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A linguagem corporal do adolescente gótico Lucilene Maria Ried
Reprodução gratuita autorizada desde que citada a seguinte referência bibliográfica:RIED, Lucilene Maria. A linguagem corporal do adolescente gótico. Cognitivo: Revista Eletrônica de Psicoterapia Cognitiva, junho de 2010. Disponível: < http://cognitivo.cjb.net > Acessado em: [dia/mês/ano].
INTRODUÇÃO
Com este trabalho se pretende investigar e compreender a linguagem corporal do
adolescente gótico, e para tanto, buscou-se contextualizar a origem do termo gótico e
seu significado. De modo que o termo é focalizado como linguagem corporal
manifestada pelos adolescentes que são adeptos da cultura gótica. E que por sua vez, os
leva a usar na maior parte dos casos, seu próprio corpo como instrumento de
comunicação para expressar sua subjetividade e revelar sua indignação e rebeldia.
A pertinência da temática abordada denota todo um movimento cultural em
torno de uma forma diferente de pensar sobre certos valores ou certa angústia coletiva,
um estado de espírito que demonstra insatisfação com a vida.
Conforme Schmidt (1985), o estilo gótico apresenta uma aparência triste
retratando um mundo de dor, rejeição e tristeza. Criam-se incompatibilidades com
alguns valores instituídos, quando os jovens defendem e tentam implantar novas
tendências éticas, estéticas e comportamentais. Sentem-se inconformados com o
controle exercido pelas instituições sociais, e busca a satisfação de suas necessidades
subvertendo os padrões, o que provoca diversos tipos de confrontos.
De acordo com a visão cognitiva a percepção das pessoas sobre as situações
influenciam suas reações. Quando a experiência infantil é percebida de um modo
negativo, o sujeito tende a, atribuir qualidades negativas á si próprios. Se esses
conceitos negativos tornam-se estruturas organizadas em suas mentes, o indivíduo
processa as informações de forma distorcida e disfuncional, percebendo e focalizando
muito rigidamente o lado negativo, evitando ou falhando no processamento das
informações (Beck, 2007, 1997).
Continuando a autora afirma que a crença central de desvalor conduz o
indivíduo a acreditar que não obterá sucesso em alcançar determinado objetivo ou que
não será merecedor de receber afetos de outras pessoas. A crença central não se refere
1
apenas à pessoa em si. Esse tipo de cognição também se desenvolve no ser humano
como uma forma de extrair sentido do contexto externo e suas relações com outras
pessoas. É uma forma encontrada pelo sujeito de organizar as suas experiências para
que ela se adapte adequadamente a seu ambiente.
Para que se possa entender melhor a “cultura” gótica e a linguagem corporal do adolescente que se identifica com esta, se faz necessário retomar alguns pontos que
fundamentam o período da adolescência (Osório, 1992) compreende a adolescência
como:
A etapa evolutiva peculiar ao ser humano. Nela culmina todo o processo maturativo biopsicossocial do indivíduo. Por isto, não podemos compreender a adolescência estudando separadamente os aspectos biológicos, psicológicos, sociais ou culturais. Eles são indissociáveis. (p.103)
Na visão de Osório (1992) a adolescência deixou de ser compreendida como
uma simples passagem da infância para a idade adulta, com alterações físicas,
aparecimento das características sexuais e mudanças de temperamento, e passou a ser
vista como momento fundamental do desenvolvimento do indivíduo, acentuando a
aquisição da imagem corporal e a estruturação da personalidade. O início da
adolescência não pode ser determinado, pois varia de acordo com o ambiente sócio-
cultural do indivíduo.
Nesse sentido, Ozella (2003) afirma que se deve entender a adolescência como
construída socialmente, esta relacionada direta e inseparável com as especificidades de
cada realidade. Depende das necessidades sociais e econômicas dos grupos sociais. É
simultaneamente produção e produtora do contexto social.
Segundo Blos (1996), a adolescência é marcada por vários conflitos entre a
dependência e independência, sendo um processo influenciado diretamente pelo
ambiente sócio-cultural e que implica a perda da condição de ser criança. E entrar no
mundo dos adultos é um mistério, causa anseios, medo do desconhecido e
conseqüentemente gera ansiedade. A maturação sexual influência inteiramente o campo
psicológico, e pode acarretar algumas dificuldades na vida do adolescente, levando-o a
não saber como agir diante de tais mudanças. Por essa razão, para o jovem surge a
necessidade de adotar muitas defesas para manter a organização mental.
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No período da adolescência no corpo vai acontecendo um processo de
crescimento, nesta fase de vida o indivíduo passa por muitas transformações, tanto na
questão física quanto psíquica. É um momento no qual se vivencia diversas e novas
emoções (Nero, 2003).
Ao explorar a compreensão do adolescente gótico, percebe-se que apresentam
uma tendência dirigida para o misticismo e para o oculto, juntamente com temáticas
consideradas “macabras”, concebidas como desviantes. São facilmente percebidos como
“mórbidos” e trazem em si uma imagem de decadência em torno da autodestruição.
Nesse sentindo Melton (1994) assevera:
Na busca de uma identidade, a fachada social gótica construiu-se associando realidades que além de terem afinidades entre si, e que se amalgamaram de tal forma que hoje constituem-se num todo uno, e com uma coerência e complexidade superior à simples soma das partes. (MELTON, 1994, p.265).
O estilo gótico conforme Pais (1996) apresentam traços marcantes em que
predomina uma elegância sombria inspirada na Europa dos anos 40: saias de lã retas e
justas na altura dos joelhos, sapatos pretos pesados, meia em destaque. Camisa de corte
clássico, brancas, para homens e mulheres que, no entanto, podem ser usadas ao
contrário, com botões nas costas. Casacos, paletós e capas, jaquetas e sobretudos, tudo
em tom escuro e preferencialmente de lã, e não é raro, que elas sejam usadas mesmo em
ambientes fechados e em dias não tão frios. Face pálida, magros com os cabelos
tingidos de preto e joalheria de prata
Pais (1996), afirma acerca dos góticos:
O simbólico de aparência é entre os jovens góticos revelador, de expressões de identidade grupal, sendo as identificações acompanhadas por complexos e sutis processos de diferenciação. O vestuário em particular aparece entre os jovens como detentor de um poder simbólico e instrumento de integração grupal. Mais do que sinais distintivos de classe o movimento gótico verifica-se a afirmação de um modelo de vida muito particular, com modos de pensar, sentir e agir específicos e conseqüentemente com algo de desviante. A dissidência estética é um indicador seguro da vontade de ruptura com o modelo dominante (PAIS, 1996, p.101).
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De acordo com Schmidt (1985), os góticos através das perfurações corporais e
tatuagens manifestam repúdio pelo socialmente instituído. Há nesse movimento uma
ruptura com os valores estereotipados de beleza, transmitindo a idéia de rebeldia,
inconformismo e agressividade em relação às normas de valores vigentes. Eles tentam
ser diferente numa sociedade de iguais, ou seja, uma maneira de combater os
preconceitos estigmatizantes. E os indumentários que usam, os estigmatiza, uma vez
que “chocam” a sociedade.
Para Abramo (1994), esses jovens ao exibir sua imagem diferenciada produzem
uma contraposição àquela do padrão considerado “normal” e evidenciam as suas
construções simbólicas, oferecendo-se a serem lidos e interpretados. A produção dos
“estilos” espetaculares por parte desses jovens envolve a elaboração crítica de questões
relativas à sua condição e ao seu tempo e significa também um esforço de expressão
dessas elaborações no espaço público. Segundo esta autora, é justamente nesse aspecto
que os mesmos chamam a atenção, e que estes adolescentes lidam com questões da sua
própria condição juvenil, relativo ao seu tempo histórico, e que procuram uma maneira
de processar essa vivência da forma mais significativa possível.
Segundo Castilho (2001), a imagem do corpo exerce papel mediador em todas as
coisas, desde a escolha de vestimentas, as preferências estéticas, até a capacidade de
empatizar com as emoções dos outros. Enfim, entre as diferentes maneiras que o sujeito
possui para pensar a respeito de si próprio, nenhuma é tão essencialmente imediata
como a imagem de seu próprio corpo.
Para os góticos os símbolos ostentados (piercing, tatuagens etc.) e as imagens
sobrecarregadas tentam comunicar às questões que os preocupa, a estratégia de choque
busca deflagrar reações e respostas, por parte daqueles com quem se defrontam. A
postura apocalíptica, as imagens demoníacas que o adolescente gótico exibe, não
representam uma patologia mórbida, um desejo de morte ou uma exaltação do horror. É
uma representação crônica espetacular da crença que ele tem da realidade, de modo a
criticá-la e denunciá-la (Abramo, 1994).
O comportamento é a ação do indivíduo que pode ser observado em um contexto
tanto micro quanto macro. O comportamento é influenciado pelas cognições do sujeito,
uma resposta ao modo como o indivíduo a percebe e interpreta os eventos que acontece
em sua vida (White, 2003).
4
A imagem do corpo não é apenas uma construção cognitiva, mas também um
reflexo de desejos, emoções e interação com os outros (Schilder, 1999).
Conforme sugere Cash e Greenn (1986) a dimensão afetiva pode ser conceituada
como os sentimentos individuais em relação à aparência de seu corpo e como o
indivíduo se sente. O componente cognitivo esta relacionado a pensamentos e crenças
quanto à forma e aparência do corpo, o aspecto comportamental está relacionado a
atitudes tomadas com o objetivo de mudar o corpo.
Nesse sentido Caminha (2003) salienta que o modelo cognitivista afirma que
nossos comportamentos são administrados por sistemas de crenças e pensamentos
automáticos, provenientes de nossa capacidade de representarmos o mundo dentro de
nossas cabeças.
De acordo com Beck (1997), desde a infância, os indivíduos desenvolvem
determinadas crenças, o entendimento mais básico de si mesmo, dos outros e seus
mundos. São denominadas crenças centrais aqueles entendimentos mais fundamentais,
nucleares e profundos de uma pessoa, que reflete as representações do real pelo sujeito,
e não o real propriamente. Nesse sentido, nossas interpretações, representações, ou
atribuições de significado atuam como variável mediadora entre o real e as nossas
respostas emocionais e comportamentais (Beck, 2007).
Conforme a autora acima (1997) as crenças centrais surgem da necessidade do
ser humano extrair sentido do seu ambiente desde as experiências de aprendizado mais
primevas e se fortalecem ao longo da vida. Partindo desse principio, a autora salienta
que o indivíduo precisa organizar a sua experiência de maneira coerente para funcionar
de forma adaptativa. É a partir da relação com o meio que o sujeito elabora
determinados entendimentos e aprendizagens, ou seja, suas crenças, as quais variam em
precisão e funcionalidade.
Para Silva (2003), Um sistema de crenças ou valores é capaz de conferir
continuidade e coerência às nossas vidas, porque ajuda-nos a tomar decisões e avaliar a
importância das experiências pessoais.
Alguns autores referem-se às crenças centrais pela denominação de esquemas, os
quais são estruturas mentais para representar o conhecimento que englobam uma série
de conceitos inter-relacionados em uma organização com significado (Bartlett, 1932;
Brewer, 1999 apud Sternberg, 2008).
5
A investigação empírica desse conceito possivelmente teve inicio por Bartlett há
cerca de 80 anos, evidenciada por Piaget nos anos 1930 e desenvolvida pela psicologia
cognitiva e social na década de 1970 (Leahy, 1997 apud Knapp, 2004).
Beck, (1967, p. 23), define esquema como:
Estruturas internas de relativa durabilidade que armazenam aspectos genéticos ou prototípicos de estímulos, idéias ou experiências, e também organizam informações novas para que tenham significado, determinando como os fenômenos são percebidos e conceitualizados.
Nesse sentido Beck (1967, p.284), destaca alguns aspectos dos esquemas. Ele
sugere que os esquemas podem explicar os temas repetitivos nas associações livres, nas
imagens e nos sonhos. Observa que os esquemas podem ficar inativos em certos
períodos, e depois “serem energizados ou desenergizados rapidamente, como
resultados de mudanças no tipo de input do meio ambiente”.
Ao definir esquema, Beck (1976) se refere a uma rede estruturada e inter-
relacionada de crenças que orientam o sujeito em suas atitudes e posturas em varias
situações de sua vida. Esquemas são, então, compreendidos como estruturas de
cognição com significado. Outra definição, de acordo com essa, afirma: “Os esquemas,
definidos como estruturas cognitivas que organizam e processam as informações que
chegam ao indivíduo, são propostos como representações dos padrões de pensamento
adquiridos no início do desenvolvimento do indivíduo” (Dobson & Dozois, 2006, p.
26).
Complementando a teoria do autor acima, Segal (1988), apresenta a seguinte
definição de esquema: “elementos organizados de reações e experiências passadas que
forma um corpo de conhecimento relativamente coeso e persistente, capaz de guiar a
percepção e a avaliação subseqüente” (p.147).
Enfim os esquemas são estruturas cognitivas que podem ser descritas com
muitos detalhes. Podemos ainda deduzi-los a partir de comportamentos ou pensamentos
automáticos, que por sua vez, influenciam a qualidade e intensidade da emoção e a
forma de comportamento (Dattilio; Freeman & cols., 2004).
Conforme assevera Blankstein; Segal (2006), dentro do modelo cognitivo, os
seres humanos são representados como seres que buscam, selecionam um padrão de
processamento de informação, com base em esquemas, como um modelo de
funcionamento humano. O sistema engloba estruturas, processos e produtos na
6
percepção e transformação de significado, baseado em dados sensoriais provenientes do
ambiente interno e externo.
Essas estruturas e processos atuam a fim de selecionar, transformar, classificar,
armazenar, criar uma forma que faça sentido para o indivíduo em sua adaptação e
funcionamento.
Segundo afirma Beck (1967, p. 174), os esquemas “são estruturas cognitivas
dentro do pensamento, cujo conteúdo específico é as crenças centrais”.
A cognição tem um papel de primazia em relação às emoções e reações dos seres
humanos dentro da teoria cognitiva (Knapp, 2004). Contudo existe uma interação entre
o sistema cognitivo do ser humano e seus outros sistemas, como o emocional e o
comportamental (Beck, Alford, 2000). O contexto ambiental e as reações fisiológicas
também fazem parte desse processo interativo (Knapp, 2004). Esses são os cinco
componentes que interagem em uma determinada situação. A mudança de qualquer um
desses componentes afeta diretamente os outros sistemas (Greenber; Padesky, 1999).
O conceito de cognições, esquemas, comportamentos disfuncionais permanece
no centro da teoria cognitiva e é um princípio integrador compatível com conceitos de
diversas outras teorias que refletem os papéis das primeiras experiências e de processos
inconscientes (Beutler; Harwood; Caldwell, 2006).
Para Maturana (1997, 1998), na cognição a linguagem também tem um papel
importante como mecanismo de interação entre os indivíduos, e a participação da
emoção na determinação das diversas situações no qual vivenciamos.
Conforme afirma o autor a linguagem não é apenas vista como um sistema de
signos e regras que cerceiam os esquemas conceituais do indivíduo e o mundo em que
ele vive, a linguagem nos move conduzidos por nossas emoções.
Corroborando com essa afirmação, Fridja (et al .2000), assevera que as emoções
exercem forte influências sob as crenças, enquanto o pensamento racional não é
suficiente para a ação, as emoções induzem o sujeito a agir de uma determinada
maneira. Emfim, os sentimentos estão amparados pelas crenças, e as crenças pelos
sentimentos.
Numa forma simplifica Beck, (2007), salienta que o modelo cognitivo propõe
que a percepção das pessoas sobre as situações influencia suas reações.
Nesse sentindo acredita-se que as crenças que o sujeito tem a respeito de si
mesmos, representadas por meio de seu auto-conceito, de sua auto-estima e de seu senso
7
de auto-eficácia, afetam a maneira que os indivíduos têm de lidar e superar as eventuais
adversidades em qualquer âmbito da vida.
Para Bower e Bower (1977, p. 26 apud PRETTE e PRETTE, 2005), a pessoa
“evoca o seu auto-conceito quando faz uma predição sobre o resultado do seu
desempenho”. Indivíduo como uma imagem predominantemente negativa de si mesmas,
e conseqüentemente com baixa auto-estima, podem sentir-se deprimidas e evitar o
contato social.
Essas crenças foram definidas por Loos (2003), como um conjunto das crenças
auto-referenciadas.
Estas crenças atuam como variáveis moderadoras nos processos que regulam os
comportamentos nos mais diversos contextos.
Certas crenças básicas sobre o significado da aparência na vida são aprendidas,
quer através de situações traumáticas, relações familiares ou socialização cultural. Estas
determinam a forma como a pessoa interpreta a realidade, funcionando como modelos
que influenciam a determinação do seu foco de atenção, como pensa sobre os eventos
da vida e sobre si mesmo (Castilho, 2001).
Em consonância com essa definição, Young (2003) elaborou uma teoria a
respeito dos esquemas na qual os denomina como Esquemas Iniciais Desadaptativos
(Early Maladaptive Schemas; EMS), empregando-os na compreensão das
psicopatologias da personalidade.
Deste modo “esquemas iniciais desadaptativos se referem a temas extremamente
estáveis e duradouros que se desenvolvem durante a infância, são elaborados ao longo
da vida e são disfuncionais em um grau significativo” (p. 15). Young refere que a
maioria dos EMS são crenças e sentimentos incondicionais sobre si mesmo em relação
ao meio, servindo como um modelo para processar a experiência posterior.
Na abordagem de Young, os EMS apresentam várias difinições, dentre as quais:
são incondicionais, ou seja, são verdades a priori; são autoperpetuadores, resistentes à
mudança; são disfuncionais de maneira significativa e recorrente; são ativados por
situações ambientais condizentes para o esquema específico; estão ligados ao um nível
de afeto elevado; e parecem resultar da interação entre o temperamento e as
experiências disfuncionais nas relações parentais e sociais nos primeiros anos de vida do
sujeito.
8
Continuando o autor afirma que Foram identificados três processos de um
esquema podendo ocorrer nos domínios cognitivo, afetivo ou comportamental,
incluindo: a manutenção, a evitação e a compensação do esquema. Aquele esquema que
está atualmente ativado em um indivíduo é denominado de modo de esquema. Na
psicopatologia, um modo de esquema disfuncional é ativado quando esquemas
desadaptativos específicos ou respostas de coping geram emoções perturbadoras,
comportamentos de evitação ou mesmo auto-derrotistas que contaminam o
funcionamento do indivíduo.
Uma vez que a participação dos esquemas emocionais torna-se necessária para
assegurar o desenvolvimento do indivíduo, toda forma de manifestação afetiva é vista
como basicamente adaptativa e funcional (Abreu e Rozo, 2003).
.
9
MÉTODO
Este estudo caracteriza-se como descritivo exploratório e teve como objetivo
identificar a linguagem corporal dos adolescentes góticos sob uma leitura sócio-
histórica e cognitiva comportamental. O campo da pesquisa foi desenvolvido na
cidade de Joinville/SC e a amostra contou com a participação de dez indivíduos
adeptos da cultura gótica, sendo sete do sexo feminino e três do sexo masculino, com
a idade média de 16 anos, sendo mais novo de 15 anos e o mais velho 19 anos.
Foram realizados encontros individuais em um shopping da cidade para a aplicação
dos questionários num período de três meses.
Foi utilizado como instrumento para coleta dos dados um questionário
estruturado semi-aberto. Este era composto de 31 questões, sendo 8 (oito) questões
abertas e 23 questões fechadas com as opções sim e não. Tais questões se referem às
características circundantes ao estilo gótico, seus hábitos, suas crenças e percepções.
Os dados foram tratados por meio de análise qualitativa conforme demonstram as
figuras.
10
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os jovens entrevistados na amostra iniciaram suas inserções no universo gótico
entre a faixa etária de 14 a 16 anos. Para Güembe; Goñi (2005), o ingresso nestes
grupos ocorre quando o adolescente começa buscar modelos para formar a sua própria
identidade, nessa fase ele se encontra disposto a se agrupar. Os dez adolescentes góticos
da presente amostra são pertencentes a um mesmo grupo. Foi possível perceber pela
postura e discurso dos mesmos que convivem com alguma carência afetiva agregada a
um vazio interior, que faz com que eles se utilizem do próprio corpo como instrumento
de expressão desses sentimentos. Esses jovens são frutos das condições em que vivem e
do acesso que possuem aos bens simbólicos. É preciso aprofundar-se nos múltiplos
significados da linguagem desses adolescentes góticos.
As figuras a seguir expressam alguns dos aspectos considerados relevantes
dentre as questões investigadas no decorrer da pesquisa, como: os motivos que o levam
a optar pelo estilo gótico, como entendem a mutilação, atração pelo mundo das trevas,
sentido expresso pela cor preta, tatuagens e acessórios e situação conjugal dos pais.
Conforme a Figura 1, a aparência para estes góticos têm um importante
significado, assim como a música e os amigos. Segundo Mercer (1988), para os jovens
góticos, a música é um fator estimulante à coesão grupal. Para eles a música é
importante pelo significado e pela união que opera entre os membros, é também um
símbolo gerencial, que marca uma distinção entre os jovens e seus pais. Pode ser
constatado que em meio a variedade de respostas, às relativas a aparência apareceu na
maioria das respostas, ora com a palavra vestimenta, ora com a palavra estilo. Sendo
que esta última extrapola o significado do vestir-se, ampliando para outros, como o uso
de acessórios e indumentárias, e também hábitos que venham a configurar o estilo
gótico.
Nesse sentido, Pais (1996), afirma:
O vestuário em particular aparece entre os jovens como detentor de um poder simbólico e instrumento de integração grupal. Mais do que distintivo de classe o movimento gótico verifica-se a afirmação de um modelo de vida muito particular, com modos de pensar, sentir e agir específicos e conseqüentemente como algo de desviante. A dissidência
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estética é um indicador seguro da vontade de ruptura como o modelo dominante. (p. 101)
SUJEITO MOTIVOS
1 Vestimenta, cultura, mistério2 Vestimenta, filosofia, isolamento, pessoas diferentes, cultura3 Amigos, identificação4 Amigos, obscuro, música, liberdade, aceitação5 Música, amigos, obscuro,sentimentos, liberdade6 Estilo, filosofia7 Sentimentos8 Luto, estilo, identificação9 Luto10 Estilo, arquitetura, história, poemas, músicas
Tabela 1. Motivos que levaram a optar pelo estilo gótico.
De acordo com o a tabela 2, referente à filosofia destes adolescentes góticos, as
respostas foram bastante variadas e expressam a percepção de adolescentes
independente do estilo que adotam, pois sendo pertencentes a um mesmo grupo não
especificaram uma filosofia que sigam em comum. Porém parecem querer justamente
romper com a transição que é a própria adolescência, quando falam em liberdade, vida
livre, comandar a sua própria vida. E neste sentido o estilo que os une enquanto grupo,
faz com que possam se identificar uns com os outros aliviando os conflitos desta fase de
suas vidas, bem como as contrariedades que se deparam em relação ao social.
Para Abramo (1994) as fases de conflitos pelos quais vivem os adolescentes são
vistas como conseqüências das rupturas de modelos entre adultos e jovens. São,
principalmente, conflitos de expectativas sobre a maneira de como os jovens são
inseridos na vida adulta e sobre a condução do jeito de viver esta fase. A condição
juvenil surge então como um período, sobretudo na reivindicação de prazer e
independência, surgem graves desavenças com os pais, e que, muitas vezes, causam
violência. .
Melton (1994) aponta que associado as práticas sociais dos góticos estão
sentimentos de liberdade individual e impulsos de rebelião contra as formas opressivas
desta sociedade. É encarada como uma forma de progressão individual no sentido da
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auto-afirmação, encontro de si mesmo, procura de identificação de personalidade do
indivíduo.
Knapp e Rocha (2003) asseveram que cada pessoa se constrói, a partir do que
vai aprendendo com as experiências no decorrer da vida, um modo de pensar, sentir e se
comportar, conforme uma conjunção própria de concepções, idéias, interpretações e
pressupostos que fazemos acerca de como as pessoas e as coisas são.
SUJEITO FILOSOFIA
1 Igualdade entre os homens, o direito de ser feliz2 Não é obrigada a defender nada3 O poder que cada um tem de comandar a sua própria vida
4 Viver em paz, mundo sem mais tristezas ou mágoas, o ideal de encontrar uma pessoa que o faça feliz
5 A sua própria felicidade, um mundo onde eles possam ser aceitos
6 Filosofia é em cima do obscuro, do estranho e de si mesmo, uma vida livre e sem preconceito.
7 A liberdade de expressão8 Nulo
9 Nulo10 Nulo
Tabela 2. Filosofia que os góticos defendem
Na figura 01 pode ser constatado como os adolescentes góticos entendem a
mutilação, de modo que a palavra dor foi destaque, ou seja, mutilar-se pelo prazer de
sentir dor. Sendo também compreendida como expressão de arte e como meio de
chamar atenção.
Para Giusti; Garreto; Scivoletto (2006), os indivíduos que provocam ferimentos
em si próprios o fazem por razões muito distintas: alguns, para pertencer a um grupo ou
contestação aos padrões culturais vigentes, outros, em busca de alívio para um grande
desconforto emocional.
Baddeley (2003, p. 39) descreve o gótico com “um inescrutável anseio da alma
por causar dor e sofrimento a si mesmo, usar da violência para a sua própria natureza,
fazer o errado simplesmente porque é errado”.
Nesse sentido, Gardner (2001) afirma que existe reciprocidade entre as questões
biológicas e a cultura, e esta dinâmica é constante ao longo do desenvolvimento
13
humano. Desde o nascimento, o sujeito entra em um mundo que é rico em
interpretações e significados. Estes contatos são essencialmente corporais.
O autor assevera que existe uma troca contínua com outras pessoas, através de
sensações e satisfações físicas, tais como calor, alimento, dentre outras; e psicológicas,
como amor, prazer, dor etc. Diante destas interações a imagem do próprio corpo sofre
alterações. Além da acomodação motora existe reciprocidade.
O prazer altera a imagem que cada um possui de si, e o mesmo ocorre diante da
dor, que inclui aspectos sensoriais, perceptivos, motores, neurológicos, afetivos e
psicossociais.
7%
14%
21%
57%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Nulo
Chamar atenção
Arte
Dor
Figura 1. Como entendem a mutilação
De acordo com a Figura 2, os tipos de mutilações mais freqüentes para os
góticos são cortes, atingindo a marca de 50%, seguido pelos piercings e tatuagens com
20%. Estes adolescentes utilizam-se do corpo para infligir em si mesmo através de
agulhas, estiletes, queimaduras, body piercings, tatuagens, entre outros objetos cortantes
que provocam cicatrizes (Melton, 1994). Para o jovem gótico o corpo é o instrumento
para chegar aos limites da dor, assim como em outras práticas sociais, depois de superar
a primeira vez, há uma forte vontade de repetir a experiência, chegando a um ponto que
se torna uma prática permanente, como forma de alcançar a satisfação. Há um retorno
aos mistérios do corpo e às sensações, uma santificação do sangue e da marca, usando o
corpo como suporte para esta arte.
Segundo Giusti; Garreto; Scivoletto et al. (2006, p. 197), os fatores de risco
associado à automutilação citados na literatura são: abuso emocional, físico ou sexual
14
na infância; viver com apenas um dos pais; conflitos familiares conhecimento de algum
membro da família ou colega pratica automutilação (fi.03); abuso de álcool e tabaco ou
outras substâncias; ser vítima de bulling na adolescência: presença de sintomas
depressivos, ansiosos, impulsividades e baixa auto-estima.
Conforme pesquisas elaboradas por Pattison; Kahan (1983) apontam a
depressão e a ansiedade como motivadoras para automutilação em adultos e
adolescentes. Ainda em outros estudos realizados mostram maior prevalência do
comportamento entre a população mais jovem, sendo que o início ocorre entre 15 e 16
anos de idade conforme afirmam Whitlok, Eckenrode; Silverman (2006, p. 197). Dados
estes que condizem com a idade dos jovens entrevistados na pesquisa.
De acordo com esses autores para melhor entendimento de um comportamento
específico, é necessário, portanto, relacionar o lugar, o comportamento e o contexto, não
desconsiderando o envolvimento biológico e social.
Nessa perspectiva, Simeon (2005, p. 191), afirmam que a automutilação pode
ser vista como uma forma de enfrentar situações utilizadas por indivíduos com poucas
estratégias de enfrentamento, uma vez que o desequilíbrio emocional favorece a
ocorrência do comportamento, podendo ser resultado de questões biológicas que estão
diretamente ligadas á dificuldade de organizar-se afetivamente, o que também pode
contribuir de modo negativo a forma como a pessoa rege ao mundo.
7%
50%
21%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Queimaduras
Piercing
Tatuagem
Cortes
Figura 2. Freqüência dos tipos de mutilação.
Através das perfurações corporais e tatuagens, eles manifestam repudio pelo
socialmente instituído. Há nesse movimento uma ruptura com os valores estereotipados
de beleza, conforme já citado no texto por Schmidt (1985). A autora aponta ainda, que
15
transmitindo a idéia de rebeldia, inconformismo e agressividade em relação às normas
de valores vigentes, eles tentam ser diferentes numa sociedade de iguais.
Na figura 3, demonstra que a maioria dos adolescentes reúne-se com seu grupo e
os lugares mais freqüentados para tal são cemitérios e bares (clubes noturnos). Sendo
locais onde podem confraternizar e consolidar a coesão grupal conforme aponta
(Melton, 1994). Nos encontros com o grupo alguns destes adolescentes disseram querer
encontrar a paz de espírito, o silêncio onde eles possam pensar e filosofar.
60%
40%SimNão
Figura 3. Ida ao cemitério.
Melton (1994) afirma que o jovem gótico tem uma tendência dirigida para o
misticismo e para o oculto, juntamente com temáticas consideradas “macabras”, é tido
como desviante, e são facilmente percebidos como “mórbidos”, trazendo em si uma
imagem de decadência em torno da autodestruição.
Esta afirmação se confirma pela relação do estilo gótico com a atração pelo
mundo das trevas que pôde ser confirmada em 90% dos jovens participantes, conforme
apresenta a figura 4. Sendo acrescidas pelo interesse desses jovens pelo mórbido, pelas
trevas e pelo macabro.
16
90%
10%
SimNão
Figura 4. Atração pelo mundo das trevas.
Abramo (1994) assevera que a figura do jovem gótico destoa dos demais jovens
e impressiona pelo tom da roupa preta que evoca o luto. As meninas usam uma
maquiagem onde acentuam este luto, pelo contraste com os olhos carregados de
sombras escuras, lábios com batom roxo e a presença das trevas que parecem indicar a
impossibilidade de harmonia.
Ao serem questionados sobre o sentido que encontram no seu estilo de vestir
predominantemente com roupas pretas, de se mostrar no social, com seus percings,
tatuagens, maquiagem e outros acessórios, os adolescentes góticos afirmaram que assim
expressam o sentimento de luto ou morte, contestação, indignação e também
exibicionismo. Assim demonstra a figura 5.
5%
14%
32%
50%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Exibicionismo
Indignação
Constestação
Luto/morte
Figura 5. Sentido expresso pela cor preta, tatuagens e acessórios.
17
Em se tratando da relação familiar destes adolescentes, ao serem questionados
como classificariam a relação com seus pais, de acordo com a Figura 6, 50% afirmaram
ser harmoniosa, porém 40% afirmaram ser problemática e 10% classificaram como
participativa. Uma diferença pequena entre a relação harmoniosa e a problemática
inviabilizando resultados conclusivos. Contudo, pode-se afirmar que é no meio familiar,
na relação com os pais que os filhos a priori constituem seus valores enquanto sujeitos,
bem como nas interações sociais que oportuniza possibilidades de escolhas do que
querem tomar pra si ou não (Pais, 1996). A convergência e divergência de idéias entre
pais e filhos oscilam ao longo da vida, mas no que tange à adolescência é sabido que as
divergências tendem a predominar. Principalmente pelo fato de nesta fase a busca de
definir-se enquanto um sujeito ser mais intensa.
Conforme Branco (2001) o conflito deve estar no meio em que vive, (fig.06)
antes de estar “no interior” de uma pessoa. Muitos dos comportamentos problemáticos
apresentados por adolescentes devem ser comportamentos de esquiva, e se há esquiva,
deve existir algum agente punidor no ambiente. Enfim, o problema está na relação do
adolescente com o seu meio.
Ferraris (2004) pontua que em muitas situações, nem sempre a ruptura de um
adolescente com os pais indica a conquista da autonomia, mas a dificuldade de adquirir
verdadeira independência emotiva sem ter de romper laços. As causas que favorecem
essa dificuldade podem ser várias e uma das causas seria a educação muito punitiva e
repressora ou caracterizada pela negligência ou pelo abandono, bem como, às
complexas dinâmicas criadas pelas separações, que geram conflitos agregados a traumas
nunca superados.
18
18%
36%
45%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
Participativa
Problemática
Harmoniosa
Figura 6. Classificação da família.
Em complemento à questão das relações familiares verificou-se acerca da
situação conjugal dos pais destes jovens, sendo que 60% são separados, 30% vivem
juntos e 10% mantém relação conflituosa. Embora haja um maior índice de pais
separados, não é possível concluir que tal dado seja determinante na qualidade da
relação familiar, uma vez que a diferença entre relação harmoniosa e problemática ter
sido muito pequena.
Ao se tratar da questão da sexualidade que na adolescência emerge com as
questões da iniciação sexual, da opção sexual, entre outras questões relacionadas. A
sexualidade é um aspecto essencial da imagem gótica, pois é também um ideal de
completude na qual uma parte da dualidade humana (masculino/feminino), acompanha
o seu recíproco.
No que tange à opção sexual dos adolescentes góticos desta amostra, 80%
afirmou ser heterossexual, sendo que 20% afirmou bissexualidade. Para Giddens (1996)
a prática da homossexualidade, masculina ou feminina, ou a bissexualidade, que faz
parte desse movimento, para os jovens góticos isto é entendido como elemento normal
da ambivalente natureza humana.
Para Isay (1998) das várias tarefas a serem cumpridas durante a adolescência,
uma das mais importantes é a consolidação de uma identidade sexual. O adolescente
homossexual entra neste período com uma cobrança maior do que os adolescentes
heterossexuais, pois já se percebem diferentes e em algumas situações se sentem
19
rejeitados, o que pode levá-los a desenvolver um padrão de comportamento evitativo ou
introvertido.
Os conflitos vividos pelo adolescente homossexual, aponta para um fato que
vai além da sexualidade, a auto-estima, ou seja, quais as regras que esses adolescentes
desenvolveram sobre si, como se percebem, quais os sentimentos possuem sobre si.
A partir da perspectiva cognitiva que trata sobre a auto-estima como parte de um
conjunto de crenças que o indivíduo constrói sobre si mesmo, sendo que estas crenças
desempenham um papel importante quando os sujeitos escolhem as condutas que vão
adotar diante das mais diversas circunstâncias (Spencer; Josephs e Steele, 1993).
Outros teóricos como Cooley, 1902 e Mead (1934, apud HARTER, 1993, p.89)
afirmam que a origem da auto-estima se encontra na estrutura social na qual o sujeito
está inserido. É construído através da valorização do olhar do outro a respeito de nós
mesmos, o que funciona como um espelho social que serve para confirmar as opiniões
de pessoas significativas com respeito ao nosso eu. Essas opiniões, que refletem as
observações do outro, são incorporadas à identidade.
20
CONCLUSÃO
Nesta pesquisa viabilizou-se o entendimento da linguagem corporal gótica
vivenciada pelos dez adolescentes que participaram desta amostra. A adolescência
sendo um momento crítico do desenvolvimento, evidência uma diversidade de conflitos,
questionamentos e escolhas que são manifestadas ora pela rebeldia, ora pelas
predominantes discordâncias com os pais, e também pela busca de identificar-se com
algo que alivie o momento de transição que vivencia. E neste momento o grupo com o
qual se identifica proporciona o conforto almejado. A necessidade do adolescente se
unir a grupos onde os seus valores e preferências sejam compreendidos conduz à
identificação com algumas dimensões de determinada cultura, de modo a integrar-se
onde for aceito. Os adolescentes afirmaram que se identificam com a ‘tribo’, com o seu
grupo, onde eles deixam de estar sozinhos e convivem com o grupo que os compreende
e que os aceite. É neste meio em que encontram liberdade de expressão para serem
criativos e aprofundarem as suas especificidades e potencialidades individuais.
Embora possam ter amigos fora da esfera da cultura, afirmam que é no grupo
gótico que encontram a solidariedade de gostos e partilha de idéias, sem quaisquer
constrangimentos que teriam ao divulgar gostos que são tidos como desviantes pela
sociedade. As crenças dos adolescentes centram-se num misticismo que adequam as
suas vidas e “dá margem” a um afastamento da realidade social com a qual têm
constrangimentos.
Nesse sentido Young; Klosko & Weishaar (2008), propõem que o indivíduo
desenvolvem estilos e respostas de enfrentamento desadaptativas desde cedo em suas
vidas para se adaptar a esquemas, para que não tenham que vivenciar as emoções
intensas e pesadas que os esquemas geralmente engendram.
Conforme aponta Young (2003), um dos estilos de enfrentamento é a evitação. É
o estilo de enfrentamento para o abandono/instabilidade, uma tentativa realizada pelo
indivíduo de não entrar em contato com o sofrimento decorrente do acionamento do
Esquema Inicial Desadaptativo e pode ocorrer nos níveis cognitivo, afetivo ou
comportamental.
Verificou-se que os adolescentes góticos desta amostra sinalizaram, de forma
original e estranha, o sentimento de insatisfação em relação ao mundo, às pessoas, com
21
as normas e regras e principalmente consigo mesmos. Conforme foi pontuado por
alguns dos autores supracitados, a insatisfação interna e, a necessidade de alívio para
um grande desconforto emocional leva os adolescentes a utilizarem o próprio corpo
como instrumento para manifestarem seu desafeto.
É possível compreender que para esses jovens os locais públicos constituindo-se
em um local de expressão das "aspirações e desejos", são espaços que se tornaram
importantes para o desenvolvimento da sociabilidade desses adolescentes, sendo
caracterizados como uma das dimensões mais significativas da vivência dos mesmos.
Constata-se, que estes adolescentes têm uma forma peculiar de protestar.
Apesar, de não apresentar propostas de mudanças da situação, denunciam a mesma.
Protestam por meio da mutilação do próprio corpo, e diante destas manifestações
corporais, pode ser percebido que estes comportamentos estereotipados são em grande
parte, estratégias, meios de sobrevivência e de integração ao mundo do outro. Pode-se
entender nesses adolescentes um movimento psíquico na busca da integridade em meio
a um relativo desajuste em relação ao modelo preconizado como desejável.
Somos aquilo que sentimos que somos, muitos destes episódios nada mais é do
que formas alternativas desenvolvidas pelo indivíduo para tentar se esquivar ou
minimizar as emoções desadaptativas que surgem e os desagradam, e uma maneira de
afastar-se destes sentimentos e evitar o mal-estar provocado é engajar-se em outras
condutas (no caso mutilação do próprio corpo) para se produzir alguma forma de alívio.
Tal prática, todavia, afasta o indivíduo daquilo que esta sentindo, colocando-as em face
de outras demandas emocionais alternativas (Abreu, 2002).
Por fim constata-se que a literatura ainda é restrita acerca dos adolescentes
adeptos a cultura gótica. Deste modo ainda que tenha sido possível investigar a
linguagem corporal dos adolescentes góticos desta amostra, faz-se necessário uma
maior produção de conhecimento acerca da linguagem gótica. Assim como estudos mais
aprofundados, para que haja uma melhor compreensão dos comportamentos dos sujeitos
que se identificam com o modo de ser e viver dos góticos, e suas especificidades.
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