09 - metabolismo da agua

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Capítulo 9 Metabolismo da Água Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly MECANISMO DA SEDE VASOPRESSINA (HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO) Mecanismo de ação do hormônio antidiurético (HAD) — aquaporinas OUTROS HORMÔNIOS Catecolaminas Hormônio tireoidiano Hormônios adrenocorticais Sistema renina-angiotensina MECANISMO RENAL DE REGULAÇÃO DA ÁGUA Considerações anatômicas Vascularização da medula renal Concentração da urina — mecanismo de contracorrente Fluxo sanguíneo medular Papel da uréia no mecanismo de concentração urinária Recirculação medular da uréia Diluição da urina DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DA ÁGUA DÉFICIT DE ÁGUA — HIPERNATREMIA — ESTADO HIPEROSMOLAR Causas de hipernatremia e estado hiperosmolar Hipernatremia com hipovolemia Hipernatremia com hipervolemia Hipernatremia com volemia aparentemente normal Manifestações clínicas de hipernatremia Manejo do paciente com hipernatremia Linhas gerais Cálculo do déficit de água Tipo de fluido Ritmo de correção Evolução EXCESSO DE ÁGUA — HIPONATREMIA — ESTADO HIPOSMOLAR Causas de hiponatremia Pseudo-hiponatremia Redistribuição de água Intoxicação aguda pela água Hiponatremia crônica MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DE HIPONATREMIA Diagnóstico TRATAMENTO DA HIPONATREMIA Linhas gerais Cálculo do excesso de água Tratamento da hiponatremia sintomática Ritmo de correção Complicações do tratamento EXERCÍCIOS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS No dia-a-dia, a ingesta de líquidos deve igualar-se às perdas através da respiração, suor, trato gastrintestinal e diurese.* 1 Nos adultos, a água corresponde a 60% do peso corporal, sendo a maior parte localizada no espaço intra- celular. Para evitar que haja variações na osmolalidade plasmá- tica, a qual é determinada principalmente pela concentra- ção plasmática de sódio, devem ser feitos ajustes adequa- dos na ingesta e excreção de água. Estes ajustes são reali- zados de forma mais significativa sobre o controle da sede, *O termo diurese refere-se a um fluxo de urina maior do que o normal, isto é, superior a 1 ml/min no adulto; antidiurese refere-se a um fluxo urinário reduzido, geralmente inferior a 0,5 ml/min no adulto.

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Page 1: 09 - Metabolismo da Agua

Capítulo

9Metabolismo da Água

Miguel Carlos Riella e Maria Aparecida Pachaly

MECANISMO DA SEDE

VASOPRESSINA (HORMÔNIO ANTIDIURÉTICO)

Mecanismo de ação do hormônio antidiurético (HAD) —

aquaporinas

OUTROS HORMÔNIOS

Catecolaminas

Hormônio tireoidiano

Hormônios adrenocorticais

Sistema renina-angiotensina

MECANISMO RENAL DE REGULAÇÃO DA ÁGUA

Considerações anatômicas

Vascularização da medula renal

Concentração da urina — mecanismo de contracorrente

Fluxo sanguíneo medular

Papel da uréia no mecanismo de concentração

urinária

Recirculação medular da uréia

Diluição da urina

DISTÚRBIOS CLÍNICOS DO METABOLISMO DA ÁGUA

DÉFICIT DE ÁGUA — HIPERNATREMIA — ESTADO

HIPEROSMOLAR

Causas de hipernatremia e estado hiperosmolar

Hipernatremia com hipovolemia

Hipernatremia com hipervolemia

Hipernatremia com volemia aparentemente normal

Manifestações clínicas de hipernatremia

Manejo do paciente com hipernatremia

Linhas gerais

Cálculo do déficit de água

Tipo de fluido

Ritmo de correção

Evolução

EXCESSO DE ÁGUA — HIPONATREMIA — ESTADO

HIPOSMOLAR

Causas de hiponatremia

Pseudo-hiponatremia

Redistribuição de água

Intoxicação aguda pela água

Hiponatremia crônica

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DE HIPONATREMIA

Diagnóstico

TRATAMENTO DA HIPONATREMIA

Linhas gerais

Cálculo do excesso de água

Tratamento da hiponatremia sintomática

Ritmo de correção

Complicações do tratamento

EXERCÍCIOS

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET

RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS

No dia-a-dia, a ingesta de líquidos deve igualar-se àsperdas através da respiração, suor, trato gastrintestinal ediurese.*1 Nos adultos, a água corresponde a 60% do peso

corporal, sendo a maior parte localizada no espaço intra-celular.

Para evitar que haja variações na osmolalidade plasmá-tica, a qual é determinada principalmente pela concentra-ção plasmática de sódio, devem ser feitos ajustes adequa-dos na ingesta e excreção de água. Estes ajustes são reali-zados de forma mais significativa sobre o controle da sede,

*O termo diurese refere-se a um fluxo de urina maior do que o normal,isto é, superior a 1 ml/min no adulto; antidiurese refere-se a um fluxourinário reduzido, geralmente inferior a 0,5 ml/min no adulto.

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capítulo 9 101

secreção do hormônio antidiurético (HAD) e mecanismosrenais de conservação ou eliminação de água.1

Quando existe déficit de água no organismo, os rinsparticipam de um sistema de retroalimentação com osmor-receptores e hormônio antidiurético, minimizando a per-da de água. Já quando existe excesso de água no organis-mo, estes mecanismos se dirigem a uma maior excreção deágua pelos rins. 2

MECANISMO DA SEDE

Para equilibrar as perdas diárias de água, é necessáriohaver ingesta de líquido, que é regulada pelo mecanismoda sede. Sede é definida como o desejo consciente de inge-rir água.2

Acredita-se que os estímulos para a sede se originamtanto no compartimento intracelular como no extracelular.A sensação de sede origina-se no centro da sede, localizadonas porções anterior e ventromedial do hipotálamo. Naverdade, os neurônios que compõem o centro da sede sãoespecializados na percepção de variações de pressão osmó-tica do plasma, e por isso recebem a denominação de os-morreceptores. Um dos mais importantes estímulos para asede é o aumento da osmolaridade do líquido extracelu-lar, e o “limiar” para o surgimento da sede é em torno de290 mOsm/L. Nesta situação, os osmorreceptores sofremcerto grau de desidratação, gerando impulsos que são con-duzidos por neurônios especializados até centros corticaissuperiores, onde então a sede se torna consciente.2,3 Estemecanismo é ativado nas situações em que há aumento daosmolalidade do plasma, como no déficit de água e naadministração de soluções hipertônicas cujos solutos nãopenetram nas células.

Por sua vez, déficits no volume extracelular e na pres-são arterial também desencadeiam a sede, por vias inde-pendentes das estimuladas pelo aumento da osmolarida-de do plasma. Por exemplo, depleção do espaço extrace-lular (diarréia, vômitos) e a perda de sangue por hemorra-gia estimulam a sede mesmo sem haver modificação naosmolaridade do plasma. O mecanismo para que isto ocor-ra está relacionado ao estímulo de barorreceptores, que sãoreceptores de pressão existentes na circulação torácica.2 Umterceiro importante estímulo à sede é a angiotensina II.Fitzsimons acredita que a angiotensina e outras substân-cias vasoativas atuem em estruturas vasculares periventri-culares (seriam receptores mecânicos da sede no cérebro),reduzindo o volume vascular a esse nível e causando sede.4

Como a angiotensina II também é estimulada pela hipo-volemia e baixa pressão arterial, seu efeito sobre a sedeauxilia na restauração do volume sanguíneo e pressão ar-terial, juntamente com as ações renais da angiotensina II,reduzindo a excreção de fluidos.2

Alguns outros fatores influenciam a ingesta de água. Porexemplo, a falta de umidade da mucosa oral e do esôfago

desencadeia a sensação de sede. Nesta situação, a inges-tão de água pode provocar alívio imediato da sede, mes-mo antes de ter havido absorção da água no trato gastrin-testinal ou qualquer modificação na osmolaridade do plas-ma. Porém este alívio da sede é de curta duração, e o dese-jo de ingerir água só é efetivamente interrompido quandoa osmolaridade plasmática ou o volume extracelular retor-narem ao normal. De modo geral, a água é absorvida edistribuída no organismo cerca de 30-60 minutos após aingestão. O alívio imediato da sede, apesar de temporário,é um mecanismo que impede que a ingestão de água pros-siga indefinidamente, o que levaria ao excesso de água ediluição excessiva dos fluidos corporais. 2

Estudos experimentais demonstram que os animais nãoingerem quantidades de água superiores às necessáriaspara restaurar a osmolaridade plasmática e volemia ao nor-mal.2 Já em humanos, a quantidade de água ingerida va-ria de acordo com a dieta e a atividade do indivíduo, e emgeral é excessiva em relação às necessidades diárias. Estaingestão excessiva, que não é induzida por um déficit deágua e cujo mecanismo é desconhecido, é extremamenteimportante, pois assegura as necessidades futuras do in-divíduo.

Habitualmente, a sede e a ingesta líquida representamuma resposta normal a um déficit de água. Isto é o queocorre nos exemplos já mencionados, de vômitos, diarréia,diabetes insipidus, diabetes mellitus, hipocalemia, hipercalce-mia etc. No entanto, em algumas situações, o paciente temsede, mas não há um déficit de água. Este estado patológi-co pode ser devido à irritação contínua dos neurônios dasede por tumor, trauma ou inflamação, ingestão compul-siva de água, hiper-reninemia etc.

Hipodipsia (diminuição ou ausência de sede) é usual-mente causada por tumor (p.ex., craniofaringioma, glioma,pinealoma ectópico etc.) ou trauma. Além de afetarem ocentro da sede, estes exemplos podem também ocasionarlesão do sistema supra-óptico-hipofisário, causando diabe-tes insipidus, o que agrava o déficit de água e dificulta omanejo clínico.

VASOPRESSINA (HORMÔNIOANTIDIURÉTICO)

O hormônio antidiurético (HAD) interage com porçõesterminais do nefro, aumentando a permeabilidade destessegmentos à água, desta forma aumentando a conservaçãoda água e a concentração urinária.

Além do aumento da permeabilidade à água nos túbu-los coletores, o HAD tem uma importante participação narecirculação da uréia entre o ducto papilar e a porção finaascendente da alça de Henle, pois aumenta a permeabili-dade do ducto coletor à uréia, e este mecanismo auxilia namanutenção da hipertonicidade da medula renal.5

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102 Metabolismo da Água

O HAD é um hormônio sintetizado no hipotálamo porgrupos de neurônios que formam os núcleos supra-ópticoe paraventricular, próximos ao centro da sede. Após a sín-tese, este decapeptídio (arginina-vasopressina em huma-nos) é armazenado em grânulos e transportado ao longodos axônios, em direção à neuro-hipófise (lobo posteriorda hipófise). No interior dos grânulos, o hormônio formaum complexo com uma proteína chamada neurofisina A ouneurofisina II. Parte destes grânulos pode ser liberada rapi-damente, através de exocitose, enquanto os demais servi-riam de estoque.3

A liberação deste hormônio está condicionada a estímu-los, que podem ser osmóticos ou não-osmóticos.

O estímulo osmótico refere-se a uma alteração da osmo-lalidade. Quando ocorre déficit de água no organismo, háum aumento na osmolalidade, reduzindo o volume dascélulas por desidratação celular* (inclusive das células dosnúcleos supra-óptico e paraventricular), estimulando as-sim a liberação do HAD. É necessário ressaltar que os os-morreceptores são estimulados apenas por variações reaisda tonicidade plasmática, isto é, por solutos que não atra-vessam as membranas. Solutos que atravessam as mem-branas celulares, como a uréia (e glicose nas células cere-brais), não aumentam a secreção de HAD.5,6

Por outro lado, quando há excesso de água no organis-mo, a hiposmolalidade que se estabelece inibe a liberaçãodo hormônio antidiurético. Tudo indica que a alteração dovolume celular altera a atividade elétrica dos neurônios dosnúcleos hipotalâmicos, afetando assim a liberação de va-sopressina.

A sensibilidade deste mecanismo osmorregulador podeser apreciada na Fig. 9.1. Observem que, à medida queaumenta a osmolalidade plasmática, aumenta a concentra-ção plasmática de HAD (Fig. 9.1 A). Com pressõesosmóticas plasmáticas superiores a 280 mOsm/L (limiarosmótico) a concentração plasmática de HAD aumenta demodo linear com a pressão osmótica. Mesmo com varia-ção de 1 mOsm ou menos, a secreção de HAD varia.3,7 Asensibilidade deste mecanismo osmorregulador pode serainda melhor avaliada quando se examina a relação entreo HAD plasmático e a osmolalidade urinária. Observemna Fig. 9.1 B que, para cada aumento de uma unidade naconcentração plasmática de HAD, a osmolalidade uriná-ria aumenta em média 25 mOsm/kg. Isto significa quepequenas alterações na osmolalidade plasmática são rapi-damente seguidas por grandes alterações na osmolalida-de urinária. Assim sendo, uma alteração na osmolalidadeplasmática de 1 mOsm/kg normalmente acarreta uma al-teração na osmolalidade urinária de 95 mOsm/kg. Isto émuito importante, permitindo que o organismo altere ra-pidamente o volume urinário, compensando a variação na

ingesta líquida e mantendo, assim, a água total constante.Desta forma, a tonicidade da água total do organismo épreservada dentro de uma estreita margem, cujo limitesuperior é regulado pelo osmorreceptor da sede, e o infe-rior, pelo osmorreceptor do HAD. Dentro destes limites(280-294 mOsm/kg), a tonicidade da água total ainda éregulada por ajustes na excreção de água livre (v. a seguir)controlada pelo HAD.

A liberação de ADH pode ser desencadeada por estímu-los não-osmóticos, entre os quais destacamos: diminuiçãoda pressão arterial; diminuição da tensão da parede doátrio esquerdo e das veias pulmonares; dor, náusea, hipó-xia, hipercapnia, hipoglicemia, ação da angiotensina, es-tresse emocional; aumento da temperatura do sangue queperfunde o hipotálamo e drogas: colinérgicas e betadre-

*O termo desidratação é empregado aqui para indicar um déficit isoladode água. V. Cap. 10 para miores detalhes sobre a conotação genérica dotermo desidratação.

Fig. 9.1 A. Representação esquemática dos efeitos de pequenasalterações na osmolalidade plasmática sobre os níveis plasmáti-cos de vasopressina. B. Repercussões de alterações na vasopres-sina plasmática sobre a osmolalidade urinária. Ver texto parainterpretação da figura. (Obtido de Robertson, B.L. e col.6)

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capítulo 9 103

nérgicas (acetilcolina e isoproterenol, respectivamente),morfina, nicotina, ciclofosfamida, barbitúricos etc.2,7 Entreos estímulos não-osmóticos para a liberação do HAD, es-tão os provenientes de áreas onde se encontram receptoresde pressão (barorreceptores): seio carotídeo, átrio esquerdoe veias pulmonares. Eles respondem a variações da pressãosobre a parede do órgão receptor, emitindo impulsos ner-vosos que modulam a liberação hipotalâmica de HAD.Quando há uma menor tensão na parede do órgão, há trans-missão de estímulos para a liberação central de HAD. Istopode ocorrer, por exemplo, na contração do volume extra-celular ou volume circulante efetivo e hipotensão arterial.8

Ao contrário, uma inibição não-osmótica da liberação deADH ocorre quando há: aumento da pressão arterial, au-mento da tensão da parede do átrio esquerdo e das veiaspulmonares, diminuição da temperatura do sangue queperfunde o hipotálamo e uso de algumas drogas (norepi-nefrina, clonidina, haloperidol, difenil-hidantoína, álcool).2

Mecanismo de Ação do HormônioAntidiurético (HAD) — Aquaporinas

O HAD modifica a membrana luminal das células prin-cipais dos túbulos distal final e coletor, causando aumentoda permeabilidade à água. O HAD interage com receptoresespecíficos da superfície (receptores V1 e V2), localizados namembrana basolateral. Esta interação produz efeitos sobreo cálcio e o AMPc intracelulares, que por sua vez modifi-cam a permeabilidade da membrana luminal à água. O re-ceptor V1 existe também no músculo liso vascular, sendoresponsável pelo efeito vasoconstritor do HAD, que por istotambém recebe o nome de vasopressina.5,7

Recentemente, foi evidenciada a existência de uma fa-mília de proteínas de membrana que exercem a função decanais de água em tecidos transportadores de fluidos (porexemplo, no cristalino, nos túbulos renais, etc).3,9 Estes ca-nais de água são hoje conhecidos como aquaporinas. Até omomento, já foram identificadas cinco aquaporinas que seexpressam nos rins (AQP 1, 2, 3, 4 e 6).10 Nas células prin-cipais dos túbulos distais e ductos coletores, está presentea aquaporina 2, que é um canal de água sensível ao HAD.Na presença de HAD, o receptor V2 é estimulado e ativa aadenil ciclase e o AMP cíclico. Com isto, vesículas especí-ficas no citoplasma se movem e se fundem com a membra-na apical (luminal). Estas vesículas contêm a aquaporina2, que, uma vez inserida na membrana luminal das célu-las principais dos túbulos distais e coletores, permite apassagem de água para dentro da célula.11 No bordo baso-lateral das células principais, estão presentes as aquapori-nas 3 e 4, que permitem o transporte de água de dentro dacélula para o interstício, porém neste ponto sem a partici-pação do HAD.5 As aquaporinas 1 e 6 estão relacionadas àabsorção de água, mas em outros segmentos tubulares,também sem dependência do HAD.10

O HAD é o principal hormônio atuante na regulação daexcreção de água. No entanto, outros hormônios afetam aexcreção de água, como veremos na seção seguinte.

Pontos-chave:

• A sede e a liberação de HAD sãodesencadeadas por um aumento daosmolalidade plasmática e têm por objetivomanter a osmolalidade estável

• No rim, o HAD ativa a fusão de canais deágua (aquaporina 2) com a membranaluminal dos túbulos coletores, permitindo areabsorção de água

OUTROS HORMÔNIOS

Catecolaminas

As catecolaminas afetam a excreção de água através deum mecanismo intra-renal e outro extra-renal. No meca-nismo intra-renal, os agentes adrenérgicos alteram a res-posta da membrana tubular renal ao HAD. Assim, os ago-nistas alfadrenérgicos tipo norepinefrina causam aumen-to do volume urinário, por diminuírem o efeito do HADsobre a permeabilidade da membrana tubular renal àágua. Já a estimulação betadrenérgica aumenta a perme-abilidade tubular à água, causando diminuição do volu-me urinário.12

No mecanismo extra-renal, a ação das catecolaminasse faz através de alterações na liberação de HAD, comojá mencionado. Várias outras substâncias vasoativas (an-giotensina II, prostaglandina E1, nicotina) têm efeitossobre os barorreceptores atriais, alterando a liberação deHAD.

Hormônio Tireoidiano

Sabe-se que pacientes hipotireóideos têm comprometi-da a sua capacidade de excretar uma carga de água. Poroutro lado, são desconhecidos os mecanismos pelos quaiso hormônio tireoidiano facilita a excreção de água. Umadas hipóteses é a de que o hormônio tireoidiano altera asensibilidade do túbulo renal ao HAD. Há evidência de quea maioria dos pacientes com hipotireoidismo e hiponatre-mia têm elevada concentração plasmática de HAD. Comoo hipotireoidismo cursa com débito cardíaco habitualmen-te diminuído,13 nestes casos a liberação de HAD pode es-tar sendo estimulada pela redução associada do volume ar-terial efetivo. Também se encontrou queda da taxa de fil-tração glomerular nestes pacientes, o que é revertido coma terapia hormonal apropriada.14

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104 Metabolismo da Água

Hormônios AdrenocorticaisNa insuficiência adrenal, pode ser observado um com-

prometimento na excreção de água, cuja causa não estáesclarecida. Alguns autores acreditam que a deficiência deglicocorticóides seja responsável pela deficiente excreçãode água. Segundo eles, a deficiência de glicocorticóidesproduziria alguns efeitos hemodinâmicos sistêmicos (ta-quicardia, diminuição do volume sistólico), e estas altera-ções estimulariam o mecanismo barorreceptor de estímu-lo ao HAD, causando retenção de água.

Também tem sido investigada a participação da deficiên-cia dos mineralocorticóides na diminuição da excreção de águaexistente na insuficiência adrenal. Acredita-se que os minera-locorticóides influenciam a secreção de HAD indiretamente,pois ao manter o volume extracelular evitam a liberação não-osmótica de HAD observada na depleção de volume.

Sistema Renina-AngiotensinaO sistema renina-angiotensina também participa no

controle da secreção de HAD, principalmente quando aosmolalidade plasmática está aumentada. A angiotensinaestimula a liberação de HAD e aumenta a sensibilidade dosistema de osmorregulação.8

MECANISMO RENAL DEREGULAÇÃO DA ÁGUA

O tremendo progresso nesse campo deve-se basicamen-te à aplicação de técnicas de micropuntura in vivo no rim demamíferos, principalmente o rato, e mais recentemente peloavanço da biologia molecular.

Para que seja mantida a homeostase do organismo, énecessário que o rim apresente a capacidade de variar ovolume urinário de modo a reter ou eliminar água, ou seja,concentrar ou diluir a urina.

Diariamente o organismo humano necessita eliminar pro-dutos tóxicos resultantes do metabolismo (p.ex., uréia, ácidosorgânicos) e solutos em excesso (sódio, potássio, cálcio, mag-nésio). A média diária a ser eliminada é de cerca de 750mOsm/dia. Com a ingestão usual de água (2-2,5 L/dia), aosmolaridade urinária encontra-se entre 400 e 450 mOsm/L,o que requer um volume urinário de 1,5 litro/dia. Caso a in-gestão de água seja deficiente, a osmolaridade da urina podesubir até 1.300 mOsm/L, e então o volume urinário vai variarcorrespondentemente, da seguinte forma: 750 mOsm a seremeliminados � osmolaridade de 1.300 � volume urinário de 0,6litro.3 Esta variação decorre do efeito do HAD, conforme jádiscutido, causando a reabsorção de água no ducto coletor.

Da mesma forma, a capacidade de diluir a urina é im-portante para que o organismo elimine excessos de água.Isto é obtido através da redução da osmolaridade da uri-na até valores como 50 mOsm/L.3

Para melhor compreensão dos mecanismos de concen-tração e diluição da urina, vale a pena relembrar algunsconceitos anatômicos.

Considerações Anatômicas

Como sabemos, cada nefro (unidade funcional básicado rim) é constituído pelo glomérulo e por uma forma-ção tubular longa, onde os sucessivos segmentos apresen-tam diferentes características quanto a estrutura e função.Em sua maior parte, os nefros são superficiais, contendoalças de Henle curtas e sem ramo ascendente delgado. Osnefros restantes são justamedulares, e seus glomérulosestão situados próximo à junção corticomedular, possu-indo longas alças de Henle com ramo ascendente delga-do (Fig. 9.2).

Os trabalhos experimentais mostraram que o transpor-te de água e solutos no nefro distal ocorre em pelo menoscinco segmentos morfologicamente distintos: a) Ramo as-cendente espesso da alça de Henle; b) Mácula densa; c)Túbulo contornado distal; d) Ductos coletores corticais ee) Ductos coletores papilares.

O ramo ascendente espesso da alça de Henle estende-se da medula externa até a mácula densa. Este segmentoreabsorve NaCl através de uma membrana impermeávelà água, elaborando, portanto, um líquido hipotônico.

A mácula densa é um segmento mais curto, cujas célu-las parecem agir como sensoras no mecanismo reguladordo feedback túbulo-glomerular (v. Cap. 10).

Na mácula densa, inicia-se o túbulo contornado distal.O túbulo distal clássico sempre foi considerado como o seg-mento que se estende da mácula densa até a junção com

Fig. 9.2 Relação dos vários segmentos do nefro com o córtex e amedula renal.

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capítulo 9 105

outro túbulo distal. Recentemente, foi mostrado que estesegmento, na verdade, está formado por dois segmentosdistintos: segmento proximal, cujo epitélio é similar ao doramo ascendente espesso, e segmento distal (também deno-minado túbulo coletor), cujo epitélio é similar ao do ductocoletor cortical15 (v. também Cap. 1).

O segmento distal (túbulo coletor) do túbulo contorna-do distal só responde à ação do hormônio antidiurético emalgumas espécies de animais. Já o segmento cortical do ductocoletor tem uma permeabilidade alta à água na presença deHAD e uma permeabilidade baixa na ausência deste.

A permeabilidade à uréia do segmento cortical do duc-to coletor é baixa, mesmo na presença de HAD. O segmentomedular interno-papilar do ducto coletor tem uma perme-abilidade à uréia mais alta que a do segmento cortical e,na presença de HAD, ela aumenta mais. A permeabilida-de deste segmento medular interno-papilar à água é altana presença de HAD e baixa na ausência deste.

Vascularização da Medula RenalA medula renal pode ser dividida em: a) Medula exter-

na, com uma faixa externa e outra interna (a faixa externaé também conhecida como zona subcortical), e b) Medulainterna (v. Fig. 9.2).

O sangue chega à medula renal através das arteríolaseferentes de glomérulos justamedulares. Estes vasos divi-dem-se na zona subcortical para formarem os vasa rectaarteriais, que atravessam a medula em feixes em forma decone e, às vezes, deixam estes feixes para suprirem umplexo capilar adjacente. Os plexos capilares são drenadospor vasa recta venosos que entram num destes feixes e as-cendem até a base do cone, na zona subcortical (Fig. 9.3).

No rato, uma secção transversal da medula externamostra três zonas concêntricas: a) área central, contendovasa recta arterial e venoso; b) anel periférico, contendo vasarecta venosos e a maioria dos ramos descendentes das al-ças de Henle, e c) por fora do anel, o ramo ascendente daalça de Henle, ducto coletor e plexo capilar.16

Acredita-se que os vasa recta têm a função de remover olíquido absorvido dos ductos coletores e segmento descen-dente da alça de Henle. O fluxo de plasma na parte terminaldos vasa recta ascendentes é maior que o fluxo de plasma naentrada dos vasa recta descendentes, e esta diferença é igualao ritmo de absorção de líquido do segmento descendente daalça de Henle e do ducto coletor. Isto é necessário, pois nãose conhece nenhuma outra via pela qual a água reabsorvidapossa chegar da medula à circulação sistêmica.

Concentração da Urina — Mecanismode Contracorrente

Recorde-se que são 180 litros de líquido filtrados pelos rinsdiariamente e que apenas 1,5 litro é excretado na urina. Isto

significa que, num adulto, aproximadamente 100 ml de fil-trado glomerular chegam aos túbulos proximais a cada mi-nuto. A maior parte da água filtrada (60 a 70%) é reabsorvidano túbulo contornado proximal, acompanhando a reabsor-ção de NaCl. Portanto, neste segmento a absorção de água épassiva. Cerca de 10% são reabsorvidos na pars recta do tú-bulo proximal pelo mesmo mecanismo. No ramo descendentedelgado da alça de Henle, ocorre a reabsorção (10 a 15%) deágua livre (sem soluto), devido ao gradiente osmótico exis-tente entre o túbulo e o interstício medular. Este gradienteosmótico se estabelece graças a um sistema de contracorren-te multiplicador (v. a seguir). O restante é reabsorvido nosductos coletores, sob a influência do hormônio antidiurético.O líquido que atinge o túbulo contornado distal é semprehipotônico e a eliminação de urina concentrada ou diluídadepende da reabsorção de água nos ductos coletores.

Foi observado inicialmente, em vários mamíferos, queo grau de concentração urinária por eles alcançado estavarelacionado com o comprimento do segmento delgado dasalças de Henle. Posteriormente, comprovou-se que apenasmamíferos e alguns pássaros podiam elevar a concentra-ção de urina acima da do plasma e que estes animais pos-suíam alças de Henle medulares (portanto, longas). Estefato sugeriu que a concentração de urina deveria ocorrerno interior das alças de Henle.

Fig. 9.3 Esquema da estrutura da medula renal no rato (zona in-terna e zona externa). VRA = vasa recta arteriais; VRV � vasa rectavenosos; RD � ramo descendente da alça de Henle; RA � ramoascendente da alça de Henle; DC � ducto coletor. (Modificadode Kriz, W. e Lever, A.F.16)

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106 Metabolismo da Água

A hipótese do sistema de contracorrente multiplicador paraexplicar a concentração de urina ao longo dos túbulos foisugerida em 1942 por Werner Kuhn, baseada na configu-ração em U da alça de Henle. Ele observou que, devido aesta configuração, o líquido tubular fluiria em ramos ad-jacentes, mas em direções opostas. Sendo um físico-quími-co familiarizado com termodinâmica, ele sabia que um flu-xo contracorrente poderia estabelecer grandes gradientesde temperatura ao longo do eixo longitudinal de canaisadjacentes, enquanto são pequenos os gradientes de tem-peratura entre canais transversais (v. Fig. 9.5).17 Transpor-tando estes princípios para a pressão osmótica, ele imagi-nou que pequenas diferenças na concentração de solutosentre os dois ramos da alça de Henle poderiam resultar emgrandes diferenças de concentração ao longo dos túbulos.Além do mais, ele achou que estas grandes diferenças deconcentração poderiam ser transmitidas ao interstício quecerca os túbulos, criando assim um aumento progressivona concentração de soluto, paralelo aos túbulos.

Haveria necessidade, no entanto, de três fatores básicospara que o sistema de contracorrente multiplicador funci-onasse: a) fluxo contracorrente (proporcionado pela alça deHenle); b) diferenças de permeabilidade entre os túbulos(o ramo ascendente é praticamente impermeável à água),e c) uma fonte de energia (atualmente atribuída ao trans-porte ativo de cloro no ramo ascendente espesso).

Na presença destes elementos, o líquido tubular seriaconcentrado da seguinte maneira (Fig. 9.4):

1. No segmento espesso ascendente da alça de Henle, háuma reabsorção ativa de cloro. Esta reabsorção ativa criauma diferença transtubular de potencial elétrico, que éresponsável pela remoção passiva de sódio.

2. O segmento ascendente espesso tem uma baixa perme-abilidade à água, o que permite que o fluido tubularneste segmento se torne hiposmótico em relação ao dointerstício. No entanto, a uréia permanece no interior dotúbulo, pois este segmento tem uma permeabilidadebaixa à uréia.

3. No ducto coletor cortical já existe ação do HAD, e, napresença deste, a água é reabsorvida, tornando o líqui-do tubular isosmótico com o sangue. A permeabilida-de deste segmento à uréia é baixa, e, com a perda deágua, a concentração intraluminal de uréia aumentaainda mais.

4. Na medula externa, o interstício hiperosmolar (osmo-lalidade determinada em parte pela reabsorção de NaClno segmento ascendente espesso) retira mais água dolíquido tubular, aumentando ainda mais a concentraçãode uréia.

5. Na medula interna, tanto a água como a uréia são reab-sorvidas do ducto coletor na presença do HAD. Este

Fig. 9.4 Sistema de contracorrente multiplicador.* O diagrama mostra os ramos descendente e ascendente da alça de Henle, o túbulo distale o ducto coletor. O contorno mais espesso do ramo ascendente da alça de Henle indica que este ramo é impermeável à água. 1. Reabsorçãoativa de cloro e passiva de sódio, mecanismo que dilui o líquido tubular e torna o interstício medular hiperosmótico. 2. No segmento distal(túbulo coletor) do túbulo distal (em algumas espécies de animais) e � no ducto coletor, ocorre reabsorção de água através de um gradi-ente osmótico. A presença de HAD (v. texto) facilita este transporte passivo. Com a reabsorção de água, ocorre concentração intratubularda uréia. Na medula interna, a água e a uréia são reabsorvidas. 3. O acúmulo da uréia no interstício medular cria o gradiente osmótico paraa reabsorção passiva de água no ramo descendente da alça de Henle � e, assim, concentra o NaCl no ramo descendente da alça de Henle.O tamanho das letras dos solutos indica-lhes a concentração relativa.*Baseado na hipótese de Stephenson19 e Kokko e Rector.20

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capítulo 9 107

segmento (medular interno do ducto coletor) tem umapermeabilidade mais alta à uréia do que o segmentocortical do ducto coletor; esta permeabilidade aumentamais na presença de HAD. Este segmento apresentauma permeabilidade alta à água na presença de HAD ebaixa na sua ausência.

6. O cloreto de sódio e a uréia no interstício exercem umaforça osmótica para retirar água do segmento delgadodescendente da alça de Henle. Este segmento é relati-vamente impermeável a uréia e NaCl. Esta perda deágua faz aumentar a concentração de NaCl no ramodescendente delgado, de tal forma que, na curva da alça,a concentração de NaCl será maior no interior do túbu-lo do que no interstício. No entanto, o líquido tubular aesse nível é isosmótico com o interstício papilar, cujaconcentração total de soluto está na maior parte consti-tuída pela uréia.

7. Quando líquido tubular atingir o ramo ascendente del-gado da alça de Henle (segmento impermeável e per-meável ao NaCl), o NaCl passará passivamente para ointerstício (devido ao gradiente de concentração). Comoa permeabilidade deste segmento é mais alta para oNaCl do que para a uréia, o NaCl sai do túbulo para ointerstício mais rapidamente que a uréia quando estapassa do interstício para o interior do túbulo. Com oaumento da concentração de NaCl no interstício, have-rá maior absorção de água na porção fina descendenteda alça, com conseqüente maior hipertonicidade do flui-do tubular, o que gera um maior fluxo de Na� e Cl� noramo fino ascendente da alça de Henle, constituindoassim um sistema de contracorrente multiplicador, apa-rentemente passivo na medula interna, que foi iniciadoe mantido pelo transporte de Na� e Cl� na porção es-pessa da alça na região medular externa.

8. O ramo espesso ascendente recebe, portanto, um flui-do diluído, que se tornará ainda mais diluído em virtu-de da reabsorção de NaCl neste segmento.

A urina final pode alcançar uma concentração próxima,mas não exceder a concentração do interstício medular. Nohomem, em condições de antidiurese, a concentração uri-nária máxima alcançada é de aproximadamente 1.200-1.300mOsm/kg, ou seja, quatro vezes a osmolalidade do plasma.

Apesar do progresso alcançado nos últimos anos emrelação aos mecanismos de concentração da urina, muitosaspectos ainda permanecem sem solução. Atualmente,aceita-se que a alça de Henle é o elemento multiplicadorno sistema de contracorrente e que o segmento delgado daalça é o multiplicador na medula interna.18 Pouca dúvidaresta também de que o segmento delgado ascendente daalça é a fonte de NaCl responsável pelo aumento na con-centração de NaCl desde a base da medula interna até apapila.18 A incerteza permanece em relação ao mecanismode reabsorção do NaCl no segmento delgado ascendente:se ativo ou passivo. Nos últimos anos, vários modelos ex-perimentais tentaram solucionar o problema, como os de

Stephenson,19 e ainda de Kokko e Rector.20,21 A descriçãoutilizada acima para o mecanismo de concentração do lí-quido tubular baseou-se no modelo de Kokko e Rector, queparte do pressuposto que não há um transporte ativo namedula interna (segmento delgado ascendente), no que dizrespeito ao mecanismo de concentração.

FLUXO SANGUÍNEO MEDULARComo já mencionamos, acredita-se que os vasa recta têm

a função de remover o líquido absorvido nos ductos cole-tores e segmento descendente da alça de Henle. Natural-mente, o fluxo sanguíneo medular deve ser de tal ordemque os solutos do interstício não sejam excessivamenteremovidos, o que eliminaria o gradiente osmótico medu-lar, tão importante na concentração urinária. Sabe-se, pois,que a concentração osmolar na ponta da papila é inversa-mente proporcional ao fluxo sanguíneo para esta área.

A manutenção deste interstício hiperosmolar deve-se:a) a um baixo fluxo sanguíneo medular (apenas 5% do flu-xo plasmático renal passam pela área medular e papilar);b) à presença dos vasa recta, responsáveis por um sistemade contracorrente trocador. A disposição anatômica da cir-culação capilar na medula tem todas as características deum sistema de contracorrente trocador.

O princípio deste sistema, conhecido em termodinâmi-ca, tem sido aplicado a sistemas biológicos e está ilustradona Fig. 9.5. Suponhamos um tubo ao qual fornecemos águaa 30°C e a um fluxo de 10 ml/min (Fig. 9.5 A). Esta águapassa por uma fonte de calor e recebe 100 calorias por mi-nuto. Logo, a água que sai do tubo está a uma temperatu-ra de 40°C. A seguir, dobramos o tubo, introduzindo, por-tanto, um fluxo contracorrente no sistema e mantendo afonte de calor no mesmo local (Fig. 9.5 B). O sistema émontado de tal maneira que o fluxo de saída passa próxi-mo do fluxo de entrada, propiciando a troca de calor entreos dois fluxos (entrada e saída). Desta forma, a água aque-cida (que está saindo) encontra a água fria (que está entran-do) e perde calor para ela. Portanto, a temperatura da águaque entra se eleva antes de atingir a fonte de calor. O pro-cesso continua até que se atinja um estado de equilíbrio. Atemperatura máxima alcançada no sistema de contracor-rente é maior que no fluxo retilíneo.

As mesmas considerações são válidas para a adição desoluto em vez de calor (Fig. 9.5 C). O soluto (NaCl) é adi-cionado ao interstício e o equilíbrio entre os capilares se fazatravés do interstício. A finalidade deste sistema é facili-tar ao máximo a transferência de uma molécula permeá-vel entre canais adjacentes, evitando o movimento dasmoléculas ao longo desses canais.

A arquitetura vascular da medula renal facilita a trocade água e solutos entre os vasa recta ascendentes e descen-dentes, minimizando a entrada de água e saída de solutoda medula renal da seguinte maneira22 (v. Fig. 9.6).

1. O sangue circula pelos vasa recta através do interstíciomedular, progressivamente mais hiperosmolar em dire-

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108 Metabolismo da Água

ção à papila. A pressão hidrostástica transcapilar favore-ce a saída de líquido do capilar, e a pressão oncótica trans-capilar favorece a entrada de líquido para o capilar. Comoo sangue circula rapidamente, não há tempo para umequilíbrio osmótico entre o capilar e o interstício.

2. Como a concentração dos solutos no interstício é mai-or, a pressão osmótica transcapilar favorece a saída deágua do capilar descendente, aumentando a concentra-ção das proteínas plasmáticas.

3. Como os capilares são permeáveis a NaCl e uréia, e aconcentração destes no interstício é maior que no capi-lar, eles entram no capilar descendente.

4. Quando o sangue atinge o capilar ascendente, a concen-tração de solutos no plasma excede a do interstício (quese torna progressivamente menos hiperosmolar em di-reção ao córtex), e os solutos, então, deixam o capilar.

5. Da mesma forma, a pressão oncótica (determinada pe-las proteínas plasmáticas) está elevada quando o san-gue atinge o capilar ascendente. A soma da pressãooncótica e da pressão osmótica (determinada pelos so-lutos não-protéicos) determina a entrada de líquido nocapilar.

6. A quantidade de líquido que entra no capilar ascendenteé maior que a quantidade de líquido removida do capi-lar descendente, e a diferença é igual ao volume de lí-quido reabsorvido no ramo descendente da alça deHenle e nos ductos coletores.

7. Em resumo, os vasa recta preservam os solutos e remo-vem a água, mantendo a hiperosmolalidade da medularenal.

PAPEL DA URÉIA NO MECANISMO DECONCENTRAÇÃO URINÁRIA

A uréia é o produto final do metabolismo protéico nosmamíferos, sendo excretada quase unicamente pelos rins.Além da água e dos gases sanguíneos, a uréia é a substân-cia mais difusível no organismo.

Investigações passadas já haviam demonstrado que apresença de uréia era essencial para a obtenção de uma

Fig. 9.5 Princípios do sistema de contracorrente trocador. Observem que a temperatura máxima obtida no sistema de contracorrente(B) é maior que a obtida no sistema de fluxo linear (A). Em (C), representamos uma alça capilar em contato com o líquido intersticial.Notem que, no início (flechas), os sais de sódio penetram no capilar e, no final, retornam para o interstício (v. texto para uma expli-cação mais detalhada). (Modificado de Berliner R.W. e col.17)

Fig. 9.6 Sistema de contracorrente trocador pelos vasa recta. Pr �proteína plasmática. O tamanho das letras dos solutos indica aconcentração relativa de cada soluto com relação à sua localiza-ção na medula (v. texto para detalhes de funcionamento do sis-tema). Obtido de Jamison, R.L. e Maffly, R.H.22

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capítulo 9 109

osmolalidade urinária máxima. Se um animal deficiente emproteínas recebia uréia, a capacidade de concentração uri-nária aumentava.

RECIRCULAÇÃO MEDULAR DA URÉIA

1. Uma quantidade mais ou menos constante de uréia éreabsorvida no túbulo proximal, independentemente dobalanço de água.

2. No ducto coletor cortical (e, em algumas espécies, notúbulo coletor), sob a influência do hormônio antidiuré-tico, a água é reabsorvida, o que determina um aumen-to da concentração intraluminal de uréia (Fig. 9.4).

3. No segmento medular interno-papilar do ducto coletor,a permeabilidade à uréia aumenta mesmo na ausênciado HAD, o qual, quando presente, parece aumentar ain-da mais esta permeabilidade. Desta forma, devido àdiferença transtubular da concentração de uréia, esta sedifunde para o interstício medular.

4. A uréia, então, torna a entrar no túbulo renal na pars rectado túbulo proximal ou ramo descendente de nefros su-perficiais e justamedulares. Como a alça delgada justa-medular está numa região contendo uma alta concen-tração de uréia no interstício, mais uréia entra no nefrojustamedular do que no superficial. Portanto, o fluxo deuréia que deixa o túbulo distal justamedular é maior doque o que deixa o nefro superficial.

Pontos-chave:

• Quando existe déficit de água, os rinsreabsorvem mais água pelo mecanismo deconcentração urinária, estimulado peloHAD

• A concentração urinária depende damanutenção de uma medula renalhipertônica pelo mecanismo decontracorrente e recirculação de uréia

Diluição da Urina

Não importa se a urina final será hiper- ou hipotônica:o líquido tubular que chega ao túbulo contornado distalserá sempre hipotônico. Os ductos coletores (segmento cor-tical e medular interno-papilar) e o segmento distal dotúbulo contornado distal são segmentos sensíveis à açãodo HAD. Quando há uma redução ou cessação na libera-ção de HAD, estes segmentos tornam-se relativamenteimpermeáveis à água. Em conseqüência, no sistema cole-tor o líquido hipotônico permanece hiposmótico em rela-ção ao plasma. No segmento medular interno-papilar doducto coletor, ocorre reabsorção de água, pois o segmentoainda é permeável à água (embora menos) na ausência deHAD.

Devido à ausência de HAD, a permeabilidade à uréiado segmento medular interno-papilar do ducto coletordiminui; logo, a reabsorção de uréia também diminui.Além disso, como há redução geral na reabsorção de água,o gradiente transtubular de uréia também diminui (recor-de-se que é a reabsorção de água dos segmentos poucopermeáveis à uréia que determina o aumento de sua con-centração intratubular), e logo se reduz a recirculaçãomedular do sistema coletor para a alça de Henle. E, comojá foi exposto, a uréia exerce um papel fundamental no sis-tema de contracorrente.

A capacidade de um indivíduo ingerir grande quantida-de de água, sem desenvolver um excesso de água, traduz acapacidade renal de excretar grande quantidade de urinadiluída. A osmolalidade mínima que pode ser alcançadapelo rim humano é de aproximadamente 50 a 60 mOsm/kg, permitindo volumes de urina de 15 a 20 litros por dia.

É necessário frisar alguns pontos importantes no meca-nismo de diluição da urina e expor os conceitos de clearan-ce osmolar e clearance de água livre.

Baseando-se no que já foi exposto nas páginas preceden-tes, conclui-se que a formação e a excreção de uma urinadiluída dependem de três fatores básicos: a) oferta adequa-da de líquido tubular ao segmento diluidor do nefro; b) re-absorção adequada de soluto no segmento diluidor do nefro;c) impermeabilidade do segmento diluidor do nefro à água.

Se analisarmos a urina, veremos que ela está constituí-da por uma fase aquosa na qual vários solutos estão dis-solvidos. Os solutos são ânions e cátions não-voláteis e osprodutos do metabolismo nitrogenado. Se relacionarmosa concentração destes solutos na urina (ou seja, a osmola-lidade urinária) com a osmolalidade plasmática, podere-mos ter três tipos de tonicidade urinária: urina isotônica,hipotônica e hipertônica em relação ao plasma (v. Fig. 9.7).Foi Homer Smith quem originalmente considerou a urinacomo contendo dois volumes virtuais: um volume conten-do uma quantidade de soluto excretado numa concentra-ção igual à do plasma (isotônica) e um outro volume con-tendo água sem soluto.23

Quando se considera o fluxo urinário (ml de urina porminuto), o volume de urina que contém os solutos numaconcentração igual à do plasma é denominado de clearan-ce osmolar e o volume de urina sem solutos refere-se ao cle-arance de água livre. O termo clearance de água livre é errô-neo, pois, na verdade, não indica a depuração de uma subs-tância e não é calculado pela fórmula clássica U � V/P, esim pela fórmula:

CH2O � V � Cosm

Onde:

CH2O � clearance de água livreV � volume de urina (fluxo urinário em ml/min)Cosm � clearance osmolar

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110 Metabolismo da Água

Considerando de outra maneira, podemos dizer que o cle-arance de água livre refere-se à quantidade de água livre (águasem solutos) que precisa ser adicionada ou retirada da urinapara que a urina se torne isosmótica com o plasma.

Observem na Fig. 9.7 B que, quando a urina é isotônica,isto é, tem a mesma concentração osmolar que o plasma, oclearance de água livre é zero. Já na urina hipotônica, o clea-rance de água livre é positivo e, na hipertônica, negativo.Costuma-se empregar a expressão TCH2O quando o clearancede água livre for negativo. A letra C indica que a reabsorçãoocorre nos ductos coletores. Portanto, TCH2O � �CH2O.

O clearance osmolar, que se refere ao volume de urinanecessário para excretar todos os solutos urinários numaproporção isosmótica, é calculado através da fórmula clás-sica do clearance:

Cosm � Uosm � V

Posm

Onde:

Cosm � osmolalidade urinária (mOsm/L)V � fluxo urinário (ml/min)Posm � osmolalidade plasmática (mOsm/L)

Vejamos, nos dois exemplos seguintes, o cálculo do cle-arance osmolar e do clearance de água livre.1. Calcular o Cosm de um paciente que apresenta osmolali-

dade plasmática de 300 mOsm/L, osmolalidade uriná-ria de 100 mOsm/L e fluxo urinário de 5 ml/min:

Cosm � 100 � 5

� 1,66 ml/min300

2. Calcular o clearance de água livre de um paciente cujaurina apresenta osmolalidade de 600 mOsm/L, osmo-lalidade plasmática de 300 mOsm/L e fluxo urinário de1 ml/min:

CH2O � 1 � 600 � 1

� � 1300

Interpretação do clearance osmolar e do clearance deágua livre

É óbvio que variações na ingesta e na excreção osmolarnão causarão alterações na osmolalidade plasmática (poisa fração osmolar é sempre isosmótica). No entanto, paraque a osmolalidade seja mantida, a fração de água livreingerida deverá ser igual ao clearance de água livre. Se aingestão de água livre exceder o clearance de água livre,haverá uma diminuição da osmolalidade plasmática. Ficaclaro, portanto, a importância do mecanismo renal de di-luição da urina (excreção de água livre) na preservação daosmolalidade plasmática.

Pontos-chave:

• A diluição urinária é resultado daimpermeabilidade dos túbulos coletores àágua na ausência de HAD

• A excreção dos excessos de água é realizadaatravés da elaboração de urina finaldiluída

Fig. 9.7 Relação do clearance de água livre com a tonicidade da urina (v. texto). (Modificado de Hays, R.M. e Levine, S.D.33)

(significa urina hipertônica)

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capítulo 9 111

DISTÚRBIOS CLÍNICOS DOMETABOLISMO DA ÁGUA

A integração do sistema sede-HAD-rim permite que mes-mo com grandes variações na ingesta líquida a osmolalidadeno organismo seja mantida mais ou menos constante. Quan-do há déficit de água, ocorre aumento da osmolalidade noorganismo, a qual estimula a sede e a liberação de HAD; estaaltera a permeabilidade do epitélio do ducto coletor, permi-tindo maior conservação de água. Na presença de excesso deágua, ocorre o inverso: hiposmolalidade, ausência de sede emenor liberação de HAD e conseqüente menor permeabilida-de à água no ducto coletor, causando, portanto, maior diure-se. Daí se deduz que alterações no mecanismo de concentra-ção e diluição da urina provocam distúrbios no metabolismoda água, que são a hipernatremia e a hiponatremia.

É importante também relembrar que os distúrbios dometabolismo da água estão relacionados a alterações naosmolalidade plasmática e são evidenciados pela dosagemdo sódio plasmático, o qual estará concentrado ou diluídono plasma, de acordo com a água corporal total do indiví-duo. Já os distúrbios do metabolismo do sódio são verifi-cados pela avaliação do estado do espaço extracelular, atra-vés do exame físico (v. Caps. 8 e 10).24

O termo desidratação refere-se à perda de água que levaa uma elevação do sódio plasmático e a um déficit de águaintracelular devido ao movimento de água das células parao líquido extracelular. Já o termo depleção de volume serefere à diminuição do espaço extracelular devido à perdade sódio e água, como ocorre, por exemplo, nas diarréias.24,25

DÉFICIT DE ÁGUA —HIPERNATREMIA —

ESTADO HIPEROSMOLAR

Hipernatremia ocorre quando a concentração plasmá-tica de sódio encontra-se acima de 145 mEq/L. A hiperna-tremia é um dos distúrbios eletrolíticos mais comuns empacientes hospitalizados. Chega a ser preocupante que,nesta população, uma importante causa de hipernatremiaé a iatrogenia, por reposição inadequada das perdas empacientes com acesso restrito à água.26

Um déficit de água no organismo é acompanhado porum aumento na concentração plasmática de sódio. Comojá foi abordado no Cap. 8, o sódio é o principal íon deter-minante da osmolalidade no compartimento extracelular,de forma que a hipernatremia tem grande importância clí-nica, por sua associação com hiperosmolaridade e conse-qüentes efeitos sobre o conteúdo celular de água. A hiper-natremia é a principal causa de hiperosmolaridade.

Uma série de adaptações ocorre em todo o organismopara minimizar o efeito da hiperosmolaridade sobre a es-

trutura e a função da célula, especialmente no cérebro. Ossintomas de hiperosmolaridade aparecem quando estesmecanismos de adaptação são ultrapassados.27

A membrana celular é de modo geral altamente perme-ável à água, o que torna o volume intracelular muito sus-cetível às variações da osmolaridade do extracelular. Ahiperosmolalidade induz um movimento de água do in-tracelular para o extracelular, reduzindo o volume celular.Esta alteração no volume celular leva a mudanças no vo-lume e função celulares.

Por razões anatômicas, o cérebro é especialmente vulne-rável às alterações no volume celular. Reduções agudas novolume cerebral podem levar a uma separação entre o cére-bro, as meninges e o crânio, com ruptura de vasos sanguíne-os e hemorragia. Porém, no cérebro, os astrócitos são capa-zes de restaurar o volume cerebral ao normal após transtor-nos osmóticos. No caso da hipernatremia, após algum tem-po estas células respondem com um aumento na concentra-ção intracelular de vários solutos osmoticamente ativos, in-cluindo o sódio, o potássio, o cloro. Além destes, progressi-vamente há acúmulo também dos chamados osmóis idiogêni-cos, que incluem aminoácidos (glutamato, glutamina, tauri-na, ácido gama-aminobutírico), creatina, fosfocreatina,mioinositol e glicerofosforilcolina. Na hipernatremia aguda,por não ter havido tempo suficiente para o acúmulo destassubstâncias, que manteriam o volume celular, é mais prová-vel ocorrer variação do volume celular cerebral, com mani-festações clínicas importantes. Na hipernatremia crônica, es-tes osmóis acumulados no interior das células levam à ma-nutenção do volume celular, com menor sintomatologia.27

Os outros mecanismos de adaptação à hipernatremiasão a liberação de HAD e a ativação do mecanismo dasede.27 Normalmente, o centro da sede é muito sensívelmesmo a pequenos aumentos da osmolalidade, da ordemde 1 a 2%. Porém, mesmo que o mecanismo da sede sejaativado, muitos pacientes podem não expressar a sedeadequadamente ou não ter acesso à água. Isto é observa-do em crianças pequenas e adultos com alterações do ní-vel de consciência, principalmente idosos. Além disso, acapacidade de concentração urinária e conservação de águadiminuem com a idade, e, nos idosos, a osmolalidade uri-nária máxima pode ser de apenas 500-700 mOsm/kg.28-30

Então, vários fatores tornam estes indivíduos mais propen-sos ao desenvolvimento de hipernatremia significativa.

Pontos-chave:

• Hipernatremia é diagnosticada comconcentração plasmática de sódio maior que145 mEq/L

• Hipernatremia produz hiperosmolalidade,uma vez que o sódio é o principaldeterminante da osmolalidade plasmática

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112 Metabolismo da Água

Causas de Hipernatremia eEstado Hiperosmolar

No Quadro 9.1 podem ser observadas as principais cau-sas de hipernatremia. Uma abordagem também bastantedidática se baseia na determinação do estado do espaçoextracelular nos pacientes com hipernatremia, agrupandoas causas mais prováveis do distúrbio de acordo com avolemia do paciente e o sódio urinário31 (v. Quadro 9.10).

A hipernatremia é uma das causas de estado hiperos-molar, o qual pode também ser ocasionado por uréia, gli-cose e etanol.

HIPERNATREMIA COM HIPOVOLEMIAHipernatremia com depleção do espaço extracelular e

hipovolemia pode ser decorrente de perdas extra-renais ou

renais de fluidos hipotônicos.31 Há uma perda concomitan-te de água e sódio, embora haja proporcionalmente umamaior perda de água. Clinicamente, observam-se sinais decontração de volume: veias jugulares invisíveis, hipoten-são ortostática, taquicardia, pobre turgor da pele e muco-sas secas. Devido à hemoconcentração, o hematócrito e asproteínas plasmáticas estão elevados.

Perdas extra-renais podem ser decorrentes de sudoreseexcessiva ou diarréia, particularmente em crianças. Emalguns tipos de diarréia, principalmente nas osmóticas,ocorre perda de fluido hipotônico em relação ao plasma,provocando aumento na concentração plasmática de sódio.Isto pode ser observado também em crianças em que o flui-do de reposição é hipertônico. Como resposta às perdas,os rins são estimulados a conservar água e sódio, a urinamostra-se hipertônica e a concentração urinária de sódio ébaixa, menor que 20 mEq/L.31

Por sua vez, perda de fluidos hipotônicos pelos rinspode ser observada durante a diurese osmótica, como ocor-re na administração de manitol e no paciente diabéticodescompensado, com glicosúria. A glicosúria é a principalcausa de diurese osmótica em pacientes ambulatoriais.Não se evidencia conservação renal de água e sódio, poisa urina é justamente a fonte de perda. A urina pode ser iso-ou hipotônica e o sódio urinário é maior que 20 mEq/L.Em pacientes hospitalizados, outras causas de diurese os-mótica são encontradas: alimentação hiperprotéica (a uréiaage como agente osmótico); expansão do volume por so-lução salina e liberação de obstrução urinária bilateral. Aosmolalidade urinária nestas situações está geralmenteacima de 300 mOsm/kg, ao contrário da urina diluída dadiurese aquosa. Além do mais, a excreção de solutos (pro-duto da urina de 24 h � volume � osmolalidade) é nor-mal na diurese aquosa (600-900 mOsm/kg/dia) e aumen-tada na diurese osmótica.

HIPERNATREMIA COM HIPERVOLEMIAEsta categoria de hipernatremia é pouco freqüente. Ge-

ralmente ocorre em pacientes que receberam grandesquantidades de cloreto ou bicarbonato de sódio hipertô-nico. Ao exame físico há sinais do excesso de extracelular,

Fig. 9.8 Relação entre a osmolalidade plasmática e a ingesta e excreta osmolar e de água livre. Como a fração osmolar é sempre umafração isotônica, não há alterações na osmolalidade plasmática quando se modifica a ingesta ou excreta da fração osmolar. No en-tanto, variações na ingesta ou excreta de água livre modificam a osmolalidade plasmática. (Baseado no diagrama de Hays, R.M. eLevine, S.D.33)

Quadro 9.1 Causas de hipernatremia

Perda de água• Perdas insensíveis (respiração e sudorese)• Hipodipsia• Diabetes insipidus central• Diabetes insipidus nefrogênico

Perda de fluido hipotônico• Perdas renais

• Diurese osmótica• Diuréticos de alça• Fase poliúrica de NTA• Diurese pós-obstrutiva

• Perdas gastrintestinais• Vômitos, sondagem nasogástrica• Diarréia• Catárticos osmóticos

• Perdas cutâneas• Queimaduras

Sobrecarga de sódio• Administração de soluções hipertônicas de sódio• Enemas ricos em sódio• Hiperaldosteronismo primário• S. de Cushing

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capítulo 9 113

como congestão pulmonar e ingurgitamento dos vasos dopescoço.31

HIPERNATREMIA COM VOLEMIAAPARENTEMENTE NORMAL

Este é o tipo mais freqüente de hipernatremia, e se devea perdas de água sem eletrólitos. Ao exame, o espaço ex-tracelular pode ser considerado normal. Devido à per-meabilidade das membranas celulares à água, um terçoda água perdida provém do extracelular, e dois terços, dointracelular. É por isso que a principal conseqüência daperda de água é a hipernatremia, e não a depleção do ex-tracelular.31

Hipernatremia com volemia normal pode ser decorrentede perdas insensíveis pelo suor e respiração, que, se nãoforem apropriadamente repostas, elevam a concentraçãoplasmática de sódio. Estas perdas em geral somam 0,6 ml/kg/hora, mas aumentam muito nas queimaduras, febre,taquipnéia e exercícios intensos.32

É causada principalmente por distúrbios que prejudi-cam os mecanismos normais de conservação renal de água,por baixa concentração plasmática de hormônio antidiuré-tico (diabetes insipidus pituitário ou central) ou por compro-metimento da resposta renal a níveis máximos de HAD(diabetes insipidus nefrogênico).

Se a perda líquida for através da pele e do trato respira-tório, a urina será hipertônica. A quantidade de sódio uri-nário é variável e reflete a ingesta diária. Se a perda líqui-da for de origem renal (diabetes insipidus central ou nefro-gênico), a urina será hipotônica, e a quantidade de sódiourinário, também variável.

Ponto-chave:

• Hipernatremia pode cursar com espaçoextracelular normal, diminuído ouaumentado

Diabetes insipidus (DI) pituitário ou centralCaracteriza-se por uma alteração central na síntese ou

secreção de HAD, limitando a capacidade renal de concen-trar a urina e causando graus variados de poliúria e poli-dipsia. A falta de HAD pode ser induzida por distúrbiosem um ou mais locais de secreção do HAD: osmorrecep-tores hipotalâmicos, núcleos supra-óticos ou paraventricu-lares; ou a porção superior do trato supra-ótico hipofisá-rio. Por outro lado, lesão do trato abaixo da eminênciamédia ou da parte posterior da hipófise produz apenasuma poliúria transitória. Nestes casos, o HAD produzidono hipotálamo ainda pode ser secretado na circulação sis-têmica através dos capilares portais da eminência média.

CAUSAS. As cirurgias de hipófise, tumores supra-se-lares e traumatismo craniano são causas de DI central33 (v.Quadro 9.2). As neoplasias primárias ou secundárias do

cérebro, que envolvam a região pituitário-hipotalâmica,podem cursar com DI central. Isto ocorre mais freqüente-mente com metástases de câncer de pulmão, leucemia oulinfoma. A incidência de DI varia com a extensão da lesão:10-20% na remoção transesfenoidal de adenoma hipofisá-rio restrito à cela e até 60-80% nos casos de grandes tumo-res que requerem hipofisectomia total. Alguns pacientesapresentam um padrão trifásico de polidipsia-poliúria nopós-operatório: na primeira fase, imediata à cirurgia, os pa-cientes apresentam polidipsia-poliúria; segue-se a segun-da fase, caracterizada por quatro a cinco dias de antidiu-rese; e, após vários dias, uma terceira fase, na qual a poli-úria reaparece. Acredita-se que, na primeira fase, ocorrauma lesão aguda dos núcleos hipotalâmicos e que, portan-to, não haja síntese e liberação de vasopressina. Já a segun-da fase ocorreria devido à liberação de vasopressina pelotecido neuro-hipofisário necrosado. Nesta fase, entre osdias 6 e 11, ingestão excessiva de água pode causar hipona-tremia. Pacientes com lesões menos graves podem ter umDI central transitório que começa 24-48 horas depois da ci-rurgia e melhora em uma semana. Além disto, nem todosos pacientes passam pelas três fases. É importante frisar quea maioria dos casos de poliúria após neurocirurgia não sãodecorrentes de DI central, mas devidos a um excesso de lí-quidos durante a cirurgia e diurese osmótica pelo uso demanitol e corticosteróides para minimizar o edema cerebral(que podem causar hiperglicemia e glicosúria). A diferenci-ação pode ser feita pela osmolalidade urinária, resposta àrestrição de água e administração exógena de HAD.

Aproximadamente 30% dos casos de DI central são denatureza idiopática, por um processo auto-imune com in-flamação linfocítica da haste hipofisária e da parte poste-rior. Uma causa mais rara é o diabetes insipidus central fa-miliar, habitualmente transmitido como um traço autossô-mico dominante. O DI central familiar parece estar associ-ado a uma mutação do gene que controla a síntese de HAD:preprovasopressina-neurofisina II. O precursor não é cli-vado em HAD, acumulando-se localmente e causando amorte de células produtoras de HAD.

Quadro 9.2 Causas de diabetes insipidus pituitário

Pós-hipofisectomiaIdiopáticoPós-traumáticoTumores supra- e intra-selares — metastático (pp. mama)

craniofaringiomapinealoma

CistosHistiocitoseGranulomas — tuberculose, sarcoidoseVasculares — aneurismas, trombose, síndrome de

SheehanInfecciosas e imunológicas — meningite, encefalite

síndrome de Guillain-Barré

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114 Metabolismo da Água

A encefalopatia hipóxica (ou isquemia grave, como ocor-re na parada cardiocirculatória ou choque) causa uma di-minuição da liberação de HAD. A gravidade do defeitopode ser variável, desde uma discreta e assintomática po-liúria até uma forma mais evidente. Exemplo: síndrome deSheehan, onde a secreção de HAD é subnormal, mas amanifestação clínica é discreta.

Após um quadro de taquicardia supraventricular podeocorrer poliúria transitória devido à liberação aumentadado fator atrial natriurético e secreção diminuída de HAD.As alterações hormonais parecem ocorrer devido à ativa-ção de receptores locais de volume devido ao aumento dapressão no átrio esquerdo e da pressão sistêmica.

Na anorexia nervosa a liberação de HAD é subnormalou errática, talvez devido à disfunção cerebral. É um de-feito geralmente discreto, e quando ocorre poliúria, esta édecorrente do aumento na sede.

Diabetes insipidus nefrogênicoRefere-se à diminuição da capacidade de concentração

urinária que resulta da resistência à ação do HAD. Istopode refletir uma resistência no local de ação do HAD nosductos coletores ou interferência com o mecanismo contra-corrente devido à lesão medular ou diminuição na reab-sorção de NaCl no segmento medular espesso ascendenteda alça de Henle.

CAUSAS. As principais causas de DI nefrogênico estãoagrupadas no Quadro 9.4.

O diabetes insipidus nefrogênico hereditário é um distúr-bio infreqüente que resulta em graus variados de resistên-cia ao HAD. Há dois receptores diferentes para o HAD: osreceptores V1 e V2. Ativação dos receptores V1 induz va-

soconstrição e aumento da liberação de prostaglandinas,enquanto receptores V2 se relacionam a resposta antidiuré-tica, vasodilatação periférica e liberação do fator VIII e fa-tor de von Willebrand das células endoteliais. A transmis-são é ligada ao sexo (X-linked). Como a mutação é no re-ceptor V2, estão comprometidas as respostas antidiuréti-cas, vasodilatadoras e do fator de coagulação, enquanto osefeitos vasoconstritores e nas prostaglandinas estão intac-tos. A herança ligada ao sexo significa que os homens têmmarcada poliúria e as mulheres variam de um estado por-tador a uma importante poliúria. Recentemente uma for-ma autossômica recessiva foi descrita na qual o receptorV2 está intacto, assim como as respostas sobre a vasodila-tação e a coagulação; o defeito está nos “canais de água”coletores (chamados aquaporina-2). Estes canais normal-mente armazenados no citosol, sob influência do HAD,movem-se e se fundem com a membrana luminal, permi-tindo a reabsorção de água.

O diabetes insipidus nefrogênico adquirido é mais comumque o congênito e também menos grave, porque a capaci-dade renal de concentrar a urina até a osmolalidade doplasma está preservada. Assim, a polidipsia e a poliúria sãomoderadas: 3-5 litros por dia. As principais causas de DInefrogênico são abordadas a seguir.

As nefropatias crônicas podem causar DI nefrogênico,com comprometimento da capacidade renal de concentra-ção máxima da urina (geralmente quando a TFG for me-nor que 60 ml/min). Embora se possa encontrar hiposte-núria (osmolalidade urinária menor que a plasmática) emnefropatias crônicas avançadas, uma poliúria sintomáticaé rara. No entanto, a evidência mais precoce e mais gravedeste comprometimento na concentração urinária ocorreem enfermidades que afetam a região medular e papilardo rim, tais como: doença policística, doença cística medu-lar, amiloidose, pielonefrite, uropatia obstrutiva, anemiade células falciformes, etc. As causas deste defeito na con-

Quadro 9.3 Diferenciação de distúrbios poliúricospor desidratação e administração exógena devasopressina

Uosm Uosm

antes* depois**

Normal 1,067 ± 68,7 987,0 ± 79,4(N = 9)Diabetes insipidus 168 ± 13,0 445,0 ± 52,0(N = 18)Diabetes insipidus 437 ± 33,6 548,0 ± 28,2

incompleto(N = 12)Polidipsia 738 ± 52,9 779,8 ± 73,1

primária(N = 7)

Modificado de Berl, T. e cols.29 após adaptação do trabalho de Miller, M.e cols.38

N indica o número de casos estudados em cada grupo.Uosm � osmolalidade urinária.*antes — ao término do período de privação líquida e antes de recebervasopressina.**depois — após a administração de vasopressina.

Quadro 9.4 Causas de diabetes insipidus nefrogênico

Congênito

AdquiridoNefropatia crônicaDoença policísticaDoença cística medularAmiloidosePielonefriteUropatia obstrutivaAnemia de células falciformesDistúrbios eletrolíticos (hipercalcemia, hipocalemia)Alterações na dieta — redução na ingesta de

proteína e sódio— ingestão crônica excessiva

de águaAgentes farmacológicos: lítio, metoxiflurano,demeclociclina etc.

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capítulo 9 115

centração urinária são múltiplas: destruição na medularenal das inter-relações anatômicas entre a alça de Henle,vasa recta e ducto coletor; talvez a presença de toxinas urê-micas na circulação, que antagonizam a ação da vasopres-sina, e a diurese osmótica a que são submetidos os nefrosremanescentes.

Alterações na dieta podem causar diabetes insipidus ne-frogênico. Em reduções crônicas na ingesta protéica, a con-centração máxima da urina está comprometida, e isto pa-rece estar relacionado com a menor formação de uréia, querepresenta mais ou menos 50% da tonicidade do interstí-cio medular. Da mesma forma, a restrição de sódio com-promete o mecanismo de concentração, pois o primeiropasso no mecanismo de contracorrente multiplicador é areabsorção ativa de cloro (e passiva de sódio) no segmen-to espesso ascendente da alça de Henle. A restrição de clo-reto de sódio resulta num aumento da reabsorção proxi-mal destes íons, e, portanto, a quantidade que chega à alçade Henle é menor. Por fim, a ingestão crônica de excessosde água, como ocorre nos bebedores compulsivos de água(polidipsia primária), reduz a tonicidade do interstíciomedular e compromete a capacidade de concentraçãomáxima da urina 34 (v. Quadro 9.4).

Alguns distúrbios eletrolíticos também são causa de di-abetes insipidus nefrogênico. Entre eles, a hipercalcemia ea hipocalemia. O mecanismo pelo qual a hipercalcemiacompromete a concentração urinária ainda não está escla-recido. A deposição de cálcio na medula renal e a contra-ção de volume que geralmente acompanha a hipercalce-mia são fatores a considerar. Uma ação direta a nível celu-lar alterando o equilíbrio osmótico também tem sido con-siderada. O defeito na concentração torna-se clinicamenteaparente quando a concentração plasmática de cálcio estápersistentemente acima de 11 mg/dl. Com concentraçãoplasmática de potássio persistentemente abaixo de 3 mEq/L,há indícios de que ocorre redução da reabsorção de NaClno segmento ascendente espesso da alça de Henle e umamenor resposta do túbulo coletor ao HAD. Tanto na hiper-calcemia como na hipocalemia, o defeito no mecanismo deconcentração é discreto, e, para explicarem a ingesta líqui-da superior às vezes a 3-5 litros, alguns autores sugeremum efeito destes eletrólitos no mecanismo da sede.

Uma outra causa de DI nefrogênico é a anemia de célu-las falciformes, em que há uma tendência das hemácias emadquirir a forma de foice no ambiente hipertônico e debaixa tensão de oxigênio na medula renal. Esta alteraçãona forma das hemácias compromete a circulação dos vasarecta e causa edema e infartos da papila renal, ocasionan-do a incapacidade de concentrar adequadamente a urina.

Existem drogas que interferem com a ação renal doHAD, prejudicando a reabsorção de água. Entre estas dro-gas, destacamos o lítio, a dimetilclortetraciclina, ometoxifluorano e as sulfoniluréias. O lítio é uma drogamuito usada em psiquiatria no manejo de psicose manía-co-depressiva. Aparentemente esta droga inibe a ação da

vasopressina na formação de adenosina-monofosfato cícli-co (cAMP) e induz poliúria reversível.35 Pacientes com acnetratados com doses altas de dimetilclortetraciclina (deme-clociclina) podem apresentar poliúria e polidipsia.36 Estadroga inibe a ação da vasopressina, possivelmente atravésde uma interferência na geração e ação de cAMP. Ela tam-bém se liga a uma proteína específica da célula epitelial,que é importante na ação do HAD. O metoxifluorano é umagente anestésico que pode causar diabetes insipidus nefro-gênico por induzir redução da permeabilidade do ductocoletor ou diminuição da tonicidade do interstício medu-lar.37

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DO DI CENTRAL ENEFROGÊNICO. Além da poliúria, noctúria e da polidip-sia que pode chegar a 15 litros ao dia, a maior parte dospacientes portadores de DI central apresenta níveis de só-dio plasmático normal ou pouco aumentado, uma vez queo mecanismo da sede está intacto, repondo pelo menosparcialmente a perda de água. Porém, pode ocorrer hiper-natremia no DI central em que o paciente não tenha aces-so à água ou que tenha seu mecanismo da sede alterado.Com o tempo, pode ocorrer grande dilatação vesical e dosureteres, a ponto de não haver mais noctúria. Além disso,outras manifestações decorrem da doença de base.

Pontos-chave:

• Diabetes insipidus central é causado poralteração da produção e/ou liberação doHAD

• Diabetes insipidus nefrogênico decorre dainsensibilidade renal ao HAD

DIAGNÓSTICO DO DI CENTRAL, NEFROGÊNICOE OUTRAS FORMAS DE POLIÚRIA. Além da poliúria,polidipsia e hipernatremia com volemia normal, no diabe-tes insipidus central a densidade da urina é bastante baixa(1,001-1,005), embora formas parciais de DI, na vigência dedesidratação intensa, possam formar urina hipertônica. Háalguns testes para o diagnóstico de DI, como a restrição deágua, administração de solução salina hipertônica e admi-nistração exógena de hormônio antidiurético, como vere-mos a seguir.

A restrição simples de água é o teste mais utilizado edetermina a capacidade de o paciente elaborar HAD emresposta à hipertonicidade do plasma. O paciente é pesa-do e, a seguir, restringe-se a água por 12-16 horas ou atéque ele perca 3-5% do peso corporal. Cada amostra de uri-na é coletada para determinação do volume e densidadeurinária e/ou osmolalidade. Um indivíduo normal reduzo volume urinário para menos de 0,5 ml/min e aumenta aosmolalidade urinária (superior a 800 mOsm/kg). O paci-ente com DI mantém um alto volume urinário e uma os-molalidade urinária em torno de 200 mOsm/kg. Alguns

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116 Metabolismo da Água

autores preferem um teste mais curto (6-8 horas) e compa-ram a osmolalidade sérica e urinária inicial com a final. Umlongo período de restrição líquida deve ser evitado devi-do ao risco de depleção de volume e hipernatremia, e al-guns autores sugerem períodos de restrição de água deapenas 2-3 horas. O volume e a osmolalidade urinária sãodeterminados a cada hora, e o sódio plasmático, a cada 2horas.

Com a administração de solução salina hipertônica (300ml de NaCl a 5%), ocorre aumento da osmolalidade plas-mática e, nos indivíduos normais, há uma liberação deHAD e conseqüente redução do volume urinário. Este testenão tem sido utilizado de rotina.

O aumento da osmolalidade plasmática em indivíduosnormais conduz a uma elevação progressiva da liberaçãodo HAD e, portanto, da osmolalidade urinária. Quando aosmolalidade plasmática atinge 295-300 mOsm/kg (nor-mal 275-290 mOsm/kg), a ação endógena do HAD no rimé máxima. Neste ponto, administrar HAD não eleva a os-molalidade urinária, a menos que haja um problema cen-tral na liberação de HAD, ou seja, DI central. O teste derestrição da água continua até que a osmolalidade uriná-ria atinja um nível normal (acima de 600 mOsm/kg), indi-cando liberação e ação intactas do HAD, a osmolalidadeurinária fique estável em duas medidas consecutivas, ape-sar de um aumento na osmolalidade plasmática, ou se aosmolalidade plasmática exceder 295-300 mOsm/kg. Nes-tas duas últimas situações, administra-se HAD exógeno (10mg de DDAVP por spray nasal). Monitora-se o volume e aosmolalidade urinária. Os padrões de resposta à restriçãode água e à administração de DDAVP são distintos, depen-dendo da causa do DI.29,38

No DI central, que é geralmente parcial, a liberação deHAD e a osmolalidade urinária podem aumentar com oaumento da osmolalidade plasmática. Porém, como a libe-ração de HAD é inadequada, a concentração urinária ob-tida não é máxima, e neste caso o HAD exógeno leva a umaumento da osmolalidade urinária e queda no débito uri-nário.

No DI nefrogênico a restrição de água causa elevaçãosubmáxima na osmolalidade urinária. O aumento da os-molalidade plasmática estimula a liberação de HAD, mascomo os pacientes com DI nefrogênico de modo geral sãoparcialmente resistentes ao HAD, pode haver um aumen-to pequeno na osmolalidade urinária. A administração deHAD exógeno também pode aumentar a osmolalidadeurinária.

Na polidipsia primária, a restrição de água aumenta aosmolalidade urinária. Como a liberação de HAD estánormal, não há resposta ao HAD exógeno. A capacidadede concentração urinária está diminuída, pois a poliúria ea polidipsia crônicas retiram solutos da medula renal, di-minuindo o gradiente intersticial medular.39

Talvez no futuro os resultados do teste de restrição àágua e administração de HAD possam ser confirmados

pela medida da excreção urinária de aquaporina-2, que éo “canal de água” do túbulo coletor. A excreção deaquaporina-2 aumenta muito após a administração deHAD em indivíduos normais e naqueles com DI central,podendo ser usada como um índice da ação deste hormô-nio no rim.39,40

Ponto-chave:

• Ο diagnóstico diferencial entre diabetesinsipidus central, nefrogênico e outrasformas de poliúria é realizado através dahistória clínica e dos testes de restrição deágua, infusão de salina hipertônica eadministração de HAD

TRATAMENTO DO DI CENTRAL. O tratamento doDI central visa a diminuição do débito urinário, através doaumento na atividade do HAD e reposição adequada dasperdas líquidas. O DI central é tratado com a administra-ção do hormônio antidiurético (HAD) ou com o uso deoutros medicamentos não-hormonais.41

Atualmente, está disponível a desmopressina (DDA-VP), que tem efeito antidiurético potente, sem efeitovasopressor. A desmopressina é apresentada na forma lí-quida e pode ser utilizada pela via intranasal, aplicada atra-vés de um pequeno tubo plástico ou na forma de spray.Inicia-se com dose de 5 µg à noite; dependendo dos efei-tos sobre a noctúria, a dose pode ser aumentada em 5 µg edepois acrescentadas doses diurnas. Nos EUA está dispo-nível uma apresentação oral de DDAVP, mas que tempotência de apenas 10-20% da forma nasal.41 O risco daadministração do DDAVP é a retenção de água e hipona-tremia, já que, sob o efeito desta droga, o paciente é inca-paz de excretar normalmente a água ingerida.

Para os pacientes que têm resposta incompleta à desmo-pressina, pode ser necessário acrescentar drogas que au-mentem a liberação de ADH, aumentem o efeito do ADHno rim (em DI central parcial) ou diminuam o débito uri-nário de maneira independente do HAD. Entre estas dro-gas, podem ser utilizadas a clorpropamida, clofibrato, ace-taminofen e tegretol, diuréticos tiazídicos e antiinflamató-rios não-hormonais.

A clorpropamida é uma droga utilizada no manejo dediabetes mellitus, mas também é eficaz no tratamento do DIcentral. Esta droga é capaz de reduzir o volume urinário eelevar a osmolalidade urinária em pacientes portadores deDI central. Acredita-se que potencialize os efeitos do HADcirculante, talvez sensibilizando o túbulo renal à ação daHAD. Ainda não está esclarecido se a clorpropamida temuma ação central (estimulando a liberação de HAD). Apóso diagnóstico, administram-se 250 mg de clorpropamidauma ou duas vezes ao dia, e o efeito será observado entreo terceiro e o sétimo dia após a administração. Ela não é

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efetiva na forma nefrogênica do DI e é menos efetiva quan-to mais grave for o DI. O maior problema é a hipoglicemiaque causa, sobretudo em crianças.

O clofibrato (droga usada no tratamento de dislipide-mias) parece aumentar a secreção pituitária de vasopres-sina e não possuir nenhuma ação sensibilizante ao nível detúbulo renal. Por não ter efeitos colaterais (como a hipo-glicemia da clorpropamida), pode ser utilizado no manejodo DI parcial. A dose de 500 mg cada 6 horas pode reduzira poliúria em DI central. A carbamazepina (usada no tra-tamento da epilepsia) parece aumentar a resposta tubularao HAD. A carbamazepina é utilizada numa dose de 100 a300 mg duas vezes ao dia. A clorpropamida, clofibrato ecarbamazepina podem reduzir o débito urinário no DIcentral em até 50%.41

A indução de discreta depleção de volume com umadieta baixa em sódio e diuréticos tiazídicos (hidroclorotia-zida, 25 mg uma ou duas vezes ao dia) são medidas efica-zes no tratamento do DI, reduzindo o débito urinário emcerca de 50%. A hipovolemia induzida aumenta a reabsor-ção proximal de água e sódio, reduzindo assim a oferta deágua aos locais HAD-sensíveis dos ductos coletores.41

Os antiinflamatórios não-hormonais (principalmente oibuprofeno) causam inibição da síntese de prostaglandinasrenais, e isto aumenta a capacidade de concentração uri-nária, já que as prostaglandinas normalmente antagonizama ação do HAD. Podem reduzir o débito urinário em 25-50%.41

TRATAMENTO DO DI NEFROGÊNICO. O tratamen-to se dirige à correção da doença de base e à diminuição dapoliúria. Os pacientes com DI nefrogênico não se benefici-am da administração de HAD ou drogas que aumentem suasecreção ou resposta renal, pois o defeito é justamente umaresistência renal (parcial ou completa) ao HAD. Ao invésdisso, apresentam efeitos favoráveis no tratamento do DInefrogênico: diuréticos tiazídicos, antiinflamatórios não-hormonais e dieta hipossódica e baixa em proteínas.

Como já mencionado, os diuréticos tiazídicos induzemuma depleção do extracelular, aumentando a reabsorçãoproximal de sódio e água, com isso diminuindo a oferta deágua aos locais sensíveis ao HAD nos túbulos coletores.Esta resposta é potencializada com o uso concomitante deamiloride ou outro diurético poupador de potássio. Osdiuréticos de alça induzem uma resistência relativa aoADH e não devem ser usados.42

Os antiinflamatórios não-hormonais apresentam no DInefrogênico os mesmos efeitos já discutidos com relaçãoao tratamento do DI central.

O débito urinário no DI nefrogênico pode ainda ser re-duzido com a utilização de uma dieta com pouco sal epouca proteína, que induz uma diminuição na excreção desolutos (sal e uréia) e no volume de água necessário paraexcretá-los.

Para os pacientes com DI nefrogênico parcial, talvez autilização de níveis suprafisiológicos de HAD possa au-

mentar a resposta renal a este hormônio. Dessa forma, adesmopressina pode ser utilizada em pacientes com poli-úria persistente após a utilização das outras medidas.

Pontos-chave:

• Ο princípio do tratamento do diabetesinsipidus central é a utilização de análogosdo HAD (DDAVP). Também são úteis:clorpropamida, clofibrato, acetaminofen,carbamazepina, tiazídicos eantiinflamatórios não-hormonais

• No diabetes insipidus nefrogênico,recomenda-se dieta com baixo teor de sal eproteínas, e o uso de tiazídicos eantiinflamatórios não-hormonais

Manifestações Clínicas de HipernatremiaAs manifestações clínicas de um estado hiperosmolar

dependem da existência ou não de alterações no volumedos compartimentos líquidos. Isto, por outro lado, depen-de de a substância que determina o estado hiperosmolarter livre acesso à água intracelular. O estado hiperosmolarpode ser classificado em dois grupos: devido à substânciacom fácil acesso à água intracelular (uréia, etanol) e devi-do ao acúmulo de solutos habitualmente excluídos do com-partimento intracelular (glicose, sódio).43 Como já menci-onamos, a hipernatremia é uma das causas mais importan-tes de estado hiperosmolar.

Como a uréia é altamente difusível, alterações na con-centração plasmática de uréia não são acompanhadas demudanças no volume dos compartimentos líquidos. Ape-nas quando é administrada rapidamente e em grandesdoses, a uréia pode causar um gradiente osmótico trans-celular e produzir mudanças nos compartimentos líquidos.A ingestão de etanol é uma causa comum de hiperosmo-lalidade, mas, da mesma forma que a uréia, tem fácil aces-so à água intracelular e, portanto, não causa mudanças novolume dos compartimentos líquidos. Apenas o álcool etí-lico pode causar um aumento da osmolalidade de signifi-cação clínica, pois cada 100 mg/100 ml elevam a osmolali-dade em 22 mOsm/L.

A glicose, por sua vez, é uma substância osmoticamenteativa, pois atravessa as membranas celulares muito lenta-mente. Diabetes mellitus e diálise peritoneal com glicosehipertônica são situações clínicas comuns de hiperosmo-lalidade plasmática. Durante a fase inicial de descompen-sação do diabetes mellitus, ocorre hiperglicemia sem glicosú-ria, enquanto o limiar renal de excreção da glicose não foiexcedido. Esta hiperglicemia inicial causa um aumento daosmolalidade plasmática, e o desvio da água do comparti-mento intracelular para o extracelular torna os dois com-

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partimentos isosmóticos. O resultado final é um aumentoda osmolalidade nos dois compartimentos, aumento dovolume do compartimento extracelular e hiponatremiadevido à diluição do sódio no extracelular pela água pro-veniente do compartimento intracelular. Na segunda fase dedescompensação do diabetes mellitus, a hiperglicemia exce-de o limiar de excreção renal e aparece a glicosúria. Nestafase ocorre uma diurese osmótica, com grandes perdasurinárias de água e cloreto de sódio e conseqüente contra-ção do volume plasmático. No coma diabético hiperglicê-mico não-cetótico, a depleção de água pode ser tão grandeque, apesar da hiperglicemia (1.000 mg/100 ml), o sódioplasmático está normal ou elevado. O organismo reage àcontração do volume plasmático, desviando líquido dointerstício e, mais importante, desviando líquido das célu-las para expandir o compartimento extracelular. A águaintracelular sai, acompanhada de eletrólitos (K�, Cl�,HPO4

�), para que a isosmolalidade transcelular seja man-tida. O manejo desses pacientes requer, além da adminis-tração de insulina, a administração de líquidos e eletróli-tos. Se a osmolalidade inicial não for muito elevada, admi-nistra-se solução salina isotônica, a fim de restaurar o vo-lume plasmático. Particular atenção deve ser dada à repo-sição de potássio, pois, mesmo na presença de hipercale-mia, a administração de insulina e líquido é seguida derápida queda na concentração plasmática de potássio.Quando a osmolalidade plasmática inicial for muito ele-vada, recomenda-se a administração de uma solução sali-na hipotônica (NaCl a 0,45%).

O sódio tem um acesso limitado ao compartimento in-tracelular, e o estado hiperosmolar que acompanha a hi-pernatremia reflete um déficit de água total, sobretudo daágua intracelular. Este déficit de água pode ser acompa-nhado de um déficit de sódio, mas sempre em menor quan-tidade que a perda de água29 (v. Quadros 9.6 e 9.10). Alémda associação com hipovolemia, também é possível encon-trar hipernatremia com volemia normal ou aumentada. Énecessário avaliar o espaço extracelular através de um cui-dadoso exame físico, conforme será abordado no Cap. 10.

Entre as manifestações clínicas da própria hipernatre-mia, predominam aquelas que refletem disfunção do sis-tema nervoso central, principalmente se o aumento na con-centração do sódio se fez de forma rápida, ao longo de al-gumas horas. A maior parte dos pacientes não internadosque apresentam hipernatremia é muito jovem ou idosa.Estes grupos etários apresentam alterações do mecanismoda sede, redução da capacidade de concentração máximada urina e falha na resposta normal ao ADH.44

Em crianças, são comuns a hiperpnéia, fraqueza mus-cular, inquietude, choro, insônia, letargia e até mesmocoma. As crianças geralmente não apresentam sintomas atéque a concentração plasmática de sódio exceda 160 mEq/L.Se o paciente está consciente, a sede pode ser intensa. Onível de consciência se correlaciona com a gravidade da hi-pernatremia. Convulsões não ocorrem, a menos que o pa-

ciente receba sobrecarga de sódio ou reidratação muito in-tensa.

Entre os pacientes hospitalizados, as manifestações po-dem não ser tão nítidas, pois muitos deles apresentamdoença neurológica preexistente. Na maioria das vezes, háalterações sensoriais, como confusão mental, estupor e,eventualmente, coma. Pode haver hipotensão, taquicardiae até hipertermia. O volume urinário é pequeno, a menosque haja uma diurese osmótica ou uma síndrome poliúri-ca. A concentração plasmática das proteínas está elevadae, se houver um déficit de sódio associado, verifica-se umaelevação da hemoglobina e do hematócrito. O líquido ce-falorraquidiano pode ser xantocrômico ou sanguinolento,graças a um aumento da permeabilidade ou mesmo rup-tura dos capilares cerebrais devido à redução de volumedo cérebro.

Pontos-chave:

• As principais manifestações dahipernatremia se relacionam ao sistemanervoso central e dependem da idade dopaciente e da rapidez de instalação

• Os sintomas são mais intensos nahipernatremia aguda que na crônica, pois omecanismo de compensação (ganhointracelular de osmóis) não está ativado

Manejo do Paciente com Hipernatremia

LINHAS GERAISO tratamento da hipernatremia depende de dois fato-

res importantes: volume do compartimento extracelular eritmo de aparecimento da hipernatremia.

Na hipernatremia associada à depleção do volume ex-tracelular, o primeiro objetivo é restaurar a volemia com

Quadro 9.5 Mecanismos renais necessários para oclearance de água

A. Produção de um gradiente osmótico1. Número suficiente de nefros funcionantes2. Oferta suficiente de NaCl aos segmentos medulares3. Transporte suficiente de NaCl nos segmentos

medulares4. Conservação suficiente de uréia na medula renal

B. Utilização do gradiente osmótico1. Fluxo sanguíneo renal apropriado2. Ação apropriada da vasopressina nos ductos

coletores3. Resposta apropriada da vasopressina pelos ductos

coletores4. Fluxo urinário apropriado

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soro fisiológico. Se houver sinais de colapso circulatóriopela contração de volume, a solução salina isotônica deveser administrada até que a instabilidade hemodinâmicaseja corrigida. Posteriormente, podem ser utilizados o soroglicosado a 5% ou uma solução hipotônica (0,45%) de clo-reto de sódio. Se não houver instabilidade hemodinâmicainicial, inicia-se a administração simultânea de soro glico-sado a 5% e solução salina isotônica. Quando se dispuserde uma solução salina hipotônica (NaCl 0,45%), esta serápreferida.

O manejo dos pacientes com hipernatremia associada aum excesso de volume extracelular baseia-se na reposiçãode água por via oral ou parenteral e na remoção do sódiocom diuréticos de alça. Na presença de insuficiência renal,hipernatremia e excesso de volume são manejados atravésde diálise.

Finalmente, naqueles pacientes com hipernatremia evolemia normal o manejo baseia-se na interrupção da per-da continuada de líquido e na administração de água soba forma de soro glicosado a 5%. A administração de líqui-do pode ser feita por via oral, via sonda nasogástrica ouvia parenteral.46

CÁLCULO DO DÉFICIT DE ÁGUAConsidere um paciente com peso usual de 70 kg, apre-

sentando sódio plasmático atual de 155 mEq/L e sódionormal de 140 mEq/L:

1.º passo: Calcular a água total normal deste paciente:70 kg x 60% � 42 litros (alguns autores consideram a águatotal do homem como 60% do peso corporal, e 50% nasmulheres, por possuírem mais tecido adiposo e, logo, me-nos água. Além disso, consideram a água total atual como

sendo menor em pacientes hipernatrêmicos e que estãocom déficit de água; logo usam, em vez de 60% e 50%,valores de 50% e 40% para homens e mulheres, respecti-vamente).

2.° passo: Calcular a quantidade de água total que estepaciente possui com o sódio em 155 mEq/L.

Água atual � Água normal � Sódio normal

� 42 � 140

� 38 litrosSódio atual 155

3.º passo: Calcular o déficit de água: Água atual � águanormal � 38 � 42 � 4 litros de déficit de água. Esta é aquantidade de fluido hipotônico que o paciente necessi-ta receber para que seu sódio plasmático retorne a 140mEq/L.

TIPO DE FLUIDOA escolha do fluido a ser infundido para a correção da

hipernatremia depende da via de administração e da ne-cessidade de corrigir outro distúrbio hidroeletrolítico coe-xistente. Para uso enteral, podem ser utilizadas a águadestilada ou soluções eletrolíticas hipotônicas.27

Para reposição endovenosa, o fluido ideal é aquele quenão contém osmóis efetivos e ao mesmo tempo não ocasi-one o risco de hemólise por exposição dos eritrócitos a umfluido excessivamente hipotônico. Alguns autores sugeremque a correção com solução contendo glicose está associa-da a acidose láctica intracelular cerebral, devendo por istoser evitada.27

Em alguns casos, a solução salina a 0,9%, contendo 154mEq de sódio por litro, pode ser útil. Isto é verdadeiroquando coexiste depleção do espaço extracelular com a

Quadro 9.6 Interpretação e manejo da hipernatremia*

Distúrbio Sódio total Causas clínicas Osmolalidade Tratamentobásico do organismo urinária e NaU**

Perda de Sódio total Perdas renais: Urina iso - ou hipo- Solução salinaágua e sódio reduzido (diurese osmótica) tônica; NaU isotônica

� 20 mEq/LPerdas extra-renais: Urina hipertônica

sudorese NaU � 10 mEq/L

Perda de Sódio total Perdas renais: Urina iso-, hipo- ou Água ou soroágua normal diabetes insipidus, hipertônica glicosado a 5%

central ou nefrogênico NaÜ variávelPerdas extra-renais: Urina hipertônica

pele e trato respiratório NaÜ variável

Adição Excesso de Hiperaldosteronismo Urina iso - ou hiper- Água ou sorode sódio sódio total primário; síndrome de tônica NaU glicosado a 5%

Cushing; diálise � 20 mEq/L � diuréticoshipertônica; bicarbonatode sódio hipertônico

*Modificado de Berl, T. e cols.8

**NaÜ indica a concentração urinária de sódio.

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hipernatremia. Esta solução (154 mEq/L) terá ainda umcerto efeito diluidor sobre o plasma em condições de hi-pernatremia muito intensa. Na maioria das vezes, entre-tanto, a correção de hipernatremia somente com soluçãosalina isotônica é um procedimento inadequado. É prefe-rível repor uma solução salina a 0,45%, o que pode serobtido pela infusão simultânea de volumes iguais de SG5% (ou água destilada) e solução salina isotônica (a 0,9%).27

Há autores que recomendam que a solução glicosada a5% seja utilizada nas situações em que existe a possibili-dade de sobrecarga de volume com a infusão de fluidoscontendo sódio, como na insuficiência cardíaca.27

RITMO DE CORREÇÃOUma correção rápida da hipernatremia é perigosa. Com

a hipernatremia ocorre saída de líquido das células cere-brais. Dentro de 1-3 dias o volume cerebral é restauradopor líquido cefalorraquidiano (aumentando o volume in-tersticial) e pela entrada de solutos nas células (atraindoágua para o interior das células e logo restaurando o volu-me). Em casos de hipernatremia aguda, que se desenvol-ve em algumas horas, a correção rápida é relativamentesegura e eficaz.

Porém, nas hipernatremias que se instalam ao longo devárias horas ou dias, é necessária uma abordagem maiscautelosa. Nesta situação crônica, uma correção rápidacausa movimento osmótico de água para dentro do cére-bro, aumentando o seu volume.27 Este edema cerebral podecausar convulsões, lesão neurológica irreversível e morte.Há evidência de que existe segurança com um ritmo decorreção entre 0,5-0,7 mEq/L por hora, acima do qual rea-ções adversas ocorrem.47 Nenhuma reação adversa ocorrequando o ritmo de correção não excede 0,5 mEq/L porhora. Assim, se o sódio plasmático for de 168 mEq/L, oexcesso de 28 mEq/L (168-140) deve ser corrigido em 56horas (28 divididos por 0,5 mEq).27

Algumas vezes, a taxa de correção não se iguala àquelaque foi calculada. Isto provavelmente se deve a perdascontinuadas de fluidos hipotônicos. Nestas circunstânci-as, o tratamento da doença de base deve ser revisado etodas as perdas fluidas devem ser reavaliadas e acrescen-tadas à reposição já calculada. Idealmente, deve ser feitauma monitorização laboratorial a cada 4-6 horas para ava-liar a eficácia do tratamento.27

A piora do quadro neurológico durante a reposição defluido hipotônico pode significar o desenvolvimento deedema cerebral e requer reavaliação imediata e interrup-ção temporária da reposição.44

EVOLUÇÃOAparentemente, a morbidade e a mortalidade pela hi-

pernatremia se relacionam principalmente com a rapidezde instalação do distúrbio, e não com sua intensidade.Mesmo com o tratamento, a mortalidade em adultos ultra-passa 40%, o que em parte pode ser conseqüência da do-

ença de base. Muitos dos pacientes que sobrevivem desen-volvem algum grau de dano cerebral permanente.27

Além disso, alguns autores relatam a possibilidade dea hipernatremia crônica acionar um processo catabólicosistêmico. A hipótese é que a diminuição do volume dascélulas hepáticas e musculares pela hipernatremia desen-cadearia um processo de catabolismo protéico, caquexia edegradação tecidual.27

Pontos-chave:

• Ο tratamento da hipernatremia é feito comsoluções hipotônicas

• Para evitar edema cerebral, a correção dosníveis plasmáticos de sódio não deveexceder 0,5 mEq/L por hora

EXCESSO DE ÁGUA —HIPONATREMIA — ESTADO

HIPOSMOLAR

Em condições normais, a concentração plasmática de só-dio é mantida dentro de limites estreitos, 135 a 145 mEq/L,devido à regulação da sede e adequada secreção e ação doHAD. A capacidade de o rim excretar água sem solutos(controlada pelo HAD) é um ponto fundamental no con-trole da tonicidade do organismo.45 A osmolalidade efeti-va ou tonicidade se refere à contribuição de solutos que nãopodem atravessar livremente todas as membranas celula-res (como o sódio e a glicose), induzindo assim desviostranscelulares de água (v. Cap. 8).48

A dificuldade na excreção de água livre é uma das cau-sas mais comuns de hiponatremia ou estado hiposmolarencontrado no paciente hospitalizado, correspondendo a1-2% dos pacientes admitidos por doença aguda ou crôni-ca.45 Os idosos apresentam diminuição da capacidade deeliminação de uma carga de água, o que pode explicar emparte a suscetibilidade deste grupo ao desenvolvimento dehiponatremia.44

As principais situações clínicas associadas à hiponatre-mia estão agrupadas no Quadro 9.7. A hiponatremia poderesultar de liberação excessiva de HAD, anormalidades nadiluição urinária e/ou desordens do mecanismo da sede.45

Enquanto a hipernatremia sempre implica hipertonici-dade e hiperosmolalidade, a hiponatremia pode cursarcom tonicidade baixa, normal ou aumentada.48

A hiponatremia dilucional ou hipotônica (também chama-da de hiponatremia real), que é a forma mais comum dehiponatremia, é causada por retenção de água e cursa comosmolalidade plasmática menor que 275 mOsm/kg. Se aingesta ou aporte de água é superior à capacidade de ex-creção renal, ocorrerá diluição dos solutos do organismo,

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resultando em hiposmolalidade e hipotonicidade. São cau-sas deste tipo de hiponatremia: insuficiência cardíaca, se-creção inapropriada de HAD e depleção do espaço extra-celular.48-50 A hiponatremia hiperosmolar ou hipertônica ocor-re na hiperglicemia e infusão de manitol e cursa com os-molalidade plasmática habitualmente superior a 290mOsm/kg.48,50 Por fim, a hiponatremia isosmolar ou isotô-nica é a causada por hiperproteinemia ou hiperlipidemiagraves (pseudo-hiponatremia) e cursa com osmolalidadeplasmática normal, de 275-290 mOsm/kg.49

A hiponatremia também pode ser classificada de acor-do com sua duração, sendo chamada de aguda, quandodura menos que 48 horas, e crônica, quando ultrapassa esteperíodo.51

Causas de Hiponatremia

PSEUDO-HIPONATREMIATanto a hiperproteinemia (por exemplo, no mieloma múl-

tiplo) como a hiperlipidemia podem resultar em dosagensaparentemente baixas de sódio, devido ao espaço que estassubstâncias ocupam na fase aquosa de uma amostra de san-gue.45,52 Se grandes quantidades de macromoléculas ou li-pídios estão presentes, a quantidade de água por unidadede volume de plasma está diminuída. Os laboratórios apre-sentam os resultados da dosagem de sódio por unidade devolume de plasma. Entretanto, a concentração real de sódioé a quantidade (mEq) em uma unidade de volume (1 litro)de plasma dividida pela percentagem de água no plasma(cerca de 93%). Os 7% restantes do plasma correspondemàs proteínas e lipídios. Uma vez que os íons sódio estão dis-solvidos somente na fase aquosa do plasma, uma concen-tração de sódio de 143 mEq/L no plasma total equivale auma concentração de 154 mEq/L na água do plasma (143� 0,93). Para evitar avaliações errôneas, o plasma pode sercentrifugado para separar e remover as proteínas e os lipí-dios, ou a dosagem pode ser feita diretamente com eletro-dos sensíveis a íons, que somente reconhecem a quantida-de de sódio dissolvido na água do plasma.45

A redução na dosagem de sódio causada por hipertri-gliceridemia pode ser calculada multiplicando-se a concen-tração plasmática dos triglicérides (mg/dl) por 0,002. Porexemplo, para uma concentração de triglicérides de 5.000mg/dl, a concentração de sódio diminuiria de 144 para 134mEq/L.45 Para pacientes com hiperproteinemia, calcula-sea repercussão sobre a dosagem plasmática de sódio multi-plicando-se a quantidade de elevação da proteína totalacima de 8 g/dl por 0,25. Por exemplo, para uma concen-tração plasmática de proteína de 17 g/dl, a concentraçãode sódio diminui apenas 2,25 mEq/L. A pseudo-hipona-tremia é tratada com a correção da doença que ocasiona odistúrbio.45

Em todo caso, para uma conclusão correta sobre umabaixa concentração de sódio, é prudente verificar que mé-todo está sendo utilizado pelo laboratório para a dosagemdeste íon.

REDISTRIBUIÇÃO DE ÁGUAOutra causa de hiponatremia em que a diminuição na

concentração de sódio não está associada com uma dimi-nuição na osmolalidade plasmática também merece umcomentário especial. Quando está presente no plasma gran-de quantidade de um soluto (que não o sódio) que não sedifunde livremente através das membranas celulares, cria-se um gradiente osmótico que favorece o movimento deágua do intracelular para o extracelular, resultando emhiponatremia com hipertonicidade.

A causa mais comum deste tipo de hiponatremia é ahiperglicemia, mas também tem sido relatada durante te-rapia com manitol hipertônico. Ao contrário do que ocor-re com a hiperlipidemia e hiperproteinemia, a baixa con-centração de sódio nestas circunstâncias é um reflexo realda concentração de sódio no espaço extracelular. O queocorre é a passagem de água do intracelular para o extra-celular, diluindo o sódio do plasma. O tratamento destetipo de hiponatremia deve ser dirigido à correção das con-centrações elevadas de glicose ou manitol, o que resultaráno movimento de água para o intracelular, com restaura-ção da concentração do sódio plasmático ao normal.45

Outra causa é a irrigação durante cirurgia de próstata,com grandes volumes de manitol, sorbitol, glicina ou águadestilada, que acabam sendo absorvidos através do leitocirúrgico cruento. Inicialmente, o soluto absorvido ficaconfinado ao espaço extracelular, trazendo água do intra-celular, a qual dilui o sódio plasmático, resultando numestado de hiponatremia isotônica. O manitol é imediata-mente excretado na urina, mas o sorbitol e a glicina sãometabolizados, causando severa hipotonicidade e desviode água para o intracelular. Sintomas neurológicos gravespodem ocorrer, especialmente com a glicina, devido à neu-rotoxicidade direta do aminoácido e níveis elevados deamônio gerados durante seu metabolismo.45

Para calcular a contribuição da glicose ou do manitolpara a osmolalidade plasmática, basta dividir a concentra-

Quadro 9.7 Situações clínicas associadas comhiponatremia*

1. Pseudo-hiponatremia2. Insuficiência cardíaca congestiva3. Cirrose hepática avançada4. Síndrome nefrótica5. Insuficiência renal crônica6. Contração de volume intravascular ou extravascular7. Estresse emocional e físico8. Distúrbios endócrinos9. Agentes farmacológicos

10. Síndrome de secreção inapropriada de vasopressina

*Obtido de Berl, T. e col.8

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122 Metabolismo da Água

ção plasmática (mg/100 ml) pelo peso molecular da subs-tância (glicose e manitol têm peso molecular de 180). Mul-tiplica-se a concentração plasmática da substância por 10para transformar mg/100 ml em mg/L. Exemplo: se a con-centração plasmática da glicose for 180 mg/100 ml, a con-tribuição para a osmolalidade será: 180 � 10 � 180 � 10mOsm/L.

Pode-se também considerar que para cada 100 mg/dlde elevação na glicemia acima de 200 mg/dl, há uma re-dução de 1,6 mEq/L no sódio plasmático. Exemplo: a gli-cemia passou de 200 a 1.200 mg/dl. A concentração desódio plasmático deve cair de 140 para 124 mEq/L semalteração no conteúdo total de água ou de eletrólitos, masapenas com desvio de água do intracelular para o extrace-lular (1,6 mEq/L � 10 � 16 mEq).

INTOXICAÇÃO AGUDA PELA ÁGUAHiponatremia pode desenvolver-se agudamente em

pacientes que ingerem grandes quantidades de fluido hi-potônico. Isto ocorre em três situações: pacientes com taxade filtração glomerular (TFG) normal que ingerem gran-des quantidades de água (polidipsia psicogênica); pacien-tes com TFG muito reduzida que ingerem quantidadesmoderadas de água; e pacientes bebedores de cerveja.45

A polidipsia psicogênica ou ingestão compulsiva deágua é relatada em pacientes psiquiátricos, sendo que partedeles desenvolve hiponatremia sintomática. A ingesta agu-da de líquidos pode exceder 15-20 litros ao dia, superandoa capacidade máxima do rim em eliminar a sobrecarga deágua. De modo geral, a interrupção da ingesta excessiva euma diurese volumosa são suficientes para a correção dahiponatremia; estes pacientes raramente desenvolvem sin-tomas. Porém, um grupo de pacientes psiquiátricos desen-volve hiponatremia sintomática. Nestes, estudos demons-traram sensibilidade aumentada ao HAD, defeito na dilui-ção urinária independente do HAD ou mesmo níveis ele-vados de HAD. Alguns fatores, tais como a própria psico-se, náuseas, nicotina e várias drogas psicotrópicas, estimu-lam a secreção de HAD.45

Hiponatremia é bem descrita em indivíduos que inge-rem grandes quantidades de cerveja, sem aporte nutricio-nal adequado. Nesta situação, há redução da quantidadede urina diluída que pode ser formada, pois há poucossolutos na urina.

Na insuficiência renal, a diluição urinária não está com-prometida, mas a quantidade total de urina que pode serexcretada está muito reduzida devido ao comprometimen-to da TFG. Por exemplo, num paciente com TFG de 5 li-tros ao dia, apenas 30% do filtrado glomerular alcançamos segmentos diluidores do nefro, resultando em 1,5 litrode urina ao dia. Mesmo que os níveis de HAD estivessemcompletamente suprimidos, e que os 5 litros de filtradoalcançassem o segmento diluidor, o volume urinário nãopoderia exceder 5 litros. Então, no paciente com insufici-ência renal severa, a ingestão excessiva de água pode fa-

cilmente exceder a capacidade do rim de excretar uma car-ga de água, mesmo que o mecanismo de diluição estejaintacto.45

HIPONATREMIA CRÔNICAA abordagem racional ao paciente com hiponatremia

envolve uma avaliação correta do sódio corporal total eespaço extracelular (através do exame físico),31 osmolali-dade urinária e sódio urinário (v. Quadros 9.11 e 9.12). Aavaliação e a classificação do paciente hiponatrêmico combase na volemia têm sido utilizadas desde a década de1960.

Hiponatremia com Sódio Corporal Total AumentadoHiponatremia com um aumento no sódio corporal é

observada em três situações: cirrose, síndrome nefrótica einsuficiência cardíaca congestiva. O exame físico destespacientes demonstra sinais de sobrecarga e excesso doextracelular (v. Cap. 10). O denominador comum entreestas condições é um volume circulante efetivo diminuí-do, ao qual o rim responde como se estivesse sendohipoperfundido, com menor TFG e retendo sódio proxi-malmente. Esta diminuição do volume circulante efetivoativa a liberação não-osmótica de HAD, o sistema renina-angiotensina-aldosterona e o sistema simpático. A concen-tração urinária encontra-se aumentada, como resultado dasecreção excessiva de HAD e pelo menor fluxo urinário,que tem maior tempo de contato com o epitélio do ductocoletor, permitindo maior retrodifusão passiva de águapara o interstício. Com aumento da gravidade da cirrose,síndrome nefrótica ou insuficiência cardíaca congestiva,perde-se a capacidade de concentrar a urina, e uma urinaisotônica com o plasma, e com alto teor de sódio, é elabo-rada. Deve-se tomar cuidado ao avaliar a dosagem de só-dio urinário nos pacientes que recebem diuréticos, parti-cularmente os diuréticos de alça, pois também produzemurina hipotônica e com sódio alto.45

Hiponatremia com Sódio Corporal Total DiminuídoHiponatremia associada com diminuição do espaço

extracelular pode ocorrer por perdas renais ou não-renais.A semiologia evidencia sinais de contração do espaço ex-tracelular (v. Cap. 10).

As perdas não-renais incluem as perdas gastrintestinais(diarréia e vômitos), perdas cutâneas excessivas (queima-duras, raramente sudorese) ou acúmulo de terceiro espa-ço (pancreatite, peritonite, queimaduras, esmagamentomuscular). Em todas estas situações, a redução do espaçoextracelular resulta em hipoperfusão renal e diminuição daTFG. Isto provoca aumento da reabsorção de sódio no tú-bulo proximal, com menos sódio disponível para os seg-mentos diluidores distais. Também existe um estímulo aoHAD, com maior reabsorção de água. Recentemente temsido descrita a síndrome de hiponatremia dos maratonis-

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tas, em que os atletas perdem grandes quantidades de só-dio pelo suor e de modo geral ingerem fluidos de reposi-ção que contêm água, glicose e pouco sódio.45,53,54

Perdas renais de sódio são observadas com o uso dediuréticos, doença renal intersticial crônica e deficiênciade aldosterona. Todos os diuréticos, independentemen-te de seu local de ação, induzem um balanço negativo desódio. Esta depleção de sódio, por sua vez, desencadeiaa liberação não-osmótica de HAD. Na nefrite intersticialcrônica, há lesão direta das células tubulares nos segmen-tos diluidores distais e alteração da arquitetura renal nor-mal. Disso resultam uma perda renal de sódio e diminui-ção do clearance de água livre. Por fim, na deficiência dealdosterona, o defeito na diluição urinária está relaciona-do ao balanço negativo de sódio, que resulta em diminui-ção do sódio que chega aos segmentos diluidores distais,e à liberação não-osmótica de HAD induzida pela deple-ção do EEC.45

Hiponatremia com Sódio CorporalAparentemente Normal

Hiponatremia em um paciente com o espaço extracelu-lar aparentemente normal pode resultar de secreção ina-propriada de HAD (SIHAD) ou de um reajuste deosmostato.45

A SIHAD foi inicialmente descrita em 1957.55 É assimchamada, pois a secreção de HAD não se deve a um estí-mulo osmótico ou não-osmótico. Tem como característicasa hiponatremia, hipotonicidade, urina inapropriadamen-te concentrada, sódio urinário elevado e, freqüentemente,ácido úrico plasmático em níveis baixos.56 As causas destasíndrome podem ser observadas no Quadro 9.8. O meca-nismo básico da SIHAD é atividade HAD ou HAD-símileexcessiva, causando aumento da reabsorção de água noducto coletor, resultando em expansão do espaço extrace-lular. Como apenas um terço da água retida é distribuídano espaço extracelular, sinais de hipervolemia, como ede-ma ou ingurgitamento das veias do pescoço, não estãopresentes. Porém, uma discreta expansão do intravascularresulta em aumento do fluxo plasmático renal e TFG e di-minuição da reabsorção proximal de sódio. Como a secre-ção de aldosterona é normal ou tende a ser suprimida pelaexpansão crônica de volume, uma quantidade significati-va de sódio deixa de ser reabsorvida na alça de Henle etúbulo distal. Conseqüentemente, quantidades aumenta-das de sódio chegam ao túbulo coletor, que possui capaci-dade limitada de absorver sódio, e a excreção de sódio estáaumentada.45 A hipouricemia encontrada na SIHAD sedeve a uma menor reabsorção proximal de ácido úrico.57

Cabe aqui um comentário a respeito da hiponatremia empacientes com SIDA (síndrome da imunodeficiência adqui-rida). A hiponatremia é encontrada em 35-55% dos paci-entes aidéticos internados e é geralmente causada porSIHAD relacionada a pneumonia, neoplasia ou infecção dosistema nervoso central. Eventualmente perdas por diar-

réia podem causar depleção de volume circulante efetivo,ativando a liberação de HAD pelos mecanismos já descri-tos. Uma causa menos comum de hiponatremia em aidéti-cos é a insuficiência de adrenais, relacionada com infecçãopor citomegalovírus, micobactérias, pelo próprio HIV ouainda por infiltração e hemorragia por sarcoma de Kaposi.58

Os pacientes com um quadro compatível com reajustedo osmostato possuem um limiar de osmorregulação emtorno de uma hiposmolalidade plasmática. Estes pacien-tes conseguem suprimir o HAD adequadamente quandoa osmolalidade plasmática está baixa e a diluição urináriaé adequada. Em situação de hipertonicidade, há aumentoapropriado na secreção de HAD e concentração urinária.O reajuste de osmostato pode ser encontrado em qualqueruma das causas de SIHAD, estados hipovolêmicos, qua-driplegia, psicose, desnutrição e tuberculose.45,59 A hipona-tremia não é progressiva e melhora espontaneamente coma resolução da doença básica.45

Quadro 9.8 Situações clínicas associadas comSIHAD*

1. Produção excessiva de HAD por tumor• Pulmão, gastrintestinal, timo, próstata, linfoma

2. Aumento da liberação hipotálamo-hipofisária deHADa) Doença pulmonar

• Tuberculose, pneumonia, abcessob) Doenças do sistema nervoso central

• Trauma, convulsões, meningite, encefalite,abcesso

• Tumor• Hemorragia subdural, subaracnóide, aneurisma• Acidente vascular encefálico

c) Doenças endócrinas• Deficiência de glicocorticóides• Mixedema

d) Drogas• Opiáceos e barbitúricos• Ecstasy• Sulfoniluréias (clorpropamida, tolbutamida)• Nicotina• Clofibrato• Antidepressivos tricíclicos• Inibidores seletivos da recaptação de serotonina

(fluoxetina, sertralina)• Carbamazepina• Drogas antineoplásicas (vincristina, vinblastina)• Tiazídicos

e) AIDS

3. Administração exógena de HAD

4. Drogas que potencializam o efeito do HAD ou têmefeito HAD-símile• Clorpropamida• Ciclofosfamida64

• Ocitocina

*SIHAD = Síndrome da secreção inapropriada de HAD.

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124 Metabolismo da Água

Pontos-chave:

• Ο diagnóstico de hiponatremia é feito comconcentrações plasmáticas de sódio � 135mEq/L

• Hiponatremia pode cursar com volemianormal, aumentada ou diminuída

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DEHIPONATREMIA

O nível de hiponatremia que pode causar sinais e sinto-mas varia com o ritmo de queda do sódio plasmático e coma idade do paciente. Em geral, um paciente mais jovemtolera melhor um determinado nível de hiponatremia queum mais idoso. Entretanto, hiponatremia aguda pode de-terminar importantes sinais e sintomas do sistema nervo-so central: depressão do nível de consciência, convulsõese morte, mesmo com níveis de sódio plasmático entre 125e 130 mEq/L. Estas manifestações são atribuídas principal-mente a um edema cerebral, causado pela rápida reduçãona concentração plasmática de sódio.60 Isto ocorre porquenão há tempo para as células cerebrais eliminarem partí-culas osmoticamente ativas do seu interior, reduzindo as-sim o edema celular. Por outro lado, este mecanismo prote-tor contra o edema cerebral é muito efetivo na hiponatre-mia crônica, de forma que um paciente pode estar assinto-mático com um sódio plasmático inferior a 110 mEq/L.

Os sinais e sintomas se correlacionam com o grau deedema cerebral. Náuseas e mal-estar são sintomas preco-ces e podem ser observados quando a concentração plas-mática de sódio cai para 125-130 mEq/L. Na seqüênciaocorrem cefaléia, letargia, obnubilação e eventualmenteconvulsões, coma e parada respiratória, caso o sódio caiapara 115-120 mEq/L.60 Outros sinais e sintomas incluemcâimbras e anorexia, diminuição dos reflexos tendinososprofundos, reflexos patológicos, hipotermia e paralisiapseudobulbar. São particularmente suscetíveis ao edemacerebral mulheres jovens em pós-operatório, mulheres ido-sas usando diuréticos tiazídicos, crianças e pacientes hipo-xêmicos.51

Estão presentes também os sinais e sintomas relaciona-dos à doença de base que ocasionou a hiponatremia.45

Diagnóstico

Na avaliação de um paciente hiponatrêmico, a históriaclínica é de grande importância, assim como a verificaçãodo balanço hídrico, perdas e aporte de fluidos nos diasprecedentes.50

Além da dosagem do sódio plasmático e do sódio uri-nário, a osmolalidade plasmática, osmolalidade urinária,

potássio plasmático e gasometria são de utilidade no diag-nóstico diferencial das hiponatremias.

A osmolalidade plasmática encontra-se diminuída namaior parte dos pacientes hiponatrêmicos, uma vez que ébasicamente determinada pela concentração plasmática desódio. Mas, em alguns casos, a osmolalidade (e não a tonici-dade) do plasma está normal (como na hiperlipidemia e nahiperproteinemia) ou elevada (hiperglicemia, administraçãode manitol). Quando há osmolalidade plasmática elevada,ocorre movimento osmótico de água para fora das células, ea concentração de sódio no plasma diminui por diluição.57

A resposta renal apropriada em presença de um exces-so de água é excretar urina maximamente diluída. Quan-do isto não ocorre, deve-se suspeitar de que exista ação doADH ou anormalidade renal.61 Na urina, a osmolalidadeauxilia a diferenciar entre uma alteração na capacidade deexcretar urina diluída (presente na maior parte dos casos)e a polidipsia primária, na qual a excreção de água é nor-mal, mas a ingesta é tão volumosa que ultrapassa a capa-cidade de excreção. Na polidipsia primária, a resposta àhiponatremia é a supressão do HAD, resultando numaurina com osmolalidade abaixo de 100 mOsm/kg e densi-dade menor que 1,003. No restante dos casos, a secreçãode HAD continua apesar da hiponatremia, prejudicandoa diluição urinária e mantendo a osmolalidade urináriamaior ou igual a 300 mOsm/kg.57

Concentrações urinárias de sódio menores que 25 mEq/Lsugerem a participação de perdas não-renais de sódio nagênese da hiponatremia, enquanto concentrações superi-ores a 40 mEq/L sugerem secreção inapropriada de HAD.57

A dosagem do potássio e a verificação do estado ácido-básico podem auxiliar a diferenciar algumas situações: porexemplo, alcalose metabólica e hipocalemia indicam usode diuréticos ou vômitos; acidose metabólica e hipocale-mia sugerem diarréia ou uso de laxantes, e acidose meta-bólica e hipercalemia sugerem insuficiência adrenal.57

TRATAMENTO DAHIPONATREMIA

Linhas Gerais

Com exceção da pseudo-hiponatremia e da hiperglice-mia, a hiponatremia implica um desvio de água para den-tro das células e edema das células. Este desvio é particu-larmente importante no sistema nervoso central, uma vezque o cérebro está alojado no espaço inextensível da caixacraniana e o edema cerebral causa sintomas graves.61

A idade do paciente, rapidez de instalação da hipona-tremia, avaliação do volume do compartimento extracelu-lar e a concentração do sódio urinário são muito importan-tes no planejamento terapêutico dos pacientes com hipo-natremia (Quadros 9.9 e 9.11).45 A doença básica deve ser

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capítulo 9 125

avaliada e tratada adequadamente. Deve ser interrompi-do o uso de qualquer agente farmacológico que interfiracom o manejo renal da água.45

A maior parte dos pacientes hiponatrêmicos são assin-tomáticos e apresentam concentração plasmática de sódiomaior que 120 mEq/L. Nestes, a correção da hiponatremiapode ser feita de modo mais lento e gradual, através darestrição de água livre,62 e o tratamento com solução sali-na hipertônica não é indicado.45 Com a restrição de águalivre para menos de 1 litro ao dia, ocorre balanço negativode água, e o sódio plasmático é corrigido lentamente. Empacientes que se alimentam normalmente por via oral, ataxa de correção do sódio com a restrição de água raramen-te excede 1,5 mEq/dia. Já nos que não estão recebendonutrição via oral, e são mantidos apenas com fluidos in-travenosos, o balanço entre as perdas insensíveis e a repo-sição pode estar próximo de zero, e será ainda mais difícilobter um balanço negativo de água.45

Em um paciente hiponatrêmico com depleção do extra-celular concomitante, a solução salina isotônica (154 mEqde sódio por litro) é a solução escolhida. A solução salinacausa repleção do extracelular, interrompendo o estímulo

para a liberação de HAD, permitindo que a água em ex-cesso seja eliminada. Além disso, a solução salina tambémauxilia na correção da hiponatremia por possuir uma con-centração de sódio mais elevada (154 mEq/L) que o plas-ma hiponatrêmico.62

Se o paciente apresenta excesso do extracelular conco-mitantemente, ou se o paciente estiver perdendo o sódioinfundido através da urina, pode ser administrado diuré-tico de alça juntamente com a salina hipertônica. Nestasituação, é necessário avaliar a dosagem do sódio na uri-na após início do tratamento, para que este sódio seja re-posto, ao menos parcialmente. Se a correção do sódio plas-mático for menor que a esperada, a infusão deve ser rea-justada. 45

Na hiponatremia que ocorre no diabetes, a correçãoda hiperglicemia fará a água retornar para o interior dascélulas, normalizando a concentração plasmática de só-dio.

A hiponatremia associada a um excesso de sódio totalno organismo ocorre na insuficiência cardíaca, insuficiên-cia renal, cirrose ou síndrome nefrótica. O manejo destespacientes com excesso de água e sal baseia-se na restrição

Quadro 9.9 Interpretação e manejo da hiponatremia*

ConcentraçãoDistúrbio Compartimento urinária debásico extracelular Causas clínicas sódio (NaU)** Tratamento

Déficit de água Depleção do Perdas renais: NaÜ > 20 mEq/L Solução salinatotal e déficit volume extra- excesso de isotônicamaior de sódio celular diuréticos;total Deficiência de

mineralocorticóide;Nefrite perdedora

de sal;Acidose tubular

renal combicarbonatúria

Perdas extra-renais: NaÜ � 10 mEq/Lvômitos, diarréias,terceiro espaço;queimaduras,pancreatite

Excesso de Discreto excesso de Defic. de glicocorticóide; NaÜ � 20 mEq/L Restrição de águaágua total volume extrace- Hipotireoidismo;

lular (sem edema) Dor, emoção, drogas;Síndrome de secreção

inapropriada de HAD

Excesso de Excesso do Síndrome nefrótica; NaÜ � 10 mEq/L Restrição de águasódio total volume extra- Insuf. cardíaca;e maior celular (edema) Cirrose hepáticaexcesso deágua total Insuf. renal aguda NaÜ � 20 mEq/L

e crônica

*Modificado de Berl, T. e cols.8

**NaÜ indica a concentração urinária de sódio.

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126 Metabolismo da Água

Quadro 9.10 Diagnóstico diferencial da hipernatremia

HIPERNATREMIA

AVALIARVOLEMIA

NORMOVOLEMIA– Água corporal total �– Sódio corporal total ↔

HIPOVOLEMIA– Água corporal total ��– Sódio corporal total �

HIPERVOLEMIA– Água corporal total �– Sódio corporal total ��

NaU variável NaU �20NaU � 20 NaU � 20

Ganho de SódioPrimárioHiperaldosteronismoS. CushingDiálise hipertônicaBic. sódio hipertônicoComprimidos de NaCl

Perda Extra-renalde H2OPerda insensível

PeleRespiratória

PerdaRenalde H2OD insipidusHipodipsia

PerdaExtra-renalde H2O � Na�

SudoreseexcessivaQueimadurasDiarréiaFístulas

Perda Renalde H2O � Na�

Diuréticoosmóticode alça

Pós-desobstruçãoDoença renal

Adaptado de Schrier, R.W.31

NaU � sódio urinário (mEq/L).

Quadro 9.11 Diagnóstico diferencial da hiponatremia

Adaptado de Schrier, R.W.31

NaÜ � sódio urinário (mEq/L).

HIPONATREMIA

AVALIARVOLEMIA

EUVOLEMIA– Água corporal total �– Sódio total ↔

HIPOVOLEMIA– Água corporal total �– Sódio total ��

HIPERVOLEMIA– Água corporal total ��– Sódio total �

NaU � 20 NaU � 20 NaU � 20 NaU � 20NaU � 20

PerdaExtra-renal– Vômitos– Diarréia– Terceiro

espaço

Perda Renal– Diuréticos– Deficiência de

mineralocorticóide– Nefrite intersticial

crônica– Diurese osmótica

– Síndromenefrótica

– Cirrose– Insufic.

cardíaca

– Insufic.renalagudaoucrônica

– Deficiência deglicocorticóide

– Hipotireoidismo– Drogas– Estresse– SIHAD

Page 28: 09 - Metabolismo da Agua

capítulo 9 127

de água e sal e no uso apropriado de diuréticos. Conside-rar hemodiálise nos casos de concomitante insuficiênciacardíaca congestiva ou síndrome nefrótica.

O manejo dos pacientes com hiponatremia e depleçãodo volume extracelular baseia-se na expansão do volumecirculante com solução salina isotônica. Os diuréticos, seem uso, deverão ser suspensos, e potássio deverá ser ad-ministrado, se houver hipocalemia. No caso da insufici-ência de adrenal, deve ser feita a adequada reposição hor-monal.

Nos pacientes com hiponatremia e sem sinais de altera-ção do sódio total do organismo, como ocorre na SIHAD ereajuste do osmostato, o manejo básico é a restrição líqui-da, que geralmente normaliza a concentração plasmáticado sódio. Apenas quando há sintomas de intoxicação aquo-sa, há necessidade de uma correção mais rápida (estupor,coma, convulsões). Em caso de necessidade de uso de so-lução contendo sódio, considerar que o manejo renal dosódio na SIHAD está intacto, ao contrário da depleção doextracelular, em que o sódio é retido. Isto significa que osódio administrado será eliminado na urina, e para issonecessitará de um volume de água. Por exemplo, ao seadministrar 1 litro de solução salina isotônica (300 mOsm),o sódio será eliminado juntamente com cerca de 500 ml deágua. Os 500 ml restantes terminarão por diluir ainda maiso plasma hiponatrêmico. Se for administrada uma soluçãohipertônica a 3% (1.026 mOsm/L), o sódio será eliminadopela urina, mas para isso necessitando de um volume maiorde água, o que produz um balanço negativo de água, cola-borando para a correção da hiponatremia. Concluindo, nahiponatremia sintomática da SIHAD a osmolalidade dofluido administrado deve exceder a osmolalidade da uri-na (que nesta síndrome geralmente é superior a 300mOsm/L). Portanto, a solução salina é de pouca utilidadenesta situação. Pode haver benefício também na adminis-tração de diurético de alça, o qual inibe a reabsorção decloro no ramo ascendente espesso da alça de Henle, o queinterfere com o mecanismo de contracorrente e induz umestado de resistência ao ADH. A demeclociclina e o lítiodiminuem a responsividade do túbulo coletor ao HAD eaumentam a excreção de água.62

Para os pacientes hiponatrêmicos com insuficiência car-díaca, cirrose ou SIHAD, uma perspectiva para o futuro éa utilização de um antagonista seletivo dos receptores V2(antidiuréticos) do HAD, atualmente em fase de testes. Esteagente produziria um balanço negativo de água sem pro-duzir mudanças na excreção de sódio e potássio.62,63

Cálculo do Excesso de ÁguaCalcular qual o excesso de água em um paciente de 70

kg, com sódio plasmático de 120 mEq/L.

1.° passo: Calcular qual seria a água total normal deste pa-ciente: 70 kg � 60% � 42 litros.

2.° passo: Calcular a quantidade de água total que este pa-ciente possui com o sódio em 120 mEq/L.

Água atual � Água normal � Sódio normal

� 42 � 140

� 49 litrosSódio atual 120

3.º passo: Excesso de água: Água atual � água normal� 49 � 42 � 7 litros de excesso de água.

Tratamento da Hiponatremia SintomáticaA hiponatremia sintomática é uma emergência médica,

e muitas vezes os pacientes necessitam de suporte avan-çado de vida, dada a intensidade do edema cerebral. Ossinais neurológicos e sintomas já foram descritos. Esta sín-drome pode ocorrer em qualquer estado hiposmolar, in-dependente do volume extracelular do paciente. Mesmopacientes com hiponatremia e grave depleção de volumepodem desenvolver edema cerebral.

Nestas circunstâncias, é necessária correção mais ágil dodistúrbio (v. Quadro 9.12). Por isso, a restrição de água nãoé considerada terapia adequada para a hiponatremia sin-tomática, uma vez que promove correção lenta do sódioplasmático.45 Nos indivíduos com hiponatremia sintomá-tica, o tratamento de escolha é a administração de soluçãosalina hipertônica (a 3%).

O cálculo da quantidade de sódio necessária para ele-var a concentração plasmática a um determinado valor éfeito com a fórmula a seguir:

Na necessário (mEq) � Água corporal normal � (Nadesejado � Na atual)

Por exemplo, quantos mEq de sódio são necessários paraelevar o sódio plasmático de 110 para 120 mEq/L numpaciente de 70 kg? Na necessário (mEq) � 42 L � (120 �110) � 420 mEq

Então, são necessários 420 mEq de sódio.Uma vez que a solução salina a 3% contém aproxima-

damente 514 mEq de sódio por litro, serão necessários cercade 800 ml desta solução para atingir o objetivo, o que podecausar sobrecarga de volume, principalmente nos pacien-tes com baixa reserva cardíaca. Quando a solução salina a3% não estiver disponível, pode ser preparada a partir dasolução salina isotônica a 0,9%, acrescentando 10 ml de clo-reto de sódio a 20% para cada 100 ml de salina isotônica.Observe que, no exemplo acima, a correção de 10 mEq es-taria dentro do limite de segurança para as 24 horas, mas,na presença de sintomas, a correção inicial pode chegar a1,5-2 mEq nas primeiras 3-4 horas, até a melhora dos mes-mos (v. Quadro 9.12).

Este modo de correção não deve ser usado para restaurar osódio plasmático a níveis normais! A utilização da salina hiper-tônica visa a melhora dos sintomas neurológicos mais graves.

Durante o intervalo em que a correção da hiponatremiasintomática estiver sendo feita, devem ser monitorados os

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128 Metabolismo da Água

Quadro 9.12 Tratamento da hiponatremia, com base na duração e nos sintomas

Baseado em Berl, T.51

HIPONATREMIA

AGUDA CRÔNICA AGUDA CRÔNICA

Solução salinahipertônica

1-2 ml/kg/h�

Furosemide

A correção nãodeve ultrapassar 2mEq/L por hora

Não énecessáriacorreçãoimediata

Restriçãode

água livre

Solução salinahipertônica

1-2 ml/kg/h�

Furosemide

A correção nãodeve ultrapassar10-12 mEq/dia

SINTOMÁTICA ASSINTOMÁTICA

eletrólitos plasmáticos, até que o paciente esteja neurolo-gicamente estável.45 Além disso, há necessidade de semonitorar a volemia, se possível com medida da pressãocentral venosa (considerando suas limitações potenciais)ou pressão em capilar pulmonar com o cateter de Swan-Ganz.

Em 1973, Hantman e colaboradores propuseram o em-prego de furosemida no manejo da hiponatremia.64 Isto seaplica sobretudo aos pacientes que não podem tolerar umaexpansão do compartimento extracelular. A administraçãoendovenosa de furosemida induz um balanço negativo deágua, quando ao mesmo tempo se repõem as perdas ele-trolíticas (sódio e potássio) através de uma solução maisconcentrada. Os autores propõem a administração inicialde 1 mg/kg de furosemida. A concentração urinária desódio e potássio é determinada a cada hora, e a quantida-de excretada é reposta através de uma solução salina hi-pertônica (3%) com a quantidade apropriada de potássio.Nesta circunstância, a infusão de salina hipertônica deveser igual às perdas de sódio, potássio e cloro. O balançonegativo de água assim obtido é a diferença entre o fluxourinário e a quantidade de solução hipertônica adminis-trada. Doses subseqüentes de furosemida são administra-das para manter o balanço líquido negativo.

No caso de uma correção muito rápida ocorrer e serprontamente reconhecida, deve-se suspender temporari-amente a correção da hiponatremia e administrar DDAVPpara os pacientes com osmolalidade urinária baixa, pois oADH é suprimido pela hiponatremia. No caso da SIHAD,suspender a salina hipertônica. Os dados obtidos experi-mentalmente sugerem que o benefício deste tipo de abor-

dagem ocorre se o tratamento for iniciado antes do apare-cimento de sintomas neurológicos, ou seja, nas primeiras24 horas. Não há benefício se a desmielinização já se insta-lou.62

Ritmo de CorreçãoNão se sabe ao certo com que rapidez se deve corrigir

uma hiponatremia grave. Em pacientes assintomáticos,considera-se adequado corrigir cerca de 10-12 mEq/dia (0,5mEq/hora).

Já os pacientes sintomáticos necessitam de uma corre-ção mais rápida, com outra estratégia, mas mantendo oslimites de segurança. Nos pacientes sintomáticos, com con-vulsões ou outros sintomas graves, recomenda-se umacorreção inicial mais rápida, cerca de 1,5-2 mEq/hora, nasprimeiras 3-4 horas, ou até melhora dos sintomas neuro-lógicos. A correção no primeiro dia também não deve ul-trapassar 12 mEq.

Complicações do TratamentoA adaptação que preserva o volume cerebral na hipo-

natremia crônica protege contra o aparecimento de edemacerebral, mas cria problemas no momento do tratamento,pois um aumento rápido na concentração de sódio no plas-ma durante a correção pode levar à mielinólise pontinacentral (ou desmielinização osmótica).

O termo mielinólise pontina central pode não ser o maisadequado, uma vez que a desmielinização é geralmentemais difusa e muitas vezes não envolve a ponte. Estas al-

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capítulo 9 129

terações podem ocasionar graves repercussões neurológi-cas que permanecem transitória ou definitivamente apóso tratamento.

Na hiponatremia crônica (desenvolve-se em mais de48 horas) há perda de osmóis intracelulares como prote-ção contra o edema cerebral. Porém, estes osmóis nãopodem ser rapidamente repostos quando o cérebro dimi-nui de volume durante a elevação do nível de sódio nosangue. Como resultado, o volume do cérebro diminuidurante a correção rápida da hiponatremia. É nas áreasonde o reacúmulo de osmóis é mais lento que as lesõesde mielinólise são mais intensas. Um mecanismo possí-vel é que a diminuição de volume dos axônios induzidapela variação osmótica produza a desmielinização pelaruptura de conexões dos axônios com sua bainha de mi-elina.60

De maneira geral, as manifestações clínicas de desmi-elinização osmótica ocorrem 2-6 dias após a correção dosníveis de sódio. Os sintomas incluem disartria, disfagia,letargia, paraparesia ou quadriparesia e até coma. Estessintomas podem não ser reversíveis.62 Evidências de-monstram que é a rapidez de correção nas primeiras 24horas que determina a ocorrência de lesões desmielini-zantes. Estas lesões são mais freqüentes quando a corre-ção ultrapassa 20 mEq/dia ou quando o sódio se elevapara mais de 140 mEq/L, e mais raras com correçõesabaixo de 0,5 mEq/hora ou 10-12 mEq/dia. Lesões des-mielinizantes não são vistas quando a correção é maislenta.62

A tomografia computadorizada e a ressonância magné-tica detectam as lesões de desmielinização, sendo este úl-timo método o preferido.65 Às vezes são necessárias atéquatro semanas para as lesões serem detectadas.62

Encontram-se em maior risco para o desenvolvimentoda desmielinização osmótica: mulheres na fase pré-meno-pausa usando tiazídicos, etilistas, desnutridos, queimados,pacientes depletados em potássio e crianças pré-púberese pacientes em insuficiência respiratória.51,66 Os pacientespsiquiátricos que desenvolvem polidipsia com hiponatre-mia de modo geral corrigem rapidamente a hiponatremia,sem seqüelas.60,62

Pontos-chave:

• O tratamento da hiponatremia depende dagravidade dos sintomas e rapidez deinstalação. Os sintomas mais gravesdecorrem de edema cerebral

• A hiponatremia sintomática é corrigida coma administração de solução salinahipertônica a 3%

• A correção da hiponatremia sintomática nãodeve ultrapassar 0,5 mEq/L/hora

EXERCÍCIOS

1) Um paciente de 35 anos sofreu trauma cranioencefálico grave e foi in-ternado em coma, escala de Glasgow 5, evoluindo para Glasgow 3. Seudébito urinário nos primeiros dois dias foi de aproximadamente 7 li-tros/dia. Além de receber 2 litros de solução salina isotônica e 1 litrode solução glicosada a 5% a cada dia, manitol era administrado na dosede 70 ml a cada 8 horas. Seus exames atuais demonstraram: Na� � 165mEq/litro. Responda:a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Qual?b) Qual a causa mais provável para o mesmo?c) Como você corrigiria este distúrbio?

2) Para um sódio plasmático de 150 mEq/litro, num paciente de 70 anosde idade, com 60 kg e assintomático, calcule:a) Qual a água normal?b) Qual a água atual?c) Como corrigir este distúrbio?

3) Mulher de 55 anos, usuária de fluoxetina, internada por broncopneu-monia. Na admissão, espaço extracelular aparentemente normal,contactuando adequadamente. Na� � 128 mEq/litro. Durante a in-ternação atual, tornou-se confusa e progressivamente sonolenta. Na�

� 117 mEq/litro. Peso = 55 kg.a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Qual?b) Qual a causa mais provável?c) Como tratar?

4) Homem portador de síndrome nefrótica, em anasarca, internado portromboflebite em membro inferior. Sem outros sintomas. Peso = 72kg. Na� � 125 mEq/L.a) Qual a água normal?b) Qual a água atual?c) Qual o tratamento?

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ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET

http://www.kidneyatlas.org/book1/adk1_01.pdf —Excelente capítulo do Atlas on-line de Doenças Renais deRobert Schrier. Ótimas figuras.http://www.postgradmed.com/issues/2000/05_00/fall.htm — Artigo interessante sobre hipo- e hipernatremia.http://www.aafp.org/afp/20000615/3623.html — Artigosobre hipo- e hipernatremia em idosos.http://www.emedicine.com/emerg/topic263.htm — Boarevisão sobre hipernatremia.http://www.emedicine.com/emerg/topic275.htm — Boarevisão sobre hiponatremia.http://www.learndoctor.com/chapterpages/chapter19.htm— Auto-avaliação em metabolismo da água.http://www.swmed.edu/stars/resources/toto.pdf —Grupo de slides muito bons sobre hipernatremia.

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capítulo 9 131

http://www.curriculum.som.vcu.edu/m2/renal/ppt/Homeostasis/ — Grupo de slides sobre distúrbios dometabolismo do sódio e da água.http://www.ndif.org/Translation/jtran-160.html —Resumo de um artigo da Medical Clinics of NorthAmerica de maio de 1997, pela Nephrogenic DiabetesInsipidus Foundation.

RESPOSTAS DOS EXERCÍCIOS

OBS.: Nestes exercícios utilizaremos 60% como a percentagem de águaem relação ao peso corporal, para homens e mulheres.

1) 35 anos, trauma cranioencefálico, sódio � 165 mEq/litro.a) Existe distúrbio hidroeletrolítico? Sim. Qual? Hipernatremia.b) Qual a causa mais provável? Este paciente apresenta pelo me-

nos três causas em potencial para o desenvolvimento de hiper-natremia. A primeira é o trauma cranioencefálico, que podecausar dano à secreção ou liberação de HAD, tornando o paci-ente incapaz de concentrar a urina, o que explicaria a poliúriaapresentada. Em segundo lugar, a administração de manitolinduz à produção de urina hipotônica. E por último, as perdasde água livre através da respiração e pela urina não estão sen-do adequadamente repostas.

c) Para corrigir esta hipernatremia, deveria ser reposta uma solu-ção hipotônica. O déficit de água que o paciente apresenta é de:

Sódio atual � água atual � sódio normal � água normalÁgua atual � 140 � (70 � 0,6)/165 � 35,6 litrosDéficit de água � água atual � água normal � 35,6 � 42 � 6,36 litros

Portanto, para que o sódio retorne ao normal (140 mEq/litro), é ne-cessário administrar 6,36 litros de solução salina hipotônica ou SG 5%. Acorreção não deve ultrapassar 0,5 mEq/litro/hora, em pelo menos 50horas (a dosagem de sódio está 25 mEq/litro acima do normal; 25 dividi-dos pela taxa de 0,5 � 50 horas).

2) 70 anos de idade, 60 kg, sódio � 150 mEq/litro.a) Água normal � 60% do peso � 60 � 0,6 � 36 litrosb) Sódio atual � água atual � sódio normal � água normal

Água atual � 140 � 36/150 � 33,6 litrosDéficit de água � 33,6 � 36 � 2,4 litros

c) Deve ser administrada solução salina hipotônica (2,4 litros) em20 horas (a dosagem de sódio está 10 mEq/litro acima do nor-mal; 10 divididos pela taxa de 0,5 � 20 horas).

3) 55 anos, broncopneumonia. Sódio � 117 mEq/litro.a) Trata-se de hiponatremia.b) Existem algumas possibilidades: a primeira é que a paciente

tenha uma SIHAD pela broncopneumonia, daí a impossibili-dade de eliminar urina diluída. Em segundo lugar, está em usode fluoxetina, que pode induzir aumento na liberação de HAD.Neste caso, deveria ser cuidadosamente verificado o balançode fluidos dos dias antecedentes, para excluir a participaçãode uma reposição excessiva de soro glicosado a 5%.

c) Como a paciente tornou-se agudamente sintomática, deve re-ceber solução salina hipertônica (3%). A quantidade de sódionecessária para elevar o sódio plasmático para 125 mEq é:

Sódio necessário � água corporal normal � (sódio desejado � atual)Sódio necessário � (55 � 60%) � (125 � 117) � 33 � 8 � 264 mEq

Sabendo que a solução salina hipertônica tem 514 mEq/litro, serãonecessários aproximadamente 500 ml desta solução. Nas primeiras 3-4horas, o ritmo de correção pode ser mais rápido (1,5-2 mEq/hora), e de-pois manter 0,5 mEq/hora.

Observe que em 264 ml desta solução há tanto sódio como em 1.700ml de salina isotônica. Além de corrigir a hiponatremia sintomática, estesódio também estará provocando expansão do extracelular, com o riscode congestão circulatória.

4) Paciente com síndrome nefrótica, em anasarca. Sódio � 125 mEq/litro.a) Água normal � (72 � 0,6) � 43 litros.b) Água atual � 43 � 140/125 � 48 litros.c) Este paciente apresenta excesso de 5 litros de água e está as-

sintomático. Deve ser restrita a ingestão de água e administra-do diurético, pois apresenta extracelular aumentado.