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Histórico da Av Amaral Peixoto em Niterói RJ.

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  • Avenida Amaral Peixoto: O Modernismo e o Colonial na abertura de uma via monumental.

    Carlos Alberto Peres Krykhtine

    Arquiteto e Urbanista da Secretaria de Habitao da Prefeitura do Rio de Janeiro, mestrando do curso de Ps Graduao em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense

    Rua Professor Hernani Pires de Melo, 43 ap 802 So Domingos, Niteri

    CEP 24210-130

    Tel: 9476.2852

    [email protected] [email protected]

  • Avenida Amaral Peixoto: O Modernismo e o Colonial na abertura de uma via monumental.

    A abertura de vias monumentais est sempre associada a intervenes urbanstica importantes, em que a remodelao de Paris por Haussmann representou um marco. No Rio de Janeiro, a abertura da Avenida Rio Branco no incio do sculo XX e da Avenida Presidente Vargas na dcada de 1940 representaram medidas de interveno urbana exemplares.

    Em Niteri, municpio da regio metropolitana do Rio de Janeiro, verifica-se tambm iniciativas de envergadura, dentre elas, a abertura da Avenida Amaral Peixoto em 1942 no bairro do Centro de Niteri. O seu traado regular que ancora a implantao da avenida foi resultado da implantao do desenhado do francs Pallire, em 1819, para a criao da Vila Real de Praia Grande.

    A abertura da via tem o intuito de criar uma porta de entrada para o centro cvico projetado, j experimentado por Atlio Correa Lima em seu projeto-tese Avant Projet dAmnagement et dExtension de la ville de Nireri, de 1930. O projeto implantado era um rebatimento da Avenida Presidente Vargas no Rio de Janeiro. Rasgando uma quadra densamente ocupada, a proposta prev a ligao da Rua Visconde Rio Branco (localizada no litoral) com a rua Marqus do Paran (Rua Diamantina), a partir da Praa Martim Afonso (Estao das barcas), tangenciando a Praa da Repblica (local do centro cvico da cidade). A avenida possua uma formula gabaritada com edifcios de 13 pavimentos construdos nas divisas, modulados pela testada frontal de 24 metros e galerias para o abrigo dos pedestres. A avenida mudou o cenrio colonial projetado por Palliere, que j vinha sofrendo atualizaes, principalmente pelos aterros e acrscimos de territrio ao mar, mas nenhum com o a envergadura e o radicalismo formalstico e tecnolgico da Avenida Amaral Peixoto at ento.

  • Avenida Amaral Peixoto: O Modernismo e o Colonial na abertura de uma via monumental.

    Novos tempos

    A abertura de vias monumentais est sempre associada a intervenes urbanstica importantes,

    em que a remodelao de Paris por Haussmann representou um marco. De fato, era incontestvel

    a necessidade de modernizao urbana diante das novas perspectivas tecnolgicas associadas

    ao transporte e ao saneamento das cidades. A revoluo industrial transformou a arquitetura e as

    cidades. O domnio do ao e do concreto na construo, a crescente motorizao das ferramentas

    (com a substituio do carvo pelo petrleo) e a energia eltrica revolucionaram vrios aspectos

    da vida urbana. No caso do Rio de Janeiro, os exemplos mais emblemticos so a abertura da

    Avenida Rio Branco no incio do sculo XX, e a Avenida Presidente Vargas na dcada de 19401

    representando medidas de interveno urbana que significavam a criao de novas reas de

    atrao do capital para promover novas dinmicas urbanas expandindo da cidade.

    Em Niteri, municpio da regio metropolitana do Rio de Janeiro, verifica-se tambm iniciativas de

    envergadura, dentre elas, a abertura da Avenida Amaral Peixoto em 1942. Fazendo parte do

    plano de remodelao e extenso da cidade, a avenida materializada no centro de Niteri, bairro

    localizado em frente ao centro do Rio de Janeiro, separados pela Baa de Guanabara. De maneira

    quase espelhar, a operao de implantao da Avenida Amaral Peixoto em muito se assemelha a

    abertura da Avenida Presidente Vargas, em uma escala menor. Em ambos os casos, longas

    extenses territoriais foram desapropriadas pelo poder pblico, que reparcelou a terra em lotes

    adaptados a monumentalidade esperada para o espao do novo urbano que se descortinava.

    O Desenho de Pallire

    O seu traado regular que ancora a implantao da avenida foi resultado da implantao do

    desenho Arnaud Julien Pallire (Bordeaux, Frana 1784 idem 1862)2 em 1818 (Figura 1),

    compondo plano de urbanizao da cidade da Vila Real da Praia Grande, que hoje corresponde

    ao centro da cidade de Niteri. O plano tambm atribudo ao Major Engenheiro Antnio

    Rodrigues Gabriel de Castro. Junto com o desenho de Pallire a vila foi dotada de cdigo de

    posturas que disciplinava e regulava as construes, exaltando sua caracterstica colonial como

    podemos comprovar no texto da Ata da Cmara da Vila Real da Praia Grande encaminhando os

    informes e a normativa a Dom Joo VI. Dizia o primeiro documento, remetendo o Plano:

    1 A avenida foi criada pelos decretos municipais n 6897 e 6898 de 28 de dezembro de 1940

    2 Pintor, desenhista, litgrafo, decorador, professor. Estuda retrato e pintura histrica em Paris, em 1805. Participa do Salo de Paris

    em 1808, 1810 e 1814. Chega ao Rio de Janeiro em 1817, no mesmo navio que traz a princesa Maria Leopoldina (1797 - 1826). Nesse ano, a pedido de dom Joo VI (1767 - 1826), pinta vrios panoramas das provncias do Rio de Janeiro, So Paulo e Minas Gerais. Em 1818, desenvolve um plano para a urbanizao da cidade da Vila Real da Praia, hoje Niteri, Rio de Janeiro. Atua como professor de desenho na Real Academia Militar. Segundo alguns historiadores, o artista faz as primeiras litogravuras no Brasil, na Oficina do Arquivo Militar. Pinta o primeiro Panorama da Cidade de So Paulo (visto do rio Tamanduate), em 1821. No ano seguinte, casa-se com a filha do arquiteto Grandjean de Montigny (1776 - 1850), integrante da Misso Artstica Francesa. Realiza vrios retratos, entre eles o da imperatriz dona Amlia de Leuchtenberg (1812 - 1873), em 1829, a pedido do imperador dom Pedro I (1798 - 1834). Retorna Frana em 1830.

  • (...) contemplando a utilidade e esplendor que resultar se esta vila for edificada sobre um

    plano regular e decoroso; e pesando com vistas no futuro as bem fundadas esperanas de

    que a mesma cresa em numerosa populao a passos rpidos, (...) este stio recebeu nos

    ltimos dez anos de sua existncia, que no contando quele tempo seno trinta a quarenta

    casas, hoje est enriquecido com perto de trezentas; (...) tem a honra de depor na mui alta e

    augusta presena de Vossa Majestade o seguinte Plano de Edificao da Vila Real da Praia

    Grande. A planta junta oferece uma vista aproximada do estado atual da edificao desta

    vila, e do qual ela dever vir a ser se este plano for levado a desempenho. Os lugares que

    vo em branco denotam as ruas antigas; os que vo marcados entre pontos encarnados

    indicam as ruas novas. O campo nmero um ser destinado para sobre ele se levantar um

    Passeio Pblico, consagrado feliz memria do faustssimo dia treze de maio de mil

    oitocentos e dezesseis. No nmero segundo se levantar o Rossio3, que ser formado por

    um quadrado retngulo de mil e quinhentos e quarenta palmos, e no centro dele se colocar

    o pelourinho. (...) Sobre a Rua nmero seis se levantaro mais quatro ruas, nmeros sete,

    oito, nove e dez, paralelas entre si o mais que for possvel4. Estas cinco ruas sero cortadas

    por nove ruas transversais, que todas devem ter seu comeo na Rua seis e o seu

    acabamento na nmero dez5. Todas as ruas contaro uma largura de 60 palmos e ao

    menos de cinqenta aquelas que por algum obstculo atendvel no puderem ter 60. (...)

    Este ser regulado pela maneira seguinte: nos cantos e esquinas das quatro ruas que

    quadram o Rossio e nos dois cantos da Praa sobre o mar, a ningum ser permitido

    levantar seno casas de sobrado. No meio e dos lados do Rossio e em todas as outras ruas

    ser livre edificar casas de sobrado ou trreas sempre que aquelas tenham trinta e cinco

    palmos de altura e estas dezessete, sendo de doze a altura das portadas. Ningum poder

    edificar fora do alinhamento das ruas; e por nenhum pretexto ser livre a qualquer deixar

    nas mesmas ngulos entrantes ou salientes que dem lugar a serem nelas surpreendidos

    insidiosamente os que de noite passarem pelas ditas ruas. A Rua da Praia conservar o

    alinhamento que lhe foi dado, por meio de uma singela graderia de madeira fingindo bronze,

    entre pilares de tijolo e cal, levantada na frente das casas. Nas outras ruas as casas sero

    edificadas sobre o alinhamento; e se alguma pessoa quiser formar ptio ao lado de sua

    casa, ou conservar terreno com chcara, ser obrigado a aformosear a frente da rua com

    um muro da altura de doze palmos, coberto de cal branco. Para evitar que no centro da vila

    se conserve terreno devoluto e sem casas, (...), todos os donos de terrenos devero ser

    obrigados por termo assinado na Cmara a edificar no termo de trs anos; e no querendo

    ou no podendo sero constrangidos a venderem seus terrenos quelas pessoas que se

    3 O Plano assinala como Rossio o atual Jardim So Joo,.

    4 A Rua 6 era a Rua da Praia, batizada como Visconde do Rio Branco em 1880. As paralelas foram denominadas d'El Rei, da Rainha,

    do Prncipe e da Princesa. As duas primeiras passaram a se chamar Visconde do Uruguai e Visconde de Itabora, em 1868; a Rua do Prncipe recebeu em 1882 o nome de Baro do Amazonas; e a Rua da Princesa desde 1888 a Visconde de Sepetiba. 5 Esse plano no voltou da Mesa do Desembargo do Pao, tendo a Cmara, por isso, grande dificuldade em execut-lo. H cerca de

    meio sculo foi descoberto por um pesquisador de renome, que o teria vendido a uma biblioteca ou colecionador americano, deixando em seu lugar, no Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro, apenas uma cpia fotosttica de muito m qualidade.

  • obrigarem a edificar no sobredito terreno6, pagando aos donos dos terrenos o justo valor

    (...). E por igual razo a ningum ser permitido aforar seno metade dos fundos que houver

    nos espaos de rua a rua, conseguindo-se daqui ao mesmo tempo a vantagem de que todas

    as casas fiquem patrimoniadas de quintais. Se na abertura de novas ruas, praas e largos, a

    necessidade de sua retido ou largura conveniente comodidade dos habitantes e ao

    servio dos que por elas passam for encontrar alguma pequena casa ou plantaes, ser o

    seu valor pago pela Cmara, pelo seu justo preo, (...). Jos Clemente Pereira7. Pedro

    Henrique da Cunha. Joo de Moura Brito. Francisco Faria Homem.

    Essas disposies, e o fato de definir com muita preciso a utilizao dos espaos pelos edifcios

    pblicos (Cmara, Cadeia, matriz, mercado, etc) deixam claro que muito alm de um simples

    plano de arruamento, este era de fato um plano de urbanizao. Da muitos historiadores

    defenderem a tese de que Niteri foi a primeira cidade realmente projetada do Brasil.

    Figura 1 - Projeto de Edificao da Vila Real da Praia Grande. Fonte: Sociedade de Geografia de Lisboa, 1819

    O traado original encaminhado ao regente foi implantado e as vias do ncleo do bairro

    resguardam at hoje os 60 palmos de largura (cerca de 12 metros) de testada a testada dos lotes

    6 Interessante que o plano em 1818 utilize a edificao compulsria dos terrenos ociosos, instrumento esse regulamentado nos dias

    atuais, atravs do Estatuto das Cidades, Lei Federal 10.257 de 10 de julho de 2001 7 O plano tambm ficou conhecido por Plano Jos Clemente administrador pblico a poca.

  • com seus imveis edificados no alinhamento dos passeios, com suas esquinas chanfradas e

    quintais cercados por muros.

    Novos desenhos de expanso

    Passados cerca de 120 anos desde o desenho proposto, e analisando a evoluo da malha

    urbana, constata-se tambm a preocupao do Estado em legislar sobre a produo da cidade e

    o que nela acontece. No regime republicano, instaurado em 1889, depois de uma tumultuada

    dcada, inicia um esforo modernizador, e ao transformar a Provncia do Rio de Janeiro em

    Estado e fazer de Niteri sua capital, realizou grandes investimentos na cidade, da mesma forma

    como acontecia na vizinha capital federal, onde o prefeito Pereira Passos, seguindo a orientao

    do Presidente da Repblica, Rodrigues Alves, tentava transformar o Rio de Janeiro numa "grande

    cidade", num esforo que se prolongaria pelas primeiras dcadas do sculo XX.

    Um passo firme dado em direo a modernizao da Cidade de Niteri ocorreu na dcada de

    1920, quando foi realizado o aterro de 357.000 m2 que eliminou a enseada de So Loureno com

    as terras provenientes de 3 morros da cidade, para dar lugar ao Porto (1927). O traado, radial e

    concntrico, influenciado por Howard, parece ser contemporneo s propostas de Agache para o

    aterrado do Castelo, considerando que em 1927 este projeto j estava publicado. (Azevedo, 2005)

    Dessa forma, a cidade contava com oferta de reas urbanizadas adequadas ao seu porte e sua

    dinmica de crescimento no incio da dcada de 1940. Apesar disso, observa-se o

    recrudescimento de uma vaga urbanizadora aps a decretao do Estado Novo (1937-1945) com

    a consolidao de Ernani do Amaral Peixoto como Interventor do estado do Rio. Trata-se de um

    perodo de investimentos urbanos e de relaes estreitas com a iniciativa privada do setor de

    obras pblicas e da construo civil. Duas obras se destacam: o aterrado da Praia Grande e a

    abertura da Avenida Amaral Peixoto8. A dcada que se segue mais discreta, representando a

    sedimentao da Avenida e a postergao das obras do aterrado, cuja realizao, lenta e

    juridicamente no equacionada, traz conseqncias que se estendem at os nossos dias.

    (Azevedo, 2005)

    Uma interveno monumental

    A Avenida Amaral Peixoto mudou o cenrio colonial projetado por Palliere. J bastante povoado

    por espcimes arquitetnicos eclticos, a malha urbana vinha sofrendo atualizaes, mas,

    excetuando os aterros, nenhum com o a envergadura e o radicalismo formalstico e tecnolgico da

    Avenida at ento.

    A abertura da via teve o intuito de criar uma porta de entrada para o centro cvico projetado, j

    experimentado pelo plano de Attlio Correa Lima em seu projeto-tese Avant Projet

    8 A Avenida inicialmente teve dois nome: Rua Bernardo Vasconcelos e Av. Duque de Caxias, recebendo a designao atual em 1952.

  • dAmnagement et dExtension de la ville de Nireri, defendida em 13 de dezembro de 1930 no

    Institut dUrbanisme de Paris. O projeto implantado era um rebatimento da Avenida Presidente

    Vargas no Rio de Janeiro. De acordo com a anlise de Azevedo (1997, p.45),9 podemos comparar

    os planos Agache e Corra Lima e encontrar muitos pontos em comum: priorizao das reas

    pblicas, praas monumentais que irradiam grandes avenidas e diagonais que configuram um

    sistema de trnsito, monumentos nas principais intersees, parques, alm da preocupao

    explcita de Correia Lima de integrar os centros de Niteri e do Rio, por tnel ou ponte.

    Rasgando uma quadra densamente ocupada, a proposta prev a ligao da Rua Visconde Rio

    Branco (localizada no litoral) com a Rua Marqus do Paran (antiga Rua Diamantina), a partir da

    Praa Martim Afonso (Estao das barcas), tangenciando a Praa da Repblica (local do centro

    cvico da cidade). As obras que vo ser iniciadas faro da capital fluminense uma das mais

    modernas cidades do Brasil e da Amrica, modificando assim inteiramente, seu aspecto vetusto

    que mais avilta em contraste com a capital carioca. (jornal O FLUMINENSE, em 6 de fevereiro

    de 1942).

    Nas Figuras 2 e 3, podemos observar um comparativo entre a massa edificada do casario

    existente em 1940, antes da implantao da avenida e a sua resultante, j em 199610. Na

    simulao possvel perceber a mudana de escala do conjunto edificado e tambm o grande

    eixo que se forma em direo ao conjunto cvico da Praa da Repblica (edificaes em amarelo

    claro ao fundo). A predominncia em 1940 era de edificaes de um pavimento, salteadas por

    sobrados, sobretudo na rua da praia, como preconizava o plano original. Eventualmente

    encontramos edificaes de 3 pavimentos.

    9

    Azevedo, Marlice, faz uma anlise das propostas de Atlio Correia para Niteri e levanta uma dvida sobre a possvel influncia que as idias expressadas pelo plano teriam representado nos anos seguintes. Esta anlise est presente em outro artigo da autora: Niteri: Planos e projetos para uma capital da velha repblica. P. 45 In Seminrio de Histria da Cidade e do Urbanismo. 1996, onde aponta a presena de preceitos de Henard e Howard e solues sanitaristas de Saturnino de Brito.

    10 A simulao de 1996 apresentada utilizou as bases Aerofotogramtricas da Fundao CIDE (centro de Informaes do Estado do

    Rio de Janeiro, disponveis no departamento de Urbanismo da Prefeitura de Niteri. A de 1940, foi reconstituda a partir de plantas cadastrais da Prefeitura.

  • Figura 2 - Simulao das quadras antes da interveno da avenida

    Figura 3 - Simulao das quadras aps a consolidao da avenida

    A avenida possua uma formula gabaritada com edifcios de at 13 pavimentos construdos

    colados nas divisas, modulados pela testada frontal de 24 metros, embora observado que nem

    todos os lotes tiveram a testada generosa defendida para o projeto, sendo que variavam entre 10,

    12 e 18 metros, com profundidade de 23 metros , em sua maioria. As galerias para o abrigo dos

    pedestres so tambm uma caracterstica marcante com p-direito duplo, possuindo seis metros

    e oitenta centmetros de altura e quatro metros de passeio coberto e um metro de passeio

    desabrigado entre os pilares da galeria e o meio fio.

    Um dos edifcios mais emblemticos da avenida o Edifcio das Secretarias (Figura 4). Constitui-

    se de uma construo modernista exemplar, fachada em concreto aparente, com Breeze Soleil,

    pilotis e pavimentos-tipo livres, elevadores abrindo para o passeio pblico, alm de esquadrias

    deslizantes e com venezianas. O edifcio contava ainda com um painel de Burle Max que foi

    retirado em 1972. O edifcio coroava o inicio da Avenida Amaral Peixoto no seu primeiro trecho e

    se confrontava com o antigo edifcio do Frum, em estilo ecltico.

  • Figura 4 Ilustrao do Edifcio das Secretarias (lbum do Estado do Rio de Janeiro 1951/54)

    Os projetos eram principalmente comerciais, mas tambm foram construdos prdios residenciais

    e mistos, dois deles em galeria (uma delas sobre a travessa Maurity), comunicando-se com a rua

    vizinha. A maioria das licenas para construo se deram na dcada de 1950, quando os prdios

    eram majoritariamente comerciais. Entre os prdios licenciados havia exemplares de prdios

    residenciais e mistos. A atividade bancaria da cidade se concentrara nesta avenida e a ocupao

    foi mais intensa no lado mpar cujas galerias e caladas logo se transformaram em corredores de

    passagem obrigatria dos polticos fluminenses, que da Assemblia Legislativa seguiam para a

    Cmara e o Senado, do outro lado da baa, at a mudana da capital federal. (Azevedo, 2005)

    Na Figura 5 percebemos o posicionamento da avenida sobre a malha da cidade, onde possvel

    perceber a subtrao da Travessa Maurity. Mesmo com o rigor e a fora da implantao, curioso

    perceber que possvel reconhecer algumas permanncias arquitetnicas ainda das antigas

    quadras, principalmente na periferia do eixo.

  • Figura 5 - Acima, a Avenida Amaral Peixoto e suas ruas transversais. Logo abaixo, a simulao das quadras antes da interveno onde

    podemos verificar a existncia da Rua Maurity

    Como instrumento urbano de transferncia da propriedade foi utilizado essencialmente processos

    desapropriatrios que se estenderam at 1963, seguindo ao fim de cada processo com a

    realizao de concorrncias pblicas (foram quase 20 ao todo). Como a Avenida foi aberta em 2

    etapas, os procedimentos iniciais de venda, direcionados ao primeiro trecho, parecem ter tido uma

    resposta significativa do mercado imobilirio. Em algumas operaes temos os exemplos dos

    lotes 1 e 3, inicialmente vendidos pela municipalidade, em 1943, Empresa Fluminense de

    Diverses Ltda. ( a incorporadora do Hotel Quitandinha, em Petrpolis), e j repassados ao Banco

    Predial, 3 anos depois. Outra forma de operao imobiliria eram as permutas, como ocorreram

    entre o Instituto de Aposentaria e Penses dos Martimos e a Prefeitura para aquisio do lote 56.

    Com a desapropriao da segunda etapa da avenida, uma propriedade foi trocada por um lote da

    Prefeitura na Rua Miguel Couto em Icara. A transferncia de lotes tambm foi feita para

    abatimento de dvidas bancrias da municipalidade. Localizou-se tambm a doao de lote para a

  • Associao Fluminense de Jornalistas (lote 36), com vrias prorrogaes de prazo para que a

    Associao pudesse cumprir o tempo exigido para a edificao do prdio. Os vencedores da

    concorrncia tinham prazo de construo e normas para os projetos, comerciais ou mistos

    (dimenso das fachadas de lojas, galeria padro, nmero de elevadores, etc,) registradas na

    escritura. As vendas iniciadas na dcada de 1940 se intensificaram na dcada de 1950 e se

    estenderam at a dcada de 1960. (Azevedo, 2005).

    Figura 6 - Quadras da cabeceira oposta, prximo a Avenida Marques de Paran, simulao da ocupao em 1940.

    Figura 7 - Situao atual da avenida nas proximidades da Avenida Marques de Paran

    Nas figuras 6 e 7, temos uma viso da avenida prximo a Avenida Marques de Paran. Este

    trecho se configurou a segunda parte da interveno, ocorrendo apenas a partir da dcada de 50,

    com a demolio de parte do morro prximo a Praa da Repblica, desobstruindo o caminho para

    a via. Nesta parte encontramos hoje trs edifcios, mas apenas o da esquina da Rua Marques de

    Olinda possui plano de galeria. Na quadra oposta, um trecho ficou vazio por dcadas, sendo

  • urbanizado com praa j no incio do sculo 21.11 Na quadra prxima ao Liceu de Artes e Ofcios a

    avenida simplesmente no aconteceu, esta quadra posteriormente foi alvo de diferentes

    legislaes com o intuito de proteger a ambincia do conjunto histrico da Praa da Repblica.

    Ncleo de resistncia e fragmentao da avenida

    O conjunto histrico da Praa da Repblica o principal divisor espacial entre as fases da

    operao da urbana da Avenida Amaral Peixoto. A rea era conhecida como "Campo Sujo"

    limitava-se pelas ruas Dr. Celestino, Marqus do Paran, Coronel Gomes Machado e Visconde de

    Sepetiba totalizando 1.650 metros quadrados. Em 1913, o Governador Oliveira Botelho e o

    Prefeito Feliciano Sodr adquiriram o terreno e projetaram para a implantao de "obras de

    embelezamento e urbanizao". O projeto, de autoria do arquiteto Emile Depuy Tessain auxiliado

    por Pedro Campofiorito, previa a construo de edifcios pblicos em torno da praa, formando um

    grande "Centro Cvico", composto pela Assemblia Legislativa, o Frum, a Chefia de Polcia, o

    Tribunal de Justia, a Escola Normal e a abertura da ampla avenida que viria ser a origem inicial

    do conceito da Amaral Peixoto. Com o desmonte de grande parte do parte do morro situado

    esquerda da Rua Dr. Celestino, aterrou-se o antigo Campo Sujo e construiu-se a praa, que na

    poca foi chamada de D. Pedro II. Em 1924, sob direo do engenheiro Pio Borges de Castro, foi

    proposta a construo do monumento denominado Triunfo da Repblica - concebido por Correia

    de Lima - ento Diretor da Escola Nacional de Belas Artes. A praa foi reinaugurada em 1927,

    pelo Prefeito Manoel Ribeiro de Almeida, j com o nome atual.12

    Figura 8 - Situao atual da Praa da Repblica, com seu desenho restaurado.

    A Praa da Repblica permaneceu com sua feio original at 1969. Em 1970, o Governador

    Geremias de Mattos Fontes decidiu construir, no lugar, o Tribunal de Justia do Estado. O

    11

    Praa projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer 12

    "Niteri Patrimnio Cultural", editado pela SMC/Niteri Livros, Rio de Janeiro, 2000.

  • monumento "Triunfo da Repblica" foi desmontado e em seu lugar ergueu-se a estrutura

    arquitetnica do edifcio do Tribunal de Justia que nunca foi concludo. Em 1989, o governo do

    estado determinou a imploso do "esqueleto" do prdio e a reconstituio da praa na sua forma

    original. No dia 4 de dezembro de 1989 reinauguraram-se a Praa da Republica e seu

    monumento. Reconhecendo o papel histrico, urbanstico e afetivo desse espao, o Instituto

    Estadual do Patrimnio e Cultural - INEPAC- tombou todo o logradouro, em 06/09/1990, atravs

    do processo E-18/000.164/90. Nas figuras 9, 10 e 11 podemos observar os trs cenrios

    morfolgicos encontrados para esta parte da avenida.

    Figura 9 - Situao em 1940, com a Praa da Repblica e as quadras originais.

    Figura 10 - Situao em 1969, com o Palcio da Justia implantado sobre a Praa.

    Figura 11 - Situao pois 1989 com a atual da Praa da Repblica restaurada.

  • Concluses

    O desenho da avenida cumpre com seus objetivos de maneira bem clara, estabelecer o eixo

    monumental entre o centro cvico da Praa da Repblica com a Estao Hidroviria na Praa

    Martin Afonso (Araribia) alm de dar nova face a antiga capital do estado. Todas essas aes

    originrias de iniciativas do governo central no devem ser desvinculadas dos princpios

    autoritrios do Estado Novo em que o monumentalismo das largas e extensas avenidas ocupadas

    por prdios verticalizados e homogneos reiteravam simbolicamente o urbanismo do poder.

    Sem levar em conta a escala humana e as relaes de integrao com o entorno existente, a

    avenida carece de acertos perifricos de transio e comunicabilidade com a antiga malha do

    centro, gerando distores na granulometria oferecida pela arquitetura implantada sobre o

    desenho de Pallire. Est criado com a implantao da avenida um novo centro, sobre ou na

    extenso do existente com uma nova linguagem urbanstica e arquitetnica, funcional, sem

    maiores preocupaes estticas, mas com a marca do novo, visto entendido como moderno. Na

    maior parte das ocorrncias verificamos que os edifcios deram suas largas costas, desoladas

    fachadas de fundo de lote, como skyline para as ruas transversais de chegada a avenida.

    Enquanto espao a avenida se fecha entorno de si mesma, reforando o caracterstico

    desfiladeiro de concreto. A verticalizao da Avenida capitalizou a capacidade de renovao do

    centro da cidade e se estendeu por cerca de 4 dcadas para se efetivar.

    O urbanismo extremamente racional, desvinculado da populao, voltado para um pretenso

    progresso se associava aos interesses empresariais, que buscavam novas opes econmicas

    propiciadas pela construo civil. O momento de crescimento das cidades justificava as iniciativas,

    ainda que no correspondessem s verdadeiras demandas dos anos de 1940. Ainda que se tenha

    notcia de insatisfeitos e prejudicados com as desapropriaes, no se encontra nos jornais da

    poca nenhuma crtica ou referncia s obras da Avenida, em decorrncia certamente do regime

    ditatorial. Esta avenida, integrante do Plano de Urbanizao e Remodelao da Cidade de

    Niteri, pela sua largura e ocupao verticalizada, fora dos padres da rea central, teve um papel

    de eixo divisor da cidade, separando zona norte e zona sul. (Azevedo, 2005)

    Apesar desse efeito desarticulador, a sua implantao preencheu as necessidades de expanso

    do Centro e constituiu um empreendimento de maturao lenta, mas relativamente bem sucedido,

    se levarmos em conta todo o territrio criado pelos aterros, relativamente contemporneos a

    interveno. certo de que ela absorveu as demandas de ocupao da rea central por longo

    perodo. Gerando at certo ponto a estagnao do mercado imobilirio do seu em torno, e

    enfraquecendo os outros projetos de expanso, tanto os aterros do Porto, quanto o da Praia

    Grande (esse com srios problemas de estratgia fundiria).

  • A Avenida Amaral Peixoto funcionou como um elemento de atrao centrfuga da rea central,

    concentrando nela todas as possibilidades de renovao das ruas adjacentes, mesmo onde

    posteriormente o gabarito da avenida tenha sido replicado como proposta, gerando poucos

    exemplares dispersos e desconexos at mesmo da avenida, j que estes no mais estavam sob a

    guarda da grande operao.

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