1fasee

Upload: aline-morais

Post on 04-Feb-2018

223 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/21/2019 1fasee

    1/55

    1 Fase Questes

  • 7/21/2019 1fasee

    2/55

    ALEX ANTONELLIANGELA BORGES MARTINS

    ANTONIO CARLOS DO PATROCINIOANTONIO CARLOS VITTEANTONIO MANOEL MANSANARESCLAUDETE DE CASTRO SILVA VITTECRISTINA MENEGUELLOEDMUNDO CAPELAS DE OLIVEIRAFOSCA PEDINI PEREIRA LEITEFRANCISCO DE ASSIS M GOMES NETOIARA LIS FRANCO SCHIAVINATTO C. SOUZAIZABEL ANDRADE MARSONJEFFERSON CANOJOSE DE ALENCAR SIMONIKATIA LUCHERI CAVALCA DEDINILAURECIR GOMES

    MARCIA REGINA CAPELARI NAXARAMARIA CRISTINA CINTRA G. MARCONDESMARIA ELISA Q. P. MARTINSMARIA VIVIANE VERAS C. PINTOMATILDE VIRGINIA RICARDI SCARAMUCCIMATTHIEU TUBINOMAURICIO URBAN KLEINKEPAULO ROBERTO OTTONIPETER ALEXANDER BLEINROTH SCHULZPLAMEN EMILOV KOCHLOUKOVRAQUEL RODRIGUES CALDASTEREZINHA DE JESUS MACHADO MAHER

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    Colaboradores

    Cidade Universitria Zeferino VazBaro Geraldo - Campinas - SP - CEP 13083-970

    Tel: (19) 3289 3130 - 3788 7440 - 3788 7665Fax: (19) 3289 4070

    [email protected]

  • 7/21/2019 1fasee

    3/55

    3

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    INTRODUOComo em anos anteriores, trazemos nesta publicao as trs propostas da provade redao 2004 comentadas pela banca examinadora, acompanhadas porredaes selecionadas para discutir e ilustrar importantes aspectos da correo.Pretendemos, desta forma, oferecer um material que, juntamente com o programaque consta do manual do candidato e publicaes anteriores, possa ser utilizadopor professores e candidatos para uma compreenso mais profunda dos aspectosda prova e de sua correo, com benefcios para a preparao que a antecede.A prova de redao da Unicamp vem seguindo basicamente um mesmo formatodesde 1987 e um observador atento poder perceber que as mudanas efetuadasao longo dos anos foram mnimas e insucientes para alterar a concepo deleitura, de escrita e de linguagem que a fundamentam. Apesar de a prova estar em

    uso h 17 anos e de muitos professores estarem familiarizados com seus conceitos,ainda observam-se prticas de ensino que, ao invs de trabalharem os processosde ler e escrever, limitam-se a apresentar aos alunos estratgias ou frmulas que,no entender de seus proponentes, so sucientes para um bom desempenhona prova. Esses comportamentos demonstram conhecimentos equivocados dosconceitos envolvidos, uma vez que, dada a natureza da prova, essas estratgiasraramente so bem sucedidas.Como elaboradores deste exame, acreditamos ser nossa responsabilidade fazercom que cheguem at os professores e candidatos, os conceitos sobre a provae sua correo da forma mais completa e detalhada possvel. Esta publicao,portanto, uma oportunidade mpar para estabelecermos esse dilogo, visandoesclarecer aspectos fundamentais relativos a nossa compreenso dos processosde leitura e escrita de textos, de forma a manter este exame enquanto uminstrumento potencial de mudanas e no apenas de seleo.

    Apresentamos, na prxima seo, a prova de redao 2004. Em seguida,na segunda seo, focalizamos alguns aspectos salientes da prova, maisespecicamente relacionados estrutura e concepo da coletnea, enquantona terceira, discutimos cada uma das trs propostas. Finalmente, na ltima seo,redaes de nveis distintos so comentadas com base nos critrios utilizados nacorreo.

  • 7/21/2019 1fasee

    4/55

    4

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    APRESENTAO DA COLETNEAA cidade um lugar signicativo da experincia humana. Ela tem sido objeto dereexo de gegrafos, urbanistas, historiadores, prossionais da sade, estudiososda linguagem, lsofos, engenheiros, matemticos, artistas, enm, de muitosprossionais que procuram entender seu funcionamento. Ao atrair tantas e tovariadas atenes, a cidade mostra-se complexa e multifacetada.

    COLETNEA1.No primeiro sinal verde aps o relgio do canteiro central marcar 12h40min,

    cerca de cem pessoas atravessaram a Avenida Paulista, na altura da Rua Augusta.De repente, tiraram um sapato, bateram com o solado repetidas vezes no cho,calaram-no novamente e seguiram seu caminho. Um novo tipo de manifestaopoltica? Longe disso. O que a Paulista viu foi a primeira fash mob (multidoinstantnea) brasileira. O fenmeno, mania na Europa e nos Estados Unidos,consiste em reunir o maior nmero de pessoas no menor tempo possvel -por e-mail e celular - para fazer alguma coisa estranha simultaneamente. Osnova-iorquinos j invadiram uma loja e gritaram em frente a um dinossauro debrinquedo. Na verso brasileira, cou decidido tirar o sapato e bat-lo no cho,como que para tirar areia de dentro. (Adaptado de Anglica Freitas, 40 segundosde frenesi na Paulista. Flash Mobchega a So Paulo, Estado de S.Paulo, 14 de agosto de2003).

    2.No produtivo ano de 1979, o grupo encapuzou, com sacos de lixo, as esttuasda cidade, visando chamar a ateno das pessoas que nunca, ou quase nunca,reparavam em seu dia-a-dia as obras de arte em nossa cidade. Na manh seguinte,a imprensa registrou o fato. No mesmo ano vedaram as portas das principais

    ORIENTAO GERAL: LEIA ATENTAMENTE.

    Proposta:Escolha uma das trs propostas para a redao (dissertao, narraoou carta) e assinale sua escolha no alto da pgina de resposta. Cadaproposta faz um recorte do tema geral da prova (CIDADE), que deve sertrabalhado de acordo com as instrues especcas.

    Coletnea: um conjunto de textos de natureza diversa que serve de subsdio paraa sua redao. Sugerimos que voc leia toda a coletnea e selecione oselementos que julgar pertinentes para a realizao da proposta escolhida.Um bom aproveitamento da coletnea no signica referncia a todosos textos. Esperamos, isso sim, que os elementos selecionados sejamarticulados com a sua experincia de leitura e reexo. Se desejar, vocpode valer-se tambm de elementos presentes nos enunciados dasquestes da prova. ATENO: a coletnea nica e vlida para as trspropostas.

    ATENO Sua redao ser anulada se voc:a)fugir ao recorte do temada proposta escolhida; b)desconsiderar acoletnea;c)no atender ao tipo de textoda proposta escolhida.

    1. A PROVA DE REDAO 2004

  • 7/21/2019 1fasee

    5/55

    5

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    galerias [de lojas] com um X em ta crepe, deixando um bilhete em cada uma: Oque est dentro ca, o que est fora se expande. Em 1980, o grupo, em maisuma ao noturna, estendeu 100 metros de plstico vermelho pelos cruzamentose entradas no anel virio da Avenida Paulista com rua Consolao. O Detran,porm, desmontava essa e outras aes do grupo, que realizou uma srie de 18intervenes pela cidade at 1982, quando dissolveu-se.(Adaptado de Celso Gitahy,Grafteiros passo a passo rumo virada do milnio, Revista do Patrimnio Histrico, 2,n. 3, 1995, p. 30).

    3.O Mapa

    Olho o mapa da cidadeComo quem examinasse

    A anatomia de um corpo

    ( nem que fosse o meu corpo.)

    Sinto uma dor innitaDas ruas de Porto AlegreOnde jamais passarei.H tanta esquina esquisita,Tanta nuana de paredes,H tanta moa bonita,Nas ruas que no andei.(E h uma rua encantadaQue nem em sonhos sonhei...)

    Quando eu for, um dia desses,Poeira ou folha levadaNo vento da madrugada,Serei um pouco do nadaInvisvel, delicioso

    Que faz com que o teu arParea mais um olhar,Suave mistrio amoroso,Cidade de meu andar(Deste j to longo andar!)

    E talvez de meu repouso...

    (Mrio Quintana,Apontamentos de Histria Sobrenatural. Porto Alegre: Globo, IEL, 1976).

    4.As favelas se constituem atravs de um processo arquitetnico e urbansticosingular que compe uma esttica prpria, uma esttica das favelas. (...) Umbarraco de favela construdo pelo prprio morador, inicialmente, a partir defragmentos de materiais encontrados por acaso. A construo cotidiana econtinuamente inacabada. (...) O tecido urbano da favela malevel e exvel, o percurso que determina os caminhos. (...) As ruelas e becos so quasesempre extremamente estreitos e intrincados. Subir o morro uma experinciade percepo espacial singular, a partir das primeiras quebradas se descobre umritmo de andar que o prprio percurso impe. (Adaptado de Paola Berenstein Jacques,Esttica das favelas, em http://www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp078.asp).

  • 7/21/2019 1fasee

    6/55

    6

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    5.O dia-a-dia das sociedades gira em torno dos objetos xos, naturais ou criados,aos quais se aplica o trabalho. Fixos e uxos combinados caracterizam o modo devida de cada formao social. Fixos e uxos inuem-se mutuamente. A grandecidade um xo enorme, cruzado por uxos enormes (homens, produtos,mercadorias, ordens, idias), diversos em volume, intensidade, ritmo, durao esentido. Alis, as cidades se distinguem umas das outras por esses xos e uxos.(Milton Santos, Fixos e uxos cenrio para a cidade sem medo, em O pas distorcido. OBrasil, a globalizao e a cidadania. So Paulo: Publifolha, 2002).

    6. Cidades globais so aquelas que concentram percia e conhecimento emservios ligados globalizao, independente do tamanho de sua populao. (...)Megacidade outra categoria dos estudos urbanos. As megacidades so reasurbanas com mais de 10 milhes de habitantes. (...) Algumas so megacidades e

    cidades globais, simultaneamente, como Nova York e So Paulo. (...) As cidadesmdias so outra categoria de classicao das cidades, com populao entre 50mil e 800 mil habitantes. Abaixo de 50 mil so as pequenas cidades, ideal utpicode moradia feliz no imaginrio de milhares de pessoas. (Maria da Glria Gohn, Ofuturo das cidades, em www.lite.fae.unicamp.br/revista/art03.htm).

    7. Se, por hiptese absurda, pudssemos levantar e traduzir gracamente osentido da cidade resultante da experincia inconsciente de cada habitante edepois sobrepusssemos por transparncia todos esses grcos, obteramos umaimagem muito semelhante de uma pintura de Jackson Pollock, por volta de1950: uma espcie de mapa imenso, formado de linhas e pontos coloridos, umemaranhado inextrincvel de sinais, de traados aparentemente arbitrrios, delamentos tortuosos, embaraados, que mil vezes se cruzam, se interrompem,

    recomeam e, depois de estranhas voltas, retornam ao ponto de onde partiram.(Giulio Carlo Argan, Histria da arte como histria da cidade. Trad. Pier Luigi Cabra. SoPaulo: Martins Fontes, 1995, p. 231).

    Jackson Pollock, Silver over Black

    8.A heterogeneidade de freqentadores dosshopping centersvem se ampliandoe ntida numa cidade como So Paulo, uma vez que estes, outrora destinadossomente a grupos com alto poder aquisitivo, vm abarcando, em sua expansopor outras regies, grupos que antes no faziam parte da clientela usual. A idiade um espao elitizado vai sendo substituda pela de um espao interclasses.Alm disso, uma centralidade ldica sobrepe-se centralidade do consumo,sobretudo na esfera do lazer: especialmente aos ns de semana, osshopping centerstransformam-se em cenrios, onde ocorrem encontros, paqueras, derivas, cio,exibio, tdio, passeio, consumo simblico. Tornam-se uma espcie de praainterbairros que organiza a convivncia, nem sempre amena, de grupos e redessociais, sobretudo jovens, de diversos locais da cidade. (Adaptado de Heitor Frgoli

    Jr., Os Shoppingsde So Paulo e a trama do urbano: um olhar antropolgico, em SilvanaMaria Pitaudi e Heitor Frgoli Jr. (orgs.),Shopping Centers espao, cultura e modernidadenas cidades brasileiras.So Paulo: Editora Unesp, s/d, p. 78).

  • 7/21/2019 1fasee

    7/55

    7

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    9.O tombamento de espaos como terreiros de candombl, stios remanescentesde quilombos, vilas operrias, edicaes tpicas de migrantes e outros dessaordem, isto , ligados ao modo de vida (moradia, trabalho, religio) de grupossociais e/ou etnicamente diferenciados j no causa muita estranheza: apesarde ainda pouco comum, a incluso de itens como esses na lista do patrimniocultural ocial mostra a presena de outros valores que ampliam os critriostradicionais imperantes nos rgos de preservao. Em 1994 ocorreu, entretanto,um tombamento em So Paulo que de certa maneira se diferencia at mesmo dosacima citados: trata-se do Parque do Povo, uma rea de 150.000 m2, localizadaem regio nobre e das mais valorizadas da cidade. Dividida em vrios campos defutebol de terra, ocupada por times conhecidos como de vrzea. (Adaptadode Jos Guilherme Cantor Magnani e Naira Morgado, Futebol de vrzea tambm patrimnio, Revista do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional, n. 24, 1996, p. 175).

    10. Na Rocinha no h quem no respeite o Doutor (cirurgio aposentadoWaldir Jazbik, 75 anos). Morador h 19 anos da maior favela da zona sul do Rio deJaneiro, ele sabe que pode caminhar pelas ruas de l sem medo, mesmo morandoem uma habitao fora dos padres locais. Sua casa, em estilo colonial, ca numterreno com mais de 10.000 m2. (...) Meus amigos da high societydiziam queeu era maluco. Eu poderia ter escolhido uma casa num condomnio fechado aquiperto, mas preferi vir para c. (...) S vim para c porque quero viver a vida queeu mereo viver. (Adaptado de Antonio Gois e Gabriela Wolthers, Mdico busca vidatranqila na Rocinha, Folha de S.Paulo, 17 de agosto de 2003, p. C4).

    PROPOSTA A

    Trabalhe sua dissertao a partir do seguinte recorte temtico:

    A cidade o lugar da vida, espao fsico no qual acontecem encontros,negociaes, tenses, num dinamismo permanente de criao e transformao.

    Instrues: Discuta a cidade como um espao mltiplo; Argumente em favorde uma viso dinmica dessa multiplicidade; Explore os argumentos para mostrar que a cidade um espao que se conguraa partir de relaes diversas.

    PROPOSTA B

    Trabalhe sua narrativa a partir do seguinte recorte temtico:

    Hoje, mais do que nunca, podemos armar que a cidade no dorme. Alm defreqentarem bares, clubes, cinemas e bailes, h um crescente nmero de pessoasque circulam noite pela cidade, fsica ou virtualmente, trabalhando, consumindo,estudando, divertindo-se.

    Instrues: Imagine a histria de um(a) personagem que encontre um grupo que vivenciaa noite e, identicando-se com ele, passe a ver a cidade a partir de uma novaperspectiva; Narre o encontro, o processo de descoberta e a transformao que o(a)personagem experimentou;

    Sua histria pode ser narrada em primeiraou em terceira pessoa.

  • 7/21/2019 1fasee

    8/55

    8

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    PROPOSTA CTrabalhe suacarta a partir do seguinte recorte temtico:

    As denies do que patrimnio histrico tm mudado, incorporando mbitose aspectos que ampliam o alcance do conceito e, com isso, o raio de ao dalegislao. Fala-se em patrimnio edicado, mas tambm em patrimnio afetivo.Tudo o que relevante para determinada comunidade pode ser consideradopatrimnio.

    Instrues: Escolha um bem urbano, material ou no, que voc considere relevante paraser preservado em sua cidade; Argumente em favorda preservao desse bem;

    Dirija a carta a uma pessoa que, na sua opinio, pode vir a se tornar um aliadona luta pelo tombamento desse bem.

    2. A COLETNEAA coletnea da prova de 2004 abordou o tema geral da prova da primeira fase(Cidades), que foi recortado (da o termo recorte temtico) de maneira distintaem cada uma das trs propostas(ou temas, em provas anteriores).Mantendo a concepo de que a prova de redao do Vestibular da Unicamp uma prova de leitura e escrita, denimos, diferentemente dos anos anteriores,uma coletnea nicapara as trs propostas de trabalho, fazendo dela o lugarde entrada da prova de redao, o elemento desencadeador da relao leitura/escrita, no sentido de levar o candidato a re-elaborar sua leitura (da coletnea) noprocesso de escrita do texto. Com uma coletnea nica, pudemos reorganizar arelao entre as trs propostas, de modo que os vrios excertos pudessem ser lidosde maneiras diversas e no pr-estabelecidas, dependendo da proposta escolhidapelo candidato. Com essa mudana, visamos tambm alcanar um equilbriomaior de leitura entre as trs propostas, no havendo excertos exclusivos paraqualquer uma delas.Buscamos ainda, com a coletnea nica, um equilbrio entre a leitura quedenominamos de instantnea - aquela feita no momento da realizao da prova- e a experincia de leitura prvia do candidato. Em outras palavras, a coletneatem o papel desencadeador na relao do autor com seu projeto de texto,valorizando sua experincia prvia de vida, leitura e reexo. essa experinciaque deve ser mobilizada a partir da leitura da coletnea.Por concebermos a leitura como um processo de construo de sentidos,

    procuramos evitar fazer com que a coletnea fosse lida como um roteiro - e queo foco dessa leitura fosse a recuperao de contedos e de informaes, citadas ecoladas no texto do candidato. Assim, a coletnea no pensada como um roteirointerpretativo, mas como um conjunto de possibilidades diversas de abordagemda prpria complexidade do tema, com o qual, supunha-se, o candidato j tivessetido algum contato. Alm disso, a coletnea no dene uma hierarquia entre osexcertos, que podem ser aproveitados de diferentes maneiras, conforme o modode cada candidato mobilizar sua leitura da coletnea (sempre a partir de suaexperincia como leitor e autor de textos), em funo de seu projeto de texto.Seguindo a tradio do vestibular da Unicamp, os excertos so de naturezadiversa. Havia, na Coletnea 2004, alguns excertos claramente conceituais,expondo vises sistemticas sobre a cidade, outros de natureza artstica, contendoelaboraes subjetivas em torno do tema, e outros ainda de teor descritivo,apresentando casos concretos de experincia urbana.

    Ainda ao produzir a coletnea, procuramos evitar a polarizao de idias, quelevaria o candidato a uma tomada de posio sobre opinies dicotmicas, parano correr o risco de reduzir a produo da redao a um preenchimento deexpectativas j pressupostas. Em outras palavras, a coletnea foi concebida

  • 7/21/2019 1fasee

    9/55

    9

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    para permitir que as contradies inerentes cidade se manifestassem, sem seresolverem em dicotomias demarcadas e cristalizadas tais como, por exemplo,periferia versuscentro, pobres versusricos, cultura popular versuserudita, etc., quemuitas vezes servem apenas como frmula fcil. Isso no signica, evidentemente,que o candidato estava impedido de formular contrastes ou confrontos; o que seesperava era a elaborao pessoal do candidato, reconhecendo e movimentando-se em um panorama de questes complexas.A coletnea, assim estruturada, foi introduzida por um texto de apresentaoque, na prova de 2004, forneceu ao candidato a perspectiva da cidade comoum lugar signicativo da experincia humana e, por isso, objeto de reexomultidisciplinar. Com essa apresentao, a banca examinadora pretendeusinalizar a complexidade do tema e evitar reducionismos: idias estereotipadas,abordagens-clich ou textos prontos, tais como a reduo da cidade ao problemada violncia, da pobreza, do trnsito catico, da falta de planejamento, etc.

    3. AS PROPOSTASComo j dissemos acima, cada proposta consistiu num recorte do tema geral ea cada uma delas correspondeu a um conjunto de instrues que determinava,tanto a especicidade da abordagem em relao ao tema, quanto a especicidadedo tipo de texto que se esperava que fosse produzido. Essas instrues foramdestacadas no interior de um box sinalizando que seriam cobradas na correo.Destacamos aqui a necessidade da construo de argumentos no textodissertativo, da construo da voz narrativa no texto de co e da construo deuma argumentao mediada por uma interlocuo slida na carta.

    3.1 A PROPOSTA A: DISSERTAO

    As instrues da dissertao procuraram evitar que a proposta fosse apresentadaatravs de frases ttulo, de paradoxos, interrogaes, que pudessem levar a umfechamento pr-determinado e conclusivo do tema e a uma leitura politicamentecorreta do recorte temtico, abrindo um leque praticamente innito depossibilidades de apropriao do tema pelo candidato. Dessa forma, foi solicitadodo candidato que discutisse, argumentasse e explorasse argumentos em favor deuma viso dinmica da cidade como um espao mltiplo, sem, no entanto, pr-estabelecer o que dene tal dinamismo, tal multiplicidade e quais argumentosdeveriam ser mobilizados.Em funo da apresentao que precede a coletnea e da prpria natureza dosexcertos que a compem, a banca esperava que o candidato percebesse que nodeveria tratar o recorte temtico daproposta Ade forma redutora. Isto signicaque a cidade no poderia ser tomada como mero aglomerado fsico, nem comocenrio catico, oposto fantasia idlica do campo, tampouco como um palco

    esttico de problemas insolveis. Evidentemente, esperava-se do candidato umolhar crtico sobre o recorte proposto capacidade de identicao das partes, deanlise das relaes e de interpretao dos sentidos.Pensar sobre dinamismo e multiplicidade implicava tratar o espao (ruas, bairros,esttuas, muros, edicaes, limites, jurisdies, etc.) a partir da presenahumana, que, individual ou coletivamente, o transforma e re-signica. Essapresena humana apropria-se do espao urbano mediante atividades prossionais,familiares, de lazer, etc. e de modos variados (fsica, artstica, afetiva, simblica,etc.).As instrues especicavam algumas exigncias objetivas para a dissertao:1) Discutir a cidade enquanto um espao heterogneo;2) Trabalhar argumentos que mostrassem que esse espao heterogneo dinmico (espao-movimento);3) Explorar esses argumentos na direo da estreita relao entre a presenahumana e o espao fsico (a vida na cidade), de que resulta o dinamismo(permanente criao e transformao).

  • 7/21/2019 1fasee

    10/55

    10

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    3.2 A PROPOSTA B: NARRATIVAAs instrues da narrao procuraram estimular a inventividade dos candidatos,evitando que a proposta casse presa a um nmero grande de requisitos pontuais.Foi na tentativa de evitar uma realizao tcnica e engessada dos processosnarrativos, que se instruiu o candidato sobre os elementos de composiosem, no entanto, predenir a maneira como eles deveriam ser estruturados edesenvolvidos. Ou seja, foi solicitado ao candidato que imaginasse e narrasseuma experincia noturna, em que estivessem envolvidos um encontro e umatransformao, sem, no entanto, xar uma voz narrativa e determinar qualexperincia deveria ser narrada.Do mesmo modo que naproposta A, esperava-se que o candidato levasse emconta a complexidade do recorte temtico e considerasse a cidade como umlugar signicativo da experincia humana, espao que est sendo pensado, nosexcertos oferecidos, como lugar de apropriao humana. O candidato encontrava

    na coletnea exemplos de vivncias e de re-signicaes do espao urbano, tantono plano fsico quanto no simblico.As instrues especicavam algumas exigncias objetivas para a narrativa:1. A personagem deveria passar por uma experincia no perodo noturno;2. Essa experincia deveria se dar a partir de um encontro dela com um grupo depessoas que j vivencia a noite;3. Desse encontro resultaria uma transformao no modo como a personagemvivencia a cidade.O texto poderia ser narrado em primeira ou terceira pessoa. Esperava-se que ocandidato, alm de optar por um dos focos narrativos e mant-lo adequadamente,demonstrasse a relevncia de sua escolha.

    3.3 A PROPOSTA C: CARTA ARGUMENTATIVA

    As instrues da carta procuraram criar um espao de comunicao interpessoal emque o candidato no casse preso a lugares-comuns tanto em relao ao recortetemtico, quanto em relao interlocuo mobilizada para dar consistnciaargumentativa ao texto. Para desfazer o lugar da interlocuo como um lugarde preenchimento de marcas formais (prezado senhor, atenciosamente, etc),instrumos o candidato que a carta deveria ser dirigida a algum especicamente,sem, no entanto, pr-estabelecer o nome do interlocutor nem quais argumentosdeveriam ser mobilizados. Ou seja, foi solicitado do candidato que escrevesseum texto em que a interlocuo era central e a defesa de uma causa tambm;nesse caso, o candidato deveria construir a imagem desse interlocutor deforma condizente com a sua escolha do bem urbano a ser preservado e dosargumentos mobilizados. Estabeleceu-se, atravs das instrues da carta, umaindissociabilidade entre a construo e desenvolvimento de argumentos e aconstruo e desenvolvimento da interlocuo.

    Tambm aqui, ao redigir a carta, esperava-se que o candidato considerasse acomplexidade apresentada na coletnea e nas formulaes da prova de redao.Nesse caso concreto, h um texto preliminar que mostra que o processo detombamento de um bem relevante para uma determinada comunidade implica aconsiderao de uma vasta rede de interesses e sentidos e no apenas de pensar opatrimnio como sinnimo necessrio de edicaes antigas, monumentos, obrasde arte. A idia de preservao, como o recorte temtico prope, no alcanaapenas o patrimnio material ou histrico, mas tambm o afetivo e o intangvel,tudo dependendo da signicao estabelecida pelas relaes com o espao.A escolha do bem cuja preservao ser defendida depende em grande parteda anlise dessa complexidade e da considerao do interesse coletivo envolvido(grupo social, comunidade, bairro, parquia, etc.), levando em conta a construocoletiva de memria.As instrues determinavam um conjunto de procedimentos:1. A escolha de um bem urbano que merecesse ser preservado;2. A identicao de um possvel aliado na luta pela preservao do bem;3. A argumentao que justicasse o tombamento daquele bem, tramada esustentada por meio de uma interlocuo bem construda.

  • 7/21/2019 1fasee

    11/55

    11

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    4. COMENTRIOS SOBRE ALGUMAS REDAESDiscutimos, a seguir, algumas redaes de nveis de desempenho diversos, combase nos critrios utilizados na correo.

    4.1. PROPOSTA A

    EXEMPLOS DE REDAES ACIMA DA MDIA

    Exemplo1

    O uido urbano

    Em razo da rapidez e ecincia dos meios de comunicao e transportes da ps-modernidade, o homem tem estado a par de todas as notcias e acontecimentosdos pases do mundo e, com passos largos, tem podido manifestar-se em prol deseus interesses e ideologia, de forma a relegar segunda pgina a importncia dacidade em que vive. A humanidade vem caminhando pelos bairros e avenidas comolhos grandiloqentes, perseguindo objetivos globais, sem perceber, no entanto,que a cidade em que se encontra algo muito mais amplo e histrico que suacegueira corriqueira costuma imaginar trata-se de um microcosmo de todas asrelaes mundiais sob a pincelada do povo e sua vivncia regional.Numa cidade como So Paulo, relativamente jovem no que tange colonizao, possvel vericar desde as razes da vinda dos europeus, africanos e asiticosat os recentes avanos tecnolgicos e industriais. Num breve passeio pela zonacentral, v-se o sincretismo cultural, tnico, artstico e religioso, cuja transmutao continua e perceptvel: uma pea barroca facilmente combinada com

    computadores; um prato tipicamente japons adaptado com feijo e pastis.De maneira exclusiva, costura-se todo o universo que constitui o presente e opassado, sendo ele udo e suscetvel a novas interpretaes e impresses.Nesse sentido, a cidade constri-se a partir de constantes chegadas e partidasde indivduos que marcam nela sua memria, seu conhecimento acadmico epragmtico e, especialmente, suas utopias. bastante comum, por exemplo,encontrarmos em cidades interioranas a situao em que as pessoas vivem ata faixa dos vinte anos numa determinada regio e, aps tal idade, mudam-separa reas metropolitanas, onde adquirem formao superior e qualicaoprossional, retornando, mais tarde para, seus pontos de origem a m deexercerem a atividade para a qual se especializaram. Trata-se, portanto, de umuxo migratrio bastante benco em mbito cultural, social e econmico, bemcomo retrata um dos componentes responsveis pelo dinamismo urbano.Da mesma forma, o uir da cidade tambm pode ser traduzido pela contoro

    do espao fsico, cuja modelao se d de acordo com as necessidades imediatase retrata as relaes sociais: numa ruela de um morro possvel detectar desdeas preocupaes da losoa quanto da medicina e da engenharia. Se por umlado a excluso (ou a mera no-incluso) potente, por outro a ajuda mtua e a

  • 7/21/2019 1fasee

    12/55

    12

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    solidariedade so gritantes, o que signica que a cidade feita de dispositivos queanulam e compensam uns aos outros concomitantemente.Tambm relevante lembrar que o ncleo urbano, ao passo que tradicionalmentereconhecido pelas realizaes de sua elite econmica e cultural, tem incrustadonas mincias de suas esquinas e praas o folclore, as danas populares e acriatividade prpria de um coletivo que no possui time, cor ou credo denidos;trata-se de um povo sem hierarquia e multicromado, cuja vivacidade transcende avida propriamente dita e materializa-se em pinturas e mosaicos nos metrs e nosviadutos. A cidade, assim, uma mescla de nomes, datas e estatuetas com umamassa amorfa perfeitamente caracterizada pelo coletivo de sonhos e histria; o ambiente das relaes humanas, do desenrolar da economia, da educao, dasade, do aprendizado.No se pode, por conseguinte, desprezar a importncia desse microcosmo dahumanidade, visto que ao mesmo tempo que ele repete circunstncias e atritos

    sociais e polticos de outrora dos tempos do Imprio Romano, em que asprimeiras cidades foram construdas , inova a expresso do cerne humano, sejaatravs da ambivalncia de um terreno que agrega uma favela e uma mansocontguas, seja atravs da constante migrao de um espao a outro. importanteque o ncleo urbano seja visto de forma holstica, como algo plural e dinmico,visto congurado a partir de diferentes indivduos, os quais carregam consigouma bagagem cultural singular e passvel de sincretismo.

    COMENTRIOS

    Apesar de apresentar alguns problemas, sobretudo em relao a encadeamentoscoesivos e consistncia argumentativa contnua do decorrer do texto, o autor deO uido urbano apresenta um bom projeto de texto, absolutamente construdoa partir da proposta do recorte temtico, movimentando-se com desenvolturaentre diferentes pontos de entrada de leitura desencadeadores da coletnea, ques ganham dinamismo e conseqncia, porque so trabalhados atravs de umaexperincia prvia de leitura.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicampresumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: o autor trabalha o recorte temtico e articula idias a ele vinculadas. Faz umbom aproveitamento dos elementos selecionados (transita entre os vrios planos particular/geral, concreto/abstrato, etc), sustentando seu projeto de texto. Hmarcas claras de apropriao temtica no processo de autoria, ou seja, explorabem algumas das possveis relaes suscitadas pela proposta, o que demonstrareexo anterior que permite ao autor perceber a complexidade do tema, e trat-lo sob diferentes aspectos.

    Coletnea: h integrao, com encadeamento de elementos mobilizados a partirda leitura de excertos que compem a coletnea no texto do autor. Esse encade-amento sustenta o projeto de texto.

    Tipo de texto: H constituio de argumentos atravs de uma articulao dasformulaes, o que indica domnio do movimento argumentativo, ou seja, hdesdobramento dos argumentos em uma direo bem denida, garantida pelaprogresso dinmica, mesmo que em alguns momentos essa progresso sejaprejudicada por alguns truncamentos coesivos/argumentativos.

    Coerncia: No h inconsistncias internas, embora os elementos do texto aindano sustentem plenamente, ao longo de todo o texto, o conjunto possvel formu-lado no interior da dissertao.

    Coeso: No h comprometimento da leitura. Embora o uso dos recursos coesivosapresente falhas, estas no chegam a impedir a unidade na estruturao sinttico-semntica do texto.

    Modalidade: Mesmo apresentando alguns problemas em termos de imprecisesde algumas expresses, domina com segurana o padro normativo da escrita eapresenta um conjunto lexical amplo e desenvolto.

  • 7/21/2019 1fasee

    13/55

    13

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Exemplo 2

    Cidade: o encontro das diferenas

    As sociedades mostram seu constante grau de aprimoramento tcnico e socialatravs da maneira como se organizam e mantm relaes mltiplas no espaofsico no qual se instalam. O Renascimento urbano do sculo XV na Europa,deagrado pela crise do sistema feudal, emblemtico por ter sido resultado deuma nova realidade econmica e social, j que a recente dinmica do comrcioe a ascenso social de uma nova classe a burguesia demandavam uma novaestruturao da arcaica organizao poltico-administrativas dos feudos. Naatualidade, o que se observa o mais alto grau de adensamento urbano dascidades mundiais, que vem apresentando complexas Redes Urbanas, as quais

    so denominadas diferentemente segundo a inuncia que exercem. Diantedisso, torna-se necessria a analise desse novo espao mltiplo em constantetransformao.Esse novo mapa urbano pode ser analisado e comparado em duas perspectivas.Uma delas seria com relao s inuncias endgenas que aliaram as relaessociais de uma cidade, as quais criam um cenrio mltiplo. Sobre isso o gegrafoMilton Santos j analisava ao propor a existncia de uma dinmica urbanainuenciada pelo que chamou de xos e uxos, j que no espao fsico deobjetos naturais ou criados o xo aplica-se o uxo, que se caracteriza pela parteviva e ativa das cidades: os homens e as relaes polticas e econmicas.Sob um outro aspecto, o das cidades como um local de inuncias exgenas, tm-se as relaes comerciais, poltico-econmicas entre as diferentes sociedades, oque cria uma dinmica ativa de idias e inuncias. Vale lembrar aqui, porm, quealgo de novo tempera esse tipo de inuncia na nova realidade da globalizao;

    j que, se antes as cidades dependiam para isso da sua localizao geogrca como no caso da antiga Atenas, cuja posio no s a fez progredir no planodas idias, como tambm economicamente -, na nova realidade esse fator j nose faz to fundamental, haja visto o aprimoramento tecnolgico que promove asupresso das barreiras fsicas em prol de um contato mais profundo e ecaz entreas diversas cidades. Exemplo disso o alto nvel de complexidade de algumascidades, elevando-as categoria de cidades globais pelo elevado grau de impactoque possuem diante de outras. baseada nesses diferentes tipos de inuncia que uma cidade moderna temrealizada sua estruturao fsica no espao. Acrescentando-se a isso o componentetnico-cultural, capaz de promover uma abrangente diversidade norteadora dasrelaes sociais e da estruturao do espao urbano. Quanto a isso, vale ressaltar aexistncia de uma mudana fsica das cidades com a expanso das favelas urbanas,as quais abrigam um sexto da populao mundial atual, segundo dado recente.Esse espao singular revela-se transformador das relaes sociais, j que promovea desigualdade socioeconmica categoria de segregao fsica. nesse contextoque se insere o lado oposto dos shopping centers como local de acesso restrito auma minoria abastada, realidade essa que vem sendo negada pela disseminao

  • 7/21/2019 1fasee

    14/55

    14

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    desse espao a outras regies da cidade, abrangendo diferentes classes sociais.No entanto, a segregao fsica ainda no pode ser totalmente refutada, seja pelacrescente disseminao de condomnios fechados de alto padro pela cidade, sejapela criao do mundo paralelo e excludo das favelas, chegando-se at a falarem uma esttica das favelas. Portanto, a anlise do meio urbano modernoenquanto se mostra favorvel a um intercmbio cada vez maior de diferentesculturas atravs do progresso tecnolgico que nelas impera, alm de permitir amultiplicidade das relaes sociais, tambm se revela capaz de criar divergnciase disparidades sociais, criando um caldo frtil para nutrir a intolerncia e o diosocial graas s diferenas que o espao urbano permite coexistir.

    COMENTRIOS

    Assim como a redao anterior, esta apresenta um bom projeto, trabalhado no

    interior das diversas possibilidades trazidas pelo recorte temtico proposto. Apesarde apresentar alguns problemas coesivos/argumentativos pontuais na trama argu-mentativa, sua unidade textual garantida. Diferentemente do primeiro texto, arelao do autor com a coletnea um pouco menos desenvolta, no deixando,entretanto, de demonstrar que o autor de fato se apropria de alguns elementos ar-ticulando-os realmente ao seu projeto de texto, sem encaixes postios, mostrandoque esses elementos so trabalhados a partir de uma experincia prvia de leiturae formulao escrita do candidato, o que garante que a coletnea no que res-trita a um exerccio de leitura instantnea sem conseqncia.

    Pensando em termos dos seis critrios que balizam a correo da redao noVestibular da Unicamp, poderamos dizer que somente em relao modalidadenossos comentrios diferem dos j feitos ao primeiro texto. Nesse critrio, o textodo candidato, alm de apresentar pequenos problemas em relao ao padro

    normativo da escrita, demonstra um conjunto lexical bom (porm no amplo edesenvolto), com poucas imprecises.

    EXEMPLO DE REDAO ABAIXO DA MDIA

    A cidade no para

    Hoje, as pessoas so divididas e at recebem uma classicao partindo dascidades onde moramMas ao analisar a vida das pessoas de uma cidade, que se pode notar adiversidade das pessoas que nelas se habitam, no somente se tratando daquesto de serem ricos ou pobres, mas sim de como vivem, no que crem, o que

    fazem nas horas vagas por exemplo, revelando a multiplicidade do espao dentrodas cidades.Desde o empresrio que vive no tumultuado mundo dos negcios e procura sedistrair indo aos shoppings, teatros, com a familia nos nais de semana, at o

  • 7/21/2019 1fasee

    15/55

    15

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    morador de uma favela que batalha por um emprego e tenta sobreviver com opouco que tem, e que mesmo assim, arruma tempo para jogar uma partida defutebol com os amigos. Ambos moradores de uma mesma cidade agitada comopor exemplo So Paulo.H cidades que se destacam pelos seus dias tumultuado, repletos de xos e uxos,mas h tambm cidades que se destacam pelas lindas paisagens que a naturezaproporciona, tornando-se uma cidade turstica, e visitadas por outras culturas deoutras cidades, formando uma mistura de culturas e ocasionando transformaesculturaisEnquanto a vida passa as cidades no param de se desenvolver, e as pessoas noparam de criar novas idias para seu desenvolvimento e transformao.

    COMENTRIOS

    A idia do primeiro pargrafo muito interessante: uma etiquetagem que se pro-duz na memria social que liga as pessoas s cidades em que moram. Porm, essadireo argumentativa no desdobrada no texto do candidato. Ela contrapos-ta, atravs do segundo pargrafo, heterogeneidade das cidades. Haveria a umjogo muito interessante a ser explorado no sentido de contrapor (e a a conjunoadversativa mas, que inicia o segundo pargrafo, ganharia sentido) as imagenscristalizadas na memria social e histrica que etiquetam sentidos nas pessoas enas cidades heterogeneidade marcante desses espaos citadinos.

    O segundo pargrafo tambm muito interessante. Apesar de no ser antecedidopor uma formulao que o sustente, mostra que a diversidade/multiplicidade deuma cidade no se d somente sob o aspecto scio-econmico (lugar-comumtratado pela mdia em geral), mas no modo como se vive a cidade.

    No terceiro pargrafo, o candidato mantm a diviso do modo de se viver a ci-

    dade subsumido a uma diviso econmica, incluindo, o que interessante, umadescrio de diferentes modos de ocupao do espao em termos de lazer. En-tretanto, no h desenvolvimento no sentido de mostrar a dinamicidade dessesdiferentes modos de ocupao, nem tambm, o que era central nas instrues daproposta A, no sentido de trabalhar a relao entre os modos de ocupao daspessoas e a construo/transformao desses espaos. Isto , no h nenhumaforma de tratamento, mesmo que tangencial, da relao entre o espao fsico e oshomens que nele vivem.

    No quarto pargrafo, ca clara uma relao de colagem com a coletnea, o queinterfere consideravelmente no texto do candidato, j que elementos da coletneaentram no texto de modo automtico, numa tentativa de mero preenchimento,sem articulao com um possvel projeto de texto. Em outras palavras, no h mar-cas de apropriao daquilo que est sendo dito. Se nos trs primeiros pargrafos,mesmo que de modo ainda frgil, havia indcios de um projeto de texto que no

    chegava a se formular, nos dois ltimos pargrafos v-se esse projeto ruir funda-mentalmente por dois motivos:

    1) Falta de articulao dos elementos da coletnea com o modo de abordar pos-sveis trabalhos com o recorte temtico;

    2) Finalizao rpida e no sustentada que o candidato d ao seu texto, que re-sponde a um modelo engessado do que seja fazer uma dissertao.

    Em suma, o candidato responde imagem que faz da banca e imagem que fazda imagem de texto dissertativo ideal para a banca. Esse um problema recor-rente nas redaes do Vestibular Unicamp que precisa ser trabalhado no espaoda sala de aula.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicampresumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: As marcas de apropriao temtica no processo de autoria so frgeis, ouseja, o tema apresentado de forma supercial. Mas, apesar de apresentar umtratamento simplicado do tema, h tentativa de articulao de idias a ele vincu-ladas, o que indica alguma reexo anterior.

  • 7/21/2019 1fasee

    16/55

    16

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Coletnea: Embora haja alguma integrao dos elementos dos excertos quecompem a coletnea no texto do candidato, ela frgil. Essa fragilidade deve-sea uma integrao apenas pontual desses elementos no texto do candidato.

    Tipo de texto dissertativo: A redao do candidato apresenta-se como uma listade comentrios que no chegam a constituir argumentos, ou seja, as formulaesno esto articuladas de modo a denir uma direo.

    Coerncia: Tratada sob o aspecto da consistncia textual, diramos que, no textodo candidato, o modo de tecer essa consistncia frgil, interferindo na sustenta-o do texto como conjunto possvel.

    Coeso: O uso de seus recursos frgil e produz estruturaes sinttico-semnti-cas apenas localizadas, produzindo um comprometimento da leitura.

    Modalidade: H ocorrncias, sobretudo, de problemas de concordncia, pronomi-nalizao de verbo e regncia. O texto marca-se pela presena de um conjunto

    lexical razovel, com algumas impropriedades (informalidade, coloquialismo,inadequao).

    EXEMPLO DE REDAO ANULADA EM TEMA

    A importncia do shopping center

    Os shopping centers so importantes para que haja um aumento na convivnciaentre as diversas classes sociais. O nmero de freqentadores dos shoppingcenters vem aumentando cada vez mais.

    Antigamente o nmero de freqentadores de shopping centers era bem menor,pois era destinado a classe social com maior poder aquisitivo, deixando de fora asclasses sociais com menor poder aquisitivo.Os shopping centers eram um espao eletizado, uma centralidade de consumo,por isso eram bem menos freqentados e no havia uma convivncia entre asclasses sociais.Hoje, os shopping centers se tornaram um espao interclasses, onde deixaramde ser uma centralidade de consumo, para se tornar um cenrio de encontros,paqueras, passeio, consumo simblico e outras coisas. Por isso os shoppingcenters so importantes para que haja uma convivncia entre os diversos grupose redes sociais.

  • 7/21/2019 1fasee

    17/55

    17

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    COMENTRIOSO recorte temtico denido pela proposta A solicitava que o candidato discutissea cidade como espao mltiplo, argumentando na direo de uma viso dinmicadessa multiplicidade.

    Esta redao no atende ao recorte solicitado uma vez que ela transforma emtema um elemento da coletnea o shopping center desviando o foco da pro-posta. Nesse sentido, no se pode negar o uso da coletnea, embora este seja umuso redutor, que parafraseia de maneira circular o excerto n 8 nos trs primeirospargrafos e, no ltimo, praticamente reproduz a formulao do excerto.

    4.2. PROPOSTA B

    EXEMPLOS DE REDAES ACIMA DA MDIA

    Exemplo1

    As paredes do escritrio onde Andr trabalhava eram foscas. Entre pedaos detinta cinza que, cuidadosamente, delas se desprendiam, percebia-se uma janelaque recebia a poeira vinda da Avenida Paulista. Em frente a ela permanecia elesentado como quem espera por uma conduo que s chegaria muito mais tarde.Os olhos, cansados, avermelhados, xos, prendiam-se em ver, partcula a partcula,as peas da sujeira que o vento se encarregava de trazer e fazer repousar sobresua pele. Mesmo imerso no tdio que chegara junto com esta chuva seca, suamente constitua-se de milhares de pensamentos e expectativas restauradoras.Sonhos, planos e verdades que, conforme o desnimo pesava-lhe sobre a cabea,

    tomavam mais forma e nitidez. Andr ansiava pela mudana. Queria o ar que nofosse o que invadia o cmodo do escritrio. Queria perder a saudade que tinhado que no conhecia.Com um movimento brusco, embebido das vontades que amontoavam-se-lhe nospensamentos, Andr levantou-se de sua cadeira e, prometendo a si mesmo a fugado que o sufocava, saiu sem rumo para a rua. O brilho do sol, intenso e incmodo,ofendeu-o os olhos. Quis voltar, mas seus desejos o impediam. Ento, mesmo quevendo-se desorientado, aguardava o sinal para poder atravessar a rua. Percebeuque as pessoas sua volta tinham um sorriso irnico e exato estampado no rosto,fato que causou-lhe estranheza. Julgou tal percepo como resultado dos raiosde sol que ainda mereciam suas palavras de indignao. O semforo abriu paraos pedestres.As pessoas que estavam a seu lado olharam-se mais uma vez e, com um movimentocombinado, sacaram seus sapatos e os batiam no cho riscado de branco. Era umaash mob. Andr foi tomado novamente pelo anseio da mudana e o impulso ofez imitar o gesto. Sorria com uma sinceridade que h tempos no experimentava,e depositou ali, ao bater o calado contra o cho, toda a poeira, fumaa do tdioque se prendia sobre ele.

  • 7/21/2019 1fasee

    18/55

    18

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    No perdendo o contato com as pessoas que conheceu na mobilizao, aquele diaera apenas o primeiro de outros que fariam dele uma pessoa exatamente comoimploravam suas expectativas. Fazia parte, agora, de um grupo que, como ele,sentia a vontade de mudar, ou ao menos questionar o que a realidade apontava. E,tendo a diverso noturna como nica obrigao, Andr era um homem realizadoe satisfeito.A cidade vista com os novos amigos, iluminada pela lua, apresentava a ele umanova alegria. Via uma cor oposta que a parede do escritrio lhe impunha, e searrependia de no ter percebido o que agora aprendia com seus companheiros.A liberdade dentro da noite de So Paulo era forte e edicante. Cada praa,poste, rua tinha uma lio a ensinar, as esttuas tinham outros rostos, contavamhistrias, e cada palavra pichada nos muros signicavam algo.A vida, naqueles dias, tivera outro valor a Andr, que buscava a mesma felicidadea que aspira qualquer humano. Extraiu da vida paulistana das noites a diverso,

    absoluta e nita, os vcios. O amor liberdade que s no se pode sobrepor necessidade de sobreviver. brio, tendo dormido sozinho em uma praa pblicaonde passara observando as estrelas por cima dos galhos da rvore, acordou demanh quando ouviu os lamentos de um mendigo. E se lembrou que na prximasegunda-feira ainda teria que trabalhar. Levantou-se vagarosamente e caminhouat sua casa, onde no entrava desde que entrou para o grupo. No pensouem despedida, esquecera-se de sentir saudades, e, enquanto escutava os lentospassos, imaginava o seu escritrio pintado de azul.

    COMENTRIOS

    Nesta redao, o candidato narra em terceira pessoa a experincia de Andr, quedescobre uma nova alegria de viver ao participar de uma manifestao de fashmobna Avenida Paulista, local onde cava seu escritrio de trabalho. A participa-o espontnea da personagem na manifestao de rua justica-se, no texto, pelarotina tediosa em que vivia, da mesma forma com que sua vivncia noturna aolado dos amigos que conheceu na mobilizao explica a nova percepo da cidadee do lugar de trabalho.

    Nota-se que o candidato trabalha bem o recorte temtico e atende s instruesda proposta. Aproveita os elementos selecionados na coletnea re-signicando-os, de modo a sustentar seu projeto de texto. A voz narrativa introduz e articula asinformaes numa direo clara, organizando o enredo com propriedade.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicampresumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: O texto traz marcas claras de apropriao temtica no processo de autoria,ou seja, explora bem as possveis relaes suscitadas na proposta, o que indicareexo anterior que permite ao autor dominar a complexidade do tema.

    Coletnea: H integrao, com encadeamento ao longo do texto, dos elementosdos excertos que compem a coletnea no texto do autor. Esse encadeamentosustenta o projeto de texto. A presena desses elementos confere dinamismoao texto em seu conjunto, demonstrando que o autor tem domnio sobre a suaconduo.

    Tipo de texto narrativo: A voz narrativa, alm de denida, introduz e articula compropriedade todos os elementos descritivos numa direo narrativa clara.

    Coerncia: Entendida sob o aspecto da consistncia textual, os elementos internossustentam de forma consistente o texto enquanto conjunto possvel.

    Coeso: A estruturao sinttico-semntica bem articulada pelos recursos coesi-vos. A leitura uida e envolvente.

    Modalidade: O candidato domina o padro normativo da lngua escrita e apresen-

    ta um conjunto lexical amplo e desenvolto, com poucas ocorrncias imprprias.

  • 7/21/2019 1fasee

    19/55

    19

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Exemplo 2

    Cidade oculta na madrugada

    Os ps, da mesma forma que sua cabea, latejavam doloridos aprisionadas nassosticadas prises a que eram submetidos: saltos altos italianos e um penteadode duzentos reais moda da ltima estao. Mais do que o cansao oculto pelamaquiagem feita com esmero seu rosto ansiava exprimir o desnimo e o tdio queoutro evento como aquele lhe causava, o que inexoravelmente no era permitido.Convenes sociais impingiam um sorriso estanque e a previsvel alegria. Fechavaas portas de sua galeria de arte, aps outra exposio pautada em comentriosintelectuais e decorada pelo brilho de jias legtimas questionando-se o que erafeito daquela jovem que fora, to entusiasta e absolutamente fascinada pelo

    misterioso mundo das cores, formas e contrastes que descobria na faculdade deBelas Artes. Era naquele tempo uma pequena cidade esta que escolhera paramorar. Trinta anos corridos que zeram de si uma renomada artista, e de suacidade um catico e impessoal mundo que no mais reconhecia ao sobrep-lo aqueles casares cheios de sutis toques de arte que representavam em suamemria o espao em que optara por viver.Piscava em neon quinze minutos para a meia-noite. Caminhando em direo asua casa, notou um grupo de jovens rindo alto e bebendo em garrafas de vinho,numa praa distncia de uma quadra. Tinham latas de tintas nas mos e estavamsobre um antigo monumento da cidade. Talvez a madrugada estrelada e quieta,ou a nostalgia das luzes de mercrio da praa, ou ainda o mais provvel que eraseu fastio com a vida... algo destes a fez aproximar-se do grupo, no sem medo.Imaginava serem vndalos pichadores, mas qual no foi sua surpresa ao descobrirtratarem-se de um j noticiado bando de jovens que a tempos realizavam pelas

    noites inusitadas aes, a m de chamar a ateno da imprensa e clamar cuidadopara trechos antigos da cidade. Escreviam poesias no cho. Lia-se em vermelho:Que grite de dor um monumento no atropelo do viaduto sombra do mais cinzaesquecimento. De incio estranharam a presena de uma mulher to elegante,mas um breve dilogo os puseram vontade.Estava fascinada. E no apenas pela beleza dos versos, mas tambm pela da praae das formas do monumento, a tantos anos em seu caminho, mas nunca destaforma em seus olhos. Pediu aos rapazes, quase implorando-lhes que a deixassemseguir com eles naquela madrugada. Em pouco tempo viu-se sem seu penteadoe seus saltos, em um coreto da dcada de trinta, embriagada de vinho baratoexperimentando traos de guache em uma simples folha de cartolina com dizeresde protesto em metforas juvenis. Era como se criasse sua Gioconda, tamanho oprazer que sentia. Passeou por antigas galerias de lojas e reparou pela primeira vezem seus azulejos. Visitou a estao ferroviria e contemplou afrescos deteriorados

    como a tempos no contemplava uma tela em qualquer parede.A certa altura, quando ouviu as quatro badaladas do sino da matriz notou quedescobria algo: a cidade. No aquela cidade de homens de terno, de construesbarulhentas, de festas glamourosas. Denitivamente no a mesma cidade de

  • 7/21/2019 1fasee

    20/55

    20

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    trnsito intenso, de aglomeraes nas caladas, de ritmo acelerado. Descobria, madrugada com aqueles jovens, uma cidade que podia parar para ver, com fosseuma obra de arte exposta. Percebia seu corpo de cimento e pedra e sua alma deluzes e sombras. Sentia perfumes de suas praas e prdios antigos, notava seusamplos espaos xos. Subitamente notou a ausncia. A cidade se fazia bela pelaausncia de seu uxo. Sentia-se penetrando nas veias desse imenso organismourbano, mas como que estivesse este em repouso, com batimentos calmos eespaados. Aquele jorro de carro, sons, pessoas, luzes dava lugar a uma paz emque a contemplao era permitida.Foi tomada da jovialidade daqueles rapazes que lhe mostraram uma cidadeesquecida, cheia de arte e de romantismo. Viu-se penetrada de uma poesia escritasob uma malha de avenidas duras. Banhou-se de lembranas acumuladas desdeo dia em que chegara de trem aquele lugar e viu pela primeira vez os afrescos daestao. Admirou a lua emoldurada pela janela de um antigo casaro abandonado.

    Embriagou-se da cidade. Desnudou-se de seu vestido caro e provavelmente fezamor com algum daqueles rapazes em algum lugar belo e antigo sufocado entrealtos e modernos arranha-cus.Acordou como de costume com o barulho eletrnico de um despertador quaseem compasso com as buzinas das ruas. Foi janela e olhou os prdios em redor. Acidade parecia-lhe mais catica do que nunca. Teve vontade de chorar.

    COMENTRIOS

    Nesta redao, o candidato narra em terceira pessoa o encontro noturno de umamulher elegante, proprietria de uma galeria de arte, com um grupo de jovensque fazem intervenes na cidade, a m de chamar a ateno da imprensa.

    A adeso da protagonista s aes do grupo, durante aquela noite, antecedida

    de um longo pargrafo de apresentao em que o narrador, ao mesmo tempoem que introduz sicamente a personagem, traz luz seus questionamentos,sugerindo insatisfao com o trabalho, a cidade e a sociedade. Assim, o envolvi-mento dela com os jovens desconhecidos e o processo de redescoberta da cidadeencontram motivao real na comparao entre as obras expostas nas galeriasde arte e a arte das ruas, que inclui edicaes, esculturas, poesias e a prpriamovimentao humana.

    Nota-se que o candidato trabalha o recorte temtico de forma abrangente earticula noes a ele associadas. Aproveita bem os elementos selecionados na co-letnea re-signicando-os, de modo a sustentar seu projeto de texto. Assim comono texto anterior, a voz narrativa introduz e articula as informaes numa direoclara, organizando o enredo com propriedade.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicamp,

    resumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:Tema: H marcas claras de apropriao temtica no processo de autoria, ou seja, ocandidato explora bem as possveis relaes suscitadas na proposta, o que indicareexo anterior madura que permite ao autor dominar a complexidade do temae trat-lo de forma dinmica.

    Coletnea: H integrao, com encadeamento ao longo do texto, dos elementosdos excertos que compem a coletnea no texto do autor. Esse encadeamentosustenta o projeto de texto. A presena desses elementos confere dinamismoao texto em seu conjunto, demonstrando que o autor tem domnio sobre a suaconduo.

    Tipo de texto: A voz narrativa, alm de denida, introduz e articula com proprie-dade todos os elementos descritivos numa direo narrativa clara. O candidatodemonstra domnio sobre o jogo narrativo, controlando a tenso e o ritmo do

    texto.Coerncia: Entendida sob o aspecto da consistncia textual, os elementos internossustentam de forma consistente o texto enquanto conjunto possvel, tornandosingular a integrao entre a forma da narrativa e o contedo narrado.

  • 7/21/2019 1fasee

    21/55

    21

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Coeso: A estruturao sinttico-semntica bem articulada pelos recursos coesi-vos. A leitura uida e envolvente.

    Modalidade: O candidato domina o padro normativo da lngua escrita e apre-senta um conjunto lexical amplo e desenvolto, sem impropriedades.

    EXEMPLO DE REDAO ABAIXO DA MDIA

    A noite na cidade grande.

    De cabea baixa, andava Caico, garoto pobre que veio para So Paulo, iludidocom o sonho de vencer na cidade, sonho esse que logo percebeu que no

    conseguiria realizar. Foi quando levantou a cabea e comeou a notar o que acidade tinha a oferecer, observou atentamente aquele lugar agitado, onde s sevira carros, pessoas esquisitas mutiladas com piercings, cabelos pintados, prdiosenormes, o tempo passa rpido na cidade grande, pensou Caico.Caico ento decidiu conhecer a noite na cidade grande, se juntou a um grupo quesaia durante a noite paulista para observar a vida noturna paulistana.Foi neste momento que Caico descobriu que a cidade grande no para, coisa deque ele j ouviu falar e no acreditava. Viu shoppings abertos, academias lotadas,o futebol correndo solto em plena madrugada, bares, tentativas de assalto, prontosocorro sempre lotados.O que pior viu uma cidade em que o lixo jogado nas ruas, ruas sem iluminao,traco de drogas sem ser combatido, pessoas passaram por eles com medodesconadas, ou seja, uma grande cidade, com culturas, costume, lazer e muitadiverso e ao mesmo tempo muita violncia e insegurana.

    Caico pensou que seria melhor voltar para seu lugar de origem, como vrios amigosque vieram atrs de emprego fcil e descobriram que a cidade grande diverti, mastambm destroe a vida de quem veio com pouco e acaba voltando com menosainda. Caico pegou o Itapemirim com destino a Serra Talhada torcendo para queo progresso desenfreado no tenha chegado a sua regio.

    COMENTRIOS

    Nesta redao, o candidato narra em terceira pessoa a experincia de um garotopobre chamado Caico que, como tantos outros migrantes, vem a So Paulo embusca de um ideal de prosperidade, logo desfeito. A desiluso do protagonistacom o futuro prspero na cidade grande narrada a partir de sua deciso deobservar atentamente os lugares. Tendo passado por uma srie de descobertas,

    conclui pela volta cidade de origem, onde os males do progresso ainda nochegaram.

    Com relao ao recorte temtico, nota-se que o candidato desenvolveu apenasparcialmente as instrues da proposta. No h, por exemplo, informaes sobre

  • 7/21/2019 1fasee

    22/55

    22

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    o encontro do garoto com o grupo que vivencia a cidade noite, nem menesao modo como ele se identica com este grupo. Sendo assim, a transformaosofrida pela personagem no resulta do contato com o grupo, mas das constata-es relativas a uma viso negativa que o candidato tenta transmitir sobre a vidanas metrpoles.

    Quanto ao aproveitamento da coletnea, nota-se que o candidato pouco utilizouas possibilidades oferecidas pelos excertos, atendo-se sobretudo, ao enunciadoda proposta que chama a ateno para as atividades contnuas nas cidades. Hno texto do candidato um uso fragmentrio de elementos dos excertos, formandouma espcie de painel urbano genrico e desligado do tempo e da ao do pro-tagonista, cujo papel se limita ao de observador. Nesse papel, o protagonista noganha consistncia e se transforma em mero instrumento de transmisso dasidias do narrador.

    Em conseqncia disso, o texto narrativo se aproxima do dissertativo, pois noexplora sucientemente os elementos ccionais.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicamp,resumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: O texto mostra que as marcas de apropriao temtica no processo de auto-ria da narrativa so frgeis. Embora no se perca, o candidato trabalha o tema deforma supercial, justapondo idias atribudas, neste caso, ao personagem, semque estas tenham sido motivadas por uma vivncia objetiva na cidade.

    Coletnea: Embora haja alguma integrao dos elementos dos excertos quecompem a coletnea no texto do candidato, ela frgil. Essa se deve a umaintegrao apenas pontual dos elementos no texto do candidato.

    Tipo de texto narrativo: A voz narrativa est denida em terceira pessoa e h ten-tativa de organizar o enredo, mas as informaes se articulam de modo frgil e os

    elementos descritivos esto dispostos de modo precrio.Coerncia: Entendida sob o aspecto da consistncia textual, o modo de construiressa consistncia frgil, interferindo na sustentao do texto enquanto conjuntopossvel.

    Coeso: Embora o uso dos recursos coesivos apresente falhas, estas no chegama impedir a unidade na estruturao sinttico-semntica do texto. A leitura noca comprometida.

    Modalidade: H ocorrncias principalmente de pontuao, acentuao e orto-graa. O texto apresenta um conjunto lexical razovel, com algumas improprie-dades.

    EXEMPLO DE REDAO ANULADA EM TEMA E COLETNEA

  • 7/21/2019 1fasee

    23/55

    23

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Joo algum

    Joo era um professor do ensino pblico na cidade de So Paulo, dava aulas todosos dias em uma escola prximo da Avenida Paulista, aulas de matemtica comoseus alunos costumavam dizer. Estava com seus 50 anos prximo de se aposentar,e dizia que no via a ora de por a mo no seu fundo de garantia para comprar umsitiozinho no interior pra l poder descansar em paz. Era uma pessoa simples, deombros curvados, no s pela idade, mas tambm devido presso, que ele dizia:um dia destes ainda morro com tanta presso sobre meus ombros, exercidapela sociedade.Mas ento quando faltava poucos meses para se aposentar, eis que houvemudanas no pais, um novo presidente havia sido eleito, e o povo dizia que erahora de mudana, que o pais agora iria decolar, etc. Joo sabia que no era bemassim, mas no sabia o que estava por vir.

    Um belo dia este novo governante achou melhor fechar as escolas, pois dizia queno havia melhor sistema de ensino do que a vida, e que com a Internet todospoderiam ter acesso educao, pesquisa e a qualquer informao que quisesse.Foi um escndalo. O povo queria tirar o tal governante fora, de qualquermaneira. Mas o problema que o novo presidente era militar e tinha o apoio dosmilitares e de suas armas.O pais viu-se em meio uma ditadura militar, e Joo viu-se na rua da amargura.

    COMENTRIOS

    Com relao ao recorte temtico, nota-se que o texto foge totalmente propostaapresentada, pois narra a decepo sofrida por um professor da rede pblica deensino, demitido s vsperas da aposentadoria, em decorrncia da mudana de

    regime poltico. O candidato no seguiu as instrues e desenvolveu a narrativaem torno da problemtica prossional da personagem. Alm disso, nota-se queembora haja meno cidade de So Paulo, esta no faz parte integrante danarrativa, nem est descrita em termos de ambiente noturno. No h encontrode qualquer tipo (fsico, virtual, afetivo, visual, etc.) com um grupo que vivenciea noite e com o qual a personagem se identique. A transformao que afeta oprotagonista em sua atividade prossional de ordem poltica, no tendo efeitona percepo que ele tem da cidade.

    Quanto coletnea, pode-se armar que no h um aproveitamento mnimo, ano ser pelo fato de que o texto trata de um episdio ocorrido na cidade de SoPaulo.

  • 7/21/2019 1fasee

    24/55

    24

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    4.3. PROPOSTA C

    EXEMPLOS DE REDAES ACIMA DA MDIA

    Exemplo1

    Campinas, 23 de novembro de 2003

    Excelentssima Prefeita,

    Venho como el eleitor fazer uma singela solicitao, na certeza de queserei atendido, visto estar ao vosso alcance, e ser de vosso interesse o que pedirei,como se evidenciar no que segue. Sou morador do Jardim Santa Genebra. L nasci, l fui criado. Em meubairro, a trs quarteires de minha casa, h um grande terreno de esquina: umterreno de cho batido, palco de minha infncia. Ali meu pai me ensinou a soltarpipa; naquele pedao de cho batido z meu primeiro gol, freqentei minhaprimeira quermesse, beijei minha primeira namorada. Ali convivi 43 anos com osdemais habitantes, no s do Genebra, mas tambm dos bairros circunvizinhos;z grandes amizades, que ainda hoje guardo. Ali, nos churrascos improvisados,surgiram idias que resultaram em Associaes de Moradores e at em enredosde escola de samba. Meu pai me contava, quando era vivo, que o at h poucos meses pontode encontro da regio era puro mato, cheio de ratos e entulho de construo.Foram meu pai e seus amigos os transformadores da rea: carpiram, colocaramtraves de futebol, mesas e bancos de cimento espalhados por um belo jardim.

    H trs meses uma sbita transformao, feita nossa revelia, ps abaixoe murou nossa pracinha. Nada pudemos fazer. O dono da propriedade surgiu derepente. Ficamos desnorteados... onde brincaro nossas crianas? Onde a peladade domingo? De freqentadores passamos a invasores. Ns, os mais velhos,chocados, sem reao. Nossos adolescentes, privados de referncia, partiram paraa depredao, pixando o muro que l foi erguido, quebrando as lajotas que oraocultam a histria de centenas de ns. Depois de trs meses, reunindo-nos ora numa ora noutra casa, algumteve a idia de comprarmos o terreno por meio das trs Associaes de Moradoresenvolvidas: a da Vila Cury, a do Genebra e a do Costa e Silva. Fomos falar com oproprietrio... Bem, o terreno era imenso, trs lotes em que cabia boa parte denossas vidas. O preo justo j seria alto, mas o valor pedido era impraticvel:R$ 450.000,00, 50% acima do valor de mercado. A bem da verdade, no

    havia interesse na venda. Aquele senhor pretendia construir ali um conjunto deestabelecimentos comerciais, para locao. Veja o que pode a especulao imobiliria! Destruir nosso ponto dereferncia, diluindo nossa comunidade; pois era ali, principalmente, que nossa rede

  • 7/21/2019 1fasee

    25/55

    25

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    social era diariamente tecida. Nossa praa, freqentavam tanto os ricos quandoos menos favorecidos, tanto os catlicos quanto os evanglicos, tanto bugrinosquanto ponte pretanos. Era o nosso lugar, seguro e agradvel, e zelvamos porele. Diante do que narrei, creio que a senhora j tenha uma idia de como nosajudar... O que solicito, em nome das comunidades envolvidas, a desapropriaodo terreno e posterior tombamento. E antes de a senhora pensar em verbascomunico, em nome das Associaes, que estamos dispostos a pagar de nossobolso todo o custo da desapropriao, esperando apenas que, pela mediao daPrefeitura, seja cobrado um preo justo, e negociadas condies de pagamentode acordo com nossas possibilidades. Pagamos de bom grado, cientes de que no um terreno o que compramos, mas nossa histria, nossas memrias, e o futuroharmonioso de trs grandes bairros to dispares, mas unidos no interesse desteresgate.

    Quanto ao tombamento, aps recuperada a praa, para salvaguardarnossas futuras geraes de possveis interesses polticos contrrios comunidade,porque doaremos a praa, comprada e recuperada, Prefeitura. Ressalto quetombar uma praa, um campinho de futebol e um jardim, no idia inusitada. Aidia, alis, nos surgiu quando soubemos que l na capital uns tantos campos devrzea foram tombados pelo valor afetivo que tinham para os paulistanos. Prefeita, peo urgncia na considerao desse pedido, pois a qualquermomento o proprietrio poder iniciar a construo de seu mesquinho prdio.Considere que nada custar aos cofres pblicos; pelo contrrio, a cidade ganhamais um patrimnio, um patrimnio afetivo, mais uma marca de sua identidade. senhora, minha gratido, certo, rearmo, de que serei atendido.

    De seu mui humilde eleitor,

    D.N.R.L,representante das Associaes de moradores dos Bairros Jardim Santa Genebra,Miguel Vicente Cury e Costa e Silva.

    COMENTRIOS

    J armamos que uma boa carta deve conseguir ter bem denida a imagem dequem a escreve e de quem a recebe, o que signica que a interlocuo propostapela carta deve ser particularizada, indo alm de um preenchimento formal epadro.

    Esta carta uma redao acima da mdia justamente pelo conjunto de detalhesque particularizam sua autoria. Vale observar os segundo e terceiro pargrafos,em que o autor da carta vai construindo um cenrio que distingue a singela

    solicitao anunciada no primeiro pargrafo e, inclusive, desfaz o sentido piegasdas expresses el eleitor e singela solicitao. O recorte temtico vai sendobem articulado num desenho interessante de uma situao que, embora nosendo incomum o conito entre a propriedade privada e a utilizao pblicade um terreno no qual se localizava a pracinha do bairro - adquire contornos deespecicidade que a tornam um bom argumento para uma carta endereada prefeita de Campinas.

    tambm interessante a maneira pela qual o autor apresenta a coletnea, fugindode citaes encaixadas ao longo da redao. No nono pargrafo da carta lemos:A idia, alis, nos surgiu quando soubemos que l na capital uns tantos camposde vrzea foram tombados pelo valor afetivo que tinham para os paulistanos.Uma referncia coletnea que mostra a capacidade de apropriao, pelo autorda carta, da leitura feita dos excertos propostos na prova. Uma questo impor-tante conseguir incorporar a leitura escrita, de forma a que esses dois proces-sos se inter-relacionem. Mesmo que nesta carta o autor no tivesse explicitado areferncia coletnea, podemos observar que o encaminhamento de sua argu-mentao e de seu relato vai fazendo ressoar pontos tambm de outros excertosalm do 9, como por exemplo o excerto 3, que traz uma relao simblico-afetiva

  • 7/21/2019 1fasee

    26/55

    26

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    com a cidade: Suave mistrio amoroso, Cidade de meu andar, que resume asexperincias vividas pelo autor da carta no segundo pargrafo um terrenode cho batido, palco da minha infncia. Ali meu pai me ensinou a soltar pipa;naquele pedao de cho batido z meu primeiro gol, freqentei minha primeiraquermesse, beijei minha primeira namorada. [...]. Tambm o excerto 7, em quelemos um emaranhado inextrincvel de sinais, de traados aparentemente arbi-trrios, [...] que mil vezes se cruzam, retomado na carta pela formulao eraali, principalmente, que nossa rede social era diariamente tecida. Ressaltamosque a relao entre leitura e escrita no precisa, e muitas vezes no deve, serpontual. O importante poder observar que o processo de escrita foi afetado peloprocesso de leitura.

    Um deslize cometido nesta redao o tempo verbal do sexto pargrafo, escritono passado. As questes ali enfocadas so presentes: o terreno imenso, ovalor impraticvel, no h interesse na venda, aquele senhor pretende

    construir.Ainda dois momentos de pieguice a serem desfeitos: salvaguardar nossas futurasgeraes e de seu mui humilde eleitor. Mas so pontos que no conjunto dotexto podem ser relevados, dadas as outras qualidades aqui discutidas.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicamp,resumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: O recorte temtico trabalhado de forma abrangente e as idias a ele vin-culadas so bem articuladas, o que congura consistncia no processo de autoria.H dinamismo no tratamento do tema.

    Coletnea: Nesta redao, observamos uma boa integrao da leitura dos excer-tos que compem a coletnea, com sustentao do projeto de texto.

    Tipo de texto: Esta redao apresenta uma slida interlocuo argumentativa e a

    convergncia das formulaes com as imagens que estabeleam a relao entrequem escreve e quem recebe a carta muito consistente, o que particulariza asolicitao apresentada.

    Coerncia: Os elementos internos sustentam consistentemente o texto enquantoconjunto possvel, tornando singular a integrao entre forma e contedo.

    Coeso: A estruturao sinttico-semntica desta redao est bem articulada, eh uidez na leitura.

    Modalidade: O conjunto lexical desta redao bom, h desenvoltura na sua uti-lizao, embora observemos a ocorrncia de expresses cristalizadas.

  • 7/21/2019 1fasee

    27/55

    27

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    Exemplo 2

    Querida Marta!

    Obrigada por ter me escrito, que to bom saber que nossos amigos no seesqueceram da gente. difcil, na nossa idade, largar tudo assim, sair da casa ondepassou a vida inteira. Pelo menos mantendo o contato com os amigos, mata umpouco a saudade.Queria te dar parabns. Como voc est se dando ao cargo? Dona Marta,presidente da Associao dos Moradores do Bairro... Sabe, quei muito feliz ao lerque voc foi eleita, pelo menos vai se preocupar com as coisas. No como aquelehomem que foi presidente quando eu morava por l ainda, como era mesmo onome dele? Acredita que eu o vi por aqui h umas semanas, com aquela secretriapelo brao...Mas ento... O meu neto, o Luisinho, o mais novo, veio me falando ontem dessascoisas de patrimnio histrico. Se bem que eu nunca fui muito entendida nisso,e esses jovens de hoje que me parece que adoram se fazer de inteligentes... Poisele me disse que deveriam tombar a pracinha l do bairro. Que eu vivia falandopara eles, ento... Estranhei a cidade est cheia de praas, tudo igual nossa...Ento o Luisinho foi me explicando, disse que a pracinha patrimnio afetivo dacomunidade, assim mesmo. Que tudo que importante para a populao podese tombado.Fiquei um bom tempo pensando nisso. E no que deveria mesmo? Que apracinha eu acho que o lugar mais importante do bairro. Se voc pegar qualquerpessoa que morou por l por um tempo, no desses que vem e vo, e pedir parafalar da vida, sempre acaba nela... Quem viveu no bairro desde criana, como agente, ento... A infncia, a juventude, o que havia de brincadeira, de namorar...Gente que est casada faz meio sculo e havia se conhecido na pracinha, como

    voc e o Jorge.Olha que deveriam tombar mesmo, talvez assim algum se preocuparia mais emcuidar de l. Que como est agora eu no sei, mas quando eu estava me mudandoera tudo s mato. Criava at bicho, ratos, um horror. At bandido se escondia l,lembra que a polcia falou quando assaltaram a casa do seu Cristovo, coitado...E nem tanto para os velhos, que a gente s memria mesmo, deveriam tombarpara as crianas. Porque olha como est agora, os pequenos brincando tudo pelasruas. S por um milagre que ainda no atropelaram ningum...Fiquei pensando nisso... E quando recebi a sua carta hoje de manh, e li que voctinha sido eleita Presidente da Associao dos Moradores, achei que deveria teescrever sobre isso. Algo to importante para o bairro, como era mesmo? Sim,patrimnio afetivo da comunidade. Quem sabe voc consegue fazer alguma coisapara que a pracinha seja tombada e preservada...Quanto ao resto, estamos todos bem aqui e espero que voc e todos os outros

    meus amigos de l do bairro tambm estejam. A Carol te manda beijos.

    Abraos,Ana do G.

  • 7/21/2019 1fasee

    28/55

    28

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    COMENTRIOSTambm esta redao acima da mdia apresenta uma interlocuo muito bemdenida, na qual as imagens de quem escreve e de quem recebe a carta vo sendoajustadas em torno de uma memria comum. Uma carta que traz bem dosada ainformalidade que caracteriza a amizade das duas interlocutoras e a preocupaoem situar o leitor frente histria de vida comum a ambas, histria da qual fazparte a pracinha que dever ser tombada e que constitui o principal argumentoda carta.

    bem elaborada a maneira pela qual a autora vai tornando familiar a noo depatrimnio histrico ao argumentar pelo tombamento da pracinha. Ela vaientrelaando sua argumentao com elementos particulares da sua vida e davida de sua interlocutora, o que permite que a pracinha seja signicada comopatrimnio afetivo da comunidade e, portanto, um patrimnio histrico a sertombado.

    Ao propor a pracinha como o patrimnio afetivo da comunidade a ser tom-bado, signicando-a como o espao de convivncia central do bairro, inclusive umespao no qual, por culpa do descuido, at bandido se escondia, a autora daredao faz ressoar a parte nal do excerto 8 e o excerto 9, nos quais lemos umaespcie de praa interbairros que organiza a convivncia, nem sempre amena,de grupos e redes sociais, e tambm o tombamento de espaos como terreirosde candombl, stios remanescentes de quilombos [...]. No quarto pargrafo daredao, a pracinha signicada como um grande xo por onde circulam tan-tos uxos (excerto 5): eu acho que o lugar mais importante do bairro. Se vocpegar qualquer pessoa que morou por l por um tempo, no desses que vm evo, e pedir para falar da vida, sempre acaba nela... Maneiras de fazer uso dacoletnea sem necessariamente citar trechos pontuais dos excertos.

    Em termos de recursos coesivos e padro normativo da escrita, esta redao apre-

    senta vrios deslizes que nos obrigam a avali-la como mediana. No entanto, nocmputo geral, podemos certamente consider-la um processo de autoria bas-tante interessante.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicamp,resumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: O recorte temtico trabalhado de forma abrangente e as idias a ele vin-culadas so bem articuladas, o que congura consistncia no processo de autoria.H dinamismo no tratamento do tema.

    Coletnea: Nesta redao, observamos a integrao da leitura dos excertos quecompem a coletnea, com sustentao do projeto de texto.

    Tipo de texto: Esta redao apresenta uma slida interlocuo argumentativa e aconvergncia das formulaes com as imagens que estabeleam a relao entrequem escreve e quem recebe a carta to consistente, que produz singularizaona relao entre o eu e o tu.

    Coerncia: Os elementos internos sustentam consistentemente o texto enquantoconjunto possvel, tornando singular a integrao entre forma e contedo.

    Coeso: Embora a estruturao sinttico-semntica desta redao apresente fal-has, estas no comprometem a uidez da leitura.

    Modalidade: O conjunto lexical desta redao bom, com a ocorrncia de impro-priedades no que se refere ao padro normativo da escrita.

  • 7/21/2019 1fasee

    29/55

    29

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    EXEMPLO DE REDAO ABAIXO DA MDIA

    So Paulo, 23 novembro 2003Caro Gustavo Liberato,

    Venho por meio desta apresentar a importncia da preservao do estdio defutebol Ccero Pompeu de Toledo, onde foram revelados diversos cones doesporte que o smbolo nacional brasileiro.Tomando como base a necessidade de enaltecer o nosso sentimento patriota,devemos conservar aquele que foi um dos beros dos cones do esporte que o nosso smbolo nacional, e que hoje, e antigamente j o zeram, representamnosso pas com garra. Analisando o fato de que por diversos motivos o estdiopossa deixar de existir, vemos a necessidade de passar os cuidados do mesmo aogoverno para que sejam tomadas as devidas precaues e ento sempre teremosesse patrimnio histrico que ser contemplado pelos nossos descendentes.Peo ento para que colabore e seja mais um aliado na luta para a preservaodeste, que poder um dia no existir mais.

    Grato,GTS

    COMENTRIOS

    Esta redao abaixo da mdia um bom exemplo do que podemos denominar umtrabalho de escrita e leitura de pouqussimo investimento por parte do candidato. sem dvida uma carta que ca restrita a um preenchimento formal da solicita-

    o trazida pelaproposta C da prova de redao, sem construir um processo deautoria minimamente particularizado. As imagens dos interlocutores envolvidosno so trabalhadas em momento algum. A carta, dirigida a Gustavo Liberato,nos faz lembrar do apresentador Gugu, cujo nome, se no nos falha a memria, Augusto Liberato. E mesmo que o apresentador tivesse sido corretamentenomeado, no se desfaz a necessidade de argumentar por essa escolha, menosbvia que a escolha, por exemplo, de guras do poder executivo e legislativo. sempre interessante denir a imagem da pessoa a quem a carta se dirige, e emalguns casos isso fundamental. Tambm a imagem de quem escreve a cartaca, nesta redao, absolutamente vazia, o que permite que ela seja assinada porqualquer outro indivduo. justamente nesse sentido que a carta se caracterizacomo uma carta indistinta, apenas um preenchimento formal da solicitao feita.O candidato escolheu um bem urbano o estdio de futebol Ccero Pompeu deToledo e argumentou em favor da preservao desse bem, sem quaisquer par-

    ticularizaes e referncias que contextualizem o leitor e expandam o argumentoapresentado: ser um bero dos cones do esporte que nosso smbolo nacional[...] e representam nosso pas com garra.

    Quando lemos analisando o fato de que por diversos motivos o estdio possa

  • 7/21/2019 1fasee

    30/55

    30

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    deixar de existir, vemos a necessidade de passar os cuidados do mesmo ao gov-erno para que sejam tomadas as devidas precaues [...], necessariamente nosperguntamos: Quais os diversos motivos que podem levar o estdio a deixar deexistir? Quais as devidas precaues a serem tomadas? Esse estdio deve ter prio-ridade em relao a outros? Boas oportunidades perdidas para um bom trabalhode escrita e leitura.

    E vemos que, em razo de no ter havido um investimento na escrita da carta,tambm a leitura ca apresentada de forma mnima e o uso da coletnea extrema-mente restrito. A escolha de um estdio de futebol apenas sintomatiza a leitura doexcerto 9. importante observar que o trabalho da escrita abre para o trabalho deleitura, assim como o contrrio.

    Em relao aos seis critrios balizadores da correo do Vestibular da Unicamp,resumiramos da seguinte forma a avaliao desta redao:

    Tema: As marcas de apropriao temtica no processo de autoria so bastantefrgeis, ou seja, o recorte temtico apresentado de forma banalizada e super-cial, com alguma tentativa de articulao de idias a ele vinculadas.

    Coletnea: No h integrao da leitura dos excertos que compem a coletneanesta redao.

    Tipo de texto: Nesta redao, as formulaes conguram um preenchimentoformal do padro carta, sem constituio de uma direo argumentativa e de ima-gens que estabeleam relao entre quem escreve e quem recebe a carta.

    Coerncia: H inconsistncias que fragilizam a sustentao deste texto comoconjunto possvel.

    Coeso: A estruturao sinttico-semntica desta redao no apresenta falhasformais, mas no pode ser denida como bem articulada.

    Modalidade: O conjunto lexical desta redao razovel, com a ocorrncia de

    algumas imprecises.

  • 7/21/2019 1fasee

    31/55

    31

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    EXEMPLO DE REDAO ANULADA EM TEMA E COLETNEA

    So Paulo 23 de novembro de 2003

    Ao Exmo Geraldo AlquemeGovernador de Estado de So Paulo.

    Prezado Governador

    Escrevo-lhe esta missiva para convenc-lo sobre os problemas que cercam o

    transito da cidade de So Paulo.Como morador dessa cidade, sinto-me no dever de questionar os muitos riscos edefeitos que o transito paulista apresenta.O elevado nmero de automveis, motos, e vns que congestionam cada vez maisas ruas e avenidas geram muitos acidentes, os quais acabam com vidas colaboramcom engarrafamentos e tornam o transito enfadonho, o que causa um grandeestrs entre os motoristas. Vejo, que tais fatores podem vir a prejudicar a economiado estado na medida que diminuem a ecincia do trabalhador, pois este j chegacansado ao trabalho devido as pssimas qualidades que o transito oferece.Penso tambm, nos problemas ecolgicos gerados pela elevada taxa de gscarbonico emitidas pelos meios de transportes, que agravam cada vez mais oefeito estufa.A meu ver governador Alqueme, acredito que a melhoria nos meios de transportescoletivos pblicos tornaria a vida do cidado paulista mais prspera, pois o

    transporte coletivo bem projetado para o contingente populacional de So Pauloreduziria o transito vergonhoso que assola tanto esse Estado.Acredito que investimentos no setor pblico de transportes e a melhor preservaodestes poderia acabar com o caos nas vias pblicas. Digo tambm que essa reformageraria mais empregos e poderia aumentar o nmero de pesquisas nesse campo,fator que estimularia a tecnologia em todo o pas atravs de recursos que possamdiminuir os gstos dos combustveis e conseqentemente preservar a Ecologia.Entrego-lhe esta idia e aguardo atenciosamente sua colaborao. Pesso quepense em articular esse projeto, visto que o transito catico no um defeitoapenas de So Paulo e sim de cidades do mundo inteiro.

    Respeitosamente, M.G.

  • 7/21/2019 1fasee

    32/55

    32

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    COMENTRIOSO recorte temtico denido na proposta C da prova de redao solicitava aocandidato escrever uma carta a algum que pudesse se tornar um aliado, argu-mentando em favor da preservao de um bem urbano, material ou no, consid-erado relevante para a cidade.

    Podemos dizer que a discusso proposta nesta redao atende ao tema geral daprova de primeira fase Cidade -, mas foge ao recorte do tema acima retomado.Convencer o governador sobre os problemas que cercam o trnsito da cidadede So Paulo um objetivo que desconsidera tanto a escolha do bem urbanoquanto a argumentao em favor da preservao desse bem.

    Tambm observamos a desconsiderao total dos excertos que compem acoletnea. A perspectiva de cidade apresentada nesta carta completamentenegativa e se restringe a reiterar os lugares comuns nos quais o trnsito sempre

    signicado: caos, congestionamento, m qualidade... Alm disso, o candidatoestabelece relaes bastante grosseiras, do ponto de vista argumentativo, entre otrnsito, a economia e a ecologia: prejuzo da economia do Estado pela diminu-io da ecincia do trabalhador; diminuio dos gastos dos combustveis econseqente preservao da Ecologia.

  • 7/21/2019 1fasee

    33/55

    33

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    MATEMTICAComo em anos anteriores, as duas questes de matemtica [questes 1 e 2] foramsimples, procurando avaliar a compreenso de textos e de dados; a capacidadede realizar clculos elementares e de interpretar esses clculos atravs de umaresposta objetiva. O uso de unidades e o desenvolvimento do raciocnio tambmso devidamente avaliados atravs de problemas contextualizados.

    A cidade de Campinas tem 1 milho de habitantes e estima-se que 4%de sua populao viva em domiclios inadequados.Supondo-se que, emmdia, cada domiclio tem 4 moradores, pergunta-se:

    a) Quantos domiclios com condies adequadas tem a cidade deCampinas?

    b)Se a populao da cidade crescer 10% nos prximos 10 anos, quantosdomiclios devero ser construdos por ano para que todos os habitantestenham uma moradia adequada ao nal desse perodo de 10 anos? Su-ponha ainda 4 moradores por domiclio, em mdia.

    RESPOSTA ESPERADA

    a) (2 pontos)

    1.000.000 hab / (4 moradores/domiclio) = 250.000 domiclios.

    96% de 250.000 = 240.000.

    Resposta: 240.000 domiclios com condies adequadas.

    b) (3 pontos)

    1.000.000 + 10% de um milho = 1.100.000.

    1.100.000 / 4 = 275.000 domiclios.

    Logo, tero que ser construdos 35.000 novos domiclios em 10 anos.

    Resposta: 3.500 domiclios por ano.

    EXEMPLO ACIMA DA MDIA

    QUESTO 1

  • 7/21/2019 1fasee

    34/55

    34

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    EXEMPLO ABAIXO DA MDIA

    COMENTRIOS

    O clculo de porcentagens e a compreenso desse assunto tm sido objeto de di-versas questes de matemtica da primeira fase do vestibular da Unicamp, ao lon-

    go dos anos. No caso desta questo, alm de avaliar os clculos e o entendimentodas respostas, a banca examinadora procurou dirigir a ateno dos candidatospara um problema social relevante, no somente na cidade de Campinas, masem quase todas as grandes cidades brasileiras. Notamos a diculdade de algunscandidatos na compreenso da proposta do item b. Mesmo assim, o resultado foiconsiderado satisfatrio, com mdia 3,07 na escala 0-5.

    Supondo que a rea mdia ocupada por uma pessoa em um comcio sejade 2.500 cm2, pergunta-se:

    a)Quantas pessoas podero se reunir em uma praa retangular que mede150 metros de comprimento por 50 metros de largura?

    b)Se 3/56 da populao de uma cidade lota a praa, qual , ento, apopulao da cidade ?

    RESPOSTA ESPERADA

    a) (2 pontos)

    150 m x 50 m = 7.500 m2.

    2.500 cm2= 50cm x 50cm = 0,5m x 0.5m = 0,25 m2.

    7.500 / 0,25 = 30.000

    Resposta: 30.000 pessoas.

    b) (3 pontos)

    3/56 30.000. Ento 1/56 10.000.

    56/56 560.000.

    Resposta: 560.000 habitantes.

    QUESTO 2

  • 7/21/2019 1fasee

    35/55

    35

    1 Fase

    Prova comentada Primeira Fase

    EXEMPLO ACIMA DA MDIA

    EXEMPLO ABAIXO DA MDIA

    COMENTRIOS

    Esta questo, envolvendo idias bsicas de geometria e fraes, procurou avaliar ouso correto de unidades, a percepo de dimenses e sua adequao realidadee