03 exercicios aerobicos vs exercicios anaerobicos

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| FITNESS | TREINO | 12 TREINOS AERÓBIOS VS ANAERÓBIOS é um tema que surge sempre que se fala desse objectivo tão comum que é queimar gordura. Mas, antes de se escolher qual deles será o mais indica- do há que atender ao seguinte: as fontes energéticas (obtidas através dos alimentos) são substâncias que libertam grandes quantidades de energia quando se destroem quimicamente (os principais nutrientes que dão origem a energia são os hidratos de carbono e as gorduras, tendo as proteínas um papel secundário). O organismo realiza permanentemente reacções (mesmo quando em repouso) e, à medida que se intensifica o trabalho fí- sico, aumenta a necessidade de consumo de nutrientes e oxigé- nio. Nos momentos em que a quantidade de O2 de que se dispõe não chega para as necessidades pode-se, no entanto, continuar o trabalho (dentro de certos limites de intensidade e de duração). Em resumo: o organismo pode produzir energia através de processos metabólicos com oxigénio (metabolismo aeróbio) e sem oxigénio (metabolismo anaeróbio). A produção de energia por mecanismos aeróbios é muito eco- nómica: aproveita a totalidade das fontes energéticas que se transforma apenas em água e dióxido de carbono. Para se ser ca- paz de realizar um esforço do tipo aeróbio, tem que existir a capa- cidade de realizar um conjunto de adaptações que mantenham a homeostasia (equilíbrio do corpo). A primeira grande adaptação passa por atingir um estado está- vel de consumo de oxigénio. Este fenómeno, mais conhecido por steady state, implica que o organismo tenha sempre ao seu dispor O2 suficiente. O metabolismo aeróbio utiliza como substratos os hidratos de carbono e as gorduras. É utilizado por excelência quando o orga- nismo se encontra em repouso ou em exercícios de intensidade submáxima e de longa duração. No metabolismo anaeróbio, os combustíveis sofrem apenas uma degradação parcial, pelo que é muito menos económico e muito mais rápido. Em vez dos produtos finais serem apenas água e dióxido de carbono, formam-se também outras substân- cias que resultam da destruição incompleta das fontes energéti- Pedimos a Miguel Lucena, Master Trainer do Holmes Place de Miraflores, que explicasse aos leitores da revista The Place quais as diferenças e especificidades dos exercícios aeróbicos e anaeróbicos. Para um treino mais inteligente! VS EXERCÍCIOS AERÓBIOS EXERCÍCIOS ANAERÓBIOS 12a18 1/16/06 5:07 PM Page 12

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TREINOS AERÓBIOS VS ANAERÓBIOS é um tema que surgesempre que se fala desse objectivo tão comum que é queimargordura. Mas, antes de se escolher qual deles será o mais indica-do há que atender ao seguinte: as fontes energéticas (obtidasatravés dos alimentos) são substâncias que libertam grandesquantidades de energia quando se destroem quimicamente (osprincipais nutrientes que dão origem a energia são os hidratos decarbono e as gorduras, tendo as proteínas um papel secundário).

O organismo realiza permanentemente reacções (mesmoquando em repouso) e, à medida que se intensifica o trabalho fí-sico, aumenta a necessidade de consumo de nutrientes e oxigé-nio. Nos momentos em que a quantidade de O2 de que se dispõenão chega para as necessidades pode-se, no entanto, continuar otrabalho (dentro de certos limites de intensidade e de duração).

Em resumo: o organismo pode produzir energia através deprocessos metabólicos com oxigénio (metabolismo aeróbio) e semoxigénio (metabolismo anaeróbio).

A produção de energia por mecanismos aeróbios é muito eco-

nómica: aproveita a totalidade das fontes energéticas que setransforma apenas em água e dióxido de carbono. Para se ser ca-paz de realizar um esforço do tipo aeróbio, tem que existir a capa-cidade de realizar um conjunto de adaptações que mantenham ahomeostasia (equilíbrio do corpo).

A primeira grande adaptação passa por atingir um estado está-vel de consumo de oxigénio. Este fenómeno, mais conhecido porsteady state, implica que o organismo tenha sempre ao seu disporO2 suficiente.

O metabolismo aeróbio utiliza como substratos os hidratos decarbono e as gorduras. É utilizado por excelência quando o orga-nismo se encontra em repouso ou em exercícios de intensidadesubmáxima e de longa duração.

No metabolismo anaeróbio, os combustíveis sofrem apenasuma degradação parcial, pelo que é muito menos económico emuito mais rápido. Em vez dos produtos finais serem apenaságua e dióxido de carbono, formam-se também outras substân-cias que resultam da destruição incompleta das fontes energéti-

Pedimos a Miguel Lucena, Master Trainerdo Holmes Place de Miraflores, que explicasse

aos leitores da revista The Place quais as diferenças e especificidades dos exercícios aeróbicos e anaeróbicos.

Para um treino mais inteligente!

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cas. A mais conhecida dessas substâncias é o ácido láctico, cujoaparecimento é uma das principais causas de fadiga.

Embora os nutrientes não sejam utilizados na íntegra, este tipode metabolismo fornece muito mais energia, pelo que possibilitaesforços mais intensos.

O factor limitativo na utilização do sistema anaeróbio é a acu-mulação do ácido láctico. Quanto mais capacidade o atleta tiverde lhe resistir, e quanto mais alto for o grau de condição física,maior poderá ser a duração do esforço recorrendo a este sistema(num máximo de 3 minutos).

Dos três macronutrientes, os lípidos só são metabolizados paraa produção de energia na presença de oxigénio, mas os glúcidose as proteínas tanto produzem com ou sem oxigénio. É normalpensar que, se o objectivo é emagrecer, o ideal é realizar um exer-cício aeróbio, uma vez que as gorduras só são metabolizadas napresença de oxigénio. Mas falemos, então, do EPOC (ExcessivePost-Training Oxygen Consumption), ou seja, a quantidade deoxigénio em excesso que é consumida após o treino relativamenteaos valores de repouso.

O EPOC é visto actualmente como o reflexo do consumo deoxigénio necessário para levar o organismo de volta ao seu estadopré-exercício.

Quando se fala de perda de massa gorda é essencial organizaro treino com o objectivo de conseguir intensificar a ocorrênciadeste consumo acrescido de oxigénio, pois tal poderá levar a umacréscimo do consumo metabólico diário.

Os benefícios pós exercício de um treino muito intenso são signi-ficativos sendo que, no período de descanso, a recuperação é rea-lizada sobretudo pela utilização das reservas de gordura.

No treino destinado à perda de massa gorda é cada vez maisfrequente a inclusão de treino intervalado de alta intensidade, emdetrimento do tradicional treino extensivo de baixa intensidade, con-seguindo-se deste modo obter consumos energéticos pós-exercíciomais intensos e com durações que podem chegar às 12 horas.

Por outro lado, a utilização de programas de treino com resis-tências com cargas moderadas a alta permite conseguir obter pe-ríodos de EPOC que chegam às 38 horas.

COMPARAÇÃO DAS CALORIAS UTILIZADAS, DURANTE E APÓS O EXERCÍCIO (ESTUDO DE MELBY, 1998)> CALORIAS ADICIONAIS USADAS 2 HORAS APÓS

O EXERCÍCIO: AERÓBIO = 25; ANAERÓBIO = 150> CALORIAS ADICIONAIS USADAS 3 A 15 HORAS

DEPOIS: AERÓBIO = 0; ANAERÓBIO = 260

> Miguel Lucena, Master Trainer do Holmes Place de Miraflores

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Já se viu que durante um exercício de longa duração e de baixaintensidade a gordura é responsável por uma grande percentagemdo dispêndio energético, sendo esse contributo diminuto duranteum exercício de média/alta duração e grande intensidade. À medidaque um exercício se torna mais intenso, menos gordura é utilizada,mas o número total de calorias conseguidas após o exercício atravésda degradação de gorduras é superior.

Hickson descobriu em 1993 que "a predominância do substratoenergético utilizado durante o exercício não tem um papel impor-tante na perda de gordura". Assim, as evidências sugerem que aperda de gordura pode ocorrer num treino de alta intensidade, ape-sar da fonte energética utilizada durante o exercício serem os car-bohidratos. Convém ainda salientar que ambos os sistemas,anaeróbio e aeróbio, funcionam paralelamente, complementando--se. A predominância de cada um em termos de contributoenergético depende, em primeiro lugar, da intensidade do esforço e,secundariamente, da sua duração. A maioria das actividades émista, ou seja, aeróbia com momentos de anaerobiose.

UTILIZAÇÃO DOS DIFERENTES SISTEMAS ENERGÉTICOSMEDIANTE A DURAÇÃO E INTENSIDADE DO ESFORÇO.

INTENSIDADE DURAÇÃO SIST. ENERGÉTICOMUITO INTENSO 0 – 6 SEGS ANAERÓBIOINTENSO 6 – 30 SEGS ANAERÓBIOPOUCO INTENSO 30 SEGS – 2 MIN ANAERÓBIOMODERADO 2 – 3 MIN ANAERÓBIO | AERÓBIOLEVE > 3 MIN AERÓBIO

Adaptado de Conley, M. (2000)

Tome-se como exemplo uma faixa de uma aula de RPM nofinal da qual é exigido um sprint. Se, quando se está a utilizar afonte aeróbia, de repente se der um aumento da actividademuscular e/ou dificuldades na captação e distribuição do O2, aquantidade de O2 deixa de ser suficiente e, como consequência, oorganismo terá de recorrer ao sistema anaeróbio.

CONSUMO TÍPICO DE EPOC (EXCESSIVE POST-TRAININGOXYGEN CONSUMPTION) EM DIVERSAS ACTIVIDADES E EM DIVERSAS INTENSIDADES.

ACTIVIDADE EXERCÍCIO EPOC (ML/KG)COMPETIÇÃO 10KM 120-26060 MIN. BAIXA INTENSIDADE 40-90CAMINHADA 1H 10-25RPM 40 MIN. 50-200PASSEIO 20 MIN. 5-15

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