12. do direito das obrigaÇÕes - responsabilidade civil

52
14 de maio de 2009 DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES (Livro I) RESPONSABILIDAD E CIVIL (Título IX) INTRODUÇÃO Na linha de pensamento de José de Aguiar Dias toda manifestação humana traz em si o problema da responsabilidade. O problema da responsabilidade não é somente um problema concernente ao mundo jurídico. A idéia de responsabilidade transcende o mundo jurídico. As violações poderão ser morais e sociais, decorrendo também em suas conseqüentes responsabilidades. 1

Upload: rodrigo-eidi

Post on 21-Oct-2015

34 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

14 de maio de 2009

DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES (Livro I)

RESPONSABILIDADE CIVIL (Título IX)INTRODUÇÃO

Na linha de pensamento de José de Aguiar Dias toda manifestação humana traz em si o problema da responsabilidade. O problema da responsabilidade não é somente um problema concernente ao mundo jurídico.

A idéia de responsabilidade transcende o mundo jurídico. As violações poderão ser morais e sociais, decorrendo também em suas conseqüentes responsabilidades.

No campo jurídico existe o desdobramento da responsabilidade em responsabilidade civil, penal, administrativa, tributária, processual, entre outras. Será aqui estudada somente a responsabilidade civil, uma das espécies dentro do gênero “responsabilidade”.

RESPONSABILIDADE CIVIL E RESPONSABILIDADE PENAL

Qual a diferença entre a responsabilidade civil e a responsabilidade penal? Tanto a responsabilidade civil como a responsabilidade penal são espécies de responsabilidade jurídica. Mas existe diferença entre elas.

O ponto de análise diferenciador não é o comportamento ilícito do indivíduo. Um mesmo comportamento poderá ensejar diversas espécies de

1

Page 2: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

responsabilidades. Exemplo: condutor que atravessa sinal vermelho e depois atropela um transeunte, terá em decorrência de sua conduta a responsabilidade administrativa (pontos na carteira); a responsabilidade penal (lesões corporais) e por fim, a responsabilidade civil (pelos danos causados, morais e materiais).

O direito penal é o soldado de reserva do direito, nas palavras de Nelson Hungria. E possui este ramo do direito modo diferente de lidar com os ilícitos cometidos, comparado ao direito civil.

Observa o professor Miguel Fenech, da Universidade de Barcelona, em sua clássica obra “O processo penal”, que a diferença fundamental entre estas formas de responsabilidade não está na natureza do comportamento ilícito; um mesmo comportamento pode deflagrar mais de um tipo de responsabilidade. Sucede que, na responsabilidade penal, além da exigência da tipicidade, a resposta sancionatória poderá ser mais severa.

CONCEITO DE RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil, espécie de responsabilidade jurídica, deriva da transgressão de uma norma civil pré-existente, com a conseqüente imposição ao causador do dano do seu dever de indenizar.

ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

A depender da norma jurídica pré-existente violada, a conseqüente responsabilidade civil formada será uma dentre as duas espécies:

1) RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL

Esta responsabilidade será de melhor forma estudada no módulo de teoria geral do contrato. Aqui a responsabilidade civil decorre da violação de uma norma jurídica prevista no contrato firmado entre as partes.

2) RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL OU AQUILIANA

Há violação neste caso de uma norma legal, fora de qualquer contrato, e deverá ser imposta a responsabilidade extracontratual (também chamada de

2

RESPONSABILIDADE PENAL

Tipicidade do ato ilícito

Sanção mais severa aplicada à conduta

Page 3: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

responsabilidade aquiliana, nome que advém em razão da Lex Aquilia de Damno do direito Romano). Neste estudo, será esta espécie de responsabilidade civil que terá mais enfoque.

MATRIZ DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL

É correto dizer, no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, que a sua matriz (ou seja, a sua regra geral) encontra-se no artigo 186, CC que define a expressão “ato ilícito”. Este artigo estabelece a regra geral da responsabilidade civil no Brasil.

Este artigo 186, CC também consagra o princípio de que a ninguém é dado o poder de causar prejuízo a outrem. Também é chamado este princípio de neminem laedere.

Art. 186, CC (REGRA GERAL) - Aquele que, por ação ou omissão voluntária (conduta dolosa), negligência ou imprudência (conduta culposa), violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Este artigo 186, CC que define o “ato ilícito”, define uma ilicitude subjetiva ou objetiva? Há consagração neste artigo de uma ilicitude subjetiva, pela presença dos elementos subjetivos, o dolo e a culpa. O fato de a culpa ou o dolo integrarem o conceito de ato ilícito, não implica necessariamente dizer que somente haverá responsabilidade civil quando estes elementos estiverem presentes.

Além do artigo 186, CC, integram também o sistema jurídico de responsabilidade civil os artigos 187 e 927, CC que consagram formas de ilicitude objetiva.

Art. 187, CC - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Art. 927, CC - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Estes dois artigos acima consagram a configuração da responsabilidade civil e o conseqüente dever de indenizar mesmo na ausência de qualquer elemento subjetivo.

O sistema de responsabilidade civil brasileiro é montado sobre o tripé destes três artigos do Código Civil: art. 186, art. 187 e art. 927.

ABUSO DE DIREITO

3

Page 4: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

O livro “O abuso de direito e o novo Código Civil”, de Daniel Boulos (editora método) é a doutrina para referência deste estudo.

Art. 187, CC - Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Para a configuração do abuso de direito, na forma do artigo 187, CC, se exige o elemento culpa ou dolo? NÃO, há responsabilização objetiva para a caracterização do abuso de direito. Preenchida a ilicitude objetiva já restará configurado o abuso. Não se exige a prova da intenção de prejudicar.

Este artigo utiliza apenas um critério finalístico, funcional e objetivo para que haja seja configurado o abuso. Bastará a comprovação do desvirtuamento no exercício do direito para que reste configurado o seu abuso e, por conseguinte, a responsabilidade civil devida.

Observação: com o desdobramento de aplicação do princípio do venire contra factum proprium, em respeito ao princípio da boa-fé objetiva, o direito adquirido e exercido em virtude de surrectio, este direito não poderá ser atacado como abusivo pela parte que sofre a supressio.

Art. 330, CC - O pagamento reiteradamente feito em outro local (“surrectio”) faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato (“supressio”).

Outro exemplo de surrectio: um dos condôminos utiliza parte da área comum do condomínio como garagem por um longo período de tempo. Se eventualmente, vier o condomínio a cobrar o aluguel pelo uso desta área comum de modo retroativo, o condômino poderá demonstrar resistência quanto à medida

4

SUPRESSIOA supressio traduz a perda de um direito em face de seu não exercício, consolidando situação favorável à outra parte, que adquire o direito correspondente via surrectio. A supressio tem a idéia de supressão e perda do direito, não podendo ser invocado o abuso por parte do direito praticado através da surrectio.

SURRECTIOA surrectio é a outra face da moeda da supressio. Praticando a conduta uma das partes, e não se manifestando a parte contrária sobre esta conduta, mostra esta aparentemente aceitar a situação. Haverá aquisição do direito em razão da boa-fé do agir desta parte.

Page 5: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

em virtude de seu direito correspondente ao exercício da surrectio. Haverá supressio nesta cobrança para o condomínio durante aquele tempo. Mas, o condomínio poderá requerer que ele saia da área comum e as questões de usucapião de área comum ficarão para o estudo outra oportunidade (professor Pablo Stolze diz que a matéria é controvertida, mas que já existem autores que defendem a possibilidade de usucapião de uma área comum).

REQUISITOS OU ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Os elementos da responsabilidade civil são apenas três. Não se insere o elemento subjetivo (dolo ou culpa) por ele não ser obrigatório para a configuração da responsabilidade civil. Apenas interessa à responsabilidade civil subjetiva, mas não interessando à responsabilidade civil objetiva.

CONDUTA HUMANA

A conduta humana, para efeito de responsabilidade civil, pressupõe voluntariedade na sua atuação, omissiva ou comissiva. Deverá haver o mínimo grau de consciência inserido na conduta da pessoa.

Exemplo: não há realização de conduta humana e voluntária para fins de responsabilidade quando for ela motivada pelo sonambulismo, hipnose, reflexo, etc.

A regra é de que esta conduta humana culmine na realização de um ato ilícito. Mas é somente a regra. Existem exceções, em que poderá haver responsabilização civil decorrente de uma conduta lícita. Atenção à observação logo abaixo.

Observação: é possível que haja, por exceção, responsabilidade civil decorrente de uma conduta humana lícita. Exemplos: desapropriação é um ato lícito e jurídico que gerará responsabilização e devida indenização para aquele que tem seu imóvel desapropriado; também gera indenização o exercício do direito da passagem forçada que deverá ser pago, baseado pela existência de responsabilidade da conduta lícita realizada.

5

Conduta Humana

Nexo de causalidade

Dano ou prejuízo

Page 6: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

NEXO DE CAUSALIDADE

Nexo causal é o liame ou do vínculo que une o agente ao resultado danoso. Fundamentalmente existem três teorias dentro do estudo do direito civil que explicam o elemento nexo de causalidade.

Serpa Lopes diz que o nexo causal é essencial para a configuração da responsabilidade. Para o autor, a noção de causa se reveste de conteúdo essencialmente filosófico e as teorias se desdobram quanto à delimitação de “tempo” e de “espaço” (na busca de se saber o que na verdade seria uma causa).

Mas, as teorias explicativas que serão analisadas logo abaixo analisadas não são propriamente teorias científicas, mas sim teorias jurídicas:

1) Teoria da equivalência das condições (conditio sine qua non)

Para esta teoria todo e qualquer antecedente fático que concorra para o resultado será considerado como causa.

Crítica histórica: Gustavo Tepedino diz que o grande problema desta teoria é que ela considera todos os fatos ocorridos anteriormente como causas podendo realizar o “regresso ao infinito”, encontrando causas que são muito distantes do evento danoso.

A doutrina penal reconstruiu esta teoria da equivalência das condições com a teoria da imputação objetiva do resultado. Sempre com a tentativa de sanar o regresso ao infinito que gera esta teoria.

Esta primeira teoria é a mais abrangente, é a que mais dá valor à imputação da responsabilidade, porque para ela todas as condições anteriores produzidas para chegar ao resultado são equivalentes.

2) Teoria da causalidade adequada

Esta segunda teoria, diferentemente da anterior, considera que causa é apenas o antecedente fático abstratamente adequado à consumação do resultado. Para esta segunda teoria, nem todo antecedente é causa, cada um deles deverá ser analisado para que seja realizada a imputação.

A teoria parte de um juízo de probabilidade. Deve somente ser causa o fato que se mostre idôneo para a produção do resultado danoso.

Exemplo de Cardoso Gouveia: amigo dá um tapa leve na cabeça de outro amigo e este vem a sofrer convulsões. Esta conduta, para o autor, não é causa idônea para produzir o resultado. Não há abstratamente conseqüência lógica em dar um pequeno tapinha na cabeça de uma pessoa e ela venha a sofrer convulsões.

3) Teoria da causalidade direta e imediata

Esta terceira teoria, para professor Pablo Stolze, Gustavo Tepedino e Carlos Roberto Gonçalves, é mais aproximada de uma teoria objetiva.

A teoria da causalidade adequada foi desenvolvida pelo professor Agostinho Alvim, de São Paulo. Para esta teoria, causa é apenas o antecedente

6

Page 7: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

que determina o resultado como conseqüência sua de modo direto e imediato.

Comparada com a segunda teoria, que se mostra muito abstrata junto à análise de cada causa; esta teoria em comento demonstra ser mais objetiva, devendo haver comprovação concreta do liame direto e imediato da causa para o alcance do resultado.

Exemplo: “A” dá soco em “B”, e este vem a cair batendo a cabeça. “C” ao levar “B” para o hospital bate o carro e capota, levando este evento do acidente à morte de “B”. Para a teoria da causalidade direta e imediata o fato da conduta soco não é conseqüência direta e imediata para configurar como causa da morte de “B”. Não há linha de desdobramento lógico, direto e imediato.

Na linha desta terceira corrente que sustenta o vínculo direto e necessário entre o comportamento causal e o resultado danoso, para efeito de responsabilidade civil ver o REsp 686208/RJ.

REsp 686208 / RJ RECURSO ESPECIAL 2004/0112790-9 Relator(a): Ministro LUIZ FUX (1122) Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento: 16/06/2005 Data da Publicação/Fonte: DJ 01/07/2005 p. 414 LEXSTJ vol. 192 p. 177 Ementa DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. AUSÊNCIA DE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. REJEIÇÃO DE RIM TRANSPLANTADO. NEXO CAUSAL. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 07/STJ. 1. Consignado pelo acórdão recorrido que o Estado do Rio de Janeiro fora compelido, por decisão judicial, a fornecer ao recorrido a medicação necessária para evitar a rejeição do rim transplantado, restou inequívoca a sua legitimidade ad causam passiva para a ação indenizatória, porquanto, sponte sua estagnou o fornecimento a que restara obrigado judicialmente, ocasionando o ilicito in foco. 2. Destarte, instado a cumprir a decisão judicial, a sua omissão configurou inequívoca responsabilidade em face da rejeição do órgão transplantado, ante a ausência do medicamento. 3. Deveras, restou assente na instância local que: "A saúde pública é um serviço de competência comum a todas as esferas da Federação e para a sua melhor execução foi instituído o Sistema Único de Saúde (SUS), do qual o Hospital Universitário Pedro Ernesto é participante. A alegação de que o referido hospital possui personalidade jurídica distinta da do Estado, não afasta legitimidade do Embargante, uma vez queaquele atua como longa manus deste na distribuição da saúde. Além disto, o que se discute neste feito é a responsabilidade pelo não fornecimento de medicamento necessário para evitar a rejeição de órgão transplantado, obrigação única e exclusiva do ente público e não do Hospital Pedro Ernesto." 4. Outrossim, "o laudo pericial de fls. 541 usque 544 é conclusivo quanto ao nexo de causalidade entre asuspensão no fornecimento da medicação imunosupressora e a perda do rim transplantado." 5. Desta sorte, "não há como se amparar a tese de que o dano decorreu exclusivamente dos riscos da complicada cirurgia a que fora submetido o Embargado, uma vez ter ficado comprovado tecnicamente que o quadro clínico do paciente evoluiu após a utilização da medicação 'sandimmum' e que em decorrência de sua interrupção houve a falência total do órgão" (fls. 696) 6. Assentando o aresto recorrido o nexo de causalidade entre a omissão do Estado do Rio de Janeiro no fornecimento de medicamento e o dano sofrido pelo ora recorrido foi constatado pelo Eg. Tribunal a quo, assim, decisão em sentido contrário em sede de recurso especial ensejaria minucioso reexame do material fático-probatório dos autos, esbarrando no enunciado da Súmula nº 07 desta Corte. Precedentes: STF, RE 257.090/RJ; RE 140.798/SP; STJ, AgRg nos EDcl no AG 244.454/GO. 7. Recurso Especial desprovido.

Observação: Qual destas teorias acima analisadas foi a adotada pelo Código Civil? Para os estudiosos do Código Civil a teoria que menos se aproxima do Código é a primeira teoria. Os autores civilistas se dividem entre a teoria da

7

Page 8: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

causalidade adequada (como Sérgio Cavalieri Filho); e a teoria da causalidade direta e imediata (como Gustavo Tepedino, Carlos Roberto Gonçalves e professor Pablo Stolze).

Professor Pablo Stolze diz que existem mais autores que defendem a causalidade adequada, mas insiste que a doutrina está dividida. É preciso haver a análise da banca de concurso para que seja tomado o posicionamento.

O argumento da teoria da causalidade direta ou imediata é baseada na redação do artigo do Código Civil que trata do elemento do nexo causal:

Art. 403, CC - Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato (teoria da causalidade direta e imediata) , sem prejuízo do disposto na lei processual.

DANO OU PREJUÍZO

Responsabilidade civil sem dano é um corpo sem alma, segundo analogia do professor Pablo Stolze. Se não há o dano, haverá indenização de quê? Para o professor o dano integra indispensavelmente o sistema da responsabilidade civil.

O dano que interessa à responsabilidade civil é o DANO INDENIZÁVEL. Ele é que será estudado neste tópico.

O dano ou prejuízo traduz a lesão a um interesse jurídico tutelado material ou imaterial. E para que este dano seja indenizável, ele deverá observar três requisitos:

a) A violação de interesse jurídico material ou moral ;

Exemplo: o dano decorrente do fim de um namoro não interessa à responsabilidade civil, não se caracterizando como um interesse jurídico. Diferentemente de ter o indivíduo seu nome inscrito erroneamente no cadastro do Serviço de Proteção ao Crédito.

b) A subsistência do dano ;

Nas palavras da professora Maria Helena Diniz, “se o dano já foi reparado pelo responsável, o prejuízo é insubsistente, mas, se o foi pela vítima, a lesão subsiste pelo quantum da reparação; o mesmo se diga se terceiro reparou o dano, caso em que ele ficará sub-rogado no direito do prejudicado” (DINIZ, Maria Helena. Responsabilidade Civil, 7º volume, Editora Saraiva, 2004, p.69).

c) A certeza do dano .

É o requisito mais difícil de ser caracterizado. Significa dizer que não se indeniza dano hipotético. O dano deverá ser certo e atual.

8

Page 9: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Observação: Existe uma teoria francesa que relativiza este requisito da certeza do dano. Lembra-nos o professor civilista Fernando Gaburri que este requisito da certeza do dano é mitigado pela teoria da “perda de uma chance”.

Conceitualmente a “perda de uma chance” poderá ser indenizável por afastar uma expectativa ou a probabilidade favorável ao lesado.

Sérgio Novaes Dias, em sua obra “Responsabilidade Civil do Advogado pela perda de uma chance” lembra que esta teoria poderá ser também aplicada ao advogado que perde o prazo do recurso que poderia favorecer ao seu cliente.

No próprio direito de família, observa o professor Cristiano Chaves a hipótese da mãe que não informa ao pai o nascimento do filho, configura o dano pela perda de uma chance, fazendo com que ele venha a perder a chance de conhecê-lo.

O REsp 788459/BA consagra situação famosa de perda de uma chance por conta da impropriedade de pergunta formulada em programa televisivo.

RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. IMPROPRIEDADE DE PERGUNTA FORMULADA EM PROGRAMA DE TELEVISÃO. PERDA DA OPORTUNIDADE.1. O questionamento, em programa de perguntas e respostas, pela televisão, sem viabilidade lógica, uma vez que a Constituição Federal não indica percentual relativo às terras reservadas aos índios, acarreta, como decidido pelas instâncias ordinárias, a impossibilidade da prestação por culpa do devedor, impondo o dever de ressarcir o participante pelo que razoavelmente haja deixado de lucrar, pela perda da oportunidade.2. Recurso conhecido e, em parte, provido.(REsp 788459/BA, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 08/11/2005, DJ 13/03/2006 p. 334)

Questões especiais de concurso envolvendo o tema do dano

1. Como se deve entender o redutor indenizatório previsto no artigo 944, CC?

Art. 944, CC - A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização (redutor indenizatório baseado na desproporção da culpa do réu e da indenização) .

Alguns professores, como Rui Stocco, fazem inúmeras críticas a este sistema redutor da indenização do dano. É um mecanismo para beneficiar o réu em virtude de sua conduta estar baseada em uma culpa leve. Benefício este dado em detrimento do direito da vítima em ser ressarcida.

Professor Pablo Stolze diz que em uma situação ou em outra até poderá ser uma opção justa a ser aplicada pelo Magistrado. No entanto, despreza-se todo o prejuízo da vítima que não teve culpa alguma no tocante à conduta.

Exemplo: agente deixa “bituca” de cigarro acesa na ponta do cinzeiro e ela vem a colocar fogo no apartamento da vítima. Há clara desproporção entre a conduta e o tamanho da indenização; mas seria justo deixar a vítima sem qualquer ressarcimento, tamanha foi sua perda?

9

Page 10: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Professor Arruda Alvim e professor Pablo Stolze dizem que somente poderá ser aplicado este redutor da indenização nas espécies de responsabilidade civil baseadas em elementos subjetivos, ou seja, quando da análise da culpa do agente.

Este redutor ainda causa outro inconveniente, uma vez que, toma por base a culpa do réu, mas nem toda demanda envolverá a discussão da culpa, como nos casos da responsabilidade objetiva (sobre esta polêmica ver os enunciados 46 e 380 das Jornadas de Direito Civil).

Enunciado 46, I Jornada de Direito Civil – Art. 944: a possibilidade de redução do montante da indenização em face do grau de culpa do agente , estabelecida no parágrafo único do art. 944 do novo Código Civil, deve ser interpretada restritivamente, por representar uma exceção ao 8 princípio da reparação integral do dano, não se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva .

Enunciado 380 , IV Jornada de Direito Civil - Atribui-se nova redação ao Enunciado n. 46 da I Jornada de Direito Civil, com a supressão da parte final: não se aplicando às hipóteses de responsabilidade objetiva.

2. Qual a diferença entre o dano indireto e dano reflexo ou em ricochete?

Dano indireto remete-nos à idéia de uma cadeia de prejuízos: a mesma vítima sofre um dano direto e danos indiretos ou conseqüenciais da conduta realizada. Somente uma única vítima sofre uma cadeia de acontecimentos e danos.

Já o dano reflexo ou em ricochete é aquele que atinge além da vítima indireta, uma vítima indireta, a exemplo do filho de sofre o dano pela morte do pai. Existem duas vítimas envolvidas, o dano recai sobre o pai e sobre o filho, e o ordenamento autoriza que o lesado indireto possa litigar por sua indenização, por ter sofrido este dano.

3. O que é dano in re ipsa?

Esta expressão é encontrada em muitos julgados do STJ. O dano in re ipsa é aquele que dispensa a sua demonstração em juízo. REsp 1.059.663/MS. É como se fosse recebesse o tratamento de um dano presumido.

10

Page 11: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

RECURSO ESPECIAL 2008/0112156-1 Relator(a): Ministra NANCY ANDRIGHI (1118) Órgão Julgador: T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento: 02/12/2008Data da Publicação/Fonte: DJe 17/12/2008 Ementa Civil e processual civil. Recurso especial. Omissão. Inexistência. Danos morais. Não renovação do cheque especial. Ausência de prova. Protesto indevido. Negativação. Pessoa jurídica. Dano in re ipsa. Presunção. Desnecessidade de prova. Quantum indenizatório. Exagero. Afastamento de um dos motivos de sua fixação. Redução. - Para o Tribunal de origem, o envio do título a protesto de forma indevida gerou presunção de dano moral, o que tornou desnecessária a análise dos pontos questionados em embargos declaratórios; - A não renovação do contrato de cheque especial não pode ser imputada ao protesto indevido promovido pela recorrente. Fato não comprovado nos autos; - Nos casos de protesto indevido de título ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, isto é, prescinde de prova, ainda que a prejudicada seja pessoa jurídica. Precedentes;- Os valores arbitrados a título de danos morais somente comportam modificação pelo STJ quando fixados de modo irrisório ou exagerado; - Na espécie, o valor mostra-se exagerado, em especial pelo afastamento da indenização pela não renovação do contrato de cheque especial. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, parcialmente provido.

21 de maio de 2009

RESPONSABILIDADE OBJETIVA E ATIVIDADE DO RISCO

É a teoria do risco que embasa a responsabilidade objetiva, aquela que dispensa a análise da culpa. A idéia da teoria do risco é que aquele que o cria, deverá responder por ele, independentemente da análise de sua culpa.

O Código Civil brasileiro consagra tanto a responsabilidade subjetiva, baseada na culpa, como a responsabilidade objetiva, baseada no risco.

O artigo 927, CC em conjunto com os artigos 186 e 187, CC, como já dito, forma um sistema que consagra as duas formas de responsabilidade.

Art. 927, CC - Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187 – consagra o abuso de direito com previsão da responsabilidade objetiva), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,

nos casos especificados em lei , ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem .

O Código Civil no parágrafo único consagra duas hipóteses em que poderá haver a consagração da responsabilidade objetiva:

1. Leis especiais

São exemplos de leis especiais que possuem disposição acerca da responsabilidade objetiva: Código de Defesa do Consumidor; legislação ambiental; seguro obrigatório de veículos (DPVAT); etc.

O primeiro ato normativo a consagrar a responsabilidade objetiva no Brasil, foi o decreto 2681/1912, que autorizava esta espécie de responsabilidade sobre os danos causados em decorrente da atividade ferroviária.

11

Page 12: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

2. Quando atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem.

Este parágrafo único dá a falsa impressão de que toda e qualquer atividade de risco gerará a responsabilidade objetiva. Tal interpretação não deverá ser feita amplamente, deste modo. Qual comportamento humano não envolve risco?

É preciso que se crie um parâmetro hermenêutico para que não se considere que todo comportamento ou atividade humana gere a responsabilidade objetiva genericamente. Viver é um risco.

Na linha de pensamento do grande autor Alvino Lima, em sua clássica tese “Da culpa ao risco”, a responsabilidade objetiva justifica-se na medida em que o causador do dano, visando a auferir um proveito, submete a vítima a uma probabilidade de lesão maior que outros membros da coletividade (maior que outros membros da coletividade). Ver também o enunciado 38 da I Jornada de Direito Civil:

Enunciado 38, I Jornada de Direito Civil – Art. 927: a responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

Observação: o autor Roger Aguiar observa ainda, analisando o advérbio presente no parágrafo único que a atividade de risco deve traduzir uma ação reiterada e habitual:

Art. 927, CCParágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente (deve ser uma atividade habitual, que corriqueiramente acontece; com maior probabilidade de risco) desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

CAUSAS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

Estas causas excludentes não são privilégio da responsabilidade subjetiva. Poderão também ser aplicadas para que seja excluída a responsabilidade objetiva:

1) ESTADO DE NECESSIDADE E LEGÍTIMA DEFESA

Previsão legal

Art. 188, CC - Não constituem atos ilícitos (exclusão da il icitude do ato):

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

12

Page 13: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente (estado de necessidade).

Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.

Conceito

Tanto um instituto como o outro excluem a ilicitude do ato, como regra, e em conseqüência a própria responsabilidade civil.

No estado de necessidade, o agente atua visando a salvaguardar interesse jurídico próprio ou de terceiro, agredindo direito alheio para remover uma situação de direito. Há uma colidência de interesses no estado de necessidade. Não há qualquer agressão neste caso do estado de necessidade.

Na legítima defesa, diferentemente, atua-se em face de uma agressão injusta atual ou iminente. Há neste caso, propriamente uma agressão que necessita ser repelida.

Exceções do dever de indenizar

É muito importante destacar, segundo os artigos 929 e 930, CC, que mesmo em estado de necessidade ou legítima defesa, caso seja atingido direito de terceiro inocente, este poderá demandar o agente que terá uma ação regressiva contra o verdadeiro culpado.

Art. 929, CC - Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.

Art. 930, CC - No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano (art. 188, inciso I).

É como se houvesse uma responsabilidade civil decorrente de um ato lícito. É importante não se esquecer destes artigos, embora haja muita crítica da doutrina sobre eles.

2) EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO E ESTRITO CUMPRIMENTO DE UM DEVER LEGAL

Previsão legal

Há regra no Código Civil excluindo a ilicitude do ato de quem o pratica no exercício regular de um direito.

Art. 188, CC - Não constituem atos ilícitos:

13

Page 14: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; (...)

Frederico Marques diz que o estrito cumprimento do dever legal é uma forma de exercício regular de um direito. E no momento que consagra este último o Código Civil, abarca a primeira excludente mencionada também. São institutos que se correlacionam.

O estrito cumprimento do dever legal é mais utilizado no direito público. Exemplo: policial que efetua mandado de prisão atua sob o mando do estrito cumprimento do dever legal, desde que não haja o excesso configurado; da mesma forma quando o oficial de justiça realiza um arrombamento por ordem judicial para realizar a busca e apreensão; etc.

Situações de exercício regular de um direito

São situações e exemplos trazidos pelo professor Pablo Stolze e retirados da doutrina e da jurisprudência sobre o exercício regular de um direito:

1. Porta-giratória de um Banco – desde que não haja descriminação ou excesso, a porta-giratória é exercício regular de um direito do Banco quanto à sua segurança.

2. Guarda-volume de supermercado – também é considerado como exercício regular do direito do supermercado.

3. Ajuizamento de ação – O STJ tem inclusive firmado o entendimento de que também é consagrado como exercício regular do direito o mero ajuizamento de ação (AgRg no Ag 1.030.872/RJ). Se o Juiz julgar o pedido improcedente, a parte contrária não poderá entrar com uma ação de danos morais contra o autor. Mero ajuizamento de ação não causa dano moral.

AGRAVO REGIMENTAL. AJUIZAMENTO DE AÇÃO. PREJUÍZO MORAL. INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM ESTA CORTE. DANO MORAL. ATO ILÍCITO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ.1. O acórdão guerreado está em consonância com entendimento preconizado nesta Corte no sentido de que o mero ajuizamento de ação judicial não gera dano moral, porquanto o autor está no seu exercício regular de direito.2. O aresto impugnado, ao reconhecer ausentes os requisitos aptos a ensejar indenização por danos morais em face da agravada, o faz com base nos elementos de convicção da demanda. Neste contexto, sua reforma demandaria o reexame das provas constantes dos autos.3. Agravo regimental desprovido.(AgRg no Ag 1030872/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 03/11/2008)

Observação: o STJ, por outro lado, não acatou a tese do exercício regular de um direito no REsp 164391/RJ, sobre a alegação da excludente da ilicitude pela defesa em relação às medidas tomadas por uma família que para repreender

14

Page 15: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

a empregada doméstica que em sua casa trabalhava, a trancou no apartamento por um momento, para que determinadas averiguações fossem feitas:

CIVIL E PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPREGADA DOMÉSTICA. SUSPEITA DE FURTO. TRANCAMENTO NO APARTAMENTO. QUEDA DO EDIFÍCIO. SUSPEITA DE SUÍCIDIO. IRRELEVÂNCIA. RESPONSABILIDADE DOS PATRÕES. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. USO IMODERADO DO MEIO. DOUTRINA. RECURSO ESPECIAL. PRESSUPOSTOS. FALSIDADE DE DOCUMENTO. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA/STJ. ENUNCIADO Nº 7. PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. CPC. ART. 132. SENTENÇA PROFERIDA PELO JUIZ DA INSTRUÇÃO, REMOVIDO PARA OUTRA VARA DA MESMA COMARCA. INOCORRÊNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE ENFRENTAMENTO DE TEMAS NÃO PREQUESTIONADOS. RECURSO DESACOLHIDO.I - A relação de trabalho entre patrão e empregada doméstica confere àquele o poder de exigir tão-somente as obrigações decorrentes do contrato de trabalho. Prender o empregado no local de trabalho, sob o argumento de averiguações quanto a eventual ilícito praticado, constitui uso imoderado do meio, nos termos da melhor doutrina.II - O exercício regular de um direito não pode agredir o direito alheio, sob pena de tornar-se abusivo e desconforme aos seus fins.III - O cerceamento ao direito fundamental de ir e vir encontra no ordenamento constitucional hipóteses restritas, não se podendo atribuir ao empregador o poder de tolher a liberdade do empregado, ainda que por suspeita de crime contra o patrimônio.IV - Matéria concernente a falsidade documental, decidida pelas instâncias ordinárias com base nos fatos da causa, não pode ser revista em sede de recurso especial, nos termos do veto contido no verbete nº 7 da súmula desta Corte.V - Encontrando-se já encerrada a instrução do feito, a simples remoção do juiz que a tenha conduzido e concluído, máxime se efetivada para outra vara da mesma comarca, não o impede de proferir a sentença.

VI - A técnica do recurso especial exige que os temas concernentes aos dispositivos legais apontados como violados pelo recorrente tenham sido debatidos no acórdão impugnado.(REsp 164391/RJ, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 18/03/1999, DJ 28/06/1999 p. 118)

3) CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR

Conceito

A doutrina brasileira não é unânime quanto a estas definições. Existe uma acesa polêmica (cotejar as obras de Maria Helena Diniz, Sílvio Rodrigues, Agostinho Alvim e Álvaro Villaça Azevedo).

Professor Pablo Stolze diz que a doutrina possui a tendência, mas sem pacificação, que o caso fortuito é o evento imprevisível (exemplo: seqüestro-relâmpago); ao passo que, a força maior é um evento inevitável, porém previsível (exemplo: terremoto).

Observação: o Código Civil, no parágrafo único do art. 393, CC, adotando uma recomendável postura de neutralidade não diferencia os conceitos de caso fortuito de força maior, identificando-os apenas como “um fato necessário”. Não cabe ao codificador conceituar e agiu corretamente em não entrar na celeuma doutrinária.

15

Page 16: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Art. 393, CC - O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado .

Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir .

Nos julgados, os Juízes ou Tribunais utilizam as expressões indiscriminadamente. Também não entram na discussão doutrinária sobre os conceitos específicos de caso fortuito e força maior.

Fortuito externo e fortuito interno

Qual a diferença entre fortuito externo e fortuito interno? Esta classificação aplica-se principalmente nas relações de consumo.

O fortuito interno é aquele que incide durante o processo de elaboração do produto ou execução do serviço, não excluindo a responsabilidade civil do réu. Exemplo: recall que promove a indústria automobilística porque durante a elaboração de determinada linha de veículo ocorreu danificação de uma das peças do carro, em virtude de um evento da natureza.

O fortuito externo, por sua vez, exclui a responsabilidade civil porque está fora do exercício da atividade do fornecedor. É o fortuito externo à elaboração ou execução do produto ou serviço. Exemplo: companhia aérea anuncia que o vôo se atrasará em virtude de uma mudança climática.

Questão de concurso

Qual é o tratamento jurídico dado pelo STJ ao assalto em ônibus? O STJ reiteradamente tem dito que o assalto a ônibus traduz fortuito externo excludente de responsabilidade civil da transportadora (AgRg no Ag 711078/RJ).

AGRAVO REGIMENTAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ASSALTO - INTERIOR DE ÔNIBUS - RESPONSABILIDADE DA EMPRESA - EXCLUDENTE - CASO FORTUITO - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO.I. Fato inteiramente estranho ao transporte (assalto à mão armada no interior de ônibus coletivo), constitui caso fortuito, excludente de responsabilidade da empresa transportadora.II. O agravante não trouxe qualquer argumento capaz de modificar a conclusão alvitrada, a qual se mantém por seus próprios fundamentos.Agravo improvido.(AgRg no Ag 711078/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 30/09/2008)

Observação: a despeito do entendimento do STJ, alguns Tribunais inferiores têm entendido que se o assalto é reiterado, e na mesma rota de passagem do ônibus, passa a ser ele previsível, impondo-se a responsabilidade da empresa transportadora. No Rio de Janeiro encontram-se alguns julgados e também nos Tribunais de outros estados.

4) CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA

16

Page 17: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Conceito

A culpa exclusiva da vítima, não apenas no direito civil, mas inclusive no direito administrativo e do consumidor, exclui a responsabilidade civil por quebra do nexo de causalidade.

Culpa concorrente da vítima

A culpa que exclui a responsabilidade civil é apenas a culpa exclusiva da vítima. A culpa concorrente não traduz conseqüentemente o mesmo efeito. A culpa concorrente não exclui a responsabilidade civil, ela apenas reduz a verba indenizatória que deverá ser paga pelo causador do dano.

Art. 945, CC - Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

5) FATO DE TERCEIRO

Conceito

No fato de terceiro, um comportamento voluntário de terceira pessoa exclui a responsabilidade jurídica do agente físico causador do dano.

Observação: a súmula 187, STF, veda a aplicação da excludente do fato de terceiro em favor de transportador em caso de acidente com passageiro.

Súmula 187, STF - A RESPONSABILIDADE CONTRATUAL DO TRANSPORTADOR, PELO ACIDENTE COM O PASSAGEIRO, NÃO É ELIDIDA POR CULPA DE TERCEIRO, CONTRA O QUAL TEM AÇÃO REGRESSIVA.

Questão de concurso

O que é teoria do corpo neutro? Trata-se de uma aplicação do fato de terceiro na hipótese em que o agente físico do dano, atingido é involuntariamente lançado contra a vítima (clássico exemplo do “engavetamento” de veículos).

Exemplo: No caso de um engavetamento, em que o carro “A”, bate no carro “B” e este conseqüentemente bate no carro “C”. A defesa de “B” será pautada na teoria do corpo neutro.

17

Page 18: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Na linha de entendimento do REsp 54444/SP, a vítima final deverá demandar diretamente aquele que causou a cadeia dos acontecimentos danosos (no exemplo dado acima, “C” deve demandar o condutor do carro “A”).

RESPONSABILIDADE CIVIL PRESSUPOSTA

O que é responsabilidade civil pressuposta (baseada na obra de Giselda Hironaka)? Para a referida autora, a responsabilidade civil não pressupõe o dano essencialmente. Para ela, o sistema jurídico possui uma responsabilidade já pressuposta. O Juiz deve primeiramente pensar nos prejuízos causados à vítima. Cabe ao réu, causador do dano provar a excludente de sua responsabilidade.

Nas palavras do professor, segundo a autora Giselda Hironaka, para além da culpa e até mesmo do risco, deve-se pensar primeiro na vítima como se houvesse uma pressuposição de responsabilidade do réu, simplesmente por conta do dano injusto praticado contra a vítima.

Esta idéia vai até mesmo além da responsabilidade subjetiva e da responsabilidade objetiva. Não é preciso, como se demonstrou no conceito, elaborar a prova da culpa do autor causador do dano ou de sua atividade eivada de risco.

18

A

B

C

Page 19: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

RESPONSABILIDADE CIVIL INDIRETA

1) RESPONSABILIDADE CIVIL PELO FATO DA COISA E DO ANIMAL

Teoria da guarda

A denominada “teoria da guarda”, de origem francesa, desenvolvida por autores do quilate de Planiol, Ripert e Boulanger, sustenta que a responsabilidade pelo fato da coisa e do animal é da pessoa que detém o poder de comando sobre ela: em geral, o proprietário é o guardião presuntivo.

Responsabilidade civil pelo fato do animal

O art. 1527, CC/1916 dizia que o dono ou detentor do animal poderia eximir-se da responsabilidade se provasse que o fato do animal não ocorreu por sua culpa. Tratava da matéria com base na responsabilidade subjetiva (inspirado pelo Código Civil Francês).

Art. 1.527, CC/1916 -  O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar:

I - que o guardava e vigiava com cuidado preciso (isto é, que não houve sua culpa);II - que o animal foi provocado por outro;III - que houve imprudência do ofendido;IV - que o fato resultou de caso fortuito, ou força maior.

Já o novo art. 936, CC/2002, por conta do potencial risco que o animal pode representar, evoluiu ao consagrar apenas a responsabilidade objetiva em decorrência desta responsabilidade indireta.

Art. 936, CC - O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior .

Observação: o STJ, conforme se pode ver no REsp 438831/RS, admite a responsabilidade subjetiva do Estado por omissão na fiscalização e sinalização de rodovia federal, quando do intenso tráfego de animais na pista.

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART 535 DO CPC.DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA N. 284/STF. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. COMPETÊNCIA DO STF. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ANIMAL NA PISTA. AUSÊNCIA DE FISCALIZAÇÃO E SINALIZAÇÃO. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA N. 7/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.

19

Page 20: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

1. Atrai a incidência do óbice previsto na Súmula n. 284/STF recurso que apresenta fundamentação genérica e deficiente, bem como alegação de violação do art. 535 do CPC desacompanhada de argumento que demonstre efetivamente em que ponto o acórdão embargado permaneceu omisso.2. É vedado ao Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial, analisar suposta violação de dispositivos da Constituição Federal, dado que seu exame refoge dos limites da estreita competência que lhe foi outorgada pelo art. 105 da Carta Magna.3. Na hipótese de acidente de trânsito entre veículo automotor e eqüino que adentrou na pista, há responsabilidade subjetiva do Estado por omissão, tendo em vista sua negligência em fiscalizar e sinalizar parte de rodovia federal em que, de acordo com o acórdão recorrido, há tráfico intenso de animais.4. A constatação de ocorrência de culpa da vítima por excesso de velocidade ou de mera fatalidade do destino reclamaria necessariamente o reexame do material fático-probatório, o que é vedado pela Súmula n. 7/STJ.5. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a revisão do arbitramento da reparação de danos morais e materiais somente é admissível nas hipóteses de determinação de montante exorbitante ou irrisório.6. Não há como conhecer de recurso especial em que não resta cumprido o requisito indispensável do prequestionamento e a parte não opõe embargos de declaração para buscar a manifestação do Tribunal a quo acerca do dispositivo suscitado. Incidência das Súmulas n. 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.7. Descabe ao Superior Tribunal de Justiça revisar os critérios levados em consideração pelo julgador ordinário para arbitramento do quantum devido a título de honorários advocatícios, em face do óbice consubstanciado na Súmula n. 7 da Corte.8. Recurso especial não-conhecido.(REsp 438831/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2006, DJ 02/08/2006 p. 237)

No entanto, conforme pode ser lido no REsp 647710/RJ, se a rodovia for privatizada a responsabilidade é objetiva da concessionária com base no Código de Defesa do Consumidor. Ela presta serviço diferenciado, apesar de estar a serviço do poder público ou desempenhar uma atividade que deveria ser prestada pelo Estado.

RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE EM ESTRADA. ANIMAL NA PISTA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES. Conforme jurisprudência desta Terceira Turma, as concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários, estão subordinadas à legislação consumerista. Portanto, respondem, objetivamente, por qualquer defeito na prestação do serviço, pela manutenção da rodovia em todos os aspectos, respondendo, inclusive, pelos acidentes provocados pela presença de animais na pista. Recurso especial provido.(REsp 647710/RJ, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/06/2006, DJ 30/06/2006 p. 216)

Responsabilidade civil pelo fato da coisa

Duas situações sobre o “fato da coisa” são tratadas no Código Civil: a questão do art. 937, CC (sobre a ruína de edifícios e construções) e também no art. 938, CC (que trata das coisas caídas ou arremessadas de um prédio).

Art. 937, CC - O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.

20

Page 21: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

“Ruína” não significa que todo o prédio deva vir abaixo causando dano (configuração da ruína total). Poderá também ser a ruína ser parcial (quando apenas a placa de um estabelecimento caia, causando dano, por exemplo).

Alguns autores possuem certa resistência em dizer que a responsabilidade é objetiva baseada neste artigo. Sérgio Cavalieri Filho afirma enfaticamente, juntamente com o professor Pablo Stolze, que não obstante haja doutrina dissonante, que cuida este artigo essencialmente de uma responsabilidade objetiva.

Este artigo 927, CC foi inspirado no art. 1386, do Código Civil Francês.Desde José de Aguiar Dias entende-se que não é possível que se prove

pelo dono do edifício ou construção que o reparo necessário fora feito. Esta responsabilidade continua sendo objetiva porque se pressupõe que se houve qualquer sorte de ruína e conseqüentemente o dano, houve realmente falta ou falha quanto aos reparos possivelmente efetuados.

Mas é possível que se reconheça uma responsabilidade entre o construtor e do dono, porque o Código Civil diz que serão responsabilizados todos aqueles que concorreram para o dano.

Art. 938, CC - Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido .

Qual o nome da ação judicial que deve propor a vítima que sofre o dano decorrente do objeto lançado ou caído contra a unidade residencial de onde partiu o projétil? É a chamada actio de effusis et dejectis.

Esta responsabilidade pelos objetos lançados ou caídos que recai sobre aquele que habitar o prédio, ou parte dele, também é uma espécie de responsabilidade objetiva.

O Código Civil utiliza conceito aberto contra quem recai esta espécie de responsabilidade civil indireta: poderá ser o proprietário, detentor, locatário, usufrutuário, contra qualquer deles, desde que habite a unidade residencial, o apartamento.

E se a vítima não souber de onde partiu o projétil? Aplica-se neste caso a teoria da causalidade alternativa. Esta teoria diz que quando não se identifica o responsável, pode-se imputar em alternatividade a responsabilidade civil. Neste caso se a vítima não souber de qual apartamento partiu o projétil, a vítima poderá colocar como réu em sua ação todo o condomínio. O condomínio indenizará a vítima e depois terá direito de regresso, se descobrir posteriormente quem foi o verdadeiro responsável pelo lançamento.

A jurisprudência diz que, se houver mais de um bloco no condomínio, de onde não se poderia ser arremessado nada no ponto em que a vítima foi atingida, todo este bloco será excluído desta ação apresentada contra o condomínio.

Questões especiais envolvendo fato da coisa e acidente com veículos

21

Page 22: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

1. Acidente de veículo e ausência da transferência do veículo nos registros do DETRAN;

Considerando-se o princípio básico do direito civil, segundo o qual, nos casos dos bens móveis, é a tradição que opera transferência de propriedade, mesmo que não tenha havido transferência administrativa no DETRAN, em caso de acidente, o antigo proprietário não tem responsabilidade civil.

Súmula 132, STJ - A AUSENCIA DE REGISTRO DA TRANSFERENCIA NÃO IMPLICA A RESPONSABILIDADE DO ANTIGO PROPRIETARIO POR DANO RESULTANTE DEACIDENTE QUE ENVOLVA O VEICULO ALIENADO.

Em caso de infração administrativa, o STJ, conforme se lê no REsp 1.024.815/RS, tem admitido solidariedade entre proprietário velho e o novo.

ADMINISTRATIVO. ALIENAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. MULTAS, RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO ALIENANTE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 134 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO.1. "Alienado veículo automotor sem que se faça o registro, ou ao menos a comunicação da venda, estabelece-se, entre o novo e o antigo proprietário, vínculo de solidariedade pelas infrações cometidas, só afastadas quando é o Detran comunicado da alienação, com a indicação do nome e endereço do novo adquirente. Não havendo dúvidas, in casu, de que as infrações não foram cometidas no período em que tinha o recorrido a propriedade do veículo, não deve ele sofrer qualquer tipo de sanção" (REsp 965.847/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de 14.03.08).2. Recurso especial não provido.(REsp 1024815/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2008, DJe 04/09/2008)

28 de maio de 2009

2. Acidente de veículo e locação de veículo automotor.

A súmula 492, STF estabelece, com fundamento na teoria do risco que empresas locadoras de veículos são solidariamente responsáveis com o locatário por dano causado a terceiro.

Súmula 492, STF - A EMPRESA LOCADORA DE VEÍCULOS RESPONDE, CIVIL E SOLIDARIAMENTE COM O LOCATÁRIO, PELOS DANOS POR ESTE CAUSADOS A TERCEIRO, NO USO DO CARRO LOCADO.

A solidariedade não se presume. Mas, a partir da idéia do artigo 942, CC, todo aquele que concorre para o ilícito será responsável pela indenização. Mesmo que seja uma regra geral de solidariedade, é o entendimento do STF.

Art. 942, CC - Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932.

22

Page 23: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

2) RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO DE TERCEIRO

Novo sistema do Código Civil de 2002

Inicialmente, vale referir que as hipóteses de responsabilidade por ato de terceiro, previstas no art. 932, CC, não pressupõe mais presunções de culpa (culpa in eligendo ou culpa in vigilando), traduzindo responsabilidade objetiva nos termos do art. 933, CC.

Exemplo: o pai que tem um filho que causa um dano a outrem não poderá alegar que estava o vigiando e não teve culpa quanto a sua conduta; e também o empregador não se eximirá do ressarcimento dos danos causados por seu empregado dizendo que o escolheu bem, que não possuía culpa pela escolha dele.

Art. 933, CC - As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte (com ou sem culpa), responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.

Questionamento da culpa

No entanto, mesmo que não possa retirar-se da indenização o empregador, respondendo de forma objetiva, nada impede que seja alegado em contestação que houve ou que não houve a culpa por parte do empregado que praticou a conduta.

O dever de indenizar, nestas hipóteses de dano proveniente de fato de terceiro, é objetivo; mas poderá ele defender-se dizendo que o terceiro não teve culpa quando do acontecimento da conduta, analisando o aspecto subjetivo.

Exemplo: empregador diz em sua contestação que o seu empregado não teve culpa ao realizar a conduta. Isso quando for possível a discussão da culpa no ato ocorrido.

Hipóteses de responsabilidade pelo fato de terceiro

Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:

Quando o caput diz que “são também responsáveis”, o Código faz uma referência a uma solidariedade passiva, com regramento mitigado, como será estudado mais adiante.

I - os pais, pelos fi lhos menores (incapazes em geral) que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;

O Código, no inciso I, não diferencia se os filhos são absoluta ou relativamente incapazes, como era feito no Código Civil de 1916. O Código Civil de 2002 menciona neste inciso que somente será o pai responsável que estiver o filho sob sua autoridade e em sua companhia.

23

Page 24: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

E o que acontece com a guarda unilateral? Não é dever dos pais, em mesmo grau, o dever de educar? O STJ, ao julgar o REsp 540459/RS, firmou entendimento no sentido de afastar a responsabilidade de qualquer dos pais que não tenha o filho sob sua guarda e companhia.

REsp 540459 / RS RECURSO ESPECIAL 2003/0068859-6 Relator(a) Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO (1108) Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 18/12/2003 Data da Publicação/Fonte DJ 22/03/2004 p. 299 Ementa Acidente de trânsito. Responsabilidade do proprietário do veículo e dos pais do motorista. Precedentes da Corte. 1. Prevalece a responsabilidade do motorista, na linha da jurisprudência da Corte, quando de acordo com a prova dos autos não foi afastada a presunção de culpa do proprietário que empresta o seu veículo ao terceiro causador do acidente. 2. A responsabilidade do pai foi afastada porque não detinha a guarda nem estava o filho em sua companhia, mas não a da mãe, porque não enfrentado o argumento da falta de condições econômicas apresentado no especial para afastar seu dever de indenizar, prevalecendo, portanto, precedentes da Corte amparados no art. 1.521, I, do Código Civil de 1916. 3. Recurso especial não conhecido.

Professor Pablo Stolze diz que o afastamento desta responsabilidade é causa de afronta também às razões políticas determinadas constitucionalmente quanto ao dever de educação, já que a Carta Maior dá o dever de educar para ambos os pais, sem ressalvas. Não importa se estão na guarda e na companhia dos filhos.

II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;

Este inciso possui mesmo regramento, por disposição final do inciso II, das regras expostas acima, do inciso I.

Nestas duas hipóteses, tanto no inciso I, quanto no inciso II, a solidariedade passiva é especial porque caracteriza uma forma de subsidiariedade. É solidariedade porque qualquer dos dois responderá pela dívida, pela indenização. Mas primeiro responde o representante (qualquer dois pais), depois o representado (filho).

O CC/1916 entendia que o absolutamente incapaz era considerado inimputável. Mesmo que ele possuísse muitos recursos, não arcaria com nenhum ressarcimento de dano por ele praticado. O CC/1916 assentia que a vítima ficaria sem receber nada, por haver uma proteção quase que absoluta para com o absolutamente incapaz.

Silvio Rodrigues dá o exemplo do inimputável, enfermo mental milionário, dizendo que era absurdo que ele não respondesse nada, ficando a cargo da indenização seu curador, que poderia ser paupérrimo.

Hoje, o CC/2002 diz que a vítima não poderá ficar sem ressarcimento. Vide a observação abaixo.

Observação: o art. 928, CC, modificando a sistemática tradicional do CC/1916, passou a admitir a responsabilidade civil, ainda que subsidiária, do incapaz.

24

Page 25: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Art. 928, CC - O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes (solidariedade passiva subsidiária, especial) .

Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem (regra geral do CC/2002, nenhuma execução poderá esgotar o patrimônio mínimo de ninguém, muito menos do incapaz).

O incapaz (absolutamente ou relativamente) terá responsabilidade civil quando seu representante não tiver qualquer condição econômica de indenizar a vítima ou quando ele não tiver a obrigação de indenizar a vítima, a exemplo da imposição ao adolescente da medida socioeducativa de reparação de danos, na forma do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Estas medidas socioeducativas possuem característica pedagógica e educadora. Não há qualquer sentido em estender a obrigação de responsabilidade aos pais, não dando a atenção a estes atributos que devem incidir contra o menor causador do ato.

III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos , no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele ;

O conceito de “comitente” traduz uma série de entendimentos. Em geral, o comitente é parte de uma relação jurídica de preposição. Nem sempre o preposto é empregado. Exemplo: contrato de comissão/ de agência/ de corretagem possui comitente e preposto. São outras relações de preposição afora a relação de emprego.

O empregador responde pelo ato do empregado. A vítima poderá demandar o empregado? SIM. Embora normalmente demande diretamente o empregador. O empregador responderá objetivamente (relação interna). Mas, poderá questionar a existência de culpa ou não do seu empregado (relação externa).

Uma vez que, a responsabilidade por ato de terceiro objetivou-se, perdeu razão de ser a súmula 341, STF que estabelecia presunção de culpa do empregador em face do empregado. “Teoria da substituição” é como menciona este fenômeno uma parte da doutrina, sobre esta situação do empregador entrar no lugar do empregado ao momento do ressarcimento dos danos.

Súmula 341, STF - É PRESUMIDA A CULPA DO PATRÃO OU COMITENTE PELO ATO CULPOSO DO EMPREGADO OU PREPOSTO (teoria da substituição).

O empregador responde pelo ato do empregado, quando está este último trabalhando (no exercício efetivo do trabalho) ou quando atua em razão dele (estando somente à disposição do empregador).

Exemplo: se o empregado está com o carro da empresa, se dirigindo para o trabalho, e vem a atropelar alguém, em tese o empregador será responsabilizado por este ato, em havendo culpa do empregado.

25

Page 26: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

E no caso de ser domingo, dirigindo-se para a praia o empregado, e com o carro da empresa atropelar alguém, continua sendo responsabilidade do empregador? Entende o STJ que há responsabilidade do proprietário do carro, do empregador, porque a título de comodato emprestou o carro ao seu empregado.

IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;

O dono de hotel/hospedaria/ qualquer outro estabelecimento que albergue pessoas em troca de uma contraprestação possui responsabilidade por todo hóspede que está em seu estabelecimento albergado.

Exemplo: se o hóspede que está se embriagando no bar do hotel, vindo a lesionar outro hóspede, esta vítima poderá voltar-se contra o dono do hotel. É dever do hotel, parar de vender bebida para este hóspede embriagado nas dependências do estabelecimento.

Dono de escola também responde por ato de educando menor. Escola neste caso do inciso é a privada. Diferente se a escola fosse pública, porque neste caso a responsabilidade do Estado, em sua posição de garante.

Os pais transferem para a escola privada, e por conseqüência, para o dono da escola, a responsabilidade de educar e cuidar zelosamente de seus filhos.

Em se tratando de educando maior, esta responsabilidade não existe. Não haveria sentido nesta responsabilidade, não há esta delegação do cuidado e do zelo para o estabelecimento educacional por parte dos pais. Apenas ocorre em relação aos educandos menores.

Observação: o bullying, forma de violência moral e física, especialmente observado em escolas e universidades pode resultar na configuração da responsabilidade civil do estabelecimento educacional por omissão.

V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.

Para evitar enriquecimento sem causa, todos aqueles que participarem do produto do crime, responderão civilmente sobre os danos que causaram a terceiros.

Direito de regresso

Art. 934, CC - Aquele que ressarcir o dano causado por outrem pode reaver o que houver pago daquele por quem pagou, salvo se o causador do dano for descendente seu, absoluta ou relativamente incapaz.

Não cabe a ação regressiva quando a pessoa por quem se pagou for seu descendente absoluta ou relativamente incapaz.

26

Page 27: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

DANO MORAL

HISTÓRICO

Em um primeiro momento, o direito negava a reparabilidade do dano moral, argumentando-se que a sua incerteza impediria a sua configuração.

Segundo o professor Yussef Said Cahali foi somente com a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, V e X, CF que o dano moral foi dotado de autonomia jurídica, independentemente do dano material sofrido.

Art. 5º, CFV - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;(...)X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...)

Augustinho Alvim diz que o CC/1916 não proibia e nem incentivava a configuração do dano moral. Mas, nesta época, havia muita resistência do poder judiciário em estabelecê-lo frente aos danos causados.

Com o advento do Código Civil de 2002, o artigo 186, CC, se mostra na mesma linha harmônica do entendimento da CF/1988, pregando a autonomia do dano moral.

Art. 186, CC - Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (autonomia do direito moral) , comete ato ilícito.

CONCEITO

Dano moral traduz lesão a direito da personalidade. Dano moral não se confunde com mero aborrecimento daquele que foi perturbado.

Já foi visto anteriormente, na aula sobre pessoa jurídica, que se tem admitido na doutrina e na jurisprudência (com até súmula a respeito) a incidência de dano moral envolvendo a pessoa jurídica.

QUESTÕES ATUAIS DE JURISPRUDÊNCIA SOBRE DANO MORAL

1) Súmula 370, STJ

Súmula nova do STJ, de fevereiro de 2009.

Súmula 370, STJ - Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado.

2) Súmula 362, STJ

27

Page 28: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Súmula 362, STJ - A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.

3) Súmula 281, STJ

Súmula 281, STJ - A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação previstana Lei de Imprensa (embora a lei de imprensa tenha sido rechaçada pelo STF, este entendimento é importante, que veda a possibilidade de tarifamento do dano moral) .

4) Súmula 227, STJ

Súmula 227, STJ - A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.

5) Dano estético

O dano estético não é somente um dano físico. A imagem não é apenas imagem retrato (que corresponde mais ao dano físico sofrido pelo indivído),mas é também a imagem-atributo da pessoa (com reflexo dentro da seara do dano moral).

O réu pode alegar que no pagamento em virtude do dano estético, engloba-se o dano moral? NÃO, a orientação geral do STJ, em mais de uma oportunidade, é de se admitir a cumulação de pedidos de indenização por dano estético e dano moral (REsp 251719/SP e REsp 910794/RJ).

CIVIL. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. CUMULAÇÃO. Os danos estéticos devem ser indenizados independentemente do ressarcimento dos danos morais, sempre que tiverem causa autônoma. Recurso especial conhecido e provido em parte.(REsp 251719/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/10/2005, DJ 02/05/2006 p. 299)

28

Page 29: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

RECURSO ESPECIAL DE JPGB E OUTROS. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. HOSPITAL MUNICIPAL. AMPUTAÇÃO DE BRAÇO DE RECÉM-NASCIDO. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM FAVOR DOS PAIS E IRMÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. É possível a cumulação de indenização por danos estético e moral, ainda que derivados de um mesmo fato, desde que um dano e outro possam ser reconhecidos autonomamente, ou seja, devem ser passíveis de identificação em separado. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, em Hospital Municipal, recém-nascido teve um dos braços amputado em virtude de erro médico, decorrente de punção axilar que resultou no rompimento de veia, criando um coágulo que bloqueou a passagem de sangue para o membro superior. 3. Ainda que derivada de um mesmo fato - erro médico de profissionais da rede municipal de saúde -, a amputação do braço direito do recém-nascido ensejou duas formas diversas de dano, o moral e o estético. O primeiro, correspondente à violação do direito à dignidade e à imagem da vítima, assim como ao sofrimento, à aflição e à angústia a que seus pais e irmão foram submetidos, e o segundo, decorrente da modificação da estrutura corporal do lesado, enfim, da deformidade a ele causada.4. Não merece prosperar o fundamento do acórdão recorrido no sentido de que o recém-nascido não é apto a sofrer o dano moral, por não possui capacidade intelectiva para avaliá-lo e sofrer os prejuízos psíquicos dele decorrentes. Isso, porque o dano moral não pode ser visto tão-somente como de ordem puramente psíquica - dependente das reações emocionais da vítima -, porquanto, na atual ordem jurídica-constitucional, a dignidade é fundamento central dos direitos humanos, devendo ser protegida e, quando violada, sujeita à devida reparação. 5. A respeito do tema, a doutrina consagra entendimento no sentido de que o dano moral pode ser considerado como violação do direito à dignidade, não se restringindo, necessariamente, a alguma reação psíquica (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, pp. 76/78). 6. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 447.584/RJ, de relatoria do Ministro Cezar Peluso (DJ de 16.3.2007), acolheu a proteção ao dano moral como verdadeira "tutela constitucional da dignidade humana", considerando-a "um autêntico direito à integridade ou à incolumidade moral, pertencente à classe dos direitos absolutos". 7. O Ministro Luix Fux, no julgamento do REsp 612.108/PR (1ª Turma, DJ de 3.11.2004), bem delineou que "deflui da Constituição Federal que a dignidade da pessoa humana é premissa inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual". 8. Com essas considerações, pode-se inferir que é devida a condenação cumulativa do Município à reparação dos danos moral e estético causados à vítima, na medida em que o recém-nascido obteve grave deformidade - prejuízo de caráter estético - e teve seu direito a uma vida digna seriamente atingido - prejuízo de caráter moral. Inclusive, a partir do momento em que a vítima adquirir plena consciência de sua condição, a dor, o vexame, o sofrimento e a humilhação certamente serão sentimentos com os quais ela terá de conviver ao longo de sua vida, o que confirma ainda mais a efetiva existência do dano moral. Desse modo, é plenamente cabível a cumulação dos danos moral e estético nos termos em que fixados na r. sentença, ou seja, conjuntamente o quantum indenizatório deve somar o total de trezentos mil reais (R$ 300.000,00). Esse valor mostra-se razoável e proporcional ao grave dano causado ao recém-nascido, e contempla também o caráter punitivo e pedagógico da condenação.

29

Page 30: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

9. Quanto ao pedido de majoração da condenação em danos morais em favor dos pais e do irmão da vítima, ressalte-se que a revisão do valor da indenização somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada. Essa excepcionalidade, contudo, não se aplica à hipótese dos autos. Isso, porque o valor da indenização por danos morais - fixado em R$ 20.000,00, para cada um dos pais, e em R$ 5.000,00, para o irmão de onze (11) anos, totalizando, assim, R$ 45.000,00 -, nem é irrisório nem desproporcional aos danos morais sofridos por esses recorrentes. Ao contrário, a importância assentada foi arbitrada com bom senso, dentro dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. 10. Recurso especial parcialmente provido, apenas para determinar a cumulação dos danos moral e estético, nos termos em que fixados na r. sentença, totalizando-se, assim, trezentos mil reais (R$ 300.000, 00). RECURSO ESPECIAL ADESIVO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REVISÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. RECURSO NÃO-CONHECIDO. 1. O recurso especial adesivo fica prejudicado quanto ao valor da indenização da vítima, tendo em vista o exame do tema por ocasião do provimento parcial do recurso especial dos autores. 2. O quantum indenizatório dos danos morais fixados em favor dos pais e do irmão da vítima, ao contrário do alegado pelo Município, não é exorbitante (total de R$ 45.000,00). Conforme anteriormente ressaltado, esses valores foram fixados em patamares razoáveis e dentro dos limites da proporcionalidade, de maneira que é indevida sua revisão em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 3. Recurso especial adesivo não-conhecido. (REsp 910794/RJ, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 04/12/2008)

QUANTIFICAÇÃO DO DANO MORAL

Existem dois sistemas jurídicos que apresentam critérios para que seja realizada a quantificação do valor a ser pago a título de dano moral:

1. Sistema livre ou sistema do arbitramento

Professor Araken de Assis, Judith Martins Costa, entre outros, defendem esta espécie de sistema livre. Tem ele base nos artigos 4º, LICC e 126, CPC.

Art. 126, CPC - O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito . (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

Art. 4o , LICC - Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito .       

Este sistema não dá liberdade absoluta para que seja fixado o dano moral pelo Juiz, porque a jurisprudência tem estabelecido limitações para este sistema de arbitramento.

O sistema do arbitramento é o mais utilizado no sistema civil brasileiro. Este sistema precisa ser constantemente aperfeiçoado, para que não se incentive a indústria do dano moral.

Está ele também em consonância com a CF/1988, que não fixou o valor limite para que seja realizada a concessão do dano moral.

2. Sistema do tarifamento legal

30

Page 31: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Este segundo sistema pretende estabelecer em lei valores, já tabelados, para o estabelecimento da quantia ser paga a título de dano moral. Tramitam no congresso projetos de lei que pretendem implantar o tabelamento do dano moral (PL 7124/2002 e PL 1443/2003).

Professor Pablo Stolze diz que a hermenêutica de pautar o valor do dano moral sobre o valor de rendimento da vítima fere todo o sistema da responsabilidade, com a conseqüente afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana.

DANO BUMERANGUE

Segundo o professor Salomão Resedá, em sua obra “A função social do dano moral”, da Editora Conceito, este tipo de dano traduz uma situação em que o próprio infrator como conseqüência de seu comportamento anterior danoso sofre um prejuízo causado pela própria vítima.

Exemplo: Caio guiando seu veículo abalroa o veículo de Tício, causando-lhe um dano. Tício, em ato contínuo, reagindo ao evento, deflagra tiros no carro de Caio, causando prejuízos para ele.

Resultará neste caso uma compensação de danos. É o dano que “vai e volta”, como se fosse um bumerangue.

FUNÇÃO PEDAGÓGICA DO DANO MORAL E A TEORIA DO PUNITIVE DAMAGE

Não é possível que sejam equiparados o sistema de responsabilidade civil dos Estados Unidos com a teoria do sistema de responsabilidade civil no Brasil aplicado. Esta teoria do punitive damage possui acertos e erros e vem sendo aprimorada pelos estudiosos dos Estados Unidos.

Professor Pablo Stolze diz que não basta apenas a tutela dos direitos coletivos quanto aos danos corriqueiramente causados. É preciso que haja atenção à tutela dos direitos individuais de mesmo modo, com mesma intensidade.

A indenização não poderá possuir apenas caráter ressarcitório/ compensatório. Deve ter ela também o cunho pedagógico e de ensinamento para os demais danos que venha o causador do dano efetuar. Uma característica de sanção, fundada em uma cláusula privada.

A teoria do desestímulo começa a se fazer presente, conforme se pode verificar na redação original do projeto de reforma do Código Civil que pretende alterar o artigo 944, CC para estabelecer que a indenização por dano moral deve-se compensar a vítima e desestimular as condutas futuras do lesante.

Além disso, o enunciado 379, da IV Jornada de Direito Civil, interpretando o direito positivo já admite a teoria:

Enunciado 379, IV Jornada de Direito Civil: Art. 944 - O art. 944, caput, do Código Civil não afasta a possibilidade de se reconhecer a função punitiva ou pedagógica da responsabilidade civil .

31

Page 32: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

 O próprio STJ tem proferido decisões admitindo a teoria do desestímulo,

com a função pedagógica (REsp 910794/RJ e REsp 965500/ES). Professor Pablo Stolze diz que, se houvesse legislação específica, seria mais indicado que a quantia elevada, a ser paga a título de desestímulo, fosse direcionada a centros de caridade e hospitais (fundos específicos e assistenciais, evitando o enriquecimento sem causa da vítima).

RECURSO ESPECIAL DE JPGB E OUTROS. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ERRO MÉDICO. HOSPITAL MUNICIPAL. AMPUTAÇÃO DE BRAÇO DE RECÉM-NASCIDO. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM FAVOR DOS PAIS E IRMÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. É possível a cumulação de indenização por danos estético e moral, ainda que derivados de um mesmo fato, desde que um dano e outro possam ser reconhecidos autonomamente, ou seja, devem ser passíveis de identificação em separado. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, em Hospital Municipal, recém-nascido teve um dos braços amputado em virtude de erro médico, decorrente de punção axilar que resultou no rompimento de veia, criando um coágulo que bloqueou a passagem de sangue para o membro superior. 3. Ainda que derivada de um mesmo fato - erro médico de profissionais da rede municipal de saúde -, a amputação do braço direito do recém-nascido ensejou duas formas diversas de dano, o moral e o estético. O primeiro, correspondente à violação do direito à dignidade e à imagem da vítima, assim como ao sofrimento, à aflição e à angústia a que seus pais e irmão foram submetidos, e o segundo, decorrente da modificação da estrutura corporal do lesado, enfim, da deformidade a ele causada. 4. Não merece prosperar o fundamento do acórdão recorrido no sentido de que o recém-nascido não é apto a sofrer o dano moral, por não possui capacidade intelectiva para avaliá-lo e sofrer os prejuízos psíquicos dele decorrentes. Isso, porque o dano moral não pode ser visto tão-somente como de ordem puramente psíquica - dependente das reações emocionais da vítima -, porquanto, na atual ordem jurídica-constitucional, a dignidade é fundamento central dos direitos humanos, devendo ser protegida e, quando violada, sujeita à devida reparação. 5. A respeito do tema, a doutrina consagra entendimento no sentido de que o dano moral pode ser considerado como violação do direito à dignidade, não se restringindo, necessariamente, a alguma reação psíquica (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007, pp. 76/78). 6. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 447.584/RJ, de relatoria do Ministro Cezar Peluso (DJ de 16.3.2007), acolheu a proteção ao dano moral como verdadeira "tutela constitucional da dignidade humana", considerando-a "um autêntico direito à integridade ou à incolumidade moral, pertencente à classe dos direitos absolutos". 7. O Ministro Luix Fux, no julgamento do REsp 612.108/PR (1ª Turma, DJ de 3.11.2004), bem delineou que "deflui da Constituição Federal que a dignidade da pessoa humana é premissa inarredável de qualquer sistema de direito que afirme a existência, no seu corpo de normas, dos denominados direitos fundamentais e os efetive em nome da promessa da inafastabilidade da jurisdição, marcando a relação umbilical entre os direitos humanos e o direito processual".

32

Page 33: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

8. Com essas considerações, pode-se inferir que é devida a condenação cumulativa do Município à reparação dos danos moral e estético causados à vítima, na medida em que o recém-nascido obteve grave deformidade - prejuízo de caráter estético - e teve seu direito a uma vida digna seriamente atingido - prejuízo de caráter moral. Inclusive, a partir do momento em que a vítima adquirir plena consciência de sua condição, a dor, o vexame, o sofrimento e a humilhação certamente serão sentimentos com os quais ela terá de conviver ao longo de sua vida, o que confirma ainda mais a efetiva existência do dano moral. Desse modo, é plenamente cabível a cumulação dos danos moral e estético nos termos em que fixados na r. sentença, ou seja, conjuntamente o quantum indenizatório deve somar o total de trezentos mil reais (R$ 300.000,00). Esse valor mostra-se razoável e proporcional ao grave dano causado ao recém-nascido, e contempla também o caráter punitivo e pedagógico da condenação. 9. Quanto ao pedido de majoração da condenação em danos morais em favor dos pais e do irmão da vítima, ressalte-se que a revisão do valor da indenização somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada. Essa excepcionalidade, contudo, não se aplica à hipótese dos autos. Isso, porque o valor da indenização por danos morais - fixado em R$ 20.000,00, para cada um dos pais, e em R$ 5.000,00, para o irmão de onze (11) anos, totalizando, assim, R$ 45.000,00 -, nem é irrisório nem desproporcional aos danos morais sofridos por esses recorrentes. Ao contrário, a importância assentada foi arbitrada com bom senso, dentro dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. 10. Recurso especial parcialmente provido, apenas para determinar a cumulação dos danos moral e estético, nos termos em que fixados na r. sentença, totalizando-se, assim, trezentos mil reais (R$ 300.000, 00). RECURSO ESPECIAL ADESIVO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REVISÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. RECURSO NÃO-CONHECIDO.1. O recurso especial adesivo fica prejudicado quanto ao valor da indenização da vítima, tendo em vista o exame do tema por ocasião do provimento parcial do recurso especial dos autores.2. O quantum indenizatório dos danos morais fixados em favor dos pais e do irmão da vítima, ao contrário do alegado pelo Município, não é exorbitante (total de R$ 45.000,00). Conforme anteriormente ressaltado, esses valores foram fixados em patamares razoáveis e dentro dos limites da proporcionalidade, de maneira que é indevida sua revisão em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ.3. Recurso especial adesivo não-conhecido.(REsp 910.794/RJ, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 04/12/2008)

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO MOVIDA EM RAZÃO DE ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO CAUSADO POR "BURACO' EM RODOVIA EM MAU ESTADO DE CONSERVAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO APURADA E RECONHECIDA, PELA SENTENÇA E PELO ACÓRDÃO, A PARTIR DE FARTO E ROBUSTO MATERIAL PROBATÓRIO. CONDENAÇÃO DO ESTADO AO PAGAMENTO DE PENSIONAMENTO VITALÍCIO E DANOS MORAIS. ALEGADA EXORBITÂNCIA DO VALOR INDENIZATÓRIO (DE R$ 30.000,00) E DE HONORÁRIOS (R$ 5.000,00). DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO ÓBICE INSCRITO NA SÚMULA 7/STJ. MANIFESTA LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO, ORA RECORRENTE. RECURSO ESPECIAL NÃO-CONHECIDO. 1. Trata-se de recurso especial (fls. 626/634) interposto pelo Estado do Espírito Santo em autos de ação indenizatória de responsabilidade civil e de danos morais, com fulcro no art. 105, III, "a", do permissivo constitucional, contra acórdão prolatado pelo Tribunal Justiça do Estado do Espírito Santo que, em síntese, condenou o Estado recorrente ao pagamento de danos morais e pensão vitalícia à parte ora recorrida.

33

Page 34: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

2. Conforme registram os autos, diversos familiares do autor, inclusive sua filha e esposa, faleceram em razão de acidente automobilístico causado, consoante se constatou na instrução processual, pelo mau estado de conservação da rodovia em que trafegavam, na qual um buraco de grande proporção levou ao acidente fatal ora referido. Essa evidência está consignada na sentença, que de forma minudente realizou exemplar análise das provas coligidas, notadamente do laudo pericial 3. Em recurso especial duas questões centrais são alegadas pelo Estado do Espírito Santo: a - exorbitância do valor fixado a título de danos morais, estabelecido em R$ 30.000,00; b - inadequação do valor determinado para os honorários (R$ 5.000,00).4. Todavia, no que se refere à adequação da importância indenizatória indicada, de R$ 30.000,00, uma vez que não se caracteriza como ínfima ou exorbitante, refoge por completo à discussão no âmbito do recurso especial, ante o óbice inscrito na Súmula 7/STJ, que impede a simples revisão de prova já apreciada pela instância a quo, que assim dispôs: O valor fixado pra o dano moral está dentro dos parâmetros legais, pois há eqüidade e razoabalidade no quantum fixado. A boa doutrina vem conferindo a esse valor um caráter dúplice, tanto punitivo do agente quanto compensatório em relação à vítima.5. Quanto ao valor de honorários, semelhante juízo se aplica, uma vez que decorrente exclusivamente da apreciação dos elementos fáticos presentes no processo. Confira-se (fl. 606): Em relação aos honorários de sucumbência, estes são reconhecidos como um direito do advogado da parte que venceu a demanda, devendo a parte vencida, neste caso o apelante ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, arcar com o ônus sucumbencial. Entendo que, em se tratando do caso concreto, o valor dos honorários advocatícios foi fixado de forma equilibrada e justa.6. A alegada ilegitimidade passiva do Estado querelante se encontra determinantemente afastada, haja vista o expresso liame causal estabelecido nos autos, com amparo em elementos probatórios fartos e robustos, demonstrados à saciedade no curso da instrução processual.7. Recurso especial conhecido em parte e não-provido.(REsp 965500/ES, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2007, DJ 25/02/2008 p. 1)

RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO

Este tema tem caído constantemente em várias provas de Magistratura. Aumentaram em 165%, em 06 anos, os processos veiculando a responsabilidade civil do médico, dentro do Superior Tribunal de Justiça.

CONCEITO

O erro médico (chamado por alguns autores de dano médico) é o dano imputável ao exercente da medicina, nos termos do artigo 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor cumulado com o artigo 951, do Código Civil, segundo a apuração de sua culpa profissional (imperícia, imprudência ou negligência, plenamente demonstrada).

Art. 14, CDC - O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.(...)        § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa. 

34

Page 35: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Art. 951, CDC - O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

RESULTADO E RESPONSABILIDADE DAS DIVERSAS ÁREAS DA MEDICINA

A) Cirurgião plástico estético

O cirurgião plástico estético responde de que forma? No caso do cirurgião plástico, que faz o procedimento de cirurgia estética, assume a obrigação de resultado.

Para o cirurgião estético, que assume esta obrigação de resultado, há entendimento no sentido de sua responsabilidade objetiva quando da ocorrência do dano. Porque médicos em geral, como regra, respondem subjetivamente perante o dano causado. Professor Pablo Stolze não concorda com este entendimento da jurisprudência.

B) Anestesiologista

E o anestesiologista responde por qual resultado? Segundo o professor Jurandir Sebastião o anestesiologista, como os médicos em geral, assume uma obrigação de meio, uma vez que a medicina não contra todas as reações adversas.

TRANSFUSÃO DE SANGUE E TESTEMUNHAS DE JEOVÁ

Aqui é mencionada a transfusão de sangue quando for este instrumento o único meio para que haja salvamento da vida da testemunha de Jeová. Existem duas correntes na doutrina:

1ª correnteDefendida por autores como Gustavo Tepedino sustenta que neste caso irá prevalecer a liberdade de crença em respeito à dimensão de dignidade do paciente. É preciso ressalvar que o pai nunca poderá embasar a recusa da transfusão para seu filho menor. A ninguém é dado poder renunciar a direito da personalidade de outrem.

2ª correnteProfessor Pablo Stolze é adepto desta segunda corrente, juntamente com Fredie Didier e a maioria da doutrina. O médico deve atuar para salvar a vida do paciente segundo o princípio da proporcionalidade (Resolução 1021/1980 do Conselho Federal da Medicina e artigos 46 a 56 do Código de Ética Médica). Na jurisprudência, ver decisões segundo esta corrente, como do Tribunal de Justiça/SP na Apelação Cível 123430-4.

35

Page 36: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO - APELAÇÃO CÍVEL N° 123.430-4/4 APTE.: SILVANA REGINA ZANELLA APDO.: SOCIEDADE BENEFICENTE HOSPITAL SANTO ANTÔNIO S/C LTDA. E OUTROS EMENTA: Indenizatória - Reparação de danos - Testemunha de Jeová - Recebimento de transfusão de sangue quando de sua internação – Convicções religiosas que não podem, prevalecer perante o bem maior tutelado peta Constituição federal que é a vida - Conduta dos médicos, por outro lado, que pautou-se dentro da lei e ética profissional, posto que somente efetuaram as transfusões sangüíneas após esgotados todos os tratamentos alternativos - Inexistência, ademais, de recusa expressa a receber transfusão de sangue quando da internação da autora — Ressarcimento, por outro lado, de despesas efetuados com exames médicos, entre outras, que não merece acolhido, posto não terem sido os valores despendidos pela apelante - Recurso improvido.

QUESTÕES ESPECIAIS ENVOLVENDO A RESPONSABILIDADE MÉDICA

1) O que é termo de consentimento informado ?

Com base no artigo 15, CC, o termo de consentimento informado, à luz do princípio da boa-fé objetiva, é a declaração firmada pelo paciente pela qual ele toma ciência expressa dos riscos e das conseqüências da intervenção médica.

Art. 15, CC - Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Lembra-nos o professor Miguel Kfouri Neto que este termo não significa a possibilidade de haver a isenção do médico pelo seu erro, por constar a enumeração dos riscos aceita pelo paciente.

2) Uso indevido de meio por um médico/ diagnóstico errado

Poderá o médico também ser civilmente responsabilizado pela perda de uma chance, de um diagnóstico antecipado corretamente (uso indevido de meios). Neste caso, a indenização é reduzida.

3) Responsabilidade do hospital

Em mais de uma oportunidade, o STJ tem reiterado a tese de que a responsabilidade de hospitais e clínicas é SUBJETIVA por erro médico (mesmo o hospital sendo uma pessoa jurídica, e estando ele em uma relação de consumo, quando deveria a responsabilidade também ser objetiva). Vide os seguintes julgados REsp 258389/SP e REsp 908359/SC.

36

Page 37: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

CIVIL. INDENIZAÇÃO. MORTE. CULPA. MÉDICOS. AFASTAMENTO. CONDENAÇÃO. HOSPITAL. RESPONSABILIDADE. OBJETIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1 - A responsabilidade dos hospitais, no que tange à atuação técnico-profissional dos médicos que neles atuam ou a eles sejam ligados por convênio, é subjetiva, ou seja, dependente da comprovação de culpa dos prepostos, presumindo-se a dos preponentes. Nesse sentido são as normas dos arts. 159, 1521, III, e 1545 do Código Civil de 1916 e, atualmente, as dos arts. 186 e 951 do novo Código Civil, bem com a súmula 341 - STF (É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.). 2 - Em razão disso, não se pode dar guarida à tese do acórdão de, arrimado nas provas colhidas, excluir, de modo expresso, a culpa dos médicos e, ao mesmo tempo, admitir a responsabilidade objetiva do hospital, para condená-lo a pagar indenização por morte de paciente. 3 - O art. 14 do CDC, conforme melhor doutrina, não conflita com essa conclusão, dado que a responsabilidade objetiva, nele prevista para o prestador de serviços, no presente caso, o hospital, circunscreve-se apenas aos serviços única e exclusivamente relacionados com o estabelecimento empresarial propriamente dito, ou seja, aqueles que digam respeito à estadia do paciente (internação), instalações, equipamentos, serviços auxiliares (enfermagem, exames, radiologia), etc e não aos serviços técnicos-profissionais dos médicos que ali atuam, permanecendo estes na relação subjetiva de preposição (culpa). 4 - Recurso especial conhecido e provido para julgar improcedente o pedido. (REsp 258389/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2005, DJ 22/08/2005 p. 275)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL.1. A doutrina tem afirmado que a responsabilidade médica empresarial, no caso de hospitais, é objetiva, indicando o parágrafo primeiro do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor como a norma sustentadora de tal entendimento.Contudo, a responsabilidade do hospital somente tem espaço quando o dano decorrer de falha de serviços cuja atribuição é afeta única e exclusivamente ao hospital. Nas hipóteses de dano decorrente de falha técnica restrita ao profissional médico, mormente quando este não tem nenhum vínculo com o hospital – seja de emprego ou de mera preposição –, não cabe atribuir ao nosocômio a obrigação de indenizar.2. Na hipótese de prestação de serviços médicos, o ajuste contratual – vínculo estabelecido entre médico e paciente – refere-se ao emprego da melhor técnica e diligência entre as possibilidades de que dispõe o profissional, no seu meio de atuação, para auxiliar o paciente. Portanto, não pode o médico assumir compromisso com um resultado específico, fato que leva ao entendimento de que, se ocorrer dano ao paciente, deve-se averiguar se houve culpa do profissional – teoria da responsabilidade subjetiva.No entanto, se, na ocorrência de dano impõe-se ao hospital que responda objetivamente pelos erros cometidos pelo médico, estar-se-á aceitando que o contrato firmado seja de resultado, pois se o médico não garante o resultado, o hospital garantirá. Isso leva ao seguinte absurdo: na hipótese de intervenção cirúrgica, ou o paciente sai curado ou será indenizado – daí um contrato de resultado firmado às avessas da legislação.3. O cadastro que os hospitais normalmente mantêm de médicos que utilizam suas instalações para a realização de cirurgias não é suficiente para caracterizar relação de subordinação entre médico e hospital. Na verdade, tal procedimento representa um mínimo de organização empresarial.4. Recurso especial do Hospital e Maternidade São Lourenço Ltda. provido.(REsp 908359/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/08/2008, DJe 17/12/2008)

Em danos advindos de falta de estrutura, de comida oferecida de má qualidade, infecção hospitalar, as responsabilidades do hospital serão aferidas de forma OBJETIVA.

37

Page 38: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

Professor Pablo Stolze entende que este entendimento do STJ é incongruente porque o CDC abriu a exceção da aferição de culpa apenas em sede de responsabilidade de profissional liberal. Deveria a responsabilidade do hospital, mesmo em caso de erro médico, ser objetiva, com ação regressiva baseada na culpa do profissional.

Observação: existe precedente admitindo inclusive responsabilidade de plano de saúde por erro médico (REsp 328309/RJ).

CIVIL E PROCESSUAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. PLANO DE SAÚDE. ERRO EM TRATAMENTO ODONTOLÓGICO. RESPONSABILIDADE CIVIL. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO NÃO CONFIGURADO. CERCEAMENTO DE DEFESA INOCORRENTE. MATÉRIA DE PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS NS. 282 E 356-STF.

I. A empresa prestadora do plano de assistência à saúde é parte legitimada passivamente para a ação indenizatória movida por filiado em face de erro verificado em tratamento odontológico realizado por dentistas por ela credenciados, ressalvado o direito de regresso contra os profissionais responsáveis pelos danos materiais e morais causados.II. Inexistência, na espécie, de litisconsórcio passivo necessário.III. Cerceamento de defesa inocorrente, fundado o acórdão em prova técnica produzida nos autos, tida como satisfatória e esclarecedora, cuja desconstituição, para considerar-se necessária a colheita de testemunhos, exige o reexame do quadro fático, com óbice na Súmula n. 7 do STJ.IV. Ausência de suficiente prequestionamento em relação a tema suscitado.V. Recurso especial não conhecido.(REsp 328309/RJ, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 08/10/2002, DJ 17/03/2003 p. 234)

RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR

CARONA/ TRANSPORTE DESINTERESSADO DE CORTESIA

A súmula 145, STJ admite a responsabilidade pela carona, no transporte desinteressado, desde que haja dolo ou culpa grave do transportador (responsabilidade subjetiva).

Súmula 145, STJ - NO TRANSPORTE DESINTERESSADO, DE SIMPLES CORTESIA, O TRANSPORTADOR SÓ SERA CIVILMENTE RESPONSAVEL POR DANOS CAUSADOS AO TRANSPORTADO QUANDO INCORRER EM DOLO OU CULPA GRAVE (verificação do elemento subjetivo) .

OVERBOOKING

Em geral a companhia aérea/ viária emite mais passagens do que existem assentos. Não é exercício regular do direito da companhia a utilização desta atividade. O STJ já reconheceu que o overbooking é ato ilícito da companhia, movido por mera conveniência administrativa (REsp 211604/SC).

38

Page 39: 12. DO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES - Responsabilidade Civil

CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATRASO DE VÔO (24 HORAS). EXCESSO DE LOTAÇÃO NO VÔO ("OVERBOOKING"). DANO MORAL. VALOR. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA. CDC. PREVALÊNCIA.I. Inobstante a infraestrutura dos modernos aeroportos ou a disponibilização de hotéis e transporte adequados, tal não se revela suficiente para elidir o dano moral quando o atraso no vôo se configura excessivo, a gerar pesado desconforto e aflição ao passageiro, extrapolando a situação de mera vicissitude, plenamente suportável.II. Diversamente do atraso de vôo decorrente de razões de segurança, que, ainda assim, quando muito longo, gera direito à indenização por danos morais, a prática de "overbooking", constituída pela venda de passagens além do limite da capacidade da aeronave, que é feita no interesse exclusivo da empresa aérea em detrimento do direito do consumidor, exige sanção pecuniária maior, sem contudo, chegar-se a excesso que venha a produzir enriquecimento sem causa.III. Recurso especial em parte conhecido e parcialmente provido.(REsp 211604/SC, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 25/03/2003, DJ 23/06/2003 p. 372)

BAGAGEM E CONVENÇÃO DE VARSÓVIA

A convenção de Varsóvia regula o limite da indenização, tarifada, pela perda da bagagem nos vôos internacionais e estendido aos vôos domésticos.

Esta limitação da indenização por perda de bagagem, em vôos domésticos ou internacionais, é valida no ordenamento brasileiro? NÃO, a Constituição de 1988 não limita qualquer valor para a indenização, e o STJ tem decidido que o extravio de bagagens admite indenização integral, uma vez que, nem mesmo a convenção de Varsóvia pode suplantar o princípio constitucional de defesa do consumidor (REsp 552553/RJ).

CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. CARGA. MERCADORIA. EXTRAVIO. TRANSPORTADOR.INDENIZAÇÃO INTEGRAL. CDC. APLICAÇÃO. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA.AFASTAMENTO.1 - A jurisprudência pacífica da Segunda Seção é no sentido de que o transportador aéreo, seja em viagem nacional ou internacional, responde (indenização integral) pelo extravio de bagagens e cargas, ainda que ausente acidente aéreo, mediante aplicação do Código de Defesa do Consumidor, desde que o evento tenha ocorrido na sua vigência, conforme sucede na espécie. Fica, portanto, afastada a incidência da Convenção de Varsóvia e, por via de conseqüência, a indenização tarifada.2 - Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença.(REsp 552553/RJ, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 12/12/2005, DJ 01/02/2006 p. 561)

39