02. a primavera rebelde - queda dos reinos - morgan rhodes

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LIVRO 2 -

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  • Agora, o que est em jogo aconquista do mundo inteiro...

  • _________________________________________

  • P R L O G O _________________________________________

    A morte lanou uma grande sombrasobre os quilmetros ridos de Paelsia.

    A notcia do assassinato do chefeBasilius se espalhou rapidamente, evilas de toda a regio caram em lutoprofundo. Lamentavam a morte de umgrande homem um feiticeiro que

  • podia entrar em contato com a magia eque era considerado um verdadeiro deuspor muitos habitantes dessa terra semreligio oficial.

    O que vamos fazer sem ele? era umbrado constante nas semanas que seseguiram. Estamos perdidos!

    Sinceramente Lysandraresmungou para o irmo mais velho,Gregor, enquanto escapuliam do casebreda famlia no fim da tarde. Ele nuncamostrou nenhuma magia de verdade.No passava de conversa fiada! Pareceque as pessoas esqueceram que elecobrava impostos altssimos. O chefeera um ladro mentiroso, que vivia comarrogncia do alto de seu complexo,fartando-se de vinho e comida enquanto

  • o resto de ns passava fome! Quieta Gregor alertou, mas

    estava rindo. Voc no pode falartudo o que pensa, pequena Lys.

    Certamente voc tem razo. Ainda vai se meter numa encrenca

    por causa disso. Eu sei lidar com encrencas.

    Lysandra apontou a flecha para o alvoem uma rvore a vinte passos dedistncia e atirou. Acertou bem no meio.O orgulho a aqueceu naquela noite fria,e ela olhou de relance para o irmo paraver a reao dele.

    Bela pontaria. Ele abriu umsorriso e assumiu o lugar dela,empurrando-a com o cotovelo. Mas a

  • minha melhor.Sem esforo, ele partiu a flecha dela

    em duas. Foi impossvel no ficarimpressionada. Eles vinham praticandohavia meses, em segredo. Ela precisouimplorar para que o irmocompartilhasse seus conhecimentos dearco e flecha, mas ele finalmente cedera.No era comum uma garota aprender ausar armas. A maioria das pessoasacreditava que garotas deveriam apenaslimpar, cozinhar e cuidar dos homens.

    O que era ridculo. Principalmenteporque Lysandra era uma arqueira nata.

    Ser que eles vo voltar? elaperguntou a Gregor em voz baixa,observando a pequena vila ali perto, ostelhados de palha, as paredes de barro e

  • pedra. Saa fumaa das chamins demuitas casas.

    O maxilar dele ficou tenso. No sei.Uma semana antes, representantes do

    conquistador rei Gaius de aparnciaimportante haviam visitado a vila deles,em busca de voluntrios para seguirpara o leste e comear a trabalhar emuma estrada que o rei queria construirrapidamente uma estrada quepassaria no s por Paelsia, mastambm pelas terras vizinhas, Auranos eLimeros.

    Gregor e o pai foram escolhidos paradar as boas-vindas aos homens do rei, ea dupla havia encarado os sorrisos

  • reluzentes e palavras suaves sem sedeixar intimidar ou influenciar. A vilahavia recusado a oferta.

    O Rei Sanguinrio achava que agoraos governava. Mas estava redondamenteenganado. Eles podiam ser pobres, mastinham orgulho. Ningum tinha o direitode lhes dizer o que fazer.

    Os homens do rei Gaius haviampartido sem discusso.

    Basilius idiota Lysandramurmurou. Ele provavelmenteconfiava no rei, mas ns somos espertoso suficiente para no fazer a mesmacoisa. Basilius mereceu ser cortado. Eraapenas uma questo de tempo. Ficoenjoada s de pensar como ele foiidiota. Sua prxima flecha desviou

  • do curso. Ela precisava trabalhar mais aconcentrao. Me conte mais sobreos rebeldes que pretendem desafiar orei.

    Por que quer saber? Quer ser umadas poucas garotas a se juntar ao grupo?

    Talvez eu queira. Venha, pequena Lys Gregor riu

    e a segurou pelo pulso. Podemosprocurar uns coelhos para voc treinar apontaria. Por que desperdiar flechasem rvores e flego com palavras tolas?No se preocupe com os rebeldes. Setem algum que logo se juntar a elespara lutar contra o rei, esse algum soueu.

    No so tolas ela murmurou.

  • Mas ele tinha razo pelo menos noque dizia respeito ao treino de pontaria.As rvores eram mesmo escassas porali. A maior parte da regio era marrome seca, com algumas pequenas reasverdes, onde a me deles e outrasmulheres plantavam hortas que, a cadaano, davam cada vez menos vegetais emais lgrimas. A me deles no haviaparado de chorar desde que ficousabendo da morte de Basilius.

    O corao de Lysandra ficavaapertado ao ver a me to triste, toinconsolvel, mas tentava argumentarcom ela:

    Acredito que criamos nossoprprio destino, cada um de ns ela

  • havia dito me na noite anterior. No importa quem nos lidera.

    A resposta foi um olhar triste,cansado e paciente.

    Voc to ingnua, filha. Rezopara que isso no a desvie de seucaminho.

    E agora a me orava ao chefe mortopela filha transgressora. O que no eranenhuma surpresa. Lysandra sempretrouxera muito sofrimento me por noser uma filha adequada que fazia coisasadequadas. Lysandra estava acostumadaa no se encaixar no grupo de amigas elas no conseguiam entender suafascinao por fazer flechas at surgirembolhas nos dedos ou continuar fora decasa at o nariz ficar to vermelho que

  • praticamente brilhava no escuro.Gregor estendeu o brao para

    interromper os passos de Lysandra. O que foi? ela perguntou. Veja.Estavam a menos de dois quilmetros

    da vila. Diante deles havia uma pequenaclareira, sem nenhuma vegetao. Estavacercada de arbustos secos e rvoresdesfolhadas. Uma senhora de idade, queLysandra reconheceu como Talia, a maisvelha da vila, estava parada no centro,com uma carcaa de raposa-vermelhadiante de si. A mulher havia drenado osangue do animal em um copo demadeira. Com esse sangue, desenhavasmbolos na terra rida e rachada

  • usando a ponta do dedo.Lysandra nunca tinha visto nada

    parecido com aquilo. O que Talia est fazendo? O que

    ela est desenhando? Quatro smbolos Gregor disse

    em voz baixa. Sabe o que so? No, o qu? Os smbolos dos elementos: fogo,

    ar, gua e terra. Ele apontou paracada um: um tringulo, uma espiral, duaslinhas onduladas empilhadas, e umcrculo dentro de outro crculo. Eleengoliu em seco. Eu no fazia ideia.A anci da vila uma bruxa. UmaVetusta.

    Espere. Est dizendo que a velha einofensiva Talia uma bruxa?

  • Lysandra esperou que ele comeasse arir e dissesse que estava apenasbrincando. Mas ele estava falando srio.Extremamente srio.

    Gregor franziu a testa. Eu tinha minhas suspeitas, mas

    aqui est a prova. Ela manteve emsegredo durante todos esses anos. Vocsabe o que pode acontecer com asbruxas.

    Em Limeros, um dos reinos vizinhos,elas eram queimadas. Enforcadas.Decapitadas. Bruxas eram consideradasms mesmo ali em Paelsia. M sorte.Uma maldio sobre a terra que a faziadefinhar e morrer. Em Limeros, muitosacreditavam que as bruxas haviam

  • amaldioado a terra e a transformado emgelo.

    Lysandra se lembrou da reaoincomum de Talia quando soube que ochefe havia sido assassinado pelo reiGaius. Ela meneou a cabea,sombriamente, limpou a poeira da saia edisse trs palavras.

    E assim comea.Todos achavam que a velha era louca,

    ento no deram ateno s suasdivagaes, mas por algum motivoaquelas palavras repercutiram emLysandra e lhe causaram um arrepio.

    O qu comea? Ela segurou obrao da velha. Do que a senhoraest falando?

    Talia virou os olhos claros e midos

  • para Lysandra. O fim, minha querida. O fim est

    comeando.Demorou um tempo at Lysandra falar

    de novo com Gregor. Ela sentia seucorao bater forte.

    Como assim, Vetusta? algum que venera os elementos.

    uma religio antiga; quase to antigaquanto os prprios elementia. E pelojeito ele apontou a cabea para aclareira Talia est fazendo magia desangue esta noite.

    Lysandra sentiu um calafrio. Magiade sangue.

    Ela j tinha ouvido falar disso antes,mas at ento nunca havia tido nenhuma

  • prova. Gregor sempre acreditou mais doque ela no que no podia ser visto eraramente era comentado magia,bruxas, lendas. Lysandra mal ouvia oscontadores de histria, estava maisinteressada em fatos concretos do queem histrias fantsticas. Agora desejavater prestado mais ateno.

    Qual o objetivo? elaperguntou.

    Naquele exato momento, os olhos deTalia se voltaram diretamente para eles,como os de um falco, distinguindo-osna pouca luz do anoitecer.

    tarde demais ela disse, alto obastante para eles escutarem. Noconsigo evocar magia suficiente paranos proteger. S consigo ver as sombras

  • do que est por vir. No tenho poderpara det-los.

    Talia! A voz de Lysandra soouincerta ao chamar a mulher. O queest fazendo? Saia da, isso no certo.

    Voc precisa fazer uma coisa pormim, Lysandra Barbas.

    Lysandra olhou para Gregor, confusa,e voltou a olhar para Talia.

    O que quer que eu faa?Talia estendeu as mos cobertas de

    sangue ao lado do corpo, arregalandocada vez mais os olhos, como se tivessevisto algo amedrontador ao seu redor.Algo realmente terrvel.

    Corra!No mesmo instante, uma enorme

  • flecha flamejante cortou o ar e acertouTalia bem no centro do peito. Elacambaleou e caiu no cho. Suas roupaspegaram fogo antes que Lysandraconseguisse entender o que estavaacontecendo.

    Lysandra agarrou o brao de Gregor. Ela est morta!Ele ergueu a cabea rapidamente e

    olhou na direo de onde tinha vindo aflecha, depois puxou Lysandra para olado a tempo de desviar da outra flechaapontada diretamente para eles, queacabou acertando uma rvore.

    Temia que isso fosse acontecer. Isso o qu? Lysandra

    vislumbrou uma figura a uns cinquentapassos de distncia, armada com arco e

  • flecha. Ele a matou! Gregor, ele amatou! Quem ele?

    A figura havia localizado os dois ecomeado a persegui-los. Gregorpraguejou alto e a agarrou pelo pulso.

    Vamos, precisamos correr!Ela no discutiu. De mos dadas,

    correram de volta para a vila o maisrpido possvel.

    Estava em chamas.O caos havia se instalado

    rapidamente pelo local. Gritoshorrorizados de medo e dor cortavam oar gritos de moribundos. Vrioshomens de uniforme vermelhogalopavam pelas ruas, segurando tochasusadas sem piedade para incendiar cada

  • casebre. Moradores corriam das casasem chamas, tentando escapar de umamorte trrida. Na outra mo, os guardaslevavam espadas afiadas e golpeavammuitos, atravessando carne e osso.

    Gregor! Lysandra gritou quandofizeram uma parada abrupta,escondendo-se dos soldados atrs de umcasebre de pedra. O rei Gaius Isso obra dele! Ele est matando todomundo!

    Ns dissemos no a ele. Ele nogostou da resposta. Gregor a seguroupelos braos, olhando-a fixamente nosolhos. Lysandra, irmzinha. Vocprecisa ir. Precisa fugir daqui.

    O fogo aquecia o ar, transformando oanoitecer em uma claridade aterrorizante

  • ao seu redor. Do que voc est falando? Eu no

    posso ir! Lys Preciso encontrar a mame! Ela

    se soltou de Gregor e correu para a vila,desviando dos obstculos no caminho.Ela parou do lado de fora de sua casa,agora engolida pelo fogo.

    O corpo de sua me estava perto daentrada. O de seu pai estava a apenasdez passos de distncia, cado em umapoa de sangue.

    Antes que ela pudesse absorvertotalmente o horror daquilo, Gregor aalcanou. Ele a agarrou e jogou sobre oombro, correndo para fora dos limites

  • da vila antes de deix-la cairdesajeitadamente no cho. Ele jogou oarco e algumas flechas para ela.

    Eles esto mortos elasussurrou. Seu corao parecia umapedra que havia cado sobre o estmago.

    Eu estava prestando atenoenquanto corria. Os guardas do rei estoreunindo todos os sobreviventes paraobrig-los a trabalhar na estrada. Avoz dele falhou. Preciso voltar paraajudar os outros. V Encontre osrebeldes. Faa o que puder para impedirque isso acontea em outros lugares,Lys. Voc entendeu?

    Ela sacudiu a cabea, os olhosqueimando por causa da fumaa e daslgrimas de dio.

  • No, eu no vou deixar voc! Voc tudo o que me resta!

    Gregor segurou o queixo dela comfora.

    Venha comigo ele resmungou e eu mesmo cravo uma flecha no seucorao para livr-la do destino dosnossos amigos e vizinhos.

    E ento se virou e correu de voltapara a vila.

    Tudo o que Lys podia fazer era v-lopartir.

  • 1_________________________________________

    JONAS_________________________________________

    AURANOS

  • Quando o Rei Sanguinrio queria provaralguma coisa, fazia isso da maneira maisdura possvel.

    Era meio-dia. Com pancadas detremer os ossos, o machado do carrascodesceu sobre o pescoo de trs rebeldesacusados, separando a cabea doscorpos. O sangue escorreu pelas torasde madeira e se espalhou pelo cho depedra lisa diante de uma multido que jsomava mais de mil pessoas. E tudo oque Jonas podia fazer era observarhorrorizado as cabeas serem enfiadasem estacas altas na praa do palcio,para todos verem.

    Trs garotos que mal haviam setornado homens estavam mortos porque

  • foram considerados perigosos eencrenqueiros. As cabeas decapitadasencaravam a multido com olhos vaziose expresso inerte. Sangue escarlateescorria pelas estacas de madeiraenquanto os corpos eram levados paraserem queimados.

    O rei que havia conquistado aquelaterra de maneira rpida e brutal noconcedia segundas chances especialmente a quem representassequalquer oposio pblica a ele. Arebelio seria combatida com rapidez,sem remorso e abertamente.

    A cada descida fatal da lmina, umaagitao crescente avanava pelasmassas, como uma nvoa densa que nodava mais para ignorar. Auranos uma

  • dia fora um reino livre, prspero epacfico mas agora algum com gostopor sangue estava no trono.

    A multido estava ombro a ombro nagrande praa. Ali perto, Jonas podia verjovens nobres, bem-vestidos, com omaxilar tenso e expresso preocupada.Dois homens gordos e bbadosbrindavam com clices cheios de vinho,como se comemorassem um dia repletode possibilidades. Uma velha senhorade cabelos grisalhos e rosto marcadopor linhas de expresso, usando umvestido fino de seda, olhava para oslados desconfiada. Todos estavamempoleirados, procurando o melhorlugar para ver o rei quando ele

  • aparecesse no terrao de mrmore l emcima. O ar estava tomado pelo odor dafumaa das chamins e das cigarrilhas,pelos aromas de po e carne sendoassados, e pelos leos e perfumesflorais de fragrncia carregada usadoslargamente como substituio a banhosregulares. E o barulho uma cacofoniade vozes, sussurros conspiratrios egritos guturais impossibilitava que sepensasse direito.

    O palcio auraniano brilhava diantedeles como uma enorme coroa de ouro,com torres elevando-se at o cu azul elmpido. Ele ficava no centro da Cidadede Ouro, uma cidade murada com maisde trs quilmetros de largura eextenso. At as paredes possuam

  • ranhuras cobertas de ouro, que refletiama luz do sol como uma pilha de moedasde ouro no meio de uma vasta reaverde. L dentro, vias pavimentadascom pedras levavam a quintas,comrcios, tavernas e lojas. Apenaspessoas privilegiadas e importantespodiam fazer daquela cidade seu lar.Mas hoje os portes estavam abertospara quem quisesse ouvir o discurso dorei.

    Este lugar impressionante. Era difcil ouvir a voz de Brion no meiodo falatrio incessante da multido.

    Voc acha? Jonas desviou suaateno sombria das cabeas empaladas.Os olhos azul-escuros do amigo estavam

  • fixos no palcio reluzente, como sefosse possvel roub-lo e vend-lo.

    Eu poderia me acostumar a viveraqui. Ter um teto sobre a cabea;ladrilhos dourados sob os ps bemtratados. Toda a comida e bebida que eupudesse engolir. Estou dentro. Eleolhou para cima, viu os rebeldesexecutados e fez uma careta. Isto ,considerando que eu continuasse com acabea intacta.

    Os rebeldes executados naquele diaeram auranianos, portanto no faziamparte do grupo de Jonas e Brion jovens rapazes com ideias afins quedesejavam se revoltar contra o rei Gaiusem nome de Paelsia. Desde o cerco aocastelo, trs semanas antes, eles estavam

  • vivendo no meio da floresta queseparava Auranos de sua pobre terranatal. As Terras Selvagens como area era conhecida tinham a terrvelreputao de abrigar bandidos perigosose animais ferozes. Alguns tolossupersticiosos tambm acreditavam quedemnios e espritos perversos viviamna sombra das rvores altas e espessas,que bloqueavam toda a claridade,deixando passar apenas um pequenofeixe de luz do sol.

    Jonas era capaz de lidar combandidos e feras. E, ao contrrio damaioria esmagadora de seusconterrneos, ele acreditava que taislendas haviam sido criadas apenas para

  • incitar o medo e a paranoia.Quando ouviu a notcia das execues

    marcadas para aquele dia, Jonas quisver com os prprios olhos. Ele estavacerto de que elas fortaleceriam suadeterminao, sua convico de fazerqualquer coisa, assumir qualquer risco,para ver os reinos tomados escaparemcomo areia das mos do tirano queagora os governava.

    Em vez disso, elas o encheram deterror. O rosto de cada garoto setransformou no de seu irmo morto,Tomas, quando o machado caiu e osangue foi derramado.

    Trs garotos com a vida inteira pelafrente agora silenciados para semprepor dizer algo diferente do que era

  • permitido.Tais mortes seriam consideradas por

    muitos como obra do acaso. Destino. Ospaelsianos, principalmente, acreditavamque o futuro j estava determinado e queera preciso aceitar o que lhes eraoferecido fosse bom ou ruim. Isso sservia para criar um reino de vtimascom medo de enfrentar a oposio. Umreino facilmente tomado por algumfeliz em roubar o que ningum lutariapara manter.

    Ningum, ao que parecia, excetoJonas. Ele no acreditava em acaso,destino ou respostas mgicas. O destinono estava determinado. E se ele tivesseajuda suficiente daqueles dispostos a

  • lutar ao seu lado, sabia que era capaz demudar o futuro.

    A multido ficou em silncio por uminstante, at que o burburinho comeou acrescer novamente. O rei Gaius haviasurgido no terrao um homem alto ebelo, com olhos escuros e penetrantesque analisavam a multido como sememorizasse cada rosto.

    Jonas sentiu uma necessidaderepentina de se esconder, como se fossepossvel identific-lo no meio damultido, mas se obrigou a permanecercalmo. Embora j tivesse encontrado orei frente a frente, no seria descobertoali. O manto cinza, similar ao usado pormetade dos homens ali presentes,incluindo Brion, era suficiente para

  • ocultar sua identidade.Ao lado do rei no terrao estava

    Magnus, prncipe herdeiro do trono.Magnus era quase a imagem espelhadade seu pai, s que mais jovem, claro, ecom uma cicatriz que atravessava seurosto, visvel mesmo de longe.

    Jonas havia encontrado rapidamente oprncipe limeriano no campo de batalhae no tinha esquecido que Magnusimpedira que uma espada perfurasse seucorao. Mas agora no estavam maislutando do mesmo lado. Eram inimigos.

    A majestosa rainha Althea, comcabelos escuros e mechas grisalhas,juntou-se ao filho esquerda do rei. Eraa primeira vez que Jonas a via, mas era

  • fcil reconhecer aquela mulher. Elalanou um olhar soberbo para amultido.

    Brion segurou o brao de Jonas, queolhou para o amigo achando um poucode graa.

    Voc quer me dar a mo? Eu noacho que

    Apenas fique calmo Briondisse, sem sorrir. Se perder a cabea,pode acabar, hum, perdendo a cabea.Entendeu?

    Logo em seguida Jonas entendeu omotivo. Lorde Aron Lagaris e a princesaCleiona Bellos, filha mais nova doantigo rei, juntaram-se aos demais noterrao. A multido comemorou ao v-los.

  • Os cabelos longos, claros e douradosda princesa Cleo refletiam a luz do sol.Jonas j havia odiado aqueles cabelos esonhado em arranc-los pela raiz. Paraele, simbolizavam a riqueza de Auranos,que se mantinha a uma curta distncia dapobreza desesperada de Paelsia.

    Agora sabia que nada era to simplescomo ele pensava.

    Ela prisioneira deles Jonassussurrou.

    No me parece uma prisioneira Brion disse. Mas, claro, se voc estdizendo

    Os Damora mataram o pai dela,roubaram seu trono. Ela os odeia. Comopoderia ser diferente?

  • E agora l est ela, obediente, aolado de seu pretendente.

    Seu pretendente. Jonas olhou fixopara Aron.

    O assassino de seu irmo estavaacima deles, em uma posio de honra,ao lado de sua futura esposa e do reiconquistador.

    Voc est bem? Brionperguntou com cautela.

    Jonas no pde responder. Estavaocupado visualizando a si mesmoescalando a parede, pulando no terraoe matando Aron com as prprias mos.Ele j havia imaginado diferentesmtodos para acabar com aquelepresunoso desperdcio de vida, mas

  • acreditava ter deixado seu desejo devingana de lado em nome dos objetivosmais elevados de um rebelde.

    Ele estava errado. Eu o quero morto Jonas disse

    entredentes. Eu sei. Brion estava l quando

    Jonas ficou de luto por Tomas e, furioso,jurou vingana. E esse dia vaichegar. Mas no ser hoje.

    Lentamente, bem lentamente, Jonascontrolou sua clera imprudente. Seusmsculos relaxaram, e Brion finalmentesoltou seu brao.

    Est melhor? o amigoperguntou.

    Jonas no havia desviado os olhos dorapaz odioso e arrogante no terrao.

  • S vou ficar bem quando o virsangrar.

    um de nossos objetivos Brionafirmou. Um objetivo vlido. Mas,como eu j disse, no ser hoje. Fiquecalmo.

    Jonas respirou fundo. Desde quando voc d ordens? Como subcomandante do nosso

    pequeno grupo de rebeldes, se meucapito enlouquecer de repente, euassumo. So ossos do ofcio.

    Bom saber que voc est levandoisso a srio.

    Existe uma primeira vez para tudo.No terrao, Aron se aproximou mais

    de Cleo e estendeu o brao para segurar

  • sua mo. Ela virou seu lindo rosto paraolhar para ele, mas nenhum sorriso seformou em seus lbios.

    Ela merecia coisa melhor do queesse cretino Jonas resmungou.

    O qu? Deixa pra l.A multido cresceu ainda mais em

    questo de minutos, e o calor intenso dodia se abateu sobre eles. Suor escorriada testa de Jonas, e ele o secava com amanga do manto.

    Finalmente, o rei Gaius deu um passo frente e ergueu a mo. Fez-se silncio.

    uma grande honra o rei disse,com a voz potente o bastante para seprojetar com facilidade sobre a multido estar aqui diante de vocs como o rei

  • no s de Limeros, mas agora tambmde Paelsia e Auranos. Houve um tempoem que os trs reinos de Mtica eram ums, forte, prspero e pacfico. E agora,finalmente, teremos isso de novo.

    As pessoas na multido murmuravamem voz baixa umas com as outras, amaioria dos rostos mostrando traos dedesconfiana, de medo, apesar daspalavras suaves do rei. A reputao doRei Sanguinrio o precedia. Nasconversas sussurradas antes e depoisdas execues, Jonas ouviu muitosdizerem que a partir daquele discursodecidiriam se o rei era amigo ouinimigo. Muita gente duvidava que osrebeldes mortos estivessem certos,

  • qualquer que fosse a anarquia quehaviam tentado estabelecer; talvez osrebeldes s piorassem as coisas paratodos ao irritar o rei.

    Tanta ignorncia tanta prontidopara pegar o caminho mais fcil, curvar-se diante do conquistador acreditandoem quaisquer palavras que sassem desua boca. Tudo isso indignava Jonas ato ltimo fio de cabelo.

    Mas at ele precisava admitir que orei dominava a arte do discurso. Cadapalavra parecia coberta por ouro, dandoesperana aos desesperanados.

    Optei por viver com a minhafamlia neste belo palcio por um tempo,pelo menos at a transio se completar.Embora seja muito diferente de nosso

  • amado lar em Limeros, queremosconhecer todos vocs melhor, e sentimosque nosso dever de acolhida ajudar aguiar todos os nossos cidados rumo aessa nova era.

    Tambm ajuda o fato de Limerosestar congelado como o corao de umabruxa Brion zombou, apesar dealguns murmrios de aprovao suavolta. Ele faz parecer um sacrifcioviver em um lugar que no est cobertode neve e gelo.

    Hoje tenho um anncio importantea fazer, que beneficiar a todos o reiafirmou. Sob meu comando, j foiiniciada a construo de uma grandeestrada que ir interligar nossos trs

  • reinos.Jonas franziu a testa. Uma estrada? A Estrada Imperial partir do

    Templo de Cleiona, a algumas horasdesta cidade, cortar as TerrasSelvagens at Paelsia, onde seguir parao leste, atravessando as MontanhasProibidas, e depois para o norte,cruzando a fronteira para Limeros,chegando ao Templo de Valoria, seudestino final. Vrias equipes j estoposicionadas, trabalhando dia e noitepara garantir que a construo daestrada termine o mais rpido possvel.

    Atravessando as MontanhasProibidas? Jonas sussurrou. Paraque serve uma estrada que leva aondeningum quer ir?

  • O que o rei estava tramando?Um brilho no cu chamou sua ateno,

    e ele viu dois falces douradossobrevoando a multido.

    At os vigilantes esto interessados.Pensamentos ridculos como esse ele

    guardava para si em vez de compartilharcom Brion. As histrias sobre imortaisque assumiam a forma de falces paravisitar o mundo mortal no passavamdisso: histrias contadas para ascrianas na hora de dormir. Sua prpriame lhe contara essas histrias.

    Os lbios do rei se abriram numsorriso que pareceria genuno e calorosoa todos que no conhecessem aescurido por trs dele.

  • Espero que estejam to satisfeitosquanto eu com essa nova estrada. Seique est sendo um perodo difcil paratodos, e no tenho prazer algum com osangue derramado no processo.

    Houve uma onda de murmriosdescontentes e inquietos na multido,mas deveria haver muito mais.

    Est funcionando, Jonas pensou. Eleest enganando os que querem serenganados.

    At parece Brion exclamou. Ele adora derramar sangue. Teria sebanhado com ele se tivesse aoportunidade.

    Jonas concordava plenamente.O rei Gaius continuou:

  • Como todos podem ver aqui hoje,a princesa Cleiona est muito bem. Elano foi exilada nem aprisionada comofilha de meu inimigo. Por que seria?Depois de toda a dor e sofrimento queenfrentou bravamente, eu a recebi emminha nova casa de braos abertos.

    Ele falava como se ela tivesse tidoalguma escolha, mas Jonas noacreditava nisso.

    Meu prximo anncio de hoje dizrespeito sua princesa. O rei Gaiusestendeu a mo. Venha c, minhaquerida.

    Cleo lanou um olhar desconfiadopara Aron antes de se virar para o rei.Ela hesitou apenas um instante, e depois

  • atravessou o terrao para se posicionarao lado do rei. Sua expresso eraindecifrvel; os lbios estavamapertados, mas a cabea erguida. Umcolar de safiras brilhava em seupescoo, e joias tambm enfeitavamseus cabelos, combinando com o vestidoazul-escuro. Sua pele brilhava radiantesob o sol. Sussurros empolgados agorase elevavam da multido, sobre a filhade seu antigo rei.

    A princesa Cleiona sofreu umagrande perda, e seu corao estpartido. Ela de fato uma das garotasmais corajosas que j conheci e entendopor que o povo de Auranos a ama tanto. A voz e a expresso do rei pareciamrepletas de afeio quando ele olhava

  • para a princesa. Todos sabem que elaest comprometida com lorde AronLagaris, um belo rapaz que defendeu aprincesa de um selvagem em Paelsia quepretendia fazer mal a ela.

    Brion agarrou o brao de Jonasnovamente e cravou a ponta dos dedos.Jonas no havia se dado conta de quetinha dado um passo frente, com asmos cerradas ao lado do corpo,incitado pelas mentiras a respeito de seuirmo.

    Fique calmo Brion resmungou. Estou tentando. Se esforce mais.O rei puxou Cleo para mais perto. Foi assim que lorde Aron provou

  • seu valor ao finado rei Corvin e recebeua mo da princesa e a promessa de umcasamento que sei que os auranianosaguardam ansiosamente.

    Aron estampou um sorriso no rosto eum olhar de triunfo nos olhos.

    De repente, Jonas percebeu o queestava acontecendo. O rei estava prestesa anunciar a data do casamento de Arone Cleo.

    O rei Gaius apontou a cabea nadireo do rapaz.

    No tenho dvidas de que lordeAron formaria um timo par com aprincesa.

    Jonas ardia de raiva em silncio poraquele desgraado se envaidecer ebrilhar luz de seus crimes e ser

  • recompensado por eles. O dio de Jonasera palpvel, um monstro horrvel queameaava renovar sua obsesso devingana e ceg-lo para todo o resto.

    O rei continuou: Ontem cheguei a uma importante

    deciso.A multido ficou em silncio

    absoluto, inclinando-se para a frentecoletivamente na expectativa do que elediria em seguida. Jonas no conseguiatirar os olhos de lorde Aron e de suaexpresso alegre e desprezvel.

    Eu, neste ato, encerro ocompromisso firmado entre lorde Aron ea princesa Cleiona o rei Gaius disse.

    A multido levou um susto, e a

  • expresso alegre de Aron ficouparalisada.

    A princesa Cleiona representa adourada Auranos de todas as formas o rei disse. Ela filha de todosvocs, e sei que mora em seu corao.Vejo isso como uma oportunidade deunir Mtica ainda mais. Assim sendo,hoje tenho a satisfao de anunciar onoivado e iminente casamento, daqui aquarenta dias, de meu filho, prncipeMagnus Lukas Damora, e a adoradaprincesa Cleiona Aurora Bellos, deAuranos.

    O rei Gaius pegou a mo de Cleo e ade Magnus e as uniu.

    Logo aps o casamento haveruma excurso dos recm-casados.

  • Magnus e Cleiona viajaro por Mticacomo smbolo da unio e do brilhantefuturo que todos compartilhamos.

    Houve um momento de silncio atque a maior parte da multido comeoua comemorar, em aprovao algunscom nervosismo, outros aprovandototalmente a unio e a excursopropostas.

    Hum Brion disse. Por essaeu no esperava.

    Jonas encarou o terrao durantevrios minutos, aturdido.

    J ouvi o bastante. Precisamos sairdaqui. Agora.

    Mostre o caminho.Jonas desviou o olhar do rosto

  • confuso de Cleo e comeou a abrircaminho pela multido. Ele estava maispreocupado com a notcia da EstradaImperial o que aquilo significava?Quais eram as verdadeiras intenes dorei? O destino da princesa, agora noivade seu inimigo mortal, deveria ser altima de suas preocupaes.

    Ainda assim, o novo noivado de Cleoo perturbou profundamente.

  • 2_________________________________________

    CLEO_________________________________________

    AURANOS

  • Hoje tenho a satisfao de anunciar onoivado e iminente casamento, daqui aquarenta dias, de meu filho, prncipeMagnus Lukas Damora, e a adoradaprincesa Cleiona Aurora Bellos, deAuranos.

    Cleo ficou sem ar.O mundo virou um borro diante de

    seus olhos, e seu ouvido comeou azumbir. Ela sentiu um puxo quando orei a arrastou para perto, e em seguidaalgo quente e seco tocou sua mo. Elaolhou e viu Magnus ao seu lado, com orosto impassvel e indecifrvel desempre. Seus cabelos pretos caamsobre a testa, emoldurando seus olhoscastanho-escuros enquanto ele mirava a

  • multido uma multido que vibrava egritava, como se aquele horror deembrulhar o estmago fosse uma boanotcia.

    Finalmente, depois do que pareceuuma eternidade, Magnus soltou a modela e se virou para a me, que haviasegurado o brao dele.

    Aron agarrou o pulso de Cleo e aarrastou pelo terrao de volta para ocastelo, atrs dos demais. Seu hlito,como sempre, cheirava a vinho e fumaacustica de cigarrilha.

    O que acabou de acontecer lfora? ele murmurou.

    Eu eu no sei.O rosto de Aron estava vermelho

    como uma beterraba.

  • Voc sabia que isso ia acontecer?Que ele pretendia romper nossonoivado?

    No, claro que no! Eu no tinhaideia at at Pela deusa, o quehavia acabado de acontecer? No podiaser verdade!

    Ele no pode mudar o que j estdeterminado Aron estava to furiosoque chegava a cuspir. Ns devemosficar juntos, e ponto final! J estavadecidido!

    claro que sim ela conseguiudizer, com muito mais reserva do quesentia. Ela no tinha nenhuma afeioprofunda pelo belo porm insosso lordeAron, mas preferia passar mil anos em

  • sua companhia do que uma hora sozinhacom Magnus.

    O prncipe sombrio havia matado oprimeiro rapaz que ela amara oatacara pelas costas com uma espadaenquanto Theon tentava proteg-la. Alembrana da morte de Theon fez umanova onda de sofrimento crescer dentrodela, quente e densa o bastante parafaz-la engasgar.

    Aprisionada havia semanas nopalcio depois de ser capturada, Cleoconhecera as profundezas do desesperoe do luto por Theon; por seu pai; porsua irm, Emilia. Tudo fora arrancadodela. Tanta tristeza abrira um buracofrio e sem fundo em seu peito, que nuncaseria preenchido. Ela poderia se perder

  • em tamanha escurido se no tivessecuidado.

    Vou dar um jeito nisso. Ocheiro de vinho no hlito de Aron estavaainda mais forte do que o normal. Eleolhou na direo do rei quando este saiudo terrao. Vossa majestade, fundamental que eu fale com o senhorimediatamente!

    O rei tinha um sorriso reluzente norosto, combinando com a coroa douradaincrustada de rubis que os dedos deCleo coavam para arrancar de suacabea. Aquela coroa e tudo o que elarepresentava pertenciam ao seu pai.

    Pertenciam a ela. Certamente eu ficaria feliz em

  • falar com voc sobre qualquer assunto,lorde Aron.

    Em particular, vossa majestade.O rei Gaius ergueu uma sobrancelha.

    Um humor sombrio iluminou seu rostoquando ele encarou o jovem lorde queesbravejava diante dele.

    Se voc insiste.Os dois saram sem demora, deixando

    Cleo ali sozinha, apoiada na parede friae lisa enquanto tentava retomar o flegoe os pensamentos ambos acelerados.

    Magnus foi o prximo a sair doterrao. Ele olhou para ela, semexpresso.

    Parece que meu pai tinha umasurpresinha guardada para ns hoje, no?

  • O prncipe era ao mesmo tempofriamente belo, como seu pai traioeiro,e imponentemente alto. Cleo tinha vistomuitas meninas o observando nasltimas trs semanas, os olhos brilhandode interesse. A nica coisa queestragava sua beleza era uma cicatriz dolado direito do rosto, um arco que ia doalto da orelha at o canto da boca.

    Um gosto amargo subiu at suagarganta ao v-lo.

    No tente me convencer de queno sabia nada sobre isso.

    No estou tentando convenc-la denada, princesa. Sinceramente, no estoumuito interessado no que voc pensa demim ou de qualquer pessoa.

  • No vai acontecer. A voz delaera baixa, mas firme. Eu nunca voume casar com voc.

    Ele deu de ombros preguiosamente. Explique isso ao meu pai. Estou explicando a voc. Meu pai toma as decises, e ele

    gosta que sejam seguidas sem discusso.Sinta-se totalmente vontade parabrigar com ele sobre isso.

    O ultraje que ela sentia rapidamentese dissipou, restando apenas adescrena.

    Isso s pode ser um sonho. No,no um sonho: um pesadelo. Umpesadelo terrvel.

    Os lbios de Magnus se afinaram.

  • Para ns dois, princesa. No tenhadvidas quanto a isso.

    A rainha Althea se aproximou esegurou as mos de Cleo. As dela eramsecas e quentes, exatamente como as dofilho. Parecia que ela estava tentandosorrir, mas a expresso era to falsa emseu rosto de traos finos como seriampenas em uma cabra.

    Minha querida, uma honrareceb-la em nossa famlia. Tenhocerteza de que um dia voc ser umarainha extraordinria.

    Cleo mordeu a lngua at quase tirarsangue para no dizer que ela j erarainha. S que o Rei Sanguinrio estavano caminho de seu ttulo de direito.

  • Teremos muito trabalho paraplanejar um casamento adequado para omeu filho a rainha continuou,ignorando a falta de resposta de Cleo. E precisamos fazer isso rpido, dadaa proximidade da data. Ouvi falar de umestilista exemplar em Pico do Falcoque ser perfeito para fazer seu vestido.Iremos at l em breve. Ser bom para opovo ver sua amada princesa douradaandando entre eles novamente. Elevaros espritos em todo o reino.

    Cleo no conseguia encontrarpalavras, ento nem tentou responder.Ela concordou com a cabea e baixou osolhos para ocultar a raiva. Por entre osclios, viu a rainha Althea olhar para

  • Magnus, como se transmitisse algum tipode mensagem atravs de seus olhos azul-claros. Depois ela acenou com a cabeapara os dois e seguiu pelo corredor.

    Minha me entende muito de modae beleza Magnus disse, displicente. a paixo dela, da qual ela sempredesejou que minha irm compartilhasse.

    A irm dele princesa Lucia. Jhavia trs semanas que a princesalimeriana estava em coma depois de tersido ferida na exploso que escancaroua entrada do palcio e possibilitou aorei Gaius e seu exrcito uma vitriaviolenta.

    Cleo havia notado que a meno irm enferma era a nica coisa queparecia suscitar um pingo de emoo no

  • olhar grave de Magnus. Muitoscurandeiros a haviam examinado, entreeles os maiores e mais bem-sucedidosdo reino. Ningum conseguiu determinaro que havia de errado com ela oudescobrir qualquer ferimento queexplicasse sua condio.

    Cleo havia sugerido que sua queridaamiga Mira Cassian, antiga dama decompanhia de sua irm, fosse designadacriada de Lucia, na esperana de que orei a considerasse til demais pararebaix-la a empregada da cozinha.Felizmente, havia dado certo. Miracontou a Cleo que a princesa levantavade seu repouso como se estivesse emtranse, apenas o suficiente para

  • consumir alimentos especialmentetriturados para garantir suasobrevivncia, mas nunca ficavatotalmente consciente. Era umverdadeiro mistrio o que haviaacontecido com a princesa de Limeros.

    Vou deixar uma coisa bem clara,prncipe Magnus Cleo disse comfirmeza, esforando-se para expulsar otremor de sua voz. Eu nunca sereiforada a me casar com algum que euodeie. E eu odeio voc.

    Magnus a observou por um instante,como se ela fosse algo que ele pudesseesmagar facilmente sob a sola da bota.

    Muito cuidado com o jeito que falacomigo, princesa Cleiona.

    Ela empinou o queixo.

  • Ou voc vai fazer o qu? Enfiaruma espada em mim quando eu virar ascostas, como fez com Theon? Seucovarde fraco!

    Em um segundo, ele agarrou o braodela com fora suficiente para faz-laestremecer e a empurrou contra a paredede pedra. A raiva transpareceu em seuolhar, e tambm algo inesperado algocomo dor.

    Se voc d valor sua vida,princesa, nunca, jamais me chame decovarde novamente. Estou avisando.

    Sua expresso exaltada era todiferente do olhar glido de sempre queela ficou confusa. Ele havia ficadofurioso ou magoado com suas palavras?

  • Talvez as duas coisas? Me solte ela sussurrou.Os olhos dele frios como

    diamantes negros, desalmados, cruis a imobilizaram por mais um instante, atque a soltou de forma to abrupta queCleo desabou junto parede.

    Um guarda vestindo o familiaruniforme vermelho limeriano seaproximou.

    Prncipe Magnus, seu pai requisitaa presena do senhor e da princesa nasala do trono imediatamente.

    Magnus finalmente desviou o olhardela e se virou para o guarda.

    Muito bem.O estmago de Cleo ficou

    embrulhado. Ser que Aron havia sido

  • bem-sucedido em sua argumentaocontra aquele novo noivado?

    Na sala do trono, o rei Gaius havia seinstalado na poltrona dourada do paidela. Esparramados no cho, a seus ps,estavam dois de seus ces horrveis lbreis enormes e babes que rosnavamsempre que ela se aproximava demais.Para Cleo, pareciam mais demnios dasterras sombrias do que ces.

    Uma lembrana repentina de suainfncia surgiu diante de seus olhos opai dela sentado naquele mesmo trono,os braos estendidos para ela, queconseguira escapar da rgida ama paracorrer direto at ele e subir em seu colo.

    Ela rezou para que seus olhos no

  • revelassem o quanto queria vingar amorte de seu pai. Por fora, ela nopassava de uma adolescente, de corpoesguio e estatura pequena, nascida ecriada com uma vida privilegiada,repleta de excessos e luxo. primeiravista, ningum veria Cleo como umaameaa.

    Mas ela sabia que era. Seu coraoagora batia por um propsito a nicacoisa que ajudou a estancar a torrente deluto que se abatera sobre ela.

    Vingana.Cleo sabia que estava viva porque o

    rei Gaius via alguma vantagem emmanter a princesa auraniana a salvo. Elea usava como representante do querestara da linhagem real da famlia

  • Bellos em todas as questes que diziamrespeito s polticas do rei e seu podersobre o povo auraniano. Ela era umpardal preso em uma gaiola dourada,levada para fora quando necessrio,para mostrar a todos como era bela ebem-comportada.

    Ento ela seria bela e bem-comportada. Por enquanto.

    Mas no para sempre. Minha querida o rei disse

    quando ela e Magnus se aproximaram. Voc fica mais adorvel a cada diaque passa. impressionante.

    E voc fica cada vez mais odioso erepugnante.

    Obrigada, majestade ela disse

  • com o mximo de doura possvel. O reiera um lobo em pele de cordeiro, e elanunca subestimaria a fora de suamordida.

    Ficou satisfeita com o anncio-surpresa de hoje? ele perguntou.

    Ela se esforou para que suaexpresso controlada no desabasse.

    Fico muito grata por ter meconcedido uma posio to honrada emseu reino.

    O sorriso dele se abriu, mas nocondizia nem um pouco com seus olhoscastanho-escuros o mesmo tom dosde Magnus.

    E voc, meu filho, certamentetambm foi pego de surpresa. Foi umadeciso de ltima hora, para dizer a

  • verdade. Achei que o povo ficaria feliz,e eu estava certo. Todos ficaram.

    Como sempre Magnusrespondeu , eu acato sua deciso.

    O som da voz do prncipe, grave efirme, to parecida com a do pai, deixouos nervos de Cleo mais flor da pele doque j estavam.

    Lorde Aron quis falar comigo emparticular o rei disse.

    Em particular? Meia dzia deguardas estavam distribudos pela sala,com dois do lado de fora da passagemarqueada que levava sala do trono. Aolado do rei, em um trono menor, estava arainha Althea, olhando para a frente,com lbios comedidos que no

  • revelavam emoo alguma. Ela podiamuito bem estar dormindo com os olhosabertos.

    Aron estava direita, com os braoscruzados.

    Sim ele afirmou, arrogante. Expliquei ao rei que essa mudana inaceitvel. Que o povo esperaansiosamente por nosso casamento.Minha me j avanou muito noplanejamento da cerimnia. Eu quisfalar com o rei para que elereconsiderasse a deciso de hoje.Existem muitas garotas nobres e bonitasem Auranos que seriam muito maisadequadas ao prncipe Magnus.

    O rei Gaius inclinou a cabea,observando Aron sem se preocupar em

  • conter o riso, como se ele fosse ummacaquinho treinado.

    Claro. E como voc se sente emrelao a essa mudana abrupta,princesa Cleiona?

    A boca dela ficara seca depois deouvir o breve discurso de Aron, quemais parecia a birra de uma crianaquando os brinquedos eram recolhidosna hora de dormir. Aron estava toacostumado a ter as coisas do seu jeitoque seu bom senso fora totalmenteprejudicado. No entanto, ela no podiaculp-lo totalmente por tentar salvar opouco poder que ainda tinha no palcio.Mas, se fosse esperto e ela sabia quea inteligncia no era um dos fortes de

  • Aron , veria que Cleo no detinhamais nenhum poder por ali, no tinhainfluncia alguma alm de ser umfantoche para manter o povo auranianona linha e ganhar sua confiana.

    Ela forou um sorriso. Eu certamente me curvo diante de

    qualquer deciso que o sbio rei tomarem meu nome. A falsidade daspalavras se contorcia em sua garganta. s que o argumento de Aronpode ter um certo fundamento. O reino jestava empolgado com a ideia de nsdois juntos depois da atitude muitobem, muito corajosa de Aron para meproteger naquele dia no mercadopaelsiano.

    Ela estremeceu por dentro ao se

  • lembrar do assassinato de TomasAgallon, uma atitude que no teve nada aver com proteo e sim com uma reaoexagerada de Aron a um insulto pessoal.

    Garanto que isso foi considerado. A coroa roubada do rei refletia a luzdas tochas e brilhava. Lorde Aron muito bem aceito pelo povo auraniano,sem sombra de dvida. Essa foi uma dasrazes que me levaram a conceder a eleo ttulo de vassalo do rei.

    Aron fez uma profunda reverncia. E eu fico muito satisfeito com essa

    honra, vossa majestade. Vassalo do rei Magnus

    murmurou atrs de Cleo, alto o bastantepara apenas ela escutar. Um ttulo

  • imponente demais para quem nuncaesteve em uma batalha. Ridculo.

    O rei Gaius observou Cleoatentamente.

    Deseja permanecer noiva de lordeAron?

    Ela quis responder imediatamente quesim Aron, apesar dos pesares, eramais palatvel do que Magnus , masparou para refletir. No era ingnua obastante para acreditar que taisdesejos seriam concedidos. Depois deanunciar a data do casamento aoscidados, no havia chance alguma de orei voltar atrs em sua proclamao.Concordar com Aron s a faria ser vistacomo tola uma tola ingrata edesrespeitosa.

  • Cleo baixou a cabea e observou osces aos ps do rei como se fosse tmidademais para olhar diretamente em seusolhos.

    Vossa majestade, desejo apenasagrad-lo.

    Ele assentiu levemente com a cabea,como se aquela fosse a resposta correta.

    Ento fico satisfeito que vocpermita que eu tome essa deciso em seunome.

    Aron soltou um resmungo dedesgosto.

    Ah, o que isso, Cleo?!Ela lhe lanou um olhar cauteloso,

    alertando-o silenciosamente a tomarcuidado com o que dizia.

  • Aron, voc precisa entender que orei sabe o que certo.

    Mas ns deveramos ficar juntos ele choramingou.

    Voc encontrar outra noiva, Aron.Mas receio que no possa ser eu.

    A raiva brilhou em seus olhos, e elese virou para encarar o prncipeMagnus.

    muito importante que uma noivaseja pura at a noite do casamento. No?

    O rosto de Cleo comeou a pegarfogo.

    Aron!Ele apontou para ela com selvageria. Cleo j entregou sua castidade a

  • mim. Ela no pura!Fez-se um silncio mortal.Cleo lutou para manter o controle,

    mas sentiu que ele escorregava por entreos dedos. L estava seu terrvel segredo at ento escondido de todos exposto como um peixe tirado da gua,agitado e viscoso para todo mundo ver.

    Ela tinha lembranas enevoadas deuma festa, vinho demais, uma princesamimada que gostava de se esquecer detudo e se divertir e Aron, um lordebelo e popular desejado por todas assuas amigas, que queria estar com elamais do que qualquer outra pessoa.Quando ficou sbria, Cleo se deu contade que havia cometido um erro terrvelao sacrificar sua virgindade com um

  • garoto to vaidoso e superficial.Ser vista agora como uma princesa

    desgraada em uma terra que valorizavaa pureza como a virtude mais importantede uma noiva podia significar suaderradeira queda. Ela perderia o poucopoder que lhe restava no palcio.

    Restava apenas uma opo para sesalvar daquela situao.

    Aron ela disse da maneira maisseca que conseguiu. Quase sinto penade voc por precisar mentir a esseextremo. No consegue simplesmenteaceitar a derrota com elegncia?

    Os olhos dele se arregalaram tantoque ela conseguiu ver a parte branca emvolta de suas ris.

  • No mentira! Voc me quis tantoquanto eu quis voc! Precisa admitir queessa a verdade e agradecer por euainda quer-la!

    O rei Gaius se encostou no trono eolhou para eles, com as mos unidas.

    Parece que temos umdesentendimento aqui. A verdade muito importante para mim; a coisa maisimportante de todas. Mentiras no sotoleradas. Princesa, est dizendo queeste rapaz mentiria sobre algo toimportante?

    Sim ela disse sem hesitao elanou ao rei um olhar perspicaz. Eleest mentindo.

    Cleo! Aron vociferou, ultrajado.

  • Ento o rei disse , no tenhooutra escolha alm de acreditar emvoc. Ele olhou rapidamente paraMagnus. Diga-me, meu filho, o quecostumamos fazer em Limeros com quemmente para o rei?

    O rosto de Magnus estavaindecifrvel como sempre, os braoscruzados diante do peito.

    A penalidade por mentir ter alngua cortada.

    O rei assentiu, depois fez um gestopara os guardas.

    Dois guardas deram um passo frentee agarraram os braos de Aron comfora. Ele perdeu o ar e seu rostoencheu-se de medo.

  • Vossa majestade no pode fazerisso! No estou mentindo! Nuncamentiria para o senhor; obedeo suasordens em todos os sentidos. O senhor meu rei agora! Por favor, acredite emmim!

    O rei no disse nada, mas fez um sinalcom a cabea para outro guarda, que seaproximou tirando uma adaga da bainhaem sua cintura.

    Aron foi obrigado a ficar de joelhos.Um quarto guarda segurou seu maxilar,agarrou um punhado de cabelo, e abriu aboca dele fora. O guarda usou umapina de metal para puxar sua lnguapara fora, e Aron soltou um gritosufocado de terror.

  • Cleo assistia a tudo issocompletamente em choque.

    Ela odiava Aron. Odiava tercompartilhado seu corpo com ele consolando-se apenas com o fato de queestava bbada demais para se lembrarde muita coisa do ato em si. Odiava-opor ter matado Tomas Agallon e nosentir um pingo de remorso. Odiava queAron fosse to insensvel a ponto de noentender por que tudo aquilo era indignopara ela.

    Ele merecia ser punido de muitasmaneiras. De verdade.

    Mas no por isso.Ele havia dito a verdade ao rei.No entanto admitir que ela havia

  • mentido, deusa Cleiona Cleo raramente

    rezava para a divindade auraniana dequem recebera o nome, mas certamenteabriria uma exceo dessa vez. Porfavor, por favor, me ajude.

    Ela podia deixar aquilo acontecersem protestar. Poderia ser seu segredoat o dia de sua morte. Ningum nuncamais acreditaria em Aron depoisdaquela punio.

    Seus punhos estavam to apertadosque as unhas cravavam dolorosamentena palma das mos enquanto ela via aadaga se aproximar da boca de Aron.Ele soltou um guincho aterrorizado.

    Pare! Cleo gritou, deixando apalavra escapar antes mesmo de se dar

  • conta. Ela tremia dos ps cabea, ocorao batendo to forte que sacudiaseu corpo todo. No faa isso! Porfavor, no! Ele no mentiu. Ele estavadizendo a verdade! Ficamos juntos umanica vez. Eu entreguei minha castidadea ele conscientemente e sem reservas!

    O guarda que segurava a adaga ficouparalisado, com a borda da lminapressionando a lngua rosada econtorcida de Aron.

    Bem o rei Gaius disse comsuavidade, mas Cleo nunca tinha ouvidotanta ameaa na voz de algum. Issocertamente muda as coisas, no ?

  • 3_________________________________________

    MAGNUS_________________________________________

    AURANOS

  • O rosto da princesa Cleo estava plido eseu corpo literalmente tremia de medodiante da fria do rei Gaius.

    E pensar que Magnus acreditava queaquele reino dourado no teriaentretenimento de valor.

    Sua me permanecia em silncio aolado do rei, o rosto impassvel em meioa todo o drama, como se no tivesseopinio nenhuma sobre lnguas cortadase virgindades perdidas. Em algum lugarpor trs daquela expresso nula, elesabia que a rainha certamente tinha umaopinio a respeito do que seu maridodeveria fazer e com quem.

    Mas aprendera havia muito tempo ano dizer o que pensava em voz alta.

  • O rei Gaius se inclinou para a frentepara olhar a princesa maculada maisatentamente.

    Seu pai soube da sua perda deinocncia vergonhosa antes de morrer?

    No, vossa majestade elasoluou.

    Era uma tortura para ela. Para umaprincesa, mesmo de um reino derrotado,admitir que fora desonrada antes danoite de npcias

    Bem, simplesmente no acontecia.Ou, pelo menos, no era algo quealgum j tivesse admitido toabertamente.

    O rei balanou a cabea lentamente. O que vamos fazer com voc

  • agora?Magnus notou que os punhos de Cleo

    estavam fechados ao lado do corpo.Durante todo o tempo, seus olhospermaneceram secos, e sua expresso,soberba apesar do medo bvio. Ela nochorou, nem caiu de joelhos e implorouperdo.

    O rei Gaius adorava quando aspessoas lhe imploravam misericrdia.Raramente adiantava alguma coisa, masele apreciava mesmo assim.

    Esse orgulho ser sua runa,princesa.

    Magnus o rei disse , o queacha que devemos fazer agora que essainformao foi revelada? Parece quefirmei um compromisso entre voc e

  • uma prostituta.Magnus no conseguiu conter o riso.

    Cleo olhou feio para ele, um olharafiado como vidro quebrado, mas suainteno no fora rir dela.

    Uma prostituta? ele repetiu.Bem, seu pai havia especificamentepedido sua opinio, o que de fato eraalgo raro. Por que desperdiar aoportunidade? A garota admite terpassado uma noite com lorde Aron, umrapaz com quem pretendia se casar.Talvez desde ento tenham se dadoconta de que agiram impulsivamente aoceder a suas paixes. Sinceramente,no vejo isso como um crime assimcomo voc. Caso no saiba, tambm no

  • mantive minha castidade.Falar to francamente poderia ter

    vrios resultados diferentes negativos ou positivos. Magnus ignorouo frio na barriga e manteve a expressomais neutra possvel enquanto esperavapara descobrir o que aconteceria.

    O rei recostou, olhando friamentepara ele.

    E quanto confisso dela de quementiu para mim?

    Se eu estivesse na posio dela,teria feito a mesma coisa, numa tentativade recuperar minha reputao.

    Acredita que devo perdo-la poressa leviandade?

    Isso, claro, fica a seu critrio. De canto de olho, ele podia ver Cleo o

  • encarando, como se estivesse surpresapor ele sair em sua defesa.

    No era uma defesa. Era umaexcelente chance de testar os limites dapacincia do rei com seu filho eherdeiro, agora que havia chegado aosdezoito anos. Magnus agora era umhomem, ento no podia mais agir comoum menino e se acovardar diante dapossvel fria de seu pai.

    No o rei disse. Quero quevoc me diga. Diga o que acha que devofazer, Magnus. Estou curioso para saber.

    Havia cautela no tom de voz do rei,como o chocalho de uma cobramomentos antes de dar o bote.

    Magnus ignorou.

  • Durante o anncio inesperado noterrao, ele se sentiu impulsivo, sem sepreocupar com as consequncias.Naquela hora, Magnus lanou um olharestupefato na direo do pai e recebeuum olhar duro em resposta. Um olharque deixava claro que se ele discutisseaquela deciso, ficaria muito, muitoarrependido.

    Magnus nunca subestimaria o pai. Acicatriz que marcava seu rosto era umlembrete constante do que haviaacontecido quando o contrariou. O reino via problema em machucar aquelesque mais alegava amar mesmo quefossem meninos de sete anos de idade.

    Seu pai insistia em fazer joguinhos,

  • mas Magnus no era uma pea dexadrez, era o futuro rei de Limeros eagora de toda a Mtica. Ele tambmpodia entrar no jogo se houvesse chancede vitria.

    Acho que deve perdoar a princesadesta vez. E se desculpar com lordeAron por assust-lo. O pobre rapazparece muito perturbado.

    O trmulo lorde Aron estava tocoberto de suor que parecia ter sadopara nadar no lago.

    O rei ficou olhando para Magnus,incrdulo, por vrios longos e pesadosminutos. Depois comeou a rir, um somdenso que vinha do fundo da garganta.

    Meu filho quer que eu perdoe,esquea e pea desculpas ele disse a

  • ltima palavra como se no soubesseseu significado. Provavelmente nosabia. O que acha, lorde Aron? Devome desculpar a voc?

    Aron continuava ajoelhado no chocomo se no tivesse energia para selevantar sem ajuda. Magnus notou umaregio mida na virilha da cala, ondeele havia se molhado.

    No no, claro que no, vossamajestade. Aron conseguiu usar alngua que por pouco no perdera. Sou eu que tenho que me desculpar portentar dissuadi-lo de seus planos. claro que vossa majestade tem razo emtodas as coisas.

    isso que o meu pai gosta de ouvir,

  • Magnus pensou. Minha deciso disse o rei.

    Sim, minha deciso era unir meu filho ea jovem Cleiona. Mas isso foi antes desaber a verdade sobre ela. Magnus,diga-me, o que deve acontecer agora?Quer manchar sua honracomprometendo-se com um garotaassim?

    Ah, agora ele havia chegado inevitvel bifurcao na estrada. Muitoapropriado, j que estradas andavam topresentes na mente de seu paiultimamente.

    Uma palavra dele podia romperaquele noivado absurdo e livr-lo dequalquer compromisso com a princesa,que nem tentava esconder seu dio

  • infinito por ele. Refletido nos olhos delaestava o momento brutal que haviamudado Magnus para sempre.

    No tanto por Theon Ranus ter sido aprimeira pessoa que Magnus matou. Ojovem guarda tinha que morrer, porqueteria matado Magnus sem hesitar paradefender a princesa que amava. Era ofato de Magnus ter assassinado o rapazpelas costas que o assombraria parasempre. Havia sido o ato de umcovarde, no de um prncipe.

    E ento, meu filho? o reiincitou. Quer romper esse noivado?A deciso sua.

    At ento, seu pai considerava Cleoum smbolo de sua nova e frgil posse

  • de Auranos. Apesar de sua reputaoconhecida de rei violento que distribuapunies sem misericrdia, o rei Gaiusdesejava ser respeitado e admirado porseus novos sditos, no temido, e osestava bajulando com belos discursos epromessas grandiosas de um futurobrilhante. Tais cidados seriam muitomais fceis de controlar principalmente com o exrcito limerianoagora disperso pelos trs reinos , e orei acreditava que isso reprimiriaqualquer anarquia, alm de algunspoucos e escassos, pormproblemticos, rebeldes.

    Apesar do que havia sido reveladosobre a princesa, Magnus acreditava queCleo continuaria sendo um trunfo

  • valioso durante aquele perodo delicadode transio. Um pouco de poderdourado para iluminar o caminho escuro frente.

    Poder importava para seu pai. Etambm importava para Magnus.

    Qualquer poder que ele pudesse obterpara si no era algo a ser descartado demaneira impensada. E embora eledesejasse voltar para Limeros torpido quanto um navio pudesse lev-lo,sabia que era impossvel. Seu pai queriaficar naquele palcio dourado.

    Enquanto estivesse ali, Magnusprecisaria fazer escolhas que lheservissem no presente e no futuro.

    uma deciso difcil, pai

  • Magnus finalmente respondeu. Aprincesa Cleiona certamente umagarota complicada. Mais do que elejamais havia imaginado. Talvez ele nofosse o nico que sentisse necessidadede usar mscaras todos os dias. Elaadmitiu ter sacrificado sua castidadecom esse rapaz. Teve algum outro,princesa?

    O rosto de Cleo corou, mas seu olharbrutal dava a entender que era mais porfria do que constrangimento. Aindaassim, ele achava que era uma perguntavlida. Ela havia declarado que amava oguarda morto uma declarao quenunca fez a respeito de lorde Aron.Quantos haviam aquecido a cama daprincesa auraniana?

  • No houve mais ningum. Cadapalavra era um rosnado. E graas aoolhar firme e afiado em seus olhos azuis,ele acreditou.

    Ele no falou por um instante,deixando os segundos se tornaremlongos e desconfortveis.

    Assim sendo, no vejo nenhumarazo lgica para o noivado serrompido.

    Voc a aceita? o rei perguntou. Sim. Mas espero que no haja

    mais nenhuma surpresa no que dizrespeito a minha futura esposa.

    Cleo ficou boquiaberta, em choque.Talvez ela no tivesse se dado conta deque aquela unio desagradvel dizia

  • respeito apenas ao poder de Magnus enada mais.

    A menos que precise de mim paramais alguma coisa, pai Magnus dissecom firmeza , gostaria de visitar oleito de minha irm.

    Sim, claro. O rei observouMagnus com olhos semicerrados,inquisidores, tambm parecendosurpreso pelo filho no ter aproveitado aoportunidade de acabar com oinesperado noivado. Magnus se virou esaiu rapidamente da sala do trono,esperando que no tivesse cometido umerro muito grave.

    A criada deu um salto quando Magnus

  • entrou pelas portas de madeira dosaposentos de Lucia. Ela olhou para ocho e ficou passando o dedonervosamente pelos longos cabelosruivos.

    Perdo, prncipe Magnus. Osenhor me assustou.

    Ignorando-a, ele entrou no quarto,com a ateno focada inteiramente nagarota na cama com dossel. Todiferentes de sua residncia mais austeraem Limeros, aqueles cmodos tinhampiso de mrmore e grossos tapetes depele. Tapearias coloridas retratandobelos prados e animais fantsticos um parecia ser o cruzamento de umcoelho com um leo adornavam as

  • paredes. O sol brilhante chegava emraios suaves pelas portas de vidro quedavam para o terrao. As lareiras noestavam constantemente acesas paraimpedir que o frio entrasse no palcio,pois em Auranos o clima era quente etemperado comparado ao gelo e ao friode Limeros. Os lenis eram feitos deseda clara e luxuosa, o que s tornava oscabelos pretos de Lucia muito maisescuros, e seus lbios, muito maisvermelhos.

    A beleza de sua irm sempre opegava de surpresa.

    Sua irm. Era como ele sempre viraLucia. Apenas recentemente haviadescoberto que ela era adotada tinhasido roubada de seu bero em Paelsia e

  • levada para o castelo de seu pai para sercriada como a princesa limeriana. Tudopor causa de uma profecia. Umaprofecia que dizia que Lucia se tornariauma feiticeira capaz de utilizar as quatropartes dos elementia: magia do ar, dofogo, da gua e da terra.

    A confuso de descobrir que ela noera sua irm de sangue, o alvio por seudesejo anormal por ela no ser umpecado realmente sombrio, e o olhar dedesgosto dela quando ele no conseguiuconter sua necessidade de beij-la tudo voltou tona naquele momento.

    A esperana radiante havia sidomarcada para sempre pela dor cruel.

    Lucia o amava, mas era o amor de

  • uma irm pelo irmo mais velho sisso. Mas no era suficiente. Nuncaseria suficiente.

    E agora, o pensamento de que elahavia se sacrificado para ajudar o pai epoderia nunca mais acordar

    Ela tinha que acordar.Seu olhar se desviou para a criada, a

    garota auraniana que a princesa Cleionahavia insistido que seria perfeita para atarefa. Suas curvas suaves mostravamque no havia passado por muitasdificuldades, apesar de agora usar ovestido simples de uma criada.

    Como se chama? ele perguntou. Mira Cassian, vossa graa.Ele apertou os olhos. Seu irmo Nicolo Cassian?

  • Sim, vossa graa. Em Paelsia, ele atirou uma pedra

    na minha cabea e depois me deixouinconsciente com o cabo de uma espada.Ele podia ter me matado.

    Um tremor passou pelo corpo dela. Estou muito feliz por meu irmo

    no ter lhe causado nenhum danopermanente, vossa graa. Ela piscou,olhando nos olhos dele. Eu no ovejo h semanas. Ele ele ainda estvivo?

    Certamente merecia morrer peloque fez, no acha?

    Ele no havia compartilhado aquelahistria com muita gente. NicoloCassian havia atacado Magnus para

  • faz-lo soltar Cleo depois que mataraTheon. Era dever de Magnus capturar aprincesa e lev-la a Limeros para que orei pudesse us-la como moeda debarganha contra seu pai. Ele haviafalhado e acordado sozinho, cercado porcadveres e pela amarga derrota.

    Nic agora trabalhava nos estbulos,enterrado at o joelho na sujeira doscavalos, sem permisso para entrar nocastelo. O garoto deveria sereternamente grato por Magnus no terexigido que pagasse com a vida.

    Ele virou as costas para Mira e seconcentrou em Lucia. No ouviu a portase abrir, mas no demorou muito at asombra de seu pai recair sobre ele.

    Ficou bravo comigo pelo anncio

  • que fiz hoje o rei disse. No era umapergunta.

    Magnus rangeu os dentes e ponderou aresposta antes de falar.

    Fiquei surpreso. A garota meodeia, e eu s sinto apatia por ela.

    No h necessidade de que oamor, ou mesmo a afeio,desempenhem qualquer papel em umcasamento. uma unio apenas pornecessidade, por estratgia poltica.

    Sei disso. Vamos encontrar uma amante que

    lhe proporcione todo o prazer que faltarem seu casamento. Uma cortes, talvez.

    Talvez Magnus consentiu. Ou talvez prefira uma criadinha

  • bonita para satisfazer suas necessidades. O rei olhou na direo de Mira, queastutamente permaneceu nos fundos doquarto, com os ouvidos fora de alcance. Falando em criadinhas bonitas,lembra-se daquela criada da cozinha quenos causou algumas dificuldades emcasa? Aquela com tendncia paraespionar. Qual era o nome dela? Amia?

    Amia havia sido um flerte casual deMagnus, assim como um par de ouvidosatentos para as fofocas do palcio. Elateria feito de tudo pelo prncipe.Tamanha lealdade lhe rendera tortura echicotadas, mas ainda assim ela norevelou sua ligao com ele. Mas porque seu pai se daria o trabalho delembrar o nome dela?

  • Acho que lembro. O que tem ela? Ela fugiu do castelo. Deve ter

    achado que eu no notaria, mas notei.Ela tinha fugido porque Magnus a

    havia mandado para longe, com moedassuficientes para iniciar uma nova vidaem outro lugar.

    mesmo?O rei se abaixou para tirar os cabelos

    escuros do rosto de Lucia. Mandei uns homens atrs dela.

    Recebi a notcia de que a encontraramcom facilidade, com um saco de ouroroubado de ns. Claro que a executaramimediatamente. Ele voltou suaateno para Magnus com um pequenosorriso no rosto. Achei que gostaria

  • de saber.Magnus ignorou a pontada de dor

    repentina em seu peito. Mediu aspalavras antes de dizer:

    Foi um fim merecido para umaladra.

    Fico feliz por estarmos de acordo.Amia havia sido ingnua e tola

    uma menina que no tinha o coraoduro o bastante para sobreviver aspereza do palcio limeriano. Mas elano merecia morrer. Magnus esperou osofrimento surgir, mas sentiu apenas umafrieza escorregando pela pele. Partedele esperava por aquilo desde que acarruagem de Amia partira do castelo,mas ele tinha esperanas. Devia terimaginado. Seu pai nunca permitiria que

  • algum em posse de segredoscomprometedores sobre ele fugisse.

    O destino da garota havia sido seladono momento em que seu caminho cruzoucom o dos Damora. Aquilo no passavade uma confirmao. Ainda assim,Magnus ficou irritado por seu pai dizeraquilo to casualmente, quando a mortede Amia era tudo menos casual. O rei oestava testando, procurando fraquezasem seu herdeiro.

    O rei o testava o tempo todo.Eles ficaram em silncio por um

    instante; Lucia era o ponto focal entre osdois.

    Preciso que ela acorde o reidisse, com o maxilar tenso.

  • Ela j no fez demais por voc? A magia dela a chave para

    encontrar a Ttrade. E quem disse isso? Sua

    impacincia crescente com as decisesque o pai havia tomado naquele diatornou suas palavras mais cortantes doque o normal. Uma bruxa qualquerque precisava de prata? Ou talvez umfalco tenha pousado em seu ombro esussurrado

    A fora da mo do pai contra seurosto marcado pela cicatriz o pegoutotalmente de surpresa. Ele colocou apalma da mo sobre a bochecha e ficouolhando para o rei.

    Nunca zombe de mim, Magnus

  • o rei esbravejou. E nunca mais mefaa parecer um tolo na frente dos outroscomo fez hoje. Est me ouvindo?

    Estou ele respondeuentredentes.

    O pai no batia nele havia algumtempo, mas fora uma prtica comum emsua juventude. Como a naja, emblemaoficial de Limeros, o rei Gaius atacavacom violncia e malcia quando irritadoou desafiado.

    Magnus lutou contra o mpeto de sairdaquele quarto pois sabia que isso ofaria parecer fraco.

    Recebi essa informao de minhamais nova conselheira real o reidisse finalmente. Ele foi para o ladooposto da cama de Lucia, com a ateno

  • novamente fixa em seu rosto pacfico. Quem ? No da sua conta. Deixe-me adivinhar. Essa

    conselheira misteriosa tambm sugeriuque a construo da estrada passassepor dentro das Montanhas Proibidas?

    Isso rendeu a Magnus um olhar queretomava certo respeito. Ele havia feitoa pergunta certa.

    Sim, ela sugeriu.Ento a nova conselheira de seu pai

    era uma mulher. No foi uma surpresamuito grande para Magnus. A ltimaconselheira de confiana do rei haviasido sua amante de longa data umabruxa bela e traioeira que atendia pelo

  • nome de Sabina. Realmente acredita que a Ttrade

    real? Acredito.A Ttrade era uma lenda Magnus

    nunca achou que fosse mais do que isso.Quatro cristais contendo a essncia doselementia, perdidos milhares de anosatrs. Possu-los conferiria ao detentorpoder absoluto o poder de um deus.

    Magnus estava tentado a acreditar queseu pai estava louco, mas no havianenhuma loucura em seu olhar firme.Estava claro e focado, se no obcecado.O rei realmente acreditava na Ttrade ena existncia dos vigilantes. At poucotempo antes, Magnus no compartilhavadessa crena. Mas a prova da magia,

  • dos elementia, estava deitada naquelacama. Ele havia visto com os prpriosolhos. E se a profecia sobre umafeiticeira podia ser real, a Ttradetambm.

    Vou deix-lo tomando conta de suairm. Informe-me imediatamente se elaacordar. O rei ento saiu dosaposentos de Lucia, deixando Magnussozinho com a princesa adormecida eseus prprios pensamentosatormentados.

    A magia dela a chave.Ele ficou em silncio por um tempo,

    com o olhar focado no terrao e naradiante tarde ensolarada. Oliveiras emvasos balanavam graciosamente na

  • brisa quente. Ele podia ouvir o gorjeardos pssaros e sentir o cheiro doce dasflores.

    Magnus odiava aquele lugar.Preferia mil vezes a neve e o gelo, as

    caractersticas mais conhecidas deLimeros. Ele gostava do frio. Erasimples. Era perfeito e puro.

    Mas era naquela terra dourada queseu pai acreditava ser possvel iniciar abusca pela essncia da magia elementar,e no em Limeros. E se aquela belagarota que dormia diante de seus olhosera a chave para encontr-la, Magnusno podia ignorar a informao.

    Com a Ttrade em mos, ele e Luciaseriam verdadeiramente iguais, em todosos sentidos. Ele no ousava ter mais

  • esperanas de que talvez a posse daTtrade fizesse Lucia olhar para ele deoutra forma. Em vez disso, refletiu quese conseguisse encontrar aquele tesouroperdido, provaria seu valor ao rei econquistaria o respeito de seu pai deuma vez por todas.

    Acorde, Lucia ele pediu. Encontraremos a Ttrade juntos, eu evoc.

    Seu olhar recaiu, alarmado, em Mira,que havia se aproximado para encher umclice de gua. Ela olhou para ele epareceu chocada com o olhar frio querecebeu.

    Vossa alteza? Tenha muito cuidado ele

  • alertou em voz baixa. Orelhas muitovidas por escutar segredos correm orisco de serem cortadas.

    Com o rosto muito vermelho, ela sevirou e voltou rpido para o outro ladodo quarto. Uma criada no tinha voz emseu prprio destino. Mas o filho de umrei bem, era uma questo totalmentediferente.

    O rei queria a Ttrade para obter seupoder eterno e absoluto. Esse podia sero teste definitivo para seu filho eherdeiro.

    Se realmente existisse, Magnusdecidiu, agarrando os cobertoresaveludados de Lucia, seria ele quem aencontraria.

  • 4_________________________________________

    LUCIA_________________________________________

    O SANTURIO

  • Lucia se lembrava da exploso dosgritos, do choro. Os corposensanguentados e dilacerados ao seuredor. Olhos sem vida em cabeasdeitadas sobre poas de sangue. Depoisa escurido durou tanto tempo que elaachou que estava morta e no tinha idopara o tranquilo alm, mas para as terrassombrias, lugar para onde iam aspessoas ms quando morriam umlugar de tormento infinito e desespero.

    s vezes ela achava que tinhaacordado, mas em seguida eraempurrada de volta para as profundezasinfinitas do sono. Sua mente estavaenevoada e confusa.

    Ela havia rezado desesperadamente

  • para a deusa Valoria perdo-la parasalv-la mas suas preces deusalimeriana no haviam sido atendidas.

    Mas ento, finalmente, a alvorada.Raios de sol aqueceram sua pele com ocalor de um dia de vero. E muito, muitodevagar, ela abriu os olhos, piscandopara clarear a viso. As cores eram tovivas e radiantes que ela precisouproteger os olhos at se acostumar comaquela intensidade inesperada.

    Lucia percebeu que usava seda brancaesvoaante, um lindo vestido combordado dourado no corpete, o maisbelo que a melhor das costureiraspoderia criar.

    Um prado exuberante estendia-se porquilmetros sua volta. Acima, um

  • magnfico cu azul. O perfume de floressilvestres enchia o ar quente. Havia umaglomerado de rvores perfumadas,carregadas de frutas e flores suadireita. Ela sentiu a grama e o musgosuaves sob a palma das mos ao selevantar para absorver o entorno, cadavez mais chocada.

    primeira vista, o prado pareciaigual a qualquer outro, mas no era.Vrias rvores que pareciam salgueiroscintilavam como se fossem feitas decristais, com galhos que tocavam o chocomo delicadas penas de vidro. Outrasrvores pareciam dar frutos douradosem galhos adornados com folhas quelembravam joias. A grama no era

  • apenas verde-esmeralda, mas salpicadade prateado e dourado, como se cadalmina tivesse sido mergulhada emmetais preciosos.

    Ao longe, esquerda, havia colinasverdejantes atrs das quais erapossvel ver uma cidade que pareciatotalmente feita de cristal e luz. Maisperto do prado havia duas belas rodasesculpidas em pedra, afundadas na terra,uma de frente para a outra, cada uma daaltura de trs homens adultos, brilhando luz do dia como se fossem recobertasde diamantes.

    Era tudo to estranho e belo que, porum longo momento, ela ficou sem flegoe hipnotizada.

    Onde estou? ela sussurrou.

  • Bem-vinda ao Santurio, princesa.Sua cabea se virou rapidamente na

    direo das rvores, e ela viu um jovemse aproximando. Ela se esforou para selevantar o mais rpido possvel,afastando-se alguns passos dele.

    No se aproxime! Ele a haviaassustado, e o corao dela batia comouma criatura selvagem aprisionada nopeito. No chegue mais perto.

    No vou lhe fazer mal.Por que acreditaria nele? Ela cerrou o

    punho e invocou a magia do fogo. Suamo irrompeu em chamas.

    Eu no conheo voc. Pare amesmo ou juro que vou me defender!

    Ele fez como ela pediu e se manteve a

  • cinco passos de distncia. Ele inclinou acabea e observou a mo dela,fascinado.

    A magia do fogo a parte maisimprevisvel dos elementia. Deve tercautela ao utiliz-la.

    E voc deveria ter cautela ao seaproximar de algum sem avisar, se noquiser ser queimado.

    Ela tentou parecer calma, mas haviasido pega de surpresa. Agora, tudo o quepodia fazer era olhar fixamente para ogaroto mais bonito que j tinha visto navida. Alto e esguio, pele dourada,cabelos sedosos cor de bronze, olhoscor de prata escura. Ele usava umacamisa branca e larga, calas brancas eestava descalo sobre a grama macia e

  • cintilante. Eu vi o que voc fez com a bruxa

    quando seus poderes despertaramtotalmente ele disse, como seestivessem tendo uma conversa trivial. A amante do rei tentou for-la a usarseus elementia na presena dela. Voc areduziu a cinzas.

    Ela sentiu uma onda de enjoo com ameno da morte terrvel de Sabina. Ocheiro da carne queimando ainda aassombrava.

    Como voc pode ter testemunhadouma coisa dessas?

    Ficaria surpresa com o que sei aseu respeito, princesa. A voz dele eracomo ouro lquido, fazendo um arrepio

  • percorrer o corpo dela. Meu nome Ioannes. Sou um daqueles que os mortaisconhecem como vigilantes. Eu a vigiodesde que era criana.

    Vigilante. A palavra parou emsua garganta, e ela olhou-o nos olhos. Voc um vigilante?

    Sou.Ela sacudiu a cabea. No acredito nessas histrias. No so histrias. Ele franziu a

    testa. Bem, so histrias, mas issono significa que no sejam verdadeiras.Acredite em mim, princesa, eu sou bemreal. To real quanto voc.

    Impossvel. Ele era irreal demais,tanto quanto aquele prado. Ela nuncatinha visto nada parecido com ele antes.

  • Ela manteve o punho cerrado e emchamas.

    E este lugar? Voc disse que oSanturio?

    Ele deu uma olhada ao redor antes defixar os olhos nela novamente.

    Isto apenas uma cpia do meular. Estou visitando voc em seussonhos. Eu precisava v-la, precisavame apresentar e dizer que posso ajud-la. Quis fazer isso por muito tempo, efinalmente estou muito feliz em conhec-la pessoalmente.

    Ento ele sorriu um sorriso tosincero, aberto e belo , e o corao deLucia deu um salto.

    No. Ela no podia se distrair com

  • essas coisas. Sua cabea estavainundada com o que ele havia dito atento, e sua mera presena adesequilibrava.

    Em Limeros, apenas livros quecontinham fatos e verdades slidas erampermitidos pelo rei no palcio paraeducar seus filhos. Mas Lucia havianascido com uma sede de conhecimentosde todos os tipos, que iam alm do quelhe era permitido. Conseguira pr asmos em livros proibidos de histriasinfantis, atravs dos quais descobriu aslendas dos vigilantes e do Santurio.Havia lido histrias sobre a capacidadeque eles tinham de entrar nos sonhos dosmortais. Mas eram apenas isso histrias.

  • Aquilo no podia ser real. Podia? Se me vigia h tanto tempo quanto

    diz Parecia totalmente impossvelque fosse verdade. Ele no pareciamuito mais velho do que ela. Entopor que s se apresentou agora?

    Antes no era o momento certo. Seus lbios se contorceram. Mas,acredite, no sou o mais paciente entremeus semelhantes. Foi difcil esperar,mas estou me apresentando agora. Euposso ajud-la, princesa. E voc podeme ajudar.

    Ele estava falando bobagem. Serealmente era um vigilante, um serimortal que vivia em um mundodiferente daquele dos mortais, por que

  • precisaria da ajuda de uma garota dedezesseis anos?

    Mas ento ela se deu conta de que noera uma garota de dezesseis anosqualquer, como havia ficado claro aodeixar o punho em chamas com o poderdo pensamento.

    No acredito em nada que estdizendo. Ela colocou o mximo deconvico que conseguiu em suaspalavras, mesmo sentindo um desejorepentino de descobrir tudo o quepudesse sobre Ioannes. Vigilantesno passam de lendas, e isto isto nopassa de um sonho bobo. Estousonhando com voc, s isso. Voc nopassa de um produto da minhaimaginao.

  • Ela nunca tinha se dado conta de quesua imaginao era to incrvel.

    Ioannes cruzou os braos, analisando-a com interesse e uma ponta defrustrao, mas no tentou chegar maisperto. Olhou novamente para o punhodela, que continuava queimando comouma tocha. No causava nenhumdesconforto nela, apenas uma levesensao de calor.

    Pensei que seria mais fcil.Ela riu daquilo, e o som saiu spero

    de sua garganta. No tem nada de fcil nisso,

    Ioannes. Quero acordar. Quero sairdeste sonho.

    Mas como um sonho podia parecer

  • to real? Ela conseguia sentir o cheirodas flores, sentia o cho sob seus psdescalos, a porosidade mida domusgo, as ccegas provocadas pelagrama. Nenhum sonho jamais fora toreal. E o que era aquela cidade decristal sobre a colina? No havia nadacomo aquilo no mundo mortal nemcomo o prado estranho e mgico. Elateria ouvido falar de algo tosurpreendente. Mesmo nos livros quedescreviam as lendas dos vigilantes, elanunca tinha visto uma ilustrao oudescrio daquela cidade.

    Ele acompanhou o olhar dela. l onde moramos.Lucia voltou a encar-lo e respirou

    fundo.

  • Ento por que no estou l? Porque estou nesse prado?

    Ioannes percorreu a rea rapidamentecom os olhos.

    Foi aqui que eu peguei no sonopara poder encontr-la em meus sonhos.Aqui reservado e silencioso. Poucossabem que gosto de vir aqui.

    Lucia comeou a andar de um ladopara o outro, em linhas curtas e rpidas,as saias brancas arrastando no cho, tolongas que quase a faziam tropear. Elaestava totalmente atenta a Ioannes, meioesperando que ele avanasse e aatacasse a qualquer momento. Que elearrancasse o lindo rosto e revelasse algoterrvel e feio por baixo. Talvez ele

  • fosse um demnio que a estivessemantendo adormecida e aprisionada empesadelos ela j havia lido sobrealgo assim, embora tambm tivesse sidoem um livro de histrias infantis, quedevorou rapidamente antes de esconderembaixo da cama para ningum ver.

    Certo. Se estava presa ali, precisavaconversar. Precisava de respostas paraas perguntas que borbulhavam em suagarganta sobre o estranho eencantador Ioannes, sobre tudo.

    Quantos anos voc tem?Ele ergueu as sobrancelhas como se

    no esperasse essa pergunta. Sou velho. Voc no parece velho. Nenhum de ns parece. A

  • expresso de divertimento no rosto deletinha comeado a irrit-la. No havianada de divertido. Pode apagar ofogo, princesa. No pretendo lhe fazermal hoje, posso garantir.

    Sua mo continuava a queimar.Concentrando-se, fez as chamasaumentarem e brilharem mais. Ela noaceitaria ordens de ningum,principalmente de um garoto imaginriode seus sonhos.

    Aquilo s fez o sorriso de Ioannesaumentar.

    Muito bem, faa como quiser.Talvez se vir por si mesma o que eu sou,ainda que nos confins deste sonho,talvez comece a acreditar. Este apenas

  • nosso primeiro encontro. Haver outros.Um tremor espontneo de antecipao

    percorreu seu corpo. No se eu puder fazer algo a

    respeito. Logo vou acordar, e voc terdesaparecido.

    Talvez. Mas mortais precisamdormir todos os dias, no precisam?No vai conseguir escapar de mim tofcil, princesa.

    Lucia olhou feio para ele, mas teve deadmitir que era um bom argumento.

    Observe. Ele deu um passopara trs e ergueu as mos ao lado docorpo. Um redemoinho o envolveu,borrando sua imagem por um instante, oar se transformando, brilhando, girando.

    No momento seguinte, seus braos

  • eram asas, sua pele estava coberta depenas douradas que cintilavam sob a luzdo sol. Com um bater de asas, elelevantou voo.

    Era um falco, que planava no alto dontido cu azul. Impressionada, Luciaprotegeu os olhos da luz brilhante,incapaz de desviar o olhar e notouque seu fogo havia se extinguido semque se desse conta.

    Finalmente, ele pousou no galho deuma rvore prxima, carregada demas douradas. Ao mesmo tempohesitante e fascinada, ela se aproximou eficou olhando para ele, surpresa porseus olhos terem mantido o mesmo tomprateado-escuro.

  • Isso no prova nada ela disseao falco, mas seu corao batia forte erpido. Qualquer coisa podeacontecer em um sonho. Isso no o tornareal.

    Ele soltou as garras afiadas do galho,mas, antes de tocar o cho, transformou-se em homem de novo. Ele olhou para simesmo.

    Normalmente, quando mudamos deforma, no permanecemos vestidos.Penas se transformam em pele, pele setransforma em penas. a nicadiferena que notaria se estivesseacordada.

    O calor tomou conta de seu rostodiante da mera sugesto de que ele

  • estaria completamente nu se elaestivesse acordada.

    Ento suponho que devo ser gratapor no passar de um sonho.

    Voc sabe que isso real porquesabe quem voc , o que voc . Seudestino est ligado ao Santurio,princesa. Est ligado aos vigilantes, Ttrade. Ele ousou se aproximar,com o olhar mais intenso. Seu destinoest ligado a mim, e sempre esteve.

    A proximidade dele a perturbou e,por um momento, tornou-se impossvelse concentrar ou falar.

    Ela percebeu que havia substncia everdade no que ele dizia. O corpo delapodia estar inconsciente em uma cama,mas sua mente, seu esprito estavam

  • ali. Voc me vigiou por causa da

    profecia ela disse.Ele franziu a testa enquanto olhava

    atentamente para ela, como sememorizasse seus traos.

    Sim. Voc a feiticeira que euespero h um milnio.

    Que voc espera?Ioannes assentiu. Muitos no acreditavam, mas eu,

    sim. E esperei at voc descobrir suamagia para me aproximar. Para gui-la.Para ajud-la. Ele ficou em silncioat que ela, novamente, olhou para afrente e encontrou diretamente seusolhos prateados. Sua magia

  • poderosa demais para voc nessemomento, e est ficando mais forte acada dia. Voc nem se deu conta dissoainda.

    Ah, pode acreditar ela disse emvoz baixa. Estou bem ciente doquanto poderosa.

    Seu pai, o rei Gaius, obrigou-a a usarsua recm-descoberta magia pararomper a proteo da entrada do casteloauraniano, aps uma batalha sangrentado lado de fora das muralhas da Cidadede Ouro. O feitio de proteo se elevoucomo um drago feroz diante dela, e acombinao dele com seus prprioselementia havia causado a exploso quematou tanta gente.

    Algum dia vou acordar? ela

  • sussurrou. Ou vou morrer dormindocomo punio pelo que fiz?

    Voc no vai morrer dormindo.Disso eu tenho certeza.

    Ela ficou aliviada com essaspalavras.

    Como voc sabe? Porque precisamos de voc. Sua

    magia far a diferena para ns, para oSanturio.

    Como?Ioannes desviou o olhar e se virou

    para o prado, e sua expresso ficou maistensa.

    A magia elementar que existe aqui,que foi aprisionada no meu mundo comoareia em uma ampulheta, tem escapado

  • desde que a Ttrade foi roubada de nse perdida. Desde que a ltima feiticeiradeixou de existir. A feiticeira que tinhaexatamente a mesma magia que voc.Seu nome era Eva, e ela tambm era umavigilante imortal.

    Eva meu segundo nome Luciadisse, surpresa.

    Sim, . E foi ela que lanou aprofecia como suas ltimas palavrasantes de morrer, dizendo que a prximafeiticeira nasceria em mil anos. Umamortal que deteria o poder doselementia como ela. Voc. O rei Gaiussabia da profecia o tempo todo. Elesabia no que voc se transformaria. Foipor isso que a criou como sua prpriafilha.

  • A cabea de Lucia se esforou paraacompanhar o que ele dizia.

    O que aconteceu com Eva? Comouma vigilante imortal pode morrer?

    Ela cometeu um erro que lhecustou a vida.

    Qual?Um sorriso triste apareceu no canto

    da boca dele. Ela se apaixonou pelo rapaz

    errado; um caador mortal que a desvioudo caminho e a afastou daqueles que aprotegiam. Ele a destruiu.

    Lucia percebeu que havia seaproximado ainda mais de Ioannes semse dar conta estava to perto que,quando ele se virou para ela novamente,

  • sua manga roou no brao dela. Apesarde estar em um sonho, ela podia jurarque sentiu o calor da pele dele na sua.

    Ela deu um passo trmulo para trs.Lucia sempre absorveu livros e

    informaes; sua mente era vida pormais do que os tutores queriam ensinar.E ningum parecia saber muito sobre oselementia, uma vez que a magia eraconsiderada uma lenda pela maioria,exceto por algumas pessoas acusadas debruxaria. At mesmo Sabina, que seautoproclamava bruxa, no haviamostrado nenhum sinal real de magia aLucia pelo menos no o suficientepara se defender quando Lucia protegeuMagnus e a si mesma daquela mulherdiablica.

  • Voc no precisava mat-la , umavozinha disse dentro dela. A mesma vozque a torturava desde o ocorrido. Alembrana do corpo sem vida ecarbonizado de Sabina no cho invadiusua mente mais uma vez.

    Conte mais, Ioannes Luciasussurrou. Conte tudo.

    Ele passou a mo pelos cabelos corde bronze, com a expresso cada vezmais incerta.

    Faz muito tempo que Eva viveu.Lembranas sobre ela foram ficandoincertas, at mesmo para mim.

    Mas faz mil anos que ela fez daprofecia suas ltimas palavras. Vocno disse isso?

  • Sim. A mesma poca em que aTtrade se perdeu de ns.

    Ela respirou fundo. Voc tem lembranas incertas de

    uma feiticeira que viveu h mil anos.Quantos anos voc tem?

    Eu j disse, princesa. Sou velho. Certo, mas exatamente quo

    velho?Ele hesitou, mas apenas por um

    instante. Dois mil anos.Ela ficou olhando para ele em choque. Voc no velho. Voc uma

    relquia da antiguidade.Ele ergueu uma sobrancelha,

    formando um sorriso nos lbios.

  • E voc tem dezesseis anos mortais.Apenas uma criana.

    No sou criana! , sim.Lucia resmungou de frustrao.

    Aquela discusso no a estava levando alugar nenhum, assim como as tentativasde entender como um vigilante de doismil anos podia ter uma aparncia tojovem e atraente mais do quequalquer outro garoto que j haviaconhecido. Ela precisava se concentrarem obter mais conhecimento, maisinformaes que pudessem ajud-la. Elaapontou para a cidade.

    Quero ir at l. Quero falar comalgum, algum que no tenha

  • lembranas to incertas sobre o queaconteceu exatamente com a ltimafeiticeira, quem era ela, o que fezqualquer coisa!

    impossvel, princesa. Isto umsonho e, como eu disse, apenas umacpia do que real. E mesmo que nofosse, mortais no entram no Santurio,assim como vigilantes no saem, amenos que assumam a forma de falco.

    Aquela podia ser uma conversa real,mas ainda assim se passava nos confinsde um sonho. O que ela via diante de sitinha tanto peso na realidade quanto umapintura ou um esboo. Ela pensou naforma de falco de Ioannes e em comoele costumava viajar ao mundo mortalpara espion-la. Era desconcertante

  • pensar que ele a vigiava desde que eraapenas um beb.

    um dom to maravilhoso poderassumir a forma de algo que voa elafinalmente disse.

    Um dom ele disse calmamente,e algo agudo e doloroso em sua vozchegou ao corao dela. Ou umamaldio. Acho que depende totalmentedo ponto de vista.

    Ela franziu a testa, sem saber ao certoo motivo dessa mudana de tom.

    Voc me arrastou para esse sonhoporque diz que pode me ajudar. Como?Ou isso tambm est incerto para voc?

    Ela no pretendia parecer topetulante, mas no pde evitar. Ele no

  • lhe dissera nada de til, apenasfragmentos interessantes de informaoque no tinham utilidade prtica. O rostode Ioannes se virou para a esquerda, eele franziu muito a testa.

    Tem algum aqui.Ela olhou em volta. Eles estavam

    sozinhos. Quem?Finalmente sua expresso relaxou. minha amiga, Phaedra. Ela no

    nos fa