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Luís Barbeiro ESCRITA Construir a Aprendizagem 2003 Departamento de Metodologias da Educação Instituto de Educação e Psicologia Universidade do Minho

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Luís Barbeiro

ESCRITAConstruir a Aprendizagem

2003

Departamento de Metodologias da Educação

Instituto de Educação e Psicologia

Universidade do Minho

5. Configuração formal: a face daescrita

Na análise efectuada nos três capítulos precedentes, relativos à planificação

inicial, à colocação em texto, à revisão final, estiveram em foco as decisões dosujeito. Estas incidiram sobre o conteúdo informativo a seleccionar e sobre as

expressões linguísticas que veiculam esse conteúdo. Poderão ainda ter incidido

sobre a própria tarefa, sobre os passos a dar com vista à geração e selecção do

conteúdo ou com vista à formulação e reformulação das expressões linguísticas.

Geralmente, considera-se que a natureza do texto escrito reside no seuconteúdo e estrutura linguística - não se engloba a sua materialidade (cf.

Sharples, 1999: 129). Contudo, para que o texto exista perante o leitor, tem de

assumir essa materialidade, a qual, tal como as expressões linguísticas e o

conteúdo transmitido, poderá ser objecto de decisão por parte do sujeito.

A quase total separação entre o sujeito que escreve o texto e a configuração

formal que esse texto irá apresentar aprofundou-se enormemente com o recursoà tipografia, à edição mecanizada, feita fora do alcance ou com um alcance

limitado por parte do autor. Na escola, em relação aos textos manuscritos, a

forma física da escrita mantém alguma presença ou valor por meio da

apresentação do texto. Na passagem do texto a limpo, os alunos investem nos

aspectos formais, ao procurarem determinados desenhos de letras para as capas

e títulos dos seus trabalhos escritos, ao utilizarem a cor em determinadas

palavras, ao conjugarem texto e ilustrações em cartazes.

Com a utilização de meios limitados, marcados pela diferença e pelo défice

de possibilidades em relação ao ambiente profissional, os alunos já activavam

relações que é possível estabelecer, recorrendo a variações de configuraçãoformal - nomeadamente relações de:

diferenciação;estruturação;

hierarquização ou ênfase.

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E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N O I Z A G E M

A utilização generalizada do computador veio colocar ao serviço destas

relações um manancial de meios, que quebraram o fosso com os meios da

edição tipográfica, que possibilitaram ou exigiram a cada «escritor» que se

tomasse um «designer» de texto (Sharples, 1999). O desafio colocado à escola e

aos professores pela disponibilização dos novos meios, perante os quais os

alunos se sentem frequentemente mais à vontade e mesmo deslumbrados, é

possibilitar ao sujeito a tomada de decisão, segundo um leque alargado de

possibilidades, também no domínio da configuração formal.

Configuração formal e significação

Qualquer sistema de comunicação, para transmitir uma mensagem,

necessita de um suporte material, que possa ser percebido pelos sentidos do

receptor. Na fala, esse suporte é constituído pelo som, na escrita pelos símbolos

gráficos.É o suporte material utilizado num sistema de comunicação que estabelece

as características fisicas em que pode haver variação. É o funcionamento

enquanto sistema que estabelece qual o alcance da variação que dá origem à

emissão / recepção de unidades diferenciadas ou nos coloca perante a mesma

unidade do sistema, sob uma forma diferente, ou seja, que apresenta variação

nalguns aspectos que não são tomados como distintivos, ou ainda nos conduz a

uma forma que não é reconhecida como pertencente ao sistema.

Como o sistema é marcado por diferenças ditadas no seu interior e não pela

qualidade absoluta intrínseca dos seus elementos, verifica-se a possibilidade de

aparecimento de variações quanto à sua realização material.

As alternativas de configuração formal de uma unidade correspondem,

assim, ao conjunto de variações que essa unidade pode apresentar num

determinado suporte material, sem perder um determinado valor diferencial

perante as outras unidades do sistema em que se integra.

No sistema da língua, as variações ocorrem quer na oral idade quer na

escrita. As variantes no desenho das letras são, aliás, tomadas por F. de

Saussure para esclarecer esta característica do sistema de um modo geral:

«o valor das letras é puramente negativo e diferencial; por isso, amesma pessoa pode escrever t com variantes como:

é ~--r-

114

115

A única coisa essencial é que este sinal não se confunda, na escritadessa pessoa, como o de I, de d, etc.» (Saussure, 1977:202)

No caso da escrita, podemos não estar apenas perante variações do

desenho. Também o «meio como é produzido cada sinal é totalmente

indiferente, pois não interessa para o sistema (...) Escrever as letras a branco ou

a preto, em sulco ou em relevo, com uma caneta ou com uma tesoura, não tem

qualquer importância para a significação.» (Saussure, 1977:202).

Na perspectiva do sistema, marcado pelo carácter diferencial, e das

relações entre e do signo linguístico, marcadas pela

arbitrariedade, a configuração formal, por si, não seria significativa. É essa a

posição que podemos apreender da perspectiva de F. de Saussure.Contudo, esse carácter diferencial abre um leque de possibilidades formais,

do qual, em cada utilização emerge uma determinada forma que afasta outras.

Elementos como o instrumento de escrita, a cor, a modificação produzida nomaterial de suporte, para além do desenho específico da letra por um indivíduo

num determinado momento, abrem possibilidades de variação para a

representação escrita. Num texto concreto, numa passagem textual definida, é

uma determinada forma que emerge. De que modo surge? Será por mero acaso?

Se olharmos o produtor de signos num contexto, localizado num tempo e num

espaço concretos, que facultam meios e que condicionam possibilidades,veremos que essa forma está ligada à situação vivida pelo sujeito, resulta da

conjugação de factores nesse contexto.

Se a variação formal não é pertinente para a relação estrita de significação,

na perspectiva de Saussure, se a unidade significativa (signo) não é alterada, tal

facto não quer dizer que essas variações não sejam informativas. Na verdade, a

um outro nível, que não coincide com o nível do sistema linguístico em si, tal

como tomado por Saussure, mas que o envolve, as variações referidas poderão

informar-nos acerca das condições em que se processa o acto de enunciação e

em que o signo adquire a sua significação. Os signos não são utilizados na sua

versão estrita e abstracta, mas surgem de forma motivada em cada contexto.Esse aparecimento motivado revela-se face aos outros signos que poderiam ter

sido utilizados. Inclui a vertente formal, em contraste com as outras

possibilidades que poderiam ter surgido para a materialização da escrita.Na perspectiva semiótica de Roland Barthes (cf. Barthes, 1977a, 1977b) a

utilização de um signo, constituído por significado e significante, pode tomar-se

E S C R I T A: C O 1ST R U I R A A P R E N O I Z A G E J\l

signi te para um novo ou seja, resultar num segundo nível de

significação.

Retomando o duplo sistema de significação com que Barthes analisa osmitos e a conotação, teríamos para a configuração formal da escrita, no primeiro

nível o signo tal como facultado pelo sistema da língua, com o seu significado,

o conceito, e o seu significante, a imagem material, marcados pelas diferenças

dentro do sistema; no segundo nível, a configuração do signo segundo

determinada possibilidade formal concreta faria com que adquirisse novas

significações, de índole «conotativa». Por exemplo, a escrita de um título em

itálico, face ao formato redondo, activaria significações ligadas a movimento, a

dinamismo; a apresentação de um texto alinhado nas margens esquerda e direita

(justificado) activaria significações ligadas a rigor, mas porventura também a

artificialismo, pelo que o alinhamento à esquerda, que dantes constituía em

muitos casos a única possibilidade disponível, foi recuperado com a

significação de informal idade, de relação espontânea e directa.

A perspectiva social-semiótica (cf. Halliday, 1978; Kress e van Leeuwen,

1996) contrasta com a perspectiva saussureana e tivemo-la já presente ao

efectuar a passagem da arbitrariedade do signo linguístico para a conjunção

motivada de significante e significado que o signo apresenta no contexto em que

é utilizado: o utente da língua utiliza as formas que nesse contexto considera

aptas para a expressão do significado (Kress e van Leeuwen, 1996:5-6).

Deste modo, a escrita e a sua configuração formal abrem ao sujeito um

conjunto de possibilidades para a expressão do significado, incluindo o

estabelecimento de relações de estruturação, de diferenciação e de

hierarquização entre os elementos.

Diferenciação, hierarquização, estruturação

As variações relativas à forma das letras, no caso de um texto manuscrito,

poderão informar-nos acerca do estado emocional em que o sujeito as desenhou,

do seu domínio do instrumento de escrita, da disponibilidade de tempo, etc. Na

perspectiva da tomada de decisão por parte do sujeito no processo de escrita,

mais importante do que este tipo de informação relativa ao autor - informação

que, aliás, deixa de existir no caso da escrita impressa - e às condições que o

rodeiam, é o facto de essas variações formais poderem servir de base à

expressão de outras relações.

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Assim, relações de diferenciação, de estruturação, de hierarquização entre

unidades poderão ser criadas ou postas em relevo num determinado texto

recorrendo a variações de configuração formal.

A escrita não se limitou a uma representação gráfica ou transcrição das

unidades linguísticas que garantisse a reconstrução da significação. Integrou no

seu sistema variações de configuração formal que permitem estabelecer esse

tipo de relações. Assim, foi-se consolidando ao longo dos tempos a conjugação

entre a utilização de letras maiúsculas e minúsculas, com funções específicas e,

por vezes, bem delimitadas, no interior do sistema de escrita. Também o

tamanho das unidades gráficas, a disposição na página, as variações no desenho,

o recurso a meios auxiliares como o sublinhado serviram e continuam a servir

de base ao estabelecimento de relações de diferenciação, de estruturação, dehierarquização entre unidades. 10

A imprensa ou outros meios mecânicos de escrita vieram uniformizar

muitos dos aspectos formais sujeitos à variação individual na escrita à mão. No

entanto, não deixaram de dar resposta às exigências de estabelecimento dessas

relações. Nos nossos dias, os computadores não só alargaram as possibilidades

de configuração formal, mas - e este facto reveste-se de uma importância não

menos significativa - generalizaram a sua utilização, colocaram-nas ao nossodispor.

Para tirarmos proveito dessas possibilidades, devemos tomar consciênciadas relações que com base nelas se podem estabelecer. Apesar de procurarmos

explicitar algumas dessas relações, devemos ter presente que a obra gráfica -

que a escrita é - também activa perante o sujeito uma dimensão intuitiva, ligada

à sua sensibilidade estética. Por outro lado, a configuração formal da escrita não

é relativa apenas à forma tomada por cada um dos elementos. A imagem da

escrita na página tem uma dimensão que é percebida de forma global, holística.Deve também ter-se em conta que a apreensão das relações estabelecidas

pela configuração formal da escrita, tal como a própria sensibilidade estética, é

influenciada por aspectos culturais. Para a compreensão deste aspecto, basta

lembrarmo-nos que a progressão da esquerda para a direita e de cima para

10 A pontuação, que não está aqui em foco por si, cumpre igualmente funções nestes domínios,nomeadamente de diferenciação e estruturação entre unidades. Como a escrita não constitui, namaior parte das vezes, a transcrição de um discurso oral anteriormente produzido, naconstrução do texto escrito, deparam-se-nos alternativas de pontuação que constituem viasespecíficas de diferenciação e de estruturação. Pense-se, na possibilidade de separação defrases por vírgula ou por ponto final.

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E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N DIZ A G E M

baixo, característica dos sistemas de escrita ocidentais, não é universal. Na

cultura ocidental, a disposição na página, por exemplo, de elementos textuais

conjugados com imagens ou de sequências ordenadas tende a orientar-se da

esquerda para a direita e de cima para baixo, o que não acontece noutras

culturas, em que a sequência poderá ser da direita para a esquerda, ou adoptar

uma disposição em tomo do centro.

Para além dos aspectos culturais, devemos ter presente que a configuração

da escrita se baseia no sistema visual, ou seja, para que se possam estabelecer asrelações de diferenciação, estruturação e hierarquização, é necessário que elas

sejam apreensíveis pela visão humana. Assim, para que um elemento se tome

saliente é necessário que consiga captar a atenção por meio da percepção visual.Kress e van Leeuwen (1996) analisam a composição visual com base em

três aspectos: a , que corresponde à capacidade dos elementos de

atraírem a atenção de quem olha, o obtido pelo lugar ocupado

na composição visual (polarização horizontal: à esquerda . à direita;

polarização vertical: em cima . em baixo; disposição centrada: no centro .

em redor, nos lados, nas margens) e ou seja, a criação de uma grelha

visual na página, a qual liga e separa elementos por meio da utilização de

mecanismos como molduras ou linhas.

Estes aspectos podem ser relacionados com o estabelecimento das relações

de diferenciação, hierarquização e estruturação. Assim, para que um elemento

seja diferenciado em relação aos outros, é necessário que se distinga

visualmente. Para que entre numa relação hierárquica ou de ênfase com outros,

é necessário que as características visuais a que está ligado consigam atrair em

maior grau a atenção de quem olha, por exemplo, por meio de um tamanho

maior, de uma espessura maior (carregado), de uma cor que se destaque,

isolando-o com espaço branco à volta, etc. A estruturação pode viver da

disposição na página (por exemplo, os títulos colocados numa polarização

vertical em relação ao texto a que se referem), da criação de ligações por meio

de linhas ou pela colocação de toda uma secção de texto dentro de uma

moldura. A estruturação pode ainda ter por base a gestão do espaço em branco,

criando espaço adicional entre diferentes secções e a adopção de formas

específicas para elementos do mesmo nível, por exemplo, a adopção do mesmo

tipo e tamanho de letra para os títulos de capítulos, entrando simultaneamente

em relações de diferenciação e de hierarquização face a outros elementos comoos subtítulos de secção.

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Anis (1998), para além dos grafemas alfabéticos, ou

correspondentes à letra ou letra acentuada, considera a existência dose dos

Os topo gramas ou grafemas pontuo-tipográficos correspondem aos sinais

de pontuação e às variantes tipográficas. Enquanto os sinais de pontuação estão

presentes na cadeia gráfica enquanto unidades discretas.: autónomas, os

grafemas tipográficos, por exemplo, a variação maiúscula/minúscula,

romano/itálico, normal/carregado combinam-se com os alfagramas. Os

topo gramas «contribuem para a produção de sentido, enquanto organizadores dasequencialidade e indicadores sintagmáticos e enunciativos» (p. 15).

Os logogramas estão ligados a unidades significativas e são constituídos por

algarismos, operadores aritméticos e símbolos convencionais, como $ ou §.

Alternam com a notação alfabética, relativamente à qual constituem uma espécie

de abreviaturas.

As relações entre o texto e o seu espaço gráfico estabelecem-se em

diferentes níveis, que enquadram as decisões do sujeito relativas à configuração

formal. Retomamos os níveis considerados por Anis (1998:21-22) e a respectiva

explicitação:

escritural ou micro-sistérnico: as dimensões do suporte, o tipo de

inscrição e os atributos gráficos disponíveis delimitam o campo das

possibilidades grafo-textuais; considere-se, por exemplo, a carta e o seu

espaço de escrita limitado, a escrita manual desprovida de itálico ou de

carregado;

morfo-textual: a espacialização e os atributos gráficos podem realizar uma

delimitação ou corte correspondente a níveis de estruturação: separação

em versos, elementos de lista, parágrafos, partes, capítulos, etc.

expressivo: diversas marcas (ligadas ao micro-sistema escritural),

arbitrárias (carregado, cor, sublinhado) ou motivadas (corpo ou tamanho

dos caracteres, associado à importância do elemento que expressam)

podem valorizar ou atribuir ênfase a certos elementos: palavras-chave a

carregado num manual escolar; elementos a piscar num ecrã;

metatextual: as características globais do escrito (por exemplo, o suporte,

o tipo de justificação) contribuem para o reconhecimento do género: aslinhas desiguais segundo a disposição tradicional do poema;

enunciativo: do ponto de vista interno ao texto, o posicionamento e os

atributos gráficos são essenciais para marcar os níveis enunciativos: texto

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principal, notas, glosas, etc., num livro; sumário, editorial, títulos, artigos,

coluna social, etc., no jornal;

icónico: nos dispositivos de colocação em relevo já intervém uma

exploração das virtual idades icónicas; trata-se aqui de dispositivos mais

globais: letras figurativas, palavras-imagem e caligramas, nos quais ocontributo para o sentido advém da activação do código iconográfico;

associação sinestésica do auditivo e do visual: o silêncio pode exprimir-se

pelo espaço em branco, enquanto o volume sonoro está ligado ao tamanho

da letra, por ex., a representação do grito; as sobrecodificações ou

conotações gráficas: modificação na banda desenhada dos caracteres para

evocação de povos exóticos, com outros sinais gráficos.

Activado um micro-sistema escritural, ficam delimitadas as possibilidades

formais a que é possível recorrer para estabelecer as relações de diferenciação,

criação de ênfase ou estruturação, que podem manifestar-se segundo os outros

níveis considerados por Anis (1998): morfo-textual, expressivo, metatextual,

enunciativo e icónico.Algumas possibilidades podem constituir alternativas ao dispor de escolhas

intencionais e conscientes por parte do sujeito, enquanto outras resultam do

micro-sistema escritural em que decorre a prática de escrita (suporte,

instrumento, etc.) ou da integração em modelos textuais que activam

determinadas configurações.

Ao longo do processo de escrita, a dimensão relativa à configuração formal

é objecto de processamento: a acompanhar a redacção das unidades e podendo

ser alvo, por si, de revisão. Pode também surgir ligada à planificação, se

tivermos em conta que determinadas unidades, como o parágrafo, são

delimitadas graficamente.

Os resultados encontrados em Barbeiro (1994), relativos a uma prática de

escrita manual, mostram que esse processamento entre alternativas de

configuração formal incide sobre a adopção ou não de um determinado tipo de

letra para a grafia de uma palavra (utilização ou não de letra de imprensa, por

exemplo), a representação com inicial minúscula ou maiúscula, a escolha do

meio para assinalar a eliminação de elementos já escritos (riscando-os ou

colocando-os entre parênteses), a representação pictórica ou verbal de um

objecto (por exemplo, uma flor), a utilização de abreviaturas, a escrita dos

números por extenso ou por meio de algarismos e, sobretudo, as possibilidades

120

121

ç o e d e it

relativas à pontuação e à separação ou não em parágrafos diferentes, nos casos

em que a alternativa existe segundo as normas adoptadas (contrariamente, por

exemplo, ao estabelecido para a representação do diálogo). Estes aspectos

repartem-se pelos sujeitos do segundo ao oitavo anos de escolaridade.

A reconfiguração formal das unidades pode dar-se em consequência da

reformulação das expressões linguísticas. Por exemplo, determinados sinais de

pontuação, como vírgulas e pontos finais, poderão ter de ser alterados, em

virtude de operações de adição ou de supressão de elementos.

Os argumentos que fundamentam as alternativas de configuração formal

revelam algumas linhas de força ou preocupações que emergem na interacção

entre os sujeitos:

uma maior ocupação do espaço: «tou le s Ii I

is g nde» (2.0 ano); «... on I es e

que é I is» (8. o n

- apresentação: «ó p I põe ent p tes .../ que é e » (2.0 ano);«pões e e p ênteses que é elho do que esbo » (4.0 ano);

let /isto uito p sent o I s ...» (4.0 ano);

expressividade: « / l p que /

ch / p l dois pontos de ...» (4.0 ano); «o H é

edond o p de c » (8.0 ano); « I ...

pode os p l en s / » (8.0 ano);

- frequência (repetição de sinais de pontuação): « s ponto I s

e p ponto» (6.0 ano); «ó !/ p ponto i /

h l pontol / ponto ... l l í l é se p e ponto / !» (6.0

ano); «tou qui é uitos pontos in is . .. n / os

pontos que isto p qui te ... ponto / is ponto» (8.0 ano);

a conformidade com o valor de cada sinal de pontuação: !1

de sunto e t p g (6.0 ano); « !/ ponto

/ » (8.0 ano); « eticê I que di que o / o /

eles di » (8.0 ano).

Por vezes, é a própria configuração formal que «oferece» determinadas

relações que se tomam salientes para o sujeito, atraindo a sua atenção: «

qui/ po o/ do eu es se fonte

luminosa cou (4.0 ano).

E S C R J T A: C O N S T RUI R A A P R E N DIZ A G E M

A materialidade da escrita, como mostram as operações ligadas a

alternativas de configuração formal e os argumentos que as sustentam, não

surge como um resultado obtido de forma automatizada ao longo do processo.

Tal como para a escolha das expressões linguísticas, a atenção do sujeito é

mobilizada no decorrer do processo quer em relação a aspectos gerais que foram

integrados no código, como os sinais de pontuação ou a utilização de

maiúsculas e minúsculas, quer em relação a aspectos ligados a um determinado

sistema escritural, a escrita manual, por exemplo. Se a escrita manual já

desafiava o sujeito com alguns recursos, a disponibilização, cada vez mais

generalizada, de outros meios tecnológicos fez surgir novos desafios para a

decisão por parte do sujeito.

Recursos de configuração formal e utilização do computador

Hoje em dia os computadores colocam à nossa disposição um leque de

possibilidades quanto ao arranjo gráfico dos textos que, ainda há pouco tempo,

era apenas acessível na tipografia. Sobre a nossa secretária, ao alcance dos

nossos textos, de uma forma generalizada, passaram a estar disponíveis imensos

recursos de tratamento do texto ligados à

tipos de letra

estilos

formatos

tamanhos (corpo)

alinhamentos

espaçamentos

posiçãoorientação

cor

inserção de imagens

etc.

Digamos que, hoje, o problema já não reside em ter acesso a essas

possibilidades (como acontecia quando era necessário recorrer à tipografia, ou

se ficava limitado pela máquina de escrever), mas em tomar decisões quanto às

soluções a adoptar. A utilização destes recursos deve cumprir objectivos, deve

ser colocada ao serviço do nosso texto e da comunicação em que este se integra.

122

Como se disse, a configuração formal permite estabelecer relações de

diferenciação, de estruturação e de hierarquização entre unidades de um texto,

quer estas sejam palavras, expressões, frases, parágrafos ou partes ainda

maiores.

Para que essas relações possam ser reconhecidas pelo leitor, é essencial

termos presente que tais relações têm por base o entre elementos.

Assim, por exemplo, um texto integralmente escrito em maiúsculas ou que

esteja sublinhado na sua totalidade não estabelece no seu interior relações de

diferenciação ou de realce com base nas maiúsculas ou no sublinhado.

Na perspectiva da criação de ênfase, por meio da configuração formal, um

elemento precisa de contrastar com os outros elementos, para que seja percebido

como diferente e eventualmente como mais importante. Escrever um texto

integralmente em maiúsculas ou em itálico pode corresponder a uma opção de

arranjo gráfico com determinada finalidade comunicativa. Contudo, cada uma

das palavras no interior do texto não receberá uma força adicional em relação às

outras palavras do texto, uma vez que todas receberam o mesmo tratamento, não

se estabelece contraste entre elas.

/

Na história da escrita ocidental, derivada do alfabeto latino, verificou-se a

consolidação de dois alfabetos: o de letras maiúsculas e o de letras minúsculas.

O alfabeto minúsculo tem a sua origem, segundo McMurtrie (1982), na

transformação das letras maiúsculas, face às exigências de celeridade na escrita

manuscrita.

A consagração das letras minúsculas não levou ao abandono das

maiúsculas. A diferenciação quanto à configuração formal obteve

correspondência na aquisição de valores específicos no sistema de escrita.

Assim, a diferenciação maiúsculas / minúsculas passou a desempenhar funções

de estruturação, de diferenciação segundo categorias de referentes, de

hierarquização. Na conjugação com as minúsculas, as letras maiúsculas

receberam a função de, na construção do texto, iniciar períodos, nomespróprios, de expressar ênfase ou valorização. 11

11 No século XVI, publicam-se as primeiras gramáticas da língua portuguesa. Contudo, nem ac , de Fernão de Oliveira, publicada em 1536, nem a

123

E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E DIZ A G E 1>1

o facto de a distinção entre maiúsculas e minúsculas ter integrado o

sistema normativo da escrita retira ao sujeito o poder de decisão nalguns

domínios (se se tomar como activo o requisito de observação dessas normas).

Contudo, o sistema deixa lugar para o aparecimento de alternativas. Assim,

podemos ter de optar em algumas circunstâncias entre a utilização de letras

maiúsculas ou minúsculas.Em capas, cartazes, ou seja, em textos com alguma descontinuidade, a

decisão assentará sobretudo em critérios de composição estética, de equilíbrio

entre os diversos elementos, da força que se pretende atribuir a determinado

elemento, tendo-se ainda em conta a conjugação com outros aspectos

(tamanhos, cores, figuras, etc.).A utilização de maiúsculas em títulos (de partes, de capítulos, etc.),

segundo uma hierarquia frequentemente estabelecida no próprio texto, contribui

para a percepção da organização textual.

No caso de um texto contínuo, a utilização de maiúsculas, para além das

regras estabelecidas pelas gramáticas, deverá ter em conta que, associada às

letras maiúsculas, se encontra a expressão de ênfase:a escrita de uma palavra com inicial maiúscula ou integralmente

em maiúsculas traduz-se numa valorização dessa palavra, daquilo

que expressa; por conseguinte, ao decidirmos utilizar as letras

maiúsculas, essa utilização deve estar de acordo com a mensagem

que se quer transmitir, a palavra colocada em realce por meio das

letras maiúsculas deve ser, de facto, uma palavra-chave na nossa

mensagem.

Um texto ou porção larga de texto escritos integralmente em maiúsculas

apresenta maiores dificuldades para a leitura. Esta maior dificuldade deve-se ao

facto de a combinação exclusiva de letras maiúsculas apresentar uma menorvariabilidade na utilização do espaço entre as linhas do texto:

tic lingu o , de João de Barros, publicada em 1540, apresentamquaisquer normas relativas à utilização diferenciada de letras maiúsculas e minúsculas.A presença de tais normas encontra-se pela primeira vez na obra de Pero de MagalhãesGandavo que e e de e es ,

publicadajá na segunda metade do século, em 1574 (cf. Verdelho, 1994).

124

ig ç e

AS LETRAS MAIÚSCULAS, CONTRARIAMENTE ÀS MINÚSCULAS,

APRESENTAM OS RESPECTIVOS DESENHOS APENAS ACIMA DA

LINHA DE BASE, PARA ALÉM DE A SUA ALTURA SER UNIFORME.

COMO CONSEQUÊNCIA, SURGEM UMA LINHA DE BASE E UMA

LINHA SUPERIOR SEM QUEBRAS. A ESTA MENOR VARIAçÃO

CORRESPONDE UMA MAIOR DIFICULDADE NA LEITURA. O LEITORTEM DE BASEAR-SE APENAS NA FORMA INTRÍNSECA DAS LETRAS,

SEM PODER CONTAR COM O APOIO DE DIFERENÇAS NA ALTURA E

NA RELAÇÃO COM A LINHA DE BASE, QUE EXISTEM NO CASO DAS

LETRAS MINÚSCULAS. LER UM TEXTO LONGO, ESCRITO

INTEGRALMENTE EM MAIÚSCULAS, TORNA-SE CANSATIVO.

de

Os tipos de letra constituem um dos domínios em que o computador tomou

acessíveis e vulgarizou possibilidades formais que anteriormente eram de

acesso muito limitado (geralmente só na tipografia). Para darmos forma aos

nossos textos, passámos a poder escolher entre numerosos tipos de letra. Para

além de passarmos a poder escolher o tipo de letra a utilizar em determinado

texto, passámos também a poder combinar tipos de letra para estabelecer num

mesmo texto relações de diferenciação e de criação de ênfase.

A variedade de tipos de letra existentes é marcada por diferenças quanto à

adequação dos diversos tipos a finalidades concretas. O fácil acesso a essa

variedade não deve levar-nos a transformar o nosso texto numa montra ou

exposição de tipos ou a prejudicar a legibilidade, utilizando um tipo que não se

adeqúe ao tipo de leitura que virá a ser feita.

• Com ou sem serifas

Uma das características que permite estabelecer diferenças entre os

diversos tipos de letra é a existência ou não de serifas - os pequenos traços quecompletam os traços principais das letras.

Do ponto de vista espacial, sem ter em conta os aspectos semânticos, ou o

reconhecimento lexical, as letras integram-se numa mesma palavra pelaproximidade que mantêm entre si. Na escrita impressa, essa proximidade não

chega a ser uma ligação efectiva entre os traços de cada letra, em contraste com

a ligação que existe na escrita manuscrita (cursiva). De facto, cada um dos

125

E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N DIZ A G E M

caracteres impressos apresenta-se de forma independente, sem um traço que o

ligue ao anterior ou ao seguinte.

De qualquer modo, alguns tipos de letra, mesmo sem ligarem os caracteres,

reforçam a continuidade entre eles pela existência de serifas. Estas diminuem o

isolamento de cada letra. Efectivamente, as serifas intensificam a impressão de

união entre as letras de uma palavra devido ao efeito de ligação produzido pelos

traços horizontais, designadamente na base, e pelo próprio facto de a mancha da

palavra resultar mais densa, contrastando com os espaços em branco dos

intervalos entre as palavras. Por outro lado, a linha virtual correspondente à base

do corpo das letras tende a materializar-se, o que apoia a progressão do olhar ao

longo dessa linha, durante a leitura.

Tem-se colocado a questão se os tipos de letra com serifas apresentam

maior legibilidade para textos que exijam uma leitura contínua, sequencial.

Surge, por vezes, recomendada a sua utilização no corpo de um texto longo.

Muitos jornais adoptam tipos de letra com serifas para a escrita dos textos dos

artigos, procurando, desse modo, facilitar a leitura de textos que, à partida, por

razões de espaço disponível, se apresentam de forma densa, com um tamanho

de letra e com um espaçamento entre linhas reduzidos. No entanto, a

investigação não fornece respostas concludentes quanto a essa maior legibili-

dade (cf. Hartley, 1994:29).

Os tipos de letra sem serifas não dispõem dos pequenos traços que

reforçam a linha horizontal em que assentam as palavras. Sem esse reforço da

linha de base das letras, a leitura continuada, longa, não se encontraria

favorecida, nomeadamente com utilização de corpos grandes, pois o olhar

deverá seguir essa linha de base dispondo de menos apoios.

Reduzindo-se a força da linha horizontal, são as próprias palavras

individualmente que poderão chamar a atenção, ganhar força, pois tenderão a

contrastar em maior grau com os espaços em branco.

A leitura contínua, sequencial, não é a única que nós praticamos. Os tipos

de letra sem serifas favoreceriam uma leitura descontínua, por palavras soltas ou

por pequenos blocos de palavras, que prendem a nossa atenção. É o que sucede

frequentemente na leitura dos títulos. Por essa razão, é frequente os jornaisapresentarem tipos de letra sem serifas nos títulos das notícias e tipos de letra

com serifas nos textos de desenvolvimento das notícias. Nestes casos, para além

da diferenciação entre títulos ou subtítulos e texto, que se alcança deste modo e

que geralmente também se manifesta por meio de recursos como os tamanhos

126

ç e

de letras ou estilos, a diferença entre os tipos de letra procura ajustar-se à leitura

que é feita. Contudo, como dissemos, as investigações não estabelecem de

forma clara a oposição entre os tipos com e sem serifa quanto à legibilidade. Em

tamanhos pequenos, por exemplo, alguns autores defendem a utilização de tipos

de letra sem serifas (cf. Hartley, 1994:29).

Não devemos esquecer que, para além do tipo de letra, em si, e do facto de

apresentar ou não serifas, a composição de uma página de texto e a sua

legibilidade resultam do cruzamento de uma série de factores, entre os quais o

espaçamento entre os caracteres e entre as palavras, o corpo ou tamanho da

letra, a largura da coluna, a distância entre as linhas, etc. No próprio desenho da

letra, a existência ou não de serifas não é o único factor determinante.

Sharples (1999) atribui aos tipos de letra com serifas a característica de

elegância clássica, enquanto os tipos de letra sem serifas sugerem

«modernidade» e «simplicidade» (cf. p. 139).

• Outros tipos

Para além da distinção entre tipos de letra com ou sem serifas existem

outras famílias de tipos de letra, que se diferenciam, nomeadamente, pela

existência ou não de contraste na espessura das linhas que formam o desenho

das letras, pela dimensão desse contraste quando existente e pela orientação no

espaço das formas das letras.

A adesão a determinado tipo de letra é, muitas vezes, intuitiva, dada a

grande variedade existente. Contudo, entre os factores a considerar na decisão

por um determinado tipo para a apresentação do texto deve encontrar-se a sua

legibilidade. Por outro lado, deve estar-se consciente que os diversos tipos de

letra apresentam, por vezes, diferenças bastante marcadas quanto à economia de

ocupação do espaço, ou seja, quanto à quantidade de texto que permitem

colocar numa página. Enquanto a máquina de escrever atribuía a cada letra omesmo espaço, quer se tratasse de um «i» ou de um «m», isso não acontece coma generalidade dos tipos de letra. 12

Alguns tipos de letra caracterizam-se pela apresentação de efeitos

decorativos ou figurativos. Nestes casos, por maioria de razão, a sua utilizaçãodeve ter por base uma intenção comunicativa específica.

127

12 Existem tipos de letras, como o «Courier», que foram desenhados mantendo esta característicadas máquinas de escrever.

E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N DIZ A G E M

Salvo casos especiais, a apresentação de um texto toma por base um

determinado tipo de letra. Este facto corresponde no plano formal à unidade que

se atribui ao próprio texto ou conjunto de textos reunidos, por exemplo, num

volume. Uma vez escolhido esse tipo de letra, toma-se possível estabelecer

relações de diferenciação, por meio da mudança de uma unidade maior ou

menor para outro tipo de letra. Estas mudanças quanto à forma deverão

encontrar justificação na estrutura ou conteúdo do texto. É o que acontece no

caso já referido da diferenciação entre títulos e textos das notícias dos jornais.

Noutros casos, poderá tratar-se da coexistência de um texto e respectivo

comentário, de prefácio e obra, de texto e legendas de figuras, de entradas de

termos num dicionário ou lista e respectivas definições, classificações,

explicitação de significados ou indicação de exemplos de utilização, etc.

O facto de um texto tomar como base um determinado tipo de letra permite,

pela adopção de um tipo de letra diferente, estabelecer uma relação de

diferenciação:

com o exterior, ou seja, por contraste com outros textos, e

designadamente com um texto que com ele co-exista (que surja na

mesma página, no mesmo volume, etc.)

no interior do próprio texto, quando uma unidade é colocada em

contraste com outras.

Neste último caso, à semelhança do que acontece com a utilização de

maiúsculas/minúsculas, a diferenciação pode ter como objectivo assinalar

formalmente a própria estruturação do texto, por exemplo, pela adopção de um

tipo diferente para determinados títulos. Se a unidade se encontrar em

combinação directa com outras, o contraste que lhe é atribuído, para além da

diferenciação, terá como resultado a atribuição de ênfase, ou seja, a unidade que

sofreu a alteração tenderá também a chamar a atenção do leitor. É o que

acontecerá se uma determinada palavra do texto for escrita num tipo de letra

diferente.

Para além dos tipos de letra ou da utilização de maiúsculas/minúsculas, o

contraste, associado à estruturação do texto ou à criação de ênfase, poderá ser

estabelecido com base noutros aspectos de configuração formal, como estilo,formato, tamanho, espaçamento, cor, alinhamento, orientação, etc. Os diversos

aspectos formais podem ainda combinar-se entre si.

128

ig ç d esc i

Estilo

Um mesmo tipo de letra pode apresentar-se sob dois estilos: o normal (ou

redondo, direito) e o itálico.

O estilo normal é geralmente tomado como base. À utilização do itálico no

interior de um texto encontra-se associada a atribuição de ênfase. O itálico é

também utilizado com frequência em títulos e subtítulos, no âmbito da

expressão formal da estruturação da obra.

A escrita de um texto ou porção de texto totalmente em itálico pode ter

como objectivo a diferenciação face a outro texto ou porção em estilo normal.

Por outro lado, a inclinação que caracteriza o itálico cria uma impressão de

dinamismo, de movimento, que pode estar na origem de se encontrar, por vezes,

a adopção do itálico para todo um texto.

Os estilos normal ou itálico dos tipos de letra podem, ainda, sofrer

variações, segundo diferentes formatos: sublinhado, carregado, contornado,

sombreado, ...

Os formatos sublinhado e carregado são frequentemente utilizados para

atribuição de ênfase no interior de um texto ou no âmbito da estruturação desse

texto em títulos e subtítulos.

Os formatos contornado e sombreado acentuam a vertente decorativa dos

tipos de letra, aproximam mesmo os tipos clássicos dos tipos decorativos.

Em relação aos formatos, os computadores alargam cada vez mais as

possibilidades: diferentes versões de sublinhados (integral, por palavra, duplo,

ponteado), riscado, emoldurado, etc. Na utilização dessas possibilidades deve

ter-se em conta qual o objectivo que se pretende atingir, a fim de julgar a

adequação do formato que se pretende utilizar.

129

nho (c let

Na estruturação do texto por meio de títulos e subtítulos, o tamanho da

letra (por si só ou conjugado com estilos, formatos e espaçamentos) tenderá a

reflectir a posição hierárquica na organização textual. A ligação do tamanho à

criação de ênfase encontra, por si, correspondência na percepção visual: o

elemento maior receberá maior força.

E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N DIZ A G E i\!

l entos

Uma das características que diferenciava fortemente um texto impresso (na

tipografia) consistia no alinhamento regular na margem direita. Os

computadores, face às máquinas de escrever, trouxeram a possibilidade de

apresentar um texto à semelhança do texto tipográfico. Essa apresentação

passou a constituir a solução mais frequente.

Contudo, as soluções trazidas pelo computador, para além de poderem ser

adoptadas na globalidade do texto, permitem diferenciar blocos de texto:

alinhado à esquerda, centrado, alinhado à direita, justificado (alinhado à

esquerda e à direita).

O alinhamento à esquerda, que dantes resultava, em grande parte dos casos,

de uma limitação, passou a constituir uma possibilidade de escolha. Em muitos

casos, a utilização desse alinhamento é guiada pelo objectivo de personalização,

ou seja, de estabelecimento de uma relação mais próxima, mais pessoal,

recuperando a configuração que existia antes do acesso à possibilidade deoutros alinhamentos.

A variação no espaço entre as letras da palavra poderá diferenciar um blocode texto face a outro, reduzindo ou alargando esse espaço, correspondendo aosespaçamentos geralmente designados como condensado ou expandido.

O espaçamento entre as letras permite, ainda, designadamente quandoestão em causa blocos de texto, como os que surgem em capas e composiçõessimilares, uma ocupação mais vasta por parte da palavra do espaço disponível,

sem a alteração de outras características como tamanho, tipo ou formato.Para além do espaçamento horizontal entre as letras da palavra ou mesmo

entre as palavras, pode variar-se o espaço entre as linhas. O espaço verticalconstitui um dos recursos mais utilizados na estruturação formal do texto (o quepoderá ser feito em articulação com outros mecanismos como tamanhos,formatos, tipos de letra, etc.). Nessa estruturação, o espaçamento vertical éutilizado para separar e estruturar títulos e subtítulos segundo diferentes graus

de distância em relação ao texto e para autonomizar blocos de texto, comosecções, parágrafos, exemplos, etc.

A diferenciação entre blocos de texto é geralmente efectuada no caso decitações longas. O texto correspondente à citação é apresentado num bloco maisdenso com menor espaço entre as linhas.

130

i o ce e

O espaço ou largura da coluna determina a posição em que os elementos do

texto ocorrem ao longo da página. O princípio geral é assim o da continuidade

da esquerda para a direita ao longo da linha horizontal de escrita e leitura,

conjugada com a progressão vertical. Quando se esgota uma linha muda-se para

a linha imediatamente inferior.

Contudo, habitualmente, os textos não nos surgem como um bloco

absolutamente contínuo.

Desde logo, a divisão em parágrafos é feita por um sinal relativo ao espaço

- a mudança de linha e avanço da primeira linha do novo parágrafo - e não por

um sinal com uma forma gráfica específica (por exemplo, um ponto final que

fosse diferente). Não é o texto globalmente considerado que se apresenta como

um bloco, mas cada parágrafo. O isolamento de cada parágrafo reflecte a

estruturação do conteúdo do texto e facilita, desse modo, a leitura, pela

apreensão da organização. Esse isolamento pode ser colocado ao serviço de uma

leitura descontínua, que fazemos quando percorremos o início de cada parágrafo

à procura do tratamento de determinado assunto.

Para além da divisão em parágrafos, o aspecto de bloco contínuo do texto é

quebrado pela posição específica que geralmente os títulos e subtítulos ocupam.

Ao surgirem isolados numa linha, os títulos adquirem ênfase e captam a atenção

do leitor, favorecendo a apreensão da estrutura do texto e a leitura descontínua.

Por outro lado, são geralmente acompanhados pelo tratamento diferente

segundo outros recursos (maiúsculas, formato, estilo, tamanho, etc.). Quanto à

posição na linha, ela também pode variar: mais ou menos avançada, alinhada à

esquerda, ao centro ou mesmo à direita.

Se o isolamento dos títulos lhes atribui realce, o mesmo princípio é

aplicável a outros elementos: a colocação no texto de uma palavra ou expressãode forma isolada é geradora de ênfase.

Retomemos o , antes referido, que Kress e van Leeuwen

(1996) atribuem à posição ocupada por um elemento na página.

A polarização horizontal analisa a página em lado esquerdo / lado direito.

Na composição visual da nossa cultura, em que a leitura é feita da esquerda para

a direita, o lado esquerdo encontra-se associado ao que é apresentado comoinformação "dada", enquanto o lado direito recebe a informação nova.

Na polarização vertical, estabelece-se oposição entre e c e o.

O cimo da página está conotado com o ideal, enquanto o fundo é associado ao

131

E S C R I T A: C O N S T R U I R A A P R E N DIZ A G E 1\1

real; um elemento colocado no cimo da página como que é idealizado ou

generalizado, enquanto se aparecer por baixo constitui uma instância, uma

concretização ou exemplificação (cf. Kress e van Leeuwen, 1996:193 e segs.;

Sharples, 1999: 136).

A disposição de um elemento no centro pode corresponder a atribuir-lhe

ênfase, uma vez que o centro é uma área em que a visão se focaliza. O centroconstitui o núcleo em relação ao qual os outros elementos são de algum modo

subservientes. Por outro lado, o elemento central pode funcionar como

mediador entre os elementos que surgem no lado esquerdo e no lado direito, ou

em cima e em baixo (cf. Kress e van Leeuwen, 1996:203 e segs.).

Como se referiu, a orientação da escrita/leitura no nosso sistema é

horizontal da esquerda para a direita e descendente, quanto à progressão do

texto na página. A orientação vertical da escrita das palavras surge também,

embora em casos específicos, como cartazes, reclamos, etc., que se afastam de

uma leitura longa ou contínua.

A procura de ênfase ou a consideração de objectivos comunicativos

específicos pode levar à apresentação num texto de uma palavra ou conjunto de

palavras segundo orientações espaciais diferentes (vertical, diagonal, circular,

etc.), que contrastam com a orientação habitual dos textos ou do restante texto.

É o que acontece frequentemente nos poemas visuais ou em textos publicitários.

No caso de adopção de outras orientações, os maiores obstáculos à

legibilidade surgirão se se contrariar em maior grau a disposição esquerda-

-direita e a progressão descendente, pois, no extremo, o leitor terá que

reconstituir a palavra tendo como referência a orientação habitual entre as letras

da palavra.

132

No caso da cor, as máquinas, desde a imprensa ao computador

(acompanhado pelas impressoras) começaram por representar limitações face às

possibilidades já utilizadas nos trabalhos feitos pela mão do homem.Lembremo-nos das iluminuras medievais ricamente coloridas face às limitações

da imprensa na utilização da cor que ainda existiam há algumas décadas. A

máquina de escrever também, geralmente, não ia além de duas cores. A mão

C o d

facilmente podia socorrer-se de canetas de diversas cores. Esse era mesmo um

dos recursos utilizados nos cadernos de apontamentos para facilitar o estudo -

criação de diferenciação e de realce por meio da cor. Tal como no caso da

imprensa, em que o avanço da técnica suplantou as dificuldades e ultrapassou as

possibilidades manuais, hoje em dia já é vulgar o acesso a impressoras a cores.Os princípios de diferenciação e de realce continuam a aplicar-se. A cor

constitui mais um recurso a ter em conta para a criação dessas relações. As

potencialidades das cores para captar a atenção passam a estar disponíveis.

A variedade e diversidade introduzidas pela cor têm sido ligadas a aspectos

motivacionais. Basta lembrarmo-nos do amplo recurso a fotografias e

ilustrações coloridas que surgem nos manuais escolares. Os próprios alunos, nosseus trabalhos, tendem a valorizar a presença da cor.

Quando a cor é utilizada no próprio texto, de uma forma extensiva, deve

ter-se em conta a legibilidade permitida pelo contraste da cor dos caracteres

com a cor do fundo em que eles surgem. Algumas cores como o amarelo, o

rosa, o laranja ou tons claros de verde e azul que, por si, numa mancha contínua

ou contra um fundo escuro, apresentam força de atracção, perdem contraste com

um fundo branco. Devemos ter em conta que o máximo contraste é conseguido

pelos caracteres negros no papel branco. A adopção de uma outra cor que não o

preto para o texto de um documento ou de uma secção, que exija uma leitura

contínua, deve assegurar a legibilidade e evitar o cansaço, pelo que oscaracteres, num papel branco ou claro, deverão continuar a surgir em cores

escuras.

Nos títulos (continuando activo o critério da legibilidade), por não

exigirem uma leitura contínua e prolongada, já é possível recorrer a uma maior

variabilidade.

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