15º seminário nacional de história da ciência e da ... · 15º seminário nacional de história...
TRANSCRIPT
1
15º Seminário Nacional de História da Ciência e da Tecnologia
As relações entre o fenômeno espacial religioso e a pretensão de verdade do conhecimento científico na formação do subcampo da Geografia da Religião
Doutorando Diego Lopes da Silva1
A comunicação tem por base retratar as formas de relacionar o
conhecimento científico e o fenômeno religioso sob a ótica da geografia, nesta
categorização, utiliza-se como fundamento os pressupostos científicos de
objetividade e racionalidade que estão ligados ao processo de observação do
mundo, enquanto a subjetividade e o caráter emocional estão ligados aos
segmentos religiosos fundamentados sobre a tradição.
Considerando que tanto o modelo científico das ciências naturais quanto
o religioso trazem consigo uma pretensão de verdade, o confronto entre ciência
e religião poderia ser evitado se religião e ciência fossem consideradas como
esferas distintas da realidade com metodologias que pudessem ser justificadas
em seus próprios termos.
O teórico Ian Barbour na sua clássica obra Ways of Relating Science
and Religion2, ao retratar as diferentes formar de relacionar ciência e religião,
utiliza como fundamentos essenciais para sua classificação os pressupostos
científicos de objetividade e racionalidade que estão intrinsecamente ligados ao
processo de observação do mundo e dos seus habitantes, enquanto a
subjetividade e caráter emocional estão ligados aos segmentos religiosos que
tem como fundamento sua tradição.
Vale ressaltar que Barbour discorre na sua narrativa sobre quatro tipos
ideais para as relações entre conhecimento científico e a religião; conflito,
1 Doutorando em Geografia da Religião pelo Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade de Brasília (PPGGEA/UnB), Mestre em História Social com ênfase em Orientalismo pela mesma Instituição de ensino. A atual pesquisa desenvolvida tem como ênfase o conhecimento espaço-temporal da religião e cultura judaica e os seus símbolos de culto e tradições incorporadas do Oriente Antigo e resignificadas no processo de resistência cultural a dominação estrangeira. Atua como pesquisador nos seguintes temas: judaísmo helenístico, espaço sagrado da religião judaica na antiguidade, território sagrado do Templo, literatura apocalíptica e resistência cultural. E-mail para contato: [email protected] 2 BARBOUR, Ian. “Ways of Relating Science and Religion”. In Religion and Science - Historical and Contemporary Issues. London: SCM Press, 1998. Pp. 77-105.
2
diálogo, independência e integração, nesta comunicação se atentará as
relações conflituosos e de diálogo entre ciência e religião; e como este diálogo
permitiu o surgimento do subcampo da Geografia Cultural intitulado Geografia
da Religião que através da uso de metodologias científicas proporcionou uma
relação menos conflituosa para o entendimento do fenômeno religioso pela
lente hermenêutica da cientificidade geográfica.
No espectro da relação conflituosa entre ciência e religião, pode-se
apontar como os extremos; o materialismo científico e o literalismo bíblico,
respectivamente, observando que mesmo tecnicamente distantes, existem
características comuns entre essas escolas, tendo em vista o uso errôneo da
ciência, e a falta de entendimento da perspectiva social, humana e cultural do
conhecimento científico; enquanto o uso do termos ciência nos grupamentos
religioso é visto como algo antagônico a fé e a espiritualidade.
Observa-se que ambos movimentos desrespeitam os limites de atuação e
entendimento de suas respectivas disciplinas, este opinando a respeito de
assuntos científicos que estão além dos limites de compreensão da fé, e
aquele por buscar fazer cientificidade de conteúdos não científicos ou mesmo
usar um modelo de ciências naturais para estudar relações humanas e a
interação entre sagrado e profano que necessitaria de uma metodologia que
não limitasse o entendimento apenas ao campo da dedução, observação e
experimentação.
Aquilo que Karl Popper3 intitula como uma espécie de pseudociências
nos seus estudos por suas "teses" não possuírem uma "germe" para refutação
na sua teoria da falseabilidade; acaba sendo um campo importante de estudo,
já que a fé faz parte da natureza humana e assim como as relações sociais,
políticas e culturais também não possuem um modelo pré-estabelecido; e o seu
crivo científico pode ser dado por um método de análise que permita enxergar
3 Popper defende que a epistemologia seja identificada com teoria do método científico que formulem enunciados científicos que devem ser submetidos a prova a fim de auferir sua confiabilidade e sua "falseabilidade", isto é uma boa teoria do método deve ser submetida a inúmeras provas comprovar sua sustentação naquele período, tendo em vista na concepção Popperiana nenhum argumento científico seria eterno, e toda teoria seria conjectural e provisória, tendo em vista que no próprio bojo da ciência existe um germe para refutação.
3
as complexidades inerentes a análise sociocultural que possuem suas
contradições, logo existe parâmetros para possíveis refutações.
Vale ressaltar que no ponto de vista das ciências humanas as
abordagens de Popper são extremamente válidas; não sendo convenções que
se transformam em dogmas, mas verdades que podem ser refutadas ao longo
do tempo. As hipóteses podem ser revisitada e reformuladas para ser mais
resistentes as provas ou o "falseamento" de uma consequência da primeira
hipótese.
Sua abordagem mostra as diferenças entre a ciência e a lógica, tendo
em vista a preocupação metodológica na arquitetura da teia de fatores que
interligam um argumento científico, isto é as relações temáticas entre as regras
que tornam possível falar em uma teoria do método; mesmo em abordagens de
temas que não são exclusivamente científicos podem ser guiados por uma
metodologia de estudo científica que trará plausibilidade.
Retornando a análise quanto ao conflito entre religião e ciência um novo
ponto possível de polarização seria as apropriações de hipóteses científicas
por meio de teorias filosóficas, trazendo o problema do fundamentalismo
pseudocientífico, isto é, a transformação da ciência em religião. Do outro lado
poderia ocasionar uma transformação de religião em ciência quando se aborda
assuntos que não estão na ordem religiosa, embora sejam postos em debate
pela religião, por exemplo, a questão do status legal da teoria criacionista,
classificando-a como ciência4.
A adoção de um modelo que permitisse um diálogo a partir das novas
perspectivas de observar e entender o mundo oferecidas pela ciência,
provavelmente diminuiria de forma mais eficiente suas tensões com a religião,
oferecendo a ciência subsídios para debates teológicos e a
religião/espiritualidade maneiras de ser menos "dolosas" ao conhecimento
científico; questionando o "estatuto de verdade" imprimindo pelas duas esferas
4 Do mesmo modo que as interpretações alegóricas de passagens controversas da Bíblia vêm sendo oferecidas desde a Antiguidade, constata-se que os reformadores João Calvino e Martinho Lutero também seguiram, pelo menos no início, essa tradição, não menos verdadeira é a constatação que grupos fundamentalistas, especialmente nos EUA, mantêm até os dias de hoje uma fé inabalável na interpretação literal das Escrituras.
4
distintas existentes na sociedade, mas que podem dialogar e contribuir
significativamente para o entendimento e configuração do espaço humano.
Os problemas envolvendo o relacionamento entre a autoridade religiosa
e os assuntos relacionados à ciência já haviam sido expostos na Antiguidade
por aqueles que não encontravam nas Escrituras respostas satisfatórias para
suas dúvidas, o texto de Jó 38 mostra exatamente essas questões.
A resposta dada pelo próprio Deus mostra a incapacidade do homem em
entender fatos relativos ao seu mundo físico discorrendo sobre as leis naturais,
o desenvolvimento da vida humana e a reação do homem frente aos fatos
cotidianos, sendo assim diante da sua incapacidade em saber de eventos
tipicamente humano e presentes no seu cotidiano, jamais conseguirá entender
o conhecimento de Deus, outro texto que descreve essa situação em escala
diferente é o Testamento de Jó, um típico texto da literatura sapiencial judaica:
Por onde se divide o relâmpago, ou se difunde o vento leste sobre a terra? Quem abriu um canal para o aguaceiro e o caminho para o relâmpago e o trovão, para que chova em terras despovoadas, na estepe inabitada pelo homem, para que se sacie o deserto desolado e brote erva na estepe? Terá pai a chuva? Quem gera as gotas de orvalho? De que seio saiu o gelo? Quem deu à luz a geada do céu, quando as águas desaparecem, petrificando-se, e se torna compacta a superfície do abismo? Podes atar os laços da das Plêiades, ou desatar as cordas de Órion? Podes fazer sair a seu tempo a Coroa ou guiar a Ursa com seus filhos? Conheces as leis dos céus, determinas o seu mapa na terra? Consegues elevar a voz até as nuvens, e a massa das águas te obedece”5 Baldas: ... E eu novamente te pergunto, por que nós vemos o sol nascendo no leste e se pondo no oeste, e quando acordamos no dia seguinte novamente encontramos o mesmo sol nascendo no leste? Jó: ... Quem somos nós para nos ocupar com os assuntos celestiais, sabendo que somos matéria e temos muito de pó e de cinzas? Assim, ouça o que te pergunto: tanto a água como os alimentos são engolidos pela boca e passam pela mesma garganta, mas são eliminados do nosso corpo de modo diferente. Quem os separa? Baldas: Eu não sei a resposta. Jó: Se és incapaz de entender o funcionamento de seu próprio corpo, como queres entender as coisas do céu?
5 Trecho do livro de Jó 38:24-34
5
Há uma clara correlação entre a impotência humana na compreensão
das leis naturais e a incapacidade de entender os princípios da justiça divina,
tão claramente manifestadas nos textos supracitados, permite assim tirar a
conclusão, que o homem, por não conseguir alcançar a sabedoria celestial,
deve se contentar apenas em temer ao seu Deus6.
No período intertestamentário (sécs. II a.C. - I d.C.) a literatura
apocalíptica traz consigo uma mudança fundamental nessa relação entre
homens e sua divindade, uma vez que se torna claro que é permitido ao
homem receber informações a respeito do mundo divino, não havendo mais
nenhuma razão para negar-lhes o acesso aos “segredos da natureza”, uma vez
que a existência humana não existe sem a presença dos eventos naturais.
Na literatura judaica referências a diversos fenômenos naturais podem
ser encontradas, por exemplo, em 4Ezra, temos uma exposição do mundo
natural ao homem, fato que não é compreendido na sua totalidade pela
existência humana:
Então o anjo que chamava Uriel, chamado para responder minhas questões, respondeu para mim o seguinte: "A sua compreensão é completamente falha em relação ao mundo físico, e você ainda acredita que conseguirá compreender o caminho do Altíssimo?"Então eu disse, "Sim, o meu senhor." E ele respondeu-me, "fui enviado para mostrar-lhe três problemas. Se conseguir responder ao menos uma dessas questões lhe revelarei o mundo a qual deseja ver; ensinando por que o coração humano é tão mau.” Então eu disse, “Fale meu Senhor”. E ele me disse, vá e pese para mim o peso do fogo, ou calcule a medida do vento, ou traga de volta para mim o dia anterior. E eu respondi, “Quem é dos nascidos de mulher que pode responder a tais questionamentos?”E ele me disse “Se eu tivesse perguntado quantas residências existem no coração do mar, ou quantas correntes estão no profundo mar, ou no firmamento, ou quantas são as portas de saída do inferno e de entrada no Paraíso? Provavelmente você teria me dito que nunca teria descido as profundezas e adentrado no inferno,e também nunca teria subido ao paraíso. Mas perguntei sobre vento, fogo e dia que estão presentes no seu cotidiano desde sua infância e não tem nenhuma resposta sobre isso. E ele me disse “Muito menos sua mente compreenderia os caminhos do Altíssimo? Como pode aquele desgastado pelo mundo corrupto compreender os desígnios do incorruptível.
6 GRUENWALD, Ithamar. Apocalyptic and Merkavah Mysticism. Leiden / Köln: E. J. Brill, 1980. p. 4.
6
Observa-se que mesmo alterando o enfoque, continuava claro ao leitor
que Deus era o único a conhecer as respostas corretas e que somente Yahweh
seria capaz de regular os fenômenos naturais. A crença que vontade divina não
seria a resposta para todos os questionamentos do homem só veio a ser
verdadeiramente desafiada a partir do séc. XV, quando o modelo heliocêntrico
desenvolvido por Copérnico deu início a novas maneiras de compreender os
fenômenos naturais.
Desde então as regulações metódicas pautadas na tradição e na
subjetividade da religião passaram a ser baseada na racionalidade e a
objetividade da ciência moderna, rompendo com o modelo religioso de
conceber os fenômenos naturais, e evocando o modelo de visão cientificista,
que é o preponderante até a contemporaneidade.
A partir do Renascimento cultural e científico o debate entre a ciência e
religião se torna mais acentuado, tendo no filósofo Bertrand Russell (1872-
1970) um dos observadores do debates acalorados entre ciência e religião.
Russell vê que a religiões possui um tripé estrutural fundamental
baseada em uma igreja una, um credo comum e um código de conduta
pessoal, cuja importância foi vital durante os séculos, embora alterando
relativamente cada um deles ao longo do tempo e do espaço.
Para Russell, o questionamento de um credo religioso pela ciência não
deve ser avaliado como a uma simples questão teórica, mas como uma
questão política e moral, com todas as consequências que essa colocação
acarreta - a diminuição da autoridade eclesiástica, no caso da primeira e um
relaxamento da moralidade, no da segunda7. Na visão de Russel o epicentro
do confronto entre religião e ciência está na configuração dos credos e sua
função reguladora da mentalidade humana.
Russell redigiu suas principais ideias em um pequeno volume8, onde
afirma que “entre a religião e a ciência houve um prolongado conflito, do qual,
até os últimos poucos anos, a ciência sempre se saiu vitoriosa”. Russell afirma
7 RUSSELL, Bertrand. Religion y Ciencia. Cidade do México: Fondo de Cultura Econômica, 2000. 8 RUSSELL, Bertrand. Op. cit. Pp. 9-10.
7
que o modelo desenvolvido por Copérnico representava a revitalização das
ações racionais humanas que passaram a ser protagonista dos fenômenos
naturais, uma teoria proposta por Aristarco de Samos9 há mais de 2.000 (dois
mil) anos, mostrando que os questionamentos acerca do deslocamento da
Terra (do centro para periferia do Sistema Solar), sofreu forte oposição da
igreja somente por diminuir a importância da divindade como controladora do
sistema e dos humanos, até então o centro da teologia cristã.
Não se constituiu em surpresa, portanto, a inclusão dos textos de
Copérnico - e daqueles que o seguiram, como Kepler e Galileu - no Index da
Igreja e a proibição da divulgação de suas teses até meados do século XIX.
Russell faz, contudo, questão de enfatizar que esse confronto não se
limitou apenas a Igreja Católica. Na sua visão a oposição não teria sido menor
nos países protestantes, mas a falta de uma Inquisição e os próprios
questionamentos dos reformistas teria impedido uma ação mais repressora da
Igreja e consequentemente, permitido um avanço maior da ciência "naturais"
naquelas regiões.
Bertrand Russell enfatiza a tese de conflito ao expor que a teologia
medievalista, que pretendia ser um sistema lógico imutável, não passava de
uma “ignorância tecnicamente organizada e que perpetuava erros antigos”10.
Manifestações de fenômenos naturais que não obedecessem às leis de
regularidade, como aparição de cometas ou erupções vulcânicas, maremotos,
abalos sísmicos, por exemplo, eram de difícil explicação para a mentalidade
medieval e invariavelmente atribuídas à vontade divina.
Logo, essas manifestações estiveram na linha de frente daquilo que foi
refutado pela ciência, chamada de “ignorância científica”, e constituíssem as
primeiras baixas quando foram questionadas pelo progressivo avanço das leis
naturais a partir do renascimento.
O progresso da ciência contra a mentalidade religiosa teria se
processado do mundo p, mais distante, para o mundo pp, mais próximo ao ser
9 Astrônomo de origem grega que viveu em Alexandria a maior parte de sua vida (310 a.C.-230 a.C.), autor Da Magnitude e da Distância do Sol e da Lua. 10 RUSSELL, Bertrand. Op. cit. P. 33.
8
humano. Kant e Laplace, foram os primeiros a elaborar uma teoria científica
que explicasse o desenvolvimento gradual do sistema solar, desafiando de
maneira frontal a tese aristotélica da imutabilidade do mundo supralunar11.
Ainda no século XVIII a crença que as modificações geológicas teriam
ocorrido em curto prazo foi duramente questionada por Buffon, o qual
argumentava que essas alterações não só seriam naturais como ainda
estariam se processando12 de forma lenta e gradual. Paulatinamente a teologia
foi se conformando com os dados levantados pela ciência, e no início do
período oitocentista já havia algum consenso entre Igreja e o campo científico a
respeito das novas concepções da astronomia e geologia.
Persistiam, no entanto, as dificuldades crescentes de explicação para a
diversidade biológica do mundo moderno, provocadas em parte pela
identificação de um grande número de espécies diferentes na América e na
Ásia, que colocava sob suspeita cada vez maior a tese teológica
diluviana.Entretanto, no campo biológico a Igreja sentia-se ainda confiante na
defesa de suas posições. A impressão existente nos meios científicos da época
era de que havia também nessa área algum tipo de “evolução”, sendo
respondida no ambiente religioso da Inglaterra no início do século XIX, por
meio de um entusiástico endosso às teorias teleológicas expostas por William
Paley (1743-1805).
Natural Theology or Evidences of the Existence and Attributes of the
Deity, Collected from the Appearances of Nature13, Paley, membro eclesiástico
da Igreja Anglicana, expressava a opinião que organismos biológicos poderiam
ser entendidos como mecanismos desenhados por um Ser Inteligente. A
metáfora com que dá início a sua obra é hoje considerada clássica14:
Suponhamos que ao cruzar um descampado, topasse com uma pedra, e que me perguntassem como a pedra viera dar ali; eu poderia bem responder que, tanto quanto sabia, ela devia estar ali desde sempre – e creio que não seria fácil acusar tal resposta de absurda. Mas suponhamos que eu tivesse
11 RUSSELL, Bertrand. Op. cit. P. 43. 12 Idem, P.45. 13 Teologia Natural: ou Evidências da Existência e Atributos de Deus, Coletadas a Partir das Aparências da Natureza. 14 PALEY, William. Apud DAWKINS, Richard. O Relojoeiro Cego. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. P. 22.
9
encontrado um relógio no chão, e me perguntassem como o relógio podia estar ali; desta feita eu dificilmente pensaria em responder que, tanto quanto sabia, o relógio devia estar ali desde sempre.
A inferência que se pode tirar é inevitável; as partes diferentes do relógio
foram montadas com o propósito de se movimentarem de modo a marcar
corretamente a passagem das horas, pois caso não fossem assim, as peças
não se movimentariam e o relógio não teria nenhuma utilidade. Da mesma
maneira, a conclusão que se pode chegar é óbvia; o relógio teve
necessariamente um criador que o planejou e montou de acordo com seu
propósito para servir da maneira certa, isto é, marcar as horas.
No caso dos organismos vivos - com suas incríveis capacidades de
mutação, adaptação e elevados graus de complexidade, são, no entanto, muito
mais complexos que os relógios. Os indícios da existência de um projeto de
tamanha magnitude seriam excelentes demais para serem ignorados e,
portanto, somente um projetista inteligente poderia tê-los criado, da mesma
forma que somente um relojoeiro experiente seria capaz de montar um relógio
de qualidade. Para o projeto de criação e desenvolvimento das espécies
teríamos um projetista, e este projetista seria Deus.
Compreensivelmente, a teoria da evolução das espécies de Darwin
(1809-1882) por meio da “sobrevivência do mais apto”, eliminava a tese de
uma criação divina provocando assim uma enorme ira na Igreja, e
constrangimento à teologia cristã, o que de certa forma perdura, em algumas
denominações fundamentalistas, especialmente nos EUA15.
Russel encontra um relativo equilíbrio na avaliação com relação aos
atritos entre religião e ciência, ideia não compartilhada por Richard Dawkins, o
qual contesta veementemente a teoria de um “projeto consciente16” para a
criação do mundo, alegando, de forma a não deixar dúvidas, que os únicos
projetistas (designers) da natureza são as forças da física, ainda que atuando
de forma muito especial.
15 RUSSELL, Bertrand. Op. cit.. P. 52. 16 DAWKINS, Richard. “Por que quase com certeza Deus não existe”. In Deus, um delírio. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
10
Darwin tinha uma grande consideração por Paley, acreditando, como
acreditava William, que os organismos não somente se adaptavam aos
ambientes mais diversos aos quais viviam, como também que suas estruturas
invariavelmente refletiam as funções que executavam ao longo de suas vidas.
Entretanto, diferentemente de Paley, que explicava as “evoluções” do
mundo natural pela intervenção do “Projetista Consciente-Benevolente”, a
teoria Darwiniana de evolução das espécies explicava aquele o mundo (dos
seres vivos) por meio de formulações contínuas do processo de seleção natural
que dispensava a interferência de um criador. A colocação de religião e ciência
em campos opostos, não representa, necessariamente, uma unanimidade de
crença nos meios científicos ou religiosos.
Um grande número de pesquisadores (filósofos, historiadores e
geógrafos) acreditam que alguma forma de diálogo entre elas poderia
representar uma melhor solução para aqueles conflitos, uma vez que o
verdadeiro dilema estaria em encontrar um espaço de acomodação (onde haja
um dialogo moderado) para ambas.
No contexto da ciência geográfica as relações de conflitos e diálogos
fazem parte da história do pensamento geográfico desde a sua gênese com um
objeto de estudo meramente físico (até o final do séc. XIX), até a
contemporaneidade quando temos uma imensidão de objetos materiais e até
imateriais que são visitados e analisados pela ciência geográfica.
As bases do conhecimento geográfico moderno são oriundas das
contribuições sistemáticas de Alexander von Humboldt17 (1769-1859) e Karl
Ritter18 (1779-1859) que buscam sistematizar o estudo das paisagens e
17 Alexander von Humboldt (1769-1859), mais conhecido como Barão de Humboldt, foi um geógrafo, naturalista e explorador alemão. Ele desenvolveu (e se especializou em) diversas áreas como a etnografia, botânica, geologia, mineralogia e a geografia, tendo lançado as bases destas ciências através da observação e descrição das paisagens através das suas expedições pela Europa, Américas e Ásia. Sua grande contribuição à comunidade científica está na sua obra clássica Kosmos, que é um compêndio do conhecimento científico acumulado até sua época. Observação e descrição era o modus operandi da geografia moderna que construiu as bases teóricas da nossa atual ciência geográfica; uma ciência hibrida que dialoga aspectos naturais e humanos. 18 Karl Ritter (1779-1859) foi geógrafo e naturalista, nascido em Quedlimburgo, pertencente à Prússia, sendo sua colaboração fundamental para o futuro surgimento da geografia humana. Ritter foi um dos precursores da Geografia Moderna, assim como fundador da Sociedade
11
análises do meio físico; vale ressaltar que o berço do conhecimento da ciência
geográfica nasce pela mentalidade de pensador como Ritter que afirma que
nos seus escritos que consegue vislumbrar o "plano divino" nas dinâmicas da
Terra.
Observa-se que ainda no século XIX a mentalidade religiosa convive
com o pensamento científico no que tange a análise das estruturas geológicas
e das paisagens naturais - já que este era o objeto mor do inicio do
pensamento geográfico no contexto franco-germânico; e os aspectos religioso
advindo tanto da teoria criacionista quanto do arcabouço cultural do homem
moderno faz "o pensar religioso" esteja ainda presente na sua forma de fazer
ciência.
Vale ressaltar que o a história do pensamento geográfico assim como a
história do pensamento religioso se confunde com a própria história da
humanidade, sendo desde a Antiguidade Oriental debatido o local de habitação
dos deus(es) e seu lócus de atuação na natureza.
Uma ideia de uma Geografia Teológica remonta a Antiguidade e ao
Medievo, no qual ainda não existir uma sistematização do pensamento
geográfico; os deus(es) faziam parte diretamente da análise da paisagem e do
espaço, já que as divindades eram fator principal na análise do ambiente, tendo
em vista as respostas naturais e políticas que davam as ações diretas dos
homens.
A dita Geografia Teológica apenas descrevia os deuses (seu
habitat/local de ação e sua (re)ação direta as atitudes humanas; sem buscar
entender a crença, as peculiaridades do(s) deus(es), seu raio de ação e a
amplitude da religião e do fenômeno religioso no imaginário da população local.
Geográfica de Berlim. Karl Ritter foi o primeiro professor de ensino de geografia regular em uma universidade, sendo que a cátedra de geografia da Universidade de Berlim foi instituída justamente para que ele a ocupasse; sua análise estava além da descrição da paisagem já que suas observações tinham um caráter mais antropocêntrico que seus antecessores, embora à época as inclinações geográficas estavam ligadas mais às ciências naturais que humanas; assim, a ideia de um mapeamento da superfície terrestre estava ligado ao pensamento de sistematização do conhecimento científico nos moldes das ciências da natureza (da qual a geografia fazia parte à época).
12
A visão de uma geografia teológica ganha contornos cristãos no
medievo; embora neste período a historiografia registre uma maior cisão entre
pensamento estritamente religioso e pensamento natural, mesmo que grande
parte desta "protogeografia" da Religião Cristã tenha sido escrita por teólogos
numa geografia teologicamente orientada/enviesada, na tradição muçulmana
ou celta os escritos geográficos não deixam de lado suas concepções sobre
deus(es) agindo como motor da história, modificando os costumes. A religião
cria, recria e transforma as espacialidades do homem através das rupturas e
continuidades na temporalidade.
A contemporaneidade na virada do séc. XIX para o XX trouxe fortes
mudanças nas ciências; os diálogos entre ciência geográfica, ciências
humanas se atenuaram com um mescla de teses defendidas tanto nas ciências
naturais quanto nas humanas como o determinismo.
Desenvolve-se a ideia da geografia como a ciência das essências
também é a ciência do movimento e da análise do meio natural sem
desvincular da análise humana. Uma concepção clássica de Vidal de La
Blache19 que buscava uma geografia que dialogasse entre o físico e o humano
reforçando o conceito de "gênero de vida" frente a uma escola de cunho
determinista20 germânica.
Vale observar que ambas não são anacrônicas e excludentes; tendo em
vista que dialogam com a forma de fazer o conhecimento geográfico. Um
gênero de vida pode ser fruto de uma condição geográfica pré-determinada;
vale ressaltar que tanto o determinismo geográfico quanto ideia de gêneros de
19 Paul Vidal de La Blache (1845-1918) foi um geógrafo francês e um dos nomes mais lembrados no que se refere à história do pensamento geográfico. Sua obra é bastante reconhecida por ser fundadora da corrente de pensamento que veio a ser denominada por Possibilismo em suposta oposição ao determinismo germânico. Vidal também foi considerado o fundador da moderna Geografia Francesa e da Escola Francesa de Geopolítica. 20 Escola que tinha como base a ideia que homem seria produto do meio, as condições naturais determinavam a vida em sociedade. Tinha como grande expoente o pensador alemão Friedrich Ratzel influenciado pela obra de Darwin, que defendia que a evolução se basearia na luta entre as diferentes espécies, de forma com que aquelas que possuíssem as características de melhor adaptação ao meio sobreviveriam. Ratzel, aplicou essas ideias a vida em sociedade. O homem seria escravo do seu próprio espaço; e os seres humanos, raças e etnias mais aptos venceriam e dominariam os povos considerados inferiores. Pensamento reapropriado por Hitler no contexto da Segunda Guerra Mundial
13
vida estavam presentes em um contexto de expansão da fé cristã a África e a
Ásia, tendo em vista a que na tradição geográfica francesa a base do
conhecimento do "lugar/região" seria obtida através da ida a campo e
demarcação do lugar a ser estudo.
Observa-se que o geógrafo na tradição francesa deveria ir ao lugar
estudado e fazer o inventário para a descrição do lugar estudada, a moral
religiosa servia de guia para as expansão realizadas por pesquisadores a
África e Ásia mapeavam o aspectos naturais e paisagísticos e difundiam a
moral e a fé cristã.
A tradição vidaliana tinha como base na geografia humana, a história e a
geografia física a geologia; neste contexto a geografia passou a expandir seus
objetos de pesquisa que passou a ir além das análises paisagísticas; com a
cisão no contexto pós-vidaliana entre os discípulos de Vidal de La Blache
Emmanuel de Martonne21 (geógrafo físico) e Jean Brunhes22 (geógrafo
humano); os objetos de estudo geográfico começaram a se difundir e ir além de
inventários geológicos locais.
O estudo da religião no contexto geográfico seguia a tendência
geodeterminista; mostrando as religiões e suas práticas como fruto do
ambiente, conforme escritos de Ellsworth Huntington23 (1945) – paradigma este
que não perdurou nas décadas coma evolução dos estudos sistemáticos.
21 Emmanuel de Martonne (1873-1955) foi um importante geógrafo francês conhecido por desenvolver ao longo de sua vida, um amplo trabalho docente de difusão da geografia como ciência experimental. Estudou na Escola Normal Superior de Paris, onde, também lecionou história e geografia (1895). Foi nomeado professor da Sorbone (1909), tornou-se um dos grandes nomes da geografia de seu país e assumiu a direção do Instituto de Geografia da Universidade de Paris(1927). Tornou-se presidente de honra da União Geográfica Internacional (1949). Seu livro Traité de géographie physique (1909), teve sucessivas edições revistas e tornou-se obra clássica da matéria. deixou também vasta produção científica em publicações especializadas, como nos Annales de Géographie, do qual foi um dos diretores. 22 Jean Brunhes (1869-1930) foi um importante geógrafo francês, foi estudante da Ecole Normale Superieure, em Paris, seguiu o conselho de Vidal de La Blache, passando mais de um ano na Espanha, onde estudou o assunto de sua tese sobre as condições geográficas, os métodos e a organização na Península Ibérica e Norte de África: estudo da geografia humana. Foi professor na Universidade de Freiburg (1896) onde ele cunhou o termo "geografia social" e de Lausanne (1907) primeira cadeira no mundo onde aparece o termo "geografia humana". 23 Elsworth Huntington (1876-1947) foi professor de geografia da Universidade de Yale. Conhecido por seus estudos sobre o determinismo climático e geográfico; tendo um grande foco na economia. Foi Presidente da Sociedade Ecológica da América e da Associação de Geógrafos Americanos. Huntington liderou a Yale Expedition para a Palestina. Sua missão era
14
A mentalidade dos estudos geográficos caminhavam junto com a religião
(embora houvesse o problema biológico/humano) que com a necessidade uma
ciência mais ativa e que dialogasse com as demandas da sociedade no
contexto do pós-guerra; neste contexto a ciência geográfica se torna mais
social para entender a dinâmicas que iam além da análise geológica.
A sociedade, a economia, política e a cultura passam a ser visitados
como objetos de estudo geográfico; o espaço geográfico passa a ser objeto de
estudo e não somente o aspectos paisagístico do lugar, neste contexto a
religião passa a ser observada pela lente geográfica; porém ainda falta uma
método para o estudo espacial do fenômeno religioso.
Tal metodologia aparece no final dos anos 60, quando a Geografia
passa a se "servir" de olhares de outras ciências e concepções originárias da
filosofia para entender a relação homem-ambiente e espaço.
Neste contexto nasce a Geografia Humanística e da Percepção com o
uso do aporte metodológico da fenomenologia que traz sua contribuição a
ciência geográfica ao fazer do homem como elemento primordial para a
transformação do espaço.
As ideias Heideggerianas auxiliam numa concepção humana de
conceitos chaves da Geografia como: "região", "território", "paisagem", "lugar".
As experiências são tidas como modelos interpretadores individuais e coletivos
de leitura da realidade humana, e da realidade geográfica focada no
entendimento do homem "cultural" e suas relações com o ambiente.
A geografia vista através da lente hermenêutica da fenomenologia trazia
consigo a possibilidade de entender o espaço através das transformações
culturais do homem produzidas em um determinado lugar, e a religião como
fenômeno cultural de abrangência global, logo, nada mais interessante que o
geógrafo humanístico se debruçar no estudo deste fenômeno cultural mundial
(diversidades de culturais e religiões) e suas nuances locais.
descrever "passo a passo" o processo pela estrutura geológica, as formas topográficas, assim como a natureza (presente e passada) do clima que moldou o progresso do homem contemporâneo. As condições de clima e de estrutura geológica europeia determinaram a evolução socioeconômica e cultural dos europeus; inclusive vindo a ter um sistema religioso mais evoluído que o dos outros povos, justificando assim o processo de colonização.
15
As dinâmicas religiosos de migração, simbolismo religioso, os territórios
de culto e os territórios imateriais que representam uma faceta dos micro
espaços que nos levam a entender as peculiaridades do fenômeno religioso, as
relações de poder e as dinâmica do ambiente estudado.
As dinâmicas culturais passam a ser valorizadas e a religião como
marca importante do homem no espaço passa a ser analisada com um campo
de investigação científico social; nasce assim o subcampo da Geografia da
Religião como uma vertente da Geografia Cultural.
Neste contexto de uma Geografia da Religião mais bem pavimentada
em seus conceitos e ideias; surge o nome de David Sopher24 no campo da
Geografia Cultural e da Religião norte-americana; mostrando que a religião é
um sistema organizado e moldado culturalmente, e que reproduz o
pensamento existente dentro de uma determinada sociedade. A sua obra
intitulada Geography of Religion (1968) é considerada um clássico dentro do
estudo da geografia da religião, buscando inserir a temática dentro de eixos
culturais que balizam a relação homem, ambiente e sociedade.
Considerando a abordagem da temática da religião na geografia, pode-se analisar por quatros espectros; o primeiro seria o significado do ambiente natural para evolução dos sistemas religiosos e suas instituições, o segundo viés seria a forma como a qual essas instituições e sistemas religiosos modificam o ambiente; o terceiro aspecto seria as diferentes formas e maneiras dos sistemas religiosos ocuparem e organizarem o espaço e o quarto e não menos importante seria a distribuição geográfica das religiões e a sua forma de dispersão e interação (aproximação e afastamento) entre os mais diversos segmentos e sistemas religiosos. (SOPHER, 1967, p. 56).
Nos escritos de Sopher já se consegue visualizar evoluções e rupturas
com o modelo de pensamento da Geografia da Religião Tradicional; porém
ainda há a valorização excessiva dos aspectos visíveis do fenômeno religioso;
fazendo assim do seu texto um compêndio da geografia da religião material. As
24 David Sopher foi o grande nome do estudo em geografia da religião nos Estados Unidos nos anos 1960 e 1970, sendo o primeiro geógrafo a sistematizar o pensamento religioso sobre o prisma da geografia interligando homem, ambiente, sociedade, natureza e religião.
16
décadas de 70 e 80 trouxe o florescimento da de uma fenomenologia
estritamente religiosa; que se tornou um dos principais aportes teóricos para o
estudo da religião sob o prisma da geografia.
A fenomenologia aplicada à religião fez com que a natureza da
experiência/vivência religiosa tivesse significado ímpar na relação homem-
espaço, sendo um caminho que buscava quebrar a lógica positivista e a
estrutura marxista, mostrando que tanto a cultura quanto a religião são
compostas de aspectos materiais e imateriais que dão sentido e significado à
experiência humana.
As discussões envolvendo geografia e religião com o aporte teórico da
fenomenologia deram um novo impulso aos estudos em geografia cultural e
Geografia da Religião, através de conceitos que buscavam entender a marca
que o fenômeno religioso deixava no espaço geográfico através do
pensamento e atitudes humanas. Ideias como a "geoteologia" de Thoma25
(1970), a "geopiedade" de Yi Fu Tuan26 (1976) e uma "geografia mística" de
Singh e Khan27 (1999), mostraram-se influentes pela forma interdisciplinar de
agregar conceitos e ideias das mais diversas ciências humanas à ciência
geográfica contemporânea nos estudos da religião.
O geógrafo M. Büttner (1985) traz sua contribuição, sugerindo algumas
orientações para o estudo da religião, das quais se pode destacar dois
importantes elementos: o trabalho de estudo da geografia da religião deve
começar na investigação da comunidade religiosa, buscando identificar sua
estrutura espacial e ocupacional e a dinâmica social presente; posteriormente,
deve-se apropriar da dialética da relação entre religião e ambiente – por um
25 A “geoteologia” proposta por Thoma está ligada às doutrinas teológicas presentes no contexto da ciência geográfica na explicação do espaço. São noções geográficas que nascem do contexto de uma tradição religiosa. 26 Yi Fu-Tuan ao falar sobre “geopiedade” mostra que a religião é construtora de percepções diferentes sobre o espaço e também com seu lado "piedoso" constante em diversas doutrinas teológicas humaniza o espaço geográfico e traz uma melhor percepção da natureza humana intrinsecamente presente no espaço geográfico. 27 A ideia de “geografia mística” está ligada à forma como as culturas orientais relacionam conhecimento geográfico e teológico; as divindades estão presentes e atuantes na constituição do espaço; sendo o espaço o campo de ação/reação dos homens e dos deuses numa simbiose que visa explicar a constituição dos elementos paisagísticos, humanos (e obviamente) religiosos.
17
lado, considerando as influências que a religião exerce sobre as pessoas
(costumes, imaginário e atitudes), por outro, verificando os fatores externos que
promovem mudanças na religião investigada.
O estudo da religião na ótica da ciência geográfica passa a ter sua
própria metodologia de investigação e o espaço de ação do fenômeno religioso
passa a ser estudado pelas crivo da cientificidade da análise do espaço
dialogando com a espiritualidade e até elementos da fé que não são (e nem
podem) ser submetidos a análise científica.
O diálogo entre ciência e religião proporcionou a evolução que temos ao
analisar a dimensão e amplitude do fenômeno religioso sobre metodologias das
ciências humanas; entretanto; a falta de um crivo de cientificidade jamais pode
esgotar as potencialidades da fé e da religião na sociedade.
Ciência e Religião podem dialogar perfeitamente evitando tensões
desnecessárias, contribuindo para a conciliação de teorias que podem propiciar
uma melhor visão de mundo, aliviando o fardo e as complicações inerentes a
natureza física e humana, sendo conceitos como os biológicos (seleção
natural) e geológicos (tectônica de placas, as mudanças naturais e
paisagísticas) aceitos pela religião e a concepção da existência de Deus menos
conflituosa para a ciência.
A dinâmica espacial no tripé homem, natureza/ambiente e sociedade
auxiliam com que o diálogo entre religião e ciência geografia seja menos
conflituoso, tendo em vista áreas menos "limítrofes" para polarização e um
objeto de estudo que busca entender por uma metodologia própria um
fenômeno de extrema importância para o desenvolvimento tanto social quanto
científico.
O diálogo moderado para existência dessas duas esferas importantes da
sociedade contemporânea encontra corpo e vida no estudo da geografia como
conhecimento científico que busca entender o espaço e as modificações do
homem no meio natural e nos "lugares artificiais", sendo a religião um
importante fenômeno de forte abrangência que ocasiona inúmeras
transformações na sociedade.
18
A Geografia torna o fenômeno religioso mais palpável para a
compreensão científica e a Ciência menos traumática a Religião, tendo em
vista objetos que agregam valores sociais que necessariamente não são
científicos, mas estão presentes no cotidiano da sociedade.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fontes Primárias
CHARLESWORTH, James (ed.). The Old Testament Pseudepigrapha. New York: Doubleday, 1983-1985. (2 volumes) [abreviado como OTP 1 e 2]. GÊNESIS E JÓ. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulinas, 1986.
Fontes Secundárias (Comentadores)
BARBOUR, Ian. Ways of Relating Science and Religion. In: Religion and Science - Historical and Contemporary Issues. London: SCM Press, 1998. BRUNHES, Jean. La geographie humaine. Essai de classification positive. Paris: Alcan, 1910. BUTTNER, Manfred. El Significado de la Reforma para la nueva orientación de la Geografia en la Alemania Luterana. In: Geocrítica. Universidad de Barcelona, 1977, pp. 12-22. DAWKINS, Richard. O Relojoeiro Cego. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. ______________. Deus, um delírio. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. GRUENWALD, Ithamar. Apocalyptic and Merkavah Mysticism. Leiden / Köln: E. J. Brill, 1980. RUSSELL, Bertrand. Religion y Ciencia. Cidade do México: Fondo de Cultura Econômica, 2000. SING J. Paul and Khan Mumtaz. Saptadvîpâ Vasumantrî: the mythical
geography of the Hindus. GeoJournal, vol 48, nº 4 (Dec), 1999, pp. 269-278.
SOPHER. David. Geography of Religions. Englewood Cliffs: Prentice Hall,
1967.
19
THOMA, Clemens. Das Land Israel in der rabbinischen tradition. In: Eckert Willehad et all (org.). Judisches Volk-Gelobtes Land. Die biblischen Landverheiβungen als Problem des Judischesn Selbstverstãndnisses un der christlichen Theologie. München: Kaiser, 1970, pp-37-51.
TUAN, YI-FU. Cultural Geography: Glances Backward and Forward. Annals of Association of American Geographers, 2004. pp 729-733. ____________. Geopiety. A Theme in Mans Attachment to Nature and to Place. In: LOWENTHAL, David and BOWDEN, Martyn. Geographies to the Mind, New York: Oxford University Press, 1976, pp. 11-39.