depender das condições estruturais da escola. Para Atividades Experimentais com
procedimento mais longo é preferível que o roteiro seja disponibilizado de forma escrita para
economizar tempo.
Esse material deve estar organizado em kits para facilitar a distribuição do material.
Este cuidado evita o desperdício de tempo. O esperado por parte dos estudantes é a atenção
às orientações apresentadas.
O momento da execução corresponde à etapa da experimentação quando o
pesquisador manipula os materiais, realiza medidas e/ou cálculo, compara e/ou observa.
Neste momento, numa aula por Atividade Experimental, espera-se que cada equipe realize
os procedimentos estabelecidos como tarefa.
O docente neste momento deve deixar as equipes trabalharem livremente,
supervisionar o desenvolvimento das ações e auxiliar nas dúvidas, quando solicitado ou
perceber dificuldade de execução, que possam surgir em cada equipe no ocorrer da
realização do procedimento.
Os estudantes neste momento devem procurar seguir as instruções previstas no
roteiro da Atividade Experimental, sem conversas paralelas ou atenção para assuntos alheios
a atividade. Também devem evitar deixar o grupo ou ficar visitando outros grupos.
Eles devem ter a oportunidade de agir para obter os resultados buscados, mas também
de receber orientações cuidadosas quando tiverem dificuldades ou duvidas para realizar
alguma ação prevista. As orientações devem ser claras e precisas para permitir o
prosseguimento da Atividade Experimental sem constrangimento dos executores.
Quando um questionamento ou dúvida evidenciar que sua origem é fruto de uma
falha das orientações contidas no procedimento ou da confecção do material a ser utilizado
o docente deve imediatamente socializar com a turma o fato e apresentar uma orientação que
contorne o ocorrido e permita o prosseguimento da Atividade Experimental, se possível.
Esse tipo de situação pode evitado com um planejamento cuidadoso.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
157
O momento do registro corresponde ao momento da sistematização das informações
na pesquisa cientifica. Neste momento espera-se que cada equipe registre as informações
obtidas durante a execução dos procedimentos no respectivo espaço destinado no roteiro.
O docente durante a realização do registro deve supervisionar o desenvolvimento das
ações e auxiliar dirimindo as eventuais dúvidas que possam ocorrer durante o processo. O
ideal é que o roteiro da Atividade Experimental contenha espaço adequado para o registro
das informações produzidas durante o momento da execução. Isto facilita o registro e evita
o gasto de tempo desnecessário neste momento.
Neste momento da análise espera-se que cada equipe analise as informações que
foram registradas e descubram uma relação válida entre as informações. Este momento é
crucial para o alcance do objetivo da Atividade Experimental devido ser o momento em que
os estudantes deverão ter o primeiro acesso à informação desejada pelo docente.
Quando durante a análise alguma equipe apresentar dificuldade para perceber uma
relação válida a partir das informações registradas o docente deve auxiliar a equipe por meio
da formulação de questões que auxiliem os membros da mesma a perceberem uma relação
válida. O momento da análise corresponde a análise dos resultados de uma pesquisa
cientifica. Este momento deve ser concluído com a elaboração de uma conclusão pela
equipe.
A institucionalização é o momento em que será produzida a conclusão oficial da
turma a partir das conclusões que cada equipe elaborou no momento da análise. O momento
da institucionalização corresponde grosso modo ao momento da elaboração das
considerações finais de um trabalho cientifico. O enunciado elaborado na primeira Atividade
Experimental realizada por uma turma sem experiencia com esta forma de ensino costuma
não atender as condições de um texto de natureza conclusiva. É comum os estudantes
reproduzirem na conclusão a relação obtida no momento da análise. Isto não é motivo de
grandes preocupações devido ser uma consequência da pouca experiência dos aprendizes em
participarem de aulas em que lhes é solicitado que realizem observações, registro e análise
de informações e a elaboração de textos conclusivos.
O docente, independente do formato das conclusões elaboradas pelas equipes, deve
solicitar que um representante de cada equipe vá ao quadro e registre a conclusão elaborada
pela sua equipe. Após analisar as conclusões registradas o docente deve perguntar as equipes
quais das conclusões apresentadas permitem a alguém que não participou da atividade
entender relação estabelecida. Este momento é oportuno para que o docente teça
considerações sobre as características de uma conclusão. Finalmente o docente pode elaborar
junto com a turma uma conclusão que permita a alguém que não participou da Atividade
Experimental entender relação estabelecida.
A conclusão que foi elaborada em conjunto com a turma será denominada de
conclusão da turma. Se for possível é positivo elaborar um registro pictórico da conclusão
produzida ou mesmo elaboração de uma representação com símbolos matemáticos da
conclusão.
Além disso, é importante destacar aos estudantes que não foi realizada uma
demonstração do resultado concluído e que existem técnicas específicas para a demonstração
do resultado encontrado. Se for possível é recomendável apresentar a demonstração do
resultado se existir uma demonstração ao alcance do entendimento dos estudantes,
principalmente no ensino médio e no fim do ensino fundamental.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
158
Com a elaboração da conclusão da turma chega ao fim o momento da
institucionalização e da atividade experimental também.
Vejamos os elementos funcionais da Atividade na aula de Matemática por
Atividade Experimental.
Quadro 9: Elementos da Atividade em aula de matemática por Atividade Experimental
Elemento Funcional da
Atividade
Elemento da Atividade na aula Experimental de
Matemática
Os sujeitos da atividade Docente e estudantes.
O objeto da atividade Conhecimento matemático.
O motivo Necessidade de ensinar/aprender conhecimentos
matemáticos.
O objetivo Oportunizar o acesso a conhecimento matemático.
O sistema de operações Ações que são permitidas realizar a partir do
procedimento e dos materiais disponíveis para aula.
A base orientadora da ação As informações prévias a respeito dos materiais
disponíveis e do conteúdo matemático envolvido.
Os meios Os recursos disponíveis para a realização das ações.
As condições As regras de utilização do material do experimento.
O produto Conclusão/ conceituação obtida.
Fonte: Criação e adaptação a partir de Nuñez e Pacheco (1997)
Como a aula experimental de Matemática não se caracteriza como nenhuma das
Tendências da Educação Matemática anteriormente referidas julgamos adequado incluir
doravante o Ensino de Matemática por Atividades Experimentais como uma das Tendências
da Educação Matemática.
Segundo Sá (2019) as Tendências não são incompatíveis entre sim e nem conflituosas
com o ensino de Matemática por Atividade Experimental.
Na oportunidade é importante destacar que o ensino de matemática por Atividade
Experimental:
1) Não deve ocorrer de forma improvisada;
2) Não dispensa a participação ativa do docente durante a sua realização;
3) Não deve ser utilizado após se ministrar exposição sobre o conteúdo;
4) Não deve ser utilizado para verificar a validade de um resultado já estudado;
5) Não dispensa do docente o conhecimento do assunto a ser trabalhado;
6) Não deve ser utilizado como reforço de assunto explorado.
Estas observações sobre o ensino de matemática por Atividades Experimentais são
concordantes com as características do ensino de matemática por Atividade apresentado em
Sá (2019) que são as seguintes:
1) É diretivo;
2) Tem compromisso com o conteúdo;
3) Tem compromisso com o desenvolvimento de habilidades para além do
conteúdo;
4) É estruturado;
5) É sequencial;
6) Não está necessariamente associado à resolução de problemas;
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
159
7) Leva em consideração os conhecimentos prévios dos estudantes;
8) Os resultados são institucionalizados ao final da Atividade Experimental;
9) Não dispensa a participação ativa do docente;
10) É adequado para formação de conceitos e acesso a resultados operacionais ou
algorítmicos;
11) É iterativo entre estudantes e docente.
Considerações Finais
Os resultados apresentados neste trabalho nos permitem concluir que as aulas que
são realizadas com base nas atuais Tendências da Educação no Brasil possuem os elementos
funcionais de uma Atividade, em particular da Atividade de Estudo proposta por Davydov.
Os resultados também permitem reconhecer que além das atuais Tendências da
Educação Matemática brasileira há uma outra que denominamos de Ensino por Atividades
Experimentais, que tem características que as permitem se distinguir das demais Tendências
de Educação Matemática.
Assim de maneira consciente ou não quando se usamos uma das atuais Tendências
da Educação Matemática se tem como suporte teórico a Teoria da Atividade, em particular
da Atividade de Estudo.
Em continuidade ao presente estudo se faz necessário estudos que respondam as
seguintes questões, entre outras: a) Quais as aproximações e distanciamentos entre as
Atividades realizadas pelas Tendências em Educação Matemática? b) Qual a diferença em
tempo da lembrança de resultados estudados por Atividades Experimentais e pelo ensino
expositivo? c) Quais os efeitos do ensino de matemática por Atividades Experimentais sobre
a autoestima escolar dos estudantes? d) Qual é a aceitação dos estudantes ao ensino por
Atividades Experimentais ao longo de sua escolarização? e) Como o ensino de matemática
por Atividades Experimentais influencia na capacidade de produzir textos conclusivos dos
estudantes? e f) Como o ensino de matemática por Atividades Experimentais pode ser
utilizado na Formação Inicial de Professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental?
As respostas as questões propostas trarão para a Educação Matemática mais solidez
no quesito fundamentação e no quesito articulação entre articulação entre as Tendências da
Educação Matemática no trabalho pedagógico.
Para finalizar registramos que também se faz necessário para apoiar a pesquisa e o
trabalho docente que sejam criados centros de referencia como o de Modelagem Matemática
e o de História da Matemática para que o acesso aos trabalhos de cada tendência que se
avolumam cada vez mais sejam mais facilmente localizados pelos pesquisadores e docentes
interessados em alguma da Tendências da Educação Matemática.
Referencia
ALLEVATO, N. S. G. e ONUCHIC, L. R.. Ensinando Matemática através da Resolução de
Problemas. Boletim do GEPEM, v. 33, n. 55, p. 1- 19, 2009.
BARICHELLO, L. e GUIMARÃES, R. S.. Com quantos adjetivos se descreve uma
atividade matemática? JIBEM, v.10, n. 3, p.186-197, 2017.
BRAGA, R. M.. Aprendizagem em modelagem matemática pelas interações dos
elementos de um sistema de atividade na perspectiva da teoria da atividade de
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
160
Engestrom. Tese (Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemáticas),
Universidade Federal do Pará, Instituto de Educação Matemática e Científica, Belém, 2015,
133 f.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Matemática. BSB: MEC, 1998.
DAVYDOV, V.V.. O que é a atividade de estudo. Revista «Escola inicial», № 7, p.1-8,
1999.
DAVYDOV, V.V.. Problemas do Ensino Desenvolvimental: a experiência da pesquisa
teórica e experimental na Psicologia. In. La enseñanza escolar y el desarrollo psíquico.
Tradução de José Carlos Libâneo e Raquel A. M. da Madeira Freitas. Moscú: Editorial
Progreso, 1988.
EIDT, N. M. e DUARTE, N.. Contribuições da teoria da atividade para o debate sobre a
natureza da atividade de ensino escolar. Psic. da Ed., São Paulo, 24, 1º sem. de 2007, 51-
72.
ENGESTRÖM, Y.... Learning by expanding: An Activity-Theorical Approach to
Developmental Research. Helsinki: Orienta-Konsultit, 1987.
FERREIRA, L.A.G.. Abordagem temática na EJA: sentidos atribuídos pelos educandos a
sua educação científica. Dissertação (Mestrado em Educação Tecnológica) Centro Federal
de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2009.
FOSTER, C. e INGLIS, M..Teachers’ appraisals of adjectives relating to mathematics task.
Educational Studies Mathematics. v.95, n.3, p.283-301, 2017.
FRANCO, M.L.P.B.. A atividade de aprendizagem: da origem a algumas de suas
implicações. Psicologia da Educação. n.28, p.197-205, 2009.
LEONTIEV, A. N.. Actividad, conciencia y personalidade. México: Editorial Cartago do
México 1984.
LEONTIEV, A. N. (1988). Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil.
In: Vigotski, L. S.; Luria, A. R.; Leontiev, A. N., Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem, p. 59-83. São Paulo: Ed. Ícone.
LIBÂNEO, J. C.. A didática e a aprendizagem do pensar e do aprender: a Teoria Histórico-
cultural da Atividade e a contribuição de Vasili Davydov. Revista Brasileira de Educação.
n. 27, p. 5-27, Set /Out /Nov /Dez 2004,
LIMA, C. P. de e SEKKEL, M. C.. A promoção da atividade de estudo: repercussões para a
organização do ensino. Psicologia Escolar e Educacional, SP. Volume 22, Número 2,
Maio/Agosto de 2018: 403-411.
LISBOA, D. P. Análise de prática educativa configurado por uma metodologia de
projetos: dialogo entre a teoria da atividade e a teoria do ator rede. Dissertação (Mestrado
em Educação Tecnológica) Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo
Horizonte, 2009.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
161
MENDES, I. A. Ensino da matemática por atividades: uma aliança entre o construtivismo e
a História da Matemática. Tese (Doutorado em Educação) Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Natal, 2001.
MOREIRA, A., PEDROSA, J.G. e PONTELO, I. O conceito de atividade e suas
possibilidades na interpretação de práticas educativas. Revista Ensaio. v. 13, n. 3, p: 13-29,
set-dez, 2011.
NUÑEZ, I. B., PACHECO, O. G. La formación de conceptos científicos: uma perspectiva
desde la Teoria da Atividade. Natal: EDUFRN, 1997.
PICCOLO, G. M. HISTORICIZANDO A TEORIA DA ATIVIDADE: do embate ao debate.
Psicologia & Sociedade, 24 (2), 283-292, 2012.
PONTE, J.P. Investigações matemáticas e investigações na prática profissional. São
Paulo: Livraria da Física, 2017.
PONTELO, I. Sistemas automáticos de aquisição e tratamento de dados em atividades
práticas de Física: um estudo de dois casos na Iniciação Científica Júnior. Dissertação
(Mestrado em Educação Tecnológica) Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas
Gerais, Belo Horizonte, 2009.
QUEROL, M. A. P.; CASSANDRE, M. P. e BULGACOV, Y. L. M. Teoria da Atividade:
contribuições conceituais e metodológicas para o estudo da aprendizagem organizacional.
Gest. Prod., São Carlos, v. 21, n. 2, p. 405-416, 2014.
REIS, A.Q.M., NEHRING, C.M. e BREUNIG, R.T. O ensino desenvolvimental na
Educação Matemática. VII Jornada nacional de Educação Matemática. Anais... 2018.
ROLINDO, J. M. R. Contribuições da Teoria Histórico-cultural e da Teoria da Atividade a
Educação atual. Revista de Educação. 10, nº 10, p.48-57, 2007 Disponível em
https://revista.pgsskroton.com/index.php/educ/article/view/2136
SÁ, P. F. Ensinando matemática através da redescoberta. Traços, v.2, n.3 p. 77-81,1999.
SÁ, P. F. O que resolução de problemas, afinal? Trilhas, v.5, n.2, p. 11-17, 2004.
SÁ, P. F. A resolução de problemas como objetivo nas aulas de matemática. Trilhas, v.7,
n.16, p. 25-34, 2005.
SÁ, P. F. A resolução de problemas como processo nas aulas de matemática. Trilhas, v. 8,
n.18, p. 59-71, 2006.
SÁ, P. F. A resolução de problemas como ponto de partida nas aulas de matemática. Trilhas,
v.11, n. 22, p.7-24, 2009
SÁ. P.F. Possibilidades do ensino de Matemática por Atividades. Belém: SINEPEM,
2019 Disponível em http://sinepem.sbempara.com.br/file/V7.pdf
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.143-162 ISSN: 2675-1909
162
SANNINO, A. Activity theory as an activist and interventionist theory. Theory &
Psychology, v. 21, n. 5, p. 571-597, 2011;
SFORNI, M.S. de F. Aprendizagem conceitual e organização do ensino: contribuições da
Teoria da Atividade. Araraquara: JM Editora, 2004.
VARANDAS, J.M. e NUNES, P. Actividades de Investigação: uma experiencia no 10º ano.
In: ABRANTES, P., PONTE, J.P., FONSECA, H. e BRUNHEIRA, L. (orgs). Investigações
matemáticas na aula e no currículo. p.169-173, Lisboa: APM,1999.
Pedro Franco de Sá
DMEI, GCEM, PPGED, PMPEM-UEPA e REAMEC
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8986-2787
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 29 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p163-177.id291 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
Resolução de problemas e expressões numéricas: o quadro dos quatro
quatros e o nunca dois e números binários
Problem solving and numerical expressions: the table of four fours and
never two and binary numbers
Narciso das Neves Soares
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará - UNIFESSPA
Nelson Antonio Pirola
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP
RESUMO
Este artigo tem como objetivo apresentar os recursos didáticos O Quadro dos Quatro Quatros e o
Nunca Dois e Números Binários, que podem contribuir na resolução de problemas que recaem em
expressões numéricas e sua funcionalidade. Os recursos são provenientes de um projeto de
extensão desenvolvido no Laboratório de Ensino de Matemática na UNIFESSPA, em 2015, e, de
uma atividade de ensino realizada com uma turma de Pedagogia na UNESP-Campus de Bauru, em
2019. Os recursos são caracterizados como de manipulativos e inclusivos. Como fundamentação
teórica, se utilizou os estudos de Sternberg (2008) sobre os passos do Ciclo da solução de
problemas e os obstáculos de Configuração Mental. Observamos que estas atividades de ensino se
mostram como importantes aliadas para o estímulo do raciocínio lógico e desenvolvimento de
estratégias, apreensão e direcionamento para o uso correto dos sinais de operação e sinais de
associação, e da mudança de base entre números binários e decimais.
Palavras-chave: Quadro dos Quatro Quatros. Nunca Dois e Números Binários. Expressões
Numéricas, Resolução de Problemas.
ABSTRACT
This article aims to present the teaching resources The Framework of the Four Fours and the Never
Two and Binary Numbers, which can contribute to the resolution of problems that fall into
numerical expressions and their functionality. The resources come from an extension project
developed at the Mathematics Teaching Laboratory at UNIFESSPA, in 2015, and from a teaching
activity carried out with a Pedagogy class at UNESP-Campus de Bauru, in 2019. The resources are
characterized as manipulative and inclusive. As a theoretical basis, the studies of Sternberg (2008)
on the steps of the Cycle of problem solving and the obstacles of Mental Configuration were used.
We observed that these teaching activities are shown to be important allies for the stimulation of
logical reasoning and development of strategies, apprehension and direction for the correct use of
the operation signals and association signs, and of the change of base between binary and decimal
numbers.
Keywords: The Framework of the Four Fours. Never Two and Binary Numbers. Numerical
Expressions. Resolution of Problems.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
164
Introdução
É sintomático e notório no Brasil que grande parte dos alunos ao chegarem nos
anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9° ano) apresentam dificuldade na aprendizagem
da matemática, e, particularmente, em aritmética, que age como “efeito cascata”, tendo
como consequência, o baixo desempenho também na aprendizagem de álgebra e
geometria.
Diversas são as pesquisas e estudos voltados para encontrar explicações para tal
comportamento na aprendizagem, a considerar as dificuldades dos alunos na resolução de
problemas de matemática (CURY, DA SILVA (2008); MOURA (2007); PIROLA (2000)).
Outra frente, busca ainda, nesse sentido, produzir recursos, métodos, didáticas e
pedagogias que deem conta de munir professores para que os alunos tenham prazer em
aprender matemática.
Incentivar os alunos em olimpíadas matemáticas, como é o caso da Olimpíada
Brasileira de Matemática nas Escolas Públicas (OBMEP) que atinge todas as unidades da
federação brasileira, quase 100 por cento dos municípios, segundo dados da página oficial
da OBMEP, é um passo importante para incentivar os alunos e detectar novos talentos em
matemática. Em 2019 houveram 18.158.775 alunos inscritos na primeira fase, e destes,
apenas 55671 tiveram alguma premiação, 0,31% dos inscritos, dos quais 579 ganharam
medalha de ouro, um número nada animador.
Há muito ainda a ser feito, mas estamos na direção certa. Em 2018 foi anunciado
pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) a entrada do Brasil no grupo dos dez
países do mundo que mais desenvolvem pesquisa matemática, refletido na medalha Fields,
considerado o Nobel da matemática, concedida ao brasileiro Arthur Ávila, em 2014, um
fator inspirador para alunos e professores.
Neste artigo serão apresentadas duas atividades, a saber: O Quadro dos Quatro
Quatros, e, o Nunca Dois e os Números Binários. Ambos, tem a pretensão de se posicionar
como atividade relacionada à resolução de problemas e expressões numéricas, visando
auxiliar no desenvolvimento cognitivo, ao que se refere a capacidade de pensar e
compreender, e ao raciocínio lógico, voltado à estruturação de um pensar consciente e
organizado, de forma criativa e descontraída.
Resolução de problemas
Resolver problema é o que fazemos o tempo todo, observamos, analisamos,
erramos, buscamos outros caminhos, levantamos argumentos, selecionamos as variáveis,
determinamos o melhor método, testamos, validamos, e tomamos uma decisão. É claro,
que nem sempre nos utilizamos de todos esses processos, entre outros, ou mesmo,
percebemos que nossa memória executa uma série de passos para resolver um problema,
dada a velocidade com que processa as informações coletadas. Ora, mas se resolvemos
problemas o tempo todo, como é possível a resolução de problemas, em particular os de
matemática, ser um dos maiores desafios na aprendizagem escolar? Eis um problema
difícil de se resolver, mas não por falta de interesse da academia. Um dos grandes
implicadores para a solução deste problema, está na complexidade, diversidade e
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
165
desigualdade social ainda muito presente no Brasil, o que pode desmotivar os alunos e
afetar a forma como resolvem problemas, ou mesmo, não conseguindo fazê-lo
(ZIMMERMAN e CAMPILHO, 2003 apud STERNBERG, 2008).
Segundo Sternberg (2008) só estamos diante de uma resolução de problema se sua
solução não for facilmente recuperada pela memória. Assim, se estivermos diante de um
problema a ser resolvido propõe passos do Ciclo da Solução de Problema, onde destaca a
identificação do problema, sua definição, a estratégia para sua formulação, a organização
da informação, a alocação de recursos (tempo, dinheiro, equipamento, espaço, mente), o
monitoramento e a avaliação, como pode ser visto na figura 1.
Em um problema matemático hipotético, estes passos podem ser entendidos da
seguinte maneira: Identifiquei o problema (1), é sobre produção de gado; defino (2) como
um problema algébrico a ser representado como um sistema linear; a estratégia (3) é
analisar o problema para determinar as variáveis e suas condições de existência; organizo
(4) as variáveis em forma de equações e uso as três operações, ou transformações
elementares no processo de solução; a depender do número de variáveis, mais ou menos
tempo (5), levarei para resolver o problema, devido ao número de operações envolvidas,
caso esteja muito demorado, retorno ao passo (4); monitoro (6) todos os dados e decisões
tomadas até o momento no processo de solução e, em caso de algum erro ser detectado,
retorno para o passo (3) ou (4) e busco outros procedimentos; e finalmente, me acerco (7)
de que tudo saiu como planejado e se convergiu a solução do problema. Resolvido o
problema, poderá usar procedimentos semelhantes para novos problemas e inicia-se um
novo ciclo de solução.
Figura 1: Passos do Ciclo da Solução de Problemas
Fonte: Sternberg (2008).
No processo de resolução de problemas Sternberg (2008) destaca alguns obstáculos
denominados de Configuração mental (CM), baseada em modelos de resolução pré-
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
166
existentes. O entrincheiramento é um tipo de CM que se dá quando se insiste em um
modelo que resolve vários problemas, mas não um problema específico. A fixação
funcional e a incapacidade de perceber que algo que se sabe para resolver um problema
possa resolver outros problemas. Outra CM que chama bastante atenção e se configura
como um aspecto da cognição social é a do estereótipo, crenças de que, pertencer a um
certo grupo social pode determinar suas características, a exemplo, um aluno da periferia
que estuda em escola pública, teria menos condições de resolver um determinado problema
do que um aluno de classe alta que estuda em uma escola privada.
É importante ressaltar que cada problema pode apresentar formas ou procedimentos
diferentes para serem resolvidos, dado que um mesmo problema pode ser entendido de
forma diferente e assim gerar soluções diferentes, e mesmo assim, chegando-se ao mesmo
resultado.
Expressão numérica
As expressões numéricas é um daqueles casos em que o aluno faz o seguinte
questionamento ao Professor “Para que serve isto?”, “Como vou usar no meu dia a dia?”,
ou exclama frases como “É muito símbolo misturado”. Em geral as expressões numéricas
são trabalhadas em sala de aula para se exercitar as operações de adição, subtração,
multiplicação, divisão, potência e radiciação. No entanto, elas são muito mais do que isto,
são representações de situações reais, em aplicações nas diversas áreas do conhecimento.
Por exemplo, quando escrevemos a equação de Torricelli desenvolvida a partir da
junção da função horária da velocidade com a função horária da posição para o movimento
uniformemente variado (MUV), ou seja, um movimento que ocorre em linha reta e com
aceleração constante, obtemos a seguinte equação:
, onde V é a velocidade
final, a velocidade inicial, a variação do espaço, S medida do espaço final e
medida do espaço final.
Assim, se quisermos determinar o valor de V, basta substituir os valores de
, resultando em uma expressão numérica, que resolvida resulta o valor
de V. Desta forma, as expressões numéricas pode ser definida como uma representação
simbólica de um problema a ser resolvido. Para além desta questão, podem servir, entre
outros, para o professor observar e avaliar a competência do aluno com relação as
operações aritméticas.
Em termos gerais as expressões numéricas são conjuntos de números e operações
matemáticas com ordem bem definida. As operações envolvidas em expressões numéricas
são as básicas: adição, subtração, multiplicação, divisão, potenciação e radiciação, e os
sinais de associação parênteses, colchetes e chaves.
Com relação as operações, seguem a seguinte ordem de prioridade: 1º as
potenciações ou as radiciações, 2º Multiplicações ou divisões e, 3º Adições e subtrações.
Essas operações podem ser feitas em qualquer ordem dentro de suas prioridades.
Nas expressões numéricas algumas operações são colocadas com maior prioridade
do que outras. Essa prioridade é dada pelo uso de sinais de associação do seguinte modo:
1º as operações dentro dos Parênteses, 2º as que estiverem nos Colchetes, 3º as que
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
167
restarem dentro das Chaves, e 4º realizar as operações que restarem fora das chaves.
Ressalta-se que não necessariamente as expressões numéricas precisam ter sinais de
associação, bem como há ocasiões nas quais só aparecem parênteses, ou parênteses e
colchetes, ou os três sinais de associação.
Com relação aos sinais de associação, seu uso é uma convenção aceita por toda
comunidade matemática, embora, esta associação possa ser feita unicamente com o uso de
parênteses, ao modo como realizam as calculadoras científicas.
Na sequência apresentaremos as atividades de ensino O Quadro dos Quatro Quatros
e o Nunca dois e Números Binários e seus procedimentos de produção e uso didático.
O Quadro dos Quatro Quatros
Esta atividade é um dos resultados do projeto de extensão intitulado “Leitura e
Matemática: histórias de Malba Tahan e sua potencialidade como Material Curricular
Educativo na formação inicial e continuada de professores que ensinam Matemática”,
financiado pela Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Sul e Sudeste do
Pará, que objetivou produzir recursos didáticos educacionais, com propósito de auxiliar e
estimular a leitura na formação inicial e continuada de professores que ensinam
matemática, de modo que tais recursos sejam significativos na aprendizagem para melhoria
da prática pedagógica docente.
O recurso foi idealizado para se trabalhar expressões numéricas com alunos do 6º
ao 9º ano do ensino fundamental, mas pode ser utilizado, a depender da aplicação, com
alunos do Ensino Médio e como desafio para alunos do ensino superior, em particular de
cursos de Matemática. Tem como objetivo geral compreender o uso das regras das
expressões numéricas manipulando quatro quatros (4 4 4 4). A partir deste objetivo o
Professor se assim o quiser, pode adaptar outros objetivos específicos, a depender de sua
intenção didática.
O recurso se compõe de um quadro pequeno (60x40 sugestão!) com fundo em
feltro, números de 0 a 10, confeccionados em 3 quantidades cada, sinais de operação e
sinais de associação, também em quantidade de 3 cada, todos em material EVA com
pequeno velcro colado na parte de trás para pregar no quadro, conforme se pode visualizar
na figura 2. A participação dos alunos na produção do material pode ajudar a despertar
interesse pelo recurso. O objetivo desse material é que o aluno consiga escrever com
quatro quatros expressões numéricas utilizando os sinais de operação de adição, subtração,
multiplicação, divisão, raiz quadrada, e sinais de associação parênteses, colchetes e chaves.
Em alguns desafios, de números acima de 10 podem aparecer ainda o fatorial e log na
expressão. Uma extensão da atividade é propor a elaboração de expressões que resultem
em números de 11 a 100, usando os quatro quatros.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
168
Figura 2: O quadro dos quatro quatros
Fonte: Santos e Soares (2015).
O recurso pode ser classificado como manipulativo, o que lhe permite ser inclusivo,
visto que não se limitados a uma parte apenas dos alunos. No caso de alunos cegos ou de
baixa visão Ferreira e outros (2010, p.167), mencionam que “O ensino da Matemática de
maneira geral fica disperso e inconsistente se não adotar meios de ‘visualização’ de
gráficos, equações, figuras geométricas”. Deixando, em caso contrário, por exemplo,
alunos cegos, ou de baixa visão, excluídos, pois, o tato é um dos principais meios de
“visualização” deles e algumas vezes apenas ouvir o professor não é insuficiente para tratar
de operações que demandam uso intensivo da memória. Neste sentido, Mollossi (2013) diz
que ensinar matemática a esses estudantes necessita um fazer pedagógico que ultrapassa a
apresentação oral de conteúdos, sendo indispensável encorajá-los no uso dos sentidos
remanescentes para que possam adquirir conhecimentos matemáticos.
A atividade foi produzida com base a uma adaptação do texto “Os quatro quatros”
do livro o Homem que Calculava de Malba Tahan (1995). Vejamos uma parte do texto:
Ao ver Beremiz interessado em adquirir o turbante azul, objetei:
- Julgo loucura comprar esse luxo. Estamos com pouco dinheiro e ainda não
pagamos a hospedaria.
- Não é o turbante que me interessa – retorquiu Beremiz. – Repare que a tenda
desse mercador é intitulada “Os Quatro Quatros”. Há nisso tudo espantosa
coincidência digna de atenção.
- Coincidência? Por quê?
- Ora bagdali – retorquiu Beremiz -, a legenda que figura nesse quadro recorda
uma das maravilhas do Cálculo: podemos formar um número qualquer
empregando quatro quatros! (TAHAN, p. 28-29, 1995)
A partir daí o texto mostra o personagem Beremiz Samir formando números de 0 a
10 com quatro quatros. Nossa sugestão é que o professor comente sobre o livro e sua
importância para o ensino de Matemática, faça a leitura até onde vai a citação. Em seguida,
apresenta os desafios de compor expressões numéricas com os quatro quatros. A resolução
dos problemas propostos requer bastante atenção, momento no qual o professor pode
colocar em prática o Ciclo da Solução de problemas proposto por Sternberg. Na figura 3
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
169
são apresentadas algumas sugestões de formar expressões que representem números de 0 a
10 com os quatro quatros.
Figura 3: formando números de 0 a 10
Fonte: Santos (p. 34, 2017).
Sugestão de atividades
Para esta atividade, recomenda-se o uso de dois quadros:
1ª momento: O professor inicia a aula informando que se trata de expressões numéricas,
mas que envolverá apenas quatro quatros (4 4 4 4), sinais de operação (+, -, x, ÷ e √) e
sinais de associação ( ), [ ] e { };
2º Momento: O professor conta a história dos quatro quatros, informando que se trata de
uma história do Livro O homem que Calculava. O professor pode abrir o livro e ler a
história até a parte em que o personagem principal gera expressões que resultem nos
números 0 e 1 com os quatro quatros como motivação;
3º momento: A partir da história contada, o professor sugere aos alunos com auxílio do
Quadro dos Quatro Quatros que formem expressões que representem números de 2 até o
número 10, podendo ser feita individualmente ou em grupo;
4º momento: Separar algumas duplas e escrever no quadro dos quatro quatros, uma
expressão que forme um número inteiro dado. Vence a dupla que conseguir realizar a
atividade primeiro;
5º momento: Deixar que produzam no Quadro dos Quatro Quatros expressões e vejam
que número será formado.
Os desafios apresentados, são problemas que vão demandar estratégias, raciocínio
lógico, atenção, paciência e momentos de retorno para buscar outras estratégias.
Nunca dois e Número binário
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
170
Esta atividade foi desenvolvida para se trabalhar números binários com uma turma
de pedagogia da UNESP Campus de Bauru, no segundo semestre de 2019. O objetivo da
aula foi apresentar a história dos números binários, mostrar a sua composição e ensinar a
mudança de base de binário para decimal e de decimal para binário.
Em se tratando de um curso que forma professores que vão, entre outras, ensinar
matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental, levantou-se a preocupação de como
os professores poderiam abordar o assunto com alunos do 5º ano, em particular, com
relação a mudança de base.
Assim, o recurso proposto tomou como base o jogo Nunca dez, desenvolvido para
ajudar os alunos a compreender o sistema de numeração decimal, sendo com frequência
trabalhado com materiais de contagem como o material dourado e o ábaco.
Ao usar o material dourado a regra é que nunca se poderá acumular mais de 10
peças iguais. O primeiro tipo de peça que ele começa a acumular é o cubinho que equivale
a uma unidade. Quando ele acumular mais de 10 desses cubinhos, ele deverá trocar 10
cubinhos de unidade por uma dezena. Quando acumular mais de 10 barras de dezena,
deverá trocar por uma placa de centena, e assim por diante, como no exemplo a seguir com
quadrados e barra de quadrados (figura 4 e 5):
Figura 4: 11 unidades
Fonte: os autores
A cada 10 quadrados troca-se por uma barra de dezena e sobra 1 quadrado. E assim
teremos uma dezena e uma unidade, formando o número 11 na base decimal.
Figura 5: 1 barra e 1 quadrado
Fonte: os autores
No caso do Nunca Dois e os Números Binários, utilizou-se a ideia básica do Nunca
Dez, porém, ao invés de cubos, foram usadas as formas geométricas, triângulo, quadrado,
círculo, losango e pentágono, com 2cm de lado, e no caso do círculo 2cm de diâmetro, que
podem ser confeccionadas em cartolina, papel cartão ou papel sulfite, sendo adotadas as
seguintes representações para cada forma: a cada dois triângulos troca-se por um quadrado,
a cada dois quadrados troca-se por um círculo, a cada dois círculos troca-se por um
losango, e a cada dois losangos troca-se por um pentágono. As trocas podem se ampliar a
critério do professor ou jogador com outras formas geométricas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
171
Figura 6: modelos de formas
Fonte: os autores
O sistema binário é base para a Álgebra booleana (de George Boole (1815-1864) -
matemático inglês), que permite fazer operações lógicas e aritméticas usando-se apenas
dois dígitos ou dois estados (falso e verdadeiro, ligado e desligado, 0 ou 1).
Numericamente seus números são representados apenas por 0 ou 1, formando a linguagem
binária, adotado internamente pelos sistemas computacionais, daí a importância de se
compreender seu funcionamento, e sua relação com a base decimal.
Para se entender a composição do número binário, vamos apresentar um exemplo
de número natural na base decimal e sua decomposição, e por analogia, representar e
decompor um número binário, sem nos utilizamos de matemática mais rigorosa.
Seja o número 5.379, façamos sua decomposição.
Daí, temos a decomposição em potências de base 10.
Assim, para decompor um número, multiplicamos os algarismos posicionais por
potências de 10, sendo que o expoente da primeira potência (da esquerda) é determinado, a
partir da seguinte ideia, será a quantidade de algarismos do número menos 1, ou seja, como
Troca-se por
Troca-se por
Troca-se por
Troca-se por
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
172
o número tem 4 algarismos, a potência será 3, e as demais seguem em ordem decrescente
até chegar em zero.
Analogamente, um número na base binária pode ser decomposto da seguinte forma:
Seja o número binário (o número 2 indica a base), vejamos sua
decomposição. Se o número está no sistema binário, a potência será de base 2 seguindo o
mesmo critério da base decimal para determinação dos expoentes, como o número tem
algarismos, o expoente da potência do primeiro algarismo da esquerda será 4. Assim,
teremos que:
Tendo este entendimento, e aplicando outros exemplos, podemos agora passar à
mudança de base.
Para transformar um número binário em decimal, basta resolvermos as potências de
dois e resolver a expressão, o resultado será a representação em base decimal. Tomemos o
exemplo dado:
Calculando-se as potências obtemos:
Ou seja, o número 10111 na base 2 representa o número 23 na base 10.
Já para transformar um número decimal em número binário, usamos o método das
divisões sucessivas por 2. Tomemos como exemplo o número 23.
23 2
(1) 11 2
(1) 5 2
(1) 2 2
(0) 1
Concluído o processo, pegamos o último quociente e juntamos com os restos das
divisões conforme o sentido da seta, e, formamos o número binário 10111 que representa o
número 23 na base decimal.
Com intuito de tornar esta aprendizagem mais descontraída e prazerosa para os
alunos a partir do 5º ano do ensino fundamental o Nunca Dois e Números Binários se
apresenta aqui na forma de uma cartela para se apreender o processo de mudança de base
de binário para decimal (figura 7) e de decimal para binário (figura 8).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
173
Figura 7: Cartela de Mudança Binário para Decimal
Representação
Numérica
A = sobra de peças B = potências de base 2
A x B C = Soma dos produtos
(A x B)
Cálculo da expressão C
Fonte: os autores.
Figura 7: Cartela de Mudança Binário para Decimal
Distribuição em pares Nº de pares Sobra
Antes das atividades específicas, o professor pode propor como uma atividade
coletiva, produzir as cartelas e as peças (formas) com os alunos, ou como uma atividade
extraclasse. Ou ainda, propor que os alunos pesquisem sobre a história dos números
binários e suas aplicabilidades, e apresentarem na forma de seminário, ou gravarem vídeo
entrevistando profissionais que trabalhem na área de tecnologia e possam falar da
importância dos números binários e como ele os utiliza em seu trabalho.
Sugestão de atividade
Mudança de Binário para Decimal
1º momento: o professor faz uma apresentação motivacional dos números binários,
na forma de vídeo, ou slides, ou mesmo cartaz sobre a sua história e importância;
2º momento: o professor define Binário e mostra sua representação;
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
174
3º momento: o professor mostra a decomposição do número binário numa relação
análoga com a decomposição dos números na base decimais;
4º momento: definição das duplas para as atividades com o Nunca Dois e Números
Binários;
5º momento: é realizado a distribuição de peças, em quantidades diferentes para
cada dupla;
Vamos supor a seguinte distribuição:
- Triângulos: 35
- Quadrados: 23
- Círculos: 12
- Losangos: 17
- Pentágonos: 5
A Questão é:
Com as peças distribuídas, qual número binário será formado e qual valor ele
representa na base decimal?
Como a cada dois triângulos trocamos por um quadrado, teremos 17 pares de
triângulos que serão trocados por 17 quadrados, sobrando 1 triângulo.
Aos 23 quadrados junta-se os 17, resultantes da troca, ficando com 40 quadrados,
obtendo assim, 20 pares de quadrados, que serão trocados por 20 círculos, e nenhuma
sobra.
Os 20 círculos serão adicionados aos 12 distribuídos, somando-se 32 círculos, e dos
quais se obtém, 16 pares, que serão trocados por 16 losangos, e nenhuma sobra.
Soma-se aos 17 losangos distribuídos os 16, obtendo-se 33 losangos, de onde
obtém-se 16 pares, a serem trocados por 16 pentágonos, e uma sobra.
E, por último, junta-se aos 5 pentágonos, os 16 da troca, somando-se 21
pentágonos, dos quais obtém-se 10 pares, e uma sobra.
Representação
Numérica
A = sobra de peças 1 1 0 0 1
B = potências de base 2
A x B
C = Soma dos produtos
(A x B)
Cálculo da expressão
Então, temos que 11001 na base 2, representa 25 na base decimal.
Observe que sobram sempre uma (1) ou nenhuma peça (0).
Assim como nos números da base decimal, o zero à esquerda não tem valor. Então
caso o primeiro valor à esquerda termine em zero, ele não será considerado, ou seja, se
tivermos o número 001101 na base dois ele será representado por 1101.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
175
O maior número em decimal que pode ser escrito no quadro (cartela) acima é o
número 31, que em decimal é representado por 11111 na base 2. Quanto mais colunas
forem inseridas, números maiores podem ser gerados. Distribuições diferentes geram
números diferentes, então são muitas possibilidades.
6º momento: Para se trabalhar Mudança de Decimal para Binário, se faz uso de uma
outra cartela, e desta vez, apenas são distribuídos números X de triângulos, e a
demais peças ficam disponíveis para se fazer a troca;
Vamos supor que tenham sido distribuídos 25 triângulos, para determinada dupla.
Assim, usando a ideia das divisões sucessivas por 2, teremos 12 pares de triângulos
e uma sobra.
Os 12 pares de triângulos são trocados por 12 quadrados, que geram 6 pares de
quadrados, a serem trocados por 6 círculos, e com nenhuma sobra.
Dos 6 círculos formam-se 3 pares de círculos, a serem trocados por 3 losangos, e
com nenhuma sobra.
Dos 3 losangos é possível formar apenas 1 par de losangos, a ser substituído por 1
pentágono, e com uma sobra.
Como só resta 1 pentágono, não é possível formar novos pares. Daí, passamos a
compor o número binário, que será formado, pela junção dos valores das sobras, tomadas
de baixo para cima, formando o número binário 11001.
Assim, o número 25 na base dez é representado pelo número 11001 na base binária.
Então, com as duas cartelas, podemos fazer a ida e a volta, ou seja, apreender a mudança
de binário para decimal e de decimal para binário, em um jogo de manipulação, e por
consequência de inclusão.
Distribuição em pares Nº de pares Sobra
12
1
6
0
3
0
1
1
0
1
Embora as atividades pareçam de fácil manuseio e aprendizagem, alguns alunos
podem sentir dificuldades, ou errar determinados passos, e devem ser orientados pelo
professor, que deve entender o erro como uma parte do processo de aprendizagem. Alunos
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
176
que saiam melhor com as atividades podem ser posicionados como monitores em sala, isto
pode ajudar a não dispersarem, ou darem pouca atenção às atividades.
Considerações finais
No percurso deste artigo, o cerne foi dar notoriedade a dois recursos desenvolvido
no âmbito dos espaços da academia, sendo um pensado e produzido em um Laboratório de
Ensino de Matemática, e outro, durante estudos e orientações pós-doutorais, o que
provocou a elaboração de um recurso para uma aula na graduação.
É interessante notar que os materiais são de baixo custo e podem ser construídos de
forma coletiva, e que o ensino de expressões numéricas foi abordado com a
transversalidade da leitura do livro O Homem que Calculava e com os estudos de números
binários, este último um assunto pouco explorado na educação básica, enquanto que o livro
é geralmente usado para se contar histórias, sendo pouco potencializado.
Os passos do ciclo de soluções proposto por Sternberg, embora não sejam vistos de
forma explicita, eles aparecem implícitos nas atividades, no processo de resolução.
Principalmente os professores devem estar atentos e orientar as soluções, com base no
ciclo, o que pode ser feito com prévia conversa, antes das atividades propostas aos alunos
pelo professor em sala de aula.
As configurações mentais por sua vez, são corriqueiras, estão presentes, quase que
naturalmente na resolução de problemas, achar que não sabe, não saber usar o
conhecimento que possui, se sentir excluído, são aparentes e perceptíveis nas ações e
atitudes comportamentais dos alunos. Portanto, a psicologia cognitiva deve ser também
uma constante no acompanhamento dos alunos, sejam por sentirem alguma dificuldade,
seja por apresentarem uma excepcionalidade para resolver problemas.
Os recursos podem ser adaptados, a partir da necessidade do professor, e para além
disto, podem ser transformados em objetos de aprendizagem, um próximo passo a ser
dado, tendo em vista o avanço da informática nos ambientes escolares, bem como a
facilidade em terem acesso a ferramentas tecnológicas com o celular.
Por fim, destacamos a relevância de recursos, como os apresentados neste artigo,
como uma alternativa metodológica promissora para o Ensino de Expressões Numéricas,
pois, além de toda discussão aqui já apresentada, este Produto Educacional com ênfase na
resolução de problemas, propõe tomadas de decisões, estimula e desenvolve capacidades,
valorizando também atitudes que extrapolam o âmbito da Matemática.
A utilização de jogos e metodologias diferentes das que são habitualmente
utilizadas, traz importantes benefícios à aprendizagem dos alunos já que permitem o
envolvimento, a atenção e a participação do grupo. Por outro lado, ao mostrar a
aplicabilidade e outras formas de se trabalhas expressões numéricas colabora para tornar a
matemática uma ciência ao alcance de todos e de formas variadas. Certamente
problematizar, contextualizar e utilizar atividades lúdicas são alguns caminhos de sucesso
no processo de ensino-aprendizagem da matemática.
Referências
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.163-177 ISSN: 2675-1909
177
CURY, Helena Noronha; DA SILVA, Priscila Nitibailoff. Análise de erros em resolução
de problemas: uma experiência de estágio em um curso de licenciatura em matemática.
Revista Brasileira de Ensino de Ciência e Tecnologia, v. 1, n. 1, 2008.
FERREIRA, A.L.; CORRÊA, E.M.M.; BORON, F.C.S.; SILVA, M. E. C. O ensino da
matemática para portadores de deficiência visual, 2010.
MOLLOSSI, L. F.S.B. Educação Matemática no Ensino Fundamental: Um estudo de caso
com estudante cego, Joinville, 2013. Disponível em:
<http://pergamumweb.udesc.br/dados-bu/00001a/00001ad9.pdf> Acesso em: março de
2020.
MOURA, Graziella Ribeiro Soares. Crianças com dificuldades em resolução de
problemas matemáticos: avaliação de um programa de intervenção. 2007, 159 f. Tese
(Doutorado em Educação do Indivíduo Especial) - Universidade Federal de São Carlos,
São Carlos, 2007. Disponível em:
<http://www.bdtd.ufscar.br/htdocs/tedeSimplificado//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=
1678>. Acesso em: março de 2020.
PIROLA, N. A. Solução de problemas geométricos: dificuldades e perspectivas. 2000.
245f. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, 2000.
SANTOS, Bianca Kariny Fernandes dos. SOARES, Narciso das Neves. Leitura e
Matemática: potencializando textos de malba tahan na forma de materiais curriculares
educativos. In: Anais da Jornada de Estudos em Matemática – JEM. UNIFESSPA.
Marabá-Pará. 2015.
SANTOS, Bianca Kariny Fernandes dos. Vida e obra de malba tahan e sua
potencialidade para o ensino e aprendizagem de matemática. Trabalho de Conclusão
de Curso. UNIFESSPA. 2017.
STERNBERG, R. J. Psicologia Cognitiva. 4ª ed. Porto Alegre. Artmed, 2008.
TAHAN, M. O Homem que Calculava. Ed. Record, 40ª ed. 1995.
Williams, W. M., & Sternberg, R. J. Group intelligence: Why some groups are better than
others. Intelligence, Volume 12, 1988. Disponível em:
<https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/0160289688900025>. Acesso em
20 de março de 2020.
Narciso das Neves Soares
UNIFESSPA
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0331-4497
Nelson Antonio Pirola
UNESP
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8215-1317
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 16 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p178-193.id292 Aprovado em: 24 de novembro de 2020
Narrativas de professores ao desenvolver atividades sobre fração:
contribuições de um curso de formação continuada
Teachers' narratives when developing activities on fractions:
contributions from a continuing education course
Idemar Vizolli
Universidade Federal do Tocantins – UFT
Ritianne de Fátima Silva de Oliveira
Rede Pública Municipal de Canaã dos Carajás, PA
RESUMO Estudo integra o PROCAD – AMAZÔNIA, o qual desenvolve ações integradas para qualificar a
formação na pós-graduação em educação no Pará, Tocantins e Rio Grande do Norte, no qual se insere
o estudo de pós-doutoramento. Desde o final do século passado e de forma mais intensa nos últimos
anos, profissionais da educação tem feito uso de Sequência Didática (SD) para o desenvolvimento
dos processos de ensino e aprendizagem bem como na formação inicial e continuada de professores.
Na perspectiva de contribuir com as reflexões sobre esta temática, estabelecemos como objetivo
deslindar contribuições do desenvolvimento de uma SD sobre fração em um curso de formação
continuada para professores que ensinam Matemática nos 4º e 5º Anos do Ensino Fundamental na
rede municipal de Araguaína, TO. Para proceder as análises inspiramo-nos nos escritos de estudiosos
sobre SD (Zabala e Oliveira) e sobre o processo de ensino e aprendizagem de fração (Bertoni,
Merlini, Nunes & Bryant). Trata-se de um estudo de natureza qualitativa e exploratória em que se
fez uso de narrativas orais e textuais de participantes do curso. Os resultados indicam que os
professores ampliaram sua compreensão em relação ao conceito de fração e ao uso de SD e isso
reverbera em seu fazer de sala de aula.
Palavras-chave: Educação; Sequência Didática; Formação continuada de professores; Fração.
ABSTRACT Study is part of PROCAD - AMAZÔNIA, which develops integrated actions to qualify postgraduate
education in Pará, Tocantins and Rio Grande do Norte, which includes the post-doctoral study. Since
the end of the last century and more intensely in recent years, education professionals have made use
of the Didactic Sequence (SD) for the development of teaching and learning processes as well as in
the initial and continuing training of teachers. In order to contribute to the reflections on this theme,
we established as an objective to unravel contributions from the development of an SD on fraction
in a continuing education course for teachers who teach Mathematics in the 4th and 5th Years of
Elementary Education in the municipal network of Araguaína, TO. In order to carry out the analyzes,
we are inspired by the writings of scholars on SD (Zabala and Oliveira) and on the fraction teaching
and learning process (Bertoni, Merlini, Nunes & Bryant). It is a qualitative and exploratory study in
which oral and textual narratives of course participants were used. The results indicate that teachers
expanded their understanding of the concept of fraction and the use of DS and this reverberates in
their classroom practice.
Keywords: Education; Following teaching; Continuing teacher education; Fraction.
Palavras iniciais ....
As inquietações em relação ao processo de compreensão conceitual de fração advêm
de experiências vivenciadas no exercício da docência na Educação Básica e em cursos
superiores, especialmente na Pedagogia e Licenciatura em Matemática, alcança a Pós-
Graduação e encontra eco nos estudos de Bertoni (2004).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
179
Considerando a dificuldade do tema e outras prioridades curriculares, documentos
oficiais têm diminuído a ênfase em frações, nas séries iniciais. É o caso dos
Parâmetros Curriculares Nacionais, cujas orientações vão no sentido de eliminar
das séries iniciais as operações com números racionais na representação
fracionária. A matriz de descritores da 4ª série do SAEB – Sistema Nacional de
Avaliação da Educação Básica, MEC/INEP - também não inclui essas operações.
Por outro lado, não se nota, de modo geral, nos livros e nas propostas curriculares
de 5ª a 8ª série, mudanças no sentido de uma introdução mais cuidadosa às frações
e às operações entre elas, visando suprir essa lacuna deixada nas séries iniciais.
Isso nos leva à constatação de que o espaço para a aprendizagem desses números
nas séries iniciais foi diminuído e não houve ganho de espaço nas séries finais.
(BERTONI, 2004, p. 1)
No Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), muito se falou sobre
a utilização de Sequência Didática (SD) para trabalhar com estudantes conteúdos
curriculares, com ênfase na produção de gêneros textuais. Embora muitos professores
fizessem uso do termo, ficou patente a perspectiva do uso de um conjunto de atividades
relacionadas a um determinado conceito, por exemplo, o que em matemática se configura
como uma lista de exercícios tal qual os que constam em livros didáticos.
No Programa de Pós-Graduação de Mestrado Acadêmico em Educação o grupo de
estudantes com formação em Matemática, sentiu a necessidade de enfrentar o desafio e
propor um curso de formação continuada para professores que ensinam Matemática nos
Anos Inicias do Ensino Fundamental em que se fez uso da Sequência Didática para trabalhar
o conceito de fração, considerando a história e significados de fração, bem como a existência
de uma diversidade de registros de representação semiótica e as características das
quantidades. Assim, a partir de narrativas orais e escritas de cursistas, busca-se responder à
seguinte indagação: que contribuições o desenvolvimento de uma Sequência Didática sobre
fração em um curso de formação continuada trouxe à atuação de professores que ensinam
Matemática nos 4º e 5º Anos do Ensino Fundamental na rede municipal de Araguaína, TO?
Na perspectiva de contribuir com as reflexões sobre esta temática, estabelecemos como
objetivo geral deslindar contribuições de um curso de formação continuada para professores
que ensinam Matemática nos 4º e 5º Anos do Ensino Fundamental na rede municipal de
Araguaína, TO, em que se desenvolveu uma SD sobre fração.
Importante ainda destacar que este estudo integra o PROCAD – AMAZÔNIA,
desenvolve ações integradas para qualificar a formação na pós-graduação em educação no
Pará, Tocantins e Rio Grande do Norte, no qual se insere o estudo de pós-doutoramento e
vincula-se a um projeto do Programa de Doutorado da Rede Amazônica de Ensino de
Ciências e Matemática – REAMEC, que está desenvolvendo um estudo com o objetivo de
mapear e construir um panorama das pesquisas que tematizam a formação de professores na
Amazônia Legal Brasileira.
O lugar de onde se fala ...
Uma vez que os estudos de Zabala (1998) e Oliveira (2013), dentre outros, indicam
que o desenvolvimento de Sequências Didáticas (SD) por professores têm se mostrado
salutar ao processo de ensino e aprendizagem, para este artigo estabelecemos como objetivo
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
180
deslindar contribuições do desenvolvimento de uma SD sobre fração em um curso de
formação continuada para professores que ensinam Matemática nos 4º e 5º Anos do Ensino
Fundamental na rede municipal de Araguaína, TO.
A opção pela rede municipal de Araguaína se deve ao fato de que é um município
com forte polo educacional: conta com 03 (três) Instituições de Ensino Superior (IES)
públicas tais como a Universidade Federal do Tocantins (UFT), que oferta cursos a nível de
graduação, pós-graduação lato e stricto sensu (mestrado e doutorado); o Instituto Federal do
Tocantins (IFTO), que oferta cursos tecnológicos integrados com o ensino médio, superior;
a Universidade Aberta do Brasil (UAB), que oferta cursos de graduação e pós-graduação na
modalidade de Educação à Distância (EaD); Universidade Tocantinense Presidente Antônio
Carlos (UNITPAC); a Faculdade Católica Dom Orione; as quais desempenham papel
relevante ao desenvolvimento educacional da região. Tal fato, contribui com a formação
inicial e estimula a busca pela qualificação profissional, o que propicia parcerias entre
Universidades e Educação Básica.
Inspirados na Engenharia Didática (ED), elaboramos e propusemos o
desenvolvimento de uma SD com professores, a qual organizada em atividades, constituídas
de tarefas que, em alguns casos, desmembram-se em situações. A SD foi desenvolvida em
três etapas, totalizando seis encontros: sondagem (primeiro encontro 19/02/2018), composta
por cinco atividades de sondagem encontradas em Barros (2018) e devolutiva (segundo
encontro – 17 e 18/04/2018). A fase de experimentação aconteceu nos terceiro, quarto e
quinto encontros, na qual os professores desenvolveram 22 atividades constituintes da SD,
as quais encontram-se em Cardoso (2020) sete sobre história das frações, três sobre
equivalência de fração (terceiro encontro – 16 e 17/05/2018); três sobre comparação de
fração, duas sobre as características das quantidades; duas sobre registro de representação
semiótica (quarto encontro – 13 e 14/09/2018); cinco sobre significados de fração e duas
sobre Sequência Didática (quinto encontro – 21 e 22/03/2019). No último encontro (sexto –
0 2 e 03/05/2019) realizou-se a validação/avaliação, em que os cursistas apresentaram os
planos de ensino contendo a proposição de uma sequência didática com vistas ao processo
de ensino e aprendizagem de fração com crianças de 4º e 5º ano do Ensino Fundamental e
os mestrandos apresentaram suas pesquisas aos professores participantes.
O curso de formação continuada foi desenvolvido com 120 professores, teve duração
de 120h e foi realizado no período de fevereiro/2018 a maio/2019, no qual os professores
foram organizados em equipes, distribuídos em três salas, cujas atividades foram mediadas
por, pelo menos um, dos cinco formadores.
O curso de formação continuada integra o projeto amplo denominado “Ensino e
Aprendizagem de Fração”, registrado no Comitê de Ética e Pesquisa da UFT, sob o número
de protocolo 80769217. 0. 0000. 5519, e tem possibilitado o desenvolvimento de uma série
de dissertações nos Programas de Mestrados Acadêmico e Profissional da UFT, duas já
defendidas e três em fase de elaboração.
Uma vez que o projeto mais amplo contou com aprovação no Comitê de Ética e os
cursistas citados neste estudo concordaram com a utilização de seus nomes, efetuamos os
registros das narrativas indicando os respectivos sobrenomes dos autores, seguido da letra
“c” a qual indica o instrumento carta e “e” para indicar a entrevista videografada.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
181
A fase de sondagem resultou na dissertação de Barros (2018), a qual teve como
objetivo “verificar o modo como professores que ensinam matemática nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental de Araguaína, TO, resolvem situações que envolvem o conceito de
fração, considerando o uso de registros de representação semiótica, os diferentes significados
de fração, bem como as características das quantidades.” (BARROS, 2018, p. 09). Na fase
da experimentação Cardoso (2020), realizou sua pesquisa com objetivo “analisar os efeitos
do desenvolvimento de uma sequência considerando a história, equivalência, comparação e
significados de fração, bem como as características das quantidades e a utilização de
diferentes registros de representação semiótica sobre o conhecimento de fração dos
professores participantes do curso.” (CARDOSO, p. 08, 2020).
Estão em fase de elaboração as dissertações dos mestrandos Adílio Jorge Sabino, a
qual tem como objetivo analisar as contribuições dos envolvidos no processo de elaboração
e desenvolvimento de Sequências Didáticas; Ademir Brandão Costa, que analisa o legado
do curso aos professores que participaram do curso de formação continuada; Ritianne de
Fátima Silva de Oliveira que analisa os planos de ensino e as SDs produzidas por cursistas.
O material de pesquisa para este artigo se constitui de sete cartas elaboradas pelos cursistas,
os quais falam, para supostos amigos, sobre suas percepções em relação ao curso de
formação continuada e transcrição de suas falas videografadas, as quais indicam legados do
curso à sua atuação docente. A escolha dos autores deve-se ao fato de que versam sobre
aspectos matemáticos do curso, suscitaram reflexões/análises/críticas em relação ao curso
de formação continuada, trataram do uso de SD no processo de ensino e aprendizagem e
versam sobre a atuação pedagógica dos cursistas; e se dispuseram a conceder entrevista para
compor um documentário em relação ao legado do curso de formação continuada aos
professores (COSTA, 2020).
Trata-se, portanto, de um estudo de natureza qualitativa em que se faz uso de
narrativas orais e escritas de participantes. Pesquisas dessa natureza preocupam-se em
descrever pormenorizadamente as situações, de modo a alcançar a complexidade do
fenômeno, o que muitas vezes requer a atuação direta dos pesquisadores na ação,
especialmente quando se trata de capturar ideias em relação as situações que envolvem
variáveis a serem evidenciadas.
A entrevista “é um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha
informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza
profissional.” (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 195). As entrevistas foram realizadas em
novembro de 2019, para tanto, valemo-nos de um roteiro semiestruturado contendo três
perguntas abertas elaboradas a partir do conteúdo de suas respectivas cartas. De acordo com
Meihy (2005), as questões devem ser contextualizadas, seguindo uma ordem de importância,
de modo a provocar o entrevistado referir-se a assuntos/temas tidos como fundamentais a
pesquisa.
Palavras que orientam o curso de formação continuada ...
Desde o título nos reportamos a palavras/conceitos que merecem ser analisados pelos
leitores a fim de compreenderem melhor o conteúdo do artigo como um todo e em especial
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
182
as narrativas de professores. Termos/conceitos como Sequência Didática (SD) e fração, por
exemplo, são caros para este artigo, daí a necessidade explicitá-los.
Algumas palavras sobre Sequência Didática ...
Zabala (1998, p. 18), define Sequência Didática (SD) como “um conjunto de
atividades ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos objetivos
educacionais, que têm um princípio e um fim conhecidos tanto pelo professor como pelos
alunos”. De acordo com Oliveira (2013, p, 39), a “sequencia didática é um procedimento
simples que compreende um conjunto de atividades conectadas entre si, e prescinde de um
planejamento para delimitação de cada etapa e/ou atividade para trabalhar os conteúdos
disciplinares de forma integrada para uma melhor dinâmica no processo ensino
aprendizagem”. Ainda,
A sequência didática é um procedimento para a sistematização do processo ensino-
aprendizagem, sendo de fundamental importância a efetiva participação dos
alunos. Essa participação vai desde o planejamento inicial informando aos alunos
o real objetivo da sequência didática no contexto da sala de aula, até o final da
sequência para avaliar e informar os resultados. (OLIVEIRA, 2013, p. 40)
Concebemos a Sequência Didática (SD) como um conjunto de atividades
organizadas, articuladas, ordenadas e encadeadas entre si, as quais comportam níveis de
complexidades cada vez maiores, de modo a conduzir os sujeitos a compreenderem um
determinado conceito. Assim, o professor e os estudantes são sujeitos ativos no processo de
ensino e aprendizagem.
Uma vez que os conceitos matemáticos conectam-se uns aos outros, há necessidade
de estudos reflexões, a fim de planejar as atividades adequadamente. Nessa perspectiva, para
o desenvolvimento de uma SD como um procedimento de ação pedagógica, o professor e/ou
o pesquisador pode se inspirar nas tendências em Educação Matemática e fazer uso da
modelagem matemática, resolução de problemas, história da matemática, jogos, uso das
tecnologias, etnomatemática, atividades experimentais, atividades por redescoberta, dentre
outras.
Segundo Oliveira (2013), a proposição de SD comporta cinco passos básicos, nos
quais deve-se levar em consideração os conhecimentos prévios dos estudantes: escolha do
tema a ser trabalhado; problematização do assunto a ser trabalhado por meio de
questionamentos; dos conteúdos; definição dos objetivos a serem alcançados no processo de
ensino e aprendizagem; e, delimitação da sequência de atividades.
Para Zabala (1998), a SD deve ser organizada de modo a considerar as três dimensões
do processo de ensino e aprendizagem: conceituais, “o que se deve saber?”; procedimentais
ou “o que se deve saber fazer?”; e atitudinais “como se deve ser?”.
Em relação aos aspectos conceituais, o professor precisa conhecer o espectro de
conceitos subjacentes e que influenciam na compreensão do objeto em estudo; nos
procedimentais, o professor necessita perceber e criar condições adequadas às necessidades
específicas para cada estudante; os atitudinais, estão intimamente ligadas às ações
formativas, não bastando propor debates e reflexões sobre comportamento cooperativo,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
183
tolerância, justiça, respeito mútuo, dentre outros, e sim, viver um clima de solidariedade,
cooperação, tolerância e cumplicidade.
Ao propor o desenvolvimento de SD, instrumentaliza-se e incentiva-se professores e
pesquisadores em sua atuação no processo de ensino e aprendizagem, especialmente porque
remete à análise da prática profissional. Zabala (1998), disponibilizou um modelo para
analisar e interpretar a relações didáticas que se estabelecem entre os envolvidos no processo
educativo, mais precisamente entre professor-estudantes-objeto de estudo. Trata-se de uma
proposta que se contrapõe ao modelo tradicional em que o professor é tido como o único
responsável no processo e os estudantes como agentes passivos.
Zabala (1998), ancora-se no pensamento prático do fazer de sala de aula, alicerçado
na capacidade reflexiva do professor. Recomenda, portanto, uma constante avaliação do
trabalho desenvolvido com os estudantes. Numa perspectiva processual estabelece fases para
o planejamento, desenvolvimento e avaliação do trabalho realizado, a partir das variáveis
selecionadas às intervenções didático-pedagógicas, assim como das condicionantes
implicadas processo educativo, dentre as quais se destaca as implicações do contexto social
amplo e particular, a formação do professor bem como suas percepções e concepções em
relação aos processos de educar e aprender, pressões sociais, a trajetória profissional dos
professores.
Uma vez que a função social da escola reside na formação integral dos estudantes, o
que envolve necessariamente o desenvolvimento de habilidades e competências para além
dos aspectos cognitivos e conceituais, a partir das relações constituídas nas experiências
vividas nos processos educativos, alicerçam-se os vínculos e as condições que definem as
concepções sobre cada um e em relação aos demais, o que remete a sociedade como um
todo, e em especial aos educadores, a uma reflexão profunda e constante sobre as condições
de cidadania. Nessa perspectiva, os conteúdos de ensino devem contemplar as distintas
dimensões da pessoa, de modo a abarcar as aprendizagens: factual e conceitual, relacionadas
ao o que se deve aprender; procedimental, que dizem respeito ao o que se deve fazer e;
atitudinal, como se deve fazer (ZABALA, 1998).
Para além de conhecer e vivenciar a cultura dos estudantes, o processo de ensino
requer que os professores compreendam o modo como os estudantes aprendem, o que
implica em conhecimentos de filosofia, sociologia, psicologia, bem como do conteúdo da
ciência a ser ensinada. Segundo Zabala (1998), a ordenação e articulação das atividades se
constituem num diferenciador nas metodologias de ensino. Há, portanto, que se considerar
os conhecimentos que os estudantes já dispõem sobre o assunto em estudo e as atividades
devem ser elaboradas e dispostas considerando níveis de complexidade cada vez maiores e
as variáveis escolhidas. Assim, as SD contemplam as intenções educacionais na definição
dos conteúdos de ensino e nos procedimentos metodológicos adotados no processo de
desenvolvimento das atividades pelos estudantes, de modo a abarcar as dimensões
conceituais, procedimentais e atitudinais.
Algumas palavras em relação ao ensino de fração ...
Bertoni (2004), nos diz que os professores indicam que o conteúdo de fração
apresenta uma série de problemas de aprendizagem nos Anos Iniciais do Ensino
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
184
Fundamental e que as avaliações nacionais mostram que os estudantes apresentam baixo
índice de acertos em questões que tratam desse conceito. Merlini (2005) analisou o
desempenho de estudantes de 5ª e 6ª séries em relação aos diferentes significados de fração
e percebeu que somente 35% obteve sucesso nas respostas às questões.
É importante que os estudantes compreendam que os números racionais se
desdobram em duas representações igualmente importantes: a decimal e a fracionária, sendo
que a primeira é bastante usual no meio social enquanto que a segunda se faz mais presente
quando se trata de razões, escalas, porcentagens e probabilidade (BERTONI, 2004). Cabe
destacar, no entanto, que raras vezes os livros didáticos e mesmo os professores estabelecem
a relação fação-decimal-porcentagem (Vizolli 2001; 2006).
De acordo com Bertoni (2004), as representações fracionárias são mais usuais em
particionamentos da unidade, enquanto que as decimais aparecem com bastante frequência
em quantias monetárias e medidas. Naturalmente fala-se metade de uma barra de chocolate,
por exemplo, e escreve-se ½ e dificilmente a representamos por 0,5. “Ainda que facetas de
um mesmo número, as duas representações são, geralmente, tratadas de modo estanque,
como se dissessem respeito a números diferentes – números decimais e frações. Isto é,
confundem-se o número e suas representações” (BERTONI, 2004, p. 1-2)
Nunes et al (2003), tratam a fração com os significados de número, relação parte-
todo, quociente, medida e operador multiplicativo. Com o significado de número, a notação
a/b, com (a ∈ Z, b ∈ Z, com b # 0), expressa um número na reta numérica. Nele diferencia-
se as quantidades em maior, menor e igual (>, < e =), ou ainda, sua representação na notação
decimal (representar ¾ e 0,75 na reta numérica). Na relação parte-todo, tem-se a ideia de
partição de um todo em partes iguais, em que cada parte pode ser representada como 1/n.
Nas situações estáticas a utilização de um procedimento de dupla contagem é suficiente para
chegar a uma representação. A fração como quociente, indica uma divisão e seu resultado,
como por exemplo, uma barra de cereal a ser repartida igualmente entre 5 crianças. Temos
o quociente entre duas variáveis (quantidade de barras de cereal e número de crianças), em
que uma corresponde ao numerador e a outra ao denominador, neste caso, 1/5 = 1 : 5, em
que cada criança recebe 1/5. Como medida, as frações podem se referir a quantidades
intensivas, as quais se baseiam na relação entre duas quantidades diferentes – suco de limão
e água que resulta na limonada. Outro exemplo é o caso da probabilidade de um evento
acontecer (quociente entre o número de casos favoráveis e o número de casos possíveis),
onde temos uma relação em que o valor do todo não influencia a quantidade intensiva. Trata-
se da probabilidade de um evento que varia de 0 a 1, e a maioria dos valores com os quais
trabalhamos são fracionários. Como operador multiplicativo as frações podem ser vistas
como o valor escalar aplicado a uma quantidade. “Situações em que os números são
operadores (1/4 de 24): dividir 24 em quatro grupos de 4, tomar 1 grupo. João perdeu 1/4 de
suas bolinhas de gude.” (NUNES, 2003, p. 13).
Nunes et al (2005), caracterizam quantidades continuas, discretas, intensivas,
extensivas, as quais implicam no processo de compreensão conceitual da fração. Para as
autoras, as quantidades contínuas são aquelas que podem ser divididas exaustivamente sem
necessariamente perderem suas características, como é o caso das medidas unidimensionais.
As quantidades discretas dizem respeito a um conjunto de objetos idênticos, que representa
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
185
um único todo e o resultado da divisão deve produzir subconjuntos com o mesmo número
de unidades inteiras (quantidade de pessoas, por exemplo).
Apesar das diferenças entre quantidades contínuas e descontínuas, elas estão
baseadas na mesma estrutura lógica, que é a relação parte-todo: a soma das
unidades é igual ao valor do todo. Essa estrutura lógica relaciona-se ao fato de que
a medida dessas quantidades é essencialmente uma comparação entre duas
quantidades de mesma natureza. "Três metros" expressa a comparação de uma
unidade de comprimento, o metro, com outro comprimento, o comprimento da
mesa. (...) Quando a medida de uma quantidade baseia-se na comparação de duas
quantidades da mesma natureza e na lógica parte-todo, dizemos que a medida se
refere a uma quantidade extensiva. (NUNES et al, 2005, p. 123).
De acordo com as autoras supramencionadas, a quantidade intensiva baseia-se na
relação entre duas quantidades de natureza diferentes, onde a quantidade é medida pela
relação entre duas variáveis distintas e resulta numa terceira, fruto de fusão de ambas, como
nas relações reais por litro; gramas de açúcar por litro de refrigerante; concentração de suco
de limão por litro de água na limonada; colheres de achocolatado em pó por litro de leite. A
comparação entre as quantidades de natureza distintas pode ser escrita na forma de razão ou
fração, mas nem sempre é possível efetuar a representação de uma determinada situação nas
formas de razão e fração, isto porque a condição necessária é a de que as quantidades de
naturezas diferentes possam ser misturadas formando uma nova composição homogênea,
como é o caso da mistura de suco concentrado de limão com água, por exemplo. Ao se tratar
do preço por quilo de laranja não é possível fazer sua representação por meio de fração, e
sim, por meio da razão.
Narrativas de cursistas ...
Ao tratar de narrativas de professores em relação a formação continuada sobre fração
para professores que atuam nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, há que considerar que
o ensino de Matemática pode ter sido o causador do distanciamento de estudos em que esta
ciência figure com grau de importância significativa. Ao ofertar um curso de formação
continuada via Secretaria Municipal de Educação envolvendo Matemática, a possibilidade
de resistência se amplia, isso porque há uma tendência (natural) de os professores sentirem-
se vigiados em relação ao domínio de conhecimentos em áreas específicas, como é o caso
da fração. Os excertos das cartas a seguir retratam bem essa realidade.
(...) junto com a expectativa veio ansiedade e talvez o medo devido à idade das
crianças e a forma de conduzir, isto é, me reinventar, tive que sair da zona de
conforto e saber que a matemática faria parte do meu cotidiano em sala de aula.
(...) confesso que no primeiro encontro fiquei apreensiva, sem saber o que
encontraria, se seria testada ou se ficaria muito exposta, já que não sou muito de
participar se não estou segura de algo, prefiro ouvir e tomar nota, e assim, mesmo
que só ouvindo aprendi muito durante essa formação. (ACHURE, 2019c)
(...) lá podemos vivenciar e compartilhar com os outros colegas as nossas
experiências e frustrações dentro da sala de aula e principalmente com a tal da
sequência didática. (SILVA, 2019c)
As narrativas de Nunes (2019c), “Confesso que na minha graduação o ensino de
matemática foi muito fragmentado, deixando algumas lacunas que foram preenchidas
durante os encontros dessa formação”, ecoa como um pedido de socorro às Instituições de
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
186
Ensino Superior a repensarem seus currículos e forma como os conteúdos são abordados na
formação inicial de professores e quanto ainda os sistemas educacionais carecem de políticas
públicas que atendam as demandas do ensino de Matemática, neste caso específico, dos Anos
Inicias do Ensino Fundamental. Na continuidade da carta menciona a metodologia utilizada
no curso de formação como sendo responsável pela compreensão de conceitos.
A metodologia utilizada me favoreceu a melhor compreensão dos conteúdos, os
recursos foram adequados e a dinâmica das aulas contribuiu para uma troca de
experiências excepcional, me fazendo refletir sobre grandes possibilidades de
mudanças na minha prática pedagógica. (NUNES, 2019c)
Os estudos de Nunes & Bryant (1997), indicam que as dificuldades dos estudantes
aparecem quando eles não distinguem as características particulares dos conjuntos
numéricos e acabam transferindo as propriedades do conjunto dos Números Naturais para o
conjunto dos Números Racionais, e neles as frações; e ainda, que alguns concluem a seus
estudos sem necessariamente ter superado uma série de dificuldades em relação à
compreensão do conceito de fração. As narrativas dos professores indicam que eles também
apresentam lacunas em relação a compreensão do conceito de fração.
Alguns participantes do curso fizeram menção a aspectos de conteúdos de
matemática suscitados no desenvolvimento das atividades da SD, destaca-se o excerto de Sá
(2019c) e Neto (2019c), os quais indicaram quase a totalidade de conteúdos/conceitos
trabalhados no decorrer do curso de formação.
Números e fração localizem na reta numérica as frações (...) História das frações
em diferentes civilizações (...) Sistema Mesopotâmico com atividade da prova
Brasil com questões sobre horas/Minutos. (...) representação das frações
impróprias utilizando se de números mistos (...) Equivalência de fração (...) Tantos
Conceitos. O que é um quadrado? Trace 3/4 da outra diagonal. (...) Resolvemos
cálculos, montamos tangaram e vimos Equivalência (...) quantidades discretas,
continua, intensivas, extensivas cada um dos conceitos MMC e Situações-
problema etc. (...) Significado de uma fração (SÁ, 2019c).
(...) ainda me lembro quando estudamos as figuras geométricas com uso do
Tangram, para aprender tivemos que voltar um pouco e lembrar passo a passo de
cada ângulos, centímetros, vértices, retas para realmente chegar na atividade
proposta, a evolução das atividades no ramo da fração nos proporcionou uma
evolução muito sistematizada voltada a área da matemática em forma geral. (...)
vale ressaltar também sobre aquele texto da “Fração em diferentes civilizações”
que foi um espetáculo, várias representações numéricas, quanto a representação
semiótica esse nome me deixou um pouco preocupado, mas foi tranquilo (NETO,
2019c).
As narrativas supramencionadas encontram eco nos estudos de Bertoni (2002),
segundo a qual a formação do conceito de fração pelos estudantes, requer a utilização de um
conjunto de representações simbólicas, linguísticas, gráficas e gestuais, capazes de
representar situações e procedimentos intimamente ligados ao conceito. Isso significa que a
construção do conceito pelo estudante requer uma metodologia fortemente articulada às
situações cotidianas, cujo processo de ensino perpassa pela proposição de respostas de modo
informal, mentalmente ou por meio de falas. Os registros inicias das frações tem origem nas
estratégias utilizadas pelos estudantes e, posteriormente utiliza-se os registros formais.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
187
Se faz mister lembrar que, de acordo com Carvalho (2017), nos livros didáticos é
bastante usual o significado parte-todo, embora em menor incidência seja possível encontrar
o operador multiplicativo. Pouco se encontra o significado de número, quociente e medida.
Ademais, pouca atenção é dada em relação à natureza das quantidades. Já os estudos de
Vizolli (2001; 2006), apontam para a necessidade da utilização de diferentes registros de
representação semiótica. “As representações semióticas são constituídas pelo emprego de
signos pertencentes a um sistema de representação os quais comportam regras próprias de
significado e funcionamento” (DUVAL, 1993, p. 38).
Achure (2019c) e Diniz (2019c), chamam a atenção em relação a experiências no processo
de ensino e aprendizagem de fração.
Fração ainda é um conteúdo que requer muito estudo da minha parte, no entanto,
estar em contato com outras experiências me possibilitou ter um olhar diferente,
saber que meu aluno pode aprender de várias maneiras. Podemos brincar com um
conteúdo que muito nos assusta e percebê-lo nas situações mais simples do dia a
dia. (ACHURE, 2019c)
A princípio, a temática era insignificante, pois se tratava de um assunto ao qual eu
dominava. Mas o professor orientador dos mestrandos foi introduzindo os pontos
de interrogação em nossas mentes. Assim percebi que não tinha conhecimento do
conteúdo frações a fundo. (DINIZ, 2019c)
Os excertos coadunam-se com o pensamento de Damico (2007, p. 171), ao referir-se
sobre a concepção de ensino de Matemática,
[...] se a concepção de ensino de Matemática estiver embasada na teoria
construtivista de construção de conhecimentos matemáticos, o conhecimento de
regras ou algoritmos, por parte de quem ensina, seria um item necessário, mas não
seria suficiente. Neste caso, a organização do ensino é mais complexa, uma vez
que não se trata de transmissão de conhecimentos em fase final de elaboração, o
que demanda de quem ensina um amplo conhecimento conceitual do objeto de
estudo que, obviamente, está além do conhecimento processual imposto pelas
regras (DAMICO, 2007, p.171).
As entrevistas dos professores indicam que a formação possibilitou que passassem a
refletir sobre suas práticas em sala de aula. As narrativas de Silva (2019e), as falas dos
demais entrevistados indicam contribuições do curso de formação às práticas educativas dos
professores.
Nós pudemos através da formação trazer um conhecimento maior para os nossos
alunos que foi de grande valia, e até mesmo as experiências dos outros professores
que alguns conhecimentos que uns tinham, outros não tinham, experiências que
nós podemos até mesmo dentro da formação está atrelando aos nossos alunos,
compartilhando com eles.
(...) a formação nos trouxe isso, de tirar aquele negócio de papel, quadro e pincel,
e partir para construção realmente de fato, onde o aluno possa pegar, fazer,
aprender, discutir, ir e assim chegar a um resultado, de saber realmente o que que
ele estava fazendo, o quê que ele estava manuseando.
(...) Então, a partir do momento que os formadores nos colocaram novos caminhos
para a gente levar para os nossos alunos com outro olhar, nós professores
mudamos também totalmente a nossa prática, até mesmo com materiais
construídos que nós podemos levar para dentro de sala, mudou o comportamento
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
188
dos alunos. Porque, a partir do momento que eles têm algo a manusear, algo
diferenciado para fazer e até nós mesmo professores, a partir do momento que o
formador nos levou algo novo, não conteúdo novo, mas um conteúdo que nós já
estudamos mais de outras formas. Então, quando ele levou práticas novas, nós nos
tornamos também pessoas com conhecimento mais elevado e nossos alunos
gostam disso, porque eles gostam de coisas diferentes, eles gostam de manusear,
fazer, recortar e descobri que realmente estão aprendendo, porque a matemática
em si, ela já não é algo que todo mundo ama de paixão. (SILVA, 2019e)
Em suas narrativas, os participantes teceram comentários em relação a Sequência
Didática, inclusive suas percepções e concepções. Os excertos das falas dos participantes
dão a dimensão das discussões efetuadas.
(...) nós pudemos naqueles momentos de formação entender que a sequência
didática, tão falada, não era necessariamente a interdisciplinaridade que nós
professores achávamos que era, e era imposta a nós (...), mesmo porque nós
mesmos e nossos formadores anteriores, também não conseguiram nos passar o
que era a sequência didática. (...) conseguimos enfim, saber sequenciar esses
conteúdos e obtermos o sucesso dentro da nossa sala de aula. (SILVA, 2019e)
Para fazer uma sequência didática precisava ter todas as disciplinas? Eu poderia
fazer uma sequência didática só de matemática? Eu poderia fazer uma sequência
didática só de outras disciplinas? Foi esse o ponto que houve mais discussão, na
sala que eu estava. Então chegou à conclusão de que você poderia fazer com essa
sequência didática de matemática. Mas, isso não impedia de ser regado por outras
disciplinas, que outras disciplinas viessem dar sua contribuição. Foi por isso, que
o carro-chefe da sequência didática do nosso grupo foi a matemática, claro! Porque
era a disciplina que nós estávamos tendo a formação. Só que lá não impediu que
outras disciplinas aparecessem mais de forma natural, não abrir a gavetinha e falar,
ó aqui agora nós vamos ver a fração lá na história! Agora em Geografia, você vai
ver isso aqui de frações! (ACHURE, 2019e)
Zabala (1998) indica que os métodos globalizados, dentre os quais encontra-se a SD,
como uma das formas de inserir o estudante no centro das atenções e no foco dos objetivos
de aprendizagem.
Nestes métodos, as unidades didáticas dificilmente são classificáveis se tomamos
como critério o fato de que correspondam a uma disciplina ou matéria
determinada. Os conteúdos das atividades das unidades dística passam de uma
matéria para outra sem perder a continuidade: a uma atividade que aparentemente
é de matemática segue outra que diríamos que é de ciências naturais, e a seguir
uma que poderíamos classificar como de estudos sociais ou de educação artística.
A diferença básica entre os modelos organizativos disciplinares e os métodos
globalizados está em que nestes últimos as disciplinas como tais nunca são a
finalidade básica do ensino, senão que têm a função de proporcionar os meios ou
instrumentos que devem favorecer a realização dos objetivos educacionais.
(ZABALLA, 1998 p. 141-142)
De acordo com Zabala (1998), o diferencial, além da organização e encadeamento
das atividades na SD, reside no fato de elas atenderem as especificações dos estudantes assim
como do conteúdo a ser estudado. O pano de fundo nesse tipo de trabalho reside no fato de
atender as especificidades dos estudantes e colocá-los em cena no processo de aprendizagem.
As oportunidades comunicativas estabelecidas a partir das análises e reflexões sobre as
atividades, orientam e definem os papeis de cada um dos envolvidos no processo.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
189
O que queremos dizer é que mais do que nos movermos pelo apoio acrítico a um
ou a outro modo de organizar o ensino, devemos dispor de critérios que nos
permitem considerar o que é mais conveniente em um dado momento para
determinarmos objetivos a partir da convicção de que nem tudo tem o mesmo
valor, nem vale para satisfazer as mesmas finalidades. Utilizar estes critérios para
analisar a nossa prática e, se convém, para orientá-la em algum sentido, pode
representar, em princípio, um esforço adicional, mas o que é certo é que pode
evitar perplexidades e confusões posteriores. (ZABALA, 1988, p. 86).
A fala de Achure (2019e), a seguir, remete-nos a pensar em relação aos papeis dos
envolvidos no processo de ensino e aprendizagem.
(...) porque nós não somos prontos e acabados, nós estamos sempre em processo
de aprendizagem(...), eu me vi na mesma situação dos meus alunos. (...) Houve
tipo que um despertar, não que ninguém estivesse vendo isso antes. Mas, nós
vimos que tinha a necessidade de estar trabalhando mais a matemática com os
nossos alunos, não que tenha que ser trabalhado só no quinto ano, acho que desde
as séries iniciais, (...) Então, ela (a formação continuada) está para o professor,
mas tá pensando no aluno, como que eu vou preparar esse professor para estar
atendendo esses anseios da educação. Então, eu acho que a formação, ela vai
contribuir muito para o nosso crescimento individual, como pessoa, como
profissional (...). Então, baseado na experiência do meu colega, nos recursos que
ele utiliza, eu posso estar levando isso para minha sala de aula, (...) e nós podemos
trocar essas experiências, e o que eu acho bom da formação é isso, estar em contato
com as outras pessoas. Então, essa troca de experiência para mim é
fundamental.(ACHURE, 2019e)
O valor social das relações do professor com os estudantes vai além do que é ensinado
em sala de aula e, uma vez que todos devem atuar ativamente no processo de solução das
atividades, os diálogos constantes, inclusive sobre assuntos do contexto social em que vivem
os estudantes devem servir para orientá-los em suas atuações na comunidade. Isso remete ao
professor planejar atividades de modo a diversificar as estratégias de ensino, prevendo
situações desafiadoras tanto do ponto de vista do conteúdo das ciências tratadas e discutidas
na escola, como de situações do contexto social. Os diálogos instiguam os estudantes na
busca de soluções e respostas criativas às situações em discussão.
A plasticidade das relações interativas entre professores e estudantes e objeto do
conhecimento por meio do desenvolvimento de SD, permite a adaptação das atividades
previstas de modo que os estudantes em diferentes níveis de conhecimento possam participar
ativamente do processo e expressar suas ideias. Assim o planejamento das ações deve
atender as necessidades dos estudantes; considerar suas experiências; auxiliá-los na
compreensão do que estão fazendo; levá-los a enxergar os processos; deixar claros os
objetivos a serem alcançados; municiá-los com dados e informações que propiciem
condições para que respondam ao que lhes é demandado; propiciar um ambiente de
estudo/trabalho colaborativo; permitir reflexões e trocas de ideias; avaliar as aprendizagens;
dentre outras condições que favoreçam as aprendizagens.
Nessa perspectiva, o ambiente de sala de aula deve ser propício à aprendizagem, o
que requer uma disposição na organização/distribuição dos estudantes distinta daquela de
“cabeça atrás de cabeça”, o que não significa que em determinados momentos os estudantes
não tenham que trabalhar de forma individual, mas esta não pode e nem deve ser
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
190
predominante. Aconselha-se o predomínio do trabalho colaborativo e em equipe e que as
atividades requeiram a realização de registros dos procedimentos adotados para responder
as tarefas.
Eu acho que o mais difícil é elaborar o material, porque é mais cômodo para nós,
devido a correria, tanto os outros fatores, você só pegar o que vem no livro, ou
então, uma situação e colocar para o aluno. Agora, a parte que você vai se
desdobrar para tentar mostrar para aquele aluno, na maneira mais visual, algo que
ele possa tocar, que ele possa ver, possa vivenciar aquilo. Eu acho que é a parte
mais desafiadora, pelo menos para mim! Porque, você pode ter os materiais, mas
você construir aquele material, você tentar fazer uma multiplicação de frações,
você mostrar a equivalência de frações, você elaborar um material concreto eu
sinto dificuldade em fazer essa parte. (ACHURE, 2019e)
Não é muito difícil produzir a sequência (...) A dificuldade foi pensar o quê que
poderia vir primeiro, aí veio a história da fração, como tudo iniciou. Depois foi a
reunião do grupo para debater como é que iremos iniciar e um sempre quer
iniciar de uma forma ou de outra, (...) (NETO, 2019e)
O planejamento das atividades, a metodologia a ser adotada no processo de solução
das tarefas, a organização dos estudantes, o estabelecimento de critérios e condutas a serem
seguidos no desenvolvimento da SD e a decoração do ambiente de sala de aula, inscrevem-
se no rol de competências do professor e são importantíssimas ao processo de ensino e
aprendizagem porque orientam os papeis dos estudantes, do professor e situa o lugar do
objeto de estudo.
(...) porque nós não somos prontos e acabados, nós estamos sempre em processo
de aprendizagem(...), eu me vi na mesma situação dos meus alunos. (...) Houve
tipo que um despertar, não que ninguém estivesse vendo isso antes. Mas, nós
vimos que tinha a necessidade de estar trabalhando mais a matemática com os
nossos alunos, não que tenha que ser trabalhado só no quinto ano, acho que desde
as séries iniciais, (...) Então, ela (a formação continuada) está para o professor,
mas tá pensando no aluno, como que eu vou preparar esse professor para estar
atendendo esses anseios da educação. Então, eu acho que a formação, ela vai
contribuir muito para o nosso crescimento individual, como pessoa, como
profissional (...). Então, baseado na experiência do meu colega, nos recursos que
ele utiliza, eu posso estar levando isso para minha sala de aula, (...) e nós podemos
trocar essas experiências, e o que eu acho bom da formação é isso, estar em contato
com as outras pessoas. Então, essa troca de experiência para mim é fundamental.
(ACHURE, 2019e)
As falas dos participantes remetem aos termos de Vizolli (2006), em que a formação
inicial e continuada de professores não pode ser constituída de teorias desconexas de práticas
e tampouco distante das indicações ou orientações das pesquisas.
(...) é preciso estudar com os professores teorias e metodologias que fundamentem
sua ação, de forma a melhorar o processo ensino e aprendizagem desta disciplina
(Matemática). Para tanto, o professor que atua na formação de professores deve
discutir com eles, o conteúdo e os objetivos a que se destina a formação
continuada, porque, ao contrário, teremos o que se pode chamar de “pacotes” de
cursos, que pouco tem contribuído com a melhoria da qualidade da ação docente
em sala de aula (VIZOLLI, p. 27-28).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
191
Tecendo considerações ...
As pesquisas de Bertoni (2004), Oliveira (2013), Barros (2018), Cardoso (2020),
COSTA (2020), dentre outros, indicam que os professores ensinam matemática nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental carecem de conhecimentos em relação ao conceito de fração.
Este estudo indica que há necessidade de se considerar a diversidade de registros de
representação semiótica, os diferentes significados quea fração comporta, bem como sua
relação com os números decimais e a porcentagem; que os professores tendem a ensiná-la
em seu significado parte/todo, o que é importante, porém insuficiente à compreensão
conceitual.
Ao solicitar que os participantes da pesquisa elaborassem sistemas de numeração e
operassem matematicamente para resolver situações que tratam da história da fração em
diferentes civilizações provocou um certo desconforto, isso porque esse tipo de atividade
exigiu ação intelectual dos cursistas, o que não é algo trivial em cursos de formação de
professores. A pesquisa indicou que muitos participantes não conheciam elementos da
história das frações; a relação com as características dos sistemas de numeração; a existência
de distitnas bases numéricas e os diferetens modos de representar uma fração.
Dos cinco significados apresentados no desenvolvimento da sequência didática, os
cursistas apresentaram facilidade com os significados numérico, medida, parte/todo e
quociente. Os cursistas apresentaram maiores obstáculos com o operador multiplicativo.
Tais resultados corroboram com Silva (1997), segundo o qual, há professores que
apresentam dificuldades em associar frações em diferentes registros. Assim como os
estudantes, alguns professores ainda levam em conta somente a quantidade de partes em que
o todo foi particionado, ficando evidente, mais uma vez, a dificuldade dos cursistas com a
natureza das quantidades contínuas. Por isso a necessidade do ensino de fração considerando
as múltiplas quantidades (discreta, contínua, intensiva e extensiva).
Nosso entendimento é que os professores participantes da pesquisa ampliaram seus
conhecimentos em relação a fração a medida que apresentaram desenvoltura ao converter
frações e resolver problemas envolvendo os diversos significados e natureza das
quantidades. Acreditamos também que este trabalho serva de instrumento para outras
formações, mas de modo algum ele está pronto e acabado, pois a educação é um processo e
como tal, há que se buscar constantemente novas perspectivas.
Os relatos dos professores reverberam dificuldades iniciais e resistências aos
diferentes entendimentos sobre SD até então apresentados à eles, e de acordo com falas dops
os entrevistados persistiram nos primeiros três encontros da formação. O entendimento da
maioria dos cursistas é de que o planejamento de aulas, com atividades sobre conteúdos que
deveriam ser, obrigatoriamente apresentados de forma interdisciplinar.
Ademais, entende-se que sequência didática precisa ser apreendida como um
procedimento de ação pedagógica que estreita as relações entre professores, estudantes e os
conteúdos de aprendizagem, de modo a favorecer a compreensão do conceito do conteúdo
em estudo. Neto (2019c) diz que “ao final da formação, a maioria demonstrara terem
adquirido o entendimento conceitual e a ampliação de seu conhecimento prático em relação
a temática desenvolvida”.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
192
O exposto denota que existem diferentes possiblidades de se organizar o trabalho de
sala de aula a partir da proposição e desenvolvimento de SD, assim como se constitui numa
importante fonte de pesquisa aos interessados em compreender os meandros do processo de
ensino e aprendizagem nas diferentes áreas do conhecimento.
Recomenda-se estudos em relação as concepções dos professores sobre sequências
didática e compreender os campos conceituais mobilizados pelos cursistas ao solucionarem
as atividades propostas.
Referências
BARROS, M. J. P. A solução de situações que envolvem o conceito de fração por
professores que ensinam Matemática nos Anos Iniciais. Programa de Pós-Graduação de
Mestrado Acadêmico em Educação, Universidade Federal do Tocantins. Palmas:
PPGE/UFT, 2018. (Dissertação de Mestrado).
BERTONI, N. E. Um novo paradigma no ensino e aprendizagem das frações. In: VIII
Encontro Nacional de Educação Matemática. Educação Matemática: um compromisso
Social. Sociedade Brasileira de Educação Matemática. Anais, Palestra. Recife, PE, 2004.
Disponível em <http://www.sbem.com.br/files/viii/pdf/15/PA01.pdf> Acesso em, 07 de
agosto de 2017.
CARDOSO, L. S. O desenvolvimento de uma sequência didática para trabalhar o
conceito de fração com professores de 4º e 5º Anos do Ensino Fundamental. Programa
de Pós-Graduação de Mestrado Acadêmico em Educação, Universidade Federal do
Tocantins. Palmas: PPGE/UFT, 2020. (Dissertação de Mestrado).
CARVALHO, E. S. Sequência Didática: uma proposta para o ensino de conceito de fração.
2017. Programa de Pós-Graduação de Mestrado Profissional em Matemática, Universidade
Federal do Tocantins. Arraias-TO: PROFMAT/UFT, 2017. (Dissertação de Mestrado).
COSTA, A. B. O legado no andarilhar de um curso de formação continuada sobre
fração. Diseertação. Programa de Pós-Graduação Profissional de Mestrado em Educação -
PPPGE, Universidade Federal do Tocantins – UFT. Palmas-TO, 2020.
DAMICO, A. Uma investigação sobre a formação inicial de Professores de Matemática
para o ensino de números racionais no ensino fundamental. Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo – PUC/SP. PUC: São Paulo-SP, 2007. (Tese de Doutorado em
Educação Matemática).
DUVAL, R. Registres de représentation sémiotique et fonctionnements cognitif de la pensée.
In: Annales de didactique et Sciences Cognitives. Strasbourg: IREM-ULP, 1993. vol.5,
pp. 37-65.
DUVAL, R. Semiósis e pensamento humano: registro semiótico e aprendizagens
intelectuais. Trad. Lênio Fernandes Levy e Marisa Rosâni Abreu da Silveira. São Paulo:
Editora Livraria da Física, 2009.
MARCONI, M. de A.; LAKATOS, E. M. Fundamentos de metodologia científica. 5. ed. São
Paulo: Atlas, 2003.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.178-193 ISSN: 2675-1909
193
MEIHY, J. C. S. B. Manual de história oral. 5. ed. São Paulo: Loyola, 2005.
MERLINI, V. L. O conceito de fração em seus diferentes significados: um estudo
diagnóstico com alunos de 5ª e 6ª séries do ensino fundamental. Dissertação (Mestrado
em Educação Matemática) Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2005.
NUNES, T; et al. Educação Matemática 1: números e operações numéricas. São Paulo:
Cortez, 2005.
NUNES, T.; BRYANT, P. Crianças fazendo matemática. Porto Alegre: Artes Médicas,
1997.
NUNES, T.; et al. The effect of situations on children’s understanding of fractions.
Trabalho apresentado no encontro da British Society for Research on the Learning of
Mathematics. Oxford, junho de 2003.
OLIVEIRA, M. M. Sequência Didática Interativa no processo de formação de
professores. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.
SILVA, M. J. Sobre a introdução do conceito de número fracionário. 1997. 245 f.
Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, São Paulo, 1997.
VIZOLLI, I. Registros de alunos e professores de educação de jovens e adultos na
solução de problemas de proporção-porcentagem. Curitiba, 2006. 245f. + 188 anexos
(CD). Tese (Doutorado em Educação) Universidade Federal do Paraná.
VIZOLLI, I. Registros de representação semiótica no estudo de porcentagem.
Florianópolis, 2001. 245f. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Federal de
Santa Catarina.
ZABALA, A. A prática educativa: como ensinar. Trad. Ernani F. da F. Rosa. Porto Alegre:
Artmed, 1998.
Idemar Vizolli
Professor na Universidade Federal do Tocantins – UFT
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7341-7099
Ritianne de Fátima Silva de Oliveira
Professora na Rede Pública Municipal de Canaã dos Carajás, PA
Mestranda em Educação pela Universidade Federal do Tocantins – UFT
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6928-6348
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 18 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p194-208.id293 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
O corpo do indivíduo como meio semiótico e centro do sistema referência
no processo de objetivação da orientação espacial
The individual's body as a semiotic medium and center of the reference
system in the process of objectivation spatial orientation
Jussara Patrícia Andrade Alves Paiva
Universidade Federal da Paraíba
Claudianny Amorim Noronha
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
RESUMO
Este artigo tem como objetivo evidenciar como o corpo atua como sistema de referência central
para o desenvolvimento da orientação espacial. Para isso, com fundamentação na Teoria da
Objetivação, desenvolvida por Luis Radford, analisa evidências relacionadas a objetivação dos
saberes matemáticos referentes à orientação espacial, em especial quanto a utilização do corpo do
indivíduo como meio semiótico relevante no âmbito da localização, da movimentação e da
comunicação espacial. Os dados apresentados foram coletados durante uma pesquisa de
intervenção desenvolvida em sala de aula, com estudantes do 6º ano do Ensino Fundamental, em
que foram realizadas tarefas que abordam a orientação espacial. Na análise dos dados coletados,
demonstramos a importância da tomada de consciência dos saberes matemáticos mobilizados em
torno do conceito de lateralidade e a importância do corpo do indivíduo como meio semiótico e
sistema de referência central para o desenvolvimento da orientação espacial, quer seja no espaço
real perceptível, no espaço representacional ou na relação entre ambos.
Palavras-chave: Teoria da Objetivação; meios semióticos; orientação espacial; lateralidade.
ABSTRACT
This article aims to show how the body acts as a central reference system for the development of
spatial orientation. For this, based on the Theory of Objectification, developed by Luis Radford, it
analyzes evidence related to the objectification of mathematical knowledge regarding spatial
orientation, particularly the use of the individual's body as a relevant semiotic medium within the
scope of location, of spatial movement and communication. The data presented were collected
during an intervention research carried out in the classroom, with students from the 6th year of
elementary school, in which tasks were performed that address spatial orientation. In the analysis of
the data collected, we demonstrate the importance of becoming aware of the mathematical
knowledge mobilized around the concept of laterality and the importance of the individual's body
as a semiotic medium and central reference system for the development of spatial orientation,
whether in real space perceptible, in the representational space or in the relationship between the
two.
Keywords: Objectification Theory; semiotic means; spatial orientation; laterality.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
195
Introdução
Neste artigo trazemos discussões sobre os resultados de uma pesquisa de
Doutorado (PAIVA, 2019) que objetiva analisar os meios semióticos mobilizados no
processo de ensino-aprendizagem da orientação espacial, que possibilitam ao estudante
estabelecer uma relação reflexiva e ética com o espaço. Essa pesquisa adotou como
referencial teórico a Teoria da Objetivação (TO) desenvolvida por Radford (2006), na qual
o saber é entendido como algo posto culturalmente e historicamente, e o processo de
objetivação ocorre por meio da tomada de consciência dos indivíduos, desses saberes
movimentados durante o labor conjunto, que pressupõe um comprometimento e um
envolvimento na atividade e põe em evidência que o mundo não existe sem o outro.
Destaca-se que o conceito de atividade, na perspectiva da TO, recebe influências
da Teoria da Atividade, de Leontiev, que articula a ideia de atividade como movimento,
com base no Materialismo Dialético, e a caracteriza por seus objeto e motivo (RADFORD;
D’AMORE, 2017). Essa perspectiva embasa um dos conceitos chaves da TO, apresentado
no item 2.1, o de labor conjunto. Portanto sempre que falamos em “atividade” neste texto,
não nos restringimos a uma tarefa escolar, mas também “a uma serie de acoes
mobilizadoras (discussoes orais entre alunos-alunos, alunos-professores, registros escritos,
uso de gestos, dentre outros), de diferentes naturezas (social, cognitiva, dentre outras) que
fomentam o encontro dos envolvidos com o saber matemático” (GOMES, 2020, p. 71).
Em relação aos conceitos de orientação espacial partimos dos estudos de Clements
e Sarama (2009) que definem que orientação espacial e “saber onde você está e como se
locomover no mundo; isto é, entender as relações entre diferentes posições no espaço, a
princípio com respeito à sua própria posicão e ao seu movimento atraves dela.”
(CLEMENTS; SARAMA, 2009, p. 107, tradução nossa).
Para a coleta de dados na pesquisa buscamos estabelecer tarefas para o ensino-
aprendizagem da orientação espacial, fundamentadas na teoria da objetivação, vivenciadas
com estudantes do 6º ano do Ensino Fundamental, para identificar e analisar as
dificuldades envolvidas, as intervenções realizadas e os meios semióticos mobilizados no
processo ensino-aprendizagem da orientação espacial.
Este artigo tem como objetivo evidenciar como o corpo dos indivíduos atua como
sistema de referência central para o desenvolvimento da orientação espacial. Para isso,
analisamos segmentos da atividade realizada na sala de aula durante a vivência das tarefas
e buscamos destacar situações que demonstram a relevância do próprio corpo como
sistema de referência e a compreensão da alteridade espacial, considerando que não
estamos sós no mundo e que no labor conjunto, o outro tem o seu próprio corpo como
sistema de referência central para sua orientação espacial.
Na segunda seção deste artigo apresentamos o marco teórico utilizado para o a
vivência em sala de aula e a análise dos resultados. Na seção seguinte, trazemos o
delineamento metodológico da coleta e análise dos dados. Na quarta seção, realizamos a
descrição do episódio, que serviu de base para a coleta de dados, bem como analisamos
algumas evidências coletadas na pesquisa. Por fim, alinhados com o objetivo deste artigo e
tecemos algumas considerações finais.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
196
Marco teórico
Nesta seção delineamos os principais pressupostos teóricos utilizados para a
construção das hipóteses, desenho das tarefas vivenciadas, coleta e análise dos dados.
Discorremos sobre os conceitos utilizados, organizando-os em torno da Teoria da
Objetivação e da orientação espacial.
Teoria da Objetivação
Em relação aos conceitos em torno da Teoria da Objetivação (TO) podemos
compreender que a objetivacão se caracteriza como “os processos sociais atraves dos quais
os estudantes são confrontados com formas de pensamento e ação historicamente e
culturalmente constituídas e gradualmente se familiarizam com eles de uma maneira
crítica” (RADFORD, 2018a, p. 67, traducão nossa). Diante disso, aprender e tomar
consciência dos sistemas de pensamento, reflexão e ação culturalmente e historicamente
constituídos, e ocorre por meio de um labor conjunto. (RADFORD, 2017).
Para a Teoria da Objetivação, o processo de ensino e de aprendizagem não são
processos distintos, separados, com uma ação feita pelo professor (ensino) que passa as
orientações e outra pelo estudante (aprendizagem) que recebe essas orientações, mas como
um processo único, inseparável, um Labor conjunto (RADFORD, 2014b). O labor
conjunto, por sua vez, é a categoria central da TO o que pressupõe que o conhecimento se
revela por meio das interações entre os indivíduos, valorizando a alteridade, e com isso
destacando a importância do papel de cada sujeito nesse processo e pressupõe que o labor
conjunto ocorre por meio da mobilização de meios semióticos.
Nesse sentido, para a TO o processo de objetivação ocorre por meio de uma
atividade semiótica, em que o sistema de signos e significação é visto como algo mais
amplo e imerso dentro de contextos históricos e culturais. Assim, o indivíduo é
compreendido no âmbito de um Sistema Semiótico de Significação Cultural (SSSC), que é
uma estrutura simbólica e dinâmica que estabelece a compreensão de indivíduo e de
mundo (RADFORD, 2016). Os modos de conhecimento são então compreendidos por
meio da relação entre a atividade (labor conjunto) e o SSSC, no qual essa atividade está
imersa. Ressalta-se que, o “[...] SSSC está cheio de tensões, assim como as atividades de
onde elas emanam, e tem uma função normativa (que pode ser explícita, implícita ou
ambas)” (RADFORD, 2016, p. 2, traducão nossa).
Ressaltamos que a tomada de consciência dos saberes postos culturalmente ocorre
por meio do labor conjunto, imerso em um sistema semiótico cultural e dentro de um
Sistema Semiótico. Os signos são entendidos como um registro de representação
semiótica, porém, de uma maneira abrangente, como tudo que exprima significados
(linguagem, gestos, ritmos, escritos, expressões faciais). Destacamos o entendimento de
Radford (2018b) quando ele diz que
[...] não limito o escopo dos signos à marcas ou inscrições. Eu considero os
indivíduos como signos também. Como os signos, os indivíduos ocupam
posições no mundo social e se comportam de maneiras que não são de todo
diferentes dos signos de um texto. Uma diferença crucial entre inscrições e
indivíduos, no entanto, é que os indivíduos não são meramente significados por
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
197
meio de sintaxes bem definidas, como inscrições e signos tradicionais. As
sintaxes culturais pelas quais os indivíduos passam a se posicionar no mundo
social são menos visíveis: elas fazem parte de uma superestrutura simbólica
cultural dinâmica (RADFORD, 2018b, p. 21, tradução nossa).
Assim, na Teoria da Objetivação o conceito para meios semióticos é o conjunto
desses meios dotados de significado que são mobilizados no processo de objetivação
(RADFORD et al, 2003). No âmbito da mobilização desses meios semióticos destacamos
dois construtos relevantes para as análises desse artigo. O primeiro construto é o nó
semiótico, caracterizado como o segmento do labor conjunto, em que os meios semióticos
foram coordenados de tal maneira que levaram o indivíduo a progressivamente tomar
consciência de determinados saberes mobilizados (RADFORD et al, 2017). É importante
ressaltar que
Um nó semiótico não é um conjunto de signos. É um segmento de atividade
conjunta que geralmente inclui uma coordenação complexa de vários registros
sensoriais e semióticos que os estudantes e professores mobilizam para perceber
algo (por exemplo, uma estrutura matemática ou um conceito matemático
trabalhado) (RADFORD et al, 2017, p. 718, tradução nossa)
O outro construto relevante, é a contração semiótica, que ocorre quando há uma
reorganização dos meios semióticos utilizados no processo de objetivação, de forma a
descartar alguns recursos semióticos inicialmente utilizados e otimizar o processo, por
meio de uma escolha mais consciente daqueles a serem utilizados, simplificando o
processo (RADFORD, 2015).
Na contração semiótica, o estudante usa menos recursos e de forma mais
consolidada, demonstrando um nível mais aprofundado de intelegibilidade e, portanto,
dispendendo menos energia, passa a direcionar a atenção aos elementos centrais do
processo. Diante dos diversos meios semióticos mobilizados no processo de objetivação,
os gestos e a movimentação corporal são considerados relevantes para as análises desse
artigo. Assim, dentre os significados que podem ser expressos por meio do corpo do
indivíduo destacamos a significação espacial, como referência no âmbito da orientação
espacial, conforme discutido na seção seguinte.
Orientação Espacial
Quanto aos saberes matemáticos envolvidos nas análises deste artigo é preciso
compreender, inicialmente, a orientação espacial como constitutiva do pensamento
espacial. Para Clements “[...] o pensamento espacial e importante porque e uma habilidade
humana essencial que contribui para a capacidade matemática” (2008, p. 107, traducão
nossa) e afirma que o pensamento espacial requer aprendizagem da orientação espacial e
da visualização.
A visualização diz respeito a como um indivíduo percebe determinado objeto e
movimenta as partes que o constitui, e nesse caso o observador está externo ao sistema
referencial a que esse objeto pertence. Nessa perspectiva, a posição do observador em
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
198
relação ao objeto ou mesmo a relação entre objetos observáveis não é necessariamente
relevante.
De outro modo, a orientação espacial requer a compreensão de um sistema
referencial mais amplo, em que a posição do observador em relação ao objeto, ou a posição
desse objeto em relação a outros, é fundamental para a compreensão do espaço no sentido
mais amplo. Podemos considerar que na visualização centramos a atenção no objeto em si,
e, na orientação espacial, centramos a atenção no sistema espacial no qual o objeto está
imerso, e do qual fazem parte outros objetos. Ressaltamos que nesse artigo centramos
atenção aos conceitos matemáticos em torno da orientação espacial, considerando-a
distinta da visualização espacial.
Partindo do conceito proposto por Clements e Sarama (2009), para os quais a
orientação espacial é saber onde você está (localização) e como se locomover no mundo
(movimentação), propomos uma primeira categorização relevante para o desenho das
tarefas e para a análise dos dados quanto aos saberes envolvidos na orientação espacial,
conforme expresso no Quadro 1.
Quadro 1 - Categorias de mobilização de saberes matemáticos nas tarefas de
orientação espacial
Fonte: Paiva (2019)
Na categorização para análise da orientação espacial, apresentada no Quadro 1, a
localização e a movimentação são categorias diretamente ligada ao conceito proposto por
Clements e Sarama (2009). Entretanto, ampliamos essa categorização, incluindo a
comunicação como uma categoria que deve ser analisada de forma distinta da localização e
da movimentação, por consideramos que essa requer mais do que a compreensão de uma
linguagem adequada e significativa para comunicar algo. Requer, também, o
Quanto a mobilização de saberes matemáticos nas tarefas de orientação espacial.
Localização - refere-se à identificação de posições noespaço, de um observador ou de um objeto (estáticos), emrelação a um determinado sistema de referência adotado.
Movimentação - refere-se à identificação do movimentorealizado por um observador ou objeto num determinadoespaço. A posição do observador ou dos objetos se alteramentre eles ou em relação a um determinado sistema dereferência.
Comunicação - Considera-se a alteridade na orientaçãoespacial, ou seja, como um indivíduo comunica a outro (ououtros) indivíduo uma determinada localização oumovimentação no espaço. Destaca-se a relaçãoestabelecida entre o sistema de referência adotado por umindivíduo que comunica determinada orientação espacial eo sistema de referência do indivíduo que recebe amensagem
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
199
estabelecimento de uma relação entre sistemas de referência espaciais, por quem comunica
a orientação e quem recebe essa comunicação.
Portanto, a comunicação de uma orientação espacial não é meramente uma forma
de informar uma determinada localização ou movimentação no espaço, mas exige a
compreensão de saberes matemáticos e habilidades1 espaciais. Dessa forma, envolve a
compreensão de uma alteridade espacial, de que não estamos sós no mundo, buscando nos
colocar no lugar do outro, neste caso, também no sentido espacial.
Diante da categorização exposta (Quadro 1), definimos então que orientação
espacial é a mobilização de saberes pelo indivíduo para localizar, movimentar, comunicar,
perceber e representar objetos e pessoas no espaco” (PAIVA, 2019, p.58).
Uma segunda categorização (Quadro 2) utilizada como parâmetro para as análises
efetuadas neste artigo, é quanto ao sistema de referência adotado pelo observador durante a
orientação espacial, distinguindo se ele está alicerçado no espaço real perceptível ou no
espaço representacional.
Quadro 2 –Modos de vivência das tarefas de Orientação Espacial
1 Grande parte dos estudos sobre o desenvolvimento de habilidades ligadas a orientação espacial no âmbito
do ensino fundamental tem centralidade no desenvolvimento cognitivo individual do aluno. Todavia,
partindo-se do conceito de ensino-aprendizagem para a Teoria da Objetivação, esta investigação buscou uma
abordagem educacional sobre a orientação espacial, fundamentada no labor conjunto entre os indivíduos
dentro de uma perspectiva histórico-cultural. Com isso, devemos entender habilidade como formas de ação e
reflexão que já existem na nossa cultura e que as “encontramos no curso de nossa vida como objetos
externos” (RADFORD, 2017, p.118).
Quanto aos modos de vivenciar tarefas de orientação espacial com base no
sistema de referência adotado.
Espaço real perceptível - em que o espaço objeto da orientação é oespaço percebível pelos sentidos, especialmente a visão, e neste caso opróprio corpo do observador é elemento central do sistema dereferência;
Espaço representacional - quando a orientação ocorre levando-se emconsideração um sistema de referência de um espaço representacional,seja uma representação gráfica ou na memória, de um espaço real ounão;
Relação entre espaço real perceptível e espaço representacional -quando a orientação espacial ocorre por meio do estabelecimento deuma interligação entre o sistema de referência do espaçorepresentacional e o sistema de referência do espaço real perceptível;
Relação entre espaços representacionais - quando a orientação espacialocorre no estabelecimento de relação entre sistemas de referência deespaços representacionais distintos.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
200
Fonte: Paiva (2019).
Para estabelecermos essa categorização (Quadro 2), partimos da distinção
estabelecida entre espaço real e espaço representacional. O espaço real não é caracterizado
apenas pelo fato de existir ou não concretamente, mas aquele espaço que também está
sendo percebido pelo indivíduo no momento da orientação. Nesse caso, um espaço real que
exista, mas não esteja sendo vivenciado e ocupado pelo indivíduo no exato momento de
uma orientação, é um espaço que, naquele momento, está representado na memória do
indivíduo, sendo assim considerado também um espaço representacional.
Assim, podemos considerar que um parâmetro relevante para essa distinção entre o
espaço perceptível e o espaço representacional é o fato do indivíduo que está se orientando
ser ou não considerado como origem do sistema de referência adotado. Nesse caso, para a
compreensão de espaço real, como aquele espaço perceptível no momento da orientação,
com o observador como central no sistema de referência, o corpo do indivíduo, sua
movimentação, seus gestos, são meios semióticos centrais.
Assim, realizamos a análise dos dados coletados com base em elementos da Teoria
da Objetivação, considerando especialmente a articulação de meios semióticos mobilizados
no labor conjunto e essas duas categorizações estabelecidas quanto a orientação espacial.
Aspectos metodológicos
Os dados utilizados para a análise deste artigo foram coletados no âmbito de uma
pesquisa de doutorado, que tem caráter metodológico qualitativo, com o pesquisador
atuando como parte ativa do processo analisado e não apenas como um observador desse
processo. Consideramos como característica relevante da abordagem qualitativa a de que é
“focalizada no indivíduo com toda a sua complexidade, e na sua insercão e interacão com o
ambiente sociocultural e natural.” (D’AMBRÓSIO, 2000, p.103)
Com base no referencial teórico da Teoria da Objetivação e nos conceitos que
envolvem a orientação espacial, desenhamos tarefas a serem vivenciadas durante as aulas
de matemática, numa turma de 6º Ano do Ensino Fundamental, composta por 30
estudantes com a faixa etária, entre 11 e 13 anos de idade, de uma Escola Pública do
Município de Marcação-PB.
O desenho das tarefas foi baseado na estrutura objeto – meta – tarefa, como
proposto por Radford (2015), e proporcionou situações nas quais os estudantes atuassem
em pequenos grupos e, com interações entre os grupos, valorizando as discussões entre os
estudantes, e desses com o professor, considerando a importância do labor conjunto.
A etapa seguinte foi a vivência dessas tarefas na sala de aula. Essas vivências foram
gravadas em vídeos, com duas câmeras fixas e uma móvel, e os episódios relevantes foram
transcritos para coleta de dados. A primeira autora atuou como professora da turma durante
a intervenção na escola.
Os dados analisados neste artigo foram coletados durante a Tarefa-1 e a Tarefa-4,
das seis vivenciadas na pesquisa. A Tarefa-1 foi realizada no primeiro encontro, como uma
forma de conhecer melhor a turma, de estabelecer uma relação de confiança e de
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
201
reconhecer os conceitos matemáticos envolvidos que os estudantes já tinham consciência.
A Tarefa-4, foi desenvolvida no terceiro encontro com a turma.
Transcrevemos os episódios evidenciando os meios semióticos mobilizados durante
o labor conjunto. Analisamos os dados coletados na transcrição com base nos pressupostos
da Teoria da Objetivação e nas categorias estabelecidas para a análise quanto aos conceitos
matemáticos mobilizados em torno da orientação espacial.
Evidências das tarefas vivenciadas
A vivência da Tarefa-1 ocorreu em 4 horas-aula e permitiu um melhor diagnóstico
da turma e uma melhor aproximação entre a pesquisadora-professora e os estudantes. A
meta dessa tarefa foi realizar um diagnóstico sobre os conceitos de elementos matemáticos
básicos envolvidos na orientação espacial, como por exemplo, a noção de lateralidade,
sistemas de referência, representação gráfica, posicionamento no espaço real e no espaço
representacional e vocabulário de termos linguísticos de significação espacial.
Na discussão geral com os estudantes, solicitamos que alguns explicassem o
caminho que nós faríamos para ir da escola até às suas respectivas casas, com o intuito de
identificarmos os termos mais utilizados por eles, os gestos e a utilização do corpo para
comunicar essa orientação. Nesse momento, percebemos que nenhum dos estudantes
mencionou termos como “direita” e “esquerda” para indicar a orientacão espacial. Embora,
eles conhecessem esses termos, não os utilizaram para exprimir uma orientação espacial.
Com isso, optamos por realizar algumas ações para verificar o estabelecimento da
relação entre esses termos e a respectiva posição do corpo. A partir dessas, identificamos
que a maioria dos estudantes da turma sentiam dificuldade em identificar o lado direito ou
esquerdo do próprio corpo e até mesmo em utilizar o corpo como sistema de referência.
De acordo com Garnica e Martins-Salandim (2014, p.62) “a partir dessas nocoes de
lateralidade inicia-se uma sistematização da percepção da localização de si mesmo, de seu
próprio corpo e de outros objetos, disparando, portanto, um processo de representação do
espaco”. Ressaltamos a distincão entre o conceito de lateralizacão, que e a escolha em
utilizar membros de um lado do corpo para a realização de certas ações, e o conceito de
lateralidade, que requer uma evolução e a compreensão da posição do seu lado esquerdo ou
direito em relação a outros indivíduos e ao espaço à sua volta (GARNICA e MARTINS-
SALANDIM, 2014). Nesse caso, “o que propicia a passagem da ‘lateralizacão’ ao
conhecimento da ‘lateralidade’ e a orientacão no espaco” (PIRES, CURI e CAMPOS,
2000, p. 54).
Embora, essas habilidades espaciais ligadas à lateralidade devam ser trabalhadas e
desenvolvidas desde a educação infantil, nosso grupo de estudantes (entre 11 e 13 anos)
em sua maioria, apresentou dificuldades em expressar esses conceitos básicos. Assim,
optamos por realizar uma discussão específica sobre lateralidade e o uso dos termos direita
e esquerda para exprimir a posição do corpo.
Inicialmente, a pesquisadora-professora solicitou que os estudantes levantassem o
braço direito e, nessa ocasião, apenas uma estudante (Y) levantou o braço, entretanto, o
erguido foi o esquerdo. Como não tínhamos certeza se os estudantes não tinham levantado
os braços por terem dúvidas sobre qual o braço correto ou se estavam envergonhados,
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
202
alteramos a estratégia e pedimos aos estudantes que levantassem os dois braços e, em
seguida, solicitamos que baixassem o braço esquerdo. Nesse momento, apenas duas
estudantes permaneceram com o braço correto levantado (braço direito). Percebemos então
que havia uma dificuldade real na maior parte da turma em identificar com segurança o
lado direito ou esquerdo do seu próprio corpo.
Na continuidade da atividade com a turma, novas solicitações foram feitas,
conforme transcrito a seguir, entretanto, em uma dessas, ao fazer o comando para que
levantassem o braço direito (L1), a pesquisadora-professora, de frente para a turma,
também levantou o seu.
L1. Pesquisadora-
professora:
Braço direito ... levanta!
Braço direito ... levanta! [de frente para a turma
levantamos nosso braço direito]
A Estudante Y que tinha levantado o braço correto, quando olhou o braço direito da
pesquisadora-professora levantado, teve a impressão de que havia levantado o braço
errado, por isso baixou o seu braço direito e levantou o esquerdo (Imagens 1 e 2)
provocando, nesse instante, alguns risos na turma.
Imagens 1 e 2 – Na imagem da esquerda, a Estudante Y está com o seu braço direito
levantado; e na imagem da direita, o momento seguinte, quando a Estudante Y baixou o
seu braço direito e levantou o seu braço esquerdo.
Fonte: Dados da pesquisa
Na continuidade da atividade, a Estudante X percebeu que a Y tinha trocado o
braço devido a uma impressão equivocada, por conta da diferença de posição entre a
pesquisadora-professora e os estudantes, e disse isso para a sua colega (L2).
L2. Estudante X: Não tá vendo que ela está ao contrário, ‘Estudante Y’!
[Dirigindo-se à Estudante Y e à posição da
pesquisadora-professora]
Nesse momento, ao constatar que a Estudante Y, mesmo com a intervenção
assertiva da Estudante X, ainda não tinha percebido a diferença de posição entre a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
203
pesquisadora-professora e si, foi instigada a refletir sobre o comentário da Estudante X
(L3). Porém, a Estudante Y, olhando para o braço direito da pesquisadora-professora ainda
levantado, manteve a sua posição e mais uma vez levantou o seu braço esquerdo (L4).
L3. Pesquisadora-
professora:
E, por que não é esse? [apontado para o braço direito
da Estudante Y]
L4. Estudante Y: É esse! [levanta o braço esquerdo, olha para
pesquisadora-professora e olha para a Estudante X]
A Estudante X, envolvida no labor conjunto e com uma postura de cooperação,
tenta mais uma estratégia para explicar para a Estudante Y a diferença de posição entre os
estudantes e a pesquisadora-professora. Para isso, realiza gestos contundentes,
rotacionando o seu corpo com o braço direito levantado (Imagem 3) para que a Estudante
Y visualizasse espacialmente o que ela estava falando (L5).
L5. Estudante X: Oh! Se tu virar pra lá, não vai ser aquele dali não!
[Toca na Estudante Y, levanta o braço direito e faz um
movimento giratório no corpo e depois aponta para o
braço direito da pesquisadora-professora]
Imagem 3: Sequência de fotos em que a Estudante X dialogava com a Estudante Y,
enquanto rotacionava o seu corpo.
Fonte: Dados da pesquisa
Nesse instante a Estudante Y tomou consciência de que a diferença que ela tinha
percebido entre o braço dela e o da pesquisadora-professora se devia à diferença de posição
entre ambas, já que estavam uma de frente para a outra. A Estudante Y deixa transparecer
que tomou consciência disso, com uma expressão de riso e o rosto envergonhado.
A atuação da Estudante X, no labor conjunto, fez com que a Estudante Y tomasse
consciência sobre a distinção entre a direita e a esquerda do seu corpo e a de uma outra
pessoa à sua frente. Assim, compreendendo que esse é um saber matemático importante
para que todos os estudantes da turma tomem consciência, foi solicitada a atenção de toda
a turma para que a Estudante X explicasse para os demais colegas aquilo que acabou de
demonstrar à Estudante Y.
Ressaltamos que pela categorização estabelecida quanto aos elementos da
orientação espacial, essa evidência descrita pode ser enquadrada na categoria de
localização, com referência ao espaço real perceptível, considerando o próprio corpo como
integrante do sistema de referência. Os gestos, orquestrados pela Estudante X, foram
dotados de uma característica dinâmica fundamentais para que a Estudante Y tomasse
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
204
consciência da diferença entre considerar o seu próprio corpo ou o corpo do outro como
origem do sistema de referência.
Outra evidência que ressaltamos ocorreu durante a Tarefa-4, que teve como meta
planejada levar os estudantes a interpretarem as orientações de itinerários dadas e
representar por meio de desenhos o trajeto relacionado às respectivas instruções, numa
representação em 2D. Nessa tarefa, procuramos estimular os estudantes a perceberem
elementos importantes na comunicação de uma orientação espacial, quer seja por meio de
instruções escritas, quer seja pela adequada representação gráfica. Após essa discussão
geral, para realizar a Questão-2 da tarefa, foi entregue o desenho de uma planta baixa da
escola e uma orientação escrita para percorrer 3 (três) itinerários distintos dentro da escola.
A planta da escola disponibilizada, continha os nomes dos ambientes, mas nas orientações
dos itinerários citava apenas o nome do ambiente que era o local de partida do primeiro
itinerário (Portão Principal). Era esperado que os estudantes traçassem na planta baixa,
com lápis de cores diferentes, o caminho percorrido por cada um dos três itinerários. A
folha de resposta de um dos grupos de estudantes, com os itinerários percorridos na planta,
delineados com segmentos de retas com cores diferentes, foi apresentada na Imagem-4.
Imagem-4 – Representação gráfica dos itinerários propostos na Questão-
2 da Tarefa-4 da pesquisa, elaborada por um dos grupos.
Fonte: Dados da pesquisa
Nesse segmento da tarefa, destacamos o diálogo entre duas estudantes que
divergiram quanto a movimentação a ser realizada em um dos itinerários na representação
gráfica, quando em determinado ponto do percurso a Estudante M, leu a instrucão “virar à
esquerda” e fez o movimento correto na representacão gráfica. Entretanto, a sua colega,
Estudante V que estava posicionada ao seu lado, disse que com esse movimento a sua
colega estava “indo para trás” e não à esquerda. As duas estudantes descreveram o mesmo
movimento do objeto no espaço representacional e a diferença entre as instruções que cada
uma expressou decorreu do fato de que elas, como observadoras, estavam em posições
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
205
diferentes em relação à representação gráfica. Nesse momento, foi solicitado à Estudante V
que se movimentasse e ficasse na mesma posição que a Estudante M ocupava em relação à
representação gráfica, de modo a verificar novamente a descrição do itinerário. Com isso,
as estudantes perceberam que pode existir uma diferença na comunicação do movimento
de um objeto no espaço, dependendo da posição do corpo do observador.
Conclusões
No segmento descrito que ocorreu durante a vivência da Tarefa-1, evidenciamos a
dificuldade de estudantes na identificação da direita ou esquerda do seu próprio corpo
(lateralidade). Como pudemos observar na descrição da nossa tarefa diagnóstica a noção da
existência dos termos linguísticos ‘direita’ e ‘esquerda’ era um saber que os estudantes
envolvidos na intervenção tinham consciência. Todavia, não tinham a vivência desse saber
matemático, que relaciona os termos linguístico ‘direita’ e ‘esquerda’, para expressar uma
orientação espacial. Era mais comum na orientação espacial, utilizarem termos como
‘enrola’, ‘vira’, ‘pega ali’, acompanhados do movimento do próprio corpo para
complementar o significado da comunicação espacial.
No âmbito do Sistema Semiótico de Significação Cultural (SSSC) vivenciado com
esse grupo, os termos “direita” e “esquerda” não eram comumente utilizados para
expressar uma orientação espacial. Isso nos remete para uma das funções do SSSC
descritas por Radford, a organizacional, que tem “[...] a ver com a maneira pela qual a
cultura organiza e legitima as relacoes dos indivíduos com o mundo e entre eles”
(RADFORD, 2014a, p. 63, tradução nossa).
Ao tomar consciência da importância do significado dos termos “direita” e
“esquerda” para a comunicacão da orientacão espacial e ao adotar o seu próprio corpo
como central no sistema de referência, percebemos inicialmente a dificuldade de muitos
estudantes em fazer a relação entre o seu lado direito e esquerdo e do outro. Nesse contexto
destacamos a existência de formas de referência alocêntrica, em que as localizações
espaciais são codificadas em termos do ambiente circundante, como por exemplo as
direções cardeais (norte, sul, Leste e oeste) e de formas de referência egocêntricas que
codificam a localização em relação ao próprio corpo (NEWCOMB, 2016).
Como o primeiro sistema de referência geralmente adotado para a localização é
egocêntrico (o próprio corpo), ressaltamos que quanto mais agilidade se tem nessa
identificação inicial da localização de objetos em relação ao corpo do observador, mas
agilmente podemos pensar sobre a localização de outros objetos e entre os objetos.
Entendemos que essa agilidade requer, não mero processo corporal sinestésico e individual
cognitivo, mas a tomada de consciência de saberes ligados a interpretação matemática do
espaço e a sua adequada mobilização junto a outros indivíduos no espaço social. Essa
agilidade requer então, a mobilização de meios semióticos envolvidos nesse aspecto da
orientação espacial configurando uma contração semiótica, que “nos leva a escolher entre
o que conta como relevante e irrelevante; leva a uma contração da expressão e a um nível
mais profundo de consciência e inteligibilidade concomitantes” (RADFORD, 2008b, p. 90,
tradução nossa).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
206
Um desafio importante ligado a adoção do próprio corpo como centro do sistema
de referência é estabelecer a relação com o sistema de referência de outros observadores.
No segmento descrito da vivência da Tarefa-1, identificamos a dificuldade da Estudante Y
que estava à nossa frente, em identificar a diferença entre o nosso braço direito e o braço
direito dela. Essa dificuldade ocorre pela diferença em considerar como referência o
próprio corpo ou o corpo de outra pessoa, que está à sua frente. Neste segmento, a
intervenção de uma terceira pessoa, a Estudante X, possibilitou demonstrar a Estudante Y a
diferença entre os sistemas de referência, por meio de movimentos de rotação do seu
corpo, colocando-se ora na posição da Estudante Y, ora na nossa posição. Esse exemplo
nos leva a evidenciar a tomada de consciência dessa alteridade espacial, percebendo o
próprio corpo como central no seu sistema de referência espacial e o corpo dos outros
indivíduos como dotados de uma significação espacial que depende de sua posição no
espaço, sendo que a movimentação dos indivíduos muda a correlação entre esses sistemas
de referência.
Pudemos evidenciar essa tomada de consciência também no segmento de
atividade descrito durante a vivência da Tarefa-4, quando no diálogo entre as estudantes M
e V, ao colocarem-se espacialmente no lugar do outro, as estudantes perceberam que a
utilizacão de termos “esquerda” ou “para trás”, podem significar uma mesma
movimentação no espaço, dependendo da posição do corpo do observador.
Nesse exemplo, evidenciamos também que, ao observar a movimentação de um
objeto no espaço representacional é necessária uma maior atenção aos saberes matemáticos
para reflexão e o estabelecimento da relação entre o sistema de referência do corpo do
observador e o sistema de referência desse espaço representacional. Isso ocorre, por
exemplo, quando seguimos um mapa de uma cidade ao guiar um veículo. Podemos notar
que a maioria dos aplicativos eletrônicos utilizados para guiar as pessoas nas cidades
(GoogleMaps, Waze), para facilitar a relação entre a movimentação nos espaços real
perceptível e representacional, buscam alinhar automaticamente o sistema de referência do
mapa na tela à direção que o corpo do indivíduo se move. Na ocasião em que essa
movimentação ocorre com o uso de um mapa impresso, que não tem esse dispositivo
automático de rotação do sistema de referência, é muito comum que a própria pessoa
busque fazer esse alinhamento e rotacione o mapa impresso, para que fique alinhado à
direção que se movimenta ou numa posição alinhada aos pontos de referência que se
visualiza, para facilitar o estabelecimento da relação do espaço real perceptível com o
espaço representacional.
Referências
CLEMNTS, M.A. Spatial Abilities, Mathematics, Culture, and the Papua New Guinea
Experience. In: CLARKSON, P., PRESMEG, N. (Eds.), Critical Issues in Mathmatics
Education. Major contributions of Alan Bishop, New York, p. 97-106, 2008.
CLEMENTS, D. H.; SARAMA, J. Learning and teaching Early Math: The learning
trajectory approach. New York, 2009.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
207
D’ÁMBROSIO, U. Educação Matemática: da teoria à prática. 7.ed. Campinas: Papirus,
2000.
GARNICA, A. V. M.; MARTINS-SALANDIM, M. E. A lateralidade e os modos de ver e
representar. In: BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Apoio à Gestão
Educacional. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa: Geometria. Brasília:
MEC, SEB, 2014, caderno 5.
GOMES, L. P. da S. Introdução à álgebra nos anos iniciais do Ensino Fundamental:
uma análise a partir da Teoria da Objetivação. Tese (Doutorado em Educação).
Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Natal, Rio Grande do Norte, Natal, 2020.
NEWCOMB, N. S.; UTTAL, D. H.; SAUTER, M. S. Spatial development. In P. Zelazo
(Ed.), Oxford Handbook of Developmental Psychology, Oxford University Press. 2016.
PAIVA, Jussara Patrícia Andrade Alves. A Teoria da Objetivação e o desenvolvimento
da Orientação Espacial no Ensino-aprendizagem de Geometria. Tese (Doutorado em
Ensino de Ciências e Matemática). Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e
Matemática. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, 2019.
PIRES, C.M.C.; CURI, E.; CAMPOS, T. M. M. Espaço e Forma: a construção de noções
geométricas pelas crianças das quatro séries iniciais do Ensino Fundamental. São Paulo:
PROEM, 2000.
RADFORD, L. Elementos de una teoría cultural de la objetivación. Revista
Latinoamericana de Investigación en Matemática Educativa, Special Issue on
Semiotics, Culture and Mathematical Thinking. p. 103-129, 2006.
RADFORD, L. Cultura e história: dos conceptops dificiles y controversiales en
aproximaciones contemporaneas en la educación matemática [Culture and history: Two
difficult and controversial concepts in current approaches to mathematics education]. In:
MENDES, I. A.; SILVA, C. A. F. (Org), Cultura, Práticas Sociais e Educação
Matemática. São Paulo: Livraria da Física, p. 49-68. 2014a.
RADFORD, L. De la teoría de la objetivación. Revista Latinoamericana de
Etnomatemática, v. 7, n. 2, p.132-150, 2014b.
RADFORD, L.). Methoological Aspects of the Theory of Objectification. Revista
Perspectivas da Educação Matemática – UFMS. Mato Grosso do Sul: UFMS, p. 547-
567, 2015. Disponível em: http://seer.ufms.br/index.php/pedmat/article/view/1463/970.
Acesso em 25 de mar. de 2018.
RADFORD, L. The Ethic of Semiosis and the Classroom constitutions of Mathematics
subjects. 13th International Congress on Mathematical Education, 2016.
RADFORD, L. Aprendizaje desde la perspectiva de la Teoria de la Objetivación. In:
D’AMORE, B., & RADFORD, L., Enseñanza y aprendizaje de las matemáticas:
problemas semióticos, epistemológicos y prácticos. Bogotá, Colombia: Universidad
Distrital Francisco José de Caldas. p. 115-136, 2017.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.194-208 ISSN: 2675-1909
208
RADFORD, L., Algunos desafíos encontrados en la elaboración de la teoría de la
objetivación. PNA, v.12, n.2, p. 61-80, 2018a.
RADFORD, L., Semiosis and Subjectification: The Classroom Constitution of
Mathematical Subjects. In: PRESMEG, N., RADFORD, L., ROTH, M., & KADUNZ, G.
(Eds), Signs of signification. Semiotics in mathematics education research. Cham,
Switzerland: Springer. p. 21-35, 2018b.
RADFORD, L., DEMERS, S., GUZMÁN, J. and CERULLI, M. Calculators, graphs,
gestures, and the production meaning. In: PATEMAN, N.; DOUGHERTY, B.; ZILLIOX,
J. (eds.), Proceedings of the 27 Conference of the international group for the
psychology of mathematics education (PME27 –PMENA25), v.4, p. 55-62, 2003.
RADFORD, L., ARZARELLO, F., EDWARDS, L., & SABENA, C. The multimodal
material mind: Embodiment in mathematics education. In: CAI, J.; (Ed.), First
compendium for research in mathematics education. Reston, VA: NCTM, p. 700-721,
2017.
RADFORD, L.; D’AMORE, B. Enseñanza y aprendizaje de las matemáticas:
problemas semióticos, epistemológicos y prácticos. Bogotá, Colombia: Universidad
Distrital Francisco José de Caldas. 2017. 192 p
Jussara Patrícia Andrade Alves Paiva
Universidade Federal da Paraíba
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4127-3665
Claudianny Amorim Noronha
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4238-065X
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 28 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p209-227.id294 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
Critérios de divisibilidade à luz do ensino por atividades
Divisibility criteria in the light of teaching by activities
Sandro Benício Goulart Castro
Universidade do Estado do Pará
SEDUC-PA
São João de Pirabas
SEMED- Belém
Ana Kely Martins da Silva
Universidade do Estado do Pará
SEMED- Belém
RESUMO
Este artigo apresenta os resultados de um estudo baseado no ensino de matemática por atividades
desenvolvido com estudantes do 6º ano do ensino fundamental em uma escola da rede pública do
município de São João de Pirabas, cidade localizada no nordeste paraense, que objetivou analisar a
validade de conclusões produzidas por estudantes sobre critérios de divisibilidade a partir de
atividades de redescoberta. O experimento obedeceu às seguintes etapas: diagnóstico, aplicação das
atividades e análise dos resultados. A análise dos resultados se deu através da comparação dos
registros das observações e conclusões feitas pelos discentes ao final de cada atividade com o
enunciado de alguns livros didáticos sobre tais critérios de divisibilidade. Entre os principais
resultados obtidos podemos destacar o bom desempenho dos estudantes no que diz respeito às
observações e conclusões que foram apresentadas no final de cada atividade, além de mostrarem-se
capazes de resolver questões relativas ao assunto, que lhes foram propostas ao término da
experiência. Por isso pudemos concluir que as atividades causaram impactos positivos na
aprendizagem dos estudantes, ajudando-os na descoberta de regras referentes às divisibilidades por
dois, dez, cinco, quatro e oito.
Palavras-chaves: Ensino de Matemática por Atividades; Divisibilidade; Critérios de divisibilidade.
ABSTRACT
This article presents the results of an experiment based on activity-based teaching developed with
students from the 6th year of elementary school in a public school in the city of São João de
Pirabas, a city located in northeastern Pará, which aimed to investigate whether students could find
out and enunciate criteria for divisibility by two, ten, five and eight without the teacher having
previously formalized them, in addition to verifying their performance in resolving issues that
require knowledge about such criteria. The experiment followed the following steps: diagnosis,
preparation of activities, application of activities and analysis of results. The analysis of the results
was made by comparing the records of observations and conclusions made by the students at the
end of each activity with the statement of some textbooks on such divisibility criteria. Among the
main results obtained, we can highlight the good performance of the students with regard to the
observations and conclusions that were presented at the end of each activity, in addition to proving
themselves capable of resolving issues, related to the subject, that were proposed to them at the end
of the course. experience. Therefore, we were able to conclude that the activities had a positive
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
210
impact on students' learning, helping them to discover rules regarding divisibility by two, ten, five
and eight.
Keywords: Teaching by activities; Divisibility; Divisibility criteria.
Introdução
A matemática escolar é uma disciplina, considerada por muitos, abstrata e
historicamente de difícil assimilação. Na educação básica este fato é uma realidade, pois
relatos de professores, com os quais convivemos, destacam que boa parte dos discentes não
demonstra interesse em estudar matemática, alegando que as aulas são monótonas e que
eles não conseguem entender muita coisa dos conteúdos ministrados. Tais afirmações
podemos testificar como verdadeiras, devido nossa atuação como docentes da Educação
Básica, em especial o ensino público, há mais duas décadas.
O ensino de matemática tem recebido muitas sugestões de alteração de realização.
As alterações que foram sistematizadas e analisadas têm recebido a denominação de
Tendências em Educação Matemática. Entre essas Tendências temos, segundo Sá (2019), o
ensino de matemática por atividades.
O uso de atividades, na direção apresentada por Sá (2019), foi registrado em muitos
trabalhos, dentre eles podemos citar: Jucá (2008), Moreira (2010), Graça (2011), Paula
(2011), Gomes (2013), Silva (2014), Lopes (2015), Pires (2017), Santos (2017), Silva
(2018), Alves (2018), Batista (2018), Rosas (2018) e Soares (2018).
Em Sá e Salgado (2011) temos os resultados de um estudo que mostrou os
estudantes em aulas de matemática desenvolvidas por meio de atividades com calculadora
produziam conclusões sobre o modo de operar com os números inteiros que eram válidas
quando comparadas com as respectivas regras, enunciadas em livros didáticos.
Neste artigo apresentamos os resultados de uma pesquisa que teve como objetivo
analisar a validade de conclusões produzidas por estudantes sobre critérios de
divisibilidade a partir de atividades de redescoberta.
O ensino de matemática por atividades
O ensino de Matemática por atividades é uma tendência de ensino que aponta uma
proposta que permite que o estudante seja o elaborador do seu próprio conhecimento, o
ajudando assim a entender alterações que lhes auxiliarão a construir sua própria ação de
pensamento. De acordo com Sá (2019), o ensino de matemática por atividades tem
características dentre as quais podemos enumerar:
1) é diretivo, ou seja, segue um conjunto de orientações;
2) tem compromisso com o conteúdo trabalhado;
3) tem compromisso com o desenvolvimento de habilidades que vão além do
conteúdo trabalhado;
4) é organizado;
5) é sequencial;
6) não está necessariamente associado à resolução de problemas;
7) leva em conta os conhecimentos prévios dos estudantes;
8) os resultados são institucionalizados ao final das atividades realizadas;
9) é imprescindível a participação do professor;
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
211
10) é conveniente para formação de conceitos e acesso a resultados operacionais ou
algorítmicos;
11) é participativo entre estudantes e professor.
Quanto ao objetivo, o ensino de Matemática por atividades pode ser realizado por
dois tipos básicos de atividade: conceituação ou redescoberta.
Nesse sentido, uma atividade de conceituação tem por objetivo levar o estudante a
perceber a ocorrência de determinado tipo de situação/tipo de objeto matemático. A
definição deste objeto percebido é o objetivo da atividade de conceituação. Uma atividade
de redescoberta tem por objetivo levar o estudante a descobrir uma relação ou propriedade
relativa a um dado objeto ou operação matemática. Uma atividade de redescoberta não
representa uma demonstração de um resultado matemático, mas sim a ocasião da
investigação do objeto que precede a demonstração do resultado.
As atividades que utilizamos são de redescoberta, daremos ênfase aos momentos
de elaboração dos tipos de atividades de redescoberta, que segundo Sá (2019), são os
seguintes:
1º) organização: Neste momento a turma deve ser, preferencialmente, organizada
em grupos com no máximo 4 estudantes e no mínimo 2 estudantes. Porém podendo
também ocorrer de forma individual o que não é muito recomendável devido ao fato de
não estimular a troca de ideias que é fundamental para o processo de aprendizagem. Esta
organização deve ser feita, preferencialmente, de forma espontânea onde o professor deve
conduzir as ações, orientando na formação das equipes sem determinações, além de
demonstrar segurança e que planejou com cuidado a atividade, e evitar que os estudantes
desperdicem tempo com ações alheias a organização da turma.
2º) Apresentação: Neste momento, cabe ao professor distribuir o material
necessário para a realização da atividade incluindo o roteiro da mesma. O roteiro pode ser
impresso ou disponibilizado no quadro o que vai depender das condições estruturais da
escola. Para atividades com procedimento mais longo é recomendável que o roteiro seja
viabilizado de forma escrita com intuito de economizar tempo. Esse material deve estar
organizado em kits para facilitar a distribuição do material. Este procedimento evita o
desperdício de tempo. O esperado por parte dos estudantes é a atenção às orientações
apresentadas.
3º) Execução: Este momento corresponde à fase da experimentação quando o
estudante manipula os materiais, realiza medidas e/ou cálculo, compara e/ou examina.
Neste momento, numa aula em que é utilizado o ensino por atividades, deseja-se que cada
grupo realize os procedimentos determinados para a atividade. O professor neste momento
deve deixar os grupos trabalharem com liberdade, supervisiona o desenvolvimento das
ações e auxilia nas dúvidas quando solicitado, e/ou percebe possíveis dificuldades de
execução, que possam surgir em cada grupo no ocorrer da realização do processo. Os
estudantes neste momento devem procurar seguir as instruções determinadas no roteiro da
atividade, sem conversas paralelas ou atenção para assuntos alheios a atividade. Também
devem evitar abandonar o grupo e/ ou ficar visitando outros grupos.
Os estudantes devem ter a oportunidade de atuar no sentido de alcançar os
resultados desejados, porém também devem receber orientações cuidadosas quando
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
212
tiverem dificuldades ou dúvidas para realizar alguma ação prevista na atividade. As
orientações devem ser claras e precisas para permitir o prosseguimento da atividade sem
constrangimento dos estudantes. Quando uma pergunta ou dúvida salientar que sua origem
é fruto de uma falha das orientações contidas no procedimento ou da confecção do material
a ser utilizado o professor deve imediatamente socializar com a turma o fato e apresentar
uma orientação que contorne o ocorrido e permita o prosseguimento da atividade, se
possível. Esse tipo de situação pode ser evitado, com um planejamento cuidadoso da
atividade.
4º) Registro: Este momento corresponde à sistematização das informações. Neste
instante deseja-se que cada grupo registre as informações obtidas durante a execução das
determinações no respectivo espaço destinado no roteiro. O professor durante a realização
do registro deve monitorar o desenvolvimento das ações e auxiliar eliminando as possíveis
dúvidas que possam ocorrer durante o processo. O ideal é que o roteiro da atividade
contenha espaço adequado para o registro das informações produzidas durante o momento
da execução. Isto facilita o registro e evita o gasto de tempo neste momento.
5º) Análise: É o momento em que se deseja que cada grupo analise as informações
que foram registradas e descubra uma relação válida entre tais informações. Este instante é
fundamental para o bom desenvolvimento da atividade devido, ser o momento em que os
estudantes deverão ter o primeiro acesso a informação desejada pelo professor. Quando
durante a verificação alguma equipe apresentar dificuldade para perceber uma relação
válida a partir das informações registradas o professor deverá auxiliar o grupo por meio da
formulação de questões que orientem os membros de tal equipe a perceberem uma relação
válida. Esta ocasião corresponde a análise dos resultados do experimento. Este é o instante
que deve ser concluído com a elaboração de uma conclusão formulada pelo grupo ou
participante da atividade.
6º) Institucionalização: é o momento em que será produzida a conclusão oficial
da turma a partir das constatações que cada grupo elaborou no momento da análise. O
momento da institucionalização corresponde a grosso modo ao instante da elaboração das
considerações finais de um trabalho cientifico. O exposto elaborado na primeira atividade
realizada por uma turma sem experiência com o ensino por atividades costuma não atender
as condições de um texto convincente. É muito normal que os estudantes reproduzam na
conclusão a relação obtida no momento da observação. Isto não é motivo de grandes
preocupações devido ser uma consequência da pouca experiência dos aprendizes em
realizarem atividades que solicitem a elaboração de textos conclusivos.
Para Sá (2019), o professor, independente de como sejam as conclusões elaboradas
pelos grupos, deve solicitar que um representante de cada um se dirija ao quadro e registre
a conclusão elaborada pela sua equipe. Após analisar as conclusões registradas, o professor
deve perguntar as equipes quais das conclusões apresentadas permitem a alguém que não
participou de tal atividade entender a relação estabelecida. Este momento é oportuno para
que o professor faça considerações sobre as características de uma conclusão. Finalmente o
professor pode elaborar junto com a turma uma conclusão que permita a alguém que não
participou de tal atividade entender a relação estabelecida.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
213
Metodologia
O experimento foi desenvolvido em uma escola pública municipal localizada no
Município de São João de Pirabas no nordeste paraense, contando com a participação de
12 estudantes de uma turma do 6º ano do ensino fundamental. Para o desenvolvimento do
experimento seguimos as seguintes etapas: diagnóstico, aplicação das atividades e
análise dos resultados.
Diagnóstico
O diagnóstico da turma foi realizado por meio de um questionário sócio econômico
que teve por objetivo colher informações pessoais dos estudantes, bem como informações
relacionadas aos conhecimentos matemáticos dos mesmos, incluindo a temática proposta
por este artigo, no caso alguns critérios de divisibilidade como: os critérios de
divisibilidade por dois, cinco, dez, quatro e oito.
A análise dos resultados da sistematização das informações obtidos pela aplicação
do questionário, mostrou que a maioria dos estudantes consultados gostavam de
Matemática, embora terem informado que só às vezes entendiam as explicações e sentiam-
se interessados pelas aulas; só estudavam no período de avaliações, mesmo não
trabalhando para ajudar em casa; recebiam a ajuda familiar nas tarefas de Matemática; só
às vezes conseguiam relacionar os conteúdos matemáticos com o cotidiano; diziam que as
aulas de Matemática desenvolviam-se através de definição de conceitos, exemplos e
exercícios ; que o professor os avaliava através de provas e testes semanais; gostavam da
explicação do professor e se sentiam-se tranquilos diante de uma avaliação em
Matemática. Os dados supramencionados foram imprescindíveis para aplicação do
experimento, pois proporcionaram um diagnóstico dos estudantes que tomamos por base
para subsidiar a condução das atividades.
Aplicação das atividades
As atividades foram desenvolvidas em três encontros, onde o primeiro teve início
às 07:30h e término às 08:10, no qual foram trabalhados os critérios de divisibilidade por
dois e o por dez. Nesse dia notamos a surpresa por parte dos estudantes ante a proposta da
atividade, algo que consideramos natural, pelo fato de os mesmos nunca terem trabalhado
com uma metodologia dessa natureza.
Antes da aplicação das atividades, solicitamos que os estudantes se organizassem
em seis grupos de duas pessoas cada. Os grupos foram formados pelos próprios estudantes
sem maiores problemas. Na realização do experimento foi entregue a cada grupo uma folha
contendo a atividade, e uma calculadora que seria usada como recurso didático, a partir daí
orientamos os grupos no sentido de como deveriam preencher as fichas e para fazerem as
devidas observações. Os grupos responderam aos questionamentos da ficha, e, logo em
seguida, foram orientados a conversar entre si no sentido de fazerem observações sobre o
que tinham acabado de realizar.
Após concluído esse momento, solicitamos que um representante de cada grupo
fizesse a socialização no quadro branco do que haviam observado e concluído sobre a
atividade, provocando desta forma uma discussão geral. Em seguida realizamos a
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
214
institucionalização dos critérios trabalhados, os quais foram escritos no quadro branco, a
fim de que todos pudessem copiar em seus cadernos.
No segundo encontro, que teve início às 07:30h e término ás 9:00h, trabalhamos a
atividade relacionada ao critério de divisibilidade por cinco. Neste dia, notamos os
estudantes mais familiarizados com a atividade e bem mais confiantes no que deveriam
fazer, o que nos exigiu poucas orientações para a execução, registro e análise da mesma.
Após esses momentos, solicitamos novamente que um estudante do grupo socializasse no
quadro branco o que haviam observado e concluído, gerando assim uma discussão geral
entre os grupos, por fim realizamos a institucionalização do critério.
No terceiro encontro, que teve início às 07:30h e término às 09:00h, trabalhamos as
atividades relacionadas aos critérios de divisibilidade por quatro e por oito, onde os
estudantes não mostraram nenhuma dificuldade em relação aos procedimentos a serem
seguidos para o preenchimento da atividade, onde no término um estudante de cada grupo,
como de costume, fez a socialização no quadro branco para logo em seguida fazermos a
institucionalização dos critérios. Vale ressaltar que após cada atividade, foram propostas
questões no sentido de fazer a fixação do conteúdo trabalhado, onde os estudantes
apresentaram desempenho bastante satisfatório.
Análise dos resultados
Para realizarmos a análise dos resultados usamos as observações e conclusões que
foram socializadas pelos estudantes no momento da análise, fazendo a comparação com o
resultado constante dos livros didáticos a seguir:
1) Matemática na medida certa de Marília Centurión e José Jakubovic
(Jakubo).
2) Matemática: ideias e desafios de Iracema Mori.
3) Praticando Matemática de Álvaro Andrini e Maria José Vasconcelos.
4) Matemática: Fazendo a diferença de José Roberto Bonjorno, Ayrton
Olivares, Regina Azenha Bonjorno e Tânia Gusmão.
A primeira atividade desenvolvida foi a relacionada ao critério de divisibilidade por
dois e que teve a participação de todos os estudantes.
A atividade 1 que é uma atividade de redescoberta, é uma adaptação de atividade
proposta em Mendes e Sá (2006, p.45). O Quadro 1 apresenta o roteiro da Atividade 1
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
215
Quadro 1 Roteiro da Atividade Experimental 1
Atividade 1
Título: Divisibilidade por dois
Objetivo: Descobrir uma maneira de identificar quando um número é divisível por dois,
sem realizar a divisão.
Material: Roteiro da atividade, lápis ou caneta e máquina de calcular.
Procedimento:
Verifique, com o auxílio da calculadora, se os números dados são divisíveis por 2;
Com as informações obtidas preencha o quadro a seguir
Número
O número é par? O número é divisível por 2?
Sim Não Sim Não
72
83
96
114
125
230
425
508
5579 .
1274
Observação:
Conclusão:
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
Os autores dos livros didáticos, usados como referência, apresentam os seguintes
enunciados em relação ao critério de divisibilidade por dois:
1) Centurión e Jakubovic (2010, p.97): “Um número natural é divisível por dois
quando é par”.
2) Mori (2015, p.113): “Um número natural é divisível por 2 quando ele é um
número par”.
3) Andrini e Vasconcelos (2012, p. 89): “Todo número par é divisível por 2”.
4) Bonjorno et al (2009, p.119): “um número é divisível por 2 quando o algarismo
das unidades for 0, 2, 4, 6 ou 8”.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
216
As conclusões dos estudantes para a Atividade 1 estão no Quadro 2.
Quadro 2 Comparação das Conclusões elaboradas para Atividade 1 com livro didático
Grupo Conclusão Autor comparado Validade
1 “Nós concluímos que todo
número que dava par era sempre
divisível por dois”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
2 “Nossa conclusão foi que a
mesma resposta da primeira
pergunta foi igual a segunda”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010);
Mori (2015) e
Bonjorno et al
(2009)
Inválida
3 “Nós concluímos que podemos
saber se o número é divisível por
2 se ele for par”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015)
Válida
4 “Todo número que é par é
divisível por dois”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015)
Válida
5 “Nós concluímos que os números
pares sempre são divisíveis por
2”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015)
Válida
6 “Nós concluímos que todos os
números pares sempre serão
divisíveis por 2”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015)
Válida
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
Da análise dos resultados do Quadro 2 permite concluir que a maioria dos grupos
conseguiu produzir conclusões válidas a respeito da divisibilidade de um número natural
por 2 após a realização da Atividade 1.
A Atividade 2 foi relacionada ao critério de divisibilidade por 10 tem seu roteiro no
Quadro 3.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
217
Quadro 3 Roteiro da Atividade Experimental 2
Atividade 2
Título: Divisibilidade por dez
Objetivo: Descobrir um critério de divisibilidade por dez.
Material: Papel, lápis ou caneta e máquina de calcular.
Procedimento
Verifique, com o auxílio da calculadora, se os números dados são divisíveis por 10;
Com as informações obtidas preencha o quadro a seguir
Número O número é divisível por 10? O número termina em 0?
Sim Não Sim Não
20
26
40
100
325
13140
20425
32420
40628
45680
Observação:
Conclusão:
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
Os autores dos livros didáticos, usados como referência, apresentam os seguintes
enunciados em relação ao critério de divisibilidade por dez:
1) Centurión e Jakubovic (2010, p.97): “Um número natural é divisível por 10
quando termina em 0 ”.
2) Mori (2015): “Um número natural é divisível por 10 quando ele terminar em
zero” (p.114).
3) Andrini e Vasconcelos (2012): “Um número é divisível por 10 quando o
algarismo das unidades é zero” (p.89).
4)Bonjorno et al (2009): “um número é divisível por 10 quando termina em 0” (p.
119).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
218
O Quadro 4 apresenta as conclusões elaboradas pelos grupos.
Quadro 4 Comparação das Conclusões da Atividade 2 com livro didático
Grupo Conclusão Autor comparado Validade
1 “Nós concluímos que todo
número que termina em zero era
divisível por dez”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
2 “Minha conclusão foi que os
primeiros tinham os mesmos
resultados que a segunda
pergunta”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Inválida
3 “Nós concluímos que a maioria é
divisível por 10”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Inválida
4 “Todo número que termina em
zero é divisível por dez”
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
5 “Nós concluímos que os números
que terminavam em zero dava por
dez”. [Sic]
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
6 “Concluímos que a maioria
terminava em zero e dava por
dez”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Inválida
Fonte: Castro (2019)
A análise dos resultados do Quadro 4 permite concluir que a metade dos grupos
produziu conclusões válidas quando comparadas com os enunciados registrados nos livros
didáticos.
Durante o planejamento da Atividade 2 foi esperado que o total de conclusões
válidas aumentaria em relação à Atividade 1. Entretanto, os resultados produzidos não
concretizaram tal previsão. Nossa análise da realização da Atividade 2 indicou que durante
a realização da mesma não demos a devida atenção na direção de auxiliar os grupos a
direcionarem a atenção para as condições para que um número natural seja divisível por 10
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
219
no momento da análise dos resultados. Este fato pode justificar a ocorrência do total de
conclusões válidas não ter aumentado como fora previsto.
A Atividade 3 que foi relacionada ao critério de divisibilidade por cinco tem seu
roteiro no Quadro 5.
Quadro 5 Roteiro da Atividade Experimental 3
Atividade 3
Título: Divisibilidade por cinco
Objetivo: Descobrir um critério de divisibilidade por 5.
Material: Papel, lápis ou caneta e máquina de calcular.
Procedimento:
Verifique, com o auxílio da calculadora, se os números dados são divisíveis por 5;
Com as informações obtidas preencha o quadro a seguir
Número
O número é
divisível por 5?
O número
termina em 0?
O número
termina em 5?
Sim Não Sim Não Sim Não
165
380
563
246
420
647
1231
5108
10715
9880
Observação:
Conclusão:
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
Os autores dos livros didáticos, usados como referência, apresentam os seguintes
enunciados em relação ao critério de divisibilidade por cinco:
1) Centurión e Jakubovic (2010): “Um número natural é divisível por 5 quando
termina em 0 ou 5 ” (p.97).
2) Mori (2015): “Um número natural é divisível por 5 quando ele termina em zero
ou em cinco” (p.114).
3) Andrini e Vasconcelos (2012): “Um número é divisível por 5 quando o
algarismo das unidades é zero ou cinco” (p.89).
4) Bonjorno et al (2009): “um número é divisível por 5 quando o algarismo das
unidades for 0 ou 5” (p. 119).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
220
O Quadro 6 apresenta as conclusões elaboradas pelos grupos.
Quadro 6 Comparação das Conclusões da Atividade 3 com livro didático
Grupo Conclusão Autor comparado Validade
1 “Nós concluímos que quando um
número era divisível por cinco
sempre dava cinco ou zero”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
2 “Minha conclusão foi que os
divisíveis por cinco eram números
como 165, 380 etc.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Parcialmente
válida
3 “Concluímos que termina mais em
zero do que cinco”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010);
Mori (2015) e
Bonjorno et al
(2009).
Inválida
4 “Nós concluímos que todo
número que termina em cinco ou
zero é divisível por cinco”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010); e
Mori (2015).
Válida
5 “Nós concluímos que é divisível
por 5 pois termina em 5”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010);
Mori (2015) e e
Bonjorno et al
(2009).
Parcialmente
válida
6 “Concluímos que a maioria
terminava em 0 ou 5”.
Andrini e
Vasconcelos (2012);
Centurión e
Jakubovic (2010);
Mori (2015) e
Bonjorno et al
(2009).
Inválida
Fonte: Castro (2019)
A análise do Quadro 6 indica que a realização da Atividade 3 novamente produziu
conclusões válidas e inválidas, sendo que as válidas foram maioria quando consideramos
as conclusões parcialmente válidas. As conclusões inválidas mostraram que o professor
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
221
durante o ensino por atividades deve ficar atento ao que está sendo elaborado pelas equipes
no momento da análise. Se o professor constatar que os participantes estão produzindo
conclusões a partir da análise dos resultados sem focar no objetivo da Atividade deve neste
momento direcionar a análise tendo o objetivo como referência. Em nossa opinião a falta
de direcionamento ao objetivo levou a produção das conclusões inválidas.
A Atividade Experimental 4 foi dedicada ao critério de divisibilidade por quatro, o
Quadro 6 apresenta o seu roteiro.
Quadro 7 Roteiro da Atividade Experimental 4
Atividade 4
Título: Divisibilidade por 4
Objetivo: Descobrir um critério de divisibilidade por 4.
Material: Papel, lápis ou caneta e máquina de calcular (optativa).
Procedimento:Verifique, com o auxílio da calculadora, se os números dados são
divisíveis por 4;
Com as informações obtidas preencha o quadro a seguir
Número
O número é
divisível por 4?
O número
termina em 00?
Os dois últimos
algarismos do número
formam um número
divisível por 4?
Sim Não Sim Não Sim Não
300
932
1000
1300
4158
7813
8991
9998
19990
23456
Observação:
Conclusão:
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
Os autores dos livros didáticos, usados como referência, apresentam os seguintes
enunciados em relação ao critério de divisibilidade por quatro:
1) Centurión e Jakubovic (2010, p. 99): “Um número natural será divisível por 4
se o número formado pelos algarismos das dezenas e das unidades é divisível
por 4”.
2) Mori (2015, p. 114): “Um número natural é divisível por 4 quando o número
formado pelos algarismos das dezenas e das unidades simples desse número é
divisível por 4”.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
222
3) Andrini e Vasconcelos (2012, p. 90): “Um número é divisível por 4, se o
número terminar em 00, ou se os dois últimos algarismos da direita formam um
número divisível por 4”.
4) Bonjorno et al (2009,p. 121): “um número é divisível por 4 se terminar em 00
ou se os dois últimos algarismos da direita, juntos, formarem um número
divisível por 4”.
No Quadro 8 estão as conclusões elaboradas pelos grupos.
Quadro 8 Comparação das Conclusões da Atividade 4 com livro didático
Grupo Conclusão Autor comparado Validade
1 “O quatro só pode ser divisível
quando o número tem dois zeros
ou quando a soma de seus últimos
algarismos dá um número divisível
por 4”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Inválida
2 “A minha conclusão foi que
quando o número é dividido
quando o número termina em
quatro em zero”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Inválida
3 “A minha conclusão que é
divisível quando termina em
quatro ou dois zeros”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Parcialmente
Válida
4 “Quando os dois últimos
algarismos forem divisível por 4”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Parcialmente
Válida
5 “Nós concluímos que o número
dividido por quatro quando o
número termina em zero”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Parcialmente
e válida
6 “Nós concluímos quando um
número é divisível por quatro
quando o número termina em
zero”.
Andrini e Vasconcelos
(2012); Bonjorno et al
(2009)
Parcialmente
válida
Fonte: Castro (2019)
A análise do Quadro 8 indica que para o critério de divisibilidade por 4 os
participantes não elaboraram conclusões válidas, somente foram produzidas quatro
conclusões parcialmente válidas e duas inválidas. Este fato pode ser explicado pela
característica do enunciado do critério de divisibilidade por 4 de ser composto por duas
possibilidades de um número ser divisível por 4. Mais uma vez fica explícita a necessidade
de atenção por parte do docente ao momento da análise dos resultados da atividade para
tentar auxiliar os participantes no sentido de não deixaram de lado aspectos importantes
dos resultados obtidos que são indispensáveis para a produção de uma conclusão válida,
esperada e desejada.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
223
A seguir apresentamos a quinta atividade e seus resultados:
Quadro 9 Roteiro da Atividade Experimental 5
Atividade 5
Título: Divisibilidade por 8
Objetivo: Descobrir um critério de divisibilidade por 8.
Material: Papel, lápis ou caneta e máquina de calcular.
Procedimento: Verifique, com o auxílio da calculadora, se os números dados são
divisíveis por 8;
Com as informações obtidas preencha o quadro a seguir
Número
O número é
divisível por 8?
O número
termina em 000?
O número formado
pelos três últimos
algarismos do número
é divisível por 8?
Sim Não Sim Não Sim Não
1000
3120
5410
2000
4775
10000
1688
10240
6308
9814
Observação:
Conclusão:
Fonte: Castro, Silva e Sá (2019)
O critério divisibilidade por oito de autores dos livros didáticos, usados como
referência, estão registrados no Quadro 9.
Quadro 10 O critério de divisibilidade por oito em livros didáticos
Autor Critério de divisibilidade por oito
Centurión e Jakubovic
(2010)
“Um número será divisível por 8 se o número formado
pelos algarismos das centenas, dezenas e unidades é
divisível por 8” (p.100).
Mori (2015) “Um número natural é divisível por 8 quando o número
formado pelos algarismos das centenas, dezenas e
unidades simples desse número é divisível por 8”
(p.117).
Andrini e Vasconcelos
(2012)
“Um número é divisível por8 quando termina em 000 ou
quando o número formado pelos seus três últimos
algarismos da direita é divisível por 8” (p.90).
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
224
Bonjorno et al (2009) “Um número natural é divisível por8 se terminar em 000
ou se os três últimos algarismos da direita, juntos,
formarem um número divisível por 8” (p. 121).
Fonte: Pesquisa bibliográfica (2019)
O Quadro 11 apresenta as conclusões produzidas para a Atividade 5.
Quadro 11 Comparação das Conclusões da Atividade 5 com livro didático
Grupo Conclusão Autor comparado Validade
1 “O número é divisível por oito
quando termina em 000 ou
quando os três últimos números
formarem um número divisível
por oito”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Válida
2 “Um número é dividido por oito
quando termina em 3 zeros ou
quando os 3 algarismos formam
o número dividido por 8”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Válida
3 “Concluímos que um número é
divisível por oito quando
termina em três zero ou quando
um número forma número
divisível por oito”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Parcialment
e válida
4 “Um número é divisível por 8
quando termina em 3 zeros ou
quando os 3 últimos algarismos
formar um número divisível por
8”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Válido
5 “Nós concluímos que o número
é divisível por oito quando ele
terminar em 3 zeros ou quando
o número formado da pra
dividir por oito”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Parcialment
e e válido
6 “O número é divisível por oito
quando termina em três zeros
ou quando os 3 últimos
algarismos formarem número
divisível por oito”.
Andrini e Vasconcelos
(2012) e Bonjorno et al
(2009)
Válido
Fonte: Castro (2019)
A análise dos resultados do Quadro 11 permite concluir que ao contrário da
Atividade 4 as conclusões da Atividade 5 tiveram o predomínio de conclusões válidas e
parcialmente válidas, com o predomínio das conclusões válidas, sem o registro de
conclusões inválidas.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
225
Esta diferença de resultados creditamos a atenção que foi dada de nossa parte ao
momento da análise dos resultados da Atividade e também aos comentários que foram
realizados no momento da institucionalização da Atividade 4.
Quadro 12 Distribuição da validade das conclusões por atividade
Validade Atividades
Total Atividade1 Atividade2 Atividade3 Atividade4 Atividade5
Válida 5 3 2 --- 4 14
Parcialmente
válida
--- --- 2 4 2 10
Inválida 1 3 2 2 --- 8
Não elaborou
conclusão
--- --- --- --- --- ---
Fonte: Castro (2019)
A análise do Quadro 12 indica que a validade das conclusões elaboradas teve variação
de atividade para atividade, com a presença de constante da validade, mesmo que parcial,
em cada uma delas. Fato que não ocorreu com a invalidade de conclusões. Outro registro
que consideramos importante realizar é que em todas as atividades sempre foram
elaboradas conclusões, isto demonstrou o envolvimento dos participantes na realização das
tarefas propostas. Também é possível perceber que o total de conclusões válidas em termos
absolutos foi maior que os totais de conclusões parcialmente válidas e inválidas.
Considerações finais
A problemática orientadora do estudo cujos resultados aqui foram apresentados foi
o seguinte: O ensino dos critérios de divisibilidade por meio de atividades permite ao
estudante descobrir e enunciar regras válidas sobre o assunto sem que o professor as tenha
apresentado previamente?
Com base nos resultados apresentados a resposta para esta questão não pode ser
apresentada de maneira absoluta e única, mas sim em enfoques diferentes.
Em primeiro lugar os resultados indicaram que foi possível produzir conclusões
válidas sobre os critérios de divisibilidade sem a apresentação prévia do assunto pelo
professor com a ressalva de que há oscilação entre a frequência de conclusões válidas,
parcialmente válidas e inválidas a depender do critério trabalhado.
Em segundo lugar a produção de conclusões válidas tendeu a ocorrer de forma
maioritária.
Desse modo podemos afirmar que o ensino dos critérios de divisibilidade por meio
de atividades mostrou-se viável, vale ressaltar que o mesmo exige pouco esforço por parte
do docente e dos discentes para produzirem enunciados válidos sobre o assunto.
O estudo aqui apresentado tem a limitação de ter sido realizado com apenas uma
turma. Entretanto, os resultados obtidos indicaram a possibilidade de replicação do mesmo
em outras turmas sem grandes problemas.
A replicação do estudo em tela certamente apontará os aspectos do processo de
ensino que necessitam de aperfeiçoamento para que os resultados produzidos sejam ainda
mais significativos do que os aqui apresentados.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
226
Os resultados que foram obtidos neste experimento demostraram que os estudantes
são capazes de participar ativamente do processo de aquisição do conhecimento
matemático desde que lhes sejam oferecidas condições para tal, sempre com a participação
do professor para realizar a mediação necessária visando o alcance do objetivo de cada
atividade.
Referências
ALVES, Kamilly Suzany Felix. O ensino de frações por atividades. Dissertação
(Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará, Belém, 2018.
ANDRINI, Álvaro; VASCONCELOS, Maria José. Praticando Matemática- 3ª ED.
Renovada, São Paulo: editora do Brasil, 2012.
BATISTA, Jakelline de Aquino. O ensino de proporcionalidade por atividades.
Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará, Belém, 2018.
BONJORNO, José Roberto...[ et al ]. Fazendo a diferença. São Paulo: FTD, 2009.
CASTRO, Sandro Benicio Goulart, SILVA, Ana Kelly Martins da e SÁ, Pedro Franco de.
O ensino de divisibilidade de números naturais por atividades. Belém: PMPEM-
UEPA, 2019.
CENTURIÓN, Marília Ramos; JAKUBOVIC, José. Matemática na medida certa, São
Paulo: Scipione, 2010.
GOMES, Rosana Pereira. O Ensino das Relações Trigonométricas no triângulo por
Atividades. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará.
Belém, 2013.
GRAÇA, Vagner Viana da. O ensino de problemas do 1º grau por atividades.
Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará, Belém, 2011.
JUCÁ, Rosineide de Souza. Uma sequência didática para o ensino das operações com
os números decimais. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do
Pará, Belém, 2008.
LOPES, Adriele Mendello. O ensino de radicais por atividades. Dissertação (Mestrado
em Educação), Universidade do Estado do Pará. Belém, 2015.
MENDES, Iran Abreu; SÁ, Pedro Franco de. Matemática por Atividades: Sugestões para
a sala de aula. Natal: Flecha do tempo, 2006.
MOREIRA, Ivanete Maria Barroso. O ensino de operações envolvendo frações com a
calculadora. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará,
Belém, 2010.
MORI, Iracema. Matemática: Ideias e desafios, 18ª ed- São Paulo: Saraiva. 2015.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.209-227 ISSN: 2675-1909
227
PAULA, Andrey Patrick Monteiro de. O ensino de áreas de figuras planas por
atividades. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará, Belém,
2011.
PIRES, Elise Cristina Pinheiro da Silva. O ensino de geometria analítica por atividades.
Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará, Belém, 2017.
ROSAS, Leonardo da Silva. Ensino de Análise combinatória por Atividades.
Dissertação (Mestrado profissional em Ensino de Matemática), Universidade do Estado do
Pará, Belém, 2018.
SÁ, P.F. e SALGADO, R. C. da S.. A construção das regras operatórias dos números
inteiros com a calculadora. EM TEIA – Revista de Educação Matemática e Tecnológica
Iberoamericana – vol. 2, número 3, 1-16, 2011.
SÁ, Pedro Franco de. Possibilidades do ensino de matemática por atividades. Belém:
IFPA, 2019.
SANTOS, Neusa de Oliveira. O ensino de potenciação por atividades. Dissertação
(Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará. Belém, 2017.
SILVA, Diego Cunha da. O ensino de função afim por atividades: experiência em uma
escola pública do estado do Pará. Dissertação (Mestrado profissional em Ensino de
Matemática), Universidade do Estado do Pará, Belém, 2018.
SILVA, Silvio Tadeu Teles da. O Ensino das Funções Exponencial e Logarítmica por
Atividades. Dissertação (Mestrado em Educação), Universidade do Estado do Pará.
Belém, 2014.
SOARES, Marcel Brito. O ensino de probabilidade por atividades. Dissertação
(Mestrado Profissional em Ensino de Matemática), Universidade do Estado do Pará.
Belém, 2018.
Sandro Benício Goulart Castro
Universidade do Estado do Pará
SEDUC-PA
São João de Pirabas
SEMED
E-mail: [email protected]
Ana Kelly Martins da Silva
Universidade do Estado do Pará
SEMED
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
Submetido em: 19 de setembro de 2020 DOI:
http://dx.doi.org/10.37084/REMATEC.1980-3141.2020.n15.p228-244.id295 Aprovado em: 19 de novembro de 2020
Um Estudo sobre o Ensino de Poliedros por Atividades
A Study on Teaching Polyhedra by Activities
João Nazareno Pantoja Corrêa
Universidade Federal do Pará – Pará – Brasil
Ducival Carvalho Pereira
Universidade do Estado do Pará – Pará – Brasil
RESUMO
Este trabalho apresenta os resultados de uma pesquisa desenvolvida com discentes do 3º ano do
ensino médio de uma escola pública federal no município de Tucuruí no Estado do Pará no Brasil,
que objetivou analisar a validade de conclusões elaboradas por estudantes sobre aspectos de
Poliedros a partir da realização de atividades experimentais sem que o professor tivesse apresentado
o assunto anteriormente. O experimento obedeceu aos seguintes momentos: diagnóstico, elaboração
das atividades, aplicação das atividades e análise dos resultados. A análise dos resultados obtidos
apontou que o ensino por atividade juntamente com uso de materiais manipuláveis possibilitou que
os discentes enunciassem conclusões válidas sobre propriedades dos Poliedros. Além disso, foi
observado que no experimento em questão, ocorreu uma maior compreensão na aprendizagem dos
discentes durante a descoberta de relações/propriedade na exploração do objeto matemático estudado
e as conclusões produzidas pelos participantes foram comparadas com resultados encontrados em
livros didáticos do ensino médio.
Palavras-chave: experiência didática, poliedros, ensino por atividade, manipuláveis.
ABSTRACT
This work presents the results of a research developed with students of the 3rd year of high school at
a federal public school in the municipality of Tucuruí in the state of Pará in Brazil, which aimed to
analyze the validity of conclusions drawn by students on aspects of Polyhedra from the carrying out
experimental activities without the teacher having previously presented the subject. The experiment
followed the following steps: diagnosis, preparation of activities, application of activities and
analysis of results. The analysis of the results obtained showed that teaching by activity together with
the use of manipulable materials enabled students to make valid conclusions about the properties of
Polyhedra. In addition, it was observed that in the experiment in question, there was a greater
understanding of the students' learning during the discovery of relationships / property in the
exploration of the studied mathematical object and the conclusions produced by the participants were
compared with results found in high school textbooks.
Keywords: didactic experience, polyhedra, teaching by activity, manipulable.
Introdução
O processo de ensino e aprendizagem de Matemática, não só no ensino médio, mas
de modo geral, ou seja, nos vários níveis educacionais, são notórias as dificuldades no
entendimento de conceitos estudados e suas respectivas aplicabilidades de forma concreta,
demonstrando a carência talvez de metodologias que proporcionem a minimização deste
problema, uma vez que o ensino que valoriza apenas a mecanização de exercícios e conjunto
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
229
de regras que devem ser obrigatórias, ainda é muito utilizado nas metodologias, porém vem
se mostrando pouco eficaz em relação a maioria dos conteúdos matemáticos estudados.
A geometria como ramo da matemática em que se dedica ao estudo das propriedades
e das medidas das figuras no espaço ou no plano, presente na vida do ser humano desde
períodos mais remotos, é uma excelente ferramenta para materializar conceitos matemáticos,
pois considera o espaço em volta do educando, podendo desse modo formalizar
matematicamente a realidade contribuindo com a construção de capacidades e habilidades
intelectuais, sendo de suma importância para o desenvolvimento da capacidade de abstração,
resolução de problemas práticos do quotidiano, estimar e comparar resultados, reconhecer
propriedades das formas geométricas.
Durante o ensino de poliedros, conteúdo pertencente a geometria espacial, a
possibilidade de manipulação favorece a visualização, a qual é um aspecto imprescindível
no estudo da geometria, uma vez que potencializa o entendimento das propriedades destes.
Neste sentido, existem muitas pesquisas enfatizando a importância da visualização, bem
como do raciocínio visual no ensino e aprendizagem de matemática.
Os estudos relacionados ao ensino de poliedros, categorizados por Corrêa (2019)
como estudos diagnósticos, teóricos e experimentais, convergiram em suas conclusões que
uma diminuição significativa das dificuldades pode ser alcançada através da utilização de
metodologias que enfatizem o uso de materiais manipuláveis e softwares de maneira
dinâmica e interativa, isto é, favorecendo a visualização e o manuseio, onde os discentes
tendem a ser mais participativos, e até colaborativos entre si nas atividades propostas, se
sentindo inseridos de forma mais ativa em seu aprendizado.
Nesta perspectiva, o Ensino por Atividades como metodologia tem o potencial de
transformar o discente em autor principal do seu aprendizado, de forma a construir seus
conhecimentos através de atividades de forma ativa, bem como a sua divisão didática através
dos seus respectivos momentos levará a construção do conhecimento através de um processo
de ensino e aprendizagem mais significativos.
Dessa forma, com a finalidade de contribuir para uma possível reversão do cenário
de dificuldades no ensino de geometria, mas especificamente ao ensino de poliedros, no qual
os alunos do ensino médio demonstram dificuldades e baixos rendimentos educacionais, esta
pesquisa tem como objetivo analisar a validade de conclusões elaboradas por estudantes
sobre aspectos de Poliedros a partir da realização de atividades experimentais sem que o
professor tivesse apresentado o assunto anteriormente.
Metodologia
A pesquisa foi desenvolvida no Instituto Federal do Pará (IFPA), campus de Tucuruí,
e contou com a participação efetiva de 26 (vinte e seis) discentes do 3º ano do turno da
manhã da turma técnico em edificações integrada ao ensino médio. Para o desenvolvimento
do experimento seguimos as respectivas etapas: diagnóstico, elaboração das atividades,
aplicação das atividades e análise dos resultados.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
230
Diagnóstico
Para construir o perfil dos discentes e diagnosticar seus respectivos desempenhos
acerca da resolução de questões envolvendo poliedros aplicamos um questionário a turma e
seus 26 (vinte e seis) discentes presentes, contendo questões referentes ao perfil
socioeconômico destes, bem como a relação dos participantes com a matemática na vida
escolar.
Os resultados obtidos demonstraram que a turma era composta por 07 discentes do
sexo masculino e 19 discentes do sexo feminino, com idades entre 16 e 19 anos, dos quais
61% responderam que já haviam ficado em dependência em alguma disciplina, sendo 12%
só em Matemática e 27% Matemática e outras disciplinas.
O diagnóstico apontou que a maioria dos discentes (65%) afirmou ter afinidade com
a matemática, gostando um pouco da disciplina. E que 69% dos discentes pesquisados
estudam matemática somente em períodos ligados a prova. No que se refere ao entendimento
dos discentes nas aulas de matemática, as respostas obtidas indicaram que os discentes em
sua maioria, sendo 54%, conseguem chegar as vezes ao entendimento nas aulas.
A respeito das formas de avaliação de matemática que os discentes geralmente são
submetidos, estes responderam em sua maioria (92%), que as formas mais comuns de
avaliação são provas ou simulados.
O diagnóstico também revelou que 92% dos discentes apontaram que as aulas de
matemática iniciaram pela definição seguida de exemplos e exercícios, e ainda que a forma
que o professor costumava praticar os conteúdos eram apenas duas: solicitar que os
estudantes resolvessem os exercícios do livro didático, o que foi apontado por 54% dos
pesquisados; e apresentar aos discentes uma lista de exercícios para serem resolvidos por
estes (citado por 46% dos discentes). Por fim, 62% dos discentes pesquisados afirmaram que
as aulas de matemática despertam seu interesse apenas “as vezes”.
Elaboração das atividades
O Ensino por Atividade é uma metodologia pautada na construção da autonomia do
aluno na construção do seu conhecimento, sendo esta a principal peculiaridade desta
metodologia, onde os conteúdos propostos possam ser descobertos pelo próprio aluno
durante o processo de aprendizagem, tendo o professor apenas como orientador (MENDES
e SÁ, 2006, p. 13).
Essa metodologia, busca apresentar os conteúdos matemáticos através do encontro
de leis gerais, ou ainda de generalizações, sem a intervenção do professor, no que diz respeito
a oferecer informações iniciais, fazendo com que o aluno construa sua aprendizagem por
meio de descobertas (SÁ, 2009, p.18).
Segundo Sá (2019) o ensino por atividades pode ser realizado por dois tipos básicos
de atividade que são a de conceituação e a de redescoberta, as quais possuem características
distintas. Em linhas gerais, enquanto atividade de conceituação visa a construção do
conhecimento durante a definição do objeto matemático, a atividade de redescoberta tem o
enfoque na construção do conhecimento a partir da descoberta das relações/propriedade
durante a exploração do objeto matemático.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
231
Apesar da distinção entre os objetivos de uma atividade de conceituação e de uma
atividade de redescoberta, o ensino de matemática por meio de uma aula por ambos os tipos
de atividade, podem ser divididos didaticamente em seis momentos a saber: organização,
apresentação, execução, registro, análise e institucionalização (SÁ, 2019).
Desse modo, embasados no Ensino de Matemática por Atividades e nos seus
respectivos Momentos elaboramos nossas atividades, sendo um total de onze atividades, das
quais abordaremos os resultados de somente três atividades de redescoberta neste momento,
dada a grande extensão destas.
As três atividades que serão abordadas são: Atividade 01, sobre a relação entre as
Arestas e os Vértices de um poliedro; a Atividade 02, tratando da relação entre Arestas e os
Polígonos das faces de um poliedro e a Atividade 03 que traz a Relação de Euler. É
importante destacarmos aqui, que as atividades utilizaram kits de sólidos geométricos
construído para que os discentes manuseassem os poliedros durante a realização destas, os
quais apresentamos a seguir:
Figura 1: Kit de Sólidos Geométricos
Fonte: Corrêa, 2019.
Figura 2: Poliedros construídos para Kit
Fonte: Corrêa, 2019.
No decorrer das atividades o nome da caixa onde ficam os sólidos do kit foi
modificado de acordo com o que era proposto no desenvolvimento de cada respectiva
Cubo Grande Cubo
Pequeno Dodecaedro
grande Dodecaedro
pequeno Icosaedro
Grande Icosaedro Pequeno
Octaedro Grande
Octaedro Pequeno
Tetraedro Grande Tetraedro Pequeno
Pirâmide Hexagonal
Grande
Pirâmide Hexagonal Pequena
Poliedro Côncavo
Prisma Quadrangular
Prisma Triangular Grande
Prisma Triangular Pequeno
Pirâmide Quadrangular
Grande
Pirâmide Quadrangular
Pequena
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
232
atividade de modo a buscar ajudar na identificação e classificação dos sólidos presentes no
decorrer do processo.
Para uma melhor compreensão no desenvolvimento das atividades que propomos,
recomendamos uma leitura minuciosa dos momentos do ensino por atividade de autoria de
Sá (2019).
Aplicação das atividades
Para iniciarmos as atividades primeiramente organizamos a turma em equipes, as
quais foram formadas de maneira espontânea pelos discentes, de no máximo quatro
integrantes, como a turma possuía 26 (vinte e seis) alunos, então foram formados sete grupos,
sendo cinco contendo quatro alunos e dois com três alunos respectivamente. Informamos a
todos que permaneceriam nas mesmas equipes no decorrer de todas as atividades.
Logo em seguida, distribuímos o kit de sólidos geométricos para cada um dos sete
grupos formados, posteriormente apresentamos o referido kit e distribuímos envelopes
contendo as atividades acordo com o número de integrantes de cada equipe.
As atividades eram constituídas com um roteiro contendo os seus respectivos
procedimentos, bem como possuía o espaço destinado as respostas, e outro para posterior
conclusão, a qual buscamos chegar juntamente com os participantes.
De modo geral, os procedimentos descritos nas atividades solicitavam que os
discentes manuseassem os sólidos do kit, e a partir das características observadas
conseguissem chegar em uma conclusão sobre um conceito ou relação envolvendo poliedros.
Para tanto, após a realização dos procedimentos determinados por cada atividade,
bem como as discussões internas entre os grupos, solicitamos que um representante de cada
equipe fizesse a leitura de suas conclusões, instigando desse modo uma discussão com toda
a turma sobre o conceito ou relação encontrados, e posteriormente entrar com a formalização
construída a partir das respostas dos discentes.
Após cada atividade, é importante ressaltamos que solicitamos que os participantes
devolvessem ao envelope a folha referente a esta, o qual recolhíamos, e logo em seguida
distribuíamos outros envelopes contendo questões referentes ao conteúdo proposto em cada
respectiva atividade.
No momento em que os discentes terminavam de resolver as questões solicitávamos
que devolvessem as folhas para os envelopes. E após todos os grupos terem concluído as
resoluções, iniciávamos outra atividade. É importante registrar que durante a resolução os
discentes consultaram o kit de sólidos geométricos com frequência.
Análise dos resultados
Para a análise dos resultados obtidos utilizamos as construções das equipes descritas
nas folhas de atividades, classificando as observações e conclusões de cada grupo como:
Características inválidas, parcialmente válidas e válidas, relacionadas a Poliedro, e
atribuindo as cores vermelha, amarela e verde, respectivamente para cada uma delas. A
seguir apresentamos nossa primeira atividade de redescoberta:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
233
Quadro 1: Roteiro da Atividade 01
Fonte: Corrêa, 2019.
Esta atividade teve como objetivo a descoberta de uma relação entre as arestas e os
vértices de um poliedro através dos procedimentos descritos na folha da atividade, os quais
eram: identificar os poliedros da atividade presentes na caixa; determinar o total de vértices,
arestas e faces destes; determinar a quantidades arestas presentes em cada vértice; e
preencher o quadro.
De forma geral, a maioria dos participantes executaram de maneira efetiva a atividade
proposta, uma vez que conseguiram perceber sem dificuldades as características dos sólidos
presentes dentro da caixa, e até mesmo começaram a comentar sobre as características dos
que estavam fora da mesma, a seguir apresentamos as características encontradas pelos
discentes e as análises destas:
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
234
Quadro 2: Resposta dos Discentes sobre Arestas e os Vértices de um poliedro
ALUNO
S OBSERVAÇÕES E CONCLUSÕES ANÁLISE
(GRUP
O 01)
A20,
A22
e A26
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
O resultado de “v . n” são o dobro do número de arestas.
CONCLUSÃO
O número de arestas de cada vértice multiplicado pelo total
de vértice é igual ao dobro do total de arestas de um
poliedro.
(GRUP
O 02)
A1, A2,
A11 e
A23
OBSERVAÇÃO
Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
A aresta é a metade do valor multiplicado de vértices com
as arestas que encontram os vértices no polígono.
CONCLUSÃO
O número de arestas de cada vértice multiplicado pelo total
de vértice é igual ao dobro do total de arestas de um
poliedro.
(GRUP
O 03)
A7, A9,
A13 e
A18
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
O número de vértices vezes a quantidade de arestas
encontradas em cada vértice é igual ao dobro do número
total de arestas.
CONCLUSÃO
(GRUP
O 04)
A10,
A17
e A24
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
Todos os “V.(n)” são o dobro do número de arestas.
CONCLUSÃO
Em um poliedro convexo o númermo de arestas cada
vértice multiplicado no total de cada vértice é igual ao
dobro no total de arestas.
(GRUP
O 05)
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
O número de vértices multiplicado pelo número de arestas
em um vértice sempre dará o dobro do número de arestas.
Poliedro
𝐴 =𝑉.𝑛
2
𝐴 =𝑉.𝑛
2 𝐴 =
𝑉1 .𝑛1+𝑉2 .𝑛2
2
𝑉 × 𝑛 = 2𝐴
𝑉 × 𝑛 = 2𝐴
𝐴 =𝑉.𝑛
2 𝑉 × 𝑛 = 2𝐴
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
235
A3, A5,
A15 e
A16
arestas e
vértices dos
poliedros CONCLUSÃO
O nº de arestas de cada vértice × total de vértice é igual ao
dobro do total de arestas do poliedro.
(GRUP
O 06)
A6,
A14,
A19 e
A25
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
A multiplicação do número de vértices pelo número de
arestas em cada vértice , sempre sera o dobro do número
de arestas.
CONCLUSÃO
ou
(GRUP
O 07)
A4, A8,
A12 e
A21
OBSERVAÇÃO
Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e
vértices dos
poliedros
O número total de arestas (A) é sempre metade do produto
do total de vértices (V) e o número de arestas que se
encontram em cada vértice do poliedro.
CONCLUSÃO
O número de arestas de cada vértice multiplicado pelo total
de vértice é igual ao dobro do total de arestas de um
poliedro.
Fonte: Corrêa, 2019.
Para verificarmos a respectiva validade das observações e conclusões obtidas nos
embasamos em Lima e outros (2006) que afirma que o número de arestas também pode ser
contado através da observação dos vértices do poliedro, através da contagem do número de
arestas que ocorrem nestes, e que bastaria multiplicarmos por três o vértice com gênero V3,
multiplicarmos por quatro o vértice com gênero V4, multiplicarmos por cinco o vértice com
gênero V5, e assim sucessivamente, somando seus respectivos resultados, e por conta de cada
aresta ter sido contada duas vezes, esta soma deverá ser igualada ao dobro do número de
arestas. Logo,
3 4 5 6
3
2 3 4 5 6 ...j
j m
m
A V V V V jV mV
No desenvolvimento desta atividade, como previsto, os discentes tiveram certa
dificuldade no princípio, no que se refere ao preenchimento do quadro, posteriormente na
observação e na conclusão, levando assim um tempo superior ao que planejamos para a
realização da atividade pelos grupos.
Porém, como podemos observar com as análises das conclusões obtidas das equipes,
mesmo existindo dificuldades no desenvolvimento da atividade, estas foram possivelmente
𝐴 𝑉 𝑛12 8 3
𝑉.𝑛24
𝑉 × 𝑛 = 2𝐴 𝐴 =𝑉.𝑛
2 𝐴 =
𝑉1 .𝑛1+𝑉2 .𝑛2
2
2𝐴 = 𝑉 × 𝑛 𝐴 =𝑉.𝑛
2
𝑉 × 𝑛 = 2𝐴 ⇒ 𝐴 =𝑉×𝑛
2
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
236
superadas, uma vez que todos os estudantes conseguiram possivelmente chegar ao
entendimento da relação existente entre os elementos dos poliedros a qual a atividade se
referia.
Desse modo, acreditamos que todos os participantes conseguiram a partir dos
procedimentos descritos na atividade que levou ao preenchimento do quadro, a observação
e posterior conclusão, chegar à relação entre o número arestas e o número vértices em um
poliedro.
Ao final da realização dos procedimentos descritos na atividade, solicitarmos que um
representante de cada equipe fosse até o quadro e expusesse sua conclusão, em seguida
fizemos a análise das conclusões de todas as equipes presentes no quadro, e tomando por
base as conclusões de cada equipe produzimos a conclusão oficial da turma.
A Atividade 02 tinha como objetivo a descoberta de uma relação entre os polígonos
que formam a face e o total de arestas de um poliedro regular através dos procedimentos
descritos na folha da atividade, sendo estruturada da seguinte forma:
Quadro 3: Roteiro da Atividade 02
Fonte: Corrêa, 2019
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
237
Todos os participantes executaram de maneira efetiva a atividade proposta,
conseguindo enumerar várias características dos sólidos que estavam dentro da caixa, a
seguir apresentamos as características encontradas pelos discentes:
Quadro 4: Resposta dos Discentes sobre Arestas e os Polígonos das faces de um poliedro
ALUNO
S OBSERVAÇÕES E CONCLUSÕES ANÁLISE
(GRUP
O 01)
A20,
A22
e A26
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
O número de lados do polígono das faces de um poliedro
multiplicado pelas vezes que se repete é igual ao dobro do
número de arestas.
CONCLUSÃO
(GRUP
O 02)
A1, A2,
A11 e
A23
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
CONCLUSÃO
O dobro do número de arestas é igual ao número de lados
do plígono das faces multiplicado pelas vezes que ele se
repete.
(GRUP
O 03)
A7, A9,
A13 e
A18
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
O número de lados das faces multiplicado pelas vezes que
se repete igual ao dobro do número de arestas.
CONCLUSÃO
(GRUP
O 04)
A10,
A17
e A24
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
O número de arestas é igual metade do número de lados do
polígono das faces pelas vezes que se repete.
CONCLUSÃO
Assim, temos:
(GRUP
O 05)
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
O número de faces multiplicado pelas vezes que repete é
igual ao dobro do nº de arestas.
CONCLUSÃO
𝐹 × 𝑛 = 2𝐴 𝑜𝑢 𝐴 =𝐹. 𝑥
2
𝐴 =𝑛.𝐹
2
𝐴 =𝑛1.𝐹1 + 𝑛2.𝐹2
2
𝑛.𝐹 = 2𝐴 𝑜𝑢 𝐴 =𝑛.𝐹
2
𝐴 =𝑛 × 𝐹
2 𝑜𝑢 𝐹 × 𝑛 = 2𝐴
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
238
A3, A5,
A15 e
A16
O nº das arestas de uma face × pelo nº de vezes que se
repete.
arestas e as
faces dos
poliedros
(GRUP
O 06)
A6,
A14,
A19 e
A25
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
CONCLUSÃO
O número de arestas é igual a metade do multiplicado do
número de lados do polígono das faces pelas vezes que se
repete.
(GRUP
O 07)
A4, A8,
A12 e
A21
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação ente
arestas e as
faces dos
poliedros
O número de arestas é igual a metade do número de lados
do polígono das facesmultiplicado pelas vezes que ele se
repete.
CONCLUSÃO
Fonte: Corrêa, 2019
Para examinarmos a respectiva validade das observações e conclusões construídas,
também nos fundamentamos em Lima e outros (2006) que apresenta a relação entre as
arestas com as faces de um poliedro, por meio de um exemplo onde imaginamos um poliedro
qualquer totalmente desmontado com suas respectivas faces sobre uma mesa ou qualquer
outra superfície plana.
Neste cenário, notaríamos que cada uma de suas faces é representada por um
polígono, de modo que se quiséssemos saber a quantidade de lados de cada um destes,
bastaria multiplicarmos o número de triângulos por três (F3), o número de quadriláteros por
quatro (F4), o número de pentágonos por cinco (F5), o número de hexágonos por seis (F6) e
assim sucessivamente, e depois realizar a soma de todos os resultados obtidos. Porém, por
conta de cada aresta do poliedro ser lado de exatamente duas faces, esta soma deverá ser
igualada ao dobro do número de arestas do poliedro, assim:
3 4 5 6
3
2 3 4 5 6 ...i
i n
n
A F F F F iF nF
Ao observarmos as análises das conclusões das equipes, podemos inferir que mesmo
existindo dificuldades durante o desenvolvimento da atividade, estas possivelmente foram
superadas, uma vez que todas as equipes conseguiram chegar a construção da relação
existente entre os elementos dos poliedros que a atividade propunha entre as arestas e as
faces de um poliedro.
𝐹 × 𝑛 = 2𝐴 𝑜𝑢 𝐴 =𝐹 × 𝑛
2
𝐴 =𝑛.𝐹
2
𝐴 =𝑛.𝐹
2 𝐴 =
𝑛1.𝐹1 + 𝑛2 .𝐹2
2
𝐹. 𝑛 = 2𝐴 ⇒ 𝐴 =𝐹. 𝑛
2
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
239
Novamente ao final da realização dos procedimentos descritos na atividade,
solicitarmos que um representante de cada equipe fosse até o quadro para expor para a turma
sua conclusão, em seguida fizemos a análise das conclusões de todas as equipes, e a partir
de cada uma destas produzimos a conclusão oficial da turma.
A Atividade 03 abordava a Relação de Euler, e estava estruturada da seguinte forma:
Quadro 5: Roteiro da Atividade 03
Fonte: Corrêa, 2019
Com a execução do preenchimento do quadro pelos grupos, estes começaram as
discussões internamente sobre as observações e conclusões, as quais destacamos a seguir:
Quadro 6: Resposta dos Discentes sobre a Relação de Euler
ALUNO
S OBSERVAÇÕES E CONCLUSÕES ANÁLISE
(GRUP
O 01)
A20,
A22
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F é igual a 2 em todos os poliedros
convexos e para alguns não convexos.
CONCLUSÃO
A relação V-A+F=2 em todos os poliedros convexos
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
240
e A26
(GRUP
O 02)
A1, A2,
A11 e
A23
OBSERVAÇÃO
Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F é igual a 2 nos poliedros convexos e
alguns poliedros não convexos.
CONCLUSÃO
V-A+F=2 é válido em todos os poliedros convexos e alguns
não convexos
(GRUP
O 03)
A7, A9,
A13 e
A18
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F é igual a 2 em todos os poliedros
convexos e para alguns não convexos.
CONCLUSÃO
Em todos os poliedros convexos a relação V-A+F=2
(GRUP
O 04)
A10,
A17
e A24
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F é igual a 2
CONCLUSÃO
A relação V-A+F=2 é válido em todos os poliedros
convexos, e para alguns não convexos.
(GRUP
O 05)
A3, A5,
A15 e
A16
OBSERVAÇÃO
Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F é igual a dois em todos os poliedros
convexos.
CONCLUSÃO
A relação V-A+F é igual a dois em todos os poliedros
convexos, sendo paraalguns não convexos.
(GRUP
O 06)
A6,
A14,
A19 e
A25
OBSERVAÇÃO
Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
V-A+F é igual a 2.
CONCLUSÃO
A relação V-A+F=2 é válida em todos os poliedros
convexos e para alguns não convexos
(GRUP
O 07)
A4, A8,
A12 e
A21
OBSERVAÇÃO Observação e
Conclusão
válidas sobre a
relação de
Euler
A relação V-A+F=2
CONCLUSÃO
A relação V-A+F=2 em todos os poliedros convexos e para
alguns não convexos
Fonte: Corrêa, 2019
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
241
Para verificarmos a validade das observações e conclusões desta atividade, também
nos baseamos em Lima e outros (2006), que apresenta por meio de demonstração adaptada
do professor Zoroastro Azambuja Filho, publicada na RPM nº 3 (1983) a relação Euler, a
saber: “Em todo poliedro com A arestas, V vértices e F faces, vale a relação V – A + F = 2”,
e ainda afirma que os poliedros para os quais é válida a relação de Euler, são conhecidos por
poliedros eulerianos, e como consequência da existência de poliedros não convexos que
satisfazem esta relação, e assim toma como a Propriedade que “Todo poliedro convexo é
euleriano, porém nem todo poliedro euleriano é convexo”.
De acordo com as análises das conclusões das equipes, podemos inferir que os
participantes possivelmente conseguiram construir o entendimento da validade da relação
de Euler para poliedros. E como nas demais atividades semelhantes a esta, isto é, contendo
campos para observações e conclusões, solicitamos que um representante de cada equipe
registrasse no quadro a conclusão de sua equipe, posteriormente a partir das conclusões das
equipes construímos a conclusão oficial da turma.
No decorrer do processo de experimentação percebemos que os discentes
participantes da pesquisa ficaram cada vez mais rápidos no desenvolvimento das atividades
propostas, o que corrobora com Sá (1999, p.81), o qual afirma que “a experiência tem
mostrado que o educando fica mais rápido à medida que as atividades são vencidas e deste
modo o maior tempo gasto no início é recompensado posteriormente”.
Durante o estudo das análises das respostas dos discentes percebemos que no decorrer das
atividades a quantidades de respostas consideradas válidas sobre poliedros cresce
significativamente, enquanto que as parcialmente válidas e inválidas diminuem,
demonstrando que os discentes ao longo das atividades conseguiram construir conceitos e
desenvolver respostas.
Um fator que chamou nossa atenção, reiteramos, foi a fala constante dos discentes a respeito
da vontade de que as aulas de matemática fossem conduzidas dessa forma, onde eles
pudessem sair do campo do pensamento, isto é, do abstrato e ver a aplicabilidade da
matemática de forma concreta.
Conclusões dos estudantes e os Livros Didáticos
Com o objetivo de comparar as respostas obtidas nas conclusões dos estudantes
durante nossa pesquisa com as relações/propriedades existentes nos livros didáticos
referentes a Poliedros, selecionamos quatro livros didáticos utilizados no Ensino Médio que
abordam o conteúdo, a saber: Matemática Contexto & Aplicações (2016), Matemática
Ciência e Aplicações (2016), Conexões com a Matemática (2016) e Matemática Paiva
(2015).
Ao buscar compararmos as conclusões obtidas na Atividade 01 com as informações
existentes a relação apresentada, referente as Arestas e os Vértices de um poliedro,
verificamos que os quatro livros destacados não abordam a relação separadamente para
posteriormente apresentar a Relação de Euler, mas sim as apresentam somente em seus
exemplos e exercícios de maneira superficial. O mesmo acontece com a relação apresentada
na Atividade 02, que trata da relação entre as arestas e os polígonos das faces de um poliedro.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
242
Essas relações são essenciais no estudo das propriedades de Poliedros, bem como
para o desenvolvimento do entendimento da Relação de Euler e sua respectiva aplicação em
questões que a abordem. E ao apresenta-las sem ênfase, como já percebemos em nossa
experiência docente e no desenvolvimento das atividades apresentadas, poderemos nos
deparar com maiores dificuldades no processo de ensino e aprendizagem do referido
conteúdo.
No que se refere as conclusões obtidas na Atividade 03, que aborda diretamente a
Relação de Euler, podemos observar que estão de acordo com o que apresentam os quatro
livros didáticos selecionados, como observamos no livro Matemática Contexto &
Aplicações (2016), que apresenta os poliedros e solicita que por meio da observação destes
o leitor observe que o número de arestas é exatamente duas unidades a menos do que a soma
do número de faces com o número de vértices.
Na sequência, apresenta a relação de Euler “V-A+F=2”, e posteriormente afirma que
o valor 2 da referida expressão é uma característica de todos os poliedros convexos, e ainda
traz observações sobre a validade da relação, como “Em alguns poliedros (não em todos)
não convexos vale também a relação de Euler”, apresentado exemplos de poliedros não
convexos em que a relação é válida.
No livro Matemática Ciência e Aplicações (2016), apresenta a relação de Euler após
abordar os poliedros e suas fórmulas para o encontro de suas respectivas áreas e volumes,
entre outros. Então de maneira direta afirma que “Pode-se mostrar que para todo poliedro
convexo vale a relação: V - A + F = 2”, e em seguida comenta superficialmente sobre
Leonhard Euler.
Este livro traz exemplos de poliedros com quantidades de vértices, arestas e faces de
poliedros em tabelas, mostrando que os poliedros não convexos geralmente não satisfazem
a relação de Euler, mas sugere que um poliedro não convexo pode ou não satisfazer a relação
de Euler. Por fim, afirma que “Se um poliedro (convexo ou não) satisfaz a relação de Euler,
diz-se que é um poliedro euleriano”.
No livro Conexões com a Matemática (2016), antes da abordagem da relação de
Euler é chamada a atenção para o fato de que os elementos dos poliedros mantêm entre si
muitas relações geométricas, e na sequência afirma que uma das mais importantes é a relação
de Euler que está relacionada aos poliedros convexos.
Para verificar a validade da relação, apresenta três exemplos de poliedros convexos
em que a relação de Euler tem validade, em seguida aponta um exemplo de poliedro não
convexo em que também é válida, neste sentido faz uma observação que embora todo
poliedro convexo satisfaça a relação de Euler, nem sempre um poliedro que satisfaz essa
relação é convexo.
Por fim, o livro Matemática Paiva (2015), aborda como introdução a relação de Euler
as características dos polígonos convexos, posteriormente comenta sobre a descoberta de um
teorema por Leonhard Euler, indicando que em todo poliedro convexo vale a relação “V-
A+F=2”, e posteriormente traz dois exemplos de poliedros convexos em que a relação
apresentada é válida.
Como podemos observar os livros didáticos somente apresentam a Relação de Euler
e sua validade para os poliedros convexos, porém a validade da relação para alguns poliedros
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
243
não convexos não é aprofundada no desenvolvimento do conteúdo de poliedros. Nas
conclusões construídas pelos grupos podemos verificar que a maioria conseguiu identificar
que a Relação de Euler tem validade para todos os poliedros convexos e para alguns não
convexos, sendo um total de cinco grupos, e apenas dois grupos não identificaram, porém
em suas observações destacaram a validade para alguns não convexos, de modo que
inferimos que entenderam a corrente validade.
Considerações Finais
Nossa pesquisa objetivou analisar a validade de conclusões elaboradas por estudantes
sobre aspectos de Poliedros a partir da realização de atividades experimentais sem que o
professor tivesse apresentado o assunto anteriormente, e dado ao fato de que todas as
respectivas conclusões obtidas foram válidas no que se refere ao respectivo conteúdo,
consideramos que nossos resultados foram significativos, uma vez que contribuiu para que
os discentes participantes da pesquisa identificassem as regularidades e descobrissem leis
gerais para chegarem ao entendimento das relações desejadas.
Com esta pesquisa, esperamos ter contribuído com para o desenvolvimento do
conteúdo de Poliedros em sala de aula, na intenção de oferecer suporte ao professor, e
buscando favorecer a obtenção do conhecimento pelo discente, para deste modo tentar
ocasionar a existência de maiores possibilidades de um processo efetivo de ensino e
aprendizagem do conteúdo matemático em questão. Temos consciência que o conteúdo de
poliedros e de geometria espacial de modo geral possuem uma grande extensão, o que nos
leva a refletir sobre possíveis atividades a serem futuramente desenvolvidas de forma
semelhante.
Por fim, no que se refere a pesquisas envolvendo o ensino e aprendizagem de
poliedros, acreditamos que nossa pesquisa abre espaço para novas investigações sobre a
referida temática por meio de outras pesquisas envolvendo metodologias semelhantes, ou
ainda outras metodologias.
Referências
CORRÊA, J. N. P. O Ensino de Poliedros por Atividades. 2019. 354f. Dissertação
(Mestrado em Ensino de Matemática) – Universidade do Estado do Pará, PA, Programa de
Mestrado Profissional em Ensino de Matemática, Belém, 2019.
DANTE, Luiz Roberto. Matemática: Contexto & Aplicações: Ensino Médio, 3. ed. São
Paulo: Ática, 2016.
DOLCE, O.; POMPEO, J. N., Fundamentos de Matemática Elementar - Volume 10, 4ª
edição. São Paulo. Editora ATUAL. 1985.
IEZZI, Gelson.; DOLCE, Osvaldo.; DEGENSZAJN, David.; PÉRIGO, Roberto.;
ALMEIDA, Nilze de. Matemática: Ciência e Aplicações: Ensino Médio, volume 2. 9. ed.
São Paulo: Saraiva, 2016.
LEONARDO, Fabio Martins de. Conexões com a Matemática. 3. ed. São Paulo: Moderna,
2016.
REMATEC: Revista de Matemática, Ensino e Cultura, Ano 15, Número 35, p.228-244 ISSN: 2675-1909
244
LIMA, E. L. O teorema de Euler sobre poliedros. In: Meu Professor de Matemática e
outras Histórias - Coleção do Professor de Matemática, Sociedade Brasileira de
Matemática. Rio de Janeiro: IMPA, 1991a.
LIMA, E. L. et al. A Matemática do Ensino Médio - Volume 2, SBM Coleção do Professor
de Matemática. 6ª Edição (2006). Rio de Janeiro.
SÁ, Pedro Franco de. Atividades para o ensino de Matemática no ensino fundamental.
Belém: EDUEPA, 2009.
SÁ, Pedro Franco de. Possibilidades do ensino de matemática por atividades. Belém:
SBEM-PA, 2019. Disponível em http://sinepem.sbempara.com.br/file/V7.pdf.
PAIVA, Manoel. Matemática: Paiva. 3.ed. São Paulo: Moderna, 2015.
João Nazareno Pantoja Corrêa
Universidade Federal do Pará – Pará – Brasil
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1875-4711
Ducival Carvalho Pereira
Universidade do Estado do Pará – Pará – Brasil
E-mail: [email protected]
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4511-0185