cnenebio.files.wordpress.com€¦ · web viewcante lá que eu canto cá. patativa do assaré....

13
Cante Lá Que Eu Canto Cá Patativa do Assaré Composição: Patativa do Assaré Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante a cidade que é sua, Que eu canto o sertão que é meu. Se aí você teve estudo, Aqui, Deus me ensinou tudo, Sem de livro precisá Por favô, não mêxa aqui, Que eu também não mexo aí, Cante lá, que eu canto cá. Você teve inducação, Aprendeu munta ciença, Mas das coisa do sertão Não tem boa esperiença. Nunca fez uma paioça, Nunca trabaiou na roça, Não pode conhecê bem, Pois nesta penosa vida, Só quem provou da comida Sabe o gosto que ela tem. Pra gente cantá o sertão, Precisa nele morá, Tê armoço de fejão E a janta de mucunzá, Vivê pobre, sem dinhêro, Socado dentro do mato, De apragata currelepe, Pisando inriba do estrepe, Brocando a unha-de-gato. Você é muito ditoso, Sabe lê, sabe escrevê, Pois vá cantando o seu gozo, Que eu canto meu padecê. Inquanto a felicidade Você canta na cidade, Cá no sertão eu infrento A fome, a dô e a misera. Pra sê poeta divera, Precisa tê sofrimento. Sua rima, inda que seja Bordada de prata e de ôro, Para a gente sertaneja É perdido este tesôro. Com o seu verso bem feito, Não canta o sertão dereito, Porque você não conhece Nossa vida aperreada. E a dô só é bem cantada, Cantada por quem padece. Só canta o sertão dereito, Com tudo quanto ele tem,

Upload: lamthien

Post on 17-Dec-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Cante Lá Que Eu Canto CáPatativa do AssaréComposição: Patativa do Assaré

Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante a cidade que é sua, Que eu canto o sertão que é meu.

Se aí você teve estudo, Aqui, Deus me ensinou tudo, Sem de livro precisá Por favô, não mêxa aqui, Que eu também não mexo aí, Cante lá, que eu canto cá.

Você teve inducação, Aprendeu munta ciença, Mas das coisa do sertão Não tem boa esperiença. Nunca fez uma paioça, Nunca trabaiou na roça, Não pode conhecê bem, Pois nesta penosa vida, Só quem provou da comida Sabe o gosto que ela tem.

Pra gente cantá o sertão, Precisa nele morá, Tê armoço de fejão E a janta de mucunzá, Vivê pobre, sem dinhêro, Socado dentro do mato, De apragata currelepe, Pisando inriba do estrepe,

Brocando a unha-de-gato.

Você é muito ditoso, Sabe lê, sabe escrevê, Pois vá cantando o seu gozo, Que eu canto meu padecê. Inquanto a felicidade Você canta na cidade, Cá no sertão eu infrento A fome, a dô e a misera. Pra sê poeta divera, Precisa tê sofrimento.

Sua rima, inda que seja Bordada de prata e de ôro, Para a gente sertaneja É perdido este tesôro. Com o seu verso bem feito, Não canta o sertão dereito, Porque você não conhece Nossa vida aperreada. E a dô só é bem cantada, Cantada por quem padece.

Só canta o sertão dereito, Com tudo quanto ele tem, Quem sempre correu estreito, Sem proteção de ninguém, Coberto de precisão Suportando a privação Com paciença de Jó, Puxando o cabo da inxada, Na quebrada e na chapada, Moiadinho de suó.

Page 2: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Amigo, não tenha quêxa, Veja que eu tenho razão Em lhe dizê que não mêxa Nas coisa do meu sertão. Pois, se não sabe o colega De quá manêra se pega Num ferro pra trabaiá, Por favô, não mêxa aqui, Que eu também não mêxo aí, Cante lá que eu canto cá.

Repare que a minha vida É deferente da sua. A sua rima pulida Nasceu no salão da rua. Já eu sou bem deferente, Meu verso é como a simente Que nasce inriba do chão; Não tenho estudo nem arte, A minha rima faz parte Das obra da criação.

Mas porém, eu não invejo O grande tesôro seu, Os livro do seu colejo, Onde você aprendeu. Pra gente aqui sê poeta E fazê rima compreta, Não precisa professô; Basta vê no mês de maio, Um poema em cada gaio E um verso em cada fulô.

Seu verso é uma mistura, É um tá sarapaté,

Que quem tem pôca leitura Lê, mais não sabe o que é. Tem tanta coisa incantada, Tanta deusa, tanta fada, Tanto mistéro e condão E ôtros negoço impossive. Eu canto as coisa visive Do meu querido sertão.

Canto as fulô e os abróio Com todas coisa daqui: Pra toda parte que eu óio Vejo um verso se bulí. Se as vêz andando no vale Atrás de curá meus male Quero repará pra serra Assim que eu óio pra cima, Vejo um divule de rima Caindo inriba da terra.

Mas tudo é rima rastêra De fruita de jatobá, De fôia de gamelêra E fulô de trapiá, De canto de passarinho E da poêra do caminho, Quando a ventania vem, Pois você já tá ciente: Nossa vida é deferente E nosso verso também.

Repare que deferença Iziste na vida nossa: Inquanto eu tô na sentença, Trabaiando em minha roça,

Page 3: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Você lá no seu descanso, Fuma o seu cigarro mando, Bem perfumado e sadio; Já eu, aqui tive a sorte De fumá cigarro forte Feito de paia de mio.

Você, vaidoso e facêro, Toda vez que qué fumá, Tira do bôrso um isquêro Do mais bonito metá. Eu que não posso com isso, Puxo por meu artifiço Arranjado por aqui, Feito de chifre de gado, Cheio de argodão queimado, Boa pedra e bom fuzí.

Sua vida é divirtida E a minha é grande pená. Só numa parte de vida Nóis dois samo bem iguá: É no dereito sagrado, Por Jesus abençoado Pra consolá nosso pranto, Conheço e não me confundo Da coisa mió do mundo Nóis goza do mesmo tanto.

Eu não posso lhe invejá Nem você invejá eu, O que Deus lhe deu por lá, Aqui Deus também me deu. Pois minha boa muié, Me estima com munta fé,

Me abraça, beja e qué bem E ninguém pode negá Que das coisa naturá Tem ela o que a sua tem.

Aqui findo esta verdade Toda cheia de razão: Fique na sua cidade Que eu fico no meu sertão. Já lhe mostrei um ispeio, Já lhe dei grande conseio Que você deve tomá. Por favô, não mexa aqui, Que eu também não mêxo aí, Cante lá que eu canto cá.

Page 4: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)A Carlos Heitor Cony

Artigo I Fica decretado que agora vale a verdade. agora vale a vida, e de mãos dadas, marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas,

têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III Fica decretado que, a partir deste instante, haverá girassóis em todas as janelas, que os girassóis terão direito a abrir-se dentro da sombra; e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único: O homem, confiará no homem como um menino confia em outro menino.

Artigo V Fica decretado que os homens

estão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem a armadura de palavras. O homem se sentará à mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa.

Artigo VI Fica estabelecida, durante dez séculos, a prática sonhada pelo profeta Isaías, e o lobo e o cordeiro pastarão juntos e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII Por decreto irrevogável fica estabelecido

o reinado permanente da justiça e da claridade, e a alegria será uma bandeira generosa para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar-se amor a quem se ama e saber que é a água que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X Fica permitido a qualquer pessoa, qualquer hora da vida, uso do traje branco.

Artigo XI Fica decretado, por definição, que o homem é um animal que ama e que por isso é belo, muito mais belo que a estrela da manhã.

Page 5: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Artigo XII Decreta-se que nada será obrigado nem proibido, tudo será permitido, inclusive brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único: Só uma coisa fica proibida: amar sem amor.

Artigo XIII Fica decretado que o dinheiro não poderá nunca mais comprar o sol das manhãs vindouras. Expulso do grande baú do medo, o dinheiro se transformará em uma espada fraternal para defender o direito de cantar e a festa do dia que chegou.

Artigo Final. Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente

como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

Santiago do Chile, abril de 1964

Page 6: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

NÃO SEI... Cora Coralina

Não sei... se a vida é curta...Não sei... Não sei...

se a vida é curta ou longa demais para nós.

Mas sei que nada do que vivemos

tem sentido, se não tocarmos o coração das

pessoas.

Muitas vezes basta ser: colo que acolhe,

braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia,

lágrima que corre, olhar que sacia,

amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo:

é o que dá sentido à vida.

É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais,

mas que seja intensa, verdadeira e pura...

enquanto durar.

Nada É Impossível De Mudar

Bertold Brecht

Desconfiai do mais trivial , na aparência singelo.E examinai, sobretudo, o que parece habitual.Suplicamos expressamente:não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,pois em tempo de desordem sangrenta,de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,de humanidade desumanizada,nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar.

Page 7: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

O Analfabeto PolíticoBertold Brecht

"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo."

Os que lutamBertold Brecht

"Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons;Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons;Há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda;Porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis."

Page 8: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

Se os Tubarões Fossem Homens Bertold Brecht Se os tubarões fossem homens, eles seriam mais gentís com os peixes pequenos. Se os tubarões fossem homens, eles fariam construir resistentes caixas do mar, para os peixes pequenos com todos os tipos de alimentos dentro, tanto vegetais, quanto animais. Eles cuidariam para que as caixas tivessem água sempre renovada e adotariam todas as providências sanitárias cabíveis se por exemplo um peixinho ferisse a barbatana, imediatamente ele faria uma atadura a fim de que não moressem antes do tempo. Para que os peixinhos não ficassem tristonhos, eles dariam cá e lá uma festa aquática, pois os peixes alegres tem gosto melhor que os tristonhos. Naturalmente também haveria escolas nas grandes caixas, nessas aulas os peixinhos aprenderiam como nadar para a guela dos tubarões. Eles aprenderiam, por exemplo a usar a geografia, a fim de encontrar os grandes tubarões, deitados preguiçosamente por aí. Aula principal seria naturalmente a formação moral dos peixinhos. Eles seriam ensinados de que o ato mais grandioso e mais belo é o sacrifício alegre de um peixinho, e que todos eles deveriam acreditar nos tubarões, sobretudo quando esses dizem que velam pelo belo futuro dos peixinhos. Se encucaria nos peixinhos que esse futuro só estaria garantido se aprendessem a obediência. Antes de tudo os peixinhos deveriam guardar-se antes de qualquer inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista. E denunciaria imediatamente os tubarões se qualquer deles manifestasse essas inclinações. Se os tubarões fossem homens, eles naturalmente fariam guerra entre si a fim de

conquistar caixas de peixes e peixinhos estrangeiros.As guerras seriam conduzidas pelos seus próprios peixinhos. Eles ensinariam os peixinhos que, entre os peixinhos e outros tubarões existem gigantescas diferenças. Eles anunciariam que os peixinhos são reconhecidamente mudos e calam nas mais diferentes línguas, sendo assim impossível que entendam um ao outro. Cada peixinho que na guerra matasse alguns peixinhos inimigos da outra língua silenciosos, seria condecorado com uma pequena ordem das algas e receberia o título de herói. Se os tubarões fossem homens, haveria entre eles naturalmente também uma arte, haveria belos quadros, nos quais os dentes dos tubarões seriam pintados em vistosas cores e suas guelas seriam representadas como inocentes parques de recreio, nas quais se poderia brincar magnificamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam como os valorosos peixinhos nadam entusiasmados para as guelas dos tubarões.A música seria tão bela, tão bela, que os peixinhos sob seus acordes e a orquestra na frente, entrariam em massa para as guelas dos tubarões sonhadores e possuídos pelos mais agradáveis pensamentos. Também haveria uma religião ali. Se os tubarões fossem homens, eles ensinariam essa religião. E só na barriga dos tubarões é que começaria verdadeiramente a vida. Ademais, se os tubarões fossem homens, também acabaria a igualdade que hoje existe entre os peixinhos, alguns deles obteriam cargos e seriam postos acima dos outros. Os que fossem um pouquinho maiores poderiam inclusive comer os menores, isso só seria agradável aos tubarões, pois eles mesmos obteriam assim mais constantemente maiores

Page 9: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

bocados para devorar. E os peixinhos maiores que deteriam os cargos valeriam pela ordem entre os peixinhos para que estes chegassem a ser, professores, oficiais, engenheiros da construção de caixas e assim por diante. Curto e grosso, só então haveria civilização no mar, se os tubarões fossem homens.

Elogio da DialéticaA injustiça passeia pelas ruas com passos seguros.Os dominadores se estabelecem por dez mil anos.Só a força os garante.Tudo ficará como está.Nenhuma voz se levanta além da voz dos dominadores.No mercado da exploração se diz em voz alta:Agora acaba de começar:E entre os oprimidos muitos dizem:Não se realizará jamais o que queremos!O que ainda vive não diga: jamais!O seguro não é seguro. Como está não ficará.Quando os dominadores falarem falarão também os dominados.Quem se atreve a dizer: jamais?De quem depende a continuação desse domínio?De quem depende a sua destruição?Igualmente de nós.Os caídos que se levantem!Os que estão perdidos que lutem!Quem reconhece a situação como pode calar-se?Os vencidos de agora serão os vencedores de amanhã.E o "hoje" nascerá do "jamais".

Elogio do RevolucionárioQuando aumenta a repressão, muitos desanimam.Mas a coragem dele aumenta.Organiza sua luta pelo salário, pelo pãoe pela conquista do poder.Interroga a propriedade:De onde vens?Pergunta a cada idéia:Serves a quem?Ali onde todos calam, ele falaE onde reina a opressão e se acusa o destino,ele cita os nomes.À mesa onde ele se sentase senta a insatisfação.À comida sabe mal e a sala se torna estreita.Aonde o vai a revoltae de onde o expulsampersiste a agitação.

Page 10: cnenebio.files.wordpress.com€¦ · Web viewCante Lá Que Eu Canto Cá. Patativa do Assaré. Composição: Patativa do Assaré. Poeta, cantô de rua, Que na cidade nasceu, Cante

O BICHOManuel Bandeira

VI ONTEM um bichoNa imundície do pátioCatando comida entre os detritos.Quando achava alguma coisa,Não examinava nem cheirava:Engolia com voracidade.O bicho não era um cão,Não era um gato,Não era um rato.O bicho, meu Deus, era um homem.

Aula de VôoMauro Iasi

O conhecimentocaminha lento feito lagarta.Primeiro não sabe que sabee voraz contenta-se com cotidiano orvalhodeixado nas folhas vividas das manhãs.

Depois pensa que sabee se fecha em si mesmo:faz muralhas,cava Trincheiras,ergue barricadas.Defendendo o que pensa saberlevanta certeza na forma de muro,orgulha-se de seu casulo.

Até que maduroexplode em vôos

rindo do tempo que imagina saberou guardava preso o que sabia.Voa alto sua ousadiareconhecendo o suor dos séculosno orvalho de cada dia.

Mas o vôo mais belodescobre um dia não ser eterno.É tempo de acasalar:voltar à terra com seus ovosà espera de novas e prosaicas lagartas.

O conhecimento é assim:ri de si mesmoE de suas certezas.É meta de formametamorfosemovimento fluir do tempoque tanto cria como arrasaa nos mostrar que para o vôoé preciso tanto o casulocomo a asa